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QUESTÃO ÚNICA

Nome: Ana Vitória Pinheiro Amorim Moura


Matrícula: 493361
De acordo com a Epistemologia de J. Lacan diferencie o Eu e o conceito de
sujeito em psicanálise.
Nota de Autoavaliação: 2/2.

A análise lacaniana diverge do cogito cartesiano ao abordar a formação do


sujeito além da ótica exclusiva do pensamento consciente. Enquanto Descartes
enfatizava a certeza da existência individual através da fórmula 'Penso, logo existo',
Lacan questionava essa noção de identidade ao ressaltar a influência determinante
da linguagem e do inconsciente na constituição do sujeito psíquico. Para Lacan, o
sujeito não se resume a um pensador autônomo, mas é concebido como uma
construção complexa, moldada por interações sociais, processos simbólicos e
desejos inconscientes. Sua perspectiva desafia a ideia de uma identidade unificada
e estável, propondo que a formação do sujeito seja atravessada por fragmentação
(como o discurso do Outro, que chega ao sujeito fragmentado, em pedaços,
simbolizado pela falta) e descentramento, elementos fundamentais do inconsciente
estruturado como linguagem. Ele via o sujeito como atravessado por uma falta
primordial, que é parcialmente preenchida pela entrada na linguagem e na cultura.

Na obra de Lacan, a concepção de sujeito emerge gradualmente das


implicações implícitas da teoria psicanalítica para adquirir progressivamente o status
de um conceito formalmente desenvolvido. Ao longo de suas investigações, Lacan
promove uma transição significativa ao explorar e formalizar a noção de sujeito,
anteriormente sugerida de maneira mais tácita dentro do contexto da teoria
psicanalítica. Esse processo gradual culmina na elevação do sujeito a um conceito
central e estruturante dentro da sua abordagem, conferindo-lhe uma fundamentação
teórica mais explícita e definida. O que Lacan chama de sujeito é justamente esse
enigma trazido pela falta (pela barra), pela divisão que funda o inconsciente, a qual
descentra o indivíduo e a razão valorizada por Descarte. Tendo isso em vista, a
concepção de sujeito pelo viés do simbólico é permeada pela falta e alienado no
significante, necessitando, portanto, de um objeto, uma coisa que venha nomeá-lo
pela linguagem.

No Seminário livro 9: a identificação (1961-1962/2003c), Lacan pensa o traço


unário como primeira marca do significante, sendo aquele que faz surgir o sujeito
como consequência e, deste modo, implica as identificações ao simbólico, a partir da
relação com o Outro. O traço unário é um elemento crucial na formação do sujeito,
um marcador que é atribuído ao significante mestre (S1), conferindo-lhe um caráter
particularmente significativo na psique do indivíduo, é um traço sem qualidade,
detendo um poder simbólico que é o suporte da identificação, ela estará ligada ao
traço unário, elemento estrutural que garante a função da cadeia significante, como
uma garantia. É nessa identificação que com um primeiro significante (S1) qualquer,
no campo do Outro, o sujeito surge, no entanto, ao ingressar nesse campo do Outro,
o sujeito se depara com um significante que ocupa o lugar do Outro, ou seja, um
significante que ainda não foi discernido ou compreendido em sua totalidade. Esse
significante, ao ocupar esse lugar, tem o efeito de petrificar, eclipsar ou cristalizar o
sujeito. Isso significa que o sujeito, ao entrar nesse espaço simbólico, é afetado de
tal maneira pelo poder dos significantes e das estruturas simbólicas que sua
identidade começa a se formar e se solidificar em torno desses elementos
simbólicos. Na concepção lacaniana, a linguagem é estruturada em torno de um
jogo de faltas e desejos. O primeiro significante (S1) emerge como um ponto nodal
na formação da cadeia significante, porém não é capaz de suprir todas as lacunas
simbólicas existentes. Essa estrutura linguística é intrinsecamente marcada por uma
falta fundamental. É nesse momento, de a alienação inicial a um significante
primeiro qualquer S1, que o sujeito se constrói na estrutura simbólica, a partir de um
efeito da articulação do S1-S2, pois, a partir dessa identificação com o S1, ocorre a
convocação de um segundo significante (S2), estabelecendo uma relação entre eles
(S1 → S2), formando o que Lacan chamou de "cadeia mínima". Essa sequência de
significantes representa um momento crucial na estruturação do sujeito, pois é
através dessa cadeia de significantes que o sentido começa a se construir na psique
do sujeito. A convocação do segundo significante (S2) se dá como uma tentativa de
lidar com essa lacuna inerente à estrutura simbólica. A articulação entre S1 e S2
constitui uma cadeia significante que busca atribuir sentido a essa falta inicial,
permitindo ao sujeito a construção de significados dentro do campo simbólico da
linguagem. Ainda assim, sabendo que o sujeito é complexo e descentrado, sabe-se
que o sujeito não pode ser totalmente representado no campo do Outro, ou seja, na
estrutura simbólica da linguagem. Quando um significante representa o sujeito para
outro significante (S1 representando o sujeito para S2), cria-se uma lacuna, uma
falta fundamental. Isso acontece porque nenhum significante pode abarcar
completamente a complexidade do sujeito. A linguagem, por sua própria natureza, é
incapaz de capturar a totalidade do sujeito. Lacan argumenta que há um "não-todo"
do sujeito nesse domínio simbólico, ou seja, uma parte do sujeito escapa à
representação pela linguagem. É nesse espaço entre os significantes que o sujeito
também se encontra, marcado pela busca contínua de sentido dentro dessa
estrutura simbólica.

Enquanto isso, o "eu" (moi), na abordagem lacaniana, Lacan distingue o "eu"


como uma construção imaginária, associada ao campo do imaginário que pode ser
consciente e o "sujeito" como uma entidade do inconsciente, ligada ao campo do
desejo e do simbólico. O "eu", na concepção lacaniana, é formado através das
identificações, das imagens, das representações mentais que construímos sobre nós
mesmos e sobre como somos vistos pelos outros. É uma imagem unificada e
idealizada de nós mesmos, baseada em identificações com figuras externas, como
pais, modelos sociais, etc.

Esse "eu" é uma construção que busca uma sensação de totalidade e


coerência, mas é uma ilusão, já que nunca reflete completamente quem somos. Por
outro lado, o "sujeito" para Lacan está mais relacionado ao inconsciente, ao desejo e
à estrutura simbólica. Ele não é uma entidade consciente ou unificada, mas uma
construção fragmentada e descentrada, atravessada por falta e divisão. O sujeito
está ligado à divisão do sujeito pela linguagem, marcado por influências simbólicas e
desejo inconsciente. Essa discrepância entre o eu e o sujeito é de suma importância,
pois revela a complexidade da subjetividade humana. O eu representa apenas uma
faceta consciente e limitada da identidade, uma construção mental tentativa,
enquanto o sujeito é uma entidade mais ampla e complexa, sendo atravessado por
forças inconscientes e simbólicas que estão além do alcance e controle conscientes.
Essa dicotomia entre eu e sujeito destaca a incapacidade do eu consciente de
abarcar integralmente a totalidade do sujeito, ressaltando a presença de elementos
inconscientes e simbólicos que influenciam profundamente a constituição do sujeito.

REFERÊNCIAS

BRUDER, Maria Cristina Ricotta; BRAUER, Jussara Falek. A constituição do sujeito na


psicanálise lacaniana: impasses na separação. Psicologia em estudo, v. 12, p. 513-521, 2007.

DARRIBA, Vinicius Anciães; BRUNHARI, Marcos Vinicius; PEREIRA, Lívia Beatriz Lisboa. O estatuto do
significante mestre na segregação: causa e efeito do discurso. Trivium, Rio de Janeiro , v. 13, n. spe, p. 23-33,
mar. 2021 . Disponível em
<http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2176-48912021000100005&lng=pt&nrm=iso>.
acessos em 04 dez. 2023. http://dx.doi.org/10.18379/2176-4891.2021vNSPEAp.23.

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