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SANEAMENTO DO MEIO AMBIENTE

Sumário

1 Contextualização do tema 3

2 Mecanismos bioquímicos e autodepuração 5

3 Modelo de Streeter-Phelps 10

4 Balanço de massa e vazão 13

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Capítulo 1

Contextualização do tema

Saneamento Ambiental e seus desafios

A maioria das cidades é construída próxima de rios, lagos ou estuários porque esses ambientes
naturais contribuem com a sobrevivência das pessoas. Mas, estes ecossistemas aquáticos também são
utilizados como esgotos naturais e gratuitos. Seria desejável que as pessoas percebessem como medir
a necessidade de afastar, acondicionar adequadamente e descartar corretamente seus resíduos em rios e
mares. Porém, isso depende de interações entre gestores públicos, especialistas, atores da sociedade
civil, atores econômicos, mídias e políticos. Há um falso conforto, por parte dessas pessoas envolvidas,
por causa desses ecossistemas possuírem águas correntes (rios e riachos), que possibilita o descarte
indesejável dos resíduos humanos. No Brasil, esse comodismo compromete a condição sanitária e
piora a estética urbana de um grande número de municípios.

Em qualquer ecossistema a maior diferença entre os seres humanos e os outros seres vivos é que os
humanos são imprevisíveis. Todas as outras criaturas agem de acordo com regras de sobrevivência
bem estabelecidas. Por isso, os humanos necessitam de uma escolaridade básica rigorosa que possa
promover uma capacitação para associar os conteúdos das disciplinas ensinadas com uma sobrevivência
ética, sanitária e coletiva. Essa escolaridade deve acontecer desde a infância, para quando chegar na
fase adulta não ficar sozinha com o compromisso de adquirir o raciocínio crítico da ligação entre
ciência e vida. Deixar uma criança crescer sem envolvê-la em temas coletivos como saneamento e
saúde pública corre-se o risco de que em um futuro próximo sua atitude fique mais egocêntrica do
que ecocêntrica. O individualismo é inimigo da organização de ecossistemas. Seria viável que a
promoção da educação em saúde ambiental fizesse parte do conteúdo básico de todo currículo escolar
fundamental de forma universal, livre e gratuito, como questão de interesse para a sobrevivência da
espécie humana. Isso permitiria contribuir com a prevenção de doenças, com a redução da propagação
de vírus, fungos e parasitas, otimizaria o controle de epidemias e diminuiria a transmissão dos agente
contagiosos. Essa promoção escolarizada deveria acontecer de forma contextualizada com o local
de moradia das pessoas. A falta desta promoção destrói, em qualquer país, não apenas o seu sistema
econômico privado ou público, mas também a sua infraestrutura urbana ou rural.

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Deve-se considerar que dentro de um ecossistema aquático existem três grupos de seres vivos - os
produtores, os consumidores e os decompositores. Esses organismos interagem continuamente entre
si. Essas interações são consequências direta ou indireta das suas relações com a radiação solar, com
a fotossíntese e com os diversos nutrientes encontrados na Natureza. As interconexões são descritas
nos ciclos biogeoquímicos da biosfera. Por exemplo, o nitrogênio é formador das proteínas, como
também o fósforo, o potássio, o carbono, o enxofre, o ferro, o oxigênio e muitos outros elementos já
conhecidos na Tabela Periódica. O fósforo e o potássio estão presentes em formações minerais (solos e
rochas), o nitrogênio pode ser fixado por bactérias ou gerado por descargas elétricas atmosféricas. A
sobrevivência dos seres vivos depende de todos esses elementos (nutrientes) existirem em quantidades
corretas e oriundas de fontes naturais para o delicado equilíbrio dos ecossistemas. Inclusive, na
presença desses quantitativos em alimentos utilizados pelos humanos. Após os seres vivos utilizarem
esses nutrientes eles têm de ser devolvidos ao meio ambiente, mesmo que de outra forma, para entrar
na cadeia alimentar de todos novamente. Qualquer excesso, ou carência, ou incrementos artificiais
nesses elementos pode ser fatal para a sobrevivência dos humanos, ou das outras espécies.

Em ecossistemas aquáticos os seres produtores são assim chamados por produzirem seus próprios
alimentos nos processos de fotossíntese, por exemplo, as algas. Os organismos consumidores são
assim determinados pois necessitam, direta ou indiretamente, ingerirem os nutrientes fabricados pelos
seres fotossintetizantes (produtores). A devolução ao meio ambiente ocorre por intermédio dos seres
decompositores, que decompõem a matéria orgânica (resíduos excretados ou corpos mortos de outros
seres vivos). Nesse processo, eles oxidam a matéria orgânica como reciclagem natural formando novos
nutrientes. Esses seres decompositores são microrganismos que vivem no lodo do fundo da água, por
exemplo, as bactérias.

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Capítulo 2

Mecanismos bioquímicos e autodepuração

A influência humana em ecossistemas de águas correntes

Quando a matéria orgânica biodegradável é despejada no meio aquático, por exemplo, via efluente
de esgoto, ela é digerida pelos decompositores por mecanismos bioquímicos, mas as não biodegra-
dáveis são mortais para os seres vivos. Os decompositores chamados aeróbios respiram o oxigênio
dissolvido na água para oxidar os materiais orgânicos em suspensão na água limpa e competem com
os organismos dos outros dois grupos, produtores e consumidores. Conforme a matéria orgânica
(elementos nutrientes), continua a entrar por despejo de esgoto, os microrganismos decompositores,
por possuírem requisitos de sobrevivência mínimos, ganham a competição pelo uso do oxigênio
dissolvido na água e satisfazem seus metabolismos. Assim, pode ocorrer uma falta de oxigênio para
os outros grupos, os peixes, por exemplo, morrem e formam mais matéria orgânica em suspensão,
ou deposição, e a população dos microrganismos cresce mais rapidamente - exigindo mais oxigênio
para decomposições. Dessa forma, a matéria orgânica em excesso pode causar o que chamamos de
poluição aquática, que é o fim do oxigênio dissolvido na água. A redução do oxigênio dissolvido pelo
alto consumo dos decompositores prejudicam os seres produtores e consumidores. Isso coloca em
risco todo o ecossistema aquático e o ser humano perde a salubridade desse ambiente.

O Oxigênio Dissolvido (OD) na água é um dos principais indicadores da qualidade do ecossistema,


pois essa demanda é requisitada por todos os seres vivos deste ambiente aquático. Essa Demanda
Bioquímica de Oxigênio, (DBO), relaciona o organismo e a sua sobrevivência com o grau de poluição
de um corpo hídrico. Ao avaliar a DBO de rios, riachos e lagos saberemos quais seres estarão vivos
ou mortos. Por outro lado, quando o oxigênio dissolvido começa a ficar ausente, entram em cena
outros microrganismos, os chamados anaeróbios. Esses decompositores não necessitam de oxigênio e
liberam substâncias que conferem odor, sabor e aspectos indesejáveis à água. É o começo do fim de um
ecossistema aquático. Peixes e outros seres vivos de um corpo hídrico necessitam uma concentração
de oxigênio dissolvido entre 2mg/l e 4mg/l para existirem na forma de vida aeróbia superior.

A concentração de oxigênio dissolvido em rios e riachos depende de diversas variáveis, dentre


algumas, temos:

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1. As características dos despejos de esgotos dos diversos setores da sociedade, tais como a
concentração de resíduos suspensos nos efluentes de esgotos domésticos, industriais e comerciais
que podem conter misturas não biodegradáveis, tais como, detergentes, produtos de higiene,
produtos farmacêuticos entre outros;

2. As características dos corpos d’águas associadas à facilidade com que as cargas poluidoras são
misturadas neste meio, tais como a velocidade do fluido, a geometria do canal de escoamento,
inclinação do canal, difusão turbulenta etc.;

3. A produção de oxigênio dissolvido que pode ser originada pela produção de fotossíntese dos
organismos produtores e pela reaeração, que é a passagem do oxigênio atmosférico para dentro
do corpo d’água (interface ar-água).

Um corpo hídrico poluído por lançamento de matéria orgânica biodegradável, ou não, pode sofrer
um processo natural de recuperação chamado de autodepuração. Este fenômeno acontece por meio
de processos físicos, como diluição e sedimentação; químicos, como oxidação e biológicos, como
decomposições dos microrganismos aeróbios.

Em rios e lagos podem ocorrer excessos de nutrientes. Grande quantidade de nutriente ocasiona
o crescimento exagerado de algas. Esse processo é chamado de eutrofização. Embora a geração
de algas seja necessária para dar suporte à cadeia alimentar, a sua proliferação excessiva acarreta a
deterioração do corpo hídrico. Porém, os rios são raramente eutrofizados por possuírem águas correntes.
A principal diferença entre um rio e um lago é que o primeiro é continuamente "lavado"pelas águas.
Com relação ao fluxo da água, os rios e riachos são chamados de ecossistemas lóticos. Lagos e tanques,
que não possuem águas correntes, ou até mesmo um riacho com fluxo muito lento, são chamados de
ecossistemas lênticos.

No infográfico da Figura 2.1, as regiões anterior e posterior ao lançamento de matéria orgânica


biodegradável por um efluente estão associadas aos gráficos da concentração de OD e da DBO por
tempo, ou distância percorrida pela pluma de poluentes desde a fonte poluidora. Nesse gráfico é
possível observar a evolução das linhas que indicam o OD e a DBO por zonas de impactos à jusante.

Figura 2.1: Fonte: Imagem adaptada de Braga e outros. Introdução à Engenharia Ambiental. 2ª ed. São Paulo:
Pearson, 2005.

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As águas correntes de um rio podem ser caracterizadas, hidraulicamente, como um reator de fluxo,
tipo um pistão, como alusão ao instrumento musical de sopro. Essa estratégia de análise permite utilizar
o Cálculo Diferencial e Integral para aferir a taxa de crescimento, ou decrescimento, do oxigênio
dissolvido, ou seja, o potencial poluidor do efluente através da propagação da pluma de esgoto que se
desloca misturada com a correnteza do rio. Essa pluma caminha à jusante dependendo de fatores como
o tempo e a velocidade do fluxo da correnteza (figura 2.2).

Figura 2.2: Fonte: Imagem adaptada de Vesilind e Morgan. Introdução à Engenharia Ambiental. 2ª ed. São
Paulo: Cengage Learning, 2014.

Se considerarmos que nesse reator o fluxo (pistão) do efluente realiza uma reação, taxa de variação
do poluente com o tempo, de primeira ordem a matéria orgânica biodegradável despejada reagirá com
a água. Assim, a taxa de reação A, que caracteriza o consumo ou destruição do oxigênio utilizado
pelos organismos decompositores, pode ser expressa como:

dA
= − kA (2.1)
dt

Essa equação pode ser integrada entre A0 e A1 , t0 e t, assim :

Z A1 Zt
dA
=−k dt
A0 A t0

lnA − lnA 0 = − kt

A
ln = − kt
A0

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A − kt
= e
A0

− kt
A = A0 · e (2.2)

Onde,
A = quantidade qualquer de nutriente, normalmente necromassa,
A0 = quantidade qualquer logo após o lançamento.
dA/dt = taxa de reação,
k = constante da taxa de reação,
t = tempo.

Num ecossistema aquático as reações causadas pelo fluxo do pistão não param de ocorrer. Além da
reação de primeira ordem ocorrem reações de segunda ordem e outras sucessivamente. Numa segunda
reação, ou seja, a reação de segunda ordem, pode ser expressa como:

dA
= − kA2 (2.3)
dt

Z A1 Zt
dA
=−k dt
A0 A2 t0

1− 1
= kt (2.4)
A A0

As reações podem ser consecutivas envolvendo diversos materiais. A equação 2.1, que foi de
primeira ordem para um material poluente com taxa de degradação A, evoluiu para um resultado
com variação exponencial negativa (decrescimento do poluente ao longo da correnteza), que foi a
equação 2.2. A equação 2.3 foi de segunda ordem e evoluiu para um resultado mais complexo, que foi
a equação 2.4.

Numa situação mais real, com multiplos materiais, além de um poluente reagindo com a água,
podemos ter uma segunda reação de primeira ordem com relação a uma outra taxa de degradação
(outro poluente), que podemos chamar de B, a reação geral será:

dB
= k1 A − k2 B (2.5)
dt
Onde,

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k1 e k2 são constantes das taxas de reações das concentrações dos poluentes A, B, C etc., que
saem do efluente e se misturam na água limpa formando plumas misturadas que se movimentam no
sentido da corrente e diluem-se à jusante. Mas essa diluição dependerá do volume de água do rio e da
quantidade de poluente. Observa-se na equação 2.5 que a concentração de B está sendo formada a uma
taxa k1 A, por isso é positiva, enquanto a outra está sendo destruída a uma taxa k2 B, por isso é negativa.

Para obter o valor de B na equação 2.5 devemos integrar a expressão dB/dt, que fica como exercício
de cálculo para o leitor. Essa integração é importante para determinar o grau de poluição de um rio. O
resultado da integração produz a equação:

k1 · A0 − k1t − − k2t −
B= e e + B 0 · e k2 t (2.6)

k2 k1

Essa equação 2.6 foi utilizada por Streeter e Phelps para elaborar um modelo matemático que
mede a taxa de oxigênio dissolvido em um riacho. O déficit de oxigênio é B, sendo aumentada como
resultado do consumo de oxigênio pelos microrganismos e diminuída pela entrada de oxigênio na água
a partir da atmosfera e da fotossíntese que atuam como provedores da autodepuração do rio.

Esse modelo foi proposto inicialmente em 1925 por Harold Warner Streeter e Earle Bernard Phelps
(1876-1953) a partir de um estudo do processo de reoxigenação e desoxigenação no Río Ohio, nos
Estados Unidos, com base em dados obtidos desde maio de 1914 a abril de 1915.

Com esse arcabouço matemático do Cálculo I pode-se entender que quando um rio recebe efluente
de matéria orgânica biodegradável a ação simultânea de reoxigenação e desoxigenação formam o que
se denomina curva do oxigênio dissolvido (Figura 2.3), que será detalhado no próximo capítulo.

Figura 2.3: Fonte: Imagem adaptada de Vesilind e Morgan. Introdução à Engenharia Ambiental. 2ª ed. São
Paulo: Cengage Learning, 2014.

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Capítulo 3

Modelo de Streeter-Phelps

Processo de autodepuração de águas correntes

O modelo de Streeter-Phelps é um modelo matemático que possibilita avaliar o mecanismo que


define a taxa de variação do oxigênio dissolvido em um corpo hídrico quando recebe a descarga
de águas residuais, com decomposição de matéria orgânica e a aeração (reposição) de oxigênio por
fotossíntese e por penetração do oxigênio atmosférico. Esse modelo tem sido adaptado tanto para
fontes pontuais como para fontes difusas ou dispersas de poluentes.

A Figura 2.3 apresenta a forma da curva do oxigênio dissolvido como resultado da soma da taxa
de consumo do oxigênio pelos organismos, que é a desoxigenação, e a taxa de fornecimento por
fotossíntese e por penetração atmosférica através da interface ar-água, que é a reoxigenação. Se a taxa
de utilização for grande, como no trecho logo após a descarga da matéria orgânica biodegradável (com-
pare a Figura 1.1 com a Figura 2.3), o nível de oxigênio dissolvido cai porque a taxa de fornecimento
não pode acompanhar o uso de oxigênio pelos decompositores. Assim, um déficit é criado. O Déficit
(D) é definido como a diferença entre a quantidade máxima de oxigênio que a água limpa poderia
conter, ou seja, a Saturação (S), e a concentração (C) de oxigênio dissolvido na água do rio, assim:

D = S− C (3.1)

Onde,
D = déficit de oxigênio, mg/ l,
S = nível de saturação de oxigênio na água (o máximo de oxigênio que pode conter), mg/ l,
C = concentração de oxigênio dissolvido na água, mg/ l.

Na Figura 2.3 pode-se observar que após a alta taxa inicial de decomposição, quando a matéria
orgânica é decomposta pelos microrganismos decompositores, a taxa de utilização de oxigênio diminui
porque os materiais que menos se decompõem permanecem. Com o uso de tanto oxigênio, o déficit é
grande, mas o fornecimento de oxigênio da atmosfera é alto e começa acompanhar a utilização, que é
uma situação favorável para a autodepuração. Portanto, o déficit começa a ser reduzido e, mais uma
vez, atinge os níveis de saturação. Quando o déficit aumenta - começa a poluição.

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Esse processo foi analisado por Streeter e Phelps e descrito em termos de reações consecutivas,
como a equação 3.5. A taxa de utilização do oxigênio e a taxa de reabastecimento de oxigênio foram
expressas, na notação de Streeter e Phelps, da seguinte forma:

dD
= k1 z − k2 D (3.2)
dt

Onde z é a quantidade de oxigênio necessária para os microrganismos que estão decompondo a


matéria orgânica. k1 é a constante de desoxigenação e k2 é a constante de reoxigenação, D é o déficit
da concentração de oxigênio. A taxa de variação do Déficit (D) depende da concentração de matéria
orgânica a ser decomposta, ou da necessidade restante de oxigênio para os microrganismos (z). Pode-se
entender o Déficit em qualquer tempo t. Considerando z como a taxa proporcional de oxigênio para
ocorrer a decomposição em uma reação inicial de primeira ordem, podemos expressá-la por:

dz
= − kz (3.3)
dt
Z z1 Zt
dz
=−k dt
z0 z t0

lnz − lnz 0 = − kt

z
ln = − kt
z0

z − kt
= e
z0

− kt
z = z0 e (3.4)

Se z é a quantidade de oxigênio em qualquer tempo t, e z0 é a demanda bioquímica de oxigênio


final e, trocando a letra desta variável, fazendo z0 = L, e substituindo o valor de z, após esta troca, na
equação 3.4, e integrar esta equação, o resultado será:

k1 · L0 − k1t − − k2t −
D= e e + D 0 · e k2 t (3.5)

k2 k1

Essa é a chamada equação de Déficit de Streeter-Phelps.

onde,
D = déficit de oxigênio em qualquer tempo t, mg/l

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D0 = déficit de oxigênio imediatamente abaixo da localização do efluente de poluentes, mg/l
L0 = demanda final de oxigênio imediatamente abaixo da localização do efluente do poluente.

A maior preocupação quanto à qualidade da água é com o ponto na corrente aquática em que o
déficit é maior, ou seja, onde a concentração do oxigênio dissolvido é mínima. Essa análise pode
ser utilizada para estabelecer o grau de poluição de um rio ou riacho. Inclusive, pode ser utilizada,
também, para saber o grau de eficiência dos despejos dos efluentes das Estações de Tratamento de
Esgoto, ETE.

Sabe-se, por observação direta, que não adianta o tratamento do esgoto por uma ETE se o despejo
após a água residual ser tratada é num rio que está com sua biota morta. O rio precisa ser tratado antes,
para depois analisar se a carga do efluente será diluída pelas águas correntes (autodepuração) ainda
dentro do trecho municipal contemplado pelo saneamento. Assim, evitará morte do ecossistema, que
chamamos de poluição. Caso aconteçam despejos num rio já morto, os gestores públicos contribuirão
com amplificações para a destruição do sistema hidrológico dessa região. Esse fato é muito comum em
comunidades na Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro, e em outras periferias de centros urbanos.
A sociedade deve participar das ações do governo sobre a construção de uma ETE no seu bairro e
receberem incentivos (materiais, mão-de-obra etc.) para conectarem seus efluentes aos novos troncos
coletores instalados, pois na maioria dos casos essas obras acontecem em bairros cujas pessoas são
mais desfavorecidas socioeconomicamente e sozinhas não teriam condições de arcar com as despesas
para conectar com tubulações os seus lares ao novo sistema de saneamento instalados pelo poder
público.

Além disso, a equação 3.5, de Streeter-Phelps, permite também avaliar em que condições as espécies
(biota) ficariam vivas nos rios ou riachos após despejos dos efluentes de esgotos. A existência de
microrganismos nos rios e riachos qualifica sanitariamente a existência de seres vivos em ecossistemas,
inclusive a do humano, pois todos os organismos vivos fazem parte da cadeia alimentar de todo o
trecho urbano, ou rural, cortado por rios e riachos. Deve-se observar que todo corpo hídrico contribui
com a cadeia alimentar de sua região. A rede hidrológica está associada com a saúde coletiva.

Se na equação 3.5 for definido dD/dt = 0, que é a condição de máximo e mínimo do Cálculo,
poderá ser realizado o processo matemático de integração e obter uma equação resultante que avalia
o ponto em que a curva do oxigênio dissolvido chega ao mínimo e começa a subir (a integração fica
como exercício). A equação resultante dessa integração permite avaliar esse momento crítico de um
rio à jusante, o resultado da integração será:

− D0 (k2 k1 )
1 · k2 −
t= ln 1 (3.6)
k2 − k1 k1 k1 · L0

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Capítulo 4

Balanço de massa e vazão

Entrada e saída em sistemas áquaticos

Seria desejável, baseado no modelo de Streeter-Phelps, que a vazão da descarga do poluente pudesse
ser muito pequena comparada com a vazão do rio. Porém, nem sempre isso acontece. O volume de
descarga dos poluentes, na maioria das cidades brasileiras, não está permitindo autodepuração de seus
rios urbanos. Mas se fosse verdadeiro, o primeiro ponto limpo no rio abaixo do ponto de descarga teria
o mesmo déficit que no ponto antes da descarga do efluente, autodepuração perfeita. O balanço de
cargas sobre o pistão no ponto de descarga do efluente, em t=0, na figura 2.3, apresenta uma mistura
das vazões do rio e da descarga do poluente.

Ao compararmos a figura 2.3 com a figura 4.1, e denominarmos vazão como Q e concentração
como C, observa-se que no ponto de descarga, ponto 0, a vazão da corrente de água do rio à montante
e a sua concentração de oxigênio dissolvido à montante são QM e CM , respectivamente, e o efluente de
poluição tem vazão e concentração de oxigênio dissolvido QP e CP . À jusante, denominam-se a vazão
como QJ e a concentração como CJ . Já misturadas.

Figura 4.1: Fonte: Imagem adaptada de Vesilind e Morgan. Introdução à Engenharia Ambiental. 2ª ed. São
Paulo: Cengage Learning, 2014.

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O balanço de massa é como a conservação de energia aplicada à Equação da Continuidade, para
entender o que ocorre com as vazões diferenciadas do rio, do efluente e da vazão misturada de água
limpa do rio com a do efluente, em um processo de diluição dos poluentes até uma autodepuração.
Para isso utilizaremos o conceito de caixa-preta. Essas caixas são representações esquemáticas de
processos reais ou cruzamentos de fluxos, assim:

[ENTRADA] = [SAÍDA]

Entrada =⇒ ■ =⇒ Saída

QM + QP = QJ (4.1)

Em outras palavras, a concentração de oxigênio na vazão à jusante da fonte de poluição é uma


combinação da concentração de oxigênio na vazão à montante da descarga com a concentração de
oxigênio na vazão do efluente. Uma vez que o déficit é igual a D = S − C, o déficit inicial D0 deve ser
uma combinação do déficit na vazão à montante , DM , e do déficit do Poluente, DP .

Onde,
D = déficit de oxigênio em qualquer tempo t,
D0 = déficit de oxigênio da vazão imediatamente abaixo da localização do efluente de poluentes,
DM = déficit de oxigênio da vazão à montante (déficit de saturação DS ),
QM = fluxo à montante,
CM = concentração de oxigênio à montante,
QP = fluxo da fonte poluidora,
CP = concentração da fonte poluidora,
QJ = fluxo à jusante,
CJ = concentração de oxigênio à jusante.

Antes de prosseguir com a interpretação do infográfico apresentado na figura 4.1, deve-se esclarecer
quais são as diferenças importantes no Brasil sobre o que é um fluxo, ou seja, quando ele é vazão e
quando ele é carga. Em processos de engenharia o fluxo pode ser gravimétrico (massa) ou volumétrico
(volume). O primeiro se expressa em kg/ s e o segundo em m3 / s. No Brasil, o fluxo gravimétrico é
chamado de carga e o fluxo volumétrico é chamado de vazão.

Esses dois fluxos são interdependentes. A massa de um material que passa por um trecho de um
rio durante um intervalo de tempo se relaciona com o volume desse material pela equação:

M
ρ=
V

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Onde,
ρ = massa específica, kg/ m3
M = massa, kg
V = volume m 3 .

Assim, no Brasil, a vazão seria Qvolumetrico


´ e a carga seria Qmassico
´ . A concentração pode ser
definida como uma massa específica, do seguinte modo:

Qmassico
´
C=
Qvolumetrico
´

Então,

Qmassico
´ = Qvolumetrico
´ ·C

Por isso chamamos de balanço de massa. As diferentes vazões na figura 4.1, ou seja, o balanço
no ponto de despejo do poluente será um balanço em termos de vazão e concentração, que pode ser
escrito como:

QMCM + QPCP = QJCJ

Se QJ = QM + QP , temos para a concentração de oxigênio na mistura à jusante entre a água do rio


e o efluente, a seguinte equação:

QMCM + QPCP
CJ = (4.2)
QM + QP

Observe que a equação 4.2 do balanço de massa indica que se a vazão do poluente chegar a ser
zero, QP = 0, a concentração de oxigênio à jusante será igual a concentração de oxigênio do rio antes
do despejo do poluente.

Por outro lado, o nível de oxigênio em água limpa corrente depende da temperatura da água antes e
depois do despejo do poluente. Vários estudos são realizados para determinar esta dependência de
forma empírica. A tabela apresentada no infográfico 4.2 mostra a relação do oxigênio dissolvido com
várias temperaturas.

Essa tabela mostra que quanto mais "quente"for a água menos seres vivos (microrganismos -
flora e fauna) ela terá, pois diminui a concentração de oxigênio dissolvido. O aquecimento dos
ecossistemas aquáticos é uma das preocupações com relação ao desequilíbrio climático global, porque
esta crise ecológica faz aumentar a temperatura média do planeta e se soma com a degradação de rios e

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Figura 4.2: Fonte: Imagem adaptada de Vesilind e Morgan. Introdução à Engenharia Ambiental. 2ª ed. São
Paulo: Cengage Learning, 2014.

mares. Os despejos não controlados de efluentes também interfere na temperatura dos corpos hídricos
amplificando a crise ambiental em curso.

Uma vez que a concentração de oxigênio dissolvido da mistura de água limpa com águas residuárias,
depois do despejo, ou seja, à jusante, foi determinada conforme a equação 4.2, a temperatura da água
da mistura à jusante pode ser calculada utilizando-se a seguinte equação:

QM TM + QP TP
TJ = (4.3)
QM + QP

O valor da saturação do oxigênio à jusante, S0 em um T0 , pode ser encontrada na Tabela da figura


4.2. O déficit inicial, ver infográfico 4, é então calculado como:

D0 = S0 − C0

Da mesma forma, o rio também pode ter uma Demanda de Oxigênio dissolvido, DBO, à jusante
do ponto de despejo do efluente. Supondo que a mistura fique completa, a DBO à jusante deve ser
calculada por:

LM QM + LP QP
LJ = (4.4)
QM + QP

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Onde,
LJ = demanda final de oxigênio abaixo do despejo do efluente,
LM = demanda final de oxigênio da água antes do despejo do efluente,
LP = demanda final de oxigênio do poluente despejado.

Além disso, deve-se ressaltar que, uma importante fórmula popular generalizada para avaliar a
contante de reoxigenação do modelo de Streeter-Phelps e suas relações com a temperatura da água, a
velocidade do fluxo e a profundidade média de um canal, pode ser dada por:
/ − /
3, 9.v1 2 .[1, 025(T 20) ]1 2
k2 = (4.5)
H 3/ 2

Onde,
T = temperatura da água, ◦ C
v = velocidade média da corrente, m/s
H = profundidade média da vazão, m.

O termo correspondente à temperatura representa a variação da taxa da temperatura, os termos H e


v descrevem a energia cinética no rio e a facilidade de transporte de O2 em razão da profundidade da
água. Um meio alternativo de obter os valores para k2 é a utilização, segundo O’Connor e Dobbins, de
1958, dos seguintes valores empíricos para 20◦ C dias − 1 :

Onde
pequenos córregos = 0,1 a 0,23
pequenos rios com baixa velocidade = 0,23 a 0,35
grande rios, velocidade lenta = 0,35 a 0,46
grande rios, velocidade normal = 0,46 a 0,69
rios muito rápidos = 0,69 a 1,15
corredeiras = 1,15.

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Referências Bibliográficas

[1] VESILIND, P. Aarne. Introdução à Engenharia Ambiental. São Paulo: Editora Cengage Learnig,
2014

[2] MIHELCIC, James R. ; ZIMMERMAN, Julie B. Introdução à engenharia ambiental: funda-


mentos, sustentabilidade e projetos. Tradução Ramira Maria Siqueira da Silva. Rio de Janeiro:
Editora LTC, 2018.

[3] BRASIL. Ministério da Saúde. Fundação Nacional de Saúde. Manual de Saneamento / Ministério
da Saúde, Fundação Nacional de Saúde. – 4. ed. – Brasília : Funasa, 2015.

[4] BRAGA, Benetido et al. Introdução à engenharia ambiental: o desafio do desenvolvimento


sustentável. 2ª ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2005.

[5] VON SPERLING, Marcos. Introdução à qualidade das águas e ao tratamento de esgotos. 4ª ed.
Belo Horizonte: Editora UFMG, 2014.

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