Você está na página 1de 61

U UNIVERSIDADE OE SÃO PAULO

FACULDADE DE FILOSOFIA.LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS

OS FUTU
ROS CIENTISTI
S SOClllS
Algumas características. avaliações e expectativas dos
alunos de Ciências Sociais da Universidade de São Paulo

JOSÉ R EGINALDO PRANDI

\MENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS


A'ULO
.ROSÉ REGINALDOPRANDI
ProfessorAssistente Doutor do Departamento de (iências Sociais
da FFLCH da Universidade de São Paulo
Pesquisador-bolsita do CNPq

DEDALUS - Acervo - FFLCH-FIL


307 Futuros cientistas sociais
P898f
e.3

lll lll lllllllll lll llllllll


21000016055

OSFUTUROSCIENTISTASSOCIAIS
Algumas características, avaliações e expectativas
dos alunos de Ciências Sociais da Universidade de São Paulo

TOMBO.:83747

l;Bt)--FE'LCH--UE?

São Paulo.1980
&)Y..

'p 8 'a8.F
e.3

UNIVERSIDADE DESÃOPAULO
Reitor: Prof. Dr. Waldyr Muniz Ogiva
Vice-Reitor: Prof. Dr. Antonio Bruto da Cunha
Secretário Geral: Dr. José GerandoSoaremde Melão

FACULDADE DE FILOSOFIA. LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS


Diretor : Prof. Dr. Erwin Theodor Rosenthal
Vice-Diretor: Prof. Dr. PautaVizioli
Assistente Técnico para Assuntos Acadêmicos :
Eduardo Marquei da Silvo Airosa
AssistenteTécnico para Assuntos Administrativos :
Cétio Machado da Sirva

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS


Chefe: Prof. Dr. Ruy Galvão de Andrada Coelho
Vice-Chefe: Prof, Dr. Azia Simâo

Este trabalho foi impresso nas oficinas da SecçãoGráfica da Faculdadede


Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, eú
abrilde 1980.
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO 5

1 .1 . A pesquisa e o presente relatório


6
1.2. A estrutu ra curricular 7
1.3. A "contabilidade'' acadêmica 11

2. CARACTERI'STICAS GERAIS DOS ALUNOS 17


2.1 . Diurno persasnotu rno 18
2.2. Diferenças por sexo e estado conjugal 20
2.3. Calou ros e veteranos . 22
2.4. Trabalho 23

3. DADOS SOBRE A ORIGEM SOCIAL 25

4. AVALIAÇOESEEXPECTATIVAS 29

5. O CURSO EA CARREIRA 39
5.1 . A formação incompleta 39
5.2. Notas pessoaispara um debate 47
5.3. Um depoimento coletivo: Falam os alunos 50
1-INTRODUÇÃO

Em 1977, alguns professores do Departamento de Ciências


Sociais da Faculdade de Filosofia. Letras e Ciências Humanas da
Universidade de São Paulo, resolveram fazer um levantamento in-
dicativo de algumascaracterísticasdo corpo discente do Curso de
Ciências Sociais, bem como de suas expectativas e avaliações em
relação ao curso e à carreira profissional/O prometoinclui? tam-
bém uma análise de atitudes políticas do corpo discente,;irPreten-
dia-se. enfim. conhecer melhor o aluno com que se trabalhavam'A
idéia não era nova e anteriormente alguns levantamentosforam
feitos. Infelizmente, as informações específicas sobre o curso de
Ciências Sociais colhidas em outras épocas se perderam. Resolve-
mos retomar o propósito, uma vez que, de possedessasinforma-
ções, se poderia, talvez, refletir sobre o próprio curso de Ciências
Sociais a partir do conhecimento de características da clientela
que, de uma forma ou outra. não podem ser esquecidas.Quando
se tem por fim o debate -- e talvez a mudança -- é conveniente
conhecer, mesmo que de forma grosseira, quem é o aluno-, o que
ele deseja e o que pensa.
Um relatório sobre os resultados da pesquisa deveria circular
entre professorese alunos, como subsídio para uma reflexão so-
bre a situação atual do curso e os rumos a tomar. A pesquisa
seria um primeiro passo,e. por isto, se pretendeu que fossesimples
e despretensiosa.. O conhecimento que cada um de nós temos
acerca do cotidiano acadêmico. de suas dificuldades e descaminhos
deveria complementar os resultados da pesquisa inicial. O que
queríamos, na verdade.era algum material estatístico para ali-
mentar um grande forum de debates.

5
1.1 A pesquisae o presente relatório

Na terceira semana do primeiro semestrede 1977 foi apli-


cado nos alunos um questionário contendo perguntas a respeito
daquelas características e atitudes apontadas. Estrategicamente,
escolheu-se a quarta feira para a aplicação nos dois períodos. A
análisedo horário mostrouque nestedia teríamospresentesca-
louros e veteranos. Como os veteranos se inscrevemdiferenciada-
mente em disciplinas optativas das três áreas do Departa-
mento -- Antropologia, Ciência Política e Sociologia-- a quarta
feira se mostrava ideal, pois neste dia func.ionavam disciplinas
optativas das três áreas.
Os questionários foram aplicados em classe, às 15 e às 21 ho-
ras, respectivamentepara os dois períodos de funcionamento do
curso. O,.professor de cada disciplina ficou responsávelpela apli-
cação. ,f488 alunos estavam presentes e responderam ao questio-
nário.,/Tivemos que eliminar questionáriosde 9 alunosque de-
monstraram não estar dispostos a colaborar. ./Os 479 questioná-
rios considerados,/' utilizáveis representam aproximadamente
60% dos alunos inscritos. Pelas razões anteriormente apontadas,
não temos elementos para suspeitar que a amostra obtida não seja
representativa da população.
Em seguida,os questionáriosforam codificadose transcri-
tos em cartões de computador.
Fizemosuma primeira apuraçãoe dividimos o temário em
vários tópicos a serem analisadospelos professoresque executa-
ram as tarefas de planejamento da pesquisa.aplicação e codifica-
ção dos questionários.
Obtidas as tabelas desejadas,o trabalho foi interrompido.
As razões são inúmeras e não há por que enumera-las. Quasetrês
anos depois, resolvi abrir as gavetas. Mas não dispunha de tempo
para trabalho analítico. Acreditando que algumasdas informa-
ções colhidas ainda poderão ser de utilidade, redigi o presente
relatório. Algo melhor continua. contudo. nos planos de alguns
professores que iniciaram o projeto. Especialmente a parte refe-
rente a atitudes políticas -- que. vale lembrar, ainda são dos

6
tempos do AI 5 -- deverá merecer um tratamento nos próximos
meses
Neste relatório, forneço exclusivamente os dados mais ele-
mentares sobre características sociais e económicas dos alunos,
bem como alguma coisa a respeito da imagem que o aluno formou
do curso e da profissão. Limitei-me a apresentaralgunsresultados
separando alunos por período, por sexo e, em alguns casos, por
tempo de curso. Creio que isto, para um começo, é suficiente.
Certo de que boa parte dos professorese especialmentedos
alunos desconhece algumas informações importantes sobre a com
posiçãocurricular e a contagem de créditos, incluí nesta Introdu-
çãoalgunsdados que me pareceraminteressantes,agregando tam-
bém informações sobre o número de alunos que se formam anual-
mente.
No decorrerda exposiçãolimitei-me a descreveros resul-
tados, ou simplesmente a apresenta-los em forma de tabelas
simplificadas.
Análises, conclusões e propostas, espero possam decor-
rer -- seguindoo projeto original -- de um trabalho coletivo de
reflexão. Sem esta esperança. eu não teria justificativa para
apresentar este relatório.
A última seção deste relatório (''Um depoimento coletivo:
falam os alunos'') apresentauma montagemfeita a partir de depoi-
mentos de alunos, colhidos em março de 1980 com auxílio de uma
equipe de estudantes do curso de Ciências Sociais.. Pensoque sua
leitura pode fornecer elementosaos quais não se teria acessoatra-
vésdo levantamentode 1977. Justifica-se
tambéma inclusãodes-
ta seção na medida em que ela pode, com as devidas restrições,
acrescentar informações atuais aos dados estatísticos de 1977. To-
das as demais seçõesdo presente relatório foram redigidas antes
do acesso a estes novos dados.

1 .2 -- A estrutura curricular

Funcionando em dois períodos -- o diurno com aulasdas 14


às 18 horas e o noturno com aulasdas 19 ài 23 horas -- o Curso de

.7
Ciências Sociais tem a mesma estrutura curricular tanto para os
alunos da tarde quanto para os da noite. Em quatro anos. con-
cluindo as disciplinas básicas e mais as optativas. o estudante
pode obter o bachareladoem CiênciasSociaise também sua li-
cenciatura pela Faculdade de Educação.
Anualmente.sãooferecidas 100 vagaspara o diurno e 100 pa-
ra o noturno.
As disciplinas obrigatórias a serem cumpridas nos dois pri-
meiros anos, cada uma com duração de um semestreletivo são:
Antropologia l e }l, Sociologia 1, 11e 111,CiênciasPolítica 1, 11e
111.Métodos e Técnicas de Pesquisa1, 11e lll, Introdução à Proba-
bilidade e à Estatística l e 11.GeografiaHumanaGeral e do Brasil,
História Económica, Política. Social, Geral e do Brasil. Introdu-
ção à Economia l e ll, Instituições Políticas Brasileiras,Estudo
de Problemas Brasileiros l e 11e Educação F ísica.
As disciplinas optativas são fornecidas pelas três áreasdo De-
partamento, Antropologia, Ciência Política e Sociologia,podendo
o aluno cursar.também disciplinas oferecidaspor outros Departa-
mentos. Atualmente (1980), as disciplinas optativas departamen-
tais, oferecidaspelas três áreasdo Departamento,sãoas seguintes:

Área de Antropologia

Antropologia do Brasil Urbano


Introdução à Arqueologia Brasileira
OrganizaçãoSocial da Tribo Bororo
Antropologia Económica
Antropologia e o Campesinato no Brasil
Introdução à Etnologia Brasileira
Antropologia da SociedadeMulti-Racial Brasileira
o Segmento Negro
O Homem Urbano
Liminaridade e Marginalidade

8
Área de Ciência Pol ítica

Problemas Pol éticosContemporâneos


Pensamento Pol ético Brasileiro
.Teoria Pol ética
Sistema de Relacões Internacionais
Desenvolvimento Pol ético na América Latina
Representação e Participação Política no Brasil
Instituições e Poder na Sociedade Civil
ParticipaçãoPolkica em Meio Urbano
Introdução à Ciência Pol ítica
Economia Política e Vida Política l
Economia Política e Vida Política ll
SistemasSimbólicos e Ideologia Política
Desenvolvimento Económico Brasileiro:
Aspectos Pol íticos

Área de Sociologia

Sociologia da Africa Negra


O Estudo de Caso na Sociologia
Metodologia das Ciências Sociais
Formação"e Desenvolvimento da Sociedade Brasileira
Sociologia da Sociedade Agrária
Formação da Sociedade de Classes
Introdução à Sociologiada Cultura Brasileira
Indústria Cultural e Ideologia
Magia, Estrutura Social e Personalidade
História do PensamentoSociológico
Sociedade Cultura e Personalidade: A Reprodução
Social
Teoria Sociológica
Educação e Ideologia
Planejamento e Desenvolvimento
Introdução à Sociologia do Conhecimento:
Estudo da ''lntelligentzia'' no Brasil

9
Estas disciplinas podem ser suprimidas do currículo, ofe-
recidas ou não em determinado semestre e acrescidas de outras.
Paraa matrícula em qualquer delas o aluno deve observaro siste-
ma de pré-requisitos e adequar-seao horário, não podendo, obvia-
mente. se inscrever em disciplinas dadas no mesmo horário. Cada
disciplina é sempre oferecida, no mesmo semestre,para os dois
turnos.
A seleção das optativas, com as duas ressalvasanteriores.
é de responsabilidadeúnica do aluno.. Não existe um plano para
a formação de sociólogo, antropólogo ou cientista político, po-
dendo o aluno compor seucurrículo como achar melhor.
Além das disciplinas básicas de Métodos e Técnicas e de uma
ou outra optativa, não são oferecidas disciplinas especialmente
voltadas para uma formação profissional que leve em conta a de;
manda possível de técnicos em pesquisa social. No entanto, um
grande número de disciplinas optativas prevêemem seuconteúdo
programático elementosque favorecema aquisiçãode conheci-
mentos técnicos. O curso não conta no momento com nenhum
programa de treinamento sistemático em pesquisa, embora alguns
alunos possam se engajar em pesquisas desenvolvidas pelos docen-
tes
No decorrer do curso, o aluno tende a voltar seu interesse
particularmente para uma das três áreasdo Departamento. Isto
não impede.contudo, que ele freqüêntedisciplinasfora de sua
área de preferência. Em 1977, segundo as declarações encontra-
das nos questionários, a preferência entre os alunos que já haviam
conclu ído as disciplinas básicas era a seguinte:

Área de Preferência % de alunos (*l


Antropologia 11,9
Ciência Pol ética 53.1
Sociologia 35.0

1*1 -- Excluídos os calouros.

10
1.3 -- A "Contabilidade'' acadêmica

Compondo seu currículo de disciplinas básicaslobrigató-


rias), disciplinas optativas e mais as pedagógicas,paraa licencia-
tura. o aluno deve manter uma ''contabilidade'' de créditos que
Ihe permita a conclusão do curso.
Um crédito correspondea 15 horas semestraisde trabalho
em disciplinas. Computando-se as 15 semanas regulamentarespor
semestre letivo, uma hora-aula semanal equivale a um crédito. Pa-
ra o baçharelado são necessários120 créditos (ou 1800 horas-aula)
e mail 32 cr)ditos (480 horas) ém'disciplinas pedagógicas para a
licenciàtm.
De acordocom a atual estruturacurricularos créditosde
bachareiado se dividem em:

68 créditos em disciplinas básicas e


52 créditos em disciplinas optativas

O ritmo que o aluno imprime ã sua obtençãode créditos


depende de sua disponibilidade de tempo para estudo e de motiva-
ções para a conclusão do curso.
Através de levantamento realizado anualmente pelaCOSEAS.
sabe-se que entre os alunos ingressantes na USP. aproximadamente
1/3 exerce alguma atividade remunerada. Esta proporçãotem se
mantido praticamente constante desde 1970 para o conjunto da
Universidade(Cf. C/éncü e Cu/fura. v. 31 (4) : 434):
Para os alunos de Ciências Sociais. essaproporção éde 43,9%
entre os calouros. Entre alunos que já cumpriram pelomenos2/3
dos créditos 69,4% trabalham. Entre os que estão se formando,
esta taxa sobe para 75,9%. Certamente. este fator interfere no rit-
mo do cu rso.
Levando em conta que,,o-número máximo possívelde crédi-
tos por ano é da ordem deG4Ç)P(consideradçig..4.c(éditos oor dia),
podemos ter uma idéia bastante aproximada do ritmo do aluno na
obtenção de créditos, conforme mostra a Tabela 1. Verifica-se que
nos anos mais recentes. tem aumentado a lentidão no cumprimen'
to do número máximo de créditos possíveis,ou seja,a taxa dos
TABELA 1 -- Porcentagem de alunos ''retardatários'
porano de ingresso.

% de alunos com número


ANO DEINGRESSO de créditos inferior ao
número máximo previsto

]977
1976 36,2
1975 36,7
1974 25,7
1973 20,0
1972 10,0
1971 l0,5
1970 11,8
ou antes

alunos que não atingiram o mínimo de créditos parase formar em


quatro anos vem aumentando consideravelmente. de tal sorte que
o contingente dos que ''devem créditos'' tende a aumentar a popu'
laçãode alunos. Do ponto de vista do atendimento dessademanda
por parte do Departamento não se coloca nenhum problema signi-
ficativo, pois estesalunos ''retardatários'' se distribuem pelosdife-
rentes cursos optativos sem acarretar congestionamentodas tur-
mas. Por outro lado, é preocupante tal tendência na medida em
que esseretarda pode significar duascoisas:ou o aluno não tem de
fato condições económicas de se formar nos quatro anos previstos,
ou não encontra motivações para tal esforço. Essas motivações,
de ordens múltiplas, devem estar associadasao caráter não profis-
sionalizante do curso de Ciências Sociais. Assim, não haveria pres-
sa em concluir o curso , uma vez que com ele não se cumpre uma
etapa claramente definida na colocação dos formados no mercado
de trabalho. Na verdade. dos alunos regularmente matriculados
em 1977, 20%já tinham outro t(tufo universitárioou estavamfre-
quentando outro curso superior.

12
Em termos da legislaçãovigente. o aluno pode cumprir um
mínimo de 12 créditos por semestree um máximo de 20. Isto
situa o tempo hábil de realizaçãodo curso entre 4 e 5 anospara o
bacharelado,tempo que pode ser estendido para 10 anos.
A partir do segundo ano, o aluno pode transferir-se de um
turno para outro. Os dados disponíveis mostram uma maior con-
centração no turno da noite, que tem contado com aproximada-
mente 500 alunos contra 350 no diurno nos últimos 6 anos. Es-
tes números,confrontados com aquelesapresentadosna Tabela l,
levantam a suposição de que a maior incidência de evasãose daria
nos dois primeiros anos, passandoos retardatários a ocupar o lugar
deixado pelos que abandonam o curso.
C)s números de bacharéis formados nos últimos anos estão
dados na Tabela 2.

TABELA 2 Bacharéis em Ciências Sociais formados nos


últimos anos

em relação ao número
de vagas

1978
1977 41,0
1976 32,0
1975 53,5
1974 47,5
1973 75,0
]972 44,0

FONTE FFLCH-USP, Expediente de Ensino

Vê-seque o número de alunos que chegam a se formar varia


bastante,situando-seem torno de 1/3 em relaçãoàs vagas(100 pa-

13
ra cadaturno) nos últimos 3 anos. Em relaçãoa 1968o número
de alunos novos admitidos foi bem maior do que este número de
vagas. É possível que isto explique parcialmente astaxas mais ele-
vadas observadas para o período de 1973 a 1975. Em relação aos
demais cursos mantidos pela Faculdade de Filosofia, o Curso de
Ciências Sociais se situa entre os que apresentam menores taxas de
desistência.
A Tabela 3 fornece as evidências deste fato. Para efeito de
cálculo, tomaram-se os dados referentes aos anos de 1975 a 1978
operando-se com as médias destes anos para se evitar efeitos de
flutuações provocados por inúmeros fatores. Note-seque Geogra-
fia é o curso que forma mais alunos em relação aos que ingressam.
Segue-se Ciências Sociais com 5% acima da média para toda a
Faculdadede Filosofia, cujo índice é próximo a 35%.

14
0
=
Õ
Q.
m
I's 8
©
Ê
a) .
- 8 g
uü E
'B c
a.o
'D 0 0
Eo
'+' CD 0 0
'D
m 0 J0
.c: C 0
Q Q. E
m
C 0
0
Q Õ
0
'0
'D
'D
0 0
8
C
< 0 0 ê
g
.Q
.J
0 a
'D
a a. 8
< X 0 0
LU
h- '0
E
H 8
a.
cn 0 'D
®
D '0
l 0
0
J E B
LL E
LL C
0
LU l
F
Z
0 l
15
2 CARACTERÍSTICAS GERAIS DOS ALUNOS

Embora o curso noturno tenha as mesmascaracterísticas que


o diurno -- quanto ao númerode créditos, estruturacurricular.
corpo docente, etc. -- há uma suspeita generalizadaentre os pro
fessores.e mesmo entre alunos, de que a clientela do noturno seria
sensivelmentediferente da do diurno. Pensa-se,inclusive, que se-
ria adequado modificar o curso noturRO de modo a atender a es-
pecificidade de sua clientela. Diante desta preocupação,um con-
junto de tabelas foi preparado para permitir tal comparação.
Igualmente, privilegiou-se a comparação segundo três outros ti-
pos de agrupamentos: por sexo, separando-se os casados dos sol-
teiros, e de acordo com a situação do aluno estar ou não traba-
lhando. e finalmente de acordo com a situação do aluno quanto ao
número de créditos já obtidos. Esta última variável está montada
da seguinte forma: calouros, alunos que já completaram 2/3 dos
créditos (intermediários) e alunos já em fase de conclusão do cur-
so (concluintes). .Aão.çjnco, portanto, as variáveis.domadas como
classificatõriaspara efeito deste relatei:io:período (ou turno), se-
xo e estadoconjugal, trabalho ou não e tempo de curso..' Esta
última variável é importante na medida em que ela discrimina alu-
nos em diferentes etapas da carreira acadêmica. Por um lado, ela
é indicadora do grau de exposição do aluno ao curso, exposição
que pode se dar através da assimilação de conteúdos da ciência
social, da leitura, da aprendizagem do trabalho intelectual, da con-
vivência universitária. Por'outro. ela está associadaà própria tra-
jetória do aluno fora da Universidade!.em'tubo aquilo que se re-
laciona com a muda;;Õà'da'papétGaféitaà idade e formação profis-
sional. Evidentemente,não há como isolar, entre estesdois con-
juntos de fatores, o mais importante.

17
2.1 . -- Diurno persas noturno

Observando os dados da Tabela 4, notam-se algumas diferen-


ças que podem ser sumariadas. As característicasque aparecem
como melhores discriminantes são:
sexo, com predomínio maior de homens no curso notur-
no(41 ,4%contra 25,4 no diurno);
exercício de atividade remunerada. Enquanto que 77.0%
dos alunos do noturno exercem alguma atividade remune-
rada,estataxa é de 42.7 no período vespertino.

TABELA4 Algumas características, por período e para o total

Período

Carácter ísticas Diurna Noturno Total


(213)* (266) (479)

%odeâlunosdo
sexo masculino

dade média

% de alunos que
trabalham

%ode alunos casados

go de alunos casados
com cônjuges estu-
dantes

% de alunos que
fizeram madureza
ou supletivo

% de alunos que curvam


ou jcompletaram
outro curso su perior

% de alunos que
dispõem de carro
para vir à escola

Número base das percentagens. Paraalgumas características este número


pode ser um pouco menor, por exclusão de casossem respostas.

18
Para as demais variáveis arroladas. as diferenças são pouco
significativas, embora aquelas que mostraram diferenças mais
relevantes são bastante importantes na caracterização de uma
clientela algo diferente no curso noturno, já que ó fato do aluno
trabalhar interfere fortemente no seu desempenho acadêmico,
restringido que fica o tempo disponível para dedicação aos estu
dos
O fato do aluno trabalhar ou não, entretanto, não diz tudo a
respeito dessadisponibilidade. A Tabela 5 mostra que há grande
variaçãono númerode horasque o aluno gastacom o trabalho.
Pode-severificar que o número de horasgastocom o trabalho é
proporcionalmente maior entre os alunos do curso noturno.

TABELA5 Horas semanaisde trabalho, por período

HORAS SEMANAIS Período


DETRABALHO Diurno Noturno

Não trabalham 22,9


até 12 horas 13,9
de 13 a 25 horas l0,9
de 26 a 38 horas 16,5
39 horas ou mais 35,8
TOTAL 100,0% 100.0%
(213) (266)

De fato, entre os que trabalham, 52,3% dos alunos do notur-


no o fazem mais do que 26 horas por semana,enquanto que essa
taxa entre os do diurno é de l0,3, ou seja a proporção no noturno
é cinco vezesmaior que a observada para os discentesda tarde.
Mais adiante mostraremos dados a respeito das atividades desenvol-

19
vidas pelos alunos. No momento, vale ressaltarque, de acordo
com a Tabela 4, 20,1 % dos alunos de CiênciasSociais concluíram
ou estão frequentando um outro curso universitário. Entre os
casados,43,5% têm conjuges que continuam estudando com maior
percentagemno noturno. 30,0% dispõe de carro para virem à es-
cola e apenas10,0% dos alunos completaram o curso médio pelo
sistema de madureza ou supletivo.

2.2 Diferenças por sexo e estado conjugal

No que diz respeito a características económicas do aluno.


fica bastante claro que o sexo e o estado conjugal mostram-se
como fatores fortemente associadosa certas característicasde in.
11 teresse, conforme indica a Tabela 6.
Entre os homens casados,apenas7,9% frequentam o vesper
tino, enquanto que esta taxa para os solteirosé 5 vezesmaior.
Entre as mulheres, estadiferença é pequena.
Outro dado interessante é que no grupo das mulheres casadas
97,0% dos cônjuges trabalham regularmente. Quando se trata de
homens casados, apenas metade de suas mulheres têm emprego
Ê regular.
Isto mostra que os encargosfinanceiros dos alunos masculi-
nos são maiores que os dos alunos femininos.
f
11 Nos grupos dos solteiros, homens e mulheres, essasdispari-
dades não são assim acentuadas.
Note-se que o estado conjugal, tanto para alunos como alunas.
discrimina fortemente a disponibilidade de carro para uso pró-
prio. Os casados, de ambos os sexos, apresentam taxas de posse
ou uso de carro duas vezesmaiores que os solteiros.
A maior taxa de emprego se apresenta para os alunos casados
92.1% e a menor para as alunas solteiras.
Em resumo, pode-se inferir que o aluno casado está propenso
por seus encargos familiares e ocupacionais, a enfrentar maiores

20
dificuldades para dispor de tempo de dedicação ao curso. No
con)unto estudado, eles representam.no entando, apenas8.1%do
total de alunos, enquanto as alunas solteiras somam 51,1%, ou se
ja, pouco mais que a metade do corpo discente.
No conjunto, os homens trabalham mais horas semanaisque
as mulheres,sendo a taxa de tempo integral 18 horas por dia)
igual a 49,1% para os alunos e 30,2% para as mulheres.

TABELA 6 Características segundo sexo e estado conjugal (* )

Homens Mulheres

Caracte rística Solteiros l Casados Solteiras i Casadas


(124) 1 (38) (240) 1 (68)
á no período
diurno

que trabalham
de cônjuges
estudantes

% de cônjuges
com trabalho
regular

% dos que dis-


põem de carro
% de alunos que
frequentam ou
conclu eram
cu rso superior

( ') Por sua reduzida participaçâb no conjunto dos alunos. foram elimi-
nados das tabelas uns poucos casos de desquitados ou separados. Os
alunos que voltaram a se unir conjugatmente. foram juntados na
categoria dos casados. Aqueles excluídos quando se dá a distribui-
çãopor estadoconjugalforam. no entanto.incluídos no total. Pa-
ra efeito da pesquisa o estado conjugal não é necessariamente sina
nimo de estado civil

21
Outra informação interessante é que 85,5% das mulheres
casadastêm cônjuges com curso superior, enquanto que entre os
homens esta taxa é de 59,0%. Ainda mais, 50,0% dos conjuges
dos alunos continuam estudando, contra 40,3% para o grupo das
alunas, donde se supõe que, a curto prazo, as taxas de endogomia
quanto à formação superior tendem a se equiparar para ambos
os sexos, cabendo, no momento, maior empenho dos homens
na manutenção da família. O efeito desta situação pode ser ava-
liado pelo tempo de ''retardo'' na obtenção dos créditos, que para
os homens casadosé maior que o observado para o total dos alu-
nos. Igualmente. a aluna casada leva mais tempo para a obtenção
de créditos que a aluna solteira. No conjunto de alunos, as percen-
tagensdaqueles que ingressaramantes de 1972 e que, portanto,
já poderiam ter conclu ído o curso são as seguintes:

GRUPO % de "atrasados'

homens solteiros .
8.9
homens casados .
36,8
mulheres solteiras 7.1
mulheres casadas
16,6

No total de alunos 11.4

2.3. -- Calouros e veteranos

O tempo de curso está associadopositivamentecom algumas


variáveis indicativas da trajetória social dos alunos, ou seja. a fre-
quência à Universidade não impede que eventos socialmente asso-
ciados à idade apareçam claramente nos resultados.
À medida que os anos de estudo aumentam. crescem as ta-
xas de participação em atividades remuneradas, crescem as horas
semanais dedicadas ao trabalho, aumenta a porcentagem de alu-
nos casados, cresce o rendimento médio do trabalho. aumenta o
número de filhos.

22
Um dado interessante diz respeito à origem escolar do aluno
Entre os calouros, a porcentagem dos que frequentaram escola
secundáriaprivada mais curtinho preparatório para vestibular é
maior que a encontrada entre alunos na fase intermediária e mais
ainda entre aquelesque estãoconcluindo o curso.

2.4 -- Trabalho

O exercício de atividades remuneradasse verifica em 62.2%


dos alunos, sendo mais frequente para os alunos do noturno
177.0%) do que para os do diurno (42,7%)f Igualmente. os
homens trabalham proporcionalmente mais que as mulheres
167,7% e 58.4%, respectivamente).
No seu conjunto, 20,1% dos alunos são funcionários públi-
cos, 66,4% são assalariadosregularesem empresasprivadas e ou-
tros 1 1,7% trabalham esporadicamente em atividades diversas sem
vínculo empregatfcío. 1,7% são proprietários de pequenasempre-
sas. Os ramos predominantesde atividade são a administração
pública (15.9%) e o setor bancário (15,5%).
A Tabela 7 mostra que a ocupação predominante é o empre-
go de escritório (45,9%), seguidode técnicos assalariados(34.5%).
Apenas um décimo dos alunos que trabalham é constituído de
professores ou pequenos intelectuais assalariados {jornalistas, re-
datores. publicitários. etc.).
Separando-se por sexo, pode-se ver que as ocupações de es-
critórios estão mais presentesno grupo feminino (52.2% contra
36,0%), somando pouco mais de 10.0% os alunos masculinoscom
empregos de gerência ou de profissão liberal, tax8 esta que para as
mulheres está próxima de zero.
A comparaçãoentre as distribuições do diurno e do noturno
mostra diferençasbem marcantes. O aluno do noturno tem sua
ocupação mais concentrada em atividades de escritório (52.7%).
enquanto que a atividade predominante no grupo do diurno apa-
rece sob a rubrica de técnicos diversos (57.1%).

23
Os homens recebem por seu trabalho mais que as mulheres
conforme indicam os dados a seguir:

Homens Mulheres

Rendimento mensal mediano .Cr$ 3.900.00 Cr$ 2.100,00


% abaixo de Cr$ 2.000.00 mensais 23.5% 33,5%

% acima de Cr% 10.000.00 mensais 19,1 3,8%

(Ob$.:Aos preços de março de 1 977)

TABELA 7 Ocupação dos alunos, por sexo e turno, separadamente

Sexo Turno
OCUPAÇÃO Diurno l Noturno
Masculino Feminino TOTAL

Gerentes de
empresa 7,9 0,5 ],1 4,4 3,4

Altos fun-
cionários 2,6 0,5 - 2,0 1,4

Profissão-
naif liberais 3,5 - - 2,0 1.4

Professores
e intelec-
tuais 14,0 6,6 6,6 10,7 9,5

Técnicos as-
salariados 29,8 37.4 57,1 24,4 34.5

Pequenos
proprietá-
rios

Empregados
de escritório

Outros

TOTAL l oo.o% 100.0e 100,0g


l (114) (182) '$'Í'" { 205) '.go9'gf

- 24
T

3- DADOSSOBREAORIGEMSOCIAL

Os alunos de Ciências Sociais são, em sua maioria, nascidos


na cidade de São Paulo (60,0%j ou outras cidades do Estado
122,7%). 12,4% são originários de outros Estadose os restantes
5,4% de outros países. No entanto, apenas25 % dos não nascidos
na cidade de São Paulo aqui residem há menos de 8 anos. É de
se supor que o número de alunos que tenham se mudado para a
Capital especialmente para cursar Ciências Sociais seja insignifi-
cante. No conjunto, 31,9% dos alunos não nascidosna Capital
aqui residemhá maisde 16 anos.
Predominantemente. os alunos são originários de camadas
sociais médias, com menor proporção de casos com origem em es-
tratos sociais mais elevados ou inferiores.: Isto pode ser confirma-
do com base nos dados da Tabela 8. Em resumo, pode-sever que
25,1% vêm de famílias de sfafus elevados (pais grandesproprietá.
rios de empresae altosfuncionários),11,2%têm origemproletá-
ria str/ófu senso, 7,7%dos paissão trabalhadores artesanais:autóno-
mos. NÓ espaço intermediário do gradiente têm destaqueos pe-
quenos proprietários (22,8%) e a classe média intelectual com uma
participação em torno de 20 %.
Outros dados fornecem as seguintes proporções referentesà
posição na ocupação dos pais dos alunos:

funcionários públicos 17,8%


assalariados de empresas 32,3%
trabalhadores autónomos 23,9%
pequenos empresários (até 10 empregados) . lo.1%
empresários médios (de 1 1 a 50 empregados) 6,7%
grandes empresários(mais de 50 empregadosl 5,0%

25
TABELA8 C)cupação dos pais dos alunos, por período

Período
Ocupação do pa Diurno soturno Total

Grandes proprietários 15,0 9,8 12,1

Gerentes de empresa 11,3 6,8 8B

Altos funcionários 5,2 3,4 4,2

Profissionais liberais 16,4 9,8 12,7

Professores e intelectuais 8,0 3,4 5,4

Teénicos especializados 0,9 2,6 1,9

Pequenos proprietários 19,2 25.6 22,8

Empregados de
escritório 6,1 9,8 8,1

Artesãos autónomos 4,7 l0.2 '7,7

Operários qualificados 6,6 8,6 7,7

Operários não qualifi


cados 1.4 5,3 3.5

Outras

TOTAL 100.o.% 100,o% 100.o%


[213} (266) (479)

A Tabela 8 indica também que a origem social dos alunos


do curso noturno tende a ser mais modesta do que a dos alunos
do diurno. Note que, observando-sea tabela de cima para baixo,
as frequências nas ocupações de maior slaíus são maiores para os
alunosdo curso diurno até a categoriade professorese inte-
lectuais, invertendo-se a tendência daf para baixo.
Outro dado que procura informar sobrea origemsocial do
aluno é a instrucão dos pais, conforme a Tabela 9.

26
c> aZ q. aQ tQ «
. tq cq «. a! ®
F r» p vn p cv)
0
'0
Q
Q.
o cl cu. r". cl q
Õ
-:' 8 R = 8 9
Q.
&
Q
''a
=
8
e
<
..J
a
<
b-
Q
:l l l } ,
27
No conjunto, é bastante elevadaa proporção de pais e mães
com instrução superior (33,9% e 14,4%, respectivamente). tenden-
do os pais a apresentarem níveis mais elevadosque as mães. Quan-
do se comparam os turnos, as conclusões apontadas pela ocupação
do pai são bastante reforçadas, originários que são os alunos da
tarde de famílias com n íveis de instrução mais elevados.
Com respeito à instrução dos avós, os dados mostraram que
em 17.8% dos casos pelo menos um dos avós teve instrução su-
perior. Para o noturno esta taxa foi de 13.9% e de 22,6% para o
diurno.
Reforçando as conclusões quanto a diferenciação dos alunos
dos dois períodos, a renda mensal familiar do aluno. distribui-se
também de forma diferenciada. conforme mostram os dados se-
guintes:

% de famílias Diurno Noturno

com rendainferior a Cr$ 6.000,00 11,1 21,1

com rendasuperiora Cr$ 30.000.00 27.0 8,7

Na mesma direção. 52.6% dos alunos da tarde cursaramo se-


cundário em escolas particulares. contra 24.2% dos alunos da noite.
A comparação entre calouros, alunos em fase intermediá-
ria e concluintes não mostrou diferençasque merecessemregistro.

28
4 AVALIAÇÕESEEXPECTATIVAS

A quase totalidade dos alunos (97.5%) declarou que Ciências


Sociaisfoi sua primeira opção no vestibular. sem nenhuma varia-
ção entre os períodos,sexose tempo de curso. No entanto,se
fossem recomeçar. 20,7% prefeririam um outro curso. Entre os
calouros, apenas 7,4% estariam dispostos a ingressarem outro
curso. Dos que estão se formando, encontramos 21.9% nesta
situação.
Um dado muito significativo a respeitoda opção pelo curso
de Ciências Sociais está certamente associado ao prometo profissio-
nal do aluno. A Tabela 10 mostra que quasemetade(47,1%) não
pensou em emprego ao ingressar. Outros 1 8,3% encararam o curso
como oportunidade de melhorar seus conhecimentos gerais, en-
contrar subsídios para uma outra profissão já em exercício ou em
formação. Somente 5,8% pensaramem trabalhar como cientistas
sociais em empresasprivadas, o que somados aos 12,4 que tinham
em menteum empregoem Órgãogovernamental,dá uma taxa de
18.2% de alunos com a expectativa de virem a trabalhar como
cientistas sociais. Restam 16,4% com aspiraçõespara o magistério
As diferenças por período, sexo e tempo de curso são pouco signi-
ficativas.
Na verdade 20,2% dos alunos declararam-seformados ou em
formação em outros cursos de nível superior. Este tipo de aluno
foi mais encontrado entre os homens (26.2% contra 16,9%) e en-
tre os alunos do noturno (22.6% contra 17,1%). O tempo de
curso fornece dados muito sugestivosa este respeito. pois as per-
centagensde alunos com outro curso concluído ou em conclusão
sao

29
T
g
0
0
0
0
e
3
Q
0
C
0
0
''0
a>
'a
0
Q.
E
UJ
0
0
< '0
J 0 8
.a)
0 0
m 'D
<
}- <
>
30
T'

calou ros . 31,0%


intermediários 19,0%
concluintes 10,1%

Parece que, cada vez mais, Ciências Sociais tende a se tornar


um curso con?p/e/narrar. A própria avaliaçãoque os alunos
fazem das oportunidades de trabalho do cientista social pare
ce bastante realista (Tabela l l).
Os dados mostrados na Tabela 12. são bastante coerentes
com os resultadosanteriores. Quando perguntadossobrequal
deveria ser a orientação ideal do curso apenas5,1% optaram pela
alternativa ''formação profissional''. A maior porcentagem apa-
rece para ''informação teórica", com 71,5%. A espectativa de
formação, visando a participação política é de 14,8%, embora
esta alternativa possa estar já contida em formação teórica. Ape
nas 6,3% gostariam que o curso fornecesseprimordialmente infor-
mações gerais sobre a sociedade brasileira. Note-se que o interes-
se na formação profissional, embora pequenano conjunto, cresce
com o tempo de curso, como provável consequênciadas preocupa-
çõesdos alunos que em meio ou fim de curso ainda não encontra-
ram algum meio de sobrevivência que considere adequado.
Ao avaliarema or/enfaçâbafia/ do curso, 77,0% indicaram
a prevalênciada formação teórica, contra 4,2% de formaçãotécni-
ca (Tabela 13). Apenas 18,8% dos alunos responderamque o
curso fornece predominantemente visão crítica da realidadebra-
sileira.
No conjunto, os alunos tendem a valorizar fortemente o
curso de Ciências Sociais, tanto quando se pede para compara-lo
com outros cursos da USP, como quando a comparaçãoé feita
entre o curso que frequentam e outros cursos de CiênciasSociais
existentes(Tabelas14 e 15).
Metade dos alunos gostaria que se melhorassea formação
teórica e também a técnica (Tabela 16). 25,6% gostariam que se
mantivesseo nível de formação teórica, com aumento da forma-
ção técnica.

31
ê

g
g
3
8
a)
''D
0
g
C
0
0
®
g
0
0
ã
'D
â
a)
.Q
0
0
0
C
a.
0
Q.
0
ê
Z C
8
0
=
m
Õ
g
=
U
X
LU
0
3
0
'0

0
0
0
8
g
C
a)
0 g
]
a)
.Q
0
C
Q.
0
<
.J
<
}-
l ll
34-
0
®
a>
E
0
0
3
©
a.
0
a
0
'D
0
'D
®
'D
H
q)
>
0
0
C
D
©
8 C
a>
D
8 8
'0 0 CW
Q
® 0 0
Q
C
0
=
Õ
a)
'Q
0 0
=
0
'D
©
©
>
<
<
.J
a
<
h-
!
3
C 0
0
2
0a)
-35
0C
3
0
0
g
Q)
E
In -
Q a.
'D n
.0
0
0
'D
Q
€a
>
<
.J
®
<
}-
36
8
=
0
©
0
0
0
'Q
3
X
g
3
0
0
e
0
E
ã
g
.g
0
<
<
.J
a
<
}-
- 37
5- O CURSOEACARREIRA

Conquanto alguns problemas referentes ao Curso de Ciên-


cias Social da USP e à carreira profissional dos alunos por ele
formados tenham já sido tratados anteriormente, reserveipara es-
te capítulo a discussãode alguns problemas que merecessematen-
ção destacada. Inicialmente se tratará do problema da põs-gradua-
ção, entendida como continuidade do curso de graduação. Em se-
guida, procuro fazer uma avaliação -- do meu ponto de vista -- de
problemas relativos ao curso e à ciência social, para finalmente
apresentar uma avaliação preparada, no início deste ano, por um
conjunto de alunos.

5.1 . -- A formação incompleta

A "aceitação'' por parte do aluno de fracas possibilidades de


preparo profissional, o caráter de curso complementar na formação
profissional e a baixa expectativa de escolarizaçãovoltada para o
exercício intelectual remetem o prometode vida do aluno para
além da graduação, esperando uma continuidade na pós-gradua-
ção uma vez que o curso não se conclui como um pro/eto acabado.
Como mostra a Tabela 17, apenas 1 1 ,3% dos veteranos decla-
raram não pretender cursar a pós-graduaçãoe 22,6% ainda não sa-
bem se cursariam ou não. Para o total dos que estariam decididos
a cursos de pós-graduação, temos (excluídos os calouros) :

39
ÇD - a) o Ln (D (D
" 8 ! " ! = 8
8 q' c') tr) r"' (D G) LÍ)
=
b cq LÓ + r- (o Ln
0
8 CN CD o q' co (o rb
0 - ! ! " ! ' 8
'0
b
3
X
LU r- r<. r\ C) F'- o ('q
0 "' 2 : - R = R
g
3
'D
j
r'- r r- {o q- a> c)
" 8 = = : '' R
.0
8
3
a>
'D
0
c:
a.
I'x ' . o
<
.J
a
<
h
40
1%l (Número al)soluto)

Em Sociologia . 26,1 54

em Antropologia 6,8 14
em Ciência Pol ética 30,9 64
em outra área 7,7 17

a decidir em que área 28,5 59

TOTAL 100,0 207

Isto indica que o mestrado tende a ser visto como uma espé
cie de prolongamento ''natural" do curso de bacharelado,como o
doutorado em relação ao mestrado, fato suficiente para se pensar
numa política de pós-graduação bastante di.ferente daquela h.oje
praticada na Faculdade de Filosofia. Atualmente. o pós-graduan
do se inscreve somente após ser aceito por um professor orienta-
dor. Cada professor-orientador, por recomendação do MEC, so-
mente pode orientar cinco candidados,os quais, por sua vez,
'ocuparão'' a vaga por cinco ou seteanosantes de concluir o mes
tudo, o que provocaum total congestionamento
no fluxo de
alunos.
O Departamento de Ciências Sociais conta hoje com 33 pro-
fessores-orientadores, oque equivale a 165 vagaspara mestrado e que
somente são abertas quando os alunos inscritos obtêm o título de
mestre, ou quando são desligados. Considerando-se a média oti-
mista de 5 anos por aluno (o prazo máximo é de 7 anos), haveria
uma oferta de 33 vagasanuais nas três áreas,o que na prática não
acontece. pois o Departamento só regularizará seu fluxo dentro
de 4 ou 5 anos, uma vez que há casosremanescentesda orienta-
ção anterior, segundo a qual cada professor podia receber 12 orien-
tandos, ou mais em situações especiais.
Supondo a média otimista de novas 33 vagasanuais para o
mestrado, ainda assimseria impossívelatender as necessidades do
Departamento que somente entre os seus alunos graduadosa cada
ano contaria com a demanda de 51 alunos potencialmente interes-
sados. A estes deve-se acrescentar os candidatos formados pela

41
USP nos anos anteriores e os provenientesde outras instituições
de São Pautae outros Estadosincluindo os que parao Departa
mento se dirigem através do plano PICD do MEC.
O Curso de Pós-Graduaçãoem Ciências Sociais titulou. desde
1971 (ano de sua implantação) até 1979, 1 18 mestrese 33 douto-
res e estai.com suas vagas praticamente cotadas, prevendo-se para o
próximo ano a abertura de 15 a 20 vagas-- uma estimativa calcula-
da na base do ''máximo otimismo'
Assim. o aluno que -- por decorrênciada própria incapacida-
de do curso de bacharelado ser concluído como prometo acaba-
do -- vai mais uma vez se depararcom o problema que o vem per-
seguindo desde sempre: falta de vagas,embora possa contar com
os cursos da UNICAMP e da PUC-SP,sendoque nestaúltima, que
abre em média 30 vagas por ano, através de concurso vestibular,
o custo das mensalidadesé extremamente elevado para a maioria
dos interessados.
Diante disto tudo, creio ser de extrema urgência repen-
sar -- mais uma vez, por que não? -- o próprio curso de graduação.
Aliás, este não é, certamente. um problema exclusivo da USP.
Há duas maneiras iniciais de se encarar a questão. Apr/me/ra,
dar por certo que o curso de CiênciasSociais não visa à formação
para atuação profissional e que, portanto, sua função estaria res-
trita ao fornecimento de ''cultura geral'', como curso de formação
intelectualcomplementar. É, se não a verdadeira,por certo a
alternativa mais cómoda. Como consequênciadela, corre-seo ris-
co de abandonar ó curso à passividadeconservadora. A oposição
a este tipo de passividadese faria internamente no conteúdo pro-
gramático das ''disciplinas críticas'', sem que o curso, como um
todo, tivessequalquerobjetivo geralde atingir um ou maisfins
explicitamente postos, que não a vaga intenção da formação em
aberto, e de responsabilidade individual dos alunos que compõem
seu currículo, ao se inscreverem nesta ou naquela disciplina opta-
tiva. A segunda. implicaria a definição de objetivos específicos,
com a necessáriaapresentaçãode opções bem definidas e organi-
camente planejadas,de modo que, ao final do 2o ano, o aluno já
pudesseter idéia das diferentes alternativas de trabalho e também
de direcionamento teórico-intelectual. Poderia se atender. portan-

42
to, àquelesque pretendemtrabalhar como cientistassociaise os
que procurará no curso complementação para sua formação profis-
sional paralela (obtida através de outros cursos), ou simplesmente
aprimoramento intelectual genérico não voltado especificamente
para o mercado de trabalho, mas para outras atividades de caráter
social que não visam necessariamente a ocupação remunerada, sem
contudo deixarem de ter importância social.
Nos últimos anos, os alunos saídos dos cursos de Ciências
Sociais, e que quiseram e lograram trabalhar na área de formação
vêm atuando em três carreiras principais:
1) como professor de ensino médio e superior,
2) como técnico de pesquisasocial e
3) como pesquisadorcientífico.
Vejamos,no entanto, como estas três carreirasna verdade
se integram e dependem. no nível de formação especializada. da
própria concepção que se faz da sociologia, da antropologia e
da ciência política. tal como são ensinadas na Universidade e tal
como, enquanto ciências, se desenvolvem a partir da postura de
seus profissionais perante elas mesmas.
A reforma do ensino de lç e 29 graus limitou a já então pre-
cária participação dos licenciados como professoresdo ensino mé-
dio. O ensino Normal (hoje denominado Habilitação Especí-
fica para o Exercício do Magistério), que durante muitos anosse
constituiu em uma das peçasmais importantes da estrutura educa-
cional no Brasil. consistia,basicamente,o núcleo central de atua-
ção do cientista social, como professor de sociologia geral e so-
ciologia educacional. A redução da importância daquele curso na
cstrutura do ensino e mais a introdução no ensino médio da dis-
ciplina Estudos Sociais-- fusão retrógrada. que, incapaz de realizar
a síntese do conhecimento, se compraz em lançar ao olvido os
avançosdo conhecimento especializado-- reduziu, em termos re-
lativos de oferta e procura, as oportunidades do cientista social no
mercado de trabalho como professor de sociologia. Do mesmo
modo, como contrapartida qualitativa do processoem geral provo-
cado por essamudanças, deu-se o aviltamento da sociologia como
componente curricular capaz de oferecer alcanceintelectual o/lgá-
r7üo ao conjunto do conteúdo programático voltado para o aluno

43
r

em fase fundamental de sua formação como estudante e como ci


dadão.
Quero dizer com isto que. usandouma frase infelizmente já
corrente, ''o professor não se dá mais o devido respeito'', ou seja.
as más condições de trabalho e os rebaixados níveis de remunera-
ção, aliados à descrença no próprio ensino, fazem da carreira do
magistério secundário uma forma de soóreL'/ü'er,mas não um modo
de p'/da. E, justamente para sobreviver, os licenciados saídos de
um curso de CiênciasSociais, por dificuldade de encontrar empre-
go de professor de Sociologia, passama lecionar disciplinas fora de
sua especialidade,notadamente História, Geografiae EstudosSo
dais. Sem mercado de trabalho situa-se. na maioria dos casos,nas
regiões periféricas do ensino de 2ç) grau: cursinhos pré-vestibulares,
supletivos e congêneres,uma vez que nem na rede oficial de ensino
podem atuar, pois, para as matérias curriculares de maior demanda
o sociólogo não obtém o indispensável registro fornecido pelo
MEC
Para trabalhar como docente no ensino superior, a graduação,

11 cadavez mais. é insuficiente e se impõe um novo e árduo empre-


endimento: a pós-graduação. Masesta está reservadaa poucos pri-
vilegiados, forçados que são os programasde mestrado ase-
lecionar -- falo em tese -- apenas e tão somente ''os melhores".
A escassez
de vagasnão permite que se aceite o graduadoque,
por muitas razões, somente após passar pelo bacharelado terá con-
dições de demonstrar seu talento e capacidadede se transformar
em um pesquisador científico competente. Cortam-se, assim. pela
raiz, potencialidades merecedoras de atenção especial.
A pesquisacientífica é o pressupostoda pós-graduação. Sem
o aprendizadode sua prática qualquer projeto de trabalho no en
sino superior será frustrado e frustrante. Nesteponto, o ens/no
como profissão está decisivamente vincu lado à pesou/sac/enr/'/?ca
também como profissão. Referindo-seàs três oportunidades de
trabalho apontadas atrás. o Professor Florestan Fernandes já afir-
mava em 1956: '' : . . nenhum desses três papéis é capaz de ofere
cer à sociologia, como especialidade,uma posição inalterável no
sistema de ocupações. Por sua própria natureza, são papéissociais

44
r'
dependentes . . . '' (Florestan Fernandes -- .4 soc/o/og/a /}o Bus//
Petrópolis, Vozes, 1977, p. 39)
O pesquisador científico poderá encontrar emprego em
instiuições científicas extra-acadêmicas, que, no entanto, além
de serem poucas, acabam por exigir do pesquisador titulação
acadêmica. Esta exigência se explica, em parte, pela condição
financeira deste tipo de instituição, que dependede dotações de
verbas por parte de agências financiadoras, as quais, via de regra,
levam em consideração os títulos dos pesquisadores. Outra estra-
tégia desses centros não universitários de pesquisa consiste em
agregar pesquisadores bolsistas. Por sua vez, é requisito impera
tivo para se candidatar a uma bolsa de estudos ou pesquisaa fre-
quência a cursos de mestrado e doutorado.
Em terceiro lugar, cumpre destacar a profissão do fécn/co.
A maioria das agênciasgovernamentais, muitos dos institutos pri
vados de planejamento e empresas de pesquisa de mercado necessi
tâm de técnicos formados em CiênciasSociais,embora aí também
a demanda seja muito inferior à oferta. O que faz este profissio-
nal? Opera com dados, planeja e executa pesquisasdescritivas,
prepara diagnósticos,.faz levantamento de markef/ng, avalia a
opinião pública a respeito de fatos, produtos, projetos e persona-
gens. E. na quase totalidade, têm um grande sonho: ''Gostariam
de sersociólogos
Pela própria natureza da técnica empregada, a pesquisa reali
zada com os alunos não tratou destes problemas de modo satis-
fatório. Entretanto. o convívio cotidiano com os alunos me auto-
riza em parte a lembrar que o problema do empregoé bastanteim-
portante e interfere não só no ritmo que o aluno imprime à sua
referida ''contabilidade'' acadêmica. mas também na própria cre-
dibilidade dele frente à CiênciasSociais. Lembremo-nosque. no
tordo, a grande promessa do curso é a formação intelectual.
Descartada a hipótese da formação técnico-profissional e considera-
da a dificuldade de ocupação no magistério, o curso teria a ofere-
cer uma formaçãoteórica geral, complementadapor um mínimo
de formação técnica,mostrando, inclusive, como a teoria e a técni-
ca no nível do discursocientífico estãometodologicamente com
prometidas.

45
r
No decorrer do curso, frequentando um conjunto muito di-
versificado de disciplinas, torna-se difícil para grande parte dos alu-
nos entender a que vém as CiênciasSociais. Lidando todo dia
com teorias e problemas de mudança -- nos diferentes planos da
sociedade.
da cultura e da política, em quea economiae a histó-
ria entram quase sempre como pressupostos metodológicos abs-
tratos -- o estudante enquanto candidato a cientista social, tende
a perder de vista que a promessada formação intelectual somente
pode se concretizar no momento de sua identificação com ''algu-
ma dasa/fernaf/pas po//filas da mudança (as quais poderiam ser
reduzidas a três possibilidades básicas -- conservantismo cultural,
reforma social ou revolução social)", nas palavrasdo Professor
Florestan Fernandes (obra citada. p. 269). Entretanto, não creio
que este requisito seja exp//c/fado pela dinâmica do próprio curso.
Evidentemente.a opção por uma prática teórica implica o engaja-
mento em um trabalho científico de transformaçãodos resultados
obtidos pela pesquisaempírico-indutiva,e teoricamenteorienta-
da de acordo com a alternativa assumida.em tecnologia da mu-
dança. A maior dificuldade reside no fato de a tecnologia da ciên-
cia socialse desenvolverno domínio da práticapolítica, ou seja,
cabe à ciência social, como pretendiam seus fundadores mais emi-
1 nentes, fornecer à comunidade os fundamentoscientificamente
!comprováveispara a direção, no nível político, da ação transfor-
!madora, qualquer que seja sua alternativa. Mas a comunidade a
que me referi não existe como organismounanimementeinteressa-
do em atingir os noesnoos ob/ef/Pos. Ao contrário, ela se constitui
em conjuntos antagónicosde grupos, associações,partidos poléti-
cos e classessociais. Isto marca o terreno escorregadioem que se
move o estudante ao longo de sua formação. Iniciado no suposto
da neutralidade científica, ele. com esforço tem que chegar à ne-
gação da suposta posição científica inteiramente neutra, para ver
surgir da análise concreta de situaçõesconcretasda realidade so-
cial o drama das contradições que regemo seu objeto de trabalho.
AÍ está o segredo da ciência social. Desvenda-lo é fazer-se o ante
lectual da promessa.
Em suma, é aprender a fazer a pesquisae aprendera fazer-se
pesquisador científico. A pedagogiaque de modo não intencional

46
r'
ode.nta o curso da USP segueesta ordem: primeiro fazer, depois
fazer-se. Ao fazer-se.então. começa de fato, no refazer,a possibi
cidade do trabalho discente no qual o aluno seja capaz de encon
trar justificativa parasua própria opção.
No entanto, o tempo é curto, astarefassãomuitas(princi
palmente o volume de leituras) e nem todos têm oportunidades
de chegarao fim da linha, o que geralmentesetorna maisviável
acrescentandomais anos de estudo na pós-graduação,sem garan-
tia prévia.
Ê premente. contudo, refletir devidamentea respeito de até
que ponto da formaçãodo cientista social é possívelse chegarcom
a graduação,sem perder de vista que ''uma nova relaçãoentre as
ciências sociais e a sociedade está na dependência de nossacapaci-
dade de criar novas formas de comunicaçãoe de absorçãodo co
nhecimento científico pelo meio'' (Florestal Fernandes, Obra
citada, p. 269).
Entender as leis da sociedadeé descobrir o sentido da ciência
social, e. a partir daí, entender o porquê do cientista social.
Por tudo isto, estou seguro de que seria ingênuo imaginar que
o jovem aluno do Curso de Ciências Sociais poderia, antes de
passarpor um longo período de formação, ter idéia clara do papel
do cientista social. Isto ficou, creio, parcialmente demonstrado
por alguns dados sobre avaliações e expectativas dos alunos.

5.2. Notas pessoais para um debate

As dificuldadesque o aluno enfrenta provavelmenteseriam


atenuadas se ele tivesse oportunidade de trabalhar mais próximo
do professor. Se pudesse acompanhar suas pesquisas e comparti-
lhar suaspreocupações. De modo geral, a relaçãoprofessor-aluno
limita-se ao encontro semanaldurante a aula. Via de regra,o alu:
no só tem acessoa parte dos resultados das pesquisasrealizadasno
Departamento,
quandojá publicadas. Ele desconhece
toda a
trajetória percorrida pelo pesquisadoraté a chegadaaos resulta-
dos finais. Nem sempreé capazde imaginarqual a ''fórmula da
criação''. Fórmula que na verdade não existe.

47
r

Acostumado que estou por dever de ofício, a ministrar aulas


das disciplinas de Métodos e Técnicas de Pesquisa.sinto por parte
dos alunos, pelo menos num grande número de casos e situações,
senão rejeição completa por essasdisciplinas, pelo menos uma cer-
ta desconfiançaa respeito de suapossívelutilidade. Tudo lhes pa-
rece por demais árido e ''sem conteúdo". Quando, no segundo se-
mestre da disciplina chegamos aos números, é um total ''Deus nos
acuda'
O aluno desconheceinclusive, em variada gama de investiga-
ções, a necessidadedas tarefas mais elementares da pesquisa, como
a consulta a fontes de informações, quer sejamelas fontes numéri-
cas. fontes manuscritas, jornais, arquivos, etc. Ele tende a supor
que a verdadeira ciência social se faz por meio dos ensaiosde sín-
tese com os quais têm mais contato através das bibliografias das
''disciplinas de conteúdo''. Obviamente. como não é informado.
na prática, dos caminhos percorridos até sechegara essesresultados,
o estudante sente-secom frequência incapaz de vir- a produzir
este tipo de trabalho, o que, além de Ihe dar uma ideia totalmente
distorcida a respeito do processo de produção sociológica, o faz
sentir-se quase que desiludido a respeito de suas próprias potencia-
lidades. E se não bastasse.a maioria dos professorestende a exi-
gir que o candidatoà pós-graduação
apresenteno ato de inscri-
ção, um projeto de pesquisam
O fato de muitos alunos terem que trabalhar dificulta tudo
mais ainda. Além de todas essasdificuldades a que me referi. a
preparaçãodo cientista social implica o consumo de muito tempo
para digerir a literatura das ciências sociais e se informar minima-
mente sobre Economia e História, disciplinasque, no curso de
Ciências Sociais, não dispoêm de carga horária satisfatória para su-
prir a generalizada pouca informação que o aluno têm nestas
áreasde fundamental importância.
Enfim. o bachareladonão é didaticamente encaradocomo o
aprendizado de um ofício, como o entende Wright Mills (4 /1'nag/-
naçâb soc/o/óg/ca,4a edição, Rio de Janeiro, Zahar. 1975, espe-
cialmente ''Do artesanato intelectual'').
Se déssemos,como professores, mais atenção a esta questão,
é provável que grande parte das dificuldades do curso fosse resolvi-

48
r'

da. Alguns dos colegas professores não concordam absolutamente


com isso, pois o ''curso semprefoi assim'', o que não impediu a
formação -- elitista, a meu ver -- de um bom número de pesquisa-
dores e intelectuais competentes.
Possoaté concordar que o curso tenha sido ''sempre assim''
e que tenha apresentado boa produtividade. Mas os tempos são
outros. E além do mais, o número de vagasdo curso foi sendo
consideravelmente aumentado. até se chegar às 200 vagas anuais de
hoje. É certo que o corpo docente também cresceupara atender
às necessidades impostas .por um número maior de alunos. Mas a
tradição artesanal do curso e o relacionamento professor-aluno
foram alterados. A implantação da pós-graduaçãono novo sistema
contribuiu para afrouxar esserelacionamento. Hoje, ou o profes-
sor está por demais preocupado em trabalhar, quase que solitaria-
mente em suasteses{principalmente no casodos Auxiliares de En-
sino e ProfessoresAssistentes)ou em cuidar d3s tesesdos alunos
de pós-graduação,tarefa esta reservadaaos AssistentesDoutores e
docentes mais graduados.
Infelizmente. a divisão de trabalho imposta pela estrutura do
horário das disciplinas reduz as chances de melhorar a relação pro-
fessor-aluno. Após trabalhar um semestre.comuma classe,o pro-
fessor perde o contato com estes alunos que passamà responsabi-
lidade de outros docentes,não existindo, portanto, uma continui-
dade nessa relação.
A relaçãoaluno-aluno também é prejudicada pelo sistema
de disciplinas optativas. Não temos mais as antigas "turmas" que
seguiam por anos trocando suas experiências e dividindo seu traba-
Iho
Usando as palavras de W.Mills, ''o leitor bem pode estar, ago-
ra. dizendo para si mesmo: 'Bem, chegou a hora. Ele vai formular
um ideal tão elevado que em termos dele tudo o mais parecerá
baixo' '' (Wright Mills, Obra citada, p. 203). Mills, ao escreveres-
tas palavrasem 1959, estavadiscutindo o problemada democra-
cia relacionadacom o papel do cientista social. Não pretendo, so-
zinho. formular ideal algum, mas, situando a citação extraída de
W. Mills no seucontexto, gostaria de poder pelo menoster elemen-
tos para responder, sem os costumeiros rodeios, à pergunta que

49
r

cedo ou tarde (às vezes tarde demais) o aluno apresenta ao profes-


sor: ''A que vêm as Ciências Sociais?" A resposta não é por certo
tão difícil quanto possaaparentar. E para chegarmosa ela tería-
mos que discutir um outro tipo de relação: professor-professor.
Estas três relações -- professor-aluno. aluno-aluno, professor-pro-
fessor --, agregadaa uma quarta , a relação curso de CiênciasSo-
ciais -- papel do cientista social, compõem os elementos operacio-
nais de definição daquilo que, atrás, denominei ''explicitação peda
gógica do curso''. Mas:esta. é claro, implica outra explicitação
também anteriormente referida como o ''segredoda ciência so-
cial''
S. Paulo, 24 de março de 1980.

J.R.P.

5.3. Um depoimento coletivo: Falam os alunos

Explicação preliminar

Com a finalidade de completar os dados apresentados no pre-


sente relatório. solicitei a um grupo de alunos que preparasse um
documento a respeito de alguns tópicos aqui tratados. Como os
dados de que dispunha datam de 1977, julguei que uma novacon-
sulta aos alunos. feita no mês de março de 1980, poderia contri-
buir para colocar problemas com os quais se deparam os alunos
hnip
Promovemos uma reunião inicial em que expus os objetivos
do trabalho e em que .traçámosuma série de itens a serem-objeto
de discussão. Os alunos tiveram prazo de uma semanapara ouvi-
rem seus colegas. Insisti para que cada participante.do grupo
entrevistasseinformalmente colegasde diferentes características,
como o tempo de curso. sexo, período, etc. Alguns estudantes
deram seus depoimentos por escrito. Cadamembro do grupo, por
sua vez, preparou um relatório com base na sua experiência e na
dos colegas ouvidos.

50
r'

Com essematerial. fizemos uma reunião para preparar o que


chamei de ''um depoimento coletivo''. As informações trazidas,
em grande parte, eram coincidentes; em muitos aspectosse com-
plementavam.
Passamosà etapa de produção de um só relato. Os diversos
depoimentose observações foram juntados de modo a se obter a
necessárialinearidade na exposição. preservandoao máximo a
linguagemoriginal e o conteúdo, mesmo quando estenos pareceu
incompleto ou superficialmente tratado. Para efeito de exposi-
ção, montei o relato compondo blocos, cadaum tratando de itens
específicos ou afins.
Participaram dessegrupo os seguintes alunos: Helena Wendel
Abramo. José Leopoldo Nora Antunes e Sérgio Carvalho Alli, co-
mo representantes do CEUPES (Centro Universitário de Pesqui-
sas e Estudos Sociais, órgão dos alunos do curso de Ciências So-
ciais). e mais Bárbara Corrales, Edson Luiz Rosas, Esther Império
Hamburguer, Marcelo Penteado Coelho e Sandra M. Christiani de
la Torre. Importa advertir que o depoimento não expressaneces
sariamente as idéias e avaliações destes alunos, nem como grupo,
nem individualmente. Do mesmo modo, o que seguenão é neces-
sariamente representativo do conjunto de todos os alunos do Cur-
so de Ciências Sociais. Como as minhas próprias idéias expostas
anteriormente, as que ora são apresentadastêm como objetivo
básico a promoção do debate.

J.R.P

O Depoimento eoletivo

O cotidiano

''A primeira coisa que salta aos olhos de quem entra no Cur-
so de Ciências Sociais da USP é a quantidade de alunos que cursa-
ram. se formaram ou ainda frequentam outros cursos na USP ou

51
r
fora dela. Politécnica,Economia.Direito, Psicologia,os alunos
vêm com a expectativa de obter do curso de CiênciasSociaisalgo
que complemente sua formação, lhes dando uma visão mais geral
da sociedade; ou, desiludidos com sua primeira opção, procuram
algo 'mais aberto'
'No mesmo bolo de uma calourada entram também os que
desejam ser sociólogos, antropólogos, . . . Muitas vezes, quase
sempre, nem sabem o que isto quer dizer. Às vezes nem depois
''Interesses muito diversos, portanto, convivem no curso.
Isso envolve muitas questões que não são discutidas claramente.
O curso de Ciências Sociais tem sua especificidade ou visa somente
propiciar cultura geral? A expectativa do aluno que visa entender
um pouco a sociedadeem que vive é atendida num curso de teo-
ria sociológica?
'A escola de Ciências Sociais se caracteriza por ser um am-
biente 'sério', seco, de poucos papos, poucos amigos. Uma escola
competitiva que propicia um espaçocoletivo de desenvolvimento
cultural e científico muito pequeno.
''Outra característica é a dispersão: as pessoas entram e saem
correndo. atividades afins não se encont.ram,as pessoasse conhe-
cem pouco, a passividadedos alunos frente aos problemas do curso
é grande, as discussõesem sala de aula não são conclusivas e muitas
vezes são monopolizadas por alunos que 'estão em todas'. Os alu-
nos mais tímidos são boicotados. O número de desistentesé mui-
to grande. Gente sai, depois volta: ninguém se conhece. A vida
11 fora da escola não se integra com a vida na escola.
'Tambémé prejudiciala apatiado aluno na aula, a pouca
participaçãoem classe,a falta de vida cultural própria dentro da
escola. Nem alunos e nem professores promovem atividades pa-
ralelas capazes de despertar interesse.
'Alguns alunos se reúnem e formam grupos de estudo para
tapar os buracos. Professores e alunos, principalmente de dois ou
três anos para cá, parecem ter uma vida intelectual e profissional
ou política fora da escola muito mais ativa do que a que desenvol-
vem na escola.. Cada dia uma classediferente, um professordife=
rente, uma aula de quatro horas (pouca gente agilenta o tempo to-
do). A heterogeneidadedos alunos e dos professores,a falta de

52

i
r'
uma linha contínua no curso, falta de informaçãosobre asdisci
planasoptativas, visão difusa das Ciências Sociais como um to
do . . Até o segundo ano fica a expectativa de definição e depois
cadaum tem que sevirar pra seencontrar no curso. AÍ dá umavi
rada e muitos se desinteressam:saemdo curso ou ficam completa
mente passivos sem saber pra que estão estudando.
'Quanto às dificuldades materiais, falta tudo nas Ciências
Sociais: a biblioteca é insuficiente e fecha em horários em que os
alunos poderiam fazer consultas; os cursos não são apostiladose
há uma constante apelação ao xerox, o que fica muito caro para os
alunos sem recursos. Os próprios professoresnão se preocupam
muito com a seleçãode textos e o aluno tem que comprar livros
carospara ler somenteum ou outro capítulo. As instalações
de
vivência são péssimas. As alunas que tem filhos menoresenfren-
tam muitos problemas pela inexistência de creche na escola'

O relacionamento ontre alunos

''O relacionamento entre os alunos é prejudicado por muitas


causas.como as diferenças sócio-económicas, o isolamento entre
os alunos da tarde e da noite. as diferençasde geraçãoe o fato de-
corrente de interessesdiversos, pois tem aluno que vem querendo
se formar como sociólogo, antropólogo ou cientista político e os
lque só querem cultura geral para outras profissões ou para a com-
plementação sem necessidade de pensar em emprego.
'0 que prejudicamuito é que a partir do terceiro ano as
atençõesse voltam para o trabalho fora da escola,sem tempo de
uma maior participaçãono curso; também a participaçãopolíti-
ca fora da escola interfere.
''O fato de não existir classe depois do segundo ano não per-
mite um desenvolvimentoconjunto, nem estabelecimentode for-
mas para organizar grupos constantes de estudo e participação nas
atividades coletivas da escola. Papos rápidos. contatos só na sala
de aula ou só nos intervalos,este é.o clima reinante,semcontar
a dificuldade de relacionamento com .osalunos dos outros cursos
da USP

53

i
r
'0 relacionamento que as disciplinas optativas poderia pro-
porcionar entre os alunos mais velhos e os mais novos às vezes é
positivo, mas muitas vezesprovoca uma participação bastante di-
ferenciada. causando inclusive certa inibição nos alunos mais no-
vos. Tem classeoptativa com alunos que estão na escolahá mais
de cinco anos e alunos com só dois anos de curso. Estes mais no-
vos ficam intimidados no momento dos debates e seminários, com
temor de estaremmuito por fora do assunto.
''Tudo isto sedá em condiçõesde inexistênciade uma prá-
tica coletiva,quer se trate de estudo,pesquisaou outrasativida-
des. como as culturais e o movimento estudantil dividido em mui-
tas facções. O aluno novo demora muito tempo para entender o
que está acontecendo. Outros nem se interessam em saber, porque
logo de cara sentem que tem grupinhos fechados mais interessados
em fazer politicagem do que resolver problemas que os tocam de
perto com relação ao próprio curso e à Universidade. Esta é uma
das visões existentes na escola em relação ao Movimento Estudan-
til. Existem outras'

O relacionamento professor-aluno

A relação dos alunos com os professores é muito variada.


Porém.no geralexiste um contadomuito ténue. Poucossãoos
professores que se preocupam com os alunos e vice-versa. Ativida-
des extra-classe entre professores e alunos (debates, discussões, in-
formações) são quase inexistentes..
"Os alunos, na maioria das vezesnão encaramo professor
como profissional. Muitas vezesfica a impressãoque a aula não
foi preparada. de que não há interesse porpartedo professarem
ministra-la, e mais, nas matérias básicasos alunos não percebem
quase nada do professor enquanto pesquisador. Isto tudo é um
pouco melhorado nas optativas.
''Poucos são os cursos considerados importantes. Muitos são
escolhidos porque dá pra passar fácil e muitos são feitos só para
obtenção de créditos. Mas o que falta mesmo é uma orientação

54
r'
sobre os cursos que cada um deveria fazer se quer ser soa(51ogo,
antropólogo, etc. Por exemplo, se um aluno quer fazer antropolo-
gia, que cursos, e em que ordem.deve fazer? Começa pelo curso
dos Bororo. ou tem que fazer outros antes deste? Como o aluno
deve compor o currículo? Talvez quem sabedestasdoisasseriam
os professores, que deveriam orientar os alunos. E os cursos 'cha-
mativos'? Entram em que etapa do currículo?
'A diferença de geraçãoentre professorese alunos. a expe-
riência. é enorme. Apesar de não serem encarados como donos do
saber, os professores têm atrás de si uma bagagem enorme de
contribuição às CiênciasSociais {teses, livros, artigos, etc.) que in-
timida o aluno e impede uma orientação na basede uma relação
pessoal e menos formal.
'Um outro aspecto. porém, do relacionamento entre profes-
sorese alunosé bem mais positivo: no plano dos problemasco-
muns, ou nas lutas travadas especificamente por uma das catego
rias, geralmente se verifica o apoio recíproco. Neste terreno. a
situação da escola é uma das melhores da USP (vide o caso do con-
gressoda UNE e o da grevedos professores).
Há ainda professores que desenvolvem uma relação bastan-
te autoritária, quase sempre conseqüência de uma postura de fun-
do etilista. a 'autoridade acadêmica'. Rebatem as críticas dos alu-
nos com a sua condição de ter tantos anos de estudo e tantos li-
vros publicados. Na maior parte dasvezesse dá um relacionamen-
to muito passivono ato de transmissão
do conhecimento:o pro-
fessor desenrola a verdade e o aluno tenta absorva-la.

'Fica a sensaçãode que a produção da ciência que se efetua


na escolapassatotalmente ao largo dos alunos, que não têm nem
capacidade de contribuição, pois para isto nem é orientado e nem
chamado. Sobre a produção da escola quase nada se sabe. a não
ser comprando o livro do professor que sai publicado. Quasenão
se aproveita essa produção. E a pouca produção feita pelos alunos
fica nas gavetasdosprofessores,sem crítica, correção ou utiliza-
ção pra outros trabalhos futuros.
''Um dos problemas mais gerais e mais graves. com exceções
poucas, é o fato do professor dar muito pouca ou nenhuma assis-

.55
r

tência ao desenvolvimento do aluno (acompanhamento de traba-


lhos, soluções de dúvidas, ou mesmo orientação no estudo).
''Também é verdadeque o aluno não aprendeua cobrar essas
coisas do professor e às vezes não atende a seus convites. Assim
vai se cristalizando um clima de comodismo que tende a ser rompi-
do apenas quando acontece alguma crise relacionada com alguma

1 disciplina'

1 A composição curricular

''A incapacidade que o curso de Ciências Socias tem de pro-


porcionar ao aluno uma idéia mais estruturada sobre a formação
de um cientista social, a dificuldade do aluno enxergaruma estru-
turação mais consistente do curso, e ainda a dificuldade dos alu-
nos compreenderem qual a ligação entre as áreas básicas e entre
as diversasdisciplinas de cada uma delas fazem normalmente com
que a composiçãocurricular se estabeleça
a partir de fatoresos
mais diversos.
'0 primeiro deles, talvez o que mais pese, é a preferência
que se estabelece,a partir do segundoano, por uma das áreas,ten-
do contribuído para essaescolhao contato com os professorese
temas dos primeiros cursos (obrigatórios) já feitos. Outro fatos
de grande peso é o horário disponível, os dias que sobram depois
de escolhidas as obrigatórias, e horário de outras atividades, acadê-
micas ou não, o que é mais grave no caso do aluno que trabalha.
Para escolher entre uma ou outra matéria optativa, geral-
mente os critérios são: conhecer o professor, sua popularidade en-
tre os alunos e o interesse que o tema pode despertar. As biblio
grafias raramente são consultadas,que por sinal é incompleta no
Manual (ele só traz cinco títulos por matéria, custa 30 cruzeiros e
quase ninguém o consulta). Há ainda as matérias 'fáceis': quatro
créditos sem esforço.
''O que é mais difícil é compor as matérias visando a uma es-
pecialização. Quaseninguémsabecomo fazer isto. As optativas
são oferecidas como corpos isolados e você escolhe a que pode Ihe
interessar de acordo com razões diferentes. Não dá para perceber
entre as optativas nenhum tipo de ligação ou de planejamento.

56
r

'0 curso se propõe mais teórico do que de pesquisa,masa


baseteórica com que se saida escolaé insuficiente, senãoconfusa.
''As disciplinas não departamentais já são bem conhecidas
pela sua desarticulaçãocom o curso em geral. Basta citar como
exemplo o curso de História (obrigatório) em 1979, que versou
sobre 'História das Mentalidades no Período Colonial Brasileiro'
A classe terminou o semestre sem saber definir o próprio conceito
de mentalidade e sem aproveitar o tempo para tr8tar de assuntos
mais relevantes para a ciência social.
'Quanto às obrigatórias departamentais,divididas em três
áreasque compõem o curso ISociologia,Ciência Política e Antro-
pologia) também não há articulação alguma. Textos iguaissão
usados em épocas diferentes, os mesmos assuntos são abordados
pelas três áreas (em alguns casos), sem que a gente compreenda
onde é que está a'diferença
'0 curso não conseguemostrar com facilidade a diferença
das 'três ciências' . Será uma divisão didática? Será que tratam
com objetos diferentes? A CiênciaPolítica é a.ciência do poder
e do Estado? Então por que tratamos dessesassuntosna introdu-
ção da Sociologia? Não fica clara a delimitação dos campos e nem
as interrelações entre eles. A falta de atividade prática (pesquisa
pra valer) deixa os alunos muito distantes do objeto de trabalho
das disciplinasteõricas.
'A seqüência nas disciplinas obrigatórias pode ser só no no-
me: X--l. X--ll. X--lll, sem que haja em todos os casosuma liga-
ção entre os semestre que se seguem.
''A carga de leitura às vezes é muito excessiva. .outras, mal
combinadas. Pareceque os professoresnunca sabemo que o ou-
tro está ensinandoe que texto está usando. Se repetissemo texto
jcomplementando a análise de acordo com o interesse específico
de cada disciplina, aí então poderia ser feita a distinção analíti-
ca que de fato nãose faz.
'Os cursos que tratam de problemas da realidade não canse
quem dar conta da realidade atual, perdendo os alunos a oportuni
dade de aprender a fazer análisesda realidade em cima dos fatos

57
r

'As disciplinas não departamentais optativas são em geral


de pouco interesse,prevalecendoem número as de letras. As de
Filosofia que podem interessar oferecem poucasvagas.
''O maior problema é que quando a gente cobra de um pro-
fessor a tal da amarração, ele logo entra com o discurso de que isso
é feito no futuro, e assim por diante. Talvez seja assim mesmo,
mas não sabemos como.
No caso da orientação do aluno, sabemospor exemplo, que
poderíamos até dispor de bolsa da FAPESPpara iniciação cientí-
fica, só que para isso falta o maior contato com o professor.
Quanto à seqtlênciadasdisciplinas,tem até aluno que pensa
que quem determina os pré-requisitos é o computador!

O problema do trabalho durante e depois do curso

''A preocupação com o trabalho vem lá pelo 29 ou 3ç) ano e é


mais grave para os alunos da noite. Durante o curso, os alunos da
tarde podem trabalhar só meio período, pois geralmentetêm me-
nos responsabilidades familiares que os alunosda noite. os quais
têm que trabalhar o dia todo. O aluno da tarde pode até trabalhar
para ter um dinheirinhosó parasi, maso da noite em maioria
têm que sustentar a família. Os alunos da tarde podem até conse-
guir um estágio,sesubmetendoa ganharmuito pouco por este
trabalho.
"Sobre o futuro, pasmo gerall O que faz um cientista social?
O médico cura. o arquiteto projeta edifícios, etc. E nós? Esta
questão é pouquíssimo discutida com eficácia durante o curso e
poucos conseguem ter despreendimento para enfrentar a questão.
Discutimos Durkheim, Weber.Marx, Hobbes, Tocqueville.
e daí? Com base nos conhecimentos que temos do mercado de
trabalho, que é fraco, podemos constatar o que faz um sociólogo
hoje: técnico em órgãos estatais,fazendo pesquisanão se sabe
para quê. O sociólogo é visto como 'profissional criativo' bom pa-
ra equipes multiprofissionais. Trabalha também em agência de
publicidade, dá aula, é bancário
Pareceque a definição do papel do sociólogotem que vir
da sociedadee não da escola. No decorrer do curso esta questão

58
r
começa a preocupar os alunos cada vez mais. Nós achamos que
a escolanão deve ser uma banca de recrutamento de gente para
participação política e nem de formação de mão-de-obra alienada.
'0 profissional que sai daqui e vai ser burocrata deve conhe-
cer a burocracia e saber critica-la; entender as técnicase propor
formas novas, etc. A pergunta se coloca sempre, faz parte do coti
diano e é sempreadiada: O que faz o sociólogo,o antropólogo,
etc.?
'AÍ entra o problemada política. Política e profissãose
confundem. Sociologia e Ideologia são problemas complicados.
Discursosoficiais, a Televisão,veiculam uma ideologia que tem
baseteórica. As CiênciasSociais e a Filosofia alimentam a ideo-
logia do Estado e da ordem; mas tem a ideologia da mudança. O
sociólogo pode trabalhar nos órgãos do Estado, mas e no sindicato
lpode?
''O antropólogo é visto como o que vai cuidar dos i'ndios.
Agora que a Antropologia começa a abarcar outras questões, a di
ferenciação com o sociólogo se torna mais difícil.
''O cientistapolítico é o que tem a função mais difícil de
serapreendida pelos alunos.
'Quando discutimos o conteúdo do curso há os que o enca-
ram como mero diletantismo intelectual e os que são contra as
'teorias estratosféricas', querendo mais técnica. Os adeptos desta
última corrente reivindicam mais cursos de técnica de pesquisae
estatística. por exemplo. Mas esta é uma falsa questão, a nosso
ver
''Trabalhar como sociólogo implica saber claramente o que
é esta figura. E o teórico, é o técnico, é o político? É claro que,
excluindo os colegasque já têm outra profissãoe fazem o curso
para completarsua formação, a maioria dos alunos quer tra-
balhar como cientista social. só que não sabebem como fazer e o
que fazer. Os próprios professores têm visões diferentes da situa
ção. Por exemplo, uns sãoa favor da regulamentaçãoda profissão
outros sãocontra

59
r
O Cientista Social, o que é?

''Há dois modosde se entendera tarefado cientistasocial,


o seu papel O primeiro que identificaria sua atividade com qual-
quer outra área científica. visando a rego/verproa/amas,aventar
soluções para o que se chamaria foco de crise ou insatisfação no
corpo social. Por exemplo, dado um problema-- a miséria-- des-
cobrir suascausase qual a melhor estratégiapara debelá-la,assim
como um médico ou engenheiro procuraria soluções, cada um no
seu campo Outra concepção de ciência social, que talvez compro-
meta a chamada :'cientificidade' é exatamente inversa. Visa /e-
l.'arfar proa/amas, ciente que sua resolução não é tarefa do Estado
esclarecido,
masde toda a sociedade.Nestesentido,o 'levantar
problemas' coincidiria com o processo de autoconsciêncía dessa
sociedade. Explicitando: que cada problema em particular está
interligado com toda a:sociedade. A primeira visãovê o problema
na sociedade;a segundaprocura apresentara sociedadecomo um
problema.
''Diante disto, a dificuldade em situar o curso de Ciências
Sociaispode estar no fato de que ele não estásituado em lugar
nenhum. Sem dúvida, o esforço de levantar problemas está pre-
sente no curso. Sua própriaparcialização talvez se deva ao fato de
que nossos professores cumpram bem demais essa tarefa; mas.
enquanto professores, vêem-se obrigados a passar informações,
preencher vazios em nossa formação anterior. etc. (o que leva,
diga-se de passagem,à excessiva carga de leituras). Com isso. cria-
se um vezo 'informador' que nos dá ilusão de que devamossair
daqui com respostasprontas, quando sabemos,mal e mal, apenas
que tipos de problemas estão em jogo na sociedade.
''A formação de 'intelectuais críticos', mais que de 'cientis-
tas sociais' é apresentada no curso mais como inquirição, exegese
e problematização de textos do que análise de uma realidade.
Isto contribui para aguçar nossa capacidade crítico-intelectual,
mas nos deixa meio desaparelhadospara enfrentar a realidade; e
também bastante desorientados teoricamente, uma vez que o
problema com que nos deparamos no curso são extremamente
complexos.

60
r
''Então, saem da escola os que pretendem levar adiante UMa
carreira intelectual. adquirindo, na atividade cotidiana de pesqui-
sador -- meio aos trancou e barrancos -- e na pós-graduação o
que falta para se chegar a ser um cientista social. Por outro lado.
o curso complementa a vida profissional do bancário, engenhei-
ro, arquiteto, etc., com um vagorepertório de inquietaçõese teo-
rias que tendem a desagregar-secom o passardo tempo.
''A própria indefinição do curso -- formar técnicos. inte-
lectuais, ou dar 'visão crítica a profissionais de outras áreas -- ten-
de a confundir o próprio aluno, porque é 'na cabeçadele' que es-
tas especializações devem se concretizar.
Uma coisa que acontece muito no nosso relacionamento
com colegas de outras áreas --politécnicos. matemáticos. econo-
mistas -- é a curiosidade deles sobre a nossa profissão. E por aqui-
lo que conseguimosexplicar, eles perguntam: '0 curso então é
prá formar políticos?' Não é. Ou será que é?''

61
l

$BÍ)/f FC/} íu S P
seçaQJ

AQUISIÇÃO
'4. VALOR

@.
=Ú'Õ'57Õã;71l?:* .i TOFd30
A EQUIPE

Participaram do planejamento inicial da pesquisa José Regi-


naldo Prandi. Eunice Ribeiro Durham. Leõncio Mastins Rodrigues.
Colaboraram no delineamento do questionário José Alvará Moisés
e Mana TerezaAma Sadek. Engrossarama equipe no momento de
codificação dos questionários Gabriel Cohn, Mana Lúcia Montes e
Amélia Cohn.
Outros colegasajudaram em fases diversas.Alunos da disci-
plina Planejamento e Execução de Pesquisa, ministrada por José
Reginaldo Prandi, auxiliaram na correção da sintaxe de programas
para o processamentodos dados. Alunos do curso prepararam
seu ''Depoimento Coletívo". Conceição Pinez Garcia ficou res-
ponsável pela composição tipográfica e Lucy Lagunas pela monta-
.gem.

63

Você também pode gostar