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Módulo 2 – A Teoria Moreniana: Socionomia

MÓDULO 2
A TEORIA MORENIANA:
Socionomia
Objetivos Específicos

Compreender a socionomia e as leis que regem o


comportamento social;
Identificar o papel da criatividade e da espontaneidade na
teoria do psicodrama;
Conhecer a prática psicodramática.

Vamos conhecer agora como a pesquisa do comportamento


humano no teatro da espontaneidade se diferencia completamente de
estudos psicológicos da época.

Inicialmente, é importante destacar que a psiquiatria e a psica-


nálise concentravam suas observações em pacientes internados e am-
bulatoriais, quer fossem psicóticos ou neuróticos. Moreno observava as
interações relacionais entre os homens “normais” que participavam do
seu teatro. Em 1925, indo morar nos EUA, desenvolveu e sistematizou
suas descobertas sobre a socionomia que estuda o grupo e suas relações.

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Para melhor compreendermos, a So-


Você já ouviu falar cionomia é uma ciência que tem como
sobre a socionomia eixo fundamental a inter-relação en-
em algum tre o individual e o coletivo, visando o
momento da sua bem-estar social. São três, as princi-

?
vida? pais ramificações metodológicas da
Socionomia. Vejamos:

Infográfico 1 – Teoria Moreniana

Fonte: Adaptado de Coelho (2021)


2.1 Sociometria

A sociometria é o estudo quantitativo das características


psicossociais dos grupos e visa mensurar as relações entre os membros
do grupo, evidenciando as preferências e evitações presentes nas relações
grupais. Kaufman (1992, p. 58) assegura:

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“A Sociometria é a “Ciência da medida do


relacionamento humano”. Descreve e mede
a dinâmica dos grupos, das relações sociais, a
dinâmica inter e intra grupal”.

Seu principal método é o teste sociométrico, que produz um


sociograma de grupos relacionados. Estes testes visam elucidar a rede
de conexões que compõem a estrutura do grupo. Um sociograma é uma
representação gráfica de uma rede de relacionamentos de grupo (LIMA,
2000).

2.2 Sociodinâmica

Caso você não


A Sociodinâmica estuda a
conheça, o role playing
estrutura e funcionamento dos grupos
é um jogo dramático
sociais, dos grupos isolados e das
de personagens,
associações de grupo e sua dinâmica. representado em
Neste caso, o role playing é usado situações imaginárias.
como método.

A dramatização desse tipo de jogo de papéis ajuda a explicar


conflitos entre personagens relacionados, resolve expectativas
contraditórias de papéis, oferece oportunidades para empatia, atuação
e se tornar outros, e é mais propício à espontaneidade e criatividade
favorecendo o exercício de um papel (KAUFMAN, 1992).

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2.3 Sociatria:
sociodrama e psicodrama
Sociatria é a ciência do tratamento dos sistemas sociais, que visa
o tratamento das relações, os vínculos, utilizando-se, principalmente,
de seus dois métodos: o Psicodrama (quando o foco é o indivíduo), o
Sociodrama (quando o foco é o grupo e a ênfase é colocada nos papéis
institucionais (KAUFMAN, 1992).

Na perspectiva de tratar as relações grupais,


a sociatria se subdivide em:

Psicodrama
Sociatria
Sociodrama

Saiba mais

Psicodrama e Sociodrama são instrumentos de intervenção e


tratamento da realidade do ser social. Para compreender bem as
duas abordagens é necessário conhecer a Teoria dos Papéis.
Acesse o link a seguir e conheça a diferença entre o Psicodrama e
o Sociodrama, disponível em: https:/
/febrap.org.br/psicodrama-
sociodrama/

Moreno (1959) desenvolveu o sociodrama como ferramenta


psicológica tradicionalmente usada no campo da terapia de grupo. O
sociodrama possibilita o desenvolvimento de papéis sociais dentro de
instituições e do papel profissional em um trabalho coletivo que abrange
o grupo como um todo.

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Já Almeida (2004, p. 68) corrobora:

O sociodrama viabiliza a ‘reedição das relações e dos valores


de um grupo e, consequentemente, da existência ou não
da alteridade nesse grupo, mas abrindo a possibilidade de
exercitá-la e desenvolvê-la, por meio do manejo das técnicas
psicodramáticas’.

Para conceituarmos, o sociodrama é um psicodrama baseado em


técnica terapêutica aplicado para resolver um problema do grupo, que é
usado para ajudar os participantes a entender o ponto de vista de outras
pessoas, e assim, possam colocar-se no lugar delas e encontrar compor-
tamentos alternativos aos já existentes.
No sociodrama, parte-se de uma demanda coletiva, de um tema
vivido pelo grupo e na etapa de “comentários ou compartilhamento” cada
participante do grupo entra em contato com sua versão pessoal daquele
drama.
O psicodrama oferece a oportunidade de conhecer homens
inacabados que são moldados por meio das relações sociais, também
reflete a subjetividade entre as pessoas. As representações de
papéis constituem o reconhecimento do eu e do outro por meio do
jogo psicodramático, a possibilidade de se reduzir as resistências e
promover a reflexão no tocante à subjetividade.

O psicodrama idealizado para ser público possui a capacidade de


mobilizar intensamente e provocar a sensibilização de inúmeras pessoas
que estarão reunidas uma única vez, em um único momento, podendo,
assim, com o propósito de expressar seus dilemas de vida e dramatizá-
los ou não (SOEIRO, 1995; WECHSLER; MONTEIRO, 2016), possibilitando,
a partir desse contexto, constituir-se em um grupo psicodramático, uma
vez que reuniu pessoas dinâmicas que romperam com a inibição ao se
expressarem já no primeiro encontro, além de se mostrarem capazes de
verbalizar suas emoções.

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O psicodrama parte da demanda singular de um indivíduo, mas


na terceira etapa da sessão de psicodrama, que se chama “análise ou
compartilhamento”, faz-se a mediação entre o problema do indivíduo
(protagonista) e os aspectos sociais, coletivos da problemática. A
Sociodinâmica e a Sociatria têm objetivos complementares e utilizam-
se das mesmas técnicas: o Psicodrama, o Sociodrama, o Role Playing, o
Teatro Espontâneo e a Psicoterapia de Grupo (BARBARINI, 2009, p.57).

Infográfico 2 – Sociodinâmica e sociatria

Fonte: Adaptado de Coelho (2021)

Para o surgimento dessa teoria, Moreno desafiou críticas, rom-


peu com o movimento médico da sua época, atacando os valores ofi-
ciais, conseguindo desenvolver uma teoria baseada numa concepção de
ser humano e de saúde que têm como núcleo a espontaneidade. O oti-
mismo sobre o vital, o amor, a catarse e os papéis que o Eu do indivíduo
vai formando (VITALI, 2013).
O ato de nascer se concretiza numa nova situação
completamente desconhecida, não tem referência nem modelo
anterior ou pré-estabelecido, requerendo espontaneidade.

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CURIOSIDADE

Para Moreno (1978, p. 100), elucida:

A situação de um bebê ao nascer faz com que seja quase um mi-


lagre o fato dele nascer vivo. Muda-se de um exíguo comparti-
mento fechado para um espaço aberto e ilimitado. Transfere-se
de uma escuridão eterna para um meio iluminado e multicolo-
rido. Ingressa numa esfera de visão e som. Muda de posições
limitadas para um meio em que a locomoção e a direção são
indispensáveis. Passa de uma existência parasitária, em que foi
alimentado através da placenta materna, para uma existência
em que a sua atividade própria é indispensável na ingestão e
eliminação do alimento. Passa de um estado de sono constante
para um estado de gradual despertar e percepção do mundo
que o cerca. Muda de uma situação que lhe proporciona um
equilíbrio seguro para um mundo que terá de ser conquistado
para sobreviver nele e no qual terá de adquirir, gradualmente,
um equilíbrio próprio. Ingressa nesse mundo de um modo tão
súbito que o seu ajustamento bem sucedido é um dos grandes
enigmas da vida. Dentro de poucos minutos, ele transfere-se,
praticamente, de um mundo para um outro.

Ao longo da vida, a espontaneidade permite ao ser humano dar


resposta apropriada e adequada frente a uma determinada situação
apresentada. Contudo, a espontaneidade não se manifesta se o homem
está fechado ao novo, em função de uma cultura que cristaliza padrões
de comportamentos, de relações e de sentimentos. Para não ser
embotada e poder se manifestar, a espontaneidade requer certo grau
de imprevisibilidade e abertura ao desconhecido (MORENO, 1978).

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Khouri (2005, p. 122) sustenta que:

O sistema socionômico, por seus métodos, é capaz de trafegar


pelos multiníveis organizacionais, tanto na perspectiva


micro como na perspectiva macro, facilitando a produção de
novas formas de subjetividade e a construção de sentido
compartilhado de qualquer temática proposta ao grupo ou
protagonizada pelo próprio grupo.

A aplicação da teoria socionômica se justifica, uma vez que o


Homem, ser em relação e dotado de recursos inatos, na concepção
de Moreno, encontra-se como um sujeito que tem perdido sua ação
criadora e suas possibilidades, enquanto um agente de transformação
(BARBARINI, 2009).

Saiba mais
A ciência socionômica, conforme define Moreno (1975), é composta
por sociometria, sociodinâmica e sociatria. Entre elas, destaca-se
a sociatria, por representar a parte prática, a aplicação da ciência
socionômica. É nessa vertente que está localizado o psicodrama,
como uma das possibilidades de aplicação. O psicodrama se
configura enquanto instrumentalização da socionomia, podendo
promover a transformação social, a alteração de comportamentos
e o exercício do protagonismo, a partir de práticas em ambiente
seguro e com supervisão, estimulada e orientada pelas conexões
sociais.

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2.4 Prática Psicodramática

Para novas aprendizagens dos relacionamentos interpessoais, o


treinamento da espontaneidade através do psicodrama é imprescindí-
vel. Ele cria um espaço para o desem-
penho espontâneo de papéis, possibi- A prática
litando desvendar as determinações psicodramática,
culturais de um grupo, suas redes assenta-se sobre
sociais e a tomada de consciência da o tripé: contextos,
situação e da condição de cada parti- instrumentos e
cipante em um determinado contexto etapas.
social.

Contextos é o encadeamento de vivências privadas e coletivas, de


sujeitos que se interrelacionam numa contingência espaço-temporal.
São eles:

Contexto Social
Meio social, realidade externa da qual fazem
parte os integrantes do grupo, onde vivem
seus dramas. São as aprendizagens coletivas
e seus significados, realizadas pela mediação
da cultura, que dão sentido à existência
humana;

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Contexto Grupal
Realidade do grupo que está reunido com suas
normas e características próprias. A história,
identidade e regras de “funcionamento” do grupo,
que matizam a participação nele;

Contexto Dramático
forjado no momento de clímax da ação principal
do grupo, reveladora de conteúdos da psique em
ação de cada integrante do grupo (inter-subjeti-
vidade) e do co-inconsciente coletivo (imaginário
do grupo).

São cinco os instrumentos necessários para que ocorra o


psicodrama: o cenário, o público, o diretor, o(s) ego(s) auxiliar(es)
e o protagonista:

Cenário: é construído de forma simbólica, num espaço


físico delimitado para que possibilite a incursão na cena
dramática e o retorno ao contexto grupal;

Público: são os participantes que não estejam atuando


diretamente na cena no momento, mas que podem ser
convocados a agir, dependendo da direção da cena;

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Diretor: é o que dirige (tal como diretor teatral) a cena,


seguindo o script (roteiro de atuação) fornecido pelo
socius-protagonista. Não existe um roteiro prévio. A
espontaneidade e a criatividade são as ferramentas
principais do diretor;

Ego-auxiliar: atua no papel complementar ao do “ego” do


socius-protagonista, atuando como ator-observador parti-
cipante; podem atuar vários egos-auxiliares, e ainda podem
ser recrutados entre o público;

Protagonista: é o ator principal do grupo, aquele que


“sintetiza” a ação dramática (ou a dor, a queixa, o sofrimento
mais proeminentes) do grupo, visto que não atua por ele
mesmo, mas no momento “encarna” a intersubjetividade do
grupo.

São três as etapas ou momentos do psicodrama:

Aquecimento:

Cria o clima de confiança, mobilizando as condições


necessárias para apreensão da verdade do grupo.
Pode subdividir-se em aquecimento inespecífico e
específico. Conjunto de procedimentos para criar o
clima afetivo-emocional do grupo na preparação da
ação. Suscita estado de espontaneidade, favorecendo
o desempenho espontâneo e criativo dos papéis;

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Dramatização ou Ação Dramática:

Ação principal que revela a estrutura das interações ou


tramas do grupo, produzindo a catarse de integração e,
desta forma, as alternativas possíveis de superação da
situação atual. Considerado o núcleo do psicodrama,
é o que o caracteriza. São as cenas vividas ou imagens
plásticas representadas pelo protagonista, o grupo. A
ação dramática é a força que parte de um ponto e dirige-
se a outro durante a representação;

Compartilhar ou Comentários:

O momento em que são compartilhadas as visões de


mundo, as emoções mobilizadas e os aprendizados
realizados. É o momento da decodificação dos con-
teúdos simbólicos do grupo. É o compartilhamento
das vivências, experiências, papéis, cenas que cada
um mobilizou e reatualizou em ressonância com o
que aconteceu no cenário dramático.

A ação dramática possibilita profundos insights do protagonista


e do grupo sobre os papéis assumidos. Para Moreno (1974), toda ação é
uma interação por meio de papéis. A terapia de Moreno em psicoterapia
de grupo dá importância máxima à espontaneidade. O aquecimento,
fase inicial de uma sessão psicodramática, visa levar a pessoa a agir
de forma espontânea, sem preconceitos ou limitações. As reservas
culturais trazidas pela educação e pelo ambiente permitem que alguém
se sinta mais seguro em usá-las do que viver no desconhecido e à mercê
da improvisação. Ele busca uma certeza que o empobreça como ser
humano.

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RESUMO

Neste módulo, caracterizamos melhor os segmentos do


psicodrama, considerando esta construção, como uma janela que se
abre para apontar as possibilidades de continuidade de pesquisa e de
reflexões.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, L. O trabalhador no mundo contemporâneo: psicodrama


nas Organizações. São Paulo: Ágora, 2004.

BARBARINI, Larissa Ramiro. O psicodrama socioeducacional:


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Universitário de Brasília, Brasília, 2009. Disponível em: https://
repositorio.uniceub.br/jspui/bitstream/123456789/2587/2/20312133.
pdf. Acesso em: 16 maio 2023.

COELHO, Acileide. Psicodrama: sociodinâmica, sociatria e sociometria,


a Socionomia de Moreno. 2021. Disponível em: http://www.crp23.org.
br/wp-content/uploads/2021/11/psicodrama.pdf. Acesso em: 16 maio
2023.

FEDERAÇÃO BRASILEIRA DE PSICODRAMA -FEBRAP. Psicodrama e


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febrap.org.br/psicodrama-sociodrama/. Acesso em: 16 maio 2023.

GONÇALVES, Camilla Salles; WOLFF, José Roberto; ALMEIDA, Wilson


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KAUFMAN, A. Teatro pedagógico: bastidores da iniciação médica. São


Paulo: Ágora, 1992.

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Módulo 1 - Psicodrama Pedagógico: nasce um método para a educação

LIMA, Liliana Aparecida de. Psicodrama e dinâmica de grupo: re-


criando possibilidades para o ensino de Psicologia na Universidade.
2000. Dissertação (Mestrado em Psicologia) - Universidade Estadual
de Campinas da Faculdade De Educação, Campinas, 2000.

MORENO, J. L. Fundamentos do psicodrama. São Paulo: Summus,


1983.

MORENO, J. L. Psicoterapia de Grupo e Psicodrama. São Paulo: Editora


Mestre Jou, 1974.

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VITALI, Conrado. Oficina de Psicodrama reúne alunos de Pedagogia


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WECHSLER, M. P. F.; MONTEIRO, R. F. Psicodrama público na


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