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O Enriquecimento Sem Causa (1273)
O Enriquecimento Sem Causa (1273)
1. Considerações gerais
A proibição do enriquecimento injustificado está consagrada no artigo 473º
que obriga aquele que enriqueceu sem causa justificativa à custa de outrem, a restituir
aquilo com que injustamente se locupletou. Deste modo, o credor da obrigação de
restituir é a pessoa à custa de quem o enriquecimento se deu e o devedor é o sujeito que
injustamente se locupletou à custa dele.
2. Pressupostos
São três os pressupostos da obrigação de restituir:
a - Existência de um enriquecimento.
É ainda o caso do credor que cede o seu crédito a terceiro sem avisar o
devedor, fazendo com que este pague ao cedente. Em atenção à boa-fé do devedor, a lei
considera-o desonerado, dando o pagamento por bem feito (artigo 583º/2), apesar de ter
sido efectuado a quem já não era credor. De todo o modo, houve um enriquecimento
injusto do cedente obtido à custa do cessionário, cujo crédito se extinguiu com o
pagamento que o devedor fez ao cedente. Logo, o cedente tem que restituir o
locupletamento sem causa que obteve à custa do cessionário.
Esta norma significa que a lei pretende que a acção de enriquecimento seja o
último recurso a utilizar pelo empobrecido. Deste modo, está-lhe vedada a sua utilização
no caso de possuir outro fundamento para uma acção de restituição (como sucede
quando há invalidade ou resolução do contrato), quando a lei pretende que a aquisição à
custa de outrem seja definitiva (usucapião) ou quando a lei atribui outros efeitos ao
enriquecimento sem causa (como acontece na modificação do contrato com base em
usura). O carácter subsidiário do instituto não significa, porém, que em concreto não
possa haver concurso de pretensões com a responsabilidade civil, porquanto a obrigação
de indemnizar visa reparar danos e o enriquecimento sem causa propõe-se corrigir
locupletamentos sem cobertura normativa (exemplo: a pessoa que se instalou
gratuitamente em casa de outrem, impedindo que este a arrendasse durante esse período,
tem que indemnizar o proprietário pelos danos que lhe causou e restituir-lhe o
enriquecimento que obteve com o uso gratuito do seu bem).
4. Modalidades de enriquecimento
Deve ter-se em consideração que a cláusula geral do artigo 473º/1 é
demasiado genérica para permitir a resolução de casos concretos. É assim necessário
proceder à divisão do instituto em várias categorias: enriquecimento por prestação,
enriquecimento por intervenção, enriquecimento por despesas realizadas em benefício
de outrem e enriquecimento por desconsideração de um património intermédio.
A - A repetição do indevido
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Accipiens: o que recebe. Solvens: devedor
A segunda hipótese de pagamento do indevido está prevista no artigo 477º,
que se verifica quando o terceiro cumpre uma obrigação alheia por julgar que é própria;
neste caso, o preceito faz depender a restituição de o erro ser desculpável (A paga a B
uma indemnização porque julgava que C, seu filho, tinha partido uma janela de B; vem
contudo a descobrir-se que tinha sido outra pessoa a partir a janela). Só não existe
direito de repetição quando se verifique alguma das circunstâncias previstas no artigo
477º/1, parte final.
O problema que se coloca agora diz respeito ao modo como devem ser
resolvidos os casos de enriquecimento forçado que caem fora do âmbito de previsão de
uma qualquer disposição legal. Obrigar o enriquecido a restituir, em qualquer caso, um
enriquecimento obtido contra a sua vontade, contradiz a autonomia privada, princípio
fundamental do Direito das Obrigações, porquanto significa reconhecer a possibilidade
de alguém constituir obrigações noutra esfera jurídica contra a vontade do seu titular.
Mas, por outro lado, permitir que esse locupletamento se consolide na esfera do
enriquecido, também contraria a regra que proíbe, em geral, o enriquecimento
injustificado.
Em primeiro lugar, importa definir o que se deve entender por “tudo quanto
se tenha obtido”. Há duas acepções possíveis: a primeira é a concepção real do
enriquecimento e diz que o objecto da obrigação de restituir é o valor objectivo da
aquisição, o qual corresponde em regra ao seu valor de mercado. A segunda é a
concepção patrimonial do enriquecimento e diz que o objecto da restituição é o aumento
patrimonial por ela causado, correspondendo à diferença entre o património actual do
enriquecido e aquele que existiria se não tivesse havido enriquecimento. As diferenças
entre o enriquecimento real e o enriquecimento patrimonial podem ser consideráveis,
como decorre do seguinte exemplo:
A passa um mês de férias, sem autorização, em casa de B, que este não iria
utilizar nem arrendar durante aquele período. Por seu lado, se não fosse este facto, A
também não teria gozado férias.
O artigo 482º estabelece que o direito à restituição do que foi obtido sem
justa causa está sujeito à prescrição de três anos a contar da data em que o credor teve
conhecimento do direito que lhe assiste e da pessoa do responsável. O prazo é curto
porque a lei pretende pressionar o credor a exercer o seu direito logo que reúna os
elementos necessários para agir.