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O papel das

comunidades
terapêuticas na garantia
dos direitos humanos

O papel das

6
Comunidades
Terapêuticas na garantia
dos direitos humanos
dos seus acolhidos

1
Conteudista:
Matheus Caracho Nunes (Conteudista, 2021);
Diretoria de Desenvolvimento Profissional.

Enap, 2021

Enap Escola Nacional de Administração Pública


SAIS - Área 2-A -70610-900 - Brasília, DF

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Sumário
Unidade 1 – Os direitos dos indivíduos em acolhimento nas comunidades terapêuticas .......
5
1. Conceituação do modelo e método de Comunidade Terapêutica .....................................................................5
2. Legislações de Comunidade Terapêutica.....................................................................................................................7
3. Direitos Humanos e Comunidades Terapêuticas......................................................................................................7

Unidade 2 – Monitoramento e fiscalização de direitos no contexto das Comunidades


Terapêuticas ................................................................................................................................. 11
4. Monitoramento e fiscalização nas comunidades terapêuticas................................................................................... 11

Referências ......................................................................................................................................... 14

3
MÓDULO

O papel das Comunidades


6 Terapêuticas na garantia dos direitos
humanos dos seus acolhidos
O módulo 6 está estruturado da seguinte forma:

• Unidade 1 – Os direitos dos indivíduos em acolhimento nas comunidades terapêuticas

• 1.1 Conceituação do modelo e método de Comunidade Terapêutica

• 1.2 Legislações de Comunidade Terapêutica

• 1.3 Direitos Humanos e Comunidades Terapêuticas

• Unidade 2 – Monitoramento e fiscalização de direitos no contexto das Comunidades


Terapêuticas

• 2.1 Monitoramento e fiscalização nas comunidades terapêuticas

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Unidade 1 – Os direitos dos indivíduos em
acolhimento nas comunidades terapêuticas
Ao final desta unidade, você será capaz de relacionar a proteção dos direitos humanos no contexto do
acolhimento social em comunidades terapêuticas.

1.1 Conceituação do modelo e método de Comunidade Terapêutica

Na segunda metade do século XX, Maxwell Jones, psiquiatra sul-africano radicado no Reino Unido, criou o
modelo de Comunidade Terapêutica psiquiátrica destinado a atender soldados que voltavam da 2ª Guerra
Mundial.

Neste contexto, o paciente com transtorno psiquiátrico tinha a possibilidade de desenvolver-se como ser
humano.

Em 1959, em Santa Mônica, Califórnia/EUA, foi fundado o primeiro protótipo de Comunidade Terapêutica
para a recuperação da dependência química da história. Neste modelo uniram-se os saberes de grupos
de ajuda mútua como os Alcoólicos Anônimos (A.A) e os Narcóticos Anônimos (N.A) e o modelo
residencial/ terapêutico, para a fundação da Synanon.

O primeiro modelo que se autodenominou como Comunidade Terapêutica para tratamento da


dependência química, foi o Daytop Village, fundado em Nova Iorque, em 1963. O principal diferencial
desta nova abordagem foi a inclusão de profissionais da área da saúde dentro da equipe técnica, o
que se tornou parte integrante do que hoje se entende por Comunidade Terapêutica. Após o sucesso de
Daytop Village, o modelo de Comunidade Terapêutica difundiu-se pelo mundo todo.

No Brasil, a primeira Comunidade Terapêutica data de 1968, em Goiás.

Afinal, o que são Comunidades Terapêuticas? São entidades privadas, sem fins lucrativos, que
realizam o acolhimento de pessoas com transtornos decorrentes do uso, abuso ou dependência
de substâncias psicoativas, em regime residencial transitório e de caráter exclusivamente
voluntário.

As Comunidades Terapêuticas prestam os serviços buscando acolher pessoas que necessitam de


afastamento do ambiente no qual iniciou, desenvolveu ou se estabeleceu o uso ou a dependência de
substâncias psicoativas, como o álcool, crack, maconha, cocaína, dentre outras.

O serviço realizado pelas Comunidades Terapêuticas é categorizado como acolhimento, e não como
internação, prática própria dos serviços de saúde, como Hospitais Psiquiátricos, Hospitais Gerais, Clínicas
Especializadas em Dependência Química. Ademais, nas Comunidades Terapêuticas não há a prescrição de
medicamentos. Podem ser admitidas pessoas usuárias de remédios controlados, de posse de prescrições
médicas e a entidade assumirá a responsabilidade pela administração e guarda do medicamento, nos
termos do receitado.

A internação em Comunidade Terapêutica é expressamente vedada pela Lei nº 10.216, de 2001, dado que
estas não oferecem os serviços médicos requeridos.

As Comunidades Terapêuticas são lugares cujo principal instrumento terapêutico é a convivência entre
os pares. Oferece uma rede de ajuda no processo de recuperação das pessoas, resgatando a cidadania,
buscando encontrar novas possibilidades de reabilitação física e psicológica, e de reinserção social.

A condição para o acolhimento é a realização prévia de avaliação diagnóstica, podendo ser emitida por
médico da rede privada ou pública de saúde, ou por médico contratado pela entidade acolhedora.
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As pessoas que apresentam grau de comprometimento grave no âmbito orgânico e/ou psicológico/
psiquiátrico não são elegíveis para tratamento nas Comunidades Terapêuticas, devendo ser encaminhadas
a outras modalidades de atenção.

O funcionamento das Comunidades Terapêuticas é disciplinado, pela Resolução da Diretoria Colegiada,


da Agência Nacional de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde – RDC nº 29/2011 e pela Resolução
nº 01/2015, do Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas (CONAD), que “regulamenta, no âmbito do
Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (SISNAD), as entidades que realizam o acolhimento
de pessoas, em caráter voluntário, com problemas associados ao uso nocivo ou dependência de substância
psicoativa, caracterizadas como Comunidades Terapêuticas”.

O acolhimento de adolescentes encontra-se disciplinado pela Resolução nº 3/2020 do CONAD.

A “Nova Política Nacional sobre Drogas” - PNAD, aprovada por meio do Decreto nº 9.761, de 11 de abril de
2019, prevê nos seus pressupostos:

Item 3.3. Garantir o direito à assistência intersetorial, interdisciplinar e transversal, a partir da


visão holística do ser humano, pela implementação e pela manutenção da rede de assistência
integrada, pública e privada, com tratamento, acolhimento em comunidade terapêutica,
acompanhamento, apoio, mútua ajuda e reinserção social, à pessoa com problemas
decorrentes do uso, do uso indevido ou da dependência do álcool e de outras drogas e a
prevenção das mesmas a toda a população, principalmente àquelas em maior vulnerabilidade.
(grifo nosso)

Não bastante, a Lei 13.840, de 5 de junho de 2019, alterou a Lei de Drogas para tratar expressamente das
comunidades terapêuticas acolhedoras (art. 26-A), reafirmando as principais características do
acolhimento:

Art. 26-A. O acolhimento do usuário ou dependente de drogas na comunidade terapêutica


acolhedora caracteriza-se por:

I.- oferta de projetos terapêuticos ao usuário ou dependente de drogas que visam à


abstinência;
II.- adesão e permanência voluntária, formalizadas por escrito, entendida como uma
etapa transitória para a reinserção social e econômica do usuário ou dependente de drogas;
III.- ambiente residencial, propício à formação de vínculos, com a convivência entre os
pares, atividades práticas de valor educativo e a promoção do desenvolvimento pessoal,
vocacionada para acolhimento ao usuário ou dependente de drogas em vulnerabilidade
social;
IV.- avaliação médica prévia;
V.- elaboração de plano individual de atendimento na forma do art. 23-B desta Lei; e
VI.- vedação de isolamento físico do usuário ou dependente de drogas.
§ 1º Não são elegíveis para o acolhimento as pessoas com comprometimentos biológicos
e psicológicos
As Comunidades Terapêuticasde natureza
são grave que
equipamentos mereçam
da rede atençãorecuperação
de atenção, médico-hospitalar contínua
e reinserção ou de
social de
emergência, caso em que deverão ser encaminhadas à rede de saúde.
dependentes de substâncias psicoativas, de modo que integram o Sistema Nacional de Políticas Públicas
sobre Drogas – SISNAD, por força do Decreto nº 9.761/2019 e da Lei nº 13.840/2019.

Para saber mais sobre boas práticas e encaminhamento para Comunidades


Terapêuticas, acesse o vídeo:

Boas Práticas em Comunidades Terapêuticas

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1.2 Legislações de Comunidade Terapêutica

Atualmente, as Comunidades Terapêuticas brasileiras legalmente devem se pautar em quatro legislações


principais, são elas:

• Resolução da Diretoria Colegiada nº 29 (RDC 29/2011), da Agência Nacional de Vigilância Sanitária


(ANVISA), que dispõe sobre os requisitos de segurança sanitária para o funcionamento de
instituições que prestem serviços de atenção a pessoas com transtornos decorrentes do uso,
abuso ou dependência de substâncias psicoativas e respectiva Nota Técnica nº 55/2013.

• Resolução CONAD nº 01/2015 (Marco Regulatório das Comunidades Terapêuticas), que regulamenta as
entidades que realizam o acolhimento de pessoas, em caráter voluntário, com problemas
associados ao uso nocivo ou dependência de substância psicoativa, caracterizadas como
Comunidades Terapêuticas.

• Resolução CONAD nº 3/2020, que regulamenta, no âmbito do Sistema Nacional de Políticas Públicas
sobre Drogas - Sisnad, o acolhimento de adolescentes com problemas decorrentes do uso, abuso
ou dependência do álcool e outras drogas em comunidades terapêuticas.

• Decreto nº 9761, de 11 de abril de 2019, que aprova a Política Nacional sobre Drogas.

• Lei nº 13.840, de 5 de junho de 2019, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Políticas Sobre
Drogas (SISNAD) e as condições de atenção aos usuários ou dependentes de drogas e para
tratar do financiamento das políticas sobre drogas.

Tais diretrizes fornecem as bases legais para o funcionamento, gestão e financiamento das Comunidades
Terapêuticas no Brasil e são válidas para todo o território brasileiro.

Podemos observar que tais regulamentações são relativamente recentes, se considerarmos o tempo de
existência das Comunidades Terapêuticas no Brasil. Este é um dos motivos pelos quais ainda há muitas
instituições que se autointitulam como Comunidade Terapêutica, mas estão em desacordo tanto com a
regulamentação nacional sobre estas entidades, como com suas origens históricas que, conforme estudado
neste módulo, privilegiam um atendimento horizontalizado e participativo.

1.3 Direitos Humanos e Comunidades Terapêuticas

As Comunidades Terapêuticas possuem inegável


reconhecimento por meio de sólido arcabouço legal
e normativo que regulam os serviços de interesse
público por elas prestados.

Esse arcabouço é inequívoco quanto ao


cumprimento dos direitos humanos no acolhimento
das pessoas com problemas decorrentes do uso e
abuso de substâncias psicoativas.

Justiça e Direitos.
Fonte: Direitos Humanos: o que são, artigos e como
surgiram - Brasil Escola

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A Resolução CONAD nº 01/2015 é muito clara quanto à obrigatoriedade das Comunidades Terapêuticas
em respeitarem a não-institucionalização, o desenvolvimento de atividades recreativas, o desenvolvimento
da espiritualidade e a promoção do autocuidado e sociabilidade (atividades que tem por objetivo a prática
de atos do cotidiano: higiene pessoal, arrumação e limpeza, elaboração de refeições, organização dos
espaços coletivos). Todas as atividades desenvolvidas não poderão ter caráter punitivo e deverão ser
supervisionadas por membros da equipe da organização.

São direitos garantidos na Resolução nº1/2015 do Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas
(CONAD):

• adesão e permanência voluntárias;

• interromper o acolhimento a qualquer momento;

• receber tratamento respeitoso, bem como à sua família, independente de etnia, credo
religioso, ideologia, nacionalidade, orientação sexual, identidade de gênero,
antecedentes criminais ou situação financeira;

• a privacidade, inclusive no tocante ao uso de vestuário, corte de cabelo e objetos


pessoais próprios, observadas as regras sociais de convivência;

• participar das atividades previstas no art. 12, mediante consentimento expresso no Plano
de Atendimento Singular - PAS ou Plano Individual de Atendimento (instrumento
que especifica e monitora as ações de acolhimento individual, devendo reunir todas as
informações a respeito do acolhido, inclusive aquelas exigidas pelos órgãos de
controle e fiscalização;

• o sigilo, segundo normas éticas e legais, incluindo o anonimato, sendo vedada a


divulgação de informação, imagem ou outra modalidade de exposição da pessoa sem sua
autorização prévia, por escrito; e

• participar da elaboração do PAS/PIA, em conjunto com a família ou pessoa indicada pelo


acolhido, e em consonância com o programa de acolhimento da entidade.

A Resolução, em seu art. 6º, traz as obrigações das Comunidades Terapêuticas que garantem os direitos
humanos das pessoas com dependência química acolhidas:

Art. 6º São obrigações das entidades que promovem o acolhimento de pessoas com
problemas associados ao abuso ou dependência de substância psicoativa, caracterizadas como
comunidades terapêuticas, dentre outras:
I.- possuir e cumprir seu programa de acolhimento, que também deverá conter as normas
e rotinas da entidade;
II.- somente acolher pessoas mediante avaliação diagnóstica prévia, emitida pela rede de
saúde ou por profissional habilitado, que as considere aptas para o acolhimento, em
consonância com o disposto no art. 3º desta Resolução;
III.- elaborar Plano de Atendimento Singular - PAS, em consonância com o programa
de acolhimento da entidade;
IV.- informar, de modo claro, os critérios de admissão, permanência e saída, bem como o
programa de acolhimento da entidade, que devem receber a anuência prévia, por escrito, do
acolhido;
V- garantir a participação da família ou de pessoa indicada pelo acolhido no processo de
acolhimento, bem como nas ações de preparação para a reinserção social;
VI - comunicar cada acolhimento ao estabelecimento de saúde e aos equipamentos de
proteção social do território da entidade, no prazo de até cinco dias;

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VII. - comunicar o encerramento do acolhimento ao estabelecimento de saúde
e aos equipamentos de proteção social do território do acolhido;
VIII.- oferecer espaço comunitário e de atendimento individual, com acompanhamento e
suporte de equipe da entidade;
IX.- incentivar, desde o início do acolhimento, o vínculo familiar e social, promovendo-se,
desde que consentido pelo acolhido, a busca da família;
X.- permitir a visitação de familiares, bem como acesso aos meios de comunicação que
permitam contato com familiares;
XI.- nortear suas ações e a qualidade de seus serviços com base nos princípios de
direitos humanos e de humanização do cuidado;
XII.não praticar ou permitir ações de contenção física ou medicamentosa, isolamento
ou restrição à liberdade da pessoa acolhida;
XIII.manter os ambientes de uso dos acolhidos livres de trancas, chaves ou grades,
admitindo- se apenas travamento simples;
XIV.- não praticar ou permitir castigos físicos, psicológicos ou morais, nem utilizar
expressões estigmatizantes com os acolhidos ou familiares;
XV.- não submeter os acolhidos a atividades forçadas ou exaustivas, sujeitando-os a
condições degradantes;
XVI.- informar imediatamente aos familiares ou pessoa previamente indicada pelo
acolhido e comunicar, no prazo de até vinte e quatro horas, às unidades de referência de
saúde e de assistência social, intercorrência grave ou falecimento da pessoa acolhida;
XVII.- observar as normas de segurança sanitária, de instalações prediais e de
acessibilidade, além de manter atualizadas as licenças emitidas pelas autoridades
competentes;
XVIII.- fornecer alimentação, condições de higiene e alojamentos adequados;
XIX.- articular junto à unidade de referência de saúde os cuidados necessários com o acolhido;
XX.- articular junto à rede de proteção social para atendimento e acompanhamento das
famílias dos acolhidos, quando do seu ingresso, durante sua permanência na instituição e,
também, após o desligamento da entidade;
XXI.- articular junto à rede intersetorial a preparação para o processo de reinserção
social do acolhido;
XXII.- promover, quando necessário e com apoio da rede local, a emissão dos
documentos do acolhido, incluindo certidão de nascimento ou casamento, cédula de
identidade, CPF, título de eleitor e carteira de trabalho;
XXIII.- promover, com o apoio da rede local, além das ações de prevenção relativas ao
uso de drogas, também as referentes às doenças transmissíveis, como vírus HIV, hepatites e
tuberculose;
XXIV.- manter equipe multidisciplinar com formação condizente com as atividades
oferecidas no Programa de Acolhimento e para o pleno funcionamento da entidade, sob
responsabilidade de um profissional de nível superior legalmente habilitado, bem como
substituto com a mesma qualificação;
XXV.- promover, de forma permanente, a capacitação dos membros da equipe que
atuam na entidade.

As Comunidades Terapêuticas possuem, portanto, condição propícia para que sejam importantes elementos
de promoção dos Direitos Humanos.

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Quanto à espiritualidade, característica de grande parte das Comunidades Terapêuticas, cabe transcrever
o que decidiu o TRF3 no julgamento do Agravo de Instrumento nº 0016133-39.2016.4.03.0000/SP, em 05
de setembro de 2019:

Religiosidade/Espiritualidade na Comunidade Terapêutica: A religiosidade/espiritualidade é


um dos elementos essenciais das Comunidades Terapêuticas Latino-americanas, e as
Comunidades Terapêuticas do Brasil têm a espiritualidade como um dos elementos
essenciais, como parte integrante do método de acolhimento/tratamento, fazendo parte
do rol das atividades terapêuticas das entidades.

Por outro lado, estas atividades devem acontecer em consonância com a legislação, e
respeitando a liberdade de cada indivíduo, visando sempre a melhora na qualidade de vida
do mesmo, a recuperação e a reinserção social da pessoa acolhida.

Para o anexo do MR, objetivando que esta atividade terapêutica seja realizada sem qualquer
indício de imposição religiosa ou outros desvirtuamentos, sugere-se colocar:

A equipe deve garantir que o candidato ao acolhimento, assim como seus familiares tenha
clareza do tipo de prática religiosa da Comunidade Terapêutica, e tenha plena liberdade de
escolher ingressar ou não na mesma, devendo informar de forma antecipada e detalhada
como se desenvolve esta atividade e a linha espiritual adotada, com a adesão formal
consentida no PAS - Plano de Atendimento Singular. Caso o candidato não deseje ingressar
ou ficar na Comunidade Terapêutica por motivos religiosos, deve ser providenciado o
encaminhamento para outra Comunidade Terapêutica com a qual este possa se
identificar, ou para outra modalidade de atendimento de interesse.

O direito da pessoa em optar pela proposta terapêutica oferecida pela Comunidade Terapêutica,
devidamente esclarecida e anuída, por escrito, inclusive quanto à questão da espiritualidade, é respeito ao
direito fundamental expresso na Constituição Federal e aos direitos humanos básicos.

Da mesma forma, a opção da pessoa acolhida de desligar-se da Comunidade Terapêutica, é condição


fundamental de respeito aos direitos humanos.

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Unidade 2 – Monitoramento e fiscalização de direitos
no contexto das Comunidades Terapêuticas
Ao final desta unidade, você será capaz de identificar os mecanismos de monitoramento e fiscalização de
direitos.

1. Monitoramento e fiscalização nas comunidades terapêuticas

Nos últimos sete anos, as Comunidades Terapêuticas mantêm relação com a União, a partir de editais de
chamamento público. Atualmente, o Governo Federal, por meio da Secretaria Nacional de Cuidados e
Prevenção às Drogas (SENAPRED), do Ministério da Cidadania, mantém contratos celebrados com 481
Comunidades Terapêuticas, que somam 10.607 vagas, ao custo de aproximadamente 150 milhões de reais
ao ano.

Considerando o financiamento público federal de vagas em Comunidades Terapêuticas, o Governo Federal


acompanha e fiscaliza os serviços por elas prestados por meio do Sistema de Gestão de Comunidades
Terapêuticas- SISCT, da fiscalização presencial e da fiscalização remota, instituídos pelas seguintes Portarias:

• PORTARIA Nº 562, DE 19 DE MARÇO DE 2019 - Cria o Plano de Fiscalização e Monitoramento de


Comunidade Terapêutica no âmbito da Secretaria Nacional de Cuidados e Prevenção às Drogas -
SENAPRED.

• PORTARIA MC Nº 582, DE 8 DE JANEIRO DE 2021 - Estabelece normas e procedimentos


administrativos para a comprovação da prestação de serviços de acolhimento residencial transitório,
prestados pelas Comunidades Terapêuticas (CTs) contratadas no âmbito do Ministério
da Cidadania (MC), por meio da Secretaria Nacional de Cuidados e Prevenção às Drogas (SENAPRED).

• PORTARIA MC Nº 625, DE 6 DE ABRIL DE 2021- Institui a Fiscalização Remota de Comunidades


Terapêuticas no âmbito da Secretaria Nacional de Cuidados e Prevenção às Drogas - SENAPRED.

É importante ressaltar que para receberem recursos do Governo Federal visando o financiamento de
vagas para dependentes químicos, as Comunidades Terapêuticas devem possuir “Cadastro Nacional de
Comunidades Terapêuticas e Entidades Afins”, no âmbito da SENAPRED, instituído pela PORTARIA 563,
DE 19 DE MARÇO DE 2019.

Além disso, o Governo Federal vem celebrando parcerias com Estados e Municípios que também repassam
recursos para essas entidades para auxiliar no acompanhamento e fiscalização dos serviços de
acolhimentos de pessoas com dependência química.

Registre-se, também, que a Secretaria Nacional de Cuidados e Prevenção às Drogas - SENAPRED, do


Ministério da Cidadania , está realizando ações de capacitação para gestores e profissionais de
Comunidades Terapêuticas para que essas entidades realizem, cada vez mais, um serviço qualificado e de
excelência. Em 2019, 2020 e 2021, além de capacitações locais, e com a participação de Organismos
Internacionais, foram disponibilizados os Cursos EAD “COMPACTA - Capacitação de Monitores e
Profissionais das Comunidades Terapêuticas” e “Política Nacional sobre Drogas: O que os gestores
estaduais e municipais devem saber”. Registre-se que, até o final do ano de 2022, serão disponibilizados
mais três cursos EAD com essa finalidade.

A SENAPRED, ainda, está implementando em parceria com o Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (PNUD) a “Parametrização das Comunidades Terapêuticas” (ampliação dos indicadores
de qualidade) e o “Monitoramento e Avaliação dos Indicadores de Recuperação”.

É importante ressaltar que o Ministério da Cidadania disponibiliza em seu site o “Mapa Virtual das
Comunidades Terapêuticas”, com todas as informações das entidades financiadas pelo Governo Federal
– vagas, valor repassado, endereço, e-mail, público atendido, vagas disponibilizadas – de modo que a 11
população tenha acesso a esse serviço, além de dar transparência em relação à destinação dos recursos.
Devido à pandemia causada pelo COVID-19, em 6 de abril de 2021 o Ministério da Cidadania publicou a
Portaria 340, de 30 de março de 2020, que estabelece medidas para o enfrentamento de Emergência em
Saúde Pública da Importância Nacional decorrente de infecção humana pelo novo coronavírus (COVID-19)
no âmbito das Comunidades Terapêuticas. Além disso, foi elaborada e disponibilizada Cartilha de
Orientações para as Comunidades Terapêuticas com informações sobre o Coronavírus.

As atividades e os serviços realizados pelas Comunidades Terapêuticas são considerados essenciais,


nos termos dos incisos I e II do art. 3º do Decreto nº 10.282, de 20 de março de 2020. Portanto, essas
entidades continuaram realizando seus serviços durante a pandemia, seguindo as normas emanadas
pelos Ministério da Cidadania e Saúde.

Ressalte-se que a SENAPRED faz um acompanhamento semanal dos casos de COVID-19 nas instituições
financiadas e não foi detectada ocorrência de óbito em razão da doença.

De acordo com os dados da pesquisa denominada “Perfil das Comunidades Terapêuticas”, realizada pelo
Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas, (IPEA, 2017), atualmente existem aproximadamente duas
mil Comunidades Terapêuticas em funcionamento no Brasil.

No que tange à abordagem médica, o Conselho Federal de Medicina (CFM) em seu Parecer nº 9/2015 assim
expressou:

“Esse artigo objetiva deixar claro que os médicos entendem que parte do tratamento de portadores de
doenças mentais ou de pessoas com problemas de ajustamento não exige a presença de
médicos porquanto as estratégias terapêuticas têm também perfil reabilitador, reeducador e
voltado para a reinserção sócio-familiar-ocupacional. [...]. Nesse ambiente não existe tutela
médica, nem de enfermagem com prontuários para prescrição e assentamento de condutas
médicas e de enfermagem. A assistência médica pode ocorrer em ambulatórios ou em
consultórios públicos ou privados, como seria feito em qualquer paciente que se trata
permanecendo em sua casa. Definitivamente esses ambientes não são ambientes médicos.”

As Comunidades Terapêuticas enquadram-se no conceito “extra-hospitalar” a que se refere o caput do


Art.4º da Lei nº 10.216, que, como diz o Parecer nº 9/2015 do CFM, “não são ambientes médicos”.

Da mesma forma, a Lei nº 13.840/2019 claramente demonstra a diferenciação entre os serviços


ambulatoriais, médico-hospitalares do acolhimento em comunidades terapêuticas, sendo que para a
admissão nas comunidades terapêuticas deve haver a avaliação médica prévia, que comprove não haver
comprometimentos biológicos ou psicológicos/psiquiátricos graves que demandem atendimento médico-
hospitalar.

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Da mesma forma, o acolhimento de adolescentes está amparada no inciso VI do Art.101 do ECA, assim
como disposto no § 3º do Art.23-B com o inciso V do Art.26-A, da Lei nº 11.343/2006, com as alterações
da Lei nº 13.840/2019.

A legalidade da Resolução nº 1/2015 do CONAD, sua consonância com a Lei nº 10.216/2001, bem como
do acolhimento de adolescentes em Comunidades Terapêuticas, foi reconhecido na decisão do TRF3, no
julgamento do Agravo de Instrumento nº 0016133-39.2016.4.03.0000/SP, em 05 de setembro de 2019:

“A Resolução CONAD 01/2015 mostra-se compatível com as disposições do novo marco


legal constituído pela Lei nº 11.343/2006 e alterações da Lei nº 13.840/2019”;

“Em razão da intersetorialidade, interdisciplinaridade e transdisciplinaridade, o Ministério da


Saúde, através da ANVISA, e o Ministério da Justiça, através do CONAD, podem
regulamentar as CT’s e as matérias a elas afetas, no âmbito de suas respectivas
competências, não se podendo excluir a competência do CONAD para expedir a Resolução
nº 1/2015.”

“12. A nova regulamentação das Comunidades Terapêuticas claramente diferencia as


situações:

i) "acolhimento" do usuário ou dependente de drogas como atividade própria das


Comunidades Terapêuticas (art. 26-A), mantendo as peculiaridades de tais entidades tal
como previstas na Resolução CONAD nº 01/2015;

e ii) "tratamento" do usuário ou dependente de drogas que "deverá ser ordenado em uma
rede de atenção à saúde, com prioridade para as modalidades de tratamento ambulatorial,
incluindo excepcionalmente formas de internação em unidades de saúde e hospitais gerais
nos termos de normas dispostas pela União e articuladas com os serviços de assistência
social" (art. 23-A), sendo "vedada a realização de qualquer modalidade de internação nas
comunidades terapêuticas acolhedoras" (§9º do art. 23-A);”

“13. O regramento das comunidades terapêuticas acolhedoras não tem incompatibilidade


com a política antimanicomial da Lei nº 10.216/2001 (Reforma Psiquiátrica);”

“d) Acolhimento de Adolescentes em Comunidades Terapêuticas: Não existe uma


regulamentação que impeça esta prática, desde que as prerrogativas presentes no ECA
sejam contempladas pelas instituições de acolhimento.”

Nenhum modelo terapêutico subsistiria, nem em nível nacional, nem em nível mundial, por tanto tempo, se
não fosse obtido resultado nessa modalidade terapêutica.

Com o objetivo de que esses serviços, que tanto contribuem para o cuidado e a recuperação de pessoas
com problemas decorrentes do uso e abuso de substâncias psicoativas, promovam os direitos humanos e
integrem os acolhidos à sociedade, é de fundamental importância que se cumpra toda a legislação vigente.

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Referências

BRASIL. Ministério da Saúde. Resolução RDC n. 29, 30 de junho de 2011. Dispõe sobre os
requisitos de segurança sanitária para o funcionamento de instituições que prestem serviços
de atenção a pessoas com transtornos decorrentes do uso, abuso ou dependência de
substâncias psicoativas. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Brasília, 30 jun. 2011.

BRASIL. Ministério da Justiça e Segurança Pública. Conselho Nacional de Políticas sobre


Drogas (CONAD). Resolução CONAD n. 01/2015. Regulamenta, no âmbito do Sistema
Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (SISNAD), as entidades que realizam o
acolhimento de pessoas, em caráter voluntário, com problemas associados ao uso nocivo
ou dependência de substância psicoativa, caracterizadas como comunidades terapêuticas.
Brasília, DF, 2015.

BRASIL. Decreto nº 9.761, de 11 de abril de 2019. Brasília, DF: Presidência da República, 2019.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/decreto/
D9761.htm.

BRASIL. Lei Nº 13.840, de 5 de junho de 2019. Brasília, DF: Presidência da República, 2019.

DE LEON, G. The Therapeutic Community: Toward a General Theory and Model. In:
therapeutic Community: Advances in Research and Application. NATIONAL INSTITUTE ON
DRUG ABUSE (NIDA), 1994. p. 16-52.

DE LEON, G. Is the therapeutic community an evidence based treatment? What the


evidence says. Their Communities. v. 31, n. 2, p. 104-128, 2010.

IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Perfil das Comunidades Terapêuticas


Brasileiras. Brasília, 2017 (Nota técnica, n.21). Disponível em: https://www.ipea.gov.br/
portal/images/stories/PDFs/nota_tecnica/20170418_nt21.pdf

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