Você está na página 1de 8

Marcel Mauss: Ensaio sobre a Dádiva (é publicado logo após os

Argonautas do Pacífico Ocidental, de Malinowski, que ao contrário


de Mauss pôde ir à campo).

Princípio Durkheimiano de social é aplicado a mercadoria à


construção do eu e do corpo: indivíduo depende da sociedade –
descobertas de atos coletivos sob bases individuais.
Tese central: A dádiva é fundamento de toda sociabilidade e
comunicação humanas, assim como sua presença e sua diferente
institucionalização em várias sociedades analisadas por Mauss,
capitalistas e não capitalistas. Ora, o argumento central do Ensaio é
de que a dádiva produz a aliança, tanto as alianças matrimoniais
como as políticas (trocas entre chefes ou diferentes camadas
sociais), religiosas (como nos sacrifícios, entendidos como um
modo de relacionamento com os deuses), econômicas, jurídicas e
diplomáticas (incluindo-se aqui as relações pessoais de
hospitalidade).
Relativiza ao afirmar que o comércio não é igualmente universal –
trata-se de um evolucionista que começa a ter um tom crítico
quanto ao próprio evolucionismo. Crítica de Lévi-Strauss: O
conceito de Mauss é muito específico para a abrangência em que
este é utilizado (comparação)

Introdução: Da dádiva e, em particular, da obrigação de retribuir


presentes:
"Um presente dado espera sempre um presente de volta"
Enfoque no caráter voluntário, por assim dizer, aparentemente livre
e gratuito, e no entanto obrigatório e interessado, dessas
prestações. Princípios geradores desta forma necessária de troca:
"Que força existe, na coisa dada, que faz que o donatário à
retribua". Uma arqueologia das transações humanas em outras
sociedades. Existe um mercado econômico, mas o regime de troca
é diferente do nosso: moral e economia que regem essas
transações.
Método de comparação preciso – áreas de estudo: Polinésia,
Melanésia, Noroeste americano, e alguns grandes direitos.
Renúncia a comparação constantes, restringindo o objeto de
estudo.
Estudo dos mesmo Polinésios a quem classificavam como
detentores de uma Economia Natural. Não existe a simples troca de
bens entre indivíduos. Em primeiro lugar pois não são indivíduos,
mas coletividades que se obrigam mutuamente – pessoas morais:
clãs, tribos, famiílias. Além disso, o objeto de troca não é,
exclusivamente, bens economicamente úteis, podendo ser
amabilidades, banquetes, ritos, mulheres, crianças, danas, festas:
Circulação é um termo de um contrato bem mais geral e
permanente (e o mercado apenas um dos momentos): Sistemas de
Prestações Totais. Tipo mais puro nas tribos australianas ou norte-
americanas: Potlatch: "Nutrir", "Consumir" – assmbléia solene da
tribo, uma perpétua festa realizada no inverno em que, segundo as
confrarias hierárquicas, uma trama inextricável de ritos, prestação
jurídica, econômica e determinações de cargos políticos se dá.
Importantes: O princípio da rivalidade e do antagonismos que
domina essas práticas. Briga entre os chefes pela hierarquia que
beneficiará todo o seu clã: prestações totais de tipo agonístico.
Outros casos, como na Polinésia, em que estudaremos a razão que
obriga a restribuição da coisa dada.

I – As dádivas trocadas e a obrigação de retribuí-las (Polinésia)

1. Prestação total, bens uterinos contra bens masculinos (Samoa)


Sistema de oferendas contratuais em Samoa, muito além do
casamento, acompanhando acontecimentos como o nascimento do
filho, a circuncisão, doença, puberdade da moça, ritos funerários,
comércio. 2 elementos essenciais no potlatch: a) o da honra,
prestígio, mana que a riqueza confere; b) obrigação absoluta de
retribuição sob pena de perder esse mana, autoridade, talismã,
fonte de riqueza que é a própria autoridade. Ex: O sacrifício dos
vínculos naturais do nascimento de uma criança facilita a
sistemática de circulação entre propriedades indígenas e
estrangeiras (trocas de bens entre as famílias uterinas e masculina).
Falta apenas a rivalidade, o combate, a destruição para haver
potlatch Oloa: objetos, bens móveis do marido Tonga: propriedade,
tudo o que pode ser trocado, ou como objeto de compensação: uma
propriedade-talismã (definição ampliada).
2. Do espírito da coisa dada (Maori)

Sistema de trocas: dar presentes que devem ser ulteriormente


trocados ou retribuídos; trocadas por tribos ou famílias amigas sem
estipulações. Hau: espírito da coisa dada – idéia dominante do
direito maori: "Os taonga e todas as propriedades rigorosamente
ditas pessoais têm um hau, um poder espiritual. Você me dá um, eu
o dou a um terceiro; este me retribui um outro, porque ele é movido
pelo hau de minha dádiva; e sou obrigado a dar-lhe essa coisa,
porque devo devolver-lhe o que em realidade é o produto do hau do
seu toanga". O hau acompanha todo detentor, todo indivíduo ao
qual o taonga é simplesmente transmitido: hau que quer voltar ao
lugar de seu nascimento. A) Entender a natureza do vínculo jurídico
criado pela transmissão de alguma coisa, que detém uma própria
alma: dar alguma coisa a alguém é dar algo de si; b) obrigação de
retribuir: uma vez que recebe-se uma parte do outro, o que recebeu
vê-se obrigado à dar uma parte de si, não apenas porque seria
ilícito não faze-lo, mas também porque a coisa dada exerce uma
grande influencia mágica sobre quem quer que as possua.

3. Outros Temas: a obrigação de dar, a obrigação de receber


Não se resume somente a obrigação de retribuir, mas também à
obrigação de dar, por um lado, e de receber, pelo outro. Estes 3
atos geram a explicação da forma de contrato entre os clãs
polinésios. Recusar dar é tido como negligenciar convidar, e recusar
receber equivale a declarar guerra (recusar aliança, comunhão). Há
assim uma série de direitos e deveres de dar e receber. Tudo é
matéria de transmissão e de prestação de contas: tudo vai e vem
como se houvesse uma constate troca de uma matéria espiritual
que compreendesse coisas e homens, entre clãs e indivíduos,
repartidos entre as funções os sexos e as gerações.

4. Observação – O presente dado aos homens e o presente dado


às divindades: Presente dado aos homens em vista das divindades
e da natureza: as trocas entre homens incitam os espíritos dos
mortos, as divindades, as coisas, os animais, a natureza a serem
"generosos para com eles". Os homens podem ser tidos como
encarnações xamanísticas, assim a troca entre eles e os contratos
arrasta consigo todo um turbilhão não apenas de homens e de
coisas, mas também de seres sagrados à eles associados.
Tentativa de dar maior abrangência à esta instituição de troca-
dádiva, não restrita apenas à Polinésia; essa interpretação vale
para vários outros grupos de sociedades.

II – Extensão desse sistema. Liberdade, honra, moeda.

1. Regras de generosidade. Andamam

Finalidade Moral: produzir sentimento de amizade entre as partes


envolvidas – rivalidade na generosidade, buscando superar o outro.
Trata-se essencialmente de misturas, das almas nas coisas e as
coisas nas almas; vidas: mistura é dada pelo contrato e troca.

2. Princípios, razões, e intensidade das trocas e de dádivas


(Melanésia)
Conservaram e desenvolveram o sistema de trocas na Melanésia,
aparecendo com mais clareza a noção de moeda. Kula: Sistema de
comércio intertribal, uma espécie de grande potlatch; de ordem
nobre, restrito aos chefes (círculo no qual transitam as coisas).
Muito diferenciado das trocas simples econômicas de mercadorias
úteis (gimwali): dar e receber, os donatários de um dia sendo os
doadores do outro (podem ocorrer na mesma festa) – pode-se
aproveitar o kula de menor envergadura para a troca de
carregamentos. Há uma ritualística durante a troca em que o doador
simula uma modéstia exagerada para demonstrar certa liberalidade,
liberdade, autonomia e grandeza ao ato – mas são no fundo
mecanismos de obrigação.

Objeto essencial dessas trocas-doações: vaygu'a – dois tipos: a)


mwali: braceletes de conchas talhada e polida, usados em grandes
ocasiões; b) soulava: Colares confeccionados por hábeis artesãos
com o nácar da ostra-espinhosa vermelha: usados solenemente
pelas mulheres, e excepcionalmente pelos homens (em caso de
agonia). Os braceletes são transmitidos de Oeste a Leste, e os
colares ao contrário. Devem ser guardados, e as comunidades se
orgulham de possuí-los. Uma propriedade que se tem sobre o
presente recebido, mas que muito difere das categorias jurídicas,
morais, e econômicas do ocidente.

Possui também uma face mítica, religiosa e mágica: vaygu'a


possuem cada um suas idiossincrasias, denotando-lhes um caráter
sagrado. Há a invocação de animais durante o ritual, seja de
crocodilos, ou de aves: sociologicamente, é a mistura dos valores,
das coisas dos contratos, dos homens.

Kula: Ponto culminante da vida econômica e civil, do sistema de


prestações e contraprestações: a) Kula dá origem ao gimwali,
trocas prosaicas que não necessariamente precisam ocorrer entre
parceiros; b) entre os parceiros do Kula passa uma cadeia
ininterrupta de presentes suplementares, dados, retribuídos e
também um comércio obrigatório. A aceitação de uma oferenda
significa a disponibilidade para entrar no jogo, quando não para
permanecer. Durante todo o tempo da troca, intervém atividades
regularmente retribuídas, como a troca de mulheres e
hospitalidade.
Kula intertribal, caso exagerado, mais solene e dramático, de um
sistema mais geral, em que a tribo passa a se relacionar com
outras, transcende suas fronteiras, sendo um légitimo potlatch. O
sistema de dádivas permeia toda a vida econômica e moral dos
nativos. Existem relações análogas ao Kula. Não parece que a troca
seja realmente livre.

Este princípio é relativamente encontrado entre demais tribos de


outros pontos da Melanésia: Melanésios e Papua Nova Guiné tem o
potlatch. Há uma vida econômica que ultrapassa as fronterias das
ilhas e dialetos, e um comércio considerável. Problema:
Incapacidade de abstrair e dividir seus conceitos econômicos e
jurídicos (tal como não conseguiu fazer o direito germânico), os
próprios indivíduos não sabem diferenciar-se: compra e venda,
fazer e tomar empréstimo são expressadas pelas mesmas palavras:
atos antitéticos são expressos pela mesma palavra. Há uma parte
da humanidade que troca coisas consideráveis sob outras formas e
por razões diferentes das que conhecemos.
3. Noroeste americano Indígenas do noroeste americano
apresentam as mesmas instituições, com a diferença de que nelas
sai ainda mais radicais e acentuadas. Tal regime, dada a extensão,
Mauss presume que este regime de trocas foi o de grande parte da
humanidade durante uma fase de transição, e que subsiste em uma
série de povos além dos quais foram descritos: "Esse princípio de
troca-dádiva deve ter sido os das sociedades que ultrapassaram a
fase da "prestação total" (de clã a clã e de família a família), mas
que ainda não chegaram ao contrato individual puro, ao mercado
onde circula dinheiro, à venda propriamente dita e, sobretudo, à
noção de preço calculado em moeda pesada e reconhecida".

III. Sobrevivências desses princípios nos direitos antigos e nas


economias antigas

As etnografias supracitadas permitem a compreensão de uma


evolução social: "instituições desse tipo forneceram realmente
transições para nossas formas", de direito e economia. Podem
servir para explicar historicamente nossa própria sociedade. Nosso
direito e economia se originaram de instituições semelhantes à
essas. Há as distinções jurídicas de direito real e pessoal, bem
como de obrigações e dádivas.

1. Direito pessoal e direito real (direito romano muito antigo)

O vínculo do direito provém tanto das coisas como dos homens.: tal
vínculo é ainda permeado por representações religiosas. Além
deste vínculo religioso, há o do formalismo jurídico, palavras e
gestos. As coisas não são seres inertes, mas fazem parte da posse
da família. Há a figura do contrato. A res, que denota posse, deve
ter sido, anteriormente, como a palavra sânscrito rah, que denota
dádiva, troca. Há, assim, a presença, em algum momento histórico,
de sistemas semelhantes aos descritos na América e Oceania nos
sistemas jurídicos indu-europeus.

2. Direito Hindu Clássico (teoria da Dádiva)

Lei da dádiva aqui descrita só se aplica aos brâmanes, havia um


sistema de potlatch em todo o país, em dois grandes e numerosos
grupos, que desapareceu após séculos de existência. A coisa dada
produz sua recompensa nessa vida e em outra (ex: terras doadas
que produzem o ganho a outrem faz crescer nossos ganhos neste
mundo e no outro). Há, portanto, um fundo teológico-místico nas
doações. É da natureza do alimento ser compartilhado, não dividi-lo
é matar a sua essência (a riqueza é produzida para ser dada). Os
princípios do direito bramânico nos lembram alguns princípios
polinésios, melanésios e americanos: a maneira de receber a
dádiva é análoga. (a casta dos brâmanes, que vive de dádiva,
pretende recusa-las, transgredindo e aceitando as que foram
oferecidas espontaneamente, anotando em listas as pessoas que
doam, criando um vínculo entre doador e donatário: um esta
demasiadamente ligado ao outro). Dádiva: o que se deve fazer,
deve receber, e no entanto é perigoso tomar.

3. Direito Germânico (a caução e a dádiva)

A civilização germânica existiu por muito tempo sem mercados,


tendo ao extremo todo o sistema do potlatch, mas sobretudo o
sistema das dádivas: a vida fora do interior, seja dos clãs ou da
família, era promovida pelo sistema das dádivas. A doação de
presentes aos recém-casados é um exemplo deste sistema. A
necessidade de caução em todos os tipos de contratos germânicos
é outro exemplo, cuja função era promover o vínculo entre as
partes. Há, por outro lado, a dádiva, o presente que pode ser
transformado em veneno – muito recorrente ao folclore germânico.
Direito Céltico: também conheceu tais instituições
Direito Chinês: Conserva uma marcante característica dos tempos
arcaicos: o vínculo indissolúvel entre a coisa com seu proprietário
inicial. Mesmo que ele a venda, sempre poderá "chorar seu bem",
uma espécie de direito de sucessão sobre a coisa.

IV – Conclusão:

1. Conclusão de Moral

É possível estender essas observações a nossas sociedades. Ainda


hoje existe uma certa reciprocidade, como na troca de presentes e
convites, em que ocorre a proibição moral do "ficar em dívida". As
coisas vendidas tem também alguma alma, sendo seguidas pelo
antigo proprietário. Há, além disso, o reaparecimento da dádiva no
direito, em especial nas políticas governamentais de programas
intervencionistas.
O sistema de prestações totais (clã-clã) é o mais antigo sistema de
direito e economia, e o fundo sob o qual se estruturou a moral
dádiva-troca.

2. Conclusões de Sociologia Econômica e Economia Política

Trata-se de uma economia muito rica, repleta de elementos


religiosos. Clãs, gerações e sexos, devido às múltiplas relações
que os contratos ensejam, estão em estado de perpétua
efervescência econômica. No fundo, as dádivas não são nem livres
nem desinteressadas (servindo de contraprestações para manter
alianças e pagamentos de serviços). O Potlatch assume o caráter
de puro gasto dispendioso, a destruição pelo prazer de destruir.
Riquezas é um meio de prestígio e utilidade, muito diferente do
Homo oeconomicus, um produto da Sociedade Ocidental: a busca
individual do útil é muito diferente da fria razão capitalista.

3. Conclusão de Sociologia Geral e de Moral

Este estudo é um guia para que próximos estudos possam ser


feitos. Estuda fatos sociais totais (ou gerais), ou seja, aqueles que
põem em ação a totalidade da Sociedade e das Instituições,
constituindo sistemas sociais inteiros (jurídicos, morais e
econômicos). Importante ver a generalidade dos fatos e a sua
realidade.

Conclusão: As sociedades progrediram na medida que souberam


estabilizar as suas relações; retribuir. Estudo em certos casos
particulares de um comportamento humano total, a vida social
inteira.

Você também pode gostar