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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ


PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS
COORDENAÇÃO DO MESTRADO ACADÊMIO EM LETRAS
Disciplina: Literatura, Cinema e Sociedade
RESPONSÁVEIS PELO FICHAMENTO E CONDUÇÃO DA DISCUSSÃO:
Géssica da Silva Pereira
Área de Concentração: Estudos Literários
Professora: Margareth Torres de Alencar Costa
Carga Horária: 45 horas
Período: 2017.1
FOUCAULT, M, Vigiar e punir: nascimento da prisão; tradução de Raquel Ramalhete. Petrópolis,
Vozes, 1987. 288p.

VIGIAR E PUNIR: NASCIMENTO DA PRISÃO


com entusiasmo. Como pano de fundo,
1- SOBRE O AUTOR Foucault vivia os tormentos da Segunda
Paul-Michel Foucault nasceu em 15 de Guerra Mundial. Decepcionando a
outubro de 1926. Filho de Paul Foucault, expectativa de seu pai de que se tornasse
cirurgião e professor de anatomia em Poitiers, médico, e apoiado pela mãe, Foucault segue
e Anna Malapert, Michel pertencia a uma seu rumo à filosofia.
família onde a medicina era tradição, pois O fato de pertencer a uma família
tanto o avô paterno quanto o materno eram burguesa, possibilitou a Foucault um auxilio
cirurgiões, mas Michel traçou o próprio frente as suas necessidades econômicas.
caminho. Desde cedo demonstrou interesse Foucault e o pai tinham uma relação
pela história influenciado por um professor conturbada, o que não se repetia com a mãe,
que teve ainda na escola, padre De com quem mantinha forte vínculo. Mudou-se
Montsabert. para Paris em 1945, e retornava sempre que
Foucault era uma pessoa curiosa, o que fazia podia para visitar a mãe em Poitiers.
com que buscasse por conta própria suas Enquanto preparava-se para provas,
leituras. Seu interesse pela filosofia não concorrendo a vagas como aluno na École
tardou a aparecer, aprofundando seus estudos Normale da rue d’Ulm, Foucault entrou em

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contato com Jean Hyppolite, professor que lhe universidades, em países como: Alemanha,
ensinou Hegel e reforçou seu encanto e sua Suécia, Tunísia, EUA, etc.
vocação para a filosofia, marcando-o Trabalhou durante muito tempo como
profundamente. Em 1946, iniciou seus psicólogo em hospitais psiquiátricos e prisões.
estudos na École Normale da rue d’Ulm. Escreveu para diversos jornais. Viajou o
Foucault trazia com ele a característica de ser mundo apresentando conferências. Em 1955
uma pessoa solitária e fechada, o que foi mudou-se para Suécia, onde conheceu
tornando-se cada vez mais forte, pois as Dumézil. Este contato foi importante para a
relações e a competitividade por parte dos evolução do pensamento de Foucault, pela
alunos desta escola fizeram com que ele idéia de estrutura que Dumézil desenvolveu.
recuasse ainda mais do contato social.
Tornou-se uma pessoa agressiva e irônica, FONTE:
características estas que se mantiveram por https://www.ufrgs.br/corpoarteclinica/?page_i
toda sua vida. d=70
Em 1948 Foucault tentou suicídio, o 2- APRESENTAÇÃO DA OBRA
que acabou levando-o a um tratamento
Vigiar e punir: nascimento da prisão é
psiquiátrico. Este impulso, retornou outras
um livro do filósofo francês Michel Foucault,
vezes em sua vida. Segundo o psiquiatra que
publicado originalmente em 1975 e tido como
o acompanhou, esta atitude estava ligada à
uma obra que alterou o modo de pensar e
dificuldades frente a sua homossexualidade,
fazer política social no mundo ocidental. Só
que começava a anunciar-se. Esta experiência
foi publicado no Brasil traduzido em 1987.
colocou-o pela primeira vez em contato com a
É um exame dos mecanismos sociais e
psiquiatria, psicologia e psicanálise, o que
teóricos que motivaram as grandes mudanças
marcou profundamente a sua obra.
que se produziram nos sistemas penais
Licenciado em filosofia pela Sorbone em
ocidentais durante a era moderna. É dedicado
1948, em 1949 licenciou-se em psicologia.
à análise da vigilância e da punição, que se
No ano de 1952 cursou o Instituto de
encontram em várias entidades estatais
Psychologie e obteve diploma de Psicologia
(hospitais, prisões e escolas). Embora baseado
Patológica. No mesmo ano tornou-se
em documentos históricos franceses, as
assistente na Universidade de Lille. Foucault
questões sobre as quais se debruça são
lecionou psicologia e filosofia em diversas
relevantes para as sociedades

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contemporâneas. É uma obra seminal que teve das antigas ordenanças, supressão dos
grande influência em intelectuais, políticos, costumes; projeto ou redação de códigos
ativistas sociais e artistas. Foucault muda a “modernos”(P.11/12).
ideia habitualmente aceita de que a prisão é O CORPO DOS CONDENADOS
uma forma humanista de cumprir pena, Três décadas mais tarde, eis o
assinalando seis princípios sobre os quais regulamento redigido por Léon Faucher para a
assenta o novo poder de castigar: “Casa dos jovens detentos em Paris”:
 Regra da quantidade mínima; Art. 17. — O dia dos detentos começará às
 Regra da idealidade suficiente; seis horas da manhã no inverno, às cinco
 Regra dos efeitos (co)laterais; horas no verão. O trabalho há de durar nove
 Regra da certeza perfeita; horas por dia em qualquer estação. Duas
 Regra da verdade comum; horas por dia serão consagradas ao ensino. O
 Regra da especificação ideal. trabalho e o dia terminarão às nove horas no
A partir destas, o delinquente pode ser inverno, às oito horas no verão.
definido em oposição ao cidadão normal, Art. 18. — Levantar. Ao primeiro rufar de
primeiro como louco, depois como meliante, tambor, os detentos devem levantar-se e
malvado, e finalmente como anormal. vestir-se em silêncio, enquanto o vigia abre as
O livro tem quatro partes, intituladas portas das celas. Ao segundo rufar, deve estar
"Suplício", "Punição", "Disciplina" e de pé e fazer a cama. Ao terceiro, põem-se em
"Prisão". fila por ordem para irem ã capela fazer a
oração da manhã. Há cinco minutos de
3- Síntese das ideias principais do intervalo entre cada rufar.
livro: Art. 19. — A oração é feita pelo capelão e
SUPLÍCIO seguida de uma leitura moral ou religiosa.
É a época em que foi redistribuída, na Esse exercício não deve durar mais de meia
Europa e nos Estados Unidos, toda a hora.
economia do castigo. Época de grandes Art. 20. — Trabalho. Às cinco e quarenta e
“escândalos” para a justiça tradicional, época cinco no verão, às seis e quarenta e cinco no
dos inúmeros projetos de reformas; nova inverno, os detentos descem para o pátio onde
teoria da lei e do crime, nova justificação devem lavar as mãos e o rosto, e receber uma
moral ou política do direito de punir; abolição primeira distribuição de pão. Logo em

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seguida, formam-se por oficinas e vão ao Uma leitura de um quarto de hora, tendo por
trabalho, que deve começar às seis horas no objeto algumas noções instrutivas ou algum
verão e às sete horas no inverno. fato comovente, é feita por um detento ou
Art. 21. — Refeições. Às dez horas os algum vigia, seguida pela oração da noite.
detentos deixam o trabalho para se dirigirem Art. 28. — Às sete e meia no verão, às oito e
ao refeitório; lavam as mãos nos pátios e meia no inverno, devem os detentos estar nas
formam por divisão. Depois do almoço, celas depois de lavarem as mãos e feita a
recreio até às dez e quarenta (P. 10). inspeção das vestes nos pátios; ao primeiro
Art. 22. — Escola. Às dez e quarenta, ao rufar de tambor, despir-se, e, ao segundo,
rufar do tambor, formam-se as filas, e todos deitar-se na cama. Fecham-se as portas das
entram na escola por divisões. A aula dura celas e os vigias fazem a ronda nos corredores
duas horas, empregadas alternativamente na para verificarem a ordem e o silêncio (P.11).
leitura, no desenho linear e no cálculo. A OSTENTAÇÃO DOS SUPLÍCIOS
Art. 23. — Às doze e quarenta, os detentos A ordenação de 1670 regeu, até à
deixam a escola por divisões e se dirigem aos Revolução, as formas gerais da prática penal.
seus pátios para o recreio. Às doze e Eis a hierarquia dos castigos por ela descritos:
cinqüenta e cinco, ao rufar do tambor, entram A morte, a questão com reserva de provas, as
em forma por oficinas. galeras, o açoite, a confissão pública, o
Art. 24. — À uma hora, os detentos devem banimento. As penas físicas tinham, portanto,
estar nas oficinas: o trabalho vai até às quatro uma parte considerável. Os costumes, a
horas. natureza dos crimes, o status dos condenados
Art. 25. — Às quatro horas, todos deixam as as faziam variar ainda mais (P. 35).
oficinas e vão aos pátios onde os detentos O suplício penal não corresponde a
lavam as mãos e formam por divisões para o qualquer punição corporal: é uma produção
refeitório. diferenciada de sofrimentos, um ritual
Art. 26. — O jantar e o recreio que segue vão organizado para a marcação das vítimas e a
até às cinco horas: neste momento os detentos manifestação do poder que pune: não é
voltam às oficinas. absolutamente a exasperação de uma justiça
Art. 27. — Às sete horas no verão, às oito que, esquecendo seus princípios, perdesse
horas no inverno, termina o trabalho; faz-se todo o controle. Nos “excessos” dos suplícios,
uma última distribuição de pão nas oficinas. se investe toda a economia do poder (P. 37).

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O corpo supliciado se insere em violência social, uma vez que o assassino terá
primeiro lugar no cerimonial judiciário que que q narrar seu próprio julgamento, ao invés
deve trazer à luz a verdade do crime (P.38). A do juiz. Em meados do século XIX, ouve a
informação penal escrita, secreta, submetida, transformação do suplicio para a prisão,
para construir suas provas, a regras rigorosas, passando a punir a alma.
é uma máquina que pode produzir a verdade A PUNIÇÃO
na ausência do acusado. Por essa mesma A PUNIÇÃO GENERALIZADA
razão, embora no estrito direito isso não seja Tem-se no século XVIII, O protesto
necessário, esse procedimento vai contra os suplícios XVIII: entre os filósofos e
necessariamente tender à confissão (P. 56/57). teóricos do direito; entre juristas, magistrados,
1) Fazer em primeiro lugar do culpado o parlamentares; nos chaiers de doléances e
arauto de sua própria condenação (P. entre os legisladores das assembleias. É
61). preciso punir de outro modo: eliminar essa
2) Prosseguir uma vez mais a cena da confrontação física entre soberano e
confissão (P. 62). condenado; intolerável castigo (p.94).
3) Prender o suplício no próprio crime; Trata-se de organizar o múltiplo, de se obter
estabelecer de um para o outro um instrumento para percorrê-lo e dominá-lo;
relações decifráveis. Exposição do impõe-se uma “ordem”.
cadáver do condenado no local do 1) O horário: é uma velha herança. As
crime, ou num dos cruzamentos mais comunidades monásticas haviam sem dúvida
próximos (P. 63). sugerido seu modelo estrito. Seus três grandes
4) A lentidão do suplício, suas peripécias, os processos — estabelecer as cesuras, obrigar a
gritos e o sofrimento do condenado têm, ao ocupações determinadas, regulamentar os
termo do ritual judiciário, o papel de uma ciclos de repetição — (P. 175).
derradeira prova. 2) A elaboração temporal do ato: vejamos
MINHA EXPLICAÇÃO duas maneiras de controlar a marcha de uma
Inicialmente expõe-se, uma descrição tropa. Começo do século XVII: Acostumar os
de um suplício e um regulamento de execução soldados a marchar por fila ou em batalhão, a
presente em alguns artigos. Nessa primeira marchar na cadência do tambor. E, para isso,
parte, Foucault mostra o desaparecimento do começar com o pé direito a fim de que toda a
suplicio, decisão talvez tomada em razão da

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tropa esteja levantando o mesmo pé ao (em 1764, criação da Escola de Paris, em
mesmo tempo (P. 177). 1776 criação das doze escolas de província);
3) Donde o corpo e o gesto postos em recrutar os soldados profissionais desde muito
correlação: o controle disciplinar não jovens, tomar crianças, “fazê-los adotar pela
consiste simplesmente em ensinar ou impor pátria, prepará-los em escolas particulares”;
uma série de gestos definidos; impõe a melhor ensinar sucessivamente a postura, depois a
relação entre um gesto e a atitude global do marcha, depois o manejo das armas, depois o
corpo, que é sua condição de eficácia e de tiro, e só passar a uma atividade se a anterior
rapidez (P. 178). estiver completamente adquirida: “É um dos
5) A utilização exaustiva: o princípio que erros principais mostrar a um soldado todos
estava subjacente ao horário em sua forma os exercícios ao mesmo tempo”; enfim
tradicional era essencialmente negativo; decompor o tempo em sequências, separadas
princípio da não-ociosidade; é proibido perder e ajustadas. (P.183).
um tempo que é contado por Deus e pago 2°) Organizar essas sequências segundo um
pelos homens; o horário devia conjurar o esquema analítico — sucessão de elementos
perigo de desperdiçar tempo — erro moral e tão simples quanto possível, combinando-se
desonestidade econômica. A escola é dividida segundo uma complexidade crescente (P.
em três classes. A primeira para os que não 183).
têm nenhuma noção de desenho. A segunda 3) Finalizar esses segmentos temporais, fixar-
“para os que já têm alguns princípios” ou que lhes um termo marcado por uma prova, que
passaram pela primeira classe. Na terceira tem a tríplice função de indicar se o indivíduo
classe, aprendem as cores, fazem pastel, atingiu o nível estatutário, de garantir que sua
iniciam-se na teoria e na prática do tingimento aprendizagem está em conformidade com a
(P.182). dos outros, e diferenciar as capacidades de
1) Divide-se a duração em segmentos, cada indivíduo. (P.184).
sucessivos ou paralelos, dos quais cada um 4) Estabelecer séries de séries; prescrever a
deve chegar a um termo específico. Por cada um, de acordo com seu nível, sua
exemplo: isolar o tempo de formação e o antiguidade, seu posto, os exercícios que lhe
período da prática; não misturar a instrução convêm; os exercícios comuns têm um papel
dos recrutas e o exercício dos veteranos; abrir diferenciador e cada diferença comporta
escolas militares distintas do serviço armado exercícios específicos. (P. 184).

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A MITIGAÇÃO DAS PENAS do delito despertará o sinal punitivo.
A arte de punir deve, portanto, Vantagem para a estabilidade da ligação,
repousar sobre toda uma tecnologia da vantagem para o cálculo das proporções entre
representação. crime e castigo e para a leitura quantitativa
Encontrar para um crime o castigo que dos interesses; pois tomando a forma de uma
convém é encontrar a desvantagem cuja ideia consequência natural, a punição não aparece
seja tal que torne definitivamente sem atração como o efeito arbitrário de um poder (P. 125).
a ideia de um delito. É uma arte das energias 2) Esse jogo de sinais deve corresponder à
que se combatem, arte das imagens que se mecânica das forças: diminuir o desejo que
associam, fabricação de ligações estáveis que torna o crime atraente, aumentar o interesse
desafiem o tempo. Importa constituir pares de que torna a pena temível; inverter a relação
representação de valores opostos, instaurar das intensidades, fazer que a representação da
diferenças quantitativas entre as forças em pena e de suas desvantagens seja mais viva
questão, estabelecer um jogo de sinais- que a do crime com seus prazeres (P. 126).
obstáculos que possam submeter o 3) Consequentemente, utilidade de uma
movimento das forças a uma relação de poder. modulação temporal. A pena transforma,
124). modifica, estabelece sinais, organiza
Sinais-obstáculos devem constituir o obstáculos (P. 127).
novo arsenal das penas, como as marcas- 4) Pelo lado do condenado, a pena é uma
vinditas organizavam os antigos suplícios. mecânica dos sinais, dos interesses e da
Mas, para funcionar, têm que obedecer a duração. Mas o culpado é apenas um dos
várias condições: alvos do castigo. Este interessa
1) Ser tão pouco arbitrários quanto possível. É principalmente aos outros: todos os culpados
verdade que é a sociedade que define, em possíveis (P. 128).
função de seus interesses próprios, o que deve 5) Daí resulta uma sábia economia da
ser considerado como crime: este, portanto, publicidade. No suplício corporal, o terror era
não é natural. A punição ideal será o suporte do exemplo: medo físico, pavor
transparente ao crime que sanciona; assim, coletivo, imagens que devem ser gravadas na
para quem a contempla, ela será memória dos espectadores, como a marca na
infalivelmente o sinal do crime que castiga; e face ou no ombro do condenado (P. 129).
para quem sonha com o crime, a simples ideia MINHA EXPLICAÇÃO

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Nesse texto o autor aborda uma limitações, proibições ou obrigações. A
transformação da punição. Enfatizando a escala, em primeiro lugar, do controle: não se
ameaça ao poder exposta pelo suplicio, trata de cuidar do corpo, em massa, grosso
podendo gerar revoltas. Passando a considerar modo, como se fosse uma unidade
alguma forma de respeito, por menor que indissociável, mas de trabalhá-lo
fosse, pelo assassino. detalhadamente; de exercer sobre ele uma
A DISCIPLINA coerção sem folga, de mantê-lo ao nível
OS CORPOS DÓCEIS mesmo da mecânica — movimentos, gestos
No início do século XVII, ainda se atitude, rapidez: poder infinitesimal sobre o
descrevia a figura ideal do soldado. O soldado corpo ativo (P. 163).
é antes de tudo alguém que se reconhece de OS RECURSOS PARA O BOM
longe; que leva os sinais naturais de seu vigor ADESTRAMENTO
e coragem, as marcas também de seu orgulho: O poder disciplinar é com efeito um
seu corpo é o brasão de sua força e de sua poder que, em vez de se apropriar e de retirar,
valentia (P.162). tem como função maior “adestrar”; ou sem
Segunda metade do século XVIII: o dúvida adestrar para retirar e se apropriar
soldado tornou-se algo que se fabrica; de uma ainda mais e melhor (P.195). A disciplina
massa informe, de um corpo inapto, fez-se a “fabrica” indivíduos; ela é a técnica específica
máquina de que se precisa; corrigiram-se aos de um poder que toma os indivíduos ao
poucos as posturas; lentamente uma coação mesmo tempo como objetos e como
calculada percorre cada parte do corpo, se instrumentos de seu exercício (P.195). O
assenhoreia dele, dobra o conjunto, torna-o exercício da disciplina supõe um dispositivo
perpetuamente disponível, e se prolonga, em que obrigue pelo jogo do olhar; um aparelho
silêncio, no automatismo dos hábitos. Ao onde as técnicas que permitem ver induzam a
corpo que se manipula, se modela, se treina, efeitos de poder, e onde, em troca, os meios
que obedece, responde, se torna hábil ou cujas de coerção tornem claramente visíveis aqueles
forças se multiplicam (P.162). sobre quem se aplicam (P.196).
O corpo é objeto de investimentos tão As instituições disciplinares
imperiosos e urgentes; em qualquer produziram uma maquinaria de controle que
sociedade, o corpo está preso no interior de funcionou como um microscópio do
poderes muito apertados, que lhe impõem comportamento; as divisões tênues e

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analíticas por elas realizadas formaram, em onisciente que se subdivide ele mesmo de
torno dos homens, um aparelho de maneira regular e ininterrupta até a
observação, de registro e de treinamento. determinação final do indivíduo, do que o
(P.198). caracteriza, do que lhe pertence, o do que lhe
A vigilância torna-se um operador acontece (P.221).
econômico decisivo, na medida em que é ao Peste como forma real e, ao mesmo
mesmo tempo uma peça interna no aparelho tempo, imaginária da desordem tem a
de produção e uma engrenagem específica do disciplina como correlato médico e político.
poder disciplinar (P.200). Atrás dos dispositivos disciplinares se lê o
O PANOPTISMO terror dos “contágios”, da peste, das revoltas,
As medidas que se faziam necessárias, dos crimes, da vagabundagem, das deserções,
segundo um regulamento do fim do século das pessoas que aparecem e desaparecem,
XVII, quando se declarava a peste numa vivem e morrem na desordem (P.221).
cidade, lugar, um policiamento espacial O dispositivo panóptico organiza
estrito: fechamento, claro, da cidade e da unidades espaciais que permitem ver sem
“terra”, proibição de sair sob pena de morte, parar e reconhecer imediatamente (P.224).
fim de todos os animais errantes; divisão da Dispositivo importante, pois automatiza e
cidade em quarteirões diversos onde se desindividualiza o poder. Este tem seu
estabelece o poder de um intendente. Essa princípio não tanto numa pessoa quanto numa
vigilância se apoia num sistema de registro certa distribuição concertada dos corpos, das
permanente: relatórios dos síndicos aos superfícies, das luzes, dos olhares; numa
intendentes, dos intendentes aos almotacés ou aparelhagem cujos mecanismos internos
ao prefeito(P.219). produzem a relação na qual se encontram
A ordem responde à peste; ela tem presos os indivíduos (P.225). O Panóptico é
como função desfazer todas as confusões: a um local privilegiado para tornar possível a
da doença que se transmite quando os corpos experiência com homens, e para analisar com
se misturam; a do mal que se multiplica toda certeza as transformações que se pode
quando o medo e a morte desfazem as obter neles (P. 226/227).
proibições. Ela prescreve a cada um seu lugar, O Panóptico pode até constituir-se em
seu corpo, sua doença e sua morte, a cada um aparelho de controle sobre seus próprios
seu bem, por meio de um poder onipresente e mecanismos. Em sua torre de controle, o

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diretor pode espionar todos os empregados fechadas onde funcionavam e a circular em
que tem a seu serviço: enfermeiros, médicos, estado “livre”; as disciplinas maciças e
contramestres, professores, guardas; poderá compactas se decompõem em processos
julgá-los continuamente, modificar seu flexíveis de controle, que se pode transferir e
comportamento, impor-lhes métodos que adaptar. (P.234).
considerar melhores; e ele mesmo, por sua 3) A estatização dos mecanismos de
vez, poderá ser facilmente observado. (P.227) disciplina: na Inglaterra, foram grupos
Cidade pestilenta, estabelecimento privados de inspiração religiosa que, muito
panóptico, as diferenças são importantes. Elas tempo, realizaram as funções de disciplina
marcam, com um século e meio de distância, social. ( P.236).
as transformações do programa disciplinar. MINHA EXPLICAÇÃO
(P.228). O esquema panóptico, sem se Aqui Fucault descreve sobre a
desfazer nem perder nenhuma de suas maquinaria do poder, como também discute
propriedades, é destinado a se difundir no os métodos formadores do projeto disciplinar
corpo social; tem por vocação tornar-se aí na presente sociedade, as imposições voltadas
uma função generalizada. para uma cidade pertencente ao século XVIII,
x o que importa é tornar mais fortes as forças a partir do aparecimento de algum tipo de
sociais — aumentar a produção, desenvolver epidemia.
a economia, espalhar a instrução, elevar o A PRISÃO
nível da moral pública; fazer crescer e INSTITUIÇÕES COMPLETAS E AUSTERAS
multiplicar (P.231). A forma-prisão preexiste à sua
1) A inversão funcional das disciplinas: utilização sistemática nas leis penais. Ela se
originalmente cabia-lhes principalmente constituiu fora do aparelho judiciário, quando
neutralizar os perigos, fixar as populações se elaboraram, por todo o corpo social, os
inúteis ou agitadas, evitar os inconvenientes processos para repartir os indivíduos, fixá-los
de reuniões muito numerosas (P.233). e distribuí-los espacialmente, classificá-los,
2) A ramificação dos mecanismos tirar deles o máximo de tempo, e o máximo
disciplinares: enquanto por um lado os de forças, treinar seus corpos, codificar seu
estabelecimentos de disciplina se multiplicam, comportamento contínuo, mantê-los numa
seus mecanismos têm uma certa tendência a visibilidade sem lacuna, formar em torno
se desinstitucionalizar, a sair das fortalezas deles um aparelho completo de observação,

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registro e notações, constituir sobre eles um então um novo sono lhe dá um repouso
saber que se acumula e se centraliza (P.260). agradável que não vem perturbar os fantasmas
A prisão, peça essencial no conjunto de uma imaginação desregrada. Assim se
das punições, marca certamente um momento passam seis dias da semana. São seguidos por
importante na história da justiça penal: seu um dia exclusivamente consagrado à oração, à
acesso à “humanidade” (P.260). instrução e a meditações salutares (P.268)
Na passagem dos dois séculos, uma A prisão, local de execução da pena, é
nova legislação define o poder de punir como ao mesmo tempo local de observação dos
uma função geral da sociedade que é exercida indivíduos punidos. Em dois sentidos.
da mesma maneira sobre todos os seus Vigilância, é claro. Mas também
membros, e na qual cada um deles é conhecimento de cada detento, de seu
igualmente representado; mas, ao fazer da comportamento, de suas disposições
detenção a pena por excelência, ela introduz profundas, de sua progressiva melhora
processos de dominação característicos de um (P.277).
tipo particular de poder. ILEGALIDADE E DELINQÜÊNCIA
A prisão deve ser um aparelho No que se refere à lei, a detenção pode
disciplinar exaustivo. Em vários sentidos: ser privação de liberdade. O encarceramento
deve tomar a seu cargo todos os aspectos do que a realiza sempre comportou um projeto
indivíduo, seu treinamento físico, sua aptidão técnico. A passagem dos suplícios, com seus
para o trabalho, seu comportamento cotidiano, rituais de ostentação, com sua arte misturada à
sua atitude moral, suas disposições; a prisão, cerimônia do sofrimento, a penas de prisões
muito mais que a escola, a oficina ou o enterradas em arquiteturas maciças e
exército, que implicam sempre numa certa guardadas pelo segredo das repartições, não é
especialização, é “onidisciplinar”. (P.264). passagem a uma penalidade indiferenciada,
1) Primeiro princípio, o isolamento. abstrata e confusa; é a passagem de uma arte
Isolamento do condenado em relação ao de punir a outra, não menos científica que ela
mundo exterior, a tudo o que motivou a (P.285).
infração, às cumplicidades que a facilitaram. A cadeia, tradição que remontava à
(P.265). época das galeras, ainda subsistia sob a
2) O trabalho que se alterna com as refeições monarquia de julho (P.285). O grande
acompanha o detento até à oração da noite; espetáculo da cadeia se relacionava com a

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antiga tradição dos suplícios públicos; 3) As penas, cujo desenrolar deve poder ser
relacionava-se também com aquela múltipla modificado segundo a individualidade dos
representação do crime dada na época pelos detentos, os resultados obtidos, os progressos
jornais, pasquins, palhaços, teatros de ou as recaídas (P.296/297).
bulevar; mas relacionava-se igualmente com 4) O trabalho deve ser uma das peças
defrontações e lutas cujo estrondo carrega essenciais da transformação e da socialização
consigo; ele lhes dá como que uma saída progressiva dos detentos (P.297).
simbólica: o exército da desordem, 5) A educação do detento é, por parte do
aterrorizado pela lei, promete voltar; o que foi poder público, ao mesmo tempo uma
expulso pela violência da ordem trará ao precaução indispensável no interesse da
retornar a reviravolta libertadora. “ (P.290). sociedade e uma obrigação para com o
A vigilância constante dos dois detento (P.297).
guardas que estão armados com uma pequena 6) O regime da prisão deve ser, pelo menos
maça de carvalho “com grandes cravos de em parte, controlado e assumido por um
diamante, rombudos”, permite fazer funcionar pessoal especializado que possua as
um sistema de punições, conforme o capacidades morais e técnicas de zelar pela
regulamento interno da carruagem: regime de boa formação dos indivíduos (P.297).
pão e água, dedos polegares amarrados, 7) Encarceramento deve ser acompanhado de
privação da almofada para dormir, os dois medidas de controle e de assistência até a
braços amarrados. “É proibida qualquer readaptação definitiva do antigo detento
leitura senão a dos livros de moral”(P. 291). (P.298).
1) A detenção penal deve então ter por O CARCERÁRIO
função essencial a transformação do Tivesse eu que fixar a data em que se
comportamento do indivíduo (P.296). completa a formação do sistema carcerário,
2) Os detentos devem ser isolados ou pelo não escolheria 1810 e o Código Penal, nem
menos repartidos de acordo com a gravidade mesmo 1844, com a lei que estabelecia o
penal de seu ato, mas principalmente segundo princípio do internamente celular; talvez não
sua idade, suas disposições, as técnicas de escolhesse 1838, quando foram publicados os
correção que se pretende utilizar para com livros de Charles Lucas, Moreau-Christophe e
eles, as fases de sua transformação (P.296). Faucher sobre a reforma das prisões. Mas 22

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de janeiro de 1840, data da abertura oficial de do poder, e o instrumento para a formação do
Mettray. (P.320). saber que essa mesma economia tem
1) Esse vasto dispositivo estabelece necessidade (P.331).
uma gradação lenta, contínua, imperceptível 6) Isto explica sem dúvida a extrema solidez
que permite passar como que naturalmente da da prisão, essa pequena invenção
desordem à infração e em sentido inverso da desacreditada desde o nascimento (P.332).
transgressão da lei ao desvio em relação a MINHA EXPLICAÇÃO
uma regra, a uma média, a uma exigência, a Nessa última parte, o estudioso mostra
uma norma. (P.325). que antes da prisão ser assumida como pratica
2) O carcerário, com seus canais, permite o de punição, já se faziam uso de seus aspectos,
recrutamento dos grandes “delinqüentes”. a partir das práticas utilizadas nos indivíduos
Organiza o que se poderia chamar as perante a sociedade. No século XIX ainda
“carcereiras disciplinares” onde, sob o aspecto houve essa mistura. Foucault coloca por
das exclusões e das rejeições, todo um escrito, toda a constituição do sistema
trabalho de elaboração se opera. (P.326). carcerário francês.
3) Mas o efeito mais importante talvez do
sistema carcerário e de sua extensão bem
além da prisão legal é que ele consegue tornar
natural e legítimo o poder de punir, baixar
pelo menos o limite de tolerância à
penalidade. (P.328).
4) Com essa nova economia do poder, o
sistema carcerário, que é seu instrumento de
base, encareceu uma nova forma de “lei”: um
misto de legalidade e natureza, de prescrição e
constituição, a norma. (P.330).
5) A tessitura carcerária da sociedade realiza
ao mesmo tempo as captações reais do corpo
e sua perpétua observação; é, por suas
propriedades intrínsecas, o aparelho de
punição mais de acordo com a nova economia

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