Unidade de Estudos 1 - Psicologias Jurídica, Forense e Judiciária: Designações

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Unidade de Estudos 1 - Psicologias

Jurídica, Forense e Judiciária:


designações

Apresentação

Os campos de atuação da Psicologia relacionada ao Direito são a Psicologia Jurídica, a Psicologia


Forense e a Psicologia Judiciária. Há diferentes atividades e maneiras de se trabalhar nessas áreas,
porém todas unificadas pela aplicação da ciência psicológica contemporânea.

Nesta Unidade de Aprendizagem, você vai conhecer a história das interfaces entre Psicologia e
Direito, suas práticas tradicionais e as atuais. Também vai fazer uma comparação entre os campos
da Psicologia Forense, em sua tradição norte-americana, e da Psicologia Jurídica, em sua tradição
brasileira.

Bons estudos.

Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

• Definir Psicologia Forense e Psicologia Jurídica.


• Identificar os fundamentos da Psicologia Forense.
• Diferenciar Psicologia Forense, Psicologia Jurídica e Psicologia judiciária.
Infográfico

A Psicologia, na interface entre as ciências sociais (sob a forma de Psicologia Social) e as naturais
(sob a forma de Psicologia Individual), é entendida como uma ciência "híbrida", entre Sociologia e
Biologia e, portanto, entre Direito e Medicina.

Neste Infográfico, você vai ver como se dão as relações entre as ciências formais e as empíricas e
entre as sociais e as naturais.
Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino!
Conteúdo do Livro

Considerada ciência experimental no final do século XIX, a Psicologia foi chamada para dar a sua
contribuição para a compreensão dos comportamentos individuais no século seguinte, apesar da
descrença inicial, especialmente por parte dos psiquiatras. Foi criticada por seu papel “rotulador” e
discriminatório, naturalizando fenômenos sociais, e foi acusada de imprecisão científica, ao
relativizar determinações biológicas do comportamento humano. Por que tudo isso aconteceu?
Para entender, é preciso resgatar a história da constituição do campo das interfaces entre
Psicologia e Ciências Jurídicas e de suas vertentes, a Psicologia Forense e a Psicologia Jurídica.

Na Obra Psicologia Jurídica, leia o capítulo Psicologias Jurídica, Forense e Judiciária: designações,
base teórica desta Unidade de Aprendizagem, em que você vai conhecer as relações entre
Psicologia e Direito, no Brasil e nos EUA, com definições dos campos, questões de cientificidade e
de Ética Profissional. Você também terá acesso a documentos importantes sobre as atuações dos
psicólogos, publicados pelo Conselho Federal de Psicologia.
PSICOLOGIA
JURÍDICA

Paulo Roberto
Grangeiro Rodrigues
Psicologias jurídica, forense
e judiciária: designações
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Definir psicologia forense e psicologia jurídica.


 Identificar os fundamentos da psicologia forense.
 Diferenciar psicologia forense, psicologia jurídica e psicologia judiciária.

Introdução
Será que a Psicologia pode contribuir para a melhor compreensão das
causas dos desvios e comportamentos antissociais e criminosos? A Me-
dicina e a Sociologia já oferecem todas as respostas para o que ocorre
no campo das contravenções e dos crimes? Será a Psicologia necessária
para a melhor decisão de juízes, promotores e jurados?
Considerada ciência experimental no final do século XIX, a Psicolo-
gia foi chamada para dar a sua contribuição para a compreensão dos
comportamentos individuais no século seguinte, apesar da descrença
inicial, especialmente por parte dos psiquiatras. Foi criticada por seu
papel “rotulador” e discriminatório, naturalizando fenômenos sociais; foi
acusada de imprecisão científica, ao relativizar determinações biológicas
do comportamento humano. Por que tudo isso aconteceu? Para entender,
é preciso resgatar a história da constituição do campo das interfaces entre
Psicologia e Ciências Jurídicas e de suas vertentes, a psicologia forense
e a psicologia jurídica.
Neste capítulo, você vai estudar a intersecção entre a Psicologia e o
Direito, áreas definidas como psicologia forense nos Estados Unidos e
psicologia jurídica no Brasil.
2 Psicologias jurídica, forense e judiciária: designações

Psicologia forense e psicologia judiciária


A Psicologia é chamada a contribuir com o Direito desde o início do século
XX, nos Estados Unidos. Lightner Witmer foi professor de Psicologia do Crime
na década de 1900. Em 1908, a obra On the Witness Stand (“no banco das
testemunhas”, em tradução livre), de Hugo Munsterberg, tornou-se um marco
nos Estados Unidos. Em 1909 William Healy fundou o Instituto Psicopático
Juvenil de Chicago para tratar e avaliar delinquentes juvenis, conforme leciona
Huss (2012). A partir de então, psicólogos americanos foram chamados a depor
como testemunhas peritas em alguns casos judiciais. Em 1962, no caso Jenkins,
o tribunal determinou que fosse reconhecido o testemunho do psicólogo, em
lugar do de médicos e psiquiatras, na avaliação da imputabilidade da respon-
sabilidade criminal. Após esse fato, ainda segundo Huss, houve uma expansão
rápida das atividades de psicólogos no sistema judiciário dos Estados Unidos,
levando à criação, em 1969, da Sociedade Americana de Psicologia Jurídica.
Ainda que a associação norte-americana tenha assumido o termo jurídica
em sua denominação, o termo forense passou a ser mais frequentemente uti-
lizado para essa prática. “Forense” refere-se a fórum, o lugar do julgamento
das questões legais e onde começou a ser aplicada a Psicologia no sistema
legal dos Estados Unidos. Por isso esse nome foi consolidado. Assim, podemos
entender que psicologia forense, nos Estados Unidos, refere-se às atividades
do psicólogo que auxiliam o sistema legal. Mas há autores americanos, como
Huss (2012), que reservam o termo psicologia forense para definir a intersec-
ção entre a psicologia clínica — exclusivamente — e o Direito, tanto na área
criminal (atos contra a sociedade) quanto na civil (atos contra o indivíduo).
Huss (2012) reconhece, no entanto, que trabalhos como análise da confiabi-
lidade de testemunhas oculares, detecção de mentiras por polígrafos, análise
do comportamento do júri e estudos sobre testemunho de crianças no tribunal
são parte da psicologia forense, ainda que sem a abordagem clínica.
Huss (2012) explica também a diferença entre psicologia forense e psicologia
correcional, que se refere a prisões, cadeias e reformatórios, não tendo relação
com tribunais. Por fim, o autor distingue a psicologia forense do que denomina
psicologia policial, que trata de perfis criminais, adequações para avaliações
de responsabilidade e negociações de reféns. No Dicionário de Psicologia da
American Psychological Association (2010), a psicologia correcional faz parte
da psicologia forense, e o termo psicologia jurídica não aparece, ainda que
tenha sido o nome escolhido pelas associações de psicólogos que trabalham
nessa área nos Estados Unidos. A partir deste ponto, começaremos a abordar
as diferenças entre os termos “forense” e “jurídica”, sendo esse último o que
predomina no Brasil.
Psicologias jurídica, forense e judiciária: designações 3

No Brasil, o termo psicologia forense se aplica de maneira semelhante ao


foco ampliado descrito acima por Huss, ou seja, relativo ao foro judicial e aos
tribunais, sem ser exclusivamente uma atuação clínica dos psicólogos. Já o
nome psicologia jurídica descreve uma área que relaciona diretamente psicó-
logos com o sistema de justiça, conforme expõe França (2004). Desse modo,
a psicologia jurídica pode ser definida como “[…] um instrumento auxiliar
no exercício da Justiça nos processos que tramitam nas Varas da Infância e
da Juventude e nas Varas de Família e Sucessões dos Foros Regionais, e nos
Tribunais de Justiça dos Estados”, nas palavras de Silva (2003, p. 49).
A história da psicologia jurídica no Brasil começou em 1940, quando o
Departamento de Serviço Social de São Paulo passou a pedir para “psicotéc-
nicos” avaliarem os menores considerados “fora da norma”; foi criado então
o termo psicologia jurídica. Também no Rio de Janeiro, em 1951, Emilio
Mira y López, psicólogo espanhol emigrado para o Brasil, publicou Le Psyco-
diagnostic Myokinetique, criando o teste psicodiagnóstico miocinético, em
que o comportamento expressivo de traçar a lápis repetições sobre padrões
impressos, sem o uso da visão, era usado para avaliar a impulsividade e a
agressividade de réus ou condenados em função dos desvios dos traçados
em relação aos padrões.
Assim como nos EUA, no Brasil a Psicologia inicialmente foi chamada a
contribuir para avaliações de casos criminais, sendo de fato forense, e com o
tempo foi se tornando jurídica. Em 1954, foi criada a Clínica de Orientação
Juvenil, na qual “psicologistas” integravam equipes ligadas aos Juizados de
Menores; já se começava a trabalhar na avaliação de inteligência e de perso-
nalidade. Em 1955, Mira y López editou no Brasil o seu Manual de Psicologia
Jurídica, segundo Rovinski (2009), consolidando as áreas de atuação e o nome
da disciplina (1967). Conforme Rovinski (2009, p. 14):

Fica claro que o foco inicial do trabalho do psicólogo [no Brasil] foi a com-
preensão da conduta humana quanto às motivações e possibilidades de reinci-
dência no crime. O uso de técnicas de mensuração, em evidência na década de
1960-70, não tinha tanto o objetivo de análise das funções mentais específicas
para avaliar o testemunho (realidade dos primórdios da Psicologia Jurídica
na Europa), mas, antes, trazer luz à dinâmica da produção do ato criminal.

É essa mesma psicologia jurídica europeia que Hugo Münsterberg havia


levado para os Estados Unidos, depois de estudar com Wilhelm Wundt na
Alemanha, a partir de seus estudos sobre sensação e memória. No Brasil,
semelhantemente, a Psicologia se desenvolveu principalmente por médicos
brasileiros que estudavam na Europa e por professores de Psicologia europeus
4 Psicologias jurídica, forense e judiciária: designações

que emigravam para cá, com a diferença de que aqui tudo ocorreu tardiamente
e com menos recursos. A Associação Brasileira de Psicologia Jurídica foi
fundada somente em 1998.

O texto de origem dos direitos declarados na Constituição do Brasil é o mesmo citado


no primeiro princípio fundamental do Código de Ética Profissional do Psicólogo: a
Declaração Universal dos Direitos Humanos, como se pode demonstrar:
Na Declaração Universal dos Direitos Humanos (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS,
1948, documento on-line):

Artigo 1. Todo os seres humanos nascem livres e iguais em dignidades


e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação
uns aos outros com espírito de fraternidade.
[...]
Artigo 3. Todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segu-
rança pessoal.

Na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (BRASIL, 1988, documento


on-line):

Art. 1º. A República Federativa do Brasil, [...] constitui-se em Estado


Democrático de Direito e tem como fundamentos:
[...]
III – a dignidade da pessoa humana; [...]
DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS [...]
Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer na-
tureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no
País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, [...].

No Código de Ética (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2005, p. 7):

I. O psicólogo baseará o seu trabalho no respeito e na promoção da


liberdade, da dignidade, da igualdade e da integridade do ser hu-
mano, apoiado nos valores que embasam a Declaração Universal dos
Direitos Humanos.

Você não concorda que, com esses princípios, é possível estabelecer uma ética em
comum entre operadores do Direito e psicólogos(as)?
Psicologias jurídica, forense e judiciária: designações 5

Os fundamentos da psicologia forense


No Brasil, a psicologia jurídica se expandiu e se consolidou a partir da regu-
lamentação da profissão de psicólogo, em 1962, por meio da Lei nº. 4119, de
27 de agosto de 1962, assinada pelo então presidente João Goulart. Já havia
práticas psicológicas nas instituições jurídicas, porém a regulamentação da
profissão permitiu maior segurança e estabilidade para esses profissionais,
já que, conforme o art. 13 da referida Lei, entre as atribuições definidas aos
psicólogos brasileiros, estão as chamadas funções privativas:
Art.13 – [...] § 1º- Constitui função privativa do Psicólogo a utilização de
métodos e técnicas psicológicas com os seguintes objetivos (BRASIL, 1962,
documento on-line):
a) diagnóstico psicológico;
b) orientação e seleção profissional;
c) orientação psicopedagógica;
d) solução de problemas de ajustamento.
Também o parágrafo segundo explicita: “É da competência do psicólogo
a colaboração em assuntos psicológicos ligados a outras ciências” (BRASIL,
1962, documento on-line).
Assim os psicólogos puderam trabalhar definitivamente no sistema judici-
ário brasileiro, realizando principalmente diagnósticos e orientações, em um
trabalho multidisciplinar. A Medicina, por meio da Psiquiatria, já trabalhava
com o sistema judiciário, e a Psicologia vem somando, com suas técnicas e
atuações. A Figura 1 representa as relações entre Psicologia, Medicina e Direito.

DIREITO

Psicologia Medicina
Jurídica Legal
Psicologia/
Psiquiatria
Forenses

PSICOLOGIA Psiquiatria
MEDICINA

Figura 1. Interações multidisciplinares: relações entre Psicologia, Direito e Medicina.


6 Psicologias jurídica, forense e judiciária: designações

Podemos perceber que a psicologia jurídica é fruto da interface entre Psico-


logia e Direito, sem haver necessariamente a interface com a Medicina. Porém,
ao analisarmos o diagrama, vemos que existe uma área central onde as três
atividades se encontram, denominada Psicologia/Psiquiatria Forenses. Nessa
área, encontramos a Psicologia em intersecção com a Medicina e o Direito
simultaneamente. Tendo como base a Psicologia, tem-se nessa área central uma
subárea da psicologia jurídica: a psicologia forense, conforme a tradição descrita
por Huss (2012), com o foco predominantemente clínico. E como distinguir a
psicologia forense da psiquiatria Forense? Huss (2012, p. 24) aponta que:

[...] os psiquiatras são licenciados para prescrever medicação e enfatizar esse


aspecto nos cuidados ao paciente. Tradicionalmente, os psicólogos não dirigem
seu foco para a administração de medicação, especificamente medicação
psicotrópica, e, em vez disso, focalizam a avaliação e o tratamento dos que
são mentalmente doentes.

O que é verdadeiro também para o Brasil.

Possíveis fontes de conflito entre o Direito e a


Psicologia
Ainda que a Psicologia seja hoje considerada indispensável para a atuação do
sistema judiciário, em todo o mundo, há possíveis dificuldades de entendimento,
podendo gerar conflitos entre os operadores do Direito e da Psicologia. Huss
(2012) descreve essas diferenças. A primeira é que a Psicologia é empírico-
-experimental, enquanto o Direito é dogmático-autoritativo. Isso significa
que, na Psicologia, as conclusões anteriores podem ser mudadas por novas
informações, enquanto, no Direito, tende-se a conservar decisões anteriores.
Outra diferença é sobre o modo como se chega à verdade: por experimen-
tação, na Psicologia, e por um “processo adversarial”, no Direito — a parte
que demonstrar melhor seus argumentos poderá ter a razão. Além disso, a
Psicologia tende a ser “nomotética”, isto é, busca leis científicas gerais sobre
o psíquico, enquanto o Direito tende a ser “ideográfico”, isto é, cuida de cada
caso individualmente. Em decorrência disso, também a Psicologia é descritiva
(o comportamento como é), enquanto o Direito é prescritivo (o comporta-
mento como deve ser). Dito de outro modo, na ciência empírica, lida-se com
fatos, enquanto nas ciências jurídicas, lida-se essencialmente com valores.
E, finalmente, a Psicologia pode admitir conclusões probabilísticas, ou seja,
não determinísticas, enquanto o Direito busca as certezas ao ter que julgar.
Psicologias jurídica, forense e judiciária: designações 7

É preciso que ambas as áreas reconheçam as possibilidades e as metas


da outra área e que não se substitua o que é próprio de cada campo com as
“certezas” do outro campo, sob o risco de se fazer uma Psicologia distorcida
servindo como cientificismo dentro do Direito, ou dogmatismos e moralismos
atuando dentro da Psicologia. Será possível superar essas origens de conflitos?
Talvez sempre se consiga quando existe uma “meta supraordenada”, ou seja,
uma meta em comum entre os dois grupos envolvidos em divergências de
interpretações e decisões. Considere a proposta de se criar a Jurisprudência
Terapêutica (JT), presente nos Estados Unidos: “o uso das ciências sociais
para estudar até que ponto uma regra ou prática legal promove o bem-estar
psicológico e físico das pessoas que ela afeta”, como explica Slobogin (1996,
p. 767 apud HUSS 2012, p. 32). Haverá a meta em comum de se produzir leis
e se praticar o Direito de formas que possam ser terapêuticas (promotoras
do bem-estar) ou impedir leis e práticas antiterapêuticas (prejudiciais ao
propiciarem a criação de transtornos psíquicos).

A Psicologia e os direitos
Na realidade brasileira, é o próprio Código de Ética Profissional do Psicólogo
que nos leva a buscar essa meta em comum com os operadores do Direito.
O Código de Ética define, em seus dois primeiros princípios fundamentais,
o seguinte:

I. O psicólogo baseará o seu trabalho no respeito e na promoção da liberdade,


da dignidade, da igualdade e da integridade do ser humano, apoiado nos valores
que embasam a Declaração Universal dos Direitos Humanos.
II. O psicólogo trabalhará visando promover a saúde e a qualidade de vida
das pessoas e das coletividades e contribuirá para a eliminação de quaisquer
formas de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2005, p. 7).

Ou seja, uma boa forma de alinhar as práticas do(a) psicólogo(a) e do(a)


agente do Direito é começar pela defesa dos direitos humanos e pela eliminação
de práticas que os desrespeitem.
8 Psicologias jurídica, forense e judiciária: designações

Cientificismo:
1. Concepção filosófica de matriz positivista que afirma a superioridade da ciência
sobre todas as outras formas de compreensão humana da realidade (religião, filosofia
metafísica, etc.), por ser a única capaz de apresentar benefícios práticos e alcançar
autêntico rigor cognitivo.
2. Tendência intelectual que preconiza a adoção do método científico, tal como é
aplicado às ciências naturais, em todas as áreas do saber e da cultura (filosofia, ciências
humanas, artes etc.)
3. Tendência a valorizar excessivamente as noções científicas, ou pretensamente
científicas, em qualquer campo da vida prática, intelectual ou moral (HOUAISS; VILLAR,
2009, p. 464).

Psicologias forense, jurídica e judiciária


O psicólogo pode atualmente atuar tanto na área criminal quanto na civil, com
relação a crimes, contravenções e atos ilícitos, no que se entende geralmente
como psicologia forense. Porém, pode atuar também em questões de contratos
pessoais, como casamentos ou sociedades empresariais em crise, além de se
voltar aos sistemas de ressocialização de jovens em conflito com a lei e adultos
no sistema prisional. Foi a partir da promulgação da Lei de Execução Penal
(Lei Federal nº. 7.210, de 11 de julho de 1984) que o psicólogo passou a ser
reconhecido legalmente pela instituição penitenciária (BRASIL, 1984). Esse
campo mais amplo é englobado pela psicologia jurídica. De uma forma geral,
podemos definir, no Brasil, que o psicólogo forense atua com a aplicação de
procedimentos para avaliar a personalidade de adultos ou adolescentes nos
processos criminais, nas varas especiais da infância e da juventude. Já o psicó-
logo jurídico atua como perito dentro dos processos civis, ou fora deles, como
assistente técnico da instituição judiciária, avaliando interações familiares
nos processos de litígio, nas varas da família e nas varas da infância. Aqui
aparece então o título de perito, que é como o sistema judiciário brasileiro
denomina os profissionais que elaboram laudos e pareceres para subsidiar
as ações dos juízes e promotores. O Quadro 1 mostra as áreas de atuação da
psicologia jurídica no Brasil.
Psicologias jurídica, forense e judiciária: designações 9

Quadro 1. Áreas de atuação da psicologia jurídica no Brasil

Áreas de atuação da psicologia jurídica

 Psicologia jurídica e o menor


 Psicologia jurídica e Direito de Família
 Psicologia jurídica e Direito Civil
 Psicologia jurídica do trabalho
 Psicologia jurídica e Direito Penal (fase processual)
 Psicologia judicial ou do testemunho
 Psicologia penitenciária (fase de execução)
 Psicologia policial e das forças armadas
 Vitimologia
 Psicologia forense da mediação (cível ou criminal)
 Formação e atendimento aos juízes e promotores

O Conselho Federal de Psicologia hoje reconhece a especiali-


dade psicologia jurídica no Brasil. Para ser reconhecido como tal,
o psicólogo deve buscar uma pós-graduação na área; aqueles
que trabalham já há muito tempo no sistema judiciário devem
demonstrar suas competências por meio de uma prova de
especialista, preparada pelo próprio CFP, para obter o título de
especialista. Para saber mais, acesse o link ou código a seguir.

https://goo.gl/G2vdtc

Psicologia jurídica ou judiciária?


E a psicologia judiciária, no que difere da psicologia jurídica? Na verdade, no
Brasil, a distinção se dá apenas pelo lugar que cada psicólogo ocupa, sendo
o psicólogo judiciário aquele que atua dentro do sistema judiciário, especifi-
camente. No entanto, as ações não se dão necessariamente só no espaço do
Fórum, podendo ser em espaços comunitários. Considere a ação da justiça
restaurativa, em que os adolescentes (ofensores e vítimas), os familiares de
ambas as partes e os facilitadores (psicólogos e assistentes sociais) se reúnem
no interior da vara de infância e juventude para a busca de empatia com as
10 Psicologias jurídica, forense e judiciária: designações

vítimas, podendo estas expressar seus sentimentos e vivências traumáticas.


Essas reuniões podem ser conduzidas também em escolas municipais, nas
quais participam também uma liderança pedagógica e os conselheiros tutelares,
sempre em busca da solução de conflitos, como explica Santos (2011).

Psicólogos brasileiros atuando em varas de execuções criminais podem participar de


projetos ou programas que busquem a reinserção social dos presos, estejam estes
cumprindo pena por crimes enquanto imputáveis ou em medida de tratamento ou
medida de segurança detentiva para os inimputáveis (não responsáveis). Conheça o
caso do Programa de Desinternação Progressiva, do Hospital de Custódia e Tratamento
Psiquiátrico II, em Franco da Rocha, desenvolvido desde 2002 por uma equipe da qual
participa Sidnei Celso Corocine, psicólogo do sistema penitenciário de São Paulo.
Ao constatar que os pacientes — permanecendo em média seis anos no Hospital
— ao serem desinternados, voltavam rapidamente à internação, por desadaptação ao
meio familiar e ao meio social, a equipe técnica resolveu promover um processo de
transição. Assim sendo, foi criado o Programa de Desinternação Progressiva, visando
“[...] à reinserção psicossocial dos pacientes com ações terapêuticas interdisciplinares, de
forma gradual”, como explica, Corocine (2006, p. 213). Inicialmente, 15 pacientes foram
avaliados em termos de periculosidade e enviados para a colônia de desinternação
progressiva (CDP) após ser comprovado que podiam executar os cuidados de si e o
asseio pessoal, ter um projeto para o futuro e reconhecer a necessidade do tratamento,
bem como buscar ajuda caso entrassem em crise. O CDP é gerido por uma equipe
onde o psicólogo interatua com o psiquiatra, o assistente social, o enfermeiro, o auxiliar
de enfermagem e a chefia de segurança.
No CDP, os pacientes podem participar das decisões sobre seu funcionamento:
ficam em quartos com quatro pacientes, no máximo; o horário foi ampliado para
entrada até as 22h; podem usar garfo e faca no refeitório; têm documentos e dinheiro;
podem acessar a enfermaria para pedir remédios. Os psicólogos e assistentes sociais
da equipe técnica acompanham o cotidiano dos pacientes, avaliando as possibilidades
da desinternação. Entram em contato com familiares ou amigos para promover a
reinserção, visando à recuperação de laços afetivos e à desmitificação da loucura
e da delinquência. Como resultado, os familiares passam a aceitar cada vez mais o
contato, até restabelecer vínculos. No entanto, eventualmente os contatos precisam
ser controlados, devido a influências negativas exercidas pelos próprios familiares,
que dificultam a independência e a melhora dos pacientes.
O personagem: Sidnei Celso Corocine, psicólogo clínico, mestre em Psicologia Escolar
e do Desenvolvimento Humano pela Universidade de São Paulo (2003). Professor
assistente da Universidade Camilo Castelo Branco, conselheiro do Comitê de Ética
em Pesquisa da Secretaria da Administração Penitenciária e psicólogo do Hospital de
Custódia e Tratamento Psiquiátrico II.
Psicologias jurídica, forense e judiciária: designações 11

AMERICAN PSYCHOLOGICAL ASSOCIATION. Dicionário de Psicologia APA. Porto Alegre:


Artmed, 2010.
BRASIL. Lei nº 4.119, de 27 de agosto de 1962. Dispõe sobre os cursos de formação em
psicologia e regulamenta a profissão de psicólogo. Brasília, DF, 1962. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1950-1969/L4119.htm>. Acesso em: 16
jul. 2018.
BRASIL. Constituição Federal de 1988. Promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponí-
vel em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.
htm>. Acesso em: 16 jul. 2018.
BRASIL. Lei nº. 7.210, de 11 de Julho de 1984: lei de execução penal. Brasília, DF, 1984.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/l7210.htm>. Acesso em:
16 jul. 2018.
CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. Código de ética profissional do psicólogo. Brasí-
lia: CFP, 2005. Disponível em: <https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2012/07/
codigo-de-etica-psicologia.pdf>. Acesso em: 16 jul. 2018.
CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. Psicologia: legislação, resoluções e recomen-
dações para a prática profissional. Brasília: CFP, 2011.
COROCINE, S. C. As possibilidades de tratamento em um hospital-presídio: o programa
de desinternação progressiva. In: SERAFIM, A. P.; BARROS, D. M.; RIGONATTI, S. P. (Org.).
Temas em psiquiatria forense e psicologia jurídica II. São Paulo: Vetor, 2006. p. 209-219.
FRANÇA, F. Reflexões sobre psicologia jurídica e seu panorama no Brasil. Psicologia
Teoria e Prática, São Paulo, v. 6, n. 1. p. 73-80, 2004.
HOUAISS, A.; VILLAR, M. S. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro:
Objetiva, 2009.
HUSS, M. T. Psicologia Forense: pesquisa, prática clínica e aplicações. Porto Alegre:
Artmed, 2012.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração Universal dos Direito Humanos.
1948. Disponível em: <https://www.unicef.org/brazil/pt/resources_10133.htm>. Acesso
em: 16 jul. 2018.
ROVINSKI, S. L. R. Psicologia jurídica no Brasil e na América Latina: dados históricos
e suas repercussões quanto à avaliação psicológica. In: ROVINSKI, S. L. R; CRUZ, R.
M. (Org.). Psicologia jurídica: perspectivas teóricas e processos de intervenção. São
Paulo: Vetor, 2009. p. 11-22.
12 Psicologias jurídica, forense e judiciária: designações

SANTOS, E. P. S. Desconstruindo a menoridade: a psicologia e a produção da categoria


menor. In: GONÇALVES, H. S.; BRANDÃO, E. P. (Org.). Psicologia jurídica no Brasil. 3. ed.
Rio de Janeiro: Nau, 2011. p. 43-72.
SILVA, D. M. P. Psicologia jurídica no processo civil brasileiro. São Paulo: Casa do Psicó-
logo, 2003.

Leituras recomendadas
GARRIDO, E.; MASIP, J.; HERRERO, C. (Coord.). Psicología jurídica. Madrid: Pearson Edu-
cación, 2006.
GONÇALVES, H. S.; BRANDÃO, E. P. (Org.). Psicologia jurídica no Brasil. 3. ed. Rio de
Janeiro: Nau, 2011.
MIRA Y LÓPEZ, E. Manual de psicologia jurídica. 2. ed. São Paulo: Impactus, 2008.
SERAFIM, A. P.; BARROS, D. M.; RIGONATTI, S. P. (Org.). Temas em psiquiatria forense e
psicologia jurídica II. São Paulo: Vetor, 2006.
TRINDADE, J. Manual de psicologia jurídica. 3. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado,
2009.
Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para
esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual
da Instituição, você encontra a obra na íntegra.
Dica do Professor

Um conceito importante da área das ciências sociais é o processo da naturalização do que é de fato
construído socialmente e que, portanto, poderia ser diferente. A naturalização nos faz entender a
sociedade e seus problemas como dados biologicamente, portanto, como imutáveis por políticas
públicas e novas práticas sociais, sustentando propostas conservadoras sobre as pessoas e as
classes sociais, ou até mesmo propondo violências como esterilização em massa ou manipulação
genética de embriões.

Na Dica do Professor, você vai ver onde são definidas as relações entre essa naturalização de
fatores sociais, os preconceitos, a exclusão e a violência.

Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar.
Exercícios

1) Na intersecção com o Direito, cria-se uma forma de Psicologia aplicada que, ainda que tenha
nomes diversos, hoje apresenta situação legalizada no Brasil e é especialidade reconhecida
pelo Conselho Federal de Psicologia. Qual nome é adotado para essa Psicologia e por quê?

A) Psicologia Forense, por ter múltiplas formas de atuação de modo a abranger os casos de
crime e atos ilícitos.

B) Psicologia Forense, por ter múltiplas formas de atuação de modo a abranger todas as áreas do
sistema judiciário.

C) Psicologia Jurídica, por ter múltiplas formas de atuação de modo a abranger todas as áreas do
sistema judiciário.

D) Psicologia Jurídica, por ter atuação apenas em áreas do sistema judiciário que exijam uma
capacitação clínica.

E) Psicologia Jurídica, por ter atuação apenas nas áreas do sistema judiciário em que o psiquiatra
está trabalhando.

2) A Psicologia Forense tem origem nos EUA e, inicialmente, trabalhou com peritos depondo
como testemunhas em casos de crimes e atos ilícitos. Qual foi a maior contribuição da
Psicologia nesses casos?

A) Os psicólogos avaliaram a veracidade dos testemunhos por meio da observação dos


comportamentos dos depoentes.

B) Os psicólogos avaliaram a composição dos júris, em comparação com as características dos


réus e das vítimas, para prevenir possíveis tendenciosidades de julgamento.

C) Os psicólogos só testemunharam porque estavam diretamente envolvidos com os réus ou


com as vítimas.

D) Os psicólogos avaliaram as personalidades dos réus, a fim de analisar seu grau de


periculosidade em função da impulsividade e da agressividade.

E) Os psicólogos avaliaram a aptidão mental dos réus, a fim de determinar a capacidade de estes
terem plena consciência do que fizeram e compreenderem as consequências de suas ações.
3) A Psicologia Jurídica desenvolveu-se, no Brasil, a partir de práticas em relação a menores de
idade, especialmente os de rua e os infratores. Em 1990, foi sancionado o Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA - Lei 8.069/90). Quais foram as principais mudanças trazidas
pelo ECA e quais as implicações para a atividade dos psicólogos em relação a crianças e
adolescentes?

A) Distinguiu-se a criança do adolescente e do adulto, com idades determinadas, e se definiu


níveis de capacidade de consciência moral e de trabalho. Assim, os psicólogos obtiveram mais
segurança para realizar seus laudos e fazer suas recomendações.

B) Deixou-se de fazer a distinção entre criança e menor e passou-se a entender a criança e o


adolescente como pessoas em desenvolvimento. Assim, o psicólogo passou a defender e
propiciar os direitos previstos no ECA, com crianças em todas as circunstâncias e varas da lei.

C) Deixou-se de fazer a distinção entre criança e menor , e passou-se a entender a criança como
um ser impedido para o trabalho. Assim, o psicólogo passou a defender e propiciar os direitos
previstos no ECA, com crianças em todas as circunstâncias e varas da lei.

D) Estabeleceu-se maior distinção entre criança e adolescente e passou-se a entender o


adolescente como um ser capaz para o trabalho aos 14 anos. Assim, o psicólogo passou a
defender e propiciar os direitos previstos no ECA, com crianças em todas as circunstâncias e
varas da lei.

E) Distinguiu-se a criança do adolescente, com idades determinadas, e se definiu níveis de


capacidade de consciência moral e de trabalho. Assim, os psicólogos obtiveram mais
segurança para realizar seus laudos e fazer suas recomendações.

4) No Brasil, temos as denominações Psicologia Jurídica e Psicologia Forense. Quais as


diferenças entre as duas áreas de atividade do psicólogo?

A) Considera-se Psicologia Jurídica aquela exclusiva dos tribunais, ao passo que a Forense está
em todas as atividades do sistema judiciário.

B) Considera-se Psicologia Forense aquela exclusiva dos tribunais, ao passo que a Jurídica está
em todas as atividades do sistema judiciário.

C) Considera-se Psicologia Forense aquela fora dos tribunais, ao passo que a Jurídica está em
atividades dentro ou fora do sistema judiciário.

D) Considera-se Psicologia Forense a psicologia clínica aplicada nos tribunais, ao passo que a
Jurídica aplica outras abordagens da área, como a psicologia social.
E) Considera-se Psicologia Jurídica a psicologia clínica aplicada nos tribunais, ao passo que a
Forense aplica outras abordagens da área, como a psicologia social.

5) Psicologia e Ciências Jurídicas, em seus fundamentos, apresentam diferenças fundamentais,


tais como a Psicologia ser descritiva e o Direito ser prescritivo. Como se pode ter uma
atuação em equipe que possa unificar os objetivos das duas áreas?

A) Tendo foco no Estatuto da Criança e do Adolescente, nos Códigos Civil e Penal e na Lei de
Execução Penal, na qual o psicólogo passou a ser reconhecido legalmente pela instituição
penitenciária.

B) Cada campo deve respeitar os limites e os objetivos do outro campo, sendo a Psicologia
auxiliar nas decisões do sistema judicial.

C) Cada campo deve contribuir conforme suas capacitações científicas e técnicas, respeitando
plenamente as atuações dos agentes.

D) Tendo foco nos Direitos Humanos, conforme instrui o Código de Ética Profissional do
Psicólogo e define a Constituição Brasileira.

E) Tendo foco na Constituição Brasileira e nos Códigos de Ética Profissional das áreas.
Na prática

Psicólogos brasileiros, atuando em Varas da Infância e Juventude, podem trabalhar em abrigos,


onde as suas tarefas são, entre outras: psicoterapias individuais ou em grupo, acompanhamento
terapêutico, reuniões clínicas, grupos operativos com cuidadores, oficinas de capacitação.Também
elaboram laudos periciais para embasamento de decisões de juízes.

Com a criação do ECA, levando em conta o fato de o adolescente ser um ser de direitos e pessoa
humana em processo de desenvolvimento, houve uma mudança de paradigma, com novas práticas
como o uso dos laudos “[...] como instrumento político de marcação de singularidade e afirmação da
diferença“ (SANTOS, 2011, p. 67).
Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino!
Saiba mais

Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor:

História e memória da Psicologia em SP


Veja como o Conselho Federal de Psicologia (CFP) e o Conselho Regional de Psicologia de São
Paulo - 6a Região (CRP SP) oferecem materiais sobre a história da Psicologia Jurídica no Brasil.
Você pode assistir a um vídeo e acessar os documentos pertinentes.

Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar.

Documento base – demandas do sistema de justiça aos


profissionais de psicologia lotados nas políticas públicas d
Veja e tenha acesso às publicações do CFP relativas às práticas e às questões éticas dos psicólogos
jurídicos.

Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar.

O trabalho do psicólogo no sistema prisional:


problematizações, ética e orientações
Leia o trabalho da Psicologia em que o sistema prisional iniciou a prática deste profissional na
interface com o Direito. Outras 158 possibilidades de contribuição, no sistema prisional do
Conselho Federal de Psicologia, surgiram em áreas do Direito, mas essa primeira e contestada
forma de intervenção ainda persiste com muitas dificuldades.
Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar.

Exame criminológico e psicologia: crise e manutenção da


disciplina carcerária
Leia este artigo, que fala sobre a Resolução 12/2011, ponto principal acerca da discussão sobre a
proibição ou não de realizar o exame criminológico.

Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar.

Referências técnicas para a atuação dos psicólogos no sistema


prisional
Leia relatórios e cartilhas deste site do Conselho Federal de Psicologia.

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Unidade de Estudos 2 - Prática
profissional: das áreas de
intervenção às competências

Apresentação

A Psicologia Jurídica, como uma especialização da psicologia no Brasil, é recente. Entretanto, a


prática já existe há muito tempo. As atividades antes realizadas de maneira informal entraram para
a formalidade à medida que essa área de conhecimento foi mostrando a sua importância.

Nesta Unidade de Aprendizagem, você vai conhecer os locais de inserção dos Psicólogos Jurídicos,
vai estudar sobre as competências técnicas necessárias a essa especialidade e também vai conhecer
o papel do psicólogo na avaliação de famílias em conflito.

Bons estudos.

Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

• Identificar os locais de inserção dos profissionais da Psicologia Jurídica.


• Relacionar as competências técnicas necessárias aos Psicólogos Jurídicos e aos operadores do
Direito, no âmbito da Psicologia Jurídica.
• Descrever as competências da Psicologia Jurídica na avaliação de famílias em conflito.
Infográfico

A Psicologia Jurídica é facilmente correlacionada ao psicodiagnóstico e à produção de perícia.


Entretanto, sua atuação é mais abrangente e o psicólogo necessita de diversas competências
técnicas para estar em consonância com o trabalho interdisciplinar desenvolvido com os
operadores do Direito.

Veja, no Infográfico, algumas das atividades relacionadas à prática da Psicologia Jurídica.


Aponte a câmera para o
código e acesse o link do
conteúdo ou clique no
código para acessar.
A vida nos presídios é caracterizada pela falta de um projeto ressocializador efetivo, retirada do
convívio social e aniquilação de subjetividades por fatores como ócio e desvalorização do indivíduo.
Considerando-se essas especificidades, no vídeo abaixo você vai conhecer atividades que o
psicólogo pode desenvolver no sistema prisional.

Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar.
Conteúdo do Livro

As relações entre Psicologia e Direito são complexas, recentes na história formal das áreas e
indissociáveis na sociedade moderna. A Psicologia Jurídica, como uma especialidade da ciência
psicológica, abrange diversas áreas de atuação, sendo as mais tradicionais relacionadas à atuação
nos fóruns e nas prisões.

No capítulo Prática profissional: das áreas de intervenção às competências, do livro Psicologia


Jurídica, base teórica desta Unidade de Aprendizagem, você vai estudar sobre a Psicologia Jurídica
como uma especialidade da psicologia no Brasil, conhecendo as diversas possibilidades de atuação
desses profissionais, bem como as competências técnicas necessárias para ser um bom profissional.
Além disso, conhecerá o trabalho dos Psicólogos Jurídicos que trabalham com avaliação de famílias
em conflito junto às Varas de Família.

Boa leitura.
PSICOLOGIA
JURÍDICA

Luciana Rydz
Pires
Prática profissional: das
áreas de intervenção
às competências
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Identificar locais de inserção para os profissionais da psicologia jurídica.


 Relacionar as competências técnicas necessárias aos psicólogos ju-
rídicos e aos operadores do Direito no âmbito da psicologia jurídica.
 Descrever as competências da psicologia jurídica na avaliação de
famílias em conflito.

Introdução
As relações entre Psicologia e Direito são complexas, recentes na história
formal das áreas e indissociáveis na sociedade moderna. A psicologia
jurídica, como uma especialidade da ciência psicológica, possui diversas
áreas de atuação, sendo as mais tradicionais relacionadas à atuação nos
fóruns e nas prisões.
Neste capítulo, você vai estudar a psicologia jurídica como uma es-
pecialidade da Psicologia relativamente recente no Brasil, conhecendo as
diversas outras possibilidades de atuação desses profissionais, bem como
as competências técnicas necessárias para ser um bom profissional. Além
disso, conhecerá o trabalho dos psicólogos jurídicos que trabalham com
a avaliação de famílias em conflito junto às Varas de Família.

Inserção dos profissionais da psicologia jurídica


A psicologia jurídica vem exercendo seu papel no Brasil e no mundo há muito
tempo de maneira informal. Historicamente, é possível identificar a emissão
de pareceres psicológicos, demandados pelos tribunais de justiça como forma
2 Prática profissional: das áreas de intervenção às competências

de auxílio na resolução de conflitos sociais, conforme explicam Afonso e


Senra (2014). Já em 1792 os Estados Unidos emitiam esses pareceres, sendo
legalizados em 1970 com a institucionalização da psicologia jurídica. Na Es-
panha, a institucionalização ocorreu em 1980, e na Alemanha, em 1955, ainda
conforme Afonso e Senra (2014). Assim, a Psicologia apareceu na interface
com o Direito a partir da demanda por pareceres psicológicos, segundo Freitas
(2009), e a partir de livros e publicações sobre o conhecimento psicológico
no julgamento de delitos.
No Brasil, a psicologia jurídica surgiu como área de conhecimento inde-
pendente dentro das universidades. O primeiro Laboratório de Psicologia da
Colônia de Psicopatas foi inaugurado no bairro Engenho de Dentro, no Rio
de Janeiro, em 1937, conforme leciona Rovinski (2009). Mais tarde, com a
tradução do livro espanhol Manual de psicologia jurídica, de Mira y Lopez,
em 1955, a Psicologia foi reafirmada como uma ciência que oferece as mesmas
garantias de seriedade e eficiência que outras disciplinas biológicas, mostrando
a importância dessa área de conhecimento para o meio jurídico. O lançamento
desse livro se tornou um marco para a psicologia jurídica, ainda de acordo
com Rovinski (2009).
Outra atividade realizada pelos psicólogos foi denominada psicologia do
testemunho. Essa atividade era realizada por meio de estudos experimentais
dos processos psicológicos, com o objetivo de verificar os relatos dos indivíduos
envolvidos em processos judiciais, conforme explica Altoé (2001). Na prática,
a atuação do psicólogo se dava por meio de exames criminológicos, perícias
e pareceres, com base no psicodiagnóstico do indivíduo.
A Psicologia foi reconhecida como profissão no Brasil apenas em 1962.
A partir daí, as atividades antes realizadas de maneira informal puderam ser
oficializadas, de maneira lenta e gradual, embora a psicologia jurídica como
especialização não existisse ainda, conforme explicam Afonso e Senra (2014).
Os primeiros registros de atuação de Psicólogos em instituições de justiça
surgiram entre as décadas de 1970 e 1980, no desenvolvimento de perícias
terceirizadas. Em 1985 ocorreu o primeiro concurso público para o cargo de
psicólogo. Posteriormente, em 1990, houve manifesto para a criação de cargo
oficial junto ao poder judiciário.
A atuação de psicólogos na área da Justiça foi determinada por meio da Lei
nº. 7.210, de 17 de julho de 1984, que prevê a atuação do psicólogo no sistema
penal brasileiro, in verbis:
Prática profissional: das áreas de intervenção às competências 3

Art. 6º A classificação será feita por comissão técnica de classificação que


elaborará o programa individualizador e acompanhará a execução que acom-
panhará a execução das penas privativas de liberdade e restritivas de direito,
devendo propor, à autoridade competente, as progressões e regressões dos
regimes, bem como as convenções.
Art. 7º A comissão técnica de classificação existente em cada estabelecimento
será presidida pelo diretor e composta, no mínimo, por dois chefes de serviço,
um psiquiatra, um psicólogo e um assistente social, quando se tratar de con-
denado à pena privativa de liberdade (BRASIL, 1984, documento on-line).

Em 1990, com a criação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA),


a partir da Lei nº. 8.069, de 13 de julho de 1990 (BRASIL, 1990), surgiu a
possibilidade de direcionamento do psicólogo a trabalhos e intervenções junto
aos adolescentes e suas famílias. Criou-se, então, uma grande demanda de
profissionais, fator que contribuiu para o crescimento dessa área de atuação,
levando, por fim, à legalização de cargos em concursos públicos e, consequen-
temente, ao aumento do número de profissionais nas instituições judiciárias,
conforme lecionam Lago et al. (2009). O ECA afirma a necessidade da presença
do psicólogo para lidar com questões específicas da área em relação à proteção
das crianças e dos adolescentes ou em relação aos adolescentes em conflito
com a lei, conforme estabelecem os arts. 87 e 150 dessa Lei (BRASIL, 1990,
documento on-line):

Art. 87 São linhas de ação da política de atendimento:


III – serviços especiais de prevenção e atendimento médico e psicossocial às
vítimas de negligência, maus tratos, exploração, abuso, crueldade e opressão.
[...]
Art. 150 Cabe ao Poder Judiciário, na elaboração de sua proposta orçamentária,
prever recursos para a manutenção de equipe interprofissional, destinada a
assessorar a Justiça da Infância e da Juventude.

Como consequência da criação do Estatuto, houve o reordenamento das


instituições de atendimento de crianças e adolescentes, com o objetivo de se
enquadrarem ao ECA. Da mesma forma, as práticas psicológicas realizadas fo-
ram modificadas para as especificidades de cada ambiente, conforme explicam
Lago et al. (2009). Assim, os adolescentes autores de atos infracionais passaram
a ser encaminhados para a Fundação de Atendimento Socioeducativo (Fase),
e as crianças e os adolescentes vítimas de violência, maus tratos e negligência
passaram a ser encaminhados para as Fundações de Proteção Especial (FPEs).
A criação do Núcleo de Atendimento à Família (NAF), em 1997, deu origem
a mais um campo de atuação de psicólogos. Nesse serviço, eles contribuem
4 Prática profissional: das áreas de intervenção às competências

de forma a oferecer a possibilidade de resolução de conflitos entre casais e


famílias, em um espaço terapêutico, conforme expõe Lago et al. (2009).
Segundo Costa et al. (2009), a atuação do psicólogo na Justiça visa a
assessorar os magistrados das varas de família, cíveis, precatórias e de com-
petência geral, realizando estudos psicossociais referentes aos processos
encaminhados e fornecendo informações, análises e pareceres que possam
subsidiar a decisão judicial. Visa também a assessorar os magistrados das
varas criminais nos processos cuja problemática gira em torno da dinâmica
familiar, também mediante a elaboração de estudos e pareceres psicossociais
que possam subsidiar as decisões judiciais. Nesse contexto, percebemos a
atuação do psicólogo no assessoramento direto ao magistrado, realizando
perícias, pareceres, relatórios ou estudos psicossociais.
Dessa forma, é preciso entender que o psicólogo, na sua atuação junto à
Justiça, não é um investigador da mente humana a serviço do sistema penal,
mas sim um profissional que pode identificar o sentido e interpretar situações
não perceptíveis ao operador do Direito. Além disso, o psicólogo precisa
estar atento às limitações dos instrumentos utilizados por ele, bem como
ao caráter situacional da avaliação realizada. Nunca se esquecendo de que
qualquer atividade de atuação do psicólogo está sob as regras do Código de
Ética Profissional do Psicólogo. Por isso, o profissional da Psicologia deve
sempre refletir sobre as implicações éticas, políticas e sociais do seu trabalho.
A psicologia jurídica e os profissionais psicólogos podem se inserir em
diversos setores. Para França (2004), os locais mais tradicionais para atuação
profissional são os fóruns e as prisões, além da atuação na mediação. O referido
autor subdividiu as áreas de inserção da psicologia jurídica em:

 psicologia jurídica e o menor;


 psicologia jurídica e o direito de família;
 psicologia jurídica e o direito civil;
 psicologia jurídica do trabalho;
 psicologia jurídica e o direito penal (fase processual);
 psicologia judicial ou do testemunho;
 psicologia penitenciária (fase de execução);
 psicologia policial e das Forças Armadas;
 vitimologia;
 mediação;
 formação e atendimento aos juízes e promotores;
 psicologia criminal;
 psicologia penitenciária ou carcerária;
Prática profissional: das áreas de intervenção às competências 5

 psicologia jurídica e as questões da infância e juventude;


 psicologia jurídica e o Ministério Público;
 psicologia jurídica e os direitos humanos;
 dano psíquico;
 psicologia jurídica e magistrados;
 proteção a testemunhas.

Cada ramo da psicologia jurídica possui determinadas práticas que são


estabelecidas pela instituição a que pertencem. Entretanto, como vimos ante-
riormente, o psicólogo sempre deve levar em consideração o Código de Ética
Profissional, que rege os princípios da atuação profissional que o Psicólogo
deve desenvolver em qualquer situação. Os psicólogos jurídicos podem realizar
atividades relacionadas à seleção e ao treinamento de pessoal, à avaliação
de desempenho e ao acompanhamento psicológico prestado a servidores,
magistrados e seus dependentes dentro das instituições judiciárias. Podem
desenvolver, também, atividades vinculadas aos juízos de primeira instância
(fóruns dos estados) e de segunda instância (tribunais de justiça dos estados).
Nos Fóruns, as principais atividades do psicólogo jurídico são as avalia-
ções psicológicas, os acompanhamentos de casos, a mediação, a elaboração
de documentos, o aconselhamento psicológico, a orientação, a fiscalização
de instituições e de programas de atendimento à demanda do Fórum e os
encaminhamentos. O psicólogo jurídico pode, ainda, realizar perícias ou
intervenções diretas, de acordo com a natureza dos casos e o momento do
atendimento realizado (podendo ser antes, durante ou após a sentença judicial).
Para atuar de maneira mais formal, o profissional deve fazer concurso público,
visando ao cargo de perito.
O psicólogo jurídico pode ainda atuar fazendo atendimentos em consultório,
fornecendo relatórios, pareceres e laudos tanto para advogados como para
juízes e assistentes técnicos. Pode também trabalhar em abrigos e ONGs, por
exemplo. Outra possibilidade de atuação como psicólogo jurídico é realizando
trabalho informal, autônomo ou ligado a organizações não governamentais,
desenvolvendo grupos de apoio, mediação familiar, trabalhos voluntários, etc.

Competências técnicas
A formação em psicologia jurídica é recente, tendo em vista que essa especiali-
dade foi regulamentada apenas no ano de 2000. Inicialmente, na Universidade
do Estado do Rio de Janeiro, essa área de conhecimento foi inserida no curso
6 Prática profissional: das áreas de intervenção às competências

de Especialização em Psicologia Clínica, por meio de uma disciplina chamada


psicodiagnóstico para fins jurídicos, conforme Freitas (2009). Essa área de
conhecimento se desenvolveu a partir da execução de atividades tradicionais
da Psicologia, como a elaboração de laudos nas varas cíveis, criminais, da
Justiça do Trabalho, da Família e da Criança e do Adolescente.
Posteriormente, a partir da Constituição de 1988 e com a criação do ECA,
a atuação da psicologia jurídica se diversificou. O papel do psicólogo jurídico,
que antes consistia na confecção de perícias técnicas e pareceres, se expandiu.
Devido a essas mudanças, a mesma universidade criou o curso de Especia-
lização em psicologia jurídica. Esse curso tinha ênfase na compreensão de
fatores psicossociais e culturais que poderiam favorecer o ato delitivo, fazendo
parte do departamento de psicologia social, conforme expõe Freitas (2009).
Essa ênfase no estudo psicossocial reflete a mudança de pensamento nas
avaliações. A palavra “estudo” oferece uma conotação mais compreensiva do
que expressões como “perícia” ou “parecer”. Além disso, o estudo de ordem
psicossocial abrange não somente os aspectos psicológico e psicopatológico,
mas também, segundo Costa et al. (2009), o reconhecimento de que as questões
mediadas no Judiciário possuem dimensões de ordem social, o que acaba por
ampliar a compreensão do juiz a respeito da configuração dos crimes e dos
conflitos.
A psicologia jurídica ainda é considerada uma disciplina opcional em
diversos cursos de Psicologia, acarretando prejuízos na formação acadêmica
e dificuldades para os profissionais que desejam atuar na área, em função do
pouco conhecimento adquirido na graduação. Dessa forma, as instituições
judiciárias precisam realizar diversas capacitações, treinamentos e reciclagens
para que esses profissionais estejam capacitados para o trabalho, conforme
explicam Lago et al. (2009). Apesar de ainda existirem barreiras quanto ao
ensino da psicologia jurídica nas graduações de Psicologia, muitos locais do
País já oferecem cursos de especialização na área.
Embora o trabalho do psicólogo jurídico seja facilmente associado ao
psicodiagnóstico e à confecção de perícias, a sua atuação é mais abrangente
e exige diversas competências técnicas para estar em consonância com o
trabalho interdisciplinar com os operadores do Direito. Tendo como base essa
interação interdisciplinar, o psicólogo jurídico pode atuar:

 nas instituições de Justiça, devendo ser capaz de realizar seleções e


treinamentos de pessoal, avaliações de desempenho e acompanhamento
psicológico de magistrados, servidores e seus dependentes;
Prática profissional: das áreas de intervenção às competências 7

 nos Fóruns, devendo realizar a elaboração de documentos, acompa-


nhamentos, aconselhamentos psicológicos, orientações, mediações,
fiscalização de instituições e de programas de atendimento à demanda
do Fórum, encaminhamentos e avaliação psicológica — para tanto,
deve conhecer a linguagem do Direito, de maneira a cumprir com seu
papel de forma mais eficaz;
 informalmente, como autônomo ou ligado a organizações não gover-
namentais, realizando a mediação nas famílias, desenvolvendo grupos
de apoio à adoção e promovendo trabalhos em organizações penais e
abrigos;
 na elaboração de perícias ou intervenções, antes, durante ou após a
sentença judicial.

Freitas (2009) leciona sobre a importância do psicólogo jurídico na asses-


soraria ao governo com relação às políticas públicas de prevenção à violência
social. Trindade (2012) também discute a interdisciplinaridade da profissão,
sugerindo a seguinte divisão para a atuação dos psicólogos jurídicos no âmbito
do Direito:

 nas questões de família, abrangendo separação, divórcio, regulamenta-


ção de visitas, guarda, adoção e, principalmente, questões relacionadas
aos problemas emocionais, como a raiva, ciúmes, o medo, o ódio, a
retaliação e a vingança de um cônjuge em relação ao outro;
 no Direito Penal, no crime como sendo o resultado grave de alteração
da conduta humana e suas motivações, sendo, muitas vezes, a expres-
são emocional na conduta que exprime o comportamento criminoso,
carregado de sentimentos conflituosos;
 nos delitos sexuais, nas personalidades perversas, na pedofilia, nos
crimes perpetrados por sádicos masoquistas e no abuso infantil;
 nas questões de inimputabilidade e responsabilidade diminuída, que
constam no Código Penal;
 nas medidas de segurança e nos procedimentos de declaração de inci-
dente de insanidade mental;
 na vitimologia, envolvendo a síndrome de Estocolmo e a revitimização;
 na realização do depoimento com redução de dano;
 no direito penitenciário, devendo o apenado ser reintegrado e
ressocializado;
 no direito da criança e do adolescente, assegurando, principalmente, o
direito à família natural, o direito à família saudável, livre de drogas e
8 Prática profissional: das áreas de intervenção às competências

outras dependências, o direito à escola e o direito à saúde, envolvendo


não só o bem-estar físico, mas o emocional e psicológico;
 na garantia dos direitos do idoso, exigindo cuidados especiais e atenção
psicológica;
 nos delitos de trânsito, envolvendo a atuação em ações em trâmite nas
varas especializadas em acidentes de trânsito ou automobilísticos, os
estudos de causa de sinistralidade e as tarefas de seleção, acompanha-
mento e reabilitação de motoristas;
 no direito civil, para tratar a capacidade da pessoa e a doação e interdição
por causa de doença mental ou psicológica;
 no processo penal, nos procedimentos de oitivas de testemunhas, ve-
racidade de depoimentos e interrogatório dos réus;
 no direito do consumidor, nas prestações de serviços médicos e na
intervenção nos casos de tratamento de saúde mental;
 na justiça terapêutica, implementada em alguns estados brasileiros;
 no direito do trabalho, abrangendo as condições emocionais dos indi-
víduos trabalhadores e o dano moral e psicológico;
 no direito do funcionário público que ficou enfermo em razão do ex-
cesso de responsabilidade ou do risco, como ocorre com professores,
policiais, etc.;
 no direito da mulher violentada ou agredida;
 no estudo da personalidade do réu, da testemunha e do jurado;
 na tarefa policial e na investigação criminal;
 nas teorias criminológicas de explicação da delinquência, da violência
e da guerra;
 no direito dos expatriados e dos grupos minoritários; e
 na psicologia criminal e política.

É preciso, cada vez mais, a capacitação dos psicólogos que tenham a in-
tenção de atuar na psicologia jurídica, para que os mesmos possam compre-
ender as razões pelas quais um juiz solicitou uma intervenção, por exemplo, e
consigam, então, emitir opiniões técnicas, impressões e dados que ainda não
haviam ficado claros a esse juiz. Trata-se da capacitação técnica do psicólogo
jurídico para atuar em parceria com os profissionais do Direito, fazendo uso
da linguagem da área e compreendendo suas especificações. A facilitação
do entendimento do juiz com relação às informações que o psicólogo deseja
transmitir é de grande relevância, já que muitas vezes laudos e pareceres são
dispensados pelos juízes devido à ineficiência da comunicação.
Prática profissional: das áreas de intervenção às competências 9

Na realização de avaliações, o processo de testagem é bastante utilizado


pelos psicólogos jurídicos. Para isso, segundo França (2004), é importante a
verificação da confiabilidade e da validade dos instrumentos que serão uti-
lizados, além de estar atento ao modelo teórico seguido, de forma a verificar
se os objetivos do procedimento foram respondidos. A entrevista também é
uma prática importante, que traz informações relevantes sobre a história do
indivíduo e as motivações que acabaram por levá-lo ao ato investigado.
A psicologia jurídica não é apenas um auxiliar na operacionalização do
Direito, mas também um campo autônomo, oferecendo resultados e discussões
pertinentes ao que acontece no âmbito judiciário, conforme defendem Afonso
e Senra (2014). Tanto o Direito como a Psicologia são áreas de conhecimento
autônomas, o que contribui para a sua interdisciplinaridade. Dessa forma, a
Psicologia traz um conhecimento complementar à prática do Direito, e vice-
-versa. Na psicologia jurídica, percebe-se claramente a relação entre a Psicologia
e o Direito. De acordo com Trindade (2012), a Psicologia é fundamental ao
Direito e essencial para a Justiça. Por isso a grande importância do trabalho de
forma interdisciplinar, de forma a se reduzir os erros judiciais que decorrem
da falta de conhecimentos relacionados à ciência psicológica.

O Conselho Federal de Psicologia oferece à categoria e à socie-


dade em geral o documento denominado Referências técnicas
para atuação do psicólogo em Varas de Família, produzido com
a metodologia do Centro de Referência Técnica em Psicolo-
gia e Políticas Públicas. Esse documento busca construir uma
referência sólida para a atuação do psicólogo na área jurídica.
Para ter acesso ao texto na íntegra, acesse o link ou código
a seguir.
https://goo.gl/rxD7Wn

Avaliação de famílias em conflito


Os psicólogos que atuam juntamente às varas de família desenvolvem trabalhos
demandados originalmente ao Judiciário, e não ao psicólogo. Porém, quando o
processo chega ao setor de Psicologia, subentende-se que aquela situação não
10 Prática profissional: das áreas de intervenção às competências

poderá ser resolvida judicialmente caso não sejam compreendidas, avaliadas


ou trabalhadas questões emocionais específicas, determinando-se, assim, o
caráter interdisciplinar do encaminhamento.
Nesse contexto, a psicologia jurídica pode atuar junto ao direito de família,
onde seu trabalho está relacionado aos processos de separação e divórcio, pater-
nidade, disputa de guarda e regulamentação de visitas, entre outros. A atuação
do psicólogo como perito, nesses casos, é designada pelo juiz. O psicólogo
jurídico pode também atuar como assistente técnico ou perito contratado por
qualquer uma das partes, a fim de acompanhar o trabalho do perito oficial.
O processo de separação e divórcio implica em um processo psicológico,
isto é, um conjunto de sentimentos, pensamentos e comportamentos que se
destinam à resolução do conflito emocional entre duas pessoas. Enquanto o
divórcio no ciclo de vida familiar consiste na separação conjugal como uma
etapa do processo de vida que acaba por incluir novos arranjos conjugais e
familiares, o divórcio destrutivo consiste na separação conjugal envolvendo
grandes disputas e expressões de violência, só podendo haver um acordo por
meio de processo judicial, conforme explica Trindade (2012).
Esse processo pode se estender a outras pessoas do círculo familiar, prin-
cipalmente aos filhos. Assim, a crise conjugal pode tomar as dimensões de
uma crise familiar, e mesmo com o término do processo judicial, o processo
psicológico pode se prolongar por muito tempo, o que somente se encerra
com a elaboração do luto, ainda conforme Trindade (2012). Na disputa dos
cônjuges, os efeitos possíveis para as crianças, nesses casos, são:

 problemas escolares, podendo a criança apresentar desinteresse, dimi-


nuição do rendimento escolar e estereótipos negativos, ocasionando
efeitos prejudiciais no âmbito emocional, social e pedagógico;
 sentimentos de abandono, uma vez que crianças menores tendem a
interpretar a ausência de um dos pais como abandono ou como motivo
para se sentirem culpadas; além disso, os pais, nessas situações, muitas
vezes reduzem o tempo de dedicação aos filhos;
 situação de impotência frente às mudanças de escola, de situação eco-
nômica, etc.

Assim, nos casos de separação e divórcio, o psicólogo pode atuar como


mediador, em caso de acordo entre o casal, ou pode realizar a avaliação de
uma das partes do casal, conforme solicitação. Na regulamentação de visitas,
Prática profissional: das áreas de intervenção às competências 11

o psicólogo pode atuar como mediador na família, ou fazer uma avaliação da


família, de forma a informar ao juiz a dinâmica familiar e sugerir medidas a
serem tomadas. Em relação à disputa de guarda, pode ser solicitada perícia
psicológica para avaliação do melhor genitor, isto é, aquele que tem as me-
lhores condições de exercer esse papel, conforme lecionam Lago et al. (2009).
É importante ressaltar que alguns assuntos, como guarda compartilhada,
falsas acusações de abuso sexual e síndrome de alienação parental, podem
estar envolvidos no processo, sendo fundamental o amplo conhecimento dos
psicólogos para uma perícia adequada.
A psicologia jurídica pode atuar também junto às questões relacionadas à
infância e à juventude. Aqui, o psicólogo atua junto aos processos de destituição
ou suspensão do poder familiar, guarda, disputa, habilitação para adoção,
apuração do ato infracional, acompanhamento de medidas socioeducativas de
liberdade assistida e de prestação de serviços à comunidade (em adolescentes
que cometeram algum tipo de ato infracional), acompanhamento de medidas
socioeducativas em relação à proteção, e atendimento de crianças e adolescentes
vítimas de situações de violência, ainda de acordo com Lago et al. (2009).
O psicólogo também pode estar inserido nas FPEs, de forma a oferecer
cuidados capazes de diminuir os efeitos da institucionalização, proporcionando
assim uma vivência que se aproxime à realidade familiar. Quando existe a ne-
cessidade de destituição do poder familiar, o psicólogo tem papel fundamental
na hora de considerar a decisão de separar uma criança de sua família. Os casos
em que é possível a destituição do poder familiar decorrem de negligência,
abandono, maus-tratos, abuso sexual, ineficiência ou morte dos pais.
Em relação aos adolescentes autores de atos infracionais, o papel do psi-
cólogo tem como objetivo propiciar condições de superação da sua condição
de exclusão, bem como a formação de valores positivos de participação na
vida social. O psicólogo jurídico deve sempre ter como princípio envolver a
família e a comunidade em atividades que propiciem a não discriminação e
a não estigmatização.
12 Prática profissional: das áreas de intervenção às competências

1. A participação do psicólogo nas a) Pode realizar perícias apenas


decisões judiciais nas varas de antes da sentença judicial.
família se dá por meio de perícias b) Pode realizar trabalhos
técnicas, que correspondem informais autônomos ou
ao procedimento de avaliação ligados a organizações
psicológica realizado no âmbito da não governamentais.
Justiça, principalmente nos Fóruns, c) No direito tributário, trabalha
já que resulta de uma determinação: com questões relacionadas a
a) do casal parental, nesse caso, visitas, à guarda e a adoções.
os responsáveis pela criança d) Na vitimologia, com a
que desejam um consenso. reintegração e ressocialização
b) de uma autoridade judicial, do apenado.
nesse caso, o juiz, tendo como e) No direito do trabalho, a
objetivo subsidiar as decisões. atividade do psicólogo engloba
c) de uma assistente social, principalmente o crime –
objetivando esclarecer resultado de grave de alteração
a competência parental, da conduta humana, bem
em todos os casos. como com suas motivações.
d) do advogado, para que 4. A atuação do psicólogo no
possa orientar sua decisão. contexto forense pode ter alguma
e) do promotor, que necessita alteração, dependendo de como
deliberar sobre o caso, como ele se posiciona na arena jurídica,
autoridade competente e quando o foco de seu trabalho é
máxima, se a família não dissolve a avaliação psicológica nas varas
o conflito por si mesma. de família. Qual das alternativas
2. Nas varas de família, há um crescente melhor descreveria o papel do
esforço para que os casais resolvam psicólogo como perito oficial?
seus conflitos por meio de: a) A maior contribuição do perito
a) mediação. será em relatar o que viu e
b) aconselhamento psicológico. ouviu, evitando a interferência
c) coaching conjugal. de seu conhecimento técnico.
d) ações em juizados de b) O perito deve atender os
pequenas causas. interesses de uma das partes,
e) acordos entre advogados. trabalhando com isenção
3. Sobre a atuação do psicólogo como e seguindo os referenciais
perito nos diversos contextos da técnicos e éticos.
ambiência jurídica, a partir das c) O perito trabalha no sentido
informações constantes no capítulo, de trazer a "verdade" que
indique a alternativa correta. interessa ao seu cliente.
Prática profissional: das áreas de intervenção às competências 13

d) É o perito que determina ao juiz para com os filhos não se


qual o melhor encaminhamento configura como violência.
para o desfecho do caso. c) a figura paterna não é mais forte,
e) O perito apresenta as opiniões tendo em vista que não existe
e previsões de forma imparcial mais a submissão da mulher
e neutra, discriminando os e dos filhos ao marido/pai.
fatores psicológicos em jogo, d) no interior da família existem
sem adentrar no julgamento muitas outras formas de violência
da questão legal. além da física e sexual, como
5. Sobre violência na família, o abandono, a negligência e
é correto afirmar que: a violência psicológica, isto é,
a) quando se fala em violência condições que comprometem
familiar, podemos dizer que o desenvolvimento saudável
estamos falando de violência da criança e do jovem.
física e sexual, exclusivamente. e) a maioria dos casos de
b) a falta de cuidados, alimentação violência doméstica são
e segurança dos pais ocasionados por padrastos ou
por pessoas de fora de casa.
14 Prática profissional: das áreas de intervenção às competências

AFONSO, L. A.; SENRA, L. X. Panorama histórico da regulamentação da especialização em


Psicologia Jurídica no Brasil. Psicologia.PT. Portal dos Psicólogos, 2014.
ALTOÉ, S. Atualidade da Psicologia Jurídica. Revista de Pesquisadores da Psicologia no
Brasil Psibrasil, Juiz de Fora, ano 1, nº 2, jul./dez. 2001.
BRASIL. Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984: institui a Lei de Execução Penal. Brasília, DF,
1984. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/l7210.htm>. Acesso
em: 28 jul. 2018.
BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do
Adolescente e dá outras providências. Brasília, DF, 1990. Disponível em: <http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/l8069.htm>. Acesso em: 28 jul. 2018.
COSTA, L. F. et al. O. As competências da psicologia jurídica na avaliação psicossocial de
famílias em conflito. Psicologia & Sociedade, Florianópolis, v. 21, nº 2, p. 233–241, ago. 2009.
FRANÇA, F. Reflexões sobre a psicologia jurídica e seu panorama no Brasil. Psicologia:
Teoria e Prática, São Paulo, v. 6, nº 1, p. 73–80, 2004.
FREITAS, M. A. Psicologia jurídica e psicologia forense: aproximações e distinções.
Revista de Psicoanálisis y Estudios Culturales, v. 10, p. 1–5, 2009.
LAGO, V. M. et al. Um breve histórico de psicologia jurídica no Brasil e seus campos
de atuação. Estudos de Psicologia, Campinas, v. 26, nº 4, p. 483–491, out./dez. 2009.
ROVINSKI, S. L. R. Psicologia jurídica no Brasil e na América Latina: dados históricos e
suas repercussões quanto à avaliação psicológica. In: ROVINSKI, S. L. R.; CRUZ, R. M.
(Org.). Psicologia jurídica: perspectivas teóricas e processos de intervenção. São Paulo:
Vetor, 2009. p. 11-22.
TRINDADE, J. Manual de psicologia jurídica para operadores de direito. 6. ed. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2012.
Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para
esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual
da Instituição, você encontra a obra na íntegra.
Conteúdo:
Dica do Professor

A separação, ou o divórcio, é uma alternativa para casais que não estão satisfeitos nos seus
relacionamentos. Entretanto, a separação se torna complexa quando envolve filhos menores de
idade, tendo em vista que haverá novos arranjos e reorganização familiar. Trata-se de uma etapa
muito importante, pois, dependendo do acordo familiar a respeito da guarda dos filhos, poderá
favorecer o fortalecimento de vínculos, mesmo que seus membros tenham certa perda de
convivência diária.

Nesta Dica do Professor, aprenda um pouco sobre a guarda compartilhada. Complemente o seu
conhecimento e veja quais mudanças ocorreram com a nova lei e qual o papel do Psicólogo nesse
contexto.

Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar.
Exercícios

1) Como você já sabe, a atuação do psicólogo nas decisões judiciais, nas Varas de Família, se dá
por meio da realização de perícias técnicas. Essas decisões resultam da determinação de
quem?

A) Do casal parental, em casos em que os responsáveis pelo menor desejam um consenso.

B) Da autoridade judicial, o juiz, de maneira a subsidiar suas decisões.

C) Da assistente social, a fim de conhecer qual o melhor cônjuge para ficar com o menor.

D) Do advogado, para que possa orientar sua maneira de atuação no caso.

E) Do promotor, para decidir sobre o caso, como autoridade competente e máxima.

2) As separações entre casais podem desencadear situações conflituosas, podendo prejudicar a


relação conjugal e afetar, principalmente, os filhos. Nesse contexto, as Varas de Família, nos
últimos anos, priorizam que os casais resolvam seus conflitos de que maneira?

A) Por meio da mediação.

B) Com aconselhamento psicológico.

C) Por meio de coaching conjugal.

D) Realizando ações em juizados de pequenas causas.

E) Fazendo acordos entre seus advogados.

3) Sobre a atuação do psicólogo como perito, nos diversos contextos da ambiência jurídica,
indique a alternativa correta:

A) Pode realizar perícias apenas antes da sentença judicial.

B) Pode realizar trabalhos informais autônomos ou ligados a organizações não governamentais.

C) No Direito Tributário, trabalha com questões relacionadas a visitas, à guarda e a adoções.


D) Na Vitimologia, com a reintegração e ressocialização do apenado.

E) No Direito do Trabalho, a atividade do psicólogo engloba, principalmente, o crime – resultado


grave de alteração da conduta humana —, bem como suas motivações.

4) Apesar de a atuação do psicólogo no contexto forense não ter grande variação de


atividades, tendo em vista que seu foco de trabalho é a avaliação psicológica, indique qual
das alternativas descreve melhor o papel desse profissional como perito oficial.

A) Relatar o que viu e ouviu, evitando a interferência de seu conhecimento técnico.

B) Atender aos interesses de uma das partes, trabalhando com isenção e seguindo os
referenciais técnicos e éticos.

C) Trazer a "verdade" que interessa ao seu cliente.

D) Determinar ao juiz qual o melhor encaminhamento para o desfecho do caso.

E) Apresentar as opiniões e previsões de forma imparcial e neutra, discriminando os fatores


psicológicos em jogo, sem adentrar no julgamento da questão legal.

5) Sobre violência na família, é correto afirmar:

A) Quando se fala em violência familiar, podemos dizer que estamos falando sobre a violência
física e sexual, exclusivamente.

B) A falta de cuidados, alimentação e segurança dos pais para com os filhos não se configura
como violência.

C) A figura paterna não é mais forte, tendo em vista que não existe mais a submissão da mulher
e dos filhos ao marido/pai.

D) No interior da família existem muitas outras formas de violência além da física e sexual. Há o
abandono, a negligência, a violência psicológica, isto é, condições que comprometem o
desenvolvimento saudável da criança e do jovem.

E) A maioria dos casos de violência doméstica é ocasionada por padrastos ou por pessoas de
fora de casa.
Na prática

Quando a separação envolve filhos menores, a definição sobre a guarda destes é considerada um
momento importante para todo o sistema familiar, junto aos novos arranjos e reorganização da
família. Atualmente, a guarda compartilhada é o regime de guarda preferencial em casos de pais e
mães que não morem na mesma casa. Para alcançar esse objetivo, muitas vezes o psicólogo exerce
papel fundamental, de forma a conseguir mediar esse novo arranjo familiar.

Conheça, a seguir, o caso de Rafael e Cecília, que estão vivenciando esse momento durante a sua
separação.
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Saiba mais

Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor:

Referências técnicas para atuação do psicólogo em Varas de


Família
O Conselho Federal de Psicologia (CFP) oferece à categoria, e à sociedade em geral, o documento
de referência para atuação do psicólogo em Vara de Família. Produzido com a metodologia do
Centro de Referência Técnica em Psicologia e Políticas Públicas (Crepop), esse documento busca
construir referência sólida para a atuação da Psicologia na área.

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Matilda (1996)
Assista ao filme MATILDA e reflita sobre as questões de negligência familiar. “Crianças deveriam
ser invisíveis. Deviam ser guardadas dentro de caixas, como grampos de cabelo e botões. Não
consigo entender porque as crianças tem que demorar tanto para crescer. Acho que elas fazem isso
de propósito.” O que podemos esperar de uma criança que cresce entre adultos que pensam assim?
A sorte da menina Matilda era ser superdotada. Nascida em uma família fútil, Matilda cresceu e
alfabetizou-se sozinha.

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A Defensoria Pública e os cuidados em uma Relação de


Cuidado
A Defensoria Pública ocupa lugar em processos judiciais de destituição do poder familiar, atuando
majoritariamente em favor dos pais de famílias pobres. O psicólogo que, na Defensoria, atua em
processos judiciais, é chamado de assistente técnico. O objetivo do presente artigo é discutir
concepções pertinentes à atuação do psicólogo na Defensoria a partir do lugar processual do
assistente técnico, especialmente compreendido dentro das políticas públicas que trabalham com
famílias necessitadas nos termos da lei.

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Unidade de Estudos 3 - Interfaces
com outras ciências e atuação
interdisciplinar

Apresentação

Seja bem-vindo!

A partir da complexidade dos seres humanos e das relações que estes estabelecem ao longo da vida
e do conjunto de normas e leis que regulam as interações em sociedade, emerge a necessidade de
um campo de trabalho interdisciplinar entre a Psicologia e o Direito. Da necessidade de
compreender os seres humanos, como eles agem e sua relação com a justiça, surge a psicologia
jurídica, englobando diferentes áreas de atuação.

Nesta Unidade de Aprendizagem, você irá estudar a interface entre a Psicologia e o Direito,
conhecendo os diferentes campos de atuação do psicólogo jurídico e do trabalho interdisciplinar
por ele realizado.

Bons estudos.

Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

• Descrever a psicologia jurídica a partir da interface entre a Psicologia e o Direito.


• Elencar diferentes campos de atuação da psicologia jurídica no Brasil.
• Relacionar a atuação dos psicólogos jurídicos e dos operadores do Direito no âmbito da
interdisciplinaridade.
Infográfico

A atuação de psicólogos na área da psicologia jurídica teve o seu início a partir do reconhecimento
da Psicologia como profissão, na década de 60. O trabalho do psicólogo na interface com a justiça
ocorreu de maneira gradual, muitas vezes de maneira informal, por meio de trabalhos voluntários.
O título de especialista em psicologia jurídica, concedido pelo Conselho Federal de Psicologia,
atesta o reconhecimento da atuação profissional do psicólogo na interface com a justiça.

Neste Infográfico, você irá conhecer melhor as diferentes atividades relativas à atuação profissional
do psicólogo jurídico no Brasil, conforme a Classificação Brasileira de Ocupações (CBO).
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Conteúdo do Livro

Apesar de o Direito e a Psicologia terem objetos de estudos distintos, em certo ponto podem se
entrelaçar. Desse modo, emerge a importância de pensarmos no trabalho interdisciplinar a partir
das lentes teóricas dessas duas ciências.

Para saber mais sobre esse assunto, leia o capítulo Interdisciplinaridade: teoria e campo de atuação,
da obra Psicologia jurídica. Neste capítulo, você vai estudar sobre a Psicologia e sua interface com o
Direito. Além disso, vai poder conhecer as diferentes áreas de atuação do psicólogo no Brasil, já
que a psicologia jurídica é uma especialidade com ampla gama de ramificações. E, por fim, terá a
possibilidade de conhecer as diferentes atividades que o psicólogo jurídico realiza no exercício de
sua profissão.

Boa leitura.
PSICOLOGIA
JURÍDICA

Luciana Rydz
Pires
Interdisciplinaridade:
teoria e campo de atuação
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Descrever a psicologia jurídica a partir da interface entre a Psicologia


e o Direito.
 Elencar diferentes campos de atuação da psicologia jurídica no Brasil.
 Relacionar a atuação dos psicólogos jurídicos e dos operadores do
Direito no âmbito da interdisciplinaridade.

Introdução
Apesar de o Direito e a Psicologia terem objetos de estudos distintos,
em certo ponto podem se entrelaçar. Desse modo, é muito importante
pensarmos no trabalho interdisciplinar a partir das lentes teóricas dessas
duas ciências. Da complexidade dos seres humanos e das relações que
estabelecem ao longo da sua vida, bem como do conjunto de normas
e leis que regulam as interações em sociedade, surge a necessidade de
um campo de trabalho interdisciplinar entre a Psicologia e o Direito. A
psicologia jurídica advém justamente dessa necessidade de compreensão
dos seres humanos: como eles agem e sua relação com a justiça. Engloba,
assim, diferentes áreas de atuação.
Neste capítulo, você vai estudar a interface entre a Psicologia e o
Direito e vai conhecer as diferentes atividades que o psicólogo jurídico
realiza no exercício de sua profissão, bem como as diferentes áreas de
atuação do psicólogo no Brasil, já que a psicologia jurídica é uma especia-
lidade com uma ampla gama de ramificações. Por fim, você vai explorar
o trabalho interdisciplinar realizado pelo psicólogo.
2 Interdisciplinaridade: teoria e campo de atuação

A interface entre Psicologia e Direito


A psicologia jurídica é o ramo da Psicologia que mais cresceu nos últimos
anos. Ela surgiu a partir de uma demanda do Direito em relação à necessidade
de redimensionar a compreensão dos seres humanos quanto à forma que eles
agem – suas necessidades e princípios psicológicos – e à sua relação com a
justiça, conforme Silva (2013). A psicologia jurídica foi reconhecida pelo
Conselho Federal de Psicologia pela Resolução nº. 14, de 22 de dezembro de
2000 (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2000), que institui o título
profissional de especialista em psicologia jurídica e dispõe sobre as normas
e procedimentos para o seu registro.
Tanto o Direito quanto a Psicologia são áreas do conhecimento que, entre
outros objetivos, buscam a compreensão do comportamento humano. Entre-
tanto, na visão clássica, a Psicologia se volta ao mundo do ser, procurando
analisar os processos conscientes e inconscientes, individuais e sociais do
comportamento dos indivíduos, além de estabelecer uma relação de causa-
lidade. Enquanto isso, o Direito se volta ao mundo do dever ser, sendo mais
objetivo, estabelecendo relação de finalidade e procurando regulamentar e
legislar o trabalho interdisciplinar de diferentes práticas profissionais e áreas
de atuação. Assim, ainda conforme Silva (2013), a Psicologia versa sobre a
compreensão do comportamento dos indivíduos, ao passo que o Direito legisla
com base no conjunto de regras que visa a regulamentar o comportamento
dos indivíduos.
Como os seres humanos nascem em uma sociedade com um conjunto
de regras já estabelecidas, não se pode pensar em indivíduos desconectados
dessa realidade. O contrário também é verdadeiro, tendo em vista que esse
conjunto de regras foi criado pelos indivíduos que constituem essa sociedade
e podem, eventualmente, readequar essas regras. Silva (2007) aprofunda
esse conceito explicando que não é possível entender o mundo da lei sem os
modelos psicológicos que, direta ou indiretamente, o inspiram; em contra-
partida, é impossível compreender o comportamento humano, em qualquer
de seus níveis (individual ou grupal), sem compreender como a lei, enquanto
direito positivo (normatizado), constitui o self, a identidade social e mesmo a
própria configuração e organização do grupo social em que o indivíduo está
inserido (família, instituição educacional, partidos políticos, administração
territorial, etc.).
Em uma visão mais contemporânea da interface entre a Psicologia e o
Direito, Trindade (2007) diz que, para se chegar à justiça, é preciso o trabalho
em conjunto da Psicologia e do Direito, ambos trabalhando o mesmo objeto:
Interdisciplinaridade: teoria e campo de atuação 3

o homem e seu bem-estar. Para Silva (2013), a Psicologia contribuiu com a


adequada humanização do Judiciário, buscando construir o ideal de justiça,
sendo uma das demandas mais impossíveis dos indivíduos.
Na sua prática, conforme Silva (2013), a psicologia jurídica atua na descrição
e análise dos processos mentais e comportamentais dos indivíduos, utilizando
técnicas psicológicas reconhecidas, de forma a responder à demanda judicial
sem nenhum tipo de emissão de juízo de valor, seguindo os compromissos éticos
com a liberdade, a dignidade e a igualdade do ser humano. Nesse contexto, o
psicólogo coloca seus conhecimentos à disposição do juiz, assessorando-o nas
ações judiciais e trazendo uma realidade psicológica dos indivíduos de forma a
ultrapassar a literalidade da lei. Trata-se, então, de uma análise aprofundada do
contexto de vida dos indivíduos que estão inseridos nos processos judiciários.
Conforme assinala Silva (2007), essa análise inclui aspectos conscientes
e inconscientes, verbais e não verbais, autênticos e estereotipados, indivi-
dualizados e grupais, que mobilizam as condutas humanas. Dessa forma, a
psicologia jurídica pode auxiliar na compreensão dos indivíduos envolvidos
na justiça e inclusive melhorá-los, podendo, da mesma forma, compreender e
melhorar as leis e suas formas conflituosas, inclusive nas instituições jurídicas.
Já França (2004) faz uma reflexão sobre o objeto de estudo da psicologia
jurídica. Ela diz que, como a Psicologia é uma ciência relativamente nova, não
teve tempo ainda de apresentar teorias acabadas e definitivas que determinem
com precisão seu objeto de estudo. Por isso, existe uma diversidade de objetos
de estudo, como a personalidade, a identidade, o inconsciente, entre outros.
A fim de unificar esses diversos objetos de estudo, a Psicologia se baseou na
subjetividade. A subjetividade seria a síntese singular e individual que cada
pessoa vai construindo e desenvolvendo de acordo com as suas experiências,
sejam elas sociais ou culturais. Se por um lado o indivíduo pode ser considerado
único, por outro ele pode ser comparado a outros, quando os elementos que
o constituem são experienciados no campo comum da objetividade social.
Para a autora (FRANÇA, 2004), a psicologia jurídica tem como objeto de
estudo a subjetividade, entretanto, deve ir além da subjetividade em si: deve
igualmente ter como objeto de estudo as consequências das ações jurídicas
sobre os indivíduos.
Para Foucault (1987), as práticas jurídicas e judiciárias são importantes
na determinação da subjetividade, já que por meio dessas práticas é possí-
vel o estabelecimento de relações entre os indivíduos. Essas práticas, sendo
submissas ao Estado, passam a interferir e a determinar as relações humanas
e, por esse motivo, acabam por determinar a subjetividade dos indivíduos.
4 Interdisciplinaridade: teoria e campo de atuação

A interface entre a Psicologia e o Direito exige uma constante reflexão e


problematização crítica. Segundo Brunini (2016), isso ocorre porque se exige da
psicologia jurídica uma ação mais alinhada ao conjunto de normas obrigatórias,
no que se refere aos recursos teóricos científicos contemporâneos, não devendo
ter uma relação simplista. À Psicologia não cabe o papel de auxílio do julgar,
condenar ou produzir provas, mas de indicar a situação dos envolvidos no
processo jurídico, que norteará a atuação do advogado, do promotor e do juiz.
Ou seja, o papel da psicologia jurídica seria apresentar-se, enquanto ciência
complementar, às demandas da Justiça. Ainda conforme Brunini (2016), isso
sugere que os psicólogos, como profissionais autônomos, despendem seus
trabalhos ao poder da Justiça, cabendo uma crítica alinhada à genealogia
Foucaultiana sobre essas relações de poder e os sujeitos por ela produzidos.
O fato de a psicologia jurídica produzir conteúdo e diálogo com os meios
jurídicos não significa que o psicólogo concorde com os resultados das verdades
produzidas por eles. Por isso, é necessário o psicólogo jurídico estar atento ao
seu papel relacional com a demanda do sistema judicial, com o demandante
(justiça) e com os estabelecimentos que o Poder Judicial responde, refletindo
também sobre o poder sobreposto nessas relações, conforme Freitas (2009).
De acordo com Trindade (2011), a psicologia jurídica tem tido grande
relevância para os profissionais do Direito, principalmente no que se refere
às seguintes questões:

 A Psicologia tem ajudado a aperfeiçoar o sistema de justiça.


 Parte dos erros cometidos por profissionais de justiça se deve ao des-
conhecimento dos assuntos psicológicos essenciais.
 É necessário conhecer mecanismos psicológicos do comportamento
humano para aprimorar a Justiça e as instituições.
 A psicologia jurídica deve auxiliar na instrumentalização de advogados
e promotores de justiça que lidam com os conflitos individuais e sociais,
devendo, também, auxiliar juízes na missão de resolver esses conflitos.
 Muitos conflitos jurídicos são decorrentes, motivados ou mantidos por
questões de natureza emocional e psicológica.
 A psicologia jurídica tem um importante papel em diversas áreas do
Direito.

Para Trindade (2011), apesar dos obstáculos enfrentados, é possível cons-


tatar que o Direito e a Psicologia são duas disciplinas irmãs que nascem
com o mesmo fim e compartem o mesmo objeto de estudo – o homem e seu
Interdisciplinaridade: teoria e campo de atuação 5

comportamento. Por isso, estão condenadas a dar as mãos, sendo a Psicologia


fundamental ao Direito e, mais que isso, essencial para a justiça.

No link abaixo, você poderá ler na íntegra a Resolução nº. 14/2000 do CFP que instituiu,
entre outras especialidades, o título de especialista em psicologia jurídica.
https://goo.gl/1eQEQ8

Campos de atuação
A psicologia jurídica corresponde a toda a aplicação do saber psicológico
às questões relacionadas ao saber do Direito, como afirma Leal (2008). O
termo psicologia jurídica é uma nomenclatura genérica; entretanto, dentro
dela existem outras áreas de especificidades com nomenclaturas próprias, de
acordo com a sua atividade e atuação profissional.
Para França (2004), o psicólogo jurídico está inserido em quase todas
as áreas de atuação. Entretanto, a mesma autora relata a existência de uma
grande concentração de profissionais atuando na psicologia penitenciária e
nas questões relacionadas à família, à infância e à juventude, em detrimento
de outras áreas que possuem carência desses profissionais, como as áreas de
psicologia do testemunho, psicologia policial e militar, direito civil, proteção à
testemunha, atendimento aos juízes e promotores, direitos humanos e autópsia
psíquica.
Já Lago et al. (2009) afirmam que os ramos do Direito que mais deman-
dam o serviço de Psicologia são o direito de família, o direito da criança e do
adolescente, o direito civil, o direito penal e o direito do trabalho. E, embora
na psicologia jurídica haja uma predominância de confecção de laudos, pa-
receres e relatórios, muitas outras atividades são efetuadas pelos psicólogos
especialistas nessa área.
Os psicólogos jurídicos podem desenvolver atividades relacionadas à seleção
e ao treinamento de pessoal, à avaliação de desempenho e ao acompanhamento
psicológico prestado a servidores, magistrados e seus dependentes dentro das
instituições judiciárias. Podem desenvolver também atividades vinculadas
aos juízos de primeira instância (fóruns dos estados) e de segunda instância
(tribunais de justiça dos estados).
6 Interdisciplinaridade: teoria e campo de atuação

Nos fóruns, o trabalho que o psicólogo jurídico realiza gira em torno de


avaliações psicológicas, acompanhamentos de casos, mediação, elaboração
de documentos, aconselhamento psicológico, orientação, fiscalização de
instituições e de programas de atendimento à demanda do fórum e encaminha-
mentos. Pode, inclusive, realizar perícias ou intervenções diretas, de acordo
com a natureza dos casos e o momento do atendimento realizado (podendo
ser antes, durante ou após a sentença judicial).
Para o psicólogo jurídico atuar de uma maneira mais formal, existe o
concurso público para atuação como perito. Além disso, pode atuar fazendo
atendimentos em consultório, fornecendo relatórios, pareceres e laudos tanto
para advogados como para juízes e assistentes técnicos. Pode trabalhar, da
mesma maneira, em abrigos e ONGs, por exemplo. Outras possibilidades
de atuação como psicólogo jurídico pode ser realizando trabalho informal,
autônomo ou ligado a organizações não governamentais, fazendo grupos de
apoio, mediação familiar, trabalhos voluntários, etc.
A respeito dos diferentes campos de atuação da psicologia jurídica, Lago
et al. (2009), em seus estudos, subdividem e descrevem cada área dessa es-
pecialidade, conforme segue.

Psicologia jurídica e direito de família: o trabalho do psicólogo está rela-


cionado a processos de separação e divórcio, paternidade, disputa de guarda
e regulamentação de visitas. O psicólogo atua, nesses casos, como perito,
designado pelo juiz, podendo, da mesma forma, atuar como assistente técnico
ou perito contratado por qualquer uma das partes, a fim de acompanhar o
trabalho do perito oficial.

 Separação e divórcio: o psicólogo pode atuar como mediador em caso


de acordo entre o casal, ou pode ser solicitado a ele a avaliação de uma
das partes.
 Regulamentação de visitas: o psicólogo pode atuar como mediador
ou fazer uma avaliação com a família, de forma a informar ao juiz a
dinâmica familiar e sugerir medidas a serem tomadas.
 Disputa de guarda: pode ser solicitada perícia psicológica para a ava-
liação do melhor genitor, aquele que tem as melhores condições de
exercer esse papel. Importante ressaltar que alguns assuntos, como
guarda compartilhada, falsas acusações de abuso sexual e síndrome de
alienação parental, podem estar envolvidos no processo, sendo funda-
mental o amplo conhecimento dos psicólogos para uma perícia adequada.
Interdisciplinaridade: teoria e campo de atuação 7

Psicologia jurídica e as questões da infância e juventude: o psicólogo atua


junto aos processos de destituição/suspensão do poder familiar, guarda, dis-
puta, habilitação para adoção, apuração do ato infracional, acompanhamento
de medidas socioeducativas de liberdade assistida e prestação de serviços à
comunidade (em adolescentes que cometeram algum tipo de ato infracional)
e acompanhamento de medidas socioeducativas em relação à proteção e ao
atendimento de crianças e adolescentes vítimas de situações de violência. No
Brasil, em virtude da criação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)
(BRASIL, 1990), a criança passa a ser considerada possuidora de direitos.
Podemos observar entraves no trabalho do psicólogo jurídico na interface com
a justiça, nos casos que envolvem intervenções profissionais em consonância
com os preceitos do código de ética, dos direitos humanos e do Estatuto da
Criança e do Adolescente. Isso acontece por causa das contradições entre as
demandas judiciais e a escuta das necessidades das pessoas envolvidas em
processos judiciais.

 Adoção: o psicólogo atua na assessoria às famílias adotantes, garantindo


que os candidatos estejam dentro dos limites das disposições legais;
posteriormente, assessora, informa e avalia os interessados, a fim de
prevenir a negligência, o abuso, a rejeição ou a devolução da criança
ou adolescente.
 Fundações de proteção especial: o psicólogo também atua nas fun-
dações de proteção especial, de forma a oferecer cuidados capazes de
diminuir os efeitos da institucionalização, proporcionando assim uma
vivência que se aproxime à realidade familiar.
 Destituição do poder familiar: o psicólogo tem papel fundamental
na hora de considerar a decisão de separar uma criança de sua família.
Casos possíveis de destituição do poder familiar são doença, negligência,
abandono, maus-tratos, abuso sexual, ineficiência ou morte dos pais.
 Adolescentes autores de atos infracionais: o papel do psicólogo que
envolve esse adolescente tem como objetivo propiciar a superação da sua
condição de exclusão e a formação de valores positivos de participação
na vida social. Deve sempre ter como princípio envolver a família e a
comunidade nas atividades, propiciando a não discriminação e a não
estigmatização.
 Psicologia jurídica e direito civil: o psicólogo atua em processos de
indenização por dano psíquico e nos casos de interdição, entre outras
ocorrências cíveis.
8 Interdisciplinaridade: teoria e campo de atuação

 Dano psíquico: o psicólogo tem a competência, por meio de referencial


teórico e instrumentos técnicos, de avaliar a presença de dano.
 Interdição: se refere à incapacidade do indivíduo de exercer seus atos
da vida civil. Nesses casos, o psicólogo é nomeado para a realização
da avaliação que comprove a enfermidade mental.
 Psicologia jurídica e o direito penal: o psicólogo estuda a motivação
para o crime e a integração do comportamento com os sentimentos
conflituosos do acusado, que acabam sendo transformados em ho-
micídios, por exemplo. Pode participar das oitivas de testemunhas e
medir a veracidade do depoimento do réu. O psicólogo pode atuar como
perito para avaliar a periculosidade e fornecer substrato ao julgador
nas questões de discernimento e sanidade mental das partes em litígio
ou julgamento.
 Psicologia jurídica e o direito do trabalho: o psicólogo pode atuar
como perito em processos trabalhistas, para avaliação de danos psíqui-
cos em virtude de acidentes ou doença relacionada ao trabalho, além
de avaliar o afastamento e as aposentadorias por sofrimento psíquico.

De acordo com Leal (2008), existem outras áreas de atuação mais recentes
do psicólogo jurídico, como:

Psicologia judicial ou do testemunho: estudo do testemunho nos processos


criminais, de acidentes ou de acontecimentos do cotidiano, e estudo das falsas
memórias.

Psicologia penitenciária: se refere à execução de penas restritivas de liberdade


e de direito e de penas alternativas, e envolve a intervenção junto aos reclusos
e egressos e o trabalho com agentes de segurança.

Psicologia policial e das forças armadas: o psicólogo atua na seleção e


formação geral ou específica das polícias civil, militar e do exército. Efetua
também atendimento psicológico.

Psicologia jurídica e direitos humanos: defesa e promoção dos direitos


humanos.

Vitimologia: busca atenção à vítima. Presta atendimento a vítimas de violência


doméstica e seus familiares; trabalha com estudos e intervenções no processo
Interdisciplinaridade: teoria e campo de atuação 9

de vitimização; busca a criação de medidas preventivas e a atenção integral


com o olhar voltado aos âmbitos psicológicos, sociais e jurídicos.
Segundo Rovinski e Cruz (2009), a psicologia jurídica tem se mostrado
promissora por ser um campo aberto a novas possibilidades de ação e de
investigação dentro da Psicologia no Brasil. Entretanto, Lago et al. (2009)
afirma a importância de mais pesquisas que contemplem os diferentes campos
em que a psicologia jurídica passou a atuar. Isso porque, comprovando-se
a importância do papel do psicólogo junto às instituições, será mais fácil a
inserção e a valorização dos profissionais.

O Estatuto da Criança e do Adolescente foi criado em 1990 e representa um marco


jurídico, pois implementa medidas de garantia e proteção de direitos de crianças e
adolescentes. Ao longo dos anos muitos avanços foram conquistados e novos desafios
apareceram na atuação dos psicólogos.
Para ler na íntegra o Estatuto da Criança e do Adolescente, acesse o link abaixo:
https://goo.gl/NSaUs

A interdisciplinaridade
Apesar de a Psicologia e o Direito consistirem em ciências diferentes, em certo
ponto elas se entrelaçam em função de seu objetivo comum, que é o compor-
tamento humano, mesmo que uma das partes, a Psicologia, se preocupe com
o comportamento humano, enquanto a outra, o Direito, leve em consideração
a regulação desse comportamento.
O Direito estuda o comportamento da sociedade. Porém, estudar de forma
aprofundada cada aspecto da sociedade não seria possível sem o papel de outras
áreas de conhecimento, como a sociologia e a psicologia, por exemplo. Assim,
cada disciplina auxilia o Direito a aumentar a compreensão do comportamento
humano em sociedade. A cada momento, muitas pesquisas são realizadas no
campo da psicologia jurídica, desenvolvendo métodos e técnicas diferentes de
forma a auxiliar cada vez mais os operadores do Direito nessa prática inter-
disciplinar, para que o trabalho de ambos os profissionais se complemente. O
Direito também evolui, à medida que cria legislações capazes de acompanhar
10 Interdisciplinaridade: teoria e campo de atuação

o desenvolvimento da sociedade. Um exemplo disso foi a criação do Estatuto


da Criança e do Adolescente, em 1990.
França (2004) explica que a psicologia jurídica é possível por meio da inter-
disciplinaridade entre a Psicologia e o Direito, objetivando a escuta psicológica
com o intuito de reconhecer as vivências e a história de cada sujeito que procura
ou é demandado pelo Judiciário. A complexidade do ser humano faz afastar
a ideia de que basta aplicar a lei quando os problemas chegam aos tribunais.
Para Granjeiro (2006), a proposta da interdisciplinaridade entre a Psicologia
e o Direito é criar uma atitude ou ação entre os profissionais dessas áreas, com o
intuito de garantir um espaço relacional, que proporcione mudanças no universo
comunicativo de interação entre os juízes, os promotores, os defensores e a
Psicologia. A criação de contextos mais integrados de conhecimento e ação
privilegia a aplicação da lei de forma que atenda à diversidade, à unicidade,
ao sujeito e ao seu contexto, tornando a lei mais eficaz.
Freitas (2009), em seus estudos, fala que a relação entre a Psicologia e o
Direito não pode ser vista de forma simplista, pois dessa forma reforçará o
aspecto negativo que o Direito apresenta em sua atividade de julgamento, já
que não cabe à Psicologia o ato de auxílio do julgar, condenar ou produzir
provas, mas de apresentar-se enquanto ciência complementar em relação às
demandas da Justiça, não sendo um saber que se sobressai, nem seja submisso
ao poder Judicial, como vimos anteriormente.
Existe uma coexistência de diferentes escolas de Psicologia no contexto
da atual psicologia jurídica, sendo elas a psicologia clínica e a psicologia
social. De acordo com Freitas (2009), esses estudos envolvem basicamente
o conceito de moral, sendo ela o conjunto de regras e padrões subjetivos
firmados socialmente, fazendo os indivíduos discernirem entre o bem e o mal.
Nas áreas da psicologia forense e psicologia criminal, os psicólogos jurí-
dicos se colocam à disposição para aplicar seus conhecimentos ao exercício
do Direito, de forma a trabalhar juntamente com juristas, assistentes sociais
e magistrados. Nessa atividade, eles analisam os testemunhos, fazem exa-
mes de evidências delitivas, analisam o grau de veracidade das confissões,
fazem a compreensão psicossocial do delito, realizam a orientação psíquica e
moral dos infratores, analisam as melhores medidas profiláticas do ponto de
vista sociocultural e psicológico aos diversos perfis de delinquência, atuam
preventivamente a fim de evitar a reincidência e realizam apoio e tratamento
psicológico das vítimas de delitos, conforme elenca Freitas (2009). Cabe à
psicologia jurídica elaborar e implantar programas de saúde mental em favor
da proteção, segurança e salubridade psíquica das pessoas ligadas à jurisdição
Interdisciplinaridade: teoria e campo de atuação 11

e à aplicação da lei, como nos casos dos trabalhadores das secretarias de


justiça e de segurança pública.
Em relação às assessorias, o psicólogo jurídico, juntamente com assistentes
sociais e sociólogos, atua nos escritórios de advocacia e nos juizados para
esclarecer sobre quais seriam as melhores ações diante dos conflitos judiciais
e quais estratégias poderiam ser realizadas para extinguir efeitos psicológicos
negativos na decisão judicial. Conforme Freitas (2009), atuando no sistema
penal, o psicólogo deve sustentar dados empíricos, com argumentos persua-
sivos, mas cuidando para não ser discriminatório nem leviano.
Nas perícias, o psicólogo deve estar atento ao entrevistar as vítimas ou os
réus para que a verdade dos fatos se torne mais visível, favorecendo assim
a justiça e evitando que a culpa recaia em uma pessoa inocente. Como os
profissionais do Direito não têm profundos conhecimentos psicológicos, o
psicólogo deve transmitir a informação e as produções técnicas da maneira
mais clara possível.
Sobre as diferentes atividades relativas à atuação profissional, a seguir
estão detalhadas as atribuições dos especialistas em psicologia jurídica no
Brasil, segundo a Classificação Brasileira de Ocupações:

 assessorar na formulação, revisão e execução das leis;


 colaborar na formulação e implantação das políticas de cidadania e
direitos humanos;
 realizar pesquisa visando à construção e ampliação do conhecimento
psicológico aplicado ao campo do Direito;
 avaliar as condições intelectuais e emocionais de crianças, adolescentes e
adultos em conexão com processos judiciais, seja por deficiência mental
e insanidade, testamentos contestados, aceitação em lares adotivos,
posse e guarda de crianças, seja por determinação da responsabilidade
legal por atos criminosos;
 atuar como perito judicial nas varas cíveis, criminais, da justiça do
trabalho, da família e da infância e juventude, elaborando laudos, pa-
receres e perícias a serem anexados aos processos;
 elaborar petições que serão juntadas aos processos, sempre que for
solicitada alguma providência ou haja necessidade de se comunicar
com o juiz durante a execução da perícia;
 eventualmente, participar de audiências para esclarecer aspectos técnicos
em Psicologia que possam exigir maiores informações para leigos ou
leitores do trabalho pericial psicológico (juízes, curadores e advogados);
12 Interdisciplinaridade: teoria e campo de atuação

 elaborar laudos, relatórios e pareceres, colaborando não só com a ordem


jurídica, como com indivíduos envolvidos com a justiça por meio da
avaliação da personalidade deste e fornecendo subsídios ao processo
judicial quando solicitado por uma autoridade competente, podendo
utilizar-se de consulta aos processos e coletar dados considerados ne-
cessários à elaboração do estudo psicológico;
 realizar atendimento psicológico por meio de trabalho acessível e com-
prometido com as buscas de decisões próprias na organização familiar
dos que recorrem às varas de família para a resolução de questões;
 realizar atendimento a crianças envolvidas em situações que chegam
às instituições de Direito, visando à preservação de sua saúde mental,
bem como prestar atendimento e orientação a detentos e seus familiares;
 participar da elaboração e execução de programas socioeducativos
destinados a crianças de rua, abandonadas ou infratoras;
 orientar a administração e os colegiados do sistema penitenciário sob o
ponto de vista psicológico, quanto às tarefas educativas e profissionais
que os internos possam exercer nos estabelecimentos penais;
 assessorar autoridades judiciais no encaminhamento a terapias psico-
lógicas, quando necessário;
 participar da elaboração e do processo de execução penal e assessorar
a administração dos estabelecimentos penais quanto à formulação da
política penal e ao treinamento de pessoal para aplicá-la;
 atuar em pesquisas e programas de prevenção à violência e desenvolver
estudos e pesquisa sobre a área criminal, construindo ou adaptando
instrumentos de investigação psicológica.

BRASIL. Lei nº. 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do
Adolescente e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em: 6 jun. 2018.
BRUNINI, B. C. C. B. A intersecção da psicologia com a lei: problematizando a psicologia
jurídica na prática profissional dos psicólogos. 2016. 178f. Dissertação (Mestrado em
Psicologia). – Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista Júlio de
Mesquita Filho, Assis, 2016.
CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. Resolução CFP nº. 014/00 de 20 de dezembro de
2000. Institui o título profissional de Especialista em Psicologia e dispõe sobre normas
Interdisciplinaridade: teoria e campo de atuação 13

e procedimentos para seu registro. Disponível em: <https://site.cfp.org.br/wp-content/


uploads/2006/01/resolucao2000_14.pdf>. Acesso em: 6 jun. 2018.
FOUCAULT, M. Vigiar e punir. 5. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1987.
FRANÇA, F. Reflexões sobre psicologia jurídica e seu panorama no Brasil. Psico. Teor.
Prat. [online], v.6, n.1, p. 73-80, 2004.
FREITAS, M. A. Psicologia jurídica e psicologia forense: aproximações e distinções.
Revista de Psicoanálisis y Estúdios Culturais, n, 10, 2009. Disponível em: <https://dialnet.
unirioja.es/ejemplar/234407>. Acesso em: 6 jun. 2018.
GRANJEIRO, I.; COSTA, L. A ação dos operadores de direito e da psicologia em casos de
abuso sexual. 2006. Disponível em: <http://www.psicologia.pt/artigos/textos/A0378.
pdf>. Acesso em: 6 jun. 2018.
LAGO, V. de. M. et al. Um breve histórico da psicologia jurídica no Brasil e seus campos
de atuação. Estudo de psicologia, Campinas, v. 26, n. 4, p. 483-491, out./dez. 2009.
LEAL, L. M. Psicologia jurídica: história, ramificações e áreas de atuação. Diversa, ano
1, n. 2, p. 171-185, jul./dez. 2008.
ROVINSKI, S. L. R.; CRUZ, R. M. Psicologia jurídica: perspectivas teóricas e processos de
intervenção. São Paulo: Vetor, 2009.
SILVA, D. M. P. da. Psicologia, direito e o ideal de justiça na atuação da psicologia
jurídica. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XVI, n. 112, maio 2013. Disponível em: <http://
www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=12758>.
Acesso em: 5 jun. 2018.
SILVA, D. M. P. A Psicologia a serviço do direito familiar. In: SILVA, D.M.P. (Coord.).
Revista Psique Ciência & Vida, edição especial Psicologia Jurídica, São Paulo, ano I, n.
5, p.17-20 b, 2007.
TRINDADE, J. Manual de psicologia jurídica para operadores do direito. 2. ed. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2007.

Leitura recomendada
SILVA, D. M. P. Psicologia jurídica no processo civil brasileiro. 2. ed. Rio de Janeiro: Fo-
rense, 2012.
Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para
esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual
da Instituição, você encontra a obra na íntegra.
Conteúdo:
Dica do Professor

A noção de direitos humanos sofreu um longo processo de evolução, passando por diversos
pensamentos dos povos hebreus, gregos e romanos, pelo Cristianismo e pela Idade Média, até a
atualidade. Mesmo após a assinatura da Declaração dos Direitos Humanos da ONU (1948), é
concenso a necessidade de denúncias das constantes e estruturais violações das condições básicas
de vida humana digna.

Na Dica do Professor a seguir, você vai conhecer, a partir de uma perspectiva histórica, o
surgimento dos direitos humanos. Irá compreender por que a psicologia é atuante nesta área e
reconhecer áreas de atuação que ilustram a interface entre a Psicologia e os direitos humanos.

Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar.
Exercícios

1) Tanto a Psicologia quanto o Direito têm em comum a busca pela compreensão do


comportamento humano. No entanto, essas ciências se diferenciam quanto ao objeto de
estudo. Com relação a isso, escolha uma alternativa correta:

A) A Psicologia estuda o dever ser, enquanto o Direito estuda apenas o ser.

B) A Psicologia estabelece uma relação de finalidade, enquanto o Direito estabelece relação de


causalidade.

C) A Psicologia busca regular o comportamento, enquanto o Direito estuda a compreensão


deste.

D) A Psicologia estuda os processos inconscientes e conscientes, enquanto o Direito estuda os


processos individuais e sociais do comportamento.

E) A Psicologia estuda o comportamento em si, enquanto o Direito legisla com base em um


conjunto de regras que busca regulamentarr o comportamento humano.

2) A psicologia jurídica é uma vertente dos estudos em Psicologia. Da interface desta com o
mundo jurídico, resultam encontros e desencontros epistemológicos e conceituais, os quais
permeiam a atuação do psicólogo jurídico (FRANÇA, 2004). Assim pensando, sobre a prática
do psicólogo jurídico, assinale a alternativa correta:

A) Atua na análise dos processos como um todo, juntamente com os juízes.

B) Utiliza técnicas psicológicas de forma a responder a demanda judicial: determina quem é o


culpado nas ações penais.

C) O psicólogo jurídico, em sua prática, chama à cena a realidade psicológica dos indivíduos de
forma a complementar a literalidade da lei.

D) O psicólogo jurídico tem o dever de orientar o juiz a seguir os princípios éticos estabelecidos
na Constituição, além de auxiliar o juiz a buscar felicidade e bem-estar no trabalho.

E) O psicólogo demanda ao juiz descrição e análise dos processos mentais e comportamentais


dos indivíduos.
3) A interface entre a Psicologia e o Direito, entre a ciência da mente e a ciência da justiça,
exige constante reflexão e problematização crítica. Com relação às especificidades do
campo de atuação da prática da psicologia jurídica, considerando os demais campos de
atuação da Psicologia, de forma geral, escolha uma alternativa correta:

A) A atuação do psicólogo jurídico requer uma ação mais alinhada ao conjunto de normas
obrigatórias quando se refere aos recursos teóricos científicos contemporâneos.

B) Cabe ao psicólogo jurídico o papel de auxiliar a julgar.

C) Deve ter uma relação simplista, cabendo ao psicólogo jurídico produzir provas para embasar o
trabalho dos advogados.

D) O psicólogo jurídico, enquanto trabalhador a serviço da justiça, faz uma leitura da situação
legal dos envolvidos, tarefa que irá determinar a atuação dos promotores e juízes.

E) A ação do psicólogo no meio jurídico é determinante da ação de advogados, promotores e


juízes.

4) O campo de atuação da psicologia jurídica é vasto, englobando especificidades conforme


cada área de interface (direito do trabalho, direito de família, etc) e definindo especializações
(penitenciária, do testemunho, etc). Dada a multiplicidade de possibilidades de atuação do
psicólogo jurídico, assinale a alternativa correta:

A) O psicólogo que atua na interface da psicologia jurídica com o direito do trabalho não pode
atuar como perito em processos trabalhistas.

B) O psicólogo que atua na interface da psicologia jurídica com o direito civil pode trabalhar nos
casos de interdição por meio da realização de avaliação que comprove tal enfermidade.

C) O psicólogo que trabalha com a psicologia jurídica na interface com o direito penal atua
exclusivamente com os adolescentes autores de atos infracionais.

D) O psicólogo que trabalha na interface da psicologia jurídica com o direito de família estuda a
motivação para os crimes e mede a veracidade do depoimento dos réus.

E) O psicólogo que trabalha na interface da psicologia jurídica com questões da infância e da


juventude atua na avaliação de doenças ocupacionais dos pais, relacionadas ao trabalho.

5) A Psicologia e o Direito possuem uma vasta gama de áreas de atuação, tais como:
• 1. Psicologia: escolar, clínica, trânsito, esporte, jurídica, entre outras;
• 2. Direito: penal, civil, tributário, entre outras.

Assinale a alternativa correta quanto às atividades do psicólogo jurídico:

A) O psicólogo pode atuar como perito nas varas cíveis, criminais, da justiça do trabalho, da
família e da infância e juventude, elaborando laudos, pareceres e perícias para serem
amplamente divulgados pelos veículos de comunicação midiáticos.

B) O psicólogo auxilia durante a avaliação psicológica, realizada pelos operadores do Direito,


quanto as demandas emocionais de crianças, adolescentes e adultos em conexão com
processos judiciais.

C) O psicólogo participa eventualmente de audiências para esclarecer aspectos técnicos em


Psicologia que possam exigir maiores informações para leigos ou leitores do trabalho pericial
psicológico e ocupar o lugar dos juízes na tomada de decisão sobre o processo.

D) O psicólogo avalia as condições intelectuais e emocionais de crianças, adolescentes e adultos


em conexão com processos judiciais, seja por deficiência mental e insanidade, testamentos
contestados, aceitação em lares adotivos ou posse e guarda de crianças.

E) O psicólogo realiza atendimento a crianças envolvidas em situações que chegam às


instituições de Direito, visando preservar sua saúde mental e, posteriormente, faz laudos
determinando intervenções, as quais cabe ao juiz obrigatoriamente acatar.
Na prática

Você já ouvir falar em violência intrafamiliar? Você poderá refletir sobre a atuação do Psicólogo
inserido em uma equipe interdisciplinar, a partir de um caso de violência intrafamiliar (pai agredindo
filhos).

Joana de Paula, adolescente, 13 anos, chega ao Centro de Referência Especializado em Assistência


Social (CREAS) pedindo ajuda. Veja a seguir mais detalhes sobre o caso de Joana.
Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para
acessar.
Saiba mais

Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor:

Redução da idade penal


A redução da idade penal para 16 anos é um projeto que está em pauta no Congresso Nacional e
na sociedade brasileira. Mas, você sabe o que significa reduzir a maioridade penal? Assista ao
documentário a seguir.

Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar.

A Psicologia e os direitos humanos


Este artigo busca discutir as possibilidades teóricas e metodológicas do trabalho do psicólogo em
um Centro de Direitos Humanos e o papel que desempenha esse profissional neste espaço político
de ação.

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Direito e Psicologia
Este artigo busca uma reflexão sobre o estabelecimento de ligação entre as questões
presumidamente jurídicas e a Psicologia como campo de conhecimento e prática social.

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Unidade de Estudos 4 - Psicologias
do trânsito, jurídica e do esporte

Apresentação

A psicologia é uma ciência que tem como objeto de estudo o comportamento e os processos
mentais humanos. Por meio de análises e intervenções sobre as emoções dos indivíduos, o
psicólogo pode atuar para promover, proteger e reabilitar a saúde mental, visando ao bem-estar e à
qualidade de vida individual e coletiva. Além disso, o psicólogo estabelece hipóteses diagnósticas,
propondo tratamentos e auxiliando na prevenção de doenças mentais.

Portanto, a atuação do psicólogo tem a finalidade de compreender e analisar os indivíduos, a fim de


solucionar problemas relacionados ao comportamento. Esse profissional pode estar inserido em
vários contextos em que o humano se faz presente, como no trânsito, no setor jurídico e no
esporte. Dessa forma, a psicologia é composta por várias áreas de conhecimento, entre elas:

– a psicologia do trânsito, que estuda o comportamento dos usuários das redes viárias urbanas;

– a psicologia jurídica, que abrange o estudo dos fenômenos psicológicos que afetam ou podem vir
a afetar a conduta de uma pessoa, a ponto de levá-la a infringir as normas legais vigentes na
sociedade; e

– a psicologia do esporte, que estuda os fatores comportamentais que influenciam e são


influenciados pela participação e pelo desempenho no esporte.

Nesta Unidade de Aprendizagem, você vai conhecer a origem dessas áreas de conhecimento e as
possibilidades de atuação do psicólogo nesses contextos.

Bons estudos.

Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

• Analisar a evolução histórica da psicologia do trânsito.


• Descrever a entrada na psicologia no âmbito jurídico.
• Identificar a história da psicologia do esporte.
Infográfico

A perícia psicológica é uma modalidade de avaliação psicológica e, portanto, é um processo de


trabalho orientado por demanda específica. O psicólogo atua utilizando métodos e procedimentos
de busca e coleta de dados e informações pertinentes às finalidades e ao contexto da investigação
(judicial ou extrajudicial), de forma a assessorar a Justiça. Assim, ele deve exercer a função com
isenção em relação às partes envolvidas, emitindo um laudo psicológico com base no referencial
teórico-técnico respaldado na ciência psicológica, para subsidiar a decisão do Judiciário.

Neste Infográfico, você vai estudar os itens que estruturam a elaboração de um laudo psicológico.

Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino!


Conteúdo do Livro

Os primórdios da psicologia do esporte começaram a surgir nas décadas de 1920 e 1930. Nesse
momento, o foco era principalmente na psicologia educacional e no desenvolvimento de
habilidades motoras. Alguns estudos examinavam as diferenças individuais em termos de
habilidades físicas e mentais. Contudo, principalmente a partir dos anos de 1960, a psicologia do
esporte ganha força como disciplina no sentido de contribuir para a experiência e o desempenho do
atleta. Neste vídeo, vamos explorar a breve história da psicologia do esporte. Vamos ver também o
campo de atuação da neuropsicologia do esporte para os jogadores de futebol americano, por
exemplo.

Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar.

A psicologia oferece conhecimento técnico e teórico que possibilita a atuação do psicólogo em


contextos variados; entre esses contextos, encontram-se o trânsito, o setor jurídico e o esporte. A
psicologia do trânsito estuda os fatores internos e externos que podem promover ou influenciar o
comportamento humano no trânsito. A psicologia jurídica integra os conhecimentos da psicologia e
do Direito, de forma a possibilitar a atuação do psicólogo no âmbito da Justiça, auxiliando nas
questões relativas à saúde mental dos envolvidos em um processo. A psicologia do esporte ou
esportiva tem o objetivo de compreender os fatores psicológicos que podem influenciar o
desempenho físico, a saúde e o bem-estar dos atletas e das equipes esportivas.

No capítulo Psicologias do trânsito, jurídica e do esporte, base teórica desta Unidade de


Aprendizagem, você vai conhecer melhor essas três áreas promissoras da psicologia, as suas
origens e as possibilidades de atuação em cada área.

Boa leitura.
FUNDAMENTOS
EPISTEMOLÓGICOS
E HISTÓRICOS DA
PSICOLOGIA
Psicologias do
trânsito, jurídica
e do esporte
Andréia Oliveira Vicente

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

> Analisar a evolução histórica da psicologia do trânsito.


> Descrever a entrada na psicologia no âmbito jurídico.
> Identificar a história da psicologia do esporte.

Introdução
Ao longo do tempo, a psicologia foi ampliando o seu campo de atuação, de forma
a se fazer presente nos contextos que demandam os seus conhecimentos e téc-
nicas científicas. Contextos como o do trânsito, o jurídico e o do esporte também
apresentam demandas psicológicas, que, como tais, requerem investigações e
intervenções adequadas para que essas demandas não apenas sejam identificadas,
mas compreendidas e sanadas.
Para que a psicologia possa desenvolver teorias cada vez mais específicas
para a atuação em cada contexto, ou seja, para que o psicólogo possa atuar com
instrumentos e técnicas que contemplem as especificidades de cada campo, é
necessário conhecer a fundo as áreas de interesse. Portanto, neste capítulo, você
conhecerá a história das áreas denominadas psicologia do trânsito, psicologia
jurídica e psicologia do esporte. Especificamente, será explicado como elas surgiram
e sob quais influências científicas. Além disso, serão esclarecidas as articulações
necessárias com outros campos científicos para possibilitar a atuação do psicólogo.
2 Psicologias do trânsito, jurídica e do esporte

Psicólogo do trânsito
Nesta seção, você lerá a respeito do objeto de estudo da psicologia do trânsito,
incluindo quando e como essa área surgiu. Além disso, serão apresentados
os pesquisadores que contribuíram para o seu desenvolvimento, ajudando-
-a a se consolidar como mais um campo de atuação do psicólogo. Por fim,
você verá como esse profissional atua na prática e quais conhecimentos
psicológicos pode utilizar.
A psicologia do trânsito surgiu da necessidade de desenvolver estudos
científicos que contribuíssem para o entendimento de todos os atores que
fazem parte do tráfego aéreo, marítimo, ferroviário e fluvial. O seu objeto de
estudo é, basicamente, o comportamento humano no trânsito que é construído
e movimentado diariamente pelas pessoas e está organizado por meio de
normas e procedimentos de conduta coletiva. Esses estudos buscam aperfei-
çoar a compreensão e a intervenção no ambiente do trânsito, cujos artefatos
e tecnologias estão cada vez mais diversificados, visando a melhorar as
condições de segurança. O intuito é que os riscos de acidentes possam ser
minimizados, bem como as possibilidades de ameaças à vida (CRISTO, 2019;
CRUZ; WIT; SOUZA, 2020; RUEDA; GUIMARÃES, 2021).
De um modo mais geral, os objetivos dos estudos desenvolvidos na área
da psicologia do trânsito sempre foram desenvolver teorias que descreves-
sem os fatores comportamentais que pudessem causar ou contribuir para
a ocorrência de acidentes. As pesquisas buscam investigar os processos
psicológicos associados, como a cognição e as emoções, bem como a forma
como as pessoas se comportam no contexto do trânsito, a qual reflete como
elas estabelecem as suas relações em outros contextos físicos e sociais,
considerando o contexto global no qual essas relações ocorrem. O intuito
é tentar transformar a realidade do trânsito melhorando a qualidade e o
estilo de vida das pessoas (CRISTO, 2019; CRUZ; WIT; SOUZA, 2020; RUEDA;
GUIMARÃES, 2021).

Breve histórico da psicologia do trânsito


A origem da área de conhecimento psicologia do trânsito, ou do tráfico, ocor-
reu por volta de 1910. A sua fundação é atribuída ao psicólogo alemão Hugo
Münsterberg (1863-1916), por ele ter sido o primeiro psicólogo a submeter os
motoristas dos bondes de Nova York a uma bateria de testes de habilidade e
de inteligência. Ele investigava como certos comportamentos eram resultado
de distúrbios cerebrais com o intuito de elaborar perfis psicológicos para des-
Psicologias do trânsito, jurídica e do esporte 3

crever o comportamento dos criminosos. Esses conhecimentos contribuíram


para que ele criasse a psicologia forense. Porém, o método de traçar perfis
contribuiu para o surgimento de outras áreas, como a psicologia do trânsito.
Hugo foi aluno de Wilhelm Maximilian Wundt e diretor do Laboratório de
Psicologia Experimental da Universidade de Harvard, a convite de William
James (CRUZ; WIT; SOUZA, 2020; RUEDA; GUIMARÃES, 2021).
Durante a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), instrumentos psicométricos
foram utilizados nos processos de recrutamento e avaliação de habilidade de
combatentes de forma muito eficaz. Assim, também passaram a ser aplicados
nos trabalhadores das indústrias, visando a predizer a fadiga, o comportamento
de risco e a capacidade produtiva. Por conta do uso bem-sucedido desses
instrumentos, a disciplina de psicologia do trânsito pôde se desenvolver. Em
paralelo a isso, as primeiras leis do trânsito começaram a serem aplicadas com
o objetivo de organizar o fluxo de veículos, requerendo uma maior atenção
para as habilidades dos motoristas e o novo estilo de vida urbano com o uso
dos veículos (CRUZ; WIT; SOUZA, 2020; RUEDA; GUIMARÃES, 2021).
Por volta da década de 1950, as pesquisas sobre personalidade e diferenças
individuais influenciaram a psicologia do trânsito, que passou a considerar
que determinadas características de personalidade poderiam aumentar a
possibilidade de as pessoas se envolverem em acidentes. As pesquisas sobre
a percepção humana reforçaram essa visão, pois os estudos evidenciavam
a importância da forma como os movimentos são executados (habilidades
e destreza), refletindo no comportamento de risco do condutor. Logo, os
motoristas passaram a ser considerados os principais responsáveis pela
maior parte dos acidentes (CRUZ; WIT; SOUZA, 2020; RUEDA; GUIMARÃES, 2021).
Com o intuito de reduzir os acidentes, nessa época também surgiram di-
versos centros de pesquisas de comportamento no trânsito. Esses centros se
baseavam nas teorias e medidas psicológicas e consideravam os estudos da
fisiologia e da estatística, pois tinham a finalidade de verificar a capacidade
e as habilidades psicológicas dos candidatos a condutores. Eram verificados
os desempenhos intelectual, motor, racional e emocional necessários para
dirigir. Ademais, eram investigadas as circunstâncias dos acidentes e apli-
cadas operações de estatística básica para analisar a sua ocorrência (CRUZ;
WIT; SOUZA, 2020).
Dessa forma, visando a identificar os fatores humanos envolvidos nas
possíveis causas de acidentes, a psicologia do trânsito foi direcionando, ao
longo do tempo, os seus estudos para analisar com mais profundidade os
conflitos que resultavam em infortúnios. No Brasil, desde 1941, o primeiro
Código Nacional de Trânsito (Decreto-Lei nº 2.994) já estabelecia que exames
4 Psicologias do trânsito, jurídica e do esporte

médico e psicológico deveriam ser feitos, em caráter obrigatório, de forma a


traçar o perfil psicofisiológico mínimo compatível com o ato de dirigir (BRA-
SIL, 1941). Logo, a licença para dirigir era concedida a quem comprovasse ter
a capacidade de dirigir com segurança, e o motorista, quando era culpado
por um acidente grave no trânsito, deveria passar por novo exame de visão
e exame psicofisiológico. As contribuições da psicologia industrial e da psi-
cotécnica foram essenciais ao estudo científico do perfil do comportamento
nos acidentes e dos obstáculos do ambiente à segurança (CRUZ; WIT; SOUZA,
2020; RUEDA; GUIMARÃES, 2021).
Nesse contexto, a psicologia do trânsito sentiu necessidade de organizar
um conjunto de testes psicológicos para o exame psíquico, além de procurar
estabelecer as médias normais para o perfil psicofisiológico do condutor. Além
disso, os estudos direcionados para a prevenção de acidentes passaram a ser
desenvolvidos com base na avaliação de características de personalidade e
aptidão (RUEDA; GUIMARÃES, 2021).
Nas décadas de 1970 e 80, a pesquisa em cognição se tornou predominante,
e a visão dominante na psicologia do trânsito era a de que os condutores
adaptavam o seu comportamento à situação do trânsito, tomando decisões
com base no nível de risco a que estavam sujeitos. A partir daquele período,
o campo de pesquisa em segurança e o comportamento no trânsito pareciam
divididos em dois grupos distintos. O primeiro grupo, constituído basicamente
por psicólogos europeus, mantinha a noção de propensão ao acidente como
um fator relevante à explicação dos eventos adversos no trânsito, buscando
validar teorias e instrumentos psicológicos voltados à identificação de fatores
pessoais determinantes dos acidentes. O segundo grupo, situado principal-
mente nos Estados Unidos e com sólida base estatística, considerava que
a noção de propensão ao acidente não havia sido comprovada, permane-
cendo uma dúvida razoável sobre essa premissa. Assim, deslocou as suas
preocupações à indústria de veículos, aos problemas relativos à segurança
viária e à legislação de segurança, visando a tornar os veículos mais seguros
(CRUZ; WIT; SOUZA, 2020).
Até o fim do século XX, o desenvolvimento da psicologia do trânsito incor-
porava diversos modelos comportamentais e teorias relativas ao tráfego e
à segurança rodoviária, ainda sem uma base teórica unificada da psicologia
do trânsito. Nas primeiras décadas do século XXI, tem-se observado um
movimento na psicologia do trânsito influenciado pelos estudos em psico-
logia ambiental, social e sociocognitiva, além da tradição psicométrica. Há
uma tendência de ampliação da compreensão do comportamento humano
no trânsito em função da influência do contexto político-econômico, dos
Psicologias do trânsito, jurídica e do esporte 5

problemas de planejamento e execução de políticas públicas de educação


e segurança, e das decisões de agentes públicos (CRUZ; WIT; SOUZA, 2020).

Atuação do psicólogo no contexto do trânsito


No cenário contemporâneo, a prática da psicologia do trânsito é majoritaria-
mente vinculada à avaliação psicológica. No entanto, visando a um trânsito
seguro, a psicologia deveria ser uma disciplina de maior destaque, pois o fator
humano responde por um alto percentual dos acidentes de trânsito no Brasil.
Nesse sentido, as práticas de prevenção e intervenção possivelmente remete-
riam à modificação de comportamentos. Se programas de prevenção fossem
realizados desde o início da aprendizagem do ser humano, as tomadas de decisão
e o prevalecimento do respeito no trânsito seriam facilitados. Percebe-se, então,
a necessidade de expansão das pesquisas voltadas para o desenvolvimento de
novos e sofisticados métodos educativos que envolvam a população e visem a
um trânsito de maior qualidade (CRISTO, 2019; RUEDA; GUIMARÃES, 2021).

No contexto do trânsito, a avaliação psicológica está prevista nos arts.


147 e 148 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), que a compreende
como um exame preliminar na formação de condutores de veículos automotores
(BRASIL, 1997). Ela é regulamentada pela Resolução do Conselho Nacional de
Trânsito (Contran) nº 425, de 2012, que dispõe sobre o exame de aptidão física
e mental, a avaliação psicológica e o credenciamento das entidades públicas
e privadas de que tratam o CTB (CONTRAN, 2012) e pela Resolução do Conselho
Federal de Psicologia (CFP) nº 001, de 2019, que institui normas e procedimentos
para a perícia psicológica no contexto do trânsito (CFP, 2019).

Na busca pela explicação das relações entre as variáveis do trânsito e a


ocorrência de acidentes, a perspectiva do fator humano nesse contexto tem
sido atualizada ao longo do desenvolvimento recente da psicologia. Assim,
de acordo com diversos especialistas, os fatores comportamentais são,
reconhecidamente, os que mais contribuem para os acidentes de trânsito.
O papel preditor da extensão dos efeitos do fator humano na ocorrência
de acidentes tem revelado, nos estudos atuais, a força da associação entre
variáveis como agressividade, irritabilidade, raiva, uso/abuso de álcool, ve-
locidade de condução, distração, sono, fadiga e medicação e comportamento
de risco/acidente de trânsito (CRUZ; WIT; SOUZA, 2020).
O papel do psicólogo pode ser bastante variado, a depender de fatores
como o próprio foco, o setor ou o tipo de serviço em que trabalha. No contexto
6 Psicologias do trânsito, jurídica e do esporte

de trânsito e transporte, alguns papéis tendem a ser mais fixos, como o de


avaliador nas clínicas conveniadas aos departamentos de trânsito (Detrans).
Nesse caso, o psicólogo desempenhará, no seu dia a dia de trabalho, uma
tarefa previamente designada, relacionada ao processo de habilitação. Outros
papéis, por sua vez, tendem a ser mais variáveis, como consultoria a empresas
de transporte, em que o serviço será negociado de acordo com a necessidade
do cliente (CRISTO, 2019).
A psicologia do trânsito é uma área que interage com as outras áreas
de conhecimento da psicologia, como a psicologia cognitiva, a psicologia
social e a psicopatologia, bem como com outras disciplinas, dependendo da
finalidade de atuação. Com relação à finalidade de atuação, duas vertentes
são reconhecidas pelos estudiosos da área: a pesquisa e a aplicação (CRISTO,
2019; CRUZ; WIT; SOUZA, 2020; RUEDA; GUIMARÃES, 2021).
A atuação da psicologia do trânsito na pesquisa é realizada com base
em documentos oficiais e relatórios técnicos elaborados a partir da análise
dos fatores envolvidos no trânsito para realizar diagnósticos das situações
ocorridas. O objetivo é produzir conhecimento científico que contribua para
que ações de melhoria da segurança e da conduta dos motoristas possam
ser implantadas. Com relação à aplicação, a atuação da psicologia do trânsito
refere-se à aplicação de testes psicológicos, que são utilizados para avaliar
a capacidade de os candidatos obterem a Carteira Nacional de Habilitação
(CNH). O intuito é contribuir com a segurança do trânsito e, consequentemente,
das pessoas (CRISTO, 2019; CRUZ; WIT; SOUZA, 2020; RUEDA; GUIMARÃES, 2021).
No que se refere à análise do comportamento no trânsito, há alguns fatores
bastante específicos a serem observados. São eles:

„ o tempo que uma pessoa leva para perceber o perigo e reagir;


„ a capacidade de se orientar no tempo e no espaço;
„ a forma como uma pessoa percebe uma situação-problema e a resolve;
„ o controle emocional.

Esses fatores são bastante relevantes para a atuação do psicólogo tanto


na pesquisa quanto na aplicação (CRISTO, 2019; CRUZ; WIT; SOUZA, 2020;
RUEDA; GUIMARÃES, 2021).
Psicologias do trânsito, jurídica e do esporte 7

O foco da atuação do psicólogo no contexto do trânsito é, de fato,


o comportamento humano, que, devido à sua complexidade, pode
impactar significativamente o sistema que o organiza. Isso acontece sobretudo
em decorrência dos acidentes de trânsito, cuja maioria parece resultar do
comportamento dos motoristas.
A análise e avaliação do comportamento humano e a forma como as relações
com o trânsito são estabelecidas são fundamentais para que ações de prevenção
de acidentes possam ser promovidas, sobretudo porque fomentam pesquisas
para o aprimoramento e a elaboração de testes psicológicos que evidenciem
o perfil comportamental dos candidatos a motoristas e dos motoristas em
processo de reeducação (RUEDA; GUIMARÃES, 2021).

Nesta seção, foram abordados os principais objetivos dos estudos de-


senvolvidos na área da psicologia do trânsito. Desde o seu surgimento, essa
área esteve sempre voltada para o desenvolvimento de teorias descrevessem
os fatores comportamentais que causam ou contribuem para a ocorrência
de acidentes, visando ao aprimoramento das intervenções psicológicas e
à implantação de ações que previnam ou evitem os acidentes de trânsito.

Psicologia jurídica
Nesta seção, você lerá a respeito do objeto de estudo da psicologia jurídica.
Especificamente, será detalhado como a área de psicologia e do direito se
articularam e explicados os motivos que propiciaram o surgimento da psico-
logia jurídica. Além disso, serão mencionados os pesquisadores da área da
psiquiatria que contribuíram para algumas teorias sobre personalidade e a
prática de crime no passado e analisada a atual teoria a respeito dos fatores
que influenciam os atos delituosos. Com relação à atuação do psicólogo, você
verá quais são as diferenças entre o papel do psicólogo como perito e o seu
papel como assistente jurídico.
A psicologia jurídica é uma área de conhecimento composta pelas áreas do
direito e da psicologia, que têm, em comum, o estudo do ser humano. O principal
objeto de estudo da psicologia são os processos mentais e o comportamento
humano. Assim, no âmbito jurídico, desenvolve estudos envolvendo perso-
nalidade, saúde mental, conduta criminosa e desordens comportamentais,
com o intuito de investigar, explicar, avaliar e prevenir comportamentos que
afetam a conduta dos indivíduos perante as normas legais (PINHEIRO, 2019).
Já o direito pode ser entendido como um conjunto de normas e instituições
que busca coordenar e regular o convívio e as relações sociais dos seres
8 Psicologias do trânsito, jurídica e do esporte

humanos que vivem em grupo. A vivência em sociedade demanda a criação


e a manutenção de normas que regulamentem a convivência. Como essa
convivência social é influenciada, sobretudo, pelo comportamento do indiví-
duo, que pode ou não se submeter às normas, os conhecimentos científicos
da psicologia são extremamente necessários. Portanto, quando os sujeitos
manifestam dificuldades ou inaptidão para seguir as normas jurídicas, pode
surgir a necessidade do uso de instrumentos psicológicos. Estes contribuem
para que dados confiáveis, matematicamente comprováveis, possam ser
obtidos, orientando e assessorando os operadores do direito (PINHEIRO,
2019; TAVARES, 2018).
Dessa forma, a psicologia jurídica contribui para a fundamentação psico-
lógica do direito, estudando a estrutura das normas jurídicas e como elas es-
timulam as condutas humanas. Assim, apoia a medicina legal, a antropologia,
a sociologia e a economia, entre outras áreas de conhecimento, contribuindo
com os seus conhecimentos científicos a fim de compreender o sujeito no
contexto da sociedade contemporânea (PINHEIRO, 2019).

Breve histórico da psicologia jurídica


A origem da psicologia jurídica está vinculada à medicina, mais especifica-
mente à psiquiatria. Na Idade Antiga, Hipócrates (460-370 a.C.) descreveu as
doenças mentais, até hoje reconhecidas pela psiquiatria e pela psicologia
jurídica, atualmente denominadas depressão (melancolia), psicoses, fobias,
etc. Na Idade Média, essas doenças foram associadas a castigos divinos, e
os chamados “loucos” eram julgados pela lei da inquisição da Igreja Católica,
podendo ser encarcerados em prisões ou executados na fogueira. Porém, na
Idade Moderna, com o intuito de compreender as suas possíveis causas, a
ciência passou a investigar essas doenças com base nas influências biológicas
no comportamento, desmistificando a ideia de castigo divino (PINHEIRO, 2019).
Na Idade Moderna, já existiam os hospitais para as pessoas consideradas
doentes mentais. Porém, essas instituições também abrigavam criminosos,
deficientes físicos, portadores de doenças venéreas, etc., ou seja, os social-
mente marginalizados. Apesar de, na época, a loucura já ser considerada uma
doença, a medicina ainda não conseguia compreender ao ponto de intervir
com algum tratamento eficaz. Os loucos eram simplesmente considerados
incapazes de viverem em sociedade e, portanto, excluídos (PINHEIRO, 2019).
No entanto, no século XVIII, o psiquiatra francês Phillippe Pinel (1745-1826)
desenvolveu várias experiências e formas de tratamento para os doentes
mentais nos manicômios, de forma que eram separados dos demais excluídos
Psicologias do trânsito, jurídica e do esporte 9

sociais. A partir daí, começou a ser desenvolvida uma nova área de conheci-
mento, e Pinel passou a ser considerado o pai da psiquiatria. Ele propôs que o
tratamento dos doentes mentais deveria ser voltado para a sua reeducação,
de modo que deixassem de apresentar comportamentos inadequados e
aprendessem a respeitar as normas (PINHEIRO, 2019).
Dessa forma, a psiquiatria, no século XIX, tinha uma função disciplinadora,
de forma a exercer o controle sobre as questões sociais para que o espaço
urbano fosse mantido em ordem. Assim, utilizava os conhecimentos e re-
cursos científicos desenvolvidos pelos pesquisadores da área para resolver
os problemas que poderiam causar desordens sociais, como o alcoolismo,
a prostituição, o jogo e o crime. Com relação aos pesquisadores, pode-se
citar quatro que entraram para a história da psiquiatria pelas suas teorias,
influenciando a sua época em relação não apenas à forma como a doença
mental deveria ser compreendida, mais principalmente à forma como a per-
sonalidade com tendências criminosas poderia ser identificada, ou seja,
associando crime e loucura (PINHEIRO, 2019).
Um deles foi o médico alemão Franz Joseph Gall (1758-1828), com formação
em neuroanatomia e fisiologia. Ele foi pioneiro no estudo da localização das
funções mentais no cérebro, defendendo o conceito de frenologia. Segundo
esse conceito, o caráter e as capacidades mentais estariam relacionadas
ao tamanho do crânio, ou seja, a forma da caixa craniana e o seu tamanho
possibilitariam diagnosticar personalidades socialmente inadequadas. Assim,
pela análise das irregularidades do crânio de um indivíduo, seria possível
mapear a sua personalidade, pois, para os frenólogos, cada faculdade com-
plexa da personalidade humana teria uma localização cerebral específica. Na
atualidade, porém, vários estudos comprovam que essa teoria era equivocada,
uma vez que a formação da personalidade é influenciada por vários fatores
biopsicossociais (SOUZA; SCHERER, 2020).
Por sua vez, Pinel, como já mencionado, promoveu a transformação dos
hospícios em instituições de tratamento, não meramente de isolamento,
como eram tratadas até então. Para isso, legitimou a loucura como entidade
patológica caracterizada como distúrbio no âmbito das paixões e fundou os
primeiros hospitais psiquiátricos europeus.
A hospitalização integral como forma inicial de tratamento também é um
legado de Pinel, que acreditava que o afastamento do doente do mundo ex-
terno era ferramenta para a descrição diagnóstica precisa e o distanciamento
de interferências prejudiciais. Entretanto, para Pinel, a hospitalização seria
um processo de observação completa do enfermo e cura, diferente, então,
do processo de reclusão social e morte visto até então nos hospícios. Ele
10 Psicologias do trânsito, jurídica e do esporte

observou a influência da hereditariedade na evolução do distúrbio mental


e apontou as causas morais como as mais prováveis para a alienação. Por
todo o século XIX, outros alienistas deram continuidade a esses conceitos a
partir das observações feitas por Pinel. Apesar da ênfase dada ao fato de a
hereditariedade ter variado, na segunda metade do século XIX, ela passou a ser
apontada como um fator-chave no desenvolvimento das perturbações mentais.

Pinel considerava a alienação mental como qualquer outra doença


orgânica, por concebê-la como um distúrbio das funções intelectuais
(funções superiores do sistema nervoso), sem a constatação de inflamação ou
lesão estrutural.
Para explicar a loucura, o alienista identificou três causas:
„ as causas físicas, que se ligavam às fisiológicas;
„ as causas relacionadas à hereditariedade;
„ as causas morais, ou seja, as paixões intensas, excessos de todos os tipos e
irregularidades dos costumes e hábitos da vida.
Assim, defendia a cura da loucura por meio do chamado tratamento moral,
que consistia em uma ampla pedagogia normalizadora, com horários e rotina
rigidamente estabelecidos, medicamentos receitados somente pelo médico e
atividades de trabalho e lazer (PINHEIRO, 2019).

O psiquiatra italiano Cesare Lombroso (1835-1909), outro pesquisador de


renome na área, defendia a teoria de que o comportamento criminoso é ge-
neticamente determinado, de modo que seria possível identificar o indivíduo
criminoso pelas suas características físicas. Em 1876, ele descreveu, em O
homem delinquente, a constituição orgânica do delinquente nato. Nesse livro,
ele apresenta o resultado dos seus estudos descrevendo as características
físicas de quem tem predisposição para cometer um ato criminoso. Essas
características incluiriam a cor mais escura da pele, a estrutura óssea, o
tamanho das mandíbulas, etc. No entanto, ele também considerava que esses
indivíduos com tendência ao crime seriam portadores de alguma patologia
ou transtorno orgânico, sendo o crime um fenômeno biológico. Essa teoria
perdurou por muito tempo, contribuindo para que preconceitos fossem es-
tabelecidos em relação à aparência das pessoas, criminalizando algumas e
colocando outras acima de qualquer suspeita devido à constituição física
(PINHEIRO, 2019; SOUZA; SCHERER, 2020).
Por sua vez, o psiquiatra francês Jean-Étienne Dominique Esquirol (1772-
1840) deu continuidade ao tratamento proposto por Pinel e criou a concepção
médico-moral. Nessa concepção, a loucura não era considerada apenas orga-
Psicologias do trânsito, jurídica e do esporte 11

nicista, pois ele considerava os aspectos psicológicos como um dos principais


fatores para a determinação da doença mental. Assim, a loucura passava a
ser considerada uma doença possível de ser tratada e revertida. Portanto,
cada indivíduo acometido de sintomas característicos da anormalidade nas
suas funções mentais deveria ser observado considerando as experiências
vividas, e o tratamento seria pelo viés educativo, com o intuito de corrigir
erros de tomadas de decisão que levaram o indivíduo a se afastar de um
comportamento normativo. Portanto, o tratamento não utilizava apenas
compreensão, mais também confrontação e persuasão, visando a afetar
emocionalmente o paciente a fim de que adotasse pensamentos e raciocínios
que o levassem a ter um comportamento mais de acordo com as normas
sociais, ou seja, considerado normal (PINHEIRO, 2019).
Influenciada por esses pesquisadores, a psiquiatria passou a tentar articu-
lar as doenças mentais com o ato criminoso, de forma que o seu foco principal
se voltou ao estudo do funcionamento mental dito normal. A psicologia jurídica
surgiu nesse contexto, sendo um marco de consolidação dessa disciplina a
publicação do livro No banco das testemunhas, em 1908, de Münsterberg.
Nesse livro, o autor descreve a influência dos fatores psicológicos no desfecho
de um julgamento, demostrando o seu interesse em estudar as distorções
da percepção humana ao testemunhar um crime, por mais recente que este
seja (SOUZA; SCHERER, 2020).
Dessa forma, a psicologia jurídica surgiu no início do século XX como mais
um campo de atuação do psicólogo, buscando investigar como a subjetivi-
dade pode influenciar um ato criminoso e estabelecendo interpretações a
fim de contribuir com a compreensão do ato ocorrido. Porém, a psicologia
foi além dos estudos sobre os fenômenos que influenciam o surgimento das
doenças mentais, dedicando-se mais à investigação dos processos mentais
ditos normais (PINHEIRO, 2019).

Atuação da psicologia no campo jurídico


A aproximação entre psicologia e direito ocorreu, primeiramente, no campo
penal, com estudos direcionados ao adulto criminoso e ao adolescente infrator.
O objetivo era assessorar os magistrados nas suas atividades de julgamento
utilizando instrumentos psicológicos, principalmente os testes, a fim de
estabelecer psicodiagnósticos. Portanto, no início do século XX, a prática
do psicólogo jurídico voltou-se para a testagem com fins diagnósticos, que
também envolve a elaboração de laudos, pareceres e relatórios (AMORIM,
2015; TAVARES, 2018).
12 Psicologias do trânsito, jurídica e do esporte

No entanto, apesar de subsidiar as sentenças judiciais, não cabe ao psicó-


logo determinar como os procedimentos jurídicos devem ser encaminhados,
pois a decisão judicial é função do juiz. Ao psicólogo, cabe apenas orientar e
recomendar possíveis soluções com base na sua avaliação. Portanto, a psi-
cologia jurídica, em linhas gerais, é uma área de conhecimento da psicologia
que contribui para a elaboração de normas jurídicas adequadas, colaborando
com o sistema de aplicação dessas normas (AMORIM, 2015; PINHEIRO, 2019).
Na legislação brasileira, por exemplo, o psicólogo judiciário é o denominado
perito, um profissional que atua mediante intimação do juiz, assessorando
a justiça sem envolvimento com as partes envolvidas. Ou seja, é vedado, ao
psicólogo perito, qualquer contato prévio, pessoal ou profissional entre ele
e o periciando, de forma a garantir a imparcialidade do seu parecer. Assim,
deve emitir laudas apenas com base na avaliação realizada e de acordo com
o referencial teórico e técnico da ciência psicológica.

Assistente técnico não é o mesmo que perito. Assistente técnico é o


profissional contratado pelas partes envolvidas no processo judicial.
O assistente técnico psicólogo, por ser um profissional de confiança de uma das
partes, deve assessorá-la, avaliando tecnicamente a análise e as conclusões
fornecidas pelo psicólogo perito. A sua análise deve ser restrita ao processo de
perícia e ao laudo psicológico resultante, com a finalidade de garantir a ampla
defesa do seu cliente. Atua, portanto, de forma parcial (SOUZA; SCHERER, 2020).

A psicologia jurídica está presente em todas as áreas do direito, sendo as


áreas principais o Direito da Família, o Direito da Criança e do adolescente, o
Direito Civil, o Direito Penal e o Direito do Trabalho. Cada uma dessas áreas
demanda formas diferente de atuação (AMORIM, 2015; TAVARES, 2018), conforme
pode ser visto no Quadro 1.
Psicologias do trânsito, jurídica e do esporte 13

Quadro 1. Atuação do psicólogo jurídico nas distintas área do direito

Área Como atua o psicólogo jurídico

Direito da família Atua em processos de separação e divórcio,


disputa de guarda e regulamentação de visitas.
É especialmente aplicável o uso de técnicas
de solução de conflitos alternativas, como a
mediação, em que o psicólogo pode facilitar a
comunicação, contribuindo para estabelecer limites
e possibilidades de cada parte e as consequências
de uma decisão. Além disso, o psicólogo pode
estudar aspectos relacionados a casos como, por
exemplo, separação e divórcio, disputa de guarda
e regulamentação de visitas, acusações de abuso
sexual, adoção e outras situações que podem estar
envolvidas nos processos.

Direito Civil Atua nos processos em que são requeridas


indenizações por danos psíquicos e em casos de
interdição judicial e nomeação de curador. O dano
psíquico se refere a sequelas, tanto emocionais
quanto psicológicas, devido a algum fato
traumatizante. A interdição se refere à incapacidade
por enfermidade ou deficiência mental que impede
o sujeito de ter o discernimento necessário para
exercer os atos da sua vida.

Direito Penal Costuma ser requisitado como perito para averiguar


periculosidade, as condições de discernimento
ou sanidade mental das partes em litígio ou em
julgamento e a execução de trabalho junto aos
comprovadamente doentes mentais que cometeram
algum delito.

Direito da Criança e do Atua junto aos processos de adoção e destituição de


Adolescente poder familiar e no desenvolvimento e na aplicação
de medidas socioeducativas de adolescentes
autores de ato infracional. Além disso, o psicólogo
pode aplicar técnicas de solução de conflitos
alternativas, como a mediação, facilitando a
comunicação e, portanto, contribuindo para
estabelecer os limites e as possibilidades de cada
parte e as consequências de uma decisão.

Direito do Trabalho Atua como perito em processos trabalhistas


realizando avaliações em forma de vistoria para
averiguar a relação entre as condições de trabalho e
as consequências na saúde mental do indivíduo.
14 Psicologias do trânsito, jurídica e do esporte

Apesar de, no contexto jurídico, a prática do psicólogo consistir, basi-


camente, em avaliações (confeccionando laudos, pareceres e relatórios),
ao longo dos anos, têm ganhado espaço novas formas de atuação, como
no campo da vitimologia, em que o psicólogo deve traçar o perfil da vítima
mediante a avaliação da sua personalidade. Além disso, pode envolver-se nos
estudos sobre o transtorno de personalidade antissocial e as psicopatias.
Também vêm sendo desenvolvidos estudos da psicologia do testemunho,
em que é avaliada a veracidade dos depoimentos das testemunhas e dos
suspeitos. Essa área está atrelada aos estudos sobre as falsas memórias e à
utilização de relatos espontâneos ou por interrogatório, cujo objetivo é dar
suporte ao depoimento sem danos. Portanto, são necessários constantes
aprimoramentos e inovações nos seus instrumentos técnicos e científicos
(AMORIM, 2015; TAVARES, 2018).
Nesta seção, você viu que a aproximação entre psicologia e direito ocor-
reu, primeiramente, no campo penal, com estudos direcionados ao adulto
criminoso e ao adolescente infrator. O objetivo era prestar assessoramento
aos magistrados nas suas atividades de julgamento utilizando instrumentos
psicológicos, sobretudo testes, visando a estabelecer psicodiagnósticos. Além
disso, você viu como se dá a prática profissional do psicólogo como perito
e assistente jurídico, bem como as áreas do direito em que ele pode atuar.

Psicologia do esporte
O objetivo da psicologia do esporte é estudar os efeitos psíquicos que podem
interferir nos seres humanos antes, durante e depois de praticar um exercício
ou atividade esportiva. As suas investigações científicas estão focadas em
temas como motivação, personalidade, agressão, violência e liderança, re-
lacionamento interpessoal de equipes, bem-estar psicológico, pensamentos
e sentimentos, entre outros, de acordo com as necessidades que a área do
esporte vai demandando. Essas investigações têm o propósito de promover
a saúde e o bem-estar psicológico do atleta e de qualquer praticante de ati-
vidade esportiva, educando e promovendo o autoconhecimento na busca do
desenvolvimento de comportamentos que demonstrem equilíbrio psíquico e
melhorem o desempenho esportivo (MEDEIROS; LACERDA, 2017; RUBIO, 2002).
Na atualidade, o esporte tem um papel significativo na cultura e na socie-
dade mundial, colocando em cena emoções, sentimentos, esforços, tempo
e energia. Assim, é necessária a articulação da educação física com outras
áreas de conhecimento, como a área sociocultural, que abrange as disciplinas
de filosofia, psicologia, antropologia e sociologia do esporte, assim como
Psicologias do trânsito, jurídica e do esporte 15

com as ciências biológicas e da saúde, que abrangem medicina, fisiologia,


biomecânica e medicina do esporte. Essa articulação que vem ocorrendo
indica uma tendência à interdisciplinaridade, justificada pela demanda por
uma melhor preparação dos atletas (MEDEIROS; LACERDA, 2017; RUBIO, 2002).
Para uma preparação adequada, é preciso navegar por várias especia-
lidades, focando na parte técnica, tática e psicológica do atleta. De fato,
para que o equilíbrio técnico possa ser alcançado, os aspectos emocionais
são um importante diferencial, sobretudo nos momentos decisivos. Nesse
caso, a psicologia do esporte é uma disciplina com bastante relevância, visto
que o rendimento não depende apenas de habilidades motoras, mas de um
conjunto de fatores internos e externos aos atletas (MEDEIROS; LACERDA,
2017; RUBIO, 2002).

Breve histórico da psicologia do esporte


No final do XIX, alguns estudiosos, como Coleman Roberts Griffith (1893-1966),
começaram a pesquisar os efeitos psicofisiológicos sobre as atividades físicas
e esportivas. Coleman, psicólogo americano, contribuiu com as suas pesqui-
sas para a origem da psicologia do esporte por meio de publicações como A
psicologia do coaching, de 1926, e A psicologia dos atletas, de 1928. Nessas
publicações, ele já chamava a atenção para a importância de o treinador ter
conhecimentos não apenas sobre atletismo, mas também sobre fisiologia e
psicologia para ter sucesso. Nos anos 1960, outros pesquisadores, como Cratty,
Solvenko e Antonelli, por exemplo, também contribuíram com publicações
que ressaltavam a importância da psicologia social para a atividade física e
o esporte (MEDEIROS; LACERDA, 2017; RUBIO, 2002).
No Brasil, a psicologia do esporte teve início nos anos 1950, quando João
Carvalhaes, um profissional com grande experiência em psicometria, iniciou
o seu trabalho no São Paulo Futebol Clube, em que permaneceu por quase
20 anos. João integrou a comissão técnica da seleção brasileira em 1958,
quando ela conquistou o título mundial, antes mesmo da regulamentação
da profissão de psicólogo. Ele teve toda a sua trajetória profissional ligada
à psicologia do trabalho, atuando na avaliação de trabalhadores por meio
de testes psicológicos em empresas de transporte público de São Paulo
(MEDEIROS; LACERDA, 2017; RUBIO, 2002).
Na Copa do Mundo de 1962, no Chile, Athayde Ribeiro da Silva acompanhou
a equipe de futebol da seleção brasileira, dando continuidade à história da
psicologia do esporte e contribuindo para o seu desenvolvimento. Ele escreveu
dois livros: Futebol e psicologia, em 1964, em que conta a sua experiência
16 Psicologias do trânsito, jurídica e do esporte

com a seleção brasileira de futebol, e Psicologia esportiva e preparo do


atleta, em 1967. Em 1953, ingressou no Instituto de Seleção e Orientação
Profissional (ISOP), onde se aprofundou nos estudos dos testes psicológicos
que posteriormente utilizaria com a seleção brasileira. Na época, ainda não
havia obtido a habilitação de psicólogo, o que só foi possível em 1962, após a
regulamentação da profissão. Com a regulamentação, foi reconhecido como
profissional de psicologia quem já vinha exercendo a profissão por mais
de cinco anos. Dessa forma, ele obteve o registro profissional de psicólogo
(MEDEIROS; LACERDA, 2017; RUBIO, 2002).

Por ser objeto de frequentes mudanças e renovações, a atividade


física, incluindo o esporte, demanda que o profissional esteja
sempre atualizado, buscando novas fontes de informação em uníssono ao
desenvolvimento da prática. As investigações científicas da área englobam
os conhecimentos da psicologia aplicada a ações como observação, análise
e intervenção para uma melhor compreensão do comportamento humano no
contexto do esporte (MEDEIROS; LACERDA, 2017; RUBIO, 2002).

A partir da década de 1970, a preparação psicológica de atleta avançou


para outras modalidades e começou a se desenvolver em várias regiões do
país, contribuindo para o desenvolvimento e a consolidação da psicologia
do esporte como uma área de conhecimento. Assim, passou a fazer parte do
currículo do curso de educação física. Desde então, a psicologia do esporte
vem ampliando o seu campo de atuação.
Na atualidade, o campo não se restringe ao esporte de alto rendimento,
mas também engloba praticantes de esporte recreativo, de esporte educa-
cional com enfoque socioeducativo e a reabilitação de atletas lesionados e de
pessoas com necessidades especiais. Porém, ainda são encontrados alguns
retrocessos, como profissionais atuando como psicólogos sem a devida
habilitação, além da falta de interesse de algumas entidades esportivas em
integrar um psicólogo à equipe (MEDEIROS; LACERDA, 2017).
Psicologias do trânsito, jurídica e do esporte 17

O alto desempenho geralmente está relacionado aos esportes pro-


fissionais, como natação, corrida, voleibol, futebol e basquete. Os
atletas profissionais têm a obrigação de manter um nível de desempenho e
condicionamento físico que lhes permita sustentar altos níveis de treinamento.
A ideia de rendimento desportivo, por conseguinte, diz respeito aos êxitos
obtidos ou esperados dos atletas/praticantes de desporto. Para aumentar/
otimizar o rendimento desportivo, os atletas devem estar em condições (inclusive
emocionais) de explorar os seus recursos ao máximo.
O trabalho psicológico especial para o esporte de alta competição se res-
ponsabiliza por garantir que o atleta esteja em condições de se apresentar na
competição com um estado ideal de rendimento. Assim, o psicólogo deve buscar
eliminar os estados desfavoráveis no atleta, aqueles que possam interferir no
seu bom desempenho durante a competição.

Atuação do psicólogo no contexto do esporte


A psicologia do esporte abrange a prática esportiva global e se insere nas
mais diferentes modalidades. Por ser uma área diversificada, é responsa-
bilidade do psicólogo conhecer a teoria e a prática da modalidade na qual
vai atuar, bem como as suas especificidades. Só assim estará apto a aplicar
as técnicas psicológicas de acordo com as necessidades de cada atleta ou
equipe, visando a melhorar a saúde mental e a qualidade de vida dos sujeitos
(MEDEIROS; LACERDA, 2017).
Nas modalidades individuais, em que o foco da intervenção psicológica é o
próprio atleta e o seu desempenho, a atuação do psicólogo tem o objetivo de
melhorar a concentração, o controle da ansiedade e o manejo das variações
ambientais. Para isso, técnicas psicológicas como relaxamento, técnicas
expressivas ou corporais e inversão de papéis são muito utilizadas. Já nas
modalidades coletivas, em que o foco da intervenção psicológica recai sobre
as relações grupais, a atuação do psicólogo está direcionada para melhorar
a formação de vínculo e a organização de liderança. Para isso, as técnicas
psicológicas mais utilizadas são os jogos dramáticos, o desenvolvimento do
autoconhecimento e procedimentos verbais para grupos (CONDE et al., 2019;
MEDEIROS; LACERDA, 2017; RUBIO, 2002).
Tratando-se de alto rendimento, em que o componente emocional é de-
terminante para o alcance de um ótimo desempenho, a psicologia do esporte
é composta de uma equipe multidisciplinar, com médico, fisioterapeuta,
nutricionista, fisiologista, preparador físico, treinador, etc. Nesse contexto,
a intervenção psicológica tem o objetivo de ensinar estratégias comporta-
18 Psicologias do trânsito, jurídica e do esporte

mentais e cognitivas para o atleta superar as suas dificuldades e otimizar


o seu rendimento em treinos e competições. Para alcançar esse objetivo, o
psicólogo precisa estudar o comportamento do atleta, ou seja, o que ele faz,
como pensa e sente, a fim de propor os procedimentos técnicos necessários
para modificar comportamentos que não estão sendo funcionais (CONDE et
al., 2019; MEDEIROS; LACERDA, 2017; RUBIO, 2002).
Portanto, as intervenções psicológicas podem ocorrer em modalidades
individuais ou coletivas e nas atividades de alto desempenho. Porém, o psi-
cólogo do esporte também pode atuar no esporte educativo, com o objetivo
de compreender os processos de formação e desenvolvimento das crianças
e adolescentes ou adultos iniciantes na prática esportiva. Também pode
atuar na reabilitação esportiva, visando a promover a reinserção social de
atletas lesionados ou de atletas com alguma deficiência (CONDE et al., 2019;
MEDEIROS; LACERDA, 2017; RUBIO, 2002).
Com relação às intervenções, o psicólogo pode propor um programa
composto por etapas importantes do que será feito, visando tanto ao desen-
volvimento do trabalho quanto a facilitar o entendimento para as pessoas
envolvidas. Para elaborar esse programa, os seguintes passos são essenciais
(CONDE et al., 2019; MEDEIROS; LACERDA, 2017; RUBIO, 2002).

1. O primeiro passo se refere ao contato inicial com o atleta ou a equipe


(incluindo os treinadores e a equipe técnica). Nesse contato, é impor-
tante esclarecer os objetivos a serem alcançados com a intervenção
psicológica e ouvir as demandas que já existem.
2. O segundo passo consiste em realizar avaliação psicológica, mais co-
nhecida como psicodiagnóstico esportivo. A sua finalidade é identificar
o nível de desenvolvimento das funções cognitivas e emocionais do
atleta, possibilitando prever os possíveis resultados esportivos. Na
avaliação individual, são utilizadas as técnicas de entrevistas, testes
psicológicos e observação de conduta tanto em treino quanto em com-
petições. Na avaliação em grupo, além das técnicas anteriores, podem
ser utilizados questionários adicionais e sociometria, e a observação
será referente à conduta do grupo.

Neste capítulo, você leu a respeito das áreas da psicologia do trân-


sito, jurídica e do esporte, com destaque para os marcos históricos que
contribuíram para o surgimento e o desenvolvimento dessas áreas. Além
disso, você viu a importância da psicologia nesses contextos diversificados
e as diversas formas como o psicólogo pode neles atuar, ampliando o leque
Psicologias do trânsito, jurídica e do esporte 19

de possibilidades para o desenvolvimento de pesquisas e intervenções


psicológicas.

Referências
AMORIM, S. M. A psicologia e suas contribuições nas práticas jurídicas. Revista Vox,
v. 1, p. 68-74, 2015.
BRASIL. Decreto-lei nº 2.994, de 28 de janeiro de 1941. Código Nacional de Trânsito. Rio
de Janeiro: Presidência da República, 1941. Disponível em: https://www2.camara.leg.
br/legin/fed/declei/1940-1949/decreto-lei-2994-28-janeiro-1941-412976-publicacaoo-
riginal-1-pe.html. Acesso em: 9 set. 2022.
BRASIL. Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997. Institui o Código de Trânsito Brasileiro.
Brasília, DF: Presidência da República, 1997. Disponível em: http://www.planalto.gov.
br/ccivil_03/leis/l9503compilado.htm. Acesso em: 9 set. 2022.
CFP. Resolução nº 1, de 7 de fevereiro de 2019. Brasília, DF: CFP, 2019. Disponível em: https://
www.in.gov.br/ontent/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/ontente/id/62976927/do1-2019-
-02-12-resolucao-n-1-de-7-de-fevereiro-de-2019-62976886. Acesso em: 9 set. 2022.
CONDE, E. et al. (org.). Psicologia do esporte e do exercício: modelos teóricos, pesquisa
e intervenção. São Paulo: Pasavento, 2019.
CONTRAN. Resolução Contran nº 425 de 27/11/2012. Brasília, DF: Contran, 2012. Dispo-
nível em: https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=247963. Acesso em: 9 set. 2022.
CRISTO, F. (org.). Psicologia do trânsito e transporte: manual do especialista. São
Paulo: Vetor, 2019.
CRUZ, R. M.; WIT, P.; SOUZA, C. Z. (org.). Manual de psicologia do trânsito. 2. ed. São
Paulo: Vetor, 2020.
MEDEIROS, C.; LACERDA, A. (org.). Psicologia e esporte na atualidade: reflexões neces-
sárias. São Paulo: Pasavento, 2017.
PINHEIRO, C. Manual de psicologia jurídica. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2019.
RUBIO, K. Origens e evolução da psicologia do esporte no Brasil. Biblio 3W, v. 7, n. 373,
2002.
RUEDA, F. J. M.; GUIMARÃES, J. B. Psicologia do trânsito: conquistas históricas, ADI 3481
e perspectivas para a área. Psicologia: Ciência e Profissão, v. 41, p. 1-13, 2021.
SOUZA, A. P.; SCHERER, D. C. Psicologia jurídica. Curitiba: InterSaberes, 2020.
TAVARES, K. M. C. Avaliação psicológica no contexto jurídico: demandas e práticas no
direito de família. Revista Especialize On-line, v. 1, n. 15, 2018.

Leituras recomendadas
CFP. Atuação da(o) psicóloga(o) no campo da execução penal no Brasil: relatório des-
critivo. Brasília, DF: CFP, 2019. Disponível em: https://site.cfp.org.br/wp-content/uplo-
ads/2019/12/BR84-CFP-Rel-SisPenalBrasileiro_web_vs3.pdf. Acesso em: 9 set. 2022.
CFP. Caderno de psicologia do trânsito e compromisso social. Brasília, DF: CFP, 2000.
Disponível em: https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2018/04/Caderno-de-
-Psicologia-do-Tr%C3%A2nsito-e-Compromisso-Social.pdf. Acesso em: 9 set. 2022.
20 Psicologias do trânsito, jurídica e do esporte

CFP. Psicologia do trânsito em trânsito pelo Brasil. Brasília, DF: CFP, 2012. Disponível
em: https://site.cfp.org.br/publicacao/psicologia-do-transito-em-transito-pelo-brasil/.
Acesso em: 9 set. 2022.
CFP. Referências técnicas para a atuação de psicólogas(os) em varas de família. Brasília,
DF: CFP, 2019. Disponível em: https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2019/11/
BR84-CFP-RefTec-VarasDeFamilia_web1.pdf. Acesso em: 9 set. 2022.
CFP. Referências técnicas para atuação de psicólogas(os) em políticas públicas de
esporte. Brasília, DF: CFP, 2019. Disponível em: https://site.cfp.org.br/wp-content/
uploads/2019/09/Esporte_24_setembro_FINAL_WEB.pdf. Acesso em: 9 set. 2022.

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Dica do Professor

O esporte de alto rendimento se concentra no desempenho dos atletas, com a finalidade de


aumentar seu nível de competência por meio de variados recursos e técnicas. Dessa forma, esses
atletas adquirem um condicionamento físico capaz de sustentar treinamentos mais intensos e
desafiadores, levando-os a superarem seus próprios resultados.

Nesta Dica do Professor, você vai compreender como a psicologia pode contribuir para o esporte
de alto rendimento, em que, mais do que preparo físico, exige-se do atleta preparo cognitivo e
emocional, de forma que ele consiga manter o rendimento sempre em um nível alto, obtendo
ótimos resultados, mas com bem-estar e qualidade de vida.

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Exercícios

1) De acordo com Murialdo (2020, on-line), “o Brasil registrou 27.839 indenizações pagas por
acidentes de trânsito com vítimas fatais entre janeiro e outubro de 2020”. A fim de ter uma
análise mais específica das vítimas, das regiões e das causas de acidentes de trânsito, o
Governo Federal lançou, em 2021, a primeira base nacional de dados sobre esse tipo de
ocorrência no país: o Registro Nacional de Acidentes e Estatísticas de Trânsito (Renaest).

De acordo com os estudos realizados, os acidentes de trânsito, em geral, estão


majoritariamente relacionados a qual fator?

A) Falta de sinalização adequada.

B) Condição do veículo.

C) Falha humana.

D) Falha mecânica do veículo.

E) Excesso de veículos em trânsito.

2) O psicólogo perito é um profissional nomeado pelos Tribunais de Justiça para realizar


avaliações psicológicas em pessoas envolvidas em um processo judicial. Suponha que o
terapeuta de uma criança de 5 anos foi nomeado, por coincidência, como perito na ação de
regulamentação de visitas que envolve os pais do seu cliente. Nessas circunstâncias, o
psicólogo deve:

A) atuar como perito no caso em pauta, mediante autorização do responsável legal pela criança.

B) acatar a nomeação, dado que, pela idade de seu cliente, ele não está obrigado a sigilo
profissional.

C) solicitar ao Conselho Federal de Psicologia a autorização para atuar como perito no caso em
questão.

D) aceitar o encargo e deixar de atender a criança como terapeuta, a fim de eliminar o conflito
entre as duas formas de atuação.

E) se declarar impedido, pois questões de sigilo decorrentes de sua atuação como terapeuta
podem impedi-lo de comunicar informações importantes a terceiros.
3) A psicologia do esporte atua a partir de intervenções no contexto esportivo com atletas,
equipes, treinadores, dirigentes, etc. Considerando-se que as instituições esportivas, de um
modo geral, enfatizam muito mais o rendimento do atleta do que, de fato, o seu bem-estar
emocional, cabe, cada vez mais, ao psicólogo do esporte refletir sobre sua atuação nesse
contexto.

Sobre esse contexto, assinale a alternativa correta:

A) Muitas vezes, falta aos técnicos treinamento apropriado para aprimorar sua relação com seus
atletas. Portanto, isso também deverá ser foco da intervenção do psicólogo no que se refere à
avaliação física, técnica e tática de atletas

B) Ao pensar o fenômeno esportivo atual, o psicólogo do esporte deverá ir além da superação


de marcas e recordes, pensando em nível macro (contexto da competição).

C) O preparo psicológico deve coincidir com os objetivos pessoais do atleta, e não apenas com
os objetivos políticos e financeiros do clube que, porventura, esteja patrocinando-o e/ou
investindo nele.

D) Uma vez que o foco é o rendimento (entendido como vitória no esporte atual), deve-se
eliminar os pontos frágeis ou negativos e maximizar aqueles considerados como positivos e
desejáveis.

E) O atleta deverá ser visto como mais uma peça de uma grande engrenagem chamada de
esporte, devendo-se testar diferentes estratégias que possam aumentar a adesão ao
exercício.

4) A interface entre psicologia e Direito vem ampliando a atuação profissional do psicólogo no


campo da Justiça. Mesmo consistindo em disciplinas distintas, elas têm como ponto de
intersecção o interesse em:

A) aplicação de normas.

B) comportamento humano.

C) forma de pensar do homem.

D) entendimento da sociedade.

E) busca pela verdade.

5)
De acordo com o Código de Ética de Psicologia, ao psicólogo, é vedado “ser perito, avaliador
ou parecerista em situações nas quais seus vínculos pessoais ou profissionais, atuais ou
anteriores, possam afetar a qualidade do trabalho a ser realizado ou a fidelidade aos
resultados da avaliação" (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2005, p. 10).

Isso significa que o psicólogo não pode:

A) ser perito de uma pessoa pública, sobre a qual já leu nos jornais.

B) ser perito de seu paciente que já encerrou o atendimento e com o qual não tem mais contato.

C) ser perito judicial, ainda que não tenha vínculo empregatício.

D) usar na perícia instrumentos aprovados pelo CFP, se teve participação no processo de


validação e normatização destes.

E) negar-se a realizar a perícia depois que foi nomeado.


Na prática

O objetivo do treinamento psicológico é desenvolver e melhorar as capacidades cognitivas,


emocionais, motivacionais e sociais de atletas e técnicos, visando a estabilizar o comportamento
emocional durante a competição, acelerar e otimizar o processo de reabilitação e recuperação e
melhorar os processos de comunicação. Portanto, o trabalho psicológico não é algo que serve,
unicamente, aos atletas com problemas emocionais ou alterações psicológicas de qualquer tipo. Ele
se constitui como um ramo da preparação global do atleta, igual à preparação física e ao
treinamento técnico e tático.

Neste Na Prática, você vai entender melhor a atuação do psicólogo no contexto do esporte de alto
rendimento.

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Saiba mais

Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor:

Avaliação psicológica no contexto forense


Este livro aborda as técnicas e os métodos de avaliação na área forense, sendo totalmente voltado
para o âmbito da justiça brasileira. São discutidos assuntos relacionados a varas da infância e
juventude, varas de família, varas cíveis, varas criminais, entre outros.

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Contribuições dos testes para a avaliação psicológica no


trânsito
Este artigo aborda a importância dos testes psicológicos para a avaliação psicológica no trânsito e
busca descrever e mostrar como eles são essenciais para fornecer informações que possibilitem
melhorar as condições de atuação e desempenho dos profissionais de psicologia.

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A importância e os benefícios da psicologia do esporte: revisão


da literatura
Este artigo descreve a importância e os principais aspectos da psicologia do esporte, que é uma
subárea da psicologia que existe há muito tempo e vem crescendo no mundo todo. O esporte é um
promotor da saúde como um todo, aumentando a qualidade de vida do sujeito e atuando como
meio de inserção social, principalmente para sujeitos com algum tipo de deficiência, incluindo-os na
sociedade e fornecendo-lhes mais autonomia, autoconfiança e independência.
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Unidade de Estudos 5 - Psicologias
clínica, hospitalar e social

Apresentação

A compreensão da história e da atuação em psicologia faz parte da jornada inicial ao


aprofundamento na área de conhecimento. A área clínica, comumente associada com a psicologia
em geral, tem a sua história atrelada à psicologia experimental, ao pós-guerra e à imigração
europeia resultante do período.

A psicologia hospitalar surge como um ramo da psicologia da saúde, também resultante do período
de pós-guerra, quando os efeitos dos eventos mundiais podiam ser vistos nos militares, nas famílias
e na própria comunidade. Na psicologia social, o desenvolvimento parte da tentativa do
entendimento da sociedade e das interações sociais.

Nesta Unidade de Aprendizagem, você vai aprender como as psicologias clínica, hospitalar e social
se desenvolveram até se tornarem o que são hoje. Você será capaz de compreender o contexto no
qual elas nasceram, os eventos que causaram modificações em sua existência e como se dá a sua
prática.

Bons estudos.

Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

• Analisar o processo histórico da psicologia clínica.


• Descrever a psicologia hospitalar a partir da sua história.
• Reconhecer a psicologia social como área de atuação do psicólogo.
Infográfico

A psicologia clínica moderna tem diferentes tipos de entendimento teórico-clínico que norteiam a
prática dos psicólogos. Essas diferentes abordagens foram desenvolvidas ao longo da história da
psicologia clínica e, atualmente, separam-se em grandes categorias que as agrupam por tipo de
embasamento teórico e intervenções.

Neste Infográfico, você verá um pouco sobre as principais abordagens clínicas, as suas visões de
mundo e de ser humano e os principais conceitos atrelados a elas.
Aponte a câmera para o
código e acesse o link do
conteúdo ou clique no
código para acessar.
Conteúdo do Livro

A psicologia moderna foi desenvolvida de maneira relativamente recente quando comparada com
outras áreas do conhecimento, crescendo, de fato, como área de estudo a partir do século XX,
principalmente nos Estados Unidos. Com o passar dos anos, ela foi se ramificando em áreas mais
especializadas, partindo de uma origem acadêmica e tradicionalmente "de laboratório" para
encontrar campo nos mais diversos lugares.

Da psicologia moderna, a psicologia clínica, hospitalar e social se desenvolve. A psicologia clínica


surgiu de atividades de testagem psicológica e da psicoterapia; a psicologia hospitalar, como uma
demanda que foi identificada e investida no pós-guerra; e a psicologia social, como uma tentativa
de entender os povos e a sociedade por meio das interações sociais e relações de poder.

No capítulo Psicologias clínica, hospitalar e social, parte da obra Fundamentos Epistemológicos e


Históricos da Psicologia, base teórica desta Unidade de Aprendizagem, você vai aprender mais sobre
o histórico e o desenvolvimento dessas áreas de conhecimento como disciplinas e campo de
atuação prática.

Boa leitura.
FUNDAMENTOS
EPISTEMOLÓGICOS
E HISTÓRICOS DA
PSICOLOGIA
Psicologias clínica,
hospitalar e social
Laura Cesar Figueiredo

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

> Analisar o processo histórico da psicologia clínica.


> Descrever a psicologia hospitalar a partir da sua história.
> Reconhecer a psicologia social como área de atuação do psicólogo.

Introdução
A psicologia, como área de estudo, tem uma longa história, originando-se como
uma disciplina fundamentalmente interdisciplinar, conectada a diversas áreas do
conhecimento, como medicina, biologia e filosofia, dentre outras. No entanto, tem
foco e história recentes como área de conhecimento formal, com suas práticas
se desenvolvendo, de fato, no século XIX, com Wilhelm Wundt e William James.
Dessa maneira, é necessário que os desenvolvimentos atuais da área sejam
explorados e compreendidos. Para o entendimento de como as áreas de atuação
prática funcionam e se estabeleceram, suas raízes históricas e os acontecimentos
que lhes deram forma devem ser investigados.
Neste capítulo, você vai estudar a história de como a psicologia constitui-se
enquanto uma prática clínica. Além disso, vai ver como os psicólogos começaram
a atuar em ambientes hospitalares e de que forma a sociologia, a antropologia e
a psicologia se unem como constituintes da psicologia social.
2 Psicologias clínica, hospitalar e social

O desenvolvimento da psicologia como


prática clínica
A psicologia clínica inicia acompanhando o nascimento da psicologia moderna.
A psicologia moderna surge principalmente com Wilhelm Wundt, em 1879,
com seu laboratório de psicologia experimental em Leipzig, na Alemanha.
Wundt iniciou sua atuação na psicologia estudando os processos mentais
por meio de um método experimental pautado no empirismo. O empirismo
utiliza a experiência como base fundamental para conhecer o mundo e seus
fenômenos (FIGUEIREDO, 2014; HOTHERSALL, 2019; KRAMER; BERNSTEIN; PHA-
RES, 2019; MARCONDES, 2012).
Sendo assim, a psicologia experimental faz parte de uma das bases da
constituição de uma futura psicologia clínica, por meio de um dos alunos de
Wundt. Lightner Witmer é reconhecido como o criador da primeira clínica de
psicologia nos Estados Unidos, pela Universidade da Pensilvânia, em 1896. Seu
trabalho clínico se deu com crianças com dificuldades de aprendizado, atraso
na fala e no desenvolvimento, por meio de treinamentos e “aconselhamento”
(HOTHERSALL, 2019; HUMPHREYS, 1996; KRAMER; BERNSTEIN; PHARES, 2019).
O segundo componente do que viria a se tornar a psicologia clínica eram as
atividades de avaliação e mensuração das habilidades mentais e físicas. James
Cattell, que também fora aluno de Wundt, era a favor do desenvolvimento e
uso de testes para seleções e para o diagnóstico dos indivíduos. Foi ele quem
desenvolveu a primeira bateria padronizada de testes psicométricos. Além
de Cattell, Francis Galton estudava como se dava a percepção de diferenças
entre propriedades de objetos, como calor, frio, peso, etc.; e Alfred Binet de-
senvolvia testes para avaliar a inteligência e a aptidão — esse teste, revisado
por um professor da Universidade de Stanford, mais tarde seria conhecido
como Stanford-Binet (BENJAMIN JR., 2005; KRAMER; BERNSTEIN; PHARES, 2019).
Desse modo, as avaliações psicológicas passaram a ter duas vertentes:
uma liderada por Galton e Cattell, focada no aspecto sensorial e motor; e a
outra, por Binet e estudiosos que compartilhavam do mesmo interesse, focada
em funções mentais complexas, como memória e atenção. Emil Kraepelin,
psiquiatra, mais tarde seria o primeiro a escrever uma classificação padro-
nizada e formal sobre os transtornos mentais, seus sinais e sintomas. Esse
método de categorização e descrição seria utilizado novamente, inspirando o
desenvolvimento do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais
(DSM), publicado pela American Psychological Association (APA) (KRAMER;
BERNSTEIN; PHARES, 2019).
Psicologias clínica, hospitalar e social 3

Durante o período em que a psicologia clínica ia se desenvolvendo como


área de atuação, com a clínica de Witmer e as testagens das habilidades
mentais, um movimento de humanização dos doentes mentais acontecia.
Tendo como principal figura Phillipe Pinel, na Europa, os hospitais psiquiátricos
passaram a tratar os doentes mentais como pessoas e abdicar, ao longo do
tempo, de “tratamentos” com acorrentamento, afogamentos, banhos de água
gelada, etc. Esse movimento ocorreu também em outros locais, como nos
Estados Unidos, com Benjamin Rush e com a ativista Dorothea Lynde Dix; e
no Reino Unido, com William Tuke (HOTHERSALL, 2019; KRAMER; BERNSTEIN;
PHARES, 2019).
Com o advento das Guerras Mundiais, os psicólogos clínicos passaram
a ocupar outro lugar para além da aplicação de testes e da avaliação e tra-
tamento de crianças com problemas de desenvolvimento. A área clínica
passa a se consolidar de fato, no pós-guerra da II Guerra Mundial, a partir da
grande demanda para atuação junto aos veteranos de guerra, suas famílias
e as comunidades locais como um todo. Nesse início da psicologia clínica de
fato, a “cura pela fala” da psicanálise de Sigmund Freud dominou o cenário
e apresentou um novo espaço para o psicólogo clínico: o de psicoterapeuta
(BAZAR, 2014; HUMPHREYS, 1996; KRAMER; BERNSTEIN; PHARES, 2019).

A psicologia clínica, em seus primórdios, enfrentou resistência para


seu desenvolvimento, por conta dos próprios psicólogos e de médicos
psiquiatras. A psicologia era vista como uma área de estudo atrelada ao labo-
ratório e a estudos acadêmicos. A grande maioria dos psicólogos formados, na
época da abertura da clínica de Witmer, em 1896, trabalhava e estudava psicologia
experimental e não visualizava a psicologia como uma área de atendimento
clínico. Ao mesmo tempo, os médicos psiquiatras acreditavam que as terapias
deveriam ficar atreladas à prática do médico e não a de outros profissionais.

Principais abordagens em psicologia clínica


Com o desenvolvimento da psicologia como área de atuação clínica, diferentes
abordagens foram formuladas. Algumas incluem a psicodinâmica, humanista,
comportamental, cognitiva, cognitivo-comportamental e sistêmica. Serão
apresentadas algumas características gerais sobre elas.
A psicodinâmica tem sua origem na psicanálise de Sigmund Freud, que
dominou o cenário psicoterapêutico no século XX. As terapias de cunho
psicodinâmico têm similaridades com a psicanálise original, mas também
4 Psicologias clínica, hospitalar e social

apresentam diferenças, que podem variar de acordo com a corrente teórica.


A abordagem humanista surge como alternativa à psicodinâmica, no período
em que esta era dominante. Ela segue uma visão de ser humano que busca
conscientemente seu desenvolvimento (CORDIOLI; GREVET, 2019; KRAMER;
BERNSTEIN; PHARES, 2019; PLANTE, 2011).
A comportamental tem sua origem na psicologia experimental e em suas
tradições empíricas, buscando evidências que corroborem e justifiquem os
usos de determinadas técnicas em detrimento de outras. A cognitiva surge
da “revolução cognitiva” do século XX. Ela pressupõe que existe relação entre
pensamentos e emoções, e essa interação pode causar tanto bem-estar
quanto a manifestação de sintomas psicológicos. A cognitivo-comportamental
é uma fusão das abordagens cognitiva e comportamental, como forma de
complementar-se, visto que cada uma aborda problemas específicos no
indivíduo. Essa fusão se deu por serem abordagens com semelhanças em
suas bases metodológicas, ou seja, ambas buscam validação empírica de
suas intervenções (CORDIOLI; GREVET, 2019; KRAMER; BERNSTEIN; PHARES,
2019; SINGLA et al., 2017).
A sistêmica envolve, de maneira geral, grupos, famílias, casais, dentre ou-
tros grupos de indivíduos. Pressupõe que os problemas podem surgir quando
existem problemas nas interações, relações e papéis exercidos dentro desses
sistemas. Por mais que a abordagem sistêmica seja uma abordagem por si
só, ao longo do tempo as outras abordagens desenvolveram suas próprias
formas de lidar com intervenções em grupos (KRAMER; BERNSTEIN; PHARES,
2019; PLANTE, 2011).
No Quadro 1 é possível conhecer, de forma resumida, as principais abor-
dagens, com seus pressupostos, formas de diagnóstico, tratamento e figuras
importantes.
Quadro 1. Resumo das principais abordagens clínicas

Abordagem Pressupostos Diagnósticos Tratamentos Autores importantes

Psicodinâmica O comportamento surge como Problemas psicológicos Descobrimento da causa Sigmund Freud;
reação à um conflito interno, advindos do conflito que originou o sintoma, Carl Jung;
entre desejos instintivos de interno inconsciente. A identificação de qual Alfred Adler.
caráter sexual e agressivo, e a presença de sintomas é conflito interno está
necessidade de respeitar e manter a forma de esse conflito ocorrendo. Terapeuta
regras impostas pela sociedade se fazer consciente e auxilia o paciente a
e cultura. No entanto, esses ser reconhecido pelo tornar o inconsciente
conflitos se encontram sob a indivíduo. consciente.
superfície, de forma inconsciente.
Foco em experiências passadas e
infância.
Humanista O indivíduo é um ser criativo, Problemas psicológicos Identificar, compreender Carl Rogers;
com potencial, que busca se advêm de alterações e corrigir o problema, Abraham Maslow.
desenvolver quando em condições na consciência sobre as por meio de tomada
favoráveis. O comportamento é situações ou por conta de consciência e
guiado de forma consciente. Foco de restrições impostas diminuição ou retirada
no presente. ao ser, que restringem de restrições ao
seu desenvolvimento. crescimento.

(Continua)
Psicologias clínica, hospitalar e social
5
(Continuação)
6

Abordagem Pressupostos Diagnósticos Tratamentos Autores importantes

Comportamental De origem empírica, entende que Problemas psicológicos Modificação do John Broadus Watson;
o comportamento é aprendido em surgem como comportamento Ivan Petrovich Pavlov;
um ambiente. O comportamento comportamento aprendido por meio Burrhus Frederic
aprendido pode ser modificado aprendido, condicionado de modificações de Skinner.
ao alterar suas associações com o pelo ambiente. associações.
ambiente ao seu redor ou alterar o
ambiente em si. Foco no presente.
Cognitiva Cognições, ideias sobre si mesmo Problemas psicológicos Modificação de padrões Albert Ellis; Albert
e sobre as relações sociais afetam surgem como crenças de pensamento, crenças Bandura; Aaron
as emoções dos indivíduos. Foco desadaptativas e ideias desadaptativas, Temkin Beck.
Psicologias clínica, hospitalar e social

no presente. sobre si mesmo, suas por meio da contestação


habilidades e sobre os desses pensamentos.
outros.
Cognitivo- Pressupostos combinam os da Combinam aqueles Combinam aqueles John Broadus Watson;
-comportamental abordagem comportamental e da da abordagem da abordagem Ivan Petrovich Pavlov;
cognitiva. comportamental e da comportamental e da Burrhus Frederic
cognitiva. cognitiva. Skinner; Albert Ellis;
Albert Bandura; Aaron
Temkin Beck.
Sistêmica O comportamento do indivíduo está Problemas psicológicos Identificação, Salvador Minuchin;
ligado aos sistemas aos quais ele surgem de problemas compreensão e Murray Bowen; Ivan
está inserido e é um reflexo deles. nas relações entre modificação dos Böszörményi-Nagy;
Foco no histórico dos sistemas e em sistemas. problemas relacionais Mara Selvini Palazzoli.
seu momento presente. do sistema.

Fonte: Adaptado de Kramer, Bernstein e Phares (2019).


Psicologias clínica, hospitalar e social 7

As abordagens apresentadas são algumas das utilizadas na atuali-


dade. Existem outras formas de intervenções sendo desenvolvidas,
como as intervenções clínicas da psicologia positiva, mas, geralmente, as novas
intervenções acabam fazendo parte de alguma das abordagens apresentadas.
Elas englobam vários estilos de terapia e técnicas, agrupando-se por conta do
viés teórico que apresentam.

A psicologia hospitalar como área de


atuação
A psicologia hospitalar surge como um ramo especializado do campo da
psicologia da saúde. Preocupada com a saúde mental e suas consequências
no processo de saúde-doença dos indivíduos, ela busca promover a saúde
e prevenir e tratar doenças no ambiente hospitalar. Na sua configuração
contemporânea, suas atividades englobam (AZEVÊDO; CREPALDI, 2016):

„ apoio psicológico necessário para pacientes que serão submetidos


a cirurgias;
„ apoio psicológico aos familiares de pacientes que serão ou estão
internados;
„ acompanhamento de pacientes que têm condições crônicas (dor crô-
nica, internação recorrente, câncer);
„ preparação psicológica dos pacientes que passarão por procedimentos
altamente invasivos.

Foram explicitadas algumas atividades e objetivos gerais que constituem


a psicologia hospitalar. Mas como foi que a prática da psicologia adentrou
esses espaços; o que ocorreu para que ela pudesse existir hoje?

O advento da psicologia hospitalar


As bases filosóficas e epistemológicas acompanham o desenvolvimento
histórico da psicologia como área de estudo. Elas passam pelas filosofias
sobre saúde. Do período antigo e clássico, passam pela ideia da integração
do corpo e do físico, com uma natureza espiritual e/ou sobrenatural. Passam,
então, para as questões da alma humana e da religião, na época medieval. E
pelo dualismo cartesiano, com o problema da dicotomia corpo-mente e da
8 Psicologias clínica, hospitalar e social

subjetividade/objetividade, que surge na época do Iluminismo. Após todo esse


percurso histórico, essas bases culminam para a interdisciplinaridade e os
modelos clínicos de tratar o sujeito, advindos da medicina. Também passam a
englobar medicina psicossomática, as ciências sociais, epidemiologia e saúde
pública ao modelo de entendimento de saúde mais atual, o biopsicossocial
(FRIEDMAN, 2011; FRIEDMAN; SILVER, 2006).
No entanto, as primeiras manifestações do que viria a ser a psicologia
hospitalar, no cenário internacional, correspondem com o período após a II
Guerra Mundial. Identificaram-se sinais e sintomas comuns em indivíduos que
haviam participado da guerra, como transtornos de humor, percepção, etc.,
sintomas que não tinham causa biológica. Nesse âmbito, os profissionais de
psicologia atuavam de forma a identificar possíveis repercussões psicológicas
advindas de eventos traumáticos (neste caso, da guerra), mas também as
consequências psicológicas do processo de adoecimento e das internações
hospitalares, com o objetivo de diminuir consequências negativas e alterações
de aspectos mentais e emocionais (AZEVÊDO; CREPALDI, 2016; JONES, 2010).

O que conhecemos atualmente como transtorno do estresse pós-trau-


mático (TEPT) foi identificado e desenvolvido a partir das experiências
documentadas no pós-guerra da I e II Guerras Mundiais. As manifestações
comumente associadas a esse transtorno eram inicialmente pensadas como
um “tormento da alma” ou “falta de força moral”. A presença desses sintomas
foi chamada de shell shock e combat stress reaction (neurose de guerra, em
português), para, somente mais tarde, receber a nomenclatura de transtorno
de estresse pós-traumático. Apesar de existirem registros históricos desses
sintomas, tão antigos quanto em escritos da Mesopotâmia, na época da guerra,
os sintomas desafiaram os profissionais da saúde, por, geralmente, não existirem
causas físicas que os justificassem.

Ao longo dos anos, o entendimento do tratamento e cuidado em saúde


foi se alterando, constituindo uma perspectiva que envolvia mais interdis-
ciplinaridade e a compreensão clínica de várias outras áreas da saúde do
que somente o entendimento médico. Na década de 1970, as atividades de
atuação do psicólogo no hospital foram definidas pela APA, e foram feitas
pesquisas na área para verificar e justificar as atividades atribuídas e o papel
do profissional neste local. No final dessa década, em 1978, a divisão 38 da
APA surge como a Society for Health Psychology (AZEVÊDO; CREPALDI, 2016;
ENRIGHT et al., 1990).
Nos anos 1980, esse desenvolvimento continuou acontecendo: as téc-
nicas, o local de trabalho e os objetivos da psicologia da saúde (e como
Psicologias clínica, hospitalar e social 9

consequência, a hospitalar) foram explorados e organizados. Os objetivos


foram definidos como:

„ estudo da etiologia de doenças;


„ desenvolvimento de diversas intervenções psicológicas para promoção
de saúde, prevenção e tratamento de doenças;
„ diálogo com o poder público para a identificação e desenvolvimento
de políticas públicas em saúde.

Nesse período, a APA realizou a regulamentação da prática da psicologia da


saúde e hospitalar, com o desenvolvimento de materiais e manuais contendo
diretrizes para a atuação profissional (AZEVÊDO; CREPALDI, 2016; ENRIGHT et
al., 1990; IZUTSU; HISHINUMA, 2005; TOVIAN; ROZENSKY; SWEET, 2003).
A Figura 1 apresenta, em formato de linha do tempo, alguns marcos his-
tóricos da psicologia hospitalar no contexto mundial.

Figura 1. Linha do tempo da história da psicologia hospitalar


Fonte: Adaptada de Azevêdo e Crepaldi (2016) e Enright et al. (1990).
10 Psicologias clínica, hospitalar e social

Já no Brasil, o desenvolvimento da psicologia hospitalar se deu de maneira


um pouco diferente. O início também se deu no período pós-guerra, come-
çando de maneira gradual em 1950. A partir desse período, poucos psicólogos
atuavam em hospitais, e a principal atividade era prestar apoio psicológico
a crianças que foram hospitalizadas e seus familiares, principalmente em
hospitais infantis. O desenvolvimento como área de atuação seguiu como um
campo no qual poucos profissionais atuavam, até os anos 1970, quando as
atividades do psicólogo no hospital foram permitidas em institutos e centros
de ortopedia, psiquiatria, neurologia e pediatria em hospitais de clínicas
da região de São Paulo (AZEVÊDO; CREPALDI, 2016; JACÓ-VILELA, 2011). Nesse
período, o psicólogo começa a ganhar espaço em ambientes hospitalares,
mas suas atribuições e atividades ainda precisavam de desenvolvimento.
Ainda na década de 1970, a necessidade de organização da atuação nesse
campo em especial gerou a criação e a divulgação de cursos de capacitação
em psicologia hospitalar em São Paulo. Na década de 1980, o desenvolvimento
da psicologia hospitalar se intensificou, com novos cursos e eventos na área.
Nos anos 1990 foram criadas a Sociedade de Psico-Oncologia e a Sociedade
Brasileira de Psicologia Hospitalar. Nos anos 2000, a psicologia foi incluída
como profissão da saúde em programas de residência multiprofissional.
Atualmente é reconhecida como área de saúde e parte fundamental de serviços
de saúde (AZEVÊDO; CREPALDI, 2016).

O psicólogo hospitalar é presença obrigatória para prestação de


serviços psicológicos no hospital em unidades de tratamento inten-
sivo I e II, unidades de diálise, para atendimento de gravidez de alto risco e em
unidades de tratamento geriátrico. O psicólogo hospitalar também pode atuar
com o tratamento da obesidade, com pacientes crônicos, pacientes oncológicos
e com problemas cardíacos.

A psicologia social e a busca pelas


transformações sociais
A psicologia social faz parte da grande área da psicologia. Sua especificação,
como área do conhecimento, se dá pelo seu foco. Enquanto aquilo que é estudado
ainda é o ser humano, as relações sociais e interações entre sujeitos e sociedade
ganham caráter central. Essa área se preocupa em descrever, estudar e explicar
como se dão as interações sociais (GERGEN; BOECHAT; PORTUGAL, 2008).
Psicologias clínica, hospitalar e social 11

Ela tem seu início na Europa, mas seu desenvolvimento se dá nos Estados
Unidos durante o século XX. Na Europa, a ideia inicial para seu posterior
crescimento se dá com o início da psicologia como área de estudo formal.
Wundt planejava o desenvolvimento de duas áreas relacionadas à psicologia:
a que se tornou a psicologia experimental, proveniente da ideia de uma
Naturwissenschaft (ciência natural, em alemão), com caráter experimental e
empírico; a segunda ideia vinha do estudo dos povos, seus mitos, tradições e
organização, como uma Geisteswissenschaft (ciência do espírito, em alemão),
com a observação como método (ALMEIDA, 2012; FARR, 1998).
Existem algumas vertentes da psicologia social, mas duas em específico
serão abordadas no momento: a psicológica e sociológica. A psicologia social
psicológica foi, por muito tempo, a teoria dominante dentro da psicologia
social. Como características gerais, essa vertente estava mais interessada no
aspecto individual das pessoas, tendo uma individualização das manifestações
da sociedade. Também apresentava influências cognitivas, comportamentais
e do empirismo. Em seu desenvolvimento nos Estados Unidos, ela se tornaria
mais próxima das ciências naturais, por meio de seus métodos de estudo e
entendimento do ser humano, com a tendência de pender para o lado mais
biológico. Outra característica importante, da qual surgiriam críticas a essa
vertente, é seu a-historicismo, considerando o sujeito desvinculando da
sociedade (ALMEIDA, 2012; ÁLVARO; GARRIDO, 2003; FARR, 1998).
Em comparação, a outra vertente, a psicologia social sociológica, recebe,
inicialmente, influências da psicologia social comparativa, a partir do material
Handbook of Social Psychology, que trazia um olhar mais próximo da possibi-
lidade de existir influências sócio-históricas nas relações e interações sociais,
que são passíveis de estudo. Ela surge, em seus primórdios, no pós-guerra
da Europa, com a teoria das representações sociais, de Serge Moscovici. Os
estudos de Moscovici inspiravam-se em algumas ideias de Émile Durkheim, re-
lacionadas às representações individuais (do âmbito da psicologia) e coletivas
(do âmbito da sociologia) e ao dinamismo entre representações. A teoria das
representações sociais seria, mais tarde, resgatada para compor os trabalhos
de estudiosos da América Latina (ALMEIDA, 2012; ÁLVARO; GARRIDO, 2003).
Na América Latina, a área de conhecimento da psicologia social buscava
soluções para problemas regionais e locais, com a finalidade de desenvolver
uma tomada de consciência da população sobre as ideologias hegemônicas
e as relações de poder que poderiam ou já haviam levado à subjugação.
Ainda na América Latina, especificamente no Brasil, a psicologia social vê o
nascimento e o desenvolvimento do olhar da psicologia sócio-histórica. Isso
se deu a partir de livros e cursos na área de psicologia social, no período de
12 Psicologias clínica, hospitalar e social

1930 e 1940. Esses materiais deram abertura a um novo olhar, da vertente


sociológica e da multidisciplinaridade (ALMEIDA, 2012).
Juntamente a isso, foram encontradas algumas questões teóricas e de
aplicação nos contextos da América Latina. Muitos dos conceitos e técnicas
não eram condizentes com a forma de vida, as interações e as relações dos
países sul-americanos. A crise teórica advinda desse pontapé inicial gerou
críticas à vertente da psicologia social psicológica, ainda dominante. Essas
críticas envolviam sua neutralidade, a perda do humano em seu contexto, com
a separação de sujeito e sociedade e, justamente, que os modelos de estudo
e entendimento não podiam ser aplicados nos países latino-americanos, por
sua falta de ligação com a realidade local (ALMEIDA, 2012; ÁLVARO; GARRIDO,
2003; FARR, 1998).
Dessa maneira, a psicologia social que passou a ser desenvolvida e es-
tudada na América Latina realizou uma mudança de paradigma, a partir de
propostas realizadas no Peru, em 1979. Essas propostas levavam em conta
as críticas à psicologia social psicológica e buscaram, como influências à
teoria crítica, a junção da teoria e da prática de origem marxista e a teoria
das representações sociais (ALMEIDA, 2012; FARR, 1998).

Wundt criou a separação entre sua psicologia experimental e a psi-


cologia dos povos, pois acreditava que a vertente dos povos não
poderia ser investigada de forma científica. Essa ideia inicial influenciou as
duas vertentes, sendo que a psicológica, mais individualista, estava preocupada
em investigar essas relações por meio dos métodos experimentais das ciências
naturais, se aproximando da biologia. A sociológica receberia mais influência de
sua ideia de estudo dos povos, por métodos observacionais, aproximando-se
mais da filosofia e abraçando conceitos como psiquismo. Mais tarde, estudiosos
iriam questionar e refutar a ideia inicial de Wundt sobre o estudo de povos e
sociedade, transformando esse estudo em ciência.
Psicologias clínica, hospitalar e social 13

Psicologia social comunitária


Como um ramo advindo da psicologia social, a psicologia social comunitária
(também chamada apenas de psicologia comunitária) diz respeito à aplicação,
propriamente dita, dos conhecimentos gerados pela psicologia social, de
transformações sociais, conscientização, representações sociais e diálogo
entre sujeito e sociedade, para as comunidades. Além disso, ela também
surge como uma alternativa à psicologia clínica, como uma área de atuação
e estudo na qual há base científica, não elitizada e que presta seus serviços
à população em geral. A psicologia comunitária foca em promoção de saúde,
resolução de problemas e transformações sociais a partir da sociedade (SILVA;
CORGOZINHO, 2011).
O psicólogo comunitário é um facilitador na comunidade, buscando, com
os integrantes dela, a mudança necessária para aumento em sua qualidade de
vida. Com essa transformação em nível grupal, espera-se que o indivíduo se
transforme. A atuação tem três ideais e fundamentos principais: (a) a inserção
do profissional no local, buscando resolver algum conflito; (b) a curiosidade
científica sobre seu objeto de estudo, que, neste caso, é a comunidade, a
comunicação e interações sociais e as relações de poder; e, por último, (c) a
prática baseada na ideia de transformação social (SILVA; CORGOZINHO, 2011).
Os campos de atuação desse profissional envolvem os locais onde mudan-
ças sociais significativas possam ser realizadas. Ele irá atuar principalmente
com populações em situação de vulnerabilidade, para conscientização, reso-
lução de problemas, mediação e proteção dos direitos dos grupos. Um dos
campos principais é a atuação junto ao Sistema Único de Assistência Social
(SUAS), em Centros de Referência em Assistência Social (CRAS), onde atuará
com equipes de assistência social para a proteção básica da comunidade,
das famílias e dos indivíduos (SILVA; CORGOZINHO, 2011). As demais áreas de
atuação em psicologia comunitária encontram-se esquematizadas na Figura 2.
14 Psicologias clínica, hospitalar e social

Figura 2. Campos de atuação do psicólogo comunitário.


Fonte: Adaptada de Almeida (2012).

De forma sucinta, a prática do psicólogo comunitário se dá por meio de


alguns passos:

„ levantamento de necessidades;
„ identificação de lideranças comunitárias e parcerias com estas;
„ levantamento de soluções para problemas e de recursos;
„ proposta de soluções, serviços e novas necessidades levantadas;
„ avaliação da intervenção.

Para orientação sobre a prática no âmbito comunitário e outras atuações


no campo das políticas públicas, o Centro de Referências Técnicas em Psico-
logia e Políticas Públicas (CREPOP), criado pelo Conselho Federal de Psicologia
(CFP) em 2006, publica regularmente orientações, manuais e referências
técnicas, além de relatórios sobre a atividade profissional na área, que visam
a sistematizar e construir orientações práticas voltadas aos profissionais
que atuam ou que venham a atuar na área (CENTRO DE REFERÊNCIA TÉCNICA
EM PSICOLOGIA E POLÍTICAS PÚBLICAS, 2022).
Psicologias clínica, hospitalar e social 15

Maíra é psicóloga comunitária e está prestes a iniciar uma intervenção


na comunidade do bairro Santo Antônio. Ao local, foram Maíra e
uma assistente social, onde apresentaram-se aos moradores e realizaram a
escuta e o registro das demandas que iam surgindo ao longo do diálogo. Os
moradores relataram problemas com o calçamento da rua, com a iluminação e
com a vegetação, que estava muito grande e poderia acolher animais perigosos,
como mosquitos da dengue, aranhas e sapos venenosos. Maíra e sua colega
buscaram, junto aos moradores do local, descobrir quais soluções poderiam ser
desenvolvidas em relação aos problemas relatados. Com as soluções criadas,
foram dadas orientações de como colocá-las em prática.
Após duas semanas, a psicóloga e sua colega voltaram à comunidade para
verificar como estava o andamento das soluções. Conversaram com as lideranças
da comunidade e os integrantes em geral. Durante o diálogo, foi explicado às
profissionais que as lideranças entraram em contato com a secretaria de infraes-
trutura da cidade para fazer uma reclamação sobre o calçamento e a iluminação
das ruas. Foi solicitada a pavimentação da rua e a resolução do problema de
iluminação. A iluminação seria resolvida na próxima semana, de acordo com as
informações dadas aos líderes da comunidade. O problema da vegetação estava
sendo resolvido, com cada morador ficando responsável por cortar e manter
a vegetação de seu terreno aparada. Foram feitos uma dinâmica de grupo, o
pedido e o recebimento de feedback e novo levantamento das necessidades da
comunidade. Desta vez, a falta de locais para entretenimento das crianças foi
apontada, e novas soluções foram criadas em conjunto com os profissionais e
a comunidade, a qual ficou responsável por preparar um evento de lazer social
ao longo do mês, para que todos na comunidade pudessem aproveitar.
As profissionais sugeriram o convite da secretária de infraestrutura para
participar das atividades e conversar com as lideranças diretamente na comu-
nidade, para demonstrar o problema de calçamento da rua. As profissionais
ficaram de retornar, após o feedback de avaliação da intervenção, e a comunidade
ficou responsável por continuar pensando em soluções para problemas que
viessem a identificar.

A psicologia tem diversas áreas de atuação, cada qual focando em dife-


rentes aspectos do ser humano e de suas necessidades. Na área clínica, foi
possível perceber o histórico da psicologia clínica como área de atuação, suas
atividades iniciais e algumas de suas abordagens. Na área hospitalar, vimos o
histórico e a relação com o pós-guerra. Na área social, houve a descrição do
percurso histórico realizado e de duas importantes vertentes da área, bem
como as especificidades da psicologia social no Brasil e na América Latina e
suas influências, além da psicologia comunitária como sua subárea de atuação.
Ao profissional psicólogo em sua jornada de aprendizagem, são necessá-
rios a aproximação e o conhecimento com as teorias e áreas de atuação que
poderá exercer no futuro. Para isso, é preciso entendimento de onde esses
conhecimentos vieram e para onde podem ir. Entendendo o contexto do de-
16 Psicologias clínica, hospitalar e social

senvolvimento das áreas clínica, hospitalar e social, é possível voltar um olhar


crítico aos seus fundamentos, técnicas, campos de trabalho e direções futuras.

Referências
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BAZAR, J. L. World War II and clinical psychology. In: CAUTIN, R. L.; LILIENFELD, S. O.
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CENTRO DE REFERÊNCIA TÉCNICA EM PSICOLOGIA E POLÍTICAS PÚBLICAS. Conheça o
CREPOP. Brasília: CREPOP, 2022. Disponível em: http://crepop.pol.org.br/conheca-o-
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GERGEN, K. J.; BOECHAT, F. M.; PORTUGAL, F. T. A Psicologia social como história. Psicologia
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HOTHERSALL, D. História da psicologia. 4. ed. Porto Alegre: AMGH, 2019. E-book.
HUMPHREYS, K. Clinical psychologists as psychotherapists: history, future, and alter-
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KRAMER, G. P.; BERNSTEIN, D. A.; PHARES, V. Introduction to clinical psychology. 8th ed.
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Leituras recomendadas
FERREIRA NETO, J. L. Psicologia e saúde mental: três momentos de uma história. Saúde
em Debate, v. 32, n. 78-79-80, p. 18-26, 2008.

MEIRA, C. H. M. G.; NUNES, M. L. T. Psicologia clínica, psicoterapia e o estudante de


psicologia. Paidéia, v. 15, n. 32, p. 339-343, 2005.
SCARPARO, H. B. K.; GUARESCHI, N. M. F. Psicologia social comunitária profissional.
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TONETTO, A. M.; GOMES, W. B. A prática do psicólogo hospitalar em equipe multidisci-
plinar. Estudos de Psicologia, v. 24, n. 1, p. 89-98, 2007.

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testados, e seu funcionamento foi comprovado no momento da
publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas
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declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou
integralidade das informações referidas em tais links.
Dica do Professor

O entendimento do que caracteriza os transtornos mentais e os seus sintomas é parte fundamental


do trabalho da psicologia clínica. Dessa maneira, a história das doenças psicológicas também
acompanha a história da psicologia clínica. A visão sobre as pessoas com transtorno psicológico, o
tratamento e o cuidado sofreram mudanças junto com a história, até o ponto em que se tornaram
objeto de estudo e de tratamento da psicologia clínica. É necessário, então, compreender as
mudanças e os eventos que ocorreram para que a prática clínica contemporânea pudesse existir.

Nesta Dica do Professor, você irá conhecer um pouco mais sobre a história da psicologia clínica e
dos transtornos mentais no Brasil, por meio do histórico da reforma psiquiátrica.

Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar.
Exercícios

1) A psicologia como ciência era uma disciplina focada em estudos em laboratório; a psicologia
clínica acompanhou o seu desenvolvimento enquanto também crescia como área de
conhecimento. Esse desenvolvimento ocorreu de forma mais intensa na América do Norte. A
psicologia clínica contemporânea nasceu de duas vertentes de atividades e conhecimentos,
dos testes mentais e de psicoterapias, como o treinamento psicológico de crianças, mas
outros fatores foram necessários para que se consolidasse como área de atuação.

Analise as afirmativas a seguir a respeito do desenvolvimento da psicologia clínica:

I. O contexto pós-guerra foi importante para o desenvolvimento do campo, mas foi apenas
um de muitos fatores que, em conjunto, auxiliaram nesse desenvolvimento, como a visão
mais humanizada das pessoas com transtorno mentais.

II. Ela foi desenvolvida como área de atuação, totalmente por pedido público, nos Estados
Unidos, para o diagnóstico e tratamento dos veteranos de guerra.

III. O advento da psicanálise e o interesse em "terapias de fala" auxiliaram a sua


popularização entre as populações e os profissionais.

Assinale a alternativa que indica apenas as afirmativas corretas:

A) Apenas I.

B) Apenas II.

C) Apenas III.

D) I e III.

E) I e II.

2) Os transtornos psicológicos foram interpretados de diversas maneiras ao longo da história


da humanidade. Tentativas de compreensão e tratamento estavam intimamente atreladas ao
paradigma da época sobre eles. No Brasil, após o movimento da reforma psiquiátrica,
diversas iniciativas públicas foram desenvolvidas para o tratamento humanizado dos
transtornos psicológicos. Entre essas iniciativas que fazem parte do cuidado à saúde mental
dos brasileiros, existem alguns tipos de intervenção que podem ser acessados a partir de
qualquer região do país.

Analise as opções a seguir e avalie se são verdadeiras (V) ou falsas (F):


( ) Serviço Residencial Terapêutico

( ) Centro de Convivência e Cultura

( ) Auxílio de Reabilitação Psicossocial

( ) Centro de Atenção Psicossocial

Assinale a alternativa que apresenta a ordem correta:

A) V – F – F – F.

B) F – V – V – F.

C) V – F – F – V.

D) V – F – V – V.

E) V – V – V – F.

3) A psicologia hospitalar é um ramo da psicologia, nascida como uma especialização da área de


psicologia da saúde, em que o campo de atuação é o hospital. Nessa área, o psicólogo faz
parte da equipe multiprofissional de saúde. Por meio de diversas intervenções, o profissional
busca promover saúde e prevenir e tratar doenças.

Analise as afirmativas a seguir a respeito da atuação do psicólogo hospitalar:

I. No Brasil, o seu desenvolvimento ocorreu a partir do acompanhamento de pacientes com


cardiopatias e de seus familiares.

>II. O psicólogo hospitalar utiliza principalmente a assistência direta como forma de


intervenção, e sua função está focada nesse aspecto.

III. Esse profissional tem função de enlace e interconsulta, auxiliando no delineamento de


programas de cuidado com a equipe.

Assinale a alternativa que indica apenas as afirmativas corretas:

A) Apenas I.

B) Apenas II.

C) Apenas III.

D) I e II.
E) II e III.

4) O psicólogo clínico contemporâneo tem uma gama de abordagens à sua disposição. Elas
foram desenvolvidas ao longo da evolução dessa área de atuação e apresentam
pressupostos, conceitos e entendimentos próprios sobre o ser humano, os transtornos
psicológicos e o seu tratamento.

Analise algumas dessas abordagens e relacione a primeira e a segunda coluna de forma a


estabelecer a relação correta entre elas:

I. Psicodinâmica

II. Sistêmica

III. Humanista

IV. Cognitivo-comportamental

V. Comportamental

( ) Acredita no potencial de desenvolvimento e criatividade do ser humano. Nela, o indivíduo


busca ativamente crescer, mas pode desenvolver sintomas quando existem barreiras para o
seu crescimento.

( ) Acredita que o ser humano está sempre em conflito, entre forças internas a si e forças
externas. Esse conflito existe em diferentes níveis de consciência: inconsciente, consciente e
subconsciente.

( ) Acredita que o comportamento é aprendido e pode ser modificado por meio de mudanças
de ambiente e associação de estímulos.

( ) Acredita que emoções, pensamentos e comportamentos interagem entre si, criando


diversos padrões de pensar e agir.

( ) Acredita que o ser humano faz parte de grupos e sistemas que interagem entre si.
Comportamentos surgem como consequência das relações entre os integrantes.

Assinale a alternativa que indica a ordem correta:

A) III – I – IV – V – II.

B) I – II – V – IV – III.

C) III – I – V – IV – II.
D) V – IV – II – III – I.

E) I – IV – III – V – II.

5) O psicólogo social pode atuar em diversos campos. Ele não está restrito a apenas um local,
mas, sim, a uma gama de locais, desde que estejam conectados à sua especialidade.

Analise alguns desses locais:

( ) Organizações da sociedade civil

( ) Políticas públicas

( ) Organizações comunitárias

( ) Centro de referência de assistência social

( ) Responsabilidade social

Assinale a alternativa correta sobre os locais de potencial atuação do psicólogo social:

A) F – V – F – V – V.

B) V – F – V – F – F.

C) V – F – V – V – V.

D) V – V – V – V – V.

E) F – V – F – F – V.
Na prática

No vídeo a seguir, você verá Na Prática como iniciar uma intervenção no contexto hospitalar ante
uma tentativa de suicídio.

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Um dos campos de trabalho do psicólogo social comunitário é o ambiente de organizações da


sociedade civil (OSC). Os tipos e os objetivos das OSC nos quais esse profissional trabalha podem
variar, mas sempre estão voltados para a transformação social positiva e o desenvolvimento de
uma melhor qualidade de vida.

Confira abaixo, Na Prática, um relato de caso com base na atuação do psicólogo social comunitário
e as suas atividades básicas em uma OSC para crianças em vulnerabilidade social.

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Saiba mais

Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor:

Quais são as abordagens na psicoterapia?


A psicologia clínica, como área, apresenta diferentes abordagens, e cada uma tem um
entendimento sobre o funcionamento do ser humano, sobre o desenvolvimento de sintomas e
transtornos psicológicos e sobre o tratamento.

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Psicologia hospitalar
A psicologia hospitalar, uma área que se ramificou da psicologia da saúde, está focada na atuação e
em intervenções psicológicas em ambientes hospitalares. Nesse local, o psicólogo, por exemplo,
desenvolve intervenções com pacientes crônicos, acolhimento de pacientes e familiares e trabalho
em equipe multiprofissional. Este vídeo explicativo aborda as atribuições de um psicólogo
hospitalar e os desafios que este pode vir a encontrar durante a sua atuação.

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Introdução à psicologia
Este livro aborda a história da psicologia, os processos psicológicos básicos, os transtornos
psicológicos e os seus tratamentos. Também traz informações sobre psicologia da saúde e
psicologia social, assim como áreas de atuação do psicólogo. Para saber mais, faça a leitura destes
capítulos: 1 (Introdução), 12 (Transtornos psicológicos), 13 (Tratamento dos transtornos
psicológicos) e 14 (Psicologia social).

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Grupoterapias: abordagens atuais
Este livro tem foco nas abordagens atuais de psicoterapia em grupo. As abordagens da psicologia
clínica envolvem o tratamento dos transtornos psicológicos, problemas e sintomas em algumas
modalidades. Essas modalidades podem ser individual, familiar, de casal ou em grupo. Formatos
grupais de psicoterapias diferentes foram desenvolvidos a partir do entendimento e das estratégias
de cada abordagem.

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Unidade de Estudos 6 - Psicologia
Social e Saúde

Apresentação

A psicologia da saúde reconheceu, desde sempre, a importância das relações sociais na saúde.
Todavia, falta os conhecimentos sobre os processos de interação social, de funcionamento dos
grupos ou de influência social, para poder intervir de forma eficaz neste domínio. É essa lacuna que
a psicologia social da Saúde procura preencher. Parte-se do modelo biopsicossocial, reconhecendo
o papel ativo do indivíduo no processo de resposta à doença, mas vai além dele, uma vez que
aborda o indivíduo como ser social, que, em interação com outros, dá sentido ao seu estado de
saúde, toma decisões acerca da doença e vive os problemas do seu corpo.

Nesta Unidade de Aprendizagem, você vai estudar sobre o campo da psicologia social que atua
sobre a saúde e compreender como podem ser desenvolvidas práticas em políticas de ação e
prevenção, visando à promoção da saúde.

Bons estudos.

Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

• Relacionar a psicologia social e saúde coletiva.


• Reconhecer o papel da psicologia social nas políticas de ação em saúde, prevenção de doenças
e promoção de saúde.
• Analisar a importância da criação do modelo psicologia social da saúde crítica.
Infográfico

No infográfico, você vai estudar sobre as diferenças e atuação do psicólogo nos campos da
promoção, prevenção e atenção em saúde.
Aponte a câmera para o
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conteúdo ou clique no
código para acessar.
Conteúdo do Livro

A constituição da psicologia como campo de conhecimento e profissão faz-se no entrelaçamento


de diversos saberes e acontecimentos de ordem social, política e econômica, como bem demonstra
a história da psicologia. Cruzamentos estes que foram produzindo diversos desdobramentos,
gerando multiplicidade em termos de teorias e de práticas, na tentativa de dar conta das diferentes
demandas cotidianas (Saldanha, 2004).

A psicologia, embora intimamente relacionada ao conceito de saúde (definida pela Organização


Mundial de Saúde como bem-estar físico, mental e social), como disciplina, chega tardiamente à
área da saúde. O desenvolvimento da psicologia da saúde estimulou o trabalho do psicólogo no
âmbito da prevenção e da promoção da saúde, assim como sua participação em equipes
interdisciplinares, tanto em instituições de saúde quanto em sua atuação no trabalho comunitário,
tornando-se um espaço importante de prevenção e promoção de saúde.

Faça a leitura do capítulo Psicologia social e saúde, base teórica desta Unidade de Aprendizagem.
Nele, você se aprofundará no universo de psicologia social e sua relação com a saúde.

Boa leitura.
PSICOLOGIA
SOCIAL
Daiane Duarte Lopes
Psicologia social e saúde
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Contextualizar psicologia social e saúde coletiva.


„„ Compreender o papel da psicologia social nas políticas de ação em
saúde, prevenção de doenças e promoção da saúde.
„„ Analisar a importância da criação do modelo de psicologia social da
saúde crítica.

Introdução
A psicologia sempre reconheceu a importância das relações sociais na
saúde. No entanto, a ela faltam os conhecimentos sobre os processos de
interação social, de funcionamento dos grupos ou de influência social para
poder intervir de forma eficaz neste domínio. É esta lacuna que a psicologia
social da saúde procura preencher. Ela parte do modelo biopsicossocial,
reconhecendo o papel ativo do indivíduo no processo de resposta à do-
ença, mas vai além dele, uma vez que aborda o indivíduo como ser social,
que, em interação com outros, dá sentido ao seu estado de saúde, toma
decisões acerca da doença e vive os problemas do seu corpo.
A psicologia social pode ser flexível em sua diversidade de possibili-
dades, e a sua atuação se constitui em torno da promoção e ampliação
das potencialidades de ser e existir em cada sujeito como ser social.
Neste capítulo, você vai estudar sobre o campo da psicologia social que
atua sobre a saúde e vai compreender como podem ser desenvolvidas
práticas em políticas de ação e prevenção visando à promoção da saúde.

Psicologia social e saúde coletiva


Ao compreendermos a amplitude subjetiva de cada sujeito em sua constituição
social, podemos perceber o contexto no qual está inserido, como produtor
de construções representativas do universo interior de cada um. Ou seja, a
2 Psicologia social e saúde

criação e a conservação de sintomas falam sobre a saúde coletiva disponi-


bilizando perspectivamente o sentido de comunidade. As atividades da vida
cotidiana, executadas de maneira consciente, direcionam tanto a formação do
sujeito na sociedade quanto a própria sociedade em seu trajeto constitutivo
(VYGOTSKY, 1998).
Assim, podemos entender que a saúde carrega consigo as marcas dos
modos de viver, da história, das crenças e das ideologias de cada comunidade,
produzindo e replicando memória por meio da cotidianidade e na cotidianidade
(LUKÁCS, 1978). E assim entendemos a saúde como originária de um ensaio
dialético no qual os sujeitos configuram e reconfiguram suas condições de
viver e a si mesmos em um ciclo constante e permanente.
Em um ir e vir constante na autocriação individual e coletiva, a saúde
coletiva é um “vir a ser”. O conceito de “vir a ser” ou Devir, como usado por
diversos autores, dentre os quais estão Platão, Heráclito e Nietzsche, tem sua
origem do latim devenire, que significa chegar e expressa uma construção
constante, um “se tornar” permanente e inerente ao viver de cada sujeito. Saúde
coletiva pode ser compreendida como um infinito devir, no qual somente a
mudança e a transformação são permanentes.

Devir é, a partir das formas que se tem, do sujeito que se é dos órgãos
que se possui ou das funções que se preenche, extrair partículas, entre
as quais instauramos relações de movimento e repouso, de velocidade
e lentidão, as mais próximas daquilo que estamos em vias de tornar-
mos, e através das quais nos tornamos. É nesse sentido que o devir é o
processo do desejo. Esse princípio de proximidade ou de aproximação
é inteiramente particular, e não reintroduz analogia alguma. Ele indica o
mais rigorosamente possível uma zona de vizinhança ou de co-presença
de uma partícula quando entra nessa zona. Ele é da ordem da aliança
(DELEUZE; GUATTARI, 1997, p.18-19).

Devir é movimento de compor nos corpos o inusitado a partir do encontro


com o outro, definindo em cada sujeito uma lista de afetos e devires em uma
multiplicidade de acontecimentos que nunca cessam. Assim, todo devir se
dá no encontro e no acaso (DELEUZE; GUATTARI, 1997). A psicologia
social entende a saúde em sua multiplicidade subjetiva, na qual reflete a vida
cotidiana, influente e influenciada pelo coletivo. E considera, por meio da
análise dos modos de viver, o que pode ser refletido na doença e na morte de
cada sujeito, o que é possível identificar por meio da saúde e do adoecimento
dos sujeitos sua qualidade de vida, como exemplificado na Figura 1.
Psicologia social e saúde 3

Figura 1. O homem é definido por sua qualidade de vida.


Fonte: Rawpixel.com/Shutterstock.com.

A saúde coletiva significa os modos de viver conforme a cultura e o tempo


histórico e leva em conta as particularidades de cada comunidade. É planejada
e estruturada dentro do sistema de saúde de cada região. Assim, no Brasil,
como política pública de saúde e política de inclusão social, temos o sistema
único de saúde (SUS), construído pela constituição vigente desde 1988, como
um direito de todos os cidadãos que deve ser garantido pelo poder público, o
estado. O SUS surgiu de um movimento social que visava a redemocratização
do país nos anos 1980, com base política e pública, garantindo a cidadania e
a universalidade de acesso aos serviços de saúde e priorizando a prevenção e
promoção de saúde (BRASIL, 1990).
A psicologia social convoca a saúde coletiva a se conectar de maneira
mais fluídica com a cultura local, na busca pelo protagonismo de cada sujeito,
encerrando a distinção entre corpo biológico/corpo emocional/corpo social,
pois entende a existência de uma colagem entre os diversos aspectos do ser.
A compreensão do mundo parte da compreensão e do conhecimento acerca
de si mesmo do lugar que o sujeito ocupa.
4 Psicologia social e saúde

Dessa maneira, podemos pensar o termo “saúde coletiva”, em sua integralidade


de significâncias e significados, pois, ao refletirmos sobre saúde de forma mais
aprofundada, podemos costurar ao termo a ideia de global, integral, público, grupal
e comunitário. Saúde coletiva sob a ótica da psicologia social é resistência, empo-
deramento sobre si e sobre o espaço que ocupa, em uma luta por pertencimento
sobre si em toda a integralidade implicada ao ser e sobre o lugar que habita, com
os recursos disponíveis e sua construção social, objetivando a promoção da saúde.

O filme em forma de documentário Políticas de saúde no Brasil, com roteiro e direção


de Renato Tapajós, traça uma narrativa ficcional, mas com material de arquivo, sobre a
trajetória da construção do SUS, com a sua história de lutas e construção de identidades
sociais.

Psicologia social, políticas de ação em saúde e


promoção da saúde
Questões socioeconômicas, cultura, hábitos, rituais, crenças entre outras carac-
terísticas específicas de cada comunidade constituem a experiência cotidiana
em saúde coletiva, ao mesmo tempo em que é objeto de ocupação e estudo
da psicologia social. As políticas de ação e promoção em saúde estão atentas
às dimensões e experiências emergentes das comunidades, pois necessitam
das suas significações e contornos para determinar e direcionar suas práticas.
Considerando a pluralidade cultural de cada região, o cenário de atenção
em saúde se desenvolve no Brasil. Assim, nesse contexto, as condutas da
psicologia social seguem no sentido de acolher as demandas e convergências
provenientes de cada coletivo, a fim de garantir o efetivo acesso a universa-
lidade, integralidade e ampla assistência aos sujeitos.
Buscando contemplar integralmente as práticas em políticas de ação e promoção
em saúde, a psicologia social se mantém aberta, disponibilizando seu saber e fazer
a agregação de diferentes ângulos de atuação. Ou seja, se aliando à interdisciplina-
ridade, por meio do intercambio de conhecimentos, buscando soluções conjuntas
com as demais áreas da ciência que se disponibilizem a atuar com o social, dentre
elas: assistência social, enfermagem, medicina, educação, entre outras.
A psicologia social entende a necessidade de uma articulação intersetorial
para a compreensão dos contextos e sujeitos em sua subjetividade. Conceitos
Psicologia social e saúde 5

psicossocioculturais, que aliam características individuais, sociais e contex-


tuais, estão presentes costurados aos processos de adoecimento e necessitam
de uma ampla atenção, para conter agravos e delinear estratégias de contenção
e prevenção em saúde.
Dessa maneira, ao cuidado e atenção integral, se aderem o mapeamento das
questões que exigem uma amplitude de olhar sobre a comunidade e a organização
dos setores, objetivando o alcance das prioridades de ação tanto no âmbito indi-
vidual quanto no coletivo e ainda na estruturação de instâncias educacionais que
promovam a prevenção em saúde. Assim identificamos na prevenção o sentido
de se antecipar, visualizar antes, identificar previamente, por isso a importância
de ações conjuntas por meio de espaços de escuta e atenção, para que por meio da
prevenção possa ser possível se estruturar um caminho para a promoção em saúde.
Conforme Arendt (1999), ser ouvido e integralmente visto pelo outro
possibilita tanto uma expansão no alcance do olhar sobre si próprio como
uma variedade de ângulos de compreensão. Quando a cada sujeito é possível
ser visto por uma multiplicidade de olhares, é possível ser, sem alteração da
identidade, permitindo se manifestar de forma integral e real.
Por isso, ao pensarmos sobre atenção, prevenção e promoção de saúde,
precisamos atentar para a vinculação entre os serviços e os sujeitos. Pois é
na corresponsabilidade que se pode atuar efetivamente e integralmente sobre
as prioridades. E é por meio da interdisciplinaridade que se torna possível
entender cada sujeito, assim como sua comunidade, acolhendo a complexidade
de suas demandas de maneira global e em absoluto.

No livro Saber cuidar, do escritor Leonardo Boff (1999), você pode se inspirar sobre o sentido
mais profundo de escutar, olhar e compreender o outro em sua essência e integralidade.
O livro convoca uma postura ética em valores e atitudes a todo e qualquer ser existente
no planeta, além de promover uma postura mais humilde e humana perante o próximo.

Psicologia social da saúde crítica


À denominação “psicologia social da saúde” se atribui uma conjunção entre
educação e condutas profissionais e científicas, com o objetivo de atuar sobre a
identificação de disfunções, promoção e prevenção em saúde, além de propor
6 Psicologia social e saúde

uma análise, buscando o melhoramento do sistema de atuação, bem como a


condução da formação de políticas em saúde (MATARAZZO, 1982).
A psicologia social da saúde crítica é um movimento que relaciona a intera-
ção entre os aspectos emocionais, comportamentais e contextuais conectados
às doenças e à saúde dos sujeitos, disponibilizando a atuação do psicólogo
social, assim como os demais membros da equipe de saúde, como agentes
facilitadores da transformação social. Para tanto, a psicologia social da saúde
crítica enfatiza o papel ético e político do fazer em psicologia social da saúde.
Associando conceitos de diferentes abordagens da psicologia, a psicologia
social da saúde crítica visa a traçar um esquema de intervenção que tenha
melhor alcance nos âmbitos individuais, grupais e na coletividade. Tal mo-
vimentação procura atingir além da reabilitação e tratamento de doenças,
investindo sobre a qualidade de vida dos sujeitos.
A psicologia social da saúde crítica se movimenta no sentido de escapar
do dualismo saúde/doença previamente colocado pela psicologia social da
saúde que tendia a focar suas práticas sobre as mudanças de comportamento.
Buscando promover a educação do sujeito a cerca de si e do meio em que habita.
Como estudado por Freire (1983) o mundo ao qual cada sujeito está inserido,
está intimamente relacionado com a consciência. Ou seja, a consciência que cada
sujeito tem sobre si e seu mundo vai refletir sobre suas escolhas e atitudes. Para isso,
é necessário que haja uma plena concepção de que cada consciência possui níveis
diferentes e tempos diferentes em cada sujeito. Dessa maneira, não é possível atingir
mudanças profundas e permanentes se não partirem da consciência de cada sujeito.
Exige-se da psicologia social da saúde crítica um posicionamento aberto e
humilde frente aos sujeitos, promovendo espaço para discussões, possibilitando
a criação de novas perspectivas e condutas éticas, disponibilizando-se como
agente social, mas também de ser humano para ser humano, igual e plural,
questionador, problematizador e empático.
A psicologia social da saúde crítica se movimenta por meio da conscien-
tização, em uma proposta dialógica, pela qual a atuação é, ela própria, uma
avaliação, traçando e refazendo estratégias de acordo com as mudanças das
demandas. Sempre buscando ser e estar o mais acessível e compreensível
possível, tanto para os que estiverem disponíveis, quanto para os excluídos,
como argumenta Guareschi (1998). Assim, os sujeitos que buscam atenção em
saúde são tão investigadores quanto o agente social de saúde atuante. Nesse
sentido, a visão de mundo do sujeito, sua consciência crítica, vai auxiliar
no engajamento sobre sua promoção e qualidade de vida, assim como em
melhorias e transformações na sua comunidade e sociedade.
Psicologia social e saúde 7

Para exemplificar a prática da psicologia social da saúde crítica, podemos usar como
analogia o ato de pensar. Pensar é sempre uma soma, uma união entre conhecimentos
prévios sobre fatos e realidades, articulados em meio a projeções e análises do presente
com relação ao futuro. Assim, a atuação em psicologia da saúde crítica articula uma costura
entre os mais variados conhecimentos, associados entre as interdisciplinas em busca de uma
transdisciplinaridade, em que os organismos de saberes e conhecimentos se conectam
em suas semelhanças e diferenças, mas considerando o todo como produtor de potências.

ARENDT H. A condição humana. Rio de Janeiro: Forense Universitaria, 1999.


BOFF, L. Saber cuidar: ética do humano & compaixão pela terra. Petrópolis: Vozes, 1999.
BRASIL. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção,
proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços corres-
pondentes e dá outras providências. Brasília: Presidência da República, 1990. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8080.htm>. Acesso em: 09 ago. 2017.
DELEUZE, G.; GUATTARI, F. Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia. Rio de Janeiro:
Editora 34, 1997. v. 4.
FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 16. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.
GUARESCHI P. A. Ética. In: JACQUES, M. G. C. et al. Psicologia social contemporânea.
Petrópolis: Vozes, 1998.
HELLER, A. O cotidiano e a história. São Paulo: Paz e Terra, 2004.
JAPIASSU, H.; MARCONDES, D. Dicionário básico de filosofia. São Paulo: Zahar, 1993.
LUKÁCS, G. As bases ontológicas do pensamento e da atividade do homem. São Paulo:
Ciências Humanas, 1978. (Temas de ciências humanas, n. 4).
MATARAZZO, J. D. Behavioural health’s challenge to academic, scientific and profes-
sional psychology. Americam Psychologist, v. 37, p. 1-14, 1982.
SPINK, M. J. Psicologia social e saúde. Petrópolis: Vozes, 2003.
VIGOTSKY, L. S. A formação social da mente. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
Dica do Professor

No vídeo desta unidade, você vai conhecer o trabalho do psicólogo no Sistema Único de Saúde
(SUS), principalmente na atenção básica.

Assista!

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Exercícios

1) O que a saúde coletiva visa a significar?

A) Um meio de atender todos, em todas as regiões de forma igual.

B) Os modos de viver conforme a cultura e o tempo histórico, e leva em conta as


particularidades de cada comunidade.

C) Prevenção de doenças, mediante distribuição de vacinas.

D) Atendimentos nas unidades de saúde.

E) Atendimento médico especializado.

2) O que é saúde coletiva sob a ótica da psicologia social?

A) Disponibilização local para atendimento médico.

B) Empoderamento sobre si, mas não sobre o espaço que ocupa.

C) Uma luta por pertencimento sobre si em toda a integralidade implicada ao ser e sobre o lugar
que habita.

D) Uma organização social conforme preceitos preestabelecidos.

E) Uma técnica.

3) Como a interdisciplinaridade contribui para as políticas de prevenção e promoção em saúde?

A) Tornando possível entender cada sujeito, assim como sua comunidade, acolhendo a
complexidade de suas demandas, de maneira global e em absoluto.

B) Possibilitando que cada setor atenda individualmente, sem se comunicar.

C) Possibilitando a organização da fila de atendimentos.

D) Disponibilizando-se a entender o que a equipe médica quer para o paciente.


E) Atendendo o que a gestão pública disponibiliza para o paciente.

4) Segundo o capítulo estudado, o que seria a psicologia social crítica?

A) Uma teoria.

B) Um método a ser estudado.

C) Uma demanda à qual as unidades de saúde não aderem.

D) Uma forma de gestão.

E) Um movimento que relaciona a interação entre os aspectos emocionais, comportamentais e


contextuais conectados às doenças e à saúde dos sujeitos.

5) Para a psicologia social da saúde crítica, de que maneira o sujeito está implicado?

A) Conforme o investimento material que possui.

B) Está condicionado ao modo de viver e morrer, não podendo atuar sobre uma possível
mudança.

C) Não tem conhecimento para gerir sua saúde.

D) A visão de mundo do sujeito e sua consciência crítica auxiliarão no engajamento sobre sua
promoção e qualidade de vida, assim como em melhorias e transformações na sua
comunidade e sociedade.

E) Limitado pela gestão pública.


Na prática

Jonas, 16 anos, e Janete, 30 anos, procuram a unidade de saúde para conversar com a assistente
social e a psicóloga. Janete está com dificuldades em relação ao seu filho Jonas, pois ele soube, hà
poucos meses, que tem diabetes e precisará reorganizar sua alimentação e tomar insulina durante
toda sua vida. Janete relata que Jonas não tem tomado a insulina e recusa-se a seguir a prescrição
da nutricionista sobre sua alimentação. Na última semana, chamaram Janete na escola, pois Jonas
foi pego bebendo e fumando com os amigos. Janete está preocupa com o filho, pois tem medo que
sua saúde piore e que ele acabe por ser hospitalizado novamente.

Foi por meio de uma internação após um desmaio que Jonas foi diagnosticado com a doença. A
assistente social pergunta a Jonas como era sua alimentação antes de saber que estava doente.
Jonas conta que prefere comer lanches e adora refrigerante.

Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino!


Saiba mais

Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor:

A interface da psicologia social e saúde: perspectivas e desafios

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Psicologia social da saúde: tornamo-nos eternamente


responsáveis por aqueles que cativamos

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Psicologia da saúde crítica: breve revisão e perspectiva


existencialista

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Unidade de Estudos 7 - Atuação do
psicólogo na promoção da saúde e
do bem-estar no trabalho

Apresentação

O trabalho é central e ocupa muito tempo e energia na vida das pessoas. Assim como pode
significar prazer e realização, pode transformar-se em uma fonte de sofrimento e adoecimento.
Essa não é uma dicotomia, pois o trabalho causa muitos sentimentos intercalados ou sobrepostos,
mas, quando envolve realização, tende a ser mais prazeroso e, quando não motiva ou satisfaz,
tende a ser desgastante. Quando passa a ser unicamente fonte de sustento, o trabalho provoca
alienação e desgaste físico e mental, uma vez que não permite a economia somatopsicológica,
integração entre mente e corpo (DEJOURS, 1987).

A psicologia pode auxiliar no bem-estar no trabalho — seja de forma direta, com acompanhamento
de trabalhadores e grupos em sofrimento ou conflito, seja de forma indireta, trabalhando com
gestores na construção de um ambiente de trabalho mais adequado. Será ainda melhor se a
psicologia puder atuar em ambas as frentes, tendo uma visão do todo e das possibilidades de
encontro entre as diferentes camadas e interesses de trabalhadores e organizações. São inúmeras
as possibilidades de atuação do psicólogo na busca do bem-estar no trabalho — por meio de
pesquisas, do desenvolvimento de ferramentas de diagnóstico e da condução de processos de
gestão de pessoas inclusivos e qualificantes.

Nesta Unidade de Aprendizagem, você vai conhecer algumas possibilidades de atuação do


psicólogo no ambiente de trabalho com vistas ao bem-estar e à satisfação das pessoas. Essas
possibilidades envolvem desde atividades de gestão das relações de trabalho, como seleção,
treinamento, avaliação de desempenho, etc., até outras mais diretamente ligadas ao
acompanhamento de grupos e do trabalho diário, com vistas à promoção da saúde no trabalho.
Você vai conhecer algumas abordagens da psicologia para a promoção de bem-estar no trabalho,
que são muitas e com diferentes propostas de intervenção. Dessa forma, será possível associar as
tarefas do psicólogo com a saúde nas relações sociais e de trabalho.

Bons estudos.

Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados:


• Explicar de que forma a psicologia, como ciência, pode promover a saúde e o bem-estar dos
indivíduos.
• Identificar atividades e ações do profissional de psicologia que promovem o bem-estar e a
saúde no trabalho.
• Exemplificar a intervenção psicológica no contexto organizacional com foco em promover
bem-estar e saúde no trabalho.
Infográfico

No campo do trabalho, as emoções podem ser estudadas de diferentes maneiras, mesmo que elas
estejam interrelacionadas entre si. Um campo interessante de estudo é o que relaciona as relações
interpessoais, uma vez que essa é uma situação própria nas relações de trabalho, sobretudo quando
se fala do profissional de psicologia no trabalho em busca da promoção do bem-estar e da saúde
das pessoas.

No Infográfico a seguir, você vai compreender um pouco mais essas interações e os níveis que
abordam os relacionamentos entre pessoas, com foco nas expressões e nas manifestações
emocionais envolvidas nas interações, o que demanda autorregulação por parte dos envolvidos.
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Conteúdo do Livro

As pessoas dedicam muita energia ao trabalho, e isso, ao mesmo tempo que recompensa
psicologicamente, pode gerar sofrimento e adoecimento. Daí a importância da atuação do
psicólogo no ambiente laboral, onde desempenha inúmeras funções. As mais conhecidas são
relacionadas a suas funções como integrante do Departamento de Recursos Humanos, hoje mais
conhecido como Departamento de Gestão de Pessoas.

As possibilidades de intervenção do psicólogo no campo do trabalho são inúmeras e dependem da


receptividade organizacional, da proposta de trabalho do psicólogo e do estabelecimento de uma
relação favorável entre este e o trabalhador.

No capítulo Atuação do psicólogo na promoção da saúde e do bem-estar no trabalho, base teórica


desta Unidade de Aprendizagem, você vai conhecer as múltiplas atividades que podem ser
desempenhadas pelos psicólogos nas organizações com vistas à promoção da saúde e do bem-estar
do trabalhador.

Boa leitura.
PSICOLOGIA
Atuação do psicólogo
na promoção da
saúde e do bem-
estar no trabalho
Maria Beatriz Rodrigues

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

> Explicar de que forma a psicologia, como ciência, pode promover a saúde e
o bem-estar dos indivíduos.
> Identificar atividades e ações do profissional de psicologia que promovem
o bem-estar e a saúde no trabalho.
> Exemplificar a intervenção psicológica no contexto organizacional com foco
em promover bem-estar e saúde no trabalho.

Introdução
A psicologia como prática profissional, amparada por seus estudos científicos,
é realizada em vários âmbitos, que normalmente são inseridos em três amplas
classificações: clínica, educação e trabalho. Porém a atuação do psicólogo é
cada vez mais solicitada em áreas profissionais diferentes, como esportes, co-
municação, comunidades, saúde em geral, entre outras. Independentemente do
local onde atua, a pedra fundamental do trabalho do psicólogo é a busca pela
saúde emocional (e, por consequência, física) dos sujeitos. De fato, a busca pela
saúde precisa estar presente nos locais onde as pessoas circulam e convivem,
não apenas em consultórios e clínicas de psicoterapia.
2 Atuação do psicólogo na promoção da saúde e do bem-estar no trabalho

As pessoas dedicam muita energia ao trabalho, e isso, ao mesmo tempo que


recompensa psicologicamente, pode gerar sofrimento e adoecimento. Portanto, o
psicólogo do trabalho atua em um ambiente competitivo, dinâmico, carregado de
expectativas de realização, êxito e sucesso, bem como de cobranças, frustrações
e pressões. Há abordagens teóricas específicas que norteiam seu trabalho no
ambiente corporativo, incluindo as voltadas para a saúde mental no trabalho, a
ergonomia, a integração de novos funcionários e a preparação para a aposenta-
doria. Nesse contexto, as características e os objetivos da atuação do psicólogo
do trabalho diferem, além das ferramentas que utiliza para exercer seu papel.
Neste capítulo, você vai conhecer a história da psicologia voltada à saúde,
especificamente um de seus braços, aplicado ao ambiente e às relações de traba-
lho. Há várias teorias e abordagens na psicologia que foram desenvolvidas para a
atuação do psicólogo no ambiente laboral, algumas mais adaptativas, outras mais
críticas. Assim, o capítulo também percorre propostas de atuação do psicólogo
na promoção do bem-estar e da saúde no trabalho, exemplificando as formas
mais conhecidas e fundamentadas na prática psicológica.

A psicologia na promoção da saúde


e do bem-estar
Como ciência, a psicologia transita entre campos de conhecimento. A princípio,
foi considerada uma ciência da saúde, ou biomédica. Mais tarde, tornou-se a
ciência do comportamento e, atualmente, retornou ao campo da saúde, porém
com um enfoque biopsicossocial, não apenas médico. Essa é uma reflexão
importante para entender o papel da psicologia na promoção da saúde e do
bem-estar. Aliás, não somente seu papel, mas também suas concepções e sua
epistemologia, visando a identificar propostas subjacentes a suas práticas.
Seja no lugar que for, com diferentes objetivos e enfoques, o trabalho do
psicólogo deve sempre ser voltado à promoção da saúde e do bem-estar.
O modelo biomédico de saúde busca as causas das doenças no corpo, na
biologia, sem considerar outras esferas da vida humana. A partir do século
XIX, com o grande avanço científico da medicina, essa abordagem se tornou
dominante, e algumas das características que o distinguem continuam pre-
sentes na medicina atual. Em primeiro lugar, acredita que as doenças são
causadas por fatores patogênicos, ou seja, por algo que invade o corpo e
o contamina. O que está em torno, como as variáveis sociais, psicológicas,
contextuais, não são foco de análise desse modelo. Isso significa, em segundo
lugar, que vê o corpo destacado da mente, sem influências mútuas. Portanto,
Atuação do psicólogo na promoção da saúde e do bem-estar no trabalho 3

é um modelo reducionista e cartesiano. Durante muito tempo, inclusive, a


definição de doença pela Organização Mundial da Saúde (OMS) foi pautada
na ausência de doenças (STRAUB, 2014).
Influenciada pela popularização da psicanálise e de outras vertentes
psicodinâmicas da psicologia, a psicossomática ganhou relevância. Talvez
pela primeira vez a medicina tenha se aproximado consistentemente da psi-
cologia, considerando conflitos e estados emocionais para o desenvolvimento
de doenças. Porém, assim como a biomédica, a psicossomática também
se radicalizou a ponto de sugerir determinismos entre corpo e mente. As
influências entre medicina e psicologia continuaram com o behaviorismo, na
década de 1970, por meio de estudos sobre o controle de comportamentos e
do corpo, técnicas de relaxamento a fim de evitar doenças, método chamado
de biofeedback (STRAUB, 2014).
Após posições tão extremas e impulsionados por avanços em ambas,
medicina e psicologia, hoje se sabe que as doenças têm múltiplos fatores:
hereditariedade, ambiente, condições emocionais e comportamentais (STRAUB,
2014). Assim, no final da década de 1970, foi sistematizada a psicologia da
saúde a partir de um enfoque biopsicossocial, que busca integrar mente e
corpo para prevenir e tratar doenças. Essa abordagem reconhece a influência
de fatores biológicos, psicológicos e socioculturais na promoção de saúde ou
no desenvolvimento de patologias (SIQUEIRA; MARTINS, 2013; STRAUB, 2014).
Essa forma de conceber a saúde e a doença coincide com a psicologia sis-
têmica, ou seja, uma tendência de perceber o psiquismo como uma hierarquia
de sistemas e subsistemas. Isso significa dizer que um sistema que esteja
vulnerável vira alvo de outros. Um exemplo seria um sistema imunológico
enfraquecido, o qual facilitaria o desenvolvimento de outras doenças. Essas
vulnerabilidades afetariam várias esferas da vida dos sujeitos, relacionamen-
tos em geral, família, trabalho, etc. (SIQUEIRA; MARTINS, 2013; STRAUB, 2014).
Os psicólogos da saúde adotam as seguintes perspectivas principais
(STRAUB, 2014).

1. Perspectiva do curso de vida: variações da saúde com a idade, influên-


cias de programas de saúde em diferentes faixas etárias, etc.
2. Perspectiva sociocultural: variações étnicas, práticas alimentares e
crenças sobre saúde.
3. Perspectiva de gênero: diferenças entre homens e mulheres em vul-
nerabilidades ou comportamentos assumidos.
4. Perspectiva biopsicossocial: combinação de todas as outras perspec-
tivas, assumindo que todas impactam a saúde e a doença.
4 Atuação do psicólogo na promoção da saúde e do bem-estar no trabalho

A psicologia da saúde, assim como a concepção biopsicossocial e sistêmica


da psicologia, tem sido utilizada em diferentes áreas de atuação do psicólogo.
Não somente em clínicas, hospitais e em pesquisas atuam os psicólogos da
saúde, mas também em diferentes organizações, auxiliando-as a planejar
ações de bem-estar. Ganha espaço, nesse contexto, a psicologia positiva,
que promove uma vida saudável nos ambientes de trabalho. Veja, na Figura 1,
que o bem-estar no trabalho se constituiria a partir de três vínculos afetivos:
dois dirigidos ao trabalho (satisfação e envolvimento) e um à organização
(comprometimento) (SIQUEIRA; MARTINS, 2013).

Figura 1. Bem-estar no trabalho e seus vínculos afetivos.


Fonte: Siqueira e Martins (2013, p. 632).

A psicologia positiva se apoia na crença de que emoções positivas contri-


buem para a promoção de saúde e bem-estar. Quando as pessoas se sentem
bem no trabalho (SIQUEIRA; MARTINS, 2013):

„ têm pensamentos mais organizados e favoráveis a melhores ações e


decisões;
„ apresentam mais condições físicas e psicológicas para enfrentar fa-
voravelmente desafios;
„ têm menos chances de apresentar depressão, ansiedade e estresse;
„ estão mais propensas a fortalecer capacidades, competências que
satisfazem o indivíduo e a organização.

A psicologia positiva, porém, não foca apenas em emoções. Siqueira e


Martins (2013), que estudaram o modelo desde seus autores clássicos, afirmam
Atuação do psicólogo na promoção da saúde e do bem-estar no trabalho 5

que o bem-estar no trabalho contém três vínculos psicológicos cognitivos.


Esses vínculos expressam sentimentos, mas são construídos cognitivamente,
enquanto os sujeitos refletem e vivem suas relações e experiências no contexto
do trabalho. Mesmo não sendo baseado unicamente em emoções, o modelo
acredita que os vínculos envolvidos podem ampliar “o estado psicológico e
saudável do trabalhador” (SIQUEIRA; MARTINS, 2013, p. 634).
Outras abordagens da psicologia organizacional e do trabalho também
reconhecem e investem em pesquisas para comprovar que o ambiente social
pode favorecer a saúde no trabalho. Esses estudos remontam à área de
comportamento organizacional, multidisciplinar, mas utilizada, sobretudo,
pela administração e pela psicologia, e enfatizam conceitos como satisfação,
comprometimento, justiça e confiança do colaborador na organização.
Emoções no trabalho têm sido foco de atenção de pesquisadores da área.
Zanelli, Borges-Andrade e Bastos (2014), baseados em outros autores, sistema-
tizam quatro diferentes níveis de abordagem, que se influenciam mutuamente,
para estudar as emoções no trabalho. Veja-os no Quadro 1.

Quadro 1. Níveis de abordagem para estudar as emoções no trabalho

Nível de abordagem Descrição

Variáveis individuais Formas de sentir e diferenças individuais que


impactam a satisfação, as atitudes, o desempenho e o
envolvimento no trabalho.

Interações Também chamado de interpessoal ou relacional,


pois envolve relações com outras pessoas. Gestos,
expressões faciais, sorriso e expressões do tipo
interferem nas emoções compartilhadas e nas
interações laborais. Um exemplo de abordagem
teórica relacional é a da inteligência emocional,
um conjunto de habilidades que favorecem o
reconhecimento de emoções, seu manejo e sua
adequação com as das outras pessoas.

Grupos Relações entre os membros dos grupos e com os


líderes impactam o bem-estar e a saúde no trabalho.
Os processos grupais envolvem emoções e afetos,
bem como contribuem para a atenuação de conflitos.

Organizações Tendência à preocupação com a saúde e o bem-estar


no trabalho. O bem-estar leva à manutenção de
resultados positivos da organização.

Fonte: Adaptado de Zanelli, Borges-Andrade e Bastos (2014).


6 Atuação do psicólogo na promoção da saúde e do bem-estar no trabalho

Outra abordagem empregada para entender emoções no trabalho é o


modelo dos cinco grandes fatores, ou big five-factor model, que visa a explicar
tipos de personalidades e vem sendo utilizada para discutir a afetividade no
local de trabalho, em especial as diferenças entre os padrões afetivos dos
indivíduos. Segundo essa teoria, os traços de personalidade se agrupam em
cinco tendências básicas (ZANELLI; BORGES-ANDRADE; BASTOS, 2014).

1. neuroticismo;
2. extroversão;
3. abertura à experiência;
4. amabilidade;
5. conscienciosidade.

Veja, na Figura 2, como opera o sistema da personalidade de acordo com


a teoria dos cinco fatores.

Figura 2. Operação do sistema da personalidade de acordo com a teoria dos cinco fatores. As
setas indicam a direção das influências causais, que operam por meio de processos dinâmicos.
Fonte: Adaptada de McCrae e Costa Jr. (1996).

A preocupação da psicologia com a saúde e o bem-estar no trabalho, como


visto, não é nova e continua se desenvolvendo em diferentes abordagens. A
psicologia social e do trabalho, por exemplo, aproxima-se do que em admi-
nistração se conhece como relações de trabalho, na qual os argumentos são
Atuação do psicólogo na promoção da saúde e do bem-estar no trabalho 7

mais críticos às relações entre capital e trabalho. Por sua vez, a psicopatologia
do trabalho, proposta por Christophe Dejours (1949-), é uma teoria muito
valorizada até hoje e que aborda as diversas vivências (insegurança, medo,
precariedade e repetição) que fazem parte do cotidiano laboral e impactam
de diferentes formas o corpo e a mente dos sujeitos. Ademais, temas como
estresse, burnout, assédio moral e sexual, capacitismo, racismo, sexismo,
homofobia, etc., têm sido frequentes nos estudos organizacionais. O campo
de estudos é amplo e adaptável às novas exigências sociais, mas o foco na
saúde e no bem-estar no trabalho é consensual entre as diferentes abordagens
(ZANELLI; BORGES-ANDRADE; BASTOS, 2014).
Nesta seção, você leu a respeito de algumas concepções sobre saúde e
bem-estar no ambiente laboral. O foco foi na história atual e nos estudos
conhecidos a respeito da psicologia no trabalho. Algumas abordagens foram
apenas mencionadas, então o leitor deve buscar maior aprofundamento, a
depender de seus interesses e crenças. O tema é amplo, assim como existem
muitas formas de abordá-lo. Na próxima seção, o enfoque será nas atividades
práticas que podem fazer parte do repertório do psicólogo no ambiente de
trabalho.

Atividades do psicólogo no ambiente


de trabalho
Durante a atividade profissional como psicólogo do trabalho, é comum ouvir
a expressão “entre o rochedo e o mar”, que deriva do fato de que as rela-
ções de trabalho, ou entre capital e trabalho, são essencialmente difíceis de
conciliar. Veja, portanto, que a posição do psicólogo do trabalho não é fácil
nem cômoda. Porém a psicologia desenvolveu estratégias para a atuação do
profissional nos ambientes laborais, de modo que ele pode assumir diferentes
posições em relação às contradições e assimetrias entre capital e trabalho.
Outro lugar-comum com que o psicólogo do trabalho se depara é que ele
está entre “a porta de entrada e a de saída das empresas”, uma afirmação
absolutamente simplista. Na verdade, ele se posiciona na entrada na medida
em que apoia o recrutamento e a seleção e na saída porque conduz entrevistas
e realiza o acompanhamento de processos como desligamento e preparação
para a aposentadoria. No entanto, entre um e outro, ele pode realizar muitas
e diferentes ações em que o psicólogo pode acompanhá-lo e apoiá-lo. Entre
a entrada e a saída do colaborador, ele pode ser avaliado e desenvolvido,
8 Atuação do psicólogo na promoção da saúde e do bem-estar no trabalho

adquirir novas competências, identificar-se com um novo tipo de carreira, ser


aconselhado em relação a problemas que esteja enfrentando, etc.
Há uma multiplicidade de possibilidades de atuação do psicólogo do traba-
lho, mas é importante observar que existem técnicas consagradas. Geralmente
ele atua nos processos de gestão de pessoas, ou seja, em recrutamento e
seleção, treinamento, avaliações, acompanhamentos, encaminhamentos,
etc. Alguns profissionais, por outro lado, chegam a posições de gestão e
participam, portanto, mais ativamente do planejamento estratégico devido
ao contato com a cúpula das organizações.
O recrutamento e seleção é uma das atividades mais exercidas pelos
psicólogos em organizações de trabalho, como demonstraram Gondim e
Queiroga (2013) por meio de pesquisas com mais de 500 psicólogos brasilei-
ros. A seleção de pessoas pode envolver a aplicação de testes psicológicos,
atribuição exclusiva do psicólogo, e talvez seja uma das razões pelas quais é
tão solicitado para essa atividade. O recrutamento e seleção envolve desde
o chamamento de candidatos adequados às vagas em aberto, normalmente
realizado por agências e bancos de dados, até a avaliação das pessoas inte-
ressadas por meio de entrevistas individuais e coletivas. O processo envolve
decisões importantes afetadas pelas condições do mercado de trabalho,
como escassez de mão de obra, desejo de admitir pessoas mais ou menos
preparadas, se o salário oferecido é competitivo para atrair bons candidatos,
se a gestão solicitante está em sintonia com o trabalho do psicólogo, entre
muitas outras, previsíveis ou não durante o processo.

A seleção parece ser uma atividade estandardizada, eminentemente


técnica. É, porém, mais do que isso. Em uma gestão fundamentada, os
critérios utilizados para a seleção de um colaborador servirão como preditores e
critérios de avaliação de seu desempenho, sendo, portanto, fundamentais para
o futuro do profissional na organização. Essa integração entre os processos de
gestão de pessoas precisa estar clara para o psicólogo. Além disso, ele deve
planejar as etapas do processo considerando todos os atores envolvidos, com
suas diferentes necessidades e expectativas (GONDIM; QUEIROGA, 2013).

Uma vez selecionados e admitidos, os colaboradores precisam ser ambien-


tados e orientados a respeito da empresa, bem como receber os treinamentos
necessários ao desempenho de suas funções. Essa fase se chama integração
e pode contar com tutores, ou seja, colegas que acompanham o novo traba-
lhador em seu ingresso na empresa. A integração on-line por meio de tutoriais
também é bastante utilizada para fornecer informações gerais sobre a empresa
Atuação do psicólogo na promoção da saúde e do bem-estar no trabalho 9

e o processo de trabalho. A integração, ou socialização, organizacional conta


com a participação do psicólogo, que pode, além de executá-la, planejá-la.
Se feita de forma adequada, favorecerá o desempenho, as relações e a ética
no trabalho do novo funcionário (BORGES; CARVALHO, 2013).
O psicólogo do trabalho também se envolve nos processos de treinamento
e desenvolvimento (T&D), que têm se tornado cada vez mais complexos, em
uníssono à atual dinâmica do mundo do trabalho. A palavra “educação” passou
a ser associada à já conhecida T&D (treinamento e desenvolvimento), hoje
TD&E. A abordagem não é apenas pontual, mas contextualizada na realidade
externa e interna das organizações, considerando o que é esperado dos
trabalhadores e do mercado de atuação das empresas. Hoje, então, TD&E é
um sistema composto por (BORGES-ANDRADE et al., 2013):

1. levantamento de necessidades;
2. planejamento;
3. execução;
4. avaliação.

Se uma ação de TD&E é realizada sem que haja uma demanda efetiva
que a motive, sua execução e sua avaliação podem ser impactadas. Além
da perda de recursos econômicos, um treinamento que não vá ao encontro
das expectativas e necessidades pode gerar frustrações e ser mal avaliado
pelos envolvidos. A escolha de professores adequados e de objetivos claros
a partir do levantamento de necessidades e de avaliação constante pode
favorecer o atingimento das expectativas e corrigir rotas em casos de críticas
(BORGES-ANDRADE et al., 2013).

Treinamento não são mais concebidos por meio de cursos esparsos


ou consultores. Atualmente, as organizações têm investido em uni-
versidades corporativas ou no conceito de educação corporativa continuada,
estratégicas para manter a empresa atualizada e, por consequência, mais dire-
cionada ao atingimento de suas metas (BORGES-ANDRADE et al., 2013).

O psicólogo também se envolve no processo de avaliação de desempenho,


que é um momento muito especial para equipes, chefias e colegas, sobretudo
quando a proposta é a avaliação 360°. De fato, é um momento delicado de
feedback e que pode, como tal, gerar situações constrangedoras. Preparar
10 Atuação do psicólogo na promoção da saúde e do bem-estar no trabalho

os colaboradores para dar e receber feedback é mais uma importante tarefa


do psicólogo do trabalho (PEIXOTO; CAETANO, 2013).
Além das atividades mais tradicionais até aqui descritas, o psicólogo pode
se envolver em muitas outras, como na medição do clima organizacional, na
gestão e no desenvolvimento de equipes, no acompanhamento de funcionários
e na promoção de saúde.
Mais do que nunca, tendências têm surgido no intuito de propiciar um
ambiente adequado e resultar no bem-estar do trabalhador. Um exemplo
é a employee experience (EX), uma abordagem holística que busca suprir os
trabalhadores dos pontos de vista psicológico, financeiro e competitivo. Isso
é alcançado por meio do desenvolvimento de equipes de alto desempenho,
de engajamento, de trabalho flexível, de benefícios e de outras políticas
de satisfação. A experiência dos trabalhadores é central para a gestão de
pessoas e deve abarcar as principais esferas de transformação do ambiente
organizacional: físico, tecnológico e cultural (COSTA, 2022).
Conceitos da inteligência emocional também interessam ao repertório
da atual gestão de pessoas, com atenção cada vez maior aos estados socio-
emocionais dos trabalhadores e suas contribuições para o desempenho das
organizações. Em seleção e desenvolvimento de pessoas, sobretudo, mas
não somente, é de fundamental interesse a ênfase em atitudes positivas e
outras que possam favorecer o bom clima na organização. As lideranças têm
um papel relevante no trabalho com as equipes para a criação e manutenção
desse tipo de atitude (PUENTE-PALACIOS; GONZALEZ-ROMÁ, 2013).

A teoria das trocas entre líder-membro, também chamada de vínculo


vertical diádico, sugere que o líder tem um papel estratégico no
gerenciamento emocional de sua equipe. É uma teoria que vai além de outras
tradicionais que focam unicamente na figura do líder, na medida em que ressalta
as diferentes camadas de relações entre o líder e os membros do grupo. O líder
consegue manter sua posição de comando e poder por meio de membros (in
group) em que confia e atribui responsabilidades, ao mesmo tempo que negocia
posições e os diferencia de membros fora do grupo (out group). Esse processo
se dá em três diferentes estágios (GONDIM; SIQUEIRA, 2014).
1) Avaliação inicial, quando o líder conhece o grupo e elege os membros de
sua confiança.
2) Construção de um vínculo, período de avaliação dos membros, para definir
se serão in ou out group.
3) Consolidação do vínculo, quando se dá o estabelecimento da relação, baseada
em aspectos afetivos.
Atuação do psicólogo na promoção da saúde e do bem-estar no trabalho 11

Dessa forma, a interação entre líder e colaboradores mais próximos é baseada,


principalmente, em avaliação afetiva (GONDIM; SIQUEIRA, 2014).

A inteligência emocional é concebida de diferentes formas, especialmente


como traço disposicional ou como uma competência a ser desenvolvida.
Dessa forma, seria relacionada com a prática, em situações de teste de de-
sempenho, não propriamente uma habilidade da pessoa. Por consequência,
ganha relevância a regulação emocional, ou seja, a capacidade de influenciar
o tipo de emoção expressa, bem como o modo e o momento de expressá-la
(ZANELLI; BORGES-ANDRADE; BASTOS, 2014).
Na próxima seção, você verá alguns exemplos de atividades que o psicó-
logo pode desenvolver em organizações para expandir a compreensão e o
entendimento sobre suas funções. Tendo em mente as diferentes abordagens
possíveis do trabalho do psicólogo, focaremos nas ações, no que pode ser
proposto para melhorar o ambiente e as relações de trabalho.

Intervenções do psicólogo na promoção de


saúde e bem-estar no trabalho
De forma a tornar a atuação do psicólogo no trabalho mais clara, esta seção
apresenta alguns exemplos práticos. O primeiro deles é relacionado a um
programa destinado a inibir casos de assédio moral no trabalho a partir da
sensibilização e conscientização dos trabalhadores. O segundo se refere a
um programa de diversidade implementado por uma empresa que visou a
informar, sensibilizar, conscientizar e envolver os trabalhadores.

Assédio moral nas organizações


O assédio moral tem sido muito discutido nas organizações nas últimas
décadas, sobretudo por ser frequente e negligenciado. Brincadeiras e mani-
festações de cunho discriminatório, que antes eram toleradas na sociedade,
hoje são consideradas assédio, assim como atitudes autoritárias e persecu-
tórias entre chefes e subordinados e/ou entre colegas (BARRETO; EUCLIDES;
HERNECK, 2021; HELOANI, 2005). A batalha pela criminalização dessas atitudes
foi longa. Antes, eram juridicamente enquadradas como danos morais, até
que, em 2019, foi aprovado o Projeto de Lei nº 4.742, proposto em 2001, tipi-
ficando o assédio moral (BRASIL, 2001). As empresas, com receio de ter que
responder por práticas que não conseguem controlar diretamente, passaram
a criar mecanismos inibitórios, como manuais de conduta e ética, palestras,
12 Atuação do psicólogo na promoção da saúde e do bem-estar no trabalho

canais de denúncia e ouvidorias. Além disso, os psicólogos do trabalho foram


incumbidos de lidar com o tema.
O assédio moral começa de forma menos perceptível, com até certa sur-
presa de parte de quem o sofre, mas vai se agravando a ponto de prejudicar
muito o trabalho e a vida psíquica das vítimas (GUEDES, 2008). Atrasos em
promoções, injustiças, acusações, ambientes de trabalho abusivos, boicotes,
fofocas, entre tantas outros práticas, fazem parte do repertório dos assédios.
A princípio, o assédio era considerado descendente, ou seja, realizado pelo
superior hierárquico, mas hoje se sabe que também pode ser ascendente,
dos funcionários à chefia, e horizontal, entre pares. Há casos famosos de
assédio moral, que se tornaram emblemáticos, como o da France Telecom, que
ocorreu no início dos anos 2000 a partir de um processo de privatização da
organização e da grande pressão para demissões voluntárias, o que provocou
vários casos de suicídio.
Trata-se, portanto, de casos de violência no trabalho, que devem ser
combatidos com programas de tipo tolerância zero, pois colocam em risco
a saúde mental e a vida de pessoas. As organizações não podem, mesmo
indiretamente, patrocinar esse tipo de comportamento. Para combatê-lo,
podem promover programas em diversas frentes, para que a mensagem chegue
de forma capilar a todos os colaboradores da organização. Com frequência,
esses programas começam por meio de sensibilização, pois muitas pessoas
desconhecem o significado e as consequências do problema. Também se
costuma, a princípio, criar mecanismos internos de denúncia. Nesse contexto,
a participação de todos na elaboração e construção de um código de ética
é fundamental. Isso pode ser feito por meio de consulta de forma anônima
ou em grupos de tarefa.
As pessoas precisam ser informadas e advertidas sobre consequências e
normativas. Assim, o psicólogo pode planejar formas de reunir as pessoas,
em convenções ou encontros frequentes, para discutir essas mudanças, com a
participação da alta gestão da empresa para legitimar o processo. O trabalho
coletivo deve também refletir em ambientes menores, reforçar as informações
e normas em departamentos, setores, contando com a colaboração de chefias
e gestores. A plataforma on-line da empresa também é um veículo potente na
difusão da campanha, com um trabalho gráfico amigável e atraente cada vez
que o funcionário entrar no sistema. Além disso, pode-se criar um calendário
de encontros de trabalho dos diversos setores, de modo que o psicólogo e
seus colaboradores no programa possam aproveitar alguns momentos iniciais
para retomar o tema. É importante inspirar-se em casos práticos, mas sem
revelar fontes, que esclareçam e ilustrem os objetivos da organização.
Atuação do psicólogo na promoção da saúde e do bem-estar no trabalho 13

Após o período inicial de divulgação e conscientização, a organização


precisa decidir como agir em relação a denúncias. Se o programa é
de tolerância zero, a depender do caso, caso comprovado o assédio, resultará
em demissão. Alternativas existem e dependem de algumas decisões, como a
respeito do caminho a ser seguido: se será de conciliação ou de trabalho nas
características de alguns sujeitos. Porém é necessário cuidado na condução dos
casos, para que não sejam interpretados como negligência ou, pior ainda, coni-
vência. Dessa forma, todo esforço empreendido será perdido, pois a mensagem
soará contraditória aos resultados. O tema e a realização de programas são
delicados e complexos, mas são importantes para evitar que a organização se
torne um ambiente tóxico, facilitador do desenvolvimento de doenças mentais.

Diversidade nas organizações


A diversidade tem sido um tema recorrente nas ciências humanas e sociais,
com destaque para a convivência justa e igualitária, ou ao menos protegida
de discriminação, entre pessoas de gênero, raça, cor, idade e capacidades
diferentes. Empresas têm suprido essa demanda com programas de inclusão
de pessoas com características específicas, como os já conhecidos programas
de trainee para negros e idosos, treinamento e admissão de pessoas com
deficiência (PCDs), programas de incentivo à liderança feminina, entre tantos
outros. Atualmente, organizações que desejam se manter competitivas e com
boa imagem na sociedade precisam pensar em algum tipo de programa de
inclusão, que pode ser direcionado a uma população específica ou mais geral
(CARRIERI; AGUIAR; DINIZ, 2013).
Assim como o programa de prevenção de assédio moral, o programa de
inclusão necessita de ampla divulgação e responsabilização de todos. De
fato, são frequentes os casos de PCDs protegidas por legislação de cotas
que iniciam em um novo emprego, mas são negligenciadas, não têm opor-
tunidades de ascender. A admissão por si só é apenas uma parte da solução
do problema de inclusão, pois, uma vez que o colaborador seja admitido, o
desafio é tratá-lo de forma justa. Nesse contexto, o psicólogo pode ser um
agente de transformação, incentivando o programa, criando mecanismo de
divulgação (palestras, depoimentos, uso de mídia, etc.) e angariando simpati-
zantes. É importante não criar dicotomias como “só mulher fala de mulher” ou
“só negros falam de negros”, e os simpatizantes, embaixadores, apoiadores,
aliados, independentemente do nome que receberem, são importantes para
que a inclusão seja universal.
14 Atuação do psicólogo na promoção da saúde e do bem-estar no trabalho

Nos programas de diversidade, além da inclusão, é importante o moni-


toramento da vida organizacional desses sujeitos, de modo a garantir que
eles desfrutem dos mesmos direitos e oportunidades de que todos os outros
trabalhadores desfrutam. Podem ser criados grupos de inclusão em que as
pessoas relatem suas experiências e possam resolver problemas e se sentir
apoiadas. Também podem ser criados treinamentos e planos de desenvol-
vimento específicos para superar possíveis problemas na escolarização de
pessoas de baixa renda, PCDs, etc. (GALVÃO FILHO, 2013).

No intuito de realmente fomentar um ambiente inclusivo, é muito im-


portante que a empresa invista em soluções e tecnologias assistivas,
como comunicação aumentativa e alternativa, e em recursos de acessibilidade em
geral, ou seja, formas específicas de participação, como libras, audiodescrição,
leitores de tela, etc. (BONOTTO et al., 2020; GALVÃO FILHO, 2013).

Neste capítulo, conhecimentos históricos e práticos foram abordados para


apresentar e contextualizar a atuação do psicólogo do trabalho. Muitas são
as vias possíveis de contribuição da psicologia nas empresas, pois as pessoas
colocam expectativas e desejos no trabalho, além de conviverem com outras
pessoas e por longas horas em seu ambiente. As relações de poder, as carac-
terísticas pessoais, as normas e a cultura da organização, e as relações de
trabalho são todas fundamentais para entender as possibilidades de saúde
ou de adoecimento no trabalho. Além de críticas sobre o papel do psicólogo
do trabalho, como explorador de trabalhadores ou como aliado ao capital,
é importante examinar possibilidades de contribuição para a satisfação
dos colaboradores no ambiente laboral. Acima de tudo, o psicólogo precisa
munir-se de conhecimento teórico, capacidade crítica, decisão e confiança
para se posicionar em sua atuação em um ambiente tão complexo.

Referências
BARRETO, L. C.; EUCLIDES, M. S.; HERNECK, H. R. “É só uma brincadeira!”: estudantes
negras e assédio nas universidades. Revista de Ciências Humanas, v. 2, n. 21, p. 118-
132, 2021.
BONOTTO, R. et al. Oportunidades de aprendizagem com apoio da comunicação au-
mentativa e alternativa em tempos de Covid-19. Revista Ibero-Americana de Estudos
em Educação, v. 15, n. 4, p. 1730-1749, 2020.
BORGES, L. O.; CARVALHO, V. Tutorização organizacional de novos empregados. In:
BORGES, L. O.; MOURÃO, L. (org.). O trabalho e as organizações: atuações a partir da
psicologia. Porto Alegre: Artmed, 2013. cap. 14.
Atuação do psicólogo na promoção da saúde e do bem-estar no trabalho 15

BORGES-ANDRADE, J. et al. Treinamento, desenvolvimento e educação: um modelo


para sua gestão. In: BORGES, L. O.; MOURÃO, L. (org.). O trabalho e as organizações:
atuações a partir da psicologia. Porto Alegre: Artmed, 2013. cap. 16.
BRASIL. Projeto de Lei nº 4.742, de 2001. Introduz art. 146-A no Código Penal Brasileiro
[...]. Brasília, DF: Câmara dos Deputados, 2001. Disponível em: https://www.camara.leg.
br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=28692. Acesso em: 10 jul. 2023.
CARRIERI, A.; AGUIAR, A. R.; DINIZ, A. P. Reflexões sobre o indivíduo desejante e o sofri-
mento no trabalho: o assédio moral, a violência simbólica e o movimento homossexual.
Cadernos EBAPE.BR, v. 11, n. 1, 2013.
COSTA, D. Employee experience: o que é, exemplos e importância no RH. Gupy, 28 nov. 2022.
Disponível em: https://www.gupy.io/blog/employee-experience. Acesso em: 10 jul. 2023.
GALVÃO FILHO, T. A construção do conceito de tecnologia assistiva: alguns novos inter-
rogantes e desafios. Entreideias: Educação, Cultura e Sociedade, v. 2, n. 1, p. 25-42, 2013.
GONDIM, S.; QUEIROGA, F. Recrutamento e seleção de pessoas. In: BORGES, L. O.;
MOURÃO, L. (org.). O trabalho e as organizações: atuações a partir da psicologia. Porto
Alegre: Artmed, 2013. cap. 13.
GONDIM, S.; SIQUEIRA, M. Emoções e afetos no trabalho. In: ZANELLI, J. C.; BORGES-
-ANDRADE, J.; BASTOS, A. V. B. (org.). Psicologia, organizações e trabalho no Brasil. 2.
ed. Porto Alegre: Artmed, 2014. p. 207-236.
GUEDES, M. N. Terror psicológico no trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 2008.
HELOANI, R. Assédio moral: a dignidade violada. Aletheia, n. 22, 2005.
MCCRAE, R. R.; COSTA JR., P. T. Toward a new generation of personality theories: theo-
retical contexts for the five-factor model. In: WIGGINS, J. S. (ed.). The five-factor model
of personality: theoretical perspectives. New York: Guilford, 1996. p. 51-87.
PEIXOTO, A.; CAETANO, A. Avaliação de desempenho. In: BORGES, L. O.; MOURÃO, L.
(org.). O trabalho e as organizações: atuações a partir da psicologia. Porto Alegre:
Artmed, 2013. cap. 18.
PUENTE-PALACIOS, K.; GONZALEZ-ROMÁ. V. Gestão de equipes de trabalho. In: BORGES,
L. O.; MOURÃO, L. (org.). O trabalho e as organizações: atuações a partir da psicologia.
Porto Alegre: Artmed, 2013. cap. 11.
SIQUEIRA, M. M.; MARTINS, M. C. Promoção de saúde e bem-estar em organizações. In:
BORGES, L. O.; MOURÃO, L. (org.). O trabalho e as organizações: atuações a partir da
psicologia. Porto Alegre: Artmed, 2013. cap. 21.
STRAUB, R. O. Psicologia da saúde. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014.
ZANELLI, J. C.; BORGES-ANDRADE, J.; BASTOS, A. V. B. (org.). Psicologia, organizações e
trabalho no Brasil. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014.

Leituras recomendadas
CAMPOS, K. et al. Psicologia organizacional e do trabalho: retrato da produção científica
na última década. Psicologia: Ciência e Profissão, v. 31, n. 4, 2011.
GAULEJAC, V. Gestão como doença social. Aparecida: Ideias & Letras, 2007.
PUENTE-PALACIOS, K.; PEIXOTO, A. L. A. (org.). Ferramentas de diagnóstico para organi-
zações e trabalho: um olhar a partir da psicologia. Porto Alegre: Artmed, 2015.
16 Atuação do psicólogo na promoção da saúde e do bem-estar no trabalho

Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos


testados, e seu funcionamento foi comprovado no momento da
publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas
páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os edito-
res declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou
integralidade das informações referidas em tais links.
Dica do Professor

A promoção de saúde prevê a abordagem de seu oposto, ou seja, do adoecimento no trabalho. O


melhor seria trabalhar com prevenção e essa é uma das tarefas do psicólogo nas empresas — de
colocar o seu trabalho, por mais operacional que seja, a serviço do bem-estar das pessoas. Porém,
nem sempre a prevenção é possível e o psicólogo precisa lidar com problemas consolidados que
comprometem as capacidades físicas e mentais dos trabalhadores.

Nesta Dica do Professor, você vai ver uma categoria de problemas laborais chamada de violência
no trabalho, que passa por ações isoladas de incivilidade, até atuações de desrespeito mais sérias e
repetidas nos ambientes de trabalho. Alguns exemplos são o assédio moral e o burnout. O primeiro
é favorecido por relações perversas de trabalho, em que um sujeito ou grupo escolhe outro para
boicotar e cometer repetidas ações de desrespeito a ponto de o sujeito assediado adoecer. Já o
burnout é favorecido pelo tipo de gestão ou organização do trabalho que sobrecarrega os sujeitos,
que são acometidos por sensações de esgotamento e despersonalização. Esses são conhecimentos
essenciais para que o psicólogo possa monitorar e intervir nas relações de trabalho de modo a
acolher e coibir atitudes dessa natureza.

No vídeo abaixo você verá mais sobre a atuação do psicólogo em contextos de violência no
trabalho.

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Exercícios

1) Para o estudo das emoções de trabalho, é proposta uma sistematização didática com base na
noção de níveis. É possível encontrar essa subdivisão em quatro níveis de estudo sobre as
emoções no trabalho.

O terceiro nível tem como foco os “grupos” corriqueiramente presentes nos contextos
organizacionais. Considerando que as relações impactam diretamente o bem-estar e o
desempenho dos trabalhadores, leia as afirmativas a seguir:

I. O humor do líder tem influência nos membros de sua equipe de trabalho e, de certa forma,
tem impacto direto nos processos internos do grupo, ou seja, está relacionado ao conceito
de humor do grupo, o que contribui para a composição afetiva deste.

II. O humor do grupo pode estar associado à inteligência emocional dele. Um grupo em que
grande parte dos membros se caracteriza por elevados índices de inteligência emocional tem
influência das trocas interpessoais e da aprendizagem no comportamento grupal, assim
como na sua efetividade no trabalho.

III. O modelo de liderança está diretamente relacionado ao desempenho da equipe. Um


ponto que inspira a confiança nos membros do grupo é o estilo de liderança
transformacional. Além disso, inspira padrões de conduta, provê estímulos intelectuais e
atende às necessidades emocionais de seus membros.

Qual(is) está(ão) correta(s)?

A) I.

B) I, II e III.

C) I e II.

D) I e III.

E) II e III.

2) No que diz respeito às relações do trabalho, a teoria das trocas líder-membro, também
conhecida como teoria do vínculo vertical diádico, é muito utilizada e reconhecida nos
estudos que envolvem os grupos. Sabe-se da importância da comunicação por parte do líder
no que tange ao gerenciamento e à expressão emocional de sua equipe de trabalho.
Trocas ocorrem nas relações entre líder e membros de confiança do grupo (in group) para os
quais são atribuídas responsabilidades e estabelecidos acordos, diferenciando-os dos
membros fora do grupo (out group). A construção da relação entre líder e membros do grupo
passa por três estágios.

Sobre esses estágios, avalie os itens a seguir:

I. Avaliação inicial, que define uma qualidade de relação cujos aspectos afetivos são
essenciais.

II. Processo de construção de um vínculo, em que o líder testa a avaliação inicial e define se
o novo membro pertencerá ao in group ou ao out group.

III. Consolidação do vínculo, que permite ao líder conhecer o membro e avaliar suas
potencialidades.

Qual(is) item(ns) está(ão) correto(s)?

A) I, II e III.

B) II e III.

C) I e III.

D) I.

E) II.

3) Uma teoria da personalidade importante sobre a afetividade no trabalho é a do modelo dos


cinco grandes fatores. Diante de ampla gama de dados disponíveis sobre o comportamento
afetivo dos indivíduos, essa teoria busca simplificar a visualização por meio de um padrão
hierárquico. Nela, traços marcantes podem ser agrupados em alguns fatores.

Considerando isso, leia as afirmativas a seguir:

I. O neuroticismo engloba a ansiedade, a hostilidade raivosa, a depressão, a autoconsciência,


a impulsividade e a vulnerabilidade.

II. A extroversão diz respeito à cordialidade, à gregariedade, à assertividade, à atividade e à


busca de excitação e emoções positivas.

III. A sociabilidade envolve a confiança, a sinceridade, o altruísmo, a aquiescência, a


modéstia e a ternura. Já a abertura à experiência tem relação com a fantasia, a estética, os
sentimentos, a ações, a ideias e os valores.
IV. A realização está associada com a competência, a ordem, o cumprimento de deveres, a
realização, a autodisciplina e a deliberação.

Qual(is) está(ão) correta(s)?

A) I e II.

B) II.

C) I, III e IV.

D) II e III.

E) I, II, III e IV.

4) Pessoas emocionalmente inteligentes estão mais aptas a reconhecer seus estados


emocionais e os de outras pessoas, a solucionar problemas e a regular ações em diversas
situações ou contextos, inclusive no trabalho.

Carina é coordenadora de um dos setores de telemarketing de uma grande empresa em São


Paulo. Em sua coordenação, existem 25 funcionários em uma sala coletiva, separada por
biombos transparentes, onde cada funcionário, embora tenha privacidade acústica, não
tenha privacidade visual devido à transparência do material das divisórias. De sua mesa,
Carina pode ver todos os membros da equipe, assim como todos também a veem. Durante
um turno de trabalho, uma funcionária chamada Melissa sai do seu biombo correndo aos
prantos e segue para o banheiro. Todos os outros funcionários se levantam assustados e
olham na direção de Melissa e, sequencialmente, para Carina, esperando dela alguma ação.
Carina pede que se aquietem e retornem ao trabalho, permitindo que a privacidade de
Melissa seja garantida, evitando conversas paralelas ou olhares questionadores. Então,
segue até Melissa e pergunta se pode ajudá-la. Esta conta que seu filho acabou de ser levado
ao hospital, pois sofrera uma queda na escola. Carina compreende a situação e fala algumas
palavras para acalmar Melissa, pedindo que ela pegue sua bolsa. Na sequência, chama um
táxi para levá-la até o hospital onde seu filho está internado.

Diante do caso descrito, leia as afirmativas a seguir:

I. Carina exerceu sua habilidade de empatia com Melissa.


II. Nessa situação, Carina demonstrou automotivação.
III. Diante da situação, Carina demostrou autoconsciência.

Qual(is) delas está(ão) correta(s)?

A) I e III.
B) I, II e III.

C) I.

D) II.

E) III.

5) O estado afetivo-emocional envolve questões relativas a sentimentos positivos ou negativos


em certas situações ou espaços de tempo. O estado afetivo-emocional impacta o
comportamento organizacional — como satisfação com o pagamento, comportamentos de
saída da organização, percepção de estresse no trabalho, burnout e intenção de rotatividade.
Nesse contexto, destacam-se três importantes formulações teóricas.

Diante do texto descrito, leia as afirmativas a seguir:

I. O estado de ânimo engloba duas dimensões de afetividade: os afetos positivos, que


refletem sentimentos de entusiasmo, atividade e alerta; e os afetos negativos, que incluem
nervosismo, raiva, culpa, desprezo e medo.

II. A autoestima é um sentimento sobre competência e valores pessoais que refletem na


capacidade individual para lidar com os desafios impostos pela vida e de se tornar feliz.

III. A satisfação geral com a vida é a avaliação global que a pessoa faz de sua vida,
constituindo-se em um componente de felicidade e na dimensão mais afetiva do
funcionamento mental positivo.

Qual(is) delas está(ão) correta(s)?

A) I, II e III.

B) I.

C) II.

D) III.

E) I e III.
Na prática

O trabalho é um aspecto central na vida da maioria das pessoas, pois está relacionado a questões
de subsistência, como sustento financeiro e acesso a bens materiais, bem como à formação da
identidade e de relacionamentos interpessoais. Pode ser tanto fonte de sofrimento e adoecimento
quanto de saúde mental.

Neste vídeo, você vai aprender mais sobre a abordagem da psicodinâmica do trabalho e como pode
utilizá-la para guiar sua atuação em organizações e instituições com vistas ao fortalecimento da
saúde mental das pessoas.

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As empresas são formadas por pessoas que produzem e se relacionam, ou seja, elementos de
grande relevância para o funcionamento e o sucesso do trabalho. São as pessoas que tornam
possíveis os processos e que alcançam os resultados. Entender e aprimorar a relação entre os
trabalhadores, bem como promover a saúde laboral, é essencial para o sucesso da empresa.

Neste Na Prática, você vai compreender por que o psicólogo é um dos profissionais imprescindíveis
na garantia dessa equação ao lidar com pessoas e tarefas.
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Saiba mais

Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor:

Futuro do trabalho: a importância da saúde mental


No vídeo a seguir, você verá importantes depoimentos de trabalhadores e as rotinas de trabalho
que provocam estresse e adoecimento. As empresas melhoram os ambientes, dão a ideia de maior
liberdade, mas a pressão do trabalho continua alta. As tecnologias favorecem a conectividade
constante e, por conseguinte, aumentam as horas envolvidas com o trabalho, o que repercute na
vida privada das pessoas.

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O que significa saúde?


O vídeo contrasta o conceito tradicional de saúde com o mais atual, que contextualiza o sujeito que
necessita de cuidados. Mais interessante ainda é que o vídeo fala da realidade brasileira, das
necessidades da população em termos de saúde e do quanto esse conceito é abrangente.

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O trabalho e as organizações: atuações a partir da psicologia


Leia o Capítulo 1 – Compromisso social e ético: desafios para a atuação em psicologia
organizacional e do trabalho, que trata dos desafios essenciais ao cotidiano de trabalho do
psicólogo nas organizações e seu compromisso com a saúde. Além disso, o texto diferencia a
psicologia do trabalho e das organizações, o que envolve uma discussão ética relevante e uma
postura de trabalho comprometida com a sociedade.

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Unidade de Estudos 8 - Psicologia
Comunitária

Apresentação

A psicologia comunitária é um ramo da psicologia social, que se constitui na resolução dos


problemas sociais nas comunidades. Ela busca trabalhar com sujeitos sociais em condições
específicas, atento às suas respectivas individualidades. Seus objetivos referem-se à melhoria das
relações entre os sujeitos, entre estes e a natureza e instituições sociais ou o seu empoderamento.
Nessa perspectiva, está todo o esforço para a mobilização das comunidades na busca de melhores
condições de vida. A psicologia social constitui e é constituída por uma diversidade de saberes que
estimulam a problematização dos modos de viver, como as representações sociais, os grupos e as
instituições. Os campos problemáticos criados a partir dos desdobramentos da psicologia social
abriram espaço para uma atuação mais efetiva desta.

Nesta Unidade de Aprendizagem, você vai estudar sobre a crise na psicologia social, fará uma
reflexão sobre o conceito de comunidade e entenderá a prática da psicologia social comunitária.

Bons estudos.

Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

• Reconhecer a psicologia social experimental empírico-analitica e a crise na psicologia social.


• Identificar o conceito de comunidade.
• Analisar a atuação prática da psicologia social comunitária.
Infográfico

No infográfico você vai compreender a importância da psicologia social comunitária.


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Conteúdo do Livro

A comunidade, seja ela geográfica (bairro ou cidade) ou psicossocial (colegas de escola ou trabalho),
é onde vivemos grande parte da vida. Todavia, o conceito de comunidade utilizado pela psicologia
social comunitária é para além de viver ou conviver no mesmo espaço geográfico ou psicossocial:
refere-se a uma metodologia de trabalho que deve identificar as necessidades vividas por um
determinado grupo/comunidade. Diante dessas necessidades, promover, por meio de intervenções
grupais, o desenvolvimento de uma conscientização coletiva e que, desse modo, esses grupos
possam assumir a autonomia, conscientes dos determinantes sociopolíticos de sua situação. Faça a
leitura do capítulo Psicologia comunitária, do livro Psicologia Social, base teórica desta Unidade de
Aprendizagem, e conheça o potencial da psicologia social comunitária na intervenção de grupos
populares.

Boa leitura.
Revisão técnica:
Caroline Bastos Capaverde
Graduada em Psicologia
Especialista em Psicoterapia Psicanalítica

P974 Psicologia social [recurso eletrônico] / Daiane Duarte Lopes...


[et al.] ; [revisão técnica: Caroline Bastos Capaverde]. –
Porto Alegre : SAGAH, 2018.

ISBN 978-85-9502-524-0

1. Psicologia social. I. Lopes, Daiane Duarte.


CDU 316.6

Catalogação na publicação: Karin Lorien Menoncin – CRB 10/2147


Psicologia comunitária
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Reconhecer a psicologia social experimental empírico-analítica e a


crise na psicologia social.
 Identificar o conceito de comunidade.
 Analisar a atuação prática da psicologia social comunitária.

Introdução
A psicologia comunitária é um ramo da psicologia social e se constitui na
resolução dos problemas sociais nas comunidades. A psicologia comunitária
busca trabalhar com sujeitos sociais em condições específicas, atentando
para as suas respectivas individualidades. Seus objetivos se referem à me-
lhoria das relações entre os sujeitos e entre estes, a natureza e instituições
sociais ou o seu empoderamento. Nessa perspectiva está todo o esforço para
a mobilização das comunidades na busca de melhores condições de vida.
A psicologia social constitui e é constituída por uma diversidade de
saberes que estimulam a problematização dos modos de viver, como as
representações sociais, os grupos e as instituições. Os campos problemá-
ticos criados a partir dos desdobramentos da psicologia social abriram
espaço para uma atuação mais efetiva da psicologia social.
Neste capitulo, você estudará sobre a crise na psicologia social, poderá
fazer uma reflexão sobre o conceito de comunidade e entenderá a prática
da psicologia social comunitária.

Implicações e atravessamentos
da crise na psicologia social
A psicologia social experimental empírico-analítica é uma abordagem da psicolo-
gia social que utiliza o método empírico analítico como ferramenta para estudar
os fenômenos observáveis do comportamento dos sujeitos e das sociedades. E
2 Psicologia comunitária

restringe o desenvolvimento dos seus conhecimentos, gerando conceitos somente


por meio da observação de fatos que possam ser mensuráveis e estimáveis.
Esse rigor científico estabelecido pela psicologia social experimental empí-
rico-analítica, fixado pelas metodologias quantitativas de pesquisa, estruturava
desde um problema a ser investigado, assim como hipóteses que norteavam as
observações, sendo justamente este o ponto de instabilidade, que acabou por
despertar uma nova abordagem na psicologia social, a psicologia comunitária.
A psicologia comunitária emerge receptiva à compreensão de enfoques
históricos e antropológicos, com um olhar sensível ao contexto político e social.
Sem se ater a uma metodologia ou a uma teoria, não trouxe consigo um objeto
definido, mas um enfoque mais qualitativo sobre os modos de ser e de viver.
Surgiu como uma crítica à abordagem norte-americana, onde o psicólogo
social se posicionava de maneira distante aos objetos de estudo e ganhou
força com os movimentos da análise institucional na América Latina, que
posicionavam o pesquisador em meio ao estudo, como podemos acompanhar
na pesquisa-ação e na pesquisa participativa. Foi também problematizadora
do posicionamento elitista da psicologia, que até então se colocava à margem
de questões da zona periférica e rural das cidades, deixando de lado os operá-
rios, as favelas, a miséria, a violência, a pluralidade criativa no existir, como
podemos acompanhar uma representação na Figura 1.

Figura 1. Problematização do posicionamento elitista


da psicologia norte-americana.
Fonte: Rawpixel.com/Shutterstock.com.
Psicologia comunitária 3

No entanto, com o surgimento dessa nova visão da psicologia social e


na ânsia de atuação e posicionamento que esta abordagem convoca, fez da
concepção reflexiva uma urgência prática dessa psicologia que estava a nascer,
assim inserindo como campo, para o psicólogo comunitário, a militância, o
ativismo, a postura engajada e politizada, no lugar que anteriormente era
ocupado pela neutralidade.
Com isso, a crise na psicologia social foi atravessada pela necessidade de
se criar um campo problemático, onde se tornou indispensável à presença
de uma luta de forças que questionem demandas instituídas pela realidade.
Dessa maneira, a psicologia social, com um olhar sobre a comunidade,
busca construir um espaço para diálogos constantes, objetivando a criação
de territórios para inclusão de discussões para desenvolver estratégias de
mudança social.
Sob esse novo prisma, convocado pela autoanálise a respeito do efetivo
saber e fazer da psicologia social, a construção de novas metodologias, bem
como a estruturação de novos objetos teóricos se mostraram essenciais. A crise
na psicologia social foi implicada por uma abertura da consciência sobre a
atuação e a extensão do alcance do olhar e escuta que transformou um campo
que antes se denominava lugar antropológico, de maneira a alcançar um novo
sentido, podendo ser chamado de comunidade.

No Brasil, o golpe militar de 1964 teve influência especial na crise da psicologia social e
posterior ao surgimento da psicologia social comunitária. A década de 1960 foi marcada
por extrema repressão e violência, que promoveram um desconforto e uma comoção
aos psicólogos sociais, que passaram a questionar seu papel como produtores de
consciência e organização na sociedade (CAMPOS, 2001).

Comunidade
O termo comunidade se expressa tanto como um estado, no sentido do que é
comum ou está em concordância, como em um lugar, assumindo um sentido
de coletividade, corpo social. Assim, comunidade se assume tanto como
identidade em uniformidade e harmonia, como em conjunto, união de sujeitos
com interesses semelhantes, similarizando conceitualmente com povo, nação,
confraria, cultura (ARENDT, 1997).
4 Psicologia comunitária

Para a psicologia social, comunidade se refere a um espaço criador de


identidade, um campo relacional e histórico, onde é possível que cada membro
expresse a totalidade. Comunidade, para a psicologia social e as ciências sociais,
ocupa uma esfera paisagística em que só é possível seu existir enquanto seus
membros mantiverem certa unidade.
Assim, comunidade assume um caráter de invenção norteadora em direção
à clareza teórica. Para o estudo da comunidade, fica o compromisso com a
identificação do sujeito estudado com a paisagem a qual está inserido, levando
em conta a diversidade no viver desses sujeitos e a flexibilização fronteiriça
a que se apresentam.
Como referido por Arendt (1997), a contemporaneidade trouxe consigo
uma transitoriedade no viver, com um trânsito constante entre a residência,
que acaba por existir restritivamente, muitas vezes apenas como dormitório,
e os locais de trabalho, que dão espaço para a invenção de novas formas de
existir no mesmo espaço. Afinal de contas, nos locais de trabalho existem
normas e regras próprias que contrariam a legitimidade de ser plenamente
em cada sujeito.
Dessa maneira, podemos refletir sobre o conceito de comunidade na
contemporaneidade, onde a flexibilização entre os limites da comunidade,
que cada vez mais elásticos possibilitam a criação de novas potências.
Por exemplo, se pensarmos em uma comunidade, que outrora fechada em
si estava completamente imersa em seu próprio funcionamento, muitas
vezes causando prejuízos aos seus membros, seja pela violência, miséria,
falta de saneamento, maus hábitos entre outros, não conseguia permitir
o rompimento dos ciclos destrutivos, reproduzindo e sendo reprodutor,
perpetuando um funcionamento não benéfico ou antiproducente. Hoje com
o fluxo e o trânsito cada vez mais frequente, as informações conseguem
acessar os membros da comunidade, que as utilizam como ferramentas
para romper com hábitos disfuncionais ou proliferar práticas que possam
beneficiar a todos.
A comunidade pode então ser permanência, habitação e trânsito. Ocupando
um espaço em que seus membros residem e transitam, com fluxo permanente
para a constante construção do seu desenvolvimento.
Psicologia comunitária 5

No filme dinamarquês A Comunidade, de 2016, do diretor Thomas Vinterberg, os


tensionamentos, descobertas, equilíbrios e conflitos de interesses comuns em uma
comunidade na década de 1970.

Psicologia social comunitária


Como vimos anteriormente, a psicologia social comunitária surgiu a partir da
crise na psicologia social, em inconformidade com o posicionamento neutro,
baseado no método empírico-analítico. A significante “comunitária” fala
de um lugar e implica atuação nesse lugar, visando ao desenvolvimento da
consciência dos sujeitos que habitam, sobre si, sobre seu habitar e sobre o
ambiente habitado.
A psicologia social comunitária oportuniza uma estrutura igualitária entre
as relações, unindo os membros de maneira a superar o individualismo, em
práticas que promovam à autogestão (CAMPOS, 2001). E utiliza a multiplici-
dade das inteligências dos membros e seu potencial produtivo para constituir
o desenvolvimento da autonomia da comunidade.
Ressaltando as intervenções com grupos, a psicologia social comunitária
acentua a construção das relações interpessoais e intergrupais. Potencializando
o desenvolvimento critico-ético e politizado sobre o viver na comunidade.
Sendo este o principal campo de mediação da psicologia social comunitária,
o estimulo na elaboração de possibilidades de mudança e a conscientização
de suas potencialidades.
Freire (1987) nos aponta para a importância comunicacional no desen-
volvimento e construção dos conhecimentos. O trabalho do psicólogo social
comunitário evolui conforme a progressão da dialogicidade. Pois, como apon-
tado anteriormente por Freire (1987), sem a comunicação baseada no diálogo,
a interação e a expressividade ficam restritas inibindo o aprendizado.
O desenvolvimento da criticidade se empenha a perceber a realidade a
qual a comunidade vive e está inserida. Como pensado por Freire (1996) a
6 Psicologia comunitária

criticidade organiza o sujeito ao exercício da reflexão, potencializando seu olhar


para as diferenças e para o desenvolvimento de aprendizagens e mudanças.
A psicologia social comunitária possui em seu propósito a abertura para
a diversidade de conhecimentos e acredita na amplitude destes, por meio
das trocas cambiadas em meio ao diálogo. Cada sujeito possui em si uma
infinidade de potências criadoras que se estimuladas acabam por impulsionar
competências, e é essa convicção da psicologia social comunitária que a torna
única e promovedora de transformações.

A atuação do psicólogo comunitário acontece mais efetivamente de maneira interdis-


ciplinar, associando diferentes fontes conceituais e multidisciplinares, normalmente
formando equipe com o serviço social e com profissionais das áreas da saúde, de
forma a agregar conhecimentos e somar forçar para atingir a cada comunidade em
sua individualidade, com suas características únicas.

ARENDT, R. J. J. Psicologia comunitária: teoria e metodologia. Psicologia: Reflexão &


Crítica, Porto Alegre, v. 10, n. 1, p. 7-16, 1997.
CAMPOS, R. H. F. (Org.). Psicologia social comunitária: da solidariedade à autonomia.
Petrópolis: Vozes, 2001.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São
Paulo: Paz e Terra, 1996.
FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.

Leituras recomendadas
ARENDT, H. Entre o passado e o futuro. São Paulo: Perspectiva, 1972
CASTORIADIS, C. A instituição imaginária da sociedade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982.
FOUCALT, M. Microfisica do poder. 9. ed. Rio de Janeiro: Graal, 1990.
GUATTARI, F. Caosmose: um novo paradigma estético. São Paulo: Ed. 34, 1993.
Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para
esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual
da Instituição, você encontra a obra na íntegra.
Conteúdo:
Dica do Professor

Neste vídeo, você vai conhecer a dimensão política na comunidade e a importância dos líderes
comunitários para o trabalho do assistente social na comunidade.

Assista!

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Exercícios

1) A crise na psicologia social desenvolveu-se de que maneira?

A) Em meio a conflitos e desacordos.

B) Atravessada pela necessidade de se criar um campo problemático, onde se tornou


indispensável a presença de uma luta de forças que questionem demandas instituídas pela
realidade.

C) Conforme a disponibilidade científica de alguns teóricos.

D) Somente na Europa, devido à escassez de estudos.

E) Marcada por um momento histórico, repercutindo somente naquele tempo.

2) Qual abordagem estimulou e inspirou a mudança de olhar na psicologia social experimental


empírico-analítica?

A) Analítica institucional.

B) Empirista.

C) Institucional.

D) Experimental.

E) Analítica.

3) Para a psicologia social, "comunidade" refere-se a:

A) Uma maneira de organizar-se enquanto instituição.

B) Uma localidade específica.

C) Um espaço criador de identidade, um campo relacional e histórico, onde é possível que cada
membro expresse a totalidade.

D) Locais frequentados por psicólogos.


E) Movimentos alternativos dos anos 60.

4) A psicologia social comunitária surgiu a partir de que movimentação?

A) De acordo com uma organização de diferentes abordagens teóricas.

B) Em meio a discussões entre as áreas da saúde e humanas.

C) Conforme estudos quantitativos.

D) Movimentos Hippies da década de 70.

E) Em inconformidade com o posicionamento neutro, baseado no método empírico analítico.

5) A psicologia social comunitária acentua a construção de que relações?

A) Transicionais.

B) Psicológicas.

C) Organizacionais.

D) Interpessoais e intergrupais.

E) Institucionais.
Na prática

Na cidade de Porto Alegre, alguns bairros são conhecidos por terem uma forte organização
comunitária — comunidades que conseguiram o desenvolvimento local por meio da força e
organização do coletivo.

Dentre esses exemplos, podemos citar a Vila Dique, localizada próximo ao aeroporto de Porto
Alegre, que hoje encontra-se em parte reassentada em outro loteamento, Porto Novo. A vila Dique
nasceu em 1950, às margens do Aeroporto Internacional Salgado Filho e cresceu em número de
famílias e em estrutura nas décadas de 80 e 90.

Com a ampliação do aeroporto (2011), a remoção das famílias iniciou, com modificações
importantes nas vidas dos moradores. Também, foram removidos os serviços que lá estavam e que
estabeleciam uma relação de mais de 18 anos com a comunidade nesse território.

Atualmente, parte da população está no novo território e, outra, na antiga Vila Dique — esta segue
sua luta coletiva por moradia digna, acesso a ônibus, escola e unidade de saúde, para que a
população possa receber assistência.

São realizadas, pela comunidade, assembleias para decidirem coletivamente quais serão os
próximos passos das suas reivindicações. Independentemente se a família foi ou não removida para
o novo loteamento, a luta é de todos, isto é, a consciência coletiva é maior que as necessidades
individuais.
Saiba mais

Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor:

Vila Dique existe e resiste

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Psicologia Comunitária e Política de Assistência Social:


diálogos

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Intervenções psicossociais na comunidade: desafios e práticas

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Unidade de Estudos 9 - A psicologia
da saúde: aspectos teóricos e
campo de atuação

Apresentação

A ampliação do conceito de saúde (Organização Mundial da Saúde, 1948), com a superação do


binômio saúde-doença (a saúde era considerada apenas ausência de enfermidades), gera novas
demandas para as instituições de saúde, até então centradas no saber médico. Nessa esteira, pode-
se debater o controverso campo da psicologia da saúde. Isso porque o conceito ampliado de saúde
chama à cena a importância da atenção interdisciplinar, para somar esforços em torno da dimensão
biopsicossocial do indivíduo, bem como a atenção para fatores sociais, políticos, econômicos,
ideológicos, representação social, entre outros. A psicologia da saúde abrange diferentes modelos
teóricos, práticas e metodologias, mas com o objetivo comum de, utilizando conhecimentos e
técnicas psicológicas, trabalhar com base na promoção, tratamento e prevenção de doenças e
agravos.

Nesta Unidade de Aprendizagem, você vai estudar o campo de atuação da psicologia da saúde,
conhecer o modelo de Urie Bronfenbrenner e refletir sobre as principais tendências para estudos e
práticas nessa área.

Bons estudos.

Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

• Caracterizar a psicologia da saúde com base no seu campo de atuação.


• Definir o modelo de Urie Bronfenbrenner como alternativa ao processo de saúde-doença.
• Explicar as principais tendências nos estudos, no debate e na prática em psicologia da saúde.
Infográfico

A psicologia do desenvolvimento é uma área que estuda os principais aspectos que influenciam as
habilidades básicas do ser humano, como a cognição, a aprendizagem, a percepção, a linguagem, o
pensamento, entre outros. São os aspectos que conformam o ser humano. As teorias
comportamentais, construtivistas, a Gestalt e a fenomenologia estudam esses aspectos do
desenvolvimento.

O modelo de desenvolvimento de Urie Bronfenbrenner faz uma ruptura com a definição dessas
habilidades básicas propostas pelas teorias clássicas e recentemente, na área da saúde, vem
influenciando estudos por ser um modelo sistêmico e pragmático.

Neste Infográfico, você vai ver como funciona esse sistema e como pode ser aplicado aos campos
de atuação da psicologia da saúde.
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Conteúdo do Livro

A psicologia da saúde é um campo de atuação que começou a ser definido na década de 1970.
Portanto, trata-se de um campo relativamente novo de estudos e práticas de profissionais de
psicologia no contexto da saúde.

Embasada em princípios de humanização da saúde, critica às limitações do modelo biomédico e


assentando-se em bases revolucionárias como a reforma psiquiátrica, a psicologia da saúde tem
modelos teóricos e metodológicos que influenciam o campo de atuação e as práticas dos
profissionais de psicologia, abrindo um leque maior de trabalho e valorizando, além da promoção da
saúde, a interdisciplinaridade das ações.

No capítulo A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação, da obra Psicologia


aplicada ao cuidado, você vai conhecer os aspectos teóricos dos modelos que conformam essas
práticas, defini-los e descrevê-los à luz do campo de atuação da psicologia da saúde.

Bons estudos.
PSICOLOGIA
APLICADA
AO CUIDADO

Fernanda Egger Barbosa


A psicologia da saúde:
aspectos teóricos e
campo de atuação
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Caracterizar a psicologia da saúde com base no seu campo de atuação.


„„ Definir o modelo de Urie Bronfenbrenner como alternativa ao processo
de saúde-doença.
„„ Explicar as principais tendências nos estudos, no debate e na prática
em psicologia da saúde.

Introdução
A psicologia é um campo de estudo muito antigo, a qual existia mesmo
quando o conjunto de processos psíquicos eram considerados alma,
espírito e mundo das ideias. Em épocas remotas, é provável que o caráter
psicológico, como o descrevemos hoje, não tenha sido atribuído aos estu-
dos e práticas do pensamento e dos ânimos relacionados ao ser humano
em virtude de fazer parte das crenças e dos assuntos filosóficos. Por ser
difícil a apreensão de sua totalidade e materialidade, a psicologia tornou-
-se, aos poucos, um campo vasto, obscuro, diversificado e divergente.
No entanto, apesar de a história da psicologia remontar à Antiguidade
em diversos tipos de culturas, autores modernos consideram o início da
psicologia como ciência a partir da inauguração do primeiro Instituto de
Psicologia, em 1879, em Leipzig, na Alemanha, por Wilhelm Wundt. De lá
para cá, várias correntes de pensamento, teorias e metodologias surgiram
para tentar dar conta de explicar os fenômenos desse amplo campo de
estudos, indo das mais tradicionais, como a psicologia experimental,
a psicologia cognitiva e a psicanálise, até as mais modernas, como a
psicolinguística, a psicopedagogia e a psicologia da saúde, senda esta
última o tema deste capítulo.
2 A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação

Neste capítulo, você conhecerá diversos modelos teórico-metodoló-


gicos na área da psicologia da saúde. Além disso, conhecerá o conceito
de desenvolvimento ecológico de Urie Bronfenbrenner. Por fim, estudará
a psicologia da saúde a partir de seu campo de atuação.

1 Psicologia da saúde: modelos e


campos de atuação
Nesta seção, serão apresentadas algumas concepções e modelos teórico-meto-
dológicos que influenciaram ou que participam das práticas dos profissionais
de psicologia na área da saúde.
Contudo, não se pode falar de psicologia da saúde sem retomar a ideologia
de pensamento e de ação que surgiu no início do século XV, que se preocu-
pava com o valor do ser humano e como compreendê-lo em seu mundo. Essa
corrente de pensamento foi chamada por Sartre de Humanismo (JACÓ-
-VILELLA; FERREIRA; PORTUGAL, 2013), a qual visava a compreender
o homem em sua própria existência. Nesse movimento humanista, havia o
resgate da filosofia sofista, baseada na Antiguidade Clássica: o homem é a
medida de todas as coisas. Assim, o Humanismo surge como um pensamento
que buscava educar o homem por meio do conhecimento acerca de si mesmo
e sobre a sua civilização.
No decorrer da história da humanidade, múltiplos sentidos foram atribuídos
ao Humanismo. Na Idade Média, prevaleceu o Humanismo cristão, ao passo
que, no Renascimento, tomou-se por base o realismo aristotélico, que via o
conhecimento como uma criação do homem. Por meio dos descobrimentos
de Copérnico e Galileu, houve transformações do pensamento do homem a
respeito de si mesmo e do mundo. Na Era Moderna, novas transformações
do pensamento tiveram como base a filosofia de Descartes (o homem como
o dono de seu conhecimento), Rousseau (cada homem é indivisível do todo
social) e Kant (o homem como ser autônomo que cria suas próprias leis).
Além disso, foram priorizados os valores morais e éticos para orientar a vida
do ser humano em suas comunidades. Por fim, a contemporaneidade trouxe
a valorização da humanidade e sua capacidade de autonomia (BUYS, 2006).
O movimento humanista influenciou o campo da psicologia, inaugurando
um novo saber a respeito das práticas psicológicas, conhecido primeiramente
como psicologia humanista. Por meio do desenvolvimento de estudos e práticas
humanistas em psicologia, outras correntes surgiram, integrando seus saberes
àquela que hoje chamamos de psicologia da saúde.
A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação 3

A psicologia humanista
A psicologia humanista surgiu no século XX (GOMES; HOLANDA; GAUER,
2004), amparada por um movimento social mundial de valorização da vida
de cada ser humano, que culminou na redação da Declaração Universal dos
Direitos do Homem e na criação da Organização das Nações Unidas (ONU),
em 1948, concretizando, juridicamente, o Humanismo enquanto campo que
toma o homem como um ser autônomo e consciente de si.
Nos Estados Unidos, entre 1930 e 1950, vários estudiosos das mais célebres
universidades, como Maslow, Allport, Murphy e Rogers, abriram espaço para
a definição de uma humanização do saber sobre o homem, a saúde e o bem-
-estar, criticando o modelo determinista biológico. Nessa época, a psicologia
humanista acreditava que o desenvolvimento era possível por meio das rela-
ções interpessoais que os seres humanos apresentam durante a vida. Maslow
destacava a importância da re-humanização da ciência; Murphy apelava
para um direcionamento do enfoque para as questões biossociais do homem;
Allport via o homem como um organismo ativo e acreditava no conceito de
motivos fundamentais, que orientam o homem para o futuro; e Rogers definiu
três níveis de intervenção do psicólogo humanista: na educação, no trabalho
organizacional e na psicoterapia. Este último inaugurou a psicoterapia centrada
na pessoa, destacando a importância central da terapia no cliente, e não na
figura do analista, não mais dando destaque à transferência psicanalítica.
No Brasil, a psicologia humanista foi inaugurada em 1970, com base nas
traduções dos estudos de Carl Rogers, na definição do aconselhamento psi-
cológico e na psicologia humanista existencial.

O texto Psicologia Humanista no Brasil (GOMES; HOLANDA; GAUER, 2004), além da história
da psicologia humanista no Brasil, trata da criação da influência da abordagem centrada
na pessoa de Carl Rogers, das vertentes que compunham os estudos e as metodologias
e do que ainda vigora em termos de prática nas diversas áreas aplicadas à psicologia.
4 A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação

Com o pontapé inicial da psicologia humanista, os ideais humanistas


que vigoravam no mundo todo se consolidaram na década de 70 no Brasil.
As lutas e os movimentos antimanicomiais obrigaram os psicólogos a repen-
sarem seus espaços de atuação e suas práticas. Assim, a partir dessa década,
surgiu a psicologia aplicada à saúde, abrindo o leque do campo de forma
polêmica e abrangente, pois confluíam várias correntes teóricas opositoras
em suas formas de abordagem e metodologias.
Os psicólogos, enquanto especialistas em comportamento humano e saúde,
precisaram ampliar seu campo de atuação e voltaram-se para as instituições de
saúde não restritas à saúde mental. Do mesmo modo, a saúde mental também
abria suas portas, deixando, aos poucos, de fomentar a exclusão social dos
pacientes internados.
Segundo Almeida e Malgris (2011), autores como Myazaki, Domingos e
Caballo, em 2001, e Barros, em 2002, definem a psicologia da saúde como um
campo de atuação para os psicólogos que buscam compreender e atuar sobre
a inter-relação comportamento-saúde ou comportamento-doença, além de
aperfeiçoar técnicas de enfrentamento no processo de ajustamento ao adoecer
e a suas consequências.
As autoras determinam, ainda, o surgimento da psicologia da saúde, em
1970, com um grupo de trabalho na American Psychological Association
(APA). Em 1978, foi criada a divisão 38: Health Psychology (Psicologia da
Saúde), com o objetivo de encorajar a integração da informação biomédica
com o conhecimento psicológico:

[...] a Psicologia da Saúde tem crescido rapidamente. A APA publica, desde


1982, a revista Health Psychology, a primeira oficial da área. Seguindo a
tendência, em 1986, formou-se, na Europa, a European Health Psychology
Society (EHPS, 2003), uma organização profissional que visa a promover
a pesquisa teórica e empírica e suas aplicações para a Psicologia da Saúde
europeia. Cada país-membro possui, ainda, sua associação de Psicologia da
Saúde, que realiza atividades como congressos, simpósios, pesquisas, den-
tre outras atividades. Foram criadas várias revistas especializadas: British
Journal of Health Psychology (Reino Unido), Revista de Psicologia de la
Salud (Espanha), Psicologia della Salutte (Itália), entre outras (ALMEIDA;
MALGRIS, 2011, p. 186).
A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação 5

Segundo Almeida e Malgris (2011), outros autores trouxeram importantes


contribuições para a definição da psicologia da saúde de acordo com o campo
de atuação do psicólogo. De Marco (2003 apud ALMEIDA; MALGRIS, 2011)
considerava a psicologia da saúde como um conjunto de atividades exercidas por
profissionais da área de psicologia que atuam no campo da saúde. Já Trindade
e Teixeira (1998, 2002 apud ALMEIDA; MALGRIS, 2011) reafirmaram o
campo da psicologia como ciência e profissão, incluindo saúde física e mental
em seu objeto de estudo, em virtude da importância do saber médico, mas
ultrapassando-a, ao considerar não apenas os aspectos físico-biológicos, mas
também os aspectos sociais, culturais, ambientais, econômicos, de gênero,
entre outros, como influenciadores do processo saúde-doença. Os autores
defendem que o psicólogo, ao atuar nesse campo, deve trabalhar com foco na
promoção e manutenção da saúde e na prevenção da doença.
Mas de que forma o psicólogo deve intervir e contribuir para melhorar o
bem-estar e a qualidade de vida dos sujeitos e das comunidades? Ele deve
ampliar suas práticas para não apenas as instituições de saúde mental, mas
também para as instituições de saúde em geral, como clínicas médicas, hos-
pitais, centros de pesquisa científicas, formando-se nos moldes do conceito
mais amplo de saúde.
Matarazzo (1990 apud ALMEIDA; MALGRIS, 2011) define psicologia
da saúde como um conjunto de contribuições educacionais, científicas e
profissionais específicas do campo da psicologia que devem ser utilizadas
para a promoção e a manutenção da saúde, a prevenção e o tratamento das
doenças, identificando a etiologia e o diagnóstico relacionados a saúde, bem
como doenças e disfunções para serem analisadas pelo sistema de atenção à
saúde e para a formação de políticas de saúde.
Assim, como campo de atuação, a psicologia da saúde deve considerar o
sujeito em todos os seus determinantes biopsicossociais, econômicos, culturais
e ecossistêmicos, em prol da qualidade de vida dos sujeitos e da comunidade
em que vivem. Já o psicólogo pode trabalhar nas instituições de saúde que
abarcam as atenções primárias, secundárias e terciárias, atendendo às necessi-
dades do paciente, da família e de outros profissionais de saúde em uma prática
interdisciplinar. Além disso, enquanto profissional da ciência, o psicólogo da
saúde se insere em instituições de pesquisa e de formação acadêmica, podendo
realizar especializações tanto em relação à sua área como a outras áreas da
saúde, como enfermagem, fisioterapia, fonoaudiologia, pedagogia, técnico
de enfermagem, entre outras.
6 A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação

Como visto, a partir da década de 70, houve uma grande expansão teórico-
-metodológica no campo da psicologia voltada para a área da saúde. A me-
dicina social, que vigorava desde a época inicial da Revolução Industrial, e
outras correntes que configuram o abrangente e polêmico campo de atuação
em psicologia aplicada à saúde apresentavam características comuns, no
sentido de serem tentativas de romper com o antigo modelo mecanicista
hegemônico da concepção de saúde, mas também apontavam divergências
de posicionamento, terapêuticas, concepções teóricas e práticas de atuação
nas instituições de saúde.
A medicina social surgiu como uma forma de controle da população, com
base na articulação entre medicina e estado, com o capitalismo em plena as-
censão. Estava estritamente articulada com a medicina do trabalho. Segundo
Foucault (1988 apud MONTAGNER, 2008), a medicina social seria resultado
do desenvolvimento de técnicas, maneiras e saberes cujo objeto é o mundo
social. Assim, como tecnologia aplicada às sociedades, ela surgiu como controle
dos modos de viver dos indivíduos, uma espécie de vigilância que atrelava o
saber médico ao social. Segundo Montagner (2008, p. 195), a aplicação dessa
ideia seguiu várias direções, adaptando-se “[...] às condições políticas, sociais
e econômicas de cada país onde tomava corpo [...]”.
No Brasil, a psicologia social se dividiu em diversos tipos de abordagem,
como a epidemiologia, a vigilância em saúde e a saúde coletiva. Além da ex-
pansão da medicina social, que abriu espaços para a concepção e a construção
de práticas psicológicas no campo da saúde, pode-se destacar outras principais
linhas de pesquisa da psicologia que influenciaram modelos e campos de
atuação em saúde: psicologia social, psicologia comportamental, psicologia
fenomenológica existencial e psicanálise.
Orientados por esses campos mais amplos da psicologia, novos movimentos
e tendências nas áreas médicas e de psicologia surgiram. É possível identificar
quatro modelos teórico-metodológicos de atuação em psicologia da saúde a
partir da década de 70: medicina comportamental, medicina psicossomática,
psicologia médica e psicologia hospitalar. Além disso, na prática, são utili-
zados diversos métodos aplicáveis aos estudos e práticas em psicologia da
saúde, métodos estes oriundos da sociologia, da filosofia, da antropologia,
da medicina, da psiquiatria, entre outros.
A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação 7

O trabalho do psicólogo no campo da psicologia da saúde não é homogêneo nem


possui uma única forma ou modelo de aplicação. Neste capítulos, foram fornecidas
algumas correntes que demarcaram o início do movimento da psicologia aplicada à
saúde, levando em consideração principalmente a realidade brasileira. No entanto, as
práticas do psicólogo da saúde estão sempre se atualizando e dependem muito da
influência da formação do profissional, bem como de características como comunidade,
região e instituição onde o profissional atua.

A teoria dos sistemas ecológicos do desenvolvimento humano, de Urie


Bronfenbrenner, é um importante modelo que vem sendo utilizado com
frequência em estudos sobre crianças, famílias, sociedade e idosos, por con-
siderar o indivíduo de forma ampla e intrinsecamente constituído em uma
rede de ambientes, que influenciam diretamente o desenvolvimento humano
e, consequentemente, seu estado de saúde, doença, bem-estar e qualidade de
vida (MARTINS; SZYMANSKI, 2004).

2 O modelo ecossistêmico de Urie


Bronfenbrenner
Urie Bronfenbrenner foi um psicólogo norte-americano que passou grande
parte de sua vida dedicando seus estudos ao desenvolvimento humano. Nascido
na Rússia, em 1917, e falecido em Nova Iorque, aos 88 anos, ele ficou famoso
por sua teoria ecológica e sistêmica, que analisava os aspectos da pessoa em
desenvolvimento, dentro do próprio contexto em que vive, valorizando, assim,
todos as atividades interativas que influenciam o desenvolvimento de uma
criança durante determinados períodos de tempo.
Senna e Dessen (2012) explicam o modelo de Bronfenbrenner conforme ele
o descreveu na obra de 1979, a qual foi revisada e complementada em 1999.
Os autores apontam que, para compreender o desenvolvimento humano, é
preciso pensar as habilidades motoras, cognitivas e perceptuais em correlação
com suas interações e padrões relacionais, que se estabelecem em contextos
distintos ao longo do tempo, o que Bronfenbrenner chamou de influências
múltiplas dos ambientes.
8 A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação

Martins e Szymanski (2004) afirmam que Bronfenbrenner formulou sua


teoria de desenvolvimento humano, publicada no fim da década de 70, para
expor ao campo científico importantes premissas para o planejamento e o
desenvolvimento de pesquisas em ambientes naturais, criticando os trabalhos de
pesquisa “fora do contexto” e defendendo que essas investigações focalizavam
somente a pessoa, sem a devida consideração das múltiplas influências dos
contextos/ambientes em que os sujeitos vivem.
As autoras apontam, ainda, que diversos estudos na área de saúde de
desenvolvimento infantil e da família vêm utilizando como referencial teórico-
-metodológico o modelo de Bronfenbrenner, como Cecconello (1999, 2003),
De Antoni (2000) e Yunes (2001) (apud MARTINS; SZYMANSKI, 2004).
Em suma, essa teoria defende que, desde que nasce, a criança está inserida
em contextos de desenvolvimento e aprendizagem, desenvolvendo-se de acordo
com as inter-relações que estabelece com o ambiente à sua volta. Por isso,
o desenvolvimento não seria possível se a criança fosse isolada do meio em
que vive. Martins e Szymanski (2004) definem o modelo de Bronfenbrenner
como uma abordagem ecológica que privilegia os estudos em desenvolvimento
humano nos seus contextos e ambientes naturais, e não em laboratórios, a fim de
aprender a realidade de forma mais abrangente. Muitos autores, como Haddad
(1977), Fleury (1999) e Yunes (2001) (apud MARTINS; SZYMANSKI, 2004),
utilizam esse modelo para diferenciar as várias camadas proximais do ambiente:

O ambiente ecológico [...] deve ser concebido topologicamente como uma or-
ganização de estruturas concêntricas, cada uma contida na seguinte” (BRON-
FENBRENNER, 1996 p.18). Esse conjunto de estruturas, que no dizer do autor
parece lembrar um jogo de bonecas russas encaixadas uma dentro da outra,
interferem mutuamente entre si e afetam conjuntamente o desenvolvimento
da pessoa. Cada uma das estruturas é chamada pelo autor de: micro-, meso-,
exo- e macrossistema (MARTINS; SZYMANSKI, 2004, p. 64–65).

Ao pensar na boneca russa e no esquema ecológico de Bronfenbrenner tal


como ele projetou, pode-se ver claramente a criança no centro e as esferas
das outras bonecas representando os diversos contextos dos esquemas micro
ao macro (Figura 1).
A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação 9

Macrossistema

Exossistema

Mesossistema

Microssistema

Figura 1. Bonecas russas e esquema de contextos bioecológicos de Bronfenbrenner.


Fonte: ruigsantos/Shutterstock.com e A Mente é Maravilhosa (2018, documento on-line).

Mas como Bronfenbrenner definiu esses ambientes? A seguir, são definidos


cada um deles com exemplos.

„„ Microssistema: as pessoas em desenvolvimento experienciam um pa-


drão de atividades, papéis e relações interpessoais em um dado ambiente,
com características físicas e materiais específicas (BRONFENBREN-
NER, 1996 apud MARTINS; SZYMANSKI, 2004). Abrange o próprio
indivíduo e suas principais características (sexo, idade, peso, altura,
saúde, etc.) e a forma como ela se relaciona com algumas instituições
que estão diretamente à sua volta (face a face) e o constituem como
pessoa (família, escola, igreja, etc.).
„„ Mesossistema: refere-se às inter-relações entre dois ou mais ambientes
dos quais um indivíduo participa ativamente, o qual pode ser formado
ou ampliado quando ele fizer parte de novos ambientes (MARTINS;
SZYMANSKI, 2004). Abrange as instituições que interagem direta-
mente com o sujeito e as relações entre elas. Por exemplo: a relação dos
pais com a igreja (crença), que influenciam como a criança estruturará
a sua própria crença.
10 A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação

„„ Exossistema: abarca instituições maiores e fora de um padrão mais


familiar, cujas inter-relações sujeito-família-instituições contribuem
para o desenvolvimento do sujeito. Segundo Martins e Szymanski
(2004), diferentemente do mesossistema, aqui, a pessoa em desenvol-
vimento não participa ativamente desse processo, porém podem ocorrer
eventos que a afetem ou mesmo esses eventos podem ser afetados por
acontecimentos do ambiente imediato em que ela se encontra. Essas
instituições podem ser a vizinhança, os serviços de saúde, o trabalho
dos pais, as indústrias, as mídias sociais, entre outras.
„„ Macrossistema: representa a cultura em que o sujeito está inserido, as
atitudes e ideologias de uma determinada sociedade e a relação que o
sujeito tem com elas. As interconexões feitas para um sujeito de uma
determinada cultura são diferentes das de outras culturas.

A partir de 1998, Bronfenbrenner reformulou o termo ecológico e passou


a designá-lo bioecológico, reforçando as características biopsicológicas do ser
humano em desenvolvimento. Para Senna e Dessen (2012), compreender o
desenvolvimento humano com base nesse modelo implica identificar quatro
elementos básicos, inter-relacionados e dinâmicos: o processo (P), a pessoa
(P), o contexto (C) e o tempo (T) (BRONFENBRENNER; MORRIS, 1998
apud MARTINS; SZYMANSKI, 2004). As autoras afirmam que, ao longo
do desenvolvimento, a pessoa (P) se envolve em processos (P) de interações
recíprocas com outras pessoas, objetos ou símbolos. Essas interações podem
variar de acordo com as características das pessoas, dos contextos e do mo-
mento em que elas acontecem, podendo produzir tanto competências como
disfunções no desenvolvimento (BRONFENBRENNER; EVANS, 2000 apud
SENNA; DESSEN, 2012).
Ainda sobre o novo modelo bioecológico, Martins e Szymanski (2004)
apontam outro aspecto proposto: o do construto teórico “processos proxi-
mais”, entendido como “[...] formas particulares de interação entre organismo
e ambiente, que operam ao longo do tempo e compreendem os primeiros
mecanismos que produzem o desenvolvimento humano [...]” (BRONFEN-
BRENNER; MORRIS, 1998 apud MARTINS, SZYMANSKI, 2004, p. 65).
Segundo as autoras, no modelo bioecológico, são reapresentados quatro
aspectos multidirecionais inter-relacionados, designados como modelo PPCT
— “pessoa, processo, contexto e tempo” — e definidos da seguinte forma
(MARTINS; SZYMANSKI, 2004):
A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação 11

„„ Pessoa: refere-se ao fenômeno de constâncias e mudanças na vida


do ser humano em desenvolvimento no decorrer de sua existência.
A abordagem reformulada ressalta a importância de se considerar as
características do indivíduo em desenvolvimento, como suas convicções,
nível de atividade, temperamento, além de suas metas e motivações.
Isso tudo tem considerável impacto no modo como os contextos são
experienciados pela pessoa, bem como quanto os tipos de contextos
nos quais o sujeito se insere. As características do tipo pessoais, como
gênero ou cor da pele, que podem influenciar a maneira como os outros
lidam com a pessoa em desenvolvimento, e os valores e expectativas
que se têm na relação social devem ser considerados, visto que essas
qualidades pessoais podem nutrir ou romper a operação de processo
de crescimento psicológico. Além disso, nenhuma característica da
pessoa pode existir ou exercer influência sobre o desenvolvimento
isoladamente. No modelo bioecológico proposto por Bronfenbrenner e
Morris (1998 apud MARTINS; SZYMANSKI, 2004), são descritos três
tipos de características da pessoa que influenciam e moldam o curso
do desenvolvimento humano. O primeiro diz respeito às disposições
que podem colocar os processos proximais em movimento e continuam
sustentando a sua operação. Já o segundo diz respeito aos recursos
bioecológicos de habilidade, experiência e conhecimento para que os
processos proximais sejam efetivos em determinada fase de desenvol-
vimento. Por fim, o último tipo envolve características de demanda,
que convidam ou desencorajam reações do contexto social que podem
nutrir ou romper a operação de processos proximais.
„„ Processo: refere-se às ligações entre os diferentes níveis, sendo consti-
tuído pelos papéis e as atividades diárias da pessoa em desenvolvimento.
Para se desenvolver intelectual, emocional, social e moralmente como
um ser humano, criança ou adulto, faz-se necessária — para todos eles
— a participação ativa em interação progressivamente mais complexa
e recíproca com pessoas, objetos e símbolos no ambiente imediato.
Para ser efetiva, a interação tem de ocorrer em uma base bastante
regular em períodos estendidos de tempo. Essas formas duradouras
de interação no ambiente imediato referem-se a processos proximais
(proximal process). Exemplos de padrões duradouros desses processos
são a relação pais-criança e as atividades de criança-criança em grupo
ou jogo solitário, como ler, aprender novas habilidades, resolver pro-
blemas, executar tarefas complexas e adquirir novos conhecimentos e
experiências (BRONFENBRENNER; CECI, 1994 apud MARTINS;
12 A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação

SZYMANSKI, 2004). Assim, os processos proximais são como má-


quinas ou motor do desenvolvimento.
„„ Contexto: refere-se ao meio ambiente global em que o indivíduo está
inserido e onde se desenrolam os processos desenvolvimentais. Os
vários ambientes subdivididos no modelo bioecológico abrangem tanto
os ambientes mais imediatos, onde vive a pessoa em desenvolvimento,
como os mais remotos, onde a pessoa nunca esteve, mas que se relacio-
nam e têm o poder de influenciar o curso de desenvolvimento humano.
Esses ambientes são denominados micro, meso, exo e macrossistemas.
„„ Tempo: pode ser entendido como o desenvolvimento no sentido histó-
rico ou, em outras palavras, como ocorrem as mudanças nos eventos
no decorrer do tempo, devido às pressões sofridas pela pessoa em
desenvolvimento. Para Bronfenbrenner e Morris (1998 apud MARTINS;
SZYMANSKI, 2004), os eventos históricos podem alterar o curso de
desenvolvimento humano em qualquer direção, não só para indivíduos,
mas para segmentos grandes da população. A passagem de tempo
em termos históricos tem efeitos profundos em todas as sociedades.
Pequenos episódios da vida familiar, como a entrada da criança na
escola, o nascimento de um irmão ou a mudança de trabalho dos pais,
podem ter significativa influência no desenvolvimento das pessoas da
família em um dado momento de suas vidas. Outro exemplo de como o
tempo influencia o desenvolvimento da pessoa é a diferença na maneira
como os pais criaram seus filhos com relação à década de 40, à década
de 80 e à atualidade.

Considerando tudo o que foi discutido até aqui sobre o conceito ampliado
de saúde, que não mais restringe a pessoa enferma a um corpo biológico
e às causas físico-patológicas de sua doença, e o modelo bioecológico de
Bronfenbrenner, pode-se compreender por que tantos autores que trabalham
em saúde pública e em psicologia da saúde vêm utilizando cada vez mais esse
modelo para sua prática, suas pesquisas, seus estudos e revisões políticas, até
mesmo na gestão em saúde.
Ao comparar o conceito ampliado de saúde — que defende que o ser
humano tem de ser pensado em uma rede de necessidades básicas humanas
que influenciam diretamente sua saúde e qualidade de vida, como habitação,
transporte público, acesso à cultura, entre outros —, o modelo bioecológico
— que defende que o ser humano se desenvolve em uma rede de inter-relações
que estabelece com os níveis de ambientes (familiar, escolar, estatal e cultural)
— e os processos proximais — que definem suas posturas e ações frente à
A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação 13

vida —, pode-se entender e fazer novos avanços nas práticas em psicologia


da saúde e na área de saúde de forma geral.

3 Principais modelos teórico-metodológicos


que conformam o campo da
psicologia da saúde
Retomando os modelos expostos, a seguir, são apresentadas algumas correntes
teórico-metodológicas que conformam a psicologia da saúde, com enfoque
nos estudos e práticas do contexto atual.
A medicina social, apesar de ter surgido como controle social, se desenvol-
veu ao longo da história humana e, no século XX, abriu portas para definições
de novas concepções na área de saúde, inaugurando, junto a outras disciplinas,
o que hoje chamamos genericamente de psicologia da saúde.
Segundo Montagner (2008), Foucault indicou a Alemanha, no século XVIII,
como o primeiro lugar do surgimento de uma medicina social: a Medizini-
chepolizei (polícia médica), composta por burocratas, geralmente médicos,
responsáveis pela administração dos saberes sobre a saúde, ainda em uma
lógica prescritiva. Mais tarde, outro modelo surgiu na Inglaterra, no século
XVI: a “Lei dos Pobres”, que pressupunha uma união entre a assistência social
e a intervenção médica, gerenciando, assim, os trabalhadores assalariados. Em
seguida, surgiu, ainda, um 3º modelo, identificado pelo autor como medicina
higienista (urbana), originado na França, na segunda metade do século XVIII,
o qual influenciou profundamente a comunidade médica no Brasil.
Foucault (1988 apud MONTAGNER, 2008) resume os objetivos da medicina
urbana em três pontos: a análise das regiões insalubres no espaço urbano, o
controle da qualidade do ar e da água e o controle da distribuição e da frequ-
ência de fontes necessárias à vida humana.
Apesar do seu início controlador, a medicina social teve, a partir da década
de 70, muitos desdobramentos importantes para a área da saúde. A saúde
coletiva, a epidemiologia e a vigilância em saúde, por exemplo, são teorias
e práticas essenciais para a promoção, prevenção e manutenção da saúde da
população. Além disso, é possível dizer que medicina social constituiu o início
da sociologia e da antropologia aplicadas aos problemas de saúde dos povos,
das massas, das cidades, das sociedades.
14 A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação

Oriundas de diferentes campos do saber da medicina, da psiquiatria e da


psicologia, outras correntes de estudo se voltaram, a partir dos anos 70, para
conformar o campo da psicologia da saúde. As principais propostas de atua-
ção em saúde foram: medicina psicossomática, psicologia médica, medicina
comportamental e psicologia hospitalar.
Castro e Bornholdt (2004), em um estudo comparativo entre psicologia
hospitalar e psicologia da saúde, apontam que a psicologia hospitalar brasileira,
tal como é descrita, estaria incluída na área mais abrangente da psicologia da
saúde. O Quadro 1, a seguir, mostra os resultados comparativos das autoras.

Quadro 1. Diferenças entre psicologia hospitalar e psicologia da saúde

Psicologia hospitalar (Brasil) Psicologia da saúde

Atenção secundária e terciária Atenção primária,


secundária e terciária

Atuação em hospitais Atuação em centros de saúde,


hospitais, ONGs, etc.

Prática profissional no hospital não Prática profissional na área da


exige especialização obrigatória saúde exige especialização
obrigatória em alguns países

Prática interdisciplinar (em Prática interdisciplinar (em


alguns hospitais) alguns hospitais e outras
instituições de saúde)

Distintas teorias psicológicas utilizadas Distintas teorias psicológicas utilizadas

Fonte: Adaptado de Castro e Bornholdt (2004).

Medicina psicossomática
A medicina psicossomática aparece como uma especialidade médica, de-
bruçando-se sobre doenças determinadas por fatores emocionais, mas que
podem ser compreendidas à luz do trabalho analítico. Segundo Eksterman
(1975 apud ALMEIDA; MALGRIS, 2011), é possível resumir a medicina
psicossomática em alguns aspectos fundamentais: a doença é estudada em sua
dimensão psicológica, o que pode ser conseguido por meio da interpretação
dos conflitos inconscientes; o médico, psiquiatra, psicanalista ou psicólogo
A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação 15

tentará explicar os determinantes psicológicos dos sintomas corporais; foco


na relação médico-paciente; a ação terapêutica é voltada para a pessoa do
doente (em uma perspectiva rogeriana).
Capitão e Carvalho (2006, p. 23) afirmam que, por definição, segundo a
origem da Escola de Psicossomática de Chicago (década de 30), “[...] a medicina
psicossomática diz respeito ao diagnóstico e ao tratamento de doenças físicas
que poderiam ser causadas por processos deficientes na mente [...]”.
Hoje, o campo da psicossomática mantém-se amplo e contraditório.
A medicina psicossomática é estudada e praticada com base em diversas
vertentes no Brasil, não se restringindo à essa corrente original. Ela está for-
temente influenciada pela psicanálise, principalmente a freudiana. Capitão e
Carvalho (2006), apoiados por autores como Debray e Volitch, defendem que
Freud estabeleceu um marco entre psique e soma quando estudou a histeria,
cujos sintomas físicos não apresentavam correlação com a fisiologia dos
órgãos afetados, fundando a psicanálise. Por meio dessa técnica, Freud bus-
cava a compreensão de diversas passagens e relações entre as manifestações
psíquicas e corporais, abrindo caminho para que outros estudiosos utilizassem
as suas descobertas sobre os sintomas de conversão e as forças reprimidas e
repressoras na formação do sujeito e na dinâmica das pulsões.
Os autores defendem, ainda, outras correntes importantes no campo da
psicossomática, como a psicossomática da escola francesa de Pierre Marty
(fundada em 1972) e a de Joyce McDougall. Sobre a proposta de Pierre Marty,
as autoras afirmam que ele criou o Instituto de Psicossomática de Paris, em
1972, partindo de concepções afeitas à psicanálise. Marty pensava a patologia
somática como resultado da impossibilidade da elaboração da excitação psí-
quica, em função de uma estrutura deficiente das representações e emoções de
um indivíduo. No entanto, criticava a concepção do saber médico do dualismo
mente-corpo criado por Alexander, afirmando que não só a mente influencia
o corpo a adoecer, mas que o inverso também ocorre de forma determinante
(CAPITÃO; CARVALHO, 2006).
Em relação aos trabalhos de McDougall, Capitão e Carvalho (2006, p. 26)
apontam que “Estudos acerca das manifestações psicossomáticas da primeira
infância a levaram a compreender que seus pacientes adultos, às vezes, fun-
cionavam psiquicamente como bebês que, não podendo utilizar as palavras
como veículo de seu pensamento, só conseguiam reagir psicossomaticamente
a uma emoção dolorosa [...]”. De qualquer forma, ambos os autores defendem
um conceito primordial da psicossomática praticada hoje: de que o indivíduo
psicossomático carece de maiores condições de representar, simbolicamente,
as coisas do mundo.
16 A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação

Portanto, a medicina psicossomática influenciou diversas novas concepções


e formas de atuação no campo da psicologia hospitalar, da psicopatologia
fundamental e da psicologia da saúde no Brasil.

O livro Psicossomática hoje, do autor Mello Filho e Burd (2009), um dos precursores
da corrente no Brasil, contempla reflexões que explicam a formação do campo da
psicossomática no Brasil, bem como o que orienta as práticas dos psicólogos na saúde.

Psicologia médica
A psicologia médica é inaugurada pelo psicanalista húngaro Balint, também
preocupado com a relação médico-paciente. Nessa linha, Schneider (1971
apud ALMEIDA; MALAGRIS, 2011), o médico/psicanalista se preocupa com
a relação médico-paciente. Mello Filho e Burd (2009) afirma que a psicolo-
gia médica desvia o foco da patologia (doença) em direção à terapêutica, à
atuação clínica. O autor afirma, ainda, que esse é um campo de estudo sobre
as relações humanas, visando à compreensão do homem em sua totalidade.
O saber do médico permanece no comando, o qual, por meio da sua terapêutica,
desvelará o diálogo mente-corpo no processo do adoecimento. Nesse sentido,
os demais profissionais de saúde estão apenas assistindo o médico, pois é o
saber médico que determina toda a linha terapêutica.
Segundo Brandt (2009, p. 51), “Balint adotava em sua clínica psicanalítica
um posicionamento de disponibilidade além do que era comum nos analistas
[...]”. Este enfoque também era defendido por Ferenczi: o paciente considerado
“difícil”, regredido, não pode ser alcançado no nível da linguagem adulta, que
prevalece no complexo de Édipo. Essa regressão básica aparece no nível da
linguagem próxima ao mundo das sensações e dos afetivos, ao passo que a
linguagem adulta soa enigmática, uma linguagem comparada com a de um bebê
que busca satisfação e com a da mãe, que também se satisfaz com essa relação.
Segundo o autor, na contramão da clínica individual proposta por Balint,
alguns adeptos criaram trabalhos em grupo. Brandt (2009) defende que o
trabalho grupal, fundamentado na contratransferência da figura do relator
como um terceiro ausente, que possibilita um insight, a compreensão das
formas de relacionamento no grupo.
A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação 17

Assim, o trabalho psicanalítico de Balint com relação ao adoecimento e


ao hospital está baseado na relação transferencial e contratransferencial que
o médico/psicanalista estabelece com o paciente, tanto no nível pessoal como
no grupal.

Medicina comportamental
Segundo Almeida e Malgris (2011), a medicina comportamental é uma ciência
da saúde que se utiliza de técnicas de modificação de comportamento para a
prevenção, o tratamento e a reabilitação da saúde. Afirma-se que grande parte
das doenças estão associadas a comportamentos disfuncionais (maus hábitos).
Segundo Neves Neto (2004 apud ALMEIDA; MALGRIS, 2011), as linhas
de pesquisa da medicina comportamental se aplicam à cognição, à emoção
e ao comportamento humano. O autor defende, ainda, que os métodos das
teorias psicodinâmicas não são pragmáticos (úteis, relevantes e aplicáveis na
realidade), uma vez que os processos saúde e doença são determinados por
múltiplos fatores.
A medicina comportamental aposta na intervenção interdisciplinar nas
práticas em saúde, uma vez que o ser humano é visto como um sujeito biop-
sicossocial, em que o biológico é o somático, o psicológico, o comportamento,
e o social, o ambiente externo. Barletta (2010) caracteriza que o campo da
medicina comportamental surgiu com Schwartz e Weiss, em 1977. Segundo a
autora, a medicina comportamental tem por base “o estudo do comportamento
e foca na avaliação, tratamento e prevenção de doenças físicas e disfunções
fisiológicas”. A autora defende, ainda, que esse pensamento não aceita a di-
cotomia mente e corpo, entendendo o homem como um todo. Vários estudos
em medicina comportamental apontam para a relação entre comportamentos
inadequados, estilos de vida e problemas de saúde.
Matarazzo (1984 apud BARLETTA, 2010) define os comportamentos
de saúde de duas formas: alguns comportamentos são prejudiciais à saúde
(patogênicos); outros como comportamentos são de proteção à saúde. Além
disso, existem duas fontes de respostas psicológicas que influenciam os com-
portamentos saudáveis: uma direta, agindo para aumentar as habilidades de
enfrentar e manejar o estresse, a favor da proteção à saúde; e outra indireta,
a mediação cognitiva, que pode ocorrer nas tomadas de decisão e nos com-
portamentos de aceitação e adesão aos tratamentos.
As práticas em psicologia da saúde com base na medicina comportamental
aumentaram muito nos últimos anos, concorrendo com as práticas psicoterá-
picas de orientação psicanalítica e psicossomática.
18 A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação

Psicologia hospitalar
A psicologia hospitalar é muito praticada no Brasil e possui diversas abor-
dagens. Segundo o Conselho Federal de Psicologia (2010 apud ALMEIDA;
MALGRIS, 2011), o psicólogo hospitalar atua nos níveis secundários e ter-
ciários nas instituições de saúde, realizando atendimento individual ou em
grupo e pronto-atendimento em ambulatório, enfermarias, unidades de terapia
intensiva, psicodiagnóstico, consultoria e interconsulta.
Segundo Simonetti (2004 apud ALMEIDA; MALGRIS, 2011), a psi-
cologia hospitalar é considerada um campo científico de intervenção nos
aspectos psicológicos em torno do adoecimento ou da dimensão afetiva/
emocional relacionada a uma enfermidade. Pode ser considerada uma es-
pecialidade que atua segundo sua prática psicológica não só com pacientes,
mas também junto aos familiares e com a equipe multiprofissional. Segundo
Bruscato (2004 apud ALMEIDA; MALGRIS, 2011), o psicólogo que atua no
ambiente hospitalar deve resgatar a singularidade do paciente em situação
de enfermidade.
Mattos (1999) defende que o trabalho do psicólogo clínico no hospital geral
é oferecer escuta à subjetividade do paciente, que se encontra pulsante no
contexto da internação, mas que geralmente é silenciado pelo saber médico,
um saber que se acerca do corpo fisiológico. Além disso, o psicólogo hospitalar
trabalha na recuperação da saúde, em um trabalho interdisciplinar, podendo
oferecer escuta diferenciada também à família.
Romano e Ismael (1999, 2005 apud ALMEIDA; MALGRIS, 2011, p. 195)
afirmam que “[...] o psicólogo ainda deve conhecer a doença do paciente
a quem ele presta atendimento, além de sua evolução e prognóstico [...]”.
De acordo com essa concepção, o profissional deve acompanhar a evolução
do paciente quanto aos aspectos emocionais trazidos pela situação do ado-
ecimento. Além disso, pode atuar educando e conscientizando o paciente
e a família sobre o contexto da doença e as formas de tratamento. Dessa
forma, o trabalho do psicólogo junto a equipe de saúde é facilitar as relações
equipe/paciente/família.
A psicologia hospitalar sofre críticas com relação à sua terminologia,
pois não abrange uma concepção de campo de saber, e sim apenas um local
de atuação. Além disso, muitas linhas de pesquisa confrontam suas teorias e
práticas, não havendo um consenso quanto aos procedimentos terapêuticos e
às abordagens metodológicas.
A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação 19

O psicólogo da saúde pode trabalhar junto a outros profissionais para identificar


problemas e soluções para a saúde dos trabalhadores em uma instituição de pesquisa e
assistência. Para tanto, pode ser criada uma oficina com a participação dos profissionais
de saúde para questionar e refletir sobre suas práticas, um grupo terapêutico, ou
mesmo instaurando um canal de comunicação. Os resultados desse trabalho podem
ser apresentados em congressos e ser adaptados em artigos na área de saúde. Para
saber mais sobre o assunto, leia o texto Caixa de Comunicação SOS-T: A Reestruturação
do Serviço de Orientação à Saúde dos Trabalhadores do IPEC/FIOCRUZ (BARBOSA; RO-
ZEMBERG; ALVES, 2005).

Assim, o que se pode afirmar sobre a prática do hospitalar é que ela busca
atender os pacientes submetidos a procedimentos médicos, visando à promoção
e à recuperação da saúde física e mental. Além disso, atua em instituições de
ensino superior, centros de estudo e pesquisa, em busco do aperfeiçoamento
de profissionais ou da complementação profissional de quem trabalha na área
da saúde.

A MENTE É MARAVILHOSA. A teoria ecológica de Bronfenbrenner. 2018. Disponível em:


https://amenteemaravilhosa.com.br/teoria-ecologica-de-bronfenbrenner/. Acesso
em: 9 mar. 2020.
ALMEIDA, R. A.; MALGRIS, L. E. N. A prática da psicologia da saúde. Revista da SBPH, Rio
de Janeiro, v. 14, n. 2, p. 183–202, 2011.
BARBOSA, F. E.; ROZEMBERG, B.; ALVES, L. Caixa de comunicação SOS-T: a reestruturação
do serviço de orientação à saúde dos trabalhadores do IPEC/FIOCRUZ. In: CONGRESSO
BRASILEIRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANAS EM SAÚDE, 3., 2005, Florianópolis. Anais
[...]. Florianópolis: ABRASCO, 2005.
BARLETTA, J. B. Comportamentos e crenças em saúde: contribuições da psicologia
para a medicina comportamental. Revista de Psicologia da IMED, Passo Fundo, v. 2, n.
1, p. 307–317, 2010.
BRANDT, J. A. Grupos Balint: suas especificidades e seus potenciais para uma clínica
das relações do trabalho. Revista da SPAGESP, Ribeirão Preto, v. 10, n. 1, p. 48–55, 2009.
20 A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação

BUYS, R. C. A psicologia humanista. In: VILELA, A. M. J.; FERREIRA, A. A. L.; PORTUGAL, F.


T. (org.). História da psicologia: rumores e percursos. Rio de Janeiro: Nau, 2006.
CAPITÃO, C. G.; CARVALHO, E. B. Psicossomática: duas abordagens de um mesmo
problema. Psic: revista da Vetor Editora, São Paulo, v. 7, n. 2, p. 21–29, 2006.
CASTRO, E. K.; BORNHOLDT, E. Psicologia da saúde x psicologia hospitalar: definições e
possibilidades de inserção profissional. Psicologia: Ciência e Profissão, Brasília, v. 24, n.
3, p. 48–57, 2004. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&
pid=S1414-98932004000300007. Acesso em: 9 mar. 2020.
GOMES, W. B.; HOLANDA, A. F.; GAUER, G. Psicologia humanista no Brasil. 2004. Disponível
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JACÓ-VILELLA, A. M.; FERREIRA, A. A. L.; PORTUGAL, F. T. História da psicologia: rumos e
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MARTINS, E.; SZYMANSKI, H. A abordagem ecológica de Urie Bronfenbrenner em
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MATTOS, P. R. O psicólogo e o hospital: trabalho ou ilusão? Pulsional: Revista de Psica-
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MELLO FILHO, J.; BURD, M. Psicossomática hoje. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2009.
MONTAGNER, M. A. Sociologia médica, sociologia da saúde ou medicina social? Um
escorço comparativo entre França e Brasil. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 17, n. 2, p.
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SENNA, S. R. C. M.; DESSEN, M. A. Contribuições das teorias do desenvolvimento hu-
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v28n1/13.pdf. Acesso em: 9 mar. 2020.

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Dica do Professor

A psicologia da saúde é um variado campo teórico-metodológico e de práticas psicológicas em


saúde, influenciada pelo conceito ampliado de saúde como bem-estar biopsicossocial, por métodos
tradicionais e ́por outros mais recentes, como a psicossomática. Seu campo de práticas também é
variado, abrangendo o setor público e privado nos níveis primário, secundário e terciário e também
as escolas de formação e pesquisa em saúde.

Nesta Dica do Professor, você vai saber como se formou a psicologia da saúde no Brasil e algumas
atividades práticas profissionais.

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Exercícios

1) O campo de atuação da psicologia da saúde no Brasil é novo, amplo e diverso. Segundo


Almeida e Malagris (2011, p. 191), "os psicólogos da saúde se direcionam para a
compreensão da forma como os fatores biológicos, comportamentais e sociais influenciam a
saúde e a doença". Para as autoras, a finalidade principal da psicologia da saúde é:

A) compreender como é possível, por meio de intervenções psicológicas, contribuir para a


melhoria do bem-estar dos indivíduos e das comunidades.

B) avaliar intercorrências psíquicas de pacientes que procuram os serviços de saúde, seja no


nível primário, secundário ou terciário.

C) realizar a promoção da saúde, auxiliando o profissional médico enquanto detentor de um


saber mais abrangente sobre o doente.

D) apaziguar os conflitos psíquicos que impedem o paciente de restabelecer sua saúde no


contexto de internação hospitalar.

E) fornecer formação necessária aos diversos profissionais que trabalham no campo da saúde
para que possam realizar sua prática de forma ética.

2) O humanismo surgiu no final do século XV e início do século XVI, na Europa, como um


pensamento que buscava educar o homem por meio do conhecimento acerca de si mesmo e
sobre sua civilização. Influenciou uma corrente teórico-metodológica, a psicologia
humanista, que surgiu no século XX, tendo como seus principais precursores:

A) Wundt, Freud, Firenczi e Maslow.

B) Maslow, Allport, Rogers e Murphy.

C) Freud, Jung, Maslow e Rogers.

D) Maslow, Marty, McDougall e Mello Filho.

E) Balint, Schneider, Maslow e Alexander.

3) A psicologia da saúde é um campo amplo e diversificado, composto por muitos modelos


teórico-metodológicos e práticas. De acordo com os modelos estudados, qual deles defende
que grande parte das doenças é fruto de maus hábitos que precisam ser modificados para
uma vida mais saudável?

A) Modelo da medicina psicossomática.

B) Modelo da medicina comportamental.

C) Modelo da psicologia médica.

D) Modelo da psicologia hospitalar.

E) Modelo da medicina social.

4) O modelo de Bronfenbrenner está sendo utilizado como método aplicável ao estudo da


saúde da criança, da família e do idoso devido ao seu caráter pragmático e por estar em
consonância com o conceito amplo de saúde como multidimensional. Esse modelo atua na
inter-relação de quatro eixos de comunicação proximal: pessoa, processo, contexto e tempo
(PPCT). Com relação ao aspecto pessoal, em qual das esferas ecossistêmicas as relações
interpessoais são mais diretas?

A) Apenas no microssistema.

B) No macrossistema e no mesossistema.

C) No mesossistema e no exossistema.

D) No microssistema e no mesossistema.

E) No microssistema e no macrossistema.

5) Atualmente, o psicólogo que atua na área da saúde no Brasil no nível de assistência terciário
provavelmente vai trabalhar dentro da concepção teórico-metodológica da psicologia
hospitalar. Porém existem diversos modelos de práticas que acabam sofrendo crítica sobre o
fato de a corrente representar apenas a indicação de um lugar de trabalho. Sobre a atuação
da psicologia da saúde nos espaços hospitalares, podemos afirmar que a função do psicólogo
é:

A) apenas dar suporte ao saber médico para facilitar o tratamento da doença.

B) atender a equipe de saúde em suas dificuldades de encarar a morte do paciente.


C) promover a saúde, escutar a subjetividade do paciente e da família e priorizar o trabalho
interdisciplinar.

D) atuar nos ambulatórios, enfermarias cirúrgicas, unidades de terapia intensiva, entre outros,
apenas individualmente.

E) atender pacientes submetidos a procedimentos médicos visando à recuperação, mas lidando


apenas com os aspectos mentais da doença.
Na prática

A transferência em um trabalho psicológico, seja ele no consultório particular, no hospital, no


ambulatório ou na terapia de grupo, é um mecanismo muito valorizado para o atendimento das
queixas e para que a elaboração do trabalho subjetivo do paciente aconteça. Para a psicanálise, a
transferência é a mola mestre que põe o trabalho analítico para funcionar. Alguns médicos e
psicólogos também consideram que a transferência pode prejudicar o trabalho clínico, ou a
contratransferência do médico para com as demandas do paciente.

Neste Na Prática, você vai ver um caso clínico em que os mecanismos transferenciais foram
analisados durante o trabalho de um psicólogo em um ambulatório hospitalar.
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Saiba mais

Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor:

Desafio Profissão – Psicologia hospitalar


Entrevista na TV PUC com as psicólogas Mathilde Neder, pioneira na prática psicológica em
ambiente hospitalar no Brasil, e Soraya Azzi, psicóloga do Hospital Albert Einstein, sobre o início e
os processos de trabalho do psicólogo da saúde.

Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar.

Habilidades sociais e o modelo bioecológico de


desenvolvimento humano: análise e perspectivas
Neste artigo, faça o download e veja os autores que trazem reflexões acerca de habilidades sociais
que determinam o sucesso e o fracasso nos objetivos de pessoas em sua vida social, amparados
pelo modelo ecológico de Bronfenbrenner.

Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar.

Avaliação psicológica nos contextos de saúde e hospitalar


Neste livro, você vai ver que, apesar da crescente presença da psicologia nos contextos de saúde e
hospitalar, a produção escrita ainda é escassa. O objetivo deste trabalho é a formação de
profissionais nessa área da saúde.

Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino!


Unidade de Estudos 10 - Síndrome
de Burnout

Apresentação

O mundo das organizações vem sendo impactado pelas rápidas mudanças que ocorrem no mundo,
fazendo com que as empresas atuem em um ambiente cada vez mais incerto e dinâmico, marcado
pela alta competitividade e pela necessidade de constante adaptação para sua sobrevivência. Nesse
cenário, há uma forte exigência e pressão sobre os trabalhadores que necessitam se atualizar
continuamente e têm sobre suas costas o peso da responsabilidade pelos resultados positivos das
empresas.

A síndrome de burnout, descrita por Freudenberger, é um distúrbio psíquico relacionado ao


esgotamento profissional acarretado por condições de trabalho desgastantes e em excesso e por
conflitos interpessoais nas relações de trabalho.

Nesta Unidade de Aprendizagem, você verá o trabalho na contemporaneidade, a síndrome de


burnout, suas causas e principais sintomas e como a psicologia organizacional e a gestão de pessoas
podem atuar na prevenção das doenças relacionadas ao trabalho.

Bons estudos.

Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

• Descrever o trabalho na contemporaneidade.


• Definir a síndrome de burnout, suas causas e principais sintomas.
• Identificar como a psicologia organizacional e a gestão de pessoas podem atuar para prevenir
o adoecimento relacionado ao trabalho.
Infográfico

Com a crescente pressão sobre as empresas e os trabalhadores e com a complexidade que envolve
o trabalho atualmente, torna-se cada vez mais imprescindível monitorar o ambiente de trabalho,
visto que é crescente o aumento de doenças relacionadas a ele.

Veja, no Infográfico, características do mundo empresarial e o que é exigido dos profissionais na


contemporaneidade, bem como o que as pressões e exigências sofridas pelas empresas podem
causar no trabalhador.
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Conteúdo do Livro

A necessidade de reestruturação do trabalho ocasionada pelas transformações que vêm ocorrendo


nos ambientes interno e externo das organizações desperta preocupação em todo o mundo, uma
vez que, com as exigências de adaptação cada vez mais complexas, os riscos de os trabalhadores
desenvolverem doenças de fundo emocional e psicológico e de se envolverem em acidentes nos
ambientes de trabalho vêm aumentando.

Partindo da premissa de que saúde e trabalho não se dissociam, é fundamental compreender as


organizações na atualidade, a forma como os trabalhadores se veem nesse contexto e como
empresa e trabalhador se relacionam, buscando encontrar as melhores práticas de prevenção a
esses riscos, pois todas as doenças, sejam físicas ou emocionais, causam consequências negativas
para o trabalhador e para as empresas.

No capítulo Síndrome de burnout, do livro Qualidade de Vida e Segurança no Trabalho, você verá o
trabalho na contemporaneidade, o conceito, as causas e os principais sintomas da síndrome de
burnout e como a psicologia organizacional e a gestão de pessoas podem atuar para prevenir o
adoecimento relacionado ao trabalho.

Boa leitura.
QUALIDADE DE VIDA
E SEGURANÇA NO
TRABALHO

Ligia Maria Fonseca Affonso


Síndrome de burnout
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Descrever o trabalho na contemporaneidade.


 Definir a síndrome de burnout, suas causas e principais sintomas.
 Identificar como a psicologia organizacional e a gestão de pessoas
podem atuar para prevenir o adoecimento relacionado ao trabalho.

Introdução
O excesso de trabalho, a falta de reconhecimento pelo trabalho realizado,
problemas com a liderança, trabalhos sem significado e ambiente de
trabalho instável, somados à grande pressão por qualificação, produtivi-
dade e aquisição de novas competências e habilidades, vêm abalando a
estabilidade emocional dos trabalhadores, impulsionando o surgimento
do estresse e da síndrome de burnout, que, se prolongados, podem gerar
outros problemas de saúde, inclusive, a depressão.
Neste capítulo, você vai estudar sobre o trabalho na contemporanei-
dade, conhecerá o conceito, as causas e os principais sintomas da síndrome
de burnout e vai conhecer como a psicologia organizacional e a gestão de
pessoas podem atuar para prevenir o adoecimento relacionado ao trabalho.

O trabalho na contemporaneidade
As transformações pelas quais o mundo vem passando têm provocado mu-
danças na vida das pessoas, nas sociedades e no mundo das organizações e do
trabalho. No século XVII, com o surgimento da burguesia, que se dedicava
ao comércio, o sentido do trabalho começa a ser modificado — até então,
trabalho era considerado como uma atividade inferior destinada aos escravos.
Os avanços científicos ocorridos nesse período, a transição do feudalismo
para o capitalismo e as consequências decorrentes desses eventos fazem o
2 Síndrome de burnout

trabalho ser valorizado e se consolidar na sociedade como uma atividade


digna e contrária à vida ociosa (ALVIM, 2006).
Com a Revolução Industrial, ocorrida entre os séculos XVIII e XIX, as
máquinas invadem os processos de produção para aprimorá-los e torná-los
mais eficientes, fazendo surgir um modelo de trabalho mecanizado, sem valor
afetivo por parte do trabalhador, que passa a ser controlado precisamente pelos
burocratas, responsáveis por estabelecer as regras de trabalho no modelo de
gestão inspirado nas práticas de Frederick Taylor (TAYLOR, 1995). Esse mo-
delo prega a racionalização do trabalho e leva à alienação do trabalhador. Há,
consequentemente, uma separação entre a concepção do trabalho e sua execução.

Frederick Taylor criou o modelo de administração com base na aplicação de métodos


científicos para a solução de problemas. Sua intenção era identificar e controlar os
desperdícios nas indústrias, elevando o nível de produção, em menor tempo e com
menor custo. A racionalização do trabalho, a especialização do operário e a padroni-
zação são algumas características da administração científica de Taylor (SILVA, 2013).

Nesse período, há um crescente aumento de produção, o que permite ao


comércio ter estoque de mercadorias. Dessa forma, faz-se necessário aumen-
tar o número de compradores e, aos poucos, a sociedade do consumo vai se
formando e, quanto maior as vendas, maior a necessidade de produção. Esse
movimento contribuiu para o aparecimento de mais fábricas em diversas
localidades e, com a produção em maior escala, surge a necessidade de con-
tratar mais trabalhadores. O impasse da época era como conseguir contratar
trabalhadores para uma atividade tão desvalorizada como o trabalho. Pen-
sando nisso, os produtores repaginaram o significado histórico e social do
trabalho, fazendo com que fosse visto como um ato nobre. Surge o conceito
de homo economicus, ou seja, o homem como produtor e consumidor. Esse
conceito foi crescendo de tal forma que contagiou as diversas classes sociais,
influenciou valores culturais e tornou-se algo mais importante e valorizado
que o próprio trabalhador. Nesse sentido, o trabalho era o centro da vida do
trabalhador, que ficava confinado nas fábricas, e interferia em suas relações
familiares, no lazer e em seus sonhos. O trabalho passa a ser, então, algo
essencial para a existência do homem, uma vez que não significa somente
Síndrome de burnout 3

um meio de sobrevivência, mas, também, um meio de realização pessoal e


inserção social, sendo um fator de equilíbrio e desenvolvimento (DEJOURS;
DESSORS; DESRIAUX, 1993; NARDI, 2006).
O avanço do capitalismo para um modelo mais liberal torna o mercado
mais livre e competitivo. Assim, o livre comércio, o mercado globalizado, o
avanço da tecnologia e o crescente fluxo de informações levam as organi-
zações a enxergar as pessoas como meio para alcançar maior diferencial e
competitividade, ou seja, as mudanças no trabalho não param de acontecer, e
os modelos de gestão, de evoluir. O surgimento do movimento da qualidade
total devolve ao trabalhador a responsabilidade de pensar sobre suas atividades
e sobre como exercê-las, superando a antiga separação entre a concepção e a
execução do trabalho, fazendo com que o trabalhador volte a criar um vínculo
afetivo com as atividades laborais. Dessa forma, o sentido negativo do trabalho
vai cedendo lugar a um sentido positivo e valorizado.
Cabe destacar que as transformações que vêm ocorrendo no mundo, além
de gerarem impactos nas dimensões política, econômica, social, ambiental,
tecnológica e cultural, afetam também o mundo das organizações, gerando
incertezas, imprevisibilidade e turbulência, exigindo que elas estejam atentas e
preparadas para se adaptar a todo tipo de mudanças, adotando novas estratégias e
formas de trabalhar para enfrentar o mercado altamente competitivo e encontrar
respostas para as exigências que se impõem, garantindo sua sobrevivência. Ou
seja, o mercado é dinâmico e está em constante transformação, o que faz com que
as organizações convivam permanentemente com a necessidade de adaptação,
ajustando ou alterando seus processos, relacionamentos, modelos de gestão,
estruturas, cultura, etc. Isso significa que a mudança é cada vez mais presente
no cotidiano das organizações, que buscam continuamente adaptar sua estrutura,
ressignificando sua cultura e adotando novas dinâmicas que tornam o trabalho
mais complexo, gerando maiores ou menores impactos em seus ambientes interno
e externo (LIMA; BRESSAN, 2003; OURO, 2005; JONES, 2010; KOTTER, 2013).
É importante destacar que a capacidade das organizações de se posicionarem
no mercado e de responderem aos seus desafios está diretamente relacionada às
pessoas e à forma como elas as estimulam e às suas competências, bem como
definem seu organograma e suas formas de funcionamento. Além de fatores como
produtividade, iniciativa, criatividade, conhecimento e inovação como diferenciais
competitivos, as pessoas passaram a ser vistas como o vetor de criação de valor
nas organizações, que, por esse motivo, voltaram seu olhar para o capital humano,
considerando-o como seu mais importante ativo intangível, capaz de gerar, ou não,
valor e riqueza. Ou seja, os seres humanos assumem maior importância para as
empresas, uma vez que serão capazes de aumentar ou diminuir a produtividade,
4 Síndrome de burnout

de melhorar ou piorar a qualidade de um serviço e, ainda, gerar maior ou menor


lucro para as organizações. Dessa forma, as organizações passaram a investir em
seu capital humano, utilizando novas ferramentas e estratégias de gestão capazes
de potencializar suas competências e valorizá-las. Ou seja, as empresas passaram a
se preocupar com a forma de trabalho, pois o fator humano permeia todos os níveis
da organização e, sem ele, não se produz o resultado esperado (FERNANDES,
2005; CARBONE, 2000; AFFONSO; ROCHA, 2010).
Assim, em uma luta entre o velho e o novo, ou seja, entre os paradigmas
da gestão tradicional e os da nova gestão, as organizações passam a buscar
novas práticas e estratégias de gestão, como, por exemplo, a descentralização
do poder e a administração flexível, e começam a incentivar a criatividade, a
inovação e a participação dos trabalhadores nas decisões da empresa e sobre
suas atividades, como meio de fazer com que se comprometam e se envolvam
com a missão da organização e contribuam para a realização de mudanças e
para a obtenção de melhores resultados, ou seja, que para o objetivo maior da
empresa, a sua razão de existir.

O comprometimento organizacional pode ser entendido como um tipo de vínculo


social que o trabalhador estabelece com a organização a partir de um sentimento de
afeto e de identificação que estimula um comportamento proativo, de participação,
de empenho superior e de defesa da organização (MENEZES, 2009).

Nesse sentido, a participação confere maior autonomia ao trabalhador ao


mesmo tempo que eleva sua autoestima, pois, permitindo sua participação, a
organização valoriza suas ideias, experiências e conhecimento. Essa é uma
forma de fazer com que o trabalhador se sinta como parte importante no
processo organizacional e se comprometa com os objetivos organizacionais.
A participação possibilita, ainda, maior interação entre os trabalhadores, me-
lhoria no trabalho em equipe, fortalecimento da comunicação e da cooperação,
contribuindo, também, para a construção de um ambiente de trabalho mais
saudável e motivador, além de revelador talentos (MOTTA, 1999).
Ao adotar modelos de administração mais flexíveis, as organizações
esperam dos trabalhadores, dentre outros aspectos, maior versatilidade e
responsabilidade; mente aberta às mudanças e aprendizagem contínuas, bem
Síndrome de burnout 5

como a capacidade de assumir riscos. Dessa forma, as organizações esperam


que seus trabalhadores estejam disponíveis para adequar-se rapidamente ao
ambiente que se apresenta, impulsionando o surgimento do trabalhador multi-
funcional, ou seja, capaz de atuar em diversas funções necessárias ao alcance
dos objetivos organizacionais e à preservação de seu emprego (GAULEJAC,
2007; SENNETT, 2007; BOLTANSKI; CHIAPELLO, 2009).
Mas você já parou para refletir como está o mundo do trabalho atualmente?
Não podemos falar em trabalho sem falar nas empresas e na forma como elas se
estruturam e gerenciam seus recursos e as pessoas. As empresas contemporâneas
valorizam sua mão de obra e têm seu foco em seus clientes; são mais ágeis, algu-
mas são mais enxutas e exigem de seus funcionários maior conhecimento sobre
seus negócios. Ou seja, modelos de gestão e de organização tradicionais não são
mais indicados para a gestão na contemporaneidade, apesar de ainda serem uma
prática em muitas organizações, principalmente porque o ambiente externo não
é mais o mesmo. Os princípios que orientavam as organizações nos anos 1960,
como hierarquia, especialização por funções, unidade de comando e amplitude
de controle, não se adequam às organizações atuais (GONÇALVES, 1998).
As organizações modernas passaram a ser desenhadas com base em prin-
cípios como criação de valor, trabalho em equipe, monitoramento dos resulta-
dos, coordenação, maior fluxo de comunicação direta, alocação dinâmica de
recursos, entre outros, e buscam se adequar às exigências dos novos tempos.
Assim, o universo empresarial tem como palavras de ordem “adaptação” e
“atualização”, visto que, no mundo globalizado, as mudanças são rápidas e
constantes. Assim, as organizações devem trabalhar para criar vantagem com-
petitiva, gerando resultados para seu negócio e seus stakeholders, utilizando
estratégias adequadas ao negócio (LUSTRI, 2005).
Com o ambiente empresarial altamente competitivo e imprevisível, as
empresas se veem cada vez mais dependentes de trabalhadores comprome-
tidos e preparados. Nesse sentido, devem investir na qualidade de vida no
trabalho, na motivação dos funcionários e, sobretudo, em sua qualificação e
capacitação, buscando o desenvolvimento de novas competências e habilidades.
Isso significa que capacitar a força de trabalho tem sido uma das maiores
preocupações das empresas que buscam se manter no mercado e alcançar o
sucesso. Desenvolver continuadamente as pessoas em todos os níveis e grupos
das empresas é fundamental para que estejam preparadas para os novos e
contínuos desafios. Dessa forma, requer-se dos trabalhadores novos conhe-
cimentos, novas habilidades e novos comportamentos, desde a compreensão
de processos em sua totalidade até a resolução de problemas.
6 Síndrome de burnout

Competência refere-se ao conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes necessários


aos indivíduos para exercer determinada atividade. Foi Durand (1986) quem construiu o
conceito de competência com base em três dimensões: Knowledge, Know-How e Attitudes,
também conhecidos como CHA. O conhecimento refere-se ao “saber”; habilidade refere-se
ao “saber fazer” e atitude refere-se ao “querer fazer” (CARBONE, 2000).

Nesse contexto, os trabalhadores vêm sendo cada vez mais cobrados pelas
organizações, visto que, para acompanhar as novas exigências que lhes são
requeridas, precisam qualificar-se mais, dedicar-se mais e envolver-se com o
trabalho que realizam. Dessa forma, o trabalho assume cada vez mais impor-
tância e significado na vida dos trabalhadores, visto que estes passam a maior
parte de seu tempo nas empresas e menos tempo com suas famílias. Assim,
é importante destacar que o trabalho, além de ser um fator de equilíbrio e
desenvolvimento pessoal, pode ser também um fator de deterioração física e
psíquica (DEJOURS; DESSORS; DESRIAUX, 1993).

Síndrome de burnout
Você viu que o trabalho, além de ser um meio de sobrevivência, é uma forma de
as pessoas se realizarem profissionalmente e pessoalmente, além de um meio de
reconhecimento e aceitação social. Ou seja, o trabalho é algo fundamental para
a existência humana, uma vez que é por meio da remuneração recebida que as
necessidades humanas de alimentação, moradia, educação, bem-estar social, entre
outras, são satisfeitas. Dessa forma, o trabalho é um elemento crítico que contribui
para o autoconceito e para a identidade pessoal (FERREIRA; LUCCA, 2015).
Nesse sentido, é importante ter em mente que um trabalho só possui signi-
ficado para um indivíduo se gerar algum valor que ele possa perceber, ou seja,
se contribui para seu crescimento profissional ou pessoal; se o resultado do
trabalho é relevante; se oferece benefícios em relação ao ambiente empresarial,
etc. O sentido que o indivíduo dá a seu trabalho, isto é, a forma como ele
trabalha e o que produz com seu trabalho, afeta-o diretamente, não somente
no ambiente de trabalho, mas fora dele também, gerando impacto sobre seu
pensamento, liberdade, consciência, comportamento e independência. Isso
significa que um trabalho que não gera qualquer interesse no trabalhador e
Síndrome de burnout 7

acontece em um ambiente insignificante contribui para torná-lo entediante,


absurdo e sem sentido (MORIN, 2001; RONCHI, 2010).
Estudos sobre motivação (BERGAMINI, 2008; VERGARA, 2010) têm
revelado que o significado do trabalho é fonte de motivação para alguns
trabalhadores, enquanto para outros vem enfraquecendo-se, tendo seu valor
limitado às vantagens econômicas por ele geradas e à necessidade de sobre-
vivência. Pesquisas apontam que, no Brasil, mais de 50% dos trabalhadores
formais andam insatisfeitos com seu trabalho. Dentre as principais causas,
estão a falta de reconhecimento e valorização do trabalhador, conflito entre
os valores e objetivos pessoais e organizacionais, problemas de liderança,
remuneração incompatível com o esforço empreendido, ambiente de trabalho
desfavorável, sobrecarga de trabalho, entre outros (DINO, 2018).
Essa insatisfação no trabalho é algo preocupante e precisa ser investigado,
uma vez que pode gerar consequências negativas na vida do trabalhador,
como, por exemplo, diversas doenças de fundo emocional e psicológico, como
estresse, burnout e depressão, que, por sua vez, impactam diretamente nos
resultados da empresa, visto que geram desmotivação, baixo desempenho
do trabalhador e, consequentemente, baixa produtividade, alta rotatividade,
absenteísmo, violência no local de trabalho, entre outras (QUICK et al., 1997).
O estresse organizacional é considerado como um dos riscos mais sérios ao
bem-estar psicossocial do indivíduo e é uma fonte constante de preocupação,
pois coloca em risco a saúde dos trabalhadores de uma organização, ambiente
no qual 50 a 80% de todas as suas doenças é de fundo psicossomático ou estão
relacionadas ao estresse. São muitas as reações fisiológicas, emocionais e
comportamentais associadas ao estresse, como doenças do coração e hiperten-
são, relacionadas à quantidade de estresse sofrido pelo indivíduo; ansiedade,
baixa autoestima, depressão; insatisfação com o trabalho, baixo desempenho
e violência no local de trabalho (PELLETIER, 1984; QUICK et al., 1997).
A depressão refere-se a um conjunto de manifestações que levam a neces-
sidade de isolamento, desânimo, ansiedade, insônia, tristeza, angústia, medo,
vontade de chorar, entre outros. É uma doença que pode manifestar-se em dife-
rentes momentos da vida de uma pessoa e pode ser considerada um problema de
saúde pública, uma vez que causa grande sofrimento e altas taxas de suicídio. É,
além disso, um dos principais motivos de afastamento do trabalho (OMS, 1993).
O termo burnout traduzido do inglês significa queimar lentamente, até
o fim, e tem relação com o desgaste emocional que impacta nos aspectos
físicos e emocionais do indivíduo. A síndrome de burnout foi descrita por
Freudenberger (1974) como um distúrbio psíquico relacionado ao esgotamento
profissional acarretado por condições de trabalho desgastantes e em excesso
8 Síndrome de burnout

e por conflitos interpessoais com os colegas de trabalho e demais pessoas


envolvidas nele (ROSSI et al., 2010).
É uma síndrome considerada no mundo organizacional como um grande
problema e responsável, dentre outras coisas, pela diminuição do interesse em
trabalhar. Assim, burnout é um termo utilizado quando o desgaste emocional está
correlacionado com a atividade ou com o ambiente de trabalho (MERZEL, 2019).

Freudenberger foi um psicólogo alemão e um dos pioneiros na descoberta dos sintomas


de esgotamento profissional, tendo se aprofundado nos estudos sobre a síndrome
de burnout (ROSSI et al., 2010).

Burnout é uma síndrome psicológica que envolve uma reação prolongada


à tensão emocional crônica e que se dá em três dimensões, cujas reações são
exaustão devastadora, sensação de ceticismo e desligamento do trabalho,
sensação de ineficácia e falta de realização. Veja um pouco mais sobre essas
dimensões a seguir (LEITER; MASLACH, 2005).

 Dimensão da exaustão: os trabalhadores sentem-se esgotados, sem


energia e reclamam de estarem sobrecarregados de trabalho. Essa exaus-
tão tem como fontes principais a sobrecarga de trabalho e o conflito
pessoal no trabalho.
 Dimensão do ceticismo: refere-se à sensação negativa e insensível aos
diversos aspectos do trabalho. Normalmente, desenvolve-se como uma
resposta à sobrecarga de exaustão emocional, ou seja, atua como uma
proteção emocional. Diante da carga excessiva de trabalho, o trabalhador
começa a se retrair e a reduzir o que está fazendo. Esse desligamento do
trabalho pode incorrer na perda do idealismo e na desumanização dos
outros, ou seja, com o passar do tempo, essa proteção e a diminuição
do trabalho se transformam em uma reação negativa do trabalhador
em relação às pessoas e ao trabalho. Conforme o ceticismo vai se de-
senvolvendo, o trabalhador vai deixando de fazer o melhor para fazer
o mínimo, isto é, diminui o tempo que passa no trabalho e o esforço e
a dedicação a ele. Com isso, o desempenho cai e o trabalhador acaba
fazendo o mínimo para garantir seu salário.
Síndrome de burnout 9

 Dimensão da ineficácia: refere-se ao sentimento de incompetência, de falta


de realização profissional e de produtividade no trabalho. Esse sentimento
é disparado pela falta de recursos para a execução do trabalho e pela falta
de apoio social e de oportunidades para se desenvolver profissionalmente.
Os indivíduos que vivenciam essa dimensão do burnout sentem-se como
se tivessem cometido um erro na escolha de sua carreira e passam a se
autocriticar e a ter uma ideia negativa de si mesmo e dos outros.

Mas qual será o perfil de pessoas com maior probabilidade de sofrer de


burnout? Na verdade, estudos sobre esse aspecto não apresentaram resultados
relevantes, apenas sugestões de tendências.
A doença tende a se desenvolver em pessoas com baixa autoestima, baixos
níveis de resistência, comportamento de risco e que apresentam traços de
ansiedade, hostilidade, depressão, insegurança e vulnerabilidade, ou seja,
aspectos relacionados ao neuroticismo.

O neuroticismo é um dos cinco traços da teoria dos traços que constituem a persona-
lidade de um indivíduo e refere-se ao nível crônico de desajustamento e instabilidade
emocional. Os demais traços são a extroversão, a abertura para experiência, a amabi-
lidade e a consciência (PERVIN; JOHN, 2013).

Essas pessoas encaram as situações estressantes de forma passiva e defen-


siva e são emocionalmente instáveis e passíveis de distresse psicológico, ou
seja, são pessoas que correm maior risco de desenvolver a síndrome de burnout.

Distresse é um termo das áreas de psicologia e psiquiatria relacionado ao estresse


excessivo, ou seja, aquele em maior nível, capaz de causar sofrimento e prejudicar
a saúde e, consequentemente, outras dimensões da vida pessoal e profissional. O
eustresse, por sua vez, refere-se a um estresse bom e que ajuda as pessoas a reagi-
rem positivamente diante de desafios e mudanças; é um tipo de estresse que leva
o organismo a produzir adrenalina, dando à pessoa ânimo e energia (FARO, 2015).
10 Síndrome de burnout

Os sintomas da síndrome de burnout podem ser físicos ou psíquicos,


como, por exemplo, dores no corpo, cansaço, desânimo, apatia, desinteresse,
irritabilidade, alterações no sono e no apetite, além de tristeza excessiva. É
importante destacar que a síndrome foi identificada no mundo do trabalho, mais
precisamente nas áreas de assistência, como saúde, saúde mental, assistência
social, sistema judiciário penal, profissões religiosas, de aconselhamento e
no ensino. Nessas áreas de atuação, a necessidade dos outros é colocada em
primeiro lugar, e isso exige muito trabalho, abnegação, contato pessoal e
emocional intenso e fazer o que for preciso para ajudar o outro. Assim, pro-
fissionais da área de saúde, professores e policiais possuem grande propensão
a desenvolver a síndrome (LEITER; MASLACH, 2005; MERZEL, 2019).

A síndrome de burnout é muitas vezes confundida com estresse, o que pode dever-se
ao fato de que os sintomas do estresse estão presentes nessa síndrome (MERZEL, 2019).

Outro aspecto que deve ser destacado é que o problema que causa a síndrome
não surge em decorrência de falha pessoal, e, sim, da falta de afinidade do
indivíduo com aspectos de seu trabalho, como, por exemplo, sobrecarga de
trabalho, falta de controle, recompensas insuficientes, ruptura na comunidade,
falta de justiça e conflitos de valor. Dessa forma, o acúmulo de atividades
e de responsabilidades, bem como o alto nível de exigências e pressões por
parte das empresas, pode desencadear os primeiros sintomas da síndrome.
Nesse contexto, três aspectos principais se manifestam: o esgotamento físico
e mental; uma sensação de impotência e a falta de expectativas.
Cabe destacar que, quanto maior for a incompatibilidade entre o traba-
lhador e seu trabalho, maior é a probabilidade de desenvolver burnout. Por
outro lado, quanto menor for essa incompatibilidade, maior será o nível de
comprometimento com o trabalho (ROSSI et al., 2010).
Vamos ver um pouco mais sobre algumas incompatibilidades?

 Sobrecarga de trabalho: é um dos principais preditores da dimensão


exaustão do burnout. O trabalhador sente que tem muito trabalho a
realizar e pouco tempo e recursos para isso. Pessoas com sobrecarga
de trabalho normalmente também sentem um desequilíbrio entre tal
Síndrome de burnout 11

sobrecarga de trabalho e a vida pessoal, uma vez que, muitas vezes,


acabam sacrificando momentos em família para concluir o trabalho.
 Falta de controle: o trabalhador não tem controle sobre diversos as-
pectos que podem interferir no trabalho, como, por exemplo, demissão,
mudanças na gerência, enxugamento do quadro funcional, necessidade
de trabalhar fora da empresa, de viajar, de trabalhar fora do horário de
expediente, etc. Essas situações causam impactos significativos sobre
os níveis de estresse e burnout.
 Recompensas insuficientes: o trabalhador acredita que não está sendo
adequadamente recompensado pelo trabalho exercido e pelo desempe-
nho apresentado. Isso se refere não somente ao salário e aos benefícios
recebidos, mas também ao reconhecimento pela qualidade do trabalho e
o esforço empreendido para a sua realização. O reconhecimento positivo
sobre o trabalho realizado é fundamental para prevenir o bunout.
 Ruptura na comunidade: refere-se às relações entre as pessoas no
ambiente de trabalho, como a falta de apoio e confiança e conflitos
não resolvidos. A quebra do senso de comunidade gera hostilidade e
concorrência, dificultando a resolução dos conflitos, o que eleva os
níveis de estresse e burnout, dificultando a realização do trabalho.
 Falta de justiça: refere-se à falta de justiça e igualdade no local de
trabalho, situações que levam a raiva e hostilidade, fazendo com que
o trabalhador se sinta tratado com desrespeito.
 Conflitos de valor: acontece quando há uma incompatibilidade entre
os valores da empresa e os valores pessoais. Ou seja, há um conflito,
por exemplo, entre o que o trabalhador quer fazer e o que ele tem que
fazer. Ou seja, o trabalhador precisa agir de uma forma com a qual não
concorda para realizar o trabalho, havendo, assim, um conflito de valores.

Além disso, a síndrome é preocupante porque pode gerar custos não só para
os funcionários, mas também para as empresas. Muitas vezes, os gerentes não
dão a devida importância para os sintomas de estresse e esgotamento apresen-
tados pelo trabalhador. De modo geral, ao identificar tais sintomas, os gerentes
pensam que se trata de um dia ruim na vida do trabalhador, considerando que
esse é um problema seu, e não da empresa. Muitas pesquisas revelam que o
estresse no trabalho indica uma piora no desempenho do trabalhador, proble-
mas nos relacionamentos com a família e de saúde. Por exemplo, o auge da
síndrome pode causar uma crise física e emocional que, muitas vezes, requer
um atendimento médico com intervenção medicamentosa e psicoterapia. Um
funcionário com burnout apresenta padrões mínimos de trabalho, passa a ter
12 Síndrome de burnout

um desempenho bem abaixo da média e queda na qualidade da produtividade.


Além disso, comete mais erros, torna-se menos cuidadoso e apresenta baixo
nível de criatividade na resolução de problemas, aspectos que podem gerar
altos custos para as empresas (ROSSI et al., 2010; MERZEL, 2019).

Apesar de a síndrome de burnout ter sido identificada em atividades relacionadas à


assistência, ao aconselhamento e ao ensino, sua aplicação pode tornar-se importante
em outras esferas da vida, como, por exemplo, na família, para analisar a relação entre
pais e filhos e entre pessoas que formam um casal (PROCACCINI; KIEFABER, 1983).

Psicologia organizacional e gestão de pessoas


na prevenção de doenças do trabalho
O mundo do trabalho está cada vez mais dinâmico e complexo, impactando na
forma como as pessoas realizam seu trabalho, lidam com ele e se relacionam
com as pessoas nesse ambiente. É claro que tantas mudanças não deixariam o
mundo do trabalho de fora, que é um reflexo da vida do homem e acompanha a
sua evolução. Você já sabe que as pessoas, atualmente, passam a maior parte de
seus dias dentro das empresas onde trabalham, envoltas em processos variados
que lhes permitem executar suas tarefas e contribuir para o alcance dos objetivos
da empresa. Você já parou para pensar no quanto esse ambiente é complexo
e quanta diversidade é possível encontrar nele? Pessoas, valores, crenças, for-
mação, pensamentos, experiências, vivências, conhecimentos, habilidades,
conhecimentos, todos diferentes uns dos outros. Assim, é natural encontrar
nesses ambientes problemas e conflitos que precisam ser tratados e solucionados.
Dessa forma, as empresas necessitam de profissionais preparados para
encarar toda essa complexidade e lidar cuidadosamente com as pessoas, os pro-
blemas e conflitos, permitindo que os profissionais se desenvolvam e exerçam
suas atividades em um ambiente harmonioso de trabalho. Você também já sabe
que as pessoas são o ativo mais importante das empresas, uma vez que são as
responsáveis por ajudá-las a alcançar seus objetivos, ou seja, são responsáveis
pelo aumento ou pela diminuição da produtividade, por melhorar ou piorar a
qualidade dos serviços ou produtos e por gerar maior ou menor lucro. Dessa
Síndrome de burnout 13

forma, entendemos que não basta uma ótima estrutura, recursos materiais e
tecnológicos necessários se as empresas não puderem contar com profissionais
qualificados e comprometidos. Assim, é preciso que essas empresas cuidem
dessas pessoas, entendendo-as nesse universo e compreendendo os aspectos
relacionados à sua atuação no ambiente de trabalho.
A psicologia organizacional tem como objetivo estudar o indivíduo na
organização e a influência desta no indivíduo. Nesse contexto, além de es-
tudar a estrutura formal e informal das empresas, estuda seus processos de
recrutamento e seleção, a forma como recompensam seus trabalhadores pelos
serviços executados, como estimulam a motivação nos trabalhadores, como
esses se relacionam socialmente neste ambiente e como seu pensamento, seus
sentimentos e comportamentos são influenciados pela empresa, entre outros
aspectos (FURNHAM, 2001).
A gestão de pessoas, por sua vez, tem como responsabilidade coordenar e
equilibrar os interesses pessoais e organizacionais, com vistas a manter na orga-
nização funcionários motivados, qualificados, produtivos e comprometidos com
os objetivos da organização. Nesse contexto, o psicólogo organizacional tem como
principal função ocupar-se com a saúde emocional e psicológica do trabalhador.
Mas quais são as funções da gestão de pessoas nas organizações? Vamos
ver algumas delas a seguir (GIL, 2006).

 Agregar pessoas: diz respeito a adotar políticas eficazes de atração e


retenção do capital humano, ou seja, atrair, selecionar e integrar novos
funcionários.
 Aplicar pessoas: significa que, além de descrever cargos e suas funções,
deve-se adequá-los às estratégias da organização, avaliar o desempenho
dos funcionários, viabilizar o plano de carreiras e disseminar a cultura
organizacional.
 Recompensar pessoas: refere-se a elaborar uma boa política de remu-
neração e recompensar e reconhecer o trabalho realizado.
 Desenvolver pessoas: refere-se a capacitar e desenvolver os profissionais
por meio de programas de desenvolvimento, de gestão de mudança e
de comunicação interna, de forma contínua, alinhando-os aos perfis
individuais de competência e às demandas da organização.
 Manter pessoas: refere-se a criar e manter um bom clima e cultura orga-
nizacional, gerir programas de saúde, segurança do trabalho, higiene e
qualidade de vida. Isso significa que um ambiente satisfatório e seguro
é fundamental para a realização do trabalho.
14 Síndrome de burnout

 Monitorar pessoas: refere-se ao acompanhamento e à gestão de pessoas


por meio de resultados, o que pode ser operacionalizado por meio de
reuniões periódicas com os envolvidos, buscando a análise do desen-
volvimento do trabalho e dos resultados alcançados.

Todas essas funções são imprescindíveis para o sucesso da gestão de pessoas


e para que o setor possa atender às exigências do cenário organizacional con-
temporâneo. São funções importantes também para prevenir o adoecimento no
trabalho. Nesse contexto, o psicólogo organizacional participa atuando também:

 nos processos de recrutamento e seleção;


 no treinamento e no desenvolvimento dos trabalhadores;
 na avaliação de desempenho;
 no desenvolvimento de líderes e equipes;
 no aconselhamento de carreira;
 no diagnóstico de problemas;
 na formulação de programas de qualidade de vida no trabalho;
 na identificação de doenças e acidentes de trabalho e suas causas.

O importante é que essas e outras tantas funções da gestão de pessoas, em


conjunto com a psicologia organizacional, permitam a criação de condições
necessárias para que as pessoas desenvolvam competências e habilidades
necessárias à realização de seu trabalho, tornando-se mais eficientes, eficazes,
participativas, satisfeitas e realizadas no ambiente profissional, com menor
índice de doenças e acidentes de trabalho (TEIXEIRA et al., 2010).
Os problemas emocionais e psíquicos relacionados ao trabalho, como, por
exemplo, o estresse e o burnout, acabam desencadeando outras doenças, cau-
sando sintomas como dores no corpo, cansaço, desânimo, apatia, desinteresse,
irritabilidade, alterações no sono e no apetite, tristeza excessiva, entre outras.
Esses problemas e outras doenças relacionadas ao trabalho geram prejuízos
não só aos trabalhadores, mas às empresas, acarretando problemas como
absenteísmo (falta ao trabalho), alta rotatividade (grande fluxo de entrada e
saída de profissionais na empresa), afastamento por doenças, conflitos inter-
pessoais, acidentes de trabalho, e outros (ROSSI et al., 2010).
Não existe receita pronta para resolver o problema das doenças do trabalho.
Cada organização é única e conta com estruturas e processos diferenciados. No
caso de identificação de estresse e burnout, por exemplo, é preciso avaliar os seus
impactos e consequências na saúde do trabalhador e nos resultados da organização,
com a participação dos gestores de pessoas, psicólogos, médicos do trabalho, entre
Síndrome de burnout 15

outros, pois, para cada caso, haverá uma solução ou ação específica que deve ser
buscada com a participação do trabalhador envolvido (ROSSI et al., 2010).
Além de todas as ações apresentadas, deve ser dada uma atenção maior ao
comportamento e ao desempenho do trabalhador, ou seja, a como ele está se
relacionando com seu líder, com seus colegas e seus clientes; se a sua relação
com os outros é respeitosa; se está conseguindo executar suas atividades
diárias dentro do prazo estabelecido; se cumpre normalmente seu horário de
trabalho; se participa com contribuições significativas nas reuniões com seu
líder e equipe; se consegue atingir as metas estabelecidas, entre outros. Cabe
destacar que, se a empresa cobra tanto do profissional, deve estar atenta a
esses e outros aspectos. Por sua vez, é preciso avaliar se a empresa oferece
boas condições de trabalho e disponibiliza os recursos necessários para a sua
realização; como ela remunera, recompensa e valoriza seus trabalhadores;
se as metas estabelecidas para os trabalhadores são factíveis; se o trabalho é
significativo para o trabalhador e se este possui autonomia e responsabilidade
para sua execução; se a empresa investe e estimula relações pessoais saudáveis;
se gerencia os níveis de estresse no ambiente de trabalho; se a comunicação
com os trabalhadores é clara e transparente, etc. (ROSSI et al., 2010).
Assim, podemos concluir que a manutenção da saúde do trabalhador dentro da
empresa é fundamental, pois, além de oferecer ao trabalhador maior qualidade de
vida no trabalho, traz para a empresa maior produtividade e obtenção dos resultados
esperados, uma vez que trabalho e saúde não se dissociam. Nesse sentido, o psicó-
logo organizacional atua na prevenção de adoecimentos relacionados ao trabalho.

AFFONSO, L. M. F.; ROCHA, H. M. Fatores organizacionais que geram insatisfação no


servidor público e comprometem a qualidade dos serviços prestados. In: SIMPÓSIO
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TEIXEIRA, G. M. et al. Gestão estratégica de pessoas. 2. ed. Rio de Janeiro: FGV, 2010.
VERGARA, S. C. Gestão de Pessoas. 9 ed. São Paulo: Atlas, 2010.

Leituras recomendadas
MOWDAY, R. T.; PORTER, L. W.; STEERS, R. M. Employee-organization linkages: the psycho-
logy of commitment, absenteeism and turnover. New York: Academic Press, 1982.
ROSSI, A. M. R.; MEURS, J. A.; PERREWE, P. L. Stress e qualidade de vida no trabalho: stress
interpessoal e ocupacional. São Paulo: Atlas, 2015.
Dica do Professor

Os problemas emocionais e psicológicos têm afetado cada vez mais pessoas, inclusive crianças.
Vivemos em um mundo dinâmico, com muitas atividades e preocupações diárias que, se
prolongadas, podem causar estresse e se agravar com problemas em várias esferas da vida,
principalmente no trabalho, local onde se está a maior parte do tempo.

Veja, na Dica do Professor, alguns aspectos do estresse e o que os especialistas recomendam para
equilibrá-lo.

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Exercícios

1) Os modelos de gestão e de organização tradicionais não se encaixam mais em muitas


organizações nos dias de hoje, principalmente porque o ambiente externo não é mais o
mesmo. Os princípios que orientavam as organizações nos anos 1960 não se adequam às
organizações atuais. Nesse sentido, é correto afirmar que é uma característica do trabalho
na contemporaneidade:

A) a especialização por função.

B) a centralização.

C) a padronização de processos.

D) o monitoramento de resultados.

E) a amplitude de controle.

2) Após um período de desvalorização, o trabalho assumiu grande importância passando a


representar para as pessoas, além de um meio de sobrevivência, um meio de realização
pessoal e de reconhecimento social. As empresas também passaram a se preocupar com a
forma de trabalho, pois o fator humano permeia todos os níveis da organização e sem ele
não se produz o resultado esperado. Nesse sentido, em uma luta entre os paradigmas da
gestão tradicional e os da nova gestão, as organizações passam a buscar novas práticas e
estratégias de gestão como:

A) participação das pessoas nas decisões sobre suas atividades.

B) melhor fluxo de comunicação entre as chefias.

C) estímulo a relações formais entre as pessoas.

D) capacitação de forma periódica.

E) decisões centradas nos níveis mais altos da empresa.

3) Pesquisas apontam que, no Brasil, mais de 50% dos trabalhadores formais andam
insatisfeitos com seu trabalho. Essa insatisfação é algo preocupante e precisa ser
investigada, uma vez que pode gerar consequências negativas na vida do trabalhador, como,
por exemplo, doenças emocionais e psicológicas. Ao distúrbio que envolve uma reação
prolongada à tensão emocional crônica damos o nome de:

A) ansiedade.

B) depressão.

C) burnout.

D) estresse.

E) medo.

4) O burnout é um termo utilizado quando o desgaste emocional está correlacionado com a


atividade ou o ambiente de trabalho e que se dá em três dimensões. Quando o trabalhador
começa a se retrair e a reduzir o que está fazendo, pode-se dizer que o burnout está
acontecedo em que dimensão?

A) Estresse.

B) Exaustão.

C) Conflito.

D) Ineficácia.

E) Ceticismo.

5) O problema que causa a síndrome de burnout não surge em decorrência de falha pessoal e
sim da falta de compatibilidade do indivíduo com aspectos de seu trabalho. O acúmulo de
atividades e de responsabilidades, bem como o alto nível de exigências e pressões por parte
das empresas podem desencadear os primeiros sintomas da síndrome. Nesse contexto, um
dos primeiros sinais que se manifesta é:

A) insônia.

B) ineficiência.

C) falta de expectativa.

D) conflito de valor.
E) depressão.
Na prática

Pesquisas em torno do tema trabalho revelam que as doenças de ordem emocional ou psíquica
desenvolvidas no trabalho acontecem por conta do ambiente e das condições em que o trabalho
se dá. No entanto, algumas medidas podem ser tomadas para alterar o ambiente e as condições,
reduzindo as doenças.

Veja, Na Prática, a história de funcionários que estavam adoecendo no setor de planejamento da


Secretaria Municipal de Saúde de um município do estado do Rio de Janeiro e com algumas ações o
problema foi contornado.
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Saiba mais

Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor:

Síndrome de burnout: as novas formas de trabalho que


adoecem
Neste artigo, cujo objetivo foi analisar a síndrome de burnout, você verá suas causas, sintomas e a
relação da tecnologia nas relações de trabalhos disfuncionais atuais, além de tratamentos
disponíveis.

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Qualidade de vida do trabalho: estresse ocupacional


Neste link, você acessa um estudo que teve por objetivo identificar quais são as vantagens dos
programas de qualidade de vida no trabalho para empregados e organização.

Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar.

Síndrome de burnout: causas e consequências em diversos


profissionais
Neste link, você acessa o artigo cujo objetivo foi investigar a síndrome de burnout em profissionais
de diversas áreas por meio de revisão bibliográfica exploratória quanti-qualitativa.
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