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Aula 1
Índice
Leitura Obrigatória 1 ... p. 01
Leitura Obrigatória 2 ... p.08
LEITURA OBRIGATÓRIA 1
ADA PELLEGRINI GRINOVER
Professora Titular de Direito Processual da Universidade de São Paulo (USP).
Coordenadora Científica dos Cursos de Pós-Graduação da Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes.
CUMPRIMENTO DA SENTENÇA
2
10.444/2002, estendeu o cumprimento da sentença condenatória, sem necessidade de
execução ex intervallo, às obrigações de entregar coisa certa.1
Assim, nas obrigações de fazer, não fazer e entregar coisa certa, a sentença
deixou de ser condenatória pura, sendo efetivada no próprio processo de conhecimento.
Faltavam as obrigações de pagar. E o círculo fechou-se com a Lei 11.232, de 22
de dezembro de 2005, ora em comento.
1
O Código Civil subseqüente não revogou a disciplina das obrigações de fazer, não fazer e de
entregar coisa do Código de Processo Civil, conforme afirmamos no estudo "A inafastabilidade do
controle jurisdicional e uma nova forma de autotutela: arts. 249 e 251 do Código Civil", in Princípios
constitucionais fundamentais, São Paulo: Lex, 2005.
2
Na redação original, aprovada pela Câmara dos Deputados, a redação do dispositivo era mais
precisa, conceituando sentença como o ato do juiz proferido nos termos dos arts. 267 e 269. A
redação senatorial é devida à assessoria parlamentar.
3
O resultado disso é que não haverá mais um processo de execução autônomo
fundado em sentença proferida no processo civil (art. 475-N, inc. I). Quando a sentença
reconhecer a existência de uma obrigação específica a ser cumprida pelo réu (obrigação de
fazer, de não fazer, de entregar coisa certa), a efetivação do preceito se fará mediante as
atividades qualificadas como cumprimento da sentença (s.s.); e, quando a obrigação for
em dinheiro, mediante a execução, tudo no mesmo processo aglutinado de cognição-
efetivação (art. 475-I).
Resulta daí que a disciplina do processo de execução, contida no Livro II do
CPC, só se aplicará:
a) quando o título executivo for extrajudicial, sendo que os preceitos do
processo de execução se aplicam apenas em caráter subsidiário ao cumprimento da
sentença, incluindo a execução por quantia (art. 475-R); ou
b) quando a sentença houver sido proferida fora do processo civil estatal
(sentença penal condenatória, laudo arbitral, sentença estrangeira homologada e acordo
extrajudicial homologado).
4. SENTENÇAS DECLARATÓRIAS
A sentença declaratória, que continua regulada pelo art. 4.° do CPC, é positiva
quando acolhe a demanda do autor e lhe concede a tutela Jurisdicional postulada; e é
negativa quando rejeita a demanda, concedendo tutela ao réu.
Na tradição de qualquer sistema processual, incluindo o brasileiro, para exigir a
satisfação do direito que a sentença declaratória tornou certo, o autor deve propor nova
ação, de natureza condenatória: a sentença declaratória positiva vale apenas como
preceito, tendo eficácia imperativa exclusivamente no tocante à declaração da existência
ou inexistência da relação jurídica entre as partes e a seu modo de ser.
Teria a Lei 11.232/2005 atribuído agora à sentença declaratória positiva
eficácia de título executivo, dispensando a demanda destinada a obter o título? É o que
passamos a examinar.
4
5. UMA NOVA CLASSIFICAÇÃO DAS SENTENÇAS
Examinem-se o art. 475-N e inc. I da nova lei:
"Art. 475-N. São títulos executivos judiciais:
I - a sentença proferida no processo civil que reconheça a existência de
obrigação de fazer, não fazer, entregar coisa ou pagar quantia".3
Sentença que reconheça a obrigação parece, à primeira vista, sentença
declaratória. Confronte-se, então, esse dispositivo com o art. 4.° do CPC:
"Art. 4.° O interesse do autor pode limitar-se à declaração:
I - da existência ou inexistência de relação jurídica;
II - da autenticidade ou falsidade de documento.
Parágrafo único. É admissível a ação declaratória, ainda que tenha ocorrido a
violação do direito".
Assim, pela interpretação literal do art. 475-N, inc. I, na redação da Lei
11.232/2005, c/c o art. 4.° do CPC, teríamos agora, no ordenamento brasileiro, duas
espécies distintas de sentença declaratória:
a) a que reconheça a existência de obrigação de fazer, não fazer, entregar coisa
ou pagar quantia, que constituiria diretamente título executivo, dando margem ao
cumprimento da sentença ou à execução por quantia certa, sem necessidade de
propositura de nova demanda destinada a obter o título; e
b) as demais sentenças declaratórias, que não reconheçam a existência das
obrigações acima mencionadas, e que se esgotam em si mesmas, por não dependerem de
uma prestação a ser realizada pelo obrigado (por ex., declaratória negativa), ou que
exigem nova demanda para obtenção do título executivo (por ex., declaratória de
paternidade.).4 Mesmo nessas sentenças, entretanto, haverá normalmente um capítulo
dependente de efetivação posterior, que é aquele atinente às custas e aos honorários da
sucumbência.
No primeiro caso (art. 475-N, inc. I), a sentença seria ao mesmo tempo
declaratória e mandamental (obrigações de fazer, não fazer e de entregar) ou declaratória
e executiva lato sensu (obrigações de pagar quantia certa). No segundo caso (art. 4.°),
teríamos uma ação declaratória pura, com a ressalva dos honorários advocatícios e das
custas. E o sistema brasileiro teria acabado com a sentença condenatória no processo civil.
Todavia, pode-se dar ao art. 475-N, inc. I, interpretação mais flexível e
sistemática, que não rompa com o caminho evolutivo acima traçado e melhor se afeiçoe ao
ordenamento brasileiro (particularmente às tradicionais categorias das sentenças
mandamentais e executivas lato sensu, como espécies de sentenças condenatórias, e às
sentenças meramente declaratórias, previstas no art. 4.° do CPC), afeiçoando-se, ainda, à
clássica conceituação de Andrea Proto Pisani, no sentido de que “sentença condenatória é
a que se executa”.5 Assim, entendemos que a expressão "sentença proferida no processo
civil que reconheça a existência de obrigação de fazer, não fazer, entregar coisa ou pagar
quantia" indica não apenas uma declaração, mas também a condenação, mantendo-se
conseqüentemente a categoria da sentença condenatória, mandamental ou executiva lato
sensu e, ao seu lado, a da declaratória tradicional.
3
Também essa redação é inovação do Senado devida à assessoria parlamentar.
4
Cumpre observar que o STJ tem considerado como providas de força executiva as sentenças
declaratórias que reconhecem a existência de uma obrigação. Acompanhando nosso raciocínio,
desenvolvido a seguir, consideramos essas sentenças condenatórias, e não meramente declaratórias,
apesar do rótulo que for dado à ação.
5
Daí por que entendemos que as sentenças referidas na nota supra têm natureza condenatória.
5
6. CONCLUSÕES
O certo é que a interpretação de uma nova lei, especialmente quando
inovadora, como a que estamos comentando, é tarefa difícil. E as primeiras interpretações
correm sempre o risco de virem a ser desautorizadas pela doutrina e pela jurisprudência
posteriores. Mas alguém tem que deitar a primeira pedra: e nós, aceitando o repto,
tivemos a ousadia de fazê-lo.
Numa análise, que poderá ser provisória, entendemos, em síntese, que a lei do
Cumprimento da Sentença (Lei 11.232, de 22.12.2005) trouxe as seguintes transformações
ao sistema processual brasileiro:
a) a principal característica da lei consiste na eliminação da figura do processo
autônomo de execução fundado na sentença civil condenatória ao pagamento de quantia
certa, generalizando o disposto nos arts. 461 e 461-A do CPC;
b) a efetivação dos preceitos contidos em qualquer sentença civil condenatória
se realizará em prosseguimento ao mesmo processo em que for proferida;
c) não mais haverá processo de execução autônomo fundado em sentença
proferida no processo civil. Quando a sentença reconhecer a existência de uma obrigação
de fazer, não fazer ou entregar coisa certa, a efetivação do preceito se fará mediante as
atividades qualificadas como cumprimento da sentença s.s.; e quando a obrigação for de
pagamento em dinheiro a efetivação se dará mediante a execução, tudo no mesmo
processo que aglutina cognição e efetivação;
d) conseqüentemente, não havia mais como definir "sentença" como "ato pelo
qual o juiz põe termo ao processo, decidindo ou não o mérito da causa" art. 162, § 1.°, do
CPC), sendo que, pela nova redação, haverá sentença sempre que houver julgamento do
mérito da causa (art. 269) e sempre que o juiz determinar a extinção do processo sem
julgamento do mérito (art. 267);
e) a disciplina do processo de execução, contida no Livro II do CPC, só aplicará:
e.1) quando o título executivo for extrajudicial;
e.2) quando a sentença houver sido proferida fora do processo civil estatal
(sentença penal condenatória, laudo arbitral, sentença estrangeira homologada, acordo
extrajudicial homologado);
f) parece, assim, que a lei eliminou do processo civil brasileiro a categoria das
chamadas sentenças condenatórias puras, ou seja, aquelas que demandavam um processo
autônomo de execução, com exceção das sentenças proferidas fora do processo civil
estatal (supra, e.2);
g) as sentenças serão mandamentais quando afirmarem a existência de uma
obrigação de fazer, não fazer ou entregar coisa certa; e serão executivas lato sensu quando
se referirem à obrigação de pagar quantia em dinheiro;
h) no primeiro caso, serão efetivadas mediante cumprimento da sentença s.s. e
no segundo, mediante execução sine intervallo;
i) na interpretação literal do art. 475-N, I, da lei, a sentença, nos casos
apontados supra ("g") surgiria como declaratória;
j) nessa interpretação, teríamos, no ordenamento brasileiro, duas espécies
distintas de ação declaratória:
j.l) a que reconhece a existência de obrigação de fazer, não fazer, entregar
coisa certa ou pagar quantia, que constituiria diretamente título executivo, dando margem
ao cumprimento da sentença (s.s.) ou à execução sine intervallo;
j.2) as demais sentenças declaratórias (art. 4.° do CPC), que não reconhecem a
existência das obrigações acima mencionadas, esgotando-se em si mesmas, por não
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dependerem de uma prestação a ser realizada pelo obrigado (como na sentença
declaratória negativa) ou que exigem nova demanda para obtenção do título executivo
(por. ex., declaratória de paternidade). Mesmo nessas sentenças, entretanto, haverá
normalmente um capítulo dependente de efetivação posterior, que é aquele atinente às
custas e honorários da sucumbência;
k) aceita a interpretação literal, teríamos assim sentenças declaratórias que
constituem título executivo, ao lado de sentenças declaratórias puras;
l) entretanto, uma interpretação mais flexível e sistemática do art. 475-N, inc.
I, leva a afirmar que a expressão contida no dispositivo não se refere apenas à declaração,
mas também à condenação, mantendo-se conseqüentemente as categorias das sentenças
condenatórias mandamentais e executivas lato sensu.
m) esta última interpretação parece afeiçoar-se melhor às linhas do caminho
evolutivo indicado no texto, à sistematização das sentenças mandamentais e executivas
lato sensu como pertencentes ao gênero de sentenças condenatórias, e ao próprio art. 4.°
do CPC, aderindo, ainda, ao conceito doutrinário de que sentença condenatória é a que se
executa.
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Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL
Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes – REDE LFG
Disciplina
Aula 1
LEITURA OBRIGATÓRIA 2
FERNANDO DA FONSECA GAJARDONI
Juiz de Direito no Estado de São Paulo
Doutorando e Mestre em Direito Processual pela Faculdade de Direito da USP
Professor Titular de Direito Processual Civil da Faculdade Municipal de Direito de Franca
Professor da Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes – IELF/LFG
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RESUMO: O estudo ora apresentado investiga a nova
sistemática do recurso de agravo de acordo com a Lei n.
11.187/2005, apontando a sua evolução histórica e
antevendo os deletérios efeitos que o novel regime trará
à justiça de 1º grau.
ABSTRACT: The articles investigate the new regime of
agravo (law n. 11.187/2005), showing the historic
evolution of de institute, and prevent the Brazilians law
operators about the loss in the 1st degree justice.
PALAVRAS-CHAVE: Processo Civil. Agravo. Lei n.
11.187/2005. Evolução. Prejuízo. Justiça de 1º grau.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. O regime do agravo até
então vigente. 3. As mudanças da Lei n. 11.187/2005. 4.
Conclusões.
1. INTRODUÇÃO.
Quando o Código de Processo Civil de 1973, ora em vigor, foi promulgado, a
doutrina nacional e estrangeira, em uníssono, aplaudiram o sistema recursal do então novo
diploma. Asseveravam que o cabimento do recurso conforme a natureza do ato processual
atacado (art. 162 do CPC) simplificava, e muito, o regime recursal até então em vigor no
CPC de 19396. Em vez de uma relação taxativa de hipóteses de cabimento do agravo –
como ainda ocorre hoje com o recurso em sentido estrito do CPP (art. 581) – adotou-se
uma fórmula genérica por todos conhecida: de sentença (ato que extingue o procedimento
em 1º grau de jurisdição) cabe apelação e de decisão interlocutória (ato que resolve
questão incidente) cabe agravo.
Os aplausos iniciais ao sistema recursal brasileiro, contudo, não resistiram ao
tempo. O regime recursal aberto implantado pelo CPC/1973 mostrou-se, ao longo destes
mais de 30 (trinta) anos de vigência da Lei 5.869/1973, extremamente deletério para os
propósitos da efetividade do processo. Reformas e mais reformas processuais se seguiram,
6
Previa-se no CPC de 1939 que cabia apelação das decisões definitivas de primeira instância que
apreciassem o mérito da demanda (art. 820). Já quanto ao agravo, era ele previsto em três
modalidades: de petição, de instrumento ou nos autos do processo. O agravo de petição era o
recurso cabível das decisões terminativas de primeira instância (art. 846). O de instrumento (art.
842) era reservado para as seguintes decisões: I – que não admitirem a intervenção de terceiro na
causa; II – que julgarem a exceção de incompetência; III – que denegarem ou concederem medidas
requeridas como preparatórias da ação; IV – que não concederem vista para embargos de terceiro,
ou que os julgarem; V – que denegarem ou revogarem o benefício de gratuidade; VI – que
ordenarem a prisão; VII – que nomearem, ou destituirem inventariante, tutor, curador,
testamenteiro ou liquidante; VIII – que arbitrarem, ou deixarem de arbitrar a remuneração dos
liquidantes ou a vintena dos testamenteiros; IX – que denegarem a apelação, inclusive a de terceiro
prejudicado, a julgarem deserta, ou a relevarem da deserção; X – que decidirem a respeito de êrro
de conta; XI – que concederem, ou não, a adjudicação ou a remissão de bens; XII – que anularem a
arrematação, adjudicação ou remissão cujos efeitos legais já se tenham produzido; XIII – que
admitirem, ou não, o concurso de credores. ou ordenarem a inclusão ou exclusão de créditos; XIV –
que julgarem, ou não, prestadas as contas; XV – que julgarem os processos de que tratam os Títulos
XV a XXII do Livro V, ou os respectivos incidentes, ressalvadas as exceções expressas; XVI – que
negarem alimentos provisionais; XVII – que, sem caução idônea, ou independentemente de
sentença anterior, autorizarem a entrega de dinheiro ou quaisquer outros bens, ou a alienação,
hipoteca, permuta, subrogação ou arrendamento de bens. Finalmente, o agravo nos autos do
processo tinha cabimento das decisões: I – que julgarem improcedentes as exeções de litispendência
e coisa julgada; II – que não admitirem a prova requerida ou cercearem, de qualquer forma, a
defesa do interessado; III – que concederem, na pendência da lide, medidas preventivas; IV – que
considerarem, ou não, saneado o processo, ressalvando-se, quanto à última hipótese o disposto no
art. 846.
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todas com a finalidade de diminuir a sobrecarga dos tribunais e de desobstruir as vias de
julgamento7.
Eis mais um ato legislativo de idêntica finalidade. A Lei 11.187, promulgada em
19 de outubro de 2005, publicada em 20.10.2005 e em vigor desde 18 de janeiro de 2006 8,
veio procurar (só procurar) corrigir as distorções observadas no regime de agravo, em
especial as advindas da Lei 9.139/1995 e Lei 10.352/2001.
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Tribunais, que passaram a se dedicar quase que exclusivamente aos agravos de
instrumentos12, a grande maioria deles (mais de 80%) de urgência nenhuma.
Em 2001 procurou-se corrigir esta anomalia nas cortes de apelação (ou melhor,
de agravos). A Lei 10.352 passou a admitir que o relator do agravo de instrumento, nos
casos em que o julgamento do recurso não fosse urgente nem implicasse em dano grave ao
jurisdicionado, convertesse o agravo de instrumento em retido (art. 527, II, do CPC),
evitando, com isso, que a eleição destas situações ficasse ao exclusivo talante da parte
(art. 523, § 4º, na antiga redação).
A experiência prática revelou mais uma vez que o legislador brasileiro não
conhece bulhufas da cultura recursal arraigada em nossa formação jurídica: a disposição
não teve nenhuma aplicação, pois da decisão que efetuava a conversão do instrumento em
retido, admitia-se o cabimento de um outro agravo dito interno (ou agravinho como
impropriamente dizem alguns), dirigido à Câmara que julgaria o agravo de instrumento
(art. 527, II, do CPC, na antiga redação). Os desembargadores, então, sem delongas,
preferiam julgar de uma vez o instrumento, mesmo em casos de nenhuma urgência, em
vez de julgá-lo duas vezes, uma monocraticamente quando da conversão, e a outra quando
da apreciação, pela Câmara (da qual fazem parte) do agravo interno da sua decisão.
Quanta perda de tempo!
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Nossa predileção por estatísticas recomenda que indiquemos os seguintes dados colhidos do
trabalho coordenado pelo desembargador paulista Osvaldo da Silva Ricco (não publicado). Em 2000,
no TJ/SP, entraram 24.143 agravos contra 64.140 apelações; mas foram julgadas apenas 34.895
apelações contra 21.406 agravos de instrumento. Ou seja, foram julgadas 54% das apelações
(praticamente metade) em favor do julgamento de 89% dos agravos.
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Pois aí está: a restrição à recorribilidade sempre desemboca na utilização do
mandado de segurança contra ato judicial, ressuscitado pelo advento da Lei 11.187/2005.
Certamente quem já está em 2º grau para ganhar tempo vai se valer do mandado de
segurança contra o ato do relator que converteu o instrumento em retido, writ que será
julgado pelo próprio Tribunal (súmula n. 41 do STJ13).
Como se não bastassem estas alterações inexpressivas para os fins da
efetividade, há ainda uma outra que, ao meu ver, é a pior delas, pois em vez de não
mudar nada, atrapalha profundamente o curso do processo. O art. 523, § 3º, do CPC.
De acordo com o dispositivo, das decisões interlocutórias proferidas em
audiência de instrução e julgamento (só nestas), o agravo sempre será retido (até aqui
nenhuma novidade) e interposto imediatamente de forma oral (eis a novidade), constando
do termo de audiências sucintamente as razões do agravante, e por força do contraditório
constitucional, do agravado.
Fico aqui a imaginar uma audiência de instrução e julgamento onde haja várias
testemunhas, contraditas, questões incidentais, etc. Se para cada decisão interlocutória do
juiz que a parte não concorde (e são tantas) for interposto um agravo retido obrigatório e
na modalidade oral, a constar do termo, estou certo que devemos expandir os horários de
funcionamentos dos fóruns, e implantar, definitivamente, rodízio de funcionários na
digitação dos termos (isto sem falar no número de aposentadorias por lesão de esforço
repetitivo). Afinal serão tantas horas de digitação de razões...14
E os atritos. Ah, os atritos! Imaginem advogados, promotores e juízes, em
conturbada audiência. O calor do momento (e das salas de audiência), a presença das
partes, tudo está a contribuir para que os ânimos se exaltem em razões e contra-razões de
agravo retido, em decisões e manutenções de decisões agravadas.
A obrigatoriedade da interposição imediata do retido oral das decisões
proferidas em audiência é um desserviço à justiça de 1º grau. As pautas de audiências, já
longas, se tornarão ainda mais. O juiz de 1º grau, sem poder prever o número de agravos
que serão interpostos de suas decisões, terá de reservar o dia todo para uma audiência
mais complexa. E o jurisdicionado, em termos de celeridade, não ganha nada com isso.
Seria bem melhor que o agravo nestas situações continuasse obrigatoriamente
retido, mas pudesse ser interposto por via escrita, no prazo legal. Não há razão lógica
alguma para a mudança.
Além disso, muito prejudicados pela nova norma serão também os jovens
advogados. Ainda no aprendizado profissional (algo que em nossa área se leva toda uma
vida), muitos deles não terão segurança suficiente para ofertar as razões orais de agravo,
algo que era possível quando a interposição era escrita.
Por tabela os grandes escritórios também passam a ser prejudicados, pois os
advogados mais experientes terão de deixar o conforto de seus escritórios para defender
adequadamente os interesses de seus patrocinados em audiências de instrução de causas
mais complexas.
13
“O Superior Tribunal de Justiça não tem competência para processar e julgar, originariamente,
mandado de segurança contra ato de outros Tribunais ou dos respectivos órgãos”.
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A única maneira que encontro para tentar minorar os graves efeitos da introdução do agravo oral
obrigatório é a condensação dos arrazoados para um momento final único. Assim, se na audiência de
instrução for proferida mais de uma decisão recorrível, a parte deve agravar imediatamente (isto é,
logo após a prolação da decisão), sob pena de preclusão temporal. Mas nada impede que um
arrazoado único seja feito ao final, condensando-se ali o inconformismo contra todas as decisões
impugnadas. Sem dúvida isto representa certo abrandamento do princípio recursal da
complementaridade, em que as razões necessariamente devem acompanhar a interposição do
recurso.
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4. CONCLUSÕES.
Espero, sinceramente, errar em todas as minhas previsões, e certamente terei a
humildade necessária para fazer mea culpa. Mas a Lei 11.187/2005, ao meu ver, mais
atrapalha do que ajuda.
A ótica reformadora partiu da premissa parcialmente verdadeira de que o
congestionamento da justiça está no 2º grau. Só me parece que não se aperceberam dos
reflexos negativos que a reforma do agravo opera no andamento das causas em 1º grau.
Melhorar a qualidade temporal do 2º grau em detrimento do 1º grau não me parece decisão
acertada.
O excesso de recursos é um problema cultural. Só será solucionado com
mudança de mentalidade através da formação dos novos profissionais do direito e por
sanções processuais mais incisivas aos que recorrem sem fundamento.
Não há fórmula mágica para melhorar o processo civil brasileiro. As mudanças
são esperadas com ansiedade. Mas não poupemos as críticas construtivas a elas. Afinal a
(quase) todos interessa o aperfeiçoamento de nosso sistema jurídico.
13