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RICARDO REIS

Características temáticas e formais


Referências biobibliográficas

• Nasceu em 1887, no Porto;


• Moreno, estatura um pouco abaixo da
média, era forte mas seco;
• Educado num colégio de jesuítas, foi
um exímio estudante de latim e
aprendeu grego sozinho.
• É um latinista e um semi-helenista;
• Formou-se em Medicina;
• Expatriou-se voluntariamente no
Brasil, por ser monárquico;
• Escreveu, sobretudo, odes.
Ricardo Reis: o poeta clássico

O heterónimo pessoano Ricardo Reis é um poeta


contemplativo que procura a serenidade, livre de afetos e
de tudo o que possa perturbar o seu espírito. É, também,
um estóico, apesar de, aparentemente, resignado. Há,no
seu pensamento, uma tensão, uma atitude de luta contra
tudo o que tira o desassossego. É uma atitude vital na
busca do entendimento da felicidade e da liberdade a que
tende o homem, obrigado a viver num meio social adverso.
Ricardo Reis: a consciência e a encenação da mortalidade

A palidez do dia é levemente dourada.


O sol de Inverno faz luzir como orvalho as curvas
Falo nestas coisas seguramente
Dos troncos de ramos secos. porque nasci acreditando nos
O frio leve treme. deuses, criei-me nesta crença, e,
querendo eles, nessa crença
Desterrando da pátria antiquíssima da minha
morrerei. Sei o que é o
Crença, consolando só por pensar nos deuses
Aqueço-me trémulo
sentimento pagão. Só me pesa
A outro sol que este. não poder explicar realmente o
quão absolutamente e
O sol que havia sobre o Parténon e a Acrópole incompreensivelmente diverso ele
O que alumiava os passos lentos e graves
é de todos os nossos
De Aristóteles falando.
Mas Epicuro melhor
sentimentos. Mesmo a nossa
calma, e o vago estoicismo que
Me fala, com a sua cariciosa voz terrestre entre nós alguns têm, não são
Tendo para os deuses uma atitude também de deus, coisas que se parecem com a
Sereno e vendo a vida
calma antiga e estoicismo grego.
À distância a que está.
Ricardo Reis, Odes.
Ricardo Reis: o fingimento artístico

O Dr. Ricardo Reis nasce dentro da minha alma no dia


29 de Janeiro de 1914, pelas 11 horas da noite. Eu estivera
ouvindo no dia anterior uma discussão extensa sobre
excessos, especialmente da realização, da arte moderna.
Segundo o meu processo de sentir as coisas sem as sentir,
fui-me deixando ir na onda dessa reacção momentânea.
Quando reparei em que estava pensando, vi que tinha
erguido uma teoria neoclássica, e que a ia desenvolvendo.

Fernando Pessoa
Estoicismo

O estoicismo é uma corrente filosófica que considera


ser possível encontrar a felicidade desde que se viva em
conformidade com as leis do destino que regem o mundo,
permanecendo indiferente aos males e às paixões, que são
perturbações da razão. O ideal estóico é a apatia, que se
define como ausência de paixão e permite a liberdade,
mesmo sendo escravo.
Epicurismo

O epicurismo consiste na filosofia moral de Epicuro


(341-270 a.C.), que defendia o prazer como caminho da
felicidade. Mas, para que a satisfação dos desejos seja
estável, é necessário um estado de ataraxia, ou seja, de
tranquilidade e sem qualquer perturbação. O poeta
romano Horácio seguiu de perto este pensamento da
defesa do prazer do momento, ao considerar o carpe diem
como necessário à felicidade.
Ricardo Reis: reflexão existencial

Ricardo Reis propõe uma filosofia moral de acordo com os


princípios do epicurismo e de uma filosofia estoica:

o Carpe diem (aproveita o dia), ou seja, aproveitar a vida em cada dia,


como caminho da felicidade;
o Buscar a felicidade com tranquilidade (ataraxia);
o Não ceder ao impulso dos instintos (estoicismo);
o Procurar a calma ou, pelo menos, a sua ilusão;
o Seguir o ideal ético da apatia que permite a ausência da paixão e da
liberdade (sobre esta apenas pesa o Fado).
Neopaganismo

• crença nos deuses


• crença na civilização da Grécia
• sente-se um “estrangeiro” fora da sua pátria, a Grécia

No Prefácio a Odes, diz: “nasci acreditando nos deuses,


criei-me nessa crença, e, querendo eles, nessa crença
morrerei. Sei o que é sentimento pagão. Só me pesa não
poder explicar realmente o quão absolutamente e
incompreensivelmente diverso ele é de todos os nossos
sentimentos. Mesmo a nossa calma, e o vago estoicismo
que entre nós alguns têm, não são coisas que parecem com
a calma antiga e o estoicismo grego.”
Ricardo Reis: reflexão existencial

Só esta liberdade nos concedem Aceita o destino com naturalidade,


Os deuses: submetermo-nos considerando que os deuses estão acima do
Ao seu domínio por vontade nossa. homem por uma questão de grau, mas que
Mais vale assim fazermos acima dos deuses, no sistema pagão, se
Porque só na ilusão da liberdade encontra o Fado, que tudo submete.
A liberdade existe.
Ricardo Reis procura alcançar a quietude e
a perfeição dos deuses, desenhando um novo
Nem outro jeito os deuses, sobre quem mundo à sua medida, que se encontra por
O eterno fado pesa, detrás das aparências. Os deuses são uma
Usam para seu calmo e possuído metáfora do mundo. Indiferentes, mas
Convencimento antigo omnipresentes, confundem-se connosco sempre
De que é divina e livre a sua vida.
que os imitamos. Não são mais do que homens
mais perfeitos ou aperfeiçoados. “Só esta
liberdade nos concedem/ Os deuses:
Nós, imitando os deuses,
submetermo-nos/ Ao seu domínio por vontade
Tão pouco livres como eles no Olimpo, nossa”.
Como quem pela areia Pagão por caráter, que resulta da
Ergue castelos para encher os olhos, acumulação de experiências e da sua formação
Ergamos nossa vida helénica e latina, há, nos seus poemas, uma
E os deuses saberão agradecer-nos postura ética e um constante diálogo entre o
O sermos tão como eles. passado e o presente, escrevendo odes
inspiradas nas doutrinas epicuristas de Horácio.
Caraterísticas Temáticas

• Epicurismo: busca de uma felicidade • O elogio da vida rústica (a aurea medocritas


relativa, sem desprazer ou dor, através de de Horácio): a felicidade só é possível no
um estado de ataraxia, isto é, uma certa sossego do campo (comparável a Caeiro).
tranquilidade ou indiferença capaz de
evitar a perturbação. • O gozo do momento que passa, o carpe diem
horaciano.

• Estoicismo: crença de que a felicidade só é • A tentativa de iludir o sofrimento resultante


possível se atingirmos a apatia, isto é, a da consciência aguda da precariedade da vida,
aceitação das leis do Destino e a indiferença do fluir contínuo do tempo e da fatalidade da
face às paixões e aos males. morte, através do sorriso, do vinho e das flores.
• A intelectualização das emoções.
• Paganismo: crença nos deuses. • A intemporalidade das suas preocupações: a
• A passagem inelutável do tempo. angústia do homem perante a brevidade da
vida e a inevitabilidade da Morte que leva a
• A precariedade da vida e a fatalidade da uma interminável busca de estratégias de
Morte. limitação do sofrimento que caracteriza a vida
humana.
• A moderação dos desejos e dos prazeres .
• O autodomínio e a contenção dos
• O culto do Belo, como forma de superar a sentimentos.
transitoriedade da vida e dos bens terrenos.
• A quase ausência de erotismo, de amor
• As ameaças do Fatum (entidade autêntico (em contraste com Horácio)
implacável que oprime deuses e homens),
da Velhice e da Morte.
Características Estilísticas

• Submissão da expressão ao conteúdo, às • A preferência pela ode (influência de


ideias. Horácio), com estrofes regulares em verso
decassilábico, alternando ou não com
• A complexidade da sintaxe alatinada hexassílabo.
(influência de Horácio):
- a anteposição do complemento direto ao
verbo (“As rosas amo…”). • Uso frequente do gerúndio.
- a inesperada ordem das palavras que nos
obriga a uma leitura silabada.
• Seleção cuidada de fonemas ou vocábulos
• O uso de latinismos: atro, ledo, infero, sugestivos das ideias que pretende exprimir (a
inscientes, volucres, vila, etc. elevação, a nobreza, o classicismo da
• A frequência da inversão (anástrofe e linguagem poética)
hipérbato) e da elipse.
• As perífrases que remetem para um • Verso branco ou solto, recorrendo, com
contexto religioso e mitológico grego ou frequência à assonância, à aliteração e à rima
latino. (Ex. “Antes que Apolo deixe / O seu interior.
curso visível”)
• Estilo denso e rigorosamente elaborado. • Uso frequente do imperativo e do presente
do conjuntivo com sentido de imperativo (de
acordo com a feição moralista das odes).
RICARDO REIS
Características temáticas e formais

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