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TERCEIRIZAÇÃO
Ângelo Márcio Pinto Leite
Professor Adjunto da UFVJM
Amaury Paulo de Souza
Professor Titular da UFV
Carlos Cardoso Machado
Professor Titular da UFV

Introdução
A nova ordem mundial, baseada na abertura do mercado e
globalização da economia, tem levado as empresas brasileiras a
mudanças radicais de estrutura (reestruturação produtiva), dada à
necessidade de ajustamento a padrões internacionais de produtividade,
qualidade e custo e elementos básicos da competitividade.
A reestruturação produtiva nas empresas está ocorrendo
principalmente em virtude da introdução de inovações tanto
tecnológicas como organizacionais e de gestão, buscando alcançar
uma forma de trabalho integrada e flexível. Nesse sentido, as
empresas estão desenvolvendo e implementando diferentes modelos
de gestão e de estruturas organizacionais, a fim de modificar suas
formas de produzir e, ou, de prestar serviços.
É dentro desse contexto que a terceirização surgiu e vem
ganhando força, como alternativa para as empresas racionalizarem
recursos, redefinirem suas operações e funcionarem com estruturas
mais enxutas e flexíveis. A terceirização está se fixando como
424 Leite, Souza e Machado

eficiente prática de flexibilidade organizacional e de racionalização de


recursos, possibilitando às empresas atualizar e, ou, reestruturar o
processo produtivo, com vistas a tornarem-se mais competitivas.
De acordo com Giosa (1996), a modernização das empresas,
entendida como a somatória dos conceitos de qualidade,
produtividade, agilidade, baixo custo operacional e alta capacidade
concorrencial, tem na terceirização uma de suas principais
ferramentas, à medida que esse processo permite a concentração de
esforços e recursos na atividade principal da organização e da
contratação de serviços especializados para tarefas acessórias.
A terceirização tem se tornado, portanto, uma tendência atual
das empresas de variados portes e segmentos, para sobreviverem a
ambientes de alta competitividade. Particularmente no setor florestal
brasileiro, essa ferramenta tem sido amplamente adotada, tornando-se
um processo quase irreversível.
Implementar a terceirização requer a elaboração de um projeto
criterioso, que deve ser coordenado por profissionais qualificados, a
fim de evitar resultados negativos e, ou, frustrações. É um processo
complexo que acarreta mudanças profundas nas partes envolvidas e,
portanto, seus resultados devem ser avaliados com bastante cuidado.

Caracterização

Conceitos e definições
De acordo com Brasil (1993), terceirização corresponde a um
processo de transferência, dentro da firma (empresa-origem), de
funções que podem ser executadas por outras empresas (empresa-
destino). Essas funções incluem tanto atividades de apoio quanto
aquelas relacionadas diretamente com o processo de produção da
firma.
Segundo Cappo (1996), terceirizar é transferir para terceiros
atividades que não fazem parte do negócio principal da empresa.
Do ponto de vista jurídico, terceirização é uma forma de
flexibilização administrativa, que trata genericamente de
Terceirização 425

subcontratação, a qual poderá tomar a forma de prestação de serviços,


contrato de empreitada e contrato de fornecimento.
Para Giosa (1999), terceirização é um processo de gestão pela
qual se repassam algumas atividades para terceiros, estabelecendo
uma relação de parceria, ficando a empresa concentrada apenas em
tarefas essencialmente ligadas ao negócio principal em que atua.
Desses conceitos, o último parece o mais apropriado, visto que
cita duas palavras-chave que expressam claramente o verdadeiro
significado da terceirização:
- Parceria = par = casamento, referindo-se a uma reunião de pessoas
distintas com interesse comum (indica reciprocidade = troca).
- Processo de gestão, mostrando o enfoque com o qual a terceirização
deve ser encarada e não simplesmente como um novo modismo
administrativo.
Pode-se dizer que a terceirização corresponde a um processo de
gestão participativa, que envolve uma decisão estratégica de a
empresa-origem repassar algumas atividades não-estratégicas para
prestadores de serviço executar.

Histórico
O termo "terceirização", do inglês outsourcing (out = externo,
fora e source = fonte, lugar de origem, ou seja, compra de produtos e
serviços externos), originou-se nos Estados Unidos no início da
Segunda Guerra Mundial e consolidou-se por volta da década de 50.
Nessa época, a técnica administrativa de terceirização foi
desenvolvida e adotada primeiramente com sucesso pelas indústrias
automobilísticas americanas e, posteriormente, pelos japoneses e
europeus.
Segundo Leiria (1995), o processo da terceirização no Brasil foi
introduzido no final da década de 80 e início de 90, quando da
abertura do mercado pelas multinacionais de automóveis, que,
buscando agilidade, transformaram-se em meras montadoras
intencionalmente dependentes da produção de peças entregue a outras
inúmeras empresas.
Cabe ressaltar, no entanto, que o termo foi utilizado pela
primeira vez em meados da década de 80, pelo engenheiro Aldo Sani,
426 Leite, Souza e Machado

da Riocell S.A.. Destaca-se ainda que, apesar de o termo ter surgido


somente nessa época, as empresas brasileiras já trabalhavam com
subcontratação há bastante tempo, com prestadores de serviço,
empreiteiros, consultores etc.

Evolução
Nos países desenvolvidos, a terceirização foi adotada pelas
empresas com o intuito de tornar suas estruturas administrativas mais
enxutas, flexíveis e ágeis. As atividades por elas consideradas
secundárias eram transferidas ou distribuídas a prestadores de serviço,
com o objetivo de centrar esforços no seu negócio principal (obtenção
do produto final).
No Brasil, além da preocupação com a transferência de
atividades secundárias, as empresas encontraram uma brecha para
reduzir custos, principalmente os custos fixos e de mão-de-obra, visto
que estariam isentas de pagar os encargos sociais e, ou, benefícios
extras concedidos aos trabalhadores.
Foi principalmente na última década, quando da abertura de
mercado, globalização da economia e estabilização da moeda, que a
terceirização realmente ganhou maior destaque no Brasil.
Ressalta-se que tendo sido utilizada inicialmente mais em
situações de emergência e, ou, para reduzir custos de produção, a
terceirização está sendo considerada cada vez mais nos últimos
tempos, como uma estratégia de negócio, conforme mostra a figura
15.1.
Terceirização 427

Passado Hoje

1989 2002

CRISE QUALIDADE ESTRATÉGIA


- Contratações de - Flexibilidade - Focar investimentos e
emergência - Acesso a especialistas tempo na atividade-fim(core,
- Redução de custos - Melhoria de serviços business)

Figura 15.1 – Evolução da Terceirização

Razões da terceirização
As empresas estão terceirizando porque na legislação brasileira
não existe nenhum impedimento legal para a adoção da verdadeira
terceirização. Do ponto de vista jurídico, a terceirização é considerada
uma atividade lícita inerente à administração de uma empresa, visto
que "a Constituição Federal não abriga qualquer dispositivo que vede
tal tipo de negócio jurídico e, por via de conseqüência, inexiste Lei
ordinária que proíba semelhante operação" (SAAD, 1993). Cabe
destacar que, atualmente, essa matéria é disciplinada pelo enunciado
331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que livra o tomador do
vínculo, regulamenta a terceirização nas atividades-meio, cria a
responsabilidade subsidiária do tomador e o exclui da lide quando não
tiver sido citado no título executório.
As empresas também terceirizam, porque os tabus estão caindo
e, atualmente, até mesmo setores antes considerados estratégicos,
como o de recursos humanos, informática, telemarketing e mesmo o
financeiro, estão sendo repassados para prestadores de serviço.
Do ponto de vista das contratantes, há outras razões para se
terceirizar:
• focalizar as áreas que geram vantagem competitiva;
• possibilitar melhoria da qualidade nas atividades não-essenciais;
• ter acesso a novas tecnologias, sem arcar com os custos financeiros;
• assegurar acesso a recursos qualificados;
• compartilhar riscos operacionais e financeiros com um terceiro; e
428 Leite, Souza e Machado

• reduzir custos a longo prazo.


Uma pesquisa do Centro Nacional de Modernização, realizada
entre 1998 e 1999, com 2.850 empresas brasileiras, mostrou que
terceirizar é uma forma de reduzir custos das atividades em até 50%.
Também apresentou o seguinte perfil das empresas: 61% terceirizam
ou já adotaram o sistema em alguma atividade; 57% introduziram a
terceirização por iniciativa própria; 71% obtiveram sucesso absoluto
nos resultados; 63% terceirizam em momentos e setores diversos,
segundo as necessidades; e 27% escolheram ex-funcionários como
parceiros.
Uma vez que a terceirização é um processo legal e irreversível,
o Ministério do Trabalho deveria atuar mais para fiscalizar e punir os
casos de fraude, com o intuito de proteger o trabalhador de possíveis
prejuízos ou danos.

O Processo de Terceirização

Requisitos Preliminares
Antes de se pensar nas etapas a serem seguidas durante a
implementação de um processo de terceirização, é fundamental que a
empresa esteja consciente e segura da vontade de adotar essa
ferramenta, isto é, que esta seja a melhor solução.
Estando a empresa-origem decidida a adotar a terceirização, é
preciso haver uma preparação de todos os envolvidos, dada a grande
mudança cultural interna que ocorrerá. Assim, o envolvimento, bem
como o comprometimento de todos com o processo, é fundamental,
pois uma empresa é tida como um conjunto de processos interligados
e voltados a obter resultados comuns.
A terceirização deve ser encarada com bastante seriedade e
cuidado, pois, se o processo não der bons resultados, é difícil voltar ao
status anterior.
Terceirização 429

Etapas a Serem Seguidas


Basicamente, segundo Lacerda e Costa (2000), são estas as
principais etapas a serem cumpridas num processo de terceirização:

Fase 1 - Estudo de viabilidade


Análise custo-benefício
Diagnóstico da situação atual
Análise de barreiras e facilitadores
Planejamento do projeto de terceirização
Definição do escopo

Fase 2 - Desenho
Definição da localização
Desenho de processos
Definição da estrutura
Definição de sistemas e tecnologia
Nível de serviço acordado
Plano de implantação

Fase 3 - Implantação
Preparação da infra-estrutura
Implantação de sistemas
Movimentação de pessoal
Treinamento

Fase 4 - Migração para o sistema de terceirização

Fase 5 - Acompanhamento
Acompanhamento durante o período de estabilização da estrutura
Ajustes finos em processos, sistemas, estruturas e pessoas
Mensuração dos benefícios
430 Leite, Souza e Machado

Melhoria contínua

A observação e o seguimento dessas etapas tendem a garantir o


sucesso do projeto de terceirização, bem como proporcionar os
benefícios esperados pela organização.

Cuidados e Riscos Potenciais


Apesar de a terceirização ser uma realidade e ter tido ampla
aceitação no Brasil e no mundo, há evidências e registros de casos em
que, por razões diversas, os resultados deixaram a desejar, com
situações de constrangimento entre as empresas envolvidas (Souza et
al., 1999).
Para o sucesso da terceirização, além de um planejamento
adequado de implantação do processo, outros cuidados especiais
devem ser levados em consideração, como:
• definir claramente os objetivos da terceirização;
• contratar sempre uma pessoa jurídica para executar o serviço;
• estabelecer um termo contratual;
• não contratar por prazo indeterminado, especificar o volume e exigir
qualidade e resultado do serviço que vier a ser contratado;
• adotar um critério técnico para a seleção das empresas prestadoras
de serviço, ou seja, seguindo preferencialmente as seguintes etapas:
definição do escopo, lista de potenciais parceiros, solicitação de
proposta comercial, tratamento das propostas, avaliação da
capacidade dos terceiros, negociação e elaboração do contrato;
• estabelecer o tipo de serviço a ser executado e o nível desejado;
• manter sempre um relacionamento profissional com as partes;
• definir a forma de gerenciamento a ser adotada;
• estabelecer como será feito o monitoramento (qualidade operacional,
exigências ambientais e sociais etc.);
• avaliar a capacidade financeira do terceiro para manter a
regularidade e a sustentação dos serviços contratados; e
• cumprir sempre as normas contratuais.
Terceirização 431

Os principais riscos que as empresas contratantes poderão estar


sujeitas na adoção da terceirização relacionam-se a:
• problemas de qualidade nos produtos e serviços terceirizados;
• descontinuidade da prestação de serviços por motivos diversos e
pelo surgimento de concorrentes, caso seja terceirizada a fabricação
de produtos;
• inadimplência dos contratos de fornecimento por parte dos
fornecedores dos produtos ou serviços, o que gera uma série de
conseqüências adversas para a empresa, particularmente quando o
fornecedor terceirizado for único;
• possível defasagem tecnológica do terceiro, em relação à empresa
contratante;
• conflitos devido à falta de ajustamentos dos terceiros aos padrões de
conduta e aos procedimentos de trabalho vigentes na empresa
contratante;
• resistências e conservadorismos internos, dificultando a coordenação
dos contratos e das atividades;
• conflitos com a sociedade e com os sindicatos, quando não
respeitados os direitos trabalhistas; e
• ações trabalhistas contra a empresa movidas por ex-empregados que
se sentirem prejudicados por terem mudado a natureza do vínculo
ou quando os serviços foram terceirizados através de uma empresa
criada por ex-funcionários e agravados quando se mantêm essas
pessoas nas mesmas funções ora terceirizadas.
Em suma, o sucesso da terceirização dependerá de um projeto
consistente e bem elaborado que englobe definição clara dos objetivos
e das metas a serem atingidos; escolha do parceiro certo; bom contrato
de prestação de serviço; e avaliação e monitoramento constante dos
resultados.

Sugestões para Terceirizar


A seguir, algumas sugestões que poderão orientar ou auxiliar os
gerentes quando da adoção da terceirização:
432 Leite, Souza e Machado

• terceirização depende de um embasamento teórico que deve contar,


preferencialmente, com assessoria de experts ou consultores;
• os objetivos e as metas da terceirização precisam estar muito bem
definidos;
• adoção da terceirização apenas com o objetivo de redução de custos
tende a dar errado;
• a empresa contratante precisa ser um exemplo congruente de
produtividade, organização, assertividade etc., para que o terceiro
possa desempenhar adequadamente o seu papel;
• valor moral é mais importante do que a parte jurídica;
• o que mais dificulta o processo de terceirização não é a parte técnica,
mas o envolvimento de todos em um ambiente de sinergia (CO-
LABOR-AÇÃO);
• cuidado com os contratos-padrão ou com cláusulas muito
específicas;
• as alternativas na gestão dos terceiros, a exemplo da quarteirização,
como solução ágil e enxuta, devem ser utilizadas;
• o controle do processo precisa ser contínuo devendo-se adotar
indicadores de desempenho quantitativos e, principalmente,
qualitativos; e
• as exigências legais têm que ser cumpridas, pois é bem mais oneroso
pagar na justiça.

Principais Desafios
O sucesso da terceirização depende da superação de alguns
desafios. Por exemplo:
• mudança comportamental dentro da empresa contratante (aceitação
do processo);
• equalização das culturas empresariais (interfaces);
• gerenciamento das mudanças com relação ao tomador e prestador de
serviço);
• monitoramento contínuo do processo;
• estabelecimento de critérios de avaliação justos e confiáveis; e
Terceirização 433

• confiabilidade do gerenciamento do processo a uma empresa


especializada (quarteirização).
Vale mencionar que o principal objetivo da quarteirização é
gerenciar as prestadoras de serviço, haja vista que muitas empresas
confundem terceirização com abandono. Procura-se, por intermédio
desse processo, ampliar o envolvimento e o controle da empresa
contratante sobre seus terceiros, contando com a colaboração de
firmas altamente especializadas.

Aspectos Econômicos e Sociais

Aspectos Econômicos
Apesar de alguns artigos tentarem mostrar que a terceirização
foi introduzida no Brasil como parte do processo de reestruturação
produtiva, para Ramalho (1993), esse processo vem sendo adotado
como forma de resolver os problemas conjunturais das empresas, por
meio da redução de custos, principalmente custos fixos e de mão-de-
obra. Aliado a isso, a terceirização tem proporcionado redução do
número de empregos e precarização das condições de trabalho.
Na visão das entidades sindicais e dos críticos desse processo,
muito mais do que tornar as empresas competitivas, o objetivo
principal da terceirização tem sido reduzir os custos com mão-de-obra
via transferência do pagamento de encargos sociais e demais
benefícios para os terceiros. Além disso, o custo fixo da empresa-
origem é reduzido, devido ao repasse de máquinas e equipamentos
para os terceiros, bem como pela redução de certos investimentos,
como infra-estrutura, treinamento de pessoal etc. (Brasil, 1993).
No Quadro 15.1 são apresentados alguns resultados advindos da
implementação do processo de terceirização em diversas empresas.

Quadro 15.1 - Ganhos obtidos por algumas empresas com a adoção do


processo de terceirização
Empresas O Que Terceirizaram Ganhos
Villares (SP) Fabricação de parafusos, pinos, porcas, Redução de 15% no custo de
transformadores, montagem de placas produção e ganho de 36% na área
e serviços de serralharia física da fábrica
434 Leite, Souza e Machado

Xerox (RJ) Produção de peças para copiadoras da Aumento da capacidade de


fábrica de Vitória – ES produção de 16 para 25 máquinas
Inepar (PR) Montagem de placas eletrônicas, Duplicação da capacidade produtiva
usinagem e ferramentas sem grandes investimentos
Autolatina Fabricação de assentos, chicotes Redução de 10 a 50% nos custos de
(SP) industriais e molas helicoidais produção nesses componentes
Philips (SP) Produção de plásticos e de Redução de 10 a 15% nos preços
componentes eletrônicos básicos dessas peças

Continua...

Quadro 15.1 – Cont.


Empresas O Que Terceirizaram Ganhos
Riocell (RS) Serviços administrativos, manutenção, Diminuição de US$100 no custo da
extração e transporte de madeira tonelada de celulose
Perdigão (SC) Manutenção de frigoríficos e Economia mensal de US$250.000 e
transporte de produtos desmobilização de US$1,6 milhão
Shell (RJ) Processamento de dados Economia anual de US$ 1 milhão
Santa Marina Distribuição e montagem de produtos Duplicação de volume de vendas e
(SP) domésticos redução da dependência de grandes
atacadistas
Localiza (MG) Manutenção de veículos e contratação Economia de US$200.000 mensais
de motoristas e eliminação da ociosidade de 50%
dos motoristas
Cibié (SP) Fabricação de 25 componentes de Redução de até 50% nos preços dos
faróis para automóveis itens e queda para menos de 1% no
índice de rejeição
Lupo (SP) Produção de modelos mais simples de Redução do custo da dúzia de pares
meia de meia de US$ 9 para US$8,65
Fonte: CASTANHEIRA (1992)

A terceirização não gerou apenas resultados positivos,


conforme pode ser constatado no Quadro 15.2.

Quadro 15.2 - Perdas obtidas com a adoção do processo de


terceirização
Empresas O Que Terceirizaram Perdas
Localiza (MG) Processamento de dados para 1 milhão de dólares de prejuízo
emissão de faturas de clientes devido a atrasos na emissão das
faturas
KSB bombas Áreas de apoio ao chão de Falência devida à falta de
hidráulicas fábrica qualidade e cumprimento dos
Terceirização 435

prazos de entrega
Fonte: SINDICATO... (1993)

A decisão de adotar a terceirização necessita não somente de


uma rigorosa avaliação de viabilidade econômica do processo mas,
também, da consideração de outros aspectos importantes como
qualidade, aceitação interna do processo, garantia de continuidade dos
serviços, investimento em novas tecnologias por parte do terceiro etc.

Aspectos Sociais
Ressalta-se que são justamente os aspectos sociais que têm sido
o alvo da maior parte das críticas ao processo de terceirização,
particularmente de entidades sindicais e, ou, alguns juristas e
advogados do trabalho.
De acordo com Beltran (1997), as principais críticas e, ou,
distorções que têm sido embutidas ao processo de terceirização
correspondem a:

Plano individual:
• fraude aos direitos trabalhistas ou falsas terceirizações, por meio da
contratação de empresas "picaretas" que não respondem pelos
direitos regularmente assegurados aos trabalhadores;
• rebaixamento do padrão salarial e de benefícios do trabalhador;
• inobservância das normas de segurança do trabalho;
• transferência de passivos trabalhistas; e
• transferência de riscos do negócio ao terceiro e seus contratados.

Plano das relações coletivas:


• pulverização e desmobilização da ação sindical;
• redução do número de empregos;
• obstáculo na ação direta, sobretudo os movimentos grevistas;
• precariedade nas condições de trabalho; e
• falta de garantia dos direitos trabalhistas.
436 Leite, Souza e Machado

A Terceirização no Setor Florestal


Aspectos Gerais
A prestação de serviços no setor florestal é comum desde a
década de 60, com o início das atividades de reflorestamento no
Brasil, principalmente na forma de empreitada. A partir de 1976,
iniciou-se a transferência da atividade de transporte da madeira para
prestadores de serviço (caminhoneiros autônomos ou empresas
transportadoras) e, no início dos anos 80, o processo ganha força em
outros setores como o transporte de funcionários, manutenção de
máquinas e serviços de limpeza e de alimentação etc.
A Riocell S.A. foi quem introduziu o termo "terceirização" no
Brasil em 1987, iniciando o processo nos setores de alimentação,
limpeza, transporte, segurança e manutenção predial. Na década de
90, quase todas as atividades de silvicultura e colheita de madeira
dessa empresa estavam terceirizadas e, atualmente, até mesmo o setor
de recursos humanos foi entregue a terceiros.
Nos últimos anos, quase todas as empresas do setor florestal
brasileiro terceirizam ou já terceirizaram alguma atividade, apesar de
não se conhecer ainda com precisão o percentual de adeptos desse
processo, o número exato de empresas prestadoras de serviço, o
percentual de mão-de-obra própria e de terceiros, o perfil desses
trabalhadores etc. A razão dessa falta de informação deve-se ao
pequeno número de pesquisas realizadas no setor relacionadas a essa
área.

Cuidados para o Sucesso


De acordo com Leite (1999), as observações de campo e a troca
de informações entre profissionais das empresas indicam que, na
maioria dos casos, os principais problemas relacionados à
terceirização são decorrentes das seguintes situações:
• seleção inadequada de terceiros: via de regra, quando o critério de
seleção baseia-se exclusivamente no preço dos serviços contratados,
o risco de insucesso é muito grande. Essa situação, aparentemente
absurda, ainda é adotada em muitas empresas. Tal dificuldade
Terceirização 437

poderá ser minimizada, exigindo-se também no processo de seleção


as qualificações técnica, profissional, organizacional e financeira
dos terceiros. É imprescindível que se exija da contratada uma
comprovação de sua experiência operacional qualitativa e
quantitativa;
• descontinuidade operacional: a inexistência de contratos de médio a
longo prazos impossibilita ao prestador de serviços investir em
estrutura de apoio, interação comunitária etc. Sem essa fixação
regional quase todas as decisões passam a ter caráter temporário.
Essa condição tem reflexos altamente negativos em todas as ações
do terceiro. Seria recomendável que os contratos estabelecessem
programações de médio e longo prazos que permitissem a
estabilidade funcional e a integração regional dos terceiros;
• relacionamento de submissão: embora já se verifiquem exemplos
bem sucedidos de verdadeiras parcerias, ainda é muito comum
constatar situações de total submissão do contratado. Nessas
ocasiões, torna-se impossível cultivar um relacionamento
profissional cooperativo. Haverá sempre uma disputa de "perde-
ganha" com prejuízos à qualidade dos trabalhos, à viabilidade dos
empreendimentos e da própria empresa prestadora de serviços. A
evolução da profissionalização dos terceiros deverá alterar essa
situação indesejável no relacionamento das empresas;
• qualidade operacional: observações de campo mostram que a
qualidade operacional tem estreita relação com preços contratados
e, acima de tudo, com o acompanhamento técnico de campo. As
partes devem discutir cuidadosamente as referências a serem
seguidas para se evitarem surpresas no dia-a-dia de campo. Na
maioria dos casos em que se observam problemas de qualidade
operacional, a grande causa tem sido a falta de acompanhamento
técnico no campo e a aceitação de preços irreais na contratação.
Algumas empresas têm se utilizado de auditorias técnicas
independentes para se assegurarem da qualidade dos serviços
silviculturais. A contratante tem de ter garantia absoluta da
qualidade dos serviços, sob pena de estar comprometendo,
irreversivelmente, suas produções florestais futuras;
• utilização de mão-de-obra desqualificada: a grande maioria dos
prestadores de serviços não dispõe de estrutura de apoio para
seleção, treinamento e qualificação da mão-de-obra operacional.
438 Leite, Souza e Machado

Essa dificuldade tem sido apontada como o grande desafio a ser


superado pela terceirização. Em muitos casos, a terceirização pode
diminuir sensivelmente a qualidade de vida do homem rural. Tem-
se observado que as situações críticas sempre acontecem mediante
contratações a valores irreais; e
• assistência social e respeito ambiental: é de fundamental importância
que se proceda ao monitoramento permanente das questões
essenciais e ambientais. É imprescindível que as obrigações sociais
sejam cumpridas e que todos os cuidados ambientais sejam
tomados.

A verdadeira Parceria
Os dados setoriais indicam que algumas empresas estão
executando ainda serviços silviculturais com equipes próprias. Com a
evolução qualitativa da terceirização, com certeza aumentará a
probabilidade de essas empresas substituírem as equipes próprias, por
terceiros. Há, portanto, muitas oportunidades para expansão da
terceirização.
Ainda de acordo com esse autor, para viabilizar essa expansão,
muitas providências deverão ser tomadas pelos terceiros para
aumentar o grau de segurança dos contratantes. Contratadas e
contratantes estabelecerão mecanismos de controles operacionais e
organizacionais que permitirão melhor integração de esforços e de
conhecimentos. Na medida em que os interesses das partes sejam
respeitados, haverá condições para se consolidar a verdadeira parceria
empresarial, preconizada pela terceirização. Acredita-se que, a curto e
médio prazos, muitas ações e procedimentos serão alterados pelas
contratantes e pelos contratados.

Objetivamente, citam-se as seguintes alterações:

Da contratante
• contratos mais longos, com cláusulas discutidas e negociadas para
contemplar os reais interesses técnicos e financeiros das partes e do
negócio. Os contratos com interesses parciais e impositivos deverão
Terceirização 439

ser evitados para se eliminarem as chances de constrangimentos


futuros;
• maior rigor na obediência de cronogramas, no atendimento das
responsabilidades sociais e na qualidade operacional;
• maior exigência e apoio na promoção do desenvolvimento
organizacional do terceiro, no treinamento e na qualificação da mão-
de-obra;
• obrigatoriedade no atendimento da responsabilidade técnica. Deverá
ser exigida com maior rigor a presença de profissionais bem
preparados e qualificados no acompanhamento e nas discussões
técnicas dos serviços;
• exigências para que o terceiro se prepare para atender às
emergências de campo (incêndios, problemas ambientais, exigências
trabalhistas, serviços técnicos especializados etc.);
• o prestador de serviços deverá dar e manter provas de sua
competência técnica e administrativa junto aos vários clientes e nas
comunidades em que atua. O terceiro será o próprio e legítimo
representante da contratada nas mais diferentes situações; e
• deverão surgir mecanismos de apoio financeiro aos terceiros para
que o desenvolvimento tecnológico da silvicultura e da colheita
florestal não seja tolhido.
A necessidade de investimentos para renovação ou aquisição de
equipamentos especializados deverá ser suprida compartilhadamente.

Do prestador de serviços
• contratação de profissionais tecnicamente preparados para
acompanhar e contribuir com sugestões operacionais;
• mecanismos de controle da mão-de-obra, das máquinas e dos
equipamentos utilizados nos serviços de campo;
• maior investimento no preparo e na qualificação da mão-de-obra
operacional e de apoio;
• descentralização operacional e administrativa das unidades de
trabalho, com simplificação e agilização dos processos de decisão;
440 Leite, Souza e Machado

• evolução tecnológica nos serviços de apoio. Recursos de informática


deverão ser parte do patrimônio dos terceiros e de fundamental
importância para o seu desenvolvimento empresarial;
• utilização de mecanismos comprobatórios da competência técnica e
do cumprimento das responsabilidades sociais e ambientais;
• elaboração de planilhas de custo que permitam discussões e
negociações com credibilidade e realismo. Os dados de controles
operacionais e de custo serão exigidos, gradativamente, e se
tornarão imprescindíveis nas negociações comerciais; e
• manutenção do relacionamento profissional e respeitoso entre as
partes. Os terceiros que estiverem preparados para tomar a iniciativa
neste processo estarão em vantagem no mercado de serviços.

Por fim, acredita-se que essas alterações e providências se darão


nos dois sentidos, contratantes e contratados, e em prazo relativamente
curto. Os compromissos já assumidos e as responsabilidades das
partes ganharam tamanha dimensão, que é impossível imaginar que
não sejam tomadas as providências necessárias para aprimorar o
processo e dar garantias de sucesso aos empreendimentos florestais e
às empresas em formação.

Terceirização na Colheita Florestal


Os resultados apresentados a seguir baseiam-se em pesquisa
realizada por Leite (2000) em 15 grandes empresas de reflorestamento
das Regiões Sul, Sudeste e Nordeste do Brasil, cuja área plantada
corresponde a 924.260 hectares, aproximadamente 20% do total
existente no País.
Dentre alguns resultados dessa pesquisa, destacam-se os
relacionados à empresa contratante e aos prestadores de serviço,
conforme descritos subseqüentemente.:

Resultados Relacionados à empresa contratante


Razões para adoção da terceirização em ordem decrescente de
importância:
Terceirização 441

• redução de custos fixos;


• redução dos custos com mão-de-obra e encargos;
• maior flexibilidade e agilidade;
• melhor qualidade;
• foco no negócio principal; e
• redução da força dos sindicatos.

Principais problemas enfrentados pelas empresas contratantes


com a adoção da terceirização, em ordem decrescente de importância:

• saúde financeira e capacidade de investimento dos terceiros;


• cumprimento de exigências contratuais e das metas de produção;
• entraves burocráticos e operacionais;
• fiscalização e controle das operações;
• riscos de ações judiciais; e
• carência de terceiros especializados na prestação de serviços.

O percentual de adoção da terceirização na atividade de colheita


florestal é mostrado na Figura 15.1.
442 Leite, Souza e Machado

100
100

100
71
66 63,3 69,3 56,3
80

60
%
40

20

CORTE
Corte EXTRAÇÃO
Extração CARREG.
Carregamento
TRANSP.
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Média

Figura 15.1 - Percentual de adoção da terceirização na colheita


florestal.

Verifica-se, por intermédio dessa figura, que o percentual


médio de adoção da terceirização na colheita florestal das empresas
brasileiras de reflorestamento é de aproximadamente 71%. Observa-se
que o menor percentual corresponde ao descarregamento da madeira,
pois esta atividade é realizada, na maioria das vezes, dentro do pátio
das indústrias, que dispõem de equipamentos próprios para execução
da operação. O transporte está praticamente 100% terceirizado, dada à
facilidade de contratação de fretes a preços acessíveis no Brasil.

Resultados relacionados aos prestadores de serviço


(terceiros)
Relação de vínculo com a contratante:
• oito empresas pertencentes a ex-funcionários; e
• sete empresas pertencentes a outras pessoas.
Terceirização 443

Reclamações mais comuns do contratante em ordem


decrescente de importância, em relação aos terceiros:
• qualidade dos serviços;
• segurança no trabalho;
• atingimento da meta de produção; e
• problemas operacionais.

Principais dificuldades para se trabalhar como prestador de


serviço, em ordem decrescente de importância:

• custos dos equipamentos;


• mão-de-obra não-qualificada;
• falta de financiamentos; baixos preços pagos pelo serviço, falta de
credibilidade nos terceiros; e deslealdade na concorrência pelos
serviços (política do menor preço);
• alto investimento de capital para atuar no negócio e problema com
os sindicatos (ações trabalhistas); e
• problemas operacionais diversos.

Com relação à forma do vínculo da mão-de-obra empregada no


setor de papel e celulose, a ANFPC (1996) encontrou resultados de
34%, própria; 47%, de terceiros; e 19%, coligada.

Considerações Finais
Percebe-se que vencer o desafio de administrar num mercado
globalizado significa atender a todas as condições impostas, para que
as empresas obtenham sucesso nesse novo cenário.

Dentro desse contexto, podem-se elencar as seguintes


considerações a respeito da terceirização:
• e um processo complexo, que exige profissionalismo, cuidados e
comprometimento dos envolvidos;
444 Leite, Souza e Machado

• é fundamental definir uma abordagem sistêmica para maximizar os


ganhos de uma terceirização logística;
• o termo terceirização significa PARCERIA ou CO-LABOR-AÇÃO
e, portanto, não corresponde apenas à transferência de
responsabilidade;
• a empresa contratante nunca deve exercer a supervisão das
atividades do seu contratado e sim avaliar seu desempenho e
oferecer feedback ao seu parceiro;
• a terceirização vai exigir cada vez mais parceiros estruturados,
qualificados e confiáveis; e
• os benefícios ou resultados são obtidos de forma global e, portanto,
devem ser compartilhados.

A adoção da terceirização de forma consistente, respeitando a


legislação pertinente, os direitos dos trabalhadores e levando em
consideração as recomendações anteriores, terá grande probabilidade
de sucesso e, dessa maneira, constituirá um instrumento importante
para a inserção das empresas brasileiras e, particularmente, às do setor
florestal, no contexto globalizado da economia.

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Terceirização 445

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