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ESCOLA DA MAGISTRATURA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Turma: CPI C 12022


Disciplina/Matéria: DIREITO PROCESSUAL PENAL
Sessão: 02 - Dia 19/05/2022 - 18:00 às 19:50
Professor: ELISA RAMOS PITTARO NEVES

02 Tema: Norma Processual Penal: fontes e eficácia. Interpretação da Lei Processual Penal.
Intertemporalidade da norma processual: a lei processual penal no tempo, no espaço e em relação
às pessoas. Finalidade do Direito Processual Penal. Garantias constitucionais. Princípios
constitucionais e legais do Processo Penal: Noções. Princípio da dignidade humana. Devido
processo legal. Duração razoável do processo. Favor rei. Presunção de Inocência (direito italiano:
presunção de inocência x presunção de não culpabilidade). Contraditório. Ampla defesa.
Proporcionalidade. Isonomia.

1ª QUESTÃO:
RÉGIS é processado pela prática de determinada infração penal. No decorrer do processo, é
publicada lei processual nova a implicar prejuízo para o réu. Pergunta-se:

a) Poderia o acusado alegar a irretroatividade da lei processual penal?


b) Existe hipótese de ultratividade da lei processual penal?

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RESPOSTA:
"5. LEI PROCESSUAL PENAL NO TEMPO
...
Raciocínio distinto, porém, é aplicável ao processo penal. De acordo com o art. 2º do CPP, que
consagra o denominado princípio tempus regit actum, "a lei processual penal aplicar-se-á desde logo,
sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior". Como se vê, por força do
art. 2º do CPP, incide no processo penal o princípio da aplicabilidade imediata, no sentido de que a
norma processual aplica-se tão logo entre em vigor, sem prejuízo da validade dos atos já praticados
anteriormente. O fundamento da aplicação imediata da lei processual é que se presume seja ela mais
perfeita do que a anterior, por atentar mais aos interesses da Justiça, salvaguardar melhor o direito das
partes, garantir defesa mais ampla ao acusado, etc. Portanto, ao contrário da lei penal, que leva em
conta o momento da prática delituosa (tempus delicti), a aplicação imediata da lei processual leva em
consideração o momento da prática do ato processual (tempus regit actum).
Do princípio tempus regit actum derivam dois efeitos: a) os atos processuais praticados sob a vigência
da lei anterior são considerados válidos; b) as normas processuais têm aplicação imediata, regulando
o desenrolar restante do processo.
Apesar de o art. 2º do CPP não estabelecer qualquer distinção entre as normas processuais, doutrina e
jurisprudência têm trabalhado crescentemente com uma subdivisão dessas regras:
a) normas genuinamente processuais: são aquelas que cuidam de procedimentos, atos processuais,
técnicas do processo. A elas se aplica o art. 2º do CPP;
b) normas processuais materiais (mistas ou híbridas): são aquelas que abrigam naturezas diversas, de
caráter penal e de caráter processual penal. Normas penais são aquelas que cuidam do crime, da pena,
da medida de segurança, dos efeitos da condenação e do direito de punir do Estado (v.g., causas
extintivas da punibilidade). De sua vez, normas processuais penais são aquelas que versam sobre o
processo desde o seu início até o final da execução ou extinção da punibilidade. Assim, se um
dispositivo legal, embora inserido em lei processual, versa sobre regra penal, de direito material, a ele
serão aplicáveis os princípios que regem a lei penal, de ultratividade e retroatividade da lei mais
benigna.
Não há consenso na doutrina acerca do conceito de normas processuais materiais ou mistas. Uma
primeira corrente sustenta que normas processuais materiais ou mistas são aquelas que, apesar de
disciplinadas em diplomas processuais penais, dispõem sobre o conteúdo da pretensão punitiva, tais
como aquelas relativas ao direito de queixa, ao de representação, à prescrição e à decadência, ao
perdão, à perempção, etc. Uma segunda corrente, de caráter ampliativo, sustenta que normas
processuais materiais são aquelas que estabelecem condições de procedibilidade, meios de prova,
liberdade condicional, prisão preventiva, fiança, modalidade de execução da pena e todas as demais
normas que produzam reflexos no direito de liberdade do agente -, ou seja, todas as normas eu tenham
por conteúdo matéria que seja direito ou garantia constitucional do cidadão.
Independentemente da corrente que se queira adotar, é certoqueàs normas

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processuais materiais se aplica o mesmo critério do direito penal, isto é, tratando-se de norma
benéfica ao agente, mesmo depois de sua revogação, referida lei continuará a regular os fatos
ocorridos durante a sua vigência (ultratividade da lei processual penal mista mais benéfica); na
hipótese de novatio legis in mellius, referida norma será dotada de caráter retroativo, a ela se
conferindo o poder de retroagir no tempo, a fim de regular os fatos ocorridos anteriormente a sua
vigência."
(LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. 4 ed. rev., ampl. e atual. Salvador:
Editora JusPodivm, 2016, pág. 96-97).

"7.1. Retroatividade pro réu


Objetivando uma interpretação consentânea à Constituição Federal, Paulo Queiroz e Antonio Vieira,
em posição minoritária, defendem que a irretroatividade da lei penal mais gravosa também deve ser
aplicada à norma processual, de sorte a potencializar as garantias inerentes ao imputado. Por essa
razão, o sistema não deve ser visto de forma estanque, e as normas penais e processuais penais devem
ser colocadas no mesmo patamar. Nessa linha, o dogma da aplicação imediata da lei processual
(benéfica ou maléfica), consagrado no art. 2º, CPP, estaria ultrapassado, de forma que a norma
processual mais gravosa só seria aplicada aos delitos consumados após sua entrada em vigor.
Já a lei processual mais benéfica poderia retroagir, implicando inclusive na renovação de atos
processuais, " a depender da fase em que o processo se achar".
Por outro lado, as normas estritamente procedimentais, que não afetem garantias, teriam aplicação
imediata, em conformidade com o art. 2º do CPP."
(TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 3ª
tiragem. 8 ed. rev., ampl. e atual. Bahia: Editora JusPodivm, 2013, pág. 68).

2ª QUESTÃO:
O defensor da acusada Ceidnah Danão, no início da oitiva dos réus, solicitou ao juízo a possibilidade
de formular perguntas também aos inquiridos que não estavam sob o pálio direto de sua defesa
técnica. Para tanto, fundamentou-se nas alterações introduzidas pela Lei 10.792/2003 quanto à
sistemática de realização do interrogatório judicial, que estendeu às partes a possibilidade de
formularem perguntas ao acusado inquirido, nos termos do artigo 188 do Código de Processo Penal.
O defensor sustentou que o interrogatório é a oportunidade para a colheita de elementos de cognição
acerca do meritum causae, sendo necessário distinguir, de um lado, a atuação do interrogando que
simplesmente se defende (preservando-se) e, de outro, a conduta daquele que, ao falar, incrimina
corréu. Neste último caso, o comportamento geraria desequilíbrio de forças, pois, além do órgão
acusador, o delatado passaria a contar com um novo opositor, cujo interrogatório passa a ter o
contorno de um autêntico testemunho, a merecer atenção especial do magistrado.
Logo, se afastada a possibilidade de que o defensor do delatado possa fazer reperguntas ao
interrogado, exclusivamente no tocante à delação realizada, haveria cerceamento de defesa, pois a
palavra do delator será levada em conta para compor o quadro probatório contra o delatado e este não
terá a oportunidade de produzir contraprova em cima disso. Por isso, em homenagem à garantia
constitucional da ampla defesa, cumpriria assegurar a possibilidade de se influir na produção daqueles
elementos que provavelmente militarão em seu desfavor.
Devidamente consultado, o Ministério Público manifestou-se pelo indeferimento do pedido, pois a
mencionada previsão legal deveria ser interpretada em consonância com o objetivo máximo do ato
judicial de interrogatório, o qual constitui, primordialmente, além de meio de prova, ato
personalíssimo de defesa do acusado inquirido. Este poderá encampar sua linha geral de defesa,
rebater as acusações que lhe são dirigidas, acusar corréus ou, simplesmente, calar-se diante do juízo,
fazendo uso de seu direito constitucional ao silêncio.
Caso o alcance da previsão legal que concedeu às partes o direito de formularem perguntas fosse
estendido aos defensores dos demais corréus, estaria se fraturando por completo o caráter
personalíssimo do ato como meio primordial de defesa e obrigando o acusado a defender-se duas
vezes. Assim, o conceito de ‘partes‘ externado pelo artigo 188 do CPP deveria ser interpretado
restritivamente, facultando a palavra ao MP e ao defensor, excluindo-se os advogados dos demais.
Além disso, é de se ressaltar que o deferimento ou não de perguntas ao acusado, no interrogatório, é
ato discricionário do dirigente do feito, que pode indeferir até mesmo as indagações do Ministério
Público e da defesa do interrogado, quando entender inconveniente. Tal situação se evidencia com

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mais razão quando referente aos advogados dos outros acusados, que não estão elencados no art. 188
do Código de Processo Penal.
Como deve decidir o juiz?

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RESPOSTA:
"APELAÇÃO CRIMINAL - TRÁFICO DE DROGAS - ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE
DROGAS - NULIDADE DA PERÍCIA - INEXISTÊNCIA - OITIVA TARDIA NA FASE
INQUISITORIAL- AUSÊNCIA DE ILICITUDE - SUSPEIÇÃO DE MAGISTRADA -
INADEQUAÇÃO - INÉPCIA DA DENÚNCIA - INOCORRÊNCIA - INTERCEPTAÇÃO
TELEFÔNICA - HIGIDEZ- CERCEAMENTO DE DEFESA POR IMPOSSIBILIDADE DO
PROCURADOR DO CORRÉU PERGUNTAR AOS OUTROS ACUSADOS - AUSÊNCIA DE
IRREGULARIDADE - INVERSÃO NA ORDEM DA COLHEITA DA PROVA ORAL -
PREJUÍZO PRESUMIDO - NULIDADE - RECONHECIMENTO. Se a parte não evidencia,
especifica e claramente, qual seria, de fato, a apontada nulidade e irregularidade na confecção da
perícia, não se pode cogitar de invalidá-la. Eventuais vícios que venham a afetar o inquérito policial,
que se trata de mera peça informativa, não desaguam na nulidade da ação penal. O ordenamento
processual penal vigente dispõe de instrumento adequado para se averiguar a alegação de suspeição
de Magistrado, não sendo o recurso de apelação a sede própria. Não é inepta a denúncia, se a peça
acusatória que descreve a atuação do grupo e a forma de integração de cada acusado à organização,
sendo desnecessária descrição minuciosa da atuação de cada um, já que devidamente esclarecido o
objeto da imputação e se permita o exercício da ampla defesa. Sendo hígido e tendo observado todas
as balizas impostas pela legislação e jurisprudências aplicáveis, não é nula a interceptação telefônica.
É despicienda e não é obrigatória a transcrição integral das conversas interceptadas. Inexiste previsão
legal expressa, a fim de que o Procurador de Corréu faça perguntas diretamente aos demais
acusados, por ocasião da audiência de instrução e julgamento. O interrogatório do réu deve ser
sempre o último ato de instrução probatória oral, ainda que em apuração esteja o delito de tráfico de
drogas. Se há inversão da ordem da colheita da prova oral, estando o interrogatório dos réus a
inaugurar a instrução, antes dos demais é de se presumir o prejuízo à defesa dos acusados, conforme
precedente do Superior Tribunal de Justiça, com o reconhecimento da nulidade da prova oral
colhida."
grifei
(TJMG. Segunda Câmara Criminal. Apelação Criminal 1.0693.10.095899-2/001. Relatora Des.
Valéria Rodrigues Queiroz. Julgamento em 24/06/2021).

"AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ADULTERAÇÃO,


FALSIFICAÇÃOOUALTERAÇÃO DE

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SUBSTÂNCIA OU PRODUTO ALIMENTÍCIO (LEITE). ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. ART. 288 DO


CÓDIGO PENAL. CRIME DE LAVAGEM DE CAPITAIS. ART. 1.º DA LEI 9.613/98. AUTONOMIA.
MATERIALIDADE E AUTORIA. SÚMULA 7/STJ. INTERCEPTAÇÃOTELEFÔNICA.
PRORROGAÇÃO. FUNDAMENTAÇÃO. COMPLEXIDADE E NECESSIDADE. NULIDADE NÃO
VERIFICADA. CERCEAMENTO DE DEFESA. INTERROGATÓRIO DO RÉU. DEFENSOR
DATIVO PARA O ATO. PERGUNTAS A CORRÉU. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. SÚMULA 523/STF.
MATERIAL PARA CONTRAPROVA. CONTRARIEDADE AOS ARTS. 158, § 6º [SIC] E 170 DO
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL; ARTS. 848, § 2º, DO DECRETO 30.691/1952 E ART. 27 DA LEI
6.437/1977. PROCEDIMENTO DE COLHEITA DE PROVA PREVISTO NO DECRETO 30.691/52 E
NA LEI 6.437/77 NÃO OBSERVADO. SÚMULAS 284/STF E 283/STF. DOSIMETRIA. PENA-BASE
ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. CONTINUIDADE DELITIVA,
INCIDÊNCIA DO § 4º DO ART. 1º DA LEI 9.613/98 E DO ART. 62, I, DO CÓDIGO PENAL
QUANTO AO DELITO DE LAVAGEM DE DINHEIRO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO.
SÚMULAS 282/STF E 356/STF.
I - As decisões que prorrogaram as interceptações telefônicas encontram respaldo na jurisprudência tanto
desta eg. Corte quanto na do col. STF acerca do tema, pois fulcradas na complexidade do feito e na sua
necessidade para elucidação dos fatos tidos por delituosos. Precedentes.
II - No processo penal vige o princípio pas de nullité sans grief, segundo o qual somente se declara a
nulidade de um ato se, em sua decorrência, houver prejuízo para a acusação ou para a defesa. O acórdão
recorrido deixou claramente consignado que a tese de nulidade não merecia prosperar, pois, muito
embora o advogado constituído pelo réu não estivesse presente ao ato processual, não restou indefeso,
uma vez que havia defensor dativo assistindo-o na ocasião. Nos termos da Súmula 523 do STF, "No
processo penal, a falta de defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver
prova de prejuízo para o réu". Precedentes.
III - Embora seja admitida a realização de perguntas a corréu, o interrogatório, em sua essência, é
peça defensiva, razão pela qual, no caso em apreço, não se extrai das alegações genéricas de
nulidade suscitadas pelo recorrente qualquer prejuízo pelo indeferimento do pleito. Precedentes.
IV - No que concerne à contrariedade aos arts. 158, § 6º [sic], e 170 do CPP; 536 e 848, § 2º, do Decreto
30.691/1952 e art. 27 da Lei 6.437/77, ao argumento de que a prova colhida, por não observar
procedimento previsto no Decreto 30.691/52 e Lei 6.437/77, "não é prova pericial apta a sustentar a
acusação, devendo ser declarada nula", in casu, não houve a correta indicação dos dispositivos
supostamente violados pelo v. acórdão recorrido, atraindo a incidência doenunciadosumular n. 284 do
Supremo Tribunal

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Federal. Não obstante esta questão, verifica-se que há fundamentos empregados pelo v. Acórdão e que,
isoladamente, mostram-se capazes de sustentá-lo, mas que não foram especificamente atacados pelo
agravante,razão pela qual o recurso não pode ser conhecido, pela aplicação, por analogia, do Enunciado n.
283 da Súmula do c. Supremo Tribunal Federal: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando a
decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles".
V - Tendo o Tribunal a quo concluído pela existência de elementos probatórios que atestem o vínculo
associativo entre os réus, não há como desconstituir esse entendimento sem nova apreciação detalhada
dos fatos e das provas, providência, como se sabe, incabível na estreita via do recurso especial. Ainda, em
relação ao tipo previsto no art. 288 do Código Penal, trata-se de crime autônomo, que independe da
prática de delitos pelo grupo associado ou de condenação pela prática delitiva para a qual houveram se
associar. Precedentes.
VI - Em relação à materialidade e autoria do crime previsto no art. 1º da Lei 9.613/98, a modificação das
premissas fáticas, de modo a chegar a conclusões diversas daquelas a que chegou o Tribunal a quo,
reclama reexame do material fático-probatório, como já dito, inviável na estreita via do recurso especial.
Tal qual o delito previsto no art. 288 do Código Penal, "O crime de lavagem de dinheiro é apurado de
forma autônoma em relação ao crime antecedente, até porque são distintos os bens jurídicos protegidos. É
o que se depreende da leitura do art. 2º, II, da Lei n. 9.613/98, razão pela qual, a simples existência de
indícios da prática de infração penal‘ já autoriza o processo para apurar a ocorrência do delito de lavagem
de dinheiro (precedentes do STF e do STJ)" (RHC 72.678/BA, Quinta Turma, de minha relatoria, DJe
21/08/2017). Precedentes.
VII - Mostra-se possível a majoração da pena-base em patamar acima do mínimo legal, quando as
circunstâncias do crime ultrapassam o tipo penal, e o aumento respectivo se baseia em elementos
concretos, devidamente expostos no decreto condenatório.
VIII - Na espécie, as circunstâncias judiciais culpabilidade, conduta social e motivos do crime foram
consideradas desfavoráveis. Primeiro, quanto à culpabilidade, verificou-se ser o recorrente o "líder da
quadrilha"; no que concerne à conduta social e aos motivos e efeitos do crime, considerou o Colegiado a
quo os fatos de que o alimento adulterado, por vários meses, era essencial à alimentação das pessoas, em
especial crianças e idosos, bem como o intento do recorrente na busca de lucro fácil.
IX - Por fim, em relação à incidência da causa especial de aumento de pena prevista no art. 1º, § 4º, da
Lei nº 9.613/98 e à continuidade delitiva, o Tribunal a quo não emitiu tese a respeito, pelo que não se
verifica o prequestionamento de tais matérias. Sumulas 282/STF e 356/STF. Agravo regimental não
provido."
grifei
(STJ. Quinta Turma. AgRg no AResp 674.793/RS. Relator Ministro Felix Fischer. Julgamento
em21/11/2017).

Em

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sentido contrário, convém destacar decisão do próprio Superior Tribunal de Justiça sobre o
tema:

"PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. INTERROGATÓRIO. CO-RÉU DELATOR.


POSSIBILIDADE DE REPERGUNTAS PELA DEFESA DO DELATADO.
RECONHECIMENTO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. OCORRÊNCIA.
1. O interrogatório é essencialmente meio de defesa. No entanto, se do interrogatório exsurgir delação
de outro acusado, sobrevém para a defesa deste o direito de apresentar reperguntas. Tal decorre de um
modelo processual penal garantista, marcado pelo devido processo legal, generoso feixe de
garantias. A vedação do exercício de tal direito macula o contraditório e revela nulidade
irresgatável.
2. Ordem concedida, apenas em favor do paciente, para anular o processo a partir do interrogatório,
inclusive, reconhecendo-se o excesso de prazo no seu encarceramento, deferindo-lhe a liberdade
provisória. (com voto vencido)"
grifei
(STJ. Sexta Turma. HC 83.875/GO. Relator Ministro Paulo Gallotti. Relatora para acórdão
Ministra Maria Thereza de Assis Moura. Julgamento em 25/03/2008).

Na doutrina, podemos citar a lição do doutrinador Renato Brasileiro de Lima, a saber:

"3. Pluralidade de acusados e direito de reperguntas dos demais defensores: havendo dois ou
mais acusados no processo, deve-se possibilitar a qualquer dos litisconsortes penais passivos formular
reperguntas aos demais corréus, notadamente se as defesas de tais acusados se mostrarem colidentes,
sob pena de violação à ampla defesa. Em outras palavras, além de poder assistir ao interrogatório de
todos os corréus, cada um dos defensores também tem o direito de lhes fazer reperguntas. Nas mesas
de processo penal da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, coordenadas pela Profa.
Ada Pellegrini grinover, a súmula n. 675 enuncia que "o interrogatório de corréu, incriminando outro,
tem, com relação a este, natureza de depoimento testemunhal, devendo, por isso, se admitirem
reperguntas". (...)"
(LIMA, Renato Brasileiro de. Código de Processo Penal Comentado. Salvador: Juspodivm,
2016, pág. 592).

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Turma: CPI C 12022


Disciplina/Matéria: DIREITO PROCESSUAL PENAL
Sessão: 03 - Dia 19/05/2022 - 20:10 às 22:00
Professor: ELISA RAMOS PITTARO NEVES

03 Tema: Princípios (continuação): Juiz natural. Identidade física do juiz. Princípio da concentração.
Publicidade e motivação. Direito ao silêncio. Inviolabilidades (domicílio, correspondência,
comunicações telegráficas, de dados, telefônicas, etc.). Organizações Criminosas (Lei 12.850/13).
Princípio do nemo tenetur se detegere (intervenções corporais no Processo Penal). Princípio da
Correlação entre a acusação e a sentença (congruência). Princípio acusatório: gestão das provas;
"quadro mental paranoico" (Franco Cordero); primado da hipótese sobre o fato. Convenções
Internacionais de Direitos Humanos.

1ª QUESTÃO:
CONRAD GRAYSON é preso em flagrante, portando uma faca e todo ensanguentado, ao lado de
uma pessoa morta, motivo pelo qual é levado em custódia para a 21ª Delegacia de Polícia. Na
Delegacia, o detido se recusa a prestar qualquer tipo de esclarecimento sobre os fatos e exige a
presença de seu advogado, o que é concedido pela autoridade policial, sendo certo que, antes de
invocar perante o delegado o direito ao silêncio, o preso contou ao advogado, em conversa privada,
ter sido realmente o autor do crime, dando todos os detalhes.
Outrossim, não sabiam CONRAD GRAYSON nem seu advogado que havia uma câmera escondida
instalada pelo próprio Delegado em seu gabinete, local onde foi realizado o encontro.
Pergunta-se: A interceptação ambiental capturada pode ser utilizada contra CONRAD GRAYSON?

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RESPOSTA:
A inviolabilidade jurídica da intimidade constitui direito assegurado constitucionalmente (art. 5º, X,
CRFB), sendo, portanto, ilícitas as provas colhidas mediante a inobservância de tal direito.
A prova obtida mediante a escuta gravada por terceiro de conversa alheia é patentemente ilícita em
relação ao interlocutor inconsciente da intromissão indevida, não importando o conteúdo do diálogo
assim captado.

Com o objetivo de esclarecer melhor a questão, merece destaque a lição trazida pelos
doutrinadores Eugênio Pacelli, Renato Brasileiro de Lima, Gustavo Badaró, Nestor Távora e
Rosmar Rodrigues Alencar, a saber:

"Mais que uma afirmação de propósitos éticos no trato das questões do Direito, as aludidas normas,
constitucional e legal, cumprem uma função ainda mais relevante, particularmente no que diz respeito
ao processo penal, a saber: a vedação das provas ilícitas atua no controle da regularidade da
atividade estatal persecutória, inibindo e desestimulando a adoção de práticas probatórias
ilegais por parte de quem é o grande responsável pela sua produção. Nesse sentido, cumpre
função eminentemente pedagógica, ao mesmo tempo que tutela determinados valores reconhecidos
pela ordem jurídica.
(...)
As gravações clandestinas, em princípio, são ilegais, na medida e quando violarem o direito à
privacidade e/ou à intimidade dos interlocutores, razão pela qual, como regra, configuram provas
obtidas ilicitamente, pelo que serão inadmissíveis no processo.
É o que ocorrerá em relação às gravações de conversas feitas por meio de gravadores, de câmeras de
vídeo, ou por qualquer outro meio, sem a ciência de algum dos interlocutores, já que, ao menos em
relação a ele, haverá clandestinidade na captação da comunicação e, assim, violação ao direito.
(...)
Note-se, ainda, que a gravação de conversa sem o conhecimento de um dos interlocutores, e na
qual se obtenha a confissão da prática de um crime, é evidentemente inadmissível no processo,
até pela violação dodireitoaosilêncioque

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<se reconhece a todos os que, potencial ou efetivamente, estejam ou venham a ser submetidos a
processo penal.
A prova assim obtida não teria também valor probante, na medida em que a confissão somente poderá ser
valorada quando realizada perante o juiz, no curso, pois, da ação penal. Assim, se não confirmada em
juízo, a afirmação feita na aludida gravação não se prestaria a comprovar a confissão."
grifei
(OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 16 ed. Atualizada de acordo com as Leis
nº 12.403, 12.432, 12.461, 12.483 e 12.529, todas de 2011, e Lei Complementar nº 140, de 8 de
dezembro de 2011. Rio de Janeiro: Atlas, 2012, pág. 335-340).

"Especificamente em relação à gravação de eventual confissão do suspeito, investigado, preso, ou


acusado, sem prévia e formal advertência quanto ao direito ao silêncio, jurisprudência e doutrina, todavia,
têm considerado tratar-se de prova ilícita, em razão da lesão ao princípio do nemo tenetur se detegere
(proibição da autoincriminação)."
(LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. 4 ed. rev., ampl. e atual. Salvador:
Editora JusPodivm, 2016, pág. 731).

"10.13. Interceptação telefônica


10.13.1. Questões terminológicas

No campo da liberdade de comunicação, para evitar confusões terminológicas na análise do âmbito de


abrangência da Lei 9.296/1996, é preciso distinguir a comunicação que se dá por via telefônica, da
conversa entre presentes. E, em qualquer uma delas, é preciso verificar se houve interferência de terceiros
na conversa, ou se, ao contrário, foi um dos intterlocutores que registrou o seu ato de comunicação.
Assim, em tese, podemos imaginas as seguintes situações: (1) comunicação telefônica, com interferência
de um terceiro, sem o conhecimento dos interlocutores, denominada interceptação telefônica; (2)
comunicação telefônica, com interferência de um terceiro, com o conhecimento de um dos interlocutores,
denominada escuta telefônica; (3) comunicação telefônica gravada por um dos interlocutores, sem a
ciência da outra parte, chamada gravaçãotelefônicaclandestina; (4) conversa entre
presentes,interceptada porum terceiro não

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participante, sem o conhecimento dos interlocutores, chamada interceptação ambiental; (5) conversa
entre presentes, gravada por um dos interlocutores, sem o conhecimento do outro, chamada gravação
ambiental.
...
No caso em que não há a intervenção de um terceiro na conversa alheia, mas apenas um dos
interlocutores grava a própria conversa, sem o conhecimento do outro interlocutor (gravação telefônica),
o registro da conversação é lícito e independe de prévia autorização judicial."
(BADARÓ, Gustavo. Processo Penal. 6 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Thomson Reuters Brasil,
2018, pág. 518-520).

"2.11.1.5. Interceptação ambiental

Trata-se do meio de prova consistente nos registros de conversas em sede diversa da telefônica ou da
digital, ou seja, captação de aúdio e/ou de imagem ambiete, realizada por terceira pessoa, ou seja, por
agente interceptador que não participa da conversação ambiental.
A interceptação recai sobre comunicação ambiental, entendida como aquela que ocorre sem o uso de
meios digitais, eletrônicos, óticos, telefônicos ou artificiais (ambiente diverso do telefônico ou
cibernético). A validade da interceptação ambiental depende de mais de um fator. Ela pode ocorrer:
1) de forma autorizada judicialmente, quando sua execução ocorrerá com a instalação de equipamento
para captação de conversas sem o conhecimento dos participantes. Os registros assim obtidos são válidos;
2) sem autorização judicial, porém com o conhecimento de um dos interlocutores, hipótese em que o
registro será inválido, eis que os participantes do diálogo têm o direito de sigilo (direito à intimidade), que
nãopode ser mitigado sem que seja observada a cláusula de reserva jurisdicional;
3) sem autorização e sem o conhecimento dos participantes da conversa, conhecida, caso em que os
registros serão também inadmissíveis como prova, ressalvada a possibilidade de serem utilizados em
favor da defesa do imputado;
4) em lugar público ou acessível ao público, caso em que a prova será válida, eis que o ambiente
interceptado não está protegido pelo direito à intimidade.
...
Quanto às conversas entre advogado e preso no interior do estabelecimento prisional, entendemos que há
de ser reservado espaço para que seja assegurado sigilo profissional. Deve ser reconhecido um núcleo
intangível que permita ao advogado - que não seja investigado ou acusado por crime em coautoria com o
detento - entrevistar seu cliente sem que sejam devassadas as conversas por interceptação ambiental."
(TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 3ª tiragem.
8 ed. rev., ampl. e atual. Bahia: EditoraJusPodivm,2013, pág.754-755).

Nestesentido, cumpre

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transcrever julgado do Tribunal de Justiça de Minas Gerais:

"APELAÇÃO CRIMINAL - ROUBO MAJORADO - ART. 157, §2º, INCISO II, DO CÓDIGO PENAL
- PRELIMINAR INÉPCIA DA DENÚNCIA - NÃO OCORRÊNCIA - PRELIMINAR REJEITADA -
MÉRITO - PROVA ILÍCITA - GRAVAÇÃO AMBIENTAL ENTRE POLICIAIS E ACUSADOS -
DIREITO AO SILÊNCIO E A NÃO AUTOINCRIMINAÇÃO - SENTENÇA FUNDAMENTADA
EM PROVA INDEPENDENTE E SEM NEXO COM A GRAVAÇÃO REALIZADA - NULIDADE
NÃO VERIFICADA - ABSOLVIÇÃO - POSSIBILIDADE EM RELAÇÃO A UM DOS RÉUS -
LIAME SUBJETIVO NÃO EVIDENCIADO - AUTORIA DEMONSTRADA EM RELAÇÃO AO
OUTRO RÉU - PALAVRA DA VÍTIMA E DE TESTEMUNHA - PROVA SUFICIENTE AO ÉDITO
CONDENATÓRIO - ABSOLVIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - SUBTRAÇÃO EXERCIDA MEDIANTE
COMPROVADA VIOLÊNCIA À VÍTIMA - DESCLASSIFICAÇÃO PARA FURTO -
IMPOSSIBILIDADE - REESTRUTURAÇÃO DA REPRIMENDA - MAJORANTE DO CONCURSO
DE PESSOAS - AFASTAMENTO.
- Não há que se falar em inépcia da denúncia, pois a mesma atende aos requisitos exigidos pelo art. 41 do
Código de Processo Penal. Além disso, inépcia da denúncia não pode ser alegada depois de prolatada a
sentença, pois havendo condenação, esta é que deverá ser atacada. Preliminar rejeitada.
- Não há que se acolher o pleito de absolvição em razão da alegada ilicitude da prova produzida na
fase inicial (teoria da árvore envenenada), se a condenação está fundamentada em outros elementos
de prova produzidos por meios independentes e que não possuem nexo com aquela.
- Estando o acervo probatório harmônico no sentido de apontar um dos apelantes como autor do crime de
roubo, tendo utilizado de expediente violento para efetivação da subtração, impossível se cogitar uma
absolvição ou até mesmo a desclassificação para delito mais brando. Em sede de crimes patrimoniais, que
geralmente são praticados na clandestinidade, configura-se preciosa a palavra da vítima e de testemunhas
para o reconhecimento do agente, mormente quando não há nada nos autos que demonstre que elas
tenham inventado tais fatos com a simples intenção de prejudicá-lo.
- Não havendo prova substancial de que os apelantes atuaram em unidade de desígnios e mediante divisão
de tarefas, a absolvição de um deles é medida que se impõe.
- Uma vez absolvido um dos apelantes, necessária areestruturação da pena do outro apelante condenado,

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afastando-se a majorante do concurso de pessoas."


grifei
(TJMG. Sétima Câmara Criminal. Apelação Criminal 1.0042.13.003500-1/001. Relator Des. Sálvio
Chaves. Julgamento em 28/04/2021).

Quanto à licitude dagravação ambiental realizada por um dos interlocutores, sem o conhecimento
do outro, cumpre transcrever decisões proferidas pelo STJ:

"PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. CORRUPÇÃO


PASSIVA. DESEMBARGADORA DE TRIBUNAL DE JUSTIÇA. CRIME IMPOSSÍVEL POR OBRA
DO AGENTE PROVOCADOR. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA
PARA O OFERECIMENTO DA DENÚNCIA. SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA. ILICITUDE DA
GRAVAÇÃO AMBIENTAL REALIZADA POR INTERLOCUTOR. AUSÊNCIA DE
NULIDADE. USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. NÃO
OCORRÊNCIA.
1. A controvérsia acerca de eventual atipicidade da conduta pela ocorrência de crime impossível por obra
do agente provocador nem sequer foi apreciada pelo Tribunal de origem por ocasião do julgamento do
habeas corpus originário, de maneira que fica obstado o exame da matéria diretamente por esta Corte, sob
pena de indevida supressão de instância e violação dos princípios do duplo grau de jurisdição e devido
processo legal.
2. "[A] pretensão de trancar prematuramente o processo está prejudicada pela superveniência de sentença
penal, na qual, em cognição exauriente, a pretensão acusatória foi acolhida, denotando, ipso facto, a plena
aptidão da inicial acusatória e a existência de provas da autoria e da materialidade delitivas" (AgRg no
HC n. 164.270/RS, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 6/9/2016,
DJe 15/9/2016).
3. Conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal firmado sob a sistemática da repercussão
geral, "é lícita a prova consistente em gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem
conhecimento do outro" (RE n. 583.937 QO-RG, Relator Ministro CEZAR PELUSO, julgado em
19/11/2009, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-237 de 18/12/2009) 4. "[P]ara que haja a
atração da causa para o foro competente é imprescindível a constatação da existência de indícios dda
participação ativa e concreta do titular da prerrogativa em

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ilícitos penais" (Rcl n. 26.574/RJ, Rel. Ministro CELSO DE MELLO, DJe de 14/2/2018).
5. Na hipótese, os indícios da prática delituosa da titular da prerrogativa de função, ao que se tem dos
autos, não estariam
concretizados anteriormente à gravação ambiental de diálogo com corréu, não havendo elementos, até
aquele momento, para autorizar o deslocamento da competência ao Superior Tribunal deJustiça, o que
somente veio a ocorrer posteriormente, ensejando a instauração da Sindicância n. 365/DF, a qual foi
transmudada para a Ação Penal originária n. 863/DF, esta novamente deslocada à primeira instância em
virtude da aposentadoria compulsória da recorrente determinada pelo Conselho Nacional de Justiça.
6. Recurso ordinário parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido."
grifei
(STJ. Sexta Turma. RHC 102.240/PA. Relator Ministro AntonioSaldanha Palheiro. Julgamento em
18/06/2019).

"PENAL. PROCESSUAL PENAL. AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA. DENÚNCIA POR CORRUPÇÃO


PASSIVA, LAVAGEM DE DINHEIRO E ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA IMPUTADA A MEMBRO
DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESPÍRITO SANTO. ESCUTA AMBIENTAL REALIZADA POR
UM DOS INTERLOCUTORES SEM CONHECIMENTO DO OUTRO. ADMISSIBILIDADE.
LICITUDE DA PROVA. PRECEDENTES DO STJ E DO STF. DILIGÊNCIAS NÃO
REALIZADAS NO CURSO DA INVESTIGAÇÃO. OFERECIMENTO DA DENÚNCIA.
POSSIBILIDADE. DESNECESSIDADE DE EXAURIMENTO DAS DILIGÊNCIAS REQUERIDAS
PARA A FORMAÇÃO DA OPINIO DELICTI DO MINISTÉRIO PÚBLICO. PRECEDENTES.
AUSÊNCIA DE OITIVA DO DENUNCIADO NA FASE INQUISITORIAL. FACULDADE QUE NÃO
É REQUISITO PARA AVALIDADE DA DENÚNCIA. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO
CARACTERIZADO. PRECEDENTES. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. MOMENTO
PROCESSUAL DE JUÍZO DE DELIBAÇÃO E NÃO DE COGNIÇÃO EXAURIENTE.
PRECEDENTES. PRELIMINARES REJEITADAS. EXORDIAL ACUSATÓRIA QUE ATENDE AOS
REQUISITOS DO ARTIGO 41 DO CPP.VERIFICAÇÃO DA EXISTÊNCIA DO FATO E DOS
INDÍCIOS MÍNIMOS DE AUTORIA A FIM DE DEMONSTRAR A JUSTA CAUSA PARA A
PERSECUÇÃO CRIMINAL. MEDIDAS CAUTELARES. NECESSIDADE DE MANUTENÇÃO.
1. Cuida-se de denúncia ofertada em face de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Espírito
Santo, pela suposta prática de corrupção passiva majorada (art. 317, § 1º, CP), lavagem de dinheiro (art.
1º da Lei nº 9.613/98) e integrar organização criminosa (art. 2º da Lei nº 12.850/2013), descrevendo a
exordial que o acusado
teria praticado os delitos mediante o recebimento de valores em troca de facilitação e favorecimento para
a aprovação de contas perante o Tribunal de Contas Estadual, além do oferecimento de expertise e apoio
técnico no direcionamento de processos licitatórios em diversos municípios daquele estado.
2. A escuta ambiental realizada por um dosinterlocutores sem o conhecimentodo

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outro não torna a prova ilícita, tampouco pode ser confundida com a quebra do sigilo de
comunicação, que depende de prévia autorizaçãojudicial. Precedentes do STF e do STJ.
3. Ademais, o denunciado não nega a realização da reunião nem o conteúdo da gravação, tampouco alega
que ela teria sido editada ou adulterada para fins de acusação, limitando-se a dizer que se trata de
gravação clandestina e que as conversas foram retiradas do verdadeiro contexto de seu significado, o que
não cabe ser avaliado nesta fase de recebimento da exordial acusatória.
4. O inquérito é peça investigativa de natureza sui generis, por se tratar de procedimento unilateral, em
regra sigiloso, sob a titularidade do Ministério Público, que tem o poder de requerer a realização das
diligências que entender necessárias, adequadas e convenientes à sua instrução, não se submetendo, neste
momento, ao crivo do contraditório ou da ampla defesa, que serão oportunamente exercidos na instrução
criminal.
5. Destarte, se o próprio inquérito é dispensável ao oferecimento da denúncia, tanto mais assim será em
relação às diligências requeridas e ainda não realizadas, desde que o Parquet tenha convencimento dos
elementos mínimos para o oferecimento da acusação ou de seu arquivamento.
6. Portanto, diversamente do que se sustenta, não há necessidade de exaurimento das diligências
requeridas no curso do inquérito para a formação da opinio delicti do Ministério Público, sendo certo,
ademais, que, independentemente da conclusão do procedimento investigativo, poderá otitular da
acusação oferecer denúncia em face das diligências já realizadas (v.g. RHC nº 129.043/PR, Segunda
Turma, Rel. Ministro Dias Toffoli, DJe de 26/10/16).
7. A legislação processual penal somente prevê o interrogatório do acusado ao final da instruçãocriminal
(art. 400, CPP), exatamente para resguardar o direito ao amplo exercício de defesa, sendo-lhe, inclusive
neste momento, preservado o direito ao silêncio em obediência ao corolário da vedação à
autoincriminação (nemo tenetur se detegere). Dessa forma, a ausência de oitiva do denunciado na fase
inquisitorial - mera faculdade - não invalida a denúncia. Precedentes.
8. O inquérito não se destina à colheita das provas que determinem, por si, a certeza de autoria e
materialidade, cabendo, neste momento em que se analisa o recebimento da denúncia, apenas a
demonstração da existência do fato e dos indícios mínimos de autoria, a fim de demonstrar a justa causa
para a persecução criminal.
9. A exordial acusatória atende aos requisitos do artigo 41 do CPP, já que descreve, suficientemente, os
fatos criminosos e suas circunstâncias, de modo a possibilitar o pleno exercício do direito de defesa.
10. A fase processual do recebimento da denúncia "é juízo dedelibação, jamais de cogniçãoexauriente.
Não se pode, portanto,

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confundir os requisitos para o recebimento da denúncia, delineados no art. 41 do Código de Processo


Penal, com o juízo de procedência da imputação criminal" (Inq nº 4.022/AP, Segunda Turma, Rel.
Ministro Teori Zavascki, DJe de 22/9/15).
11. Está presente a justa causa para a deflagração da ação penal, visto que há indícios suficientes de
que o denunciado teria concorrido para aprática dos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro
e integrar organização criminosa.
12. As medidas cautelares anteriormente aplicadas: (I) de afastamento do denunciado do cargo de
Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo; (II) de proibição de seu ingresso em
qualquer das dependências da referida Corte de Contas, além da utilização de bens e serviços de
qualquer natureza daquele Tribunal, excetuado o serviço de saúde; e (III) de manter contato com
qualquer de seus servidores ou funcionários, pelo mesmo período e, ainda, a proibição de contato do
denunciado com as pessoas discriminadas no voto, decretadas pela Colenda Corte Especial em
junho/2017, devem permanecer, mantidas as condições anteriores, máxime diante do recebimento da
denúncia.
13. Denúncia recebida."
grifei
(STJ. Corte Especial. APn 869/DF. Relator Ministro Luis Felipe Salomão. Julgamento em
20/11/2017).

2ª QUESTÃO:
Disserte acerca do princípio da presunção de não-culpabilidade, levando-se em consideração a regra
probatória e a regra de tratamento dele derivadas.

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RESPOSTA:
O princípio da presunção da inocência (ou presunção de não-culpabilidade) atua como regra de
tratamento e como regra probatória (ou de julgamento). Na primeira dimensão, ou seja, como regra de
tratamento, deve o imputado ser tratado como inocente, vedando-se prisões processuais automáticas
ou obrigatórias e a execução provisória ou antecipada da sanção penal.
Recente orientação do STF admitindo a prisão provisória do acórdão condenatório proferido em
condenação pelo tribunal de apelação (HC 126.292) destoaria desse entendimento.
Considerado sob o aspecto de regra probatória, o princípio da inocência age como regra de
distribuição do ônus da prova, impondo à acusação a incumbência de demonstrar a culpabilidade do
acusado além de qualquer dúvida razoável, e como regra de julgamento, valendo-se do in dubio pro
reo nas hipóteses de dúvida na valoração da prova sobre fato relevante para a decisão do processo.

Quanto ao tema em questão, convém transcrever os ensinamentos dos doutrinadores Renato


Brasileiro de Lima e Gustavo Badaró, a saber:

“3.1. Da Presunção de inocência (ou da não culpabilidade)

3.1.1. Noções introdutórias


...
Do princípio da presunção de inocência (ou presunção de não culpabilidade) derivam duas regras
fundamentais: a regra probatória (também conhecida como regra de juízo) e a regra de tratamento,
objeto de estudo nos próximos tópicos.

3.1.2. Da regra probatória (in dubio pro reo)


Por força da regra probatória, a parte acusadora tem o ônus de demonstrar a culpabilidade do acusado
além de qualquer dúvida razoável, e não este de provar sua inocência. Em outras palavras, recai
exclusivamente sobre a acusação o ônus da prova, incumbindo-lhe demonstrar que o acusado praticou
o fato delituoso que lhe foi imputado na peça acusatória.
Como consectários da regra probatória, Antônio Magalhães Gomes Filho destaca: a) a incumbência
do acusador de demonstrar a culpabilidade do acusado (pertence-lhe com exclusividade o ônus dessa
prova); b) a necessidade de comprovar a existência dos fatos imputados, não de demonstrar a
inconsistência das desculpas do acusado; c) tal comprovação deve ser feita legalmente (conforme o
devido processo legal); d) impossibilidade de se obrigar o acusado a colaborar na apuração dos fatos
(daí o seu direito ao silêncio).
Essa regra probatória deve ser utilizada sempre que houver dúvida sobre fato relevante para a decisão
do processo. Na dicção de Badaró, cuida-se de uma disciplina do acertamento penal, uma exigência
segundo a qual, para a imposição de uma sentença condenatória, é necessário provar, eliminando
qualquer dúvida razoável, o contráriodo q

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ue é garantido pela presunção de inocência, impondo a necessidade de certeza.


Nesta acepção, presunção de inocência confunde-se com o in dubio pro reo. Não havendo certeza, mas
dúvida sobre os fatos em discussão em juízo, inegavelmente é referível a absolvição de um culpado à
condenação de um inocente, pois, em um juízo de ponderação, o primeiro erro acaba sendo menos grave
que o segundo.
O in dubio pro reo não é, portanto, uma simples regra de apreciação das provas. Na verdade, deve ser
utilizado no momento da valoração das provas, na dúvida, a decisão tem de favorecer o imputado, pois
não tem ele a obrigação de provas que não praticou o delito. Antes, cabe à parte acusadora (Ministério
Público ou querelante) afastar a presunção de não culpabilidade que recai sobre o imputado, provando
além de uma dúvida razoável que o acusado praticou a conduta delituosa cuja prática lhe é atribuída.
...
3.1.3. Da regra de tratamento
...
Portanto, por força da regra de tratamento oriunda do princípio constitucional da não culpabilidade, o
Poder Público está impedido de agir e de se comportar em relação ao suspeito, ao indiciado, ao
denunciado ou ao acusado, como se estes já houvessem sido condenados, definitivamente, enquanto não
houver sentença condenatória com trânsito em julgado.
...
Há quem entenda que esse dever de tratamento atua em duas dimensões: a) interna ao processo:
funciona como dever imposto, inicialmente, ao magistrado, no sentido de que ônus da prova recai
integralmente sobre a parte acusadora, devendo a dúvida favorecer o acusado. (...); b) externa ao
processo: o princípio da presunção de inocência e as garantias constitucionais da imagem, dignidade e
privacidade demandam uma proteção contra a publicidade abusiva e a estigmatização do acusado,
funcionando como limites democráticos à abusiva exploração midiática e torno do fato criminoso e do
próprio processo judicial.”
(LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. 4 ed. rev., ampl. e atual. Salvador:
Editora JusPodivm, 2016, pág. 43-46).

“Por fim, resta definir conteúdo da presunção de inocência, é possível distinguir três significados de tal
princípio: (1) garantia política; (2) regra de tratamento do acusado; (3) regra probatória.
...
O dispositivo constitucional, contudo, não se encerra neste sentido político, de garantia de um estado de
inocência. A “presunção de inocência” também pode ser vista sob uma ótica técnico-jurídica, como regra
de julgamento a ser utilizada sempre que houver dúvida sobre fato relevante para a decisão do processo.
Para a imposição de uma sentença condenatória é necessário provar, além de qualquer dúvida razoável, a
culpa do acusado.

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Nestaacepção, presunção de inocência confunde-se com o in dubio pro reo.


Por fim, a presunção de inocência funciona como regra de tratamento do acusado ao longo do
processo, não permitindo que ele seja equiparado ao culpado. É manifestação clara deste último
sentido da presunção de inocência a vedação de prisões processuais automáticas ou obrigatórias. A
presunção de inocência não veda, porém, toda e qualquer prisão no curso do processo. Desde que se
trate de uma prisão com natureza cautelar, fundada em um juízo concreto de sua necessidade, e não
em meras presunções abstratas de fuga, periculosidade e outras do mesmo gênero, a prisão será
compatível com a presunção de inocência.”
(BADARÓ, Gustavo. Processo Penal. 6 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Thomson Reuters
Brasil, 2018, pág. 67-68).

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