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VII
No primeiro capítulo, Victor Wagner da Costa Soares discorre sobre as
sociabilidades, religiosidade e cotidiano do Maranhão setecentista. Trata-se de uma
pesquisa documental na qual os testamentos do período foram a principal fonte, por eles o
autor observou o dito e o não dito, lendo nas estrelinhas da documentação os silêncios
propositais, ou não, de instituições religiosas que influenciaram e solidificaram a sociedade
escravista maranhense.
O segundo capitulo, também fruto de uma pesquisa documental sobre o Maranhão
colonial, traz um outro tipo de silêncio. Na verdade, um longo silenciamento historiográfico
sobre o que era Ser Mulher e ser escrava no Maranhão setecentista, Laysla Eduarda dos
Santos Lopes aponta as dificuldades de se encontrar estudos sobre essa temática, já que
somente com a abertura dos estudos de gêneros e da História das mulheres começaram a
aparecer trabalhos nessa área.
Já Silvana Maranhão Lucas traz, no terceiro capítulo, uma discussão mais
contemporânea das questões de gênero no século XX, apontando a invisibilidade da
diversidade em uma famosa revista Adolescente do final do século XX. Em seu estudo
Silvana demonstra a manutenção de um padrão estético que segrega e silencia mulheres
negra, gordas, lésbicas e trans, o que contribuiu para a manutenção da marginalização
social desses sujeitos.
O último capítulo, desta parte, se debruça sobre conceitos e teorias que visam
compreender e desmistificar os preconceitos historicamente construídos. Em Gênero,
patriarcalismo e heteronormatividade, Luís Fernando Santos Vale aborda a influência do
sistema patriarcal na construção de masculinidades hegemônicas, comportamentos
heteronormativos e machismo que conduzem a casos de violência contra a mulher e
homofobia.
Já a segunda parte, Caminhos da Interseccionalidade, traz à tona a discussão
que não é possível entender as discriminações de forma descontextualizadas de seus
aspectos históricos e sociológicos de raça, classe social, gênero e sexualidade. Tais
marcadores sociais se agregam na estrutura de opressão às quais as minorias são
relegadas e devem ser cuidadosamente analisadas. Todavia, a interseccionalidade aqui
explorada também permitiu expor as múltiplas visões para a interpretação da realidade
oferecidas pelos jovens pesquisadores do Ensino Médio tecnológico do interior do
Maranhão e produzidas a partir dos projetos de pesquisas financiados pelo Instituto
Federal do Maranhão em 2019.
O primeiro capítulo, desta parte, explora as interseccionalidades de gênero e raça
na escravidão empregada no Maranhão colonial. Ao pesquisar as alforrias femininas nos
Testamentos do Maranhão setecentista, a bolsista Maria Wanilde Santos Silva e a
voluntária Laura Elisa de Albuquerque Leite Alves trazem à tona os modos de
sobrevivência das mulheres negras e escravizadas do período e como elas, em meio a
negociações, barganhas e conflitos, buscaram garantir para si e para os seus, formas de
resistir à exploração até o alcance de suas liberdades.
Já no segundo capítulo, a autora Hiza Júlia Ruben Corrêa Leal mergulha no
universo da menina adolescente comparando as influências da revista feminina Atrevida,
no final do século XX, e a ascensão das “digitais influencers” de hoje. A autora discute
representatividade e protagonismo feminino da diversidade que apesar de nos últimos
VIII
anos ganhar uma certa independência, dado à internet e às redes sociais, ainda tem pouco
espaços nos canais mais formais de comunicação, educação e mesmo político.
Seguindo as discussões de gênero, Samyra Kelly Ribeiro Arruda traz no terceiro
capítulo o debate sobre o machismo e o sexismo presente nas propagandas publicitárias
brasileiras do século XX e como estas apresentavam identidades femininas “ideais” para
dois diferentes grupos de consumo: para as mulheres as propagandas de produtos de
limpeza, repassam a ideia de boas esposas, recatadas, prendadas e utilizando sempre da
presença de uma família branca heteronormativa, enquanto que para os homens as
cervejas objetificam os corpos femininos ao ponto de confundir-se o que se está vendendo,
o produto ou a mulher.
O último capítulo explora a emergência de um movimento relativamente novo no
Brasil: o afrofuturismo, um gênero artístico revolucionário que mescla a cultura africana
ancestral com ficção científica, além de refletir sobre as imagens do povo negro-
afrodescendente, representadas pelo movimento. O artigo, que é de autoria da professora
Nila Michele Bastos Santos, também explica como essa concepção foi introduzida no IFMA
campus Pedreiras apresentando-se em projetos de pesquisa, artísticos culturais e eventos.
Por fim, é preciso dizer que o quê une as vozes do silêncio e os caminhos da
interseccionalidade é sobretudo a luta pela diversidade livre de preconceitos e
discriminação. O Caderno de Bolsa: olhares sobre a diversidade é um esforço
educacional para abandonar por vez a ideia estereotipada sobre a Educação básica como
um mero lugar de reprodução e doutrinação disciplinar, esta obra mostra que a escola
pode sim, ser um espaço de pesquisa e produção de conhecimento e um lugar para
formação de identidades e cidadania em busca por uma sociedade mais progressista, justa
e equalitária.
Todos os bolsistas e voluntários que aqui escreveram tiveram como orientadora a
organizadora dessa obra e apesar do esmero nas interferências é salutar ressaltar que os
artigos são de alunos do Ensino Médio logo, as intervenções foram pontuais. Evitamos,
propositalmente, uma linguagem mais prolixa, contudo, sem perder o rigor cientifico que a
pesquisa em ciências humanas exige. Nosso objetivo principal é alcançar os demais
alunos da educação básica, e para tanto, escrever de forma que estes, principalmente
estes, entendam foi fundamental.
Esperamos que mais jovens pesquisadores, possam perceber que é possível sair
dos estigmas que lhes são impostos, valorizando sua identidade de forma positiva,
tomando consciência de seu próprio ser, e finalmente, empoderando-se para a luta contra
toda e qualquer forma de preconceito. É o que acreditamos e, por isso, resistimos.
Esperamos que apreciem a leitura, ela é fruto de nossos esforços.
IX
CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Introdução
1 Bolsista PIBIC Ensino Médio 2018/2019 - Bolsista PIBIC ENSINO MÉDIO 2018/2019 - EDITAL
PRPGI nº 03/2018. Aluno do ensino médio integrado ao Curso de Petróleo e Gás do IFMA - Campus
Pedreiras. E-mail: victor.soares@acad.ifma.edu; victorwagnercostasoares@gmail.com
2 Orientadora PIBIC ENSINO MÉDIO 2018/2019 - EDITAL PRPGI nº 03/2018. Mestra em História
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
[...] e para que na`o possa haver omissa`o alguma na boa arrecadaçam
desta esmolla, que quero prefira as mais, que deyxo em dinheyro depois
desta prezente verba, os procuradores e intendentes deste recolhimento,
que ao prezente hê o Muyto Reverendo Padre mestre missionario Manoel
da Silva da Companhia de Jezus [...] (Rezisto com que faleseo o senhor
Gaspar dos Reys que foi desta Capitania em 16/09/1744. apud MOTA.
Antonia. SILVA. Kelcilene Rose, MANTOVANI. José Dervil, 2001, p.48.)
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
faleseo o senhor Balthazar Pereira dos Reis em 08/12/1759 - ATJ. Livro 1751 -
1759, fl. 29);
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
• Dívida: “\\\ Declaro dever a quantia de doze mil reis a Santa Caza de Jerusalem” (Rezisto
com que faleseo o senhor Antonio de Lemos em 18/07/1735. ATJ. Livro 1751 - 1759, fl.
59v);
• Esmola acostumada: “e que de tudo Se darâ a esmolla costumada” (Rezisto com que
faleseo a senhora Lourença de Tavora em 27/07/1752 1761 apud MOTA. Antonia.
SILVA. Kelcilene Rose, MANTOVANI. José Dervil, 2001, p.83).
Tais instituições católicas obtiveram assim de diversas formas um grande
capital, tornando-se inexata a imensa quantia em poder da Igreja, fazendo-nos
questionar sobre suas reais intenções com seus adeptos, já que “pode-se afirmar que
a prosperidade material da igreja católica veio junto com uma inédita crise de valores
e princípios” (SANTOS, 2009, p. 19). Consequentemente, tal prosperidade a
manteve com papel importante em todos os aspectos econômicos do Maranhão
colonial, manifestando-se na venda de indulgências, nas missas, em seus rituais
fúnebres e na própria organização presente nas formações das irmandades,
questões que influenciaram notoriamente as pessoas que conviviam com essa forte
cultura cristã.
Um breve exemplo desse capital individual de cada testador gasto com
religiosidade é o de Gaspar dos Reys, morador da cidade de São Luís do Maranhão,
em 16 de setembro de 1744; de acordo com seu testamento, estima-se que tenha
doado aproximadamente 615 mil reis e 3 mil cruzados, dinheiro distribuído entre
várias instituições católicas como a Igreja de Nossa Senhora do Rozario dos Pretos
e a Capella do Noviciado do Collegio da Companhia de Jesus, os estudos realizados
sobre este último são relevantes uma vez “que nos podem fazer ver aspectos
importantes da formação social, cultural e educativa no Brasil” (HERNANDES, 2010,
p. 222).
Portanto, essas eram questões profundamente ligadas ao cotidiano dos
indivíduos que se mostra fabulosamente diversificado nos testamentos do Maranhão
Colonial (1676-1799).
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
_//_ quero, e ordeno que sendo Deos servido levarme meu Corpo sera
sepultado na Matris desta Cidade, e ira amortalhado no habito de Nossa
Senhora do Carmo, e se dará de esmolla o Custumado - // Deixo que os
Religiozos de Nossa Senhora do Carmo aCompanhem meu Corpo a
sepultura, e se lhe dará a esmolla Custumada - // Declaro que sou irmao’ da
Sancta Caza da Mizericordia, e ja fui provedor, e tem a Irmandade
obrigaçam de me aCompanhar e se lhe dara de esmolla pera as despezas
da Caza Vinte mil reis _//_ quero, e ordeno q. Me acompanhem todas as
Cruzes das Irmandades assim das que sou Irmam Como das que nam sou,
e se lhe dara a esmolla costumada _//_ (Rezisto com que faleseo o senhor
Bartolomeu Pereira de Lemos em 29/07/1676, apud MOTA. Antonia. SILVA.
Kelcilene Rose, MANTOVANI. José Dervil, 2001, p.34).
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
= e por quanto esta he a minha ultima vontade do modo que tenho dito pedy
ao Muyto Reverendo Padre Frey Antanio, que este meu Testamento
escrevesse, e juntamente comigo abayxo assignasse (Rezisto com que
faleseo a senhora Anna Gracêz em 27/10/1777 apud MOTA. Antonia.
SILVA. Kelcilene Rose, MANTOVANI. José Dervil, 2001, p.269).
1 Neste fragmento podemos inferir que ela deixa um escravo forro, porem com condição. Contudo o
mais instigante é que ela reinicia a frase “deycho o dito mulato forro” apenas pra proferir o nome do
escravizado, presumimos que tal feito tenha sido necessário para diminuir a chance de problemas
futuros, já que o testamento é um documento, que preferencialmente não deixe aberturas para
duvidas como: “Qual o escravizado que ela deixou forro já que seu nome não consta no
documento?”.
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
// Declaro que possuo hum [corr.] por nome Dionizio [corr.] meu legitimo
escravo [corr.] cujo meu [corr.] de virem [corr.] de Annunciaçao’ [corr.] o
serviço de sua Igreja, e do mesmo Recolhimento, com {{31}} com a condiçao’
porem, que nuca por principio nenhu’ poderá ser vendido o dito mulato por
ser minha ultima vontade que o dito mulato não’ passe a outro Senhorio e
esteja sempre no serviço de Nossa Senhora e seu Recolhimento em quanto
este durar, e acabado o dito Recolhimento / o que Deos tal não’ permita /
neste cazo deycho o dito mulato forro digo mulato Dionizio forro livre e izento
de toda a pensao’ de captiveyro por ser assim minha ultima vontade o que
lhe faça pelo amor de Deos // (Rezisto com que faleseo a senhora Anna
Barboza de Jezus Maria em 01/10/1761 apud MOTA. Antonia. SILVA.
Kelcilene Rose, MANTOVANI. José Dervil, 2001, p.151).
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
• Esperando o batismo:
Declaro que forrey a hua’ molata por nome Vrsula, e dois filhos por nomes
Valerio, e Quiteria como constará de escriptura, q’ nas nottas lha passey a
qualquer [ileg. 2 palavras] na for {{226}} Na forma nella declarada // Declaro
que dey a dita molata hua’ pretinha nasção Cachêo, q’ a poucos tempos
tinha comprado, e ainda se acha por baptizar para effeito de se cazar
(Rezisto com que faleseo o senhor Jozé da Motta Verdade em 03/11/1761
1 O Concílio de Trento foi o décimo nono conselho ecumênico reconhecido pela Igreja Católica
Romana. Foi convocado pelo papa Paulo III, em 1542, e durou entre 1545 e 1563. Teve este nome,
pois foi realizado na cidade de Trento, região norte da Itália. Concílio é o mesmo que conselho e se
trata de uma reunião de cunho religioso. Foram realizadas 25 sessões plenárias, em três períodos
diferentes. Reação católica a Reforma Protestante de 1517, chamada Contrarreforma (esforço
teológico, político e militar de reorganização católica e de confronto ao protestantismo; e todas as
doutrinas católicas foram discutidas para responder às críticas doutrinárias dos protestantes).
“Significa dizer que, em matéria de fé e moral, um concílio legitimamente convocado pelo Soberano
Pontífice, a quem unicamente compete convocar, presidir, transferir, suspender, dissolver e aprovar,
exerce de modo solene, universal e infalível seu poder sobre a Igreja Católica.” (SILVA, 2015, p. 132)
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
// Declaro que, a huma menina por nome Maria Thereza, que criei, e he
minha afilhada, e hoje Se acha no recolhimento, lhe deixo a caixa de
molduras, e as oito colheres de prata, ou as que Se acharem por meu
fallescimento, e recomendo muito a meus Testamenteiros cuidem Sempre
na dita menina ate que tome o Estado, que lhe parecer, eque Selhe na’o
falte com o necessario no dito Recolhimento, onde Se acha, pois da
Legitima, que lhe deixou Seo Pay Luís Domingues lhe tem feito
applicaçoens de Se lhe dar todos os annos trinta mil reis pelo juizo dos
orfaons para Seo Sustento, e vistuario // (Rezisto com que faleseo o senhor
Jozé Barboza de Albuquerque em 06/03/1767, apud MOTA. Antonia. SILVA.
Kelcilene Rose, MANTOVANI. José Dervil, 2001, p. 217)
= Deixo mais pelo amor de Deos e obra pia a huma menina minha afilhada
chamada Anna Roza filha de Antonio da Costa e de sua mulher Lourença de
Araujo cento e vinte mil reis = Deixo mais pelo amor de Deos e obra pia a
hum menino chamado Lourenço filho do mesmo Antonio da Costa e de sua
mulher Cem mil reis as quaes duas esmollas assima declarado quero que se
metam no cofre dos orfaos’ desta Villa e para dele se porem entregue aos
tais meninos quando elles tomarem estados ou forem capas de Reger os
seus benis com o rendimentos que tiverem tido com a declaraçam (Rezisto
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
O Juízo dos Órfãos foi uma importante instituição no Maranhão que, desde o
período colonial brasileiro, tinha como papel principal zelar pelos interesses dos
menores de idade órfãos que a ela eram apresentados.
O Juízo dos Órfãos, como grande parte das instituições do Brasil Colônia e
Império, é de origem portuguesa, tendo surgido com as Ordenações
Manuelinas, em 1512. A criação desse Juízo deveu-se à necessidade de
definir normas que regulamentassem a proteção dos menores de 25 anos
de idade1, no que competia à administração própria e de seus bens. O
cuidado e a administração dos órfãos, por parte de um adulto legalmente
constituído, eram necessários em vista dos processos de separação de
bens (partilha) ou mesmo de herança em virtude de falecimento do pai do
menor (CARDOZO, 2017, p. 94).
Entretanto, por detrás dessa função que pode ser considerada nobre (cuidar
dos órfãos), o “Juízo dos Órfãos deteve suas atenções naqueles menores de idade
que possuíssem bens ou fossem descendentes de famílias de posse e/ou de
prestígio social” (CARDOZO; FLECK; SCOTT, 2011, p. 3), fazendo-se injusta sua
presença independentemente da teoria envolvida na engrenagem de seu
funcionamento.
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Declaro que tenho hum Senhor Santo Lenho este deyxo ao meu filho Jozê
Paulo, e quero que reparta igualmente com meu filho Paulo Viegaz, e não
quero que este entre a inventario, po [sic] ser minha ultima vontade. =
(Rezisto com que faleseo a senhora Thereza de Jesuz em 05/10/1768 apud
MOTA. Antonia. SILVA. Kelcilene Rose, MANTOVANI. José Dervil, 2001,
p.235).
// Declaro que quero se digão por minha alma Vinte e Sinco Capellas de
missas, huma ao Santo do meu nome outra ao Anjo {{93v}} Anjo da minha
guarda, [...], outra ao santo de quem a Igreja rezar no dia do meu
falescimento, alias sendo em dia de feria o Santo que lhe atribuhir a folhinha
portuguesa (Rezisto com que faleseo o senhor Carlos Pereira em
26/04/1765 apud MOTA. Antonia. SILVA. Kelcilene Rose, MANTOVANI.
José Dervil, 2001, p.192).
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
// Declaro, que devo fazer huma fezta ao Senhor Sam Benedito com
Sermao’, e Missa cantada por certa promessa, que fiz ao mesmo Santo por
alcançar dele Couza [corr.] me fez: e por que ella foi [corr.] a respeito de
meo marido [corr.] peço em attençao’ a Esta [corr.], a queira por mim
totalmente cumprir, e Satisfazer: e quando assim o dito meo marido nao’
obre, meos Testamenteiros o farao’ inteiramente de meos bens de Sorte
que dem [corr. 2 palavras] a minha promessa, por Ser assim minha {{315}}
minha ultima vontade // (Rezisto com que faleseo a senhora Anna
Marcianna Evangelho em 29/01/1760 apud MOTA. Antonia. SILVA.
Kelcilene Rose, MANTOVANI. José Dervil, 2001, p.125).
1 Folhinha portuguesa – Missão Católica Portuguesa no Reino Unido. Yumpu. Disponível em:
<https://www.yumpu.com/pt/document/read/12935013/folhinha-missao-catolica-portuguesa>. Acesso
em: 27 de maio de 2019.
2Folhinha Portuguesa. Scribd. Disponível em: <https://pt.scribd.com/document/14164341/Folhinha-
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
apud MOTA. Antonia. SILVA. Kelcilene Rose, MANTOVANI. José Dervil, 2001,
p.222).
Além de promessas, outros testadores também ficaram por dever algumas
instituições religiosas, seja por rituais fúnebres solicitados e não pagos, dízimos, ou
dívidas sem explicações profundas. O fato é que as instituições que representavam
o catolicismo no Maranhão colonial tinham grande participação no cotidiano
monetário dos indivíduos ali presentes.
Deve ao Dizimo:
// Declaro que deixo hum rolo de pano ao convento de Santo Antonio para
que Se mandem dizer em missas pela minha alma, a Saber a Santo
Antonio, e ao Padre Sam Francisco, e a Nossa Senhora da Conceiçao’
igualmente o que importar o rollo de pano (Rezisto com que faleseo o senhor
Manoel Rodrigues Janella em 10/07/1764, apud MOTA. Antonia. SILVA.
Kelcilene Rose, MANTOVANI. José Dervil, 2001, p.184).
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
sinco ao santo Anjo da minha Guarda, sinco ao santo do meu nome, sinco a
Nossa Senhora da Conceiçam, sinco a Nossa Senhora da Boa Morte, sinco
a Nossa Senhora da Consolaçam, sinco a Nossa Senhora do Carmo, sinco
ao Senhor Jesus dos Santos Passos, sinco ao Senhor Sam Jozé, sinco ao
Santo Antonio, sinco Sam Sebastiam, sinco a Santa Luzia, sinco a Santa
Barbara, sinco a Santa Brigida, sinco a Santa Rita, sinco a Senhora Santa
Anna, sinco a Santa Apolonia, sinco pelas almas do Purgatorio = Assim
mandaram dizer vinte capellas de missas pela minha alma, mas huma
capella pelas Almas de meus Paés, mais duas capellas pelas almas dos
meus escravos vivos e defundos. Maiz huma capella por algunz encargos
que possa ter. Maiz huma capella por algumas promessas que tenha feito
que por esquecimento az nam cumprisse. Mais huma capella pelas almas de
todos os Irmãos falecidos das minhas Irmandades, e ordens terceiras de
que sou Irman = (Rezisto com que faleseo o senhor Francisco Jozé Mendez
(Cap.) em 03/01/1799 apud MOTA. Antonia. SILVA. Kelcilene Rose,
MANTOVANI. José Dervil, 2001, p.300-301).
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
1 PAPA PAULO VI. Decreto Perfectae Caritatis sobre a conveniente renovação da vida religiosa.
Vaticano, 28 de outubro de 1965. Disponível em:
<http://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vat-
ii_decree_19651028_perfectae-caritatis_po.html >. Acesso em: 28 de maio de 2019.
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
= E tudo o mais que restar das ditas duas partes de meus benis no cazo
que me perteçam depois de tirada a vintena quero que meu Testamenteiro
me mande dizerem Missas metade pela minha alma e metade pelas almas
do Purgatorio os quaes instituo erdeiros do Remanescente dos ditos meus
benis = (Rezisto com que faleseo o senhor João Lourenço Rebelho em
06/07/1789 apud MOTA. Antonia. SILVA. Kelcilene Rose, MANTOVANI.
José Dervil, 2001, p.277).
Considerações finais
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Referências
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Fontes primárias
Rezisto com que faleseo o senhor Balthazar Pereira dos Reis em 08/12/1759.
Arquivo da Biblioteca do Tribunal de Justiça do Maranhão – ATJ: Livro de Registro
de Testamentos 1751 - 1759, fl. 29.
Rezisto com que faleseo o senhor Antonio de Lemos em 18/07/1735. Arquivo da
Biblioteca do Tribunal de Justiça do Maranhão – ATJ: ivro de Registro de
Testamentos 1751 - 1759, fl. 59v).
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Introdução
A condição do ser humano, de agir por si mesmo e ser livre durante muito
tempo foi negada ao povo negro no Brasil, que marca sua história com a escravidão
e a subserviência à sociedade senhorial, nesse contexto as mulheres negras não
ficaram alheias a essa condição, pelo contrário, foram expostas a vários tipos de
abusos sendo eles físicos, psicológico, sexuais e tanto outros que lhes foram
atribuídos não somente pela sua condição de escrava, mas também por sua raça e
gênero em meio ao patriarcado, no qual se encontravam inseridas. A resistência foi
o modo para sobreviver às imposições e ao local que não lhes pertencia, a vida mais
amena poderia vir através das relações com seus senhores, seja elas afetivas ou
não, que poderiam lhes oferecer as alforrias, sinônimo de liberdade.
As cartas de alforrias vinham através da concessão de um senhor a escrava,
que oficializado concedia a libertação, mas nos testamentos estão comprovações de
que ela não vinha facilmente, é possível ler nas entrelinhas da documentação que
“os bons serviços prestados” são na verdade frutos de uma resistência ao cativeiro
que gerava teias de relações e de interesse mútuo entre senhor e escrava, o que
não deixa de lado os outros tipos de resistências, é claro. Ao mesmo tempo que sua
condição de ser mulher poderia lhe trazer os atributos para a sua soltura, também
lhe acarretava maiores imposições a serem enfrentadas, o concubinato de senhores
e escravas, por exemplo, foi uma realidade da sociedade maranhense, onde a
escravidão era seu traço marcante, e as vidas das mulheres negras não passavam
de mercadorias a serem usufruídas.
1 Laysla Eduarda dos Santos Lopes - Bolsista do projeto com os dados do EDITAL PRPGI N° 03/2018
aluno do ensino médio integrado ao curso de petróleo e gás e estudante do curso de inicial e continua
em Educação e Relação Étnico-Raciais do IFMA- Campus Pedreiras E-mail:
Eduarda.santos@acad.ifma.edu.br ou layslaedu44@gmail.com
2 Orientadora PIBIC ENSINO MÉDIO 2018/2019 - EDITAL PRPGI nº 03/2018. Mestra em História
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
encobria a resistência à exploração e opressão vivida por ela, trazendo assim a ideia
de que o ser escravo não era dotado de concepção e cultura. Entretanto um novo
olhar sobre essa lógica deve ser lançado, as alforrias por exemplo poderiam ser
garantidas por vários meios de acordos e barganhas, o fato dos “bons serviços
prestados’’ era somente uma das formas como isso poderia ser angariado e
demonstra que entre senhores e escravizados havia sociabilidades impossíveis de
serem travadas se ambos não compartilhassem da mesma cultura, assim a
negociação também foi uma importante arma de resistência que garantia até meios
de sobrevivência. Como exemplifica o testamento abaixo:
Uma vez que suas relações se tornavam cada vez mais próximas de “seus
donos”, já que estavam em sua maioria condicionadas a trabalharem exploradas nas
casas senhoriais, diversas estratégias de sobrevivência foram criadas por mulheres
escravizadas, que não romperam com o cativeiro, mas fizeram-nas sobreviver por
meio dele, podendo até mesmo conseguir não somente sua alforria, mas também as
dos seus filhos, parentes dentre outros, como percebe-se no Traslado dos autos do
testamento 1751 – 12– 02 de João Theófilo de Barros: “A mesma dita escrava
[Sylvana] criou com muito trabalho uma rapariga mameluca chamada Januária, a
qual fazendo pela honra a deixo forra, livre e isenta de cativeiro e se casar sendo
com pessoa capaz se lhe dara cinco rolos de pano” (MOTA; SILVA; MANTOVANI,
2001. p. 81)
Esse e outros fragmentos nos levam a inferir como a mulher negra soube
travar uma luta constante contra a imposição patriarcal e coisificação do sistema.
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
uma das tantas formas com as quais a cultura afro é manifestada: a forma de
dançar, vestimenta, adereços que mostram a identidade de cada povo e assim elas
traziam, apesar de estarem longes de seu lugar de origem, um pouco da sua forma
de viver consigo, se tornando mais resilientes à opressão que sofriam.
Todas as formas pelas quais a cultura era manifestada, fazia com que a
vivência negra se tornasse mais presente, criando suas especificidades para
resistência, os terreiros é só uma delas que formou um sincretismo religioso e
estimulava a coragem dos negros à favor da sobrevivência, isso não significa que a
mesma estimulou os escravos à rebeldia e sim despertou-lhes expressarem sua
identidade, mostrando que o povo negro possuía seus saberes ainda de forma ativa,
apesar do autoritarismo pelo qual viviam.
Escravidão feminina
Ah! Meu filho! Mais tarde deram-me em matrimônio a um homem, que amei
como a luz dos meus olhos, e como penhor dessa união veio uma filha
querida, em quem me revia, em quem tinha depositado todo o amor da
minha alma: uma filha que era a minha vida, as minhas ambições, a minha
suprema ventura, veio selar a nossa santa união. E esse pais de minhas
afeições, e esse esposo querido, essa filha tão extremamente amada, ah
Túlio! Tudo me obrigaram os bárbaros a deixar! Oh! Tudo até a própria
liberdade! (REIS:1991, p. 92).
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Araújo tinha como estratégia fazer com que elas voltassem a se deitar com ele, isso
mostra a objetificação da mulher negra que quando se recusava a fazer as vontades
de seus senhores, eram submetidas a um número maior de torturas. Por estarem na
“base da pirâmide”, as mulheres de cor sofriam diversos abusos já que não eram
consideradas donas de seus próprios corpos. Segundo Baseggio e Silva
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
// Declaro que possuo huns chaons na Rua da Palma, dos quais vendi trez
braças a Luiza Bernarda mulata forra, que foi minha escrava, por huma
escriptura da qual estou pago, e o mais do dito chão dei a minha filha
Antonia Maria de Moraes, para nelles fazer suas cazas para viver, e
querendo meus erdeiros contenderem com ella sobre os ditos chaons,
entrará os ditos no seu quinhão pelo preço porque eu os comprei. (Traslado
do testamento Antonio de Moraes. Arquivo da Biblioteca do Tribunal de
Justiça do Maranhão – ATJ: Livro de Registro de Testamentos 1781-1791.
nº2, fl. 11v, 30 Ago. 1781)
Considerações finais
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Referências
MOTA, Antonia da Silva; SILVA, Kelcilene Rose; MONTOVANI, José Dervil. Cripto
maranhenses e seu legado. Maranhão: Siciliano, 2001.
REIS, Maria Firmino dos. Úrsula. 1ed. Rio de Janeiro: Presença, 1988.
SANTOS, Adriana Monteiro. Arranjos cotidianos: escravizados em São Luís do
Maranhão (1830-1839). III Simpósio História do Maranhão Oitocentista:
impressos no Brasil do século XIX, de 4 a 7 de junho de 2013, São Luís, MA. – São
Luís: UEMA, 2013.
SIMÕES, Rosa Maria Araújo. Capoeira e escravidão: movimento de resistência
versus submissão. Movimento - Ano VII - Nº 13 - 2000/2. Disponível em:
https://seer.ufrgs.br/Movimento/article/view/11779
VILA, Ivonete Costa; CRUZ; Paulo Divino Ribeiro da. Mulheres negras no século
XIX: entre submissão e rebeldia. Revista Africana e Africanidades. - Ano 3 - n. 9,
maio, 2010 - ISSN 1983-2354. Disponível em: www.africaeafricanidades.com.br
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Fontes primárias
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Introdução
1 Bolsista PIBIC ENSINO MÉDIO 2018/2019 - EDITAL PRPGI Nº 03/2018. Aluna do ensino médio
integrado ao Curso de Petróleo e Gás do IFMA - Campus Pedreiras. E-mail:
silvanamaranhao1@gmail.com
2 Orientadora PIBIC ENSINO MÉDIO 2018/2019 - EDITAL PRPGI nº 03/2018. Mestra em História
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Corpo
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Revista atrevida
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seus medos e dúvidas sobre a vida adolescente. Existiam duas seções para as
quais elas podiam mandar suas incertezas para os editores. Na seção “Sabe-tudo
sobre sexo”, lê-se perguntas sobre o sexo e tudo o que o cerca, nessas páginas são
discutidas dúvidas sobre anticoncepcionais, preservativos, gravidez, DSTS, entre
outros. A outra seção que encontramos com essa mesma finalidade, possui o nome
parecido com a da anterior, “Sabe-tudo sobre tudo”, nela encontramos pedidos de
ajuda e conselhos sobre a vida e cotidiano das jovens, como namoro, problemas
familiares, bullying e outros.
A revista Atrevida era famosa entre as jovens do final do século XX, que
geralmente buscavam copiar o que a revista publicava, desde as dietas, até
maneiras de se comportar. Em quase todas as suas publicações ela trazia dicas de
exercícios, exaltando principalmente os benefícios estéticos ao invés do bem-estar e
saúde.
O modo como a revista influenciava e ditava moda ou comportamentos, no
final do século XX, possivelmente interferiu na vida de suas leitoras, de tal forma que
elas encontravam o apoio e confiança para confessarem seus problemas em cartas
enviadas para editora, com a esperança de que a revista pudesse ajudá-las, como
mostra a seção “sabe-tudo sobre tudo” (Atrevida n° 66, 2000, p. 14-15):
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Mais uma vez, as revistas femininas aparecem como uma das ferramentas
que interferem na formação de um determinado ideal de comportamento
feminino, possibilitar às leitoras uma espécie de “autoconhecimento”,
influenciar na maneira como as mulheres enxergam seus corpos, sua saúde
e sua beleza (AMORIN; PELLEGRIN; s/p).
A busca incansável pelo corpo perfeito traz grandes preocupações, pois dependendo da
maneira como esse objetivo será alcançado, poderá causar enormes males à saúde. A mídia
reforça/incentiva que a estética é o caminho para se alcançar o bem-estar, mostrando assim que o
“feio”, ou o não “belo”, é sinônimo de sofrimento ou vergonha. Tais padrões corporais influenciam
diretamente na identidade de cada pessoa, de maneira que afeta suas ações e percepções sobre si e
o outro. De acordo com as autoras Amorim e Pellegrin,
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
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Considerações finais
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Referências
Documentos:
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Introdução
1 Bolsista PIBIC Ensino Médio 2018/2019 - Edital PRPGI Nº 03/2018 - Aluno do Ensino Médio
Integrado ao Curso de Petróleo e Gás do IFMA/Campus Pedreiras. E-mail:
vale.fernando@acad.ifma.edu.br
2 Orientadora PIBIC ENSINO MÉDIO 2018/2019 - EDITAL PRPGI nº 03/2018. Mestra em História
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
dominante impõe suas regras como forma de manter e assegurar seus privilégios
sociais. As regras impostas pelo grupo dominante patriarcal ditam o comportamento
social tanto da mulher, como o da classe LGBT+ que são continuamente afetados
por ondas de preconceito em lugares públicos.
Estudar as relações de gênero é entender como se estabelecem as
desigualdades e comportamentos discriminatórios que permeiam a sociedade e que
são legitimados perante um discurso hegemônico, tanto a favor da
heteronormatividade, como das práticas machistas enraizadas em nossa cultura.
Para isso, Michel Foucault nos lembra de que o discurso hegemônico é entendido
como:
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
[...] Como se entende, então, que entre os sexos essa reciprocidade não
tenha sido colocada, que um dos termos se tenha imposto como único e
essencial, negando toda relatividade em relação a seu correlativo, definindo
este com alteridade pura? Nenhum sujeito se coloca de imediata e
espontaneamente como inessencial; não é Outro que se definindo como
Outro define o Um; ele é posto como Outro pelo Um definindo-se como
Um... Mas para que o Outro não se transforme no Um é preciso que se
sujeite a esse ponto de vista alheio (BEAUVOIR, 1960 p. 12).
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
[...] Venerando a mulher em Deus, trata-a neste mundo como uma serva:
mais ainda, quanto mais se exigir dela uma submissão completa, mais
seguramente será ela dirigida para o caminho da salvação. Devotar-se aos
filhos, ao marido, ao lar, à propriedade, à Pátria, à Igreja, é sua função, a
função que a burguesia sempre lhe indicou; o homem dá sua atividade, a
mulher sua pessoa; santificar essa hierarquia em nome da vontade divina,
não é modificá-la em nada; ao contrário, é pretender fixá-la no eterno
(BEAUVOIR, 1960 p. 276).
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
O discurso toma-se opressivo quando exige que, para falar, o sujeito falante
participe dos próprios termos dessa opressão – isto é, aceite sem
questionar a impossibilidade ou inimeligibilidade do sujeito falante. Essa
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Identidade e diferença
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
que o outro é que eu não sou. Nesse caso, a diferença se opõe a identidade, já que
uma representa o que eu sou e a outra representa o que eu não sou, mas o que
outro indivíduo é, bem como me diferencia dele. Com isso, a diferença surge no
mesmo contexto e momento que a identidade, já que as duas são interdependentes,
ou seja, para existir uma, a outra também precisa existir. Dessa forma, as diferenças
existentes nesse sentido, são provavelmente sustentadas pela identidade criada e
tomada para si, como fator para distinguir e definir o que outros são e, portanto, me
diferenciar das identidades a qual não faço parte.
A identidade e diferença exercem entre si uma relação binária entre
afirmação/negação. Dessa forma, elas são potencializadas pelas limitações
gramaticais encontradas nas línguas, assim ambas são frutos da criação linguística
resultando das relações culturais e sociais, as quais são expressas em discursos
que formam os sujeitos, sendo que ambas são apenas instituídas como tal pelos
atos da linguagem. Dessa forma, corroboramos a ideia expressa no pensamento de
Tomaz da Silva
[...] Dizer, por sua vez, que identidade e diferença são o resultado de atos
de criação linguística significa dizer que elas são criadas por meio de atos
de linguagem. Isto parece uma obviedade. Mas como tendemos a tomá-las
como dadas, como "fatos da vida", com frequência esquecemos que a
identidade e a diferença têm que ser nomeadas. É apenas por meio de atos
de fala que instituímos a identidade e a diferença como tais. A definição da
identidade brasileira, por exemplo, é o resultado da criação de variados e
complexos atos linguísticos que a definem como sendo diferente de outras
identidades nacionais (SILVA, 2000 p. 02).
A identidade, assim como a diferença, por serem uma relação social estão
submetidas às relações de poder. Desse modo, podemos concluir que elas não são
apenas criadas, mas impostas. Nelas, há uma disputa pelos grupos sociais. Desse
modo, corrobora novamente Tomaz da Silva
[...] A identidade, tal como a diferença, é uma relação social. Isso significa
que sua definição - discursiva e linguística - está sujeita a vetores de força,
a relações de poder. Elas não são simplesmente definidas; elas são
impostas. Elas não convivem harmoniosamente, lado a lado, em um campo
sem hierarquias; elas são disputadas. Não se trata, entretanto, apenas do
fato de que a definição da identidade e da diferença seja objeto de disputa
entre grupos sociais simetricamente situados relativamente ao poder. Na
disputa pela identidade, está envolvida uma disputa mais ampla por outros
recursos simbólicos e materiais da sociedade. A afirmação da identidade e
a enunciação da diferença traduzem o desejo dos diferentes grupos sociais,
assimetricamente situados, de garantir o acesso privilegiado aos bens
sociais (SILVA, 2000 p. 03).
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Considerações finais
O presente estudo nos levou a refletir sobre como os papéis sociais foram
desigualmente distribuídos entre homens e mulheres de forma que ao homem se
deu o papel de dominador das relações de poder e à mulher o papel de submissão e
os afazeres doméstico. Durante muito tempo, essa estrutura de poder foi aceita
como a norma pela sociedade, resultando em anos de desigualdades entre os
gêneros, bem como na disseminação de um comportamento heteronormativo que
discrimina qualquer indivíduo que não se enquadra nos padrões socialmente
aceitos.
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Por fim, faz-se necessário salientar que trabalhos como estes são de suma
importância por dar visibilidade a grupos que socialmente foram marginalizados,
oprimidos e discriminados. Desse modo, estudar as relações de gênero é entender
como se constrói as estruturas de discriminações sociais e como estas se propagam
no seio da sociedade, o que se torna um passo importante no combate às
disparidades existentes entre estes grupos sociais. Assim, visamos dar voz aos que
injustamente foram silenciados e promover a visibilidade das identidades oprimidas,
a fim de demonstrar a pluralidade de identidades que o ser humano possui.
Referências
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Introdução
1 Bolsista do projeto PIBIC Ensino Médio 2019/2020- Edital PRPGI Nº 06 /2019 - Aluna do Ensino
Médio Integrado ao Curso de Eletromecânica do IFMA/Campus Pedreiras. E-mail: Maria w
anilde@acad.ifma.edu.br
2 Voluntária do projeto PIBIC Ensino Médio 2019/2020- Edital PRPGI Nº 06 /2019. Aluna do Ensino
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
participação desses sujeitos em uma história em que eles são não somente
relacionados a dados quantitativos, mas às alforrias que eram provas dos vínculos
entre as liberdades concedidas e as relações afetivas. O que visamos compreender
é como funcionavam essas relações e os motivos das alforrias em seus
testamentos, e em que momento houve uma dissociação na forma de vê-los,
passando de “mercadorias” para pessoas dignas de liberdade e confiança, além do
papel desempenhado por eles na sociedade maranhense do século XVII.
Os estereótipos criados nesse período fortalecem as raízes do racismo
estrutural ainda tão marcante e presente na atualidade, em que pouco vem sendo
feito para repará-lo, causando um imenso prejuízo a população negra. Assim,
desenvolvemos uma cultura misógina, racista e intolerante que invisibiliza uma
parcela da população. Dessa forma, temos a falta de representatividade dos negros
em propagandas, telejornais e filmes, o padrão de beleza europeia é explicitamente
difundido, as religiões de matriz africana se tornam alvo de ódio e tudo isso provém
de um passado colonial escravocrata.
Metodologia
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
História de mulheres
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Fonte: Elaborado pelas autoras com base nos Arquivo da Biblioteca do Tribunal de Justiça do
Maranhão – ATJ: Livro de Registro de Testamento 1751-1756 e MOTA, Antônia da Silva; SILVA,
Kelcilene Rose; MANTOVANI, José Dervil. Cripto maranhenses e seu legado. São Paulo: Siciliano,
2001.
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Fonte: Elaborado pelas autoras com base nos Arquivo da Biblioteca do Tribunal de Justiça do
Maranhão – ATJ: Livro de Registro de Testamento 1751-1756 e MOTA, Antônia da Silva; SILVA,
Kelcilene Rose; MANTOVANI, José Dervil. Cripto maranhenses e seu legado. São Paulo: Siciliano,
2001.
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Quadro 01: Nome e idade de escravizadas que receberam algum tipo de herança
de seu senhor(a)
Jeronima 8 anos
Jina 30 anos
Angela 17 anos
Gtherina 4 anos
Florencia 9 meses
Quiteira 25 anos
Josefa 30 anos
Fonte: Elaborado pelas autoras com base nos Arquivo da Biblioteca do Tribunal de Justiça do
Maranhão – ATJ: Livro de Registro de Testamento 1751-1756 e MOTA, Antônia da Silva; SILVA,
Kelcilene Rose; MANTOVANI, José Dervil. Cripto maranhenses e seu legado. São Paulo: Siciliano,
2001.
Por meio das tabulações dos 136 testamentos, muitos são as conjecturas da
existência de uma relação mais próxima entre escravizados e senhores de engenho,
que poderiam levar a concessão de alforria como herança.
As teias de dominação e resistência se tornam tênues no processo de
aquisição de alforrias, estas de extrema necessidade e importância, para o domínio
do próprio corpo e da vida dos escravizados. Os documentos evidenciam uma clara
distinção, dada pelos senhores a sua escravaria, enquanto uns recebiam a liberdade
como herança, outros eram encaminhados como legados para outros indivíduos, ou
espólios a serem vendidos e escravizados em outro local.
Assim, cada ação para se tornar livre; cada esforço para possuir sua carta
de alforria, era importante.
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
ideia de que os escravos não tinham nenhum tipo de controle sobre as próprias
vidas, eram meros objetos, reflete diretamente a falta de textos que explicam essas
relações.
Tudo aqui estudado provém de pequenos fragmentos deixados no corpo
documental dos testamentos já mencionados e estes não nos dão a total ideia dos
acontecimentos, tornando implícito seu contexto. Assim fazemos deduções
baseadas nas “migalhas”, nos “indícios” e “sinais” escondidos nas entrelinhas das
fontes, em um esforço para entender o que regia as relações sociais do Maranhão
setecentista e as influências dos escravizados nas sociabilidades.
Além disto, nestes documentos podemos encontrar uma série de
problemas relacionados às ações do período escravocrata e que ainda hoje são
normalizadas e perpetuadas através de termos ou comentários preconceituosos, à
humilhação e morte da população negra marginalizada. Para entender melhor todo o
contexto em que vivemos, é preciso entender que o Brasil teve séculos de
escravidão e quando a Lei Áurea foi assinada não houve nenhum tipo de assistência
à população negra.
O Estado não tentou diminuir o abismo social existente entre as etnias, pelo
contrário, as mulheres foram hipersexualizadas e os homens vistos como
preguiçosos ou criminosos. Muitas leis foram criadas visando essa exclusão, o
próprio vocabulário que nós usamos provém de palavras e expressões racistas que
perpetuam até hoje, tais como “denegrir”, “serviço de preto”, “criado-mudo” , “Tuas
nega”, “Mulata”, , “da cor do pecado”, etc.
Assim, desenvolvemos uma cultura sexista, racista e intolerante que
invisibiliza uma parcela da população. Dessa forma, temos a falta de
representatividade dos negros em propagandas, telejornais, filmes, já que o padrão
de beleza europeia é explicitamente difundido, as religiões de matriz africana se
tornam alvo de ódio, a mulher negra é sexualizada com diversos estereótipos,
propaga-se um embranquecimento da população para afastar a noção de ser negro
e assim o racismo foi sendo estruturado.
Este artigo destacou pontos relacionados às condições das mulheres negras
e escravas no Maranhão setecentista, por meio das análises dos testamentos do
mesmo período e sob o olhar teórico dos estudos relacionados a essas mulheres em
uma ampla resistência ao sistema opressor da escravatura e da forma como elas
mantinham as relações afetivas com seus senhores, e como eles se tornam visíveis
nas leituras dos testamentos, que o senhor ao conceder a liberdade à escrava,
poderia até mesmo deixar bens ou conceder a liberdade aos filhos dela, se
houvesse.
Por meios das análises, vislumbramos todo um universo relacionado à
amplitude dessas mulheres, devido às situações que elas vivenciaram e os modos
de sobrevivência que lhes eram possibilitados por meio de suas lutas e criatividades
para alcançar a liberdade, tendo em vista também, que as relações entre a escrava
e o seu senhor poderiam não estar somente relacionadas a casos envolvendo seu
corpo, por conta das relações afetivas poderiam acontecer pelo trabalho e das
situações particulares de cada história.
Essas mulheres evidenciam as lutas que travaram entre sua própria
mentalidade, suas próprias vontades, para ceder a algumas situações e realizar
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
outras como forma de resistir, logo, por meio dessas mulheres o Brasil se construiu
e a relevância delas se reflete na nossa história e nas concepções da escravidão,
que são a base de construção do nosso país.
Referências
MOTA, Antonia da Silva. SILVA, Kelcilene Rose. MANTOVANI, Jose Derivil. Cripto
maranhense e seu legado. São Paulo: Editora Siciliano, 2001.
SILVA, A A. Senhores do maranhão colonial: um estudo das disposições
testamentárias masculinas no Maranhão setecentista (1750-1780). Monografia
(Bacharelado em História). Universidade Federal do Maranhão. 2016.
SOARES, Cecília C. Moreira. Mulher negra na Bahia no século XIX. Salvador:
EDUNEB, 2006.
VILA, Ivonete Costa; CRUZ; Paulo Divino Ribeiro da. Mulheres negras no século
XIX: entre submissão e rebeldia. Revista África e Africanidades - Ano 3 - n. 9,
maio, 2010 - ISSN 1983-2354. Disponível em: >www.africaeafricanidades.com.br
Fontes primárias:
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Introdução
1 Hiza Júlia Ruben Corrêa Leal- Bolsista PIBIC Ensino Médio 2019/2020 - Edital PRPGI Nº 04/2019 -
Aluno do Ensino Médio Integrado ao Curso de Eletromecânica do IFMA/Campus Pedreiras.
E-mail: hiza.leal@acad.ifma.edu.br
2 Orientadora PIBIC ENSINO MÉDIO 2019/2020 - EDITAL PRPGI nº 04/2019. Mestra em História
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Metodologia
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Análise da documentação
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
é dada uma pauta que pode ser considerada polêmica, porque abordam assuntos
como política, educação, sociedade etc., e nela era pedida a opinião das leitoras por
cartas, as duas opiniões opostas mais bem argumentadas eram publicadas.
No entanto, o “Palavra de Menino” sempre tinha mais destaque em relação
ao “Pensando Alto”, que era sempre colocado no fim da revista, enquanto o outro
levava destaque até nas chamadas da capa. Fazendo com que a opinião dos
meninos sobre como as meninas deviam ser levadas em destaque em detrimento
das opiniões das meninas sobre o mundo em volta delas, assim a revista deixava
claro quais opiniões as meninas deviam dar mais importância.
Figura 03: Título do quadro “Palavra de menino” e título do quadro “Pensando Alto”
Fonte: Atrevida
De modo geral, a revista traz uma imagem irreal e estereotipada de como a
menina deveria ser e sustenta uma ideia de que ela deve se adequar àquilo para
poder ser aceita, ou seja, que é responsabilidade dela se manter naquele ideal, com
uma promessa falha de conquista da felicidade, resumindo completamente a
existência delas a sua aparência ou a quem elas se relacionam, a fim de manter
uma indústria que vive dessas “dicas para melhorar seu visual”, alimentando a ideia
de que elas devem se adaptar aquilo para serem aceitas.
No trabalho, “Droga de Corpo! Imagens e Representações do corpo feminino
em revistas brasileiras”, as autoras explicam essa ideia:
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Fonte: Elaborado pelas autoras com base nos Formulários respondidos por meninas adolescentes de
diversas escolas, inclusive dos institutos federais.
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Considerações finais
Referências
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Introdução
1 Bolsista PIBIC Ensino Médio 2019/2020 - Edital PRPGI Nº 04/2019 - Estudante do Curso de
Eletromecânica Integrado ao Ensino Médio do IFMA- Campus Pedreiras. E-mail:
kelly.ribeiro@acad.ifma.edu.br
2 Orientadora PIBIC ENSINO MÉDIO 2019/2020 - EDITAL PRPGI nº 04/2019. Mestra em História
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Metodologia
Resultados e discussão
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Indústria da Cerveja). Por conta disso, é comum ver imagens como as seguintes
quando o assunto é propaganda de cerveja:
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Fonte: https://mundodasmarcas.blogspot.com/
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Considerações finais
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Referências
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Introdução
1Mestra em História Social, Professora EBTT de História do Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia do Maranhão. Coordenadora do NEABI – IFMA/campus Pedreiras e do LEGIP-
Laboratório de Estudos em Gênero do IFMA campus Pedreiras. E-mail: nila.santos@ifma.edu.br
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Tal debate não pode ser negado à educação básica, é preciso investigar as
permanências e rupturas do racismo estrutural, desconstruir representações de
inferioridade Negra e denunciar preconceitos historicamente construídos que se
perpetuam como violências simbólicas em nossa sociedade.
Ora, apenas, em 2003, a cultura e a história afro-brasileiras tornaram-se
componente obrigatório na educação básica, contudo a predominância de uma
educação branca e europeizante contribuiu para que as imagens das populações
negras não possuíssem representatividades benéficas.
Negros e negras, no Brasil, são comumente associados à escravidão e
ainda que esse sistema tenha sido marcante na história dessas populações, ele foi
autoritariamente imposto e de maneira nenhuma representa o todo desses
indivíduos. É, portanto, necessário criar mecanismos em que crianças e jovens
negros e negras se percebam na sociedade como sujeitos únicos, belos e capazes
de fazer suas próprias escolhas, livres de estereótipos de inferioridade e ineptidão.
Para isso, a representatividade importa!
É fundamental que a criança se veja em posições de destaque, como
médica, como engenheira. A criança tem que perceber que ela pode ser o que ela
quiser (BENTO apud BUZATTI: 2016, p. 03). Temos que tirar o negro dessas
posições estereotipadas, do serviçal, da empregada doméstica, de personagens
hipersexualizados e o Afrofuturismo nos permite isso.
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
para empoderar o povo negro com cabedal intelectual que contestem a visão de
inferioridade e subserviência que historicamente foi construído sobre ele.
A história do povo negro no Brasil é uma história repleta de discriminação,
lutas, resistências e invisibilidades. Ela é constantemente associada à escravatura,
de forma que negro e escravo são vistos como sinônimos. De fato, não podemos
negar que inúmeras comunidades negras africanas foram cruelmente escravizadas
durante séculos, contudo essa foi uma condição que lhes foi imposta por um
colonizador europeu, determinada pelos contextos histórico-sociais em que foram
inseridos e não por determinações naturais, ou divinas. Ou seja, a escravidão não
faz parte da natureza afrodescendente, muito menos dá conta da diversidade de sua
cultura.
Portanto, se compreendemos que a cultura é dinâmica e que verdades
cristalizadas não conseguem explicar a complexidade das experiências humanas
poderemos repensar essa agregação do negro afrodescendente, tão-somente à
escravidão. Defini-los apenas como “mercadorias humanas” de um sistema
econômico reforçam uma concepção de imutabilidade e determinam identidades
fixas que impedem as visualizações de relações para além das coercitivas. Essas
noções tornam-se extremamente perigosas, pois reduzem os processos históricos e
contribuem para manutenção de preconceitos.
Essa cristalização da questão da identidade vem sendo palco de intensos
debates, nas ciências humanas. De um lado temos as “velhas identidades”, que por
tanto tempo estabilizaram o mundo social e definiram os papéis de pertencimento
ligado às culturas étnicas, raciais, linguísticas, religiosas e, principalmente, aos
nacionalismos culturais (GILROY: 2001) - nessa visão o indivíduo é visto como um
sujeito unificado e fechado em si. Na outra ponta da discussão, temos uma
identidade fragmentada composta não de uma única, mas de várias identidades,
algumas vezes contraditórias e até não resolvida. Nessa perspectiva, Stuart Hall
(2006, p. 12-13) reflete:
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
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CADERNO DE BOLSA: olhares sobre a diversidade
Tanto uma estética artística quanto uma estrutura para uma teoria crítica, o
afrofuturismo combina elementos da ficção científica, ficção histórica, ficção
especulativa, fantasia, afrocenticidade e realismo mágico com crenças não
ocidentais. Em alguns casos, é uma de elaboração total do passado e uma
especulação sobre o futuro carregado de críticas culturais (WOMACK, 2013.
Apud DIAS e SOUZA, 2018, p. 300)
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Considerações finais
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negro ele é bom! Ele é excelente, pois ele estará pautado na alteridade, equidade e
justiça.
Referências
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