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ARTIGO DE OPINIÃO

Professora Lucileine Cucuclo 2019


DEFINIÇÃO
É um tipo de texto dissertativo-argumentativo onde o autor tem a
finalidade de apresentar determinado tema e seu ponto de vista, e
por isso recebe esse nome.
Possui as características de um texto jornalístico e tem como
principal objetivo informar e persuadir o leitor sobre um assunto.
Assim, a argumentação é o principal recurso retórico utilizado nos
artigos de opinião, que surgem sobretudo, nos textos disseminados
pelos meios de comunicação, seja na televisão, rádio, jornais ou
revistas.
O artigo de opinião é um dos gêneros mais comuns
no cotidiano das cidades. Publicado normalmente em jornais,
revistas e blogs, esse tipo de texto tem como função apresentar e
defender um ponto de vista sobre algum assunto relevante para
a sociedade. Muitas faculdades e universidades costumam
solicitar aos seus candidatos que produzam artigos de opinião em
seus vestibulares.
• O artigo de opinião é um gênero argumentativo, ou seja, é um tipo de
texto que defende um ponto de vista por meio de argumentos. A
linguagem usada no artigo de opinião costuma alinhar-se à norma-
padrão da língua portuguesa, haja vista que o texto deve ser
compreendido por diversos tipos de pessoas, muitas vezes de regiões
completamente distintas — como é o caso dos artigos publicados em
jornais de alcance nacional no Brasil.
• Para além disso, justamente por se tratar de uma publicação da
imprensa, o assunto abordado nesse tipo de texto costuma ser
de relevância coletiva: fatos importantes, ocorridos nos dias ou
semanas anteriores, costumam ser os temas do artigo de opinião.
Nesse sentido, o gênero tem uma função social clara: promover
o debate público sobre as demandas da sociedade.
ESTRUTURA:
Por ser um texto argumentativo, o artigo de opinião
apresenta três partes fundamentais:
INTRODUÇÃO:
Os parágrafos iniciais de um artigo de opinião costumam ser reservados
para apresentar o assunto abordado e, além disso, o ponto de vista
defendido pelo autor. Chamamos esse ponto de vista de tese. No caso
das redações escolares e propostas de vestibulares, é comum que
somente o primeiro parágrafo da composição seja destinado para essa
função, pois, nesse tipo de produção textual, o número de
linhas é restrito.
DESENVOLVIMENTO
• Uma vez que a tese é apresentada na introdução do artigo de opinião,
é esperado que, nos parágrafos intermediários — também chamados
de desenvolvimento —, apresentem-se argumentos que comprovem
o ponto de vista.
CONCLUSÃO
A conclusão de um artigo de opinião costuma apresentar uma síntese
do desenvolvimento do texto e, em seguida, reiterar a tese, agora
comprovada pelos argumentos.
COMO COMEÇAR ...
A melhor maneira de começar um artigo de opinião é, antes de tudo,
desenvolvendo um planejamento e um projeto de texto. Planejando e
projetando antes de escrever, é muito provável que a composição
resulte-se clara, coerente e bem fundamentada. Veja, no próximo
tópico, um passo a passo de como escrever o artigo de opinião.
PROJETO PARA O TEXTO
• Tema;
• Tese;
• Fundamentos da argumentação;
Organização lógica do texto
EM OUTRAS PALAVRAS...
• O artigo de opinião, como o próprio nome já diz, é um texto em que o
autor expõe seu posicionamento diante de algum tema atual e de
interesse de muitos.

É um texto dissertativo que apresenta argumentos sobre o assunto


abordado, portanto, o escritor além de expor seu ponto de vista, deve
sustentá-lo através de informações coerentes e admissíveis.
• Logo, as ideias defendidas no artigo de opinião são de total responsabilidade
do autor, e, por este motivo, o mesmo deve ter cuidado com a veracidade
dos elementos apresentados, além de assinar o texto no final.

Contudo, em vestibulares, a assinatura é desnecessária, uma vez que pode


identificar a autoria e desclassificar o candidato.

É muito comum artigos de opinião em jornais e revistas. Portanto, se você


quiser aprofundar mais seus conhecimentos a respeito desse tipo de
produção textual, é só procurá-lo nestes tipos de canais informativos. A
leitura é breve e simples, pois são textos pequenos e a linguagem não é
intelectualizada, uma vez que a intenção é atingir todo tipo de leitor.
• Uma característica muito peculiar deste tipo de gênero textual é a
persuasão, que consiste na tentativa do emissor de convencer o
destinatário, neste caso, o leitor, a adotar a opinião apresentada. Por
este motivo, é comum presenciarmos descrições detalhadas, apelo
emotivo, acusações, humor satírico, ironia e fontes de informações
precisas.

Como dito anteriormente, a linguagem é objetiva e aparecem


repletas de sinais de exclamação e interrogação, os quais incitam à
posição de reflexão favorável ao enfoque do autor.
• Outros aspectos persuasivos são as orações no imperativo (seja,
compre, ajude, favoreça, exija, etc.) e a utilização de conjunções que
agem como elementos articuladores (e, mas, contudo, porém,
entretanto, uma vez que, de forma que, etc.) e dão maior clareza às
ideias.

Geralmente, é escrito em primeira pessoa, já que trata-se de um texto


com marcas pessoais e, portanto, com indícios claros de
subjetividade, porém, pode surgir em terceira pessoa.
PARA PRODUZIR UM BOM ARTIGO DE
OPINIÃO
a) Após a leitura de vários pontos de vista, anote num papel os argumentos que
mais lhe agradam, eles podem ser úteis para fundamentar o ponto de vista que você
irá desenvolver.

b) Ao compor seu texto, leve em consideração o interlocutor: quem irá ler a sua
produção. A linguagem deve ser adequada ao gênero e ao perfil do público leitor.

c) Escolha os argumentos, entre os que anotou, que podem fundamentar a ideia


principal do texto de modo mais consciente, e desenvolva-os.

d) Pense num enunciado capaz de expressar a ideia principal que pretende defender.
• e) Pense na melhor forma possível de concluir seu texto: retome o
que foi exposto, ou confirme a ideia principal, ou faça uma citação de
algum escritor ou alguém importante na área relativa ao tema
debatido.

f) Crie um título que desperte o interesse e a curiosidade do leitor.

g) Formate seu texto em colunas e coloque entre elas uma chamada


(um importante e pequeno trecho do seu texto).

h) Após o término do texto, releia e observe se nele você se posiciona


claramente sobre o tema; se a ideia está fundamentada em
argumentos fortes e se estão bem desenvolvidos; se a linguagem está
adequada ao gênero; se o texto apresenta título e se é convidativo e,
por fim, observe se o texto como um todo é persuasivo.
DICAS:
• O tamanho de um artigo de opinião varia bastante, dependendo do
veículo em que ele será publicado. Em jornais, impressos ou não, eles
costumam variar de meia a uma página. O mesmo vale para revistas,
que frequentemente publicam opiniões de leitores sobre determinado
assunto.
• A linguagem utilizada também varia bastante. Se o artigo de opinião for
publicado em uma revista que debate temas mais sérios, a linguagem
exigida pode ser mais formal do que aquela exigida por revistas cujo
propósito é mais o de entreter. De maneira geral, as variações de
linguagem dependem muito, também, do estilo de escrita de cada. O
importante é saber adequar a sua escrita às exigências do contexto.
DEVE USAR PRIMEIRA PESSOA?
• Esse é outro detalhe que causa bastante dúvida em quem pretende
ou precisa escrever um artigo de opinião. As duas opções são
válidas: é possível tanto usar a primeira pessoa (eu acho que…, eu
acredito que…) quanto a impessoalidade (é possível perceber que…,
vale observar que…).
• O que muitos argumentam é que, por ser um artigo de opinião, é
óbvio que o que está sendo tratado é a opinião de quem está
escrevendo, podendo ser desnecessário explicitar a primeira
pessoa. Mas, isso de maneira alguma diminui a qualidade do artigo se
os argumentos apresentados forem bem construídos e embasados.
OBSERVAÇÃO IMPORTANTE:

Em caso de precisar escrever um artigo de opinião para vestibulares ou


concursos, atente-se às exigências da proposta. Se o enunciado exigir
impessoalidade, siga o exigido.
QUANTOS PARÁGRAFOS DEVE TER?
• Geralmente, a estrutura do artigo de opinião assemelha-se e muito à
do texto dissertativo-argumentativo:uma introdução,
um desenvolvimento (argumentação) e uma conclusão.
• Portanto, recomenda-se o mínimo de três parágrafos, um para cada
etapa, sendo que a de desenvolvimento pode ser dividida em
dois, um para cada argumento, totalizando quatro parágrafos.
• Situação-problema: introduz-se o tema para que o leitor saiba do que
o artigo de opinião se trata, contextualizando-o com informações
pertinentes;
• Discussão: são apresentados os principais argumentos do autor,
embasando-os com dados concretos, exemplos, citações, etc. Não há
um mínimo ou um máximo de argumentos, ficando a critério do
autor. Entretanto, não peque pelo excesso nem pela escassez;
• Solução-avaliação: por fim, apresenta-se a resposta à situação-
problema, demonstrando que seu texto e o conjunto de seus
argumentos chegaram em algum lugar. É imprescindível, portanto,
seu texto ter coerência e seguir uma mesma linha de raciocínio do
início ao fim. Jamais mude de parecer ao longo do texto.
PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS:
• O uso da argumentação e persuasão;
• • Os textos escritos na primeira e terceira pessoa;
• • Normalmente os textos são assinados pelo autor;
• • São textos veiculados nos meios de comunicação: rádio, TV, revista;
• • Possuem uma linguagem simples, objetiva e subjetiva;
• • A maioria dos seus temas é da atualidade;
• • Possuem títulos polêmicos e provocativos;
• • O verbo aparece no presente e no imperativo.
• Confira abaixo um Artigo de opinião nos exatos termos que foi
proposto em 2018, que abarcou resposta para a seguinte pergunta-
tema: “Há limites para a liberdade de expressão?”
PROPOSTA:
• Considere a seguinte situação: uma postagem recente em uma rede social de uma
mensagem de ódio contra os nordestinos foi foco de intensa discussão. Dada a
repercussão do caso, o jornal de maior circulação de sua cidade resolveu fazer um
caderno especial sobre o tema “Liberdade de Expressão”. Leitores de diferentes perfis
foram convidados a se manifestar e você foi o estudante escolhido. Para atender a
esse convite, você deverá escrever um artigo de opinião em que discutirá a seguinte
questão: “Há limite para a liberdade de expressão?”
• No seu artigo de opinião, você deve:
• a) identificar e explicitar os dois principais posicionamentos sobre a questão tratada;
• b) assumir um desses dois posicionamentos e sustentá-lo com argumentos. Seu
texto deverá considerar as seguintes citações: “Liberdade de expressão é a
possibilidade de as pessoas se manifestarem sobre fatos e ideias sem interferências
externas, sobretudo do Estado. Discurso de ódio é uma tentativa de desqualificar e
excluir do debate grupos historicamente vulneráveis, seja por religião, cor da pele,
gênero, orientação sexual ou qualquer traço utilizado com o objetivo de inferiorizar
pessoa ou grupo.” (Luís Roberto Barroso, Ministro do STF.) ----------
• “A frase ‘eu discordo do que dizes, mas defenderei até a morte o teu
direito de dizê-lo’ talvez seja a melhor definição para a liberdade de
expressão. Afinal, é muito fácil conceder a liberdade de expressão às
ideias com que concordamos; muito mais difícil é aceitar a
manifestação de ideias que desgostamos. O que se tem visto no Brasil
nos últimos tempos, no entanto, é uma crescente vontade de reprimir
formas de expressão que sejam consideradas desrespeitosas e
preconceituosas. A iniciativa, embora tenha como pano de fundo uma
intenção nobre, tem gerado situações desproporcionais, limitando o
direito à livre expressão e violando a Constituição Federal.” (Bruno de
Oliveira Carreirão, advogado.)
• “Liberdade de expressão é poder se manifestar sobre aquilo que não ofenda ou ataque o
sentimento íntimo das pessoas. Discurso de ódio é o que tem por objetivo incitar, criar
beligerância e promover animosidades contra esses sentimentos pessoais.” (Marcelo
Itagiba, ex-deputado.) ----------
• “As grandes sociedades se caracterizam pela pluralidade de valores, alguns excludentes. A
liberdade de expressão é ligada à liberdade em si, mas há o valor da luta contra o
preconceito. Como lidar com o conflito de valores? Os EUA optaram pela liberdade de
expressão. O Brasil optou por uma legislação protetiva. Isso guarda um certo
paternalismo, mas expressa respeito. (Fernando Schüler, cientista político.) ----------
• “É necessário entender a ideia de identidade e de alteridade. Por uma questão de
sobrevivência, nos sentimos seguros quando próximos de algo com que nos identificamos.
Queremos sempre que o outro seja igual a nós e, se não for, talvez tenhamos que destruí-
lo. Este é um pressuposto fundamental para o surgimento do discurso de ódio.” (Izidoro
Blikstein, professor da FGV e especialista em Análise do Discurso.)
• “Liberdade de expressão é o direito de expor a opinião e exercitar a divergência sem ser
perseguido ou condenado. O discurso de ódio é um conceito um tanto abstrato e elástico.
Para uns, é a expressão da verdade desnuda do politicamente correto; para outros, é a
tentativa abjeta de difamar seu interlocutor.” (Rachel Sheherazade, jornalista e
apresentadora de TV.) ----------
• “O discurso de ódio aparece quando você acha que seu modo de ser e estar no mundo
deve ser um modelo com o qual outras pessoas têm que se conformar. Se isso não
acontecer, o discurso de ódio vem para deslegitimar a sua vivência, para fazer com que
pareça que sua vida não merece ser vivida.” (Linn da Quebrada, cantora.) ----------
• “Liberdade de expressão não é um direito absoluto, nem pode ser. As pessoas têm
dificuldade de entender que vivem em sociedade, que existem regras e que a gente
precisa delas, sobretudo no que diz respeito à vida do outro.” (Djamila Ribeiro, ativista dos
movimentos negro e feminista e ex-Secretária Adjunta de Direitos Humanos da prefeitura
de São Paulo.)
Liberdade e bom senso: mesmas medidas
• Nordestinos; homossexuais; gordos; prostitutas; funkeiros; negros –
nada escapa do escárnio de um sem-número de pessoas que,
diariamente, destilam ódio, quer nas redes sociais, quer nos
corredores das escolas, quer no meio da rua, ódio sempre nocivo a
qualquer debate e apenas superável pelo bom senso – o que não é
possível exigir de todos os homens, alguns, estúpidos por natureza.
• É nesse sentido que se há de reconhecer o papel fundamental dos
formadores de opinião, os quais se manifestam, na velocidade da luz,
mídias afora. Sem dúvida, a maior parte dos cidadãos, verdadeira
maria-vai-com-as-outras, deixa-se levar apenas por aquilo que está
ao alcance dos olhos, sem qualquer depuração e, assim, engole a
primeira barbárie, ainda que assinada por boçais de toda a ordem – e
o fazem em nome da liberdade de expressão. Outra parte, não só vê,
revê, contesta, aceita, recusa, pensa nos limites da liberdade de
expressão e na intolerância, como também revida, em caso de
manifestações ofensivas.
• É inegável: a liberdade de expressão é tão limitada – ou ilimitada –
quanto o bom senso. Democracia à parte, há, sim, o limite imposto
pelo bom senso, que está ligado à razoabilidade, à ética, aos bons
costumes, e pode ser aferido com a empatia. Nunca o jargão popular
foi tão oportuno: não faça aos outros o que você não quer que seja
feito a você – isso é bom senso, é polidez, é respeito. Contrário disso, a
liberdade de expressão transforma-se em ferramenta que separa, que
agride, que discrimina, o que significa retrocessos significativos no
perfil daquele que ainda se conhece por animal racional.
AGORA É COM VOCÊ!!!!!
• Coloque-se na posição de um articulista que, ao fazer uma pesquisa sobre
as recentes catástrofes ocorridas em função das chuvas que afetaram o
Brasil a partir do final de 2009, encontra a crônica de Drummond,
publicada em 1966, e decide dialogar com ela em um artigo jornalístico
opinativo para uma série especial sobre cidades, publicada em revista de
grande circulação. Nesse artigo você, necessariamente, deverá:
• a) relacionar três (3) problemas enfrentados recentemente pelas cidades
brasileiras em função das chuvas com aqueles trabalhados na crônica;
• b) mostrar em que medida concorda com a visão do cronista sobre a
questão.
OS DIAS ESCUROS – Carlos Drummond de
Andrade
• Amanheceu um dia sem luz – mais um – e há um grande silêncio na rua. Chego à
janela e não vejo as figuras habituais dos primeiros trabalhadores. A cidade, ensopada
de chuva, parece que desistiu de viver. Só a chuva mantém constante seu movimento
entre monótono e nervoso. É hora de escrever, e não sinto a menor vontade de fazê-
lo. Não que falte assunto. O assunto aí está, molhando, ensopando os morros, as
casas, as pistas, as pessoas, a alma de todos nós. Barracos que se desmancham como
armações de baralho e, por baixo de seus restos, mortos, mortos, mortos.
Sobreviventes mariscando na lama, à pesquisa de mortos e de pobres objetos
amassados. Depósito de gente no chão das escolas, e toda essa gente precisando de
colchão, roupa de corpo, comida, medicamento. O calhau solto que fez parar a
adutora. Ruas que deixam de ser ruas, porque não dão mais passagem. Carros
submersos, aviões e ônibus interestaduais paralisados, corrida a mercearias e
supermercados como em dia de revolução. O desabamento que acaba de acontecer e
os desabamentos programados para daqui a poucos instantes.
• Este, o Rio que tenho diante dos olhos, e, se não saio à rua, nem por isso a imagem é
menos ostensiva, pois a televisão traz para dentro de casa a variada pungência de seus
horrores. Sim, é admirável o esforço de todo mundo para enfrentar a calamidade e
socorrer as vítimas, esforço que chega a ser perturbador pelo excesso de devotamento
desprovido de técnica. Mas se não fosse essa mobilização espontânea do povo,
determinada pelo sentimento humano, à revelia do governo incitando-o à ação, que
seria desta cidade, tão rica de galas e bens supérfluos, e tão miserável em sua
infraestrutura de submoradia, de subalimentação e de condições primitivas de
trabalho? Mobilização que de certo modo supre o eterno despreparo, a clássica
desarrumação das agências oficiais, fazendo surgir de improviso, entre a dor, o
espanto e a surpresa, uma corrente de afeto solidário, participante, que procura
abarcar todos os flagelados. Chuva e remorso juntam-se nestas horas de pesadelo, a
chuva matando e destruindo por um lado, e, por outro, denunciando velhos erros
sociais e omissões urbanísticas; e remorso, por que escondê-lo?
• Pois deve existir um sentimento geral de culpa diante de cidade tão
desprotegida de armadura assistencial, tão vazia de meios de defesa da
existência humana, que temos o dever de implantar e entretanto não
implantamos, enquanto a chuva cai e o bueiro entope e o rio enche e o barraco
desaba e a morte se instala, abatendo-se de preferência sobre a mão de obra
que dorme nos morros sob a ameaça contínua da natureza; a mão de obra de
hoje, esses trabalhadores entregues a si mesmos, e suas crianças que nem
tiveram tempo de crescer para cumprimento de um destino anônimo. No dia
escuro, de más notícias esvoaçando, com a esperança de milhões de seres posta
num raio de sol que teima em não romper, não há alegria para a crônica, nem
lhe resta outro sentido senão o triste registro da fragilidade imensa da rica,
poderosa e martirizada cidade do Rio de Janeiro. Correio da Manhã,
14/01/1966.

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