Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Ebook Abls
Ebook Abls
ABLS
ADVANCED BARIATRIC LIFE SUPPORT
CURSO DE EMERGÊNCIAS BARIÁTRICAS
MANUAL
ABLS
ADVANCED BARIATRIC LIFE SUPPORT
CURSO DE EMERGÊNCIAS BARIÁTRICAS
FÁBIO ALMEIDA
EDUARDO LEMOS DE SOUZA BASTOS
JOÃO CAETANO DALLEGRAVE MARCHESINI
FÁBIO VIEGAS
Manual ABLS
ISBN: 978-65-992512-2-1
Publicado em 2022 pela DLR Serviços Médicos e Editoriais LTDA.
Direção editorial: Milton Artur Ruiz
Produção editorial e diagramação: Renata Ruiz
Secretaria e revisão: Camila Souza
DLR
Phone: +55 17 3304-7091
WhatsApp +55 17 991748716
E-mail: dlrserv@yahoo.com.br
EDITORES
FÁBIO ALMEIDA
Graduação em medicina pela Universidade Federal de Sergipe. Mestre em Tecnologia
Minimamente Invasiva e Simulação em Saúde - Unichristus – CE. Membro Titular da
Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM), da Sociedade Brasi-
leira de Cirurgia Minimamente Invasiva e Robótica (SOBRACIL) e do Colégio Brasileiro
de Cirurgiões (CBC). Habilitação em Cirurgia Robótica pela Intuitive Surgical - Atlanta
(USA). Coordenador do SIGO - Serviço Integrado de Gastrocirurgia e Obesidade - Ara-
caju - SE – Brasil.
FÁBIO VIEGAS
Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM),
da Sociedade Brasileira de Cirurgia Minimamente Invasiva e Robótica (SOBRACIL) e do
Colégio Brasileiro de Cirurgiões (CBC). Ex-Presidente da Sociedade Brasileira de Cirur-
gia Bariátrica e Metabólica (Biênio 2021-2022). Membro da Câmara Técnica em Cirurgia
Bariátrica do Conselho Federal de Medicina. Médico Coordenador do Instituto Fábio
Viegas – Rio de Janeiro – RJ.
COLABORADORES
FLÁVIO KREIMER
Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM).
Mestre e Doutor em Cirurgia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Profes-
sor Adjunto do Departamento de Cirurgia da UFPE.
MARCELO FALCÃO
Graduação em Medicina pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Mestrado e Dou-
torado em Cirurgia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Membro Titular
do Colégio Brasileiro de Cirurgiões (CBC), do Colégio Brasileiro de Cirurgia Digestiva
(CBCD), da Sociedade Brasileira de Videocirurgia (SOBRACIL), da Sociedade Brasilei-
ra de Endoscopia Digestiva (SOBED) e da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e
Metabólica (SBCBM). Membro da International Federation for the Surgery of Obesity
and Metabolic Disorders (IFSO) e da American Society for Gastrointestinal Endoscopy
(ASGE). Professor Adjunto da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública – EBMSP,
Salvador/BA. Diretor Médico do Instituto Falcão de Endoscopia e Cirurgia - IFEC, Sal-
vador/BA.
MARCELO PROTÁSIO
Residência Médica em Cirurgia Geral / Cirurgia do Aparelho Digestivo (Instituto de As-
sistência Médica ao Servidor Público do Estado - IAMSPE SP). Mestre em Ciências da
Saúde (IAMSPE SP). Observership em Cirurgia Digestiva e Bariátrica (Cleveland Clinic
Florida - EUA). Membro Efetivo do Colégio Brasileiro de Cirurgia Digestiva (CBCD).
Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM).
Professor de Clínica Cirúrgica do Curso de Medicina da Universidade Tiradentes (UNIT).
PAULO KASSAB
Professor Livre Docente pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.
Professor Adjunto da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo/SP.
RAUL ANDRADE MENDONÇA FILHO
Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM),
do Colégio Brasileiro de Cirurgia Digestiva (CBCD) e da Sociedade Brasileira de Endos-
copia Digestiva (SOBED). Certificação Internacional em Cirurgia Robótica pela Intuitive
Surgical - Atlanta, EUA. Fundador e Preceptor da Residência Médica em Cirurgia Geral
do Hospital de Urgências de Sergipe (HUSE). Coordenador do Centro Integrado de Tra-
tamento da Obesidade (CINTO) - Aracaju/SE.
Prefácio 1
ABLS-01 O projeto ABLS-Brasil 3
ABLS-02 Segurança em cirurgia bariátrica - morbimortalidade perioperatória 5
ABLS-03 Anatomia básica das principais cirurgias bariátricas 13
ABLS-04 Dispositivos artificiais em cirurgia bariátrica 27
ABLS-05 Trauma abdominal no paciente bariátrico 37
ABLS-06 Diagnóstico precoce e conduta imediata em emergências bariátricas 55
ABLS-07 Dor abdominal em pacientes pós-bariátrica 63
ABLS-08 Radiologia em paciente bariátrico 73
ABLS-09 Ultrassonografia à beira do leito em urgência bariátrica 87
ABLS-10 Hemorragia digestiva em cirurgia bariátrica 101
ABLS-11 Endoscopia bariátrica de urgência e emergência 109
ABLS-12 Técnicas operatórias 117
ABLS-13 Abordagem cirúrgica do abdome agudo após cirurgia bariátrica 133
ABLS-14 Fístula após bypass e sleeve 161
ABLS-15 Obstrução intestinal pós-bariátrica 167
ABLS-16 Manejo intraoperatório do paciente com isquemia intestinal 181
ABLS-17 Outras causas de abdome agudo não relacionadas à cirurgia bariátrica 189
ABLS-18 Alterações nutricionais após cirurgia bariátrica 199
ABLS-19 Síncope e hipoglicemia 211
ABLS-20 Rabdomiólise e cirurgia bariátrica 219
ABLS-21 Tromboembolismo venoso 225
ABLS-22 Diarreia em pacientes bariátricos 237
ABLS-23 Condutas rápidas na sepse abdominal em obesos 249
ABLS-24 Hérnias internas em gestantes com cirurgia bariátrica 259
Pósfacio 267
1 ABLS Brasil
PREFÁCIO
Você nunca fará o diagnóstico de uma doença que você não conhece.
Essa foi a frase que usei repetidamente durante minhas quase quatro décadas de ma-
gistério em cirurgia do aparelho digestivo na Universidade Federal do Paraná e em quase
sessenta anos de vida profissional.
Realmente, é quase impossível identificar uma complicação aguda ou crônica em
pacientes submetidos à cirurgia bariátrica se o cirurgião geral, ou o socorrista, desconhece
os possíveis problemas que podem acompanhar um paciente bariátrico em sua jornada
cirúrgica.
Felizmente, cirurgiões virtuosos, com habilidades psicomotoras invejáveis, que são
verdadeiros artistas em sala de cirurgia, mas que exercem sua especialidade com pouco
conhecimento clínico são incomuns hoje em dia. Contudo, eles existem.
De maneira geral, cirurgiões bariátricos atualizam-se em congressos e cursos, acom-
panham a literatura médica corrente, muitas vezes sob as asas da Sociedade Brasileira de
Cirurgia Bariátrica e Metabólica - nossa SBCBM.
Graças a todas essas fontes de informação, atualmente, é infrequente ver um cirurgião
bariátrico não perceber uma situação aguda ou crônica que invalide ou ponha em risco o
paciente bariátrico.
O primeiro socorro prestado a pacientes complicados na área de atuação em cirurgia
bariátrica, mais especificamente em serviços de pronto atendimento, tem ocorrido com não
desprezível frequência por colegas que desconhecem a cirurgia bariátrica e suas possíveis
complicações.
Não raro, dores abdominais recebem diagnóstico errôneo, assim como, um exame
de imagem pode ser equivocadamente interpretado. Em vários casos, o paciente chega
nas mãos dos especialistas em condições precárias, de alto risco. Contudo, isso poderia
ser evitado se fosse dada a oportunidade do conhecimento da área aos colegas socorristas
em geral.
Se olharmos para o passado próximo, nos últimos 30 anos, situações como hérnias
internas de “Petersen”, fístulas de “Ângulo de His”, hemoperitônio por sangramento de
2 ABLS Brasil
portais laparoscópicos e várias outras situações de urgência, eram pouco conhecidas nas
salas de emergência dos hospitais.
Com o decorrer dos anos, terminologias como essas passaram a fazer parte do coti-
diano de pronto-socorristas, de especialistas em imagem, de cirurgiões não especialistas
em cirurgia bariátrica e, até mesmo, dos bancos escolares universitários. Esse progresso
deu-se em função das repetidas discussões e ensinamentos em eventos da especialidade,
assim como das diversas publicações a esse respeito.
“Posters” em salas de emergência patrocinados pela SBCBM foram de grande ajuda aos
colegas e, principalmente, aos pacientes, os quais são a razão maior de todos esses esforços.
Respondendo a uma necessidade premente, a SBCBM organizou cursos denominados
Advanced Bariatric Life Support, ou ABLS, que, segundo seu próprio web site, define seus
propósitos da seguinte forma:
“O curso tem como objetivo orientar a correta avaliação, conduta e tratamento de
pacientes obesos mórbidos que foram submetidos previamente à cirurgia bariátrica e che-
gam aos hospitais para atendimento emergencial, decorrentes da cirurgia ou não. Entre
os temas que são abordados no curso estão a obesidade no Brasil, a anatomia da cirurgia
bariátrica, visão geral dos procedimentos bariátricos, avaliação do paciente, abordagem
das complicações e outros”.
Graças aos esforços de brilhantes colegas, os quais são seus editores e autores, pode-
mos agora ver nascer o manual do curso ABLS. Esta obra, rica em informações, deverá ser
livro de cabeceira de plantonistas em hospitais, a companhia inseparável de nossos novos
cirurgiões em obesidade e síndrome metabólica, assim como, livro de consulta e atualização
dos velhos guerreiros do mundo bariátrico.
Parabéns a esses estimados colegas e, principalmente, à nossa Sociedade Brasileira
de Cirurgia Bariátrica e Metabólica.
CAPÍTULO 01
O PROJETO ABLS-BRASIL
ADVANCED BARIATRIC LIFE SUPPORT
CAPÍTULO 02
Introdução
Operar um paciente com obesidade é um desafio para o cirurgião, não somente pelas
comorbidades associadas à obesidade, mas também devido às características anatômicas
e fisiológicas do obeso, as quais oferecem dificuldade técnica intra-operatória e pós-ope-
ratório passível de complicações bastante peculiares.
Com os avanços da cirurgia minimamente invasiva e o desenvolvimento de centros
de referência em cirurgia bariátrica, eventos adversos intra-operatórios e complicações
pós-operatórias têm sido cada vez mais raros, mas ainda apresentam grande variabilidade
a depender da técnica escolhida, do IMC e da experiência do cirurgião [1].
Complicações intra-operatórias
O manejo intra-operatório de pacientes com obesidade pode ser difícil mesmo nas
mãos de cirurgiões e anestesistas experientes, fato que pode aumentar o risco de compli-
cações e de eventos adversos. Algumas peculiaridades vivenciadas na prática são:
▶ Posicionamento: devido ao peso e ao diâmetro do abdome e dos membros, o
paciente deve ser bem posicionado na mesa cirúrgica, de formaa evitar lesões
nervosas, deslocamentos na mesa durante a cirurgia e rabdomiólise;
▶ Manejo da via aérea: aumento da circunferência cervical, extensão limitada da
coluna cervical e abertura restrita da boca, são alguns fatores que tornam a larin-
goscopia em obesos mórbidos seis vezes mais difícil do que na população geral [2];
▶ Farmacocinética das drogas: alguns anestésicos lipofílicos, como fentanil, mida-
zolam e sevoflurano, podem acumular-se nos adipócitos e proporcionar recir-
6 ABLS Brasil
Considerações finais
Pacientes bariátricos apresentam dificuldades técnicas e riscos específicos. Conhecer
esses riscos pode contribuir para a diminuição de complicações intra- e pós-operatórias por
meio da adoção de medidas de prevenção bem direcionadas. Complicações mais comuns
como fístula, sangramento, TEV e eventos cardiovasculares devem ser conhecidas pelos
profissionais que atendem pacientes portadores de obesidade, de forma a rapidamente
reconhecer e adequar intervenções terapêuticas.
9 ABLS Brasil
DICAS
▶ Pacientes bariátricos têm dificuldades técnicas peculiares asso-
ciadas ao peso;
▶ Preparo pré-operatório, instrumental adequado e técnica cuidado-
sa contribuem para a prevenção de complicações intra-operatórias;
▶ Complicações pós-operatórias hospitalares são infrequentes; a
maioria delas apresenta-se após a alta médica;
▶ A mortalidade operatória é baixa, mais comumente associada à
embolia pulmonar.
10 ABLS Brasil
Referências
1. Greenstein AJ, Wahed AS, Adeniji A, Courcoulas AP, Dakin G, Flum DR, et al. Preva-
lence of adverse intraoperative events during obesity surgery and their sequelae. J Am Coll Surg.
2012;215(2):271-7.e3. doi: 10.1016/j.jamcollsurg.2012.03.008.
2. Schumann R. Anaesthesia for bariatric surgery. Best Pract Res Clin Anaesthesiol.
2011;25(1):83-93. doi: 10.1016/j.bpa.2010.12.006.
3. Madan AK, Taddeucci RJ, Harper JL, Tichansky DS. Initial trocar placement and abdo-
minal insufflation in laparoscopic bariatric surgery. J Surg Res. 2008;148(2):210-3. doi: 10.1016/j.
jss.2007.08.029.
4. Flum DR, Belle SH, King WC, Wahed AS, Berk P, Chapman W, et at. Longitudinal Asses-
sment of Bariatric Surgery (LABS) Consortium. Perioperative safety in the longitudinal assessment
of bariatric surgery. N Engl J Med. 2009;361(5):445-54. doi: 10.1056/NEJMoa0901836.
5. Mitchell MT, Gasparaitis AE, Alverdy JC. Imaging findings in Roux-en-O and other
misconstructions: rare but serious complications of Roux-en-Y gastric bypass surgery. AJR Am J
Roentgenol. 2008;190(2):367-73. doi: 10.2214/AJR.07.2859.
8. Durak E, Inabnet WB, Schrope B, Davis D, Daud A, Milone L, et al. Incidence and mana-
gement of enteric leaks after gastric bypass for morbid obesity during a 10-year period. Surg Obes
Relat Dis. 2008;4(3):389-93. doi: 10.1016/j.soard.2007.11.011. Erratum in: Surg Obes Relat Dis.
2008;4(5):689.
9. Aurora AR, Khaitan L, Saber AA. Sleeve gastrectomy and the risk of leak: a systematic
analysis of 4,888 patients. Surg Endosc. 2012;26(6):1509-15. doi: 10.1007/s00464-011-2085-3.
10. Dick A, Byrne TK, Baker M, Budak A, Morgan K. Gastrointestinal bleeding after gastric
bypass surgery: nuisance or catastrophe? Surg Obes Relat Dis. 2010;6(6):643-7. doi: 10.1016/j.
soard.2010.07.016.
11. Jamal MH, Corcelles R, Shimizu H, Kroh M, Safdie FM, Rosenthal R, et al. Thromboem-
bolic events in bariatric surgery: a large multi-institutional referral center experience. Surg Endosc.
2015;29(2):376-80. doi: 10.1007/s00464-014-3678-4.
11 ABLS Brasil
12. Winegar DA, Sherif B, Pate V, DeMaria EJ. Venous thromboembolism after bariatric surgery
performed by Bariatric Surgery Center of Excellence Participants: analysis of the Bariatric Outcomes
Longitudinal Database. Surg Obes Relat Dis. 2011;7(2):181-8. doi: 10.1016/j.soard.2010.12.008.
13. American Society for Metabolic and Bariatric Surgery Clinical Issues Committee. ASMBS
updated position statement on prophylactic measures to reduce the risk of venous thromboembolism
in bariatric surgery patients. Surg Obes Relat Dis. 2013;9(4):493-7. doi: 10.1016/j.soard.2013.03.006.
14. Morino M, Toppino M, Forestieri P, Angrisani L, Allaix ME, Scopinaro N. Mortality after
bariatric surgery: analysis of 13,871 morbidly obese patients from a national registry. Ann Surg.
2007;246(6):1002-7; discussion 1007-9. doi: 10.1097/SLA.0b013e31815c404e.
13 ABLS Brasil
CAPÍTULO 03
Introdução
Cirurgias bariátricas têm sido realizadas com cada vez mais frequência, uma vez que
a obesidade tem apresentado incidência crescente e alarmante nas sociedades modernas.
Essas operações têm mostrado resultados bastante satisfatórios com aceitáveis índices de
morbi-mortalidade.
No entanto, pacientes obesos mórbidos são diferentes: podem, eventualmente, apre-
sentar peritonite difusa, quando os sinais e os sintomas semiológicos clássicos somente
estarão evidentes tardiamente. Muitas vezes, esse processo ocasiona retardo no diagnóstico
e atraso em medidas terapêuticas essenciais e urgentes [1]. Esse atraso pode gerar riscos
adicionais e aumentar a gravidade de complicações que, de outro modo, poderiam ser
sanadas sem maiores óbices [2].
Para evitar tais situações, urge que os médicos plantonistas que fazem a abordagem
inicial às referidas complicações no atendimento de emergência, conheçam essas parti-
cularidades. Ao detalhar a anatomia e a técnica básica das operações bariátricas, o intuito
deste capítulo é trazer subsídio quanto ao seu entendimento e, por conseguinte, de suas
complicações. Aqui, a importância nunca é demasiada, visto que uma considerável fração
dos urgentistas não são cirurgiões e, portanto, a priori, não dispõem destas informações.
curvatura, desde um ponto próximo ao piloro até a região do ângulo de His (Figura 3). O
remanescente gástrico (manga gástrica) fica ao lado da pequena curvatura, junto ao omento
menor mantendo continuidade com o esôfago e o duodeno [3].
A operação não tem anastomoses gástricas, nem intestinais e nem desvios do trân-
sito, por não perder comunicação com o duodeno, fato que explica porque complicações
nutricionais nessas operações são menos frequentes [4].
A estenose do tubo gástrico (Figura 4), que caracteriza-se por estreitamento em
qualquer ponto do remanescente gástrico, pode causar disfagia e intolerância a sólidos,
pastosos e, por vezes, até a líquidos. É uma complicação mecânica que pode resultar da
gastrectomia vertical. Pode também ser o desfecho de uma secção muito próxima à pe-
quena curvatura, de sobressuturas que diminuem a luz gástrica ou ainda de torção ou de
angulação do eixo da manga gástrica.
A deiscência da linha de grampeamento (fístula) é outra complicação que torna-se
melhor compreendida ao conhecer a anatomia. A ocorrência dessa complicação pode estar
associada à estenose luminal, usualmente observada na incisura angular, o que leva a maior
pressão intra-luminal na porção proximal do estômago (Figura 5).
Considerações finais
O médico que oferece o primeiro atendimento de uma emergência bariátrica pós-
-operatória deve sempre procurar saber qual foi a técnica operatória em questão, uma
vez que, tal informação permite inferir o diagonóstico com maior grau de precisão. Há
complicações que ocorrem com uma técnica, mas não com outra. A hérnia interna não
acontece no sleeve, por exemplo, mas pode ocorrer no bypass gástrico ou nas derivações
biliopancreáticas.
Alguns pacientes não sabem especificar a técnica de sua operação, mas por meio de
algumas perguntas simples, tal informação pode ser inferida. Perguntar, por exemplo, se
o paciente recebeu a recomendação pós-operatória de tomar polivitamínicos diariamente
para o resto de sua vida Em caso afirmativo, isto muito provavelmente significa que o pa-
ciente foi submetido a uma cirurgia com derivação intestinal, tais como o bypass gástrico
e a derivação biliopancreática. Palpação da região do hipocôndrio esquerdo pode também
revelar a presença de um portal subcutâneo que, no caso, indicaria a operação de banda
gástrica. Felizmente, muitos pacientes recebem de sua equipe bariátrica um relatório ou
uma carteira de paciente operado que contém essas informações. A SBCBM atualmente
recomenda e estimula o uso do aplicativo Barilife® que traz informações a respeito da téc-
nica, hospital, data e cirurgião que executou a cirurgia. Fazer essa averiguação é sempre
importante.
O conhecimento dos detalhes técnicos das operações bariátricas e de sua “anatomia”
é, portanto, imprescindível para a melhor compreensão das possíveis complicações, suas
particularidades e suas manifestações clínicas.
25 ABLS Brasil
DICAS
▶ Conhecer os detalhes técnicos das operações bariátricas e suas
alterações anatômicas é fundamental para uma rápida e eficaz investigação
de eventuais complicações;
▶ No atendimento de uma emergência bariátrica, procurar saber,
logo de início, a qual técnica cirúrgica o paciente foi submetido, uma vez que
essa informação direciona e facilita todo o raciocínio clínico a posteriori;
▶ O tempo decorrido entre os primeiros sintomas de uma compli-
cação bariátrica e a instituição das devidas medidas terapêuticas é fator
prognóstico determinante para o sucesso terapêutico;
▶ O paciente bariátrico tem dificuldades técnicas peculiares asso-
ciadas ao peso;
▶ Procure se informar se o paciente possui o registro no aplicativo
Barilife® da SBCBM.
26 ABLS Brasil
Referências
1. Campanile FC, Boru CE, Rizzello M, Puzziello A, Copaescu C, Cavallaro G, Silecchia G.
Acute complications after laparoscopic bariatric procedures: update for the general surgeon. Lan-
genbecks Arch Surg. 2013;398(5):669-86. doi: 10.1007/s00423-013-1077-2.
3. Clinical Issues Committee of American Society for Metabolic and Bariatric Surgery.
Sleeve gastrectomy as a bariatric procedure. Surg Obes Relat Dis. 2007;3(6):573-6. doi: 10.1016/j.
soard.2007.06.009.
5. Berbiglia L, Zografakis JG, Dan AG. Laparoscopic Roux-en-Y Gastric Bypass: Surgi-
cal Technique and Perioperative Care. Surg Clin North Am. 2016;96(4):773-94. doi: 10.1016/j.
suc.2016.03.003.
7. Rausa E, Bonavina L, Asti E, Gaeta M, Ricci C. Rate of Death and Complications in Lapa-
roscopic and Open Roux-en-Y Gastric Bypass. A Meta-analysis and Meta-regression Analysis on
69,494 Patients. Obes Surg. 2016;26(8):1956-63. doi: 10.1007/s11695-016-2231-z.
8. Biron S, Biertho L, Lebel S et al. Biliopancreatic Diversion with Duodenal Switch: Surgical
Technique and Perioperative Care. Surg Clin North Am. 2016;96(4):815-26.
CAPÍTULO 04
Introdução
A obesidade tem se tornado um problema de saúde pública, no Brasil. Segundo dados
da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS, 2020), 1 em cada 4 brasileiros adultos são portadores
de obesidade (25,6%) e mais da metade da população das capitais do país (60,3%) sofre
com excesso de peso. Dados sobre obesidade e excesso de peso em crianças e adolescentes
também são preocupantes [1].
A cirurgia bariátrica tem sido apresentada como uma opção segura e de alta eficácia,
sobretudo nos graus mais avançados da doença. Diversas técnicas cirúrgicas têm sido
empregadas com essa finalidade , das quais algumas fazem uso de dispositivos artificiais
que não são isentos de complicações, assim como outras técnicas bariátricas.
Esse capítulo tem como objetivo apresentar os dispositivos artificiais mais comu-
mente empregados no tratamento cirúrgico da obesidade, relacionando-os com eventuais
complicações que possam levar o paciente a buscar atendimento em serviços de urgência.
Anel de contenção
A colocação de um anel de contenção em torno do pouch gástrico de pacientes subme-
tidos ao bypass gástrico (bypass gástrico em Y-de-Roux - BGYR) (Figura 1) foi idealizada
na década 1980 para, acima de tudo, impedir a dilatação tardia desse pouch [2,3]. Além
disso, ela parece propiciar o esvaziamento mais lento do pouch gástrico em consequência
do estreitamento luminal provocado pelo anel, fato que pode aumentar mais rapidamente
a sensação de saciedade e ajudar a perda de peso e a diminuir a ocorrência da síndrome
de dumping. No entanto, diante da dificuldade de ingestão de alimentos sólidos, alguns
28 ABLS Brasil
Balão intragástrico
O balão intragástrico (BIG) é uma técnica endoscópica indicada, sobretudo, para o
manejo do sobrepeso e da obesidade grau 1 (IMC 30-35 kg/m2). Por vezes, também pode
ser usado como “ponte” para a perda de peso pré-operatória em pacientes com super-
-obesidade (IMC > 50 kg/m2). O Brasil é um dos países mais experientes no tratamento
de obesidade com BIG [5].
O BIG consiste na colocação de um balão de silicone no estômago por meio de endos-
copia digestiva. Uma vez posicionado no estômago, esse balão é preenchido com líquido
de coloração azul, em volume que varia de 400 a 700 ml (Figura 3). Opta-se pela adição
do azul de metileno uma vez que o corante serve como “marcador” em casos (raros) de
rompimento do balão. Nessa situação, o azul de metileno é absorvido pelo tubo digestório
e eliminado na urina (urina azulada ou esverdeada). Também há a possibilidade, conforme
informado pelo fabricante do dispositivo, de que este balão seja preenchido com ar; porém,
esse tipo de balão é menos utilizado. Nesse caso, não haverá urina azulada ou esverdeada
em casos de rompimento.
Nos casos de suspeita de rompimento do balão (urina esverdeada e/ou relato da perda
de sensação do balão dentro do estômago pelos pacientes), os pacientes são orientados a
procurar, imediatamente, o serviço hospitalar de referência. Isso porque o balão rompido
deve ser retirado o mais breve possível, antes que migre para o intestino delgado, onde
sua retirada por endoscopia não será mais factível. Caso o balão já tenha migrado para o
intestino delgado, a retirada cirúrgica deve ser recomendada.
Outra complicação associada ao balão é a presença de vômitos incoercíveis, princi-
palmente nos primeiros dias após a colocação do balão (período de adaptação). Muitas
vezes, é necessária uma breve internação para hidratação venosa e para a administração
de medicamentos antieméticos. A indicação de retirada do balão em função dos vômitos
(explante precoce do dispositivo) é bastante incomum.
Por fim, a presença de dor abdominal intensa e de difícil controle, juntamente com
úlceras pépticas e ocorrência de hemorragia digestiva alta, podem ser motivo para explante
precoce do dispositivo intragástrico.
A retirada endoscópica tem como princípio a introdução de uma agulha para as-
piração do conteúdo e para sua retirada com pinça de tração. Esse não costuma ser um
procedimento complexo.
S o n da nas o - g ás t ri c a : c u i da d o s pa r a pas s ag e m e
posicionamento
Atualmente, independentemente da técnica utilizada, há uma tendência mundial
de não utilização da sonda nasogástrica (SNG) no pós-operatório imediato de cirurgia
bariátrica. Como regra geral, pacientes submetidos à cirurgia bariátrica não permanecem
com SNG durante a internação hospitalar pós-operatória.
No entanto, alguns pacientes podem retornar ao pronto-socorro / pronto-atendimento
após a alta hospitalar apresentando quadro clínico em que a colocação de uma SNG pode
ser benéfica, a depender do critério adotado pelo médico emergencista.
Em caso de pacientes mais recentemente submetidos ao bypass gástrico (até 60 dias
de pós-operatório), a passagem “às cegas” (sem orientação endoscópica) da SNG deve ser
evitada. Sempre que possível, a passagem deve ser guiada por endoscopia digestiva alta.
Em casos nos quais o auxílio da endoscopia não estiver disponível, sondas de menor calibre
devem ser utilizadas, sem jamais forçar a progressão caso haja resistência. Isso deve ser
33 ABLS Brasil
feito a fim de evitar-se perfurações do coto gástrico, na sua linha de grampo, rompimento
da anastomose e perfuração da parede da alça de delgado imediatamente após a anasto-
mose. A colocação da SNG deve ser auxialiada por uma endoscopia digestiva alta, diante
de qualquer dificuldade na passagem.
No período mais tardio de pós-operatório (> 60 dias), o implante da sonda tem
menor risco de provocar lesões/complicações e pode ser feito como de hábito (às cegas).
Da mesma forma, sempre que houver uma resistência na progressão, o ideal é adotar a
passagem assistida por endoscopia digestiva alta. Para pacientes com bypass gástrico com
anel de contenção, a progressão pode ser mais difícil, pois pode haver estreitamento no
coto gástrico próximo à região do anel. Nesses casos, a endoscopia pode ser mais frequen-
temente necessária.
A passagem de sondas nasogástricas em pacientes submetidos ao sleeve talvez impli-
que em menor risco de complicações em comparação com o bypass gástrico, sobretudo
devido à ausência da anastomose gastrojejunal. No entanto, os cuidados acima descritos
devem ser tomados, sobretudo, no período pós-operatório mais recente.
Considerações finais
Dispositivos artificiais têm sido utilizados, com bastante frequência, em procedi-
mentos bariátricos. Ao médico emergencista cabe conhecer quais são, como são aplicados
e quais as principais complicações relacionadas a eles, a fim de possibilitar diagnóstico
correto e conduta precoce.
34 ABLS Brasil
DICAS
▶ Atualmente, o anel de contenção em torno do pouch do bypass
gástrico não tem sido utilizado. Porém, ainda há muitos pacientes que
foram submetidos ao bypass com anel;
▶ Em casos de rompimento do balão intragástrico, a retirada en-
doscópica do dispositivo deve ser providenciada o mais breve possível;
▶ A passagem de sonda nasogástrica em pacientes em pós-ope-
ratório imediato de cirurgia bariátrica deve ser evitada, mas não é uma
contra-indicação absoluta.
35 ABLS Brasil
Referências
1. Ministério da Saúde do Brasil. Portal da Atenção Primária à Saúde. Pesquisa Nacional de
Saúde. Disponível em https://aps.saude.gov.br/ape/promocaosaude/. Acessado em fevereiro de 2022.
2. Fobi MAL, Lee H, Fleming A. The surgical technique of the banded Roux-en-Y gastric
bypass. J. Obes. Wgt. Reg. 1989; S(2): 99-102.
3. Fobi MAL, Lee H. Silastic ring vertical banded gastric bypass for treatment of obesity.
Two-years follow-up in 84 patients. J. Natl. Med. Assoc. 1994; 86(2): 125-8. PMID: 8169987.
4. Elias AA, Garrido-Junior AB, Berti LV, Oliveira MR, Bertin NTS, Malheiros CA, et al. De-
rivações gástricas em y- de- roux com anel de silicone para o tratamento da obesidade: estudo das
complicações relacionadas com o anel. ABCD Arq Bras Cir Dig 2011;24(4): 290-295. Doi: 10.1590/
S0102-67202011000400009.
5. Neto MG, Silva LB, Grecco E, de Quadros LG, Teixeira A, Souza T, et al. Brazilian Intragas-
tric Balloon Consensus Statement (BIBC): practical guidelines based on experience of over 40,000
cases. Surg Obes Relat Dis. 2018;14(2):151-159. doi: 10.1016/j.soard.2017.09.528.
AGRADECIMENTO
Crédito da figura 3, relacionada ao texto desse capítulo: “© Dr Levent Efe, courtesy
of IFSO”. Figura disponibilizada para uso gratuito a todos os membros regulares da Inter-
national Federation for the Surgery of Obesity and Metabolic Disorders (IFSO).
37 ABLS Brasil
CAPÍTULO 05
Introdução
O trauma é uma das principais causas de morte no mundo. Anualmente, 5,8 milhões
de pessoas morrem em decorrência de algum tipo de trauma, principalmente em acidentes
de trânsito, quedas e agressões. As vítimas mais recorrentes dessas mortes são jovens do
sexo masculino em idade economicamente ativa [1].
A obesidade é uma doença que tem atingido a sociedade de forma avassaladora nos
dias atuais. Aproximadamente um terço da população mundial está acima do peso [2]. No
Brasil, conforme dados da Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônica
por Inquérito Telefônico (VIGITEL), 18,9% da população está acometida pela obesidade[3].
O paciente obeso, por apresentar maior quantidade de gordura visceral e de subcutâ-
neo, provavelmente possui alguma “proteção” contra traumas, além de apresentar menor
incidência de lesões do trato gastrintestinal e necessidade de abordagem cirúrgica[4]. Entre-
tanto, pacientes obesos que sofreram politraumas apresentam pior evolução e recuperação
pós-operatória quando submetidos aos tratamentos cirúrgicos [5]. A dificuldade técnica das
abordagens cirúrgicas é outro fator negativo para pacientes bariátricos vítimas de trauma [6].
O tratamento cirúrgico aplicado à obesidade é atualmente aquele responsável pelos
melhores resultados no que diz respeito à perda de peso sustentada, controle de comorbi-
dades e aumento da qualidade de vida [7]. O Brasil é o segundo país em número de pacientes
operados, fica apenas atrás dos Estados Unidos. Desde 2001, a cirurgia bariátrica faz parte
do rol de procedimentos do Sistema Único de Saúde (SUS). De acordo com a Sociedade
Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM), em 2017, mais de 100 mil pessoas
foram submetidas a alguma modalidade de cirurgia bariátrica [8].
38 ABLS Brasil
além de poder fornecer sinais indiretos de lesões de vísceras ocas. Infelizmente, diversos
hospitais com foco em atendimento ao trauma não possuem aparelhos de tomografia que
tenham suporte para cargas de peso maiores, o que limita a aplicação mais generalizada
desse procedimento.
A figura 1 demonstra o fluxograma do manejo de pacientes vítimas de trauma con-
tuso abdominal. A abordagem dependerá, sobretudo, da estabilidade clínica do paciente.
Pacientes instáveis e com trauma isolado poderão se beneficiar da realização do FAST
antes mesmo da indicação de LE. Entretanto, caso o exame físico seja incisivo, pacientes
instáveis com trauma isolado de abdome poderão ser levados diretamente para LE. Pacien-
tes politraumatizados e hemodinamicamente instáveis terão indicação de LE, se houver a
presença de líquido livre, observado através do FAST ou de LPD. Caso o FAST ou o LPD
sejam negativos, deve-se buscar outras fontes de sangramento: tórax, pelve, ossos longos
etc. Diante da dificuldade de exclusão de focos de sangramento abdominais, pacientes ba-
riátricos com manutenção do quadro de instabilidade hemodinâmica e sem outros focos
de sangramento devem ser submetidos à LE.
A sutura primária parece ser a abordagem mais adequada para lesões únicas de
delgado que envolvam menos de 50% da circunferência do órgão, independentemente da
localização da lesão.
Lesões penetrantes envolvendo o estômago são mais raras e o tratamento cirúrgico
também depende da localização e da extensão do acometimento. Lesões do pouch gástrico
em pacientes submetidos ao BGYR ou OAGB podem necessitar de ressecção segmentar
com confecção de nova anastomose gastrojejunal até ressecção total do pouch, a depender
do tamanho e da localização da lesão. Lesões que envolvam o estômago excluso, por sua
vez, podem ser resolvidas, na maior parte dos casos, com o fechamento primário da lesão.
Em casos de gastrectomia vertical (sleeve) (Figura 5), é importante avaliar a viabili-
dade do remanescente gástrico para decidir entre fechamento primário ou gastrectomia
segmentar. Em pacientes submetidos à banda gástrica ajustável (BGA) (Figura 6), o maior
risco está nas lesões gástricas proximais à banda ajustável, já que esse segmento pode ser
considerado uma câmara de maior pressão. Portanto, o fechamento primário e as ressecções
de lesões gástricas proximais à banda possuem maior risco de deiscência e de fístula. Nesse
caso, deve-se considerar a retirada do dispositivo, qual seja: a BGA.
cavidade abdominal. A observação clínica seriada pode ser realizada, mesmo que a cavi-
dade tenha sido perfurada.
cientes bariátricos deve ser mais criteriosa e sua reoperação programada deve ser o mais
precoce possível.
Apesar das complicações descritas acima, a indicação de CCD é viável para pacientes
com obesidade, visto que a reanimação em UTI proporciona maior estabilidade clínica ao
paciente, para que ele seja submetido ao tratamento definitivo das lesões [18,19].
Considerações finais
A abordagem de pacientes obesos, ou de pós-bariátrica, vítima de trauma abdominal
é um desafio para médicos emergencistas e para cirurgiões gerais. É necessário conhecer
minimamente as técnicas de cirurgia bariátrica, bem como as alterações endócrino-meta-
bólicas observadas em pacientes obesos para atendê-los, adequada e integralmente.
50 ABLS Brasil
DICAS
▶ A avaliação inicial do trauma abdominal em pacientes pós-ba-
riátrica deverá seguir a mesma padronização adotada pelo ABCDE,
conforme orientação do ATLS;
▶ O cirurgião geral deverá obter do paciente ou de familiares
informações sobre o procedimento bariátrico realizado e sobre o acom-
panhamento durante o pós-operatório;
▶ A utilização de exames complementares pode ser limitada em
pacientes bariátricos em função de restrições de acurácia dos exames e
a restrições referentes ao peso;
▶ Nos casos de pacientes bariátricos com trauma abdominal con-
tuso, a transferência para centros de trauma mais capacitados deverá ser
condicionada à estabilidade hemodinâmica do paciente e aos tipos de
lesões associadas ao trauma abdominal;
▶ Em casos de trauma abdominal com indicação de abordagem
cirúrgica é importante identificar e medir cada segmento intestinal du-
rante a inspeção da cavidade abdominal;
▶ Nos casos bypass gástrico, para melhor identificação das alças
alimentar, biliopancreática e comum, deve-se localizar inicialmente a
válvula ileocecal e, a partir dela, percorrer o intestino delgado de maneira
retrógrada;
▶ Antes do tratamento definitivo de lesões de delgado, deve-se
avaliar a localização da lesão, sua extensão e quantidade de intestino
viável remanescente;
▶ Antes do tratamento definitivo das lesões gástricas, deve-se
avaliar a localização da lesão, sua extensão e viabilidade da anastomose
gastroenteral (quando existente);
▶ A indicação de CCD em pacientes bariátricos deve ser mais
criteriosa e as reabordagens cirúrgicas devem acontecer o mais preco-
cemente possível.
51 ABLS Brasil
Referências
1. Murray CJ, Vos T, Lozano R, Naghavi M, Flaxman AD, Michaud C, et al. Disability-adjusted
life years (DALYs) for 291 diseases and injuries in 21 regions, 1990-2010: a systematic analysis for
the Global Burden of Disease Study 2010. Lancet. 2012;380(9859):2197-223. doi: 10.1016/S0140-
6736(12)61689-4. Erratum in: Lancet. 2013 Feb 23;381(9867):628.
3. Ministério da Saúde, Vigitel Brazil 2016: Surveillence of Risk and Protective Factors for
Chronic Diseases by Telephone Survey, MS/CGDI, Distrito Federal,2016.
4. Fu CY, Bajani F, Butler C, Welsh S, Messer T, Kaminsky M, et al. Morbid Obesity’s Silver
Lining: An Armor for Hollow Viscus in Blunt Abdominal Trauma. World J Surg. 2019;43(4):1007-
13. doi: 10.1007/s00268-018-4872-7.
5. Cameron AJ, Zimmet PZ. Expanding evidence for the multiple dangers of epidemic ab-
dominal obesity. Circulation. 2008;117(13):1624-6. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.108.775080.
6. Gendall KA, Raniga S, Kennedy R, Frizelle FA. The impact of obesity on outcome after
major colorectal surgery. Dis Colon Rectum. 2007;50(12):2223-37. doi: 10.1007/s10350-007-9051-0.
9. Nishijima DK, Simel DL, Wisner DH, Holmes JF. Does this adult patient have a blunt
intra-abdominal injury? JAMA. 2012;307(14):1517-27. doi: 10.1001/jama.2012.422.
10. American College of Surgeons Committee on Trauma. Abdominal and pelvic trauma. In:
American College or Surgeons Committee on Trauma. Advanced Trauma Life Support - ATLS. 10th
edition. Chicago: American College of Surgeons; 2018. 136-154.
11. Stroud T, Bagnall NM, Pucher PH. Effect of obesity on patterns and mechanisms of injury:
Systematic review and meta analysis. Int J Surg. 2018;56:148-154. doi: 10.1016/j.ijsu.2018.05.004.
52 ABLS Brasil
12. Newell MA, Bard MR, Goettler CE, Toschlog EA, Schenarts PJ, Sagraves SG, et al. Body
mass index and outcomes in critically injured blunt trauma patients: weighing the impact. J Am
Coll Surg. 2007;204(5):1056-61; discussion 1062-4. doi: 10.1016/j.jamcollsurg.2006.12.042.
13. Bochicchio GV, Joshi M, Bochicchio K, Nehman S, Tracy JK, Scalea TM. Impact of obe-
sity in the critically ill trauma patient: a prospective study. J Am Coll Surg. 2006;203(4):533-8. doi:
10.1016/j.jamcollsurg.2006.07.001.
14. Bloom MB, Ley EJ, Liou DZ, Tran T, Chung R, Melo N, et al. Impact of body mass index
on injury in abdominal stab wounds: implications for management. J Surg Res. 2015;197(1):162-6.
doi: 10.1016/j.jss.2015.03.052.
16. Tinkoff G, Esposito TJ, Reed J, Kilgo P, Fildes J, Pasquale M, et al. American Association for
the Surgery of Trauma Organ Injury Scale I: spleen, liver, and kidney, validation based on the National
Trauma Data Bank. J Am Coll Surg. 2008;207(5):646-55. doi: 10.1016/j.jamcollsurg.2008.06.342.
17. Edelmuth RC, Buscariolli Ydos S, Ribeiro MA Jr. Cirurgia para controle de danos: estado
atual [Damage control surgery: an update]. Rev Col Bras Cir. 2013;40(2):142-51. Portuguese. doi:
10.1590/s0100-69912013000200011.
18. Duchesne JC, Kimonis K, Marr AB, Rennie KV, Wahl G, Wells JE, et al. Damage control
resuscitation in combination with damage control laparotomy: a survival advantage. J Trauma.
2010;69(1):46-52. doi: 10.1097/TA.0b013e3181df91fa.
19. Johnston M, Safcsak K, Cheatham ML, Smith CP. Management of the Open Abdomen in
Obese Trauma Patients. Am Surg. 2015;81(11):1134-7. PMID: 26672583.
53 ABLS Brasil
III Hematoma Subcapsular, > 50% superfície; Hematoma roto com san-
gramento ativo; Intraparenquimatoso > 10cm
CAPÍTULO 06
Introdução
Plantonistas de emergências hospitalares vão se deparar, cada vez mais, com pacien-
tes bariátricos com complicações pós-operatórias ou com suspeita delas. Assim como em
qualquer serviço dessa natureza, o médico deverá procurar o diagnóstico e instituir as pri-
meiras medidas terapêuticas cabíveis. O que se buscará no presente capítulo é demonstrar
que em tais casos, mais que em outras emergências e urgências habituais, esta tarefa deve
ser muito mais célere, sob pena de o paciente ter agravamento dramático de seu quadro
clínico com consequências ominosas para seu prognóstico.
Fundamental aqui é que médicos plantonistas em emergências, por não serem, em
sua maioria, especialistas nessa área, passem a conhecer as particularidades desses pacientes
e suas operações, a fim de diagnosticar e tratar as possíveis complicações, o mais rápido
possível. Isso deve ser feito para evitar o agravamento desnecessário do prognóstico. O
detalhamento dessas peculiaridades é o objetivo deste capítulo.
Essa situação torna-se mais crítica conforme prolonga-se o tempo para diagnosticá-las e
tratá-las [1].
Não menos preocupante é o fato de pacientes obesos mórbidos demorarem mais tempo
para manifestar a semiologia clássica de quadros de peritonite aguda, tais como dor sob
descompressão brusca, reação peritoneal com defesa involuntária, abdome em tábua etc.
Esses sinais, em obesos, são, geralmente, mais tardios; amiúde, quando presentes, denotam
quadro grave e prognóstico mais reservado. Assim, emergencistas não podem esperar a
ocorrência deles para só então tomarem as medidas urgentes necessárias [2].
são muito tardios em pacientes bariátricos. Quando presentes, devem servir de gatilho
para a ativação imediata da equipe cirúrgica, para que sejam tomadas medidas enérgicas
de ressuscitação hemodinâmica e para a adoção de antibioticoterapia.
Adicionalmente, alguns sinais, embora bastante inespecíficos, são bastante úteis como
guia para indicar uma complicação potencialmente grave; os principais entre eles são:
taquicardia e taquipneia. A seguir, um breve resumo.
Taquicardia
É um achado que pode ter relação com diversas situações, das mais dramáticas,
passando pelas complicações de conduta conservadora, aos transtornos de ansiedade e
conversivos ou outros de menor gravidade. No entanto, no caso de pacientes bariátricos
em pós-operatório, a frequência cardíaca acima de 100 bpm deve deixar o médico da emer-
gência alerta para complicações mais severas. Isso dá-se pois, em casos potencialmente
mais graves, esse achado é quase onipresente. Dor abdominal sem maiores comemorativos
associada à taquicardia pode ser a única apresentação inicial de uma fístula gástrica ou
de hérnia interna, por exemplo. O emergencista deve estar atento e buscar ativamente as
complicações mais sérias na sua presença [5]. Cabe ainda ressaltar que outras complicações
maiores, mas não necessariamente cirúrgicas, podem igualmente causar taquicardia, tais
como: desidratação e embolia pulmonar.
Taquipneia
Geralmente, apresenta-se conjuntamente com a taquicardia e pode sinalizar, com
elevada frequência, complicações graves e de conduta operatória como hemorragia aguda
intra-abdominal, fístula gástrica e hérnia interna. No entanto, assim como a taquicardia,
a taquipneia também pode surgir por complicações de conduta primordialmente clínicas,
como atelectasias pulmonares, pneumonias, embolia pulmonar e anemia pós-operatória.
Essencialmente, na sala de emergência, quando tal sintoma é apresentado, juntamente com
dor abdominal e taquicardia, deve-se investigar os diagnósticos mais graves, mesmo se não
houver claros sinais de peritonite. Pacientes em pós-operatório tardio com hérnia interna
serão, de antemão, provavelmente os principais beneficiados por esse alerta.
Desidratação simples pode causar taquicardia compensatória, mas não taquipneia.
Assim, sua presença ou ausência também pode ser útil nesse tirocínio.
58 ABLS Brasil
Oligúria
A oligúria pode surgir como sintoma de desidratação simples que é relativamente
comum durante o pós-operatório precoce, quando o paciente vai para casa e não ingere
líquidos adequadamente. Nesses casos, outros achados como hipotensão postural e aste-
nia são, geralmente, observados. Contudo, quando a oligúria vem acompanhada de dor
abdominal e de outros sintomas como taquipneia, febre ou prostração pode representar
complicação dramática. Tal quadro deve, portanto, levar o médico de emergência a suspeitar
de estado de choque e/ou de sepse.
Febre
A Febre nos primeiros 3 dias do pós-operatório é geralmente causada por atelectasia
pulmonar, por infecção urinária alta ou baixa (quando usada sonda vesical) ou por flebite
superficial dos membros. Contudo, após esse primeiro momento, esse quadro pode sinalizar
complicações como pneumonia, fístula gástrica e abscesso ou hematoma intra-abdominais.
Aqui, o mais relevante é que a ausência de tais sintomas não afasta complicações graves
uma vez que podem surgir apenas como sintomas tardios. O médico de emergência deve
ter essa informação em mente.
Considerações finais
É importante que médicos dando o primeiro atendimento em emergências bariátricas
pós-operatórias procurem sempre saber qual foi a técnica operatória em questão, uma vez
que, de posse dessa informação, é possível inferir o diagnóstico com maior grau de precisão.
Há complicações que ocorrem com uma técnica, mas não com outra; por exemplo, hérnia
interna não acontece em gastrectomia vertical (sleeve), mas pode ocorrer com bypass
gástrico ou com derivações biliopancreáticas.
Alguns pacientes não sabem especificar a técnica de sua operação, mas é possível in-
ferir essa informação através de algumas perguntas. Felizmente, muitos pacientes recebem
de sua equipe bariátrica um relatório descritivo ou possuem a “carteirinha do paciente
bariátrico” (também disponível pelo App Barilife®). É importante sempre fazer essa averi-
guação na busca pelo tipo de procedimento ao qual o paciente foi submetido.
O conhecimento dos detalhes técnicos das operações bariátricas e principalmente das
particularidades desses pacientes, pode ajudar a chegar a um diagnóstico de modo mais
preciso. É forçoso ressaltar a importância do diagnóstico precoce e da rápida instituição das
medidas terapêuticas iniciais em casos de emergências bariátricas pós-operatórias. Esses
pacientes não só apresentam poucas reservas funcionais como também não costumam
apresentar sinais semiológicos clássicos de peritonite, salvo em situações de maior gravi-
dade, quando, possivelmente, a intervenção médica já não produz os melhores resultados
e o prognóstico torne-se sombrio. Somente mantendo-se um alto nível de suspeição clínica
para as situações de maior risco (especialmente para hérnias internas) é que se pode alcançar
resultados satisfatórios através de diagnóstico ágil e da pronta instituição do tratamento.
61 ABLS Brasil
DICAS
▶ Pacientes bariátricos têm peculiaridades que podem dificultar ou
retardar o diagnóstico de complicações pós-operatórias graves;
▶ O retardo no diagnóstico e na instituição das primeiras medidas
emergenciais nesses pacientes pode levar a um desfecho desfavorável;
▶ Taquicardia e taquipneia, embora inespecíficas, são achados
onipresentes e precoces em quadros clínicos de maior gravidade;
▶ O médico no pronto-atendimento deve ter um elevado índice de
suspeição no que diz respeito às complicações graves e ao baixo limiar
para indicar tratamento cirúrgico de urgência.
Referências
1. Campanile FC, Boru CE, Rizzello M, Puzziello A, Copaescu C, Cavallaro G, et al. Acute
complications after laparoscopic bariatric procedures: update for the general surgeon. Langenbecks
Arch Surg. 2013;398(5):669-86. doi: 10.1007/s00423-013-1077-2.
2. Pakula A, Skinner R. Do acute care surgeons need bariatric surgical training to ensure opti-
mal outcomes in obese patients with nonbariatric emergencies? Surg Obes Relat Dis. 2018;14(3):339-
341. doi: 10.1016/j.soard.2017.12.007.
6. Bhatti JA, Nathens AB, Thiruchelvam D, Redelmeier DA. Weight loss surgery and subse-
quent emergency care use: a population-based cohort study. Am J Emerg Med. 2016;34(5):861-5.
doi: 10.1016/j.ajem.2016.02.007.
7. Rausa E, Bonavina L, Asti E, Gaeta M, Ricci C. Rate of Death and Complications in Lapa-
roscopic and Open Roux-en-Y Gastric Bypass. A Meta-analysis and Meta-regression Analysis on
69,494 Patients. Obes Surg. 2016;26(8):1956-63. doi: 10.1007/s11695-016-2231-z.
CAPÍTULO 07
Introdução
Complicações cirúrgicas dividem-se entre precoces e tardias para que sejam melhor
compreendidas; precoces são aquelas que ocorrem até o trigésimo dia do pós-operatório; as
tardias, por sua vez, acontecem após o trigésimo dia do pós-operatório. Aproximadamente
20% dos pacientes submetidos à cirurgia bariátrica retornam ao hospital com queixas em
até 90 dias de pós-operatório [1].
Dentre as queixas de admissão em pronto-socorro, encontram-se: dor abdominal
como sintoma mais prevalente, seguido por náuseas e vômitos. Dessa forma, a dor ab-
dominal pós-operatória é frequente e pode abranger de eventos simples até quadros de
diagnósticos difíceis e potencialmente fatais [2-4].
Obstrução intestinal
Apesar de acontecer com maior frequência como complicação tardia, a obstrução
intestinal também pode ocorrer nos dias iniciais do pós-operatório. Em alguns casos, pa-
cientes apresentam quadros obstrutivos logo nos primeiros dias; em média, no 5º dia do
pós-operatório. Seus sintomas mais frequentes são náuseas e vômitos (54%), seguido por
64 ABLS Brasil
dor abdominal (45%). Existem diversas causas para obstrução precoce, as mais comuns
são: torção da anastomose jejunojejunal, coágulo intraluminal próximo à anastomose
jejunojejunal, hematomas e aderências ou bridas prévias. A tomografia computadorizada
com contraste oral e endovenoso é o principal exame para definir-se o quadro de abdome
agudo obstrutivo; porém, a definição da etiologia e do tratamento é geralmente realizado
por meio de abordagem cirúrgica do abdome.
Obstruções precoces podem ter relação com problemas técnicos, principalmente na
confecção de anastomoses, diferente das apresentadas tardiamente, que em sua maioria
são secundárias às aderências intra-abdominais ou às hérnias internas.
Trombose portomesentérica
Trombose portomesentérica é o termo utilizado para definir a obstrução parcial ou
total da veia porta e/ou das veias mesentéricas. Ela é incomum, porém potencialmente
letal e descrita com mais frequência após procedimentos laparoscópicos, além de ser mais
frequente após um sleeve e ter incidência estimada em até 1%. Apesar de muito pouco
frequente, a trombose portomesentérica também pode estar presente em casos de bypass
gástrico [9].
Embora possa haver quadro de dor abdominal associada a náuseas e vômitos, não
raramente a trombose portomesentérica pode ser completamente assintomática. Frequen-
temente, tal quadro ocorre em pacientes com coagulopatia ou com histórico de outros
eventos tromboembólicos. O diagnóstico pode ser feito por tomografia computadorizada
com contraste oral ou endovenoso, para identificar trombose venosa em região portome-
sentérica, de extensão variável. O tratamento é realizado com anticoagulação; porém, a
presença de irritação peritoneal ou a suspeita de isquemia e necrose intestinal demandam
abordagem cirúrgica imediata.
Estenose de anastomose
A estenose da anastomose gastrojejunal do bypass gástrico ocorre entre 3% e 27% dos
casos; sua fisiopatologia ainda não é bem definida [10]. Acredita-se que a técnica de confecção
(grampeadores / sutura manual) e fatores intrínsecos ao paciente (tabagismo, diabetes e
comorbidades) podem aumentar o risco para essa complicação. Além disso, outros aspec-
tos técnicos como tensão na anastomose, estabilidade hemodinâmica, hematomas locais e
desenvolvimento de fístulas podem influenciar sua ocorrência.
67 ABLS Brasil
Úlcera marginal
A úlcera marginal, ou úlcera de boca anastomótica, é uma complicação preocupante
no pós-operatório do bypass gástrico; sua incidência varia de 0,6% a 16%. A presença de
diabetes, histórico de úlcera péptica prévia, tabagismo, uso de AAS e de anti-inflamatórios
não-esteroidais (AINES), são alguns fatores de risco para essa complicação. Ocorre fre-
quentemente próxima à anastomose gastrojejunal e sua fisiopatologia não é bem definida;
contudo, acredita-se em lesão da mucosa jejunal resultante de secreção ácida e de isquemia
local. Outras causas que podem estar associadas à úlcera são: infecção pelo Helicobacter
pylori e presença de corpos estranhos no local, como fios inabsorvíveis ou materiais de
sutura mecânica.
O quadro clinico mais frequente é dor abdominal, náuseas e vômitos e, mais raramente,
sangramento digestivo. Apesar de a maior parte dos pacientes apresentar as queixas pre-
viamente descritas aqui, há uma parcela considerável deles que permanece assintomática.
O diagnóstico definitivo é firmado por endoscopia digestiva.
O tratamento da úlcera marginal pode ser realizado de forma clínica por meio de
supressão ácida (inibidores de bombas de prótons) associada ao uso de sucralfato, com
taxa de resolução próxima a 95%. Além da terapia medicamentosa, a suspensão de uso de
AINES e o encorajamento à cessação do tabagismo são recomendados. Sua erradicação
também é recomendada para pacientes com infecção por Helicobacter pylori.
68 ABLS Brasil
Hérnia interna
Hérnias internas podem ocorrer em pacientes submetidos às cirurgias bariátricas,
em especial nos casos de bypass gástrico. A incidência dos casos varia entre 1% e 6% na
literatura e trata-se da principal causa de obstrução intestinal no pós-operatório de bypass
gástrico [11]. Esses defeitos são identificados na região da anastomose jejunojejunal e no espa-
ço entre o mesocolon transverso e o mesentério da alça alimentar. Pode ocorrer um defeito
no local da abertura do mesocólon transverso em casos de transposição da alça alimentar
por via transmesocólica. O fechamento ou não dos defeitos mesentéricos ainda é tema de
discussão entre cirurgiões bariátricos. No entanto, estudos indicam que o fechamento dos
defeitos com sutura inabsorvível parece mostrar menor incidência de hérnia interna [12].
A apresentação clinica de dor abdominal aguda é observada em até 75% dos casos.
Contudo, uma parte dos pacientes pode apresentar dor abdominal de curso intermitente,
crônica, associada ou não a quadros sub-oclusivos. A tomografia computadorizada pode
servir de auxílio diagnóstico; no entanto, estima-se que em até 45% dos casos esse exame
não mostrará alterações significativas. A presença do “redemoinho mesenterial” é o achado
mais relevante, pois é forte preditor de hérnia interna. Em casos de suspeita clínica impor-
tante, mesmo sem achados de imagem consistentes, a exploração cirúrgica da cavidade
abdominal, seja por laparoscopia ou por laparotomia, é de extrema valia, podendo ser
diagnóstica e terapêutica.
O tratamento desses casos é majoritariamente cirúrgico e dependerá dos achados
intra-operatórios. Na ausência de alteração da perfusão das alças envolvidas, a redução do
conteúdo herniado e o fechamento do defeito mesentérico podem ser suficientes para a
resolução do problema. No entanto, caso a viabilidade das alças envolvidas seja duvidosa, a
ressecção do segmento comprometido, seguida de anastomose intestinal deve ser realizada.
Outras causas
Outras situações menos frequentes também podem causar dor abdominal precoce
ou tardia no pós-operatório da cirurgia bariátrica. Embora de ocorrência bem menos
frequente, tais sintomas devem estar presentes no diagnóstico diferencial desses pacientes.
69 ABLS Brasil
Considerações finais
Na era das cirurgias minimamente invasivas (videolaparoscópicas), não é comum
haver dor abdominal intensa no pós-operatório recente que cause grande incômodo ao
paciente, em casos de cirurgia bariátrica. Sendo assim, pacientes bariátricos com dor
abdominal que atendimento em serviços de emergência devem ser cuidadosamente exa-
minados (exames clínicos e complementares) para possíveis complicações relacionadas
ao procedimento. Do mesmo modo, a dor abdominal pode, por vezes, ser o único sinal
de alerta para complicações tardias que podem, em alguns casos, demandar tratamento
de urgência / emergência.
70 ABLS Brasil
DICAS
▶ A dor abdominal é um sintoma bastante frequente em casos de
complicações pós-bariátrica;
▶ O exame físico abdominal de pacientes obesos recém-operados, e
que, portanto, ainda estão obesos, pode ser enganoso. Valorize sempre o
sintoma de dor abdominal do paciente, especialmente se estiver associado
à febre e taquicardia;
▶ Na dúvida, exames complementares devem ser realizados;
▶ Sempre que um paciente bariátrico procurar um pronto-atendi-
mento/ pronto-socorro com quadro de dor abdominal, o médico emer-
gencista deve ter alto grau de suspeição para a ocorrência de complicações.
71 ABLS Brasil
Referências
1. Macht R, George J, Ameli O, Hess D, Cabral H, Kazis L. Factors associated with bariatric
postoperative emergency department visits. Surg Obes Relat Dis. 2016;12(10):1826-1831. doi:
10.1016/j.soard.2016.02.038.
3. Frederiksen SG, Ekelund M. Mesenteric Torsion as a Cause of Late Abdominal Pain after
Gastric Bypass Surgery. Obes Surg. 2016;26(4):896-9. doi: 10.1007/s11695-015-2042-7.
4. Sima E, Hedberg J, Sundbom M. Gastrointestinal symptoms, weight loss and patient sa-
tisfaction 5 years after gastric bypass: a study of three techniques for the gastrojejunal anastomosis.
Surg Endosc. 2016;30(4):1553-8. doi: 10.1007/s00464-015-4374-8.
5. Monkhouse SJ, Morgan JD, Norton SA. Complications of bariatric surgery: presen-
tation and emergency management--a review. Ann R Coll Surg Engl. 2009;91(4):280-6. doi:
10.1308/003588409X392072.
6. Fernandez AZ Jr, DeMaria EJ, Tichansky DS, Kellum JM, Wolfe LG, Meador J, Sugerman
HJ. Experience with over 3,000 open and laparoscopic bariatric procedures: multivariate analysis
of factors related to leak and resultant mortality. Surg Endosc. 2004;18(2):193-7. doi: 10.1007/
s00464-003-8926-y.
7. Smith MD, Adeniji A, Wahed AS, Patterson E, Chapman W, Courcoulas AP, Dakin G,
Flum D, McCloskey C, Mitchell JE, Pomp A, Staten M, Wolfe B. Technical factors associated with
anastomotic leak after Roux-en-Y gastric bypass. Surg Obes Relat Dis. 2015;11(2):313-20. doi:
10.1016/j.soard.2014.05.036.
8. Gonzalez R, Sarr MG, Smith CD, Baghai M, Kendrick M, Szomstein S, Rosenthal R, Murr
MM. Diagnosis and contemporary management of anastomotic leaks after gastric bypass for obesity.
J Am Coll Surg. 2007;204(1):47-55. doi: 10.1016/j.jamcollsurg.2006.09.023.
9. James AW, Rabl C, Westphalen AC, Fogarty PF, Posselt AM, Campos GM. Portome-
senteric venous thrombosis after laparoscopic surgery: a systematic literature review. Arch Surg.
2009;144(6):520-6. doi: 10.1001/archsurg.2009.81.
10. Kumbhari V, Tieu AH, Ngamruengphong S, Aguila G, Schweitzer MA, Khashab MA,
Singh VK. Endoscopic management of stomal stenosis after Roux-en-Y gastric bypass. Gastrointest
Endosc. 2015;82(4):747. doi: 10.1016/j.gie.2015.05.032.
11. Steele KE, Prokopowicz GP, Magnuson T, Lidor A, Schweitzer M. Laparoscopic antecolic
Roux-en-Y gastric bypass with closure of internal defects leads to fewer internal hernias than the
retrocolic approach. Surg Endosc. 2008;22(9):2056-61. doi: 10.1007/s00464-008-9749-7.
12. Higa KD, Boone KB, Ho T. Complications of the laparoscopic Roux-en-Y gastric bypass: 1,040
patients--what have we learned? Obes Surg. 2000;10(6):509-13. doi: 10.1381/096089200321593706.
13. Stephenson D, Moon RC, Teixeira AF, Jawad MA. Intussusception after Roux-en-Y gastric
bypass. Surg Obes Relat Dis. 2014;10(4):666-70. doi: 10.1016/j.soard.2014.01.026.
73 ABLS Brasil
CAPÍTULO 08
Introdução
Com base em um cuidadoso histórico clínico (anamnese e exame físico), exames
de imagem podem ter grande valia na condução de pacientes bariátricos atendidos em
unidades de urgência e emergência. Exames de imagem mais modernos e com maior in-
corporação tecnológica, como ultrassonografias, tomografias com contraste oral e venoso
e radiografias digitais, podem fornecer informações mais precisas e detalhadas acerca da
suspeita clínica. No entanto, por vezes, e sobretudo no serviço público (SUS), a radiografia
simples é um único exame de imagem disponível no setor de urgência.
Alterações anatômicas do tubo digestório provocadas por diversos procedimentos
bariátricos podem trazer algumas peculiaridades à avaliação de imagens de radiografias
simples do abdome. Portanto, é importante que o médico emergencista conheça o desenho
técnico dos procedimentos bariátricos mais comumente realizados no país. Esse conheci-
mento será fundamental para a correta interpretação dos achados normais e anormais. Isso
permitirá a diferenciação entre alterações radiológicas decorrentes do procedimento bariá-
trico em si (achados normais) e aquelas relacionadas às complicações (achados anormais).
Portanto, o objetivo deste capítulo é auxiliar emergencistas na interpretação de alguns
achados, através de radiografias simples de abdome realizadas em a pacientes submetidos
à cirurgia bariátrica.
músculo psoas, alça sentinela e aglomerado de conteúdo fecal e/ou fecalito nas apendicites.
Assim como em pacientes não bariátricos, a ultrassonografia e a tomografia computado-
rizada de abdome são os melhores exames complementares de imagem do abdome agudo
inflamatório.
Fístulas digestivas
Fístulas digestivas, tanto das anastomoses quanto das linhas de grampeamento, são
complicações muito temidas por pacientes e por cirurgiões. Para minimizar as elevadas
taxas de morbidade, e até de mortalidade, elas devem ser diagnosticadas e tratadas pre-
cocemente.
O tempo de aparecimento das fístulas se dá, na maioria das vezes, entre o terceiro e
o décimo dia de pós-operatório [2]. Dor abdominal associada a uma síndrome de resposta
inflamatória sistêmica é o sinal clínico precoce mais característico. Taquicardia mantida
mesmo após a analgesia é um sinal de alerta muito importante [2]. Leucograma alterado e
PCR aumentado são possíveis evidências laboratoriais. Exames de imagem podem ajudar
na confirmação do diagnóstico. Porém, frente às situações clínicas evidentes, o cirurgião
pode utilizar-se da laparoscopia como método diagnóstico e terapêutico.
Em casos de suspeição de fístula digestiva após a cirurgia bariátrica, a tomografia ab-
dominal total com contraste oral e venoso talvez seja o exame com acurácia adequada para
o auxílio diagnóstico [5]. Entretanto, o peso corporal do paciente pode ser uma limitação
para a realização da tomografia no pós-operatório imediato de cirurgia bariátrica - em
geral, as mesas de tomógrafos não suportam indivíduos com mais de 150 kg.
Um sinal muito sugestivo de fístula digestiva pós-bariátrica frente a uma forte sus-
peição clínica, pode ser um discreto derrame pleural à esquerda, com apagamento do seio
costofrênico identificado em uma radiografia simples de abdome e tórax na urgência.
Esse derrame pleural decorre de processo inflamatório por contiguidade, consequente do
acúmulo de conteúdo fistuloso no espaço subfrênico esquerdo.
Realizar uma radiografia contrastada (contraste não baritado) com o intuito de
caracterizar o local do escape do contraste e, portanto, de identificar o local da fístula
(deiscência), tanto no sleeve (Figura 7) quanto no bypass gástrico (Figura 8) é uma opção
de complementação diagnóstica, quando disponível.
Considerações finais
Radiografias simples de tórax e abdome em pacientes bariátricos quando realizadas
com boa técnica e analisadas com o devido cuidado, podem ser uma importante ferramenta
de auxílio diagnóstico, sobretudo nos locais nos quais os exames de imagem mais elabo-
rados não estão disponíveis no setor de urgência. Médicos emergencistas devem conhecer
minimamente o desenho técnico dos principais procedimentos bariátricos, bem como a
apresentação clínica das complicações mais comuns, de forma a atingir a interpretação
dos achados.
Apesar do valor de uma radiografia simples de abdome e tórax nas urgências bariátri-
cas, o principal exame de imagem complementar talvez seja a tomografia abdominal total,
com contraste oral e venoso. Por ser esse o exame de eleição, e talvez o mais realizado,
informações científicas a respeito do uso da radiografia simples frente às mais diversas
complicações em cirurgia bariátrica ainda são escassas.
85 ABLS Brasil
Referências
1. Sabiston; Textbook of Surgery; 18 edição, Cap abd agudo, cap 45: 1180 – 1197.
2. Acquafresca PA, Palermo M, Rogula T, Duza GE, Serra E. Complicações cirúrgicas pre-
coces após bypass gástrico: revisão da literature. Arq Bras Cir Dig. 2015;28(1):74-80. doi: 10.1590/
S0102-67202015000100019.
3. Shah S, Shah V, Ahmed AR, Blunt DM. Imaging in bariatric surgery: service set-up, post-
-operative anatomy and complications. Br J Radiol. 2011;84(998):101-11. doi: 10.1259/bjr/18405029.
AGRADECIMENTOS
1. Prof. Dr. Eduardo Lemos de Souza Bastos, membro titular da SBCBM-SP, pela
cessão de uso da figura 5.
2. Dr. Dirceu Barbosa dos Santos, membro titular da SBCBM-SP, pela cessão de uso
das figuras 7 e 8.
3. Dr. Thiago Sivieri, membro titular da SBCBM-SP, pela cessão de uso das figuras
9 e 10.
87 ABLS Brasil
CAPÍTULO 09
Introdução
De acordo com o modelo da ultrassonografia (US) consultiva tradicional, o médico
de plantão em unidade de emergência solicita o exame de imagem e aguarda sua realização
pelo radiologista. O tempo gasto para a realização do exame pode retardar a aplicação de
medidas iniciais em casos mais graves. Ao usar a ultrassonografia à beira do leito (USBL),
o médico emergencista pode adquirir e interpretar as imagens no local de atendimento,
assim como fazer uso de tais informações de imediato para abordar hipóteses diagnósticas
e orientar o tratamento mais adequado. Quando o próprio médico emergencista realiza o
exame, pois tem pleno conhecimento do caso clínico e do exame físico do paciente, tor-
na-se capaz de integrar rapidamente os resultados da USBL na formulação diagnóstica [1]
Sendo assim, a USBL vem tornando-se uma ferramenta diagnóstica e de auxílio tera-
pêutico essencial nas unidades de emergência/pronto-atendimento e de terapia intensiva.
Ultrassonografia Cardíaca
O termo FoCUS visa conceituar uma abordagem básica e simplificada do coração;
sua aplicação deve ser direcionada por sintomas demonstrados pelo paciente (usualmente
dispneia ou choque), fato que diferencia esse método da ecocardiografia tradicional [4]. Os
principais objetivos da US cardíaca são avaliar a presença de derrame pericárdico, mensu-
rar a função sistólica global, identificar dilatações significativas dos ventrículos esquerdo
e direito, estimar o volume intravascular, guiar eventual pericardiocentese ou confirmar
o posicionamento de um fio de marcapasso trans venoso. Os exames devem ser sempre
centrados na busca de uma resposta para possíveis alterações que envolvam a função ventri-
cular como causa de choque circulatório ou o aumento de água extravascular pulmonar [5].
As janelas para esternal, subcostal e apical são usadas para avaliar a função sistólica
do ventrículo esquerdo (VE). O objetivo é observar a excursão endocárdica e o espessa-
mento miocárdico, de modo a diferenciar os pacientes com função ventricular normal,
ou minimamente comprometida, daqueles com disfunção ventricular severa. Esses dados
facilitam a tomada de decisão clínica em casos de pacientes com dispneia ou dor torácica
com contratilidade sistólica diminuída, pois tais quadros aceleram a indicação e o início
das terapias farmacológicas e de outras intervenções [6]. Outros diagnósticos (massas in-
tracardíacas, trombo de VE, disfunção valvular, alterações segmentares de contratilidade,
endocardite, dissecção da aorta) podem parecer suspeitados através da US cardíaca, mas,
nesses casos, recomenda-se complementação da avaliação com ecocardiografia tradicio-
nal. A janela apical é a mais utilizada para fornecer uma visão rápida das quatro câmaras
cardíacas, das válvulas e da via de saída do VE (Figura 1).
Ultrassonografia Pulmonar
O protocolo BLUE da USBL foi desenvolvido para simplificar e reduzir o tempo de
diagnóstico de algumas afecções pulmonares agudas [6]. Com base nesse protocolo, são feitas
aquisições em três segmentos do tórax para identificar o edema pulmonar intersticial por
meio de artefatos chamados de “linhas B” (Figura 2). Essas imagens são produzidas pela
reverberação das ondas sonoras na pleura, provavelmente devido ao acúmulo de fluído
e, consequente, alargamento dos septos interlobulares. Os achados normais, por sua vez,
são conhecidos como padrão de “linhas A”, imagens lineares horizontais repetidas das
pleuras[7] (Figura 3).
As linhas B também podem ser utilizadas para o diagnóstico de pneumotórax, pois,
sendo originadas pela pleura visceral, sua simples presença demonstra que a pleura visceral
está “colada” na pleura parietal. Esse quadro exclui, assim, a possibilidade de pneumotórax
89 ABLS Brasil
Ultrassonografia Abdominal
A popularização da US de abdome em emergência médica seguiu a implementação
do protocolo FAST, o qual foi incorporado ao ATLS (Advanced Trauma Life Support)
em 2012 como substituto do lavado peritoneal diagnóstico em pacientes com instabili-
dade hemodinâmica vítimas de trauma contuso. Uma extensão do FAST, denominada
FAST-estendido ou e-FAST, foi desenvolvida para ampliar o protocolo. Ela ampliou a
avaliação da cavidade torácica, ou seja, incorporou o US pulmonar como descrito acima.
92 ABLS Brasil
O FAST é classicamente realizado com o paciente em posição supina; desta forma, possui
alta sensibilidade para detectar o líquido livre na cavidade abdominal, podendo localizar
volumes tão pequenos quanto 100 ml. Alterações na posição do paciente podem mudar
os achados esperados, pois a posição de Trendelenburg aumenta a sensibilidade do teste
para diagnosticar fluido livre abdominal.
Além das janelas do FAST, pode-se ampliar a visualização de órgãos frequentemente
envolvidos em complicações pós-operatórias, principalmente, em pacientes submetidos à
cirurgia bariátrica. Portanto, é altamente recomendável tentar adquirir imagens do fígado,
da vesícula biliar e do sistema canalicular, da veia porta, dos rins, do pâncreas, do apêndice
cecal e dos intestinos. Embora a obtenção de imagens com boa qualidade nem sempre é
possível, informações relevantes geralmente podem ser obtidas através dessa avaliação.
Fig 4a e 4b. Avaliação ultrassonográfica da veia cava inferior. Variação do calibre (enchimento) durante a
inspiração e expiração.
2 Em seguida, buscar imagens da veia cava inferior e do coração – macro circulação e he-
modinâmica -; sinais de sobrecarga; tamponamento; função ventricular (VE e VD)
4 Ao final, pode-se fazer um exame mais amplo, buscando insonar a vesícula biliar, o pân-
creas, os rins, a bexiga, o apêndice cecal e a pelve
do saco pericárdico e dar uma ideia inicial da condição estrutural do coração, da sua
função ventricular e dos enchimentos das câmaras cardíacas. Essas informações devem
ser integradas a outras variáveis, como tempo de enchimento capilar, temperatura da pele,
estado de consciência e disponibilidade de lactato arterial no momento de decidir-se sobre
a necessidade de expansão volêmica ou do uso de drogas vasoativas. A tabela 2 sumariza
a sequência sugerida para utilização da USBL em paciente bariátrico admitido em pron-
to-atendimento.
95 ABLS Brasil
Dor abdominal
Esse é o sintoma mais comumente relatado por pacientes em pós-operatório de cirur-
gia bariátrica, pois pode refletir diferentes condições intra-abdominais. Protocolos já bem
estabelecidos para pacientes vítimas de trauma são usualmente utilizados, com as devidas
adaptações para o ganho de agilidade na propedêutica e no diagnóstico de complicações
abdominais pós-operatórias em obesos operados.
O e-FAST, acrescido de algumas aquisições, talvez seja o método mais fidedigno para
afastar possíveis diagnósticos diferenciais em pacientes que apresentam dor abdominal
ou torácica e que foram submetidos à cirurgia bariátrica. A figura 5 ilustra as janelas para
aquisições de imagens; a tabela 3 descreve o que é possível avaliar em cada uma delas.
Limitação do método
A principal limitação da ecografia em obesos é a atenuação provocada pelo tecido
adiposo, o que pode limitar a profundidade e dificultar a formação de imagens, mesmo com
transdutores de baixa frequência. Uma maneira de minimizar esse efeito adverso é escolher
transdutores com as menores frequências possíveis, aumentar a profundidade e ajustar a
escala de ganho, além de comprimir o transdutor contra a parede abdominal do paciente.
Considerações finais
A USBL desempenha papel importante no atendimento inicial de pacientes com
intercorrências relacionadas ao pós-operatório de cirurgia bariátrica. Médicos emergen-
cistas familiarizados com o método em unidades que disponham de aparelhos de ultras-
sonografia podem lançar mão dos protocolos descritos acima para agilizar o diagnóstico
de complicações mais comuns nesse grupo de pacientes. Isso reduzirá as janelas de tempo
entre diagnóstico e condutas iniciais em pacientes mais graves, municiando o cirurgião
com informações importantes para a tomada de decisão terapêutica.
96 ABLS Brasil
DICAS
▶ A avaliação deve ser iniciada pelo pulmão, para buscar sinais
de congestão (linhas B) ou derrame pleural se houver dor torácica ou
dispneia, como queixa principal;
▶ Um derrame pleural isolado, à esquerda, pode ser reacional ao
processo inflamatório sub-diafragmático e estar associado a complica-
ções precoces (fístula) de cirurgia bariátrica;
▶ O diagnóstico de tromboembolismo pulmonar como causa de
insuficiência respiratória pode ser considerado se a US cardíaca mostrar
sobrecarga de VD e/ou cor pulmonale agudo, em casos mais severos.
O protocolo ECUS do sistema venoso pode corroborar o diagnóstico;
▶ Dentre as janelas utilizadas para avaliação do abdome, o espaço
de Morrison talvez seja a mais importante para pacientes em pós-ope-
ratório. A presença de líquido livre na cavidade abdominal, seja sangue,
secreção bilio-entérica ou líquido inflamatório, será normalmente
detectada nessa janela de insonação, se apresentar volume significativo;
▶ Por último, é sempre importante avaliar o status volêmico do
paciente no momento de sua chegada ao pronto-atendimento para
determinar e guiar a necessidade de expansão volêmica.
100 ABLS Brasil
Referências
1. Whitson MR, Mayo PH. Ultrasonography in the emergency department. Crit Care.
2016;20(1):227. doi: 10.1186/s13054-016-1399-x.
2. Özkan B, Ünlüer EE, Akyol PY, Karagöz A, Bayata MS, Akoğlu H, et al. Stethoscope versus
point-of-care ultrasound in the differential diagnosis of dyspnea: a randomized trial. Eur J Emerg
Med. 2015;22(6):440-3. doi: 10.1097/MEJ.0000000000000258.
4. Labovitz AJ, Noble VE, Bierig M, Goldstein SA, Jones R, Kort S, et al. Focused cardiac ultra-
sound in the emergent setting: a consensus statement of the American Society of Echocardiography
and American College of Emergency Physicians. J Am Soc Echocardiogr. 2010;23(12):1225-30. doi:
10.1016/j.echo.2010.10.005.
5. Via G, Hussain A, Wells M, Reardon R, ElBarbary M, Noble VE, et al. International eviden-
ce-based recommendations for focused cardiac ultrasound. J Am Soc Echocardiogr. 2014;27(7):683.
e1-683.e33. doi: 10.1016/j.echo.2014.05.001.
6. Zimmerman JM, Coker BJ. The Nuts and Bolts of Performing Focused Cardiovascular
Ultrasound (FoCUS). Anesth Analg. 2017;124(3):753-60. doi: 10.1213/ANE.0000000000001861.
8. Bourcier JE, Paquet J, Seinger M, Gallard E, Redonnet JP, Cheddadi F, et al. Performance
comparison of lung ultrasound and chest x-ray for the diagnosis of pneumonia in the ED. Am J
Emerg Med. 2014;32(2):115-8. doi: 10.1016/j.ajem.2013.10.003.
9. Needleman L, Cronan JJ, Lilly MP, Merli GJ, Adhikari S, Hertzberg BS, et al. Ultrasound
for Lower Extremity Deep Venous Thrombosis: Multidisciplinary Recommendations from the
Society of Radiologists in Ultrasound Consensus Conference. Circulation. 2018;137(14):1505-15.
doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.117.030687.
101 ABLS Brasil
CAPÍTULO 10
Introdução
Hemorragia digestiva é definida como um sangramento proveniente de qualquer
ponto do trato gastrointestinal (TGI). Pode ser classificada como hemorragia digestiva
alta (HDA), quando o sítio de sangramento ocorre à montante do ângulo de Treitz e como
hemorragia digestiva baixa (HDB), quando à jusante da mesma referência anatômica [1].
As causas mais comuns de HDA (úlcera péptica, gastrite erosiva e varizes de esôfa-
go) e de HDB (doença diverticular, angiodisplasia e tumores) também podem surgir em
pacientes depois da cirurgia bariátrica [1].
Após um procedimento bariátrico, os sítios/causas de hemorragia digestiva podem
ser divididos em precoces e tardios. Quanto aos precoces (até 14 dias de pós-operatório)
há a linha de grampo, a anastomose gastro-entérica, a anastomose êntero-entérica, a lesão
de vísceras, a lesão de vasos mesentéricos e a lesão de vasos curtos. Quanto às mais tardias
(> 14 dias de PO), há a intussuscepção intestinal, a úlcera péptica duodenal, a úlcera de
estômago excluso, a síndrome de Mallory-Weiss e a úlcera marginal. O sangramento pode,
ainda, ser dividido em: intraluminal ou extra luminal [27].
A incidência global de sangramento digestivo após uma cirurgia bariátrica é relati-
vamente baixa, entre 1,9 % e 4,4 %; porém, ele é a segunda maior causa de complicações
relacionada à cirurgia. Pode ser um pouco mais significativo em laparoscopia se compa-
rado à técnica convencional (1,6 % vs. 0,6 %, respectivamente), com taxa de mortalidade
menor que 1% [1,3].
Em casos de hemorragias manifestadas precocemente (em até 48 horas de pós-ope-
ratório), cerca de 40% dos casos de sangramento intraluminal são originados no estômago
excluso, 30% na anastomose gastroentérica e 30 % na anastomose enterro-entérica. Focos
de sangramentos extra luminais são menos frequentes e ocorrem em sítio de punções
102 ABLS Brasil
Exame endoscópico
A endoscopia digestiva alta (EDA) é um exame essencial e deve ser realizado o quanto
antes, tanto em casos de pós-operatório precoce quanto tardio, pois, além de possibilitar
o diagnóstico, pode ser terapêutico em alguns casos [9].
103 ABLS Brasil
Em casos de gastrectomia vertical (sleeve), toda a cirurgia bariátrica pode ser investi-
gada por EDA, uma vez que o procedimento cirúrgico se resume a uma intervenção sobre
o estômago - não há segmentos exclusos ao trânsito intestinal. Já para pacientes submetidos
ao bypass gástrico, o pouch gástrico e a gastrojejunoanastomose são facilmente acessíveis
por EDA. Não obstante, a êntero-êntero-anastomose e os segmentos exclusos (estômago
e duodeno) são de difícil acesso e requerem centros de endoscopia avançada com endos-
copistas bastante treinados. Por vezes, é necessário o acesso cirúrgico (gastrostomia) para
permitir a investigação endoscópica do estômago remanescente e do duodeno. Na ausência
desses recursos mais avançados, uma abordagem cirúrgica não deve ser protelada em caso
de pacientes com sangramento agudo e de repercussão hemodinâmica [11-13].
Exames de imagem
Exames de imagem padrão-ouro para sangramento digestivo são os mesmos ado-
tados para etiologias não relacionadas à cirurgia bariátrica. Além de orientar o sítio de
sangramento, a angiografia pode possibilitar a embolização como tentativa de parar o
sangramento ativo, principalmente em pacientes instáveis e deve ser utilizada apenas em
caso de falha endoscópica.
Alguns aparelhos de tomografia computadorizada ou de ressonância magnética po-
dem simular uma gastroduodenoscopia virtual, sugerindo a localização da lesão, porém,
não permitem análise de mucosa luminal e servem para orientar a abordagem cirúrgica.
Também evidenciam distensão de alças e estômago bem como coleção líquida intracavitária.
Tratamento clínico
Medidas para estabilização hemodinâmica do paciente são sempre a primeira e prin-
cipal etapa a ser adotada. Condutas para ressuscitação e estabilização hemodinâmica em
pacientes bariátricos em nada diferem daquelas adotadas para pacientes não bariátricos.
A abordagem depende, sobretudo, da gravidade do quadro clínico, do tempo de
pós-operatório e do possível local de sangramento. Ela poderá ser controlada, de maneira
geral, por medidas clínicas, já que o sangramento é autolimitado na maioria dos pacientes.
Inibidores de bomba de prótons, sucralfato, reposição volêmica, interrupção de anticoa-
gulantes e anti-inflamatórios e monitorização serão suficientes grande parte das vezes. Em
alguns casos, uma hemotransfusão também pode ser necessária. Em casos de sangramento
intraluminal, a abordagem endoscópica pode ser resolutiva. Somente uma pequena parcela
dos pacientes irá necessitar de abordagem cirúrgica (laparoscópica ou laparotômica).
104 ABLS Brasil
Tratamento endoscópico
A abordagem endoscópica é o método de eleição para tratar grande parte das condi-
ções. A endoscopia pode ser realizada em qualquer tempo de pós-operatório, desde que por
mãos experientes. Pode ser realizada com insuflação de CO2 ou pela técnica “underwater”
para maior segurança em casos precoces [13].
Uso de endoclipes, injeções de epinefrina, eletrocoagulação ou ablação com plasma de
argônio são alguns dos métodos endoscópicos utilizados e mais disponíveis. Outra opção,
se disponível, é a sutura endoscópica ou “overstitch” - mecanismo de sutura endoscópica
com fio inabsorvível. O endoscopista deve estar familiarizado com a anatomia pós-ope-
ratória e deve ter o cuidado de não insuflar demasiadamente, evitando, assim, o aumento
de tensão nas linhas de grampeamento [13-15].
A SBCBM está desenvolvendo um programa de orientação sobre endoscopia em
cirurgia bariátrica denominado EBLS (Endoscopic Bariatric Life Support), com ênfase na
atuação do médico endoscopista frente às urgências bariátricas.
Tratamento cirúrgico
Nos casos em que as medidas clínicas e endoscópicas não são suficientes para controlar
as repercussões hemodinâmicas do sangramento, a abordagem cirúrgica deve ser consi-
derada. Essa opção terapêutica deve ser analisada, sobretudo, se o sangramento ocorrer
nas primeiras 48 horas de pós-operatório e for extra luminal (não acessível à endoscopia).
A via de acesso ao abdome depende da via de acesso da cirurgia bariátrica primária
e da expertise em laparoscopia da equipe cirúrgica de plantão. Se o paciente foi prima-
riamente operado por via aberta (laparotomia) e o cirurgião geral de plantão não possuir
treinamento avançado em laparoscopia, a abordagem cirúrgica deve ser feita por laparo-
tomia, sem retardo. Em casos de grave instabilidade hemodinâmica, a via laparotômica
pode ser mais rápida e segura. Lembre-se: a via laparoscópica foi utilizada em condições
eletivas. O sangramento digestivo grave é uma emergência médica. Situações diferentes
requerem abordagens diferentes.
O objetivo da abordagem cirúrgica é buscar o local do sangramento e promover
a hemostasia cirúrgica, como habitualmente é feito em pacientes não bariátricos. No
entanto, não raramente, o achado intraoperatório resume-se à presença de hematomas
intracavitários; não sendo possível identificar o local exato do sangramento. Nesses casos, a
retirada dos hematomas e a lavagem da cavidade podem ser as únicas medidas cirúrgicas. A
105 ABLS Brasil
Considerações finais
Hemorragia digestiva após cirurgia bariátrica é uma complicação que, na maior
parte das vezes, é autolimitada, mas que requer muita atenção do cirurgião. Estabilização
hemodinâmica é o tratamento primordial e a decisão cirúrgica não pode ser retardada.
106 ABLS Brasil
DICAS
▶ A hemorragia digestiva pós cirurgia bariátrica deve ser abor-
dada precocemente, lembrando-se das particularidades de cada técnica
cirúrgica;
▶ Toda a cirurgia está acessível à endoscopia na gastrectomia
vertical (sleeve);
▶ No bypass gástrico, a endoscopia pode diagnosticar e tratar
sangramentos de origem do pouch gástrico, na anastomose gastrojejunal
e, na maior parte das vezes, na entero-entero-anastomose;
▶ A enteroscopia de balão é o exame recomendado para sangra-
mentos em estômago excluso;
▶ A abordagem cirúrgica deve ser individualizada em casos de
necessidade ou falta de recursos terapêuticos.
107 ABLS Brasil
Referências
1. Kitamura RK, Lee J, Katz LB. The Management of GI bleeding after Gastric Bypass Surgery.
Int J Surg Res Pract 2015;2:026. ISSN: 2378-3397.
2. Arterburn DE, Courcoulas AP. Bariatric surgery for obesity and metabolic conditions in
adults. BMJ. 2014;349:g3961. doi: 10.1136/bmj.g3961.
3. Palermo M, Acquafresca PA, Rogula T, Duza GE, Serra E. Complicações Cirúrgicas Tar-
dias Após Bypass Gástrico: Revisão da Literatura. ABCD Arq Bras Cir Dig. 2015;28(2):139-43. doi:
10.1590/S0102-67202015000200014.
5. Campanile FC, Boru CE, Rizzello M, Puzziello A, Copaescu C, Cavallaro G, et al. Acute
complications after laparoscopic bariatric procedures: update for the general surgeon. Langenbecks
Arch Surg. 2013;398(5):669-86. doi: 10.1007/s00423-013-1077-2.
6. Acquafresca PA, Palermo M, Rogula T, Duza GE, Serra E. Complicações Cirúrgicas Pre-
coces Após Bypass Gastrico: Revisão da Literatura. ABCD Arq Bras Cir Dig. 2015;28(1):74-80. doi:
10.1590/S0102-67202015000100019.
7. Bastid C, Drepper M, Bichard P, Frossard JL. Bariatric surgery: complications and endos-
copic treatment. Rev Med Suisse. 2017;13(572):1454-7. PMID: 28853800.
10. Siddique SS, Feuerstein JD. Gastrointestinal complications of Roux-en-Y gastric bypass
surgery. OA Minimally Invasive Surgery 2014;2(1):1-8.
11. Patrascu S, Ponz CB, Ananin SF, Soler EMT. A delayed acute complication of bariatric
surgery: Gastric remnant haemorrhagic ulcer after Roux-en-Y gastric bypass. J Minim Access Surg.
2018;14(1):68-70. doi: 10.4103/jmas.
12. Iskandar ME, Chory FM, Goodman ER, Surick BG. Diagnosis and Management of Perfo-
rated Duodenal Ulcers following Roux-En-Y Gastric Bypass: A Report of Two Cases and a Review
of the Literature. Case Rep Surg. 2015;2015:353468. doi: 10.1155/2015/353468.
13. Boules M, Chang J, Haskins IN, Sharma G, Froylich D, El-Hayek K, et al. Endoscopic ma-
nagement of post-bariatric surgery complications. World J Gastrointest Endosc. 2016;8(17):591-9.
doi: 10.4253/wjge.v8.i17.591.
14. Hernández J, Boza C. Novel treatments for complications after bariatric surgery. Ann Surg
Innov Res. 2016;10:3. doi: 10.1186/s13022-015-0021-2.
16. Greenstein AJ, O’Rourke RW. Abdominal pain after gastric bypass: suspects and solutions.
Am J Surg. 2011;201(6):819-27. doi: 10.1016/j.amjsurg.2010.05.007.
17. Abdeen G, le Roux CW. Mechanism Underlying the Weight Loss and Complications of
Roux-en-Y Gastric Bypass. Review. Obes Surg. 2016;26(2):410-21. doi: 10.1007/s11695-015-1945-7.
18. Hayashi SY, Faintuch J, França JI, Cecconello I. Four-year hospital resource utilization after
bariatric surgery: comparison with clinical and surgical controls. Obes Surg. 2011;21(9):1355-61.
doi: 10.1007/s11695-011-0404-3.
19. Toh S, Rasmussen-Torvik LJ, Harmata EE, Pardee R, Saizan R, Malanga E, et al. PCORnet
Bariatric Surgery Collaborative. The National Patient-Centered Clinical Research Network (PCOR-
net) Bariatric Study Cohort: Rationale, Methods, and Baseline Characteristics. JMIR Res Protoc.
2017;6(12):e222. doi: 10.2196/resprot.8323.
20. Patrascu S, Ponz CB, Ananin SF, Soler EMT. A delayed acute complication of bariatric
surgery: Gastric remnant haemorrhagic ulcer after Roux-en-Y gastric bypass. J Minim Access Surg.
2018;14(1):68-70. doi: 10.4103/jmas.
CAPÍTULO 11
Introdução
Com a crescente frequência de procedimentos cirúrgicos para controle de obesidade
mórbida, espera-se, também, um aumento o número absoluto de complicações pós-opera-
tórias. Algo em torno de 20% a 30% dos pacientes apresentam sintomas gastrintestinais após
uma cirurgia bariátrica, os quais podem demandar atendimento de urgência e emergência.
No total, 70% desses pacientes apresentam alterações endoscópicas [1].
Desse modo, a participação do endoscopista no diagnóstico e no tratamento de
pacientes bariátricos que chegam às emergências vem aumentando. As principais anor-
malidades encontradas no exame endoscópico realizado em caráter de emergência são:
úlcera marginal (27%-52%), estenose de anastomose (4%-19%), fístula digestiva (1%-
6%), hemorragia digestiva (0,6%-4%), impactação alimentar e deslizamento de anel de
contenção (2%-14%) [1-3].
O objetivo do presente capítulo é discutir os aspectos endoscópicos e terapêuticos das
complicações bariátricas que necessitam de intervenção em urgência/emergência.
proximal na gastrectomia vertical (sleeve) pode ocorrer em até 4% dos pacientes [7]; seus
sintomas são os mesmos apresentados por pacientes submetidos ao bypass gástrico, os
quais são caracterizados clinicamente por disfagia, inicialmente para alimentos sólidos,
com progressão para intolerância a líquidos [8].
Fístula digestiva
Considerada uma das mais graves complicações após cirurgia bariátrica, a fístula di-
gestiva pode ocorrer nas linhas de grampeamento (mais comum) ou nas anastomoses. Os
principais fatores de risco envolvidos incluem: idade avançada, IMC > 50 kg/m2, múltiplas
comorbidades, cirurgia revisional e pertencer ao gênero masculino [17].
A abordagem geral não difere muito daquela das fístulas digestivas em pacientes não
bariátricos. Como em todos os casos de fístulas digestivas, a terapêutica deve ser imediata
e agressiva, incluindo estabilização hemodinâmica em UTI, antibioticoterapia, suporte
nutricional e drenagem percutânea ou cirúrgica de coleção abdominal.
Diante da suspeita de fístula digestiva após cirurgia bariátrica, a endoscopia digestiva
alta (EDA) pode ser realizada precocemente, desde que o paciente tenha condições clínicas
para ser submetido a ela. O ideal é que seja realizada em unidade de terapia intensiva ou
em centro cirúrgico [18].
111 ABLS Brasil
Hemorragia digestiva
A hemorragia do trato GI superior ocorre em até 4% dos pacientes após o bypass
gástrico, ela é menos comum após o sleeve [3]. A maior parte da origem da linha de gram-
peamento da bolsa gástrica e da anastomose jejuno jejunal apresenta-se, tipicamente,
dentro do período de 48 horas após a cirurgia. Técnicas hemostáticas padrão, tais como o
uso de eletrocautério, plasma de argônio, injeção de epinefrina e “hemoclips” podem ser
aplicadas para controle do sangramento. Em poucos casos, será necessária uma endoscopia
revisional por ressangramento [21].
Ainda em relação ao tratamento, o manejo inicial consiste em medidas de ressuscita-
ção, em fluidoterapia, em transfusão de sangue e, sobretudo, em monitorar e determinar a
gravidade do sangramento, o qual depende do quadro clínico e do tempo de apresentação.
Isso é importante para descartar a hemorragia extra luminal [22]. Hipotensão, taquicardia,
palidez e vasoconstrição requerem reoperação. Se o sangramento ocorrer antes de seis
horas e vier acompanhado de queda no hematócrito, a reoperação também é necessária.
Entretanto, se o sangramento ocorrer após 48 horas e não apresentar alterações no hema-
tócrito, pode-se optar por tratamento clínico.
A endoscopia digestiva alta permite a avaliação diagnóstica e o tratamento em casos
de sangramento da bolsa gástrica ou de anastomose gastrojejunal; ela é usada com bastante
frequência no sangramento tardio pós-operatório. No entanto, há controvérsia no que diz
respeito ao seu uso no pós-operatório imediato, uma vez que não é isenta de riscos, tais
como deiscência de sutura e perfuração. A maior parte dos sangramentos é leve e limitada;
a endoscopia deve ser considerada se o ressangramento ocorrer após manejo conservador,
em caso de alterações hemodinâmicas ou de queda no hematócrito. No entanto, o trata-
mento conservador resolve a maior parte dos sangramentos agudos [23].
Endoscopia de duplo balão pode ser realizada com extrema cautela nos casos em que
a origem do sangramento não é encontrada, mas suspeita-se estar no estômago excluído,
pois representa um risco maior de deiscência anastomótica [24]. Contudo, a técnica da en-
doscopia de duplo balão é um método de exceção, por estar disponível em apenas poucos
centros no Brasil.
Impactação alimentar
A maior parte dos casos de impactação alimentar está associada à presença de anel de
contenção (principalmente no bypass gástrico) ou aos erros no ato da alimentação, como
mastigação insuficiente e ingesta rápida. Outros fatores envolvidos incluem a estenose do
113 ABLS Brasil
Considerações finais
Existe um consenso de que o manejo endoscópico se tornou fundamental para o
diagnóstico e o tratamento de complicações pós-operatórias da cirurgia bariátrica, pois
tem a vantagem de ser minimamente invasivo e de atuar apenas na área acometida do tra-
to gastrointestinal. Além disso, a participação efetiva da equipe multidisciplinar permite
variadas possibilidades de tratamento, as quais devem ser aplicadas de forma individuali-
zada, seja em combinação ou sequencialmente, para promover menor morbimortalidade
e recuperação eficaz dos pacientes.
114 ABLS Brasil
DICAS
▶ Após uma cirurgia bariátrica, de 20 a 30% dos pacientes apre-
sentam sintomas gastrintestinais e 70% deles apresentam alterações
endoscópicas;
▶ O manejo endoscópico é fundamental para o diagnóstico e o
tratamento das complicações pós-operatórias;
▶ As principais complicações encontradas são: úlcera marginal,
estenose de anastomose, fístula digestiva, hemorragia digestiva, impac-
tação alimentar e deslizamento de anel;
▶ A terapêutica inicial deve ser imediata e agressiva, com estabili-
zação hemodinâmica, antibioticoterapia, suporte nutricional e drenagem
percutânea ou cirúrgica de coleção abdominal. A endoscopia digestiva
alta também pode ser realizada precocemente;
▶ A prótese auto-expansível e VAC (“vacum assisted closure”)
podem ser opções de tratamento endoscópico.
115 ABLS Brasil
Referências
1. Huang CS, Farraye FA. Endoscopy in the bariatric surgical patient. Gastroenterol Clin
North Am. 2005;34(1):151-66. doi: 10.1016/j.gtc.2004.12.013.
3. Malli CP, Sioulas AD, Emmanouil T, Dimitriadis GD, Triantafyllou K. Endoscopy after
bariatric surgery. Ann Gastroenterol. 2016;29(3):249-57. doi: 10.20524/aog.2016.0034.
5. Nguyen NT, Rivers R, Wolfe BM. Early gastrointestinal hemorrhage after laparoscopic
gastric bypass. Obes Surg. 2003;13(1):62-5. doi: 10.1381/096089203321136601.
6. Rosenthal RJ. Dilating the stenotic gastrojejunostomy after laparoscopic Roux-en-Y gas-
tric bypass for morbid obesity: when things go wrong. J Gastrointest Surg. 2009;13(9):1561-3. doi:
10.1007/s11605-009-0860-4.
7. Parikh A, Alley JB, Peterson RM, Harnisch MC, Pfluke JM, Tapper DM, et al. Management
options for symptomatic stenosis after laparoscopic vertical sleeve gastrectomy in the morbidly
obese. Surg Endosc. 2012;26(3):738-46. doi: 10.1007/s00464-011-1945-1.
8. Valli PV, Gubler C. Review article including treatment algorithm: endoscopic treatment of
luminal complications after bariatric surgery. Clin Obes. 2017;7(2):115-122. doi: 10.1111/cob.12182.
9. Garrido AB Jr, Rossi M, Lima SE Jr, Brenner AS, Gomes CA Jr. Early marginal ulcer follo-
wing Roux-en-Y gastric bypass under proton pump inhibitor treatment: prospective multicentric
study. Arq Gastroenterol. 2010;47(2):130-4. doi: 10.1590/s0004-28032010000200003.
10. Capella JF, Capella RF. Gastro-gastric fistulas and marginal ulcers in gastric bypass procedu-
res for weight reduction. Obes Surg. 1999;9(1):22-7; discussion 28. doi: 10.1381/096089299765553674.
11. Higa KD, Boone KB, Ho T. Complications of the laparoscopic Roux-en-Y gastric bypass: 1,040
patients--what have we learned? Obes Surg. 2000;10(6):509-13. doi: 10.1381/096089200321593706.
12. Sapala JA, Wood MH, Sapala MA, Flake TM Jr. Marginal ulcer after gastric bypass: a pros-
pective 3-year study of 173 patients. Obes Surg. 1998;8(5):505-16. doi: 10.1381/096089298765554061.
13. Dallal RM, Bailey LA. Ulcer disease after gastric bypass surgery. Surg Obes Relat Dis.
2006;2(4):455-9. doi: 10.1016/j.soard.2006.03.004.
14. Rasmussen JJ, Fuller W, Ali MR. Marginal ulceration after laparoscopic gastric bypass:
an analysis of predisposing factors in 260 patients. Surg Endosc. 2007;21(7):1090-4. doi: 10.1007/
s00464-007-9285-x.
15. Gumbs AA, Duffy AJ, Bell RL. Incidence and management of marginal ulceration af-
ter laparoscopic Roux-Y gastric bypass. Surg Obes Relat Dis. 2006;2(4):460-3. doi: 10.1016/j.
soard.2006.04.233.
16. Aurora AR, Khaitan L, Saber AA. Sleeve gastrectomy and the risk of leak: a systematic
analysis of 4,888 patients. Surg Endosc. 2012;26(6):1509-15. doi: 10.1007/s00464-011-2085-3.
17. Fernandez AZ Jr, DeMaria EJ, Tichansky DS, Kellum JM, Wolfe LG, Meador J, et al. Expe-
rience with over 3,000 open and laparoscopic bariatric procedures: multivariate analysis of factors re-
lated to leak and resultant mortality. Surg Endosc. 2004;18(2):193-7. doi: 10.1007/s00464-003-8926-y.
18. Gonzalez R, Nelson LG, Gallagher SF, Murr MM. Anastomotic leaks after laparoscopic
gastric bypass. Obes Surg. 2004;14(10):1299-307. doi: 10.1381/0960892042583978.
19. Mitchell MT, Pizzitola VJ, Knuttinen MG, Robinson T, Gasparaitis AE. Atypical compli-
cations of gastric bypass surgery. Eur J Radiol. 2005;53(3):366-73. doi: 10.1016/j.ejrad.2004.12.016.
20. Carucci LR, Turner MA, Conklin RC, DeMaria EJ, Kellum JM, Sugerman HJ. Roux-en-Y
gastric bypass surgery for morbid obesity: evaluation of postoperative extraluminal leaks with upper
gastrointestinal series. Radiology. 2006;238(1):119-27. doi: 10.1148/radiol.2381041557.
21. Jamil LH, Krause KR, Chengelis DL, Jury RP, Jackson CM, Cannon ME, et al. Endoscopic
management of early upper gastrointestinal hemorrhage following laparoscopic Roux-en-Y gastric
bypass. Am J Gastroenterol. 2008;103(1):86-91. doi: 10.1111/j.1572-0241.2007.01588.x.
22. Griffith PS, Birch DW, Sharma AM, Karmali S. Managing complications associated with
laparoscopic Roux-en-Y gastric bypass for morbid obesity. Can J Surg. 2012;55(5):329-36. doi:
10.1503/cjs.002011.
23. Spaw AT, Husted JD. Bleeding after laparoscopic gastric bypass: Case report and literature
review. Surg Obes Relat Dis. 2005;1(2):99-103. doi: 10.1016/j.soard.2005.02.013.
24. Puri V, Alagappan A, Rubin M, Merola S. Management of bleeding from gastric remnant
after Roux-en-Y gastric bypass. Surg Obes Relat Dis. 2012;8(1):e3-5. doi: 10.1016/j.soard.2010.08.015.
25. Maluf-Filho F, Lima MS. O papel da endoscopia na cirurgia bariátrica. Einstein. 2006;Supl
1: S114-9.
117 ABLS Brasil
CAPÍTULO 12
TÉCNICAS OPERATÓRIAS
JOSÉ ALFREDO SADOWSKI
JOÃO CAETANO MARCHESINI
GUSTAVO RODRIGUES ALVES CASTRO
Introdução
Desde o início de sua utilização em 1993, a banda gástrica ajustável (BGA) laparoscó-
pica (Figura 1) contribuiu para o crescimento dos procedimentos minimamente invasivos
bariátricos e, por algum tempo, chegou a ser o procedimento de escolha [1]. Após 2008,
houve um decréscimo significativo nas indicações de BGA em decorrência das diversas
complicações relacionadas ao dispositivo e da menor eficácia no controle da obesidade em
comparação ao bypass gástrico e ao sleeve [2,3]. As complicações e falhas terapêuticas leva-
ram a uma expressiva taxa de cirurgia revisional para conversão em outros procedimentos
bariátricos [4]. No Brasil, atualmente, a BGA é um procedimento em desuso; porém, ainda
existem muitos pacientes com bandas colocadas há vários anos, os quais podem apresen-
tar-se à emergência médica com sintomas que possam ser relacionados à ela.
Indicações clínicas
A disfagia aguda é observada em alguns pacientes no pós-operatório imediato de
colocação da banda. É causada por excesso de gordura perigástrica, pois deixa a banda
apertada, ou por edema pós-operatório. Essa disfagia, às vezes até para saliva, pode levar
aproximadamente 10 dias para melhorar. O uso de corticoides intravenosos e de dieta líqui-
da restrita ajudam a melhorar o edema e a solucionar o quadro. Caso não haja melhora, é
necessário ajustar a banda ou até mesmo esvaziá-la. A disfagia pode ser causada, também,
por impactação do bolo alimentar ou por deslizamento da banda [5].
O deslizamento agudo de uma banda é definido pelo prolapso cefálico da porção
inferior do estômago com consequente deslizamento caudal da banda. Sua incidência esti-
118 ABLS Brasil
mada varia entre 1% e 3% e pode causar a obstrução completa do estômago [6]. Vômito em
grande quantidade e dor epigástrica são relatados no início do quadro. O manejo durante
a emergência requer imediato esvaziamento da BGA enquanto os exames complementares
são realizados. O exame de escolha para o diagnóstico é uma radiografia contrastada de
esôfago e estômago. A radiografia em incidência anteroposterior mostra a posição hori-
zontal (ou vertical) da banda, ao passo que a posição normal é oblíqua, de 45° (Figura 2).
não dominante de forma a segurá-lo, o centro macio deve ser identificado e a agulha deve
ser suavemente introduzida até encostar na base metálica do portal. O fluido deve, então,
ser aspirado até o completo esvaziamento do dispositivo (Figura 3).
Dependendo da marca, uma banda pode conter de 4 a 12 ml de solução salina. Caso
a agulha encoste na base metálica e não seja possível aspirar líquido algum, duas situações
devem ser consideradas: o “cuff ” da BGA pode estar vazio (rever a história clínica) ou o
portal pode estar virado com a parte puncionável para a aponeurose. Normalmente, ob-
serva-se alívio imediato dos sintomas após a aspiração do fluido [5].
Considerações finais
A BGA é um procedimento que está praticamente em desuso nos dias atuais; porém,
ainda existem pacientes que foram submetidos ao procedimento há muitos anos e que
podem apresentar complicações que demandem a atuação imediata do médico emergen-
cista. Todo médico plantonista em serviço de urgência/emergência deve saber esvaziar o
conteúdo da BGA, pois trata-se de um procedimento simples que, se realizado pronta e
adequadamente, pode evitar complicações adicionais mais graves, além de oferecer alívio
imediato dos sintomas.
121 ABLS Brasil
DICAS
▶ A banda gástrica possui elevada taxa de complicações tardias;
▶ O deslizamento da banda causa disfagia aguda, dor epigástrica
e vômitos; ele requer esvaziamento imediato. Não se deve aguardar pelo
cirurgião bariátrico;
▶ Todo médico emergencista deve conhecer a técnica correta para
esvaziar o conteúdo de uma banda gástrica: localizar o portal por meio
de palpação, segurá-lo entre os dedos polegar e indicador, identificar
o centro macio, introduzir uma agulha de 40mm x 12mm (rosa) até
encostar na base metálica do portal e aspirar o fluido;
▶ Alívio imediato dos sintomas é esperado após aspiração do
líquido.
122 ABLS Brasil
Introdução
O número de gastrectomias verticais (sleeve) tem aumentado na última década em
todo o mundo. Apesar de ser considerada um procedimento tecnicamente mais simples,
não está isenta de complicações; a técnica cirúrgica, em si, é o principal fator determinante
de complicações pós-operatórias [7]. Além de fístulas da linha de grampeamento, outra
complicação grave é a estenose do tubo gástrico, cuja taxa de ocorrência oscila entre 0,1%
e 3,9% [8].
A estenose do tubo gástrico no sleeve pode ser tanto física (mecânica), por estreita-
mento do lúmen, quanto funcional, por rotação axial ou acotovelamento do órgão.
A estenose mecânica ocorre em até 3% dos casos, mais comumente na altura da
incisura angular [9]. A estenose funcional, por sua vez, é causada pela torção (rotação ou
acotovelamento) do tubo gástrico ao longo do seu eixo longitudinal, o que leva à ocorrên-
cia de um mecanismo semelhante ao de uma válvula, fato que dificulta o esvaziamento
gástrico. A figura 4 demonstra, esquematicamente, da esquerda para direita, um sleeve sem
obstrução mecânica ou funcional, um sleeve com estenose mecânica na incisura angular
e um sleeve com estenose funcional por torção do tubo gástrico.
Fig 4. Desenhos esquemáticos mostrando, da esquerda para a direita, um tubo gástrico (sleeve) normal, um slee-
ve com estreitamento luminal (estenose) na altura da incisura angular e um sleeve com rotação parcial do eixo.
123 ABLS Brasil
Etiopatogenia
Anatomicamente, o estômago é fixado pelos ligamentos gastro-esplênico, gastro-
-hepático, gastro-frênico e gastro-cólico. Os ligamentos gastro-esplênico, gastro-cólicos e
aderências da parede posterior do estômago são seccionados no sleeve, o que deixa o tubo
gástrico menos fixo e pode propiciar a rotação do eixo longitudinal. Porém, o mecanismo
mais provável, tanto da torção quanto do acotovelamento, é a tração desigual das porções
anteriores e posteriores do estômago durante o grampeamento, fato que resulta em linha
de grampeamento tortuosa ou espiralada [10].
Quadro clínico
Os sintomas podem ser precoces ou tardios. Os pacientes podem apresentar de
náuseas, dor epigástrica, regurgitação do alimento retido e vômitos não biliares a disfagia
severa com sialorreia.
Diagnóstico
A radiografia contrastada de esôfago, estômago e duodeno é o primeiro exame diag-
nóstico a ser realizado, pois pode evidenciar torção ou acotovelamento em mais de 80%
dos casos. Tipicamente, o contraste fica retido (ou com retardo de esvaziamento) na parte
superior do tubo gástrico; frequentemente observa-se dilatação da parte proximal, tanto
nos casos de estenose funcional (torção) quanto nos casos de estenose mecânica (Figura 5).
A tomografia computadorizada de abdome deve ser solicitada quando a radiografia
contrastada for negativa ou deixar dúvidas.
A endoscopia digestiva alta deve ser realizada para caracterizar a natureza da esteno-
se (mecânica X funcional); ela é diagnóstica e, muitas vezes, possibilita alguma manobra
terapêutica. Algumas vezes, a torção identificada no estudo contrastado não é confirmada
na endoscopia, muito provavelmente em decorrência da insuflação intraluminal, a qual
pode “retificar” o tubo gástrico e mascarar a torção [11].
Tratamento
O tratamento inicial é endoscópico. Pacientes com estudo contrastado ou com to-
mografia computadorizada sugestivos de torção do tubo gástrico devem ser submetidos
à endoscopia digestiva alta. A endoscopia pode mostrar um segmento gástrico proximal
dilatado e uma área estreita ou tortuosa no corpo gástrico. É possível realizar o tratamento
124 ABLS Brasil
Considerações finais
A torção do tubo gástrico é uma complicação do sleeve que pode levar a sintomas
leves, como intolerância alimentar, disfagia completa para líquidos com intensa sialorreia
e dor epigástrica. O diagnóstico geralmente é confirmado por uma simples radiografia
contrastada de esôfago-estômago-duodeno (EED). A abordagem endoscópica, sempre que
125 ABLS Brasil
possível, deve ser a primeira opção terapêutica. Intervenção cirúrgica em urgência médica
é reservada a casos mais graves, quando a endoscopia não consegue ser resolutiva ou não
está prontamente disponível.
126 ABLS Brasil
DICAS
▶ A causa mais provável da torção do sleeve é a tração assimétrica
das porções anteriores e posteriores do estômago durante o grampeamento,
resultando em uma linha de grampeamento tortuosa ou espiralada;
▶ A radiografia contrastada é diagnóstica em mais de 80% dos casos;
▶ Em casos duvidosos ou com radiografia contrastada negativa, é
necessário solicitar tomografia computadorizada de abdome com contraste
oral;
▶ Sempre solicitar endoscopia digestiva alta, pois o tratamento inicial
é endoscópico com dilatação com balão de acalasia ou com colocação de
endopróteses;
▶ O tratamento cirúrgico varia desde lise de bridas até a conversão
para bypass gástrico.
127 ABLS Brasil
Introdução
A trombose aguda da veia porta e/ou da veia mesentérica superior tem sido cada
vez mais relatada após cirurgia bariátrica, particularmente após a gastrectomia vertical
laparoscópica. A incidência da trombose portomesentérica após a gastrectomia vertical
laparoscópica pode variar de 0,3 a 1% [12].
Possíveis etiologias incluem: obesidade, trombofilia sistêmica, redução do fluxo
esplâncnico/portal secundário ao aumento da pressão abdominal pelo pneumoperitônio,
potenciais lesões térmicas ao sistema venoso esplâncnico durante a dissecção, posição de
Trendelenburg reversa - o que pode aumentar a estase venosa - e vasoconstrição simpática
induzida pela hipercarbia da laparoscopia com subsequente liberação de vasopressina [13,14].
Causas específicas relacionadas à gastrectomia vertical laparoscópica (sleeve) que
podem levar a trombose portomesentérica incluem trauma mecânico/térmico na arcada
gastroepiplóica esquerda e nos vasos gástricos curtos durante a dissecção da grande curva-
tura, compressão da tríade portal pelo retrator de fígado, dissecção intempestiva próxima
ao piloro e na região posterior do estômago ao longo da veia esplênica e predisposição à
desidratação no período pós-operatório [15,16].
A trombose das veias porta e mesentérica tem relação com a alta morbidade, e até
mesmo, eventualmente, mortalidade. Complicações mais graves podem variar de infarto
intestinal imediato até problemas tardios relacionados com hipertensão portal [17].
Tratamento
Ainda não existe unanimidade acerca do tratamento ideal para trombose portome-
sentérica pós-cirúrgica; talvez, devido à baixa incidência (diagnóstico) dessa doença. O
tratamento baseia-se na prevenção de complicações agudas e crônicas, interrompendo e
revertendo a progressão do trombo, e no tratamento das complicações agudas, principal-
mente o infarto intestinal [18].
O principal objetivo do tratamento é a revascularização das veias porta e mesentérica.
Após o diagnóstico e a identificação do trombo, é indicado o uso imediato de anticoagulan-
tes. Benefícios da anticoagulação precoce em pacientes com trombose venosa portomesen-
térica foram comprovados em diversos estudos [19]. Sem tratamento, a extensão do trombo
para a arcada venosa mesentérica pode causar infarto intestinal, cuja mortalidade relatada
chega a 50% [20]. A duração ideal do uso do anticoagulante ainda não está bem estabelecida,
mas, em geral, um período de 3 a 6 meses de duração tem sido aceito e proposto [21]. Em
casos de trombofilias, decisões podem ser variadas; porém, o uso contínuo de anticoagu-
lantes é geralmente recomendado [22]. Essa abordagem conservadora com anticoagulantes
apresenta, de maneira geral, bons resultados em casos nos quais não há isquemia intestinal.
Apesar da literatura descrever o uso de trombolíticos em casos mais graves e de não
resposta ao uso de anticoagulantes, ainda faltam evidências para indicar seu uso rotineiro.
Isso deve-se ao fato de sua aplicação ser descrita apenas em relatos de caso ou em peque-
nas séries. Contudo, alguns autores acreditam que a trombólise pode ser útil em casos
selecionados [23].
Para situações de abdome agudo com instabilidade clínica ou sinais radiológicos de
isquemia intestinal, o tratamento cirúrgico deve ser prontamente indicado para ressecção
dos segmentos intestinais acometidos e, eventualmente, para trombectomia.
Considerações finais
Trombose portomesentérica pós cirurgia bariátrica apresenta um quadro clínico
muitas vezes bastante inespecífico e exige do médico emergencista alto índice de suspeição
clínica. O diagnóstico precoce é muito importante para o resultado final do tratamento.
O uso de anticoagulante deve ser iniciado imediatamente após o diagnóstico. Apesar
de grande parte dos pacientes com trombose da veia porta e/ou mesentérica evoluírem,
satisfatoriamente com o uso de anticoagulantes, alguns necessitam de tratamentos mais
invasivos, como trombolíticos e/ou cirurgia.
129 ABLS Brasil
DICAS
▶ A trombose porto-mesentérica tem baixa incidência, sendo
mais comum após o sleeve;
▶ Exige alto índice de suspeição para diagnóstico em função de
sintomas inespecíficos (o mais comum é a dor abdominal);
▶ A tomografia computadorizada com contraste intravenoso é o
exame de eleição;
▶ A anticoagulação deve ser instituída prontamente em pacientes
sem sinais clínicos de isquemia intestinal;
▶ O tratamento cirúrgico deve ser indicado para pacientes ins-
táveis, com sinais radiológicos de isquemia intestinal ou com sinais de
peritonite durante o exame físico.
130 ABLS Brasil
Referências
1. O’Brien PE, McPhail T, Chaston TB, Dixon JB. Systematic review of medium-term weight
loss after bariatric operations. Obes Surg. 2006;16(8):1032-40. doi: 10.1381/096089206778026316.
3. Sjöström L, Narbro K, Sjöström CD, Karason K, Larsson B, Wedel H, et al. Swedish Obese
Subjects Study. Effects of bariatric surgery on mortality in Swedish obese subjects. N Engl J Med.
200723;357(8):741-52. doi: 10.1056/NEJMoa066254.
5. Monkhouse SJ, Morgan JD, Norton SA. Complications of bariatric surgery: presen-
tation and emergency management--a review. Ann R Coll Surg Engl. 2009;91(4):280-6. doi:
10.1308/003588409X392072.
6. Egbeare DM, Myers AF, Lawrance RJ. Small bowel obstruction secondary to intragastric
erosion and migration of a gastric band. J Gastrointest Surg. 2008;12(5):983-4. doi: 10.1007/s11605-
007-0304-y.
7. Manos T, Nedelcu M, Cotirlet A, Eddbali I, Gagner M, Noel P. How to treat stenosis after
sleeve gastrectomy? Surg Obes Relat Dis. 2017;13(2):150-154. doi: 10.1016/j.soard.2016.08.491.
8. Gagner M, Deitel M, Erickson AL, Crosby RD. Survey on laparoscopic sleeve gastrec-
tomy (LSG) at the Fourth International Consensus Summit on Sleeve Gastrectomy. Obes Surg.
2013;23(12):2013-7. doi: 10.1007/s11695-013-1040-x.
9. Parikh A, Alley JB, Peterson RM, Harnisch MC, Pfluke JM, Tapper DM, et al. Management
options for symptomatic stenosis after laparoscopic vertical sleeve gastrectomy in the morbidly
obese. Surg Endosc. 2012;26(3):738-46. doi: 10.1007/s00464-011-1945-1.
10. Abd Ellatif ME, Abbas A, El Nakeeb A, Magdy A, Salama AF, Bashah MM, et al. Ma-
nagement Options for Twisted Gastric Tube after Laparoscopic Sleeve Gastrectomy. Obes Surg.
2017;27(9):2404-2409. doi: 10.1007/s11695-017-2649-y.
11. Contival N, Gautier T, Le Roux Y, Alves A. Stenosis without stricture after sleeve gastrec-
tomy. J Visc Surg. 2015;152(5):339-41. doi: 10.1016/j.jviscsurg.2015.01.008.
12. Parikh M, Adelsheimer A, Somoza E, Saunders JK, Ude Welcome A, Chui P, et al. Factor
VIII elevation may contribute to portomesenteric vein thrombosis after laparoscopic sleeve gas-
131 ABLS Brasil
trectomy: a multicenter review of 40 patients. Surg Obes Relat Dis. 2017;13(11):1835-1839. doi:
10.1016/j.soard.2017.08.015.
13. Gutt CN, Schmedt CG, Schmandra T, Heupel O, Schemmer P, Büchler MW. Insufflation
profile and body position influence portal venous blood flow during pneumoperitoneum. Surg En-
dosc. 2003;17(12):1951-7. doi: 10.1007/s00464-002-9244-5. Erratum in: Surg Endosc. 2004;18(2):351.
14. James AW, Rabl C, Westphalen AC, Fogarty PF, Posselt AM, Campos GM. Portome-
senteric venous thrombosis after laparoscopic surgery: a systematic literature review. Arch Surg.
2009;144(6):520-6. doi: 10.1001/archsurg.2009.81.
15. El Lakis MA, Pozzi A, Chamieh J, Safadi B. Portomesenteric vein thrombosis after laparos-
copic sleeve gastrectomy and laparoscopic Roux-en-Y gastric bypass: a 36-case series. Surg Endosc.
2017;31(3):1005-1011. doi: 10.1007/s00464-016-5078-4.
16. Salinas J, Barros D, Salgado N, Viscido G, Funke R, Pérez G, et al. Portomesenteric vein
thrombosis after laparoscopic sleeve gastrectomy. Surg Endosc. 2014;28(4):1083-9. doi: 10.1007/
s00464-013-3055-8.
17. Belnap L, Zaveri H, Cottam D, Surve A, Rodgers GM, Drury C. What is the optimal treat-
ment of superior mesenteric vein/portal vein thrombosis after bariatric surgery? Is SMA-directed
t-PA the answer? Surg Obes Relat Dis. 2017;13(3):533-537. doi: 10.1016/j.soard.2016.11.015.
18. Shaheen O, Siejka J, Thatigotla B, Pham DT. A systematic review of portomesenteric vein
thrombosis after sleeve gastrectomy. Surg Obes Relat Dis. 2017;13(8):1422-1431. doi: 10.1016/j.
soard.2017.03.015.
20. Kumar S, Kamath PS. Acute superior mesenteric venous thrombosis: one disease or two?
Am J Gastroenterol. 2003;98(6):1299-304. doi: 10.1111/j.1572-0241.2003.07338.x.
21. Handa P, Crowther M, Douketis JD. Portal vein thrombosis: a clinician-oriented and
practical review. Clin Appl Thromb Hemost. 2014;20(5):498-506. doi: 10.1177/1076029612473515.
22. Lang SA, Loss M, Wohlgemuth WA, Schlitt HJ. Clinical Management of Acute Portal/
Mesenteric Vein Thrombosis. Viszeralmedizin. 2014;30(6):394-400. doi: 10.1159/000369896.
AGRADECIMENTOS
1- Prof. Dr. João Batista Marchesini, membro emérito e ex-presidente da SBCBM,
pela cessão de uso da figura 2.
2- Prof. Dr. Eduardo Lemos de Souza Bastos, membro titular da SBCBM, pela cessão
de uso da figura 5.
133 ABLS Brasil
CAPÍTULO 13
Introdução
Abdome agudo é uma condição clínica frequente nos serviços de urgência e emer-
gência, uma vez que a dor abdominal é a razão principal de cerca de 5% de todos os aten-
dimentos. Em quase 10% desses casos, o tratamento necessitará de intervenção cirúrgica
de urgência [1]. Apesar de ser uma síndrome clínica já há muito conhecida, ainda não há
uma definição universalmente aceita para o abdome agudo. De maneira abrangente e não
consensual, o abdome agudo é um quadro clínico que pode englobar diversos sinais e sin-
tomas, mas que, caracteristicamente, apresenta-se como dor abdominal de início recente
(apresentação súbita), com intensidade variável, e que exige alguma terapêutica médica
imediata [2,3,4].
O abdome agudo pode ser classificado de diversas maneiras. Inicialmente, como
clínico ou cirúrgico, conforme método terapêutico primário (com ou sem procedimento
cirúrgico). É importante destacar que mesmo quadros de “abdome agudo clínico”, invaria-
velmente, ficam sob os cuidados diretos ou consultoria de um cirurgião. Outra classificação
geral bastante utilizada é categorizá-lo como traumático e não traumático. O abdome agudo
traumático (trauma abdominal) não será objeto de análise neste capítulo.
O abdome agudo não traumático, por sua vez, que neste capítulo será denominado
apenas pelo termo genérico “abdome agudo”, é didaticamente subdividido em perfurativo,
obstrutivo, inflamatório e vascular (isquêmico ou hemorrágico). Embora essa subdivisão
seja corriqueiramente empregada na prática clínica, por vezes não representa fielmente a
causa e a evolução clínica das doenças relacionadas ao abdome agudo. Desse modo, se as
condições clínicas do paciente assim permitirem, um aprofundamento diagnóstico foca-
134 ABLS Brasil
do na busca da causa exata da dor abdominal é sempre mais aconselhável do que apenas
diagnosticar o “tipo” de abdome agudo, pois permite um planejamento terapêutico mais
específico.
Indivíduos submetidos aos mais diversos procedimentos bariátricos estão tão
sujeitos aos quadros de abdome agudo quanto a população geral. Em algumas situações,
a incidência de certas doenças que levam a um abdome agudo pode ser até maior em
pacientes pós-bariátrica, como no caso de abdome agudo obstrutivo após cirurgias com
derivação intestinal, como o bypass gástrico em Y-de-Roux (BGYR), por exemplo [5]. Dado
o exponencial aumento dos procedimentos bariátricos no Brasil nos últimos anos, a pro-
porção de indivíduos portadores de alterações anatômicas do tubo digestório decorrentes
de procedimentos bariátricos e que estão sujeitos ao desenvolvimento de um quadro de
abdome agudo também tende a aumentar. Portanto, um cirurgião geral não especializado
em cirurgia bariátrica, mas que trabalhe em serviço de urgência/emergência deve conhecer
minimamente a sistematização técnica principal e as variantes de cada um dos procedimen-
tos bariátricos (atuais ou mais antigos). Dessa forma, poderá, mais rapidamente, identificar
situações clínicas relacionadas ao procedimento bariátrico que levam aos mais diversos
quadros de abdome agudo e abordar com segurança um tubo digestório anatomicamente
alterado pela cirurgia bariátrica. Esse treinamento do cirurgião geral de plantão em serviço
de urgência/emergência é essencial [6], pois raramente esses indivíduos serão atendidos por
cirurgiões bariátricos.
Um cirurgião geral de plantão em pronto-socorro ou em pronto-atendimento
poderá se deparar com três situações de abdome agudo em pacientes pós-bariátrica. A pri-
meira, quando o quadro de abdome agudo não tem qualquer relação com o procedimento
bariátrico e a abordagem cirúrgica da doença que levou ao abdome agudo não é modificada
pelas alterações anatômicas decorrentes do procedimento bariátrico prévio. Como exemplo,
um paciente previamente submetido ao bypass gástrico que desenvolve apendicite aguda
(abdome agudo inflamatório) provavelmente não trará ao cirurgião qualquer implicação
ou mudança técnica no procedimento da urgência (apendicectomia).
Outra situação semelhante é aquela de paciente submetido à gastrectomia vertical
(sleeve) que apresenta abdome agudo por perfuração de divertículo no cólon esquerdo. A
abordagem técnica do abdome agudo perfurativo não deverá sofrer qualquer mudança por
causa do procedimento bariátrico prévio, seja ela rafia primária da perfuração, ressecção
segmentar do intestino grosso com anastomose primária ou mesmo derivação externa do
trânsito alimentar (colostomia).
A segunda situação é quando a causa do abdome agudo não tem relação com a cirurgia
bariátrica, mas as alterações anatômicas no tubo digestório decorrentes do procedimento
135 ABLS Brasil
Fig 1. Fluxograma para auxiliar na decisão de indicação da via de acesso à cavidade abdominal no abdome
agudo em pacientes pós-bariátrica.
139 ABLS Brasil
Esse segmento também deve ser identificado e mensurado e seu comprimento médio
costuma estar entre 60 e 120 cm, também a depender do desenho técnico escolhido pelo
cirurgião bariátrico que realizou o procedimento. A maior parte da alça alimentar encon-
tra-se, de maneira geral, no andar inframesocólico.
Existem duas formas principais utilizadas pelos cirurgiões bariátricos para fazer
com que essa alça alcance o andar supramesocólico de maneira a permitir a confecção da
anastomose gastrojejunal. A primeira maneira trata-se de abertura no mesocólon trans-
verso, chamada “via transmesocólica”. Hoje em dia, esta via tem sido raramente utilizada.
Porém, já foi a via preferencial de reconstrução na abordagem por laparotomia e no início
da experiência de abordagem laparoscópica. Nessa via, a alça alimentar fica posicionada
atrás do cólon transverso (posteriormente). A segunda forma é a via antecólica, na qual a
alça alimentar fica posicionada anteriormente ao colón transverso (Figura 4). Essa via tem
sido mais utilizada atualmente no bypass gástrico por laparoscopia.
Em geral, a identificação de qual via foi utilizada costuma ser um passo técnico bastan-
te simples. Por fim, há cirurgiões bariátricos que optam pela realização do bypass gástrico
dito “distal”, com um canal comum que pode ser tão curto quanto 150 cm [8]. Nesses casos,
deve-se abordar o bypass gástrico com os preceitos técnicos semelhantes aos aplicáveis a
um procedimento do tipo malabsortivo, tal qual a derivação biliopancreática / duodenal
switch (DBP-DS), por exemplo - que serão discutidos mais adiante neste capítulo.
Como o desenho técnico do bypass gástrico não inclui qualquer ressecção entérica, a
soma dos comprimentos dos três segmentos: canal comum, alça alimentar e alça biliopan-
creática, resultará no comprimento total do intestino delgado (jejuno-íleo). Embora possa
haver alta variação, sobretudo a depender do método de mensuração, o intestino delgado
normal costuma ter, em média, entre 650 e 750 cm de comprimento total [9,10]. Sendo assim,
diante do desenho técnico mais comum do bypass gástrico (alça biliopancreática entre 80
a 150 cm e alça alimentar entre 60 a 120 cm), o canal comum é um segmento que costuma
ter comprimento variando entre 450 e 550 cm.
Rafias de perfurações e/ou ressecções de curtos segmentos com anastomose primária
êntero-entérica podem ser realizadas em qualquer dos segmentos intestinais sem grandes
particularidades técnicas. No entanto, caso haja necessidade de retirada de um segmento
intestinal mais extenso, como em caso de isquemias mesentéricas, de necrose por estrangu-
lamento em hérnias internas ou de intussuscepção jejuno-jejunal (Figura 5), por exemplo,
o cirurgião deve observar alguns preceitos técnicos.
Quando a doença estiver afetando o canal comum, deve-se tentar manter o compri-
mento mínimo entre 200 e 300 cm, a fim de minimizar o risco de efeitos adversos rela-
cionados à síndrome de malabsorção. O comprimento mínimo do canal comum também
142 ABLS Brasil
guarda relação com o comprimento da alça alimentar, uma vez que um comprimento
total entre 350 e 400 cm (somados os comprimentos da alça alimentar e do canal comum)
pode ser considerado seguro para evitar transtornos nutricionais. Ou seja, o objetivo é
tentar manter um comprimento absortivo de aproximadamente 350-400 cm, medido da
gastrojejunoanastomose até a válvula ileocecal.
Caso o segmento remanescente pós-ressecção do canal comum seja mais curto que
o recomendado/desejado, uma opção técnica é seccionar a alça alimentar junto à anas-
tomose êntero-entérica e reposicioná-la na alça biliopancreática o mais próximo possível
do ângulo de Treitz. Desse modo, o cirurgião encurtará a alça biliopancreática (segmento
excluso) e alongará o canal comum (segmento absortivo). Esse preceito técnico é tão mais
importante quanto maior for o fator de restrição gástrica imposta ao paciente por ocasião
do procedimento bariátrico primário, como em casos de pouch gástrico muito pequeno
e/ou com anel de restrição. A alça alimentar, por sua vez, também pode ser parcialmente
ressecada; porém, seguindo-se os princípios da reconstrução do trânsito alimentar em
Y de Roux, ela deve permanecer com cerca de 40-50 cm de extensão a fim de se evitar o
refluxo biliar [11]. Caso a extensão da ressecção resulte em uma alça alimentar muito curta,
uma opção técnica é seccionar a alça biliopancreática junto à anastomose êntero-entérica
e reposicioná-la mais distalmente, a fim de se restaurar o comprimento ideal da alça ali-
mentar à custa de um pequeno encurtamento do canal comum.
A alça biliopancreática (segmento excluso), muito comumente envolvida em hérnias
de espaços mesentéricos (sobretudo na hérnia de Petersen), pode ser parcialmente ressecada
sem maiores consequências. Lembre-se: não há uma sistematização técnica única para o
bypass gástrico. Identificar e mensurar os diversos segmentos intestinais (alça alimentar,
alça biliopancreática e canal comum) antes de abordar a causa do abdome agudo pode
evitar dificuldades técnicas no intraoperatório e minimizar o risco de graves complicações
pós-operatórias.
mente, não há estômago excluso que possa ser usado para acrescentar uma via adicional
de aporte nutricional (via gastrostomia). Portanto, garantir uma superfície mínima de
intestino delgado funcionante para absorção de nutrientes (alça alimentar + canal comum/
alça eferente) é fundamental para evitar graves efeitos adversos no pós-operatório.
É comum haver a herniação da alça alimentar (da esquerda para a direita, na visão
do cirurgião) na hérnia do espaço intermesentérico (Figura 11). Nesses casos, o cirurgião
deve proceder com a mesma sistematização técnica válida para a hérnia no espaço de Pe-
tersen: redução do conteúdo, avaliação da viabilidade do segmento herniado e fechamento
do espaço (anel herniário).
Diferentemente do bypass gástrico tradicional, em Y-de-Roux, só há um espaço me-
sentérico em pacientes submetidos ao OAGB (mini-bypass), o qual fica localizado entre o
mesocólon transverso e o mesentério da alça jejunal que foi levada ao andar supramesocó-
lico para a realização da anastomose gastrojejunal. A hérnia interna neste espaço, quando
ocorre, pode ter tanto a alça aferente quanto a alça eferente como conteúdo herniário [22,23].
A conduta na urgência é muito semelhante àquela descrita acima para o bypass
gástrico: redução do conteúdo herniário, observação da viabilidade do intestino delgado
e fechamento do espaço mesentérico por meio de sutura contínua com fio inabsorvível.
Lembre-se: para não cometer equívocos na correção das hérnias internas em espaços
mesentéricos, a sistematização de identificação e mensuração da anatomia bariátrica do
intestino delgado deve ser sempre seguida. Abordar exclusivamente o campo operatório
envolvido na hérnia interna pode gerar condutas equivocadas.
Considerações finais
A abordagem cirúrgica do abdome agudo em pacientes pós-bariátrica exige que o
cirurgião geral tenha um conhecimento mínimo do desenho técnico dos principais pro-
cedimentos bariátricos. Além disso, e principalmente em pacientes submetidos aos pro-
cedimentos com derivação intestinal, a observação de uma sistematização técnica para a
minuciosa identificação da anatomia bariátrica pode evitar equívocos técnicos que venham
a acarretar dificuldades técnicas no intraoperatório e afeitos adversos / complicações no
pós-operatório. A forma mais segura de se abordar um indivíduo com abdome agudo
pós-bariátrica é unir o conhecimento prévio do desenho técnico das principais cirurgias
bariátricas com uma cuidadosa verificação das alterações anatômicas provocadas pelo
procedimento ao qual o paciente foi submetido, sobretudo em casos de procedimentos
que envolvem derivação intestinal.
155 ABLS Brasil
DICAS
▶ Muitos pacientes não sabem relatar com precisão o procedi-
mento bariátrico ao qual foram submetidos. Além disso, um mesmo
procedimento, como o bypass gástrico, por exemplo, pode ter diferentes
desenhos técnicos;
▶ Postergar a abordagem cirúrgica apenas porque o acesso lapa-
roscópico não está disponível só é aceitável se isso não impuser prejuízo
ao tratamento do paciente. Uma laparotomia no tempo certo (precoce)
pode ser muito menos traumática para o paciente do que uma laparos-
copia no tempo errado (tardia);
▶ A cirurgia de urgência pode até exigir alguma criatividade do
cirurgião, mas nunca o improviso. A estrutura física e humana da cirur-
gia de urgência deve ser, no mínimo, a mesma disponível em condições
eletivas;
▶ Mesmo para cirurgiões com experiência em cirurgia laparos-
cópica, algumas situações clínicas acabam por anular os benefícios
normalmente atribuídos à laparoscopia, tornando a laparotomia uma
opção mais segura e vantajosa;
▶ O cirurgião que propuser a abordagem laparoscópica de urgên-
cia tem que ter treinamento suficiente para realizar, por laparoscopia,
tudo o que seria realizado por laparotomia, com a mesma eficiência e
eficácia;
▶ Em algumas situações, o simples fato de um indivíduo ter sido
submetido a um procedimento bariátrico, por si só, não deve alterar
a conduta cirúrgica na urgência. A apendicectomia continua sendo
o melhor tratamento para a apendicite aguda também em indivíduos
pós-bariátrica;
▶ Nenhuma técnica bariátrica atualmente realizada aborda o
intestino grosso. Sendo assim, todas as alterações anatômicas estão
localizadas proximalmente à válvula ileocecal;
156 ABLS Brasil
Referências
1. Kamin RA, Nowicki TA, Courtney DS, Powers RD. Pearls and pitfalls in the emergency
department evaluation of abdominal pain. Emerg Med Clin North Am. 2003;21(1):61-72. doi:
10.1016/s0733-8627(02)00080-9.
2. Martin RF, Rossi RL. The acute abdomen - an overview and algorithms. Surg Clin North
Am. 1997;77(6):1227-43. doi: 10.1016/s0039-6109(05)70615-0.
4. Patterson JW, Dominique E. Acute Abdomen. [Updated 2018 Nov 14]. In: StatPearls [In-
ternet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2019 Jan-. Available from: https://www.ncbi.
nlm.nih.gov/books/NBK459328/.
5. Geubbels N, Lijftogt N, Fiocco M, van Leersum NJ, Wouters MW, de Brauw LM. Meta-a-
nalysis of internal herniation after gastric bypass surgery. Br J Surg. 2015;102(5):451-60. doi: 10.1002/
bjs.9738.
6. O’Brien P, Brown W. Assessing the Acute Abdomen in the Bariatric Patient: Need for
Improvement. Obes Surg. 2008;18:1215-6. doi: 10.1007/s11695-008-9623-7.
7. Weller WE, Rosati C. Comparing outcomes of laparoscopic versus open bariatric surgery.
Ann Surg. 2008;248(1):10-5. doi: 10.1097/SLA.0b013e31816d953a.
8. Svanevik M, Risstad H, Hofsø D, Schou CF, Solheim B, Søvik TT, et al. Perioperative outco-
mes of proximal and distal gastric bypass in patients with BMI ranged 50-60 kg/m2 - a double-blind,
randomized controlled trial. Obes Surg. 2015;25(10):1788-95. doi: 10.1007/s11695-015-1621-y.
9. Tacchino RM. Bowel length: measurement, predictors, and impact on bariatric and meta-
bolic surgery. Surg Obes Relat Dis. 2015;11(2):328-34. doi: 10.1016/j.soard.2014.09.016.
10. Purandare A, Phalgune D, Shah S. Variability of length of small intestine in Indian popu-
lation and its correlation with type 2 diabetes mellitus and obesity. Obes Surg. 2019;29(10):3149-53.
doi: 10.1007/s11695-019-03921-5.
11. Deitel M. César Roux and his contribution. Obes Surg. 2007;17(10):1277-8. doi: 10.1007/
s11695-007-9244-6.
12. Chaim EA, Ramos AC, Cazzo E. Mini-Gastric Bypass: description of the technique and
preliminary results. Arq Bras Cir Dig. 2017;30(4):264-6. doi: 10.1590/0102-6720201700040009.
158 ABLS Brasil
13. Lee WJ, Ser KH, Lee YC, Tsou JJ, Chen SC, Chen JC. Laparoscopic Roux-en-Y vs. mini-gas-
tric bypass for the treatment of morbid obesity: a 10-year experience. Obes Surg. 2012;22(12):1827-
34. doi: 10.1007/s11695-012-0726-9.
15. Biertho L, Lebel S, Marceau S, Hould FS, Julien F, Biron S. Biliopancreatic diversion with
duodenal switch: surgical technique and perioperative care. Surg Clin North Am. 2016;96(4):815-
26. doi: 10.1016/j.suc.2016.03.012.
16. Gebelli JP Gordejuela AG, Ramos AC, Nora M, Pereira AM, Campos JM, et al. SADI-S
with right gastric artery ligation: technical systematization and early results. Arq Bras Cir Dig.
2016;29(Suppl 1):85-90. doi: 10.1590/0102-6720201600S10021.
17. Rogers AM, Ionescu AM, Pauli EM, Meier AH, Shope TR, Haluck RS. When is a Pe-
tersen’s hernia not a Petersen’s hernia. J Am Coll Surg. 2008;207(1):121-4. doi:10.1016/j.jamcoll-
surg.2008.01.019.
18. Bakker JK, Budde van Namen YW, Bruin SC, Brauw LM. Gastric bypass and abdominal
pain: Think of Petersen Hernia. JSLS 2012;16:311-3. doi: 10.4293/108680812x13427982376581.
19. Amor IB, Kassir R, Debs T, Aldeghaither S, Petrucciani N, Nunziante M, et al. Impact of
mesenteric defect closure during laparoscopic Roux-en-Y Gastric Bypass (LRYGB): a retrospective
study for a total of 2093 LRYGB. Obes Surg. 2019;29(10):3342-47. doi: 10.1007/s11695-019-04000-5.
20. Stenberg E, Ottosson J, Szabo E, Näslund I. Comparing techniques for mesenteric de-
fects closure in laparoscopic gastric bypass surgery - a register-based cohort study. Obes Surg.
2019;29(4):1229-35. doi: 10.1007/s11695-018-03670-x.
21. Aghajani E, Nergaard BJ, Leifson BG, Hedenbro J, Gislason H. The mesenteric defects in
laparoscopic Roux-en-Y gastric bypass: 5 years follow-up of non-closure versus closure using the
stapler technique. Surg Endosc. 2017;31(9):3743-8. doi: 10.1007/s00464-017-5415-2.
23. Facchiano E, Iannelli A, Lucchese M. Internal hernia after mini-gastric bypass: myth or
reality? J Visc Surg. 2016;153(3):231-2. doi: 10.1016/j.jviscsurg.2016.01.003.
159 ABLS Brasil
24. Souto KE, Meinhardt NG, Stein AT. Evaluation of quality of life and metabolic improvement
after jejunoileal bypass in a community of low socioeconomic status. Obes Surg. 2004;14(6):823-8.
doi: 10.1381/0960892041590872.
25. Justice A, Keilani Z, Tribble J. A unique case report of jejunoileal bypass reversal with
review of the literature. Int J Surg Case Rep. 2018;50:88-91. doi: 10.1016/j.ijscr.2018.07.028.
26. De Paula AL, Alessandro S, de Paula AC, Sérgio V, Alfredo H. Aspectos técnicos da in-
terposição ileal com gastrectomia vertical como possível opção ao tratamento do diabetes mellitus
tipo 2. Arq Bras Cir Dig. 2010;23(2):128-30. doi: 10.1590/S0102-67202010000200014.
27. Santoro S, Castro LC, Velhote MC, Malzoni CE, Klajner S, Castro LP, et al. Sleeve gastrec-
tomy with transit bipartition: a potent intervention for metabolic syndrome and obesity. Ann Surg.
2012;256(1):104-10. doi: 10.1097/SLA.0b013e31825370c0.
28. Alkurdi A, Rubin D, Seelhoff A, Herbst H. Brown Bowel Syndrome: An Exceedingly Rare
Condition with Longstanding Malabsorption and an Unusual Cause of Colon Pseudo-Obstruction.
Case Rep Gastroenterol. 2021;15(3):960-5. doi: 10.1159/000519942.
29. Arnold CA, Burke AP, Calomeni E, Mayer RC, Rishi A, Singhi AD, et al. Brown Bowel
Syndrome: A Multi-institutional Case Series. Am J Surg Pathol. 2020;44(6):834-7. doi: 10.1097/
PAS.0000000000001443.
AGRADECIMENTOS
1- Dr. Guilhermino Nogueira, membro titular da SBCBM, pela cessão de uso das
figuras 12 e 13.
2- Dr. Hamilton Belo de França Costa, membro titular da SBCBM, pela cessão de
uso da figura 14.
3- Dr. Rui Ribeiro, médico-cirurgião bariátrico em Lisboa (Portugal), pela cessão de
uso da figura 15.
161 ABLS Brasil
CAPÍTULO 14
Introdução
A cirurgia bariátrica é considerada o tratamento mais eficaz para indivíduos porta-
dores de obesidade mórbida. Contudo, não é um procedimento isento de complicações,
como, por exemplo, a ocorrência de fístulas digestivas, tanto após gastrectomia vertical
(sleeve) quanto após derivação gástrica em Y-de-Roux (bypass gástrico).
Fístulas pós-operatórias ocorrem mais frequentemente entre o segundo e o décimo-se-
gundo dia após a cirurgia, e sua incidência está entre 0% e 5%. Em nosso meio, apresenta-se
em menos de 1% dos casos operados.
A localização mais frequente depende da técnica realizada. No sleeve, é mais comum
próxima à junção esofagogástrica (ângulo de His). Já no bypass gástrico, ocorre mais fre-
quentemente na anastomose gastrojejunal e na linha de grampeamento do pouch gástrico.
A taxa de mortalidade por fístula digestiva em pacientes bariátricos tende a ser bas-
tante baixa atualmente. Isso se deve, muito provavelmente, ao diagnóstico precoce e ao
tratamento imediato e multidisciplinar. Contudo, pacientes obesos mórbidos podem apre-
sentar muito rapidamente uma evolução clínica desfavorável devido ao estado inflamatório
crônico da própria obesidade e de frequentes comorbidades associadas.
Por isso, o médico emergencista, seja ele clínico ou cirurgião, deve ter sempre um
alto grau de suspeição diagnóstica para fístula digestiva em pacientes em pós-operatório
precoce (até 14 dias) de cirurgia bariátrica que procuram atendimento em unidades de
urgência e emergência.
162 ABLS Brasil
Diagnóstico
O diagnóstico de fístula digestiva em pacientes bariátricos pode apresentar algumas
dificuldades adicionais, pois a propedêutica clássica pode ser limitada em pacientes obesos.
O quadro clínico, por vezes, pode se traduzir simplesmente por taquicardia, sudorese e
mal-estar geral. Mais tardiamente, sinais claros de sepse - devido à peritonite infecciosa
- podem aparecer. No entanto, nesse estágio, o prognóstico costuma ser pior. Por isso a ne-
cessidade do médico emergencista estar atento aos sinais inicias, mesmo que inespecíficos.
O diagnóstico precoce pode ser a diferença entre a vida e a morte do paciente.
Os exames diagnósticos também têm limitações nessa população de pacientes. Apesar
da tomografia ser um ótimo método diagnóstico, os aparelhos têm limites de peso, em geral
podem suportar até 130 kg. Também pode haver dificuldades durante a ultrassonografia
devido ao excesso de panículo adiposo na parede abdominal.
A existência de um dreno abdominal colocado durante a cirurgia pode ajudar no
diagnóstico de fístula. Porém, essa é uma manobra que raramente é utilizada hoje em
dia, sobretudo em cirurgias realizadas por videolaparoscopia. Além disso, a ausência de
drenagem de secreções com características digestivas pelo dreno não exclui o diagnóstico.
O exame radiológico contrastado somente deverá ser realizado se houver dreno
abdominal prévio, devido ao risco de acúmulo de contraste na cavidade abdominal. Se a
dúvida persistir e no caso de haver impossibilidade do diagnóstico pelos meios já citados,
a laparoscopia diagnóstica deve ser realizada. Se a laparoscopia não estiver disponível, e a
suspeição clínica for muito alta, uma laparotomia pode ser considerada.
Tratamento
O tratamento das fístulas apresenta várias modalidades. O tratamento clínico, ge-
ralmente em UTI (Unidade de Terapia Intensiva), com controle hemodinâmico, antibio-
ticoterapia, drogas vasoativas e suporte ventilatório não difere muito daquele aplicado a
pacientes não bariátricos.
Em pacientes com diagnóstico ou alta suspeita de fístula não drenada, deve-se pro-
ceder a abordagem cirúrgica do abdome, seja videolaparoscópica ou laparotômica, para
limpeza da cavidade seguida de ampla drenagem.
A conduta pode ser conservadora (não cirúrgica) em pacientes com dreno abdomi-
nal com saída de conteúdo entérico, clinicamente estáveis e sem coleção abdominal por
exames de imagem.
163 ABLS Brasil
Considerações finais
Tanto o diagnóstico quanto o tratamento das fístulas digestivas após uma cirurgia
bariátrica são muito complexos devido às características do paciente obeso mórbido. Deve
envolver uma equipe multidisciplinar com cirurgiões, clínicos, endoscopistas e nutricio-
nistas. O tratamento endoscópico tem assumido um papel cada dia mais relevante na
abordagem diagnóstica e terapêutica desses casos, mas o tratamento cirúrgico na urgência/
emergência, com limpeza da cavidade abdominal e ampla drenagem, não deve ser protelado.
165 ABLS Brasil
DICAS
▶ Na persistência de dúvida sobre a existência ou não de fístula,
não hesite em indicar uma abordagem cirúrgica, preferencialmente por
laparoscopia;
▶ A tentativa de realizar o fechamento (sutura) do orifício da deis-
cência (fístula) não é a manobra mais indicada na abordagem inicial;
▶ Limpeza da cavidade, drenagem ampla e estabelecimento de via de
acesso nutricional devem ser as prioridades do cirurgião geral.
166 ABLS Brasil
Referências
1. Périssé LG, Périssé PC, Bernardo Júnior C. Endoscopic treatment of the fistulas after lapa-
roscopic sleeve gastrectomy and Roux-en-Y gastric bypass. Rev Col Bras Cir. 2015;42(3):159-64.
doi: 10.1590/0100-69912015003006.
2. Storm AC, Thompson CC. Endoscopic Treatments Following Bariatric Surgery. Gastrointest
Endosc Clin N Am. 2017;27(2):233-244. doi: 10.1016/j.giec.2016.12.007.
CAPÍTULO 15
Introdução
Dado o aumento da incidência e da prevalência de obesidade, e a disseminação de
seu tratamento cirúrgico, cada vez mais os serviços de emergência irão se deparar com
possíveis complicações relacionadas à cirurgia bariátrica. Estima-se que em torno de 10%
dos pacientes submetidos à cirurgia bariátrica necessitam de consulta de urgência e emer-
gência nos primeiros 30 dias de pós-operatório [1].
Dentre as principais causas de retorno aos serviços de urgência e emergência, encon-
tram-se os quadros de abdômen agudo não traumático, os quais se configuram em uma
significante causa de atendimento. Entre os principais tipos de abdômen agudo, estão os
quadros de obstrução intestinal após bariátrica, os quais merecem atenção especial, devido
sua frequência, variedade de fatores causais e importância no diagnóstico e tratamento
precoces [2].
A obstrução intestinal estritamente relacionada ao procedimento bariátrico ocorre
somente em casos de técnicas derivativas do intestino delgado, como o bypass gástrico
em Y-de-Roux (BGYR) e o duodenal swicht, entre outras. As obstruções intestinais não
podem ser atribuídas à técnica operatória em si em pacientes submetidos à gastrectomia
vertical (sleeve) e à banda gástrica ajustável (BGA), por serem procedimentos exclusiva-
mente gástricos.
De maneira geral, entre as principais causas de obstrução intestinal relacionadas
à cirurgia bariátrica estão a hérnia interna, as aderências intestinais, a hérnia da parede
abdominal e a obstrução da êntero-êntero anastomose. Situações menos frequentes como
168 ABLS Brasil
Hérnia interna
É uma das causas mais frequentes de obstrução intestinal no pós-operatório de ci-
rurgias bariátricas com derivação intestinal, como no bypass gástrico. Pode ocorrer em
3 locais, por ordem de frequência: no espaço mesentérico entre as alças biliopancreática
169 ABLS Brasil
Aderências
As aderências podem ocorrer após qualquer cirurgia abdominal; elas parecem ser
responsáveis por quase metade dos casos de obstrução intestinal pós-operatória [2]. Apesar
da via laparoscópica apresentar ocorrência de aderência menor que a da cirurgia aberta,
as aderências ainda são causa frequente de obstrução intestinal mesmo em pacientes sub-
metidos à cirurgia bariátrica por videolaparoscopia.
Fig 2. Fotografia de uma laparotomia por obstrução intestinal mostrando segmento intestinal com necrose.
172 ABLS Brasil
Fig 3. Imagem laparoscópica de um segmento intestinal agudamente encarcerado, em um dos portais lapa-
roscópicos (hérnia de portal).
Bezoar
Bezoares são definidos como acúmulo de material não digerido no tubo digestório,
e podem ser causa de obstrução intestinal. O tratamento pode ser realizado com terapia
enzimática, com remoção endoscópica ou cirúrgica, a depender da altura do bezoar.
Vários casos são relatados, tais como bezoares de carne, coágulos e fitobezoares[11,12],
demonstrados nas figuras 4a e 4b. Eles têm relação com a mastigação e com o calibre das
anastomoses.
174 ABLS Brasil
Fig 4a. Fotografia de peça cirúrgica (segmento intestinal) com obstrução luminal causada por
bezoar.
Fig 4b. Fotografia de peça cirúrgica (segmento intestinal) aberta mostrando o bezoar com causa de
obstrução luminal.
175 ABLS Brasil
Volvo
Apesar de raro no pós-operatório de cirurgia bariátrica, volvos de cólon ou de delgado
sempre devem ser considerados no diagnóstico diferencial do abdômen agudo obstruti-
vo. Como de hábito, diante da suspeita clínica, o diagnóstico pode ser feito por meio da
radiografia simples ou de tomografia do abdômen [13].
Intussuscepção
A intussuscepção intestinal corresponde de 1 a 5% dos casos de obstrução intestinal
(Figura 5). Seu tratamento consiste, na maior parte das vezes, em ressecção do segmento
envolvido [14,15]. Caso haja resolução da intussusepção de forma mecânica durante a cirurgia,
o risco / benefício de uma enterectomia de urgência deve ser considerado.
Considerações finais
A obstrução intestinal pós cirurgia bariátrica pode ter diversas causas. O impor-
tante é realizar um exame clínico completo e minucioso com questionamentos sobre o
tipo de cirurgia realizada e o tempo do pós-operatório. Exames complementares, como a
tomografia de abdômen, são úteis para a confirmação diagnóstica e devem ser utilizados
precocemente. A intervenção cirúrgica, por sua vez, deve ser realizada rapidamente, tanto
em casos confirmados quanto naqueles de alta suspeição diagnóstica.
177 ABLS Brasil
DICAS
▶ Pacientes que forem incialmente indicados para o tratamento
conservador deverão ser reavaliados periodicamente nas primeiras 48h.
Não havendo resolução espontânea do quadro, considerar a necessidade
de cirurgia;
▶ Pacientes com quadro de abdômen agudo obstrutivo causado
por hérnia estrangulada (interna ou de parede), por volvo ou por in-
tussuscepção devem receber tratamento cirúrgico com maior brevidade
possível;
▶ O tratamento precoce e adequado é fundamental para minimi-
zar os riscos de desfechos graves e/ou potencialmente fatais no abdome
agudo obstrutivo pós cirurgia bariátrica.
178 ABLS Brasil
Referências
1. Lyn-Sue JR, Doble JA, Juza RM, Alli VV. Optimizing Hospital Resource Utilization in
Bariatric Readmission. JSLS. 2018;22(2):e2017.00096. doi: 10.4293/JSLS.2017.00096.
2. Elms L, Moon RC, Varnadore S, Teixeira AF, Jawad MA. Causes of small bowel obstruc-
tion after Roux-en-Y gastric bypass: a review of 2,395 cases at a single institution. Surg Endosc.
2014;28(5):1624-8. doi: 10.1007/s00464-013-3361-1.
3. Khoraki J, Mazzini GS, Shah AS, Del Prado PAR, Wolfe LG, Campos GM. Early small
bowel obstruction after laparoscopic gastric bypass: a surgical emergency. Surg Obes Relat Dis.
2018;14(8):1118-1125. doi: 10.1016/j.soard.2018.05.009.
4. Obeid A, McNeal S, Breland M, Stahl R, Clements RH, Grams J. Internal hernia after
laparoscopic Roux-en-Y gastric bypass. J Gastrointest Surg. 2014;18(2):250-5; discussion 255-6.
doi: 10.1007/s11605-013-2377-0.
5. Altieri MS, Pryor AD, Telem DA, Hall K, Brathwaite C, Zawin M. Algorithmic approach
to utilization of CT scans for detection of internal hernia in the gastric bypass patient. Surg Obes
Relat Dis. 2015;11(6):1207-11. doi: 10.1016/j.soard.2015.02.010.
6. Dilauro M, McInnes MD, Schieda N, Kielar AZ, Verma R, Walsh C, et al. Internal Hernia
after Laparoscopic Roux-en-Y Gastric Bypass: Optimal CT Signs for Diagnosis and Clinical Decision
Making. Radiology. 2017;282(3):752-760. doi: 10.1148/radiol.2016160956.
9. Coblijn UK, de Raaff CA, van Wagensveld BA, van Tets WF, de Castro SM. Trocar Port
Hernias After Bariatric Surgery. Obes Surg. 2016;26(3):546-51. doi: 10.1007/s11695-015-1779-3.
11. Henry D, Teixeira AF, Jawad MA. Inadequate mastication causing small bowel obstruction
after laparoscopic Roux-en-Y gastric bypass: a case report of a meat bezoar. Surg Obes Relat Dis.
2016;12(9):e73-e74. doi: 10.1016/j.soard.2016.05.024.
179 ABLS Brasil
14. Haddad FG, Zaraket V, Barakat I, Deeb L. Retrograde Jejuno-jejunal Intussusception after
Roux-en-Y Gastric Bypass: A Potential à la Mode Complication. Cureus. 2018;10(7):e3045. doi:
10.7759/cureus.3045.
16. Nasta AM, Patel D, Shrivastav O, Goel M, Shrimal A, Gupte A, Goel R. Mesenteric Pan-
niculitis-First Case Series After Bariatric Surgery. Obes Surg. 2018;28(3):881-885. doi: 10.1007/
s11695-017-3103-x.
AGRADECIMENTO
Dr. Hamilton Belo de França Costa, membro titular da SBCBM, pela cessão de uso
da figura 3.
181 ABLS Brasil
CAPÍTULO 16
Introdução
A lesão isquêmica intestinal aguda é instalada quando o fluxo sanguíneo dos vasos
mesentéricos é insuficiente para as necessidades do órgão, fato que resulta em isquemia e,
posteriormente, em necrose da parede do intestino. Apesar de infrequente, trata-se de con-
dição ameaçadora, que necessita de rápida identificação e de abordagem especializada [1,2].
Abordagem terapêutica
Considerando a alta mortalidade e a dificuldade no diagnóstico, a síndrome isquêmica
intestinal aguda expõe o profissional de saúde a grandes desafios, especialmente em casos
de pacientes submetidos à cirurgia bariátrica [10,11]. Como em outras situações clínicas, o
tempo é crucial para a viabilidade intestinal, para a manutenção da anatomia e da fisiologia
da cirurgia bariátrica, e para o bom resultado pós-operatório [12-14].
A sistematização da abordagem de pacientes com alta suspeita diagnóstica necessita
de investigação agressiva e de abordagem cirúrgica precoce, seja por laparoscopia ou por
laparotomia exploradora [15].
O tratamento desses pacientes deve ser orientado pela seguinte sistematização:
182 ABLS Brasil
Sempre iniciar esta revisão / identificação a partir da válvula ileocecal e, a partir dela,
localizar a alça comum, a alça alimentar e a alça biliopancreática, assim como as anasto-
moses intestinais realizadas. Essa manobra facilita a identificação correta dos seguimentos
intestinais modificados na cirurgia bariátrica, principalmente no bypass gástrico em Y-de-
-Roux (BGYR) e nas cirurgias mal absortivas, como o duodenal switch (DS) [17].
Após a identificação desses segmentos intestinais, deve-se proceder com a avaliação
de aspectos do segmento isquêmico, como a coloração das alças intestinais e a presença
ou ausência de peristalse.
A avaliação da viabilidade intestinal começa com o exame visual (ectoscopia) das alças
intestinais para pesquisar sinais de sofrimento por meio de gradiente empírico de cores
(coloração rosa-avermelhada indica alças possivelmente viáveis e colorações roxas escuras
indicam perda da viabilidade) e da presença de movimentos peristálticos.
Após o restabelecimento do fluxo sanguíneo, a viabilidade do intestino deve ser rea-
valiada, considerando-se as alterações na cor e a presença de pulsos vasculares palpáveis
(cirurgia aberta) ou visíveis (na cirurgia laparoscópica ou aberta).
Adicionalmente, métodos auxiliares podem ser utilizados, quando disponíveis. O
uso do doppler per-operatório permite identificar a presença de fluxo sanguíneo em vasos
periféricos. A presença de ruídos arteriais em isquemias arteriais, mistas ou de baixo fluxo
184 ABLS Brasil
pressupõe a viabilidade do segmento analisado. Aceita-se como viável a região distante 1,0
cm do último sinal de doppler audível.
Corantes intravasculares podem auxiliar na avaliação da perviedade do sistema vas-
cular (irrigação arterial) e, portanto, na viabilidade do tecido. A visualização macroscópica
da absorção dessas substâncias identifica a viabilidade do segmento. A fluoresceína (na
laparotomia) ou a endoseanina verde (na videolaparoscopia) podem auxiliar na definição
de segmentos irreversivelmente isquêmicos, os quais devem ser ressecados. No entanto,
têm pouca acurácia para determinar margens de ressecção cirúrgica.
Em alguns casos bem selecionados, uma pequena secção na alça acometida, com fina-
lidade de se observar a ocorrência de sangramento, pode ser útil na definição da estratégia
terapêutica.
Revisão (“second-look”)
Quando grandes extensões de intestino estão comprometidas, todo o esforço deve ser
empregado para preservar cada centímetro viável. Se houver dúvida consistente quanto a
viabilidade de determinado segmento, deve-se programar uma reavaliação cirúrgica ou
laparoscópica entre 24 e 48 horas, caso as condições clínicas do paciente permitam.
Considerações finais
As síndromes isquêmicas intestinais, apesar de pouco frequentes, são condições
clinicas graves e com alta morbimortalidade. Essa situação, em pacientes bariátricos, é
potencializada por alterações anatômicas promovidas pela cirurgia, fato que torna o diag-
nóstico ainda mais desafiador.
185 ABLS Brasil
DICAS
▶ Isquemia intestinal é uma condição que pode acarretar alta
morbidade e mortalidade. Por isso, exije que o médico emergencista
mantenha sempre um alto grau de suspeição clínica para o diagnóstico
e tratamento precoces;
▶ Pacientes bariátricos, sobretudo aqueles que foram submetidos
à técnicas com bypass intestinal, devem ter sua anatomia cirúrgica
cuidadosamente checada antes de qualquer tipo de ressecção intestinal;
▶ Na abordagem cirúrgica inicial da isquemia intestinal na emer-
gência, o cirurgião deve ser o mais conservador possível. Para isso, a
estratégia de uma ressecção mínima em primeiro tempo cirúrgico, com
posterior reavaliação cirúrgica (“second-look”) pode evitar ressecções
extensas, e evitar um maior comprometimento da qualidade de vida.
186 ABLS Brasil
Referências
1. Centers for Disease Control & Prevention. http://www.cdc.gov/obesity/data/adult.html.
Accessed October 15, 2018.
2. Cameron JL; Cameron AM. Chapter 20: In Cameron JL, Cameron AM, eds. Current Sur-
gical Therapy, 10th edition. Philadelphia, Pennsylvania: Elsevier, 2010.
3. Forse RA, Krishnamurty DM. Epidemiology and discrimination in obesity. In Nguyen NT,
Blackstone RP, Morton JM, Ponce J, Rosenthal R, eds. The ASMBS Textbook of Bariatric Surgery.
Volume 1: Bariatric Surgery. New York, New York: Springer-Verlag New York Inc. 2015: 3–12.
4. Chiong E, Hegarty PK, Davis JW, Kamat AM, Pisters LL, Matin SF. Port-site hernias
occurring after the use of bladeless radially expanding trocars. Urology. 2010;75(3):574-80. doi:
10.1016/j.urology.2009.08.025.
5. Johnson WH, Fecher AM, McMahon RL, Grant JP, Pryor AD. VersaStep trocar hernia
rate in unclosed fascial defects in bariatric patients. Surg Endosc. 2006;20(10):1584-6. doi: 10.1007/
s00464-005-0747-8.
6. Mala T, Søvik TT, Schou CF, Kristinsson J. Blood clot obstruction of the jejunojeju-
nostomy after laparoscopic gastric bypass. Surg Obes Relat Dis. 2013;9(2):234-7. doi: 10.1016/j.
soard.2011.12.014.
9. Marr B, Yenumula P. Roux limb volvulus in laparoscopic Roux-en-Y gastric bypass due
to Roux limb stabilization suture: case series. Obes Surg. 2012;22(1):4-7. doi: 10.1007/s11695-011-
0529-4.
11. Iannuccilli JD, Grand D, Murphy BL, Evangelista P, Roye GD, Mayo-Smith W. Sensitivity
and specificity of eight CT signs in the preoperative diagnosis of internal mesenteric hernia following
Roux-en-Y gastric bypass surgery. Clin Radiol. 2009;64(4):373-80. doi: 10.1016/j.crad.2008.10.008.
12. Rogula T, Yenumula PR, Schauer PR. A complication of Roux-en-Y gastric bypass: intestinal
obstruction. Surg Endosc. 2007;21(11):1914-8. doi: 10.1007/s00464-007-9535-y.
187 ABLS Brasil
13. Spector D, Perry Z, Shah S, Kim JJ, Tarnoff ME, Shikora SA. Roux-en-Y gastric bypass:
hyperamylasemia is associated with small bowel obstruction. Surg Obes Relat Dis. 2015;11(1):38-
43. doi: 10.1016/j.soard.2014.04.030.
14. Campanile FC, Boru CE, Rizzello M, Puzziello A, Copaescu C, Cavallaro G, et al. Acute
complications after laparoscopic bariatric procedures: update for the general surgeon. Langenbecks
Arch Surg. 2013;398(5):669-86. doi: 10.1007/s00423-013-1077-2.
15. Surgerman H. Morbid obesity. In: ACS Surgery: Principles and Practice. New York, New
York: Webmd Professional Publishing, 2003.
16. Herron DM. Gastrointestinal obstruction after bariatric surgery. In Nguyen NT, Blackstone
RP, Morton JM, Ponce J, Rosenthal R, eds. The ASMBS Textbook of Bariatric Surgery. Volume 1:
Bariatric Surgery. New York, New York: Springer-Verlag New York Inc. 2015: 231.
17. Schweitzer MA, DeMaria EJ, Broderick TJ, Sugerman HJ. Laparoscopic closure of mesen-
teric defects after Roux-en-Y gastric bypass. J Laparoendosc Adv Surg Tech A. 2000;10(3):173-5.
doi: 10.1089/lap.2000.10.173.
189 ABLS Brasil
CAPÍTULO 17
Introdução
O abdomên agudo é uma síndrome dolorosa aguda, de início súbito, intensidade
variável, rapidamente progressiva, que demanda assistência médica de urgência e requer
tratamento imediato, seja clínico ou cirúrgico.
O objetivo inicial da avaliação do abdome agudo é identificar os pacientes com etio-
logia grave, os quais podem exigir intervenção urgente. Uma anamnese bem feita e um
exame físico completo e adequado podem ser capazes de direcionar o diagnóstico etiológico
e o diferencial em quase 90% dos casos. Porém, exames complementares (laboratoriais e
imagens) podem ser necessários para melhor definição da causa e do tratamento definitivo.
Determinar quais pacientes podem ser observados com segurança e quais requerem
investigação adicional ou encaminhamento para especialistas, é um desafio para os medicos
emergencistas, pois a dor abdominal pode ser inespecífica e difusa no início e, somente em
fases avançadas do quadro, se tornar localizada e com sintomas adicionais.
A cirurgia da obesidade, como todo procedimento cirúrgico, é passível de complica-
ções pós-operatórias. Cirurgiões e clínicos emergencistas precisam estar familiarizados com
as intercorrências que podem acontecer após a cirurgia bariátrica, e como diagnosticá-las.
Não devem ignorar as causas comuns de abdome agudo cirúrgico, as quais podem ocorrer
em pacientes bariátricos, tais como apendicite aguda, diverticulite aguda, pancreatite aguda
e doenças biliares. Uma operação bariátrica prévia pode ter pouco impacto nos planos de
tratamento ou na evolução clínica, em casos de apendicite e diverticulite, por exemplo.
Por outro lado, o tratamento da pancreatite e da doença biliar pode ser significativamente
afetado pela anatomia resultante de uma operação bariátrica, pois limita as modalidades
terapêuticas disponíveis [1].
190 ABLS Brasil
A abordagem dos pacientes bariátricos com condição de emergência pode ser extre-
mamente desafiadora. Após a ressuscitação inicial, uma abordagem sistemática e gradual
deve se basear na avaliação do quadro clínico e no conhecimento do procedimento espe-
cífico bariátrico. Quando possível, e a depender das condições clínicas do paciente, deve
haver consulta precoce com o cirurgião bariátrico ou encaminhamento para um centro
de referência em cirurgia bariátrica.
Todo emergencista deve ter conhecimento básico dos procedimentos cirúrgicos
mais comuns adotados para casos de obesidade e ser capaz de lidar com suas possíveis
consequências. Cirurgiões bariátricos devem fazer qualquer esforço para compartilhar
sua “expertise” com colegas não especialistas, assim como precisam desenvolver diretrizes
para o diagnóstico, a avaliação e a condução desses pacientes [2]. Aliás, este é o principal
escopo do ABLS Brasil.
Apendicite aguda
Sintomas iniciais de apendicite aguda são frequentemente leves e inespecíficos, tais
como náuseas, anorexia e desconforto periumbilical, mas evoluem para dor no quadrante
inferior direito do abdome. A dor pode ser mais superior na apendicite aguda retrocecal e
podem ocorrer sintomas urinários ou diarreia em caso de apêndice pélvico.
A presença de quadro de apendicite aguda no pós-operatório de cirurgia bariátrica é
um desafio diagnóstico para o médico emergencista, principalmente em suas fases iniciais,
, quando o quadro clínico pode ser pouco característico e o exame físico do abdome geral-
mente é pouco confiável - isso porque os pacientes normalmente ainda estão obesos. Os
sinais e sintomas podem ser atípicos e não específicos. Por vezes, o médico emergencista
é levado a pensar primariamente em complicações relacionadas à cirurgia bariátrica [3].
Sinais clássicos de irritação peritoneal, como defesa ou rigidez de parede abdominal,
geralmente não estão presentes e não são confiáveis no pós-operatório imediato de obesida-
de mórbida. Podem indicar quadros avançados de peritonite grave, levar à sepse, à falência
de órgãos e à morte em pouco tempo [3]. É importante realizar anamnese rigorosa, com
foco nas características e na evolução da dor abdominal, assim como na avaliação deta-
lhada de sintomas associados, do tipo de cirurgia realizada e do tempo de pós-operatório.
Além disso, exames complementares de imagem, como ultrassonografia e, principalmente,
tomografia computadorizada, podem ser essenciais em dúvida diagnóstica e não devem
ser postergados.
O diagnóstico de apendicite aguda no pós-operatório de cirurgia bariátrica pode ser
mais desafiador do que o habitual, sobretudo no período precoce de pós-operatório. É
191 ABLS Brasil
preciso alto grau de suspeição clínica, criteriosa observação da evolução do quadro clínico
e uso precoce de exames complementares para evitar graves complicações decorrentes de
diagnóstico tardio. Intervenção cirúrgica exploratória, preferencialmente por via laparos-
cópica, pode ser necessária em casos nos quais a dúvida diagnóstica persiste.
Como nenhum procedimento bariátrico vigente no Brasil aborda o intestino grosso,
a técnica operatória de apendicectomia em paciente bariátrico em nada difere do habitual.
O diagnóstico de coledocolitíase pode ser suspeitado pelo quadro clínico (dor abdo-
minal e icterícia) e pela elevação das enzimas canaliculares, sendo confirmado por ultras-
sonografia ou por colangioressonância magnética (colangioRM).A abordagem endoscópica
da papila duodenal não encontra dificuldades em pacientes submetidos à gastrectomia
vertical (sleeve), uma vez que o duodeno permanece no trânsito alimentar.
A realização de colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE) para o tra-
tamento da coledocolitíase após cirurgias derivativas, como o bypass gástrico e o duodenal
switch, é tecnicamente difícil e desafiador, pois o rearranjo da anatomia do tubo digestório
superior dificulta o acesso endoscópico transoral à papila duodenal. Embora tecnicamente
complexas, há 3 opções de acesso à via biliar nesses casos:
• CPRE assistida por enteroscopia com balão;
• CPRE transgástrica assistida por laparoscopia e
• CPRE transgástrica orientada por ecoendoscopia
Menos frequentemente, mas também tecnicamente possível, a via biliar pode ser
acessada por via percutânea trans-hepática.
Em qualquer uma dessas opções, a tentativa de acesso endoscópico à papila duodenal
maior em pacientes bariátricos com procedimentos que causam exclusão gastroduodenal
estará condicionada aos serviços que possuam equipamentos adequados e a endoscopistas
e cirurgiões treinados. Na falência terapêutica do acesso por endoscopia, ou na ausência
de recursos locais para realizá-la, a coledocolitíase após um bypass gástrico (e outras
cirurgias derivativas) deve ser abordada cirurgicamente, sobretudo se houver indícios de
colangite. A via biliar comum também pode ser acessada e clareada por via transcística ou
transcoledociana e por laparoscopia, sem acessar a papila por enteroscopia, gastrostomia,
ecoendoscopia ou via percutânea, sem riscos inerentes ao método endoscópico [8-11].
Obstrução intestinal
A incidência geral de obstrução após bypass gástrico gira em torno de 5%. Suas causas
mais comuns são as hérnias internas (53%) relacionadas à cirurgia bariátrica; as menos
frequentes, e comums a qualquer tipo de cirurgia abdominal, são as aderências (14%). Fa-
tores que aumentam o risco de obstrução intestinal nesses pacientes incluem a abordagem
cirúrgica (laparoscópica ou aberta), a qual afetará o grau de aderências.
Uma hérnia incisional através de um sítio do portal, estimada em até 0,5% dos casos,
pode ser difícil de detectar clinicamente em pacientes obesos. Ela pode gerar obstrução
intestinal precoce após bypass gástrico laparoscópico e causar náuseas e e vômitos persis-
tentes no pós-operatório imediato (Figura 1). Radiografia simples do abdômen e tomografia
computadorizada do abdome com contraste, a depender do segmento herniado, revela
alças intestinais dilatadas e herniação através do defeito da parede abdominal. A imediata
exploração laparoscópica, deve ser realizada com redução da alça herniada e fechamento
do defeito na parede abdominal [12].
Fig 1. Imagem laparoscópica de um segmento intestinal agudamente encarcerado em um dos portais lapa-
roscópicos (hérnia de portal).
195 ABLS Brasil
Considerações finais
O abdome agudo não traumático continua a representar um desafio diagnóstico tanto
para médicos emergencistas quanto para especialistas. Em pacientes obesos, essa condição
é ainda mais desafiadora, principalmente em pós-operatório precoce de cirurgia bariátrica.
As causas mais comuns de abdome agudo não traumático, como apendicite aguda,
diverticulite aguda, pancreatite aguda e doença litiásica biliar também estão entre as etio-
logias mais comuns de emergências cirúrgicas em pacientes pós-bariátricos. Consequen-
temente, faz-se necessário extrema vigilância e baixo limiar para indicação de exploração
cirúrgica imediata.
196 ABLS Brasil
DICAS
▶ A abordagem de pacientes bariátricos em emergência pode
ser extremamente desafiadora; faz-se necessário uma abordagem sis-
temática gradual baseada na avaliação no exame clínico completo e no
conhecimento do procedimento bariátrico específico;
▶ Todo emergencista deve ter conhecimento básico dos procedi-
mentos cirúrgicos mais comuns adotados para a obesidade e ser capaz
de lidar com suas possíveis consequências;
▶ Os sinais e sintomas podem ser atípicos e sutis, não específicos
e mascarados ou até menosprezados, dada a raridade de ocorrência. O
raciocínio deve ser direcionado para cirurgia recentemente realizada;
▶ Os sinais clássicos de irritação peritoneal, como defesa ou rigi-
dez de parede abdominal, geralmente não estão presentes no início do
quadro clínico; quando presentes, podem indicar quadros avançados
de peritonite grave, fato que pode evoluir rapidamente para sepse,
falência de órgãos e morte;
▶ O exame físico pode não ser confiável em obesos; sintomas
clínicos sutis e os achados radiológicos e de laboratório devem alertar
clínicos para problemas no pós-operatório;
▶ Não se deve ignorar as causas comuns de abdome agudo
cirúrgico: apendicite aguda, diverticulite aguda, pancreatite aguda,
obstrução intestinal por aderências e doença do cálculo biliar - etio-
logias mais comuns de patologia abdominal no pós-operatório de
cirurgia bariátrica;
▶ A operação bariátrica prévia pode ter pouco impacto na evo-
lução clínica e no tratamento da apendicite e da diverticulite;
▶ Não espere pelo pneumoperitônio para diagnosticar uma
úlcera duodenal perfurada após bypass gástrico (ou outras cirurgias
bariátricas derivativas intestinais);
▶ Na coledocolitíase após bypass gástrico, a via biliar pode ser
acessada e clareada por via transcística ou transductal e por laparos-
197 ABLS Brasil
2. Zaigham H, Ekelund M, Regnér S, Olsson Å. Abdominal pain after gastric bypass in the
acute general surgical care setting. Surg Obes Relat Dis. 2020;16(12):2058-2067. doi: 10.1016/j.
soard.2020.07.008.
3. Mehran, A., Liberman, M., Rosenthal, R. & Szomstein, S. Ruptured appendicitis after
laparoscopic Roux-en-Y gastric bypass: pitfalls in diagnosing a surgical Abdomen in the morbidly
obese. Obes. Surg. 13, 938–940 (2003).
5. Iskandar ME, Chory FM, Goodman ER, Surick BG. Diagnosis and Management of Perfo-
rated Duodenal Ulcers following Roux-En-Y Gastric Bypass: A Report of Two Cases and a Review
of the Literature. Case Rep Surg. 2015;2015:353468. doi: 10.1155/2015/353468.
6. Wendling MR, Linn JG, Keplinger KM, Mikami DJ, Perry KA, Melvin WS, et al. Omental
patch repair effectively treats perforated marginal ulcer following Roux-en-Y gastric bypass. Surg
Endosc. 2013;27(2):384-9. doi: 10.1007/s00464-012-2492-0.
8. Gupta N. Role of laparoscopic common bile duct exploration in the management of cho-
ledocholithiasis. World J Gastrointest Surg. 2016;8(5):376-81. doi: 10.4240/wjgs.v8.i5.376.
9. Skinner M, Popa D, Neumann H, Wilcox CM, Mönkemüller K. ERCP with the overtube-
-assisted enteroscopy technique: a systematic review. Endoscopy. 2014;46(7):560-72. doi: 10.1055/s-
0034-1365698.
11. Espinel J, Pinedo ME, Ojeda V, Guerra Del Río M. Laparoscopic transgastric ERCP in ba-
riatric surgery patients: our experience. Rev Esp Enferm Dig. 2017;109(7):530-533. doi: 10.17235/
reed.2017.4933/2017.
CAPÍTULO 18
Introdução
Atualmente, a cirurgia bariátrica é extremamente segura e apresenta altos índices
de satisfação por parte dos pacientes, pois pode auxiliar uma perda de peso significativa
e duradoura, e resolução ou melhora das comorbidades [1-3]. No entanto, as deficiências
nutricionais merecem atenção especial dentre as possíveis complicações do tratamento
cirúrgico. Elas podem se desenvolver como consequência da redução da ingestão e/ou
da má absorção de nutrientes, além de serem mais comumente observadas após procedi-
mentos malabsortivos ou mistos, se comparadas aos procedimentos puramente restritivos
[2,4]
. Outros fatores causais incluem deficiências pré-operatórias, intolerâncias alimentares
desenvolvidas após a cirurgia, mudanças nos padrões de paladar e alimentação e não ade-
são às recomendações dietéticas e suplementares. Tanto o bypass gástrico em Y de Roux
(BGYR) quanto a gastrectomia vertical (sleeve) podem ocasionar deficiências nutricionais
e vitamínicas, muito embora o sleeve pareça ter relação com efeitos menos severos no
equilíbrio nutri-vitamínico [4].
Deficiências nutricionais podem apresentar uma ampla gama de manifestações
clínicas, a depender dos nutrientes envolvidos, da gravidade e da duração dos estados de
deficiência. Podem causar, ainda, sérios prejuízos para os pacientes; em alguns raros casos,
resultam em graves complicações que, se não tratadas de forma adequada, podem levar
à morte. Desse modo, é altamente recomendável a realização de um rastreio nutricional
minucioso [5], principalmente em pacientes que buscam o pronto atendimento com queixas
que possam ter relação com os déficits nutricionais ou vitamínicos, tais como vômitos,
fadiga, déficits neurológicos, edemas, distúrbios do comportamento entre outras.
200 ABLS Brasil
Vitamina B9 (folato)
A deficiência de folato é incomum, exceto em pacientes com baixo consumo de
vegetais. Pacientes que se apresentam com anemia megaloblástica devem receber suple-
mentação extra diária de ácido fólico 5 mg. Também devem ser avaliados para deficiência
conjunta de vitamina B12.
Vitamina D e cálcio
Hipovitaminose D e hiperparatireoidismo são distúrbios comumente associados com
obesidade mórbida; portanto, deficiências de cálcio e síndromes de hipocalcemia aguda
têm sido observadas após cirurgia bariátrica. Deficiência de 25-hidroxivitamina D parece
estar entre as principais deficiências vitamínicas observadas após a cirurgia bariátrica [6,12].
A incidência geral de deficiência de cálcio e de doença óssea metabólica está em torno
de 10% [3], sendo menos comuns em paciente submetidos à gastrectomia vertical (sleeve),
devido à preservação do duodeno no trânsito alimentar. A absorção de cálcio no bypass
gástrico é especialmente reduzida devido à perda de ação ácida [13]. Além disso, a perda
204 ABLS Brasil
de peso rápida e extrema está associada à perda óssea, mesmo na presença de níveis nor-
mais de vitamina D e de paratormônio (PTH). Hipocalcemia severa, apesar de rara, pode
acontecer após cirurgia bariátrica, principalmente se houver histórico de tireoidectomia
prévia. Pacientes com sintomas de hipocalcemia (tetania) ou com cálcio iônico abaixo de
7,5 mg/dl devem ser tratados com 10 ml de gluconato de cálcio a 10%, EV, em infusão
lenta (1 ml por minuto).
Aumento no PTH sérico é indicativo de balanço negativo de cálcio ou de deficiência
de vitamina D, ou de ambos. Hiperparatireoidismo secundário promove perda óssea, além
de aumentar os riscos de osteopenia e osteoporose. Níveis elevados de fosfatase alcalina e
de osteocalcina são indicativos de aumento da atividade osteoblástica e de formação óssea,
e são, geralmente, as anormalidades observadas inicialmente [13,14].
Suplementação com vitamina D pode ser fornecida por ergocalciferol ou colecalciferol
e por reposição de 5.000U 3x na semana, ou por dose alta de 50.000U por mês, as quais
são, geralmente, suficientes para regularizar os níveis séricos de vitamina D na maior parte
dos pacientes. Quando doses altas (50.000U) são usadas, dores musculares em membros
inferiores podem ocorrer; logo, os pacientes devem ser alertados quanto a isso, embora
tais sintomas sejam autolimitados e sem repercussão clínica. O polivitamínico utilizado
habitualmente por pacientes bariátricos não contém uma quantidade suficiente de cálcio.
Sendo assim, uma dose diária complementar de citrato de cálcio (1000 mg) deve ser usada
como manutenção. Citrato de cálcio é sempre preferível às demais apresentações em função
de sua melhor absorção em ambiente de menor acidez gástrica [11].
Vitaminas A, E e K
A deficiência das vitaminas A, E e K é incomum em pacientes bariátricos que realizam
a suplementação regular com uso de polivitamínico oral, pois suas necessidades básicas
são, usualmente, supridas. A deficiência de vitamina A pode causar hiperqueratinização da
pele, má cicatrização, perda de paladar e raros casos de cegueira noturna e xeroftalmia[5,11].
Nesses casos, a reposição de 50.000–100.000 UI deve ser administrada IM por 3 dias;
seguida por 50.000 UI/d IM por 2 semanas [8]. A deficiência de vitamina E pode ocorrer
em até 10% dos pacientes submetidos ao bypass gástrico, mas geralmente não apresenta
manifestações clínicas relevantes [8].
A vitamina K participa da cascata de coagulação; logo, pacientes pós-bariátrica que
apresentem alargamento de tempo de protrombina, com discrasia sanguínea e, principal-
mente, com sinais de sangramento espontâneo, devem ser submetidos à administração de
205 ABLS Brasil
Desnutrição proteica
A desnutrição proteica grave é rara, qualquer que seja o procedimento cirúrgico
adotado, sendo um pouco mais frequente em procedimentos com longo segmento de
intestino delgado excluso, como em derivações biliopancreáticas, em switch duodenal ou
em bypass com alças alongadas [8].
Os possíveis motivos para o desenvolvimento de desnutrição proteica podem ser
ingestão alimentar restrita, má absorção de nutrientes, ocorrência pós-operatória de vô-
mitos ou diferentes graus de intolerâncias alimentares. Como consequência, a redução nos
níveis de proteína no sangue e, finalmente, na massa muscular podem ser observadas [12].
A desnutrição proteica grave é uma condição caracterizada por edema, perda de massa
muscular e hipoalbuminemia severa. Quando isso ocorre, um interrogatório alimentar
rígido deve avaliar a possibilidade de uma ingesta alimentar muito pobre de proteínas,
composta basicamente por carboidratos. A ingestão desejada de proteínas deve variar,
em média, de 60 a 120 g/d. Também deve-se fazer um esforço para identificar a técnica
cirúrgica empregada, na tentativa de determinar a presença de uma alça comum muito
curta. Para tanto, pode ser necessário contatar o cirurgião bariátrico.
O suporte por nutrição enteral (NE) ou por nutrição parenteral (NP) deve ser
considerado para pacientes com desnutrição proteica grave, que não conseguem manter-se
nutridos mesmo com suplementação de proteínas por via oral. Sinais importantes de alto
risco nutricional ou de desnutrição que devem ser pesquisados nesses pacientes são: perda
de peso expressiva e contínua após 2 anos, IMC < 20 kg/m2, sinais de sarcopenia, unhas
quebradiças, queda excessiva de cabelo e baixa ingesta de proteínas na dieta.
Normalmente, a suplementação com proteína do soro do leite (“whey protein”) isolada
e hidrolisada é bem tolerada, além de ser capaz de reverter distúrbios nutricionais menos
graves, na maior parte dos pacientes, na dose de 30g 2x dia. A albumina, proteína do ovo,
tem alto valor biológico e pode ser utilizada nesses pacientes, mas costuma ser mal tolerada
em função da baixa palatabilidade e alta produção de gases intestinais.
Quando a reposição proteica via oral não é suficiente, a NE artificial (com uso de
sonda naso-entérica) é usada sempre como primeira escolha, com base nas mesmas con-
siderações que orientam decisões de tratamento para pacientes gravemente desnutridos,
206 ABLS Brasil
que devem ser reavaliados em 5 a 7 dias. Caso não haja melhora significativa do status
nutricional, a NP deve ser considerada.
A NP deve ser considerada pela equipe para pacientes com desnutrição proteica grave
e/ou hipoalbuminemia não responsiva à suplementação oral ou à NE; a pronta admissão
hospitalar para o início do suporte nutricional é necessária. Pacientes pós-bariátrica com
anasarca e/ou albumina sérica menor que 2,5 mg/dl devem ser avaliados para a necessi-
dade de NP, pois a NE normalmente não será suficiente para a recuperação nutricional.
Deve-se ter especial atenção na avaliação do tamanho da alça comum nesses pacientes,
pois a síndrome do intestino curto pode estar sendo a responsável pela desnutrição grave.
Portanto, o cirurgião bariátrico deve ser requisitado para avaliar o caso, assim que possível.
Durante a reposição com NP, não deve ser esquecida a suplementação com polivitamínico
EV e a administração de oligoelementos parenterais.
Considerações finais
Pacientes bariátricos que procuram o pronto atendimento podem apresentar vários
problemas que tenham relação com distúrbios nutricionais, vitamínicos e minerais, algu-
mas vezes graves. Portanto, o médico plantonista deve ter um alto grau de suspeição em
relação a esses distúrbios, fato que deve nortear a investigação por sinais e sintomas do
paciente e por deficiências mais prováveis conforme o tipo de técnica cirúrgica utilizada,
o tempo decorrido da cirurgia e a adesão do paciente à suplementação pós-operatória.
Problemas mais graves como anemia severa, deficiência grave de B1 e desnutrição grave
devem ser prontamente corrigidos. Em seguida, a equipe multidisciplinar (nutrólogo,
endocrinologista, nutricionista, cirurgião) deve ser contatada para avaliar e acompanhar
o paciente bariátrico.
207 ABLS Brasil
DICAS
▶ Todo paciente submetido à cirurgia bariátrica pode apresentar
alguma deficiência nutricional, de macro ou micronutrientes, e isto
sempre deve despertar alto nível de suspeição frente ao paciente que
procura atendimento;
▶ A reposição agressiva de vitaminas do complexo B deve ser
feita em pacientes com sintomas neurológicos, mesmo em vigência de
níveis séricos normais de vitaminas do complexo B;
▶ Na maior parte das vezes, a desnutrição proteica pós-bariátrica
tem relação com uma dieta hipercalórica e hipoproteica, e com a má
adesão à suplementação prescrita. No entanto, causas anatômicas rela-
cionadas à cirurgia também devem ser investigadas, tais como estenose
e alça comum muito curta; é aconselhável uma avaliação conjunta com
o cirurgião bariátrico;
▶ Hipoalbuminemia e edema em pacientes bariátricos são con-
siderados um quadro grave e devem ser tratados, inicialmente, em
ambiente hospitalar. Frequentemente, estão associados a outros déficits
nutricionais (vitaminas e oligoelementos);
▶ A nutrição parenteral deve ser considerada em pacientes com
albumina menor que 2,5 mg/dl;
▶ Após reposição rápida das deficiências vitamínicas e de mi-
nerais mais graves, o cirurgião bariátrico e a equipe multiprofissional
devem ser acionados para dar seguimento ao caso.
208 ABLS Brasil
Referências
1. Çalapkorur S, Küçükkatirci H. Vitamin deficiencies and prevention methods after bariatric
surgery. Mini-invasive Surg. 2020;4:15. doi: 10.20517/2574-1225.2019.51
2. Via MA, Mechanick JI. Nutritional and Micronutrient Care of Bariatric Surgery Patients:
Current Evidence Update. Curr Obes Rep. 2017;6(3):286-96. doi: 10.1007/s13679-017-0271-x.
4. van Rutte PW, Aarts EO, Smulders JF, Nienhuijs SW. Nutrient deficiencies before and after
sleeve gastrectomy. Obes Surg. 2014;24(10):1639-46. doi: 10.1007/s11695-014-1225-y.
5. Parrott J, Frank L, Rabena R, Craggs-Dino L, Isom KA, Greiman L. American Society for
Metabolic and Bariatric Surgery Integrated Health Nutritional Guidelines for the Surgical Weight
Loss Patient 2016 Update: Micronutrients. Surg Obes Relat Dis. 2017;13(5):727-41. doi: 10.1016/j.
soard.2016.12.018.
7. Van Osdol AD, Kallies KJ, Fredrickson KA, Kothari SN. A Different Kind of Craving:
Incidence and Treatment of Pica After Laparoscopic Roux-en-Y Gastric Bypass. World J Surg.
2017;41(9):2324-8. doi: 10.1007/s00268-017-4048-x.
9. Obinwanne KM, Fredrickson KA, Mathiason MA, Kallies KJ, Farnen JP, Kothari SN. In-
cidence, treatment, and outcomes of iron deficiency after laparoscopic Roux-en-Y gastric bypass:
a 10-year analysis. J Am Coll Surg. 2014;218(2):246-52. doi: 10.1016/j.jamcollsurg.2013.10.023.
10. DeFilipp Z, Lister J, Gagné D, Shadduck RK, Prendergast L, Kennedy M. Intravenous iron
replacement for persistent iron deficiency anemia after Roux-en-Y gastric bypass. Surg Obes Relat
Dis. 2013;9(1):129-32. doi: 10.1016/j.soard.2012.06.007.
12. Schollenberger AE, Karschin J, Meile T, Küper MA, Königsrainer A, Bischoff SC. Impact of
protein supplementation after bariatric surgery: A randomized controlled double-blind pilot study.
Nutrition. 2016;32(2):186-92. doi: 10.1016/j.nut.2015.08.005.
209 ABLS Brasil
13. El-Kadre LJ, Rocha PR, de Almeida Tinoco AC, Tinoco RC. Calcium metabolism in pre-
and postmenopausal morbidly obese women at baseline and after laparoscopic Roux-en-Y gastric
bypass. Obes Surg. 2004;14(8):1062-6. doi: 10.1381/0960892041975505.
14. Abd El Aziz M, Cahyadi O, Meier JJ, Schmidt WE, Nauck MA. Incretin-based glucose-lo-
wering medications and the risk of acute pancreatitis and malignancies: a meta-analysis based on
cardiovascular outcomes trials. Diabetes Obes Metab. 2020;22(4):699-704. doi: 10.1111/dom.13924.
211 ABLS Brasil
CAPÍTULO 19
SÍNCOPE E HIPOGLICEMIA
FLÁVIO FONTES PIROZZI
Introdução
Síncope e hipoglicemia são complicações frequentes do pós-operatório de cirurgia
bariátrica em decorrência da síndrome de dumping (SD). Alterações anatômicas de alguns
procedimentos bariátricos podem ocasionar o rápido esvaziamento gástrico e a chegada
de alimentos não digeridos nas primeiras porções do intestino delgado logo após a ali-
mentação. A SD é a complicação metabólica mais frequente após a cirurgia bariátrica; é
mais comum após bypass gástrico do que após gastrectomia vertical (sleeve). A SD pode
ser dividida em precoce, que ocorre após 1 hora da alimentação, e tardia, que ocorre de 1
a 3 horas após a alimentação [1,2].
Fisiopatologia da SD precoce
A chegada precoce do alimento hiperosmolar ao intestino delgado provoca extra-
vasamento de plasma do intravascular para o extravascular, o que resulta na redução do
volume plasmático e ocasiona sinais clínicos como taquicardia, hipotensão e síncope. Esse
deslocamento de líquido para o lúmen intestinal também está associado com distensão
abdominal, náusea, dores em cólica, borborigmo, meteorismo, flatulência e diarreia. Outros
mecanismos envolvidos estão ligados ao aumento de alguns hormônios gastrointestinais,
também chamados de incretinas, como o peptídeo intestinal vasoativo, o polipeptídeo
gástrico inibitório, o glucagon-like peptídeo-1 (GLP-1), o glucagon e a insulina [1,2].
Fisiopatologia da SD tardia
Ocorre em decorrência de um estado hiperinsulinêmico com hipoglicemia reativa.
A rápida chegada de carboidratos não digeridos no intestino delgado resulta em rápida
absorção desse nutriente, com uma resposta hiperinsulinêmica exacerbada em relação à
212 ABLS Brasil
Diagnóstico
Além da caracterização do quadro clínico agudo que leva o paciente ao pronto-aten-
dimento, o médico emergencista deve investigar o histórico de queixas inespecíficas como
fadiga após a refeição, pois pode ser uma importante dica de que o paciente vem apresen-
tando SD. Dois questionários baseados em sintomas podem ser usados para a avaliação
clínica frente à suspeita de SD - escore de Sigstad (evidência C) (Tabela 1) e escore de Arts
(evidência B) (Tabela 2) [1,3].
Diagnósticos diferenciais
Queixas gastrointestinais semelhantes à de SD precoce podem ser consequência de
complicações cirúrgicas como estenose, fístulas, bridas e isquemia. Úlceras e gastrite tam-
bém podem acarretar dor epigástrica durante as refeições. Investigação com endoscopia
digestiva alta (EDA) é sempre aconselhável [1,2].
Diagnósticos diferenciais de hipoglicemia hiperinsulinêmica são importantes em
pacientes pós-bariátrica e com sintomas de SD tardio. Pode ser necessário suspender o uso
de medicações que induzam essa situação, como sulfoniluréias e insulina. Além disso, a
medida do peptídeo C sérico pode auxiliar no diagnóstico, pois é um indicativo de produção
de insulina endógena. A hipoglicemia induzida por sulfoniluréias e insulinomas apresenta
aumento de peptídeo C; a hipoglicemia induzida por insulina exógena apresenta valores
supressos de peptídeo C. É importante descartar outras condições como insuficiência renal,
insuficiência hepática, hipocortisolismo e etilismo [1,2].
215 ABLS Brasil
Tratamento na emergência
Consensos sobre SD não especificam o nível de evidência em relação ao tratamento
na fase aguda. O tratamento na emergência de um paciente com síncope e hipotensão
consiste na expansão volêmica com solução isotônica e, nos casos de hipoglicemia, a nor-
malização da glicemia é feita por meio de solução hipertônica com glicose endovenosa ou
administração de glucagon por via subcutânea ou intramuscular. Deve-se dar preferência
para glicose endovenosa, de forma a diminuir o efeito incretínico da glicose pela via oral.
Tratamento crônico/preventivo
A mudança alimentar é o passo inicial do tratamento de SD. A reeducação alimen-
tar após a cirurgia bariátrica é fundamental tanto para o sucesso do procedimento como
para evitar sintomas de SD. A equipe multidisciplinar deve abordar o paciente acerca dos
sintomas de SD, reduzir a quantidade de comida ingerida em cada refeição e aumentar o
número de refeições ao longo do dia. Outras medidas importantes são evitar o consumo de
carboidratos de rápida absorção, priorizar fibras e proteínas, mastigar devagar os alimentos,
evitar líquidos durante as refeições e deitar por 30 minutos após as refeições para reduzir
o risco de hipotensão (evidência B) [1,2].
Suplementos dietéticos como a pectina podem auxiliar no retardo do esvaziamento
gástrico e reduzir a absorção de carboidratoa. Esses suplementos diminuem a secreção de
incretinas e os efeitos da SD; contudo, têm baixa tolerabilidade e palatabilidade. Suple-
mentos ricos em fibras podem exacerbar sintomas intestinais da síndrome precoce [1,2].
Com relação ao tratamento medicamentoso, a acarbose é um inibidor da alfa-glu-
cosidase usado no tratamento de pacientes diabéticos. Ao reduzir a absorção de carboi-
dratos, essa medicação auxilia na prevenção de sintomas de SD tardia e reduz a secreção
de incretinas. Porém, o uso dela é limitado, dado seus efeitos colaterais intestinais como
flatulência, dores abdominais e diarreia [1,2,6].
Análogos de somatostatina são uma opção para pacientes que apresentam falha no
tratamento dietético e/ou com acarbose. Esse tipo de fármaco atua no tratamento da SD pre-
coce e tardia por promover vasodilatação pós-prandial, retardo no esvaziamento gástrico,
inibição da secreção de hormônios gastrointestinais e insulina. Análogos de somatostatina
de curta duração são mais efetivos em pacientes com SD; porém, sua limitação encontra-se
em seu custo e na necessidade de 3 injeções diárias, via subcutânea. Medicações de longa
duração são preferidas por serem injetadas a cada 2 a 4 semanas via intramuscular. Os efeitos
216 ABLS Brasil
adversos mais comuns são diarreia, náusea, formação de cálculos biliares e dor no local da
injeção. O octreotide de longa duração e pasireotide saõ as medicações mais usadas [1,2,7].
Além desssas, há ainda outras opções farmacológicas. O diazóxido, um ativador do
canal de potássio que evita a despolarização das células beta, mantém fechado os canais
de cálcio e reduz a secreção de insulina. Alguns estudos usaram doses entre 100-150 mg
3x/dia, em adultos, pós cirurgia bariátrica e registraram resultados parciais. A nifedipina,
um anti-hipertensivo bloqueador do canal de cálcio, parece ter efeito sobre a célula beta
pancreática, reduzindo a secreção de insulina. Deve ter indicação cautelosa, dado o risco de
hipotensão, principalmente em pacientes idosos. Em 2019, o FDA aprovou o exendin 9-39
(Avexitide), um antagonista do receptor de GLP-1 de alta afinidade, para o tratamento da
hipoglicemia hiperinsulinêmica. Essa medicação aumenta a secreção de somatostatina e
glucagon, reduz a secreção de insulina e tem como principais efeitos colaterais, o eritema
no local da aplicação, a náusea, o vômito e a cefaleia (evidência C) [1,2,8].
Cirurgia Revisional
Embora não esteja no escopo de atuação do médico emergencista, alguns casos
refratários a todas as medidas clínicas podem necessitar de um procedimento cirúrgico
revisional. Esses procedimentos tecnicamente complexos, são reservados para casos mais
severos, com sintomas incapacitantes que afetem a qualidade de vida do paciente. A reversão
de um bypass gástrico para a “anatomia normal” é um exemplo de procedimento cirúrgico
revisional para casos graves de SD. Pancreatectomia e alimentação por jejunostomia são
pouco eficazes (evidência C) [1,2].
Considerações finais
A síndrome de dumping é uma complicação comum após cirurgia bariátrica, sobre-
tudo após procedimentos com bypass intestinal. Suas principais manifestações clínicas
são a síncope e a hipoglicemia reativa. O médico emergencista deve estar atento à possi-
bilidade da ocorrência desses quadros clínicos, os quais, muitas vezes, levam o paciente
ao pronto-socorro e necessitam de abordagem de urgência. Quando bem diagnosticadas
e prontamente tratadas, apresentam boa evolução clínica.
217 ABLS Brasil
DICAS
▶ A SD precoce e tardia, especialmente a síncope e a hipogli-
cemia, são complicações frequentes no pós-operatório de cirurgia
bariátrica, sobretudo após o bypass gástrico;
▶ O diagnóstico é, basicamente, clínico e laboratorial;
▶ É preciso ter atenção para os diagnósticos diferenciais de
acordo com os sinais e sintomas;
▶ O tratamento na fase aguda tem como foco a expansão volê-
mica, a normalização da glicemia e a observação clínica;
▶ O tratamento crônico visa prevenir novos episódios de SD.
Referências
1. Scarpellini E, Arts J, Karamanolis G, Laurenius A, Siquini W, Suzuki H, et al. Interna-
tional consensus on the diagnosis and management of dumping syndrome. Nat Rev Endocrinol.
2020;16(8):448-66. doi: 10.1038/s41574-020-0357-5.
4. Cryer PE, Axelrod L, Grossman AB, Heller SR, Montori VM, Seaquist ER, et al. Evaluation
and management of adult hypoglycemic disorders: an Endocrine Society Clinical Practice Guideline.
J Clin Endocrinol Metab. 2009;94(3):709-28. doi: 10.1210/jc.2008-1410.
7. de Heide LJ, Laskewitz AJ, Apers JA. Treatment of severe postRYGB hyperinsulinemic
hypoglycemia with pasireotide: a comparison with octreotide on insulin, glucagon, and GLP-1.
Surg Obes Relat Dis. 2014;10(3):e31-3. doi: 10.1016/j.soard.2013.11.006.
CAPÍTULO 20
Introdução
Rabdomiólise (RML) é uma síndrome clínica e bioquímica caracterizada por necrose
do músculo esquelético com liberação de conteúdo muscular intracelular para o sistema
circulatório. A lesão muscular pode resultar de trauma ou de isquemia decorrente de
pressão. A gravidade da doença varia de elevações assintomáticas dos níveis de enzimas
musculares no soro a casos com risco de vida associados a elevações extremas de enzimas,
a desequilíbrios eletrolíticos, a síndrome compartimental e a insuficiência renal aguda [1].
Embora a obesidade tenha sido previamente associada à RML, foi somente no ano
de 2003 que a RML foi relatada pela primeira vez após cirurgia bariátrica [2]. Desde então,
houve vários relatos de casos e de estudos retrospectivos e prospectivos que documenta-
ram taxa de incidência de 6% a 77% de RML em pacientes com obesidade submetidos à
cirurgia bariátrica [3].
Fatores de Risco
RML induzida por pressão é também descrita em pacientes com peso normal; porém,
pacientes portadores de obesidade correm um risco muito maior, especialmente se tiverem
sido posicionados inadequadamente ou se houver pontos de pressão preenchidos de forma
incorreta [4,5]. A maior parte dos casos relatados ocorreu após procedimentos nos quais o
paciente foi colocado em decúbito dorsal ou em posição de litotomia, que são posições
típicas usadas em operações bariátricas.
A RML intraoperatória geralmente ocorre em função de uma lesão causada por pres-
são sobre os membros inferiores e sobre os músculos glúteos e lombares. Super-obesidade
(IMC > 50 kg/m2), sexo masculino, hipertensão, diabetes e doença vascular periférica são
fatores de risco importantes. A cirurgia de longa duração é o maior fator de risco; no entanto,
220 ABLS Brasil
a RML foi relatada em pacientes com obesidade mórbida submetidos a procedimentos tão
curtos quanto 70 minutos [4,6,7].
Quadro clínico
O quadro clínico caracteriza-se por dor muscular, fraqueza, urina escura, edema,
hematomas; podendo ainda ocorrer náuseas, vômitos e confusão mental.
Os nervos sensoriais e motores são os mais sensíveis às alterações isquêmicas causadas
por danos de pressão; portanto, dor muscular e fraqueza são os sintomas mais precoces.
Porém, a analgesia pós-operatória, pode mascarar seus sintomas e retardar seu diagnóstico.
A tríade clássica para diagnóstico inclui a presença de dor (mialgia), fraqueza e urina
escura (mioglobinúria).
Diagnóstico
O marcador mais sensível para diagnóstico laboratorial é a dosagem sérica de CPK
(creatinofosfoquinase) - sua dosagem normal é de até 200 UI/L. Valores acima de 1000 UI/L
(ou cinco vezes o normal) já são compatíveis com RML. Danos musculares clinicamente
significativos com lesão renal e anormalidades eletrolíticas geralmente não estão presentes
até que os níveis de CPK aumentem para valores acima de 5.000 a 8.000 UI/L [4,6].
Qualquer paciente bariátrico que se queixe de dor nas nádegas, no quadril ou no
ombro durante o período pós-operatório; e que apresente nível sérico de CPK elevado
superior a 1.000 UI/L, é considerado portador de RML. A dosagem de rotina pré e pós-
-operatória da CPK sérica foi sugerida, uma vez que o diagnóstico precoce poderá levar a
um tratamento imediato e a um melhor prognóstico [8].
A mioglobina é a principal causa de IRA em RML. Os mecanismos propostos para o
insulto renal pela mioglobina incluem obstrução tubular, lesão oxidativa e vasoconstrição.
Hipovolemia e acidose contribuem para a nefrotoxicidade. Quando houver a presença
de urina marrom, particularmente na ausência de hemoglobinemia e hematúria, deve-se
suspeitar de RML. A mioglobina é eliminada da circulação mais rapidamente que a CPK;
portanto, é menos sensível para detectar RML, especialmente se a suspeita de RML for
tardia. O nível de mioglobina urinária superior a 3.000 ng/ml tem relação com o risco
aumentado de IRA [4,8].
221 ABLS Brasil
Prevenção
A prevenção de RML começa com o preenchimento cuidadoso de todos os pontos
de pressão e com muita atenção à posição do paciente. Leitos pneumáticos especiais com
compressão e insuflação intermitentes na área dorsal têm sido usados para pacientes após
cirurgia bariátrica [8]. Mudar a posição do paciente periodicamente durante procedimentos
longos também é recomendado, mas pode ser considerado impraticável na maior parte das
operações [9]. Minimizar o tempo operatório, garantir hidratação perioperatória adequada
e monitorar e observar o pós-operatório de perto os fatores mais importantes na prevenção
e no reconhecimento da RML perioperatória [9,10].
Embora acredite-se que a reposição adequada de fluidos intraoperatória reduza o risco
de RML pós-operatória, há poucos estudos acerca da administração de fluidos profiláticos
em pacientes bariátricos de alto risco.
Tratamento
Um dos objetivos mais importantes do tratamento é evitar lesão renal aguda, indepen-
dentemente da etiologia subjacente. Devido ao possível acúmulo de fluidos nos comparti-
mentos musculares e à hipovolemia associada, o gerenciamento de fluidos é fundamental
para a prevenção da azotemia (elevação de ureia e creatinina) pré-renal. A azotemia é
prevenida principalmente por hidratação agressiva a uma taxa de 1,5 L/h. Outra opção é
500 ml/h de solução salina alternada a cada hora com 500 ml/h de solução de glicose a 5%
com 50 mmol de bicarbonato de sódio para cada 2- 3 L de solução. Meta de débito urinário
de 200 ml/h, pH urinário > 6,5 e pH plasmático < 7,5 devem ser alcançados. Notavelmente,
a alcalinização urinária com bicarbonato de sódio ou com acetato de sódio não está com-
provada no que diz respeito à promoção da diurese, assim como o uso de manitol. Drogas
como estatinas, que são reconhecidamente um fator de risco para rabdomiólise, também
devem ser interrompidas imediatamente. A fasciotomia pode ser necessária na síndrome
compartimental com o objetivo de limitar os danos aos músculos e rins [11].
222 ABLS Brasil
Considerações finais
Apesar da rabdomiólise ser um diagnóstico pouco frequente, muitos pacientes re-
clamam de dorsalgia. Cirurgias bariátricas têm se tornado procedimentos cada vez mais
rápidos dada a padronização e a experiência das equipes. Apesar disso, é comumente ob-
servado pacientes em constante decúbito dorsal nas salas de recuperação pós-anestésica.
Outro fato que vale ser relembrado, é a possibilidade de ocorrência simultânea de RML e
de fenômenos trombo embólicos, em função de períodos prolongados de imobilização dos
pacientes. Medidas simples como a mobilização no leito (decúbitos laterais alternados), já
no pós-anestésico imediato, podem evitar essas complicações.
223 ABLS Brasil
DICAS
▶ Sintomas de rabdomiólise podem demorar até três dias para
aparecer;
▶ Dor muscular, artralgia e, principalmente, urina escura são sinais
de muita suspeição;
▶ A dosagem de CPK é mandatória;
▶ Iniciar hidratação venosa vigorosa antes mesmo de contatar a
equipe cirúrgica.
224 ABLS Brasil
Referências
1. Khurana RN, Baudendistel TE, Morgan EF, Rabkin RA, Elkin RB, Aalami OO. Postope-
rative Rhabdomyolysis Following Laparoscopic Gastric Bypass in the Morbidly Obese. Arch Surg.
2004;139(1):73–76. doi:10.1001/archsurg.139.1.73.
5. Khurana RN, Baudendistel TE, Morgan EF, Rabkin RA, Elkin RB, Aalami OO. Posto-
perative rhabdomyolysis following laparoscopic gastric bypass in the morbidly obese. Arch Surg.
2004;139:73-76. doi: 10.1001/archsurg.139.1.73.
7. Karcher C, Dieterich HJ, Schroeder TH. Rhabdomyolysis in an obese patient after total
knee arthrosplasty. Brit J Anaesth. 2006;97:822-824. doi: 10.1093/bja/ael274.
8. de Meijer AR, Fikkers BG, de Keijzer MH, van Engelen BG, Drenth JP. Serum creatine
kinase as predictor of clinical course in rhabdomyolysis: a 5-year intensive care survey. Intensive
Care Med. 2003;29:1121-1125. doi: 10.1007/s00134-003-1800-5.
9. de Menezes Ettinger JE, dos Santos Filho PV, Azaro E, Melo CA, Fahel E, Batis-
ta PB. Prevention of rhabdomyolysis in bariatric surgery. Obes Surg. 2005;15:874-879. doi:
10.1381/0960892054222669.
10. Wiltshire JP, Custer T. Lumbar muscle rhabdomyolysis as a cause of acute renal failure
after Roux-en-Y gastric bypass. Obes Surg. 2003;13:306-13. doi: 10.1381/096089203764467270.
11. Torres PA, Helmstetter JA, Kaye AM, Kaye AD. Rhabdomyolysis: pathogenesis, diagnosis,
and treatment. Ochsner J. 2015;15(1):58-69.
225 ABLS Brasil
CAPÍTULO 21
Introdução
Hipercoagulabilidade, lesão endotelial e estase venosa (tríade de Virchow) são os fato-
res primordiais implicados na fisiopatologia da trombose venosa. Eventos tromboembólicos,
incluindo trombose venosa profunda (TVP) e embolia pulmonar (EP), são algumas das
causas de morbidade e de mortalidade em cirurgias da obesidade [1]. A obesidade mórbida,
a idade avançada, o sexo masculino, o histórico prévio de EP / TVP e de apneia obstrutiva
do sono são fatores de risco bem conhecidos para tromboembolismo venoso (TEV) [2].
Pacientes obesos têm risco de moderado a alto de TEV. A incidência de EP na ci-
rurgia bariátrica varia de 0% a 3,4% [3]. Usualmente, as recomendações para profilaxia do
TEV em pacientes bariátricos incluem a combinação de terapia farmacológica com meias
de compressão graduada ou com dispositivos de compressão pneumática intermitente.
Contudo, não há consenso sobre o padrão da tromboprofilaxia [4-6]. Por exemplo, a pro-
filaxia farmacológica efetiva e segura dos fenômenos tromboembólicos é um desafio em
pacientes cirúrgicos bariátricos, pois a dosagem baseada no peso corporal pode causar
anticoagulação e risco de sangramento cirúrgico.
Epidemiologia
A incidência de EP em cirurgia bariátrica varia de 0% a 3,4%. Segundo o banco de
dados BOLD (Bariatric Outcomes Longitudinal Database) que analisou aproximadamente
74.000 procedimentos bariátricos, a incidência global de TEV (TVP e/ou EP) foi de 0,4%,
sendo que a maior parte dos fenômenos tromboembólicos ocorreu após a alta hospitalar [1].
226 ABLS Brasil
Fatores de risco
Fatores de risco para TEV incluem índice de massa corporal (IMC) > 50 kg/m2
(super-obesidade), histórico de TEV, distúrbio de hipercoagulabilidade (trombofilias),
hipertensão pulmonar, insuficiência venosa, cirurgia aberta (laparotomia), cirurgia re-
visional e tempo operatório > 3 horas [2]. Fatores de risco mais comuns associados à EP
fatal incluem insuficiência venosa grave, IMC > 60 kg/m2, obesidade central e síndrome
de hipoventilação da obesidade [3].
Interpretação
Probabilidade Pontuação
Alta probabilidade 3 ou maior
Moderada probabilidade 1 ou 2
Baixa probabilidade 0 ou menos
Modificação: Esse modelo clínico foi modificado para levar em consideração outra carac-
terística clínica: atrombose venosa profunda (TVP) previamente documentada, a qual recebe
pontuação 1. Usando esse sistema de pontuação modificado, a TVP é provável ou improvável,
como se segue:
TVP provável 2 ou maior
TVP improvável 1 ou menos
228 ABLS Brasil
outro exame. No entanto, se o D-dímero estiver > 500 ng/ml, deve-se prosseguir com a
investigação.O primeiro exame a ser solicitado a indivíduos com alta probabilidade para
EP é a angiotomografia de tórax com contraste.
Prevenção
A estratificação de risco é o primeiro passo para prevenir fenômenos tromboembóli-
cos. O escore de Caprini é uma ferramenta útil para tal avaliação (Tabela 3); sua classificação
categoriza o paciente em três grupos distintos: alto, moderado e baixo risco.
As principais estratégias de prevenção incluem:
• Métodos mecânicos: deambulação precoce após cirurgia; uso de meias de com-
pressão elástica; compressão pneumática intermitente.
• Profilaxia medicamentosa: Heparina não fracionada (HNF) ou Heparina de baixo
peso molecular (HBPM)
• Filtro de veia cava inferior
Ainda não há um consenso acerca de quais são as estratégias ideais para a prevenção
do TEV no cenário da cirurgia bariátrica. A maior parte dos cirurgiões bariátricos usa
dispositivos de compressão pneumática em conjunto com heparina não fracionada ou de
baixo peso molecular subcutânea e deambulação precoce [6]. A diretriz da American Society
229 ABLS Brasil
Interpretação
Categoria de risco Pontuação Risco estimado de TEV na ausência de
cirúrgico * profilaxia farmacológica ou mecânica (%)
Muito baixo 0 < 0,5
Baixo 1a2 1,5
Moderado 3a4 3,0
Alto ≥5 6,0
* Esta tabela aplica-se apenas à cirurgia geral, abdominal-pélvica, bariátrica, vascular e plástica e
reconstrutiva.
of Metabolic and Bariatric Surgery (ASMBS) para tromboprofilaxia orienta que todos os
pacientes bariátricos devam receber profilaxia mecânica e orientação para deambulação
precoce. Além disso, o cirurgião pode rotineiramente fazer uso de profilaxia farmacológica
de heparina de baixo peso molecular (HBPM) ou heparina não fracionada (HNF) somente
durante internação ou prolongar seu uso após alta hospitalar [2].
Não existe consenso acerca da dose e da duração da tromboprofilaxia farmacológica.
Coagulopatia, idade > 60 anos e sexo masculino são fatores para o aumento de risco de
fenômenos tromboembólicos [8].
A melhor dosagem de HBPM no pré-operatório quanto aos desfechos clínicos de
trombose, embolia e sangramento digestivo ainda é bastante controversa. Dose de 40 mg
no dia anterior à cirurgia e mantida por 10 dias após procedimento, já teve relação com
a ausência de fenômenos tromboembólicos e menor risco de sangramento digestivo, se
comparada à dose de 40 mg 2x ao dia [9]. No entanto, a tromboprofilaxia farmacológica de
longa duração (> 24 horas) não é consenso [10].
Tratamento
A anticoagulação é o ponto chave do tratamento da TVP desde que não haja con-
traindicação formal. Ela é recomendada para todos os pacientes com TVP proximal (veias
poplítea, femoral e ilíaca) e, na maior parte dos casos, com TVP distal, exceto para aqueles
que apresentem hemorragia ativa, com contagem de plaquetas < 50.000/ml ou com he-
morragia intracraniana prévia. Recomenda-se o implante de filtro de veia cava inferior
para essa população [13].
Todo paciente submetido à anticoagulação deve ser analisado antes e durante o tra-
tamento no que diz respeito ao risco de sangramento. O escore HAS-BLED, por exemplo,
é uma ferramenta útil para estimar o risco de sangramento em pacientes anticoagulados.
Pacientes que apresentam baixo risco de sangramento em três meses (< 2%) devem ser
anticoagulados. Aqueles com risco estimado de sangramento em três meses > 13% (alto
risco), por sua vez, não devem ser anticoagulados. Ainda não existe consenso na literatura
acerca da anticoagulação de pacientes com risco de sangramento moderado. Dessa forma,
deve-se pesar a relação risco-benefício para essa população, com condutas específicas para
cada caso [14].
Os anticoagulantes disponíveis para tratamento da TVP incluem a HNF, HBPM, an-
tagonistas da vitamina K (varfarina) e os anticoagulantes orais diretos, como os inibidores
orais do fator Xa (rivaroxabana, apixabana e edoxabana) e inibidores orais do fator IIa
(dabigatrana). A escolha do agente tem como base a experiência do médico, assim como
nos riscos de sangramento, nas doenças prévias do paciente, no custo e na posologia. A
dose mais utilizada da HBPM é de 1 mg/kg de enoxieparina, duas vezes ao dia [13]. Alter-
nativamente, pode ser administrado 1,5 mg/kg uma vez ao dia. Pacientes com disfunção
renal devem ter suas doses corrigidas.
A HNF é administrada em bolus inicial de 80 UI/kg, seguida de 18 UI/kg/hora, com
ajustes subsequentes após 6 horas, quando deve ser solicitada a medição do TTPa. Esse
deve ser medido a cada 6 horas até que dois valores consecutivos alcancem o alvo desejado.
O alvo terapêutico do TTPa está entre 46 e 70 segundos, o que corresponde a cerca de 1,5
a 2,3 vezes o valor normal.
Os anticoagulantes orais diretos (inibidores do fator Xa ou IIa) podem ser utilizados
como terapia inicial. De forma habitual, a primeira dose administrada em doentes com
função renal normal da rivaroxabana é de 15 mg duas vezes ao dia durante as três primeiras
semanas, seguidas de 20 mg ao dia por período variável. Já a apixabana, é administrada na
dose de 10 mg duas vezes ao dia, durante os primeiros 7 dias [15].
232 ABLS Brasil
Pode ser realizado tratamento ambulatorial com HBPM, desde que o paciente preen-
cha todos os critérios para vigilância e administração do medicamento, a saber: estabili-
dade hemodinâmica, baixo risco de sangramento, função renal normal e boas condições
socioeconômicas e ambientais. O tratamento ambulatorial não é recomendado para casos
de TVP maciça (iliofemoral, por exemplo), de EP sintomática, de alto risco de sangramento
ou de comorbidades associadas que necessitem de atendimento hospitalar [16].
A duração do tratamento é definida com base nos fatores de risco para recorrência de
TVP e de sangramento, além de fatores socioeconômicos do paciente. O tempo mínimo de
anticoagulação é de três meses para o primeiro episódio de TVP; contudo, o tempo ideal
ainda é controverso na literatura, embora haja uma forte tendência para que o tratamento
seja estendido. Evidências mostram que alguns grupos de doentes podem se beneficiar do
tratamento com anticoagulantes por tempo indefinido. Pacientes com câncer, trombofilias
hereditárias, síndrome do anticorpo antifosfolípide, entre outros, são candidatos à anti-
coagulação por tempo muito prolongado [13].
Algumas medidas adicionais à anticoagulação incluem a deambulação precoce e
frequente, e o uso de meias de compressão elástica. Essas medidas associadas parecem não
aumentar o risco de EP em pacientes com TVP. Portanto, devem ser estimuladas sempre
que possível. É aconselhado que meias de compressão sejam utilizadas após o início da
anticoagulação e que seu uso seja mantido por 2 anos [14].
Considerações finais
Pacientes portadores de obesidade mórbida submetidos à cirurgia bariátrica são con-
siderados de alto risco para o desenvolvimento de fenômenos tromboembólicos. O médico
emergencista deve sempre manter alto grau de suspeição clínica em pacientes bariátricos
em pós-operatório recente, aplicando testes diagnósticos e iniciando tratamento precoce,
mesmo em pacientes que receberam medidas profiláticas pós-operatórias.
233 ABLS Brasil
DICAS
▶ Eventos tromboembólicos, incluindo TVP e EP, são causas
comuns de morbidade e mortalidade na cirurgia da obesidade;
▶ Pacientes obesos têm risco de moderado a alto de TEV. Os
principais fatores de risco incluem IMC > 50 kg/m2, história de TEV,
história de transtorno de hipercoagulabilidade, hipertensão pulmonar,
insuficiência venosa, cirurgia aberta (por laparotomia), cirurgia revi-
sional e tempo operatório > 3 horas;
▶ TVP deve sempre ser suspeitada no pós-operatório de cirurgia
bariátrica em casos de edema assimétrico de membros inferiores, além
de dor, calor e eritema;
▶ Um evento de EP pós-bariátrica pode ser assintomático. A
dispneia é o sintoma mais comum, seguido pela dor torácica e tosse;
▶ Para o diagnóstico, é recomendada a utilização da probabilidade
pré-teste e dosagem de D-dímero em pacientes selecionados que sejam
de baixo risco, para então solicitar exames de imagem;
▶ As principais estratégias de prevenção TVP e EP incluem méto-
dos mecânicos (meias elásticas e deambulação precoce), farmacológicos
(anticoagulantes) e filtro de veia cava inferior;
▶ O tratamento da trombose venosa profunda é baseado em
anticoagulação, desde que não haja contraindicação. Todo paciente sub-
metido à anticoagulação deve ser analisado antes e durante o tratamento
para risco de sangramento. A duração do tratamento é definida com
base em fatores de risco para a recorrência de TVP e de sangramento,
além de fatores socioeconômicos do paciente.
234 ABLS Brasil
Referências
1. Winegar DA, Sherif B, Pate V, DeMaria EJ. Venous thromboembolism after bariatric surgery
performed by Bariatric Surgery Center of Excellence Participants: analysis of the Bariatric Outcomes
Longitudinal Database. Surg Obes Relat Dis. 2011;7(2):181-8. doi: 10.1016/j.soard.2010.12.008.
2. American Society for Metabolic and Bariatric Surgery Clinical Issues Committee. ASMBS
updated position statement on prophylactic measures to reduce the risk of venous thromboembolism
in bariatric surgery patients. Surg Obes Relat Dis. 2013;9(4):493-7. doi: 10.1016/j.soard.2013.03.006.
3. Masoomi H, Buchberg B, Reavis KM, Mills SD, Stamos M, Nguyen NT. Factors predictive
of venous thromboembolism in bariatric surgery. Am Surg. 2011;77(10):1403-6. PMID: 22127099.
4. Bauer KA, Huisman MV. Clinical presentation and diagnosis of the nonpregnant adult with
suspected deep vein thrombosis of the lower extremity [internet]. ©2022 UpToDate. Disponível
em: https://www.uptodate.com/contents/clinical-presentation-and-diagnosis-of-the-nonpregnan-
t-adult-with-suspected-deep-vein-thrombosis-of-the-lower-extremity#references. Acessado em
janeiro, 2022.
5. Thompson BT, Kabrhel C, Pena C. Clinical presentation, evaluation, and diagnosis of the
nonpregnant adult with suspected acute pulmonary embolism [Internet]. ©2022 UpToDate. Dis-
ponível em: https://www.uptodate.com/contents/clinical-presentation-evaluation-and-diagnosis-o-
f-the-nonpregnant-adult-with-suspected-acute-pulmonary-embolism. Acessado em janeiro, 2022.
7. Birkmeyer NJ, Finks JF, Carlin AM, Chengelis DL, Krause KR, Hawasli AA, et al. Michigan
Bariatric Surgery Collaborative. Comparative effectiveness of unfractionated and low-molecular-
-weight heparin for prevention of venous thromboembolism following bariatric surgery. Arch Surg.
2012;147(11):994-8. doi: 10.1001/archsurg.2012.2298..
8. Clark LN, Helm MC, Gould JC. Practice patterns regarding post-discharge chemopro-
phylaxis for venous thromboembolism following bariatric surgery in the United States. Surg Obes
Relat Dis. 2019;15(5):703-7. doi: 10.1016/j.soard.2019.02.017.
10. Lim RB. Perioperative morbidity and mortality. ©2022 UpToDate. Disponível em: https://
www.uptodate.com/contents/bariatric-operations-perioperative-morbidity-and-mortality. Acessado
em janeiro, 2022.
235 ABLS Brasil
11. Caruana JA, Anain PM, Pham DT. The pulmonary embolism risk score system reduces the
incidence and mortality of pulmonary embolism after gastric bypass. Surgery. 2009;146(4):678-83;
discussion 683-5. doi: 10.1016/j.surg.2009.07.011..
12. Birkmeyer NJ, Finks JF, English WJ, Carlin AM, Hawasli AA, Genaw JA, et al. Michigan
Bariatric Surgery Collaborative. Risks and benefits of prophylactic inferior vena cava filters in patients
undergoing bariatric surgery. J Hosp Med. 2013;8(4):173-7. doi: 10.1002/jhm.2013.
13. Lip GYH, Hull RD. Overview of the treatment of lower extremity deep vein thrombosis
(DVT) [Internet]. ©2022 UpToDate. Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/over-
view-of-the-treatment-of-lower-extremity-deep-vein-thrombosis-dvt. Acessado em janeiro, 2022.
14. Kearon C, Akl EA, Comerota AJ, Prandoni P, Bounameaux H, Goldhaber SZ, et al. An-
tithrombotic therapy for VTE disease: Antithrombotic Therapy and Prevention of Thrombosis,
9th ed: American College of Chest Physicians Evidence-Based Clinical Practice Guidelines. Chest.
2012;141(2 Suppl):e419S-e496S. doi: 10.1378/chest.11-2301. Erratum in: Chest. 2012;142(6):1698-
1704.
15. Lip GYH, Hull RD. Venous thromboembolism: Initiation of anticoagulation (first 10 days)
[Internet]. ©2022 UpToDate. Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/venous-throm-
boembolism-initiation-of-anticoagulation-first-10-days. Acessado em janeiro, 2022.
16. Othieno R, Okpo E, Forster R. Home versus in-patient treatment for deep vein thrombosis.
Cochrane Database Syst Rev. 2018;1(1):CD003076. doi: 10.1002/14651858.CD003076.pub3.
237 ABLS Brasil
CAPÍTULO 22
Introdução
Diarreia após cirurgia bariátrica não é um evento incomum e varia de acordo com
a técnica operatória utilizada [1]. Da mesma forma, existem inúmeras etiologias possíveis
na gênese desse problema. Além das causas associadas diretamente ou indiretamente ao
procedimento cirúrgico, doenças preexistentes e outras adquiridas no pós-operatório não
podem ser esquecidas.
Outro aspecto importante é conceituar diarreia e caracterizá-la com relação a sua du-
ração. A diarreia pode ser definida pela ocorrência de três ou mais evacuações amolecidas
ou líquidas ao longo de 24 horas, totalizando mais de 200g de fezes por dia. O evento pode
ser classificado como agudo ou autolimitado, se durar menos de 14 dias, ou persistente, se
durar mais de duas semanas. No caso da diarreia manter-se por mais de quatro semanas,
passa a ser denominada diarreia crônica. Tal caracterização é importante, pois auxilia no
diagnóstico etiológico [2].
Face ao foi relatado, é de fundamental importância realizar-se o histórico clínico
completo e exame físico detalhado, tanto para permitir um diagnóstico etiológico mais
provável e avaliar a gravidade do caso, quanto para promover uma abordagem terapêutica
mais eficaz. De quadros clínicos mais leves àqueles que cursam com repercussão clínica e
nutricional mais severas, sempre haverá algum grau de comprometimento da qualidade
de vida.
De acordo com a Portaria Ministerial 424 de 2013, embora apenas seis procedi-
mentos bariátricos tenham sua realização aprovada no Brasil[3], outras técnicas cirúrgicas
também têm sido realizadas. Muitas vezes, essa informação não está facilmente disponível
no atendimento de urgência ou para equipes não especializadas. De qualquer forma, a
diarreia parece ser um evento um pouco menos comum após procedimentos bariátricos
exclusivamente restritivos, que apenas reduzem o tamanho do estômago [4]. Dentre essas
238 ABLS Brasil
2. Avaliação da gravidade
» Grau de desidratação
• Hidratação de mucosas;
• Volume urinário e concentração da urina;
• Hipotensão (PA sistólica < 90 mmHg);
• Taquicardia (FC > 100 bpm) e
• Hipotensão postural: queda da pressão arterial sistólica (PAS) > 20 mmHg,
queda da pressão diastólica (PAD) > 10 mmHg ou ambas, quando se assume
a posição ortostática.
» Deficiência nutricional
• Lesões de pele hiperemiadas em áreas expostas – pelagra?
• Lesões de mucosas;
• Edema de membros inferiores;
• Ortopneia;
• Fraqueza, tontura, visão dupla – déficit de tiamina?
• Cegueira noturna;
• Perda de cabelo e
• Alterações ungueais.
240 ABLS Brasil
Diagnóstico Etiológico
1 – Diarreia aguda infecciosa - corresponde a um grupo de doenças infecciosas gas-
trointestinais que podem ser acompanhadas de náusea, vômito, febre e dor abdominal. Em
geral, são doenças autolimitadas com duração de até 14 dias. Em alguns casos, há presença
de muco e sangue, quadro conhecido como disenteria [6]. Seus agentes etiológicos mais
comuns são os vírus (79%), bactérias (15%) e parasitas (6%). Em casos de disenteria e nos
mais severos, sugere-se a coleta de coprocultura e o tratamento com antibioticoterapia [7].
DICAS
▶ Levar em consideração as informações clínicas relevantes para
decidir qual deve ser a linha de investigação / tratamento: idade do pa-
ciente; histórico de diarreia; uso de antibióticos recentes; perda de peso
acima do esperado; presença de anemia inexplicável; histórico familiar
de doenças intestinais;
▶ Procurar obter o maior número de informações a respeito da
técnica cirúrgica realizada. Verificar, sobretudo, se houve bypass intes-
tinal, principalmente com componente mal absortivo (duodenal switch,
SADI-S). Cirurgias do tipo “restritivas” (p.ex.: sleeve) geralmente deman-
dam mais investigações;
▶ Diarreias que se iniciam imediatamente após a cirurgia geral-
mente estão associadas à técnica operatória. Já as que se iniciam no
pós-operatório mais tardio podem estar associadas a outras causas não
diretamente relacionadas ao procedimento bariátrico;
▶ Antes da avaliação etiológica, a prioridade do médico deve se
voltar para a estabilização clínica dos quadros espoliativos (desidratação,
desnutrição);
▶ A conduta diagnóstico-terapêutica deve seguir a lógica de uma
abordagem gradativa, de acordo com o diagnóstico etiológico mais
provável para cada caso.
246 ABLS Brasil
Referências
1. Søvik TT, Karlsson J, Aasheim ET, et al. Gastrointestinal function and eating behavior after
gastric bypass and duodenal switch. Surg Obes Relat Dis 2013; 9: 641-647
2. World Health Organization. The Treatment of Diarrhoea – A Manual for Physicians and
Other Senior Health Workers (WHO/CAH/03.7). Geneva: World Health Organization, 2005. 44p.
4. Borbély YM, Osterwalder A, Kröll D, et al. Diarrhea after bariatric procedures: diagnosis
and therapy. World J Gastroenterol. 2017; 23(26): 4689–4700.*
5. The IFSO Global Registry - 5th IFSO Global Registry Report – 2019. Disponível em https://
www.ifso.com/pdf/5th-ifso-global-registry-report-september-2019.pdf
9. Kelly CR, Fischer M, Allegretti J, et al. ACG clinical guidelines: prevention, diagnosis,
and treatment of clostridioides difficile infections. Am J Gastroenterol 2021; 116(6): 1124-1147.
10. Gudmand-Höyer E, Asp NG, Skovbjerg H, Andersen B. Lactose malabsorption after bypass
operation for obesity. Scand J Gastroenterol 1978; 13: 641-647.
11. Sabate JM, Coupaye M, Ledoux S, et al. Consequences of Small Intestinal Bacterial Over-
growth in Obese Patients Before and After Bariatric Surgery. Obes Surg 2017; 27(3): 599-605.
12. Krajicek EJ, Hansel SL. Small intestinal bacterial overgrowth: a primary care review. Mayo
Clin Proc. 2016; 91: 1828–33.
13. Nickles MA, Hasan A, Shakhbazova A, et al. Alternative treatment approaches to small
intestinal bacterial overgrowth: a systematic review. J Altern Complement Med 2021; 27(2):108-119.
14. Wedlake L, A’Hern R, Russell D, et al. Systematic review: the prevalence of idiopathic bile
acid malabsorption as diagnosed by SeHCAT scanning in patients with diarrhoea-predominant
irritable bowel syndrome. Aliment Pharmacol Ther 2009; 30: 707-717.
247 ABLS Brasil
15. Smith MI, Yatsunenko T, Manary MJ, et al. Gut microbiomes of Malawian twin pairs
discordant for kwashiorkor. Science 2013; 339: 548-554
16. Lacy BE, Patel NK. Rome criteria and a diagnostic approach to irritable bowel syndrome
J Clin Med. 2017 Nov; 6(11): 99.
248 ABLS Brasil
Figura 1. Fluxograma de condução clínica do paciente com diarreia após cirurgia bariátrica. Adaptado de
Sollier C, et al [8].
249 ABLS Brasil
CAPÍTULO 23
Introdução
A infecção intra-abdominal é a segunda causa mais comum de sepse grave em pa-
cientes admitidos na UTI [1]. Mesmo em condições adequadas de tratamento, a sepse ab-
dominal está associada a elevadas taxas de morbimortalidade. Uma causa particularmente
desafiadora inclui as complicações pós-operatórias, que se tornam ainda mais complexas
em pacientes obesos.
O tratamento da sepse abdominal é multimodal e envolve o controle cirúrgico do foco
infeccioso, precedido de medidas de reanimação e de antibioticoterapia de amplo espectro.
Embora a segurança da cirurgia bariátrica tenha aumentado muito nos últimos anos,
dada a redução significativa nas taxas de morbimortalidade, pacientes obesos apresentam
risco elevado, especialmente aqueles do sexo masculino, acima de 50 anos e com índice de
massa corporal (IMC) > 60 kg/m2 [2]. A obesidade está associada ao aumento da resistência
insulínica, inflamação crônica, hipercoagulabilidade e redução da complacência da parede
torácica. Juntas, essas alterações contribuem para uma resposta fisiológica alterada, fato
que aumenta o risco desse grupo de pacientes apresentar um quadro infeccioso que exige
presteza e agilidade de emergencistas e de cirurgiões gerais de plantão no pronto-socorro
de forma a minimizar a chance de uma evolução desfavorável.
A abordagem cirúrgica deve ser direcionada de acordo com as suspeitas diagnós-
ticas e com a gravidade da infecção intra-abdominal. O retardo na indicação cirúrgica
pode acarretar índices mais elevados de evolução clínica desfavorável e necessidade de
reoperações. A exploração cirúrgica, quando indicada, deve ser feita precocemente, sem-
pre após as medidas iniciais de suporte clínico, mas muitas vezes antes mesmo de estudos
diagnósticos completos [3].
250 ABLS Brasil
Sepse e obesidade
A obesidade é uma doença caracterizada por um estado inflamatório crônico de baixo
grau. A elevação de marcadores inflamatórios na obesidade é proveniente dos próprios
adipócitos e dos macrófagos infiltrados em resposta a um estado crônico de hipóxia tecidual,
resultante da compressão de vasos sanguíneos no tecido adiposo. Associado a esse ambiente
pró-inflamatório, a pré-disposição de pacientes obesos soma-se a outros fatores de risco,
tais como doenças cardiovasculares, respiratórias e diabetes, que aumentam a susceptibi-
lidade a infecções, bem como restringem a resposta orgânica esperada durante a sepse [4].
Indivíduos com IMC e circunferência abdominal elevados são mais susceptíveis a
doenças crônicas e maior risco de eventos de sepse, por apresentar diferenças na morbidade
e na mortalidade, se comparados a pacientes com IMC normal.
Os pacientes obesos apresentam um desafio adicional aos médicos emergencistas, em
virtude de doenças crônicas frequentemente associadas, do maior risco para o desenvolvi-
mento de sepse, evolução geralmente mais rápida e desfavorável e dificuldades diagnósticas
na sepse abdominal, sendo importante o conhecimento de suas peculiaridades. Pacientes
obesos com sepse abdominal necessitam de um diagnóstico e intervenção médica preco-
ces, tanto para medidas clínicas de suporte quanto para a abordagem cirúrgica (quando
indicada), de forma a aumentar os índices de sucesso e a reduzir a morbimortalidade.
controle efetivo e precoce do foco infeccioso e (e) reavaliação da resposta clínica e ajuste
apropriado da estratégia de conduta [5].
O reconhecimento precoce do paciente com sepse abdominal em curso é o primeiro
passo para um tratamento eficaz. Após o diagnóstico de sepse de provável foco abdominal,
o paciente deve ser precocemente submetido a um conjunto de medidas durante sua pri-
meira hora de admissão na unidade de emergência [6], conforme demonstrado na tabela 1.
Estabilização da respiração
Oxigênio suplementar deve ser fornecido a todos os pacientes com sepse e a oxigena-
ção deve ser monitorada continuamente com oximetria de pulso. Intubação e ventilação
mecânica podem ser necessárias para dar suporte ao esforço respiratório que normalmente
acompanha a sepse, assim como, para proteger as vias aéreas, principalmente em pacientes
com rebaixamento do nível de consciência [3].
Investigação inicial
Um breve histórico inicial e o exame físico, bem como estudos laboratoriais, micro-
biológicos e de imagem são frequentemente obtidos simultaneamente enquanto o acesso
venoso está sendo estabelecido e as vias aéreas estabilizadas. Na anamnese, é sempre im-
portante investigar a técnica cirúrgica realizada, bem como o tempo de pós-operatório do
paciente, de forma a direcionar o raciocínio do emergencista para possíveis complicações
cirúrgicas infeciosas. A avaliação diagnóstica deve ser feita de maneira rápida e não deve
protelar o início da terapêutica.
Além de exames laboratoriais mais usuais como hemograma, creatinina, bilirrubina,
coagulograma e gasometria arterial, uma dosagem sérica de lactato > 2 mmol/L pode indicar
a gravidade da sepse e auxiliar no acompanhamento da resposta terapêutica. Duas hemocul-
turas coletadas de sítios distintos dentro do período de até uma hora, assim como culturas
microbiológicas de fontes suspeitas, como ferida operatória, sítio cirúrgico ou exsudato
de drenos abdominais devem ser realizadas, preferencialmente, antes da administração de
antimicrobianos. No entanto, o início da antibioticoterapia não deve ser postergado caso
a coleta desses exames não possa ser feita de maneira imediata.
Exames de imagem também podem ser muito úteis no diagnóstico da sepse abdo-
minal em pacientes bariátricos. Radiografia de tórax, radiografia simples de abdome ou
preferencialmente tomografia computadorizada de abdome total com uso de contraste
oral são os mais utilizados na busca do foco infeccioso. A ultrassonografia à beira do leito
(FAST), apesar das possíveis limitações por distensão gasosa abdominal, também pode ser
utilizada caso a tomografia não esteja disponível. O exame de imagem do abdome auxilia
na estratégia terapêutica cirúrgica, orientando o cirurgião quanto ao melhor método de
abordagem e quanto à via de acesso a ser utilizada.
Ressuscitação inicial
A ressuscitação volêmica deve ser iniciada com a infusão imediata de 30 ml/kg de
cristaloides na primeira hora de atendimento, em pacientes hipotensos (PAS < 90mmHg,
PAM < 65 mmHg ou redução de 40mmHg na PAS habitual) ou com sinais de hipoperfusão
tecidual (entre eles, o lactato sérico 2 vezes acima o valor normal). Sinais de hipoperfusão
também podem incluir oligúria, livedo cutâneo, tempo de enchimento capilar reduzido
e alteração do nível de consciência. O volume deve ser infundido o mais rápido possível,
levando-se em consideração as condições clínicas do paciente, como disfunção cardíaca,
por exemplo.
253 ABLS Brasil
O tratamento cirúrgico da peritonite tem três objetivos principais: (a) eliminar o foco
infeccioso, (b) reduzir o inóculo bacteriano e (c) prevenir a persistência e a recorrência
da sepse [8,9]. Além do controle do foco infeccioso, é necessário que seja abordada a causa
primária da infecção, como o controle de fístulas entéricas ou direcionamento delas por
meio da colocação de dreno abdominal. O controle inadequado do foco infeccioso no
momento do tratamento inicial está associado ao aumento da mortalidade mesmo com
antibioticoterapia, ressuscitação e suporte clínico otimizados.
A intervenção cirúrgica em pacientes que apresentam sepse em pós-operatório recente
de cirurgia bariátrica deve ser realizada com baixo limiar de indicação, com o objetivo de
abordagem do foco infeccioso, controle da fístula, colocação de drenos percutâneos e acesso
à via de alimentação parenteral ou enteral, por meio de sonda nasoenteral ou gastrostomia
(quando tecnicamente factível) [5].
O debridamento de tecido necrótico, a remoção de contaminação grosseira - seja por
material fecal ou resíduos alimentares -, a evacuação de hematomas e a retirada de corpos
estranhos são essenciais para o controle do foco infeccioso. A remoção de áreas de fibrina
permanece controversa, pois não existem estudos que suportem seu possível benefício
clínico para a evolução do paciente.
A escolha da via de acesso abdominal irá depender da condição clínica do paciente,
dos recursos disponíveis na urgência e da habilidade e do treinamento do cirurgião. Uma
laparoscopia inadequada quanto ao controle do foco infeccioso pode ser mais prejudicial
ao paciente do que uma laparotomia bem realizada.
Cuidados pós-operatórios
O pós-operatório de pacientes obesos pós-bariátrica com sepse abdominal deve ser
conduzido preferencialmente em ambiente de terapia intensiva. É importante reavaliar a
condição volêmica, a resolução ou a persistência dos sinais de sepse, assim como observar
o desenvolvimento de falência de órgãos ou dos sistemas. A cobertura antimicrobiana de
amplo espectro deve ser mantida sem interrupção, durante o período de tempo adequado,
geralmente não menor que 10 dias.
As condições clínicas do paciente devem melhorar significativa e progressivamente nas
primeiras 24-72 horas do tratamento inicial, conforme evidenciado pela resolução dos sinais
e dos sintomas de infecção e da melhora de parâmetros laboratoriais, como leucograma e
PCR (proteína C reativa), bem como da mobilização do líquido intersticial, com redução
do edema. Embora períodos de recuperação mais prolongados possam ser observados em
pacientes com disfunção significativa de múltiplos sistemas orgânicos, o prolongamento
255 ABLS Brasil
do tempo de melhora clínica e laboratorial deve levar à busca ativa por um foco infeccioso
intraperitoneal persistente ou recorrente, ou de um novo foco extra peritoneal.
No caso de persistência do foco abdominal, uma reabordagem cirúrgica deve ser
considerada precocemente, com lavagem exaustiva da cavidade peritoneal e com reposi-
cionamento de drenos para controlar possíveis coleções.
Considerações finais
Pacientes bariátricos com sepse abdominal representam um grande desafio para
equipes médicas assistentes em emergência, sobretudo no período pós-operatório mais
precoce, quando ainda estão obesos. Médicos emergencistas e cirurgiões gerais devem
ter conhecimentos básicos da fisiopatologia da obesidade e das principais complicações
infecciosas relacionadas às mais diversas técnicas de cirurgia bariátrica. Uma abordagem
rápida, com ressuscitação volêmica adequada, com medidas de suporte clínico, com uso
precoce de antimicrobianos e, subsequentemente, com controle do foco infeccioso são
essenciais para a redução da resposta inflamatória ao estresse infeccioso, pois melhoram
consideravelmente o prognóstico. Indivíduos obesos pós-bariátrica com sepse abdominal
têm uma janela estreita de oportunidade. Decisões rápidas e adequadas podem fazer toda
a diferença no resultado final.
256 ABLS Brasil
DICAS
▶ Diagnóstico precoce e ação rápida na suspeita de sepse. Não
esperar grande sinais abdominais em pacientes obesos. Atentar para o
aumento da frequência cardíaca;
▶ Colher histórico clínico da técnica cirúrgica realizada e do
tempo de pós-operatório (mesmo durante a reanimação do paciente),
com o objetivo de direcionar para possíveis complicações infecciosas.
As fístulas são as mais comuns; requerem conduta rápida;
▶ Acesso venoso e hidratação com cristaloides (30 ml/kg) na
primeira hora;
▶ Iniciar antibióticos de amplo espectro de forma precoce em
dose plena;
▶ Colher culturas para antibiograma e dosar lactato sérico (ape-
nas se possível, antes dos antimicrobianos);
▶ Iniciar vasopressores (noradrenalina) em pacientes hipotensos
durante ou após a reposição volêmica para manter PAM > 65mmHg
ou PAS > 90mmHg;
▶ Realizar exames complementares de imagem, de preferência
tomografia abdominal, para direcionar a conduta cirúrgica;
▶ Controle cirúrgico do foco infecioso de forma precoce, por
laparoscopia ou laparotomia, de acordo com a experiência do cirurgião.
Mas lembre-se, o controle do foco infeccioso de forma precoce e eficien-
te é o que vai fazer a diferença na evolução do paciente, independente
da via de acesso utilizada;
▶ Após a cirurgia, o paciente deve ser conduzido preferencial-
mente em regime de terapia intensiva, com reavaliação contínua dos
parâmetros clínicos de sepse.
257 ABLS Brasil
Referências
1. Simpson A, Kobayashi L, Coimbra R. Classifications and Principals of Treatment. In: Sar-
telli M, Bassetti M, Martin-Loeches I, editors. Abdominal Sepsis: A Multidisciplinary Approach.
Springer International Publishing AG; 2018. p. 1-14.
2. Helling TS, Willoughby TL, Maxfield DM, Ryan P. Determinants of the need for intensive
care and prolonged mechanical ventilation in patients undergoing bariatric surgery. Obes Surg.
2004;14(8):1036-41. doi: 10.1381/0960892041975488.
3. Schmidt G, Mandel J. Evaluation and management of suspected sepsis and septic shock in
adults. In: UpTodate. 2021. https://www.uptodate.com/contents/evaluation-and-management-of-
-suspected-sepsis-and-septic-shock-in-adults. Acessado em 12 janeiro 2021.
4. Terra F, Terumi M, Bottura G, Geise B, Câmara N, Latancia M. A relação entre duas sín-
dromes pró-inflamatórias da atualidade: sepse e obesidade. Rev Med (São Paulo). 2014;93(2):69-77.
5. Bindal V, Sudan R. Intensive Care Management, Sepsis, and Systemic Inflammatory Res-
ponse Syndrome in the Bariatric Patient. Bariatric Times. 2015;12(1):10-4.
6. Rhodes A, Phillips G, Beale R, et al. The Surviving Sepsis Campaign bundles and outcome:
results from the International Multicentre Prevalence Study on Sepsis (the IMPreSS study). Intensive
Care Med. 2015;41(9):1620-1628.
7. Rhodes A, Phillips G, Beale R, Cecconi M, Chiche JD, De Backer D, et al. The Surviving Sep-
sis Campaign bundles and outcome: results from the International Multicentre Prevalence Study on
Sepsis (the IMPreSS study). Intensive Care Med. 2015;41(9):1620-8. doi: 10.1007/s00134-015-3906-y.
8. Kalil A, Cawcutt K. Sepse em adultos [internet]. BMJ Best Practice; 2018. [acessado em
12 de janeiro de 2022]. Disponível em: https://bestpractice.bmj.com/topics/pt-br/245. Atualizado
em 03-12-2020.
CAPÍTULO 24
Introdução
A maior parte dos pacientes submetidos à cirurgia bariátrica é composta por mu-
lheres, muitas em idade reprodutiva. Sendo assim, espera-se que o número de gestantes já
submetidas a esse procedimento aumente no futuro.
Embora a perda de peso significativa e sustentada seja a principal vantagem da
cirurgia bariátrica, outros resultados positivos incluem a melhora da fertilidade. Como
consequência, o número de gestantes com cirurgia bariátrica prévia está aumentando e
o risco de complicações durante a gravidez não é desprezível. O manejo dessas possíveis
complicações requer bastante atenção.
O bypass gástrico em Y-de-Roux (BGYR) ainda é o procedimento bariátrico mais
executado no Brasil; portanto, é responsável pela maior parte de complicações em gestantes
bariátricas. Isso ocorre devido ao maior risco de ocorrência de hérnias internas, que pode
chegar a 10% em gestantes. O surgimento dessa complicação durante a gestação acrescenta
desafio diagnóstico e aumenta o risco de transtornos ao binômio materno-fetal.
Apresentação clínica
A apresentação clínica mais comum de HI em gestantes que foram submetidas ao
bypass gástrico é a de uma mulher com idade gestacional entre o segundo e o terceiro
trimestre. Essa gestante chega ao pronto-socorro com dor abdominal, muitas vezes inter-
mitente e pós-prandial, no epigástrio, quadrante superior esquerdo e com irradiação pra
região dorsal. Entretanto, na maior parte das vezes, os sinais e sintomas tendem a ser mais
inespecíficos. O feto em desenvolvimento e as mudanças fisiológicas da gravidez podem
mascarar o diagnóstico e atrasar a intervenção, gerando consequências deletérias para a
mãe e para o feto.
Nesses quadros de HI em gestantes, a ocorrência de vômitos não é comum, porque
há poucas secreções gástricas ou enterais da bolsa gástrica proximal ou da alça alimentar.
Além disso, a herniação do segmento intestinal excluso ao trânsito alimentar não provoca
vômitos precocemente. Nos casos em que náuseas e vômitos estão presentes, diferenciar
HI de hiperemese gravídica também pode ser um desafio [1,2].
Sinais e sintomas tardios incluem indícios de irritação peritoneal (peritonite), taqui-
cardia, acidose e sepse, o que significa quadros avançados com possível comprometimento
vascular do intestino.
262 ABLS Brasil
Diagnóstico
O grande desafio diagnóstico nessas pacientes encontra-se no fato de que os sinais,
sintomas e exames complementares podem ser inespecíficos e não conclusivos. Uma anam-
nese completa é fundamental para o diagnóstico de HI. Por vezes, pacientes que chegam
com dor abdominal difusa são “esquecidas” quanto às suas cirurgias prévias, pois o foco é
dado apenas nas causas ginecológicas e obstétricas, o que muitas vezes gera diagnósticos
imprecisos. No caso de histórico positivo de cirurgia bariátrica, é importante conhecer qual
foi o procedimento executado, pois nem todas as técnicas de cirurgia bariátrica podem
levar a HI. Hérnias internas são passíveis de ocorrer em técnicas bariátricas com bypass
intestinal, mais comumente no bypass gástrico, mas não ocorrem em técnicas exclusiva-
mente gástricas, como a gastrectomia vertical (sleeve). Na dúvida sobre qual técnica foi
realizada, alguns pacientes dispõem de um app chamado Barilife®, com informações sobre
qual procedimento foi realizado e, também, sobre o médico cirurgião que a realizou.
Exames laboratoriais fornecem pouca ajuda no diagnóstico diferencial. A ultrassono-
grafia abdominal é limitada no que diz respeito à avaliação de abdome agudo obstrutivo;
a tomografia de abdome, normalmente o exame de escolha nas suspeitas de HI, é menos
utilizada, dado o receio de expor o feto à radiação [4]. Portanto, manter um alto nível de
suspeição clínica é essencial para garantir o diagnóstico e o tratamento precoces e para
evitar complicações mais severas.
A tomografia computadorizada (TC) pode ser usada em pacientes grávidas, mas os
achados podem ser de difícil interpretação devido ao deslocamento cefálico do intestino
delgado. A TC, apesar de ser o exame radiológico preferido no cenário agudo de HI, só traz
resultados positivos em cerca de 50% dos casos [4,5]. Sendo assim, em casos de suspeita de HI,
nem a TC de abdome nem outras modalidades de imagem podem rejeitar com segurança o
diagnóstico; na verdade, em algumas situações, elas podem atrasar a intervenção cirúrgica.
A TC, quando realizada na avaliação de dor abdominal após o bypass gástrico, pode
apresentar o sinal do turbilhão mesentérico e/ou a distensão do estômago excluso como
únicas alterações radiológicas nos quadros de HI. Por outro lado, os sinais radiológicos
menos sensíveis da hérnia de Petersen são: deslocamento da anastomose jejuno-jejunal,
engurgitamento dos vasos mesentéricos e sinais secundários de obstrução intestinal e
edema intestinal.
263 ABLS Brasil
Considerações finais
Embora não seja uma condição rara, o diagnóstico de hérnia interna em gestantes
bariátricas é, frequentemente, um grande desafio. É importante lembrar que existe risco
de HI em todas as gestantes que foram submetidas ao bypass gástrico e que apresentam
sintomas de dor abdominal e/ou de náuseas. Apesar dos sintomas serem inespecíficos,
essa complicação deve sempre estar entre os diagnósticos diferenciais. O diagnóstico e o
tratamento precoces podem evitar ressecções intestinais, quadros sépticos e repercussões
deletérias para a mãe e para o feto.
265 ABLS Brasil
DICAS
▶ A hérnia interna é uma importante causa de dor abdominal
e de obstrução intestinal em gestantes submetidas ao bypass gástrico;
▶ Anamnese sobre a cirurgia e sobre a técnica bariátrica é funda-
mental. Não existe hérnia interna em pacientes submetidos ao sleeve,
pois nessa técnica não são criados espaços mesentéricos, pois o intestino
delgado não é manipulado nesse tipo de cirurgia;
▶ A apresentação clínica mais comum é em pacientes gestantes
entre o segundo e o terceiro trimestre;
▶ Sinais e sintomas tendem a ser inespecíficos, mas, caracteristi-
camente, uma dor abdominal intermitente e pós-prandial, no epigástrio,
quadrante superior esquerdo e com irradiação pra região dorsal deve
alertar o emergencista para o possível diagnóstico de hérnia interna;
▶ Apesar das limitações do uso em gestantes, a tomografia com-
putadorizada é o exame preferido no cenário agudo, sendo o “turbilhão
mesentérico” o sinal tomográfico mais característico;
▶ Um atraso no diagnóstico pode ser catastrófico para mãe e feto.
Na dúvida diagnóstica, não retardar a exploração cirúrgica, preferen-
cialmente pela via laparoscópica;
▶ Durante a exploração cirúrgica em gestantes submetidas ao
bypass gástrio, os espaços mesentéricos devem ser fechados com sutura
com fio inabsorvível, mesmo que hérnias internas não sejam encontra-
das no momento da cirurgia.
Referências
1. Goldberg MB, Tavakkoli A, Robinson MK. Petersen’s Hernia after Laparoscopic Rou-
x-en-Y Gastric Bypass Presenting in Second Trimester Pregnancy. JSM Gastroenterol Hepatol.
2017;5(1):1079–82.
2. Gudbrand C, Andreasen LA, Boilesen AE. Internal Hernia in Pregnant Women After
Gastric Bypass: a Retrospective Register-Based Cohort Study. Obes Surg. 2015 Dec;25(12):2257-62.
doi: 10.1007/s11695-015-1693-8.
4. Lockhart ME, Tessler FN, Canon CL, Smith JK, Larrison MC, Fineberg NS, et al. Internal
hernia after gastric bypass: sensitivity and specificity of seven CT signs with surgical correlation and
controls. AJR Am J Roentgenol. 2007 Mar;188(3):745-50. doi: 10.2214/AJR.06.0541.
6. de Bakker JK, van Namen YW, Bruin SC, de Brauw LM. Gastric bypass and abdominal pain:
think of Petersen hernia. JSLS. 2012 Apr-Jun;16(2):311-3. doi: 10.4293/108680812x13427982376581.
7. Warsza B, Richter B. Internal Hernia in Pregnant Woman after Roux-en-Y Gastric Bypass
Surgery. J Radiol Case Rep. 2018 Jan 31;12(1):9-16. doi: 10.3941/jrcr.v12i1.3257.
9. Dave DM, Clarke KO, Manicone JA, Kopelan AM, Saber AA. Internal hernias in preg-
nant females with Roux-en-Y gastric bypass: a systematic review. Surg Obes Relat Dis. 2019
Sep;15(9):1633-1640. doi: 10.1016/j.soard.2019.06.009.
11. Kannan U, Gupta R, Gilchrist BF, Kella VN. Laparoscopic management of an in-
ternal hernia in a pregnant woman with Roux-en-Y gastric bypass. BMJ Case Rep. 2018 Apr
19;2018:bcr2017221979. doi: 10.1136/bcr-2017-221979.
267 ABLS Brasil
POSFÁCIO