Este documento discute as ideias de Marcel Mauss sobre a dádiva e reciprocidade nas sociedades maori e polinésias. Apresenta três pontos principais: 1) O direito nativo destas sociedades se baseava na lei da reciprocidade da troca de dádivas; 2) Esta reciprocidade era obrigatória devido ao "mana" e "hau", forças espirituais ligadas aos objetos trocados; 3) Todas as trocas assumiam a forma de "potlatch", com a retribuição da dádiva sendo necessária para
Descrição original:
Título original
Troca e Reciprocidade Em Malinowski e Mauss [Trabalho II]
Este documento discute as ideias de Marcel Mauss sobre a dádiva e reciprocidade nas sociedades maori e polinésias. Apresenta três pontos principais: 1) O direito nativo destas sociedades se baseava na lei da reciprocidade da troca de dádivas; 2) Esta reciprocidade era obrigatória devido ao "mana" e "hau", forças espirituais ligadas aos objetos trocados; 3) Todas as trocas assumiam a forma de "potlatch", com a retribuição da dádiva sendo necessária para
Este documento discute as ideias de Marcel Mauss sobre a dádiva e reciprocidade nas sociedades maori e polinésias. Apresenta três pontos principais: 1) O direito nativo destas sociedades se baseava na lei da reciprocidade da troca de dádivas; 2) Esta reciprocidade era obrigatória devido ao "mana" e "hau", forças espirituais ligadas aos objetos trocados; 3) Todas as trocas assumiam a forma de "potlatch", com a retribuição da dádiva sendo necessária para
Trabalho elaborado para a disciplina Temas Clssicos de Antropologia, ministrada pelo Profa. Dra. Renata Medeiros Paoliello. UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA JLIO DE MESQUITA FILHO CAMPUS DE ARARAQUARA CURSO DE CINCIAS SOCIAIS NOTURNO ABRIL 2!" 0 II# MAUSS E A D$DIVA Antes de iniciarmos nossa discusso acerca das contribuies de Marcel Muass para a compreenso do fenmeno da ddiva precisamos, inspirandonos em sua !rande obra" Ensaio sobre a ddiva, introdu#ir a nossa refle$o sobre a %uesto da troca e da reciprocidade atra&'s da leitura de al!uns trechos do Havaml (poema contido na coleo de poemas n)rdicos anti!os" Eda Potico*" +, - .amais encontrei homem to !eneroso e to pr)di!o em alimentar seus hospedes (...* %ue receber em troca lhe fosse desa!rad/&el. 01 - (...* 2s %ue se do mutuamente presentes so ami!os por mais tempo se as coisas conse!uem se encaminhar bem. 0+ - (...* se tens um ami!o em %uem confias e se %ueres obter um bom resultado, con&'m misturar tua alma 3 dele e trocar presentes... 00 Mas se tens um outro de %uem desconfias (...* con&'m di#erlhe belas pala&ras (...* e retribuir fraude por mentira. 104 Mais &ale no re#ar (pedir* do %ue sacrificar demais (aos deuses*" 5m presente dado espera sempre um presente de &olta... 6e&ando em considerao a leitura desses fra!mentos po'ticos escandina&os, nos in%uietamos com tr7s importantes %uestionamentos fundamentais ao escopo in&esti!ati&o da antropolo!ia de Marcel Mauss" Primeiro, precisamos entender %ual o fundamento socio8ur9dico da retribuio do presente 1 nas sociedades :primiti&as;. <e!undo, ser/ necess/rio descobrir %ual a fora social e$istente no presente capa# de tornar obri!at)rio a 1 Dentro da refle$o sobre o fenmeno total da d/di&a, iremos focarnos apenas na%uilo %ue concerne ao seu car/ter aparentemente &olunt/rio, li&re e !ratuito, o %ual, concomitantemente, e$pressase de modo interessado, obri!at)rio e caro. 6o!o, a d/di&a assume (%uase sempre* uma postura de presente !eneroso, mesmo %uando tornase e&idente para n)s o fato disso ser um formalismo, ou melhor, uma mentira social, &elando a &erdadeira obri!atoriedade dos interesses econmicos e sociais (fortalecimento ou en!endro de laos intersub8eti&os*, os %uais manifestamse por tr/s da troca. 1 sua retribuio. =, enfim, procuramos refletir sobre o fato da d/di&a no poder ser considerada, em nenhum aspecto, como um mero fenmeno :e$)tico; do Direito Maori, mas, acima de tudo, ainda possui, nos dias de ho8e, uma !rande influ7ncia social na &i&7ncia das :ci&ili#aes modernas; do ocidente. >a%uilo %ue tan!e a nossa ambio prim/ria com esse sucinto esboo, podemos destacar o fato da tese fundamental do direito nati&o (principalmente dos po&os polin'sios e maoris* ser a lei da reciprocidade da troca, alicerada na tr9plice obri!atoriedade dos fenmenos" dar, receber e retribuir. ?nspirados por esse intuito, podemos destacar a tend7ncia nati&a em nunca negar (l7se sempre doar e sempre receber* hospitalidades, intercambiar presentes e :trocar mulheres;. Por e$emplo, em um ritual de hospitalidade maori reali#ase um con&ite :&oluntariamente obri!at)rio; (no pode ser recusado, mas tamb'm no de&e ser solicitado*, %ue produ# uma situao onde manifestase a necessidade do con&idado diri!irse 3 um tipo de casa de recepo (diferente se!undo as castas* e o seu anfitrio, por sua &e#, precisa ento prepararlhe uma refeio. Depois, ao partir o &isitante recebe de presente al!uns mantimentos para a &ia!em. Portanto, por um lado, dar ' to crucial %uanto receber, ou melhor, como afirma Mauss (@00+*" :>o menos importante ' a obri!ao de dar (...* Recusar dar, ne!li!enciar con&idar, assim como recusar receber, e%ui&ale a declarar !uerraA ' recusar a aliana e a comunho.; (p. @01 - @0@*. Dessa forma, a ess7ncia da reciprocidade contida na troca, acaba fundamentandose na ideia da e$ist7ncia de um elo espiritual de li!ao entre donat/rio e o doador, discutiremos essa %uesto em se!uida. Por outro lado, a instituio social de maior desta%ue entre os nati&os, no %ue di# respeito ao de&er de retribuir, so as prestaes totais ou potlatch, as %uais en&ol&em noes intercone$as dos direitos e de&eres de dar e receber, durante as trocas rituais de mulheres, filhos, alimentos, talisms, ser&ios, entre outros. Bontudo, embora parea pre&alecer uma !rande confuso na formatao do Direitos e da Moral Polin'sia, na realidade, se!undo o antrop)lo!o franc7s" :(...* essa mistura 9ntima de direitos e de&eres sim'tricos e contr/rios dei$a de parecer contradit)ria se pensarmos %ue h/, antes de tudo, mistura de &9nculos espirituais entre as coisas, %ue de certo modo so alma, e os indi&9duos e !rupos %ue se tratam de certo modo como coisas.; (MA5<<, @00+. p. @0@*. @ >esse momento da discusso, che!amos ao nosso se!undo %uestionamento, ou se8a" %ual o fenmeno social respons/&el pela :&oluntariedade obri!at)ria; da troca na populao Maori e Polin'siasC Antes de mais nada, ' preciso compreender %ue a ess7ncia do potlatch @ era e&idente na Polin'sia, isto ', e$pressase atra&'s da ideia da e$ist7ncia de honra e de prestgio contidos no mana pro&eniente da ri%ue#a, mas %ue, ao mesmo tempo, obri!a a retribuir a ddiva, em funo do temor de perder o mana. <e!undo a leitura de Mauss (@00+*, durante um casamento nati&o, ap)s as fam9lias trocarem entre si oloas e os tongas (Presentes rituais especifica e respecti&amente masculinos e femininos* no torna&amse mais ricas, no entanto, e&identemente sentiamse muito mais honradas. Tal como 8/ discutimos, os tongas, se!undo o direito e a reli!io Maori, esto estritamente li!ados a pessoa, ao cl e ao solo, por meio de uma poderosa fora m/!ica, reli!iosa e espiritual" o mana. =ntretanto, a%uilo %ue chamou mais nossa ateno, durante a leitura do Ensaio sobre a ddiva, foi a descoberta do fenmeno do esp9rito Hau (l7se esp9rito das coisas, das florestas e dos animais* contido na troca. 2 informante Tamati Ranaipiri, esclarecenos a situao, na se!uinte passa!em dessa obra" DEou lhes falar do hau... 2 hau no ' o &ento %ue sopra. De modo nenhum. <uponha %ue &oc7 possua um arti!o determinado (taonga* e %ue me d7 esse arti!oA &oc7 me d/ sem preo fi$ado. >o fa#emos ne!ociaes a esse respeito. 2ra, dou esse arti!o a uma terceira pessoa %ue, depois de transcorrido um certo tempo, decide retribuir al!uma coisa em pa!amento (utu*, ela me d/ de presente al!uma coisa (taonga*. 2ra, esse taonga %ue ela me d/ ' o esp9rito (hau* do taonga %ue recebi de &oc7 e %ue dei a ela. 2s taonga %ue recebi pelos taonga (&indos de &oc7*, ' preciso %ue eu os de&ol&a. >o seria 8usto (tika* de minha parte !uardar esses taonga para mim, fossem eles dese8/&eis (rae* ou desa!rad/&eis (kino*. De&o d/los de &olta, pois so um hau do taonga %ue &oc7 me deu. <e eu conser&asse esse se!undo taonga, poderia ad&irme um mal, seriamente, at' mesmo a morte. Assim ' o hau...D (MA5<<, @00+. p. 1,F* Tendo em mente o relato do informante maori, podemos obser&ar a ess7ncia do seu sistema de Direito, ou se8a, o fato de todas as propriedades consideradas por eles como @ =sses fenmenos sociais totais (se assim podemos nome/los* abarcam, de uma s) &e#, as di&ersas instituies nati&as, %ue atuam nos Gmbitos da reli!io, do direito, da moral, da pol9tica, da fam9lia e da economia. + pessoais possuem um hau (l7se um poder espiritual*. >esse sentido, suponhamos %ue um nati&o A presenteie o nati&o H com um taonga. Posteriormente, o nati&o H reali#a uma doao 3 um terceiro, eA !eralmente acabar/ imediatamente recebendo de &olta outro presente, o %ual ' entendido por todos os maoris como pro&eniente do hau da sua d/di&a + . Assim, o hau acaba acompanhando todas as pessoas en&ol&idas no sistema de trocas at' %ue retorne ao seu local de ori!em, melhor obser&ado pelo pr)prio antrop)lo!o franc7s" :>o fundo, ' o hau %ue %uer &oltar ao lu!ar de seu nascimento, ao santu/rio da floresta e do cl e ao propriet/rio.; (MA5<<, @00+. p. 1,,*. =m suma, todas as caracter9sticas %ue en&ol&em a e$presso do hau entre os maoris, atua com intuito de associar os seus interlocutores em um sistema de trocas rituais, at' %ue todas as d/di&as se8am corretamente retribu9das, ou se8a, de forma e%ui&alente ou superior ao recebido. Assim sendo, a forma da retribuio acaba sendo di&ersificada, abarcando desde o trabalho, os ban%uetes, as festas, os presentes, entre outros. =m outras pala&rasA primeiramente, podemos destacar o fato do Direito maori estar embasado na procura do estabelecimento de vnculos de almas, ha8a &ista %ue, os ob8etos intercambiados !uardam em si mesmos uma parte da alma de al!um nati&o. =m se!uida, todas as trocas reali#adas entre os maoris assumem a forma de potlatch, por%ue fa#em parte de um es%uema comple$o e amplo de trocas, cu8a retribuio tornase obri!at)ria (l7se sistema a!on9stico de prestaes totais*, de&ido ao fato dos ob8etos trocados le&arem consi!o um fra!mento da substGncia (l7se alma* do doador, uma fora espiritual e reli!iosa to forte para os maoris, %ue sua conser&ao no somente era considerada peri!osa como muitas &e#es mortal. Por fim, podemos perceber %ue o estudo da antropolo!ia reali#ada por Marcel Mauss no apenas nos propicia a ad%uirir um conhecimento mais profundo sobre a nature#a e o fundamento das sociedades %ue antecederamnosA bem como, nos permite analisar as formas econmicas e morais :primiti&as;, a fim de nos elucidar sobre as causas e conse%u7ncias das crises socioeconmicas da nossa pr)pria sociedade :moderna. ?sso pode ser obser&ado na refle$o feita por ele acer&a da crise econmica da primeira metade do s'culo II 0 , cu8os refle$os sentimos ainda ho8e. >o final das contas, o ensaio do + Portanto, a d/di&a ' o presente com al!o a mais (l7se al!uma coisa al'm de meras relaes comerciais*, tra# consi!o uma caracter9stica da alma do pr)prio doador, no caso dos Maoris ' o esp9rito Hau, e no nosso caso, pode ser a disposio de estar sempre preparado para retribuir a proposta irrecusvel reali#ada pelo persona!em da obra m/$ima de Boppola" Don Borleone. 0 Mauss est/ se referindo a Brise de 1,@,, cu8o emblema foi a %uebra da bolsa de >o&a ?or%ue, a %ual afetou o mundo inteiro de inJmeras formas distintas, transcendendo as influ7ncias de se!unda ordem, ou melhor 0 antrop)lo!o franc7s prope um olhar diferente para as &elhas %uestes %ue acalentam o ima!in/rio da humanidade h/ muito tempo, ou melhor, em suas pala&ras" :=ssa p/!ina de hist)ria social, de sociolo!ia te)rica, de concluses de moral, de pr/tica pol9tica e econmica, no nos le&a, no fundo, seno a colocar mais uma &e#, sob formas no&as, anti!as mas sempre no&as %uestes.; (MA5<<, @00+. p. 1F,*. meramente financeiras. 4 REFERNCIAS BIBLIOGR$FICAS MA5<<, M. !egunda Parte " # ensaio sobre a ddiva$ %ormas e ra&'o da troca nas sociedades arcaicas. ?n" KKKKKK. S%&'%(%)'* + *,-.%/%(%)'*. <o Paulo" Bosac >aifL, @00+, p. 1F+ - @10. M