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DOSSIER

A ÉTICA EM MGF

A medicina preventiva
ALBERTO PINTO HESPANHOL,* LUCIANA COUTO,** CARLOS MARTINS*

RESUMO
Introdução: Segundo a Carta de Ottawa (OMS, 1986) a Promoção da Saúde consiste no proces-
so que visa criar condições para que as pessoas aumentem a sua capacidade de controlar os facto-
res de risco de natureza ambiental e à
res determinantes da saúde, no sentido de a melhorar. A Prevenção é uma das principais compo-
preservação dos recursos naturais.2
nentes da promoção da saúde. Contudo, a sua aplicação pode levantar múltiplos problemas éticos
passíveis de interferir de forma significativa com o resultado final. Dado que o Objectivo Fundamental
Conteúdo: Neste contexto, à luz dos princípios da ética médica, discute-se a abordagem de alguns da Educação para a Saúde é preventivo,
tópicos relacionados com a prática clínica da Medicina Geral e Familiar actual: os factores de risco, tal como se classifica a Prevenção em
a educação para a saúde, a vacinação como forma de prevenção primária da doença, os rastreios primária, secundária ou terciária assim
como forma de prevenção secundária da doença e o modelo da consulta médica. se poderá fazer o mesmo relativamente
Conclusão: A reflexão sobre alguns dos dilemas éticos que envolvem a prática clínica da Medicina à Educação para a Saúde.2
Geral e Familiar é pertinente e espera-se que possa contribuir para melhorar a forma como se apli- Segundo Tones, enquanto que a pre-
ca a prevenção na prática clínica. Neste âmbito, assume particular importância a evolução que se venção primária pretende reduzir a in-
tem assistido no modelo da consulta e na forma como a decisão médica é tomada. cidência (número de novos casos) de
doença na população, a educação para
Palavras-chave: Ética Médica; Medicina Geral e Familiar; Medicina Preventiva; Promoção da Saúde, Educação a saúde primária diz respeito à promo-
para a Saúde. ção do comportamento que proporcio-
ne bem estar ou evite a doença, como é
o caso de encorajar os hábitos alimen-
ENQUADRAMENTO CONCEPTUAL tares correctos, a vacinação, o exercício
físico e evitar os acidentes.2
Também segundo Tones, enquanto a
este artigo o termo Medi- prevenção secundária pretende reduzir

N cina Preventiva deve ser


entendido como sinónimo
de Promoção da Saúde, a
qual segundo a Carta de Ottawa (OMS,
1986) consiste no processo que visa
a prevalência (número total de casos
presentes) de doença na população, a
educação para a saúde secundária diz
respeito à promoção de realização de
rastreios equacionados para a detecção
criar condições para que as pessoas au- de doença em indivíduos assintomáti-
mentem a sua capacidade de controlar cos assim como à utilização adequada
os factores determinantes da saúde, no dos Serviços de Saúde.2
sentido de a melhorar.1 Finalmente segundo o mesmo autor,
Essa acção em Promoção da Saúde enquanto a prevenção terciária preten-
implica o desenvolvimento de diferen- de reduzir a incapacidade provocada
tes actividades, que podem ser siste- pela doença já estabelecida, a educação
matizadas em três vertentes de acção para a saúde terciária diz respeito à pro-
inter-relacionadas e complementares: moção da aderência à terapêutica assim
• Educação para a saúde – processo como à utilização dos serviços de reabi-
que utiliza a comunicação pedagógica litação.2 Considerando a associação en-
no sentido de facilitar a aprendizagem tre a incapacidade e a doença, a preven-
da saúde; ção terciária implica a «gestão da doen-
Departamento de Clínica Geral da • Prevenção da doença – conjunto de ça crónica» e assim possibilita, numa
Faculdade de Medicina da
Universidade do Porto medidas que visam evitar, detectar e perspectiva populacional, a redução dos
*Centro Saúde de São João da tratar precocemente doenças específi- seus custos sociais e económicos.3
Faculdade de Medicina da cas e eventuais sequelas; Esta classificação é facilmente docu-
Universidade do Porto
**Unidade de Saúde Familiar • Protecção da saúde – conjunto de me- mentada na Educação para a Saúde e
das Camélias didas destinadas ao controlo de facto- na Prevenção de diversas doenças,

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como é o caso da Diabetes Mellitus.4 intervencionismo médico associado a


Outros autores adoptam uma clas- actos médicos inapropriados e, por ou-
sificação diferente de prevenção, em que tro lado, fornecer aos utentes a infor-
a prevenção primária consiste no con- mação necessária para poderem tomar
trolo dos factores de risco modificáveis decisões autónomas, sem falsas expec-
e a prevenção secundária refere-se à tativas, conhecendo as vantagens e as
profilaxia de episódios subsequentes da desvantagens dos métodos diagnósti-
doença. Por outras palavras, a preven- cos ou terapêuticos propostos.8
ção primária compreende o conjunto de Podemos dar vários exemplos de ac-
medidas que tem como objectivo dimi- tividades de prevenção quaternária.8, 10
nuir o risco de determinada doença em Pode ser a simples atitude expectante,
populações assintomáticas, actuando muitas vezes difícil de pôr em prática,
ao nível dos factores de risco, enquan- de «esperar para ver», o chamado «wait
to que a prevenção secundária compre- and see» dos autores anglo-saxónicos,
ende a atitude terapêutica, medicamen- em que se utiliza o tempo como elemen-
tosa ou não, que tem como objectivo re- to importante em termos de diagnósti-
duzir a incidência, morbilidade, depen- co e de tratamento.8
dência e mortalidade da recorrência da Pode ser a resolução de medos me-
doença. dicamente provocados, como por exem-
Contudo, em algumas áreas, como é plo o «medo do colesterol», em cujo tra-
o caso das Doenças Cardiovasculares,5 tamento se utilizam milhões de horas
já se começa a introduzir a designação médicas, de outros profissionais de saú-
de prevenção primordial. A prevenção de e dos próprios utentes, e se gastam
primordial está relacionada com as milhões de euros em análises laborato-
doenças crónico-degenerativas e visa riais e em medicação para «colocar os
evitar o aparecimento de estilos de vida utentes de acordo com as guidelines».
que possam contribuir para um risco Outro exemplo pode ser a estratégia
acrescido de doença, como por exemplo para reduzir o uso de antibióticos e os
a nutrição inadequada, a prática irre- níveis de resistência antimicrobiana. Os
gular de exercício físico/sedentarismo estudos que se têm vindo a realizar so-
e o tabagismo.3 bre a utilização de antibióticos em Por-
Mais recentemente surge um outro tugal, têm evidenciado uma elevada in-
nível de prevenção, a prevenção quater- tensidade do seu uso associada a taxas
nária, também designada por preven- elevadas de resistência antimicrobia-
ção da iatrogenia.6-10 Na realidade, com na.11-14
a crescente utilização na área da saúde Também pode ser prevenção quater-
de novas tecnologias e a realização de nária a crítica a sessões de educação
um maior número de intervenções diag- para a saúde ou campanhas de preven-
nósticas e terapêuticas, as quais ten- ção desnecessárias ou de benefício du-
dem a ser cada vez mais invasivas e so- vidoso, oferecendo aos utentes uma
fisticadas, o intervalo de segurança en- oportunidade de decisão informada.
tre os benefícios e os riscos tem vindo São exemplos, segundo Gérvas, alguns
a diminuir, reduzindo a segurança para tipos de rastreios mamográficos para a
o doente. Assim, a prevenção quaterná- prevenção secundária do cancro da
ria deve ser desenvolvida continuamen- mama.8 Na realidade se existe consen-
te e em paralelo com a actividade clíni- so entre as diferentes recomendações
ca, de modo a evitar o uso desnecessá- na realização da mamografia no grupo
rio e o risco das intervenções médicas.9 etário das mulheres dos 50 aos 69 anos,
A prevenção quaternária visa, por já não existe no dos 40 aos 49 anos.
um lado, evitar ou atenuar o excesso de Também no grupo etário das mulheres

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dos 50 aos 69 anos não foi ainda deter- quaternária também respeita a auto-
minada a periodicidade óptima da rea- nomia do utente ao possibilitar que adi-
lização deste rastreio.15-17 ra ou não à terapêutica prescrita ou a
E finalmente, na área oncológica a conselhos fornecidos nas áreas preven-
prevenção quaternária pode ser enten- tivas ou da doença, após ter sido devi-
dida como «prevenção do sofrimento», damente informado.20
integrando-se nos cuidados paliativos, Da definição de Promoção da Saúde
sendo a quarta fase de controlo do can- retiramos alguns aspectos e acrescen-
cro.18,19 Aparentemente parece tratar- tamos outros que nos parecem, pela
-se de um conceito diferente da preven- sua importância, merecer uma reflexão
ção quaternária anterior, ou seja da pre- especial à luz dos princípios da ética
venção da iatrogenia, contudo tal como médica: os factores de risco e princí-
nos adverte Almeida a prevenção qua- pios da ética médica, a educação para
ternária entendida como «prevenção do a saúde, a vacinação como forma de
sofrimento» orienta os cuidados de saú- prevenção primária da doença, os ras-
de no sentido de proporcionarem uma treios e a consulta médica, decisão e
melhor qualidade aos doentes termi- prevenção – do paternalismo à decisão
nais, prevenindo-se assim as interven- partilhada.
ções médicas desnecessárias.20
A pertinência deste novo tipo de pre-
venção resulta, a nível individual, da
FACTORES DE RISCO E PRINCÍPIOS
detecção de indivíduos em risco de tra- DA ÉTICA MÉDICA
tamento excessivo para os proteger de
novas intervenções médicas inapropria- Muitas das actividades preventivas
das e sugerir-lhes alternativas etica- exercidas no contexto da medicina
mente aceitáveis.6,7 A nível populacio- actual resultam de estudos que eviden-
nal, a sua relevância reside na respos- ciam a associação de determinados fac-
ta que dá ao crescimento dos gastos tores a um risco superior do indivíduo
com cuidados de saúde e que consiste sofrer determinada doença: «factores de
em proporcionar a racionalidade do tra- risco».
tamento, a utilização mais criteriosa O termo «factor de risco» diz respeito
dos recursos em saúde e finalmente a a um estilo de vida ou aspecto do com-
melhoria da qualidade do acto médico. portamento pessoal, a uma exposição
Os principais factores demográficos e ambiental ou a uma característica con-
não-demográficos responsáveis pelo génita ou hereditária, em relação ao
crescimento da despesa com saúde são qual existe evidência epidemiológica de
a inovação tecnológica, o crescimento que está associado a determinada con-
do rendimento das pessoas e o envelhe- dição relacionada com a saúde, condi-
cimento da população, embora a litera- ção essa que se considera importante
tura científica sobre a sustentabilidade prevenir.25 Numa linguagem mais sim-
financeira da saúde faça alusão a ou- ples, usa-se o termo «factor de risco»
tros factores.21-4 para descrever características (factores)
A prevenção quaternária baseia-se que estão associadas positivamente ao
em dois princípios éticos: o princípio da risco de desenvolvimento da doença,
precaução («primum non nocere») e o mas não são necessariamente factores
princípio da proporcionalidade, o qual causais.26 Um factor causal é aquele
estabelece que as eventuais vantagens que ficou estabelecido para lá de qual-
de uma intervenção devem ser pondera- quer dúvida razoável como agente cau-
dos face aos seus hipotéticos riscos, de sal de uma enfermidade.27
modo a evitar a iatrogenia. A prevenção O facto de a decisão de tratar deter-

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minada condição ou de aconselhar a usados para controlar alguns factores


realização de determinados testes ser de risco são disso exemplo. Um outro
baseada em indicadores de associação, exemplo, embora frequentemente es-
frequentemente sem nexo de causalida- quecido, é o desconforto provocado no
de comprovado, pode levantar questões paciente resultante da privação de um
do ponto de vista ético. Será que exis- hábito ou de um estilo de vida, por pre-
tem provas suficientemente robustas tenso aconselhamento preventivo, que
de que os factores de risco se associam constituía para ele uma fonte de bem-
ou causam a doença que se deseja pre- -estar físico, psíquico e social (por exem-
venir? Existirão provas suficientes de plo, a privação de um determinado ali-
que o controlo do factor de risco é efi- mento no contexto de uma dieta para
caz no controlo da doença que se pre- prevenção e controlo da obesidade).
tende prevenir? Para ajudar a respon- Frequentemente, estes dois princí-
der a estas questões, a epidemiologia pios da ética médica, a beneficência e a
tenta medir a contribuição relativa de não-maleficência, apontam para deci-
cada factor na ocorrência da doença e sões opostas e este equilíbrio pode difi-
o correspondente potencial de preven- cultar a decisão na prática clínica. A
ção da doença, supondo a eliminação epidemiologia e a medicina baseada na
ou redução (controlo) desse factor.26 evidência têm, de certa forma, contri-
Este tipo de medição baseia-se sobre- buído para tentar auxiliar, nesta pers-
tudo em cálculos de probabilidades e a pectiva, os médicos e os pacientes nas
evidência é obtida a partir de estudos decisões a tomar. Vão nesse sentido a
em grupos de indivíduos, eventualmen- criação e utilização cada vez mais co-
te do somatório de vários grupos de in- mum dos conceitos «número necessá-
divíduos (meta-análises). Na sua práti- rio para rastrear/tratar» (NNR/T) e «nú-
ca clínica, cada médico acaba por fazer mero necessário para danificar» (NND).
uma extrapolação da evidência obtida O NNR/T indica-nos o número de pa-
a partir desses grupos de indivíduos cientes que é necessário rastrear ou tra-
para o seu paciente individual, com as tar, durante o período de tempo que du-
suas próprias especificidades. Esta ex- rou o ensaio, para evitar um evento adi-
trapolação não é linear, muito menos cional e, na prática, traduz uma forma
consensual e necessita de elevada perí- de medir o grau de beneficência de uma
cia e arte médica, mas pretende sobre- determinada intervenção.28 Quanto me-
tudo aplicar o princípio da benefi- nor este número, maior será a probabi-
cência: agir no melhor interesse do pa- lidade de estarmos a actuar no melhor
ciente. interesse do paciente (beneficência). O
Contudo, muitas das actividades NND indica-nos o número de pacientes
preventivas de aplicação corrente acar- que é necessário rastrear ou tratar para
retam elas mesmas alguns riscos de fazer com que mais um paciente sofra
dano para os pacientes. Sob esta pers- dano provocado pelos efeitos adversos
pectiva, é necessário respeitar o princí- do teste ou da terapêutica.28 Quanto
pio da não-maleficência: os médicos maior este número, maior a probabili-
têm o princípio ético de não provocar dade de não se provocar dano nos pa-
dano nos seus pacientes (primum non cientes (não-maleficência).
nocere). Os falsos positivos de alguns Mas, além dos dois princípios da éti-
testes de rastreio, o desconforto físico e ca médica já referidos, também pode-
psicológico provocado nos pacientes por rão ser discutidos outros princípios no
algumas das técnicas usadas em acti- contexto da medicina preventiva: a au-
vidades preventivas e os efeitos secun- tonomia, a justiça, a veracidade e a ho-
dários de alguns dos medicamentos nestidade.

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Princípio da autonomia: o doente necessário para uma óptima saúde».31


tem o direito de aceitar ou recusar de- Tal como a OMS, a maioria dos au-
terminado teste ou terapêutica. Por ve- tores defende que o conceito de Educa-
zes, o ímpeto preventivo de alguns pro- ção para a Saúde engloba dois aspec-
fissionais de saúde ou de algumas po- tos distintos, embora complementares
líticas de saúde pode colocar em risco – a informação dos utentes sobre a saú-
este princípio. de e a mudança de comportamento pe-
Princípio da justiça/equidade: preo- rante a saúde. As mudanças de conhe-
cupação com a distribuição equitativa cimentos são as mais fáceis de realizar,
dos escassos recursos dos sistemas de seguidas pelas mudanças de atitudes.
saúde. A evolução tecnológica e cientí- As mudanças de comportamentos indi-
fica tem colocado à disposição dos mé- viduais são consideravelmente mais di-
dicos e dos pacientes um número cada fíceis e consomem mais tempo que es-
vez maior de alternativas de testes ou ses dois níveis anteriores. Mas a imple-
terapêuticas preventivas. Alguns des- mentação de mudanças de comporta-
tes, são também consideravelmente dis- mentos de grupos ou de organizações
pendiosos e, financeiramente, poderão são talvez ainda mais difíceis e levem
não ser acessíveis a toda a população e ainda muito mais tempo a conseguir do
poderão não ser sustentáveis para o que qualquer uma das outras.32
serviço de saúde. Existem também dificuldades na rea-
Princípio da veracidade e da hones- lização de sessões de educação para a
tidade: o doente tem o direito de conhe- saúde, das quais se destacam as se-
cer a verdade sobre os testes ou os tra- guintes: formação profissional inade-
tamentos a que é submetido. O mito de quada, recursos humanos e materiais
que a «medicina moderna está muito insuficientes, definição inadequada dos
avançada» e que o homem tudo conse- objectivos educativos, assistência variá-
gue descobrir ou dominar está enraiza- vel às diferentes acções por parte dos
do em muitos dos nossos pacientes. utentes e dificuldades de avaliação do
Frequentemente, o paciente olha para processo e dos resultados.33,34 Trata-se
o resultado de um teste e interpreta-o de uma abordagem comunitária ou es-
como uma verdade absoluta: o teste é tratégia populacional, menos persona-
negativo, logo eu não tenho a doença. lizada, dirigida às populações, mais ins-
Com frequência, o paciente desconhe- titucional, ao nível dos Centros de
ce que a medicina não é uma ciência ab- Saúde e outras organizações comunitá-
soluta, mas que esta é e sempre será «a rias. Contudo os utentes consideram
ciência das probabilidades e a arte das que o Clínico Geral/Médico de Família
incertezas».29,30 (CG/MF) é o seu primeiro contacto em
saúde e ocupa uma posição chave para
lhes prestar conselhos preventivos de
A EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE uma forma credível, ou seja uma abor-
dagem familiar ou estratégia individual,
A Organização Mundial de Saúde (1969) mais personalizada, dirigida aos indiví-
definiu Educação para a Saúde nos se- duos e às suas famílias, ao nível do mé-
guintes termos: «A Educação para a dico e da sua relação médico/doente
Saúde diz respeito a todas as experiên- ou utente.17 Sackett e Haynes e Haynes
cias do indivíduo, grupo ou comunida- e col, citados por Smail,31 reviram cer-
de que influenciam crenças, atitudes ca de 800 artigos originais sobre a ade-
ou comportamentos referentes à saúde, rência à terapêutica prescrita ou a con-
assim como aos modos e aos esforços selhos fornecidos nas áreas preventivas
de produzir a mudança, quando isso é ou da doença, com predominância des-

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tes últimos. Concluíram que uma série ções em que opiniões médicas, que
de factores não estavam correlaciona- mostraram estar erradas com o passar
dos com a aderência à terapêutica ou a dos tempos, foram transmitidas como
conselhos, como p.ex. a gravidade dos verdadeiras a um público insuspei-
sintomas, o tipo dos sintomas, a dura- to.31,39
ção dos sintomas, a idade do doente, o A complexidade das necessidades e
sexo do doente, o prognóstico do médi- dos problemas de saúde de utentes e fa-
co sobre a aderência do seu doente. mílias desfavorecidas bem como a inte-
Contudo encontraram correlações com racção entre os vários determinantes
a satisfação do utente com o seu médi- da saúde (físicos, psicológicos, sociais e
co, para além de outras características ambientais) obriga o CG/MF a desen-
do regime terapêutico prescrito pelo mé- volver esforços no sentido de tornar a
dico e do tipo de serviços prestados: educação para a saúde efectiva, execu-
continuidade de prestação de cuidados tando uma variedade de estratégias em
médicos, pouco tempo de espera pela colaboração com diferentes servi-
consulta, organização adequada da uni- ços.17,40,41
dade de saúde, vigilância médica con- Deve ser sempre disponibilizada ao
tínua da terapêutica, encorajamento à utente uma explicação do procedimen-
auto-vigilância do utente e regime tera- to preventivo recomendado, ou seja,
pêutico simples.31 Têm vindo a surgir na educação para a saúde que promova a
literatura médica outros factores que realização da prevenção aconselha-
aumentam a eficácia da educação para da.15,16,42,43 Isto também se aplica ao
a saúde prestada pelos CG/MF, como aconselhamento a prestar ao utente
por exemplo: sentimento de confiança para o informar que um determinado
no CG/MF por parte do utente,35 envol- procedimento não está recomendado
vimento do utente no processo de toma- como prevenção, como é o caso do ras-
da de decisão durante a consulta,36 treio do PSA (Prostate Specific Antigen)
identificação dos benefícios e dos cus- em homens assintomáticos. 15-17,42,43
tos,37 implementação de estratégias que Ultimamente, tem vindo a aumentar
visam ajudar os utentes a recordar con- a referência na literatura científica a
selhos preventivos previamente admi- factores de risco em populações saudá-
nistrados.38 veis, ao ponto de se falar numa «epide-
Assim, a educação do utente em ge- mia de riscos», que acarreta que um
ral diz respeito não só às crenças, ati- número cada vez maior de indivíduos
tudes e comportamentos perante a Saú- saudáveis seja considerado «em risco»
de e factores que os influenciam, mas e tenha necessidade de cuidados médi-
também às estratégias educacionais e cos.44 A sociedade tem vindo a evoluir
comportamentais que podem ser utili- de uma morte evitável e sem diagnósti-
zadas para as modificar. Os objectivos co para uma «cultura do risco», do medo
Gerais da Educação para a Saúde po- inevitável de morrer. Segundo Gérvas e
dem-se expressar do seguinte modo: Fernández, o risco epidemiológico, ou
1. INFORMAR OS UTENTES ACERCA DA SAÚ- seja, a simples associação estatística
DE E DOS SEUS PROBLEMAS EM GERAL OU EM entre um factor e uma doença, quase
PARTICULAR. Em primeiro lugar, antes de se converte numa doença ou numa cau-
se tentar alterar o comportamento das sa necessária e suficiente da mesma.8
pessoas, devem os profissionais envol- Segundo alguns autores trata-se da
vidos estar perfeitamente habilitados a «medicalização» dos factores de risco e
explicitar as razões que justificam os da sociedade,45,46 a que se junta o ale-
seus propósitos. Na realidade, a histó- gado «marketing de medo», da respon-
ria da medicina está repleta de situa- sabilidade de alguma indústria farma-

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cêutica, visando sobrestimar as situa- na adopção dos comportamentos.17,34


ções clínicas e os factores de risco na Recordando que os fins não justifi-
população e «medicalizar» as situações cam os meios, não bastará que a mu-
fisiológicas.47 Jordan (1984) e Becher dança do comportamento seja compro-
(1986), ambos citados pelo Grupo de vadamente benéfica para a saúde do
Educación Sanitaria y Promoción Sani- indivíduo ou da população, também os
taria y Promoción de la Salud semFYC métodos utilizados para a fazer são im-
(PAPPS),34 criticam a educação para a portantes, não devendo ser considera-
saúde por acentuar a responsabilidade dos como éticos aqueles que provoquem
individual associada aos estilos de vida um certo grau de ansiedade na popu-
pessoais o que foi descrito como a «cul- lação.31,39
pabilização da vítima» ou a « tirania da Diversos estudos retrospectivos tes-
promoção da saúde». Contudo, outros taram positivamente a validade do Mo-
autores referem que não se trata de delo de convicções perante a saúde
«medicalizar» a vida quotidiana, mas (Health Belief Model) na explicação ou
sim de facilitar e de estimular as mu- alteração do comportamento da aderên-
danças voluntárias em direcção a op- cia aos regimes terapêuticos e aos con-
ções mais saudáveis, respeitando as- selhos preventivos. Este modelo, tam-
sim a autonomia do utente, o que pres- bém conhecido pelo «Modelo dos três S»,
supõe que o utente possa aceitar ou sugere que a aderência a um conselho
recusar terapêuticas ou conselhos pre- preventivo dependerá de: percepção da
ventivos, após ter sido adequadamente Susceptibilidade, percepção da Serie-
informado.34 dade da ameaça de doença, viabilidade
Finalmente, mas não menos im- da Solução proposta.17, 31,34
portante, podem surgir problemas éti- Este modelo aplica-se a simples mu-
cos na área da relação médico/doente danças comportamentais como realizar
quando se confrontam as expectativas uma citologia cervicovaginal ou uma
cada vez maiores, expressas pelos uten- mamografia, contudo determinado tipo
tes, no sentido de serem informados de educação para a saúde pode reque-
acerca da sua saúde e dos seus proble- rer acções mais complexas durante um
mas em particular, com a relutância do período mais longo, como por exemplo
CG/MF em aceder a essas solicitações, a perda de peso, o aumento da activida-
invocando múltiplas razões que vão de física ou a abolição do tabagismo.
desde o cepticismo com que encara a Nestas circunstância pode-se utilizar
eficácia da educação para a saúde ou o por exemplo o Modelo das etapas de
receio de provocar ansiedade entre os mudança comportamental (Prochas-
seus utentes ao realizá-la, até à cons- ka,1984), que formula a hipótese de que
tatação da dificuldade que sente em as mudanças comportamentais obede-
executá-la por falta de tempo.31,39 cem a uma série de etapas, tanto nas
2. TENTAR MUDAR O COMPORTAMENTO DOS alterações espontâneas como nas que
INDIVÍDUOS PARA O BENEFÍCIO DA SUA PRÓ- obedecem a recomendações terapêuti-
PRIA SAÚDE E ENCORAJÁ-LOS A EVITAR AS SI- cas. Estas etapas de mudança podem
TUAÇÕES QUE CONDUZEM À DOENÇA. Nos ser explicadas como uma progressão
últimos anos foram propostos diversos ao longo de um processo, que se inicia
Modelo Teóricos explicativos das mu- com uma etapa de pré-contemplação,
danças comportamentais na área da continua com uma etapa de contempla-
adopção de hábitos saudáveis, que pre- ção, seguida duma etapa de prepara-
tendem identificar os determinantes ção, terminando com as etapas de ac-
comportamentais e a influência relati- ção e manutenção.17,34
va dos diferentes processos cognitivos 3. INFORMAR O PÚBLICO DOS SERVIÇOS DE

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SAÚDE DISPONÍVEIS, PROMOVENDO A SUA UTI- tante nos nossos dias quando observa-
LIZAÇÃO ADEQUADA. Muitos dos utentes mos os progressos na convocação de
inscritos num determinado CG/MF re- utentes por meio de registos, muitos já
correm aos Serviços de Saúde sem te- computorizados, os quais podem indu-
rem motivo suficiente para o fazer, en- zir o público a pensar que o seu CG/MF
quanto que outros não o fazem, embo- tomará toda a responsabilidade pela
ra tivessem motivo de saúde justificati- correcta programação dos diversos ti-
vo. Na realidade, dado que os recursos pos de serviços preventivos, como por
não são infinitos, será necessário de- exemplo a vacinação e outros rastreios
sencorajar alguns utentes a sobre- oncológicos.15-17,42,43 Muito embora estes
-utilizarem os Serviços de Saúde com sistemas possam ser extremamente be-
vista a libertá-los para outros, manten- néficos é importante realçar que só de-
do assim a eficácia dos Serviços. É nes- vem ser interpretados como sistemas do
te sentido que se desenvolve o conceito tipo «memorando», ficando a responsa-
actual da Qualidade em saúde, ou seja, bilidade na procura dos Serviços de
satisfazer as necessidades dos que mais Saúde a cargo de quem a compete – o
necessitam do serviço, ao mais baixo utente.
custo, e respeitando os limites e di-
rectivas da profissão e do contratante A VACINAÇÃO COMO FORMA DE
(Ovretveit, 1992).48 Esta definição inclui
preocupações de equidade e de exi-
PREVENÇÃO PRIMÁRIA DA DOENÇA
gências técnicas, engloba exigências
éticas e exige obediência contratual. Na A planificação atempada e adequada da
realidade é importante não só dar sa- cobertura vacinal para cada grupo etá-
tisfação aos utentes que recebem rio populacional no âmbito dos cuida-
os serviços de saúde mas também dos de Medicina Preventiva é uma for-
assegurar que todos os que necessitam ma importante de prevenção primária
de um determinado serviço poderão da doença. A vacinação tem dois objec-
obtê-lo.49 tivos temporalmente distintos, a curto
4. PROMOVER A RESPONSABILIDADE DOS prazo propõe proteger os indivíduos e a
UTENTES PELA MANUTENÇÃO DA SUA PRÓ- comunidade contra doenças infeccio-
PRIA SAÚDE. A nível da Medicina Geral e sas graves como a poliomielite e o téta-
Familiar o aconselhamento acerca dos no, enquanto que a longo prazo preten-
estilos de vida relacionado com a saú- de erradicar, sempre que possível, a
de debate-se com algumas dificuldades doença a que se dirige.50
e que fundamentalmente são, segundo No plano de saúde individual, a ní-
Demack (1987), citado pelo Grupo de vel dos cuidados antecipatórios, a pro-
Educación Sanitaria y Promoción Sani- tecção que se pretende com a adminis-
taria y Promoción de la Salud semFYC tração das vacinas a toda a população,
(PAPPS): o CG/MF espera «sucessos te- sem olhar a classes sociais, tem um po-
rapêuticos», a curto ou a médio prazo, tencial igualitário (justiça social) sendo
ao passo que o utente espera mais um expressão do princípio da universalida-
«tratamento» do que conselhos; os pro- de. Constitui ainda uma forma de in-
fissionais receberam formação insufici- tervir oportuna e apropriada para pro-
ente para lidar com questões relaciona- mover e manter a equidade social pro-
das com estilos de vida; muitos utentes tegendo a população de doenças mais
estão pouco predispostos a assumir a graves (beneficência), ponderando sem-
responsabilidade sobre a sua própria pre a relação benefícios/riscos (não ma-
saúde.34 leficência). 51,52
Este objectivo é cada vez mais impor- A sub-imunização é um problema

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DOSSIER
A ÉTICA EM MGF

importante em algumas comunidades um todo, adoptar medidas de protec-


e dentro destas em alguns grupos. ção, como por exemplo vigilância ou iso-
Quando consideramos a prestação de lamento que limitam a liberdade indivi-
cuidados à população infantil, tem de dual. Noutros casos como a gripe, ao va-
ser feito um esforço para informar os cinar os indivíduos com mais de 65
pais e crianças acerca das vacinas dis- anos e os outros doentes de risco, a
poníveis, da sua efectividade e seguran- doença tem menos impacto, mas exis-
ça.53 No entanto, alguns autores consi- te uma obrigação de cada um de evitar
deram que as vacinas são uma interfe- infecções que possam levar a interna-
rência física num doente saudável e não mento com custos acrescidos; também
um tratamento a uma doença estabe- as outras pessoas devem ter a oportu-
lecida. Do ponto de vista ético torna-se nidade e a responsabilidade de se pro-
necessário informar adequadamente tegerem. 55
quem vai receber estes cuidados sobre Outro aspecto da prevenção primá-
os riscos e benefícios que podem com- ria das doenças tem a ver com o aumen-
portar e obter por parte dos familiares to das viagens num mundo global em
ou dos seus representantes o consen- que nenhuma doença está longe de
timento informado (beneficência/não atingir qualquer população. Cada vez
maleficência).50,54 A promoção vacinal mais pessoas em cada ano fazem via-
nas instituições de saúde não deve es- gens internacionais por razões de tra-
quecer de referir as suas vantagens e in- balho ou de lazer, com benefícios eco-
cluir também a referência aos possíveis nómicos e sociais para as populações,
efeitos laterais, garantindo a liberdade mas com potenciais custos médicos pe-
de decisão, tendo por base os princípios las oportunidades criadas para dissemi-
éticos da justiça e da solidariedade, em nação de infecções. A Medicina do via-
paralelo com a autonomia da decisão de jante desempenha um papel vital, não
aceitação ou não da vacinação.54 É im- só na limitação da morbilidade das
portante não só dar satisfação aos uten- doenças relacionadas com as viagens,
tes que recebem os cuidados de saúde mas também na limitação da dissemi-
sobre as vantagens e possíveis incon- nação de doença. Nesta área de inter-
venientes, mas que todos os que neces- venção, deve ter-se em atenção os loca-
sitam dos serviços possam obter esses is com problemas específicos, como por
cuidados.49 exemplo zonas endémicas para a ma-
A relação entre a ajuda utilitária de lária, a febre amarela e outros riscos e
promoção da saúde pública e a protec- efectuar aconselhamento e orientação
ção da privacidade e liberdade de mo- adequada a todos os que viajam, infor-
vimentos no contexto de doenças com mando das precauções gerais com ali-
diferentes graus de contagiosidade e mentos, água, medicação profilática e
propagação, é uma questão ética valo- outras, bem como devem receber as va-
rizável, envolvendo em países pobres cinas recomendadas de acordo com o
também questões de justiça social, uma local para onde se deslocam.56-8
das preocupações centrais da ética.49 A saúde não é apenas um bem indi-
Outra preocupação ética importante vidual mas também um bem social e
é fazer o possível para que os outros não económico, reflectindo-se no domínio
sejam infectados, nomeadamente no da política da saúde, da desigualdade
que diz respeito à infecção pelo HIV, tu- social e económica, da aceitação da saú-
berculose multiresistente e novas doen- de como bem comum e dos princípios
ças emergentes como a Síndroma Res- éticos essenciais que estão claramente
piratória Aguda podem ameaçar a saú- associados a uma visão consensual de
de dos outros. A sociedade pode, como dignidade humana. 59

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DOSSIER
A ÉTICA EM MGF

refere aos aspectos éticos deste tipo de


OS RASTREIOS
prevenção secundária, há que ter em
consideração que certas investigações
Um dos papéis chave da Medicina Ge- e tratamentos podem ser potencialmen-
ral e Familiar é a prevenção da doença. te nocivos. Deve-se ter em conta que po-
Os especialistas de Medicina Geral e dem surgir prejuízos devido ao facto de
Familiar estão em posição privilegiada pessoas assintomáticas após a realiza-
para permitirem à população de que ção do rastreio passaram a ser catalo-
cuidam os programas de prevenção se- gadas como doentes, com as implica-
cundária com rastreios adequados.60 ções sociais de tais intervenções.60 Po-
Nos cuidados de saúde primários são dem também surgir neste tipo de ava-
observados cerca de 86% da sua popu- liação falsos positivos, efeitos físicos
lação em cada ano, desempenhando como por exemplo desconforto provoca-
por isso um papel central nos cuidados do pelo rastreio, identificação de can-
de saúde, seja na observação oportunis- cros sem relevância clínica e efeitos psi-
ta do doente que se lhe apresenta com cológicos nas pessoas como a ansieda-
um problema numa consulta não pro- de durante a sua aplicação.17
gramada, podendo antecipar necessi- Para a realização de rastreios popu-
dades preventivas, seja convocando o lacionais deve existir sustentação cien-
doente para avaliações programadas. tífica desses programas de rastreio,
De acordo com os princípios estabele- através de ensaios controlados e rando-
cidos para se implementar um rastreio, mizados, de estudos de correlação e
a doença a ser objecto de rastreio deve observacionais, como estudos de estu-
constituir um problema de saúde im- dos de caso-controlo e estudos de coor-
portante, a sua história natural deve te, para se demonstrar numa análise do
ser bem conhecida, deve ter uma fase Custo-Efectividade do Rastreio a sua
pré-sintomática relativamente prolon- evidência e assim avaliar as vantagens
gada, deve ser aplicado de forma acei- da aplicação de tal procedimento.60 To-
tável em termos de validade, de morbi- mando como exemplo a avaliação da
lidade, de riscos e de custos e para os tensão arterial a pessoas com mais de
resultados positivos devem ser assegu- 18 anos de 2 em 2 anos, esta tem um
rados métodos de confirmação diagnós- nível de evidência de boa qualidade,
tico aceitáveis. Deve existir um trata- obtida de revisão sistemática de todos
mento acessível e aceitável em termos os ensaios randomizados controlados,
de efectividade, morbilidade, riscos e enquanto que não existe evidência para
custos e deve resultar da aplicação de se efectuar rastreio do cancro do pul-
um determinado rastreio a redução da mão por radiografia pulmonar.60 Em
morbimortalidade e a melhoria da qua- contrapartida, pela divulgação desta
lidade de vida das populações.60 forma de prevenção secundária são
Antes da realização do rastreio deve criadas nas populações expectativas
ser feito aconselhamento informado e cada vez maiores sobre as intervenções
acções subsequentes, pois o diagnósti- na sua saúde.42
co de doença por rastreio pode ter po- A igualdade de acesso à prevenção
tenciais impactos psicossociais, poden- tem sido identificada como uma prio-
do ser necessário aconselhamento ade- ridade de saúde pública pela OMS, de-
quado após o diagnóstico.60 vendo ser sempre disponibilizadas aos
Os rastreios envolvem questionários, utentes as explicações dos procedimen-
testes realizados na população para tos preventivos recomendados para ele,
identificar os mais susceptíveis à doen- tendo em conta o seu grupo etário e as
ça e às suas complicações. No que se suas susceptibilidades individuais e

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DOSSIER
A ÉTICA EM MGF

também conseguir a sua adesão à rea- das (Quadro I).


lização de tais procedimentos.15,16,39,41,61 No princípio da década de 80, Ian
Existem estudos que revelam desi- McWhinney e Moira Stewart apresen-
gualdades económicas no uso dos cui- taram o «método clínico centrado no pa-
dados de medicina preventiva, nomea- ciente» (Quadro II).65,66
damente nos rastreios oncológicos, Sensivelmente na mesma altura, o
identificando-se uma maior utilização Schofield e Pendleton sugeriram que a
destes procedimentos pelas classes so- boa prática da consulta se deveria ba-
cioeconómicas mais favorecidas, parti- sear no alcançar de sete tarefas: as «sete
cularmente em relação à utilização de tarefas de Pendleton» (Quadro III).68
mamografia no rastreio do cancro da Na década de 90, na sequência dos
mama e à realização da citologia cervi- estudos efectuados por Wennberg e
co-vaginal no rastreio do cancro do colo Mulley sobre o incorporar das preferên-
do útero, sendo menos utilizado o ras- cias dos pacientes nas decisões médi-
treio do colesterol. A população social- cas 69 e sobre instrumentos que servem
mente mais desfavorecida estará em de apoio à decisão do paciente,70 o con-
maior risco de saúde, mas utiliza me- ceito do envolvimento dos pacientes nas
nos estes rastreios.62,63 O especialista decisões médicas torna-se no centro da
de Medicina Geral e Familiar cuidando discussão académica sobre a consulta.
de uma lista de utentes e contactando Surge o conceito da decisão partilhada
ao longo do tempo com estas famílias
pode e deve identificar as pessoas de ris-
co de forma individual ou por interven- QUADRO I
ção na família, de forma sistemática ou PADRÃO DAS CONSULTAS OBSERVADAS
oportunista, e posteriormente convocar POR BYRNE E LONG64
para rastreios adequados a cada um,
garantindo os princípios de ética de • O médico estabelece uma relação com o paciente
igualdade e justiça social.15,16,39,42 • O médico tenta descobrir o motivo da consulta
• O médico procede à anamnese e ao exame físico
CONSULTA MÉDICA, DECISÃO E PREVENÇÃO – • O médico, ou o médico e o paciente, ou o paciente
(nesta ordem de probabilidade) consideram a condição
DO PATERNALISMO À DECISÃO PARTILHADA
em causa (a patologia, o diagnóstico)
• O médico e, ocasionalmente, o paciente determinam os
Ao longo do tempo, a consulta médica, detalhes do tratamento ou da investigação que irá ser
a relação entre médico e paciente e a for- conduzida
ma como as decisões médicas foram
sendo tomadas, evoluíram na sua for-
ma, metodologia e conteúdo. Esta evo- QUADRO II
lução tem acompanhado a evolução da COMPONENTES DO MÉTODO CLÍNICO CENTRADO
própria sociedade e tornou-se mais evi- NO PACIENTE65,67
dente com as transformações da segun-
da metade do século XX e com os estu- • Exploração da doença e da dolência do paciente
dos sobre a consulta médica desenvol- • Compreensão da pessoa no seu todo e no seu contexto
vidos a partir da década de 70. • Estabelecer o terreno comum sob uma perspectiva de
Byrne e Long publicaram em 1976 os gestão
resultados da sua investigação sobre a • Incorporar a promoção da saúde e a prevenção
consulta médica no contexto da clínica da doença
geral.64 No seu estudo, gravaram mais • Construir a relação médico/paciente
de 2000 consultas e da análise resul- • Ser realista
tou um padrão das consultas observa-

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DOSSIER
A ÉTICA EM MGF

com os pacientes. Glyn Elwyn propõe Analisando esta «viagem» efectuada


um conjunto de aptidões para o profis- pelos vários modelos de consulta, facil-
sional de saúde alcançar uma decisão mente nos apercebemos que partimos
partilhada com os seus pacientes (Qua- de um modelo de consulta e de decisão
dro IV).71 médica essencialmente paternalista até
chegarmos ao modelo da decisão parti-
lhada que ultrapassa já o simples con-
QUADRO III sentimento informado e assume as ca-
AS SETE TAREFAS DA CONSULTA DE PENDLETON68
racterísticas próprias da era pós-mo-
derna em que vivemos.72 A voz única do
1. Definir o motivo da consulta do paciente (ideias, médico, reinante no modelo paternalis-
preocupações e expectativas) ta, deu lugar à presença de múltiplas
2. Considerar outros problemas «vozes» na consulta (p.ex. voz do pacien-
3. Com o paciente, escolher a atitude apropriada para te, voz da indústria farmacêutica, voz da
cada problema comunicação social e voz da evidência
4. Alcançar um entendimento partilhado dos problemas científica) (Quadro V). De um modelo
5. Envolver o paciente na gestão e encorajá-lo à mais centrado na agenda do médico,
aceitação de responsabilidades como o descrito pelas observações de
6. Usar apropriadamente o tempo e os recursos Byrne e Long, evoluímos para modelos
7. Estabelecer uma relação que ajude a alcançar em que a agenda do paciente se tornou
as outras tarefas mais relevante, como o método clínico
centrado no paciente e o modelo de de-
cisão partilhada.
QUADRO IV A relação dos poderes na consulta
APTIDÕES DO MÉTODO DE DECISÃO
também se alterou substancialmente.
PARTILHADA – GLYN ELWYN71
Do poder do médico que era predomi-
nante no modelo paternalista, tende-se
• Definição do problema a evoluir para um equilíbrio de poderes,
• «Equipoise» entre médico e paciente. E assim so-
• Exposição das opções brevêm também características como a
• Verificar o entendimento opção individual e a autonomia.
• Ideias, preocupações, expectativas Vários factores terão contribuído
• Preferência do papel para esta evolução. Certamente que a
• Tomar a decisão revolução das tecnologias de informa-
• Deferimento ção com maior acessibilidade à informa-
• Rever a necessidade de ajustamentos da decisão ção sobre saúde, quer pelos profissio-
nais de saúde, quer pela população e

QUADRO V

CARACTERÍSTICAS DE MODELOS DE CONSULTA E DECISÃO MÉDICA

Paternalista Decisão partilhada


Transferência Uma via: do médico para o paciente; o mínimo Duas vias: médico fornece toda a
de informação necessário para o consentimento informado informação necessária para a tomada de
decisão, o paciente fornece informação
sobre os seus valores e opções
Deliberação Pelo médico ou com outros médicos Médico e paciente (e, potencialmente,
outros)
Decisão Médico Médico e doente

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A ÉTICA EM MGF

uma maior acessibilidade aos cuidados complexidade cada vez maior. A Medi-
de saúde terão sido alguns dos factores cina Preventiva colocar-nos-á também
motivadores desta evolução. Contudo, desafios mais complexos. Basta pensar
também terão existido aspectos éticos nos desafios que a investigação cientí-
que contribuíram para esta evolução. O fica no campo da genética nos coloca-
tradicional modelo paternalista não res- rá. Contudo, parece-nos que a melhor
peita alguns dos valores e princípios éti- prática e o respeito pelos princípios éti-
cos fundamentais como, por exemplo, cos seguirá os passos da evolução aqui
o princípio da autonomia. Immanuel apresentada.
Kant definiu a autonomia como a pos-
sibilidade do «próprio efectuar opções e
tomar decisões, sendo o próprio uma
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toma decisões pelo outro, o outro não 1. WHO. Ottawa Charter for Health Promo-
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Neste contexto, centremos agora a
5. Ministério da Saúde. Programa Nacional
nossa reflexão sobre a componente pre- de Prevenção e Controlo das Doenças Cardio-
ventiva da Medicina Geral e Familiar. vasculares. Despacho nº 16415/2003 (II série)
Atendendo aos problemas éticos que a – D. R. nº 193, de 22 de Agosto.
Medina Preventiva pode levantar, pare- 6. Jamoulle M. Quaternary prevention: pre-
ce-nos óbvio que levar em consideração vention as you never heard before (definitions
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ABSTRACT
Introduction: According to the Ottawa Charter (WHO, 1986), Health Promotion is the process of
enabling people to increase control over, and to improve, their health. Prevention is a major com-
ponent of Health Promotion. However, applying prevention may raise multiple ethical issues which
can interfere with the final result.
Content: Under this context and based on the principles of medical ethics, we discuss some clini-
cal practice topics related with the modern Family Medicine: risk factors, health education, immu-
nization, screening and the model of consultation.
Conclusion: The reflection about some ethical dilemmas surrounding the clinical practice in Family
Medicine is expected to contribute to improve the way prevention is performed. Particular rele-
vance and attention should be given to the evolution of the consultation model and of the medi-
cal decision model.

Keywords: Medical Ethics; Family Medicine; Preventive Medicine; Health Promotion; Health Education.

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