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SIMBOLISMO

• Leitura de Autores Modernos - PUCRS


• 2013/I - Profa Ana Lisboa de Mello
Romantismo, Simbolismo e depois Surrealismo foram
os bastiões da resistência dos valores do imaginário no
seio do reino triunfante do cientificismo racionalista. É
no coração desses movimentos que se estabelece
progressivamente uma reavaliação positiva do sonho,
do devaneio, até da alucinação, [...] cujo resultado foi,
segundo Henri Ellenberger, “a descoberta do
inconsciente”. (Gilbert DURAND)

“O sonho é uma segunda vida. Não pude atravessar, sem


estremecer, essas portas de marfim ou de chifre que nos
separam do mundo invisível. Os primeiros instantes do
sono são a imagem da morte; um torpor nebuloso se apodera
de nosso pensamento e não podemos determinar o instante
preciso onde o eu, sob uma outra forma, continua a obra da
existência” . In: Aurélia de Gérard de Nérval,
AS DUAS PORTAS
“Disse a sensata Penélope: Meu hóspede, os
sonhos são de difícil interpretação, de sentido
obscuro; e nem tudo quanto anunciam se
realizam. Existem duas portas por ondem nos
vêm os sonhos instáveis: uma de chifre e outra
de marfim. Os que vêm pela porta de marfim
serrado enganam-nos com vâs esperanças e
palavras ocas; mas os que passam pela de
chifre polido, esses anunciam ao mortal que os
vir coisas que hão de realizar-se.”

Homero. Rapsódia XIX. In: Odisseia. Trad. E. Dias Palmeira e M. Alves Correia.
Lisboa: Sá da Costa, 1972. p. 286
“Os românticos se haviam tornado
agudamente cônscios de aspectos de sua
própria experiência que de modo algum
poderiam ser analisados ou explicados
pela teoria de um mundo regido por
mecanismo de relojoaria. O universo não
era uma máquina, afinal de contas, mas
algo muito mais misterioso e menos
racional.”
WILSON, Edmund. O castelo de Axel (estudo sobre a literatura imaginativa de 1870 a
1930). São Paulo: Cultrix, 1987. p. 10.
As fontes esotéricas e ocultas do
Romantismo e do Simbolismo
Esoterismo e ocultismo
Na segunda metade do século XIX, os termos
esoterismo e ocultismo começarão a ser
empregados correntemente, no momento em que
se tenta uma síntese das grandes tradições
secretas, em que se tenta definir uma doutrina a
partir de grandes tradições secretas. O termo
“ocultismo”, na língua francesa, surge pela
primeira vez na obra de Eliphas Levi. Segundo
Robert Amadou: “O ocultismo é o conjunto de
doutrinas e práticas fundadas na teoria das
correspondências”
In: Amadou, apud MERCIER, Alain. Les sources ésotériques et occultes de
la poésie symboliste (1870-1914). Paris: Nizet, 1969, v. I, p. 13
Esoterismo: evoca a idéia de
“segredo”, de “disciplina do arcano”,
de conhecimentos reservados. Trata-
se de um tipo de conhecimento
espiritual a ser alcançado por vias e
técnicas apropriadas, segundo
diversas escolas e correntes. São
vias que conduzem ao espaço
espiritual buscado como ao próprio
espaço alcançado. Implica um
processo de interiorização.
Elementos fundamentais do esoterismo no Ocidente
1. Correspondências: existiriam correspondências simbólicas
e reais entre todas as partes do universo visível e invisível. É
antiga a ideia de microcosmo e macrocosmo. Essas
correspondências são mais ou menos veladas para o
primeiro olhar, portanto precisam ser decifradas.

2. Natureza viva: O cosmos é complexo, plural,


hierarquizado, como se vê na ideia de correspondência. A
palavra magia, tão importante no imaginário da Renascença,
evoca bem essa ideia de Natureza vista, conhecida,
experimentada como essencialmente vívida e seguidamente
habitada por uma luz ou um fogo escondido que circula
através dela. Magia é, ao mesmo tempo, o conhecimento das
redes de simpatias e antipatias que unem as coisas da
Natureza, e o trabalho concreto com esses conhecimentos
(talimãs, pedras, plantas...).
Filósofos da Natureza na época romântica
A Naturphilosophie dos filósofos românticos alemães toma a forma
de um esoterismo:
-Uma concepção da Natureza como um texto a decifrar com auxílio das
correspondências. Ela é plena de implicações simbólicas; suas
significações residem fora dela mesma; a ciência rigorosa é somente um
ponto de partida na direção à totalizante captura de processos invisíveis,
ou seja, uma “natureza naturante”.
- Os filósofos da Natureza são mais ou menos especializados (químicos,
físicos...) mas com pensamento que se eleva a ecléticas sínteses e se
esforça por abraçar, na sua complexidade, um mundo polimorfo feito de
diferentes graus da realidade.
-A identidade do Espírito e da Natureza, considerados como dois germes
de uma raiz comum (matéria e natureza repousam sobre um princípio
espiritual, um Espírito os habita).

Filósofos alemães: Carl von Eschenmayer (1770-1852); Friedrich von Hardenberg


(conhecido por Novalis, 1772-1801); John Wilhelm Ritter (1776-1810); G.H. Shubert
(1780-1860); Carl Gustav Carus (1789-1869).
Hinos à noite
“De entre os seres vivos que têm o dom da sensibilidade haverá
algum que não ame , mas do que todas as aparições feéricas do
extenso espaço que o rodeia, a luz, em que tudo rejubila as suas
cores, os seus raios, as suas vagas; e a suave onipresença do
seu dia que desponta? Como se fora a alma mais íntima da vida,
respira-a o gigantesco orbe de astros sem repouso, que flutua
dançando no seu fluxo azul – respira-a a pedra faiscante, em
sempiterna paz, as plantas sugadoras e meditativas, e os
animais selvagens e ardentes, de tão várias figuras - todavia
mais do que todos, respira-a o excelso Estrangeiro, de olhar
pensativo, passos incertos, lábios docemente apertados e
repletos de harmonias. Como um rei da terrestre Natureza, ela
convoca todas as potências para inúmeras transformações,
prende e desprende perenes vínculos e envolve todos os seres
terrenos na sua celeste imagem. Somente pela sua presença
desvela toda a maravilha dos impérios do mundo.”
Novalis. Hinos à Noite. Lisboa: Assírio & Alvim, 1998. p. 17
: Sobre os poetas da geração de simbolistas de1880:

“Esses jovens não reconheciam mais sua maneira de sentir


nos livros dos parnasianos e naturalistas (...) Sentiam-se
exasperados com a clareza de uma língua que acabava por
ver tudo do ponto de vista demasiadamente cru, com
graças estereotipadas de uma prosódia que cedia a todos
como uma cortesã. Aspiravam à sombra, ao mistério, à
obscuridade; sonhavam com uma outra prosódia, mais
desajeitada mas mais ingênua. Queriam versos que
conservassem dos antigos versos somente a alma sutil e
delicadamente sonora, versos quase imateriais e que se
assemelhassem a mágicos encantamentos, uma espécie de
música abstrata, que não mais se dirigisse ao ouvido mas
diretamente ao espírito e capaz de resolver, com simples
alusões, todo um mundo de emoções e de pensamentos.“
POIZAT
Para os simbolistas, o símbolo é inseparável
do mistério:
“Nomear um objeto é suprimir três quartas
partes da fruição do poema que é feita da
felicidade de adivinhar pouco a pouco;
sugeri-lo, eis o sonho. É o perfeito uso deste
mistério que constitui o símbolo: evocar
pouco a pouco um objeto para mostrar um
estado de alma, ou, inversamente, escolher
um objeto e dele abstrair um estado de
alma, por uma série de deciframentos.”
Mallarmé
O símbolo não tem a função de
“impedir” uma idéia de chegar à
consciência clara, mas resulta muito
mais da impossibilidade da consciência
semiológica, do signo, em exprimir a
parte da felicidade ou da angústia que
a consciência total sente face à
inelutável instância da temporalidade.
Gilbert Durand in: A imaginação simbólica
Charles Baudelaire (1821-1867)
• Principais obras
- A arte romântica - 1852
- As flores do mal - 1857
- Os Paraísos Artificiais – 1860
- Reflexões sobre alguns de meus
contemporâneos - 1861
- Pequenos poemas em prosa ou Spleen de
Paris - 1862
- Meu coração desnudado - 1864
As Flores do Mal (1857)
Capítulos:
Ao leitor (1 poema)

Spleen e ideal (85 poemas)

Quadros parisienses (

O vinho

Flores do Mal

Revolta

A morte

Poemas acrescentados a Flores do (1821-1867)


Mal na edição póstuma
Albatroz
Às vezes, por folgar, os homens da equipagem
Pegam de um albatroz, enorme ave do mar,
Que segue - companheiro indolente de viagem –
O navio no abismo amargo a deslizar.

E por sobre o convés, mal estendido apenas,


o imperador do azul, canhestro e envergonhado,
asas que enchem de dó, grandes e alvas penas,
eis que deixa de arrastar como remos ao lado.

O alado viajor tomba como num limbo!


Hoje é cômico e feio, ontem tanto agradava!
Um ao seu bico leva o irritante cachimbo,
Outro imita a coxear o enfermo que voava!

O poeta é semelhante ao príncipe do céu


Que do arqueiro se ri e da tormenta no ar;
Exilado na terra e em meio do escarcéu,
As asas de gigante impedem-no de andar!
I Spleen e Ideal
Correspondência
Tradução de Jamil Almansur Haddad
A natureza é um templo onde vivos pilares
Podem deixam ouvir confusas vozes: e estas
Fazem o homem passar através de florestas
De símbolos que o vêem com olhos familiares.

Como os ecos lentos além confundem seus rumores


Na mais profunda e mais tenebrosa unidade,
Tão vasta como a noite e como a claridade,
Harmonizam-se os sons, os perfumes e as cores.

Perfumes frescos há como carnes de crianças


Ou oboés de doçura ou verdejantes ermos
E outros ricos, triunfais e podres na fragrância

Que possuem a expansão do universo sem termos


Como o sândalo, o almíscar, o benjoim e o incenso
Que cantam dos sentidos o transporte imenso.

Spleen e Ideal
PAISAGEM
Quero, para compor os meus castos monólogos,
Deitar-me junto ao céu, à moda dos astrólogos
E bem perto do sino ouvir-lhe cismarento
As solenes canções, levadas pelo vento.
As mãos postas no queixo, eu do alto da mansarda,
Hei de ver a oficina a cantar na hora parda:
Torres e chaminés ou mastros da cidade,
Grandes céus a fazer sonhar a eternidade.

É sempre doce ver que à tarde a bruma vela


A estrela pelo azul e a lâmpada à janela,
Os rios de carvão irem ao firmamento,
E a lua derramar seu frouxo encantamento;
Eu hei de ver a primavera, o outono e o estio;
E quando o inverno vier, monótono frio,
Por tudo fecharei cortinas e portões
Para construir na noite as feéricas mansões.
[...]
Quadros Parisienses
A uma passante

A rua em torno era um frenético alarido.


Toda de luto, alta e sutil, dor majestosa,
Uma mulher passou, com sua mão suntuosa
Erguendo e sacudindo a barra do vestido.

Pernas de estátua, era-lhe a imagem nobre e fina.


Qual bizarro basbaque, afoito eu lhe bebia
No olhar, céu lívido onde aflora a ventania,
A doçura que envolve e o prazer que assassina.

Que luz… e a noite após! – Efêmera beldade


Cujos olhos me fazem nascer outra vez,
Não mais hei de te ver senão na eternidade?

Longe daqui! tarde demais! Nunca talvez!


Pois de ti já me fui, de mim tu já fugiste,
Tu que eu teria amado, ó tu que bem o viste!

Quadros Parisienses Tradução de Ivan Junqueira.


O vinho dos trapeiros
Tradução de Ivo Barroso
Muitas vezes, à luz de um lampião sonolento,
da qual a chama e o vidro estalam sob o vento,
Num antigo arrabalde, informe labirinto,
Onde fervilha o povo anônimo e indistinto,

Vê-se um trapeiro cambaleante,a fronte inquieta,


rente às paredes a esgueira-se como um poeta,
e alheio aos guardas e aos alcagüetes mais abjetos,
abrir seu coração em gloriosos projetos.

Juramentos profere e dita leis sublimes,


Derruba os maus, perdoa as vítimas dos crimes,
E sob o azul do céu, como um dossel suspenso,
embriaga-se na luz de seu talento imenso.

Toda essa gente afeita às aflições caseiras,


Derreada pela idade e farta de canseiras,
Trôpega e curva ao peso atroz do asco infinito
Vômito escuro de um Paris enorme e aflito, ....
Retorna, a trescalar do vinho as escorralhas,
junto aos comparsas fatigados das batalhas,
os bigodes lembrando insígnias espectrais.
Os estandartes, os pendões e arcos triunfais

Erguem-se ante essa gente, ó solene magia!


E na ensurdecedora e luminosa orgia
Dos gritos, dos clarins, do sol e do tambor,
trazem eles a glória ao povo ébrio de amor!

Assim é que através da ingênua raça humana


o vinho, esplêndido Pactolo*, do ouro emana;
Pela garganta do homem canta eleos seus feitos
E reina por seus dons tal como os reis perfeitos.

E para o ódio afogar e o ócio ir entretendo


Desses malditos que em silêncio vão morrendo,
Em seu remorso Deus o sono havia criado;
O Homem o Vinho fez, do Sol filho sagrado!
* Em grego Paktolós, pequeno rio da Lídia, célebre por suas pepitas de ouro
O vinho do solitário
Tradução de Ivan Junqueira

O misterioso olhar de uma mulher galante,


Pousado sobre nós como um pálido raio
Que a lua envia ao lago em trêmulo desmaio,
Quando ali quer banhar sua beleza ondeante;

A derradeira moeda à mão de um jogador;


Um beijo libertino da esguia Adelina;
Os sons ociosas de uma música ferina,
Que lembra ao longe a humana súplica da dor;

Isso tudo não vale, ó garrafa profunda


O bálsamo que aflora em teu ventre e fecunda
O coração do poeta em júbilo antes os céus;

Tu lhe dás a esperança, a juventude, a vida


- E o orgulho, essa riqueza aos pobres concedida,
Que os torna heróicos e mais próximos de Deus!
O vinho
A Alma do Vinho
tradução Ivan Junqueira
A alma do vinho, certa tarde, nas garrafas
cantava: "Homem, elevo a ti, que me és tão caro,
No cárcere de vidro e lacre em que me abafas,
Um cântico de luz e de fraterno amparo!
Bem sei quanto custou, na tórrida montanha,
De causticante sol, de suor e de mau trato,
Para forjar-me a vida e enfim a alma ter ganha.
Mas eu não serei jamais perverso nem ingrato,
Pois sinto uma alegria imensa quando desço
Pela goela de quem ao trabalho se entrega,
E seu tépido peito é a tumba onde me aqueço
E onde me agrada mais estar do que na adega.
Não ouves os refrões da domingueira toada
E a esperança que me unge o seio palpitante?
Cotovelos na mesa e manga arregaçada,
Tu me honrarás e o riso há de ser constante;
• Hei de acender-te o olhar à esposa embevecida;
A teu filho farei voltar a força e as cores,
E serei para tão tíbio atleta da vida
O óleo que os músculos enrija aos lutadores.
• Repousarei em ti, vegetal ambrosia,
Grão atirado pelo eterno Semeador,
Para que assim de nosso amor nasça a poesia
Que até Deus subirá como uma rara flor!"
O vinho do solitário
Tradução de Ivan Junqueira

O misterioso olhar de uma mulher galante,


Pousado sobre nós como um pálido raio
Que a lua envia ao lago em trêmulo desmaio,
Quando ali quer banhar sua beleza ondeante;

A derradeira moeda à mão de um jogador;


Um beijo libertino da esguia Adelina;
Os sons ociosas de uma música ferina,
Que lembra ao longe a humana súplica da dor;

Isso tudo não vale, ó garrafa profunda


O bálsamo que aflora em teu ventre e fecunda
O coração do poeta em júbilo antes os céus;

Tu lhe dás a esperança, a juventude, a vida


- E o orgulho, essa riqueza aos pobres concedida,
Que os torna heróicos e mais próximos de Deus!
O vinho dos amantes
Tradução de Ivan Junqueira

O espaço hoje esplende de vida!


Livres de esporas, freio ou brida,
Cavalguemos no vinho: adiante
Se abre um céu puro e fulgurante!
Como dois anjos que tortura
Uma implacável calentura,
No límpido azul da paisagem
Sigamos a fugaz miragem!
Embalados no íntimo anelo
De um lúcido e febril afã,
Qual num delírio paralelo,
Lado a lado nadando, irmã,
Chegaremos enfim, risonhos,
Ao paraíso de meus sonhos!
Parece-me por vezes que ouço dizer o vinho:

“Homem, meu bem-amado, quero lançar para ti, apesar


da minha prisão de vidro e dos meus ferrolhos de
cortiça, um canto cheio de fraternidade, um canto
cheio de alegria e de esperança. (...)
Cairei no fundo de teu peito como uma ambrosia
vegetal. Serei o grão que fertiliza o sulco
dolorosamente lavrado. A nossa íntima reunião criará
a poesia. Nós dois faremos um Deus, e voaremos para
o infinito, como os pássaros, as borboletas, os fios da
Virgem, os perfumes e todas as coisas aladas”.

In: Baudelaire. Os paraísos artificiais


Embriagai-vos
Tradução de Ivo Barroso
É necessário estar sempre bêbedo. Tudo se reduz a isso; eis o
único problema. Para não sentires o fardo horrível do Tempo,
que vos abate e vos faz pender para a terra, é preciso que vos
embriagueis sem cessar. Mas - de quê? De vinho, de poesia ou
de virtude, como achardes melhor. Contanto que vos
embriagueis.
E, se algumas vezes, nos degraus de um palácio, na verde relva
de um fosso, na desolada solidão de vosso quarto, despertardes,
com a embriaguês já atenuada ou desaparecida, perguntai ao
vento, à vaga, à estrela, ao pássaro, ao relógio, a tudo o que
foge, a tudo o que geme, a tudo o que rola, a tudo o que canta, a
tudo o que fala, perguntai-lhes que horas são; e o vento, e a
vaga, e a estrela, e o pássaro, e o relógio, hão de vos responder:
- É a hora de embriagar-se! Para não serdes os martirizados
escravos do Tempo, embriagai-vos; embriagai-vos sem tréguas!
De vinho, de poesia ou de virtude, como achardes melhor.
Enivrez-vous!
  Il faut être toujours ivre. Tout est là: c’est l’unique question.
Pour ne pas sentir l’horrible fardeau du Temps qui brise vos
épaules et vous penche vers la terre, il faut vous enivrer sans
trêve.
Mais de quoi? De vin, de poésie ou de vertu, à votre guise. Mais
enivrez-vous.
Et si quelque fois, sur les marches d’un palais, sur l’herbe verte
d’un fossé, dans la solitude morne de votre chambre, vous vous
réveillez, l’ivresse déjà diminuée ou disparue, demandez au
vent, à la vague, à l’étoile, l’oiseau, l’horloge, à tout ce qui fuit,
tout ce qui gémit, à tout ce qui roule, à tout ce qui chante, à tout
ce qui parle, demandez quelle heure il est; et le vent, la vague,
l’étoile, l’oiseau, l’ horloge, vous réprondront: ‘Il est heure de
s’énivrer! Pour n’être pas les esclaves martyrisés du Temps,
enivrez-vous sans cesse! De vin, de poésie ou de vertu, à votre
guise.”
BAUDELAIRE, Charles. « Le spleen de Paris »
Stéphane Mallarmé (1842-1898)
Obras Principais:
•L’Après-midi d’un faune, 1876
•Le Vathek de Bekford, 1876
•Les Dieux antiques, 1879;
•Album de vers et de prose, 1887 ;
•Divagações, 1897;
•Un coup de dés jamais n’abolira le hasard, 1897 ;
•Poésies, 1899;
•Vers de circonstance, 1920;
•Igitur, 1925;
•Contos Indianos, 1927
O Acaso
Cai 
a pluma 
rítmico suspense do sinistro 
nas espumas primordiais 
de onde há pouco
sobressaltara seu delírio a
um cimo fenescido 
pela neutralidade idêntica do
abismo
Stéphane Mallarmé
“Temida e famosa é a obscuridade de
sua lírica. Esta deve ser decifrada a partir
de uma linguagem que só é escrita por
este autor. E, contudo, evidencia-se que
também a lírica de Mallarmé pertence a
uma estrutura poética cujas articulações
isoladas têm sua origem no Romantismo
e que foi se definindo cada vez mais a
partir de Baudelaire.” Hugo Friedrich
Brisa marinha
S.Mallarmé
A carne é triste, sim, e eu li todos os livros.
Fugir! Fugir! Sinto que os pássaros são livres,
Ébrios de se entregar à espuma e aos céus imensos.
Nada, nem os jardins dentro do olhar suspensos,
Impede o coração de submergir no mar
Ó noites! Nem a luz deserta a iluminar
Este papel vazio com seu branco anseio,
Nem a jovem mulher que preme o filho ao seio.
Eu partirei! Vapor a balouçar nas vagas,
Ergue a âncora em prol das mais estranhas plagas!

Um Tédio, desolado por cruéis silêncios,


Ainda crê no derradeiro adeus dos lenços!
E é possível que os mastros, entre as ondas más,
Rompam-se ao vento sobre os náufragos,
sem mastros, sem mastros, nem ilhas férteis,a vogar...
Mas, ó meu peito, ouve a canção que vem do mar!
Em Mallarmé, podemos constatar:
- ausência de uma lírica do sentimento e da inspiração;
- fantasia guiada pelo intelecto;
- aniquilamento da realidade e das ordens normais, tanto
lógicas como afetivas;
- manejo das forças impulsivas da língua;
- sugestionabilidade em vez de compreensibilidade;
- ruptura com a tradição humanística e cristã;
- isolamento que tem consciência de ser distinção;
- nivelamento do ato de poetar com a reflexão sobre a
composição poética, predominando nesta as categorias
negativas ( desorientação, dissolução, incoerência,
fragmentação, estranhamento, obscuridade...)
Arthur Rimbaub (1854-1891)

• Poesias (1863-1869)
• Uma temporada no Inferno
(1873)
• Iluminações (1874)
O poeta vidente
Arthur Rimbaud (1854-1891)
“O Poeta se faz vidente através de um longo, imenso e
racional desregramento de todos os sentidos. Todas
as formas de amor, de sofrimento, de loucura; ele
procura a si próprio, extrai de si todos os venenos
para guardar apenas as quintessências. Inefável
tortura, contra a qual necessita de toda a fé, de toda a
força sobre-humana, através da qual se torna, dentre
todos, o grande enfermo, o grande criminoso, o
grande maldito – e o supremo Sábio – Pois atinge o
Desconhecido! Pois cultivou a alma, já rica, mais do
que ninguém!. Atinge o incógnito e, quando,
enlouquecido, acabar perdendo a inteligência de suas
visões, já as terá visto! ”
Vogais
Arthur Rimbaud

A negro, E branco, I vermelho, U verde, O azul: vogais


Eu falarei um dia de suas florescências latentes:
A, negro espartilho veludo das moscas ruidosas
Que voltejam ao redor dos maus cheiros cruéis.

Golfos de sombra; E, canduras dos vapores e das tendas,


Lanças das geleiras orgulhosas, reis brancos, arrepios de
umbelas;
I, púrpuras, sangue cuspido, riso de lábios belos
Em cóleras ou bebedeiras penitentes;
U, ciclos, vibrações divinas dos mares viridentes,
Paz dos pastos semeados de animais, paz das rugas
Que a alquimia imprime às grandes frontes eruditas;

O, supremo Clarão, pleno de insólitas estridências,


Silêncios atravessados dos Mundos e dos Anjos
- O, Ômega, raio violeta de Seus Olhos!
(1871)
Para Hauser, “o simbolismo representa, por
um lado, o resultado final da evolução
iniciada pelo romantismo, isto é, pela
descoberta da metáfora, célula germinal da
poesia e que conduziu à riqueza da
imaginária impressionista; mas não só
repudia o impressionismo pelo seu ponto de
vista materialista e o Parnaso pelo seu
formalismo e racionalismo, como repudia o
romantismo pelo seu emocionalismo e
convencionalismo da linguagem metafórica.
Na realidade, “o simbolismo pode considerar-se a
reação contra toda a poesia anterior, descobre
alguma coisa que ou nunca se conhecera ou que
nunca até então se dera relevo: a poésie pure – a
poesia que surge do espírito irracional, não-
conceptual, da linguagem, que é contrária a toda
interpretação lógica. Para o simbolismo, a poesia é
apenas a expressão daquelas relações e
correspondências que a linguagem , deixada a si
própria, cria entre o concreto e o abstrato, o
material e o ideal, e entre as diferentes esferas
dos sentidos” – Hauser
Bibliografia
BAUDELAIRE, Charles. Os paraísos artificiais. trad. de José
Saramago. Rio de Janeiro: Ediouro, 2005.
____. Os paraísos artificiais. Trad. de Alexandre Ribondi, Vera
Nóbrega; Lúcia Nagib. Porto Alegre:L&PM, 1982.
____. O poema do Haxixe. Trad.Eduardo Brandão. São Paulo:
Aquariana, 2003.
____. Poesia e prosa. Trad. de Ivo Barroso. Rio de Janeiro: Nova
Aguilar, 1995
____. As flores do mal. Trad. de Ivan Junqueira. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira, 1985
____. As flores do mal. Trad. Jamil A. Haddad. São Paulo: Círculo
do Livro, 1995.
DURAND, Gilbert. A imaginação simbólica. Lisboa: Ed. &0, 1993
GOMES, Álvaro Cardoso. (org.) A estética simbolista. SP: Cultrix,
1985.
FRIEDRICH, Hugo. Estrutura da lírica moderna. São Paulo:
Duas Cidades, 1978.
HAMBURGER, Käte. A lógica da criação literária. SP:
Perspectiva, 1975.
HAUSER, Arnold. História social da literatura e da arte. SP:
Mestre Jou, 1982.
MERCIER, Alain. Les sources ésotériques et occultes de la
poésie symboliste (1870-1914). Paris: Nizet, 1969
NERVAL, Gérard. Aurélia. SP: Iluminuras, 1991.
NOVALIS. Hinos à noite. Lisboa: Assírio & Alvim, 1998.
RAYMOND, Marcel. De Baudelaire ao surrealismo. SP:EDUSP,
1997.
SOURIAU, Etienne. Vocabulaire estétique. Paris: PUF, 1990.
WILSON, Edmund. O castelo de Axel (estudo sobre a literatura
imaginativa de 1870 a 1930). São Paulo: Cultrix, 1987.

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