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Proibida

Izabell Marccaro
Direitos autorais © 2021 Izabell Marccaro

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Os personagens e eventos retratados neste livro são fictícios. Qualquer semelhança com pessoas
reais, vivas ou falecidas, é coincidência e não é intencional por parte da autora.

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transmitida de qualquer forma ou por qualquer meio, eletrônico, mecânico, fotocópia, gravação ou
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Design da capa por: Izabell Marccaro


Diagramação e Revisão: Izabell Marccaro
Contato: izabellmarccaro@gmail.com
Em cada ser humano existem desejos que não gostaríamos de comunicar aos outros e
também desejos que não gostaríamos de confessar a nós mesmos.

Sigmund Freud
1º Movimento
Capítulo 1

Lorena olhava novamente para aquele jovem alto e forte que flertava
consigo naquele rooftop lotado, cogitando a possibilidade de avisar aos seus
amigos que iria embora quando o viu se aproximando. O rapaz chegou bem
perto, inclinou o seu corpo e ela pode sentir a sua respiração quente quando
ele encostou a boca em sua orelha para lhe dizer:
__ Quero te conhecer!
A moça olhou para o rosto bonito daquele homem e tudo o que
desejou foi ir embora para a sua casa. Ela estava ali por insistência dos seus
amigos que praticamente a arrancaram de sua cama para arrasta-la até
aquele terraço onde funcionava o bar bem decorado. O pub havia se tornado
um badalado ponto de encontro dos jovens daquela cidade universitária
desde que fora inaugurado ha alguns meses.
__ Eu estou indo embora! __ Lorena teve que falar bem alto para
o rapaz que ainda permanecia bem próximo a si.
__ Mas não é meia noite ainda e amanhã é domingo! __ O jovem
consultou as horas em seu elegante relógio de pulso para constatar o que
dissera.
Lorena estudou a face harmoniosa do rapaz e pode perceber nele
uma aura amigável. Os seus olhos cor de mel, profundos, lhe passaram algo
de bom que inspirou confiança.
__ Ah... Tudo bem. Vou ficar mais um pouco então.
__ Ah... Deus, obrigado! __ Exclamou o jovem, olhando para o
alto, arrancando um sorriso de Lorena. Depois, ele a fitou novamente e
disse bem próximo ao seu ouvido __ esse pub tem um lugar mais silencioso
onde poderíamos ficar pra gente se conhecer melhor, o que acha?
A moça titubeou um pouco e depois se rendeu ao rapaz amigável
com a sua barba bem aparada.
__ Tudo bem, podemos ir. Vou só avisar os meus amigos aqui.
A jovem se afastou do moço e caminhou dois passos para a
esquerda para se aproximar de um casal que dançava em movimentos
cadenciados.
__ Léo, Thaís, eu estou indo para o bar com aquele “menino” ali,
mas quero ir embora com vocês, tá bom? Não me deixem para trás! __
Lorena fez uma careta no final, pois o que ela desejava mesmo era estar em
sua cama, debaixo de suas cobertas.
__ A gente não vai embora sem você, pode ficar despreocupada.
__ Leonardo agarrou uma das mãos da amiga, tranquilizando-a.
__ Obrigada, eu vou lá! __ Lorena deu um sorrisinho entre os
dentes e voltou a se aproximar novamente do rapaz, ele a conduziu até um
espaço aconchegante daquele rooftop onde poderiam conversar, pedir algo
para beber e comer.
Após ocuparem uma mesa, próximo a um janelão de vidro, o
jovem estendeu a sua mão para a moça e se apresentou.
__ Prazer em conhece-la, Enrico Grecco!
__ O prazer é todo meu, Lorena!
__ Lorena... Que nome lindo! Bom, não sei se você reparou, mas
eu estava te olhando de longe ha um bom tempo já e sinceramente, te achei
a garota mais bonita daqui!
__ Obrigada! __ Lorena esboçou um sorriso contido, estudando as
feições do rapaz a sua frente.
__ Você tem um sorriso encantador sabia?
__ Obrigada, mais uma vez!
__ Você não vai se importar se eu ficar te elogiando a noite
inteira, não é? __ Perguntou o jovem, galante.
Lorena apenas riu novamente. Não teve resposta para aquela
pergunta descabida.
__ Você quer beber alguma coisa? __ Enrico levantou uma de
suas mãos já chamando um dos garçons que circulavam naquele espaço,
com as suas rápidas passadas largas.
__ Ah... Talvez um vinho.
__ Ok! Tem algum de sua preferência?
__ Tinto, suave!
Após o garçom chegar, anotar o pedido deles e se retirar,
apressadamente, Enrico se voltou para a jovem e perguntou:
__ O que você faz?
__ Eu sou estudante da universidade federal. Faço Psicologia,
mas eu não sou louca! __ Avisou Lorena, arrancando uma gargalhada de
Enrico.
__ Imagina, eu jamais iria pensar isso de você. __ O rapaz se
divertia com a resposta da moça.
__ E você?
__ Eu também estudo lá. Faço Direito, mas não sou um
contraventor! __ O jovem tentou ser engraçado, conseguindo provocar um
sorriso preguiçoso em Lorena.
__ Grecco? De onde vem, da Grécia? __ A moça nunca havia
conhecido ninguém com aquele sobrenome, ficou curiosa para saber de
onde vinha.
__ Exatamente! A minha origem é grega, da linhagem de minha
mãe.
__ Ah, muito bonito!
__ Meu sobrenome ou eu? __ Perguntou Enrico.
__ Eu me referia ao seu sobrenome. __ Lorena se fez de
desentendida e olhou o jovem de esguelha. Geralmente, ela não tinha
paciência com os homens que a cortejavam, pois achava-os muito cheios de
si, com o ego muito inflado. Não foram poucas as vezes em que os
dispensou com um “tchau, até nunca mais”!
O garçom retornou trazendo um cálice de vinho tinto suave e uma
long neck sobre a sua bandeja. Lorena não era muito de beber, mas de vez
em quando ela se rendia.
__ Você mora aqui na cidade com a sua família ou está aqui para
estudar? __ Perguntou a moça, após tomar o seu primeiro gole da bebida.
__ Eu moro aqui com a minha família, quer dizer, com a minha
mãe. Eu não tenho pai.
__ Não tem pai, por quê? Ele morreu?
__ Não sei! Eu nunca o conheci. A minha única família é minha
mãe.
__ Desculpe-me, eu estou sendo inconveniente? __ Lorena se
sentiu mal, pois por um segundo percebeu um certo desconforto no jovem.
__ Não... É que meu pai foi um canalha! Ele... Abusou
sexualmente da minha mãe no campus universitário e ela ficou grávida, só
que ela não quis abortar e por isso eu estou aqui, bem na sua frente.
__ Enrico, me desculpa mesmo, eu acho que eu não deveria ter
entrado nesse assunto. __ Lorena ficou bastante tensa pelo rumo que a
conversa havia tomado, aquele rapaz não merecia aquilo.
__ Está tudo bem, fique tranquila! Eu não tenho problema em
conversar sobre esse assunto. Eu sou muito bem resolvido com relação a
isso porque eu sou bem diferente dele. Felizmente, eu me pareço com a
minha mãe em todos os sentidos, inclusive e principalmente, no caráter.
Lorena ouviu a última fala de Enrico e se desarmou totalmente
com relação a ele. Não era comum encontrar um homem que tivesse
disposição para se abrir assim, ainda mais em um primeiro encontro. Os
homens que chegavam nela geralmente não gostavam de falar dos seus
problemas, eles gostavam de ouvi-la para assim, montar a sua estratégia de
conquista. Falar, para os homens, em geral, significa expor as suas
vulnerabilidades, por isso são mais calados, mas essa característica não
parecia se aplicar àquele jovem sentado a sua frente.
__ Então você faz Direito. Está em qual período? __ Lorena
tentou mudar de assunto.
__ Estou no último ano. Já estou finalizando. E você?
__ Eu também. Me formo no final deste ano...
A conversa fluía entre os dois jovens de maneira natural e Lorena
percebia que estava diante de um homem bem diferente dos demais que
conhecia, pois parecia que aquele rapaz não era aquele tipo de conquistador
barato que só quer levar a mulher para a cama, comê-la e se dar por
satisfeito, não, ele parecia ser sensível e tinha um excelente papo. Eles só se
deram conta do longo tempo que ficaram ali, quando os amigos de Lorena
vieram até eles para chama-la.
__ E aí, a gente tá indo, “vamo” nessa? __ Chamou Léo.
__ Oi! Ah, esse é o Enrico! __ Disse Lorena, apresentando os
seus amigos ao rapaz e depois, completou __ Enrico, esse é o Léo e essa é a
Thaís, meus amigos e colegas de curso!
__ Oi Léo, oi Thaís, e aí? __ Enrico cumprimentou os amigos de
Lorena, amigavelmente, estendendo a sua mão para eles, educadamente.
__ Oi, prazer! _ Disse Léo, apertando a mão que lhe era estendida
pelo rapaz, depois, enquanto via a Thaís cumprimentando também aquele
jovem, se virou para a amiga e falou: __ A gente tá indo, você vem?
__ Ah, sim. Eu vou com vocês.
__ Vocês estão de carro? __ Perguntou Enrico.
__ Não, nós vamos pegar um Uber.
__ Se não se importarem, eu levo vocês. __ Propôs Enrico,
gentilmente.
__ Você disse que não era um contraventor e vai dirigir assim? __
Perguntou Lorena, pois ele havia tomado algumas cervejas e ela própria, se
sentia um pouco alta com as doses de vinho que tinha ingerido.
__ Imagina, eu estou muito bem, é só me dizer em qual hospício
você mora que eu te levo até lá! __ O rapaz falava enquanto chamava o
garçom para acertar a conta e se divertiu assistindo Lorena tentando e não
conseguindo segurar o riso que saiu largo.
Depois de descerem, os quatro jovens esperaram o manobrista
trazer o carro para partirem rumo ao apartamento que Lorena dividia com o
seu colega de curso, o Léo. Quando chegaram em frente ao prédio, os
amigos da moça agradeceram a carona, se despediram do rapaz e apearam
para esperarem a amiga na portaria.
__ Lorena, eu adorei te conhecer, de verdade. Nós podemos nos
ver de novo?
__ Tudo bem, anota meu telefone.
Enrico sacou o seu celular imediatamente, para adicionar o
contato da garota. Depois de feito, ele depositou o aparelho no painel do
carro e se voltou para ela para acariciar a sua face, sentindo a pele macia,
mas quando se reclinou para beijá-la, ela se esquivou, deixando-o no vácuo.
__ Não ganho nenhum beijinho? __ Perguntou o rapaz, dando
continuidade aos carinhos que fazia na garota.
__ Não! __ Disse Lorena, irredutível, depois completou __ boa
noite! __ Já abrindo a porta para sair.
__ Só um minuto! Que horas eu posso te ligar? __ Perguntou
Enrico, segurando a mão macia da jovem.
__ À noite, depois das vinte horas! Tchau!
Enrico viu Lorena se afastar bastante incomodado, pois não era de
levar “toco” e nem de ser tratado com tanto desdém. Ah garota! Isso não
fica assim! Pensou, dando partida em seu esportivo preto.

***
Capítulo 2

Eram exatamente seis horas da manhã quando o alarme tocou. Stela


acordou, pegou o celular e fez aquele som insistente parar, raramente isso
acontecia, pois geralmente ela acordava antes do despertador tocar. Depois
a mulher se levantou da sua grande cama confortável e caminhou em
direção ao banheiro. Ao retornar para o quarto, ela foi até ao closet, vestiu
uma malha confortável e calçou os seus tênis para fazer a sua habitual
atividade física diária.
Quando Stela chegou à academia do prédio onde morava, ela
ajeitou os fones em seu ouvido e imediatamente iniciou os seus exercícios
que eram alternados, conforme os dias da semana. Aquela mulher era
extremamente disciplinada e a sua malhação diária era sagrada. O cargo que
ocupava dependia da sua mente sã em um corpo saudável.
Exatamente uma hora depois, ela retornou para o seu
apartamento. Tomou um banho, penteou os seus cabelos úmidos, vestiu um
terno bem cortado, elegante e formal, calçou um dos seus inúmeros
scarpins pretos e saiu do quarto rumo à cozinha. Lá chegando, avistou a sua
funcionária de costas já em sua lida.
__ Bom dia Lúcia! __ Cumprimentou Stela educadamente, aquela
mulher que lhe preparava o café, depois ocupou o seu lugar na cabeceira da
mesa e à sua frente já se encontrava uma banda de mamão Papaia com a sua
polpa avermelhada apetitosa.
__ Bom dia Dra. Stela! Dormiu bem? __ Perguntou a funcionária,
atenciosa, dando uma pausa no que fazia para se voltar inteiramente à
mulher elegante e perfumada que acabava de chegar naquela peça,
preenchendo-a com a sua autoridade que lhe era característica.
__ Dormi sim Lúcia, obrigada! __ Respondeu Stela pegando a
colher que estava ao lado do mamão e depois, continuou __ amanhã à noite
o Enrico vai trazer a sua namorada aqui para me apresentar, você poderia
vir para me ajudar no jantar?
__ Claro Dra. Stela, estarei aqui! A senhora só tem que escolher o
cardápio, pode deixar que eu faço tudo!
__ Obrigada Lúcia! Eu vou ver com o Enrico o que podemos
fazer para agradar a moça. __ Stela mergulhou a colher na polpa macia do
mamão e levou um bocado à sua boca. A fruta estava doce e saborosa.
Perfeita! Pensou.
__ Mas que novidade é essa Dra. Stela? O Enrico nunca trouxe
nenhuma namorada aqui! __ Observou a funcionária, dando continuidade
aos seus afazeres.
__ É o que eu estou vendo Lúcia. Parece que o meu filho está
levando essa garota a sério.
Naquele exato momento, Enrico chegou ao local, com os seus
cabelos úmidos penteados e já vestido para ir à faculdade.
__ Bom dia! Vocês estão falando de mim, é? __ Perguntou o
jovem, se aproximando de Stela para dar-lhe um beijo no alto da cabeça.
Depois ele se sentou em seu habitual lugar naquela mesa, ao lado direito da
sua mãe, já enchendo o copo à sua frente com aquele suco de laranja
natural.
Stela riu do seu filho.
__ Estávamos sim. A Lúcia estava dizendo que você nunca trouxe
nenhuma moça para me apresentar antes, então concluímos que você está
levando essa a sério, pois a trará aqui. É verdade meu filho?
O jovem apenas riu pegando uma torrada e enchendo a sua boca
com um bom pedaço. Queria ter um tempo para pensar antes de responder.
Depois ele deixou a fatia de pão mordida por sobre o prato, tomou mais um
gole do seu suco para finalmente, falar:
__ Bom, tudo que posso dizer, em minha defesa, é que ela é linda,
educada, bem humorada e apaixonante. Nada mais a declarar!
As duas mulheres caíram na gargalhada com a rendição do rapaz.
Pobrezinho, estava caidinho de amores! Pensaram elas...

...Às oito horas em ponto, Stela Grecco pisava no piso de


mármore daquele enorme fórum para mais um dia de trabalho. Aquele local
estava bastante movimentado naquela manhã, pois às nove horas um réu
iria a júri popular e muitos cidadãos que haviam sido intimados já se
encontravam ali para se apresentarem à justiça, além das pessoas que
estavam envolvidas direta ou indiretamente com o criminoso e a vítima.
Tratava-se de mais um caso de feminicídio e o crime havia
chocado a população na época do ocorrido. O réu, depois de ter aguardado
o seu julgamento na prisão, agora teria finalmente, a sua sentença proferida
pela juíza.
Stela entrou em seu gabinete seguida da sua assessora Bianca que
trazia a sua toga preta de gabardine em punho. O processo já havia sido
estudado e analisado pela magistrada. Todas as provas estavam anexadas, as
testemunhas haviam sido intimadas, tudo estava encaminhado para ser
apresentado ao júri naquele dia que decidiria o destino do homem, um
marido irado e ciumento que havia assassinado a sua mulher a facadas.
Depois de organizar toda a papelada do processo, vestir a sua toga
preta, sempre assessorada por Bianca, Stela se encaminhou para o Tribunal
do Júri onde aconteceria a leitura das peças, as oitivas e por fim, a decisão
final, ou seja, a sua sentença judicial.
Chegando ao tribunal, a magistrada ocupou o seu lugar central
naquele amplo plenário todo entalhado em madeira maciça, cumprimentou
a todos os presentes, intimados ou não, o promotor de justiça, o defensor
público e depois, passou a ler o número do processo, o nome do réu que
seria julgado, o nome da vítima e do delito praticado, enquadrando-o no
código penal. Em seguida, determinou que o oficial de justiça apregoasse as
partes e testemunhas arroladas no processo. O oficial imediatamente iniciou
a leitura do pregão que introduzia em definitivo, o motivo de todos estarem
ali reunidos naquela sessão.
Após aquele momento inicial, Stela passou à etapa em que seriam
sorteados os membros do júri. Enquanto a magistrada lia o documento que
continha os aspectos legais que envolviam aquela importante função, um
dos oficiais se aproximou dela, com uma pequena urna de madeira nas
mãos, contendo os nomes de todos os cidadãos que haviam sido intimados a
se apresentarem ali, para comporem o conselho de sentença.
Ao terminar a leitura do documento, a juíza começou a sortear os
nomes dos sete cidadãos que fariam parte do júri. Stela retirava um nome da
urna de madeira o lia, a pessoa se levantava e era submetida a aceitação ou
recusa da acusação, que naquele caso específico estava a cargo da
promotoria, ou defesa que no caso, estava a cargo da defensoria pública.
Os cidadãos aceitos saiam das cadeiras da plateia e
encaminhavam-se imediatamente, ao seu acento à direita da magistrada,
vestiam suas becas pretas e se sentavam para aguardar o início do
julgamento. Ao final do sorteio, entre aceitações e recusas, o júri ficou
composto por cinco mulheres e dois homens.
No momento seguinte, a magistrada realizou o termo de
compromisso com o júri invitando-os a serem imparciais e decidirem de
acordo com a justiça e com a sua própria consciência. Quando terminou de
proferir o termo de compromisso, a magistrada dispensou os outros
cidadãos que haviam sido convocados para comporem o conselho, mas não
foram sorteados e depois anunciou que suspenderia a sessão por dez
minutos, para que o júri fizesse a leitura das peças obrigatórias que já
haviam sido entregues a eles por um dos oficiais de justiça.
Quando retomaram a sessão, Stela pediu que uma das
testemunhas entrasse. Ela cumprimentou o homem que se sentou a sua
frente e o convocou a prestar o compromisso legal a falar a verdade sobre o
que presenciou a respeito do fato em julgamento, pois aquela seria a sua
obrigação perante a lei, o colocando em seguida, à disposição do Ministério
Público, representado na pessoa do promotor de justiça que imediatamente,
iniciou o seu interrogatório.
Haviam duas testemunhas arroladas naquele julgamento e ambas
foram ouvidas e interrogadas tanto pelo promotor, quanto pela defensoria.
Depois foi a vez de ouvir o réu que respondeu a todas as perguntas feitas
pela juíza, depois pelo promotor e por último, pelo defensor público...
Após as oitivas, Stela anunciou os debates entre as partes. A
promotoria clamava por justiça, pedia aos membros do júri que se
decidissem em favor da civilidade e não da barbárie. O promotor repetia
inúmeras vezes, o motivo torpe que havia motivado o réu a cometer um
crime tão violento. Crime esse que havia tirado a vida da mãe de três
crianças inocentes. O promotor trazia para o plenário, os números absurdos
de feminicídio que acontecem no Brasil todos os anos e conclamava aos
cidadãos do conselho a ajudar o Ministério Público a erradicar aquela
violência absurda.
A defensoria, por sua vez, suplicava por misericórdia e que o júri
ao menos reduzisse a pena daquele homem desonrado que perdera a sua
dignidade por ciúmes da sua mulher amada...
Stela ouvia a todos com a sua imparcialidade tão necessária ao
exercício daquela profissão, mas nunca se esquecia da sua maior motivação
em se tornar uma juíza especializada em violência doméstica e familiar
contra a mulher, que era lutar pela igualdade dos gêneros, contra o
machismo e a misoginia tão arraigados em nossa sociedade patriarcal.
Após toda aquela longa audição, Stela se retirou, juntamente com
todos os membros do júri, acompanhados do promotor e da defensoria para
procederem a votação de cada quesito que eram as partes seccionadas pela
magistrada, dos autos do processo.
O júri votou quesito por quesito e foi unanime. O réu foi
condenado a pena máxima e retornaria para a cadeia para assim, cumprir a
sua pena pelo crime cometido contra a sua própria mulher, a mãe de seus
filhos...
O julgamento havia sido longo e Stela só conseguiu sair do fórum
às dezoito horas. Naquele dia, como em tantos outros desde que se tornara
uma juíza de direito, ela voltava para a sua casa com a sensação de seu
dever cumprido. Aquele homem ficaria um bom tempo na prisão cumprindo
a sua pena. Infelizmente, esse fato não devolveria a vida da mulher, mãe de
três crianças pequenas que agora estavam condenadas a uma vida cheia de
incertezas, mas ao menos a justiça havia sido feita e os cidadãos haviam
tido uma resposta positiva, tão importante na luta pela igualde de gêneros e
justiça social.
Stela dirigia o seu sedan preto cuidadosamente, por aquele
trânsito não muito cheio, ouvindo Ravel. A música clássica a acalmava,
pois reforçava nela a sensação de que o ser humano podia ser belo, puro,
dotado de um poder criativo vigoroso, emocionante e não apenas almas
rastejantes perdidas em um umbral obscuro como aquele assassino que
julgara naquele longo dia...

***
Capítulo 3

Eram sete horas da noite de sábado e as duas mulheres se mexiam


naquele apartamento, preparando-o para receber a namorada de Enrico.
Enquanto Lúcia dava andamento ao cardápio que iria ser degustado, Stela
preparava a mesa de jantar organizando os pratos, talheres, guardanapos e
outros detalhes. Ela queria que tudo ficasse perfeito para agradar o seu filho
que parecia estar apaixonado pela moça.
Às oito horas, Stela ouviu um barulho vindo da porta de entrada
do seu apartamento, ela então se virou, com uma taça de vinho na mão para
ver finalmente, quem era a jovem que havia sequestrado o coração do seu
amado filho.
A moça entrou contida, seguida por Enrico. Stela a observou do
alto da cabeça até os pés, depois retornou para a bela face daquela criatura.
Quando finalmente conseguiu olhar em seus olhos, pode ver que eram
grandes, profundos e verdadeiros. A mulher sorriu para a moça e caminhou
até ela para cumprimenta-la.
__ Mãe, essa é a Lorena, minha namorada. __ Disse Enrico.
__ Boa noite! __ Stela estendeu a sua mão na direção da linda
jovem simpática que sorria para ela.
__ Lorena, essa é a minha mãe, Stela.
__ Boa noite! __ A moça tocou as pontas dos dedos da mulher
imponente à sua frente. Ao sentir o calor e o aperto de mão firme da mãe do
seu namorado, ela teve imediatamente, uma sensação de conforto e
segurança.
__ Quando Enrico disse que você era linda, eu não imaginei que
fosse tanto. __ Observou a juíza, ainda segurando firme a mão suave
daquela garota.
__ Obrigada! __ Disse a jovem, um pouco retraída diante da
mulher que capturava toda a sua atenção.
Stela soltou a mão de Lorena para dar-lhe um abraço e um beijo
na face, sentindo o cheiro agradável que exalava da moça encantadora.
Quando finalmente elas se soltaram, Enrico falou:
__ Mãe, quando eu disse que você era uma juíza, ela quase
desistiu de vir.
__ Ora, mas por quê? __ Perguntou Stela, sem entender.
__ Ela ficou com medo. __ Enrico ria da cara de Lorena.
__ Imagina! Nós, juízes, somos pessoas normais. Somos mortais,
assim como todos os demais.
__ Eu acho que ela está com medo de ser presa, mãe. __
Continuava Enrico, se divertindo com a situação da namorada.
__ Não é isso! É que... Eu nunca estive diante de um juiz ou uma
juíza antes. Eu não sei nem mesmo que pronome de tratamento eu devo
usar! __ A garota conseguiu arrancar uma gargalhada de Stela.
__ Pronome de tratamento? Que tal “você”? Não estamos em um
tribunal! Não precisa de nenhum tratamento formal aqui, imagina! __ A
mulher estava adorando tudo aquilo.
__ Viu, sua boba! A minha mãe não vai te prender. __ Continuava
o rapaz, tirando sarro da namorada encabulada.
__ Enrico, para! __ Pediu a moça, pois não queria passar uma
falsa ideia de que era uma boboca.
__ Mãe, vejo que você já abriu o vinho. Lorena, você aceita uma
taça? __ Enrico mudou o rumo daquela conversa, pois não queria deixar a
namorada chateada.
__ Sim! __ Lorena ainda olhava para aquela mulher que parecia
magnetiza-la com a sua forte presença.
__ Venha, vamos nos sentar. Eu quero conhece-la melhor. __
Convidou Stela, pegando, mais uma vez em uma das mãos de Lorena. As
duas se sentaram nas almofadas de um dos sofás daquela ampla sala e se
voltaram inteiramente uma para a outra.
__ Conte-me, o que você faz? Você também estuda? __ Perguntou
Stela, animada.
__ Eu estudo. Eu faço Psicologia. __ Respondeu Lorena.
__ Psicologia? Excelente! Está gostando do curso? __ A juíza
fitava aqueles grandes olhos castanhos e via neles profundidade e verdade.
__ Estou amando! Estou terminando já. Faço o último ano.
Lorena sentia o perfume gostoso que vinha daquela mulher,
notando que os seus olhos eram muito parecidos com os de Enrico, eram
cor de mel também e estava sendo para ela impossível se desvencilhar
deles. A impressão que ela estava tendo era que estava diante de uma
esfinge com um tesouro de valor incalculável por dentro, mas não sabia se
possuía a chave para acessa-lo.
__ Está terminando? Que maravilha, daqui a pouco você já tem
seu consultório! __ Falou Stela, sorrindo.
Enrico retornou com duas taças de vinho tinto, entregou uma
delas a Lorena e se sentou no braço do sofá, por trás dela, colocando uma
de suas mãos por sobre os seus ombros. A jovem provou do vinho sentindo
o seu gosto suave, depois o engoliu e imediatamente percebeu a sensação
agradável em seu corpo, provocada pelo álcool contido na bebida.
__ Ha quanto tempo vocês namoram? __ Quis saber Stela antes
de bebericar do vinho que estava em sua taça.
__ Ha três meses, não é amor? __ Perguntou Enrico.
__ Ah... Eu acho que sim! Eu sou péssima com datas!
__ Onde vocês se conheceram?
Stela queria saber de tudo, ela estava encantada com o belo casal
à sua frente. Percebeu que o seu filho estava realmente apaixonado por
aquela linda garota, pois o tratamento que ele dispensava a ela era
extremamente cuidadoso e carinhoso. Não sabia ao certo se havia
reciprocidade por parte dela, mas da parte dele, estava muito evidente a
entrega.
Em um dado momento, Lúcia veio até a sala e avisou à juíza que
estava tudo pronto. Stela então convidou os dois jovens a passarem para a
sala de jantar para degustarem os pratos preparados pela sua funcionária.
Stela tinha que contar com Lúcia na cozinha, pois ela não sabia cozinhar
quase nada, só o básico do básico. A sua vida inteira tinha sido dedicada
aos estudos e depois à sua carreira jurídica. É claro que ela pagava os
adicionais à sua funcionária que até gostava de ser chamada para aquele
tipo de serviço, pois sabia da gorda recompensa que receberia depois.
O jantar transcorreu normalmente, e os pratos, como sempre,
estavam muito saborosos, pois Lúcia era daquelas mulheres que sabiam
cozinhar de verdade. A funcionária conseguia elaborar receitas finas, era
uma verdadeira chef e não tinha ninguém que não elogiasse a sua comida.
Depois do jantar, os três se levantaram satisfeitos da mesa e Stela
começou a juntar a louça, pois pretendia ajudar a funcionária a organizar a
cozinha, antes de dispensá-la.
__ Quer ajuda? __ Perguntou Lorena.
__ Imagina! Não precisa minha linda. A Lúcia e eu damos conta
de tudo. Pode ficar à vontade neste apartamento. A casa é sua. __
Respondeu a juíza, dando continuidade à organização da mesa.
__ Lorena, vamos ver um filme. __ Chamou Enrico, estendendo
uma de suas mãos à sua namorada.
__ Ah, tudo bem! __ A moça ainda observava a mulher que dava
continuidade a sua tarefa de juntar aquelas louças e talheres que haviam
sido usados por eles.
Após organizarem a cozinha deixando-a perfeita, Stela chamou
um Uber para levar a sua funcionária em casa com segurança, depois ela
encheu mais uma vez a sua taça com aquele excelente vinho e foi curtir um
pouco a noite, em sua varanda.
Recostada, confortavelmente em um chaise que havia ali naquela
sacada, a juíza se pôs a pensar em seu passado. Habitualmente, ela era uma
mulher focada no presente, pois a sua dedicação integral à carreira de
magistrada, não lhe oportunizava uma eventual fuga de sua realidade, mas
naquela noite especificamente, sem explicação, ela se pôs a pensar em um
amor antigo, uma namorada que marcara a sua vida...

...Ao ingressar na faculdade de Direito, Stela então, com dezoito


anos de idade, se apaixonou perdidamente por uma colega de curso. Elas
namoraram secretamente por anos, pois não tiveram coragem de
assumirem-se para os seus pais que eram extremamente conservadores,
pertencentes à classe média alta da sociedade.
Em uma noite fatídica, Stela, já no quarto período do curso, saiu
da biblioteca às vinte horas e caminhava pelo campus em direção ao seu
apartamento que era próximo à universidade quando de repente, foi
interceptada por um homem desconhecido que a agarrou pelas costas e a
arrastou para trás de uns arbustos e ali, a imobilizou, a estuprou
rapidamente e após, saiu correndo, deixando-a ali, deitada, tentando
processar o que havia acontecido...
Passados uns dois meses, notando que a sua menstruação não
descia, a jovem Stela resolveu comprar um teste de gravidez em uma
farmácia e descobriu que esperava um filho. A garota que ela namorava não
acreditou em sua história e terminou o relacionamento a acusando de
mentirosa, pois ela não havia denunciado o seu agressor, mantendo-se em
um silêncio absoluto até então.
Ao longo daqueles vinte e quatro anos Stela se perguntava porque
não denunciou aquele homem para as autoridades na época e a única
resposta que ela obtinha de si mesma era “vergonha alheia”! Sim, Stela
sempre fora dotada de um senso de justiça gigantesco e o ato daquele
homem desconhecido lhe causou vergonha de pertencer à raça humana.
Obviamente hoje, ela, como uma juíza de direito rechaçava toda e qualquer
violência contra a mulher, encorajando-as a denunciar os seus agressores,
talvez exatamente porque ela mesma não o fez quando fora uma vítima.
Quando ela contou o acontecido aos seus pais eles quiseram que
ela abortasse, mas ela não teve coragem e decidiu se afastar deles para
poupá-los da convivência com a sua situação vergonhosa. Stela não sabia
explicar porque não havia seguido o conselho dos seus pais, mas foi o que o
seu coração lhe ditou na época, o que a fez acabar por se decidir em ter a
criança.
Quando Enrico nasceu, Stela entendeu finalmente porque o seu
coração não havia lhe permitido fazer o aborto, pois ele era a sua cópia
fidedigna em uma versão masculina. O seu filho não se parecia com ela
apenas no aspecto físico, ele era idêntico a si também na sua forma de ser, o
que lhe tocava de uma forma que ela agradecia todos os dias por ter
atendido o seu coração e não ter matado aquele ser que lhe trazia tanta paz
de espírito.
Agora ela se encontrava ali, pensando em tudo que lhe acontecera
ha mais de vinte anos atrás, revendo os seus posicionamentos e constatando
mais uma vez, que agira corretamente e que a única coisa que faria
diferente era quanto a sua atitude perante o seu estuprador, o pai do seu
amado filho. Ela o mandaria para a prisão até para poupar outras mulheres
da sua atitude repudiável.
Quando pensou em sua antiga namorada, mais uma vez, Stela
teve saudades do seu corpo que lhe proporcionava tanto prazer, mas
questionou novamente, o seu frágil amor. No momento em que ela mais
precisou de sua compreensão, aquela moça que tanto amava lhe julgou da
pior maneira possível, lhe atirando em um poço de vergonha que ela acabou
por jamais sair de lá, pois nunca mais conseguiu se relacionar com
ninguém, permanecendo em uma total e completa solidão.
Obviamente, ela, por ser uma mulher bonita, foi cortejada
inúmeras vezes pelos homens corajosos que ousaram chegar até a
magistrada, mas eles sempre obtiveram uma resposta negativa de sua parte,
pois ela nunca teve o menor interesse neles, o seu olhar de cobiça sempre se
direcionava às mulheres, mas não conseguia se relacionar com elas porque
ela sempre se manteve em seu seguro e imaculado “armário”, porém frio,
desconfortável e incompleto...

...No quarto de Enrico, os dois jovens viam um filme que estava


um tanto quanto desinteressante para Lorena, pois ela não conseguia parar
de pensar na mulher que se encontrava em algum lugar daquele
apartamento, a mãe do seu namorado. Ela pensava em seus profundos olhos
que pareciam querer esquadrinha-la por dentro, desnudando-a com sua
perspicácia. Teve vontade de procurar por ela para beber mais um pouco da
sua fonte, mas achou melhor não, pois poderia passar a impressão de que
era invasiva e tudo o que ela não queria era parecer inconveniente.
A jovem pensou no aperto de mão firme da juíza, do cheiro
agradável que sentiu quando a abraçou, assim que chegou naquele
apartamento. Aqueles pensamentos involuntários chegavam ao seu
consciente e lhe tiravam a concentração necessária para entender aquele
filme que passava diante dos seus olhos.
Quando finalmente terminou aquela longa película, Lorena disse:
__ Enrico, preciso ir, já está tarde.
__ Dorme aqui, amanhã é domingo e você não terá nada para
fazer.
__ Melhor não! É a primeira vez que eu piso aqui, não posso fazer
isso. __ O que Lorena não queria era passar uma impressão negativa ao seu
respeito para Stela.
__ Nada a ver! Você não precisa dormir aqui, na minha cama, se
essa é a sua preocupação. Nós temos quarto de hóspedes! __ Insistiu
Enrico.
__ Eu prefiro não fazer isso hoje, fica para uma próxima vez, tá!
__ Tá bem! Você é muito desconfiada, sabia? __ Observou o
rapaz, já se sentando no colchão para calçar os seus sapatos.
__ Não é isso, apenas não quero parecer espaçosa!
Quando os jovens passaram pela sala, Lorena procurou pela sua
sogra, mas não viu nenhum sinal.
__ Você quer se despedir da minha mãe? __ Perguntou Enrico.
__ Melhor não, ela já deve estar deitada!
O casal então saiu do apartamento e se foi.

***
Capítulo 04

No dia seguinte, Stela se levantou da cama e foi para a cozinha


preparar um café. Depois de um tempo, a juíza sorvia aquele delicioso
líquido preto da sua xícara e comia uma torrada quando viu Enrico chegar
naquela peça e se aproximar para lhe dar o habitual beijo em sua cabeça
pela manhã.
__ Bom dia! __ Cumprimentou ela.
__ Bom dia mãe!
__ Eu acabei não me despedindo da Lorena ontem, eu não a vi
sair.
__ Ela não foi embora muito tarde, mas acho que você já estava
dormindo. __ Enquanto falava, Enrico pegava uma jarra de suco na
geladeira e a trazia para a mesa.
__ Ela é linda, meu filho, Perfeita! Que presença! E além de tudo,
ela me pareceu uma jovem muito sensata e inteligente. Está aprovadíssima
para o cargo de minha nora! __ Stela falava todos aqueles adjetivos porque
realmente havia ficado fascinada com a beleza e o jeito equilibrado da
namorada do seu filho.
__ Eu a convidei para dormir aqui, mas ela não quis. Em suas
próprias palavras, ela não queria parecer espaçosa! __ O jovem falou a
última palavra virando os olhos. A sua namorada podia muito bem ter
aceitado dormir ali, não via nada demais nisso.
__ Imagina Enrico, vocês podem ficar à vontade. Este
apartamento é nosso filho e você tem total liberdade aqui. Eu só te
aconselho a usar preservativos, pois uma criança agora iria atrapalhar os
estudos de vocês dois.
__ Ah... Quanto a isso você pode ficar despreocupada, eu não
estou gastando dinheiro com preservativos atualmente, se é que me entende.
__ O jovem ficou um pouco desconsertado e pegou uma torrada,
besuntando-a com uma geleia de morango que estava sobre a mesa para
dar-lhe uma mordida generosa. Ele conversava sobre tudo com a sua mãe,
pois os dois eram muito amigos, mas aquele assunto específico o deixava
um tanto quanto desconfortável.
__ Não entendo não. Do que você está falando? __ Perguntou a
mulher, sem compreender o que o seu filho tentava lhe dizer.
__ Bom, não estou precisando de preservativos no momento,
porque a Lorena não quer... Fazer sexo comigo. Entendeu agora? __
Respondeu o rapaz, bastante desgostoso.
__ Ah, é isso? Ora filho, cada mulher tem seu tempo. Talvez ela
ainda não se sinta segura ao ponto de se deitar com você. É preciso dar
tempo a ela.
__ Não sei mãe, mas eu não estou acostumado com isso. Em
todos os meus relacionamentos anteriores, sempre houve sexo. Acho que é
natural, não? __ Enrico realmente não estava se sentindo confortável
naquela situação. Já havia conversado com a namorada sobre o assunto
várias vezes, mas ela não cedia, inclusive deixava-o à vontade para terminar
tudo se essa fosse a vontade dele. Acontece que ele estava apaixonado e não
queria terminar com ela de forma alguma, mas também não estava sabendo
lidar com a falta de sexo.
__ É por isso que eu te disse Enrico, cada mulher tem seu tempo,
você precisa saber esperar. Por favor, não force a barra com ela, seja gentil!
__ É claro que eu não vou forçar nada mãe! Mas só que... Não
gosto de me gabar, mas eu tenho sexo a qualquer momento que eu quiser,
basta eu dar um telefonema.
__ É sério isso? Você namora a Lorena e faz sexo com outra
garota? Que sentido isso faz Enrico? __ Stela se assustou com o próprio
filho. Ela não teria criado um cafajeste, teria? Pensou.
__ Para mim faz muito sentido, porque eu gosto de sexo e não sei
viver sem. Sinceramente, não sei como você consegue!
Stela estudou a face do filho processando o que ele acabara de
falar, tentando encontrar algo para dizer em sua defesa, mas não conseguiu
encontrar nada, permanecendo em silêncio. De fato, ela nem se lembrava
mais de como era fazer sexo e até mesmo de como era dar um beijo na
boca. Ela vivia em uma clausura que ela mesma havia se imposto, passando
pela vida como uma ermitã. E aquele aspecto da sua vida, pelo que parecia,
não passava despercebido ao seu filho que agora a questionava.
__ Desculpe-me mãe, mas é o que eu penso. Não sei por que você
não tem ninguém! Por que mãe? Por que você vive sozinha? __ Quis saber
o filho, pressionando a mãe mais frontalmente sobre o assunto que lhe
incomodava, e muito.
__ Por que estamos falando de mim agora, sendo que estávamos
falando de você até agora a pouco? De repente eu virei a pauta? __ Stela
não gostava de falar dos seus sentimentos, se sentia exposta, desprotegida.
__ Não fuja do assunto dona Stela! Por que você vive sozinha?
Será que não tem nenhum um homem digno de você nessa terra? __
Perguntou Enrico, fitando a mãe nos olhos.
__ É uma escolha pessoal meu filho. Eu me casei com a
magistratura e não me sobra tempo para pensar em mais nada. __ O
trabalho para aquela mulher era a sua sublimação perfeita. Nele, ela investia
toda a sua energia, a sua vontade, a sua potência, por isso ela era tão
respeitada no meio jurídico.
__ Isso não faz o menor sentido mãe! Se isso fosse verdade, todos
os juízes teriam que fazer voto de castidade, no entanto, praticamente todos
são casados. __ Enrico tinha vários professores em seu curso de Direito que
eram juízes e todos, ou quase todos, ostentavam as suas grossas alianças
pesadas em seus anulares esquerdos, revelando o seu estado civil.
__ Filho, como eu já te disse, eu me decidi por ficar sozinha e
pelo que eu saiba, isso não é ilegal! Ou é?
__ Mãe, você é uma mulher bonita, é inaceitável isso! __
Continuou o filho em sua investida. Ele realmente não entendia a vida
solitária que aquela mulher levava e aquilo de fato, o deixava muito
chateado.
__ Obrigada pelo elogio, mas eu sou livre para viver da forma
como eu quiser!
__ Tá bom, eu só quero que você seja feliz porque eu te amo dona
Stela! __ O jovem deu-se por vencido e afagou uma das mãos de sua mãe
que descansava por sobre a mesa. Aquela mulher era irredutível!
__ Mas quem disse que eu sou infeliz Enrico? Eu sou uma mulher
realizada, de verdade! Primeiramente porque eu sou mãe de um rapaz
maravilhoso! Carinhoso, educado, estudioso, cheio de qualidades que me
deixam muito feliz. Segundo, eu sou realizada em meu trabalho e sabe por
quê? Porque eu amo o que eu faço e eu não me vejo fazendo outra coisa
nessa vida. A profissão que eu escolhi pra mim, me enche de orgulho por eu
poder fazer algo realmente bom para a sociedade. __ Discursou a
magistrada, radiante, pois era exatamente o que sentia, embora, bem no seu
íntimo, ela sabia que os questionamentos do seu filho eram verídicos, pois
ela era ciente de que ninguém é feliz por inteiro sem um amor carnal,
palpável e verdadeiro. Isso era inegável...

***
Capítulo 05

Lorena estava no último ano do seu curso de Psicologia, portanto ela já


estava no momento do seu estágio obrigatório. Ela havia optado por fazer
aquela etapa da sua formação profissional em uma clínica que pertencia a
um dos seus professores e que inclusive era também, o seu psicanalista. Ela
havia iniciado a sua terapia porque uma das recomendações ao final do seu
curso era que os estudantes passassem pelo processo terapêutico, porque só
assim se tornariam profissionais melhores e mais bem qualificados para
exercerem a sua profissão.
Como estagiária, ela podia ter acesso às sessões de análise e dos
estudos dos casos, tão necessário à ajuda ao paciente. Ela permanecia
naquela clínica o dia inteiro realizando o seu estágio, mas às vezes, ela é
que era a paciente e naquele dia específico, uma quinta-feira para ser mais
exata, ela tinha a sua hora com o seu professor, psicanalista e supervisor, o
Dr. Willian Santiago.
__ E então Lorena, como você está? __ Perguntou Dr. Willian,
iniciando a sessão. Ele era um homem maduro, com os cabelos grisalhos,
um pouco desgrenhados e parecia ter saído de um filme do Woody Allen,
com o seu figurino caqui amarronzado. O seu aspecto era de um intelectual,
e ele era realmente uma verdadeira enciclopédia ambulante. Sabia tudo de
Freud, Lacan, Jung e outros teóricos da Psicanálise. Aquele professor era
uma fonte inesgotável de conhecimento e aquela sua aluna-paciente tinha
uma enorme admiração por ele e não perdia uma só oportunidade de beber
daquela fonte de saber.
__ Eu estou bem! No último final de semana, eu conheci a mãe do
meu namorado... Ela é uma mulher incrível e foi muito gentil comigo... Ela
é uma juíza de direito, sabe? Daquelas que usam um martelinho de madeira
para bater na mesa! __ Riu __ a gente se deu muito bem... Ela se chama
Stela... Stela Grecco. Ela é uma mulher muito bonita... Não é velha, é jovem
ainda... Deve ter uns quarenta e tantos anos...
O consultório de Dr. Willian era um tanto quanto tradicional, pois
tinha um confortável divã bordô no centro da ampla sala, uma poltrona
robusta que era ocupada por ele e seu caderno de anotações onde ia
registrando as impressões que formulava através da análise que ia fazendo
das falas exprimidas pelos seus pacientes. As sessões eram gravadas para os
posteriores estudos e conclusões acerca do caso.
__ E o seu namorado?
__ Bom, o Enrico... Me pressiona muito... Ele quer muito fazer
sexo comigo, mas eu não me sinto preparada... É constrangedor para mim o
que eu vou dizer agora, mas... Eu nunca fiz sexo de fato, com ninguém...
__ Como assim, de fato?
__ Bem é que... Eu já fiquei com garotas e a gente se fazia alguns
carinhos mais ousados... Mas não era sexo, era apenas uma... Brincadeira...
Agora sexo mesmo, com um homem, eu nunca fiz... Quer dizer, eu nunca
fui penetrada por um pênis masculino, entende?...
__ Lorena, quando ficou com outras garotas, você chegou a ser
penetrada por elas? Teve sua vagina manipulada? Houve sexo oral entre
vocês? __ Perguntou o psicanalista.
__ Sim, houve tudo isso, mas... Pra mim não passou de uma
curiosidade, entende?
__ Você chegou a ter orgasmos com elas? __ Perguntou mais uma
vez, o professor, anotando simultaneamente, em seu bloco de papel.
__ Sim, tive...
Lorena já havia ficado com algumas garotas, mas ela não sentia
que era algo sólido. Ela encarava os relacionamentos esporádicos que tinha
com mulheres como uma extravagância, um passatempo. É claro que havia
o desejo, o tesão, mas não parecia ser legítimo para ela. Ela aguardava o dia
em que teria uma atração real por um homem ao ponto de querer se entregar
a ele. Ela queria se casar, ter filhos, formar uma família, mas só que o
homem ideal e perfeito para o seu intento ainda não havia chegado. Enrico
era um homem excelente, mas o seu problema era a sua libido que era
muito alta. Ele deveria ser mais tranquilo quanto ao assunto sexo, não?
Pensava ela.
__ Lorena, sexo para você é um tabu? __ Perguntou Dr. Willian
com a sua voz pausada.
Lorena ouviu a pergunta e respirou fundo antes de falar.
__ Tabu? Bem... A minha família é bastante religiosa... A minha
mãe é um tanto quanto autoritária e o meu pai é um pouco... Alheio... Não é
que eu não os ame, eu amo os meus pais, mas não me sinto à vontade pra
conversar sobre tudo com eles... Eles não me entenderiam... Na verdade, eu
me sinto meio antiquada quando vejo outras garotas da minha idade... Elas
são mais livres... Eu me sinto muito atada... Eu queria ser mais autêntica,
mais corajosa...
__ Você já se apaixonou por alguém?
__ Já! Quando eu era uma adolescente, eu me apaixonei por
uma... Professora, mas não tive coragem de me declarar. __ Lorena riu, pois
nunca havia admitido aquilo para ninguém, era a primeira vez que dizia
com todas as letras que fora apaixonada por uma mulher.
__ Você já considerou a hipótese de ser homossexual?
__ Não!... Não acho que eu seja, pois eu sonho em ter uma
família, filhos... __ Respondeu a jovem deitada no divã bordô, se auto
afirmando, categórica, ante aquela pergunta desconsertante.
__ Lorena, você já ouviu falar no termo “heterossexualidade
compulsória”?
__ Sim, já ouvi, mas não acho que seja o meu caso.
__ Por que não?
__ Porque eu não me sinto obrigada a me relacionar com homens.
Eu me relaciono com eles porque eu quero.
__ Lorena, nem sempre o nosso querer está ligado a nossa
verdade inconsciente. Às vezes o nosso querer está atrelado ao modo como
fomos educados ou às convenções sociais...
Dr. Willian ia anotando em seu caderno tudo de relevante que
conseguia captar na leitura que fazia do que estava implícito nas falas da
sua jovem paciente. Muitas vezes, aquele experiente psicanalista chegava
primeiro à verdade impressa no inconsciente do seu paciente ou da sua
paciente, e tinha que conduzi-lo ou conduzi-la com sabedoria, à sua
libertação. Era um exercício de paciência e muito profissionalismo.
__ Lorena, o nosso tempo acabou por hoje, mas eu quero que
você pense no termo “heterossexualidade compulsória”. Se precisar,
pesquise, leia tudo o que você encontrar sobre este fenômeno psíquico e
social, ok!
__ Tudo bem Dr. Willian, eu vou fazer isso. __ Lorena se
levantou do divã e se encaminhou para a porta de saída daquela sala,
deixando para trás, o seu psicanalista, ainda rabiscando alguma coisa em
seu bloco de papel.
Do lado de fora do consultório, Lorena respirou fundo e
caminhou até a cozinha da clínica para tomar um copo de água. Se abrir
assim, totalmente para alguém sobre a sua sexualidade um tanto quanto
confusa, não era uma tarefa fácil, pois eram informações que até então, só
ela tinha acesso, mas que agora ela punha para fora porque sabia que, se
não fizesse isso, não se permitiria ser analisada e confrontada com as suas
verdades. Ela tinha consciência que seria um processo árduo, mas
necessário à sua completa formação. Ela sabia que não seria uma boa
psicóloga se não enfrentasse os seus próprios demônios...

***
Capítulo 06

Mais um fim de semana chegou e Lorena era retirada de seus estudos


para cumprir o seu papel de namorada. Enrico era persistente em seu intento
de se aproximar cada vez mais daquela garota.
Naquele dia, o casal estava novamente no quarto do rapaz vendo
mais um filme, quando ele se voltou para a namorada e iniciou um beijo
profundo, introduzindo a sua língua dentro da boca dela. Depois o jovem
arrastou uma de suas mãos que estava naquele rosto de pele macia,
descendo até um dos seios da moça, apertando-o levemente por cima do
tecido da blusa. Em seguida, prosseguindo com o assalto, o rapaz desceu
com aquela mão quente até a coxa da jovem e começou a arrasta-la por
debaixo do tecido da saia que ela usava. O seu objetivo era chegar até o
sexo da garota, mas teve a sua mão agarrada com firmeza.
__ Para, Enrico! __ Lorena respirou fundo, percebendo o membro
rijo do namorado que havia se avolumado por debaixo do tecido de sua
calça.
Enrico bufou, e se levantou bruscamente da cama. Caminhou até
a janela, passou as mãos pelos cabelos castanhos e ali ficou por alguns
longos segundos, vislumbrando a paisagem urbana através da vidraça, em
silêncio, depois se voltou para a namorada que permanecia sentada na cama
e falou:
__ Lorena, isso não faz sentido pra mim! Você só pode ter um
problema! Desculpe-me, mas é o que eu penso. __ Enquanto falava, o
jovem gesticulava as suas mãos, demonstrando a sua impaciência com
aquela situação descabida.
__ Enrico, nós já conversamos sobre isso! Eu não quero ainda e
você vai ter que me entender! __ A moça se sentia pressionada, mais uma
vez, porém manteve-se firme no seu propósito de não ceder.
__ Eu vou tomar um banho gelado pra esfriar a cabeça! __ Falou
o rapaz se retirando para o banheiro. Ele estava ao ponto de subir pelas
paredes, pois estava apaixonado por Lorena e tudo o que queria era
consumar o ato com ela, mas lembrou-se de sua mãe pedindo a ele para ser
gentil com a garota e era exatamente o que ia fazer, ao menos enquanto
aguentasse aplacar aquele tesão desmedido que sentia por sua namorada.
Depois que Enrico entrou para o banheiro, Lorena se levantou da
cama, saiu daquele quarto e caminhou pelo apartamento até avistar uma
porta entreaberta que parecia dar em uma sacada. A moça andou até lá e
passou para aquele cômodo que de fato, era uma varanda que estava com as
luzes apagadas. Ela foi até ao resguardo de vidro e ali se debruçou para
observar a linda lua que brilhava imponente no céu, redonda, prateada,
fascinante! Ela permaneceu ali por alguns minutos mirando o astro,
sentindo a brisa fresca da noite bater em seu rosto até que o seu momento
de introspecção foi interrompido por uma voz.
__ Você também gosta da lua?
Ao ouvir a pergunta inesperada, a jovem se assustou e olhou na
direção que saíra aquele som, avistando a silhueta da mulher, sentada
confortavelmente em um chaise, segurando a haste de uma taça com o
líquido escuro pela metade.
__ Ai que susto! __ Disse a garota com os olhos esbugalhados.
__ Desculpe-me!
__ Eu que peço desculpas Stela, eu não sabia que você estava aí!
__ A moça ficou super desconsertada por ter invadido a paz daquela
mulher.
__ Não tem problema. Vem cá, sente-se aqui! __ Convidou Stela,
se ajeitando mais para o lado para que a jovem se acomodasse ao seu lado.
__ E o Enrico?
__ Ele está tomando um banho! __ A moça se sentou próximo à
mulher e se recostou nas confortáveis almofadas que haviam ali.
__ Quer um pouco de vinho?
__ Aceito! __ Respondeu a jovem.
__ Vou buscar uma taça para você. __ Stela iniciou o movimento
para se levantar, mas foi contida.
__ Não, nem pensar! Você não vai se levantar daí para buscar
nada para mim! __ Lorena segurava o braço da juíza, impedindo-a de se
levantar. __ Eu mesma vou! __ Completou.
Stela olhou para a mão firme da moça apertando o seu antebraço e
desistiu de se levantar.
__ Tudo bem!
Lorena foi até a cozinha e retornou alguns minutos depois. A
jovem sentou-se novamente e estendeu a taça para ser servida pela mulher.
Stela despejou um pouco do vinho ali e após, depositou novamente a
garrafa dentro de um balde de gelo que estava sobre uma pequena mesa ao
seu lado.
__ Obrigada! __ Agradeceu Lorena antes de provar da bebida.
__ Você e o Enrico estão bem? __ Perguntou Stela depois que
voltou a se recostar confortavelmente nas almofadas do chaise.
__ Estamos bem, mas ele está um pouco... Afoito!
Stela se lembrou da queixa do filho sobre a recusa da namorada
em se deitar consigo, entendendo exatamente o que ela tinha dito e riu da
pressa do filho.
__ Os rapazes são assim mesmo. Geralmente eles encaram um
namoro como um game em que eles têm que avançar nas fases até zerar o
jogo, e o meu filho não é diferente disso. __ Constatou a juíza.
__ É, mas... Uma vez zerado o jogo, ele perde o seu encanto. __
Lorena havia entendido perfeitamente a analogia da juíza.
__ E esse é o seu objetivo? Manter o encantamento do seu
namorado?
__ Não! Mas isso é o que acontece sempre! Pelo menos é o que
eu percebo ao meu redor. __ Respondeu a moça.
__ Bom, se não é isso, então em que se baseia a sua recusa? Eu te
faço essa pergunta porque vejo que o sexo se tornou algo normal entre os
casais de namorados hoje em dia!
Stela queria entender a recusa de Lorena em se deitar com o seu
filho, afinal, ela tinha que admitir que era uma postura um tanto quanto fora
de moda daquela jovem. Todos os casais de namorados faziam sexo, ela
sabia disso, e ninguém mais ligava para esse fato. Sexo, finalmente, havia
se tornado algo natural, não era mais um pecado como fora visto no
passado.
__ A minha recusa se baseia no meu querer! Parece até que estou
cometendo um crime!
__ Não! Eu não acho isso. Você é livre para fazer ou deixar de
fazer o que quiser! Nós não somos obrigadas a nada Lorena! __ A juíza
falou com convicção, pois se existia algo que a sua profissão lhe ensinava
todos os dias, é que as mulheres são muito subjugadas nessa sociedade
patriarcal e tudo o que ela podia fazer para ajudar na sua libertação, ela
fazia.
Stela era uma juíza de carreira que atuava especificamente na vara
especializada em violência doméstica e familiar contra a mulher, portanto,
estava sempre diante do tratamento desumano que a sociedade dispensa às
mulheres, principalmente àquelas advindas das camadas sociais mais
desfavorecidas.
__ Obrigada por me entender Stela! __ Agradeceu a jovem,
tocando mais uma vez o antebraço da juíza.
A mulher sentiu o toque da garota em seu braço, como se
estivesse sendo submetida a um choque elétrico que provocou em seu corpo
uma reação que não sentia ha tempos. A mão quente daquela moça parecia
que ia queimar a sua pele até que finalmente, depois de alguns segundos,
ela a retirou e Stela pode respirar para se recompor. Imediatamente, seu
filho veio em seus pensamentos e ela se repreendeu por ter tido aquela
reação ao toque da sua namorada.
De repente, a luz se acendeu e Enrico surgiu no campo de visão
daquelas duas mulheres recostadas confortavelmente, nas almofadas
daquele chaise.
__ Ah! Você está aí! Mãe, você está roubando a minha namorada?
__ Falou o jovem em voz alta.
Stela subitamente, sentiu as maçãs do seu rosto se queimando.
Parecia que ela havia sido pega no flagra. Tentou naturalizar o momento
rindo e tomando mais um gole do seu vinho, mas não sabia se estava
conseguindo alcançar o seu intento. A juíza se dava conta de que estava
totalmente constrangida.
__ Imagina filho, eu jamais faria isso com você! __ A sua fala que
saiu um pouco falha, só piorou as coisas. Como assim “eu jamais faria isso
com você”? É claro que não! Isso não precisava ser dito, pois já estava
implícito, não? Pensava a juíza, bastante aflita.
__ Estou te zoando dona Stela! __ Falou Enrico sorrindo,
despreocupadamente.
Lorena, que observava a juíza nos seus mínimos detalhes, não
deixou escapar a face extremamente corada daquela mulher. Por que ela
estava tão embaraçada? Perguntou-se.
__ Lorena, vamos sair! Vamos numa pizzaria eu estou com fome.
__ Voltou a falar o rapaz, totalmente alheio às reações da sua mãe.
__ Tudo bem! Vem com a gente Stela?
__ Hoje não! Em outro dia! __ Respondeu a juíza.
__ Tem certeza mãe? __ Perguntou Enrico.
__ Sim filho! Em outro dia nós podemos ir a um restaurante para
comermos uma comida de verdade!
Lorena apenas riu da fala da mulher.
__ Ah mãe, que injusto com as pizzas que são tão boas! __ Disse
Enrico em um tom zombeteiro.
__ São boas, mas não são pra mim meu filho! Não tenho mais
metabolismo para processar a gordura delas!
__ Falando assim parece que você é uma velha Stela, e você não
é. Você é tão jovem ainda! __ Lorena estava sendo sincera, pois para ela,
aquela mulher à sua frente era jovem, bonita e extremamente fascinante.
Stela fitou a moça e viu verdade naqueles grandes e profundos
olhos castanhos, o que a tocou profundamente.
__ Mãe, então estamos indo, tá! __ Falou Enrico, se curvando
sobre a mulher para beijar-lhe a cabeça.
Motivada pelo ato do namorado, Lorena também se aproximou da
mulher e também lhe deu um beijo na face, depois se levantou e saiu de
mãos dadas com Enrico.
Stela viu o casal de namorados sair de sua presença e respirou
fundo, sentindo-se aliviada. Lembrou-se das reações do seu corpo quando
foi tocada por Lorena e se repreendeu, mais uma vez. Deus, ela é a
namorada do meu filho! Pensou a mulher, sentindo-se culpada por não
conseguir dominar os seus pensamentos desgovernados...

***
Capítulo 07

No domingo, Enrico se despedia de Lorena, já na porta do apartamento


onde ela morava, dando-lhe um beijo arrastado.
__ Bom, então é isso! Amanhã irei cedo para o aeroporto, rumo a
Brasília. __ O jovem iria para a capital, em uma excursão com alguns
professores e colegas do seu curso para conhecerem o Supremo Tribunal
Federal e verem de perto algumas sessões da mais alta cúpula do Poder
Judiciário do país.
__ Hum... Vai conhecer os ministros do STF! __ Desdenhou
Lorena em um tom irônico.
__ Sim, é necessário, pois eles são os guardiões da Carta Magna
brasileira! __ Enrico estava empolgado com a viagem. Ele era um
apaixonado pelo Direito, assim como sua mãe e aquela oportunidade que
estava tendo de aprofundar-se mais no mundo jurídico, era imperdível para
o jovem.
__ Eu ficarei sozinha aqui nessa semana, pois o Léo terá que ir
em sua casa, a família dele está com um problema e estão querendo a
presença dele lá. __ Leonardo era um grande amigo de longa data de
Lorena e os dois dividiam aquele pequeno apartamento enquanto estavam
ali, naquela cidade universitária, cursando Psicologia na Federal.
Enrico era tranquilo com relação à sua namorada morar com o
Léo porque um dia, ainda bem no início do namoro, quando saia daquele
prédio, após deixar a jovem no apartamento, ele viu o rapaz aos beijos com
outro homem. Quando perguntou para Lorena sobre a orientação sexual do
amigo, ela confirmou a sua homossexualidade.
__ Por que você não dorme lá em casa? Aí você faz companhia à
minha mãe que também ficará sozinha, topa? __ Perguntou o rapaz,
acariciando o belo rosto da jovem.
__ Ah, não sei Enrico! Eu acho que eu não tenho liberdade com a
sua mãe ao ponto de dormir em sua casa. __ Respondeu a garota, pois por
mais que ela tenha se dado muito bem com a juíza, ela tinha um pouco de
receio dela, pois aquela mulher lhe parecia muito sisuda e reservada demais.
__ Que isso, a minha mãe gosta muito de você! Te acha linda,
sensata, inteligente! Conquistou a sogra, hem garota? __ Enrico falava em
um tom meio debochado, tentando arrancar mais um lindo sorriso da sua
namorada, conseguindo alcançar o seu intento, pois a via rindo largamente.
__ Eu vou pensar na sua proposta! Vou ver se eu crio coragem
para enfrentar a excelentíssima juíza...

...Eram cinco horas da tarde da segunda-feira, quando Lúcia que


já terminava os seus trabalhos naquele apartamento por aquele dia, ouviu a
campainha tocar. Quando ela abriu a porta, se deparou com a namorada de
Enrico segurando a alça de uma pequena maleta de rodinhas que
descansava ao seu lado.
__ Oi! Ah... O Enrico me convidou para ficar aqui essa semana
e...
__ Entra Lorena! A Dra. Stela me avisou que você iria vir pra cá
hoje. Eu já preparei o seu quarto. Venha! __ Lúcia estava sorridente e já
ciente de que aquela garota chegaria para ficar hospedada ali por aquela
semana. Stela havia pedido a ela para preparar tudo para a sua nora,
inclusive esperar, até que a jovem chegasse ali e só então, ir embora. E foi
exatamente o que a funcionária fez.
__ Obrigada! __ Agradeceu Lorena, entrando no apartamento e
seguindo aquela simpática mulher até o quarto de hóspedes, onde ela
ficaria.
__ Lorena, neste quarto tem um guarda-roupa vazio onde você
poderá guardar as suas coisas. Eu coloquei aqui, toalhas limpas, cobertas e
travesseiros, além dos que já estão na cama, caso você queira usar, tá! Você
terá de usar o banheiro social, pois aqui, neste quarto, não tem, mas ele fica
bem próximo daqui, como você já deve ter visto. __ A mulher bem disposta
e acolhedora, apresentava tudo para a jovem, organizadamente. __ Na
cozinha tem pães, biscoitos e na geladeira tem o que precisa para preparar
algo pra você, caso queira tomar um café, tá! Fique à vontade!
__ Nossa, muito obrigada! Eu vou ficar muito bem, obrigada
mesmo, viu!
__ Bom então é isso! Eu já vou indo, tá bom! Só estava
aguardando você chegar para te mostrar tudo. A Dra. Stela fez mil e uma
recomendações! Me pediu para te receber da melhor maneira possível! __
Falou a mulher, sorridente.
__ Obrigada, mais uma vez! Não tenho nem como retribuir,
nossa! __ Lorena se sentia imensamente agradecida pela calorosa recepção
daquela mulher que atendia a um pedido da juíza. Ela se sentiu reconfortada
e protegida.
Depois que Lúcia deixou o apartamento, Lorena pegou uma
daquelas toalhas macias e felpudas que haviam sido deixadas no guarda-
roupa pela funcionária e foi para o banheiro social, tomar um banho
relaxante.
Já de volta ao quarto de hóspedes, a jovem penteou os seus longos
cabelos úmidos e vestiu um pijama. Quando terminava de ajeita-lo em seu
corpo, ouviu três batidas na porta. A moça foi até lá e a abriu, visualizando
a juíza que parecia ter acabado de chegar do seu trabalho, pelas roupas que
estava usando. Um elegante terno social cinza escuro, camisa social branca
e scarpins pretos. Os cabelos castanhos estavam arranjados em um coque
um pouco frouxo.
Mais uma vez, Lorena sentiu a imponência emanada daquela
mulher. Parecia que a magistrada era revestida de uma autoridade que lhe
era natural e não imposta. A impressão que dava é que ela não precisava
falar nada e nem fazer nada para ser respeitada, pois o simples fato de
existir já lhe era suficiente para causar todo aquele impacto.
Stela, involuntariamente, percorreu todo o corpo de Lorena,
começando pelos seus enormes cabelos úmidos e foi descendo para a boca
rosada entreaberta, com o seu lábio inferior mais carnudo do que o
superior... Os seus olhos curiosos desceram mais, passando pelo pescoço e
chegando ao colo... Os seios cheios e arredondados da jovem pareciam
querer saltar para fora da camiseta de algodão justinha o que fez a juíza
engolir a própria saliva que produzira em sua boca... Os lumes cor de mel,
não pararam de descer, foram até o shortinho curtinho que deixava à mostra
as coxas torneadas e perfeitas daquela moça, fazendo a magistrada sentir a
sua respiração ficar pesada e curta.
Lorena sentiu um calafrio sob o olhar da mulher que parecia
querer despi-la das poucas roupas que estava usando.
__ Stela, e... Eu vou colocar uma roupa mais adequada. __
Balbuciou a jovem constrangida, tentando tapar-se com as suas mãos e
braços, pois parecia que ela estava sendo desrespeitosa em atender a juíza,
vestida daquele jeito.
A fala da moça acordou Stela do seu devaneio. Deus, o que estava
fazendo? Estava olhando para o corpo da namorada do seu filho? Onde
estava com a cabeça?
__ Não, imagina Lorena! Estamos só nós duas aqui, pode ficar à
vontade! Eu vim aqui para ver se está tudo bem com você e perguntar se
quer comer alguma coisa. Por favor, não se preocupe com roupa! __ A juíza
tentava parecer natural, mas sabia que tinha sido indiscreta ao observar o
corpo perfeito daquela jovem.
__ Bem, eu estava te esperando pra gente comer juntas. __ Lorena
ainda estava um pouco insegura diante da magistrada.
__ Você quer que eu peça algo para comermos? __ Perguntou
Stela.
__ Não precisa pedir nada, a gente faz alguma coisa aqui mesmo!
__ Mas eu sou péssima na cozinha! __ Informou a juíza.
__ Pode deixar que eu faço! Eu gosto de cozinhar, é só me
mostrar onde estão as coisas que eu preparo algo pra gente. __ Lorena
estava acostumada a cozinhar o que ela e Léo comiam à noite, depois que
chegavam em casa, então não seria problema nenhum para ela.
__ Vem cá então! __ Chamou Stela, caminhando em direção à
cozinha, seguida da moça.
Lá chegando, ela mostrou tudo o que tinha nos armários e
geladeira que estavam bem abastecidos. Ingredientes é que não iriam faltar
para aquela jovem preparar o que ela quisesse.
__ Por que você não toma um banho enquanto eu faço a nossa
refeição? __ Sugeriu Lorena.
__ Tudo bem! Você teve uma boa ideia! Eu vou tomar um banho
então! __ Disse a juíza antes de se retirar da cozinha.
Quando Stela chegou ao seu quarto, ela depositou sua bolsa por
sobre uma poltrona que tinha ali, passou as mãos pelo seu rosto, pescoço e
respirou fundo. Depois se lembrou do seu filho e mais uma vez, se
repreendeu por ter olhado daquela forma para o corpo da sua namorada. Ela
tinha que conseguir controlar os seus olhos dali por diante, ou então,
poderia ser mal interpretada por Lorena e a última coisa que ela queria era
que isso acontecesse. Seria desastroso!
A juíza pegou uma toalha e foi para o banheiro para tomar o seu
banho. Debaixo do chuveiro, mais uma vez Lorena surgiu em seus
pensamentos e contra a sua vontade, ela se imaginou beijando aqueles
lábios carnudos e rosados. Quando se deu conta do que estava pensando,
balançou a cabeça para se livrar daquela imagem que o seu inconsciente
havia criado. Maldição! Será que tinha sido uma boa ideia do seu filho
convidar aquela moça para lhe fazer companhia naquela semana? Deus!
Ao sair do banheiro, Stela foi até ao closet para pegar uma roupa.
Vestiu uma de suas camisetas brancas de malha de algodão e uma calça de
um tecido também de algodão, bem confortável. Soltou os seus cabelos que
iam até os ombros, ajeitou-os e passou a se preparar para retornar à cozinha.
A disciplina para aquela mulher, sempre havia sido algo fácil. O
autocontrole, o comedimento sempre foram as suas características
principais ao longo de toda a sua vida então, pensava ela, não iria ser tão
complicado conviver com aquela jovem durante aquela semana, era só ela
usar a sua velha forma de ser, mantendo-se um tanto quanto distante,
evitando troca de olhares, fechando-se em seu casulo habitual. Era isso,
nada demais! Sentindo-se organizada mentalmente, a juíza respirou fundo e
retornou à cozinha.
Quando Stela chegou naquela peça, avistou Lorena terminando de
montar os pratos com todo cuidado e atenção e novamente, os seus
teimosos olhos desceram pelo belo corpo da jovem. Não tinha jeito, eles
eram indomáveis!
__ Já terminou? __ Perguntou a mulher, espantada com a rapidez
da moça.
__ Sim! Por favor, enquanto eu acabo aqui, você poderia pegar o
suco que está na geladeira e dois copos pra gente? __ Pediu Lorena,
ajeitando os pratos e os talheres ao lado deles.
A juíza foi até a geladeira e viu uma jarra com suco de laranja.
Pegou-a e a trouxe para a mesa, juntamente com os copos.
__ Eu não acredito que você teve tempo de fazer esse suco
também, garota!
Lorena riu, adorando ser chamada de “garota” por aquela mulher.
Pareceu-lhe tão... Carinhoso.
__ Claro que sim! Eu sou rápida na cozinha! __ Gabou-se a
jovem, ainda sorrindo e finalmente concluindo a sua tarefa. __ Tudo
prontinho! Vamos nos sentar para experimentarmos então? __ Convidou a
jovem.
Stela se sentou seguida da moça que fez o mesmo.
__ O que você fez? __ Perguntou a mulher, curiosa, estudando o
prato que estava muito elegante.
__ Eu fiz sanduíche natural de pão sírio integral. Eu fiz pensando
em você que não gosta de nada gorduroso. __ Respondeu a moça, orgulhosa
de si mesmo, pois ela própria estava encantada com aqueles pratos
charmosos a sua frente.
__ Hum! Muito obrigada por se lembrar! __ Disse a juíza,
sorrindo para a jovem. __ Agora, eu estou louca para experimentar o sabor!
__ Então vamos! __ Lorena fez questão de esperar a mulher
provar primeiro para ver a sua reação.
Stela pegou o garfo e a faca e partiu um generoso pedaço, pois
estava com muita fome. Quando colocou o bocado em sua boca e começou
a mastiga-lo, ela sentiu a explosão de sabores. O sanduiche estava
suculento, com um tempero que tinha um gosto leve de ervas que a mulher
não soube denominar o que era, só sabia que estava delicioso. Quando ela
finalmente engoliu, limpou a sua boca com o guardanapo e falou:
__ Lorena, como você fez isso? Esses ingredientes estavam na
minha cozinha, você tem certeza?
A jovem riu largamente, feliz porque tinha conseguido agradar a
mulher a sua frente.
__ É claro que estavam! A única coisa que fiz foi juntá-los! __
Respondeu a jovem, fitando os lumes mel com os seus pares de olhos
profundos.
Stela sustentou aquele olhar por alguns segundos, mas se lembrou
da sua estratégia traçada antes, em seu quarto, cortando aquele momento
rapidamente.
__ E você, não vai comer? __ Perguntou.
Lorena baixou a cabeça, fatiou um pedaço do seu sanduíche e o
colocou em sua boca, sentindo os sabores que ela própria havia criado.
Após comer mais um pedaço daquele delicioso sanduíche, Stela
serviu os copos com o suco, pegou um deles e tomou um gole.
__ Hum, nossa! Este suco está delicioso também! Onde você
aprendeu a fazer essas coisas? __ Perguntou mais uma vez, a mulher
admirada, pois aquela jovem estava conseguindo surpreende-la por ter
conseguido, em tão pouco tempo, fazer uma refeição tão saborosa para as
duas.
__ Eu venho de uma família numerosa. A minha mãe tem muitas
irmãs e quando elas se juntam, elas passam horas na cozinha preparando as
comidas e as bebidas... Para mim, aqueles momentos sempre foram
mágicos. A impressão que dava, era que eu estava no meio de uma
convenção de bruxas. __ Respondeu Lorena, rindo largamente.
__ Eu admiro muito isso em você, porque eu não sei fazer nada na
cozinha. Quando eu tento fazer algo, é um desastre total! Na verdade, eu já
nem tento mais porque sei que o resultado não vai ser bom. __ Stela ria de
si mesma.
__ Mas você deve ser uma excelente juíza, porque você... Inspira
autoridade. A impressão que eu tenho é que você é uma pessoa muito
respeitada. __ Lorena tentou expressar exatamente o que sentia quando
estava diante daquela mulher.
__ Bem, acho que é necessário para o cargo que eu ocupo. Eu
tenho uma grande responsabilidade e preciso ter o respeito da sociedade
para exercer com propriedade, a minha função, entende?
__ Entendo, mas não é pesado? __ Perguntou Lorena.
__ Sim, é bem pesado! Mas eu amo o Direito e a Magistratura é
um sonho realizado então, o peso é suportável.
Lorena observava a juíza e sentia uma grande admiração por ela,
pois não era sempre que se deparava com uma mulher que exercia uma
função de tamanha importância na sociedade. Ela sabia que os cargos mais
importantes eram exercidos pelos homens, salvo raras e honrosas exceções,
e aquela mulher era, sem dúvida, uma exceção.
__ Stela, posso te fazer uma pergunta? __ Havia uma coisa que
Lorena não entendia, o porquê daquela mulher não ter ninguém e resolveu
arriscar __ mas acho que é um pouco indiscreta. __ Completou.
A juíza acabava de colocar mais um pedaço do delicioso
sanduíche na boca e o mastigava. Quando engoliu, ela novamente limpou os
lábios e disse:
__ Bem, então tome cuidado! Analise se você realmente pode me
fazer essa pergunta.
A resposta da magistrada soou como uma ameaça à garota que se
sentiu um pouco amedrontada.
__ Bom, você falando assim, me deu até medo e não sei se
realmente eu posso te fazer essa pergunta.
__ Infelizmente eu não vou poder te ajudar, pois eu não sei do que
se trata!
__ É que... Stela, uma coisa que eu não entendo é... Por que você
não tem ninguém? Desculpe-me, se estou sendo inconveniente, mas é que...
Você é tão bonita... É tão instigante. __ Falou a garota, pausadamente.
Stela fitou os grandes olhos castanhos de Lorena, e viu neles
verdade, o que a tocou.
__ Obrigada, mas... Talvez eu esteja sozinha pelo mesmo motivo
seu, em não querer fazer sexo.
Lorena quase se engasgou com o gole de suco que ela tomava.
Ela levou uma de suas mãos em sua boca e encarou a mulher. Realmente,
ela não esperava aquele “contra golpe”.
__ Eu não acho que seja a mesma coisa. __ Disse a garota, após
se recuperar.
__ Pois eu vejo uma grande similaridade. Você não faz sexo
porque não quer, como você mesmo disse, e eu não tenho ninguém porque
também não quero!
__ Desculpa Stela! Eu acho que eu fui invasiva. Não foi minha
intensão! __ A jovem ficou um tanto quanto constrangida, pois não
esperava que aquela mulher se armasse daquela forma, diante da sua
pergunta que em um primeiro momento, lhe pareceu inofensiva.
__ Tudo bem! __ Falou a juíza, antes de sorrir para a jovem
encabulada a sua frente.
O resto do jantar transcorreu normalmente. Lorena falou sobre
amenidades, evitando entrar na vida pessoal daquela mulher. Ao
terminarem elas se levantaram, organizaram a cozinha e caminharam até a
sala. A moça olhou as horas em um relógio que ela avistou por sobre um
dos móveis daquela peça e falou:
__ Está cedo ainda, eu não consigo dormir agora.
__ Você quer fazer alguma coisa? __ Perguntou a juíza.
__ Não sei, o que por exemplo?
__ Também não sei! __ Respondeu a mulher, mas depois se
lembrou de algo que elas poderiam fazer juntas. __ Você gosta de ver
filmes?
__ Adoro! Quer dizer, depende do filme. __ Respondeu a moça.
__ Vamos ver um então! Mas aqui na sala, como já deve ter
notado, não tem TV. Tem uma no quarto do Enrico e outra em meu quarto,
você se importa?
__ Não! Para mim está tudo bem. Só vou escovar os meus dentes,
rapidamente. __ Disse a jovem antes de se virar e caminhar em direção ao
quarto de hóspedes.
Stela aguardou Lorena retornar um pouco alarmada e já
acionando a sua defesa. Ter aquela moça sobre a sua cama, ao seu lado, e
ter que lidar com isso de forma natural, não iria ser uma tarefa fácil,
pensava ela. Depois de alguns minutos, viu a jovem retornando para a sala,
chegando próximo a si e parando em sua frente.
__ Vamos? __ Convidou Stela, depois de fazer um tour pelo
corpo da moça, mais uma vez. Droga! Pensou.
Quando entraram no quarto da juíza, Lorena sentiu um cheiro
dominante invadir as suas narinas. O aroma recendido ali, naquela peça, era
o mesmo daquela mulher, porém em proporções muito maiores. Ela então
respirou fundo para se preencher daquele agradável olor.
__ Pode ficar à vontade! __ Disse Stela, fechando a porta atrás de
si. __ Eu também vou escovar os meus dentes, mas já pode ir escolhendo o
filme. __ Continuou a mulher, pegando o controle para ligar a TV,
conectando-a a um streaming que costumava usar, em seguida passou o
comando para a jovem e caminhou para dentro do banheiro.
Lorena olhou para a grande e confortável cama e de repente,
sentiu-se amedrontada. Aquela mulher imponente metia-lhe medo, não
sabia explicar porque. Talvez fosse pelo cargo que ela ocupava... Não sabia
exatamente o que era. Depois ela se aproximou, sentou-se no colchão e
passou a estudar o controle e a tela da TV, para ver se encontrava algum
botão que pudesse acionar para iniciar a sua busca.
Quando Stela retornou do banheiro, se deitou na cama,
acomodando-se naqueles travesseiros e convidou a moça para fazer o
mesmo. Lorena então, inclinou o seu corpo e escorregou pelo colchão, se
deitando próximo à mulher.
__ Não achou nada ainda? __ Perguntou a juíza.
__ Ainda não! __ Respondeu a moça, olhando para o corpo de
Stela, percebendo a diferença de tamanho entre elas que devia ser em torno
de uns dez centímetros, pois as pernas da mulher iam mais além do que as
suas, em cima daquela cama.
__ Dê-me isso então, deixa que eu procuro! Do que você gosta?
__ Perguntou Stela à garota, pois não poderia colocar naquela tela os filmes
que ela costumava ver porque eram todos com temática lésbica e o seu
“armário” era, e iria continuar sendo bem trancafiado para a segurança da
sua boa reputação. Inclusive, aquela mulher tinha o cuidado de limpar os
históricos de todas as suas buscas naquela plataforma para não correr o
risco de alguém encontrar alguma pista daquele aspecto furtivo de sua
personalidade.
__ Romance! __ Respondeu Lorena, entregando o controle para a
juíza.
__ Romance? E você teria algum título específico?
__ Não sei talvez... Que tal, “Orgulho e Preconceito”? __ Sugeriu
a moça, ouvindo um riso contido da mulher. __ O que foi? __ Indagou ela,
curiosa.
__ É que eu nunca imaginei que você gostasse desse tipo de
filme. Eu achei que você gostasse de enredos mais... Psicológicos! __ Disse
Stela, passando a filtrar a busca por aquele título.
__ Você só vê filmes que tenham crimes e julgamentos? __
Perguntou a moça, de maneira óbvia.
Stela apenas olhou de viés para a moça e colocou o filme para
“rodar”. Não quis responder àquela pergunta petulante da garota, mas a
achou encantadoramente perspicaz...
Lorena via a primeira cena daquela bela película, ouvindo o canto
dos pássaros e o piano perfeito de Dario Marianelli, que se encaixava
acertadamente àquele cenário bucólico inglês. De repente, ela sentiu que
não queria estar em nenhum outro lugar do mundo que não fosse ali, ao
lado daquela mulher, deitada naquela cama e vendo aquele belo filme
passar diante dos seus olhos. A sua sensação foi de completude, pela
primeira vez em sua vida...
Stela nunca perdia o seu precioso tempo vendo filmes com casais
heterossexuais, mas inexplicavelmente, sentiu-se em paz vendo aquela
sequência de cenas perfeitas e sentindo o perfume delicioso que vinha dos
cabelos de Lorena, deitada tão próxima a si, naquela cama.
A juíza sentiu-se tão bem vendo aquele filme na companhia
daquela jovem, que na cena final, enquanto o Sr. Darcy caminhava pela
planície enevoada em busca do seu grande amor, ao som daquele piano
magnífico, ela simplesmente adormeceu, profundamente...
Quando finalmente, acabou o filme, Lorena olhou para o lado e
sorriu ao ver que Stela havia dormido. Ela então desligou a TV, puxou os
lençóis, cobriu a mulher e a si própria, e também adormeceu...

***
Capítulo 08

No dia seguinte, Stela acordou com uma deliciosa sensação de ter algo
quente e macio junto a si, mas quando abriu os seus olhos, levou um
tremendo susto, Lorena havia dormido consigo e estava toda recostada em
seu corpo. As nádegas da moça estavam perfeitamente encaixadas em seu
sexo. Deus! A juíza parou de respirar diante daquela situação inusitada e
imediatamente se afastou. Depois se levantou da cama com cuidado, passou
as mãos pelos cabelos sentindo o seu coração acelerado.
A mulher, atordoada, caminhou rapidamente até ao banheiro. Lá
chegando, se olhou no espelho e pode ver o seu rosto desfigurado pelo
pânico por que passara alguns segundos atrás. O que aquela moça estava
pensando? Deus! Que despropósito era aquele, dormir consigo?
Depois de sair do banheiro, Stela caminhou ligeiro até ao closet e
se vestiu para a sua habitual malhação. Antes de sair pela porta do seu
quarto, olhou para trás e viu que Lorena ainda dormia relaxadamente, em
sua cama...
Quando iniciou a sua atividade física, já na academia do prédio, a
juíza começou a traçar uma estratégia de afastamento daquela garota, pois
concluía que era muito difícil para ela, lidar com a sua proximidade. Nem
em seus sonhos mais recônditos poderia acontecer alguma coisa entre ela e
aquela moça, a namorada do seu filho!
Stela terminou de fazer a sua malhação e retornou para o
apartamento, quando entrou em seu quarto, viu, aliviada, que Lorena já
havia se retirado, inclusive, tinha deixado a cama perfeitamente arrumada.
A mulher tomou um banho, vestiu um de seus ternos sociais
monocromáticos, calçou um daqueles scarpins pretos reluzentes e foi em
direção à cozinha para tomar o café. Lá chegando, cumprimentou a sua
funcionária e se sentou para comer o mamão, como ela fazia todos os dias.
Alguns minutos depois, chegou contidamente, Lorena, já vestida para sair.
__ Bom dia Stela! Bom dia Lúcia! __ Disse a jovem,
delicadamente. __ Com licença! __ Completou ela, sentando-se próximo a
juíza que nem levantou os olhos para responder à sua mesura.
__ E então Lorena, gostou da cama do quarto de hóspedes? __
Perguntou Lúcia sorrindo, despreocupadamente.
__ Eu não dormi lá Lúcia. Eu dormi com a Stela, em sua cama. __
Respondeu a moça, ingenuamente, servindo-se de suco.
Stela entrou em pânico, mais uma vez, pegando uma generosa
colherada da polpa avermelhada do mamão e enchendo a sua boca. Ela não
conseguia nem sentir o gosto daquela fruta, de tão aturdida que ficou com a
resposta da jovem à sua funcionária. Percebia a sua face queimando e
tentava parecer natural, mas a vontade que teve foi de enfiar a sua cabeça
em um buraco, tamanho o desconforto que sentia.
__ É que nós estávamos vendo um filme e acabamos dormindo.
__ Continuou Lorena, pegando uma torrada para si.
A mulher permanecia calada, apenas enchendo a sua boca de
comida, exatamente para não ter que dizer nada e correr o risco de se expor
ainda mais.
__ Hum, e você, gostou do filme Stela? __ Perguntou a jovem,
após dar uma mordida em seu pão.
__ Sim! __ A juíza respondeu sem ao menos levantar os seus
olhos, tentava se proteger de todas as formas.
__ Stela, por onde você passa para chegar ao seu trabalho? __
Voltou a perguntar Lorena, ignorando totalmente o turbilhão de sentimentos
que eclodiam dentro da silenciosa mulher.
__ Eu vou pela avenida principal!
__ Se não for incômodo pra você, poderia me dar uma carona? A
clínica onde faço o meu estágio fica nessa avenida.
__ Claro! Sem problema.
A mulher não conseguia levantar os seus olhos para encarar
Lorena. A impressão que ela tinha é que se ela olhasse nos olhos daquela
garota, ela iria ser desvendada e isso não podia acontecer de jeito nenhum.
Ao terminarem de tomar o café, as duas desceram para a garagem
com o fim de pegarem o carro. Quando entraram dentro daquele confortável
sedan preto importado, Stela girou a chave, ligou o ar condicionado e pôs o
carro em movimento. O som, automaticamente foi acionado e o Bolero de
Ravel começou a ser executado.
Lorena, mais uma vez, teve aquela sensação de completude.
Parecia que estar dentro daquele carro em movimento ao lado daquela
mulher, ouvindo aquela música perfeita, poderia ser a última coisa que faria
em sua vida, pois aquele momento passava a ela a impressão que havia
chegado ao cume de uma montanha...
A jovem olhou para Stela, que agora estava com os seus óculos
escuros, manejando o volante com toda precisão e pode constatar o quanto
aquela mulher era elegante e magistral. Aquele instante estava sendo tão
mágico que a moça conseguia ver as partículas do ar que brilhavam sob a
luz do sol que acabara de nascer. Elas dançavam em torno da juíza,
parecendo acompanhar o ritmo cadenciado da marcha clássica que
preenchia aquele espaço. Era hipnotizante!
Stela percebeu, pela sua visão periférica, que estava sendo
observada, ela então olhou de soslaio para a garota e perguntou:
__ O que foi?
__ Nada! __ Respondeu simplesmente, a jovem, voltando a olhar
para frente.
__ Desculpe-me, mas no meu carro só tem música clássica. Quer
que eu desligue o som?
Naquele instante, Stela se lembrou que a pessoa que estava ao seu
lado era muito jovem e certamente, não devia gostar daquele tipo de
música. Devia estar sendo uma tortura para ela, pensou.
__ Não! Eu estou gostando. __ Respondeu Lorena.
E assim elas cruzaram toda aquela avenida até a moça pedir para
a mulher parar em frente ao prédio onde ficava a clínica do Dr. Willian.
__ Stela, muito obrigada pela carona. Tenha um bom dia! __ Após
agradecer, a jovem se inclinou, deu um beijo no rosto da juíza e apeou.
Assim que Lorena saiu, Stela arrancou o carro sentindo o beijo da
jovem em seu rosto, como se o local exato tivesse sido marcado com um
ferro em brasa. Ela passou a sua mão naquele lugar e depois respirou fundo,
como se quisesse extirpar aqueles pensamentos obscuros insistentes.
O dia da magistrada fluiu normalmente, mas vez ou outra ela
punha-se a pensar no que poderia fazer para afastar-se de Lorena e uma de
suas medidas foi ficar até mais tarde naquele fórum. Planejou chegar em
casa a noite, tomar o seu banho, comer algo rápido na cozinha e deitar-se,
somente isso. Então, eram dezessete e trinta horas quando a juíza pegou
uma nova pasta e a abriu para começar a estudar um novo processo.
Bianca, a sua mais competente e próxima assessora, que não saia
daquele fórum antes da magistrada de jeito nenhum, se incomodou com
aquele ato, pois imaginou que os trabalhos por aquele dia já haviam
terminado. A jovem então voltou a se sentar próximo da juíza para aguardar
as atribuições inerentes ao seu cargo.
Às dezenove horas Stela sucumbiu e, para a felicidade de Bianca,
anunciou a sua partida. Depois de uns trinta minutos, ela entrou em seu
apartamento, fechou a porta atrás de si trancando-a e olhou à sua volta, para
ver se via ou ouvia algum movimento. Não escutando absolutamente nada,
deixou a sua bolsa sobre uma poltrona e caminhou até a cozinha para tomar
um copo de água.
Quando a mulher chegava até a peça, se deparou com a jovem, de
costas, picando alguns temperos em cima da bancada de mármore. A juíza
estacou e desceu com os seus olhos pelas costas de Lorena, observando
aquela cascata de cabelos castanhos ondulados que pendiam de sua cabeça e
iam parar no início daquela bunda arredondada e perfeita que quase
aparecia por debaixo da pequena camisola que ela usava. Sentindo a sua
boca que estava aberta, secar, Stela decidiu voltar para trás, sem tomar o seu
copo de água, mas quando se virou para sair, ouviu da moça:
__ Stela!
A juíza parou e lentamente, se voltou e pode visualizar os seios
perfeitos da jovem sob aquele fino tecido. O seu coração estava acelerado e
a necessidade daquele copo com água se fazia urgente.
__ Oi Lorena!
__ Você chegou mais tarde hoje. __ Observou a moça.
__ Sim! Eu tive uns... Contratempos no fórum. __ Mentiu.
__ Eu estou preparando algo pra gente comer...
__ Não precisa! Não se preocupe com isso. Faça apenas um
lanche rápido para você e vá se deitar. __ Falou a mulher, de forma seca.
Parecia mais uma reprimenda.
__ Eu não estou entendendo, você gostou do que eu fiz ontem...
__ E o Enrico, entrou em contato com você? __ Perguntou Stela,
gesticulando as mãos, pois aquela jovem nunca falava do seu filho. Parecia
que nem se lembrava da existência do namorado e não deveria ser assim,
não é?
__ Ele fez uma chamada de vídeo hoje, à tarde. Ele estava no
STF, em plena sessão. Um dos ministros estava falando. Ele parecia bem
empolgado!
__ Certo! Bom, então eu vou tomar o meu banho. __ A juíza
virou-se e começou a andar rumo ao seu quarto.
__ Stela e o que eu faço? __ Perguntou a moça, apontando os
condimentos já picados, com o seu polegar.
A mulher se voltou mais uma vez e falou:
__ Eu já disse! Faça um lanche rápido para você e depois vá se
deitar.
__ Stela, eu fiz algo de errado? Se eu fiz, você poderia me dizer o
quê, por favor? __ Perguntou mais uma vez, a jovem, colocando as duas
mãos postas em frente à sua boca, temerosa. Ela não estava compreendendo
o repentino distanciamento daquela mulher.
__ Você não fez nada de errado. Eu só quero chegar em casa e
descansar, é só isso! __ Repondeu a juíza, sem esboçar nenhum sorriso.
__ Você quer que eu vá embora? Eu estou te incomodando? __
Indagou a moça, pois essa era a sua impressão naquele momento. Parecia
que ela estava sendo um estorvo na vida daquela mulher.
Stela olhava para Lorena e de repente se sentiu uma idiota. Deus,
aquela garota só estava sendo gentil consigo e ela com um milhão de
pensamentos na cabeça! Sentiu-se ridícula e então resolveu esquecer toda a
sua estratégia de afastamento e baixou a sua guarda. Imagina, aquela linda
jovem, hetero, namorada do seu filho, um belo e jovem rapaz... E ela ali,
uma velha em pânico, não sabendo conviver com a gentileza daquela moça
educada e doce... Sentindo-se envergonhada, tentou consertar as coisas.
__ Não Lorena, por favor! Eu é que estou cansada porque tive um
dia difícil no fórum, perdoe-me! Eu não quero que você vá embora, de jeito
nenhum! Eu só vou tomar um banho e já, já retorno para comermos juntas,
tá bom?
__ Tá bom então, eu vou te esperar! __ A jovem respirou aliviada
e abriu um largo sorriso para a mulher.
Ao chegar em seu quarto, Stela, mais uma vez, sentiu-se
envergonhada.
__ Eu sou uma idiota!
A juíza se repreendia e balançava a cabeça negativamente. Como
pode ter se confundido daquela maneira? Como pode ter pensado que
aquela moça estaria interessada em si? A mulher respirou fundo, pegou uma
toalha e foi para o banheiro tomar o seu banho, era o que lhe restava...
...Na cozinha, Lorena dava continuidade ao preparo da refeição
que Stela e ela comeriam. Como a noite estava fresca e ainda somava-se o
fato dela estar com suas poucas roupas, pois era assim que gostava de ficar
dentro de casa, a jovem então, havia se decidido por fazer um caldo de
aipim com cheiro verde.
A moça preparava aquele prato com todo o cuidado do mundo,
pois queria que tudo ficasse perfeito. Em um momento específico, ela
sorriu, pois se dava conta de que gostava de cozinhar para Stela. Gostava de
receber os seus elogios... Gostava de vê-la feliz... Mas por quê? Perguntava-
se. Talvez, aquele fato fosse algo a ser relatado ao seu psicanalista em sua
próxima sessão. Por que gostava tanto da companhia daquela mulher? Por
que via nela tantas qualidades? Por que ela era tão fascinante aos seus
olhos?
Quando Lorena terminava de montar os dois ramenkins de
cerâmica com o caldo quentinho e colocava sobre a mesa, os outros
recipientes com os acompanhamentos, Stela chegou na cozinha observando
tudo com admiração.
__ Mas o que é isso Lorena? Que elegância é essa?
A jovem sorriu e passou a apresentar o prato.
__ Hoje nós vamos de caldo de aipim com cheirinho verde. Sente-
se e prove! __ Disse a moça de maneira doce e educada, antes de sentar-se,
vendo a juíza se acomodando em seu lugar, à cabeceira da mesa.
Stela estava até um pouco constrangida, pois não sabia como iria
retribuir a tamanha gentileza daquela jovem para consigo. Ela pegou a
colher que estava ao lado do seu ramenkin e provou o caldo que estava
divino. Ele desceu em sua garganta como um afago... Um abraço... A
mulher então olhou para moça que aguardava o seu parecer, ansiosa e viu
nela tanto carinho dedicado à sua pessoa que se emocionou.
__ Lorena, está tudo tão perfeito! Eu... Não tenho como retribuir
tamanha delicadeza de sua parte. Obrigada!
__ Stela, eu que estou retribuindo aqui! Você é que está me
recebendo em sua casa, se esqueceu? __ Falou a moça, amável. __ Agora
coma, senão vai esfriar! __ Completou ela, segurando também a sua colher
para pegar o primeiro bocado do seu ramenkin.
A juíza comeu toda a sua porção, se deleitando com cada
colherada que colocava em sua boca. Enquanto tomava aquele delicioso
caldo, ela buscava em sua memória, se em algum momento de sua vida
alguém tivesse demonstrado tanto carinho para consigo daquela maneira,
mas não encontrou. Todos tinham muito respeito e admiração por ela,
muitas vezes até medo, ela sabia, mas o cuidado e o desvelo com que
aquela moça estava a tratando, não lhe eram comuns.
__ Nossa, estava maravilhoso! Obrigada garota! __ Agradeceu a
juíza assim que terminou, sentindo-se plenamente satisfeita.
__ Não me chame de “garota”! __ Disse Lorena ao ser tratada
daquela forma mais uma vez, por aquela mulher. Ser chamada de “garota”
pela juíza despertava nela algo que ela mesma não sabia explicar. Parecia-
lhe um... Convite...
__ Como? O que foi que disse? __ Stela, embora tenha ouvido
perfeitamente o que aquela moça havia dito, perguntou, para se certificar.
Como assim? O que ela queria dizer?
__ Eu disse, “não me chame de garota”! __ Voltou a repetir a
jovem.
__ E por que não? __ Perguntou Stela, sentindo a sua respiração
pesando e seu coração se acelerando. Não entendia perfeitamente o que
Lorena tentava lhe dizer, mas a sua intuição a alertava que havia ali,
implícito, algo além...
Lorena se inclinou, aproximando-se da mulher e, fitando-a nos
olhos, disse:
__ Por que não!
Depois ela simplesmente se levantou já pegando o que estava
sobre a mesa, iniciando a organização daquela cozinha.
Stela permaneceu ainda sentada por um tempo, paralisada, se
perguntando o que aquela jovem tentava lhe dizer, mas não conseguia
chegar a uma resposta exata. Depois, com um turbilhão de pensamentos
desconexos em sua cabeça, se levantou e, em silêncio, passou a ajudar a
moça na organização da cozinha.
Após elas colocarem toda a louça suja na máquina de lavar e
organizarem a mesa, a bancada de mármore e a pia, elas caminharam em
direção à sala, lá chegando, Lorena se voltou para a juíza e disse:
__ Bom, então é isso... Eu vou pro meu quarto tentar dormir.
A jovem se aproximou de Stela e lhe deu um beijo no rosto, mas a
mulher, um pouco atrapalhada e ainda aturdida pelo o que a moça havia lhe
dito na cozinha, virou a sua cabeça e acabou roçando os seus lábios aos de
Lorena. A jovem, sem se afastar, murmurou dentro da boca da juíza:
__Boa noite Stela!
A mulher sentiu um arrepio em sua nuca com o ato inusitado
daquela moça e contraiu todos os seus músculos. Observando Lorena se
virar e caminhar em direção ao quarto de hóspedes, ela continuou ali,
paralisada, com a respiração curta, impedida de se movimentar. Quando
finalmente conseguiu se mover, depois de puxar o ar para dentro dos seus
pulmões, ela também se virou e foi para o seu quarto.
Lá chegando, Stela fechou a porta, trancando-a, pois teve medo
daquela moça vir até ali e se isso acontecesse, ela não responderia por si.
Na verdade, ela se trancou para impedir a si própria de ir atrás de Lorena
porque agora tinha certeza que, se ela fizesse isso, tudo iria acontecer, mas
nada podia acontecer entre elas, Deus! Aquela jovem era a namorada de
Enrico, o seu amado filho! Repetia para si mesma, o seu mantra daquela
fatídica semana.
Quando Lorena se viu sozinha no quarto de hóspedes, ela
caminhou até a janela e, olhando para a escuridão através da vidraça,
passou as mãos pelos cabelos, respirou fundo algumas vezes e constatou
que estava morrendo de vontade de ter Stela. Aquela mulher era fascinante
demais e tê-la seria um sonho, agora estava claro em sua cabeça. Tudo na
juíza lhe agradava. Depois a jovem se aproximou da cama e se deitou,
dando continuidade aos seus pensamentos incontroláveis... Ela imaginou a
sua sogra em cima de si, beijando-a... Roçando aquele corpo no seu...

***
Capítulo 09

No dia seguinte, Stela acordou, abriu os seus olhos e se sentiu cansada,


pois havia tido uma péssima noite de sono. Ela se lembrava que acordara
várias vezes e havia se remexido na cama o tempo todo, ao ponto do lençol
estar todo embolado debaixo do seu corpo. A juíza ficou na dúvida se
realmente havia conseguido dormir ao menos alguns minutos. Durante toda
a noite, Lorena e Enrico surgiam em seus pensamentos, em uma verdadeira
tortura!
Stela respirou fundo, se levantou e foi para o banheiro, lá
chegando, olhou-se no espelho e pode constatar a sua noite mal dormida,
avistando as suas enormes e marcantes olheiras. A mulher lavou o rosto e
quando saiu do banheiro, caminhou sem ânimo até ao closet para mais uma
vez, se vestir e descer para a academia do prédio.
Depois de extirpar um pouco os seus fantasmas naqueles
aparelhos de ginástica e após, tomar um relaxante banho, Stela se sentiu
melhor. Penteou os seus cabelos úmidos, vestiu mais um dos seus elegantes
ternos bem cortados, dessa vez, preto por sobre uma camisa branca, calçou
outro scarpin, também preto e foi para a cozinha tomar o seu café. Lá
chegando, cumprimentou Lúcia e se sentou em sua cabeceira para comer a
sua costumeira banda de mamão papaia, já preparada em um pequeno prato
por sobre o elegante aparador de tecido estampado com figuras geométricas
em cores secundárias.
__ Estou vendo que tem gente cozinhando aqui, à noite, pois a
máquina de lavar está amanhecendo com louças todos os dias! __ Observou
Lúcia amigavelmente, dando continuidade aos seus afazeres.
__ Bom dia Stela! Bom dia Lúcia! Eu estou mexendo na sua
cozinha, né? Espero que não fique brava comigo, tá! __ Lorena chegava
naquela peça de forma comedida e se sentou próximo à juíza. Ela tinha
ouvido a funcionária falar sobre a lava-louças e por isso se explicava
daquela maneira.
__ Ah, eu sabia que era você Lorena, pois a Dra. Stela não gosta
de cozinhar! __ A funcionária falava sorrindo, sem interromper o que
estava fazendo.
Stela permaneceu calada de cabeça baixa, tomando o seu café,
não quis entrar naquele diálogo entre a sua funcionária e a moça. Os seus
pensamentos estavam confusos demais para esboçar qualquer fala ali,
naquela cozinha.
Lorena, também tomava o seu café e de vez em quando olhava de
esguelha para Stela, observando os seus detalhes e constatando, mais uma
vez, o quanto ela era perfeita, até mesmo em sua forma de se alimentar...
Será que estava se apaixonando pela mãe do seu namorado? Perguntou-se
naquele instante, assustada com a possibilidade. O que estava sentindo por
aquela mulher, parecia-se muito com o que sentiu por sua professora
quando era apenas uma adolescente, ha alguns anos atrás. De repente, Stela
levantou a sua cabeça e a fitou com aqueles lumes cor de mel iluminados,
parecendo duas lanças certeiras...
A juíza terminou de tomar o café, incomodada com o olhar de
Lorena sobre si. Deus! Ela não teria paz naquela semana? Depois elas
desceram para a garagem, pegaram o carro e partiram. As duas fizeram todo
o trajeto em silêncio. No som tocava a symphony 3 de Philip Glass. Aqueles
violoncelos e violinos plangentes tocavam diretamente nos corações das
duas mulheres aflitas que pareciam ter entrado em um estreito corredor, sem
possibilidades de retorno...
O dia de Stela parecia um prenúncio, pois tudo estava contra ela.
Quando ela pisou no fórum, um dos saltos dos seus sapatos quebrou, quase
provocando a sua queda naquele frio mármore. Quando conseguiu se
reequilibrar, caminhou até a sua sala, manquejando, sob o olhar dos
funcionários que, por respeito ou receio, não ousaram falar absolutamente
nada.
Chegando à sua sala, a juíza se sentou e tirou o scarpin quebrado
do seu pé para ver se ainda tinha reparo e considerou que sim.
__ Bianca, peça a um dos nossos estagiários para procurar um
sapateiro que possa consertar isso para mim, com urgência, por favor!
__ Sim senhora! __ Disse a assessora, saindo imediatamente da
sala com o sapato nas mãos para passa-lo a um dos estagiários daquele
fórum.
Enquanto aguardava o retorno do funcionário, a magistrada teve
que trabalhar com apenas um dos seus pés calçados, o outro ficava apoiado
no mármore gelado, desconfortavelmente. Felizmente, dentro de uma hora,
o estagiário retornou com o seu sapato perfeito e ela, no mesmo instante o
calçou, sentindo-se completa novamente.
As doze horas, Bianca fez o pedido do almoço delas a um
restaurante de comida orgânica, como de costume. Todos os dias, Stela, a
sua assessora e a escrevente, faziam a sua refeição na sala de audiências,
pois os trabalhos eram tantos, que elas simplesmente não conseguiam se
deslocar dali e irem a algum lugar para se alimentarem, sobretudo nos dias
de julgamentos, então elas acabavam por almoçarem por ali mesmo.
Quando a comida chegou, elas se sentaram à mesa e começaram a
abrir as embalagens com os alimentos. Stela sempre escolhia um mix de
salada orgânica que trazia como adicional à parte, um recipiente com um
molho divino para o próprio cliente acrescentar na hora de comer. Quando a
magistrada começou a abrir a embalagem com o tempero, as suas mãos se
enrolaram com a tampa e ela simplesmente derrubou todo aquele líquido
amarelado em sua camisa branca, alva e perfeita, o que a deixou atônita,
paralisada, com os seus dois braços abertos sem saber como agir diante
daquela catástrofe. Bianca até se levantou para falar:
__ Dra. Stela... Ah... __ Ela não teve palavras, pois não sabia o
que dizer diante de tal situação.
Stela se olhava, não acreditando no que tinha feito a si própria.
__ Tudo bem Bianca, eu vou até ao banheiro para ver o que pode
ser feito. __ A juíza se levantou, pegou um dos guardanapos de papel,
limpou as suas mãos, agarrou o seu blazer que estava no encosto da cadeira
em que estava sentada e saiu caminhando rumo ao banheiro, se sentindo
uma abilolada. Quando lá chegou, se olhou no espelho e perguntou para si
mesma:
__ O que está acontecendo Stela? Onde você está com essa sua
cabeça?
A magistrada retirou a sua camisa empapada com aquele molho e
depois passou a limpar a sua pele com cuidado para não ficar com aquele
cheiro do tempero. Felizmente, o molho não tinha atingido nem o seu sutiã
e nem a sua calça que permaneceram intactos. Após se limpar, Stela vestiu
o blazer sobre a pele o abotoando todo para não ficar descomposta e
embrulhou a sua camisa em papéis toalha para enviá-la até a lavanderia
mais próxima, através de um dos estagiários, mais uma vez. Deus, que dia!
Pensava ela. O que mais faltava acontecer?
Ao retornar para a sala de audiências, as duas mulheres a
aguardavam para finalmente, almoçarem juntas.
__ Não precisavam me esperar! __ Disse Stela, se sentando
novamente e abrindo o recipiente do seu mix de salada para comê-la pura,
sem qualquer condimento.
__ Dra. Stela, eu vou dividir o meu molho com a senhora. __
Falou Bianca, estendendo a embalagem com o tempero à juíza.
__ Eu também dividirei o meu molho com você, Dra. Stela. __
Dessa vez foi a escrevente que falou, uma mulher de meia idade, de cabelos
pequenos e louros que também estava sempre junto da juíza naquele fórum.
__ Obrigada! __ Agradeceu Stela, abrindo o recipiente de uma
delas, com todo o cuidado daquela vez e adicionando um pouco do tempero
à sua salada. __ Parece que hoje eu estou azarada! __ Completou a juíza,
antes de esboçar um sorriso fraco.
Depois do almoço, novamente Bianca entregou a camisa de Stela
a um dos estagiários, para que ele a levasse até a uma lavanderia próxima.
Quando o funcionário retornou com ela limpinha e passadinha, a magistrada
a vestiu e se sentiu confortável, pois não aguentava mais a textura acetinada
do forro do seu blazer, em contato direto com a sua pele.
Como se não bastasse os pequenos acidentes inoportunos sofridos
por Stela, ela ainda teve que conduzir uma audiência de retratação requerida
por uma mulher, vítima de violência doméstica. Como aquela ação penal
era pública condicionada à representação, ou seja, havia sido proposta pelo
Ministério Público mediante a denúncia feita pela vítima e era um caso de
ameaça, então aquela mulher teria o direito àquela audiência com a juíza
para pedir o arquivamento do processo.
__ Dona Marluce, a senhora está sendo obrigada pelo seu cônjuge
ou alguém do seu convívio, a desistir deste processo? __ Perguntou a
magistrada, estudando a face da simples mulher sentada à sua frente, para
captar nela a sua verdade velada.
__ Não senhora, doutora!
__ Dona Marluce, a decisão de retirar a queixa e pedir o
arquivamento deste processo é inteiramente sua? Você sustenta isso perante
a lei? __ Perguntou novamente, a juíza, dando continuidade à sua
observação dos movimentos faciais da senhora.
__ Sim senhora, doutora! Eu que tomei essa decisão. __
Respondeu a mulher.
__ O seu cônjuge voltou a te ameaçar depois que você fez a
denúncia? __ Inquiria a magistrada, com a sua voz firme.
__ N... Não senhora, doutora!...
Stela, com os seus anos de experiência, já havia passado por
aquele tipo de situação várias vezes e é claro que a reconciliação era sempre
muito bem vinda por ela ou por qualquer outro juiz, mas ela não podia
simplesmente, conceder a retratação a uma mulher visivelmente coagida,
embora todas afirmassem que agiam de acordo com a sua própria vontade.
A responsabilidade da magistrada era imensa, pois tratava-se de uma vida
sendo ameaçada diariamente e isso era inadmissível em uma sociedade
civilizada. A luta diária daquela juíza era em favor da valorização do
feminino e da extinção do machismo e da misoginia, firmemente
encravados na sociedade brasileira...

...Depois daquele longo e extenuante dia, Stela chegou ao seu


apartamento às dezoito horas. Ela foi até a cozinha e felizmente, não
encontrou Lorena. Abriu o armário, pegou uma garrafa de Johnnie Walker,
um copo, colocou dentro dois cubos de gelo e o encheu daquela bebida
amarronzada. Depois a juíza guardou novamente, a garrafa de whisky e
caminhou até a sacada para se acomodar confortavelmente no chaise que
ali ficava. Aquela mulher estava precisando de algo forte para relaxar ou
então, sucumbiria...

...Lorena saiu da clínica mais tarde naquele dia, pois o Dr. Willian
havia feito uma reunião com todos os integrantes de sua equipe para uma
troca de opiniões sobre os casos mais complicados que eles tinham, dentre
os seus pacientes. A estagiária havia sido convidada a participar, pois o seu
supervisor julgou que seria bom para a sua formação e o seu aprendizado,
presenciar as discussões que seriam feitas à cerca dos quadros clínicos que
seriam apresentados. Depois daquela longa e proveitosa reunião, a jovem
enfim, pode ir embora, de volta à casa de Stela.
Na verdade, Lorena não estava se sentindo confortável em voltar
para aquele apartamento, pois naquela manhã ela não havia conseguido
trocar uma só palavra com a juíza que parecia totalmente fechada em seu
casulo. Ela estava receosa pelos pensamentos obscuros que tivera na noite
anterior, com relação à mãe do seu namorado. Aquela jovem se dava conta
de que estava tendo desejos reais por Stela e voltar para a casa dela, de
repente, não lhe pareceu o certo a se fazer, mediante a tudo que estava
germinando dentro de si.
Lorena entrou no apartamento e resolveu caminhar direto para o
quarto de hóspedes. Lá chegando, largou as suas coisas em cima da cama,
pegou a toalha e foi para o banheiro, tomar o seu banho. Depois daquela
relaxante ducha, a jovem vestiu outra de suas pequenas camisolas, colocou
por cima um cardigan de algodão bem confortável e saiu do quarto. A sua
intenção era apenas comer algo na cozinha para depois se recolher
novamente, mas quando passou pela sala, avistou a porta da sacada
entreaberta e resolveu ir até lá para sentir a brisa fresca daquela noite em
seu rosto, porém quando adentrou naquele espaço, ela olhou imediatamente
para o chaise e se deparou com a silhueta daquela mulher que já a
espreitava, com os seus pares de olhos astutos. As luzes da sacada estavam
apagadas, mas a lua prateada conseguia iluminar aquele espaço de uma
forma magnífica.
__ Oi Stela! Estou te incomodando? __ Perguntou a jovem à
mulher, notando que ela ainda vestia as suas roupas formais do trabalho,
apenas os scarpins não estavam em seus pés e sim, largados no piso.
__ Não! __ Respondeu a juíza que estava em um estado bem mais
tranquilo naquele momento do que quando chegou ali. A bebida tinha lhe
feito muito bem e sua condição era de relaxamento e leve embriaguez.
Lorena pensou em voltar para trás, pois aquela mulher a
amedrontava um pouco, sobretudo por ela estar envolta naquela penumbra
noturna, mas a sua vontade real foi de ficar ali, junto dela. Às vezes, aquela
jovem tinha a impressão de que Stela era revestida de um ímã que sempre
conseguia atraí-la para si. A moça então se aproximou e sentou-se no chaise
rente a juíza, se recostando naquelas almofadas macias. Um cheiro de
álcool chegou até suas narinas, ela olhou para o lado e avistou o copo de
whisky quase no fim, em cima da mesinha de canto.
__ Você está bebendo? __ Perguntou ela, suavemente.
__ Sim, estava precisando. O meu dia não foi dos melhores! __
Respondeu a juíza, mantendo o seu olhar na escuridão do céu que podia se
ver dali, sentindo o calor delicioso emanado do corpo macio da jovem,
recostado ao seu e já percebendo as reações do seu corpo. De volta ao meu
calvário! Pensou, antes de respirar fundo.
__ Aconteceu algo em seu trabalho que te deixou assim? Se
quiser me contar... __ Lorena voltou toda a sua atenção à mulher, inclusive
se virou um pouco de lado para observa-la melhor.
Stela olhou para a jovem próxima a si, avistando os enormes
cabelos castanhos dela, caindo pelos seus ombros e braços, depois arrastou
o seu olhar para baixo, passeando pelo colo, abdome, chegando até aquelas
coxas perfeitas que estavam completamente descobertas. Aquela visão
despertou na juíza um formigamento entre as pernas. Ao notar a reação
embaraçosa do seu corpo, a mulher buscou se recompor e falou algo, na
tentativa de se preservar.
__ Ah... Aconteceu um monte de coisas... Desastres de um dia
trágico...
Lorena sentiu o peso na voz de Stela e sua vontade foi de fazer
algo para ajuda-la a se sentir melhor, então, ela alcançou uma das mãos da
mulher que estava repousada sobre o abdome dela e cobriu-a com a sua,
passando a acaricia-la.
__ Eu imagino que não deve ser fácil para você, todos os dias ter
que lidar com histórias ruins que não tiveram finais felizes... Você já me
disse que ama o que você faz e que ser juíza é um sonho realizado, mas eu
acredito que você deve ter endurecido um pouco para aguentar o peso do
cargo, não é? __ A moça falava com uma voz meiga, pausada, continuando
a afagar a mão da juíza em movimentos suaves e delicados.
Stela ouvia o que a jovem dizia, sentindo os carinhos que ela fazia
em sua mão notando o seu coração se acelerar, mais uma vez, mas
inesperadamente, subitamente, o seu corpo traiçoeiro começou a tremer,
como se ela tivesse sob um inverno rigoroso. Os seus joelhos passaram a
vibrar tanto que parecia que era possível ver os seus movimentos através do
tecido da calça que estava usando. A juíza tentava se acalmar e parar de
tremular, mas não conseguia se controlar. A sua cabeça passou de um
estado de torpor para um estado caótico e os seus pensamentos começaram
a fluir em flashes, e não concisos e claros, como era de seu costume.
__ Você está tremendo? __ Perguntou Lorena.
Naquele momento, a mulher trincou os dentes diante da pergunta
da jovem ao se sentir desvendada... Descoberta... Então, ela agarrou a mão
da moça e perguntou:
__ O que você quer comigo garota, hem? O que você quer
comigo? __ A juíza falava entre os dentes, voltando-se para jovem com as
narinas dilatadas, a respiração pesada e os olhos faiscando.
Lorena sentiu o perigo no olhar daquela mulher, mas ouviu ela a
chamando de “garota” de novo e aquilo lhe pareceu novamente, um convite.
Aquela palavra direcionada a si proferida por aquela mulher tão revestida
de autoridade, mexia com algo em seu inconsciente cheio de memórias
inacessíveis e sua reação foi instintiva.
__ Stela... __ Sussurrou a moça, antes de se aproximar da juíza e
roçar os seus lábios macios na boca dela, não se importando com as
consequências do seu ato ousado, apenas dando vasão ao seu imenso
desejo.
A reação de Stela foi de tensão e recuo, pois jamais imaginou que
aquela moça podia ser tão audaciosa àquele ponto, porém se deixou ser
beijada pela jovem mantendo os seus lábios fechados. Quando conseguiu
sentir a textura macia dos lábios da jovem, teve uma vontade quase
incontrolável de tomar aquela boca quente e aveludada, mas ela
simplesmente, não conseguia se esquecer de Enrico, o seu amado filho.
Depois de uns segundos daquele beijo torturante, ela segurou os ombros da
moça e a afastou cuidadosamente.
__ Lorena, você é louca? Eu não posso fazer isso! Você é a
namorada do Enrico, meu filho, se esqueceu? __ Disse a mulher, depois de
puxar o ar para os pulmões que pareciam terem se enfraquecido, pois a sua
respiração era pesada como chumbo.
Lorena observou a mulher e viu nela tensão e aflição, mas
também viu desejo.
__ Stela, eu gostaria muito de ser louca, pois assim eu não
precisaria buscar tantas explicações para tentar entender os sentimentos que
eu estou tendo por você... Eu sei que você é a mãe do meu namorado, mas
eu não consigo te ver e não te querer... __ A jovem sussurrava de forma
arrastada, pois estava cheia de vontade por aquela mulher que lhe segurava
os ombros.
__ Lorena, eu não posso!... Eu não quero fazer isso com o meu
filho! Você não entende? __ Murmurou a juíza, desejando por tudo o que
era mais sagrado, que a sua razão não a abandonasse naquela hora difícil.
__ Mas eu não estou fazendo nada demais Stela... Eu quero
apenas... Te dar um pouco de carinho...
A jovem falava e movimentava-se corajosamente, para se
aproximar mais, passando uma de suas pernas por sobre a juíza e sentando-
se em seu colo com cuidado. Depois passou a acariciar os cabelos da
mulher que a mantinha afastada, ainda segurando-lhe os ombros. Lorena
estava entorpecida pelo desejo, não conseguia retomar a razão e aplacar o
calor do seu corpo excitado, cheio de fome... Sim, era loucura o que a moça
fazia, ainda mais com aquela mulher envolta naquela aura de poder e
superioridade, mas ela estava sedenta...
A respiração de Stela ficou ainda mais pesada e suas forças para
segurar aquela moça que vinha para cima de si com tanta sede, se esvaiam.
Ela observava todo aquele corpo perfeito se aproximando cada vez mais e
não via como barra-lo. Sem alternativas, a mulher apenas deixou os seus
braços cair e entregou-se àquela linda jovem tresloucada.
__ Deus, garota!... __ Suspirou a juíza, sentindo os suaves beijos
que agora a jovem lhe dava em seu lóbulo esquerdo, com o ar lhe faltando
nos pulmões.
Lorena retomou a boca da mulher e a beijou com mais sede,
entrelaçando os seus dedos nos cabelos da nuca dela e avançando mais,
adentrando com a sua língua pelos lábios entreabertos da juíza. O seu sexo
latejante, agora estava colado no ventre da mulher que permanecia com as
suas mãos abaixadas, agarradas ao tecido das almofadas macias daquele
chaise.
Stela não conseguia pensar com a sua razão costumeira, ela
apenas ouvia os clamores do seu corpo necessitado, que ha mais de vinte
anos não tinha os carinhos de uma mulher. Faziam mais de vinte anos que
ela não era beijada, pois se mantivera em seu claustrofóbico “armário” por
todo aquele tempo, apenas movida pelo trabalho em sua sublimação
perfeita.
Talvez a juíza tenha sido classificada por muitos de assexuada,
mas ela não era assexuada, apenas não conseguia vencer o seu auto
preconceito, não sendo capaz de se aproximar de nenhuma mulher, mas
agora ela estava ali, debaixo daquela linda jovem, namorada do seu filho,
sendo assaltada de uma maneira, que ela simplesmente não conseguia se
desvencilhar, apenas deixava acontecer.
Lorena continuava com a sua investida que agora, além de beijar
a mulher em baixo de si com ânsia, ela também meneava os seus quadris
para pressionar o seu sexo sedento contra o corpo dela, numa busca ávida
por alívio. Aquela sacada iluminada somente pelo clarão da lua prateada era
preenchida pelos sons das respirações ofegantes das duas mulheres,
misturados aos gemidos contidos e aos estalidos dos lábios que se
misturavam naquele beijo faminto...
Em um dado momento a excitação de Stela foi tanta que ela
largou aquelas almofadas fofas e agarrou a moça pela cintura, juntando-a
em si, para sentir todo o calor daquele corpo cheiroso, consistente e macio,
que ondulava sobre o seu, fazendo-a esquecer-se até mesmo quem era ela.
A juíza sentia a sua calcinha inundada pelo fluido intenso que saia do seu
sexo, cada vez que ele pulsava. A cascata de cabelos fortes e longos da
jovem, caiam sobre o seu rosto, provocando-lhe ondas elétricas que
perpassavam todo o seu corpo...
Aquele beijo macio e guloso daquela moça, a movimentação que
ela fazia em seus quadris pressionando o sexo quente em seu ventre, a sua
respiração ofegante, os seus gemidos sufocados, aquelas mãos que agora
puxavam-lhe os cabelos, tudo, era demais para Stela aguentar, faziam mais
de vinte anos que ela não experimentava aquilo, então, de repente, ela
sentiu o seu corpo todo entrar em convulsão... A juíza abriu a sua boca,
mantendo-a rente aos lábios inchados da garota e gozou intensamente,
emitindo uns grunhidos picados e contidos...
Quando a mulher recobrou os seus sentidos, com a respiração
pesada e entrecortada, experimentou uma agradável sensação de
relaxamento, mas logo em seguida sentiu-se constrangida por ter gozado
sem ao menos tirar as suas roupas, como se fosse uma adolescente boba e
inexperiente, sem controle sobre o seu próprio corpo.
Lorena estava extremamente excitada, mas deu uma pausa em
seus movimentos, pois percebeu que Stela havia chegado ao orgasmo, não
lhe restando nenhuma dúvida que o que ela sentia com relação àquela
mulher era recíproco, pois ali estava a prova contundente de que a juíza
também lhe desejava.
A jovem reiniciou a sua incursão voltando a acariciar os cabelos
de Stela e aplicando beijos macios em seu rosto, depois se movimentou para
ficar mais acima da mulher, fazendo com que a boca dela ficasse na altura
de seus seios, incentivando-a a experimenta-los. Tudo o que a moça fazia
era com muito cuidado e carinho, não deixando outra alternativa à juíza que
não fosse aceitar o que estava sendo oferecido à ela.
Stela se viu com o nariz e a boca entre os seios da jovem, tudo o
que ela tinha que fazer era afastar o tecido da camisola e descobri-los para
desfrutar deles e foi exatamente o que ela fez. A juíza, com suas mãos
ágeis, removeu o fino tecido, deixando-os à mostra e passou a contemplar a
sua beleza. Os seios de Lorena eram arredondados, os mamilos soberbos,
definidos e apontavam para ela. A mulher viu o seu corpo se acender todo
de novo quando os tocou, apertando-os delicadamente pelas laterais,
enchendo as suas mãos com aquela carne macia e sedosa...
Lorena olhou para baixo e percebeu que Stela estava um pouco
receosa, então ela lhe segurou a cabeça e a direcionou suavemente para o
que queria. A jovem percebeu o seu sexo latejando novamente quando
sentiu os seus seios sendo sugados fortemente pela juíza... Gemeu e tombou
a cabeça para trás, voltando a menear os seus quadris buscando a mulher
com o seu corpo.
A moça sentia os seus seios sendo apertados e sugados com força
se desfalecendo em seus gemidos fracos, mas ela sentiu a necessidade de
mais, pois queria conquistar o seu orgasmo. Lorena agarrou a mão direita de
Stela e a levou até ao seu sexo, introduzindo-a por dentro da sua calcinha,
ela precisava ser masturbada, penetrada... A jovem não sabia se aquela
mulher iria saber fazer aquilo, mas ansiou para que ela fizesse o seu melhor.
Lorena sentiu os movimentos circulares em seu sexo, depois
percebeu os seus lábios sendo afastados e os dedos ágeis da juíza descerem
até a sua entrada inundada para depois retornarem ao seu clitóris que foi
massageado com maestria, ela sorriu, olhando para o teto, pois se dava
conta de que estava em “boas mãos”... Depois de alguns lentos segundos,
ao sentir que Stela se prolongou demais ali, a jovem abaixou a cabeça e,
acariciando os cabelos da mulher, sussurrou:
__ Me penetra...
A juíza olhou para cima, fitando a moça com os seus lumes cor de
mel e pode ver o quanto ela estava faminta. Voltou a concentrar-se então ao
que fazia, deixou o clitóris teso da jovem para trás, desceu, procurando a
sua entrada, quando a encontrou, uniu o seu indicador ao médio, penetrou-a
fundo, ouvindo um gemido fino e sentindo os seus cabelos sendo agarrados
fortemente, pela moça...
Lorena intensificou os seus movimentos com os quadris, pois
queria sentir os dedos de Stela o máximo que pudesse tamanha era a sua
necessidade, então cavalgou por sobre eles, indo de encontro às estocadas
que a juíza impingia em seu sexo.
A jovem agarrava a mulher pelo pescoço, apertando-a contra si e
movimentava o seu quadril cada vez mais forte, pois queria conquistar o seu
tão sonhado orgasmo. Os dedos de Stela eram firmes e ágeis e a fodiam
com propriedade, então, no meio de toda aquela intensidade, Lorena sentiu
o seu corpo todo entrando em erupção... A sua virilha se enrijeceu, a vagina
e o ânus passaram a se contrair e pequenos choques elétricos passeavam por
todas as suas extensões nervosas... A jovem soltou um gemido, tombou a
cabeça para trás e gozou fortemente, inundando a mão da juíza com o seu
fluido abundante...
Stela foi parando aos poucos, na medida em que a jovem
afrouxava os braços em volta do seu pescoço, lentamente. Lorena havia
chegado ao orgasmo e a juíza por sua vez, recobrava enfim, a sua razão, se
apavorando com o que acabara de fazer e saindo de dentro da moça,
rapidamente... Ela havia feito sexo com a namorada do seu filho! Deus, o
que fizera? Enrico iria odiá-la para sempre se soubesse o que havia
acontecido ali, naquele chaise... Como iria consertar aquilo agora?...
Já Lorena sentia-se plena e emocionada, ainda circulando o
pescoço de Stela com os seus braços. Não era só o fato de ter chegado ao
orgasmo que a deixava assim, mas ela dava-se conta de que a juíza
provocava-lhe sentimentos jamais experimentados antes, pois não era só a
constatação de que aquele momento havia sido perfeito, mas também a
sensação de estar no único lugar do mundo em que ela deveria estar...
Novamente, ela se sentia completa junto daquela mulher...
Stela afastou a jovem do seu corpo e a observou com os seios
para fora, os cabelos desgrenhados, a camisola levantada, a calcinha à
mostra e se achou uma desgraçada por ter feito aquilo com a namorada do
seu filho! Ela colocou as mãos sobre a boca e balançou a cabeça
negativamente sem vislumbrar uma alternativa para consertar aquele erro,
aquele descuido...
__ Stela... __ Chamou Lorena, percebendo a aflição da mulher,
__ Lorena, saia de cima de mim, por favor! __ Pediu a juíza.
__ Stela, se acalme... __ A jovem fechou o seu cardigam em um
auto abraço e saiu de cima da mulher, sentando-se ao seu lado em seguida.
A juíza passou as mãos pelos cabelos, se levantou e saiu daquela
sacada rapidamente. Ao passar pela sala, agarrou a sua bolsa que estava
sobre o sofá e foi para o seu quarto. Lá chegando, trancou a porta e,
colocando novamente as mãos em cima da boca, se deixou cair de joelhos,
desesperada, vertendo lágrimas em seus olhos.
__ Deus, o que eu fui fazer!... O Enrico jamais vai me perdoar!...
__ Dizia Stela a si mesmo, agoniada por ter traído o seu próprio filho...

...A juíza ainda estava ajoelhada, encurvada, com o rosto entre as


mãos quando ouviu o seu telefone tocar. Assustada, ela agarrou a sua bolsa
que estava jogada pelo chão, a abriu e procurou por seu telefone, quando
olhou o visor do aparelho viu que era Enrico. Stela tentou se recompor,
respirou fundo algumas vezes antes de atender a ligação do seu filho.
Felizmente, não era uma chamada de vídeo e sim, de voz.
__ Oi meu filho! __ A mulher estava com uma voz embargada.
Ela ajeitou o aparelho em um de seus ouvidos e se levantou do chão,
tentando se recompor da melhor maneira possível.
__ Oi mãe, tudo bem com você?
__ Tudo bem meu filho, e com você?
__ Tudo bem mãe! Você está com uma voz diferente, está tudo
bem mesmo? __ Perguntou mais uma vez, Enrico.
__ Estou bem meu filho, só estou com um pouco de dor de
cabeça, mas já, já passa não se preocupe! __ Mentiu a mulher.
__ Eu te liguei ha uma meia hora atrás, mas você não me
atendeu, depois liguei para a Lorena, mas ela também não me atendeu!
Está tudo bem mesmo? __ Insistiu o filho.
__ Claro filho! E aí em Brasília, está gostando? __ Perguntou a
juíza, mudando de assunto. Era a segunda vez que Enrico ligava para ela
naquela semana. Na primeira vez em que o seu filho entrara em contato
consigo, era segunda-feira e ele ainda estava no aeroporto, pois havia
acabado de desembarcar.
__ Mãe, isso aqui é incrível! Olha, eu chego à conclusão que
você tem que parar de ser tão resistente a cargos por indicação. Você que é
tão bem conceituada no meio jurídico, poderia chegar aqui mãe, não tenho
dúvidas disso! __ Enrico falava empolgado.
__ Não filho... Você sabe que eu não gosto de ficar devendo
favores... Principalmente a políticos! Você sabe como é a classe política
brasileira... Salvo raras e honrosas exceções! __ A juíza se sentou na cama e
tentava estabelecer uma conversa com o seu filho.
__ Mãe, os políticos vem e vão, mas o cargo público fica, é
perene...
__ Filho, eu estou bem assim, na primeira instância. O trabalho da
ponta é mais significativo pra mim, ao menos por enquanto!
__ Tá bom dona Stela! Eu vou deixar você descansar, tá! Toma
um remedinho para a dor de cabeça. Qualquer coisa, peça ajuda para a
Lorena, ok!
__ Tá bom filho, obrigada!
__ Vou desligar então. Beijo mãe! __ Despediu-se Enrico,
carinhosamente.
__ Eu te amo meu filho!
__ Eu também te amo mãe!
Stela desligou o telefone, o jogou em cima do colchão, passou a
mão pelos cabelos e depois a passou no nariz, sentindo o cheiro do sexo de
Lorena que ainda estava impregnado nos seus dedos.
__ Deus, o que eu fiz com o meu próprio filho? O que fiz com
Enrico? __ Martirizava-se ela, deixando-se cair no colchão, se sentindo a
pior mãe do mundo...

...Na sacada, Lorena ainda permanecia sentada no chaise,


encolhida, abraçada às suas pernas que estavam dobradas rente ao peito,
reconstituindo cada segundo do que havia acontecido ali. Ela ainda sentia o
seu sexo sensível pelas estocadas dos dedos habilidosos da juíza. Tudo
havia sido perfeito, mas o final fora horrível, pois Stela simplesmente
fugira, deixando-a ali, sozinha, como se tivessem cometido um crime.
Depois de um bom tempo, Lorena se levantou e foi para o quarto
de hóspedes. Seria a sua última noite naquele apartamento, estava decidida.
Ao chegar lá, pegou o seu celular e viu que Enrico havia ligado pra ela
dezenas de vezes, mas não teve a mínima vontade de retornar a ligação,
deitando-se em seguida, para enfim, dormir.

***
Capítulo 10

No dia seguinte, Stela acordou ouvindo aquele insistente alarme tocar.


Sentou-se no colchão e procurou o seu celular para desligar aquele som
desconfortável, alto demais, desnecessariamente. Imediatamente, a sua
memória a levou de volta para o seu calvário. Havia feito sexo com Lorena,
a namorada do seu próprio filho! A sua nora! Que absurdo! Como pôde?
Naquela manhã, o fato parecia ainda mais terrível, não havia como
consertar aquilo.
A juíza olhou-se e viu que havia dormido com as roupas do dia
anterior, sem ao menos tomar banho. Aquilo nunca havia acontecido antes,
pelo menos, não que ela se lembrasse, pois adorava chegar em sua casa,
tomar uma ducha relaxante e vestir um pijama confortável, depois de um
dia de trabalho.
A mulher levantou-se, caminhou até o banheiro e lá, olhou-se no
espelho, vislumbrando a sua face cheia de culpa. Não haveria como reparar
aquele erro, não sabia nem como iria encarar Enrico, quando ele voltasse de
Brasília. E Lorena, como iria conviver com ela depois do que aconteceu?
Perguntava-se a juíza, meneando a cabeça negativamente.
Stela inclinou-se sobre a pia e molhou o seu rosto, lavou as suas
mãos e depois voltou a olhar o seu reflexo no espelho, não reconhecendo a
juíza séria e inabalável na fisionomia daquela pessoa refletida, como
sempre vira em todas as manhãs dos seus dias iguais, durante anos a fio.
Naquela manhã, ela via uma mulher insegura, amedrontada e agoniada por
ter cometido um erro sem possibilidades de correção.
Ao sair do banheiro, a juíza caminhou até ao closet, vestiu a sua
malha, calçou os seus tênis e desceu para fazer a sua atividade física. Nada
a desvencilhava daquele compromisso que ela tinha pela manhã, sobretudo
naquele dia, ela precisava suar muito e expurgar um pouco da sua culpa
pelos seus poros.
Depois de uma hora malhando sem parar, Stela retornou para o
seu quarto, tomou um banho demorado, penteou os seus cabelos úmidos,
vestiu outro dos seus ternos elegantes, dessa vez cinza escuro, por sobre
uma de suas bem cortadas camisas brancas. Depois calçou outro de seus
scarpins pretos, lembrando-se que deixara os seus sapatos do dia anterior na
sacada, próximo ao chaise, onde tudo havia acontecido. Respirou fundo,
abriu a porta do seu quarto e foi para a cozinha, tomar o café.
__ Bom dia Lúcia! __ Cumprimentou a juíza, a sua funcionária
que já se mexia na cozinha, ocupada em seus afazeres.
__ Bom dia Dra. Stela! __ Respondeu Lúcia, fazendo uma pausa
e se voltando para a mulher para dar sua total atenção a ela.
Stela se sentou e pegou a colher para comer o seu habitual mamão
papaia que já estava preparado para ela, em um pequeno prato, na cabeceira
da mesa. Ainda não havia terminado de engolir aquela primeira colherada
da fruta avermelhada e doce quando viu que Lorena chegava à cozinha.
__ Bom dia! __ A jovem falou com uma voz baixa,
cumprimentando aquelas mulheres apenas por educação. Depois se sentou
em seu lugar de sempre, em uma cadeira próxima à Stela.
A juíza observou a jovem de esguelha, notando o seu semblante
nada amigável. Parecia que ela estava bastante aborrecida. O silêncio
daquela moça, que todos os dias chegava contente e falante naquela
cozinha, era mortal e foi notado até mesmo por Lúcia que não ousou puxar
nenhum assunto naquela manhã.
Depois do café, quando desceram pelo elevador até a garagem do
prédio, as duas mulheres continuaram em silêncio. Lorena se postou perto
da porta, de costas para Stela que se posicionou rente à parede do fundo
daquela claustrofóbica cela. A descida delas pareceu uma eternidade.
Assim que entraram no carro, Stela introduziu a chave na ignição,
mas não a girou e sim, voltou-se para a jovem, respirou fundo e falou:
__ Lorena, o que aconteceu ontem jamais pode voltar a se repetir.
Foi uma loucura o que fizemos e eu estou muito arrependida! O Enrico não
pode saber de jeito nenhum, senão ele nunca vai me perdoar! Eu... Eu não
posso contar pra ele o que ouve entre nós, ele não iria entender e nossa
relação sempre foi tão boa... Eu espero que você não fale nada pra ele, por
favor!
A moça ouviu o que a juíza disse, com os seus braços cruzados
debaixo dos seios e se sentiu tão insultada! Parecia que ela era apenas um
pedaço de carne... Parecia que o seu papel era secundário naquela trama em
que aquela mulher e o seu filho eram os grandes protagonistas. Os seus
sentimentos pareciam não ter a menor importância ali. Na verdade, ela se
sentiu uma idiota insignificante!
__ Pode deixar, no que depender de mim o Enrico não vai saber
de nada até porque, eu vou terminar o nosso namoro, assim que ele chegar
de Brasília. __ Lorena falou naturalmente, aparentando uma súbita
tranquilidade.
__ Como? __ Perguntou a juíza para se certificar do que estava
ouvindo. Aquela moça iria terminar com o seu filho e... Por sua culpa? O
caso só piorava!
__ É isso mesmo que você ouviu. Eu vou terminar tudo com o seu
filho, assim que ele voltar. __ Confirmou a jovem, decidida.
__ M... Mas o que você vai alegar? Qual motivo você vai
apresentar pra ele? __ Sondou a mulher, apreensiva.
__ A sua única preocupação é não ser descoberta, não é? __
Perguntou a moça, atônita, pois ela percebia que, definitivamente, Stela só
se preocupava com os sentimentos do seu filho e com a sua própria, ilibada
reputação. O que havia acontecido entre elas, na noite anterior, não tinha a
menor importância para aquela mulher.
__ Lorena, você faz ideia do quão complicada é a minha situação?
Você entende a gravidade do caso? Entende o quanto nós erramos ontem?
__ Interrogava a juíza aquela jovem que parecia não compreender de fato, o
imbróglio que elas haviam criado.
__ Stela, o que aconteceu ontem, entre nós duas, eu vou apenas
esquecer e sugiro que você faça o mesmo. Com relação ao Enrico, pode
ficar tranquila que ele jamais vai saber, e quanto a mim, hoje mesmo sairei
do seu apartamento e você nunca mais vai voltar a me ver, agora podemos
ir? Senão chegarei atrasada! __ A moça se expressou demonstrando toda a
indiferença do mundo, depois girou o seu corpo para frente e, olhando para
o para-brisa, pôs-se a esperar a condutora colocar o carro em movimento.
A fala de Lorena era fria e parecia estar envolta em espinhos, pois
Stela, inesperadamente, sentiu a sua carne ser cortada e perfurada, ao ouvi-
la...
A juíza olhou a linda jovem de cima a baixo, respirou fundo,
virou-se para frente se acomodando perfeitamente ao banco e, finalmente,
rodou a chave da ignição para ligar o motor daquele carro e partirem. No
som, parecia até uma caçoada, mas o clássico Moonlight Sonata de
Beethoven começou a ser executado e aquele piano arrefecido tocava no
fundo da alma das duas mulheres silenciosas...
Lorena ouvia aquelas perfeitas notas musicais e, olhando agora
pela janela, vislumbrando a cidade que passava pelos seus grandes olhos,
vivenciava o turbilhão de sentimentos que irrompiam dentro de si. O que
acontecera na noite anterior, para ela, era muito significativo e o que sentia
por aquela mulher ao seu lado, havia se tornado algo grande e profundo...
Esquecê-la não seria uma tarefa fácil, previa, mas era o mais sensato a se
fazer.
Stela conduzia o carro no automático, em silêncio. Agora ela não
pensava mais em seu filho, mas sim, naquela jovem ao seu lado. Imaginar
que nunca mais a veria era inquietante... Aquela informação deu-lhe um nó
na cabeça...

...Na clínica do Dr. Willian, naquele dia, Lorena teria outra sessão
de análise. Ela sempre era atendida nas manhãs das quintas-feiras, toda
semana.
Depois de entrar no consultório, a jovem se aproximou do divã
bordô e se estendeu sobre ele. O psicanalista já se encontrava sentado na
robusta poltrona com o seu caderno de anotações no colo e sua caneta
posicionada em uma de suas mãos.
Naquele dia, o professor vestia uma camisa de flanela xadrez em
tom castanho e por sobre ela, tinha um pulôver de lã marrom. A calça de
brim era caqui e as botas, em tom café. A paleta de cores do vestuário
daquele professor nunca se diferia, era sempre nos mesmos tons e dava a
ele um ar de erudição.
__ Bom dia Lorena! Primeiramente, você fez o seu dever de casa?
Você pensou sobre a heterossexualidade compulsória? Pesquisou sobre o
termo? Leu sobre? __ O arsenal de perguntas do homem dava início àquela
sessão.
__ Bom dia Dr. Willian! Sim. Eu li muito sobre isso durante essa
semana e acho que... Pode ser o meu caso sim. Eu venho de uma família
muito tradicional, religiosa e talvez eu tenha sido educada para ser
heterossexual. Desde que eu me lembro, tenho ouvido dos meus familiares,
falas que me obrigaram de alguma forma, a ver a heterossexualidade como
o correto e qualquer coisa que se desvie disso, é encarado como anormal,
patológico, então, eu acho... Que eu posso sim, Dr. Willian, ser
homossexual e essa semana está sendo muito decisiva pra mim...
__ Lorena, essas descobertas sobre a sua sexualidade são muito
importantes pra você, para a sua libertação, porque ninguém é completo
sem a conquista da sua vida sexual plena e bem resolvida, isso é um fato.
Portanto, vamos continuar trabalhando isso em você, Ok! A relação que
você tem com a sua mãe e com o seu pai define todas as outras relações que
você estabelece ao longo da sua jornada. É muito comum reprimirmos
nossas vontades, nossa essência para nos sentirmos aceitos e amados,
superar isso se torna vital à nossa auto aceitação. Devemos nos sentir
seguros para ser quem somos, e fortalecidos diante de nossa relação com o
mundo. Você é suficiente e pode ser amada do jeito que você é! Você não
precisa ser como as outras pessoas da sua família, você não precisa ser
como ninguém, você precisa ser você mesma e se amar do jeito que você é,
tudo bem?
Um psicanalista, geralmente ouve muito mais do que fala, pois as
descobertas do paciente, ou da paciente são infinitamente mais proveitosas
do que um discurso do terapeuta, mas como Lorena também era uma aluna,
estagiária, e uma estudiosa da Psicanálise, Dr. Willian, em alguns
momentos, optava por passar conhecimento à sua aluna, o que também seria
eficaz, tanto na cura como no desenvolvimento da profissional que se fazia
ali.
__ Agora me fala então, por que essa semana está sendo decisiva
pra você? __ Perguntou o psicanalista, aproveitando o gancho da aluna-
paciente.
__ Bem, eu estou... Confusa... __ Respondeu Lorena. Ela queria
muito falar sobre os acontecimentos daquela semana que mexeram com a
sua psique profundamente. Seria até um desabafo também, pois sentia-se
sufocada.
__ O que te fez ficar confusa? __ Perguntou mais uma vez, o
professor, com a sua voz calma e acolhedora.
__ Dr. Willian, eu... Não sei como dizer isso!
A jovem ansiava por falar o que havia acontecido entre ela e
Stela, mas ela estava extremamente constrangida e não conseguia verbalizar
os seus pensamentos.
__ Lorena, aqui não cabe nenhum julgamento moral ou de
qualquer outra natureza. O que você disser pra mim será encarado como
parte do tratamento, a não ser que você tenha cometido um crime e eu seja
obrigado a te denunciar às autoridades, pois seria o meu dever ético.
__ Não, eu não cometi nenhum crime, ao menos eu acho que não,
mas... Eu e a Stela, a mãe do meu namorado... Nós... Ah... Ontem, nós
fizemos... Sexo...
Lorena falou de forma pausada, se sentindo embaraçada, pois não
era fácil dizer aquilo ao homem. Um fato que causou estranheza à jovem
também, era que, pela primeira vez em sua vida, ela admitia que havia feito
sexo com uma mulher. Até então, ela via os encontros fortuitos que tivera
com algumas garotas, apenas como impulsos juvenis ou distrações sem
importância.
__ E o que você está sentindo diante desse acontecimento? __
Indagou o analista.
__ Bom, eu... __ Lorena respirou fundo, buscando organizar-se
mentalmente para poder responder àquela pergunta. __ Eu gosto de estar
perto dela... Eu gosto de fazer coisas com ela tipo, ver um filme, conversar,
tomar um vinho, comer algo... E o sexo com ela foi... Perfeito... O que eu
estou sentindo por ela se parece muito com o que eu senti pela minha
professora quando eu era apenas uma adolescente, mas... Agora é
diferente... Não é como se eu a idealizasse... Agora, parece real... __ Falava
a jovem emocionada, pois ela descobria, naquele momento, que estava
apaixonada por Stela...
__ Lorena, você descreve com perfeição o que a Stela é para
você. Ela é o seu objeto de desejo, portanto você descreve o amor, que está
intrinsecamente ligado ao desejo. __ Explicou o psicanalista.
__ Mas eu tenho que esquecê-la Dr. Willian, porque ela é
complicada demais, pois tem o Enrico, seu filho, entre nós e mesmo que eu
termine tudo com ele, que é o que farei, assim que ele chegar de Brasília, eu
me dou conta de que ele sempre vai estar entre nós... Então, isso torna tudo
impossível... __ Constatava a jovem, desgostosamente.
__ Lorena, o amor é um acontecimento único, que pode ocorrer
várias vezes, obviamente, em nossa vida, mas cada vez que ele se manifesta
é uma sorte tão grande que não podemos ignorar o seu chamado. Ainda que
ele venha envolto no sofrimento e quase sempre é assim, nós devemos lutar
por ele, pois o objetivo maior de nossas vidas é o amor...
...Quando a sessão terminou, Lorena saiu do consultório de Dr.
Willian se sentindo melhor, mas igualmente confusa, pois ainda que tenha
conseguido ver o que a juíza significava para si, ela não vislumbrava a
menor possibilidade de algo dar certo entre elas, até mesmo pela postura de
Stela consigo naquela manhã que foi para ela, desanimador, depois de tudo
o que acontecera entre elas na noite anterior. Não! Ela iria esquecê-la, tinha
que esquecê-la, estava decidida.

...Stela passou o dia inteiro pensando em Lorena, já não pensava


mais em Enrico. O que havia acontecido entre elas, na noite anterior,
aparecia em flashes em seu consciente. Entre uma ementa e uma averbação,
surgia os lábios carnudos da jovem, engolindo os seus... Entre um caput e
um artigo, vinha os seios arredondados da moça em sua boca, provocando-
lhe choques elétricos pelo seu corpo... Entre uma petição e uma súmula,
aparecia o sexo quente de Lorena deslizando em seus dedos, provocando-
lhe pulsações entre as pernas... Não era possível trabalhar daquele jeito!
__ Bianca, eu já volto, só um minuto! __ Disse a juíza depois de
respirar fundo, se levantando da sua cadeira diante daquela mesa cheia de
processos, com o rosto afogueado. Precisava respirar um pouco e se
reestruturar, estava demais para ela aguentar. Stela caminhou até ao
banheiro e lá chegando, se olhou no espelho, conseguindo ver o quanto
estava alterada, com as têmporas pegando fogo. A mulher molhou a face
depois passou suas mãos úmidas na nuca, precisava esfriar a cabeça senão
ia entrar em combustão...

...Às dezessete horas em ponto, Stela olhou em seu relógio e


anunciou a sua partida. Ela queria chegar antes de Lorena em casa, pois
queria vê-la antes dela ir embora do seu apartamento. A juíza então
arrumou suas coisas rapidamente e saiu do fórum a passos largos. Bianca
não compreendeu a pressa da magistrada naquele dia, pois aquela mulher
nunca tinha aquela afobação para sair do trabalho, pelo contrário, ela era
sempre tão cuidadosa que a sua saída, todos os dias, só se dava depois de
tudo estar devidamente organizado, perfeitamente.
Depois de fazer o trajeto entre o fórum e a sua casa,
aceleradamente, Stela entrou no apartamento e procurou por Lorena.
Primeiro foi até a cozinha, depois foi até a sacada e por último, foi até ao
quarto de hóspedes. Chegando lá, a juíza bateu na porta, mas não teve
resposta nenhuma. Bateu mais uma vez, acurou os ouvidos aproximando-os
da madeira, mas não escutou nada, então resolveu entrar.
Quando a mulher adentrou na peça, sentiu o delicioso cheiro de
Lorena impregnando as suas narinas... A cama estava perfeitamente
arrumada e não havia nenhum objeto que pudesse pertencer à jovem ali.
Stela caminhou até o guarda-roupa, o abriu e não viu nada, além de algumas
roupas de cama. A moça havia ido embora e ela nunca mais a veria...
A juíza sentou-se na cama, respirou fundo com uma sensação de
vazio em seu peito, depois olhou para o lado avistando o travesseiro que
havia sido usado por Lorena, rente à cabeceira. A mulher inclinou-se um
pouco para agarrá-lo e traze-lo para junto do seu corpo. Ela enfiou o seu
nariz naquela fronha macia e branca para aspirar o cheiro que ficara
entranhado ali e pode sentir o perfume dos lindos cabelos castanhos da
jovem, lembrando-se das sensações que ele lhe provocara, na noite anterior,
quando sentiu o seu rosto sendo acariciado pela textura deles em sua pele...
Na hora que foi dormir, depois de ter tomado o seu banho e
comido algo na cozinha, Stela se deitou em sua cama e abraçou o
travesseiro fofo e cheiroso de Lorena, pois ela o havia levado para o seu
quarto. Naquela noite, a juíza adormeceu sentindo o perfume da moça,
lembrando-se dela acariciando-lhe o rosto e os cabelos com as suas mãos
cuidadosas... Suaves...

***
Capítulo 11

No sábado, mais ou menos às dezoito horas, Stela estava estirada no


sofá da sala lendo um livro, quando escutou a campainha tocar. Ela estava
aguardando o seu filho chegar e julgou que deveria ser ele, pois Enrico
havia ligado para ela de Brasília, avisando-a da hora do seu voo e
informando-lhe quando provavelmente chegaria. Ele não havia levado as
suas chaves de casa, tinha as deixado com Lúcia para ser entregue à Lorena
com a intenção de que a jovem pudesse ter livre acesso àquele apartamento
em sua ausência.
A juíza fechou o seu livro, se levantou, caminhou até a porta para
abri-la e se deparar com Enrico segurando a alça de sua mala de rodinhas
que repousava ao seu lado.
__ Oi meu filho! __ Stela cumprimentou Enrico, feliz por vê-lo de
volta da viagem, mas sentindo a sua apreensão retornar, lembrando-se do
que havia acontecido entre ela e Lorena. Quando fitou os olhos do seu filho,
ela vivenciou de novo, toda a aflição pelo reconhecimento da gravidade do
erro que havia cometido.
__ Oi mãe! __ Disse o filho agarrando a mulher pela cintura,
dando-lhe um abraço apertado e carinhoso. __ Que saudades! __ Completou
o rapaz amoroso, dando um beijo na cabeça da juíza.
__ Ah, filho, eu também! __ A mulher circulou os seus braços
pelo pescoço do jovem alto e forte, devolvendo-lhe o beijo. Eles eram
muito amigos, se davam muito bem e esse fato só deixava Stela mais
amargurada pela traição que havia cometido com ele, o que a enchia de
culpa.
__ Está tudo bem por aqui? __ Perguntou o rapaz.
__ Está tudo bem. E lá em Brasília, como foi?
Stela caminhou com o seu filho até o sofá e sentou-se junto dele
para ouvir a sua experiência.
__ Foi ótimo mãe! Assistimos a julgamentos no STF, visitamos o
plenário da Câmara Legislativa e suas dependências, visitamos o Palácio do
Planalto, fizemos um tour completo, foi muito bom! __ Falava o rapaz com
empolgação.
__ E os políticos, você os viu?
__ Ah mãe, vi vários deles, os famosos representantes do povo!
Todos lá, circulando pelas avenidas em carros oficiais, sempre cercados por
assessores, imprensa, enfim...
__ E você chegou a conversar com algum deles? Me fala!...
Enrico contava detalhadamente à sua mãe, as suas impressões de
Brasília, a longínqua capital do Brasil. A cidade estrategicamente isolada,
onde se concentra todos os poderes máximos do país. O local distante, onde
se decide o destino do povo (in)esperançoso brasileiro...
__ E Lorena? Imaginei que ela ainda estivesse aqui. Pelo jeito ela
já foi. Como ela se comportou? __ Indagou Enrico, assim que terminou o
relato de sua viagem.
__ Ela já foi! Decerto o seu amigo já deve ter retornado, por isso
ela resolveu ir. __ Respondeu Stela, antes de raspar a garganta,
desconsertada. __ Está com fome, meu filho? __ Perguntou a mulher,
tentando mudar de assunto. O seu desconforto ao conversar sobre Lorena
com Enrico era imenso e contar a verdade a ele era algo impensável, fora de
cogitação.
__ Não mãe, eles serviram um lanche no voo. __ Respondeu o
jovem, antes de respirar profundamente. __ Bom, então é isso! Eu vou
tomar um banho que estou precisado.
__ Vai sim filho, um banho é ótimo pra relaxar!
Stela esboçou um sorriso fraco, assistindo Enrico se levantar e
sair caminhando em direção ao seu quarto. O seu filho não poderia saber o
que houve entre ela e Lorena de forma alguma, ele jamais a perdoaria.
Deus, por que havia feito aquilo? Por que não teve forças para fugir?
Perguntava-se a mulher em agonia, mais uma vez...

...Depois de um tempo, Enrico retornou do seu quarto, já todo


bem vestido e perfumado, chamando a atenção de sua mãe que novamente
interrompeu a sua leitura para observá-lo.
__ Mãe, eu vou sair pra encontrar a Lorena. Nós nos falamos
agora por telefone e ela me disse que tem algo importante pra me dizer.
__ A... Algo importante? __ Gaguejou a mulher, sentindo a
apreensão tomar conta do seu estado de espírito, novamente. A sua
respiração ficou curta e as suas mãos começaram a suar de aflição.
__ Sim, ela disse que não dava para falar por telefone, então estou
indo lá, tá! __ Disse o rapaz, se curvando sobre a mãe para dar-lhe mais um
beijo na cabeça e depois, pegar as suas chaves no aparador próximo à porta
para sair.
Stela ficou sentada naquele sofá, paralisada, com uma súbita dor
de cabeça. Será que Lorena iria contar tudo ao Enrico? Perguntava-se a
juíza, prevendo o pior. Ela não tinha mais concentração para dar
continuidade a sua leitura. Colocou o livro por sobre a mesa de centro e foi
até a cozinha tomar um copo de água para se acalmar, aproveitou para
tomar um analgésico. Aquele calvário lhe esmagava e parecia não ter fim...

...Lorena saiu do seu quarto e caminhou até a porta do pequeno


apartamento para olhar pelo olho mágico e descobrir quem estava tocando a
campainha. Vendo que era Enrico, o seu namorado, ela destrancou a porta e
a abriu, recebendo dele um forte abraço e um beijo quente e arrastado.
__ Oi amor, que saudades! __ Disse o rapaz, carinhoso, após
desgrudar os seus lábios da boca macia de Lorena.
__ Oi Enrico, tudo bem? __ Perguntou a jovem, se afastando do
abraço caloroso que o rapaz lhe dava.
__ Tudo bem! Você queria conversar comigo? Eu estou aqui!
__ Eu quero conversar com você sim. Vamos nos sentar!
A moça apontou para duas poltronas no canto daquela pequena
sala e os dois caminharam até elas para se sentaram de frente um para outro.
Lorena respirou fundo e iniciou:
__ Enrico, como você sabe, eu não gosto de rodeios e por isso eu
vou direto ao ponto. Eu chamei você aqui, porque... Pra mim, não dá mais.
Eu quero terminar com você!
__ O quê? Como assim? __ Perguntou o rapaz, sentindo o baque
que a fala da sua namorada provocara em si. Ele havia sido pego de
surpresa, jamais esperava que a sua namorada lhe dissesse o que ela acabara
de falar.
__ É isso mesmo que você ouviu Enrico, eu estou terminando
tudo entre nós, porque pra mim não dá mais! __ Repetiu a jovem, incisiva.
__ Como assim Lorena? A gente estava bem antes de eu viajar.
Você até ficou lá em casa! Não estou entendendo... Aconteceu algo? Você e
a minha mãe... Aconteceu alguma coisa entre vocês duas? Vocês estão bem?
__ A minha decisão não tem nada a ver com a sua mãe Enrico,
não tem nada a ver com ninguém! Sou eu mesmo que não quero mais.
__ Mas por que você não quer mais? Tem que haver algum
motivo Lorena! Nada termina assim, desse jeito, de uma hora pra outra! __
O rapaz, surpreso, não entendia aquela súbita decisão da sua namorada.
__ Enrico, eu já disse, eu não quero mais!
__ Você encontrou outro, é isso? __ Concluiu o jovem, pois só
podia ser isso, não havia outra explicação.
__ Não encontrei ninguém Enrico, eu quero ficar sozinha é só
isso. Eu preciso disso!
__ Tem algo de errado comigo? Se tiver, o que é? Me fala, por
favor! __ O rapaz se despia do seu brio e começava a considerar a
possibilidade de haver algo nele que desagradou aquela moça, mas o que
poderia ser?
__ Não tem nada a ver com você Enrico, sou eu mesmo! Estou
precisando de um tempo sozinha. Vai ser bom para o meu processo de
autoconhecimento, só isso!
__ Tem certeza que não há nada de errado comigo? Me fala,
talvez eu possa mudar! __ Insistiu o jovem, pois estava apaixonado por
Lorena e não queria perde-la de forma alguma. Na verdade, ele tinha planos
de ter algo mais sério com ela. Pensava até pedi-la em casamento, pois de
fato, estava amando aquela moça.
__ Você é uma ótima pessoa Enrico e merece uma garota que te
ame de verdade. Estou sendo sincera.
Lorena foi honesta, pois de fato, para ela, Enrico era um ótimo
rapaz, mas a questão que estava em jogo eram as suas descobertas sobre si
mesmo, sobre a sua sexualidade. E aquela semana fora decisiva para ela.
__ Mas eu não quero nenhuma outra garota, eu quero você
Lorena! Por favor, me dá uma chance de te provar que eu posso ser melhor!
__ Implorava o rapaz, envolvendo as mãos da moça com as suas, despojado
do seu orgulho, pedindo para ficar na vida dela.
__ Enrico não faz isso! A minha decisão não tem nada haver com
você, eu preciso descobrir quem eu sou e para isso, eu preciso ficar sozinha.
Enrico soltou as mãos da moça, passou-as pelos seus macios
cabelos castanhos e se levantou, bruscamente. O fim súbito do seu namoro
acabava de tirar-lhe o chão. Aquele rapaz sentia o seu coração pesar no
peito, jamais imaginou passar por uma decepção daquelas com aquela
jovem tão especial.
__ Essa é a sua última palavra? É isso mesmo que você quer? __
Perguntou o rapaz pela última vez, pois havia um nó em sua garganta e ele
precisava sair dali para extravasá-lo.
__ Sinto muito Enrico, mas é isso que eu quero!
__ Ok! __ O jovem passava as mãos pelos cabelos e meneava a
sua cabeça positivamente. __ Eu vou embora! __ Completou o rapaz,
saindo em disparada daquele apartamento, sem ao menos se despedir.
Lorena ficou ainda sentada na poltrona por um tempo, com as
mãos por entre os cabelos, emocionada com o rompimento, sentindo
algumas lágrimas descerem por sua face. Naquele momento ela deixava
para trás Enrico, visivelmente apaixonado por si e também a sua mãe, a
mulher que mexera profundamente com os seus sentimentos. A sensação de
vazio era imensa, mas teria que superar tudo aquilo e dar continuidade à sua
dura jornada de autoconhecimento...

... No dia seguinte, Stela acordou e foi para a cozinha preparar o


desjejum. Enquanto a máquina passava o café, preenchendo a peça com
aquele agradável aroma, ela fez algumas torradas de pão integral e partiu
um mamão, colocando uma de suas bandas em um pequeno prato.
Após organizar a mesa com os utensílios que seriam usados por
ela e Enrico, Stela se sentou e começou a saborear a deliciosa fruta
avermelhada que todos os dias, religiosamente, comia, antes de qualquer
outra coisa.
Quando a juíza colocou na boca a sua segunda colherada da polpa
macia, viu Enrico entrando na cozinha com uma feição carrancuda, o que a
preocupou de tal forma que o mamão se tornou insípido, instantaneamente.
__ Bom dia!
O jovem cumprimentou a sua mãe entre os dentes, abriu a
geladeira para pegar um suco, sem ao menos dar o seu costumeiro beijo na
cabeça daquela mulher que o olhava apreensiva, com a respiração curta, já
sentindo a sua agonia.
__ Bom dia, meu filho!
Enrico se sentou em seu lugar de sempre, encheu um copo do
suco gelado e tomou um gole. Depois o rapaz massageou as suas têmporas
com uma de suas mãos e suspirou alto, demonstrando um visível
aborrecimento.
__ O que foi Enrico, está se sentindo bem? __ Perguntou Stela,
cada vez mais alarmada. A possibilidade de Lorena ter contado tudo para o
seu filho era grande e ela previa o pior.
__ A Lorena terminou tudo comigo ontem!
__ Terminou? M... Mas o que ela alegou? __ Perguntou Stela,
aflita, sentindo o seu coração acelerar-se em seu peito.
__ Ela disse que precisa ficar sozinha pra descobrir quem ela é!
__ O tom da voz de Enrico revelava toda a sua revolta pela decisão
inesperada da moça. Ele estava perdidamente apaixonado por Lorena e
removê-la do seu coração parecia-lhe impossível naquele momento.
__ Ah! Ela disso isso? Q... Quer dizer, ela terminou por isso? __
A juíza ficou aliviada, mas continuou cautelosa, não queria se
autodenunciar de forma alguma. Estava disposta a levar aquele assunto para
o seu túmulo, ou melhor, para além do seu túmulo!
__ É! Ela disse isso. __ Naquele momento, o jovem fitou a sua
mãe __ aconteceu algo aqui, entre vocês duas? __ Perguntou o rapaz, pois
uma de suas hipóteses é que Lorena tenha se desentendido com a sua mãe,
mas não quis lhe dizer.
__ Aqui? Não! O que poderia ter acontecido? __ Respondeu a
mulher rapidamente, sentindo-se mal por ter de mentir ao Enrico, coisa que
nunca havia acontecido antes. Ela sempre fizera questão de ter uma relação
de confiança com o seu filho, pautada na verdade.
__ Sei lá! Eu imaginei que talvez vocês pudessem ter se
desentendido. __ Respondeu o jovem e depois balançou a cabeça
negativamente. __ Tem algo de errado comigo mãe?
__ Claro que não filho! Não tem nada de errado com você,
Enrico. Você é um rapaz maravilhoso! Dê tempo ao tempo, seja paciente.
__ Aconselhou a mulher o seu filho, afagando uma de suas mãos que estava
sobre a mesa, sentindo-se uma traidora do seu próprio filho que tanto
amava.
__ Ser paciente mãe? Eu estou... Apaixonado por ela! __ O rapaz
assumia os seus sentimentos, sem reservas e não conseguiu conter uma
lágrima que desceu por sua face desfigurada.
Stela apenas deu continuidade aos afagos que fazia em uma das
mãos de seu filho, sentindo-se a pior mãe do mundo. A sua culpa se
agigantou com o fato de Lorena ter rompido com Enrico que agora chorava
abertamente, por sua perda irremediável. Deus, eu sou uma desgraçada!
Pensava ela, diante do sofrimento estampado em seu amado filho...

***
2º Movimento
Capítulo 12

Algumas semanas se passaram e Stela via Enrico amuado, triste,


sempre calado nos momentos em que se encontravam dentro de casa, o que
geralmente era no café da manhã e à noite, quando retornavam dos seus
respectivos labores diários.
Nos finais de semana, a juíza não via o seu filho arrumado,
perfumado e saindo nas noites, indo à “caça” como ele sempre fizera, desde
que havia se tornado um homem. Enrico havia entrado em um casulo para
tentar superar Lorena, o que não estava sendo fácil para o rapaz, estreante
no universo do amor que sempre vem acompanhado do sofrimento, como se
fosse um apêndice. Era a primeira vez que aquele jovem amava de verdade
e ser preterido pela mulher amada estava sendo difícil para ele aceitar.
Todos os dias daquelas semanas decorridas, Stela, a caminho do
seu trabalho, sempre que passava em frente ao prédio onde Lorena fazia o
seu estágio, desacelerava o carro e passava lentamente, olhando por toda a
sua volta para ver se via a jovem ao menos de longe, pois não havia
conseguido esquecê-la, pelo contrário, as lembranças da moça ainda
continuavam nítidas em sua memória. Os momentos vividos por elas
naquela semana insólita, martelavam insistentemente em seus pensamentos,
sobretudo o que havia acontecido no chaise, em sua sacada, naquela noite
enluarada...
A juíza sabia que nada poderia acontecer entre ela e aquela
jovem, pois jamais iria se perdoar por ferir os sentimentos do seu filho
daquela forma, porém, Stela simplesmente não conseguia evitar em querer
ver, ao menos de longe, a linda moça que entrou em seus pensamentos e se
apossou de sua cabeça, como uma visita espaçosa que chega e toma conta
de todos os cômodos da casa...

...Mas em um fim de semana, à noite, a juíza enfim, viu o seu


filho sair de seu quarto todo aprontado e perfumado, passando por ela que
se encontrava estirada no sofá da sala, lendo uma matéria em uma revista.
__ Vai sair? __ Perguntou a mulher após tirar os olhos de sua
leitura e fitando o rapaz para estudar o seu comportamento, admirando-o de
cima a baixo, constatando que o seu “menino” havia mesmo, se tornado um
belo homem.
__ Sim! Vou sair com uns amigos. __ Respondeu o jovem alto,
forte e elegante, feliz enfim, por ter conseguido sair de sua bad. Ele havia
chegado à conclusão que ficar naquela fossa não iria leva-lo a nada e
também, concluíra o rapaz em um dado momento, Lorena não era a única
mulher existente no mundo, felizmente havia mais de três bilhões delas
sobre a terra e encontrar alguma que pudesse preencher o vazio deixado por
sua ex-namorada não seria uma tarefa impossível de ser realizada, ao menos
ele esperava que não.
__ Isso aí filho, você é lindo e a vida te espera de braços abertos!
Nada de ficar escondido e sofrendo pelos cantos! __ Stela estava feliz por
ver o seu filho sendo capaz de seguir em frente como um jovem saudável e
emocionalmente equilibrado, do jeito que deve ser.
__ Vou fazer o que né mãe? Vida que segue! Vou sair com alguns
amigos por aí, tá!
Enrico se curvou sobre a mulher para dar-lhe um beijo na cabeça,
carinhosamente e depois caminhou até o aparador, pegou as suas chaves e
se retirou, deixando o seu agradável perfume impregnado naquela sala.
A juíza ficou ali, deitada no sofá, mas não conseguiu voltar à sua
leitura, pois se Enrico estava conseguindo superar Lorena, ela não. As
lembranças da moça voltavam obstinadamente em sua memória e
conseguiam tirar-lhe o foco, mais uma vez.
Naquele momento em que Stela presenciava o filho indo à luta,
ela se sentiu tão solitária, como nunca havia se sentido durante aqueles mais
de vinte anos em que apenas se dedicou ao seu trabalho e nada além.
Lorena havia conseguido despertar nela o que estava devidamente
adormecido por todos aqueles anos, o seu desejo.
Como seria bom se tivesse uma companheira, pensava a juíza...
Mas sair do armário, vencer o auto preconceito era uma barreira
intransponível para aquela mulher distinta e respeitada por toda a
sociedade...
...Mas... Em um improvável dia da semana seguinte, Stela estava
indo para o trabalho e, ao passar novamente pelo prédio que ficava a clínica
onde Lorena fazia o seu estágio, ela simplesmente pisou no freio e ligou a
seta para estacionar em uma vaga que avistou, ouvindo até o barulho
desconfortável de uma buzina, acionada pelo motorista do veículo que
vinha logo atrás.
Depois de fazer a baliza, a mulher desligou o carro, respirou
fundo e passou analisar a situação em que se encontrava, naquele momento.
Ela, uma conceituada juíza de direito, com uma reputação incontestável na
sociedade, estava prestes a entrar naquele prédio para conversar com uma
jovem, ex-namorada do seu filho e, se lhe fosse possível, convidá-la para
um encontro ou algo do tipo. Stela iria ter coragem para fazer os seus
planos acontecerem, ou mais uma vez voltaria para a sua infinita clausura?
A mulher sentiu as suas mãos úmidas, suadas, que denunciavam o
seu nervosismo naquele momento. Já tinham se passado quase uns dez
minutos e Stela, paralisada, não conseguia sair daquele carro. Depois de
mais uns três minutos de dúvida, em um ímpeto ousado, ela abriu a porta e
saiu rumo ao prédio onde provavelmente, encontraria Lorena.
Quando chegou à portaria, a juíza dirigiu-se ao balcão,
perguntando ao homem que ali trabalhava, sobre o andar e sala que
funcionava uma clínica de psicologia naquele edifício. O senhor atencioso,
passou as informações solicitadas pela distinta mulher imediatamente e
depois observou-a caminhar até ao elevador com suas passadas elegantes e
seus trajes refinados.
Já no andar que ficava a clínica de psicologia, Stela foi até à sala
com o número informado pelo porteiro e adentrou pela ampla porta de
vidro, passando a vasculhar todo o espaço da recepção com os seus pares de
olhos mel escondidos pelas lentes escuras dos seus óculos de sol, porém não
viu nenhum sinal de Lorena naquele lugar.
A juíza caminhou até a recepcionista que já havia notado a sua
presença e perguntou:
__ Bom dia! Ah... Uma jovem chamada Lorena faz estágio aqui,
nesta clínica?
__ Bom dia! Sim, ela é estagiária aqui. __ Respondeu a moça,
simpática.
Stela mantinha as suas duas mãos nos bolsos da calça que estava
usando para disfarçar o seu nervosismo. Não intencionava retirar os seus
óculos escuros para não revelar o seu estado de espírito tenso que
certamente, estaria estampado em seus olhos.
__ Ela está aqui agora?
__ Sim, ela já chegou. Aguarde um minutinho que irei chama-la.
__ Respondeu a recepcionista, já se levantando e caminhando até uma porta
que parecia dar em um corredor para depois desaparecer por ela.
A juíza se viu sozinha na sala da recepção e, subitamente, pensou
em fugir daquela louca empreitada que havia iniciado. Parecia que a sua
razão havia retomado o seu lugar de direito. O que está fazendo Stela? Está
louca? Pensava consigo mesmo a mulher, mas no momento em que se virou
e deu dois passos para ir embora, decidida a se trancar de vez em seu
“armário” e jogar a chave por debaixo da porta para nunca mais sair, ouviu:
__ Stela!
A juíza estacou e depois se voltou, vagarosamente, avistando
Lorena que a fitou com os seus grandes lumes castanhos, expressando neles
a sua surpresa em vê-la ali, naquela sala.
__ Oi Lorena! __ Disse Stela, tentando parecer tranquila,
mantendo as suas mãos nos bolsos da calça para não ter que cumprimentar a
jovem com elas, pois fatalmente denunciariam o seu extremo nervosismo
visto que continuavam úmidas e agora estavam congeladas.
__ Me disseram que você quer falar comigo...
__ Ah... Sim! Seria possível? __ Perguntou a juíza.
__ Claro! Tem uma sala aqui que eu uso para estudar, escrever,
esse tipo de coisa... Vem comigo!
Após chamar a mulher, a moça se virou e saiu caminhando,
adentrando pela porta que de fato, dava para um corredor. A jovem andava
na frente sendo acompanhada por Stela que ia logo em seguida.
Chegando à pequena sala, Lorena esperou que a juíza passasse
pela porta para também entrar e fechá-la atrás de si. Depois se voltou, olhou
para a mulher e convidou-a para que se sentassem nas poltronas que
compunham a decoração daquela saleta. A jovem utilizava aquele pequeno
espaço para fazer os seus estudos e anotar os registros diários do estágio
que fazia naquela clínica.
As duas mulheres sentadas, voltadas uma para a outra, ficaram em
silêncio por alguns segundos até que Lorena sentiu-se desconfortável com a
situação, abriu as suas mãos e perguntou:
__ Então Stela, o que você quer falar comigo?
A juíza, que estava agora com as mãos entrelaçadas sobre o colo,
cruzou as suas pernas, se voltou ainda mais para a jovem, respirou fundo e,
tentando parecer calma, disse:
__ Bem... Lorena, eu estava passando aqui em frente, indo para o
meu trabalho, quando decidi parar aqui para saber se está tudo bem com
você... Saber se está precisando de alguma coisa, enfim...
Stela não teve a coragem de dizer o real motivo que a fizera
entrar naquele prédio, então, de última hora, optou por uma abordagem
maternal para tentar se disfarçar e sair ilesa daquela louca situação em que
se metera. Provavelmente iria embora dali sem conseguir nada do que
realmente queria, pensava ela, pois constatava, naquele exato momento, que
não passava de uma covarde.
Lorena olhou de viés para a juíza, sem saber de fato o que aquela
mulher queria, pois já não tinham ligação parental nenhuma para ela ter
aquele tipo de preocupação consigo.
__ Stela, não me leve a mal, mas se eu estivesse precisando de
alguma coisa eu me reportaria à minha família, pois eu tenho mãe, tenho pai
e não preciso desse tipo de cuidado da sua parte! __ A jovem que falava
educadamente, desconfiou que aquela mulher tenha lhe procurado para
oferecer aquele tipo de ajuda. Aquilo não estava fazendo sentido algum
para ela.
Stela coçou a nuca e se sentiu uma idiota por não ter coragem em
dizer o que planejara, àquela jovem. Ela estava ali com um único objetivo,
convida-la para um encontro, nada mais, mas simplesmente, não conseguia!
__ Bom... Então, se está tudo bem contigo, eu vou indo, não
posso chegar atrasada no meu trabalho! __ A juíza olhou em seu elegante
relógio de pulso e se levantou. Ela tentava aparentar uma certa frieza, como
se estivesse ali apenas por uma obrigação, pois queria salvar a sua
dignidade a todo custo.
Lorena, vendo a mulher já de pé e caminhando para ir embora
dali, se perguntou onde estava o sentido daquela visita! Afinal de contas, a
sua ex-sogra havia a procurado para quê mesmo?
__ Stela, só um minuto! __ Falou a jovem, antes de se levantar e
cruzar os braços por debaixo dos seus seios arredondados. __ O que você
veio fazer aqui? Porque não está claro pra mim!
A mulher se voltou, acomodando as mãos nos bolsos da calça
novamente e sentiu a deixa perfeita para expor as suas reais intenções, mas
o seu forte era firme demais, pois passara anos cimentando as suas paredes,
então novamente, recuou.
__ Você não ouviu o que eu disse? Eu estou passando aqui para
saber como você está, se está precisando de alguma coisa...
Lorena riu e meneou a cabeça negativamente porque depois de
tudo que havia acontecido entre elas, era improvável que aquela mulher
tenha se dado ao trabalho de parar ali apenas para fazer-lhe tais perguntas.
A jovem então deu alguns passos na direção da juíza e, em um ato ousado,
retirou os seus óculos escuros, descobrindo os pares de olhos da cor exata
do mel que se comprimiram, devido ao impacto da luz do sol matutino que
preenchia aquela saleta.
Colocando os óculos por sobre uma mesinha próxima e fitando a
mulher com os seus lumes penetrantes, perguntou suavemente, a moça:
__ Stela, o que você veio fazer aqui, de verdade?
A moça arriscou um pouco mais e andou mais um passo, ficando
a centímetros da juíza. Ela estava convicta de que aquela mulher estava ali
porque queria vê-la, era óbvio demais.
Stela sentiu o calor do corpo da jovem próximo ao seu,
percebendo a aceleração do seu coração e suas mãos geladas dentro dos
bolsos. Ela odiava aquele estado de vulnerabilidade que se instalava nela,
sempre que estava diante de Lorena. Se em sua vida profissional aquela
mulher era tão segura e tão competente, ali, diante daquela moça, ela não
passava de uma adolescente boba.
__ Fala Stela! O que você veio fazer aqui? Você queria me ver,
não é?
A jovem era corajosa demais! Ela estava a centímetros da juíza e
olhava no fundo dos seus olhos, desafiando-a, de queixo erguido, como
ninguém no mundo tinha a ousadia de fazer com aquela mulher imponente.
Stela respirou fundo algumas vezes e olhando aquela boca linda,
entreaberta, intimando-a a agir, não aguentou se segurar, retirou as suas
mãos dos bolsos, levantou-as e enfiou-as por entre os cabelos macios da
jovem, puxando-a pela nuca para beijar os seus lábios carnudos. A juíza
imediatamente teve as suas costas agarradas pelas mãos firmes da moça,
enviando a ela a informação de que fizera o certo, motivando-a a
aprofundar o beijo que se tornou ávido e guloso, com as línguas se
massageando e se digladiando pelo domínio do espaço.
A respiração de Stela era entrecortada e o seu sexo correspondia,
simultaneamente... Ela queria agarrar aquela moça para sentir todo o corpo
macio dela junto ao seu, então ela abaixou uma de suas mãos e abraçou a
jovem pela cintura trazendo-a para si, apertando-a avidamente... As regiões
do seu ventre, abdome e peito pareciam estar sendo perfuradas por finas
agulhas... A juíza havia perdido totalmente a sua compostura e se entregava
completamente àquele momento de loucura e deleite...
Lorena levantou os seus braços e agarrou a mulher pelo pescoço,
engolindo a sua boca, com os seus lábios carnudos... O beijo delas era
urgente, esfomeado e provocava na jovem, pulsações em seu sexo quente
que liberava o líquido viscoso, chegando a molhar sua calcinha...
As respirações entrecortadas e os estalidos dos lábios das duas
acordou Lorena que não tencionava interromper aquele delicioso momento
de forma alguma. Em um lampejo de racionalidade, a moça conseguiu ver o
perigo que a situação lhe impunha se fosse vista ali, por alguém daquela
clínica, aos beijos com aquela mulher, na sala que usava para fazer as
leituras e anotações do seu precioso estágio.
__ Stela, para! __ Sussurrou Lorena com o seu corpo em chamas,
depois de conseguir interromper aquele beijo esganado.
A juíza respirava com dificuldade, mas não soltou o corpo macio
e quente da jovem, pois ela queria mais... Estava tão tomada pelo desejo
que não conseguia raciocinar.
__ Eu quero você... __ Murmurou Stela em um sopro, reiniciando
o beijo, agarrando a moça pela cintura, pois ela a queria toda, ali, naquela
sala.
Lorena se desvencilhou e espalmou as suas mãos no peito da
juíza, para contê-la.
__ Aqui não Stela, em outro lugar!
__ Onde então? __ Perguntou a mulher com os seus lábios
inchados e rosados, arfando, com o coração a mil, se recusando a soltar o
corpo quente e macio da jovem.
__ Não sei, calma! Me solta! __ Pediu Lorena, tentando ordenar
aquela situação descabida naquela sala.
Stela soltou a moça, passou as mãos pelos cabelos e depois as
passava pelo nariz, pela boca, tentando se acalmar, pois o seu estado era de
pura excitação.
__ E o Enrico?
Lorena lembrava-se perfeitamente da última conversa que havia
tido com a juíza ha algumas semanas atrás. Aquela mulher tinha deixado
bem claro para ela que nada mais poderia acontecer entre as duas por causa
do seu filho.
__ O que tem ele?
__ E se ele souber de nós? __ Perguntou a jovem, voltando a
cruzar os braços por debaixo dos seios.
__ Ele não pode saber de jeito nenhum! Enrico não me perdoaria
Lorena, me entenda, por favor! __ Pediu a mulher, com receio de perder o
pouco que acabara de conquistar com aquela jovem.
__ Stela, caso não tenha percebido, o seu filho já é um homem e
pode entender isso perfeitamente!
__ Vamos deixar isso só entre nós duas, por favor! E... Eu não
tenho nenhuma condição de expor isso para o Enrico e nem pra ninguém!
Eu sou uma juíza e esse cargo tem um peso muito grande na sociedade! Eu
não posso ter nenhum ponto frágil que coloque em xeque a minha
autoridade, entendeu? __ Explicava a mulher, da sua melhor maneira, a uma
incrédula jovem.
Lorena soltou um risinho sarcástico, pois até mesmo para ela que
ainda não havia conseguido vencer por completo os seus tabus e que ainda
lutava por definir a sua orientação sexual, o que acabara de ouvir daquela
mulher lhe pareceu ridículo!
__ Você está me dizendo que uma juíza não pode ser homossexual
só porque tem um cargo importante na sociedade? O que tem haver uma
coisa com a outra Stela?
A homofobia daquela mulher, da qual ela própria era vítima, era o
seu grande entrave e ela não tinha nem mesmo forças para lutar aquela
batalha, que dirá vencê-la. Ela era uma desgraçada, essa que era a verdade!
Mas o seu “armário”, agora que conhecera Lorena, estava desconfortável
demais, como nunca havia sido em todos aqueles anos em que se mantivera
em sua completa solidão.
__ Lorena, por favor, eu quero você, mas não precisamos esfregar
isso na cara de ninguém, pra quê? Vamos deixar isso só entre nós duas! __
A juíza falava suplicante e acariciava o rosto de pele macia daquela jovem.
Como a queria!
Aquele caso que se configurava, não era nem um pouco atrativo
para a moça. Ela realmente precisava passar por aquela situação?
Encontrarem-se às escondidas como se fossem duas criminosas em pleno
século vinte e um? Perguntava-se Lorena. No mais, ela poderia ter quem ela
quisesse, pois todos a achavam muito bonita... Ela era jovem, inteligente...
Inclusive, pretendentes é o que não lhe faltava, tanto rapazes como garotas,
mas... Aquela mulher tinha algo que a chamava para si, algo que a seduzia
em demasia... Simplesmente não conseguia vê-la e resistir a ela... Então
resolveu ceder àquele arranjo, ao menos em um primeiro momento.
__ Eu vou te passar o meu contato aí, quando você tiver
encontrado um lugar, me liga! __ Lorena respirou fundo e pegou o seu
celular para fazer a conexão entre as duas.
__ Tá bom! __ Respondeu Stela orgulhosa de si mesma, pois ao
menos um encontro com aquela jovem, havia conseguido. O que viria
depois disso, ela não sabia.
__ Qual é o seu número? __ Perguntou a moça pacientemente,
depois de esperar que a mulher passasse aquela informação sem que tivesse
que pedir, mas sem sucesso.
A juíza ditou então o seu contato à jovem que imediatamente o
digitou, antes de mandar-lhe uma mensagem para assim, se conectarem.
Depois de guardar novamente o seu aparelho, Lorena estudou o rosto da
mulher e sorriu, mordendo o seu lábio inferior.
__ Eu sabia que você tinha vindo aqui pra me ver! __ Gracejou a
jovem.
__ Eu não consegui te esquecer! Eu tentei, eu juro, mas não
consegui! __ Confessou a juíza, agora mais calma, voltando a acariciar o
belo rosto da moça, esboçando um sorriso.
__ Eu também não! __ Falou Lorena, pegando uma das mãos de
Stela, carinhosamente.
__ Eu vou procurar um lugar pra nós, bem discreto, bem gostoso,
tá!... __ Sussurrou Stela sentindo a textura macia e quente da mão de
Lorena, quase sem acreditar que aquilo realmente estava acontecendo, pois
já havia se convencido de que sairia dali sem conseguir absolutamente
nada.
__ Tá bom, eu vou ficar esperando...
A juíza deu mais um beijo na boca gostosa da jovem e depois,
olhando por todo o seu rosto, sorriu e sussurrou:
__ Você é linda demais garota!
__ Já disse pra não me chamar de garota! __ Desafiou, mais uma
vez a jovem, fitando a juíza de queixo erguido.
Stela ria, balançando a cabeça negativamente e se perguntando
em pensamento, o que faria com aquela deliciosa tentação que havia
surgido em sua vida. Depois deu mais um beijo breve na moça e,
recobrando o seu juízo, falou, carinhosamente:
__ Eu tenho que ir embora, tá! Não posso me atrasar mais.
__ Tá bom! Tenha um bom dia, meritíssima! __ Caçoou a jovem,
abrindo um lindo e largo sorriso.
A juíza pegou os óculos escuros que estavam por sobre a
mesinha, colocou-os e, não resistindo, deu um último beijo na moça, mas
dessa vez, aspirando o seu cheiro.
__ Tenha um bom dia, linda!
Assim que Stela saiu, Lorena fechou a porta, se virou e caminhou
até a poltrona, deixando-se cair nela, sorrindo, meneando a cabeça
negativamente. Ela queria ter aquele encontro com Stela, pois ambas se
deviam isso, não é? Aquela jovem, que pretendia simplesmente esquecer a
juíza, naquele momento, viu todos os seus sentimentos voltarem à tona...
Aquela mulher mexia com ela, não sabia porque, mas mexia,
profundamente...

...Stela saiu da clínica como um foguete, apenas dizendo um


“obrigada” quando passou pela recepcionista. Depois desceu pelo elevador,
mantendo a sua postura sisuda, pois tinha uma câmera naquele cubículo
filmando todos os seus movimentos. Quando chegou ao seu carro, adentrou,
mas antes de dar a partida, ela tapou a boca com as mãos, para gargalhar e
chorar, ao mesmo tempo. Aquela mulher estava imensamente feliz e
emocionada por ter vencido o seu bloqueio e conseguido dar um passo em
direção ao amor, sentimento ausente em sua vida por mais de duas
décadas...
Depois que se acalmou, a juíza finalmente conseguiu colocar o
carro em movimento. Ela dirigia no automático por aquela avenida
ensolarada e pensava em como Lorena conseguia, como ninguém, quebrar
as suas barreiras e alcançar os seus mais recônditos desejos da forma mais
natural do mundo. Sempre que as duas se encontravam, aquela jovem
conseguia chegar até ela para arrancá-la de sua solidão e clausura de forma
inusitada...
Quando chegou ao fórum, com quase uma hora de atraso, Stela
teve que explicar, com uma bela de uma mentira, o motivo da sua demora à
sua assessora, Bianca que veio ao seu encontro preocupada assim que a viu
adentrando pela portaria. Aquela moça trabalhava com a magistrada fazia
uns sete anos e ela não se lembrava de ver a sua chefe chegar atrasada, nem
ao menos por dez minutos, por todo aquele tempo.
__ Um dos pneus do meu carro furou e eu tive que chamar um
mecânico, pois não queria me sujar. Ele demorou a vir, por isso estou
chegando agora. __ A juíza abominava a mentira, mas naquele caso, falar a
verdade não era uma opção, definitivamente.
Bianca estudou a face da mulher e percebeu os olhos meio
avermelhados, ainda alterados pelas emoções sentidas ha minutos atrás,
com um brilho anormal e diferente na face. A assessora notou também que
ela estava sem o seu costumeiro batom nude que sempre trazia em seus
lábios, sobretudo pela manhã, mas não comentou nada por receio de estar
invadindo a privacidade da magistrada...

***
Capítulo 13

No mesmo dia em que encontrou com Lorena na pequena sala da


clínica de psicologia, quando retornou do seu trabalho à tarde, Stela tomou
um banho, abriu o seu notebook e fez uma busca minuciosa pelos hotéis e
pousadas em um raio de cento e cinquenta quilômetros da sua cidade. O
lugar não poderia ser perto demais, pois a juíza não queria correr o risco de
ser reconhecida por ninguém, muito menos por alguém da sua comarca, e
nem tampouco poderia ser longe demais ao ponto de ter que fazer uma
viagem muito demorada e cansativa. O lugar teria que ser estrategicamente,
perfeito!
Depois de ficar um bom tempo pesquisando, encontrou o que
parecia ser ideal para elas. Tratava-se de uma charmosa pousada encravada
nas montanhas, no meio da mata e que tinha em seu redor, vários chalés que
eram recomendados a casais em lua de mel. Perfeito! Pensou Stela, pois
eram a exatos cento e trinta quilômetros dali, era discreto e o fato das
acomodações serem individuais, diminuía as chances de ser vista por
alguém conhecido.
A juíza pegou o celular, bastante ansiosa, pois seria a primeira vez
que ligaria para Lorena. Após identificar o contato dela, fez a ligação e
aguardou até que a jovem atendesse.
__ Alô! __ Disse a moça, suavemente.
__ Oi Lorena, tudo bem? Sou eu, Stela! __ Falou a mulher, um
tanto quanto apreensiva e amedrontada. E se a jovem tivesse mudado de
ideia e a mandasse passear?...
__ Eu sei que é você! O seu nome apareceu no meu identificador
de chamadas. E então, como você passou o seu dia?
Perguntou a jovem educada e receptiva, o que tranquilizou a
juíza, incentivando-a a ousar um pouco.
__ Pensando em você!
__ Humm... Que bom!
__ E você, por acaso pensou em mim ao menos uma vez?
Lorena riu e balançou a cabeça negativamente para depois falar:
__ Talvez...
__ Ah é? Eu sou tão insignificante assim pra você? __ Indagou
Stela, adorando o joguinho instigante. A vida daquela mulher era tão séria,
tão dedicada somente ao trabalho que aquele simples diálogo com Lorena
ao telefone, já trazia a ela um frescor, provocando-lhe um largo sorriso nos
lábios e aquecendo o seu pobre coração solitário.
__ Eu pensei em você sua boba!
__ Ah! Agora sim, bem melhor! __ A juíza ria, de graça, pois já
havia se acostumado com a ideia de morrer em sua completa solidão e
aquele encontro era tão inesperado... Tão surpreendente que parecia mais
um sonho...
__ Sabe o que eu estou fazendo aqui, neste exato momento?
__ Não, o que é? __ Stela telefonava do seu quarto e falava baixo,
pois a última coisa que queria era ser ouvida por Enrico que, pelo horário,
já devia ter chegado em casa.
__ Panquecas!
__ Hum! Devem estar deliciosas, pois suas mãos são de fada!
__ Se você quiser eu guardo algumas, levo pra clínica amanhã, aí
você passa lá e pega!
A juíza achou tão carinhosa a oferta da jovem que quase aceitou,
mas aí lembrou-se que se expor era algo que não queria, de forma alguma.
Não podia ficar passando no local em que Lorena fazia o seu estágio todos
os dias, como se fosse a sua namorada, porque ela não era. Quem dera se
fosse! Pensou ela.
__ Obrigada Lorena, mas não há necessidade! Bom apetite!
__ Então tá! __ A moça lembrou-se que a juíza a queria para um
ou mais encontros fortuitos e não para aquele tipo de relação mais calorosa
e cuidadora. Em suma, Stela a queria para... Sexo! Essa conclusão, não a
agradou muito, mas ia matar o seu desejo, mesmo assim. Depois decidiria o
que fazer. __ Encontrou um lugar pra gente? É pra isso que você está me
ligando?
__ Sim, encontrei uma pousada que tem uns chalezinhos em
volta, muito charmosos, confortáveis que fica a uns cento e trinta
quilômetros daqui. Posso reservar um pra nós neste fim de semana?
__ Pode!
Stela ficou apreensiva só de imaginá-las sozinhas dentro de um
daqueles chalés. Ela saberia mesmo o que fazer com aquela linda jovem,
em um lugar só para elas, por todo um fim de semana?
__ Então tá, fecharei a compra agora mesmo! Eu vou te pegar às
seis horas da noite, na sexta-feira, mas para isso, preciso saber onde você
mora.
Lorena ditou o endereço completo dela e Stela, que já estava com
a sua agenda e uma caneta à mão, fez a anotação, vendo a sua letra sair
trêmula pela ansiedade que aquela situação lhe causava.
__ Então é isso. Não vou te incomodar mais, pode continuar
fazendo as suas panquecas aí, tá!
__ Tá bom. Vou continuar aqui, fazendo as panquecas que você
renegou! __ Brincou a jovem, arrancando o riso da juíza.
__ Não as reneguei, só não quero atrapalhar os seus estudos e te
colocar em maus lençóis!
__ Ah não? Tá bom então!
__ Então tá, eu vou desligar. Um beijo! __ Disse Stela,
carinhosamente.
__ Um beijo pra você também! __ Respondeu Lorena, sorrindo,
antes de desligar e ver o seu amigo Léo chegando à pequena cozinha, a
olhando atravessado.
__ Quem era? __ Perguntou ele, curioso.
__ Se eu lhe disser você não vai acreditar.
__ Tenta!
__ A minha ex-sogra. __ Falou a jovem dando continuidade à sua
tarefa de rechear os discos de massa e enrolá-los, compondo as deliciosas
panquecas que ela e o seu amigo jantariam naquela noite. Cozinhar de fato
era uma terapia para aquela moça.
__ A mãe do Enrico, a juíza?
__ Ela mesmo!
__ E o que ela queria? __ Indagou o rapaz, desconfiado, pegando
dois pratos e os talheres para coloca-los por sobre a bancada de mármore,
onde ele e Lorena jantariam.
__ A meritíssima me convidou para passar um fim de semana
com ela em uma pousada que fica a alguns quilômetros daqui. __
Respondeu a moça, finalizando finalmente a travessa de panquecas e
colocando-a por sobre a bancada.
__ Mas porque você passaria um fim de semana com a sua ex-
sogra? __ Perguntou novamente o jovem, sentando-se em um dos
tamboretes e observando a amiga se acomodar também, no outro assento à
sua frente.
Lorena apenas olhou para o amigo, sobranceira e depois se pôs a
servir os pratos com os enrolados de massa recheados, decidindo se contaria
ou não, a sua aventura com a ex-sogra.
__ Lorena!... __ Chamou o jovem temeroso, pois a moça se
emudecera repentinamente.
__ Leo... Eu Fiz... Sexo com a minha ex-sogra.
Os estudos sobre o fenômeno da heterossexualidade compulsória,
juntamente com as mudanças ocorridas devido ao processo terapêutico,
somados aos sentimentos diferentes que Stela provocava em Lorena,
resultavam na capacidade que ela passou a ter em aceitar que um encontro
carnal com outra mulher podia sim, ser sexo.
__ O quê? Você fez sexo com a m... Mãe do Enrico? __ Perguntou
Leonardo, antes de colocar as duas mãos por sobre a boca e arregalar os
olhos, expressando o seu total espanto.
Lorena colocou um pedaço de panqueca na boca para não ter que
falar, pois a reação do amigo a deixou bastante constrangida. Será que havia
mesmo cometido um crime?
__ Espera, você ainda era a namorada do Enrico quando fez...
Sexo com a mãe dele?
Lorena mastigava e pensava no que dizer, se arrependendo de ter
contado aquilo para o rapaz à sua frente. Quando acabou de engolir,
resolveu falar:
__ Leo, não foi nada planejado, nem por mim e nem por ela,
apenas aconteceu...
__ Como assim aconteceu? Onde menina?
__ Sabe aquela semana em que o Enrico foi pra Brasília e você
teve que ir pra casa da sua família?
__ Sei! __ Leo não tinha iniciativa nem mesmo para comer as
panquecas que estavam em seu prato, pois a história que ouvia era
bombástica demais.
__ Então, você sabe que eu passei uma semana no apartamento da
Stela...
__ Sei, claro!
__ Naquela semana, nós duas tivemos uma conexão tão incrível...
Tudo estava tão perfeito, até que, em uma noite, já nos últimos dias, eu fui
até a sacada e ela estava lá, sozinha, no escuro, tomando uma bebida... Ela
estava tão misteriosa... Parecia uma esfinge, prestes a me devorar... Eu me
senti tão atraída por ela que não aguentei e... A beijei...
__ Lorena!... Mas e aí, ela aceitou o seu beijo, normalmente?
__ A princípio não, ela resistiu, mas aí eu insisti e ela cedeu e
veio... Com uma sede!... __ A jovem se sentiu excitada só de lembrar do
primeiro beijo que elas deram.
Leonardo bebia as palavras de Lorena de boca aberta, pois estava
pasmo.
__ M... Mas e aí?
__ Aí, o resto da história você terá que imaginar meu amigo, pois
eu não vou te contar os detalhes, né!
__ C... Claro! E... Eu não quero saber dos detalhes, eu estava
falando do Enrico!...
__ Eu terminei com o Enrico, Léo, assim que ele voltou de
Brasília! Sinceramente, eu não esperava ver a Stela de novo, mas aí hoje,
ela apareceu na clínica onde eu faço o meu estágio e... Nós nos beijamos
novamente... O resultado é o que você já sabe, nós temos um encontro no
próximo fim de semana.
__ M... Mas e o Enrico? Ele aceitou numa boa? __ Perguntou o
rapaz, ainda estupefato.
__ O Enrico não pode saber. Ninguém pode saber Léo! Vai ser
apenas um encontro, só isso e mais nada! __ Disse a jovem impaciente,
como se tivesse prestes a cometer um assassinato, não era possível!
__ Ah, então você será apenas um caso secreto da juíza, é isso?
__ Assim como você foi do seu professor! E olha que ele era
casado... E com uma mulher! __ Acusou a moça na defensiva, contra-
atacando o amigo que de repente, se tornou o seu inquisidor.
__ Lorena, você é linda garota! Pode ter quem você quiser! Por
que se amarrar a uma mulher complicada dessa? __ O amigo tentava
chamar a jovem à razão.
__ Eu não sei Léo! Eu estou apenas atendendo ao meu desejo,
será que eu não posso?
__ Essa mulher é mais velha, ela vai destruir o seu emocional,
assim como... O meu professor fez comigo... Não entra nessa, por favor! __
Alertava Léo, preocupadíssimo com a situação venturosa que a amiga
estava prestes a se meter.
__ É pra isso que eu faço terapia, coisa que você também devia
fazer!
__ Lorena, eu não sei nem o que dizer!
__ Então não diga nada e coma as suas panquecas senão elas vão
esfriar...

... Stela desligou o telefone rindo sozinha, emocionada e feliz por


conseguir, depois de longos anos, dar vazão aos seus desejos. Ela teria
aquela linda garota só para si, durante todo o fim de semana... Mas pensar
naquilo, deixava-a extremamente ansiosa e aflita.
A juíza tentava planejar, meticulosamente, todos os seus atos
diante de Lorena, quando elas chegassem ao chalé, mas não conseguia
concluir o planejamento em sua cabeça, pois ela não sabia como a moça
agiria diante de cada iniciativa sua, então... Desistiu. Seria o que Deus
quisesse! Pensou ela por fim, em desespero.
Ao sair do seu quarto e chegar à cozinha, Stela se deparou com
Enrico preparando algo para comer.
__ Oi meu filho, você já chegou?
__ Oi mãe! Sim, agora a pouco! __ Respondeu o rapaz, se
voltando para a sua mãe buscando os seus olhos, mas não conseguindo
alcançar o seu objetivo, pois Stela não o olhava de volta como era de seu
costume, desde sempre.
A juíza abriu a geladeira em busca de água e também, procurando
um subterfúgio para não ter de encarar Enrico. Ela se sentia uma traidora
com relação ao filho, mas não conseguia se barrar e desistir do seu intento
com Lorena. Iria até o fim, certamente!
__ Estou preparando um sanduíche aqui, quer que eu faça um pra
você? __ Perguntou o rapaz, atencioso.
__ Não precisa, eu mesma faço, obrigada!
Stela não conseguia fitar os olhos do filho e se sentiu angustiada
por isso. Ela gostava de olhar no fundo dos lumes mel de Enrico, até para se
ver neles, pois os olhos dele eram idênticos aos seus. De fato, era uma
desgraçada! Concluía a juíza.
Enrico voltou a concentrar-se na composição do sanduíche,
despreocupadamente, enquanto a juíza terminava de tomar o seu copo de
água e resolvia anunciar ao filho o que faria em seu fim de semana, depois
de um raspar de garganta:
__ Enrico, eu terei de viajar no próximo fim de semana. Eu irei na
sexta-feira e só retornarei no domingo à noite.
__ Ah é? Vai pra onde?
__ Eu fui convidada por uma faculdade, a ministrar uma
disciplina em um curso de formação em direito que acontecerá neste fim de
semana! __ Stela ficava tão constrangida por ter de mentir para o seu filho
de novo que, daquela vez, ficou de costas para ele para não ter que vê-lo
nem em sua visão periférica.
__ Mas você nunca aceitou esse tipo de convite?
Enrico sabia da aversão da sua mãe por uma sala de aula, pois não
foram poucas as vezes em que ela fora chamada pelas universidades
federais e faculdades particulares para ministrar aulas, sendo que todas as
vezes, sem exceção, ela recusara veementemente, sob a argumentação de
que não nascera para exercer aquele tipo de papel.
__ Eu me senti atraída pelo convite dessa vez quando vi a ementa
do curso, que encaixa-se perfeitamente com o que eu já sei e faço em meu
dia a dia, então não terei o menor problema em falar sobre o assunto!
__ Tá bom! __ Disse apenas o filho, um tanto quanto confuso,
pois uma de suas certezas é que conhecia bem a sua mãe, mas aquela
decisão repentina dela o confundiu um pouco.
Stela preparava o seu lanche de cabeça baixa, se sentindo a pior
das mortais. Enrico era seu filho e o seu melhor amigo! Como podia mentir
para ele assim, de forma tão natural?...

***
Capítulo 14

Dois dias se passaram até que chegou a tão esperada sexta-feira. A


juíza trabalhava em meio aos processos, sentindo a sua ansiedade crescer na
medida em chegava a hora de rever Lorena. Ela parecia uma criança prestes
a fazer uma viagem para um parque de diversões, um resort ou algo
parecido. Essa era a analogia perfeita para o estado de espírito daquela
mulher inquieta, até que chegou o momento de ir para a casa, tomar um
banho, pegar a sua mala que já estava pronta e partir para o seu tão
aguardado encontro.
Stela decidiu-se por não procurar o filho para se despedir, pois
não conseguiria olhar em seus olhos mais uma vez, saindo pela porta do
apartamento como uma fugitiva, era como se sentia, lamentavelmente.
Orientada pelo endereço que Lorena havia lhe passado, a juíza se
dirigiu até o local, sem grandes dificuldades, pois conhecia bem aquela
cidade onde morava ha um bom tempo. Quando ela avistou a jovem, já a
sua espera, sentiu uma batida mais forte em seu coração e sorriu
involuntariamente, feliz pelo encontro que teria... Feliz pela sua inusitada
aventura...
Como não queria ser vista e nem reconhecida por ninguém, Stela
optou por não apear do carro para ajudar a jovem com a sua mala, apenas
abriu o porta-malas pelo painel e orientou-a a colocar a sua bagagem lá e
fechá-lo novamente. É óbvio que a sua vontade era de descer e ajudar a
moça da forma mais gentil possível, porém ela agia como um dos inúmeros
réus que passara pelo seu tribunal... Sentia-se uma contraventora, saltando
os muros de suas barreiras incomensuráveis.
__ Boa noite! __ Cumprimentou Lorena, sorridente, assim que se
acomodou no banco do carona, passando a ajeitar o cinto de segurança,
preparando-se para a viagem que faria ao lado daquela mulher.
__ Boa noite! __ Respondeu a juíza já girando a chave na ignição
para colocar o carro em movimento. A vontade que ela teve foi de dar um
beijo na linda jovem perfumada que se sentara ao seu lado, mas se conteve,
pois corria o risco de ser vista por um transeunte qualquer e isso não podia
acontecer de forma alguma.
__ Hoje não temos música clássica? __ Perguntou Lorena
sentindo falta do som usual da juíza.
__ Não! O som hoje está por sua conta. Hoje eu quero ouvir as
músicas que você gosta. __ Stela não sabia explicar porque, mas aquela
jovem tinha o dom de deixa-la à vontade. Ela se sentia encorajada e livre
para dizer e fazer qualquer coisa quando estava ao seu lado. Ela se sentia
viva e imensamente feliz, bem diferente da juíza sisuda e guardiã das leis
que acabou se tornando, com o passar do tempo.
__ Mas eu gosto das suas músicas! __ Lorena dizia a verdade. Os
clássicos de Stela a transportavam para outra esfera. Os seus ouvidos
agradeciam o som produzido pelos instrumentos musicais orquestrados em
uma sintonia perfeita.
__ Mas eu quero conhecer o seu gosto musical, posso?
Diante da insistência de Stela, Lorena sacou o celular, acessou a
sua playlist e conectou o aparelho ao som do carro da juíza, iniciando a sua
execução. A música da moça preencheu o ambiente e agradou de imediato a
juíza que sorriu, pois não havia se decepcionado com a jovem.
__ Gostei! O que é isso?
__ Dreampop, Indie, Rock Alternativo... Esse tipo de coisa.
__ Muito bom! __ A mulher não mentiu, ela realmente gostou
daquele som harmonioso da garota que lhe lembrava um pouco a Janis
Joplin, Os Mutantes enfim, bem psicodélico só que numa pegada mais
moderna, New Age...

...E foi assim, a viagem das duas mulheres transcorria


tranquilamente, onde elas falavam de assuntos leves e aleatórios,
satisfatórios para ambas. Stela já não sentia mais a ansiedade e aflição de
que fora acometida durante todo aquele dia. Agora ela sentia apenas um
friozinho gostoso na barriga, como se fosse uma adolescente inexperiente e
ávida por descobrir as coisas do mundo.
Todas as pessoas tratavam aquela juíza com tanta deferência que
acabavam por coloca-la em um lugar inacessível, engessando-a em uma
armadura de autoridade e respeito. A formalidade excessiva com a qual
aquela mulher era tratada em seu dia a dia, tirava dela a capacidade de ser
apenas um ser humano, cheio de falhas, de sentimentos e desejos. Mas
inexplicavelmente, aquela jovem tinha o dom de arranca-la daquele mundo
ilusório de poder e a trazia para junto dos mortais. Era exatamente isso que
aquela garota significava para Stela...
Já Lorena não sabia o porquê, mas sempre que estava ao lado da
juíza ela tinha aquela sensação gostosa de estar no lugar de onde ela nunca
deveria ter saído. Se lhe fizessem a estranha pergunta, “quem você levaria
para o inferno?”, proposta nas entrelinhas do clássico A Divina Comédia de
Dante Alighieri, sem dúvida, ela responderia “Stela”, pois se sentia segura
ao seu lado...

...Transcorridas umas duas horas e meia, depois de subirem uma


serra não muito íngreme, as duas mulheres chegaram à pousada, já de noite.
Stela dirigiu até o estacionamento e apeou para ir à recepção com o objetivo
de pegar a chave do chalé que reservara. Lorena permaneceu no carro a
pedido da juíza, não muito satisfeita, pois queria ver mais daquele lugar
rústico e charmoso, totalmente cercado pela natureza exuberante.
Depois de alguns minutos, Stela retornou e dirigiu até o bangalô,
estacionando o carro ao lado da construção toda em madeira e tijolinhos à
vista. Quando as duas mulheres entraram no local, Lorena abriu a boca para
depois tapa-la com as mãos, espantada com a linda decoração e com o
conforto daquele quarto.
A acomodação era incrível! Tratava-se de uma ampla suíte rústica
com uma grande cama king confortável ao centro, forrada com lençóis e
edredons brancos, convidativos. O quarto tinha uma sacada com vista para a
natureza circundante que elas só iriam poder ver com mais detalhes, durante
o dia. Havia ali também, um amplo banheiro com uma hidro, em uma das
paredes tinha uma lareira e, próximo à varanda, uma saleta de refeições. O
espaço tinha sido preparado para um casal, pois em cima da mesa havia um
champanhe em um balde de gelo, ao lado de duas taças e um recipiente com
morangos e uvas.
Surpresa com a escolha da juíza, Lorena se virou para ela, após o
tour que fizeram por todo o local, circulou o pescoço da mulher com os
seus braços e disse:
__ Stela, esse lugar é lindo! __ A jovem sorria largamente.
__ E é nosso, por todo o fim de semana! __ Falou a juíza
abraçando a moça pela cintura, antes de iniciar o beijo tão ansiado, desde
que ela se sentara ao seu lado, no carro, ainda em sua cidade.
O beijo de Stela começou calmo, mas depois se tornou urgente,
faminto e ali, naquele chalé perfeito, nada iria impedi-la de fazer tudo o que
desejava com aquela jovem. A mulher sugava os lábios carnudos da moça e
agarrava-a pela cintura, já arrastando-a para a cama setindo o seu corpo
entrando em combustão...
Lorena deixou-se ser conduzida pela mulher gananciosa que
parecia querer engoli-la. A jovem dava passos para trás, pois era empurrada
por Stela que avançava para cima dela, até que sentiu a parte de trás de suas
coxas encostarem na cama. Rapidamente ela retirou as suas botas de cano
curto e simplesmente deixou-se cair, levando a juíza consigo.
__ Eu imaginei que fossemos namorar um pouco antes... Tomar
um pouco daquele champanhe... Aproveitar a hidro... __ Observou a moça,
rindo com o ataque da mulher.
__ Nós vamos fazer tudo isso, mas agora... Eu quero você... Não
aguento mais... __ A juíza estava sôfrega, pois ela era puro desejo, e sem
esperar uma resposta ela reiniciou o beijo, avidamente.
Aquela mulher quase nem acreditava no que estava acontecendo
consigo, ela sentia o corpo macio, coeso e quente da moça em baixo de si e
sabia que devia se controlar, mas simplesmente, não conseguia...
O beijo era guloso, as línguas se encontravam e se massageavam
deliciosamente... Stela queria sim, estar mais calma e curtir tudo o que
havia ali com mais serenidade, mas o seu corpo pegava fogo... Parecia que
ele estava sendo transpassado por lanças finas e o sexo latejava,
descontrolado... Como ela queria aquilo!...
Lorena bagunçava os cabelos da mulher sobre o seu corpo,
agarrando-o, puxando-o e massageando o couro cabeludo com as pontas
dos dedos... Em um dado momento, ela baixou as suas mãos e começou a
desabotoar a camisa branca, alva da juíza, botão por botão, ao mesmo
tempo a retirava de dentro da calça elegante de linho, risca de giz.
No momento em que a jovem finalmente conseguiu desabotoar
toda a camisa de Stela e a retirou, contando com a ajuda dela, desgrudou os
seus lábios carnudos, avermelhados, inchados da boca da mulher para
observar um lindo sutiã branco todo adornado em rendas que havia surgido,
enchendo os seus olhos. Até as roupas íntimas da juíza eram elegantes,
pensou ela em um lampejo, mas já levando as suas mãos no fecho, nas
costas dela para o abrir e remover a peça.
Quando os seios da amante apareceram, Lorena os observou,
notando que eles não eram cheios como os seus, eram menores, mas não
pequenos e sim, medianos. Os mamilos eram mais amarronzados que os
seus e quando os massageou, languidamente, fitando os olhos alterados da
mulher, notou a sua rigidez.
Enquanto Stela retomou a boca da jovem, esta arriscou um pouco
mais, passando a desabotoar as calças da amante, abrindo-lhe o zíper para
enfiar as suas mãos quentes pelas nádegas dela, massageando-as e
apertando-as com vontade. A juíza parou o que estava fazendo para fitar a
moça ousada que se apossava de sua bunda... Aquela garota tinha o dom de
quebrar as suas barreiras, sem nenhuma cerimônia...
...E a ousadia da jovem parecia não ter limites, pois ela deixou
uma daquelas nádegas para enfiar uma de suas mãos pela calcinha da
magistrada e massageou o seu clitóris, provocando um gemido na mulher
que fechou os olhos para sentir mais profundamente o seu tesão que só
crescia...
...Depois de alguns segundos ali, a moça abandonou o monte
enrijecido da juíza para forçar uma invertida de posições, pois queria ficar
com os seus movimentos mais livres para fazer o que bem entendesse com a
sua amante. Ela então se posicionou por cima de Stela com uma perna de
cada lado de seu abdome e depois se debruçou sobre ela para alcançar um
dos mamilos entumecidos, lambendo-o, chupando-o, ouvindo mais um
gemido fraco...
...A jovem apertava e manipulava aqueles seios, sugando os seus
bicos duros que revelavam o estado de excitação em que a mulher se
encontrava... A juíza, outrora sisuda, havia perdido toda a sua lucidez
debaixo daquela moça cheia de iniciativas. Ela sentia as sugadas vigorosas
daquela boca incandescente em seus mamilos... As enormes mechas de
cabelos fortes que se arrastavam por sua pele... As mãos ágeis que
desvendavam cada centímetro de seu corpo e caminhava para mais uma
entrega... Teria ela, outro orgasmo inesperado?...
Mas Lorena não se continha, queria derrubar cada parede que a
mulher havia construído em volta de si, como uma verdadeira
desbravadora... Ela soltou os bicos endurecidos dos seios e arrastou a sua
boca pelo abdome da amante, eriçando cada pelo daquele corpo... Quando
chegou ao ventre da juíza, o beijou e o mordiscou em vários pontos... Os
lábios da jovem eram quentes e pareciam queimar a pele da juíza que via a
sua excitação aumentar, desmedidamente...
Lorena se ergueu e fitando os lumes mel agora escuros, pela
dilatação da pupila, iniciou a retirada das calças da juíza, lentamente,
fazendo surgir uma calcinha branca, também adornada em rendas.
Certamente ela fazia par com o sutiã que estava abandonado em algum
lugar daquela enorme cama... A jovem conseguiu tirar as calças da mulher,
juntamente com os seus sapatos e depois retornou, segurou as beiradas da
calcinha de Stela e a retirou também, vagarosamente, descobrindo o seu
sexo molhado... Ela reparou nas pernas da juíza, notando a musculatura
delas, fruto de sua rotina diária de atividades físicas. A pele da magistrada
era bem descorada pela falta do sol, pois ela passava todos os seus dias em
meio aos inúmeros processos, dentro daquele fórum, mas o seu corpo era
incrível, constatava a moça, antes de se acomodar novamente em cima dela
e lamber o seu pescoço, sedutoramente...
A jovem tomou novamente, a boca da mulher, em um beijo
sensual e arrastou a sua mão para baixo até alcançar o clitóris dela para
retomar o que fazia... A moça estimulou aquele pequeno monte rígido, em
movimentos circulares e, após se concentrar em um ponto específico, na sua
base, viu Stela se entregar a ela em um orgasmo liberador...
Mas aquela jovem não tinha mesmo limites? Pois ela retirou os
seus dedos do sexo da juíza e os levou até a sua boca, fazendo-a provar do
seu próprio gosto, totalmente dominadora... Stela teria que reagir...
...A mulher, ainda com o corpo enfraquecido, o clitóris sensível,
reuniu as suas forças para iniciar a retirada das roupas da moça que era uma
blusa de mangas, verde musgo em um tecido de algodão macio, confortável
ao toque, colada à pele e uma saia preta, curta que havia se enrugado,
quando ela abriu as pernas em volta de seu abdome, o que deixou as coxas
torneadas dela completamente desnudas...
...Assim que a juíza levantou a beirada da blusa, a moça
interrompeu o que fazia para erguer os seus braços e facilitar a retirada da
peça. Os seios saltaram para fora imediatamente, pois Lorena não estava de
sutiã... Stela pode vê-los novamente, lindos, cheios, arredondados o que a
fez se lembrar da juventude e do viço que lhe estava sendo oferecido
naquele momento...
...A mulher se imaginava em um sonho com aquela linda moça,
seminua, sobre o seu corpo, naquela cama... Naquele local longínquo...
Estaria mesmo acontecendo aquilo, ou era apenas um devaneio seu?...
...Stela tocou os seios da jovem, enchendo as suas mãos com eles.
Ela os massageou, manipulou os mamilos e depois arrastou as suas mãos
pelas costas da moça para força-la a se deitar, invertendo novamente as
posições. Dessa vez, Lorena se arrastou pelos lençóis, levando a juíza
consigo, pois ela queria ocupar o centro daquela cama espaçosa...
...A mulher acompanhou a moça que a puxava pelo pescoço, para
se acomodar perfeitamente entre as suas pernas, avançando em sua boca
macia novamente, encaixando os seus seios nus aos dela... Poderia morrer
naquele momento, não se importaria, pois estava no melhor lugar do
mundo, não lhe restava dúvidas, pensou a juíza sentindo o calor emanado
do corpo denso em baixo de si...
...Lorena não se aquietava, mexia as suas ancas vigorosamente,
porque queria roçar o seu sexo quente e pulsante na magistrada, montando o
seu estado de excitação completa. As suas mãos também não paravam, elas
entravam por entre os cabelos da amante, bagunçando-os por completo. Ela
queria sentir cada pedaço daquela mulher que pesava por sobre o seu
corpo...
...Stela se desgrudou do beijo produzindo um estalido mais forte
que os demais, arrastou a sua boca pelo pescoço cheiroso da moça,
beijando-o, lambendo-o, mordiscando-o, chegando ao colo e por fim, aos
seios que foram tomados por sua boca esfomeada. A juíza massageava uma
das mamas e chupava intensamente os mamilos enrijecidos da outra, em
movimentos alternados... O seu corpo correspondia, simultaneamente,
retomando o estado de excitação...
...Após um tempo ali de puro deleite, Stela resolveu descer mais,
arrastando a sua boca pela pele macia e quente da jovem inquieta, chegando
ao seu ventre, ainda coberto. Ela queria descobrir o sexo da garota para
desfrutar dele e foi o que fez. A juíza se ajoelhou por entre as pernas
flexíveis da moça que se abriram mais, e iniciou a retirada das duas peças
que faltavam, para deixa-la completamente nua. Primeiro ela tirou a saia e
parou para observar a pequena calcinha branca de algodão, mas antes de
retira-la, se curvou e passou o nariz por sobre o tecido macio, úmido,
beijando e aspirando o cheiro inebriante exalado ali, depois ergueu o seu
corpo novamente para puxar a última peça que faltava...
...Ao terminar de retirar aquela pequena calcinha de algodão, a
mulher pode vislumbrar o sexo da jovem que mais parecia um botão de uma
rosa, prestes a desabrochar... Lindo, completamente aberto, exposto e
ofertado a si... Ela fitou a garota nos olhos e pode ver o imenso desejo que
se expressava neles...
...A juíza se curvou sobre ela, abrindo-lhe mais as pernas, ao
ponto dos pés da moça ficarem suspensos no ar, de modo que a sola deles
ficavam encostados nas costas da mulher que tomou o botão para si com
propriedade, chupando-o de forma vigorosa, provocando um gemido alto na
jovem...
...A moça se contorcia entre os lençóis, pois o prazer que a juíza
lhe proporcionava era imenso... Em um dado momento, a jovem tombou a
cabeça e começou a mexer o seu quadril mais intensamente, indo de
encontro àquela boca dominadora que a tomava com propriedade. Ela sentia
as chupadas vigorosas da amante e a sua língua açoitando o seu clitóris,
com vontade...
...Os gemidos da moça se intensificaram, pois o seu orgasmo
estava próximo, podia sentir, a cada investida daquela mulher esfomeada
entre as suas pernas, até que, não aguentando mais, buscou alguma coisa
para se segurar, pois precisava sustentar o seu corpo que iria se curvar. Após
arrastar as suas mãos pelos lençóis, agarrou as bordas dos travesseiros que
estavam acima de sua cabeça e arqueou a sua coluna, soltando um gemido
em um orgasmo alucinante...
...Mas Stela não parou, ela queria mais e continuou engolindo o
sexo da moça com a sua boca esganada, privada daquilo, por mais de duas
décadas...
...A jovem gozou mais uma vez na boca da juíza que só parou
porque teve a sua cabeça puxada por ela, a arrastando para cima. A mulher
então se deitou rente à moça prostrada, encaixando-se totalmente nela,
arrastando um das mãos por todo aquele corpo denso e quente, com o rosto
e algumas mechas de seus cabelos frontais molhados pelo fluido do sexo
que acabara de experimentar... A outra mão, ela enfiou por debaixo do
pescoço da garota, para segurar a sua cabeça...
...A jovem sentia-se entregue à intensidade daquela mulher que
agora, mordia o seu pescoço e friccionava o sexo na lateral do seu corpo. A
moça se virou um pouco e encaixou uma parte de sua bunda entre as pernas
da juíza que simplesmente arrastou a mão por seu abdome, procurou a sua
entrada com os dedos e a penetrou, deliciosamente...
__ Ah!... Stela... __ Balbuciou a moça, sentindo os dedos da juíza
dentro de si, depois, abriu as suas pernas para dar passagem a uma das
coxas da mulher que se acomodava ali para aumentar o atrito dos corpos
que entravam em sintonia perfeita com as estocadas que ela dava em seu
sexo...
...O gozo de Lorena chegou forte, mais uma vez, seguido do
orgasmo da juíza que soltou um gemido entrecortado enquanto apertava o
corpo da jovem contra o seu...
...As duas mulheres ficaram naquela posição por um bom tempo,
pois não queriam se desgrudar... Era tão bom saber que elas podiam se dar
aquele imenso prazer... O sexo entre elas tinha sido perfeito! Não havia
nada que pudesse ser considerado desfavorável, ou melhor, havia sim, um
fato, pensou Stela, o de que aquela jovem era proibida para si, pois ela era a
ex-namorada do seu filho e ele jamais a perdoaria se soubesse daquele
desatino... Na verdade, eram dois fatos, porque também tinha o problema
dela ser uma autoridade respeitada no meio jurídico, trancafiada em seu
embuçado armário... Mas ela não queria pensar naquilo, não naquele fim de
semana! Ela queria apenas sentir aquela moça por todos os seus poros, em
todos os momentos que pudesse, até o último segundo. O que viria depois
disso, ela não queria saber...

***
Capítulo 15

No dia seguinte, Lorena acordou sentindo o calor gostoso do corpo de


Stela todo encaixado ao seu, debaixo dos lençóis e edredons. As duas
estavam nuas e a juíza lhe abraçava por trás, deliciosamente. A jovem
tentou identificar o momento exato em que havia dormido, mas não
conseguiu, ela se dava conta de que tinha simplesmente apagado. Só se
lembrava do loop delicioso delas, pois haviam feito sexo inúmeras vezes,
parando apenas para tomarem o champanhe e comer algumas das frutas que
ali estavam para depois, retornarem para cama e reiniciar tudo novamente.
A moça se mexeu com cuidado, pois não queria acordar Stela,
mas o seu movimento acabou fazendo com que ela se virasse um pouco.
Lorena se acomodou bem rente a ela, apoiou-se em seu cotovelo para
observa-la dormindo e sorriu ao se lembrar da ânsia daquela mulher por si
na noite anterior. Ela nunca havia se sentido tão desejada em toda a sua
vida. Na verdade, ela nunca havia se entregado daquela forma a ninguém,
portanto, o que acontecera ali, em cima daquela cama, era novo para ela.
A jovem reparava em cada detalhe do rosto da juíza adormecida e
pode ver os seus traços mais detalhadamente. A face dela era harmoniosa,
pois tudo combinava entre si, inclusive combinava com sua personalidade
reservada, com sua introspecção e inacessibilidade.
De repente, Lorena viu Stela respirar profundamente, abrir os
olhos e fita-la com os seus lumes mel.
__ Bom dia! __ Disse a jovem, sorridente.
__ Bom dia! O que estava fazendo, reparando nas minhas rugas?
__ Não são rugas Stela, são marcas de expressão e são lindas!
Você é linda! __ Respondeu a moça passando a acariciar os cabelos da
mulher.
__ Você que é linda garota!
Lorena fitou a juíza e depois de alguns segundos disse:
__ Você me chamou de garota de novo...
__ E o que vai fazer? __ Quis saber Stela.
__ Se eu não tivesse com tanta fome, tão necessitada de um café,
você ia ver!
__ Ah é? E depois do café?
__ Você é ninfomaníaca? __ Indagou a moça, provocativa.
__ Sou! Por você!
Lorena sorriu e se mexeu para se posicionar por cima do corpo de
Stela que arrastou as mãos pelas costas dela, até chegar a sua bunda que foi
massageada e apertada, debaixo dos lençóis e edredons. A moça mordiscou
o pescoço da juíza e depois subiu para iniciar um beijo calmo e sensual,
mas então sentiu o seu estômago protestar, mais uma vez.
__ É sério Stela, vamos pedir o café que eu estou morrendo de
fome! __ Suplicou Lorena, após interromper o beijo.
__ Hum... Achei que eu ia ter um presente logo pela manhã! __ A
mulher sussurrava, se recusando a soltar a bunda deliciosa da moça, pois
sentiu o seu corpo todo reagir.
__ Por favor, vamos tomar um café primeiro, depois eu prometo
que eu volto pra cama e faço o que você quiser! __ Lorena não estava
mentindo, pois a noite anterior tinha sido perfeita para ela. Tudo o que elas
tinham feito, absolutamente tudo, tinha sido prazeroso então não havia
porque recusar-se a ter mais um pouco daquilo.
__ O que eu quiser, tem certeza? __ Perguntou a juíza,
intimidadora.
__ O que você quiser, prometo! __ Respondeu a jovem,
divagando em sua imaginação. O que mais a juíza tinha para lhe oferecer?
Iria querer saber, certamente...

...E assim aquelas duas mulheres passaram o fim de semana, se


descobrindo e experimentando os prazeres que elas podiam se dar, que
pareciam infinitos...
Elas alternavam entre o sexo perfeito, a comida e a bebida
formidável que eram servidas ali, o contato com a natureza exuberante pela
sacada do chalé e até mesmo em algumas caminhadas por entre aquelas
árvores magníficas que Stela acabou fazendo, por insistência da moça.
Quando a juíza estacionou o carro na frente do prédio de Lorena,
ela respirou fundo, pesarosa porque estava acabando o fim de semana
delicioso que ela havia passado ao lado daquela jovem linda e espirituosa.
__ Bom, é isso... Está entregue! Obrigada por tudo! __ Stela se
sentiu desconfortável por ter de se separar daquela moça apaixonante. Se
fosse olhar a sua vontade, levava-a consigo, para todo o sempre, mas sabia
que não podia...
__ Eu que agradeço Stela! Foi maravilhoso, cada segundo... __
Lorena dizia o que realmente estava sentindo. O final de semana havia sido
perfeito e estar ao lado daquela mulher era, para si, tão agradável! Era como
se a conhecesse ha anos, de tão espontâneo e natural que era o
relacionamento das duas.
__ Quando poderemos repetir isso? __ Perguntou a juíza,
murmurante... Pedinte...
__ É só você me ligar... __ Sussurrou a jovem, contornando o
rosto de Stela e a puxando para o beijo de despedida, mas...
__ Lorena, aqui não, por favor... __ Esquivou-se a mulher, se
soltando das mãos quentes da jovem. Tudo o que ela queria era beijar
aquela moça mais uma vez, mas tinha receio de ser vista e reconhecida por
alguém, o que não podia acontecer, de forma alguma.
__ Stela, era só um beijo e mais nada! __ A jovem ficou
extremamente incomodada e chateada com aquela situação. Depois de tudo
o que elas fizeram por todo o fim de semana, ela não podia se despedir
daquela mulher com um simples e inocente beijo? Era muita hipocrisia!
__ Eu sei, mas aqui não, por favor, me entenda! Eu sou uma
juíza...
__ Stela, uma coisa não tem nada a ver com a outra! Só porque
você é uma juíza, você não pode ser lésbica? Isso não é crime Stela! E no
mais, você é uma pessoa influente na sociedade, podia usar o poder que tem
para ajudar a acabar com o preconceito e a homofobia, e não ser mais uma
pessoa que alimenta isso, que fortalece isso com essa postura... Absurda! __
Disparou a moça em um só fôlego.
__ Lorena, por favor, me entenda! E... Eu não sou assumida, essa
é a minha condição! Você sabe... __ Tentava se explicar a mulher, bastante
constrangida.
__ Tá bom Stela, boa noite!
Lorena saiu do carro em um rompante, bateu a porta e caminhou
até próximo ao porta-malas para pegar a sua bagagem e como ele ainda
estava fechado, ela bateu com o dorso dos seus dedos no vidro de trás do
carro para que Stela o abrisse. Imediatamente a porta se levantou, ela pegou
a sua mala, fechou o compartimento novamente e caminhou, rumo ao
prédio onde morava, sem ao menos olhar para trás.
__ Droga! __ Disse Stela para si mesmo quando terminou de
assistir a cena que a moça acabara de fazer. O fim de semana havia sido
maravilhoso, mas ela acabava de estragar tudo! Constatava a juíza,
consternada, dando partida no carro para ir embora...

...Lorena chegou ao seu apartamento “P” da vida! O fim de


semana tinha sido incrível, mas o seu desfecho tinha sido horrível, mais
uma vez! Seria sempre assim? Stela sempre iria estragar tudo no final?
A jovem foi direto para o seu quarto puxando a sua mala de
rodinhas. Depois de tomar um banho e já de pijama, foi até a cozinha com o
fim de preparar algo para comer. Enquanto mexia na geladeira e armários,
Leonardo chegou à pequena peça para conversar com a amiga, notando a
sua cara de insatisfação.
__ O que foi? O final de semana foi tão ruim assim? __ Perguntou
Léo à jovem.
__ É que a Stela sempre tem que estragar tudo no final! __
Respondeu a moça, com uma voz alterada, depois de respirar
profundamente.
__ Como assim Lorena?
__ Quando a gente chegou, lá embaixo, eu fui dar um simples
beijo de despedida nela, no carro, aí ela recusou, dizendo que não podia
porque é uma juíza, que alguém poderia ver... Esse tipo de coisa!
__ Mas do que você tá reclamando? Você já sabia disso! Ela não é
assumida e você é só um caso secreto dela. Tá querendo o quê, que ela te
peça em casamento?
__ Não é isso! É que... __ A jovem colocou uma de suas mãos na
testa, conseguindo identificar o seu estado de confusão. Talvez o amigo
estivesse certo, ela estava cobrando algo de Stela que não podia, pois sabia
que elas eram apenas amantes.
__ Eu te avisei! Você tá na mesma situação em que eu estava com
o meu professor! Eu disse pra você que esse pessoal mais velho arrebenta
com o emocional da gente, mas você não me ouviu!
__ Não Léo, você tá certo! Eu... Não vou mais sair com ela, foi só
um fim de semana e pronto, não vai se repetir!...
A jovem falava com uma voz fraca, pois tudo o que ela queria era
repetir aquele fim de semana perfeito com Stela. No momento em que ela
fechou a boca, ouviu o seu celular tocar, rapidamente ela o pegou e pode
ver no identificador de chamadas, a foto da juíza. Lorena só deu um sinal ao
amigo, o avisando que iria atender a chamada, acionando a ligação.
__ O que você quer Stela? __ Perguntou ela ao fone, assistindo
Léo rir, meneando a cabeça negativamente anunciando a sua derrocada...

...Quando Stela chegou ao seu apartamento, ela foi até a cozinha


para tomar um copo de água e deu de cara com Enrico que preparava algo
para comer.
__ Oi mãe, chegou? __ Perguntou o jovem, dando uma pausa no
que fazia apenas para olhar em direção à mulher e após, abraça-la.
__ Oi meu filho! Sim, acabei de chegar. __ Respondeu a juíza,
correspondendo ao abraço carinhoso que ganhava do rapaz.
__ E aí, gostou? __ Indagou Enrico, assim que soltou a mãe,
observando-a dos pés à cabeça, notando um certo ar despojado nela, bem
diferente do ar sisudo, tão característico da sua genitora, desde sempre.
__ Gostei do quê? __ Perguntou Stela, confusa e temerosa.
__ Das aulas, mãe! Estou perguntando se você gostou das aulas,
da faculdade, dos alunos... Como foi a experiência? __ Inquiriu o jovem,
com obviedade, sem entender a reação estranha da mãe.
__ Ah, sim... Claro... Adorei!... Foi ótimo! __ Respondeu a
mulher tentando parecer natural, mas duvidando da sua capacidade de
interpretação daquele papel deplorável que arranjara para si.
__ Que bom que gostou mãe! Fico feliz em saber! __ O jovem,
sorriu francamente e se voltou novamente para o lanche que preparava. __
E quando vai voltar lá?
__ Voltar? __ Indagou Stela, pegando a água para tomar.
__ Sim mãe, quando serão as próximas aulas? __ Perguntou mais
uma vez o rapaz, abrindo os seus braços, cada vez mais confuso com o
estado aéreo da mãe.
__ Ah, não sei! Depois eu... Vou ligar pra eles pra saber quando
serão as próximas aulas!
__ Como assim? Eles não têm um cronograma fixo? __ Indagou
mais uma vez o jovem, se perguntando que espécie de faculdade era aquela
em que sua mãe fora se meter.
__ É, eles não têm! Estranho né?...
Respondeu a mulher, espreitando o perigo que a rondava, pois
parecia que Enrico fazia uma investigação criminal com tantas perguntas
que ele fazia, então resolveu se retirar dali em fuga.
__ Filho, eu vou tomar um banho que estou muito cansada, tá!
Depois nos falamos mais!
__ Tá bom!
O jovem achou melhor não importunar mais aquela mulher com
suas perguntas, pois ela certamente deveria estar exausta da viagem que
acabara de fazer, pelo seu estado confuso.
Quando a juíza chegou ao seu quarto, fechou a porta, trancando-a,
pegou o seu celular e ligou para Lorena para tentar se explicar com ela.
Depois de ouvir umas duas chamadas, a jovem atendeu dizendo um “o que
você quer Stela?”
__ Lorena eu... Te liguei pra te pedir desculpas!... Tudo o que eu
queria era ter te dado aquele beijo, acredite... __ A mulher estava
emocionada, pois se sentia mal por ter de mentir para o Enrico, se sentia
mal por ter de esconder algo tão puro, tão espontâneo dentro si... O que fez
com a sua vida? Perguntava-se.
Lorena acenou para o amigo e se afastou, caminhando até ao seu
quarto para ter um pouco de privacidade e poder falar sem reservas, pois
sentiu a voz enfraquecida da mulher ao telefone.
__ Stela, eu te entendo e eu sei que eu não posso te cobrar nada,
pois nós não temos nada, foi apenas um encontro que foi ótimo, mas não há
nada além disso...
__ Mas eu não queria que fosse apenas um encontro, eu queria
que fosse mais... Mas é tudo tão complicado... Eu sou complicada demais e
você é tão jovem, tem tanto pra viver, pra descobrir... Eu não quero te
prejudicar em nenhum sentido... Eu não quero te ferir de jeito nenhum... Me
perdoa... __ Stela falava e algumas lágrimas vertiam em seus olhos. Aquela
mulher constatava que, de fato era uma miserável porque os muros que ela
havia construído em volta de si eram tão altos que transpô-los, lhe era
impossível.
A moça ouvia a voz enfraquecida e entrecortada da mulher e tudo
o que ela queria era estar junto dela, coloca-la em seu colo para dar-lhe
carinho e atenção...
__ Stela... Você não tá me prejudicando e nem me ferindo, por
favor!... Eu não sou uma criança, eu já sou uma mulher e tudo o que eu fiz e
faço é porque eu quero... São as minhas escolhas...
__ Eu sei que você não é mais criança... Eu sei que você é uma
mulher... Linda... Inteligente... Perfeita e sabe bem o que quer... Diferente
de mim que sou... Uma prisioneira e o meu carcereiro... Sou eu mesma...
As lágrimas de Stela agora caiam sem reservas e molhavam a sua
camisa branca. Ela se sentia como um pássaro que consegue sair de sua
gaiola e voar livremente, mas, apesar de ter amado a sua liberdade, resolve
voltar para dentro de sua prisão, pois ali era o lugar em que se sentia
seguro...
__ Stela!... __ Lorena sentia-se desarmada com o choro da juíza.
Tudo o que ela queria era ajudar aquela mulher a se libertar, mas ela a
compreendia, pois ela própria tinha as suas amarras. Ela própria ainda se
descobria...
__ Eu só liguei pra te pedir perdão... Me perdoa... Por tudo... Eu
vou desligar...
__ Stela!...
A mulher desligou o telefone e se deixou cair em sua cama,
chorando, copiosamente, se sentindo a mais fraca das mortais. Tudo o que
ela queria era ter Lorena ao seu lado, mas não tinha meios de fazer o seu
sonho acontecer porque tinha o Enrico e o seu auto preconceito, ambos
intransponíveis para si.
Stela não queria prejudicar Lorena de forma alguma, portanto
esquece-la seria a melhor solução, pois se dava conta de que não podia
reduzi-la a um caso secreto seu, papel demasiado indigno para uma jovem
tão espirituosa, inteligente e viva.
Stela havia planejado um encontro fortuito que fosse satisfatório
para ela e para Lorena, apenas para matarem o desejo que elas sentiam, mas
ao descobrir o quanto a vida se enchia de sentido quando estava junto
daquela jovem, acabou por criar um problema para si, o desejo de viver ao
seu lado! Mas ela não podia e por isso sofria...
***
Capítulo 16

Naquela tarde de sexta-feira, Lorena escolhia as roupas e objetos que


levaria em sua pequena mala de viagem. Não precisaria levar muita coisa,
pois tinha deixado muitas peças em seu guarda-roupa, na casa dos seus pais,
pois era para lá que ela estava indo naquele final de semana. O Sr. Caio, o
pai dela, estava fazendo aniversário e a família havia decidido comemorar a
data visto que ele completaria os seus cinquenta anos, então não havia
motivo mais justo para um festim.
Quase um mês já havia se passado desde que aquela moça tivera
aquele fim de semana saudoso com Stela que não voltou a entrar em contato
consigo, depois daquele telefonema que mais pareceu uma despedida.
Lorena até pensou, por várias vezes, em ligar para a juíza, mas no último
minuto desistia, preferia esperar que a iniciativa partisse dela, então se
segurava como podia.
Depois de uma noite de viagem, Lorena chegou à casa de seus
pais, na pequena cidade onde eles moravam, a jovem estudante foi recebida
com abraços apertados e beijos calorosos, como de costume. A sua mãe,
Leila, já se encontrava na grande cozinha da casa junto de suas irmãs,
preparando os pratos que seriam servidos na festa do cinquentenário do seu
pai. A “convenção das bruxas” já havia começado e a moça participaria,
certamente, pois para ela, aquele momento era mágico e ela adorava
aprender com aquelas mulheres falantes e eufóricas.
__ Eu quero ajudar vocês, o que eu posso fazer? __ Perguntou
Lorena sorridente, ao chegar à cozinha.
Imediatamente algumas cebolas e tomates apareceram em sua
frente para que ela os picasse em pedaços diminutos. A jovem
simplesmente amava cozinhar e junto daquelas mulheres então, era sempre
uma experiência incrível.
Depois de algumas horas de trocas de receitas, de discussões
acaloradas à cerca de temperos e de várias taças de vinho, tia Íris, uma das
irmãs da mãe de Lorena, perguntou em alto e bom som:
__ E você, minha linda, quando vai trazer o seu namorado pra
gente conhecer? __ A pergunta surgiu logo depois que Lucas, o irmão mais
velho da jovem, um médico recém-formado, saíra da cozinha acompanhado
de sua nova namorada.
Lorena encarou as mulheres que olhavam para ela, aguardando a
sua resposta e lembrou-se de Stela. O seu pensamento divagou e ela a
imaginou ali, naquela cozinha, interagindo com as suas tias e sua mãe, o
que seria bastante difícil de acontecer devido a personalidade introspectiva
da juíza... Então, em um momento de pura ousadia e destemor, soltou:
__ Se eu fosse trazer alguém aqui pra apresentar para vocês, seria
uma mulher!
A sua mãe a olhou com espanto e depois encarou cada uma de
suas irmãs que se calaram repentinamente, com uma feição de quem se
pergunta: “que diabos essa garota está falando?”
__ Lorena, que isso? __ Perguntou Leila à filha.
__ É isso mesmo mãe, eu sou gay! __ Aquela jovem não tinha
mais dúvidas com relação à sua orientação sexual. Depois daquele final de
semana com Stela em que ela tinha conseguido de fato, se entregar
totalmente, sem nenhuma reserva àquela mulher e elas, juntas, terem
alcançado o ápice incontáveis vezes, não havia mais como ter dúvidas, ela
era homossexual e ponto.
__ O quê? Desde quando? __ Voltou a perguntar a mãe, russa de
constrangimento.
__ Desde... Sempre? __ Respondeu Lorena sem titubear, pois não
intencionava recuar, se manteria firme em seu propósito de revelar-se à
família.
Sim, desde sempre! Aquela moça descobrira enfim, que namorar
garotos sempre fora uma necessidade sua em dar uma resposta previsível à
sua família, e aquela jovem não podia mais fazer aquilo. Não lhe era mais
possível!
__ Leila, deixa a garota amar quem ela quiser! Ela não é a
primeira e nem será a última!__ Falou tia Íris, antes de tomar mais um gole
do seu vinho. Aquela era, das irmãs de sua mãe, a que Lorena mais gostava,
porque ela era, de todas, a mais descolada e moderna.
O apelo da tia Íris caiu tão bem, que todas as outras mulheres
daquela cozinha voltaram a tagarelar normalmente, dando continuidade ao
preparo das deliciosas receitas que seriam servidas na festa...
...Quando as mulheres terminaram todos os trabalhos e deixaram
a cozinha intacta, Lorena resolveu ir para o seu quarto descansar um pouco
antes de tomar um banho e se preparar para a festa de aniversário do seu
pai. Ela havia se deitado na cama e já estava em um estado de sonolência
quando a sua mãe entrou pela porta, sentou-se na beirada do colchão e
disse:
__ Lorena, eu quero que você me explique o que você falou lá na
cozinha!
Um pouco assustada pela entrada repentina de sua mãe naquele
quarto, a jovem despertou, sentando-se no colchão ainda um pouco
atordoada, se recostando na cabeceira da cama e colocando um dos
travesseiros em sua frente para abraça-lo.
__ O que você quer saber exatamente mãe?
__ Eu quero saber que história é essa de você ser gay, você nunca
me falou nada! Com quem você está andando na faculdade Lorena? E que
mulher é essa que você falou lá na cozinha?
Leila enchia a filha de perguntas sem esperar por respostas.
__ Mãe, eu sou gay e eu nunca te falei nada porque eu mesmo não
sabia! Eu não estou sendo influenciada por ninguém e eu disse na cozinha
que, se eu fosse apresentar alguém pra vocês, seria uma mulher, foi isso o
que eu disse!
__ Uma mulher Lorena? Que gosto é esse? Pra que gostar de
mulher? O que elas têm entre as pernas, você também tem! __ Dizia Leila,
com uma cara um tanto quanto repulsiva.
__ Mãe, me respeita, por favor!
__ Você não parece que é gay! Você me parece uma moça! Você
usa vestido, tem os cabelos compridos, usa maquiagem, esmalte nas unhas,
usa salto... Eu acho que você tá enganada, Lorena! __ Falava a mãe
tentando chamar a filha à razão, afinal, ela sendo tão feminina não poderia
ser “sapatão”, só podia estar equivocada!
A jovem ficou estupefata! Será que ela ia ter que dar uma aula
sobre diferenças de gêneros àquela mulher a sua frente? Não era possível
aquilo! O assunto é tão debatido nas mídias, mas a sua mãe parecia uma
completa desinformada!
__ Mãe, eu disse que sou gay e não que eu sou uma transexual!
Por favor, você não é uma ignorante! __ Lorena preferia se autodenominar
“gay” junto à sua família, pois a palavra “lésbica” lhe pareceu muito forte,
cercada de muitas lendas que certamente assustariam ainda mais aquelas
pessoas tão antiquadas e cheias de preconceitos.
__ O seu pai não vai gostar nada, de saber disso! __ Leila sempre
usava aquele argumento final como apelo, quando lhe faltava argumentos
junto aos seus filhos, lamentavelmente!
__ Me desculpa mãe, mas é assim que eu sou!

...Quando a noite chegou, pouco antes da festa começar, o Sr.


Caio saía do banho tranquilamente, quando se deparou com a sua mulher
sentada na cama, cabisbaixa, visivelmente incomodada.
__ O que foi Leila? __ Perguntou o homem já começando a se
vestir.
__ A Lorena Caio, que disse que é gay! __ Disse a mulher fitando
o marido para observar a sua reação diante da informação que ela trazia.
__ Gay?
__ Sim! Ela disse lá na cozinha, com todas as minhas irmãs lá, me
matando de vergonha! Depois eu conversei com ela no quarto e ela
confirmou que é mesmo!
__ Ah, não se preocupa, isso passa! Quando ela gostar de um
rapaz ela larga isso! __ Falou o homem, tranquilo, dando continuidade ao
ato de se vestir. Certamente a sua filha estava só atravessando uma fase,
mas ia passar, assim que ela resolvesse se casar! Pensava ele.
__ Não sei não!
__ Melhor assim, pelo menos ela não engravida! __ Racionalizou
o marido, vendo o lado positivo da filha se relacionar com mulher.
__ O quê? É isso que você tem pra falar? __ Pressionava Leila, o
homem pacífico demais com o qual se casara.
__ Claro! Eu fico até mais tranquilo! __ Finalizou o homem
sendo sincero, pois quando a sua filha teve que se mudar para outra cidade
por causa dos estudos, a sua única preocupação era ela voltar pra casa,
grávida.

...Mais tarde, a festa de família rolava solta. Todos se satisfaziam


com as deliciosas comidas que haviam sido preparadas pelas mulheres e
também pelas bebidas que circulavam fartamente pelo ambiente.
Lorena segurava uma taça de vinho em uma de suas mãos,
observando os seus familiares rindo e se divertindo, mas a sua cabeça
divagava... Ela pensava em Stela, imaginando como a juíza se comportaria
ali, no meio daquela gente e não conseguia encaixá-la naquele ambiente
barulhento devido à personalidade exaltada daqueles descendentes de
italianos, os seus parentes. Enquanto curtia aquele devaneio, Lorena viu a
sua prima, uma das mais próximas, vir até ela e sentar-se ao seu lado para
iniciar uma conversa:
__ Oi Lorena, quanto tempo!
__ Oi Bruna! Verdade, quanto tempo que a gente não se vê.
__ Você tá quase se formando né! É agora, no fim do ano? __
Perguntou a prima que fazia Odonto.
__ Isso mesmo, no fim do ano! E você?
__ Eu me formo no ano que vem ainda. Já estou louca pra
começar a trabalhar, você não faz ideia!
__ Legal!
__ E você? Tá namorando? Desculpa, mas a minha mãe me
contou sobre a sua... Revelação hoje...
__ Ah, a família toda já sabe que eu sou “sapatão”? A notícia
andou rápido, hem!
__ Você sabe que na nossa família as notícias andam igual
“rastilho de pólvora”, né! __ Disse a prima, soltando uma gargalhada em
seguida.
__ É, eu sei! __ Falou sem muito ânimo, Lorena.
__ Por que você não trouxe a sua namorada pra gente conhecer?
__ Eu não tenho namorada! Ela é só uma “ficante”... Na verdade,
acho que nem isso!...
__ Entendo! Fica de boa, eu também já peguei mulher, é
tranquilo!
__ Você também é gay?
__ Não! Eu sou só curiosa! __ Gargalhou a prima, mais uma vez.
__ Eu também era só uma curiosa...

...Após a meia-noite, depois de incontáveis taças de vinho


ingeridas, Lorena se sentia alta quando se afastou do grupo de primas que
havia se reunido em volta dela, para fazer uma ligação. Curiosamente, a sua
popularidade junto àquelas moças havia aumentado, coincidentemente, no
mesmo dia em que acontecera a sua súbita e repentina “saída do armário”.
Ela não sabia se era por solidariedade ou por curiosidade, o fato é que suas
primas se recusavam a sair do seu lado naquela noite.
__ Alô! __ A jovem, sentindo-se ousada, não havia conseguido se
conter daquela vez e, envolta naquele clima festivo e favorável, acabou por
ligar para Stela.
__ Alô, Lorena? __ Perguntou a mulher, ainda em estado
sonolento, pois havia acabado de acordar com o som de seu celular tocando,
insistentemente.
__ Desculpa, eu te acordei?
__ Sim, mas não tem problema! Você está bem?
__ Estou bem, mas com saudades...
__ Você está numa festa? Estou ouvindo um barulho...
__ Eu estou aqui na minha cidade natal, no aniversário do meu
pai... Queria que você estivesse aqui comigo...
__ Mas você sabe, a minha situação... A minha vida é muito
complicada. Eu não quero te prejudicar com os meus problemas, com os
meus entraves... __ Dizia a mulher, trazendo à tona novamente as razões
pela quais elas deviam se manter afastadas.
__ Mas e se nós enfrentássemos tudo, juntas?
Stela se emocionou ao ouvir a singela proposta da jovem. Parecia
um sonho, aquela moça tão linda, tão inteligente, tão esperta querer lutar
por si! Era como se ela estivesse sendo gratificada, por algum motivo.
__ Você é um sonho garota!... Um sonho bom que levanta
comigo... Fica comigo o dia todo... E dorme comigo...
A juíza falava com a voz meio fraca, porque essa era a sua
verdade, Lorena não saia de sua cabeça em nenhum segundo sequer dos
seus dias. Estava apaixonada pela jovem, não tinha dúvidas disso.
__ Stela... Eu não quero ser apenas um sonho pra você... Eu quero
você, de verdade!...
__ Eu também te quero, mas você tem que ficar com gente da sua
idade Lorena, é melhor pra ti... É mais saudável...
Tudo o que aquela mulher queria era ter aquela garota para si,
mas ela tinha que ser consciente, não podia agir como uma louca,
inconsequente e simplesmente dar vazão aos seus desejos, ela obrigava-se a
se ancorar na razão sempre, pelo bem da moça que ainda era tão jovem.
__ Mas é você que eu quero Stela! Vamos marcar alguma coisa!...
Eu prometo que eu não te cobro nada... __ Em última hipótese, a jovem se
dispunha a ser um simples caso da juíza. Ela abria de mão das
demonstrações de carinho em público, abria de mão de qualquer coisa para
ter aquela mulher.
__ Não se trata disso! Você tem todo o direito de me cobrar...
Você está certa, eu é que estou errada! Eu sou uma idiota Lorena... Eu
deveria mostrar pra todo mundo a garota linda que quer me beijar, mas eu
simplesmente não consigo...
__ Stela, hoje eu contei pra minha família que eu sou gay e eu não
estou sendo queimada em uma fogueira por causa disso! A dificuldade tá
mais dentro da cabeça da gente, sabe!
__ Que bom! Que libertador pra você... Fico feliz em saber!...
__ Eu estou feliz, mas eu quero te ajudar a se libertar também.
Por favor, me deixa fazer isso!
Stela ria sozinha em seu quarto, emocionada, ouvindo as palavras
daquela moça que ousou acordá-la de madrugada para lhe fazer propostas
que jamais sonhou em receber de alguém. Era tão inusitado, parecia algo
orquestrado pelos deuses de tão surpreendente que era tudo aquilo.
__ Você é tão doce... Tão linda! __ Sussurrava a mulher.
__ Vamos fazer assim, a gente conversa com o Enrico, porque ele
tem que ser o primeiro a saber de tudo, depois eu te apresento pra minha
família... O que você acha do meu plano?
Para Lorena as coisas não eram tão complicadas como Stela
colocava, na verdade, eram até bem simples, pois tratava-se de duas
mulheres adultas querendo ficar juntas e ninguém tinha o direito de se
interpor a isso, era tão óbvio!
__ Acho que o Enrico ainda não está pronto pra essa conversa, eu
o conheço. Ele ainda não te superou por completo. Ele estava muito
apaixonado por você, Lorena!
__ Entendo!... Então porque não fazemos assim, enquanto
esperamos o Enrico ficar pronto para nos ouvir, a gente continua a se
encontrar, o que acha?...
...E foi exatamente o que aconteceu, Stela continuou a se
encontrar com Lorena no charmoso chalé, encravado nas montanhas no
meio da densa floresta exuberante, ao menos quinzenalmente.
Sob a alegação de que estava indo para a tal faculdade obscura em
uma cidade sem nome, de quinze em quinze dias, mais ou menos, a juíza
tinha que viajar para dar as suas “aulas” no curso que inventara para o filho.
É claro que ela se sentia muito mal toda vez que tinha que mentir para
Enrico, mas já não conseguia mais ficar sem aquela garota que enchia a sua
vida de sentido, preenchendo-a com os seus carinhos, atenção e doçura...

...Mais um fim de semana chegou e novamente as duas mulheres


partiram para o chalé para se fartarem de si mesmas, pois a necessidade que
tinham de se tocarem, se beijarem, de fazerem amor era cada vez maior e a
distância entre elas era cada vez mais incômoda. Era como se as duas
fossem apenas um corpo dividido em duas partes...
Naquele dia, num sábado pela manhã, Lorena convidou Stela para
juntas, tomarem um banho na banheira de hidromassagem, pois queria
aproveitar um pouco do conforto que aquela acomodação oferecia. A moça
se recostava toda na mulher que a recebia entre as suas pernas e lhe jogava,
vagarosamente, bocados de água em seu peito e pescoço. A jovem pendia a
sua cabeça para trás, apoiando-se confortavelmente em um dos ombros da
juíza, de olhos fechados quando resolveu quebrar aquele silêncio manso que
havia se estabelecido entre as duas:
__ Stela, eu estive pensando...
__ Hum?...
__ Nós não precisamos vir pra cá toda vez que a gente quiser se
encontrar...
__ Por que, você se cansou desse chalé? Eu posso procurar outro
lugar...
__ Não é isso, eu amo esse lugar, mas ele é muito caro! Você não
precisa ficar gastando tanto dinheiro pra gente se ver, nós podemos nos
encontrar no meu apartamento. É claro que ele não é lindo como aqui, mas
em compensação eu poderia cozinhar pra você de vez em quando e você
gosta da minha comida que eu sei!
Acidentalmente, na última vez em que elas estiveram ali, na
viajem de volta, enquanto Stela havia apeado do carro em um posto de
gasolina, Lorena viu a conta daquele chalé e tomou um susto com o seu alto
custo, então pensou em fazer aquela proposta, pois em seu modo de ver,
aquele lugar podia ser economicamente viável uma vez ou outra, mas não
sempre como estava sendo o caso delas.
A juíza sorriu e deu um beijo demorado no pescoço daquela moça
que além de linda estava preocupada consigo. Que delícia de garota!
Pensou ela, será que a merecia? Contudo, resolveu tranquiliza-la, pois a
magistratura lhe propiciava um excelente salário e os gastos quinzenais que
ela empreendia naqueles encontros não lhe desfalcavam nem um pouco.
__ Não se preocupe com isso, eu estou bem!
__ Ao menos a gente podia intercalar, sei lá! Vamos pensar nisso,
por favor! __ Insistia a jovem, pois a última coisa que ela queria era se
tornar um peso para aquela mulher.
__ Mas você não mora sozinha, se esqueceu? __ A juíza sabia que
Lorena dividia o seu apartamento com um amigo e a sua intenção era
continuar com aquele caso de forma oculta, como vinha sendo.
__ Não se preocupe, o Léo já sabe da gente!
__ Já sabe? __ Perguntou a mulher surpresa, pois para ela,
somente as duas sabiam do caso secreto entre elas.
__ Já, mas pode ficar tranquila que ele é gente boa e é super
discreto! O Léo é como um irmão pra mim...
Na verdade, Stela já não se horrorizava tanto mais com a
possibilidade das pessoas saberem do seu romance com aquela jovem, pois
estava perdidamente apaixonada por ela e por isso, parecia que se fortalecia
a cada dia para querer derrubar as portas do seu “armário” e se libertar de
qualquer amarra que pudesse ser um obstáculo entre elas.
O grande temor mesmo da juíza era quanto ao seu filho. Ela
aguardava a ocasião exata para conversar com ele, mas sentia que ainda não
havia chegado o momento certo. Na realidade ela estava esperando Enrico
lhe apresentar uma nova namorada para aí sim, ter a certeza que ele havia
superado Lorena e conseguido fechar aquele ciclo para iniciar outro.
__ Tá bom, nós podemos fazer isso sim! Por que não?
Disse finalmente a juíza voltando a beijar o pescoço da jovem a
abraçando languidamente por trás, depois escorregou as suas mãos pelos
seios tentadores dela, sentindo os seus mamilos ficarem rijos debaixo dos
seus dedos. Lorena não conseguia manter o seu corpo em estado letárgico
sob o toque daquela mulher que sabia exatamente, como acordá-lo com as
suas mãos hábeis...

***
Capítulo 17

Era segunda-feira e, depois de mais um delicioso encontro com Lorena


no chalé, Stela chegava ao fórum para iniciar outra semana de trabalho, mas
algo nela estava diferente nos últimos tempos, pois agora a juíza chegava
àquele local sorridente e cumprimentado a todos que cruzavam com ela. Era
notória a mudança daquela mulher que parecia mais feliz e cheia de vida a
cada dia que se passava.
__ Bom dia Bianca! __ Cumprimentou Stela empolgada, a sua
assessora que vinha acompanhando as transformações daquela mulher mais
de perto, achando-a cada vez mais bonita, jovial e acessível.
__ Bom dia Dra. Stela! __ Respondeu Bianca sorrindo e
observando a magistrada dos pés à cabeça, contagiada pela felicidade
emanada pela sua chefe. Na verdade a assessora percebia uma vibração
diferente naquela mulher que a tornava extremamente atraente para si, mas
não sabia explicar o que era, exatamente.
__ Hoje nós temos muito o que fazer minha querida, então vamos
trabalhar! __ Disse Stela, esfregando as mãos demonstrando a sua animação
para começar aquele dia laboral...

...Tudo corria magnificamente bem naquela semana, pois Stela


adorava o seu trabalho, dominando por completo todas as demandas
surgidas nele, e encontrava-se perdidamente apaixonada por Lorena, ao
ponto de pensar nela a todo o momento então, não havia nada que pudesse
tirar daquela mulher a sua sensação de completude, o que a deixava
totalmente arrebatadora aos que estavam à sua volta...
Naquele dia específico, numa quinta-feira, já passavam das
dezessete horas e todos já haviam se retirado, quando Stela começou a
guardar os seus pertences na bolsa, encerrando os trabalhos por ali para
também ir embora quando Bianca, a única funcionária que ainda estava
com ela naquele gabinete, tomou coragem e falou:
__ Dra. Stela, ah... A senhora gostaria de... Jantar comigo, em
minha casa?
A assessora estava titubeante, pois apesar do estado bem
humorado da juíza, ela ainda continuava sendo uma autoridade e digna de
todo o respeito possível que se pudesse ter por ela.
__ Você está me convidando para um jantar Bianca? É alguma
ocasião especial? __ Perguntou Stela um pouco confusa, pois a sua
assessora trabalhava com ela já, há quase uma década e em todo esse tempo
ela nunca havia a convidado para absolutamente nada.
__ Não ha nenhuma ocasião especial, eu... Gostaria de preparar
um jantar apenas para... Nós duas!...
__ Um jantar apenas para nós duas? Como assim?
A juíza continuava confusa, porque não via motivo para ela sair
de seu apartamento e ir parar na casa da sua assessora que ela via todos os
dias, o dia todo, inclusive almoçava em sua companhia a semana inteira,
para jantar com ela, apenas as duas!
Bianca olhava para a magistrada, emudecida e começou a esfregar
as mãos de nervoso, sem coragem de explicar o motivo do convite. Ela era
apaixonada por Stela há anos, mas nunca havia tido coragem para se
declarar. Guardava os seus sentimentos em segredo absoluto, mantendo a
juíza apenas nos seus pensamentos como se ela fosse uma deusa
inalcançável. Mas ao observar a mudança daquela mulher, o seu estado de
felicidade e sua acessibilidade, criou coragem para fazer aquele convite, só
que agora ela se encontrava em uma enrascada, pois a covardia havia se
apossado do seu ser e estava ao ponto de ter um troço.
__ Bianca!... __ Chamou Stela, começando a vislumbrar o motivo
real daquele convite. A sua assessora vivia para ela, se colocava a seu
serviço o dia todo, se mantinha próximo a si todo o tempo, jamais ia
embora antes dela... Bem, o cargo não exigia daquela servidora,
oficialmente, toda aquela devoção, ou seria uma veneração?... O fato é que
aquela dedicação além da conta era perceptível a todos que ali trabalhavam
e naquele exato momento, a juíza começava a entender o porquê de tudo.
__ Dra. Stela... Me desculpe! __ Murmurou Bianca, sentindo as
maçãs do seu rosto queimando de constrangimento.
__ Bianca, por acaso você está me convidando para um jantar
romântico? __ Perguntou Stela, decidindo-se por ajudar a moça totalmente
embaraçada a sua frente. Na realidade ela conseguiu ter empatia pela
assessora, pois ela mesma havia passado por uma situação parecida a bem
pouco tempo, com Lorena, na clínica onde ela faz o seu estágio. Felizmente
a jovem a ajudou a se expressar naquela ocasião e agora elas estavam
juntas... Evidentemente que esse, não seria o desfecho ali, mas ao menos
poderia auxiliar a assessora de alguma forma.
__ Sim, isso mesmo!... Dra. Stela, na verdade, eu... Sou
apaixonada por você ha muito tempo já, mas nunca tive coragem de te
dizer... __ Bianca se emocionou porque finalmente conseguia se abrir para a
sua chefe. Foram tantos anos guardando aquele segredo só para si, que
agora que conseguia expor os seus sentimentos não se aguentou e algumas
lágrimas rolaram em sua face.
__ Bianca, saiba que eu fico imensamente honrada por ter
conseguido suscitar esse sentimento em você! Você é uma jovem tão
inteligente, tão competente, tão minuciosa!... Não há nada que você não
perceba, não há nada que você não resolva!... Você é a melhor assessora que
uma juíza ou um juiz poderia ter!... Você é tão educada, é tão bonita... Se
você tivesse me feito esse convite ha alguns meses atrás, eu aceitaria sem
hesitar... Mas acontece que no momento eu estou apaixonada por outra
mulher, desculpe-me!
__ Tudo bem, não tem problema! __ Disse a assessora, com a voz
embargada pelo choro que ela não conseguia conter.
Stela agarrou as mãos da moça, por sobre a mesa negra de
madeira maciça e disse:
__ Bianca, você é uma mulher incrível e pode ter quem você
quiser! Ainda é jovem, mas não deixe o tempo passar... Saia de casa,
conheça novas pessoas e fique atenta, pois a mulher que irá te amar como
você merece, pode estar bem próximo a você. Não se prenda aos
preconceitos alheios, livre-se das amarras o quanto antes, e viva feliz ao
lado de alguém que realmente seja digno de você!
Stela falava para Bianca, mas também para si mesmo, pois os
entraves daquela jovem a sua frente eram os seus próprios entraves.
__ Tá bom Dra. Stela... Obrigada pelas palavras! Obrigada por
tudo! __ Agradeceu a assessora, comovida e ainda mais emocionada...

...Depois de um tempo, quando Stela viu que Bianca havia


conseguido se recompor, ela a chamou para enfim, irem embora. Quando as
duas se levantaram de seus assentos e encaminhavam-se para a porta do
gabinete, a jovem se voltou para a juíza e disse:
__ Dra. Stela, eu posso ao menos te dar um abraço?
__ Claro Bianca! Não precisava nem pedir! __ disse a magistrada
abrindo os seus braços para receber a dócil e educada assessora que se
aproximou, se aconchegando em seu corpo, confortavelmente.
Enquanto apertava a jovem em um caloroso abraço, Stela falou:
__ Bianca, pense sempre na sua felicidade, tá! Nunca se
abandone, comprometa-se com você. Promete?
__ Prometo, Dra. Stela...
Depois daquele momento de carinho entre a juíza e sua assessora,
elas saíram do fórum, juntas e só se separaram no estacionamento, onde
cada uma entrou em seus respectivos carros e se foram.

...No caminho para a sua casa, Stela dirigia, recapitulando tudo o


que havia acontecido consigo e Bianca e pensava em como a vida era
mágica. No momento em que ela finalmente, consegue iniciar o seu
movimento de libertação de suas amarras ela recebe uma declaração de
amor de uma jovem que se diz apaixonada por si, ha anos. Concluiu que de
fato, tudo depende da vibração que emitimos ao mundo que nos cerca.
A juíza se sentia bem ao saber que era amada por uma jovem
como Bianca, mas também sabia da responsabilidade com a qual deveria
agir com ela daquele dia em diante, pois estava apaixonada por Lorena,
portanto não devia e nem podia alimentar aquele sentimento de sua
assessora por si.
A mulher dirigia por aquele transito calmo e deixava a sua mente
divagar por seus pensamentos, tentando amarrar cada ponta solta daquela
trama instigante... No som do carro tocava a música Alien de Tan Cologne,
um grupo musical que Lorena amava, pois Stela não havia se apaixonado só
pela garota, mas por tudo que ela gostava, por tudo que a lembrava... O seu
olhar puro e verdadeiro... O seu riso doce e contagiante... A sua voz suave...
O seu cheiro entorpecente... O seu gosto inesquecível...

***
Capítulo 18

Naquele fim de semana, Stela se encontrava estendida em seu


confortável sofá, na sala, aguardando o seu filho sair de casa para poder sair
também. A mulher lia algo em uma revista, mas de vez em quando
consultava o relógio, pois Lorena a aguardava em seu apartamento e já
havia ligado para ela a informando que o jantar que tinha preparado para as
duas já estava pronto, só faltava o toque final que seria dado, assim que ela
chegasse lá.
No momento em que a juíza virou uma página para dar
continuidade à leitura da matéria, viu o seu filho surgir na sala, todo
arrumado e perfumado, pronto pra ir para o rolê. Enrico era um jovem
estudante bem relacionado, bonito, saudável, portanto, já era mais do que
natural para a sua mãe vê-lo sair todas as noites, nos finais de semana, para
ver os amigos, as garotas e assim, vivenciar as experiências próprias da sua
idade.
__ Mãe, vou dar uma volta por aí, tá! __ Informou o jovem
carinhoso, se curvando para dar um beijo na cabeça da mulher.
__ Tá bom filho. Se cuida! __ Disse Stela, se movimentando para
receber o beijo do filho.
Quando viu Enrico saindo pela porta, imediatamente a mulher foi
até ao seu quarto para trocar de roupas se repreendendo por se prestar
àquele papel deplorável. Ela parecia uma dessas adolescentes que esperam
os pais saírem de casa, para aprontar. O que estou fazendo? Deus!...
Perguntava-se a juíza assustada com ela mesmo.
Chegando ao apartamento de Lorena, Stela tocou a campainha e,
depois de alguns segundos, viu a sua garota abrindo-lhe a porta com um
sorriso largo no rosto. Sim! Valia à pena qualquer sacrifício para encontrar
aquela linda jovem que conseguia aquecer o seu coração, a sua vida, com
um simples sorriso... Pensou a mulher.
Lorena puxou a juíza para dentro do seu apartamento, fechou a
porta, a agarrou pelo pescoço e deu-lhe um beijo quente e profundo,
matando a saudade que ela tinha daquela mulher que não saia de seus
pensamentos.
Stela apertou a moça pela cintura, correspondendo com sede, o
beijo delicioso que recebia. O desejo que elas tinham era grande e a vontade
de dar vazão a ele, era imensa, mas teriam que se conter, pois primeiro elas
iriam jantar, não?
__ Stela, vamos comer primeiro! __ Falou a jovem, com a
respiração alterada, depois de interromper o delicioso beijo que recebia.
__ Tá bom! Vamos comer... Eu trouxe um vinho! __ A juíza,
sentindo o seu corpo todo acesso, tentava se recompor e mostrou a bebida
que trouxera para o acompanhamento do jantar.
__ Ótimo! Vem cá! Enquanto você abre a garrafa eu termino o
nosso jantar. __ Lorena puxou a mulher pela mão e a levou para a cozinha.
__ Como você sabe, o meu apartamento é pequeno, não repara! __
Completou a moça.
__ Eu gostei daqui! É pequeno, mas é bem decorado, organizado,
uma gracinha! __ Stela observava os detalhes da casa onde vivia a jovem
pela qual havia se apaixonado, tentando captar um pouquinho mais da
personalidade dela.
__ Obrigada! Vou pegar o abridor pra você.
Lorena se virou, abriu uma gaveta, pegou o objeto e o entregou à
juíza que imediatamente se pôs a manejar a pequena engenhoca com o fim
de retirar a rolha daquela garrafa. Quando terminou a tarefa, viu a jovem
colocando duas taças vazias por sobre a bancada de mármore que havia ali.
A mulher as encheu com o líquido avermelhado que logo foi experimentado
pelas duas, depois de fazerem um rápido brinde com as bordas dos cálices.
__ Hum... Delícia! __ Expressou a moça, antes de dar um beijo
breve em Stela. Ela gostava de sentir o sabor do vinho intensificado pela
boca da juíza, não sabia o porquê, apenas um desejo sem explicação... __
Vou terminar de preparar o nosso jantar. Vai ser rápido!
__ O que você fez?
__ Salmão grelhado ao creme flambado! __ Anunciou Lorena,
começando a finalizar os pratos.
__ Hum!... Mas que sofisticação é essa?
__ Bom... A minha visita merece o melhor! __ Respondeu a
jovem sorrindo, olhando sobranceiro para a mulher.
__ O que é isso? __ Perguntou Stela, sentada em uma das
banquetas, apoiando-se na bancada de mármore, observando a moça com
um objeto que soltava um jato de fogo por sobre a comida.
__ Um maçarico culinário! __ Explicou de forma óbvia a garota,
como se todos conhecessem aquele aparato de cozinha.
__ Você não vai colocar fogo na cozinha, vai? __ Brincou a juíza,
encantada com a desenvoltura da moça ali, naquele pequeno, mas funcional
espaço. A jovem manuseava aqueles objetos com tanta segurança, as suas
mãos eram tão ágeis e coordenadas que deixavam a mulher que a
observava, fascinada.
__ Eu espero que não! __ Respondeu a moça, dando continuidade
ao seu afazer.
__ Onde você aprendeu isso, na convenção de bruxas?
__ Não! Esse prato eu aprendi em um pequeno e rápido curso de
gastronomia que eu fiz!
Quando terminou, Lorena apenas ajeitou os aparadores na
bancada, dispôs os talheres e colocou os pratos devidamente flambados nos
seus lugares.
__ Bon appétit! __ Falou a moça, passando a aguardar que a
mulher experimentasse primeiro, como já era do seu costume.
Stela pegou os talheres, apanhou um bocado daquela vistosa
comida e colocou em sua boca, fechando os olhos em seguida, expressando
o seu imenso prazer em provar algo tão bom.
__ Hum... Que delícia! __ Emitiu a juíza, aturdida com a explosão
de sabores em sua boca.
Lorena esboçou um largo sorriso, feliz por conseguir agradar a
sua namorada, se é que ela podia considera-la assim, com a sua comida.
__ Que bom que gostou!...
As duas mulheres saborearam aquela comida suculenta, deliciosa,
acompanhada do vinho que casou perfeitamente com o prato, e depois
foram para o quarto para namorarem um pouco, pois a vontade de se
tocarem e fazer amor, era imensa.
O quarto de Lorena era pequeno, mas era também, muito bem
decorado. Os móveis intercalavam-se entre si, o aproveitamento dos
espaços era inteligente, acabando por formar um ambiente agradável e
confortável. O cheiro da garota impregnava a peça, despertando o corpo de
Stela que havia se deitado na cama de casal, se recostando em alguns
travesseiros macios que tinham ali.
Lorena também se deitou e se recostou na juíza, entre suas pernas
que se abriram para recebe-la. A jovem havia planejado colocar um filme
que tinha separado para elas, na TV, enquanto faziam a digestão do leve
jantar que haviam ingerido.
__ Acho que você vai gostar desse! __ Garantiu a moça,
manuseando o controle para iniciar a película.
__ E qual é?
__ “Um Lugar Chamado Notting Hill”, já viu?
__ Esse é antigo, é claro que já vi!
__ E você gosta?
__ Bem, é um excelente filme, mas eu gostaria mais se tivessem
substituído o Hugh Grant pela Cate Blanchett!
__ Ah é? Você não disse que deveriam substituir o Mr. Darcy por
uma condessa quando vimos o filme “Orgulho e Preconceito” lá no seu
quarto, naquela vez! __ Ironizou Lorena, se voltando para Stela.
__ Eu não podia dizer isso! O que você ia pensar a meu respeito?
__ Se explicou a juíza, fitando o rosto da linda jovem que se encostava toda
em seu corpo, toda entregue, deliciosamente.
__ Bom... Se você tivesse dito isso, nós teríamos aproveitado
melhor aquela cama! __ Respondeu a moça, começando a construir uma
aura de sensualidade entre as duas...
__ Mas quando você começou a se interessar por mim? __ Quis
saber a mulher.
__ Acho que desde a primeira vez em que eu te vi...
Stela estava tão apaixonada que, para ela, era como se Lorena
fosse um presente trazido por alguma divindade para a sua vida, não tinha
outra explicação. Pensando nisso, ela contornou aquele lindo rosto da
garota e o puxou para iniciar um beijo vagaroso e profundo, em uma total
entrega de corpo e alma... Depois de alguns longos segundos, a juíza
desgrudou os seus lábios daquela boca macia e quente, com uma certa
dificuldade, para sussurrar:
__ É melhor você colocar o filme, senão eu vou começar a tirar a
sua roupa, porque eu estou com tanta saudade de você... Eu te quero
tanto!...
Lorena demorou alguns segundos para se decidir, mas optou por
iniciar o vídeo, para não pular nenhuma etapa, pois a sua intenção era curtir
aquela mulher com calma, naquela noite.
O filme iniciou e a voz ímpar do britânico Elvis Costello, logo
preencheu o quarto com a sua versão da linda canção, “She”. Na tela
aparecia imagens de uma Julia Roberts perfeita e poderosa, com o seu olhar
penetrante característico, mas era a letra da música que chamava a atenção
das duas mulheres, em frente a tela da TV...

“Ela pode ser o rosto que eu não posso esquecer, um traço de


prazer ou arrependimento, pode ser meu tesouro ou o preço que eu tenho
que pagar...
...Ela pode ser a bela ou a fera, pode ser a fome ou o banquete...
Ela pode ser o espelho dos meus sonhos, um sorriso refletido em um
riacho...
...Ela pode ser a razão pela qual sobrevivo... A única com que que
eu vou me importar prontamente ao longo dos anos, durante as
adversidades... Eu vou pegar suas risadas e suas lágrimas e fazer delas todas
as minhas lembranças... Para onde ela for, é onde eu devo estar... O sentido
da minha vida é ela, ela, ela...”

...As duas mulheres ouviam a bela canção e se viam na linda letra


que certamente, teria sido escrita em um momento de pura paixão pelo seu
autor...
Elas assistiram a todo o filme, porque de fato, trata-se de uma
obra prima, um conto de fadas, imortalizado na tela de cinema.
A cena final é a certeza de que o amor venceu, apesar das
diferenças entre o casal protagonista, e é também a promessa de que
ficariam juntos para todo o sempre, novamente ao som da linda composição
de Charles Aznavour...
Quando os créditos começaram a subir, Lorena paralisou a tela, se
virou para Stela e perguntou:
__ Gostou da nossa sessão de cinema?
__ Esse filme é perfeito, não há outra palavra que o defina!
__ Concordo! E assisti-lo assim, juntinho com você é mais
gostoso ainda...
Stela ouviu aquelas palavras e sentiu que era a deixa perfeita para
iniciar o que estava louca para fazer, desde que chegara ali, naquele
apartamento, pois a saudade que ela tinha daquele corpo em sua boca era
indescritível.
A juíza enfiou os seus dedos pelos cabelos da jovem e a puxou
para um beijo profundo. Lorena permanecia entre as pernas da mulher,
ainda de costas, porém a cabeça dela estava jogada para trás, apoiada em
seu peito...
Em um dado momento, Stela desgrudou a sua boca dos lábios
macios da moça e passou a morder levemente e languidamente o seu
pescoço, em vários pontos... A garota simplesmente abriu caminho para a
juíza, relaxando em seus braços, em uma total entrega, pois sabia que
aquela mulher só lhe daria o prazer e nada mais além disso...
Enquanto continuava a mordiscar aquele pescoço cheiroso, Stela
baixou uma de suas mãos para arrastá-la pelas coxas macias de Lorena,
apanhar a barra de seu vestido e iniciar a sua retirada com a ajuda da jovem.
Os seios arredondados da moça saltaram livremente e a juíza os agarrou,
automaticamente, já com a sua respiração entrecortada...
__ Ai, que corpo gostoso... __ Sussurrou Stela, totalmente
excitada.
A jovem levantou os seus braços e puxou a juíza pelo pescoço
para mais um beijo, deixando os seus seios totalmente livres para que a
amante se apossasse deles como quisesse, e foi exatamente o que a mulher
fez, massageou-os e manipulou os seus mamilos até se fartar. Em seguida,
arrastou uma de suas mãos pelo abdome da moça até chegar ao seu sexo,
primeiro alisando-o por cima do tecido da calcinha, depois enfiou os dedos
por debaixo do pano, alcançando o clitóris e o estimulando, ouvindo a
respiração da moça se alterar.
Lorena desgrudou a sua boca dos lábios da juíza e a abriu,
sentindo os dedos decididos da juíza massageando o seu monte rijo.
__ Stela... __ Murmurou a jovem, sentindo as reações do seu
corpo.
Passado alguns segundos, Lorena resolveu se movimentar para
tirar a própria calcinha, retornando em seguida para a mesma posição
confortável, recostando-se toda no corpo da juíza e abrindo totalmente as
suas pernas flexíveis, deixando o seu sexo livre para a juíza, em um claro
convite para que a mulher a penetrasse, pois estava muito necessitada.
Stela arrastou novamente a sua mão até o sexo da jovem,
massageou mais um pouco o seu clitóris e depois uniu o dedo médio ao
anular para entrar na pequena abertura quente e viscosa de Lorena que
gemeu, fracamente, iniciando um movimento nos quadris, para ir de
encontro às estocadas da juíza...
As duas já estavam acostumadas a se dar prazer, e estavam em um
ponto do relacionamento em que uma sabia do que a outra precisava para
atingir o seu ápice.
As estocadas da mulher eram precisas, determinadas e conduziam
a moça na conquista do seu orgasmo. A jovem não parava de se mexer, indo
sempre de encontro aos dedos da juíza...
Aquela foda deliciosa durou até Lorena contrair todo o seu corpo,
tombar a cabeça para trás e soltar um gemido entrecortado, chegando ao seu
gozo alucinante...
A juíza ainda permaneceu dentro da moça por um tempo,
deslizando os seus dedos pelas paredes do sexo pulsante dela, até que,
vendo-a totalmente relaxada, os retirou, arrastando a sua mão molhada pelo
corpo suado da jovem.
__ Gostosa... __ Sussurrou Stela, ao ouvido da garota entregue,
toda recostada em si que sorriu.
Depois de um tempo, a mulher se movimentou para retirar a sua
própria camisa, desabotoando-a e retirando-a de dentro da calça de linho
que, também foi aberta. Ela queria ficar nua para sentir o corpo quente e
macio de Lorena em sua pele. Não havia nada melhor do que isso em sua
vida.
Após conseguir tirar toda a sua roupa, com a ajuda da jovem, a
juíza finalmente, se deitou e recebeu aquele corpo delicioso que ela amava,
por sobre o seu, elevando o seu estado de excitação. Mais um beijo foi
iniciado e as suas mãos se arrastavam por aquela pele macia e consistente
da moça... O mundo poderia acabar ao seu redor que não se importaria, pois
ela estava toda ali... Corpo... Pensamento e alma. Era o que aquela garota
fazia consigo...
Lorena beijava a amante em baixo de si e teve uma ideia, testar
uma posição que elas ainda não haviam feito. Era um tanto quanto ousada,
mas certamente, seria muito prazeroso para ambas. A jovem tentou
formular a proposta em sua cabeça, mas não conseguiu encontrar palavras
para tal, então, decidida, passou a realizar o seu intento com a ação.
A juíza se encontrava perdida no beijo lânguido que recebia,
quando o sentiu sendo interrompido, abriu os seus olhos e viu a moça se
movimentar para baixo. O quarto estava meio escuro, havia só uma
luminária acessa, mas a mulher pode ver aquela bunda deliciosa se
aproximando do seu rosto e se abrindo toda para si, quase a matando de
taquicardia. Deus! Será que sobreviveria a isso? Pensou Stela, respirando
com dificuldade.
Lorena se estendeu toda sobre o corpo da juíza e se apossou do
clitóris rijo dela, chupando-o com gosto, esperando que sua amante fizesse
o mesmo consigo. É óbvio que ela não se decepcionou, pois sentiu a sua
bunda senso agarrada com força e o seu sexo sendo abocanhado pela
mulher esfomeada em baixo de si...
Que delícia! Pensava a juíza, chupando com vontade, o sexo da
moça e sentindo ao mesmo tempo, a língua quente dela, lambendo,
massageando e estimulando o seu clitóris com perfeição...
As duas mulheres permaneceram ali, naquela deleitosa posição,
até atingirem o gozo que foi quase simultâneo. Em seguida, Lorena se
virou, deitando-se novamente em cima de Stela e a beijou, misturando os
gostos dos sexos das duas, em suas bocas...
Mais uma vez Stela se sentiu agraciada pelos deuses em ter
aquela moça só para si... A cada encontro que elas tinham ela ficava mais
apaixonada e naquela noite específica, se havia ainda algo a ser conquistado
nela pela jovem, ela havia conseguido, pois a juíza encontrava-se
simplesmente, perdida de amor...

...Depois de se satisfazerem plenamente de sexo, na cama de


Lorena, Stela, já na sala do apartamento, próximo à porta de saída, deu mais
um abraço apertado na jovem, se despedindo para ir embora, iniciando mais
um beijo calmo e já saudoso.
__ Eu adorei o nosso encontro! Obrigada por tudo! __ Disse a
juíza, depois de interromper o beijo, mas ainda agarrada à jovem. Soltar
aquele corpo macio, quente e gostoso lhe era muito doloroso, tinha que
admitir.
__ Por que você não dorme aqui e amanhã você vai? __ Sugeriu a
moça, antes de dar mais um beijo breve na boca de Stela. Seria tão gostoso
dormir de conchinha com aquela mulher na sua cama...
__ Eu adoraria, mas melhor não, eu não teria o que dizer para o
Enrico amanhã, ou melhor, hoje, mais tarde! __ Respondeu a juíza, rindo e
consultando o seu relógio de pulso, constatando que já estavam na
madrugada do dia seguinte.
__ E quando você vai conversar com ele sobre a gente? __ Quis
saber a moça, pois para ela, aquilo dependia apenas da decisão de Stela. Ela
havia prometido para si mesma que não iria cobrar nada daquela mulher,
mas naquele momento, depois de mais um encontro perfeito, foi inevitável.
__ Eu estou esperando o momento certo!
A juíza aguardava ansiosa, o seu filho lhe apresentar outra
namorada para ela enfim, revelar a ele o seu relacionamento com Lorena, só
que esse dia ainda não havia chegado.
__ Tá bom então! __ Disse a jovem, meio impaciente. Como ela
já havia se revelado à família, então não via mais motivo para se encontrar
secretamente com Stela. Queria um namoro de verdade, com direito a
demonstrações de carinho em público e tudo mais. Queria ir ao cinema ou a
um restaurante junto daquela mulher. Queria apresenta-la à sua família e
aos amigos como sua namorada, mas quando iria poder fazer aquilo?
__ O que foi? __ Perguntou a juíza notando a carinha meio
insatisfeita de Lorena, acariciando o seu belo rosto de pele macia.
__ Eu prometi não te cobrar nada, mas sinceramente, eu acho que
você tá adiando essa conversa porque não está tendo coragem de enfrentar o
Enrico!
__ Não é isso! Eu só quero ter a certeza de que o meu filho não
sente mais nada por você, porque eu não quero machuca-lo de jeito
nenhum. Me entenda!
__ Tá bom, Stela! Boa noite! __ Falou a moça meio que se
esquivando do abraço da mulher. Mais uma vez Stela estava priorizando os
sentimentos do filho em detrimento dos seus. Era inaceitável aquela
situação em seu ponto de vista.
__ Eu não estou te enrolando, por favor, me compreenda! __
Disse a juíza, tentando dar continuidade aos carinhos que fazia na moça que
tentava livrar-se de suas mãos.
__ Tá bom, boa noite! __ Falou mais uma vez Lorena, abrindo a
porta para a mulher sair do seu apartamento, com uma fisionomia nada
amigável.
Stela olhou para a porta aberta, depois para a jovem e, com o
coração faltando um pedaço, se encaminhou para a saída para enfim, ir
embora, mas não sem antes dar um beijo breve, não correspondido, na boca
linda da garota.
__ Boa noite!... __ Sussurrou a juíza antes de partir.
Lorena fechou a porta, furiosa. Como Stela podia ser tão covarde
daquela forma? De braços cruzados, caminhou até a cozinha para tomar um
copo de água. Enquanto se hidratava, entre um gole e outro ela meneava a
cabeça negativamente. Quando Stela iria assumir-se diante do filho e de
todos? Será que as duas iriam ficar naquela situação degradante de
encontros secretos para sempre? Perguntava-se a jovem, indignada...

...A juíza dirigia, de volta para casa, sentindo o cheiro de Lorena


impregnado em suas roupas e em toda a sua pele, reconstituindo cada
momento, deliciando-se com as suas memórias, mas ao mesmo tempo
preocupada, não queria perder aquela garota de forma alguma, pois estava
perdidamente apaixonada por ela, isso era um fato.
Como iria resolver aquela questão? Como iria contar para Enrico
que ela estava tendo um relacionamento com a sua ex-namorada? O seu
filho nem mesmo sabia da sua orientação sexual!... Stela tinha a sensação
de que estava em um beco sem saída, mas ficar sem Lorena não era uma
opção...

***
Capítulo 19

__ Bom dia Enrico! __ Cumprimentou Stela o seu filho, assim que o


viu entrar na cozinha.
__ Bom dia mãe! __ Respondeu o jovem, caminhando até a
mulher para dar-lhe um beijo no alto da cabeça, depois foi até à geladeira
para abri-la, pegar uma jarra de suco e depositá-la por sobre a mesa.
__ E então, você saiu ontem... Está se encontrando com alguma
garota? __ Perguntou a mulher, antes de tomar mais um gole do seu
saboroso café.
Naquela manhã, a juíza se levantou determinada a resolver a sua
situação junto ao Enrico, mas antes, ela precisava sondar como estava a
vida amorosa dele com o fim de estudar a melhor opção para entrar na
difícil e inevitável conversa que teria que ter com o filho.
__ Não, só “pegando” algumas por aí! __ Respondeu o rapaz
tranquilamente, passando uma geleia de uvas em sua torrada integral.
__ E o coração, está bem? Não está atraído por nenhuma moça
em especial?
__ Eu não estou interessado em ninguém em especial!
__ Ah é? Nenhuma garota ainda conseguiu fisgar o seu coração?
__ Conseguiu, só que ela não me quis mais!... Eu... Ainda penso
muito na Lorena! __ Declarou o jovem, um pouco embaraçado. Era difícil
para ele admitir que ainda trazia a sua ex-namorada na cabeça, depois de
tanto tempo.
Stela levou um baque no coração ao ouvir o que o seu filho
acabara de dizer. Ela não esperava por aquilo! Na verdade ela esperava
ouvir dele que estava livre, que estava ficando com algumas garotas,
experimentando ou, na melhor das hipóteses, que ele estava se amarrando
em outra jovem.
__ Enrico, mas... Você não acha que tem que superar a Lorena?
Até porque, como ela mesmo disse, o problema não estava com você e sim
com ela. Já parou pra pensar que talvez ela tenha interesse em... Outro tipo
de pessoa? Não sei... O que eu estou querendo te dizer é que, você não pode
ficar preso a vida toda a uma moça que não te quer, entende? __ Stela
falava com cautela, pois o terreno ali era pedregoso, ela sabia.
__ É claro que eu entendo mãe! Eu estou tentando esquece-la,
mas ainda não consegui! Ela é uma garota especial... Inteligente, decidida...
Tão completa!... Não é fácil encontrar alguém que a substitua. Está sendo
difícil pra mim, pode acreditar! __ Enrico se abria totalmente para a sua
mãe que era também, sua melhor amiga.
__ Meu filho, você é um rapaz tão incrível! Você merece uma
moça que te ame de verdade. Você tem que vencer isso, o mais rápido
possível. Não perca o seu tempo! __ Disse Stela, alcançando uma das mãos
de Enrico e passando a afaga-la, carinhosamente.
__ Por que você está falando assim comigo mãe? Por acaso você
viu Lorena com outro homem, é isso? __ Perguntou o jovem, desconfiado,
pois a sua mãe não era de ficar se metendo muito em seus assuntos
amorosos.
__ Não filho, não é isso, é que você é um rapaz tão bonito, tão
estudioso, tão especial... Você merece ser muito amado, é isso!
Enrico sorriu, agarrou a mão de sua genitora e a beijou,
ternamente, antes de dizer:
__ Obrigado mãe, mas é que a Lorena significou muito pra mim.
Eu não cheguei a te contar, mas... Eu tinha planos de me casar com ela. Eu
estava olhando até as alianças já. A minha intenção era pedi-la em
casamento, assim que eu voltasse de Brasília, mas infelizmente, ela
terminou tudo, de uma hora pra outra...
Stela ouvia o que Enrico dizia sentindo as suas forças se
esvaírem, porque constatava que jamais poderia revelar o seu caso com
Lorena para ele. Era-lhe impossível! Não podia e não queria ferir o seu
próprio filho que amava tanto...
Por que a sua vida tinha que ser assim, tão difícil? Pensava a
juíza. Ela estava apaixonada pela única mulher no mundo que jamais
poderia estar! Ela e o seu único filho estavam apaixonados pela mesma
mulher. Como isso pôde acontecer? Que peça era aquela que o destino lhe
pregara?...
...Alguns dias se passaram sem que Lorena fizesse ao menos uma
ligação para Stela, ela não queria ficar correndo atrás de uma mulher que
não tinha coragem de se assumir como lésbica e nem tão pouco, coragem
para assumi-la como namorada, ela queria um relacionamento de verdade.
Não fazia mais sentido para aquela jovem ficar se encontrando
secretamente com uma mulher como se elas estivessem cometendo um
crime, pois os seus pais já sabiam da sua orientação sexual e eles não a
renegaram, por isso mesmo então, o resto do mundo também teria que
aceita-la.
Mas quando Lorena pensava em sair para conhecer outra mulher
que fosse assumida e com ela, pudesse viver um relacionamento de
verdade, ela pensava em Stela e no quanto tudo era perfeito quando estava
ao seu lado... Tudo fazia mais sentido... A letra de uma canção ficava mais
profunda... Um filme ficava mais significativo... O vinho ficava mais
saboroso... Até a comida ficava mais gostosa...
__ Ei, já tá pronta? __ Perguntou Léo todo “embecado”, pois eles
haviam planejado sair para conhecer gente nova, esse era o plano para
aquele sábado à noite.
Lorena estava toda arrumada e perfumada para sair com o amigo,
mas a sua vontade era de encontrar Stela. Sentia-se uma amaldiçoada por
isso, pois queria estar livre para conhecer uma moça, agora que tinha se
resolvido sobre a sua orientação sexual e se via livre da sua infame
heterossexualidade compulsória, só que simplesmente não conseguia, pois a
sua cabeça estava na juíza.
__ Desculpa Léo, mas acho que eu não vou!
__ Lorena!... Que isso mulher! Seu caso é mais sério que eu
pensava!... __ Falou Leonardo, espantado com o estado apaixonado da
amiga.
__ Eu posso até sair com você Léo, mas eu vou estar presente só
de corpo, eu me conheço! __ Disse a jovem, abrindo os seus braços.
__ Você vai ligar pra ela, né?
__ Eu não estou querendo fazer isso porque eu quero fazer uma
pressão na Stela. Ela tem que sair daquele armário ridículo dela!
__ Acho que você não devia fazer isso Lorena. A gente não deve
pressionar ninguém pra sair do armário, cada um tem o seu tempo!...
...Após ver o seu amigo sair de casa, Lorena pegou o seu telefone
e ligou para Stela:
__ Alô!...

...Assim que viu o filho sair de casa naquela noite, Stela foi para o
seu quarto curtir a sua solidão desconfortável. Havia já, alguns dias que
Lorena não dava sinal de vida, e ela não se sentia confiante em ligar para a
jovem, ainda se lembrava da forma como foi colocada para fora do seu
apartamento, no último encontro. A última coisa que aquela mulher queria
era ser um incômodo na vida daquela moça.
E também tinha o fator Enrico. Stela não havia conseguido contar
para o filho que tinha um relacionamento com a sua ex-namorada, portanto,
não havia conseguido cumprir a sua árdua tarefa, por isso, não se via no
direito de ligar para Lorena, preferia deixar que a iniciativa fosse dela,
assim não poderia ser acusada de estar empatando a vida da moça, então ela
estava ali, no seu quarto, curtindo a sua solidão quando o telefone tocou
provocando um baque no coração da juíza que se levantou rapidamente e
pegou o aparelho para ver na sua tela a foto da linda jovem que tanto
amava.
__ Alô, Lorena?
__ Stela, eu... Queria te ver...

...Passados uns trinta minutos, a campainha do apartamento de


Lorena tocou. A jovem caminhou até próximo à porta, observou pelo olho
mágico, viu que era a juíza e abriu.
__ Oi Stela! __ Disse a moça, assim que abriu a porta do seu
apartamento.
__ Oi Lorena! __ Falou a mulher, estudando a face da jovem,
tentando perceber, pela observação, o estado de espírito dela. Depois desceu
os seus olhos pelo corpo da moça, vendo-a toda produzida. Lorena parecia
estar pronta para ir a uma boate. Ela estava ainda mais linda, se é que era
possível!
__ Entra!
A juíza entrou, a jovem fechou a porta e a convidou para se sentar
em uma das poltronas daquela pequena sala. Stela se sentou, esperando o
pior, pois Lorena estava toda arrumada, pronta para sair e a chamou ali,
certamente para lhe avisar que a “fila iria andar”, que ela partiria para outra
situação menos complicada, o que seria totalmente compreensível,
doloroso, mas compreensível, pensava a mulher.
__ Stela, eu estava pronta pra sair com o Léo. A gente havia
combinado de ir a uma boate LGBT, porque eu queria conhecer outra
pessoa... Uma namorada com quem eu pudesse sair nas noites... Uma
mulher bacana que eu pudesse apresentar aos meus pais... Esse tipo de
coisa!
__ Tudo bem Lorena! Você é jovem ainda, tem todo direito. __
Disse apenas a juíza, meneando a cabeça positivamente, sentindo um
buraco se abrir em seu peito, mas estava determinada a não ser um
empecilho na vida daquela moça. Deixaria ela ir...
Lorena se sentiu incomodada com a postura passiva de Stela, mas
continuou:
__ Só que eu... Não consegui! Por que eu descobri... Que eu
queria estar com você...
A jovem falava e se emocionava, pois não tinha como mais negar,
estava apaixonada por Stela, porque era com aquela mulher que ela queria
estar. Não sabia se a juíza era o melhor para a sua vida, mas era ela que o
seu coração queria...
Stela observava a linda jovem a sua frente e podia perceber o seu
dilema. Podia ver nela o quanto difícil estava sendo tudo aquilo para ela,
então resolveu ajuda-la.
__ Lorena, eu não sou o melhor para a sua vida! O melhor pra
você é se relacionar com alguém da sua idade, assim vocês poderiam viver
cada etapa de suas vidas de forma correta, como deve ser.
__ Mas é você que eu quero... É em você que eu penso... __ Disse
a jovem, sentindo algumas lágrimas rolando em sua face. Ela não sabia se
chorava por Stela ou pela difícil situação em que se encontrava.
__ Lorena, eu te aconselho a sair, conhecer outras pessoas, aí você
verá que o mundo é cheio de possibilidades... Você é linda garota! Pode ter
quem você quiser... O mundo te pertence, viva a sua vida plenamente...
Stela terminou de falar e se levantou para caminhar até a porta,
ela queria sair daquele apartamento e esquecer que Lorena existia, era
melhor pra todo mundo! Melhor para a moça, melhor para o seu filho e
melhor para si mesmo.
__ Stela! Por que você tá desistindo da gente assim? __ Falou
Lorena, depois de se levantar da poltrona bruscamente. Agora ela chorava,
sem reservas.
A juíza parou de caminhar, virou-se para a jovem e, emocionada,
disse:
__ Lorena eu não posso te dar o que você quer!... Você quer que
eu converse com o Enrico e revele a ele o que nós temos para assim, eu
poder me assumir perante a sociedade, mas eu simplesmente não consigo,
sabe por quê? Porque eu descobri que ele ainda te ama!... O destino me
pregou uma peça, pois eu e o meu próprio filho... Amamos a mesma
mulher!...
Nesse momento, a juíza sentiu as suas lágrimas descerem por sua
face e ela tapou a boca com uma de suas mãos, se sentindo totalmente
impotente diante da situação.
__ Stela, só que você está se esquecendo de uma coisa... Dos
meus sentimentos! O Enrico terá que entender que é você que eu quero!...
Lorena se aproximou de Stela, contornou o seu rosto com as mãos
e, chorando, disse:
__ Eu te amo Stela... Fica comigo...
As duas mulheres se abraçaram, sentindo o peso do mundo nas
costas... Elas se queriam, muito, mas sabiam que teriam que lutar muitas
batalhas para poderem viver aquele amor...

***
3º Movimento
Capítulo 20

Stela e Lorena continuaram a se ver, não havia meios delas se


separarem. Elas passaram a se encontrar no apartamento da jovem em todos
os fins de semana e aquele era mais um.
As duas mulheres estavam com os seus corpos nus, entrelaçados,
em cima daquela cama e se beijavam calmamente depois de mais uma
maratona de sexo, quando a juíza desgrudou os lábios da boca quente e
macia da moça, olhou em seu relógio e disse:
__ Eu tenho que ir meu amor. Amanhã eu precisarei acordar bem
cedo para o trabalho.
__ Fica mais um pouco, não está tão tarde assim! Eu também terei
de acordar cedo amanhã, o meu ônibus passa às sete e meia em ponto! __ A
jovem buscou a boca da amante para iniciar mais um beijo lento.
__ Por que você anda de ônibus? __ Perguntou a mulher após
interromper o beijo.
__ Por que é mais barato, ora!
__ Você deveria tirar uma carteira de motorista, assim não
precisaria andar de ônibus.
__ Eu já tenho a minha carteira, só não tenho o meu carro ainda.
Stela afastava uma fina mecha dos cabelos de Lorena, que havia
grudado na pele suada do seu rosto, quando teve uma ideia.
__ Por que não fazemos assim, eu passo aqui de manhã e te dou
uma carona, todos os dias e à tarde, eu te pego lá em frente ao prédio onde
você faz o seu estágio e te deixo aqui novamente, o que acha?
__ Ah não Stela, eu não quero te dar esse trabalho!
__ Não é trabalho nenhum, será a minha desculpa perfeita para te
ver todos os dias! __ A juíza fitava a jovem com os seus olhos cor de mel
apaixonados, feliz por ter uma chance de ajuda-la.
__ Tem certeza que não vai ser incômodo pra você?
__ Certeza absoluta! __ Sussurrou Stela, antes de capturar aquela
boca linda e macia da moça, mais uma vez...
...E assim elas fizeram. Todos os dias pela manhã, Stela dirigia até
a casa de Lorena para apanha-la e levava-la até ao prédio onde funcionava a
clínica do Dr. Willian.
À tarde, antes de se retirar do fórum, a mulher ligava para a moça
a avisando que estava saindo do trabalho. Lorena então descia e a esperava
próximo ao prédio em que fazia o seu estágio. Assim que a juíza parava o
seu sedan preto na lateral daquela avenida pouco movimentada, a jovem
entrava no carro e era levada de volta até o seu apartamento...

...Passado alguns dias em que aquelas mulheres permaneciam


naquele arranjo funcional, pretexto perfeito para elas se verem todos os
dias, era uma sexta-feira, quando Lorena recebeu um telefonema de sua
mãe, pedindo a ela que fosse para casa naquele fim de semana, pois a
família iria se reunir em festa mais uma vez. O seu irmão, Lucas, o jovem
médico iniciante na carreira, resolvera ficar noivo de sua namorada que
estava grávida...

...Enrico era um rapaz extremamente cuidadoso com o seu corpo.


Era daqueles jovens “ratos de academia”, não era adepto de nenhum tipo de
droga, bebia muito pouco, só em ocasiões especiais e era muito ligado em
uma alimentação saudável complementada com alguns suplementos
básicos, indicados pelo seu nutricionista.
Naquele dia específico, o jovem saía de uma farmácia carregando
algumas sacolas de produtos suplementares quando avistou, do outro lado
da avenida, a sua ex-namorada, Lorena, a linda jovem que havia preterido o
seu amor, abrindo-lhe um “buraco” no peito. Não conseguiu simplesmente
continuar andando, parou para observá-la, achando-a ainda mais bonita.
Lorena estava de cabeça baixa, olhando para a tela do seu celular
e não notou a presença de Enrico, que continuava a observá-la do outro lado
da avenida, paralisado.
O rapaz olhava para a ex-namorada, analisando as reações dos
seus próprios órgãos internos e constatava que aquela jovem ainda mexia
muito consigo. Mas a sua visão foi interceptada por um sedan preto que
dava seta e encostava lentamente, do outro lado da avenida. Enrico olhou
para a janela do motorista e viu que era a sua mãe, quando ia levantar uma
de suas mãos para acenar em sua direção, percebeu que Lorena descia as
escadas para abrir a porta daquele carro e entrar.
O veículo partiu logo em seguida deixando para trás Enrico, se
perguntando por que a sua ex-namorada havia entrado no carro da sua mãe?
Sem entender nada, mas curioso para saber que assunto a sua mãe
teria com Lorena, o jovem correu até ao seu carro, o colocou em
movimento rapidamente e contornou um dos canteiros da avenida para
segui-las. Teria que entender aquela história de todas as maneiras! Pensava
o rapaz, confuso...

...Dentro do carro preto, Stela dirigia tranquilamente, levando


consigo a sua amada garota ao som de Men I Trust, uma deliciosa banda de
rock alternativo canadense, outra das preferidas de Lorena. Aquela mulher
estava tomada pela jovem em todos os sentidos que se podia imaginar e não
conseguia mais ouvir os seus clássicos, não porque não gostasse mais deles,
mas é que ela sentia sede daquela moça, de todas as formas imagináveis e o
seu som a mantinha dentro de si, percorrendo as suas sinapses,
deliciosamente.
__ Então você resolveu mesmo ir para o noivado do seu irmão?
__ Stela já sentia saudade da moça, antes mesmo dela viajar para a sua
cidade natal.
__ Eu tenho que ir, eu não posso deixar o meu único irmão
sozinho nessa história! __ Divertia-se a jovem.
__ Mas ele vai se casar só porque a namorada dele está grávida?
__ Eu quero acreditar que ele gosta dela, não é possível!
__ Enquanto isso eu fico aqui, jogada as traças! __ Como era
difícil para a juíza, ficar longe de Lorena, constatava ela.
__ Por que você não vem comigo? Aí a gente aproveita o ensejo e
eu te apresento aos meus pais!
__ Ainda não! Não podemos atropelar as coisas...
__ Primeiro o Enrico, já sei! __ A jovem respirou fundo, revirou
os olhos e depois voltou-se para a janela, olhando para a cidade que passava
pelos seus olhos. Por mais que tentasse, não conseguia engolir aquela
situação ridícula em que elas estavam já, ha quase um ano.
__ Vamos começar de novo? __ Perguntou Stela, sentindo a
pressão da moça, mais uma vez.
__ Não!...
Quando chegaram em frente ao prédio de Lorena, a juíza
encostou o carro para a jovem descer, mas ao invés disso, ela propôs:
__ Sobe um pouquinho pra gente se despedir!
__ Agora?
__ Eu vou viajar daqui a pouco Stela e vou ficar um longo final
de semana sem ti ver!
A mulher fitou a moça e pensou no quanto ela era irresistível.
Não havia possibilidade de negar um pedido daqueles àquela jovem, não é?
Pensando nisso, a mulher desligou o carro, puxou o freio de mão e se
movimentou para apear, já sentindo um formigamento em seu sexo. Ela era
assim, ficava excitada só de pensar que iria fazer amor com Lorena...

...Ha uns cinquenta metros dali, Enrico observava a


movimentação com acuro, não quis se aproximar, teve receio de
interromper alguma coisa. Em sua cabeça, a sua mãe tentava convencer
Lorena a reatar o namoro consigo, o que seria um motivo de discussão entre
os dois, pois ele já era um homem e aquilo era um assunto seu e de mais
ninguém!
Quando o rapaz viu que a mãe desceu do carro e entrou com a
moça pela portaria do prédio onde ela morava, resolveu aguardar um pouco,
com os pensamentos emaranhados. O que dona Stela iria fazer no
apartamento de sua ex-namorada? Perguntava-se o jovem confuso...

...Dentro do quarto de Lorena, as duas mulheres se despiam


rapidamente para se despedirem, se entregando aos seus instintos mais
primitivos e naturais. Os corpos das duas se desejavam com tanta vontade
que parecia que elas queriam se fundir em uma só entidade.
As respirações das amantes eram ofegantes e os estalidos dos
beijos eram audíveis por todo o apartamento, tamanho o desejo que elas
sentiam...
...Stela e Lorena, agora deitadas e emaranhadas em cima da cama,
se beijavam deliciosamente, em uma total entrega, como se não houvesse
mais ninguém no mundo, apenas elas. A juíza sentia o sabor gostoso da
língua da moça em sua boca quando ouviu o som da campainha. Ela
interrompeu o que estava fazendo e, depois de respirar fundo, perguntou:
__ Está esperando alguém?
__ Não! __ Respondeu a moça em um sopro, recobrando um
pouco a sua razão que havia se esvaído ha algum tempo.
Elas aguardaram um pouco e depois retomaram o que estava
fazendo, reiniciando o beijo macio e profundo... Mas quando começavam a
se transportar novamente, para o estado de excitação que elas sempre
alcançavam, a campainha tocou novamente e de forma insistente,
interrompendo-as mais uma vez.
__ Deve ser o Léo que esqueceu a chave, aquele descabeçado! __
Reclamou a jovem se erguendo e pegando a camisa de Stela para vesti-la.
A juíza riu e enfiou as duas mãos em baixo da nuca, relaxando o
seu corpo nu estendido na cama. Ela observava a moça vestida com a sua
camisa branca e reparava em suas pernas torneadas. Elas não eram muito
grossas, eram elegantes, lindas... Como gostava de beija-las...
__ Eu vou lá abrir pra ele, me espera...
Lorena saiu do quarto, fechou a porta e caminhou até a sala para
atender a campainha insistente...

...Enrico aguardava no carro, a sua mãe sair do prédio de Lorena e


enquanto esperava, a sua cabeça tentava juntar as peças daquele quebra-
cabeça. Ele procurava unir as informações que tinha e começava a imaginar
que havia algo na relação daquelas duas mulheres tão importantes na sua
vida, mas não conseguia amarrar todas as pontas soltas.
Depois de uns bons minutos de espera, ele resolveu ir até o
apartamento de Lorena, pois queria entender o porquê da sua mãe estar lá,
dentro da casa da sua ex-namorada. O que elas estariam fazendo? Ele se
perguntava com receio de saber a resposta.
Quando chegou ao apartamento, Enrico bateu a campainha, mas
não ouviu nada, depois de um tempo, bateu novamente, dessa vez mais
insistente e após alguns segundos, pode ouvir alguma movimentação e o
barulho das chaves girando. Quando a porta se abriu, o jovem avistou
Lorena vestida apenas com uma camisa branca que lhe era bem familiar.
Sentiu, imediatamente, o seu coração se acelerar e o estômago se revirar...
__ Enrico? O que está fazendo aqui? __ Lorena tomou um susto
quando abriu a porta e deu de cara com a última pessoa que ela pensava em
ver naquele momento. Ela estava tão convicta de que era o seu amigo Léo
que havia esquecido a chave que sequer conferiu pelo olho mágico.
O jovem não conseguiu falar nada, estava paralisado,
conseguindo enfim encaixar todas as peças do seu complicado quebra-
cabeça. Os seus olhos estavam parados, vermelhos, vendo Lorena vestida
apenas com a camisa branca de sua mãe que provavelmente, estaria no
quarto, sem aquela peça... Nua... Pensando nisso, ele deu um passo para
frente, pois queria ver tudo para acreditar que aquilo realmente estava
acontecendo.
__ Não Enrico, você não vai entrar! __ Lorena se postou na frente
do rapaz para contê-lo, pois queria proteger Stela, queria livrá-la daquele
dissabor.
__ Sai da minha frente! __ A voz do jovem saiu baixa, sofrida,
estava se sentindo traído e queria olhar nos olhos daquela que havia lhe
dado uma rasteira, sua própria mãe.
__ Não Enrico, você não vai lá, ela não merece isso! __ Lorena
espalmou as duas mãos no peito do rapaz alterado, que avançava para
dentro do seu apartamento, paulatinamente.
__ Sai!
Enrico era forte, apenas pegou nos ombros da moça que tentava
lhe conter, a removeu para o lado, deu alguns passos até a porta do quarto e
a abriu, avistando a sua mãe nua, em cima da cama de Lorena.
Stela olhou para Enrico, puxou o ar pela boca aberta, esbugalhou
os olhos e agarrou o lençol para se cobrir.
__ Enrico! __ A mulher via o seu coração sair pela boca e a sua
vergonha infinita foi imediata.
O jovem não conseguiu falar nada, apenas sentiu ódio pela traição
da mulher mais importante em sua vida, a sua mãe. Ele abriu a boca,
balançou a cabeça negativamente, revelando a sua imensa decepção. Fora
pego de surpresa, jamais imaginou passar por uma situação horrível
daquelas. Virou-se e foi embora do apartamento. Queria sair dali, queria
esquecer aquela cena deplorável, queria esquecer que aquelas duas pessoas
existiam...
Depois de ver Enrico saindo apressadamente do seu apartamento,
Lorena caminhou até o quarto e pode ver a vergonha estampada em todo o
corpo daquela mulher encolhida, agarrada ao lençol que lhe cobria
parcialmente.
__ Stela!
A juíza chorava com a expressão de decepção do seu filho colada
em seu cérebro em convulsão. Deus, tudo o que ela não queria, aconteceu,
Enrico descobriu o seu caso com Lorena da pior forma possível! E agora,
como ela iria consertar aquilo? Não havia reparo! Era uma desgraçada!
Traíra o seu único filho!
__ Stela, por favor! Olha pra mim... __ A jovem se ajoelhou no
colchão, próximo à juíza e tentava fazê-la voltar do seu estado lastimável de
derrota e sofrimento. Acariciou os cabelos da mulher e depois a abraçou,
aninhando-a em seu peito, teria que ser o seu apoio, não a deixaria sozinha
naquela situação de forma alguma.
__ O que foi que eu fiz... O meu filho nunca vai me perdoar... Ele
vai me odiar pra sempre... __ A mulher gemia as palavras que saiam em
meio aos soluços do seu choro desesperado.
__ Stela, o seu filho é adulto o suficiente para entender isso, por
favor! Ele vai ter que aceitar que foi uma escolha minha. Eu que escolhi
ficar com você. Ninguém roubou ninguém de ninguém, nós somos livres
pra ficar com quem a gente quiser!...
__ Eu vou atrás dele... Eu preciso pedir perdão... __ Parecia que a
juíza não estava ouvindo nenhuma palavra do que a moça dizia, a única
coisa que ela tinha em sua cabeça era a imagem de decepção estampada na
face do seu filho.
Stela se moveu para levantar-se e se vestir, ela precisava ir atrás
do seu filho.
__ Me dá minha camisa! __ Pediu a mulher com o seu rosto
desfigurado, molhado pelas lágrimas que vertiam em seus olhos. Ela havia
se vestido toda, mas faltava-lhe uma peça que estava cobrindo o corpo da
jovem.
Lorena retirou a camisa e a entregou a Stela, não se importando
com a sua nudez, queria apenas que ela a ouvisse. Para ela aquilo não era
uma traição e sim, era um relacionamento entre duas pessoas livres, adultas.
O único detalhe é que ela havia namorado o filho da mulher com quem
estava se relacionando e isso não fazia delas duas traidoras, não em seu
modo de ver as coisas.
__ Stela não vai dirigir assim, por favor! Acalme-se primeiro,
você está muito alterada!
__ Eu preciso ir...
A juíza já se encaminhava para porta de saída quando teve o seu
braço agarrado pela jovem, obrigando-a a se virar com os olhos lacrimados
e a face transtornada.
__ Stela, eu vou estar aqui, não vou mais viajar. Depois você me
liga, por favor!
Lorena abraçou a mulher com força, tentando passar a mensagem
a ela que enfrentariam aquela batalha juntas, depois a soltou e a viu sair
apressadamente pela porta em busca do filho...
Stela dirigiu em alta velocidade até o seu apartamento, não sabia
o que o que falaria para Enrico, mas teria que conseguir o seu perdão de
toda forma. Quando chegou ao seu prédio, viu o carro do filho na garagem,
ocupando a sua costumeira vaga o que deu a certeza para a mulher de que
ele estaria lá em cima, no apartamento.
Depois de subir pelo elevador para entrar em casa, a juíza
procurou pelo filho na cozinha, mas não o encontrou, foi então até a porta
do seu quarto deu duas batidas e abriu para vê-lo sentado na cama com a
cabeça baixa entre as mãos, estampando o seu estado de desordem mental
que deveria estar convulsionando dentro de si.
__ Enrico, me perdoa meu filho! __ A mulher estava transtornada,
cheia de vergonha e remorso por ter traído o próprio filho de forma tão vil.
__ Perdoar? Sabe qual a pergunta que eu estou me fazendo mãe?
Naquela semana que eu fui pra Brasília, porque acredito que dever ser ali
que começou tudo, qual foi o momento exato que você olhou pra Lorena, a
namorada do seu próprio filho e pensou, “vou comê-la!”
Enrico falava expressando o nojo que estava sentindo pela sua
própria mãe naquele momento. Ele levantou os seus olhos e viu uma mulher
depravada, repugnante e teve ódio dela. A imagem obscena dela nua, sobre
a cama de Lorena, jamais iria sair de sua cabeça, pelo resto de sua vida,
tinha a certeza disso. Naquele instante o seu estômago revirou mais uma
vez e ele teve vontade de vomitar.
__ Eu nunca pensei isso meu filho... Eu não sou uma pervertida!...
__ Stela chorava copiosamente e se mantinha de pé diante do filho,
encolhida , cheia de culpa, com as duas mãos postas na frente de sua boca.
__ Pra você eu sou um palhaço, um idiota, não é? Enquanto eu
estava viajando, estudando, você estava aqui, comendo a minha namorada!
Se fartando! Você é uma pervertida sim, uma indecente e uma mentirosa,
porque aquele curso naquela tal faculdade que você dava aula, nunca
existiu! __ O jovem ia juntando as peças e ficava cada vez mais horrorizado
e chegava a conclusão que a sua mãe lhe era uma estranha.
__ Filho, eu não sou uma mentirosa... Tudo o que eu queria era
contar pra você, mas tinha medo do que iria pensar de mim... Eu errei, eu
sei, mas foi para te poupar... Me perdoa, por favor!...
__ Me poupar? Você sabia dos meus sentimentos por Lorena
porque eu te contei, e sabe por que eu te contei? Porque eu achava que você
era a minha melhor amiga, mas eu sou um idiota por não perceber que eu
estava lidando com a minha pior inimiga!
Se sentindo o mais tolo dos mortais, Enrico se levantou, foi até o
guarda-roupa para tirar a sua mala e joga-la aberta em cima do colchão,
pois iria embora daquela casa, não iria morar ao lado da sua pior inimiga.
__ O que está fazendo meu filho?
__ Eu vou embora daqui! Eu não posso morar com alguém que
diz que me ama, mas me faz de otário pelas costas! Você é a minha maior
decepção mãe! Quer saber? Você deveria ter me abortado, assim eu não
precisaria passar por esse desgosto! __ Naquele momento o jovem se
entregou ao choro, a sua decepção era imensa, mas falar aquelas coisas para
a sua mãe lhe doía no fundo da sua alma.
__ Filho, por favor, não vá embora... Eu te amo Enrico, me
perdoa! __ A mulher não conseguia ter argumentos, apenas queria o perdão
do seu filho, mas o via enchendo a mala de roupas apressadamente, para ir
embora.
Enrico terminou de jogar uma pequena parte de suas coisas na
mala, fechou-a e se retirou do quarto com a sua mãe desesperada atrás,
depois ele passou pela porta de saída, bateu-a atrás de si produzindo um
estrondo e se foi do apartamento, deixando a mulher chorando
copiosamente, caída de joelhos pelo chão, vivenciando mais um episódio do
seu penoso calvário... Mortífero...
***
Capítulo 21

Lorena não viajou para a casa dos seus pais naquele fim de semana,
não conseguiu deixar Stela sozinha diante do problema que elas estavam
enfrentando. No outro dia, ela foi até ao apartamento da juíza para
conversar com ela e saber como estavam as coisas, mas não foi atendida,
apesar de ter batido a campainha várias vezes, insistentemente. Voltou para
casa pensando no que poderia fazer para reverter aquela difícil situação.
Dentro do apartamento, em seu quarto, jogada na sua cama, lá
estava a mulher, em frangalhos. Ela chorava, chorava e chorava, pois era a
única coisa que podia fazer. O seu único filho amado, havia rompido com
ela drasticamente. Ela jamais teria o seu perdão. Era uma amaldiçoada.
No dia seguinte, Stela ligou para Lúcia, a sua ajudante,
dispensando os seus serviços até segunda ordem, pois ela não queria ver
ninguém. Na segunda-feira, ligou para o fórum alegando que não estava em
condições de trabalhar, não via como seguir com a sua vida normalmente,
no estado em que estava, permaneceu dentro de casa sozinha, sem ninguém,
apenas com o seu imenso sofrimento e angústia.
Naquele dia, pela manhã, depois de ter ficado o domingo inteiro
ligando para Stela e não ser atendida, Lorena retornou ao apartamento dela,
mas novamente ficou no vácuo. Queria tanto ver a juíza, coloca-la em seu
colo, acalentá-la, ajuda-la a passar por aquela situação complicada, mas ela
não lhe dava aquela oportunidade.
Após sair do prédio de Stela, chateada por não ter conseguido vê-
la novamente, Lorena decidiu procurar por Enrico e resolver a questão
diretamente com ele, o seu ex-namorado teria que ouvi-la. A jovem, que
ainda tinha o contato do rapaz, sacou o seu celular e imediatamente ligou
para ele, mas a sua chamada não foi atendida, pelo contrário, foi encerrada.
Quando tentou ligar novamente, viu que tinha sido bloqueada.
A moça guardou o aparelho em sua bolsa, constatando que
resolver a questão com Enrico não iria ser fácil, partiu então, para o campus
universitário, diretamente para a faculdade de direito, onde certamente,
encontraria o rapaz. Chegando lá, procurou por ele na portaria, na secretaria
e nas salas de aula, até que encontrou a sua turma, e foi por um colega que
ela soube que Enrico não estava presente. Insistente, a jovem pediu ao
estudante para ligar para o ex-namorado, mas ele também não foi atendido,
o que a levou a concluir que de fato, o filho era idêntico à mãe, até na forma
de resolver os impasses, pois ambos estavam incomunicáveis.
No outro dia, Lorena fez a mesma coisa, foi até ao apartamento de
Stela, tocou a campainha insistentemente e novamente, não foi atendida,
depois partiu para faculdade de direito na esperança de encontrar Enrico,
mas outra vez, não o encontrou.
No terceiro dia, a moça, que parecia estar presa em um loop
eterno, novamente partiu para a sua difícil missão de encontrar ou a mãe, ou
o filho para tentar resolver aquela difícil questão, porque na verdade, ela se
sentia um pouco culpada por aquela situação, então se via no dever de ser a
protagonista na resolução daquele impasse. No apartamento de Stela, de
novo se deparou com as portas fechadas, mas na universidade, finalmente,
depois de receber a informação do colega, encontrou Enrico na biblioteca,
solitário, ladeado de livros, fazendo uma pesquisa. Ela foi até lá e se sentou
em sua frente, o encarando.
__ O que você quer aqui?
O jovem havia levado um susto quando levantou a cabeça, se
deparando com os olhos castanhos e profundos da moça que tinha
conseguido quebrar o seu coração de todas as maneiras possíveis.
__ Eu estou aqui pra gente conversar Enrico!
__ Eu não tenho nada pra falar com você! __ O rapaz voltou a
olhar para os livros, tentando dar continuidade à sua pesquisa, não queria
falar com aquela moça, queria esquecer que um dia havia conhecido
aquela... Vagabunda.
__ Enrico, essa sua postura é de um bebê imaturo e mimado! Você
parece uma criança chorona porque perdeu o pirulito! Você já é um homem
então acho que você já é adulto o suficiente pra entender que ninguém
rouba ninguém de ninguém! Foi eu que escolhi a sua mãe e não o contrário!
É ela que eu quero, entendeu? Quando você voltou de Brasília a primeira
coisa que eu fiz foi terminar o nosso namoro e sabe por quê? Porque eu
tenho consideração por você! No momento em que aconteceu com a sua
mãe eu tomei essa decisão por que vi que era ela que eu queria e não você!
Dá pra entender isso? __ A jovem falava de forma dura, dando ênfase a
cada uma das palavras pronunciadas, na intenção de se fazer compreendida
de uma só vez.
__ Então foi assim? Você simplesmente disse pra minha mãe, “é
você que eu quero” e ela já caiu na sua cama? __ Como um camicase,
Enrico queria saber dos detalhes, pois assim teria motivo para sofrer um
pouco mais do que já estava sofrendo.
__ É claro que não! O que aconteceu entre nós duas naquela
semana que você estava viajando, foi por um acaso, ninguém planejou nada
Enrico, mas depois que a sua mãe e eu... Ficamos, tudo se tornou muito
claro na minha cabeça. Não era você que eu queria e sim, era ela... Eu
estava passando por um processo de auto análise, eu estava descobrindo a
minha orientação sexual e Stela foi definitiva pra mim nesse processo.
Enrico ouvia as palavras da garota com os olhos vermelhos e as
narinas dilatadas, ele sofria porque em uma só tacada, o destino havia lhe
tirado as duas pessoas mais importantes da sua vida, a sua mãe amada e a
única mulher que havia conseguido chegar ao seu coração, Lorena.
__ Então a minha mãe é homossexual, é isso? __ Perguntou o
jovem, no meio de toda a confusão mental que aquela história lhe causava.
__ A Stela é lésbica Enrico, assim como eu!
A moça afirmava a sua orientação sexual ao seu ex-namorado
sem o menor problema, pelo contrário, sentia até um certo orgulho por ter a
coragem de se assumir de peito aberto.
__ E por que você não me falou a verdade, quando terminou
comigo? __ Perguntou mais uma vez, o jovem com a sua voz sofrida e
enfraquecida.
__ Porque eu não queria passar por cima da sua mãe, porque a
última coisa que ela pensava era em te machucar. A sua mãe te ama muito
Enrico e por causa desse amor, ela não encontrava uma forma de te contar
sobre nós duas, por medo de te ferir.
Naquele instante, o rapaz baixou a cabeça extravasando o seu
choro, lembrando-se de tudo o que tinha falado para a sua mãe, na intenção
de machuca-la e sentiu-se o pior filho do mundo...
De cabeça baixa, vivendo a sua difícil catarse, Enrico lembrou-se
também de uma conversa que havia tido com a sua mãe, há algumas
semanas atrás, onde foi sondado por ela sobre os seus relacionamentos
amorosos. No dia, não entendeu muito bem o porquê de toda aquela
investigação por parte de sua genitora que nunca se metia nesse aspecto de
sua vida, mas naquele momento, descobriu que o que ela estava tentando
fazer era conversar consigo sobre Lorena, só que ela não havia conseguido
levar a cabo o seu intento quando ouviu a sua revelação de que ainda nutria
sentimentos pela moça, o que o fez se sentir ainda pior, se é que era
possível.
Percebendo o sofrimento de Enrico, Lorena tomou as suas mãos e
as afagou por sobre a mesa, no intuito de dar forças ao rapaz que passava
por um momento difícil, tinha que admitir. Não deveria estar sendo fácil
para aquele jovem, descobrir de uma só vez que sua mãe era lésbica e ainda
por cima, mantinha um relacionamento com a sua ex-namorada. Contudo,
ele iria ter que compreender e aceitar, não havia outra alternativa senão,
resignar-se.
__ Enrico, perdoa ela, por favor! Não faz a sua mãe sofrer mais
do que ela já estava sofrendo. Só eu sei o dilema que ela está vivendo desde
que nós iniciamos o nosso relacionamento. Ela queria muito conversar
contigo, estava esperando você arrumar outra namorada pra ter a certeza de
que tudo estava bem, só que esse momento nunca chegava...
__ Eu preciso de um tempo pra digerir tudo isso! __ O jovem
permanecia de cabeça baixa e suas lágrimas saiam sem que ele conseguisse
conte-las.
__ Tudo bem, só que tem um problema, a sua mãe está
incomunicável desde sexta-feira, e hoje já é quarta-feira, ou seja, fazem seis
dias que ela está trancada dentro daquele apartamento e eu estou muito
preocupada... Me ajuda a entrar lá Enrico, por favor!...
O rapaz finalmente levantou a cabeça, fitando Lorena com os seus
olhos cor de mel banhado em lágrimas e pôde sentir a apreensão da moça.
Ele imaginou a sua mãe dentro daquele apartamento sozinha, sofrendo e
teve medo que algo de ruim pudesse ter acontecido com ela, ele não se
perdoaria.
__ Tudo bem, você tem razão... Vamos até lá!
Enrico decidiu-se por seguir o seu coração que estava machucado,
desde que rompera com a sua mãe. Ele simplesmente não conseguia odiá-la,
mas sim, sentia-se culpado por tê-la ferido. Ele vivia uma dubiedade entre o
ódio e a culpa que tiravam todo o seu foco e a sua felicidade. O seu
emocional estava em frangalhos, totalmente desequilibrado, mas naquele
instante descobriu que o seu amor pela mulher que havia se decidido por
coloca-lo no mundo, era muito forte, era incondicional...
O jovem guardou todos os seus pertences na bolsa, se levantou e,
junto com Lorena, caminhou até o estacionamento da faculdade para
pegarem o carro e partirem rumo ao apartamento de Stela.
Lá chegando, ao entrarem pela porta não viram a mulher e nem
ouviram nenhum barulho, o que os deixou amedrontados. Será que Stela
teria a coragem de atentar contra a sua própria vida? Perguntaram-se ao se
entreolharem, mas em seguida, felizmente, viram um trapo de gente chegar
até a sala o que os deixou aliviados e espantados ao mesmo tempo, a juíza
estava com as mesmas roupas daquela fatídica sexta-feira, os seus cabelos
estavam desgrenhados, a sua pele estava sem vida e estava mais magra, o
que revelava o seu estado de inanição. O seu semblante era de sofrimento,
os seus olhos avermelhados e lacrimejados, miravam as duas pessoas mais
importantes da sua vida que enfim, chegavam para salvá-la de si mesmo.
__ Mãe! __ Enrico estava assustado e cheio de culpa vendo a
mulher despedaçada a sua frente. A sua vontade foi de correr e abraça-la,
pois por mais que tenha tentado, não conseguia odiá-la.
Lorena via o sofrimento estampado em Stela, paralisada, com as
duas mãos postas em frente ao nariz e a boca. Teve vontade de ir até ela
para ajuda-la, mas se conteve, porque a vez era de Enrico e não dela.
__ Filho, você me perdoa? __ A voz de Stela saiu fraca e falha,
ela só pensava em ter o perdão do seu filho e em mais nada.
__ Mãe... __ O jovem aproximou-se da mulher, a abraçou e
continuou __ você precisa tomar um banho e comer alguma coisa, olha o
seu estado!
Lorena foi até a cozinha e pegou um copo de água para Stela que
provavelmente, estaria desidratada considerando o aspecto de sua pele que
parecia estar seca. Quando voltou para a sala e o entregou à mulher, a
jovem a viu tomando o líquido com ânsia, tamanha a sede que ela deveria
estar sentindo.
Após sugar toda a água do copo, Stela olhou novamente para o
seu filho e lhe fez a única pergunta cuja a resposta positiva lhe deixaria em
paz em sua vida.
__ Me perdoa meu filho?
__ Eu te perdoo mãe! Está tudo bem... Me perdoa também por ter
falado todas aquelas coisas horríveis pra você... __ Enrico abraçava a
mulher e chorava com o coração cheio de remorso por vê-la naquele estado
lastimável. Ele queria tira-la daquele buraco tenebroso que a havia
colocado.
__ Eu te amo meu filho e só quero o seu bem!...
Lorena assistia a cena linda dos dois e se emocionava com aquele
reencontro. Os dois se amavam muito e ela teria que saber lidar com isso se
quisesse continuar na vida de Stela.
__ Eu sei disso mãe... Eu também te amo e eu também só quero o
seu bem, tá bom!... Agora você tem que tomar um banho e se alimentar,
você está muito fraca, por favor!
O jovem abraçava a mulher e não sentia o tônus muscular
característico dela, fruto de suas atividades físicas diárias, por isso insistia
que ela tomasse um banho e se alimentasse, só assim ela poderia se
recompor.
__ Stela, vai lá, toma um banho e enquanto isso eu faço uma
sopinha pra você, pode ser? __ Propôs Lorena.
__ Tudo bem... Obrigada!... Eu vou tomar um banho.
A juíza se movimentou para virar com a intenção de caminhar até
o seu quarto, mas se sentiu um pouco zonza, só não caiu porque Enrico a
amparou.
__ Enrico, vá com ela, porque eu acho que a sua mãe não está se
sentindo muito bem. __ A vontade de Lorena foi se oferecer para ajuda-la
no banho, mas teve receio de ser mal interpretada pelo jovem que
certamente, ainda digeria o relacionamento das duas.
Enrico acatou a sugestão da moça e foi com a sua mãe até o
quarto. Lá, ele se postou do lado de fora da porta do banheiro e acurou os
ouvidos, preparado para agir caso fosse necessário. Felizmente, tudo correu
bem. Após o revigorante banho, Stela já se sentia melhor. Ela foi até ao
closet, vestiu uma roupa confortável de puro algodão e agradeceu em
mente, Lorena que, com a sua capacidade de diálogo, estava conseguindo
reverter aquela difícil situação entre ela e seu filho.
Ao chegarem à cozinha, viram a jovem terminar de fazer a sopa.
Stela se sentou à cabeceira da mesa, como era de seu costume, para esperar
até que a moça a servisse. Assim que concluiu, Lorena serviu o prato e o
depositou em frente à mulher, sentando-se em uma cadeira próxima, para
observá-la comendo.
A juíza pegou um bocado da sopa, o levou até a boca e sentiu o
caldo saboroso aquecendo o seu coração. Ela então fitou os olhos castanhos,
profundos e generosos da moça e a agradeceu em mente mais uma vez, se
sentindo a mais sortuda das criaturas por ter aquela pessoa maravilhosa em
sua vida. A vontade que teve foi de afagar a mão da jovem que estava sobre
a mesa, mas não conseguiu, pois o seu filho estava ao seu lado e não sabia
como ele reagiria diante de tal ato.
Enrico, sentado em outra cadeira, próximo a Stela, observava a
troca de olhares entre as duas mulheres e conseguiu perceber o quanto elas
se amavam. De repente, como se tivesse tido um clarão de entendimento,
sentiu-se bem e até um pouco protagonista daquela história, pois afinal,
havia sido ele a pessoa que tinha apresentado as duas. Pensando nisso,
sentiu-se feliz, pois ele havia conseguido tirar a sua mãe daquela solidão
eterna na qual ela se encontrava. Solidão inclusive, que o incomodava
profundamente.
O jovem observador e analítico, olhava para as duas mulheres e
via suas armas caindo pelo chão. Como pôde achar que o relacionamento
das duas era algo ofensivo a si? Agora tudo se encaixava perfeitamente em
sua cabeça, pois acabava de descobrir que não havia sido rejeitado por
Lorena, ela apenas não é heterossexual, por isso não o quis e por isso o
trocou por sua mãe. Agora ele entendia perfeitamente porque nunca havia
conseguido se deitar com aquela moça.
Com esse turbilhão de pensamentos conclusivos na cabeça, o
jovem se sentiu aliviado, pois o seu difícil enigma, finalmente havia sido
decifrado, ele não iria ser devorado pela esfinge...

...Assim que Stela acabou de comer o saboroso prato de sopa que


Lorena havia lhe preparado, limpou os seus lábios com o guardanapo
sentindo-se revigorada, olhou para o seu filho e sabia que tinha que expor
para ele tudo o que estava acontecendo entre ela e sua ex-namorada, agora
não tinha como mais recuar.
__ Enrico, eu preciso conversar com você. __ A mulher afagou
uma das mãos do rapaz esperando dele toda a compreensão do mundo
naquela hora difícil.
__ Tudo bem mãe, eu estou aqui pra isso! __ O jovem cobriu a
mão da mulher com a sua, para encorajá-la a falar, queria ouvi-la.
__ Vocês querem que eu saia? __ Perguntou Lorena.
Mãe e filho olharam para a jovem, depois se entreolharam e foi
Enrico que disse:
__ Não precisa sair Lorena. Você faz parte dessa história!
Stela então, começou a falar:
__ Filho, como você já sabe... Lorena e eu temos um...
Relacionamento. Eu queria muito ter te contado antes, mas não tive
coragem. Eu tive medo da sua reação... Tive medo do que você poderia
pensar a meu respeito... E mais uma vez eu te peço perdão, pois quando nós
tivemos o nosso primeiro... Momento, você ainda era o namorado dela e só
Deus sabe o quanto eu me senti culpada por isso... __ Naquele instante,
Stela teve que dar uma pausa, pois viu as suas lágrimas descerem
novamente, o seu sentimento de culpa ainda era imenso. __ Eu me senti
horrível, acredite... Jamais pensei em te trair de alguma forma meu filho,
mas simplesmente aconteceu, como se fosse algo inevitável...
__ Mãe, tá tudo bem! Confesso que quando eu vi você lá, na
cama de Lorena, eu fiquei muito chocado! Eu me senti um... Idiota, traído!
Mas agora eu chego à conclusão que eu não posso me opor ao
relacionamento de vocês duas. Eu não tenho esse direito... Ninguém tem
esse direito! Vocês são livres para amar quem vocês quiserem.
__ Enrico, eu tenho mais uma coisa pra te falar... Eu sou...
Homossexual!... __ A juíza fechou os olhos e baixou a cabeça,
envergonhada. Admitir a sua homossexualidade lhe era muito difícil, sentia-
se nua, inadequada. Era como se fosse uma aberração.
__ Mãe, está tudo bem! Não tem problema nenhum! Love is love!
__ Obrigada por me compreender meu filho!... A sua aceitação é
fundamental pra mim...
__ Mãe, é claro que eu te compreendo e é claro que eu aceito!
Aliás, ninguém tem que aceitar ou não aceitar nada, cada um tem a sua
orientação sexual que deve ser respeitada por todos.
Lorena observava a cena e podia ver o quanto Enrico era um filho
incrível, um homem incrível! Iria torcer para que ele encontrasse uma
mulher que o amasse como ele merecia.
__ Obrigada meu filho! Você não sabe o quanto eu me sinto
aliviada com as suas palavras...
...Stela e Enrico, finalmente conseguiram se acertar, depois de
colocadas todas as cartas na mesa. Diante da total compreensão do filho, a
mulher se sentiu em paz consigo mesmo, sentiu-se livre para amar. O seu
coração estava pacificado, renovado, como se tivesse tirado uma imensa
carga emocional de dentro do seu peito.
__ Mãe, está se sentindo melhor? __ Perguntou o jovem,
afagando uma das mãos da mulher.
__ Estou sim meu filho, obrigada!
__ Então eu vou voltar pra faculdade, tá bom! Eu tenho que
concluir algumas coisas por lá. __ Enrico decidiu-se por deixar aquelas
duas mulheres a sós, pois sentiu a necessidade que elas estavam tendo de
conversar, de se reencontrar... Ele não seria jamais, um empecilho na vida
daquele casal. Quando iniciou o seu movimento para se levantar da cadeira,
teve a sua mão agarrada por Stela.
__ Filho, volta pra casa, por favor! __ Depois de tudo conversado,
só faltava acertarem aquele ponto. Stela queria o seu filho de volta para o
seu lar, pois sabia que ele não tinha ainda, condições de se manter sozinho,
não abriria mão disso.
__ Tudo bem mãe, mas saiba que assim que eu me formar e
arrumar um emprego eu terei o meu próprio canto, certo? __ Enrico voltaria
para casa temporariamente, mas sabia que seria por pouco tempo, pois não
iria viver sendo sustentado pela sua mãe a vida toda, não era homem para
isso.
__ Tá, mas enquanto isso, você fica aqui comigo, tudo bem?
__ Tudo bem, mas agora eu preciso ir!
O jovem se levantou, deu o seu beijo habitual na cabeça da mãe,
acenou para Lorena e se retirou.
Assim que ouviu o barulho da porta sendo fechada, Stela afagou a
mão da moça e pode sentir a sua pele quente.
__ Eu não sei como te agradecer pelo que você fez Lorena! __ A
mulher se emocionou e sentiu uma lágrima descendo em sua face, pois
parecia que ela estava presa em um buraco de vergonha e de culpa que
ficaria pelo resto de sua vida, não conseguia vislumbrar uma saída, até que
viu o seu filho lhe sendo entregue novamente por aquela pessoa fantástica à
sua frente.
__ Stela, já passou! O Enrico entendeu tudo perfeitamente. Ele
não é um homem arcaico e boçal, pelo contrário, o seu filho é uma pessoa
incrível!
__ Eu não conseguiria ter resolvido esse problema sem você...
Obrigada mesmo!
Para Lorena, todo aquele drama daquela mulher era totalmente
descabido, pois Enrico não era uma pessoa antiquada e foi aí que ela se
lembrou de sua primitiva família interiorana, eles sim seriam a verdadeira
dor de cabeça para as duas...
__ Certo, e quando eu vou poder te apresentar a minha família?
__ Você quer me apresentar a sua família, agora? __ Stela se
assustou, pois jamais pensaria em ouvir uma proposta daquelas naquele
momento, depois de passar por todo aquele turbilhão de emoções.
__ Sim Stela, você me prometeu, não se lembra? Depois de
conversarmos com Enrico seria a vez de eu te apresentar à minha família,
esse era o nosso trato!
__ Lorena, deixe ao menos eu me recompor primeiro! Olha o meu
estado garota! __ Reclamou a juíza, incomodada com o jeito afoito daquela
moça. Ela podia ao menos respeitar o seu momento de debilidade, não?
__ Stela!...

***
Capítulo 22

Depois de viajarem por seis horas ininterruptas, parando apenas para


esticarem as pernas nos postos e restaurantes de beira de estrada, finalmente
as duas mulheres chegavam àquela pequena e charmosa cidade interiorana.
Stela havia cedido à pressão de Lorena e aceitara conhecer a sua família,
depois de se sentir recomposta do intricado episódio com o filho, ha
algumas semanas atrás.
Na medida em que ia avançando para dentro da cidade, sendo
guiada pela moça ansiosa ao seu lado, via o seu estômago se revirar e pode
sentir uma pequena dose do que viria pela frente. Ao dobrar mais uma
esquina, e rodar um pouco pela rua arborizada, ouviu um “aqui” da garota e
freou o carro imediatamente, estacionando-o em seguida.
Quando apeou, a juíza avistou um grande e charmoso sobrado
branco em estilo colonial, bem afastado da rua, com uma árvore imensa que
ficava a alguns metros do portão de entrada. Aliás, árvores é o que não
faltavam naquela pequena cidade, pensava a mulher.
Lorena foi até o portão, bateu a campainha e acenou à juíza para
que ela se aproximasse, pois via a mulher paralisada próximo ao carro.
Depois de uns cinco segundos, um homem um pouco grisalho, portando um
recheado bigode em cima da boca saiu pela porta principal e caminhou em
direção a elas, já as esquadrinhando de cima a baixo, montando a sua
primeira impressão.
Assim que o senhor abriu o portão, Lorena o abraçou,
carinhosamente.
__ Oi pai!
__ Oi minha filha!
Depois de sentir o abraço caloroso do pai, a jovem se soltou dele,
olhou para Stela e os apresentou.
__ Pai, essa é a Stela, minha namorada! __ A moça teve que ser
firme para não titubear naquele momento difícil, era a primeira vez que ela
trazia alguém para apresentar aos seus pais e aquele alguém que ela trazia
não se enquadrava nem um pouco no padrão de expectativas de sua família.
O homem olhou para a mulher bem vestida, sisuda e sentiu o seu
ar de importância e prestígio. Aquela que sua filha lhe apresentava como
namorada, certamente não era uma qualquer.
__ Muito prazer, eu sou Caio, o pai da Lorena! __ O homem
estendeu a mão para a mulher em uma atitude diplomática, mas achou
aquilo um tanto quanto inusitado e estranho.
__ O prazer é todo meu. __ Stela estava toda receosa e nem um
pouco simpática. Parecia que ela havia se fechado, como uma ostra e as
suas mãos geladas não estavam ajudando.
__ Vamos entrar! __ O homem convidou as duas a passarem para
dentro de casa, estendendo o seu braço, queria entrega-las a dona Leila, a
anfitriã oficial da casa.
Depois de cruzarem o quintal frontal, os três entraram pela porta
principal, chegando a uma sala. Stela observou o ambiente bem decorado e
pode perceber que os habitantes dali pertenciam a uma família de classe
média tradicional. Quando ela olhou para uma das portas de acesso àquela
peça, viu uma mulher bonita, muito parecida com Lorena, porém mais
velha, chegando por ali, a observando da cabeça aos pés, fazendo um
escaneamento completo de sua pessoa, escancaradamente.
__ Oi mãe!
Lorena abraçou a mulher que continuou a observar a juíza, como
se ela quisesse escavar, pelo olhar, a verdadeira pessoa que habitava aquela
carapaça circunspecta que lhe cobria.
__ Mãeeee!
Chamou a jovem ao perceber que Leila nem ao menos tinha
olhado para si e finalmente, conseguindo a sua atenção. Ao se desprender
dos braços da mãe, ela fez as apresentações.
__ Mãe, essa é a Stela, minha namorada. __ Lorena percebeu que
falar aquilo para a sua mãe era bem mais fácil, porém sabia que dela teria
uma retaliação. Depois se voltou para a juíza e completou __ Stela, essa é a
minha mãe, Leila!
__ Muito prazer! __ Leila falou baixo e estendeu a sua mão para a
mulher misteriosa que até aquele momento não havia esboçado um sorriso
sequer.
__ O prazer é todo meu!
As duas mulheres se cumprimentaram com um aperto de mãos e
cruzaram os seus olhares que pareceram mais uma troca de lanças. Leila
pensava: “que mulher é essa?” “Qual a sua idade?” “O que ela faz na vida?”
“O que ela esta fazendo com a minha filha?” Eram tantas as perguntas... A
vontade que teve foi de pegar Lorena, leva-la dali para interroga-la de todas
as formas, pois quando recebeu o telefonema da filha, no dia anterior, onde
foi informada por ela que iria trazer a sua namorada para apresenta-la à
família, pensou que receberia uma jovem estudante e não uma... Mulher de
meia idade!
Foi Lorena que cortou aquele momento embaraçoso entre as duas
mulheres que se desafiavam pelo olhar, visivelmente.
__ Mãe, você disse que iria nos esperar com um jantar e a gente tá
morrendo de fome!
Leila demorou alguns segundos para processar o que Lorena
havia falado, pois o seu cérebro estava ocupado demais com o
interrogatório interno que fazia à cerca de Stela.
__ Claro, o seu irmão já deve estar chegando também, aí nós
iremos jantar todos juntos.
Depois que o irmão chegou com a sua noiva, todos se sentaram à
mesa para o jantar. A comida havia sido feita por Leila e pela sua ajudante.
Lorena se sentou ao lado da sua namorada que até então, não havia
pronunciado mais do que meia dúzia de frases, tamanha a sua inabilidade
social demonstrada ali, até aquele momento. Felizmente, a jovem não se
deixava intimidar e enfrentava a todos de peito aberto.
Depois de um tempo em que todos jantavam em silêncio, Lucas
contou um episódio engraçado que havia lhe acontecido no hospital. Logo
após todos rirem do seu caso, o jovem médico perguntou, antes de colocar
mais uma garfada de comida em sua boca:
__ E você Stela, trabalha com quê?
__ Eu sou juíza!
Todos se entreolharam na mesa, pois Lorena não havia falado a
ninguém de sua família o que a sua namorada fazia.
__ Mas a gente pode te tratar de qualquer jeito assim ou precisa
de usar alguma palavra especial?
Coincidentemente, o pai de Lorena teve a mesma reação que ela,
ao saber da profissão de Stela, o que causou um risinho contido na moça
que se lembrou do episódio, quando conheceu aquela mulher.
__ Não Sr. Caio, não é necessário nenhum pronome de tratamento
aqui, pois estamos em família.
Naquele momento, Leila deu um sorrisinho de canto e se
simpatizou um pouquinho com aquela mulher. Talvez, aquele jeito sério
dela era mais uma questão de hábito do cotidiano adquirido no trabalho do
que antipatia gratuita, como estava pensando.
__ O tribunal da senhora trata de várias áreas do direito ou só de
uma vara especializada? __ Quis saber Lucas que havia se interessado
imediatamente, pelo trabalho daquela mulher à sua frente.
__ Atualmente eu atuo na vara especializada em violência
doméstica e familiar contra a mulher. __ Stela gostava de falar do seu
trabalho, pois ela amava o que fazia e não via problema nenhum em falar
sobre a magistratura em qualquer que fosse o ambiente.
__ Então você trabalha com a Lei Maria da Penha? __ Lucas
gostava do direito, na verdade, se ele não tivesse feito medicina, a carreira
jurídica seria a sua segunda opção, certamente.
__ Principalmente! __ Respondeu a juíza, antes de levar mais um
bocado daquela saborosa comida em sua boca.
__ E os casos de feminicídio, têm aumentado ou diminuído?
__ Infelizmente, em nosso país a curva é crescente.
__ Mas por que a doutora acha que tem aumentado? __ Perguntou
mais uma vez Lucas, que era um amante de uma boa conversa, sobretudo à
mesa.
__ Bom, eu concordo com a opinião de alguns pesquisadores que
afirmam que a ascensão de algumas lideranças políticas negativas, que
carregam discursos de ódio, difusores da misoginia, do machismo e de
preconceitos em geral, seja a principal causa para o aumento dos crimes
contra a mulher.
__ Mas aqui, a doutora não tem como inventar uma lei “chico da
penha” pra proteger os maridos indefesos não?
Perguntou o Sr. Caio que era conhecido pela sua faceta cômica.
Ele adorava quebrar a seriedade do ambiente com as suas falas jocosas.
Todos que estavam à mesa riram do homem, inclusive Stela que o achou
muito espirituoso.
__ Ah é? Vocês já têm tudo, não podem ter a paz também! __
Leila resolveu entrar no assunto também disposta a se defender da grave
acusação do seu marido.
Novamente, todos riram o que proporcionou uma aura prazerosa
ao jantar. O casal anfitrião era o contraponto perfeito à seriedade da juíza
que voltou a falar, assim que o silêncio se estabeleceu.
__ Sr. Caio, primeiramente o que disse não é verdadeiro, pois nós
ainda vivemos em uma sociedade patriarcal e eu concordo com você Leila,
os homens ainda têm todas as vantagens sobre as mulheres. Segundo, não
somos nós, os juízes que fazemos as leis, nós apenas garantimos o seu
cumprimento, quem fazem as leis são os políticos e sejam eles ruins ou
bons, o fato é que todos nós dependemos deles...
__ Ih!... Nem me fale em político! __ Exclamou Sr. Caio, fazendo
uma careta de aversão...

...E assim transcorreu o jantar, onde os assuntos foram surgindo e


todos emitiam a sua opinião em um ambiente agradável e descontraído.
Mas entre o prato principal e a sobremesa Leila chamou Lorena para ir com
ela até a cozinha, quando lá chegou, virou-se para a filha cruzou os seus
braços e perguntou:
__ Lorena, onde você conheceu essa mulher?
A jovem ouviu a pergunta da mãe e raciocinou rapidamente. Não
podia dizer à dona Leila que havia sido namorada do filho de Stela, ela não
iria entender e certamente, iria se horrorizar com a história.
__ Na faculdade! Eu a conheci quando ela foi fazer uma palestra
na minha faculdade, é isso!
__ Que idade ela tem?
__ Mãe, eu não fico perguntando a idade das pessoas, isso é
grosseiro sabia?
__ Ela podia ser sua mãe!
__ Mas ela não é e sabe por quê? Porque você é minha mãe! __
Lorena começava a se irritar com Leila, que não parava o seu bombardeio
de perguntas intimidadoras.
__ Você bem que podia ter me avisado que a sua namorada é uma
juíza, né!
__ Por que mãe, que diferença isso faz?
__ Se eu soubesse que ela era uma juíza e toda... Chique assim, eu
teria me arrumado melhor pra recebê-la!
__ Mãe, você está dentro da sua casa! Você quer passar a
impressão de que fica toda produzida o dia todo sendo que você não fica!
Pra quê? Você está bem assim!
E a retaliação veio de fato, pensava Lorena. A sua mãe não
deixava barato, onde não existia um problema ela tinha que criar um, não
tinha jeito!...

...Mais tarde, depois de um descontraído bate-papo na sala, Leila


se levantou e novamente chamou Lorena até a cozinha. A jovem seguiu a
mãe já se preparando para mais um bombardeio.

...Coincidentemente, Lucas que retornava da casa de sua noiva,


pois teve que leva-la até lá, chegou até aquela peça para tomar uma água e
viu as duas mulheres que já discutiam.
__ Por que vocês duas estão brigando aí?
__ É a Lorena que parece que perdeu o respeito pelos próprios
pais!
__ Mas por quê?
__ Ela quer dormir com a Stela no quarto de hóspedes!
__ Mãe, deixa ela dormir com a namorada, o que tem demais
nisso? São duas mulheres dormindo juntas! O que mais pode acontecer
além de uma masturbação conjunta?
Lucas emitiu aquela opinião de forma tão natural e até um pouco
técnico, visto que ele era um médico que nem se deu conta do que ele
estava reproduzindo. Novamente a heterossexualidade compulsória, como
um fantasma que rondava o universo de Lorena, voltava para lhe assombrar.
__ Lucas! __ Exclamou a mãe, horrorizada.
__ Lucas, você acha que existe sexo só quando tem um pênis
envolvido? __ Lorena resolveu não deixar barato e contra-atacou, apesar da
presença da sua mãe.
__ Maninha, eu estou tentando te ajudar aqui, você não vê? __
Alertou o jovem.
__ Sinceramente, eu dispenso esse tipo de ajuda antiquada e
preconceituosa! Pode guardar essa sua opinião caduca pra você!
A moça ficou muito irritada e não iria deixar o seu irmão diminuí-
la daquela forma, como se ela fosse uma caricatura ou uma piada.
__ Ei, se acalme, por favor! Me desculpa! __ Lucas se aproximou
da irmã e a abraçou, numa tentativa de reconciliação. __ Olha, eu gostei
muito da sua namorada e acho que você tá muito bem acompanhada, de
verdade! __ O rapaz terminou, plantando um beijo na cabeça de Lorena,
depois fez o mesmo com a mãe e se retirou da cozinha.
A jovem, ainda com os braços cruzados se virou para a mãe e
disse, categórica:
__ Mãe, eu sou maior de idade e vou dormir onde eu quiser, boa
noite!
Leila viu a sua filha sair da cozinha e trincou os dentes,
balançando a cabeça negativamente sem ter o que fazer naquela situação,
restando-lhe como última alternativa, colocar o seu marido a par dos
acontecimentos, como era de seu costume, infelizmente.

...No quarto, depois de tomarem um banho e se prepararem para


dormir, Stela se deitou já se aproximando de Lorena, enroscando-se toda
nela, pois era como gostava de dormir ultimamente, sentindo aquele corpo
macio e quente da moça todo agarrado ao seu, mas notou que ela estava de
cara fechada e nem um pouco receptiva.
__ O que foi?
__ O que mais poderia ser? A minha família que não me respeita!
__ A jovem havia peitado a mãe que há confrontou de todas as formas, mas
o embate acabou a desestabilizando emocionalmente, minando as suas
forças e agora ela estava ali, quebrada ao meio.
__ A sua família é ótima! Eles são agradáveis!
__ Você fala isso porque não foi contigo que a minha mãe teve
encontros intimidadores na cozinha, onde ela bombardeou de todas as
formas possíveis.
__ Ei! Cadê aquela garota madura e segura que me ajudou tanto
quando tive que enfrentar o meu filho ha algumas semanas atrás, hem?
Ao ouvir a pergunta da mulher, Lorena deixou as suas lágrimas
saírem, não conseguiu segurá-las. Por mais que tentasse e fizesse, ela não
conseguia o respeito da sua família, sobretudo da sua mãe. Era sempre
aquele formato, todas as atenções sempre foram direcionadas ao Lucas, o
seu irmão mais velho, ela não passava de uma palhaça para eles. Será que
não iam mudar nunca? Agora estava arrependida por ter trazido Stela ali.
A juíza secou as lágrimas da jovem e deu-lhe alguns beijos pelo
rosto. Naquele momento era a vez dela ser o suporte de Lorena, assim como
ela havia sido o seu quando teve que resolver a sua difícil questão com
Enrico.
__ Você é uma garota incrível! Não se deixe esmorecer... Vamos
enfrentar tudo juntas, que tal? Uma fortalecendo a outra, hum?
Lorena ouviu aquelas palavras reconfortantes e não teve outra
alternativa senão, agarrar aquela mulher pelo pescoço e puxa-la para si.
__ Eu te amo Stela!
__ Eu também te amo Lorena! Vai dar tudo certo!...

***
Capítulo 23

No dia seguinte, Stela acordou com o chilrear dos pássaros e o clarão


do sol que passava por algumas frestas através da cortina. O corpo quente
de Lorena estava todo recostado ao seu e a bunda dela parecia que estava
colada ao seu sexo, deliciosamente.
Se a jovem despertasse naquele momento, certamente fariam
amor, pois a juíza já sentia um formigamento entre as suas pernas, era o que
aquela moça fazia consigo, sempre. A mulher acabou se resolvendo por
deixar Lorena dormir, se movimentando com cuidado para não acorda-la e
por fim, levantando-se.
Depois que se trocou e se arrumou, Stela saiu do quarto e desceu
as escadas com a intenção de fazer o seu desjejum, pois sempre tinha fome
pela manhã. Ao chegar à sala de refeições, avistou a mesa servida com um
incrível café colonial onde podia se ver de tudo, frutas, pães, torradas, bolo,
broa de fubá... Tudo havia por sobre aquela mesa bem posta com as lindas
xícaras de porcelana viradas para baixo, prontas para serem utilizadas.
No momento em que a juíza pensou em se sentar e servir-se
daquele banquete matutino, pois não avistara ninguém que pudesse fazer as
honras da casa, surgiu Leila, trazendo uma elegante térmica inoxidável em
suas mãos.
__ Bom dia! Vamos tomar um café? __ A anfitriã cumprimentava
a sua visita e terminava de ajeitar a mesa ao mesmo tempo, com aquela
dinâmica perfeita de dona de casa, já acostumada com os seus afazeres
diários.
__ Bom dia! Aceito sim, obrigada!
Stela se sentou na mesma cadeira que havia ocupado no dia
anterior, já avistando um mamão pronto para ser devorado, pois era a sua
fruta predileta pela manhã. Enquanto a juíza o partia, viu Leila sentando-se
também, concluindo que tomaria o café junto de sua sogra o que a deixou
na defensiva. Esperava sinceramente, que elas se entendessem ou então,
teria que contra-atacar. Não havia outra forma de se fazer respeitada por
aquela mulher.
__ Dormiu bem? __ Perguntou Leila.
__ Dormi sim, muito bem!
__ E a Lorena, ainda não acordou?
__ Não! Ao menos eu a deixei dormindo na cama!
__ Os jovens são assim, dormem demais! Eles acham que vão
viver pra sempre. Agora nós que já atravessamos o “cabo da boa
esperança,” gostamos de acordar cedo para aproveitar o dia, não é?
Stela colocou uma colherada do mamão em sua boca e sentiu a
primeira porção do ácido expelido por sua sogra. Tentou colocar-se em seu
lugar, mas não conseguiu se imaginar rejeitando uma possível namorada de
Enrico por causa da idade, era baixo demais.
__ A Lorena está apenas aproveitando a cama em um final de
semana. Normal, para qualquer pessoa que queira descansar.
__ Você não se incomoda ao pensar que, quando tiver uns
sessenta anos a Lorena vai ter uns quarenta e poucos, ou seja, na “idade da
loba”?
__ Nem um pouco Leila! A Lorena é livre pra me deixar a
qualquer momento que ela quiser. Eu não digo que não vou sofrer, é claro
que sim, pois eu a amo e ficar sem ela pra mim, seria horrível! Mas eu não
posso prendê-la a mim para sempre, infelizmente!
Para Stela, que era feminista de carteirinha e uma defensora
incondicional das mulheres, era triste ver Leila presa a uma forma de pensar
tão arraigada a ideias preconcebidas. Mas ao mesmo tempo, se lembrou que
ela própria também não era totalmente livre, estava ainda tentando se
desprender de suas amarras. Resolveu então ser mais condescendente e
compreensiva com aquela que era a genitora da sua mulher amada.
__ A sua filha é uma pessoa incrível Leila e sabe bem o que quer.
Ela é tão capaz, tão inteligente! Pode ter certeza que ela vai saber conduzir
a sua vida da melhor forma possível. Eu sou apenas uma mulher apaixonada
e pronta para ajuda-la no que for preciso...
A anfitriã ouviu as palavras da juíza e sorriu, afinal era ela quem
havia educado Lorena, então uma fração daqueles elogios era direcionada
também à sua pessoa, não é?...

...Um pouco mais tarde, Leila recebeu um telefonema de sua


irmã, Íris que propunha uma reunião em família naquele dia, apenas uma
desculpa para comerem, beberem e falarem sobre tudo, como elas já tinham
o costume de fazer de vez em quando. Todas as irmãs se reuniam sempre na
casa de Stela, traziam os seus maridos, filhos e festejavam o fato de estarem
vivos, nada mais do que isso.
__ Não sei Íris... __ Naquele final de semana, Leila não via
motivos para comemorar, não queria dar aquela oportunidade para as suas
irmãs verem a sua filha de namoro com uma mulher.
__ Mana, já falei pra todo mundo! À noite a gente chega aí, beijo!
__ Mas eu não queri...
Leila desligou o telefone fazendo caras e bocas, com raiva de Íris
que praticamente a obrigava a receber a família naquele final de semana
difícil. Agora teria que apresentar a juíza para todas as irmãs, que droga!...

...Ainda um pouco mais tarde... Stela havia encontrado um espaço


delicioso naquela casa, uma área externa arborizada e fresca, pois o sol
estava morno naquele dia. A juíza tinha se deitado em uma das
espreguiçadeiras à beira de uma piscina não muito grande que havia ali e lia
um livro que levara para ajuda-la a passar o tempo, caso fosse necessário.
Como parecia que Lorena iria dormir o dia inteiro, então ela se deitou ali e
pôs-se a ler, despreocupadamente, até que sua garota acordasse.
Depois de ler por quase duas horas seguidas, Stela viu Lorena se
aproximar e se deitar ao seu lado, praticamente em cima do seu corpo para
que as duas coubessem naquela espreguiçadeira. A mulher fechou o livro,
colocou-o em cima de uma mesinha ao lado e abraçou o corpo quente da
jovem que havia grudado no seu.
__ Bom dia, dorminhoca!
__ Bom dia meu amor! Eu não sei o que acontece comigo aqui,
parece que essa casa é um sonífero pra mim. Eu só consigo dormir aqui!
__ É bom que você descansa! __ Stela afastou uma das mechas de
cabelo que estava sobre o rosto da moça e deu-lhe um beijo na boca,
sentindo um gosto de café.
__ A minha mãe já te importunou muito hoje? __ Perguntou
Lorena, assim que interrompeu o beijo.
__ Não, está tudo bem! Você devia ser mais condescendente com
ela.
__ O quê? Ela devia ser mais condescendente comigo!...
A alguns metros dali, Leila observava o casal enamorado pela
fresta de uma cortina, parecendo uma espiã e não conseguiu aplacar o seu
cérebro quando ele acessou os escombros de suas memórias renegadas e
trouxe à tona as suas experiências amorosas com garotas, quando era uma
estudante de Zootecnia em uma cidade próxima... Sim, isso mesmo! Ela
bem que gostou de beijar algumas bocas femininas quando fazia o seu curso
universitário que a propósito, não lhe serviu para nada, pois engavetou o
seu diploma e se casou com o filho de um comerciante local, um solteiro
cobiçado na época, o Caio, se tornando uma dona de casa “perfeita” e
entediada, não necessariamente nessa ordem...

...À noite, as últimas pessoas que chegaram ao aconchegante


espaço gourmet bem acabado da casa, foram Stela e Lorena que fez questão
de aparecer ali de mãos dadas com a sua namorada. A juíza ainda se
acostumava com aquele tipo de exposição da sua pessoa e ainda ficava um
pouco embaraçada, mas não quis se negar àquela vontade da jovem. Não
iria se acovardar diante daquele crucial momento de autoafirmação dela.
__ Boa noite a todos!
Disse Stela, parecendo que estava iniciando uma sessão de júri, de
tão formal que saiu a sua voz. Ela estava sendo oficialmente apresentada
por Lorena a toda sua família de uma só vez, tias e tios de bermudas e
chinelos que pararam o que estavam fazendo, silenciaram-se e voltaram
toda a sua atenção ao casal inusitado que chegava para participar daquela
reunião.
Leila tomou um gole de seu vinho e fulminou Lorena com os
olhos, enquanto suas irmãs e cunhados cumprimentavam o casal. Alguns
acenaram de seus próprios acentos e outros, como a tia Íris, se aproximaram
das duas para verem de perto quem era aquela mulher elegante que
namorava a sua sobrinha...
...Passado um tempo, entre bebedeiras e comilanças, regadas a mil
e uma histórias narradas, as pessoas começaram a se levantar de seus
acentos para curtirem as músicas de pé, pois algum “DJ” informal havia
colocado um som dançante, convidando todos a remexerem os seus
esqueletos.
Na “pista de dança”, os convivas meio bêbados e felizes demais,
dançavam e falavam ao mesmo tempo. Stela e Lorena haviam se rendido ao
momento e também estavam de pé. A juíza, já bem alta, se mexia
comedidamente por trás da jovem que era mais espontânea e soltava as suas
ancas sem amarras.
Todos pareciam muito felizes e despreocupados até que Leila deu
um grito, apontando o seu indicador para Stela, bem no meio da “pista de
dança”, o que calou os falantes e paralisou os dançarinos, subitamente.
__ Você! __ Era a palavra que a anfitriã tinha gritado. __ Você! __
Repetiu Leila, ainda apontando para a juíza.
__ Fala Leila! __ Disse Stela no mesmo tom de voz, resolvida a
enfrentar a sua terrível sogra.
A anfitriã se aproximou um pouco da sua oponente, o “DJ” parou
a música e todos acuraram os seu ouvidos para escutarem o que a mulher
iria dizer para a sua nora.
__ Quando você pisou nessa casa ontem, eu não gostei de você!...
Você chegou toda chique, calada, séria... Eu te achei antipática...
Arrogante... __ Leila cambaleava um pouco, o que revelava o seu estado
etílico e falava cada palavra enfatizando-as, quase soletrando-as __ mas
agora... Eu gosto de você!...
Ao ouvir a última frase, Stela riu, mas não quis interromper
aquela mulher que parecia ter mais a falar, pois estava com o seu indicador
em riste, novamente.
__ Escute o que eu vou te falar... Meritíssima!... Cuida bem da
minha filha... Não faz ela sofrer porque senão, você vai conhecer a minha
fúria!...
Lorena, paralisada, de mãos postas em frente a sua boca que
estava aberta, se emocionou, ouvindo a fala da mãe e não conseguiu conter
uma lágrima que desceu, marcando a sua face.
Leila estava bêbada, é verdade, mas falava o que trazia em seu
coração. Ela se aproximou do casal, meio cambaleante, abriu os seus braços
e juntou as duas mulheres em seu corpo, abraçando-as fortemente. Todos os
que estavam presentes urraram de felicidade, barulhentos, como
verdadeiros descendentes de italianos que eram e bateram palmas para o ato
grandioso da anfitriã que se recusava a soltar o casal no centro da “pista de
dança”...
...Depois da divertida reunião de família que havia varado a
madrugada, Stela e Lorena subiram para o quarto de hóspedes e, cheias de
desejo, jogaram-se na cama tirando as roupas, atirando-as pelo chão. A
jovem se postou em cima da juíza e deixava-se pesar sobre o corpo dela,
remexendo as suas ancas, quase a matando de tesão. O beijo delas era
profundo e as línguas se massageavam ora em uma boca, ora em outra,
produzindo uma troca fluídica perfeita.
A moça se desvencilhou dos lábios da amante e arrastou o seu
corpo para cima, colocando os seus seios em cima da boca dela.
__ Chupa... Chupa com força... __ Sussurrou a jovem, sentindo
imediatamente, um dos seus bicos ser capturado pela boca ávida da juíza
que passou a desferir fortes sugadas no mamilo enquanto massageava as
laterais das mamas com suas habilidosas mãos.
A moça permaneceu ali, matando Stela de excitação, quando
resolveu colocar uma ideia em prática, mas não sem antes propor à mulher
que já nem sabia mais onde estava, só sabia que tinha dois seios bem na sua
boca e tudo o que tinha a fazer era sugar e se fartar daquele banquete de
prazer.
__ Stela! __ Chamou Lorena.
__ Ah... __ Gemeu a mulher, sem interromper o que estava
fazendo, escorregando as suas mãos pela pele macia da jovem e
estacionando-as bem em cima de sua bunda deliciosa.
__ Eu quero fazer uma coisa com você...
__ E o que é?
A juíza não estava raciocinando direito e tudo o que aquela moça
lhe propusesse ela aceitaria, certamente. A vontade que teve foi de dizer
“sim” antes mesmo de saber do que se tratava, mas tinha que manter uma
certa dignidade, por isso perguntou o que era. Aquela moça perfeita, cheia
de iniciativas na cama, teria tudo com aquela mulher apaixonada, perdida
de amor, em um caminho sem volta...
__ Eu quero sentar na sua boca!
Stela quase teve um orgasmo só de ouvir a proposta da jovem.
Sentiu o seu corpo todo sendo perfurado por finas agulhas e seu sexo pulsou
incessantemente, só de imaginar...
__ Vem... __ Sussurrou a juíza em um sopro.
Lorena então se moveu pra cima do corpo da mulher e abriu bem
as pernas, colocando um joelho em cada lado de sua cabeça. Depois se
ajeitou ali e finalmente sentou-se, literalmente, na boca da juíza que gemeu
de tesão.
Quando Stela teve aquele sexo quente, molhado e todo aberto em
sua boca, ela passou o seu braço por debaixo das coxas da moça, para
agarrar a sua bunda e a puxar ainda mais para junto do seu rosto. Em
seguida, tomou aquele montinho rijo que tanto amava, para si e o chupou,
lambeu, estimulando-o de todas as formas possíveis, passando a repetir
aquele movimento em loop, chegando até a produzir alguns estalidos com
sua boca, na medida em que “comia” a garota por baixo, deliciosamente.
Lorena mexia as suas ancas, indo de encontro à boca faminta da
amante e sentiu que não aguentaria por muito tempo, pois já via as
contrações do seu sexo aumentando. A mulher parecia querer sugar engolir
o seu sexo com suas fortes chupadas.
A jovem queria ficar ali por mais tempo, mas foi surpreendida
pela juíza que pressionou, com um dos seus dedos, apenas a entrada de seu
ânus, o que a assustou em um primeiro momento, mas depois viu o seu
prazer aumentar, com aquela pressão que a amante fazia em seu períneo e
não aguentou mais, sentiu o seu corpo convulsionar em um orgasmo
liberador...
Após se deitar por cima do corpo da mulher, sentindo-se sem
forças, Lorena sorriu e mordeu o seu lábio inferior, lembrando-se do seu
irmão Lucas dizendo que entre duas mulheres só poderia haver uma
masturbação conjunta e nada mais. Se o que acabara de fazer com Stela não
era sexo, o que poderia ser então? No mais, duvidou que o convencido do
seu irmão pudesse dar tanto prazer para a sua namorada quanto a juíza lhe
dava, cada vez que faziam amor... Mas não quis pensar em mais nada, só
queria sentir o calor daquele corpo que tanto amava, coladinho ao seu, e
adormeceu...

...No dia seguinte, as duas mulheres partiram, deixando para trás


Leila, chorando e o Sr. Caio, um tanto quanto inexpressivo, como era
próprio da sua personalidade evasiva.
Dentro do carro em movimento, elas sentiam aquele agradável sol
matutino que adentrava pelos vidros, curtindo uma das bandas preferidas da
jovem, com a sensação de que tudo havia dado certo, apesar de alguns
percalços. Agora elas eram livres para se amarem sem nenhuma barreira
que pudesse impedi-las.
Lorena olhou para a mulher, que dirigia tranquilamente pelo
asfalto em linha reta e se sentiu completa, mais uma vez, ao lado da sua
agora, namorada oficial.
__ Obrigada Stela, por ter topado enfrentar a minha família!
__ Eles são ótimos, Lorena! Eu gostei deles. __ A juíza falava a
verdade, apesar da acidez da sua sogra em alguns momentos, ela havia
gostado dos hábitos cultivados naquela casa, lhe pareceram saudáveis e
agradáveis. Voltaria ali mais vezes, caso Lorena lhe convidasse.
__ A minha família “Buscapé”!
__ Família é sempre assim mesmo, “Deus me livre, mas quem me
dera!”
__ Ah é assim? Então tá na hora de você me apresentar à sua!
__ Mas você já conhece o meu filho!
__ Eu estou falando dos seus pais Stela! __ Lorena tinha
curiosidade em saber de que ninho aquela mulher havia saído. Que pessoas
terríveis eram aquelas que não mereciam ao menos serem lembradas, nem
pela filha e nem pelo neto?
__ Não, não, não, nem pensar! Nem começa! __ A mulher era
enfática, começava até a ficar nervosa só de cogitar aquela possibilidade.
__ Stela o que tem demais em seus pais? __ Lorena até se
assustou com o tom de voz áspero da juíza.
__ Nem queira saber! E você não vai saber! Tudo tem um limite...
__ Por que eles são tão medonhos assim?
__ Não vamos falar sobre isso!
A última coisa que faria em sua vida era levar aquela moça para
conhecer os seus pais. Pensava Stela que se calou e ficou séria, inacessível.
Em seguida ela começou a pensar neles e na última vez em que os vira...
Ela estava grávida de Enrico e era pressionada por eles a fazer o aborto. Ao
se decidir por ter a criança, houve o rompimento irreversível entre ela e os
seus pais. Nunca mais os viu! Trilhou sozinha o seu caminho até ali, e
jamais levaria Lorena para conhecer aqueles que renegaram o seu amado
filho.
Depois que Enrico nasceu ela imaginou que receberia a visita
deles e que haveria uma reconciliação, mas isso nunca aconteceu. Entendeu
que havia sido deserdada, pois nem um telefonema, carta, nada, recebia
deles. Sabia que eles estavam vivos pelos jornais, pois o seu pai, um
desembargador aposentado, de vez em quando era fotografado em algum
evento social, ao lado da dondoca da sua mãe que não perdia aquela sua
mania de sorrir forçadamente, como se ninguém tivesse notando a sua
falsidade.
Lorena observava a juíza e podia perceber a rigidez estampada em
sua face. Aquele assunto parecia realmente, ser muito difícil para ela.
Certamente, envolvia muito sofrimento.
__ Desculpa Stela! Eu não quis te provocar...
A jovem estendeu a sua mão e tocou de leve, com as pontas dos
seus dedos, a face da mulher que continuava séria e em silêncio. Aquele
assunto parecia ser de fato, uma barreira intransponível para aquela mulher.
Lorena decidiu-se por recuar e respeitar os limites da juíza, pois entendeu
que a ainda havia muito a ser descoberto e decifrado dentro do universo
intricado e cheio de dobras daquela esfinge ao seu lado.
__ Tudo bem!
Stela resolveu ceder ao suave toque da sua mulher amada e
pegou-lhe a mão, acomodando-a sobre a sua coxa enquanto continuava a
dirigir pela negra estrada em linha reta. Tudo o que ela queria era ter aquela
garota em sua vida e a felicidade do seu filho, nada mais...

***
Capítulo 24

Alguns dias depois, eram dezesseis horas, Stela se encontrava em seu


gabinete, dissecando mais um processo com a ajuda de sua fiel e
competente assessora, Bianca, quando o interfone tocou.
__ Dra. Stela, tem uma moça chamada Lorena que está aqui
dizendo que precisa conversar com a senhora. __ A voz que saia do
aparelho era da secretária da juíza.
Após sentir um batida mais forte em seu coração, a magistrada
largou os papéis que estavam em suas mãos, olhou para a assessora e em
seguida apertou novamente o botão do interfone para dizer:
__ Mande-a entrar, por favor!
Stela nunca havia recebido Lorena ali e sentiu-se feliz por ela vir
até ao seu local de trabalho para vê-la. A mulher se levantou e, com um
sorriso bobo nos lábios, viu a linda jovem adentrar pela porta da sua sala. A
reação da juíza foi notada por Bianca que também se voltou para a moça e a
examinou de cima a baixo, esquadrinhando cada centímetro quadrado da
visita que sua chefe recebia.
__ Oi! __ Disse a jovem, entrando contidamente para dentro do
gabinete, ela sorria para a magistrada, mas depois voltou o seu olhar para a
assessora que ainda permanecia sentada.
Stela não teve outra alternativa senão apresentar Lorena à Bianca,
apesar dos sentimentos que a assessora declaradamente, nutria por si, o que
também não era motivo para não apresenta-las, obviamente.
__ Bianca, essa é a Lorena, minha namorada! __ A juíza se dava
conta de que era a primeira vez que apresentava a moça à alguém, como sua
namorada e descobriu o quanto aquilo lhe fazia bem, apesar das
circunstâncias implicadas ali, pois tinha consciência do quão difícil deveria
estar sendo para a assessora, aquele momento.
__ Lorena, essa é a Bianca, a minha assessora!
__ Muito prazer! __ Lorena se aproximou um pouco mais e
estendeu a sua mão à jovem elegante que havia se levantado de seu assento
e lhe observava insistentemente desde que ali, chegara.
__ O prazer é todo meu!
Bianca finalmente conhecia a mulher que havia conquistado o
coração da magistrada, sentindo as suas últimas esperanças se estilhaçarem
pelo chão, pois vira com os seus próprios olhos a paixão estampada na face
da sua chefe, não lhe restando mais nada, apenas aceitar a sua triste
realidade.
__ Bianca, você pode nos dar licença um instante, por favor? __
Pediu Stela à sua assessora, vendo que não seria estabelecida nenhuma
conversação entre as duas e que ficariam só mesmo nas apresentações. A
assessora imediatamente, pediu licença e se retirou da sala, fechando a porta
atrás de si.
__ Bonita a sua assessora! __ Observou a jovem, se aproximando
contidamente da juíza, olhando-a meio atravessado, pois sem saber porque,
sentiu uma ponta de ciúmes. Quando chegou bem perto da mulher, passou
os braços sobre os ombros dela, acariciou a sua nuca e a puxou para um
beijo macio e breve, produzindo um estalido arrastado.
__ A que devo a honra? __ Perguntou Stela, juntando a jovem
pela cintura, colando-a em seu corpo, deliciosamente.
__ Eu vim aqui te contar, em primeira mão, que hoje eu fui
convidada por Dr. Willian, a compor a sua equipe, assim que eu me formar.
__ Hum!... Parabéns, meu amor! Fico imensamente feliz com o
seu sucesso no trabalho!
__ Obrigada! Eu já estou empregada, antes mesmo de me formar!
__ Que maravilha! Esse reconhecimento só reafirma o que eu já
sabia, que você é uma garota inteligente e muito capaz! Você vai construir
uma bela carreira, eu tenho certeza disso!
__ Obrigada Stela! __ A jovem puxou a juíza para mais um beijo,
dessa vez mais profundo e demorado, sentindo o seu corpo sendo apertado
pela mulher que a juntava pela cintura.
Após o beijo, Lorena estudou cada canto daquela sala, depois
olhou para cima da mesa da magistrada que era robusta, preta, entalhada em
madeira maciça, abarrotadas de pastas recheadas de papéis e perguntou:
__ Onde está o seu martelo?
__ Martelo? __ Stela riu com a pergunta inusitada da moça.
__ Sim! Os juízes não usam um martelo e batem com ele na mesa,
enquanto proferem a sua sentença?
__ No Brasil não usamos esse aparato. Ele é mais um símbolo de
autoridade, usado pelos juízes ingleses e americanos. __ Informou a mulher
que se divertia com aquele tipo de curiosidade da jovem pelo seu trabalho.
__ Mas que absurdo, vocês dispensarem um objeto tão sensual
como é aquele martelo!
__ Sensual? O que há de sensual em um martelo de madeira? __
Perguntou Stela com curiosidade.
__ Eu imaginei que iria chegar aqui, você tiraria a minha roupa...
Me deitaria em sua mesa... Em cima dos processos e passaria o seu martelo
por todo o meu corpo antes de me possuir...
Lorena pronunciou aquelas palavras com tanta sensualidade que
não restou mais nada à juíza a não ser dar uma gostosa gargalhada, tamanha
era a espiritualidade daquela moça.
__ Em que livro da Erika L. James você leu isso? __ Perguntou
Stela, assim que conseguiu conter a sua risada.
__ É sério Stela, eu preciso de um martelo de madeira em meu
corpo agora!
__ Vamos fazer o seguinte, eu providencio um martelo de
madeira, vou até ao seu consultório e, durante uma sessão de análise, você
se deita no divã, eu exploro todo o seu corpo com ele para depois fazermos
amor loucamente, sob o olhar analítico do Dr. Freud, emoldurado em sua
parede. Que tal?
A jovem olhou para cima, tentando imaginar a cena e depois
voltando a fitar a juíza, falou:
__ Seria excelente também! Combinado então!
__ Você não existe, sabia?
Stela juntou novamente aquela garota travessa para mais um
gostoso beijo, sentindo-se a mulher mais sortuda do mundo por tê-la em sua
vida...

Um ano depois...
Naquela noite, Lorena se aprontava em frente ao espelho daquele
closet porque ela e Stela haviam sido convidadas para um jantar em um
restaurante. O convite tinha sido feito por Enrico, pois ele queria
comemorar a sua aprovação na primeira etapa do concurso público para juiz
de direito no qual era um dos candidatos. O jovem que havia se formado no
final do ano anterior e já tinha conseguido passar no exame da ordem dos
advogados, viu uma excelente oportunidade de ascensão na carreira
jurídica, quando se deparou com o anuncio do certame para a escolha de
uma nova leva de juízes substitutos, decidindo-se por fazer a sua inscrição
imediatamente. O rapaz já havia escolhido seguir o sacerdócio da sua mãe
que sempre foi e continuava a ser, a grande mentora de sua vida.
Lorena também tinha se formado no final do ano anterior e agora
era uma das psicólogas que atendia na conceituada clínica do Dr. Willian.
Ha uns sete meses atrás, a convite de Stela, ela se transferira para aquele
apartamento, pois o seu amigo Léo tinha recebido uma irrecusável proposta
de trabalho em outra cidade e como ele não quis deixar escapar a
oportunidade, foi embora, deixando a sua colega morando sozinha.
Na ocasião, a juíza não titubeou e viu no episódio a oportunidade
perfeita para estreitar ainda mais o seu relacionamento com aquela moça
que havia conseguido tomar conta do seu coração, sem nenhuma reserva.
Quando fez o convite à Lorena para morar consigo, a jovem não se fez de
rogada e aceitou na hora. Agora ela estava ali, ocupando o closet da mulher,
o seu quarto, o seu corpo, a sua vida e tudo mais que ela tinha direito...
Stela aguardava pacientemente na sala, a moça terminar de se
arrumar para irem enfim, ao restaurante escolhido por Enrico para jantarem
em sua companhia. A juíza estava muito feliz com a aprovação do seu filho
na primeira etapa do difícil e longo certame em que era um dos candidatos.
Ela sabia que não seria fácil porque conhecia a árdua estrada que ele teria
que percorrer, pois ela mesma havia passado por aquele difícil caminho ha
mais de vinte anos atrás, portanto tinha conhecimento das várias etapas em
que o filho seria submetido para a sua conquista do cargo de magistrado.
Passados alguns longos minutos, Stela avistou Lorena chegando
na sala toda produzida para enfim, saírem e viu que valera a pena a espera,
pois a sua mulher estava linda e encheu os seus olhos de admiração. Às
vezes a juíza nem acreditava naquilo em que ela própria estava vivendo,
parecia um sonho estar casada com aquela jovem. Na verdade, nem em
sonho ela imaginou que algum dia aquilo pudesse lhe acontecer.
Stela se aproximou da moça, sentindo o seu delicioso perfume e a
abraçou pela cintura, depois de percorrer cada centímetro do seu corpo com
os seus olhos cor de mel.
__ Que mulher linda é essa que eu tenho, hem? __ A juíza sempre
sucumbia à Lorena, não tinha jeito. Aquela jovem tinha conseguido tomar
cada milímetro do seu coração, não lhe restando outra opção senão se
entregar, completamente.
Lorena levantou os seus braços e com eles circulou o pescoço de
Stela e a puxou para dar-lhe um beijo breve.
__ Obrigada meu amor, você também está linda!...
Stela sempre comprava roupas clássicas e elegantes, em tons
monocromáticos, mas na última vez que foi às compras, na companhia de
Lorena, se permitiu ser influenciada pela sua mulher quando ela lhe sugeriu
uma camisa amarela bem cortada em um tecido fino. A juíza incluiu a peça
entre as demais que carregou para o provador, duvidando que a levaria para
casa, porém quando a experimentou, amou o tom da cor em sua pele,
acabando por inclui-la em sua compra. Naquela noite especial em que
comemoraria uma importante vitória do seu filho, resolveu vestir a camisa
junto de uma calça preta de linho com o cos alto e se sentiu bem, pois
estava sofisticada e ousada, ao mesmo tempo.
__ Quando retornarmos do jantar eu quero tirar essa sua roupa e
provar pra mim mesma, que eu sou a única mulher nesse mundo que possui
o privilégio de ter o seu corpo nu... __ Lorena achava a juíza muito bonita,
mas não era esse fato que mais lhe enchia de desejo, mas sim, o que lhe
arrebatava de forma inconteste era a autoridade e respeito que inspirava o
que a fazia se sentir imensamente honrada por ser a sua mulher.
__ Saiba que eu me sinto totalmente feliz exatamente por esse
motivo! __ As palavras de Lorena tocaram o coração de Stela, porém era
ela que se achava a privilegiada ali, por ter aquela moça tão linda, tão
espirituosa, tão inteligente, tão completa, ao seu lado...

...Quando chegaram ao charmoso restaurante escolhido por


Enrico, assim que atravessaram a porta de entrada, Stela sentiu a sua mão
sendo apanhada por sua mulher. Não era a primeira vez que a jovem fazia
isso, mas estava ficando mais corriqueiro esse ato dela, sempre que estavam
em público. No princípio, a juíza ficava totalmente embaraçada com os
olhares dos curiosos fitando as suas mãos entrelaçadas, mas agora ela se
sentia bem, até gostava quando eram observadas pelas pessoas que
cruzavam com elas, sentia-se orgulhosa de ter uma moça daquelas
segurando em sua mão. O que os outros estariam pensando ao seu respeito?
Não queria saber, só queria ser livre para demonstrar o amor que sentia por
sua linda esposa.
Quando se aproximaram da mesa de Enrico, Stela notou que ele
estava acompanhado de uma bela loira. O casal que conversava
animadamente parou de falar quando percebeu a chegada delas, o jovem
então se levantou para cumprimenta-las seguido da moça que também se
pôs de pé.
__ Oi mãe! __ O rapaz se aproximou da juíza para lhe dar um
abraço e beijar-lhe a cabeça carinhosamente, como sempre o fizera. Depois
de soltar a mãe, ele estendeu a mão à ex-namorada, cumprimenta-a também
__ oi Lorena!
__ Oi Enrico!
__ Mãe, eu quero que conheça a Giovana, minha namorada!
O jovem apresentou as mulheres formalmente e Stela finalmente
soube que aquela loira bonita e elegante era a nova namorada do seu filho.
A juíza imediatamente estendeu a sua mão a ela, cumprimentando a moça
que havia conseguido a façanha de namorar com o seu esquivo filho que
parecia não querer nada sério com mais ninguém, o que a incomodava
bastante, pois se sentia um pouco culpada pela personalidade arisca adotada
pelo seu filho, dadas as circunstâncias em que fora submetido em seu
último e único namoro.
__ Oi Giovana, prazer em conhecê-la, Stela!
__ O prazer é todo meu!
__ E essa é a esposa da minha mãe! __ Disse Enrico, apontando
para a moça de cabelos castanhos ao lado de Stela.
__ Muito prazer, Lorena!
__ O prazer é meu!
Após as apresentações, os quatro se sentaram à mesa e se
acomodaram para o jantar.
__ Enrico, eu estou muito feliz pela sua vitória! __ A juíza iniciou
o assunto na mesa, falando do motivo que os fez se reunir naquele dia
especial para o seu filho.
__ Obrigado mãe! Agora eu vou me preparar para a segunda
etapa que é um pouco mais difícil.
__ Você vai estudar muito e vai tirar de letra, tenho certeza! __
Stela sabia que a segunda etapa seria uma prova aberta em que os
candidatos têm que discorrer sobre os assuntos propostos de forma textual,
o que a tornava bem mais complexa, mas acreditava no potencial do seu
filho, por isso estava tranquila.
Naquele momento, um garçom chegou até a mesa e lhes entregou
os cardápios para que pudessem escolher o que comeriam e beberiam. Após
fazerem os pedidos, o homem se retirou e Lorena perguntou à Giovana:
__ Você também é da área do Direito?
__ Sim, sou advogada. __ Respondeu a loira.
__ Ela trabalha no mesmo escritório de advocacia que eu. __
Informou Enrico.
__ Então nessa mesa, a única pessoa que não é da área do direito
sou eu. __ Concluiu Lorena.
__ E você faz o quê? __ Perguntou Giovana.
__ Eu sou Psicóloga.
__ Mas ela não é louca!
Enrico provocou o riso apenas em Lorena, pois as outras duas
mulheres ficaram sem entender aquela fala do jovem que fazia menção a
um diálogo que tivera com a sua ex-namorada ha quase dois anos atrás,
quando se conheceram, em um badalado pub no centro da cidade.
Stela, embora não tenha entendido bem o que o seu filho dissera,
ficava feliz sempre que o via conversando normalmente com Lorena, às
vezes dando-se liberdade até de brincar com ela o que produzia em si a
sensação de que ele havia superado o que acontecera entre eles,
definitivamente.
Depois de alguns minutos de conversa naquela mesa, o garçom
retornou trazendo o espumante que não podia faltar naquela comemoração.
Os quatro foram servidos pelo habilidoso homem que novamente se retirou,
assim que terminou o seu afazer ali. Stela levantou a sua taça e convidou a
todos para um brinde, felicitando o seu filho por sua gloriosa conquista, o
que foi aceito pelos demais.
Após aquele momento de congratulações e depois de todos terem
provado do delicioso espumante, Giovana, dando continuidade às conversas
naquela mesa, perguntou ao casal à sua frente:
__ E vocês duas, como se conheceram?
A pergunta aparentemente inofensiva da loira, deixou os três
apreensivos, se entreolhando, sem saber o que dizer. Depois de alguns
segundos que pareceram horas, foi Lorena que rompeu o silêncio
constrangedor, contando como a juíza e ela se conheceram, à sua maneira:
__ Nós nos conhecemos na minha faculdade, em um dia que a
Stela foi até lá para fazer uma palestra. Eu gostei tanto do que ela disse que
depois do encerramento, eu me aproximei para ouvi-la um pouco mais e foi
aí que nós marcamos um encontro para conversarmos mais sobre o assunto
e o resto vocês já sabem...
Lorena que já havia usado aquela estória fictícia com a sua mãe
evitando confrontá-la com a realidade, resolveu sacá-la novamente ali com
o mesmo objetivo, impedir que aquela jovem à sua frente ficasse assustada
com a família que ela pretendia integrar. Não que ela achasse que o que
havia acontecido entre eles era assim, tão assustador, mas resolveu
amenizar a situação para assegurar que aquele importante momento não
fosse estragado.
__ É verdade! Eu também estava lá ouvindo a palestra, né mãe?
__ Confirmou Enrico, sustentando a estória de Lorena, contribuindo para
que todos saíssem ilesos daquela situação embaraçosa.
__ É! __ Disse apenas Stela, sentindo-se constrangida por ter que
mentir, mais uma vez.
O restante do jantar transcorreu normalmente onde os quatro
conversaram sobre uma infinidade de assuntos e se fartaram da saborosa
comida servida ali. Após terminarem a comemoração, na saída do
restaurante, já no estacionamento, Stela aproveitou que as jovens se
afastaram para caminharem até os respectivos carros e deteve-se com
Enrico para dizer-lhe algumas palavras:
__ Meu filho, você não sabe o quanto eu estou feliz pela sua
vitória! Eu torço tanto por você... Eu quero tanto o seu bem... Eu te amo
Enrico e estarei sempre pronta pra te ajudar, nunca se esqueça disso!
__ Mãe, eu já sei de tudo isso que você está falando! Eu nunca
duvidei do seu amor. Saiba que ser o seu filho é uma grande honra pra mim.
Eu também te amo dona Stela!
Depois daquelas declarações de amor, os dois se abraçaram e a
juíza mais uma vez, veio às lágrimas, ela não conseguia se segurar, se sentia
frágil perto do filho que tanto amava.
__ Mãe, não chora, eu estou bem!... __ Disse o filho emocionado,
não conseguindo segurar as próprias lágrimas que também emergiram de
seus olhos.
__ Meu filho, eu ainda me sinto culpada... Perdoe-me mais uma
vez, por favor!
__ Mãe, não se sinta culpada, não nada o que perdoar!... Eu estou
feliz, acredite!... Eu gosto da Giovana. Não se sinta assim!... __ Enrico
tentava tirar aquela culpa da sua mãe, pois queria que ela ficasse bem, sem
nenhum peso na consciência que pudesse atrapalhar a sua felicidade.
__ Obrigada, meu filho!
__ O universo apenas me usou para colocar Lorena em sua vida,
eu tenho certeza disso! E acredite, eu sou feliz por tê-la levado até a você! É
assim que eu vejo as coisas hoje, tá bom!
O jovem abraçou mais uma vez a sua mãe, dando-lhe um beijo na
cabeça, carinhosamente e depois os dois caminharam abraçados até os
carros aproveitando os últimos instantes daquele encontro, já que estavam
prestes a se separar. Enrico não morava mais com Stela, agora ele tinha o
seu próprio apartamento, buscando assumir de vez a sua vida adulta e a sua
independência, como tem de ser as coisas. As jovens que assistiam a cena
protagonizada por mãe e filho, tiveram a certeza do imenso amor que os
unia.
__ Então é isso meu filho! Qualquer coisa que precisar, por favor,
me procure, tá bom! __ Disse novamente Stela, antes de abraçar o filho
mais uma vez, despedir-se da sua nova nora e entrar no carro para assim,
partir, na companhia de sua jovem mulher.
No caminho de volta para casa, depois de alguns minutos, ao
perceber que a juíza estava silenciosa e introspectiva, Lorena resolveu
puxar assunto:
__ O que foi? Está tão calada...
__ Eu ainda me sinto um pouco culpada com relação ao Enrico...
__ Stela amava tanto o seu filho que simplesmente não conseguia superar
por completo o que havia acontecido entre eles e agora que ele tinha se
mudado para o seu próprio apartamento, sentia a sua falta e ficava mal,
sempre que se encontravam para depois se separarem, dolorosamente.
__ Pra que se sentir culpada Stela, ele está bem! Ele tá
conseguindo buscar uma ascensão em sua carreira, está amando uma bela
mulher, por favor! Você tem que se sentir feliz por ele estar conseguindo ter
a sua própria vida! __ Lorena falava aquelas palavras para a juíza enquanto
acariciava os seus cabelos, ternamente. Para ela era evidente que a sua
mulher estava surtando mais uma vez, sem motivo algum.
__ Não sei... Eu ainda não consigo ficar totalmente bem depois do
que fiz com ele!...
__ Meu amor, você não fez nada! Fui eu que te escolhi porque eu
sou lésbica e era você que eu queria, entendeu? É você que eu quero! É
você que eu amo!
A juíza ouviu as palavras de sua jovem mulher, fitou-a por alguns
segundos e apanhou a sua mão para dar-lhe um beijo no dorso. Lorena era
assim, com meia dúzia de palavras ela conseguia colocar paz em seu
coração atribulado...
__ Eu também amo você Lorena!...
A moça se inclinou para dar um beijo no canto da boca da sua
mulher que permaneceu atenta naquela tarefa de conduzir o carro, mas que
se voltou um pouco para sentir o calor dos lábios macios da jovem.
__ Stela, e a nossa viagem de férias, você já sabe para onde
iremos? __ Perguntou Lorena, assim que voltou a se acomodar no banco,
mudando de assunto e ligando o som do carro, simultaneamente.
Imediatamente, a música Days da banda californiana No Vacation começou
a ser executada, preenchendo o ambiente com a sua deliciosa batida.
__ Eu estou pensando nas ilhas Maldivas ou Fernando de
Noronha, o que acha?
__ O quê? Stela!... __ A jovem se assustou com os locais
pretendidos por sua mulher. Nunca imaginou conhecer aqueles lugares tão
chiques, frequentados apenas pelas celebridades e pelas pessoas mais ricas
da sociedade.
__ O que foi? Já estou olhando os pacotes de viagem com
algumas empresas de turismo por aí.
__ Stela, não precisa ser um lugar assim, tão luxuoso! Nós
podemos ir para um local mais barato!...
A juíza sorriu e mais uma vez se sentiu presenteada pelos deuses.
A sua mulher além de linda, carinhosa, inteligente, espirituosa era
econômica, o que mais ela poderia querer?...
__ Lorena, férias é só uma vez por ano! Nós podemos nos dar
esse luxo!
É claro que podiam! A juíza tinha um alto salário e uma viagem
como a que estavam planejando, não a desfalcaria nem um pouco.
__ Você sabe que nós só poderemos viajar depois da virada do
ano, né? A minha mãe já nos intimou a passar o reveillon com ela. Não
teremos como fugir!
__ Ah não!... Eu terei mais uma dose da Leila?...
__ Ela te adora Stela! Toda vez que ela me liga, a primeira coisa
que ela pergunta é por você! Estou até começando a ficar com ciúmes,
acredita?
__ Não é irônico demais, você com ciúme de mim com a sua
mãe?
__ Sabe o que ela me perguntou da última vez?
__ Não, o que é?
__ Ela perguntou quando que a gente vai se casar!
__ Mas nós já não somos casadas?
__ Stela, eu estou falando de um casamento formal, com
cerimônia e tudo mais!
__ É sério?... E você iria querer?... __ Sondou a juíza dando uma
olhadela para a jovem, para captar a feição dela.
__ É claro que sim!...
Naquele momento, Stela se sentiu a mulher mais feliz do mundo,
por aquela moça mais linda e completa, querer se amarrar a ela daquela
forma. Mais uma vez ela teve aquela sensação de que o universo estava
conspirado a seu favor, não havia outra explicação.
__ E você... Quer?... __ Perguntou a jovem, também sondando a
juíza.
__ Nada me faria mais feliz!...
As duas mulheres apaixonadas se olharam por alguns segundos,
sentindo as batidas dos corações quentinhos, em uníssono, e tiveram a
certeza de que valera a pena todas as batalhas que elas tiveram que lutar
para viver aquele grande amor, que só se fortalecia... A cada dia... A cada
hora... A cada instante...
__ Eu já te disse que te amo?...
__ Sim, mas você pode dizer de novo...

FIM

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