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Farmacologia e

Toxicologia Geral
Processos Farmacodinâmicos de Fármacos
nos Sistemas Nervoso Autônomo e Central

Responsável pelo Conteúdo:


Prof.ª Dr.ª Mariana Cavalcante e Almeida Sá

Revisão Textual:
Prof.ª M.ª Sandra Regina Fonseca Moreira
Processos Farmacodinâmicos de
Fármacos nos Sistemas Nervoso
Autônomo e Central

• Farmacodinâmica dos Fármacos que Atuam nos


Sistemas Nervoso Autônomo e Central;
• Fármacos que Atuam no Sistema Nervoso Autônomo;
• Fármacos que Atuam no Sistema Nervoso Central.

OBJETIVOS DE APRENDIZADO
• Conhecer os fármacos que atuam no sistema nervoso autônomo: agonistas e antagonistas
­colinérgicos, agonistas e antagonistas adrenérgicos e relaxantes musculares de ação periférica;
• Conhecer os fármacos que atuam no sistema nervoso central: Anestésicos inalatórios, intraveno-
sos e locais, anticonvulsivantes, tranquilizantes, hipnoanalgésicos, ansiolíticos e antidepressivos.
UNIDADE Processos Farmacodinâmicos de Fármacos
nos Sistemas Nervoso Autônomo e Central

Farmacodinâmica dos Fármacos que Atuam


nos Sistemas Nervoso Autônomo e Central
Muitos fármacos atuam na rede de sinais químicos que fazem a comunicação entre as
células. Essa rede envolve neurotransmissores e outros mediadores químicos, como
aqueles que regulam o processo inflamatório. Os neurotransmissores fazem a comu-
nicação entre os neurônios, as chamadas conexões sinápticas. Esses últimos são os
responsáveis pelas transmissões colinérgicas e noradrenérgicas. Antes de iniciar o
estudo sobre a ação dos neurotransmissores e os fármacos que os afetam, é necessário
abordar sucintamente a constituição do sistema nervoso.

Figura 1 – Ilustração do sistema nervoso


Fonte: Freepik e Getty Images

O Sistema Nervoso Central (SNC) é um conjunto de órgãos que coordenam ­todas as


atividades do organismo. É a sede da consciência, da memória, da capacidade de apren-
der, de reconhecer e das ações mais elaboradas, tais como a imaginação, o ­raciocínio
abstrato, o pensamento criativo, entre outros. É constituído por duas partes, o encéfalo,
que se situa no crânio, e a medula espinal, que se aloja no canal raquidiano. O SNC é
formado por mais de 10.000 milhões de neurônios.

Embora se esteja ainda muito longe de compreender a base celular e molecular das
múltiplas e complexas funções do SNC, os progressos farmacológicos obtidos nos últi-
mos anos já permitem uma intervenção terapêutica eficaz e relativamente seletiva em
muitas situações decorrentes de perturbações funcionais do SNC.

Os processos básicos de funcionamento do SNC são essencialmente semelhantes aos


que operam na periferia (Sistema Nervoso Autônomo), que consiste na liberação de neu-
rotransmissores por terminações pré-sinápticas e produzindo respostas excitatórias
ou inibitórias rápidas nos neurônios pós-sinápticos.

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O Sistema Nervoso Autônomo (SNA) consiste em três divisões anatômicas princi-
pais: simpática, parassimpática e o sistema nervoso entérico. O SNA se encontra,
em grande parte, fora da influência do controle voluntário. Os principais processos que
ele regula são:
• A contração e o relaxamento da musculatura lisa;
• Todas as secreções exógenas e certas secreções endócrinas;
• Os batimentos cardíacos;
• O metabolismo energético, particularmente no fígado e na musculatura esquelética.

Outros sistemas são também afetados pelo controle autonômico, incluindo rins, siste-
ma imunológico e sistema somatossensorial. A inervação do SNA é usualmente dupla,
todavia, um sistema costuma predominar:
• Sistema Simpático: as fibras simpáticas pré-ganglionares abandonam o sistema
nervoso central a partir de T1 a L2 (toracolombares), passam pela cadeia simpá-
tica e seguem para os tecidos e órgãos pelos neurônios pós-ganglionares. Dentre
as ações promovidas pelo sistema parassimpático estão a contração das pupilas,
o aumento da liberação de secreções como suor e saliva, a redução de batimentos
cardíacos e a contração da musculatura lisa;
• Sistema Parassimpático: as fibras parassimpáticas (crâniossacrais) que partem do
sistema nervoso central pelos nervos cranianos III, VII, IX e X e ainda pela terceira
e quarta raízes espinhais sacrais. Praticamente 75% de todas as fibras nervosas
parassimpáticas estão nos dois nervos vagos que proporcionam uma extensa iner-
vação toracoabdominal. As fibras parassimpáticas pós-ganglionares se encontram
nas paredes dos órgãos de modo que promovem a manutenção das funções vitais
essenciais para a vida.

Como os neurônios se comunicam?


As células do Sistema Nervoso, os neurônios, se comunicam através de neuro-
transmissores, que são substâncias químicas liberadas pela terminação nervosa na
fenda sináptica. Quando alcançam os receptores das células pós-sinápticas podem
estimular ou inibir segunda célula. Portanto, a neurotransmissão é um exemplo de
comunicação química entre células, já que os neurônios são células individualizadas
(que não possuem contato umas com as outras) que, para se comunicarem, necessitam
de mediadores.

Como principais exemplos de neurotransmissores, temos a acetilcolina, adrenalina


e noradrenalina. Quando a ação é mediada pela acetilcolina, o neurônio é denomina-
do colinérgico, de modo que todos os neurônios pré-ganglionares são denominados
colinérgicos. Sendo assim, a acetilcolina faz a comunicação entre os gânglios autonô-
micos, simpáticos e parassimpáticos. Por outro lado, quando há ação da noradrenalina
ou adrenalina, a fibra e denominada adrenérgica, pois esta atua sobre neurônios pós-
-ganglionares no sistema parassimpático. Desse modo, todas as terminações nervosas
do sistema parassimpático secretam acetilcolina, enquanto a maioria das terminações do
sistema simpático liberam noradrenalina.

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Quando falamos sobre sistema nervoso há inúmeras formas de comunicação via neu-
rotransmissores entre os neurônios, dentre eles podemos citar dopamina, histamina,
glicina, ácido gama-aminobutírico (GABA), dentre outros. São estes neurotransmis-
sores que desencadeiam respostas teciduais e glandulares, além de estimularem a pro-
dução de enzimas e hormônios.

Como os fármacos interagem com o sistema nervoso?


A ação de uma substância farmacológica deve ser entendida como um produto obtido
pelas interações químicas entre substância e tecidos, ou seja, as moléculas dos fármacos
devem estar “ligadas” aos constituintes específicos das células e dos tecidos para produ-
zir algum efeito desejado. Com raras exceções, os fármacos atuam sobre proteínas-alvo,
que podem ser receptores, canais iônicos, enzimas e moléculas transportadoras.

Os receptores são estruturas moleculares altamente especializadas, com função de


comunicar e coordenar a função de todas as diferentes células do corpo mediante in-
teração com substâncias endógenas, e que podem também interagir com substâncias
exógenas que tenham características químicas e estruturais comparáveis às substâncias
que ocorrem naturalmente no organismo.

Os canais iônicos podem ter sua função alterada devido à ação dos fármacos, que
podem interagir diretamente com um receptor (como nos canais iônicos regulados por
ligantes), ou quando o próprio fármaco se liga à proteína do canal e altera a função
(como nos canais iônicos regulados por voltagem).

Já as com as enzimas, os fármacos podem atuar como um inibidor competitivo


­enzimático, impedindo que elas exerçam sua função de forma reversível ou irreversível.

Por fim temos as moléculas transportadoras, que são proteínas responsáveis pelo
transporte de pequenas moléculas orgânicas e íons pelas membranas celulares e que
podem ser alvo para a ação de fármacos.

A ocupação de um receptor por um fármaco pode ou não resultar em uma ativação


do receptor. A ligação e a ativação constituem etapas distintas na geração da resposta,
assim, ativar significa que o fármaco foi capaz de desencadear uma resposta tecidual.
Quando a molécula do fármaco é capaz de desencadear essa resposta é denominada de
agonista. Quando uma substância se liga ao receptor sem causar ativação, impedindo
que outro se ligue e desencadeie tal resposta é denominada de antagonista.

Fármacos que Atuam no


Sistema Nervoso Autônomo
Como discutido anteriormente, os fármacos atuam sobre os receptores dos neuro-
transmissores no sistema nervoso autônomo. Neste caso, temos dois tipos de recepto-
res: os receptores colinérgicos e receptores adrenérgicos.

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A acetilcolina é sintetizada a partir da substância colina. Para a reação bioquímica que
transforma colina em acetilcolina é necessário a atuação da enzima colina acetiltransfe-
rase, também conhecida como acetil-CoA. A acetilcolina é encontrada apenas como me-
diador endógeno (substância sintetizada pelo próprio organismo). Quando liberada pelas
fibras pré ou pós-ganglionares, promovem velozmente as respostas biológicas.

Os receptores colinérgicos, também chamados de receptores colinomiméticos,


podem atuar de forma direta, através de receptores muscarínicos e nicotínicos, e in-
diretamente, através de anticolinesterásicos. Os receptores anticolinérgicos atuam
de forma direta, e são denominados de antimuscarínicos e antinicotínicos.

Os receptores adrenérgicos, também chamados de receptores simpatomiméti-


cos, atuam de forma direta, através de receptores α-adrenérgicos e β-adrenérgicos, e de
forma indireta ao estimular a biossíntese e liberação de noradrenalina, ou evitando
a recepção de noradrenalina nas células nervosas. Os receptores antiadrenérgicos são
α-bloqueadores e β- bloqueadores.

Os receptores adrenérgicos são divididos em duas classes principais, denominadas


α e β. Todas as classes e subclasses de receptores de catecolaminas são membros da
superfamília de receptores acoplados a uma proteína transmembrânica, denominada
proteína G. Ambos os receptores adrenérgicos α e β estão acoplados a proteínas de
suporte citoplasmáticas que, por sua vez, estão acopladas a cascatas de sinalização.
Os receptores α-adrenérgicos são divididos em subclasses α1 e α2.

Os receptores α1-adrenérgicos são expressos no músculo liso, no coração e no


fígado. Os receptores α2-adrenérgicos são expressos em células nervosas e parietais
gástricas. Já os receptores β-adrenérgicos são divididos em três subclasses, denomina-
das β1, β2 e β3. Os receptores β1-adrenérgicos localizam-se primariamente no coração
e nos rins. Os receptores ß2-adrenérgicos são expressos no músculo liso, no fígado e
no músculo esquelético. Os receptores ß3-adrenérgicos são expressos especificamen-
te no tecido adiposo.

A proteína G é um heterodímero formado por duas subunidades: α para ligação com GTP
(guanosina trifosfato), que possibilita o reconhecimento específico de receptores e efetores,
e por subunidades β e γ, que formam um dímero bastante estável. Quando está em repouso
o receptor-heterodímero, a subunidade α contém GDP ligado e o complexo α-GDP: βγ está
acoplado ao receptor sem o ligante. ]

Quando recebe a ação de um agonista, liga-se a um receptor acoplado à proteína G,


promovendo uma alteração conformacional neste receptor, o que possibilita o acopla-
mento ao heterotrímero da proteína G. Essa alteração conformacional da proteína faz
com que o fator de troca de nucleotídeos de guanina (GEF) induza a troca de GDP por
GTP na subunidade α. E quando o GTP é formado, ativa a subunidade α e faz com
que ela libere o dímero βγ e o receptor, que por sua vez, faz com que o dímero βγ se

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t­ransforme em moléculas sinalizadoras ativas que iniciam cascatas de sinalização intra-


celular ativando efetores.

Figura 2 – Ilustração da ativação da proteína G


Fonte: Adaptado de Wikimedia Commons

Agonistas Colinérgicos
Como discutido anteriormente, os efeitos parassimpáticos são desempenhados pela
acetilcolina. Para que a acetilcolina exerça suas funções biológicas, ela deve ser cap-
tada por receptores presentes nas membranas celulares dos órgãos “alvo”. As reações
mediadas pela acetilcolina são relacionadas com o sistema colinérgico (por causa da
colina). Assim, a via colinérgica é a via da acetilcolina, e esta atua no sistema nervoso
parassimpático. Assim, quando falamos em transmissão colinérgica, referimo-nos ao
sistema nervoso parassimpático e como ele regula os tecidos (Quadro 1).

Por outro lado, temos o neurotransmissor norepinefrina (ou noradrenalina).


As ações relacionadas à norepinefrina têm a ver com o sistema adrenérgico (por causa
do termo adrenalina, sinônimo de epinefrina). Assim, a via adrenérgica é a via da
norepinefrina e atua no sistema nervoso simpático.

Existem dois tipos de receptores para a acetilcolina: os nicotínicos e os muscaríni-


cos. Os receptores nicotínicos encontram-se nos músculos esqueléticos, nos gân-
glios autônomos e em muitas regiões do cérebro. Já os receptores muscarínicos
encontram-se em várias regiões cerebrais, nas glândulas, no coração, no músculo
liso e nos pulmões.

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Quadro 1 – Principais tipos de receptores colinérgicos do Sistema
Nervoso Periférico e suas respectivas ações terapêuticas

Vasodilatador e depressor cardíaco. Sua ação vasodilatadora é mais


pronunciada nas áreas vasculares periféricas. Além de estimular o
Acetilcolina sistema parassimpático e a musculatura lisa das vísceras, aumenta
a secreção das glândulas salivares, lacrimais e de outras glândulas.

Age primordialmente no coração e nos músculos lisos, produzindo


Metacolina efeitos similares aos da acetilcolina, porém não atua significativa-
mente nos músculos esqueléticos e nos gânglios autônomos.

Normalmente utilizada na forma de atropina para tratamento em


Muscarina casos de intoxicação

Fonte: RANG, 2007

Antagonistas Colinérgicos
Os antagonistas colinérgicos, também chamados de anticolinérgicos, ou bloquea-
dores dos receptores muscarínicos (antimuscarínicos), inibem as respostas da estimu-
lação dos nervos colinérgicos pós-ganglionares do sistema parassimpático, em especial
aqueles que inervam as glândulas exócrinas e os músculos lisos, ou seja, são seletivos.
Os anticolinérgicos evitam que a acetilcolina exerça sua atividade ao nível dos seus re-
ceptores existentes nas células efetoras. Essas substâncias (Quadro 2) não impedem a
biossíntese da acetilcolina. E, devido a serem lipossolúveis, são absorvidos rapidamente
pelo intestino e atravessam a barreira hematoencefálica.

Quadro 2 – Principais tipos de anticolinérgicos e suas respectivas ações terapêuticas

Promove um bloqueio reversível das ações adrenérgicas nos recep-


Atropina tores muscarínicos.

Age nos receptores das células parietais gástricas e inibe a secre-


Pirenzepina ção de ácido gástrico.

Possui ação anti-cinetose (distúrbio vestibular que causa tonturas ou


Escapolamina enjoos do movimento) e proporciona alivio no tratamento da diarreia
por promover o relaxamento da musculatura lisa gastrintestinal.

Fonte: RANG, 2007

Agonistas Adrenérgicos
Agonistas adrenérgicos são fármacos que, direta ou indiretamente, estimulam o
adrenorreceptor e mimetizam os efeitos simpáticos, já que são estimulados por adre-
nalina ou noradrenalina, como discutido anteriormente.

As drogas adrenérgicas, ou simatomiméticas, agem estimulando as funções do sis-


tema nervoso simpático, ou seja, nas respostas ou efeitos obtidos através da ativação
dos receptores adrenérgicos alfa e beta.

Quando o sistema simpático é ativado simultaneamente, como uma unidade completa


(também chamada de descarga em massa), ocorre a resposta de alarme. Como discutido

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anteriormente, como exemplos de neurotransmissores adrenérgicos temos a noradre-


nalina e adrenalina, que são transmissores simpáticos que atuam nas transmissões pós-
-ganglionares no sistema parassimpático.

Antagonistas adrenérgicos
São drogas cujo principal efeito consiste em ocupar os receptores α ou β fora do
sistema nervoso central, por isso são denominadas antagonistas ou bloqueadores de
receptores α ou β (Quadro 3). Essa atividade adrenérgica pode ser bloqueada em vários
pontos do processo estimulante simpático.
Os α bloqueadores apresentam efeito vigoroso sobre a pressão arterial, atuando
principalmente sobre o músculo liso e plaquetas. O uso terapêutico dos α antagonistas
compreende hipertensão arterial sistêmica, hipertensão secundária, como feocromoci-
toma, disfunção sexual, hiperplasia benigna prostática, dentre outros. Também possui
efeitos cardiovasculares, atuando sobre o tônus arterial e venoso causando uma diminui-
ção na resistência vascular periférica e pressão arterial. Os β bloqueadores apresentam
efeitos no coração, cérebro, músculo liso e estriado cardíaco, além dos lipócitos.

Quadro 3 – Principais tipos de antagonistas


adrenérgicos e suas respectivas ações terapêuticas

Bloqueador α não-seletivo, que tem sido utilizado em feocromo-


Fentolamina citoma e disfunção erétil.

Bloqueador α não-seletivo, que causa vasodilatação, diminuindo


Fenoxibenzamina assim a pressão arterial, porém apresenta também um aumento
do débito cardíaco e da frequência cardíaca.

Pradozin Bloqueador α seletivo, que é utilizado no tratamento da hipertensão.

Bloqueador β que atua na diminuição da frequência e no débito car-


Propanolol díaco, prolonga e diminui a velocidade da sístole mecânica e diminui
levemente a pressão arterial nos indivíduos em repouso.

Nodolol Bloqueador β que possui ação hipotensora ocular local.

Bloqueador β utilizado em pacientes com diabetes ou com doença


vascular periférica, porque os receptores β₂ são importantes no fí-
Metoprolol gado para recuperação de episódios de hipoglicemia, promovendo
vasodilatação nos vasos periféricos.

Pindolol Bloqueador β com atividade simpática intrínseca.

Bloqueador α e β que promove hipotensão induzida


Labetalol e menos taquicardia.

Fonte: RANG, 2007

Relaxantes musculares de ação periférica


Relaxantes musculares de ação periférica nada mais são do que bloqueadores neu-
romusculares utilizados por via intravenosa como adjuvantes na anestesia geral por

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provocarem relaxamento muscular. Podem exercer seu bloqueio na pré-sinapse, no neu-
rônio, ou na pós-sinapse, na fibra muscular. Entretanto, todos os fármacos clinicamente
importantes atuam na pós-sinapse.
Há várias substâncias empregadas na clínica que atuam, principalmente, na inter-
rupção da transmissão do impulso nervoso na junção neuromuscular esquelética.
Com base nos efeitos característicos dessas substâncias elas podem ser classificadas em:
agentes competitivos de bloqueio não-despolarizante, por meio de um antagonista,
cujo exemplo clássico é a tubocurarina (Curare), e agentes de bloqueio despolarizan-
tes, por meio de um agonista, como a succinilcolina. Os bloqueadores neuromuscula-
res também atuam em outros locais importantes, incluindo os gânglios autônomos.
A tubocirarina é usada em anestesia, atuando como bloqueador competitivo da
acetilcolina nos receptores nicotínicos da placa terminal, promovendo assim a parali-
sia motora. A succinilcolina age por um mecanismo diferente, no qual seu efeito inicial
e despolarizar a membrana do mesmo modo que a acetilcolina, embora com maior
persistência, pois não é metabolizada nas sinapses. Com isto, resulta um breve período
de disparo manifestado por fasciculação muscular transitória, onde as membranas per-
manecem despolarizadas e não respondem a impulsos subsequentes.

Fármacos que Atuam no


Sistema Nervoso Central
O sistema nervoso central é, essencialmente, semelhante ao SNA, consistindo na
liberação de neurotransmissores por terminações pré-sinápticas e produzindo respostas
excitatórias ou inibitórias rápidas nos neurônios pós-sinápticos.

O SNC apresenta altas concentrações de aminoácidos que se ligam a receptores pós-


-sinápticos, atuando como neurotransmissores inibitórios ou excitatórios. Das duas clas-
ses principais de aminoácidos neuroativos, o Ácido γ- aminobutírico (GABA), como
principal inibitório, e o Glutamato, comoprincipal excitatório.

Há também um neurotransmissor catecolamínico que atua no SNC, a dopamina.


Este atua como alvo terapêutico para alguns distúrbios importantes do SNC, incluindo
a doença de Parkinson e a esquizofrenia. Os receptores da dopamina são membros
da família das proteínas receptoras acopladas à proteína G. Outro neurotransmissor
atuante no SNC é a serotonina, que constitui um alvo de muitos fármacos utilizados no
tratamento da depressão, muitas dessas medicações antidepressivas também afetam a
neurotransmissão da norepinefrina.

Como os fármacos atuam no sistema nervoso central?


Os fármacos que atuam no SNC são denominados psicotrópicos, e são definidos
como agentes que afetam o humor e o comportamento. Como é difícil definir e medir
esses índices de função cerebral, não existe nenhuma base consistente para a classifica-
ção dos agentes psicotrópicos.

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nos Sistemas Nervoso Autônomo e Central

A Organização Mundial de Saúde (OMS) sugere a seguinte classificação: os fárma-


cos que são utilizados para produzir anestesia cirúrgica são denominados de agentes
anestésicos; os fármacos que promovem sono e reduzem a ansiedade são denominados
agentes ansiolíticos e sedativos; os fármacos que são eficazes no alívio da esquizo-
frenia são denominados agentes antipsicóticos; os fármacos que aliviam os sintomas
da depressão são denominados agentes antidepressivos; os fármacos que atuam no
combate às crises convulsivas e no tratamento da epilepsia são denominados agentes
anticonvulsivantes; os fármacos utilizados clinicamente para o controle da dor são de-
nominados analgésicos.

Anestésicos Inalatórios, Intravenosos e Locais


Os anestésicos vão atuar bloqueando a percepção geral e nas reações aos estímulos
dolorosos. Isso ocorre tanto com o emprego de agentes inalatórios quanto com a admi-
nistração de certas drogas por via parenteral, retal ou oral. Os anestésicos gerais, ao
contrário dos anestésicos locais, são administrados sistematicamente, exercendo seus
efeitos sobre o sistema nervoso central.

A nível celular, os anestésicos inibem a transmissão sináptica, através de uma redu-


ção na liberação de transmissores, ou pela inibição da ação do transmissor, ou ainda
pela redução da excitabilidade da célula pós-sináptica

A anestesia envolve três principais alterações neurofisiológicos: inconsciência,


perda­da resposta a estímulos dolorosos e perda dos reflexos. Os anestésicos gerais
são usados como adjuvantes em procedimentos cirúrgicos, de modo a tornar o paciente
­inconsciente a estímulos dolorosos e não responsivo a eles. Agem bloqueando a condu-
ção dos impulsos nos nervos sensitivos periféricos.

Anestésicos inalatórios
Utilizados para manter o estado anestésico após administração de um agente intra-
venoso. Possuem indução e recuperação rápida, permitindo um controle flexível sobre
a profundidade da anestesia. Como exemplos desse grupo de fármacos temos o óxido
nitroso, o halotano, o metoxiflurano, o enflurano e o isoflurano

Anestésicos intravenosos
São utilizados para a rápida indução de anestesia, a qual é, então, mantida com
um agente inalatório; agem rapidamente, produzindo inconsciência tão logo o fármaco
atinja seu local de ação. Como exemplos desse grupo de fármacos temos o tiopental, a
quetamina, o etomidato e o propofol.

Anestésicos locais
São substâncias capazes de impedir, de modo reversível, a condução de impulsos
nas fibras nervosas, através do bloqueio dos canais de sódio. Desse modo, as sensações
que vêm da periferia para o SNC (aferentes) e as mensagens que o SNC manda para a
periferia (eferentes) são suspensas. Como exemplos desse grupo de fármacos temos a
cocaína, a procaína, a lidocaína, a prilocaína, a tetracaína e a bupivacaína.

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Você Sabia?
O primeiro anestésico local descoberto foi a cocaína, um alcaloide contido em porcenta-
gens consideráveis nas folhas de um arbusto das montanhas dos Andes.

Anticonvulsivantes
Esse grupo de fármacos, como o próprio nome sugere, atua revertendo episódios
convulsionantes. Um exemplo disso é a epilepsia, que é um distúrbio caracterizado por
uma crise associada a convulsões, dependendo da área do cérebro afetada, que tomam
várias formas e são devidas a descargas neuronais episódicas. A epilepsia pode ser clas-
sificada de duas formas:
• Crises Parciais: Que podem ainda ser do tipo Simples (quando não há perda da
consciência, com distúrbios focais sensoriais, motores, autônomos e psíquicos); ou do
tipo Complexa (que é caracteriza por episódios de alucinações sensoriais complexas e
distorção mental, perda da consciência e é a mais comum entre os tipos de epilepsia);
• Crises Generalizadas: que se apresenta como Crise Tônico-clônica (quando há
perda da consciência, queda, extensão rígida de tronco e membros, contração rít-
mica dos membros); pode se apresentar também como Crise de Ausência (quando
há perda da consciência por um curto período de tempo, sendo mais comum entre
crianças, com ou sem piscar de olhos); e, por fim, como Crise Mioclônica (quando
há curtos episódios de contração muscular, esse é o tipo mais raro).

Os fármacos envolvidos no tratamento da epilepsia, podem ser distinguidos em três


grupos de acordo com o mecanismo de ação que exercem em seu efeito farmacológico.
São esses mecanismos:
• Potencialização da ação do receptor GABA: fármacos antiepilépticos perten-
cente às classes dos barbitúricos (fenobarbital) e benzodiazepínicos (diazepam, clo-
nazepam), e fármacos mais novos como a vigabatrina, tiagabina e a gabapentina;
• Inibição da função dos canais de sódio: a maioria dos fármacos antiepilépticos atuam
por esse mecanismo, são exemplos: fenitoína, carbamazepina, valproato, lamotrigina;
• Inibição da função dos canais de cálcio: esse é o grupo de fármacos utilizados
para o tratamento de crises de ausência, possui como principal representante o
fármaco etossuximida.

Tranquilizantes
Esse grupo de fármacos são também conhecidos como antipsicóticos, neurolép-
ticos ou antiesquizofrênicos e são usados para tratar a esquizofrenia, por exemplo,
uma das formas mais comuns e debilitantes de doença mental.

A doença psicótica esquizofrênica se apresenta, como sintomatologia, por episó-


dios de delírios, alucinações e distúrbios do pensamento, juntamente com a exclu-
são social, abrandamento das respostas emocionais e prejuízo cognitivo.

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nos Sistemas Nervoso Autônomo e Central

O bloqueio dos receptores pós-sinápticos da dopamina no sistema mesolímbico pode


resultar em reações motoras extrapiramidais. Os neurolépticos também bloqueiam os
receptores adrenérgicos (α receptores centrais) da histamina e receptores colinérgi-
cos, isso provoca outros efeitos colaterais. As principais categorias dos fármacos envol-
vidos no tratamento são:
• Antipsicóticos “típicos” clássicos: Exemplos de fármacos são clorpromazina, ha-
loperidol, flufenazina, tioridazina, flupentixol, clopentixol;
• Antipsicóticos “atípicos” recentes: Exemplos de fármacos clozapina, risperidona,
sertindol, quetiapina.

Hipnoanalgésicos e Ansiolíticos
Os fármacos destes grupos são usados no tratamento da ansiedade, síndrome do
pânico e fobia, denominados ansiolíticos, e os fármacos usados no tratamento da
­
­insônia, denominados hipnóticos. Os ansiolíticos atuam seletivamente sobre a ansie-
dade, não interferindo com as funções cognitivas e vegetativas, estimulando a ação dos
neurotransmissores que promovem efeitos sobre as emoções e no controle do sono.
Dependendo do mecanismo de ação desses fármacos, podem ser classificados em:
• Benzodiazepínicos: São fármacos com efeitos que reduzem a ansiedade e a agres-
sividade, sedação e indução ao sono, redução do tônus muscular e da coordenação
motora, efeito anticonvulsivante e amnésia retrógrada. Potenciam a inibição neuro-
nal mediada pelo ácido gama-aminobutírico (GABA). São exemplos desse grupo de
fármacos o alprazolam, clonazepam, cloxazolam, diazepam e lorazepam;
• Agonistas dos receptores de serotonina: São os fármacos mais recentemen-
te desenvolvidos, que possuem atividade ansiolítica com discreta sedação. Como
exemplo deste grupo de fármacos temos a buspirona;
• Barbitúricos: São fármacos que apresentam efeitos desde sedação e redução da
ansiedade à inconsciência e morte por falência respiratória e cardiovascular. Devido
aos efeitos adversos que apresentam são considerados perigosos, por isso não são
mais recomendados como ansiolíticos/hipnóticos, considerando que os benzodia-
zepínicos são bem mais seguros.

Antidepressivos
A depressão é uma condição psiquiátrica extremamente comum. Atualmente existe
uma série de teorias neuroquímicas e uma variedade de diferentes tipos de fármacos
usados em seu tratamento.

Os fármacos pertencentes a cada uma das classes são bastante homogêneos, distin-
guindo-se mais pelos aspectos quantitativos do que qualitativos, assim como pela farma-
cocinética. Eles pertencem às seguintes categorias:
• Inibidores da captura da monoaminas: São os fármacos antidepressivos tricíclicos
(imipramina, amitriptilina) e os fármacos inibidores seletivos da captura da serotonina
(fluoxetina, paroxetina, sertralina);

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• Inibidores da Monoaminooxidases (IMAO): São fármacos que inibem a ação da
enzima monoamina oxidase (MAO), que é responsável por degradar monoaminas
como a noradrenalina, tiramina, dopamina e serotonina, promovendo assim um au-
mento na concentração dessas substâncias no corpo e no cérebro. Isso garante uma
condição de excitação dos neurônios que possuem receptores para esses mediado-
res. Os fármacos IMAO são a fenelzina, tranilcipromina, iproniazida e moclobemida;
• Antidepressivos variados: bupropiona, mianserina, trazodona.

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UNIDADE Processos Farmacodinâmicos de Fármacos
nos Sistemas Nervoso Autônomo e Central

Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

Livros
Farmacologia e Terapêutica em Veterinária
BOOTH, N. H.; MCDONALD, L. E. Farmacologia e Terapêutica em Veterinária.
8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004.
Farmacologia Clínica: Fundamentos da Terapêutica Racional
FUCHS, F. D.; FERREIRA, M. B. C.; WANNMACHER, L. Farmacologia Clínica:
Fundamentos da Terapêutica Racional. 3. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006.

Vídeos
Neurotransmissores
https://youtu.be/FD8Qaw1TS-k

Leitura
Sistema colinérgico: revisitando receptores, regulação e a relação com a doença de Alzheimer,
esquizofrenia, epilepsia e tabagismo
VENTURA, A. L. M. et al. Sistema colinérgico: revisitando receptores, regulação
e a relação com a doença de Alzheimer, esquizofrenia, epilepsia e tabagismo. Rev.
psiquiatr. clín., São Paulo, v. 37, n. 2, p. 66-72, 2010.
https://bit.ly/3lE6suu

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Referências
RANG, H. P. Farmacologia. 6. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007.

SPINOSA, H. S.; BERNARDI, M. M.; GORNIAK, S. L. Farmacologia Aplicada à Me-


dicina Veterinária. 4. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006.

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