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ESTADO DO PARÁ

MINISTÉRIO PÚBLICO
2 ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DIREITOS HUMANOS E CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE
POLICIAL, Ministério Público do Estado do Pará, Av. 16 de Novembro, n° 50 – Cidade Velha - Belém- Pará –
CEP 66.023 - 220, Tel.: (91) 4008-0621 | Fone/Fax: (91) 3222-4528 e e-mail: franklin@mp.pa.gov.br

EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA 9º VARA CRIMINAL DE BELÉM

Processo nº 0017859-70.2009.814.0401
Apelante: O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ
Apelado: EDER MAURO CARDOSO BARRA
Capitulação: art. 1º, §§ 2º e 4ª, inciso I, da Lei n º 9455/97 em concurso material com o
art. 69, c/c art. 299, do CPB
Apelados: JOSÉ GERALDO DA SILVA, MIGUEL FERNANDO DE SOUZA PINTO, LUIZ
MIGUEL CASTRO DE CARVALHO, AMARILDO PARANHOS PALHETA, SAMUEL
GONÇALVES BARROS e GILBERTO LUIZ DE OLIVEIRA BARROS
Capitulação: art. 1º, inciso II, da Lei n º 9455/97 c/c art. 29, do CPB

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ, através deste


representante que esta subscreve, no uso de suas atribuições legais, vem, com o devido
respeito perante Vossa Excelência, inconformado, permissa venia, com a decisão que
absolveu os acusados, EDER MAURO CARDOSO BARRA E OUTROS, interpor recurso
de APELAÇÃO, com fundamento no art. 593, do CPP, cujas razões serão apresentadas a
seguir.

Posto isto, requer a Vossa Excelência, que se digne de encaminhar as


RAZÕES DA APELAÇÃO, ao E. Tribunal "ad quem", depois de cumpridas as
formalidades legais.

São os termos em que


Pede e espera deferimento
Belém, 25 de outubro de 2013.

FRANKLIN LOBATO PRADO


PROMOTOR DE JUSTIÇA

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ESTADO DO PARÁ
MINISTÉRIO PÚBLICO
2 ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DIREITOS HUMANOS E CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE
POLICIAL, Ministério Público do Estado do Pará, Av. 16 de Novembro, n° 50 – Cidade Velha - Belém- Pará –
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Processo nº 0017859-70.2009.814.0401
Apelante: O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ
Apelado: EDER MAURO CARDOSO BARRA
Capitulação: art. 1º, §§ 2º e 4ª, inciso I, da Lei n º 9455/97 em concurso material com o
art. 69, c/c art. 299, do CPB
Apelados: JOSÉ GERALDO DA SILVA, MIGUEL FERNANDO DE SOUZA PINTO, LUIZ
MIGUEL CASTRO DE CARVALHO, AMARILDO PARANHOS PALHETA, SAMUEL
GONÇALVES BARROS e GILBERTO LUIZ DE OLIVEIRA BARROS
Capitulação: art. 1º, inciso II, da Lei n º 9455/97 c/c art. 29, do CPB

RAZÕES DA APELAÇÃO

COLENDA TURMA

DOUTO PROCURADOR

"A tortura é uma experiência humilhante. A meta não é obter


informação, mas castigar-nos e destroçar-nos tanto, que façamos o que as autoridades
querem. Transformamo-nos num exemplo para os outros, que ficam aterrorizados para
sempre." (Alende, Isabel)

Representando os anseios da sociedade, este Órgão Ministerial não poderia


se conformar com a absolvição dos acusados por incabível na espécie, uma vez que existem
provas suficientes da autoria e da materialidade do crime em epígrafe.

A respeitável decisão do nobre e culto Juiz de Direito da 9 ª Vara Criminal


de Belém que absolveu os apelados das sanções punitivas do art. art. 1º, inciso II, da Lei n º
9455/97 c/c art. 29, do CPB a, merece ser reformada, porque esta não considerou as provas
pujantes da autoria e da materialidade do delito.

O ilustre magistrado não se convenceu que o Ministério Público conseguiu


provar o crime imputado aos apelados, o que, absolutamente, não se coaduna com a prova
possante produzida nos autos. Senão vejamos.

I. DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA CONDUTA DOS POLICIAIS.

Há necessidade de fazer uma individualização da conduta dos acusados na


cena do crime, para mostrar como cada um concorreu para a prática do crime, conforme
passamos a relatar a seguir.

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Os 5 (cinco) policiais que entraram na sala do consultório do Dr. Carlos


Mário de Brito Kato são: os acusados GERALDO, SAMUEL, FERNANDO PINTO,
CARLOS FERREIRA E AMARILDO PARANHOS.

Os envolvidos CARLOS MOURA e CARLOS FERREIRA não foram


denunciados, mas foram ouvidos como testemunhas – inclusive contraditadas – pela
subordinação hierárquica e são, por óbvio, amigos dos acusados, portanto, não têm isenção de
ânimo e deveriam, quando muito, serem ouvidos na qualidade de informantes (sem prestar
compromisso e não sujeitos a crime de falso testemunho).

O acusado DEL. EDER MAURO chegou já no momento da abordagem na


garagem subterrânea. O motorista MIGUEL CASTRO não entrou na sala do consultório do
Dr. Kato, mas foi quem conduziu o carro (fiesta) das vítimas juntamente com o acuado
FERREIRA para a DEPOL/Marco levando as vítimas Dirceu Jr e Elgids.

CARLOS MOURA foi o escrivão da DEPOL/Marco que lavrou o TCO por


crime de desacato e lesão corporal, enquanto que a senhora TATIANE foi a escrivã que
lavrou o procedimento do crime de tortura.

GILBERTO BARROS foi o que surgiu na DEPOL/Marco, durante a


conduta do acusado DEL. EDER MAURO, no momento em que colhia os depoimentos e
que depois levou as vítimas pro IML. Este era o policial que ameaçava, no momento da prática
da tortura, que “dava tiro na perna” (textuais).

CARLOS MOURA E GILBERTO BARROS não compareceram por


ocasião dos fatos relatados no consultório do Dr. Kato.

O acusado FERREIRA afirmou em seu depoimento que estava presente nos


fatos com os policiais, porém MIGUEL CASTRO E GILBERTO BARROS (fls. 58), na
verdade não estava durante o episódio da abordagem no consultório, conforme se pode ver do
vídeo em anexo ao processo.

Os depoimentos das vítimas junto a DECRIF revelam com riqueza de


detalhes a individualização da conduta das policias, corroborando ainda visualmente através da
filmagem feita pelo prefeito Kato.

II. DA IMPOSSIBILIDADE DE HAVER RESISTÊNCIA. AUSÊNCIA DE AUTO


DE RESISTÊNCIA. DESCARACTERIZAÇÃO E INCOMPATIBILIDADE DE
CONDUTA POLICIAL.

Os acusados alegaram falsamente a resistência por parte das vítimas, então


foi formalizado o devido auto de resistência, para justificar o uso de algemas.

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A suposta “resistência”, contudo, se deu em razão das vítimas temerem ser


executadas pelos acusados. Como podem os ofendidos resistirem à prisão se todos estavam
impossibilitadas de se defender por estarem algemados.

Os 5 (cinco) policiais, GERALDO, SAMUEL, FERNANDO PINTO,


CARLOS FERREIRA E AMARILDO PARANHOS, agiram com truculência, mediante o
uso de arma de fogo em direção as vítimas, proferindo ofensas e palavras de baixo calão,
agredindo fisicamente e psicologicamente, empurrando as vitimas algemadas pela escada
caracol secreta nos fundos que da acesso a sala do prefeito Kato, ameaçando-as que iriam
levá-los para o “Aura” ou “Alça Viária”, como castigo e executa-las.

Ainda que afirmassem ser policiais, na verdade agiram como se fossem


capangas que iriam executar as vítimas. Logo, impossível acreditar que se tratava de policiais
civis, por estes agirem de forma incompatível com a função de agentes públicos, que atuam em
defesa e segurança da sociedade paroara.

O próprio prefeito Kato afirma que realmente as vítimas imaginaram que os


policiais eram capangas, mesmo quando se identificaram, apenas verbalmente, como policiais
(vide fls. 128).

Diante disso, desesperadamente, as vítimas gritaram para que alguém


pudesse ver o que estavam sofrendo e, de alguma forma, socorrê-las ligando para polícia, no
número 192.

Alguns dos policiais civis do GPM, apenas resolveram se identificar,


devidamente, com suas carteiras funcionais quando viram que transeuntes assustados se
aglomerarem na frente do consultório, além da presença de policiais militares. Situação esta
que possibilitou a vítima ELZA de escapar da “gravata” que estava sendo aplicada em seu
pescoço pelo acusado POLICIAL SAMUEL.

A vítima ELZA, após ter gritado, desesperadamente, um senhor assustado


indagou aos policiais para onde iriam levar as vítimas, já que os policiais estavam totalmente
descaracterizados e não havia no local nenhuma viatura da policial civil, somente carros
também descaracterizados (conforme hematoma no laudo e foto, e depoimentos, vide fls. 157,
160, 164, 165 e 27).

III. DAS LESÕES CAUSADAS PELOS POLICIAIS

É inconcebível a alegação infundada de que as lesões teriam sido causadas


pela própria resistência e na descida da escada, da simples análise das imagens fotográficas e
dos dois laudos periciais em cada uma das vítimas de tortura.

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Verifica-se que as lesões foram causadas por truculência dos policiais que
deram socos, tapas e pontapés nas vítimas. O vídeo mostra claramente agressões com soco nos
rostos das vítimas, levando em consideração o número de policiais 5 (cinco), os acusados
GERALDO, SAMUEL, FERNANDO PINTO, CARLOS FERREIRA E AMARILDO
PARANHOS, no consultório e mais o policial MIGUEL CASTRO no carro durante o
percurso do consultório à DEPOL/Marco e durante os interrogatórios, bem como o fato das
vítimas, desde o início, estarem algemadas e o próprio contraste do porte físico dos policiais
em relação às vítimas, uma senhora de idade, uma menina e um rapaz franzino (fls. 163/179 e
156/162).

Além dos laudos, a própria representante de direitos humanos da OAB fez


constar a presença de machucados nas vítimas (fls. 68).

Há, ainda, de se considerar que, em que pese ter sido instaurado, além do
flagrante preparado e forjado de extorsão, o TCO pelos crimes de desacato e lesão corporal,
figurando nesse, como vítimas os policiais SAMUEL E GERALDO, e autores dos fatos as
vítimas, os próprios policiais, na audiência de conciliação, no Juizado Especial Criminal,
voltaram a trás e inocentaram a vítima DIRCEU. Ora, do mesmo modo que a vítima DIRCEU,
as demais vítimas, ELZA E ELGIDS, jamais desacataram os policiais e tampouco os
agrediram, tanto é que posteriormente a justiça prevaleceu, tendo sido esse procedimento
penal arquivado, conforme sentença em anexo.

IV. AUSÊNCIA DE AUTO DE APREENSÃO DE VEÍCULO (FIESTA)

É irregular e de causar estranheza a ausência da devida apreensão do veículo


que se encontrava com as vítimas, nem os bens que estavam no interior do veículo foram
objeto de auto de apreensão, evidenciando de que o procedimento policial foi forjado e
totalmente irregular.

Não houve a formalização da apreensão da bolsa com os documentos,


incluindo, os documentos comprobatórios da dívida com o Juiz AUGUSTO CÉSAR DA
LUZ CAVALCANTE, materializadas em notas promissórias, mais quantia em dinheiro, joias,
óculos, lente, escrituras públicas de um imóvel, que estavam no interior do veiculo das vítimas,
tampouco houve o procedimento correto, transparente, lícito, da apreensão desse automóvel.

Para que não haja dúvida, os próprios policiais, CASTRO e FERREIRA,


confirmam que conduziram o veículo do consultório do Dr. Kato até a DEPOL/Marco,
levando as vítimas DIRCEU JR e ELGIDS (vide fls. 49/58 dos autos).

V. DA SUSPEIÇÃO E IMPEDIMENTO DAS TESTEMUNHAS

Foram ouvidas as testemunhas GILBERTO BARROS, CARLOS


FERREIRA, CARLOS MOURA, ANGELICA TATIANE e JOAQUIM CAMPOS.
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As 4 (quatro) primeiras testemunhas, além de existir um vinculo de amizade


comprovado com os acusados, são hierarquicamente subordinadas ao DEL. EDER MAURO.

Vale ressaltar que, apesar de não terem sido arroladas, as secretárias do


prefeito Kato, ÂNGELA MARIA DE SOUZA e VÂNGELA MIRACI DE SOUZA (vide fls.
130 e 135), também, não têm a devida isenção de ânimo, especialmente por elas serem suas
secretarias, inclusive, sendo as mesmas irmãs do referido dentista, portanto, quando muito,
poderiam ser ouvidas na condição de informantes, estas sendo testemunhas na instrução.

Com relação a testemunha JOAQUIM CAMPOS, é público e notório a


existência de forte vínculo de amizade, pois este jornalista promove praticamente todos os dias
o DEL. EDER MAURO no programa televisivo policial que apresenta, ou seja, o repórter não
tem isenção de ânimo, pois obtêm níveis altos de “ibope” em seu programa policial,
promovendo naturalmente operações policiais, em especial as que envolvem o DEL. EDER
MAURO, fato que é público e notório.

E mais, ainda em relação à testemunha JOAQUIM CAMPOS, embora se


fizesse presente e acompanhando o caso pessoalmente tanto no consultório como na
DEPOL/Marco, sua reportagem não foi ao ar (publicada) face à influência política, haja vista
que o prefeito Kato é coligado ao mesmo partido político que o dono da empresa de TV
(RBA), onde trabalha a testemunha, conforme a própria advogada CARLA mencionou nos
pedidos de liberdade provisória (fls.97 e 98).

Por outro lado, o fato de constar no auto de flagrante apenas como


testemunhas os próprios policiais inculpados, quando foi perfeitamente possível arrolar várias
pessoas que estavam aglomeradas na saída da garagem do consultório, demonstra que as
verdadeiras testemunhas presenciais, transeuntes que poderiam depor sobre os fatos com suas
versões isentas, não foram arroladas.

VI. DAS PERÍCIAS REQUISITADAS

A autenticidade e transcrição do áudio do DVD com filmagem na sala do


consultório do Dr. Kato, foram requeridas pela DECRIF, em 19.10.09, e pelo Ministério
Público (vide fls. 137/196).

A complementação da perícia foi requisitada nas fotos coloridas (vide fls.


163 e 179) e laudo de lesão corporal indicação (vide fls. 196). Essa perícia torna-se
desnecessária, haja vista que, embora apenas 8 das 17 fotos estejam assinadas e carimbadas
pelo médico perito (9 estão sem assinatura e carimbo) e não indique qual seria o periciando e a
qual laudo pertença, fica evidente que não há necessidade de um perito para confirmar os fatos
articulados na denúncia, tanto que em suas defesas, os acusados foram silentes em relação à

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certificação infundada, com claro objetivo de isentar policiais pelo corporativismo existente na
DECRIF (vide fls. 159 e 189).

Foi feita requisição de informações sobre manipulação de dados no sistema


da polícia civil (vide fls. 16/17).

VII. DA FALSIDADE IDEOLÓGICA

Há fortes indícios de que houve fraude na confecção do suposto registro de


ocorrências policial, o que fica claro no primeiro registro feito pelo Dr. Kato, haja vista que o
incauto, em seu depoimento, afirma que, na manhã do flagrante, conversou, pessoalmente,
com EDER MAURO na DEPOL/Marco, porém, a respectiva formalização dessa comunicação
indica como local de registro a DEAM (Delegacia Especializada de Atendimento a Mulher)
que fica situada no Município de Ananindeua, inclusive fazendo constar no rodapé que seria
atendida pela DEPOL/Marco, e constando ainda como horário do registro 10h05min, do dia
21.08.09, dia do flagrante, ou seja, o exato momento em que as vítimas chegaram no
consultório, conforme o mesmo Dr. Kato diz por volta de 10:30 horas. (vide fls. 127, 18).

Um segundo registro policial, aditando aquele primeiro e constando


apresentação das vítimas do flagrante forjado e preparado, foi constando como DEPOL/Marco
(vide fls. 19).

Estranhamente, o Del. EDER MAURO, em seu depoimento na DECRIF


requereu a juntada do BOP feito pelo Dr. Kato, no inquérito, aberto para apurar conduta
arbitrária dos policiais (vide fls. 34) como se não fosse por ele presidido o inquérito da
extorsão preparado e forjado, sendo que sequer esse registro encontra-se assinado.

Portanto, é clarividente ser um documento fantasma, em clara violação ao


princípio da obrigatoriedade e do dever formalizar os atos policiais, conforme muito bem
observou o Ministério Público (vide fls. 08/10).

Nesse mesmo ponto, esquivando-se da sua responsabilidade na confecção de


um BOP falso e impossível de ser verdade, o mesmo Del. EDER MAURO, quando de seu
depoimento junto ao Ministério público, comprometeu-se em apresentar o referido registro
policial. Este nunca foi apresentado.

Por conseguinte, como observa o Ministério Público, o Del. EDER MAURO


tem por obrigação esclarecer essa irregularidade e manipulação de dados policiais, haja vista
que essa formalização de comunicação é o que dá azo e início ao procedimento investigativo,
bem como deve ser analisadas as informações requisitadas como diligência pelo Ministério
Público para o esclarecimento desse fato (vide fls. 16/17).

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VIII. CONTRADIÇÕES DA ADVOGADA KARLA E SUA LIGAÇÃO COM O DEL


EDER MAURO E DEMAIS POLICIAIS

O Del. EDER MAURO disse que a advogada ANA CARLA apareceu na


DEPOL/Marco quando a vítima ELZA estava sendo ouvida (vide fls. 35 dos autos), portanto,
seu direito constitucional foi negado, não consta o nome dela em nenhum dos termos de
depoimento no auto de flagrante e sequer está assinado notas de garantias constitucionais, e
mais ainda a própria advogada diz em seu depoimento na DECRIF que apenas chegou na
DEPOL/Marco, já às 19:30 horas, ou seja, quando as vítimas já haviam retornado do IML
(vide fls. 138).

Estranhamente e reforçando ainda mais a existência de conluio entre o Del.


EDER MAURO e a advogada CARLA e seu estagiário ANTONIO JR, este afirma que o nariz
do policial GERALDO sangrava (vide fls. 148), portanto, em contradição, já que o próprio
policial afirma que conduziu sua moto do consultório pra DEPOL/MARCO e mais ainda disse
ele mesmo conduziu o veículo que fez o trajeto de ida e volta da Depol/Marco ao IML para
realização das perícias (vide fls. 53).

Ora, se isso fosse verdade, significaria dizer que o sangramento perdurou


desde o momento do flagrante (final da manha, por volta, de 11h00min) até o anoitecer
(19h30m), já que esse estagiário e a advogada surgiram após o retorno do IML (vide fls.
138,148, 151 e 152), ou seja, seria hipótese de uma hemorragia relevante e grave, o que é
impossível de se imaginar levando em conta o depoimento do próprio policial GERALDO e
ainda o próprio laudo pericial nele realizado que não consta sangramento algum (vide fls. 53 e
273).

Ademais, não foram assegurados às vítimas os direitos constitucionais de


contato com a família e advogado, tanto que, as mesmas estavam desassistidas de advogado,
durante os depoimentos no auto de prisão em flagrante.

Mesmo porque, o próprio Del. Eder se limita apenas em dizer que a


advogada Carla surgiu quando a vítima Elza estava sendo ouvido (vide fls. 35), o que, por sua
vez, está em contradição com o dito pela própria advogada de que chegou apenas na
DEPOL/Marco por volta das 19h30min, portanto, depois do retorno do IML (fls. 138).

Por outro lado, o Del. EDER MAURO desobedeceu à regra expressa do


Código de Processo Penal (art. 306, caput e p. único) do devido e imediato acionamento da
Defensoria Pública, em respeito às garantias constitucionais da assistência de um advogado
durante o flagrante.

Aliás, nesse patamar, é de ressaltar o estranho fato de ter sido apenas


procedida a devida ciência ao órgão da Defensoria Pública, em 25.08.12, ou seja, 4 dias depois
do flagrante.
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Assim, torna-se cristalino de que realmente houve uma captação de causa


pela advogada em conluio com o Del. EDER MAURO, ou, pelo menos, um forçoso
constrangimento no comportamento dessa advogada durante o procedimento policial, tendo
sido as vítimas coagidas em admitirem ver sua interferência durante esse episódio.

IX. DAS CONTRADIÇÕES ENTRE OS POLICIAIS.

Os policiais têm o dever de esclarecer a existência de bolsa dentro do


consultório, quem a apreendeu e quem encontrou o dinheiro contido em seu interior, o qual
supostamente seria produto de extorsão R$ 6.000,00, haja vista haver gritante contradição e
disparidade entre os depoimentos dos policiais que fizeram a abordagem, dentro da sala do
consultório, SAMUEL, FERREIRA, GERALDO, FERNANDO PINTO E AMARILDO,
prestados no auto de flagrante e na DECRIF.

O Del. EDER MAURO, no relatório do inquérito trancado do flagrante


preparado e forjado de extorsão, faz constar que o condutor, policial Samuel, ao entrar na sala
do consultório, juntamente com os demais policias, FERREIRA, GERALDO, AMARILDO
E FERNANDO PÌNTO, teria revistado e apreendido o suposto dinheiro produto de extorsão,
que estaria dentro de uma bolsa, em consonância como disse também pelo Dr. Kato (vide fls.
128 e 278).

Já na DECRIF, de forma contrária ao que foi dito durante o flagrante, os


policiais demonstram uma postura de incerteza e até de desconhecimento, não precisando
sequer sobre quem teria aprendido a suposta quantia contida na bolsa.

Para se comprovar a montagem criminosa dos mesmos, é suficiente assistir o


vídeo gravado e programado pelo próprio Dr. Kato, conforme confirma em seu depoimento
(vide fls. 127).

Certamente, os policiais ao prestarem seus depoimentos, não imaginavam


que existiria um vídeo feito pelo Dr. Kato, o qual provaria visualmente a verdade dos fatos,
revelando a tortura prática e ainda a preparação e flagrante forjado.

A filmagem revela inexistir bolsa durante a abordagem policial no


consultório, que sequer a vítima Elza adentrou no consultório de posse da citada bolsa, pois a
ofendida permaneceu dentro de seu carro, conforme facilmente se pode ver pelas imagens do
vídeo. Além do mais, na DECRIF, o Del. EDER MAURO apenas vagamente informa que foi
apreendido supostamente o valor na bolsa da vítima Elza, não mais precisando como fez,
anteriormente, no relatório do inquérito trancado e como se verifica no depoimento do próprio
Dr. Kato na mesma DECRIF (vide fls. 35/128/278).

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Perante o Ministério Público, quando perguntado sobre a quantia


supostamente apreendida na bolsa da vítima Elza, o mesmo Del. EDER MAURO, responde
apenas que um dos policiais encontrou o produto forjado da extorsão na bolsa da vítima Elza,
porém, sem devidamente precisar qual a res.

Em outro trecho, quando questionado sobre a versão da vítima Elza de que a


bolsa foi apreendida em seu carro, neste momento respondeu que quem pode melhor informar
seria o próprio prefeito e os policiais, ou seja, esquiva-se de sua obrigação de esclarecer os
fatos que geraram o procedimento ilícito praticado.

Não bastasse isso, em outra passagem, na tentativa de justificar o


injustificável e inexistente, chega, inclusive, a afirmar em seu depoimento, do mesmo modo que
o prefeito Kato, que apenas e justamente o suposto repasse do dinheiro não foi possível ser
filmado (vide fls. 128 e 278/282), sendo que a vítima não estava portando nenhuma bolsa,
tampouco houve menção a quantia forjada de R$ 6.000,00.

Ademais, o policial GERALDO afirma desconhecer quem apreendeu a bolsa


e o dinheiro nela supostamente contido, aliás, ignora o que no interior dela continha (vide fls.
53).

Por sua vez, o policial Samuel, mencionado no relatório de EDER MAURO,


é silente em seu depoimento na DECRIF sobre a apreensão do valor na bolsa da ofendida
ELZA (vide fls. 55/56 dos autos) e os demais policiais não precisam quem teria supostamente
apreendido o valor que estaria dentro da bolsa (fls. 47 a 58 dos autos).

É inadmissível se estar diante de uma situação em que os mesmos policiais


que efetuaram a abordagem, SAMUEL, GERALDO E FERREIRA, e que serviram de
testemunhas, compromissadas legalmente, advertidas precedentemente da sanção punitiva do
art. 342 do Código Penal (falso testemunho), terem afirmado, no auto de prisão em flagrante,
falsamente e com bastante riqueza de detalhes que a vítima ELZA teria pegado das mãos do
prefeito Kato a quantia de R$ 6.000,00 e colocado em sua bolsa, sendo o vídeo mostra que
não existiu nenhum valor sequer mencionado, nem presença de algum objeto caracterizando
uma bolsa.

Deste modo, o Parquet só se contentará quando os policiais SAMUEL,


GERALDO E FERREIRA responderem criminalmente também pelo delito de falso
testemunho, previsto no art. 342 do CPB, posto que cristalinamente se vê que fizeram
afirmação falsa como testemunhas no inquérito policial relativo ao flagrante preparado e
forjado.

Reforçando ser um caso típico de flagrante preparado, não é racional e


lógico crer que o Dr. Kato cederia uma quantia de dinheiro como forma de atender uma
exigência e o numerário ser produto de extorsão, uma vez que o próprio dentista Kato afirma,
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categoricamente, que quando a vítima Elza adentrou na sala onde ocorreu a abordagem, os
policiais já estavam em uma antessala (vide fls.127).

Em verdade, a bolsa estava no interior do veículo fiesta preto, que, como


dito pelos policiais, foi retirado das vítimas juntamente com outros pertences (joia, óculos,
lente de contato, bíblia, dinheiro, escrituras públicas) e os documentos originais
comprobatórios da dívida do Dr. César (vide fls. 05 dos autos), os quais, sequer foram
formalmente apreendidos.

Em contradição, o próprio Dr. Kato confirma em seu depoimento que viu


documentos em cima da mesa da sala onde fica o Del. EDER MAURO, afirmando ainda ter
ouvido que alguns seriam de outros Estados, ou seja, as escrituras públicas subtraídas das
vítimas (vide fls. 128 e 28).

Já o depoimento na DECRIF, o Del. EDER MAURO afirmou ter apenas


apreendido o suposto dinheiro e celulares (vide fls. 36), isto que dizer que, os policiais, a
pretexto de criarem um flagrante preparado e forjado, conseguiram subtrair pertences, valores,
documentos originais da dívida do Dr. César.

Não conseguindo atingir o maior bem jurídico que é a vida, por modo
milagroso e pela atitude enérgica e de desespero dos ofendidos que gritaram por socorro,
submeteram as vítimas, porém, a toda sorte de tortura com intenso sofrimento físico e
psicológico.

X. DOS POLICIAIS QUE NÃO FORAM OUVIDOS

Os policiais identificados por nome VITOR HUGO e HAMILTON, os


quais, segundo o policial Miguel Castro, teriam chegado junto com o Dr. EDER MAURO, no
consultório, não foram ouvidos (vide fls. 49).

Os policiais militares AMILTON SENA e FRANCISCO CONCEIÇÃO,


poderiam ser arrolados para servirem de testemunha em juízo, por dizerem em seus
depoimentos que estavam no consultório, inclusive, dizendo o primeiro PM, Amilton, em seu
depoimento, que estava na antessala quando da chegada das vítimas no referido consultório.
(vide fls. 132/134).

Vale ressaltar que o PM de prenome Amilton, coincidente e muito


provavelmente, é o mesmo que se fazia presente no momento da soltura das vítimas Dirceu e
Elgids (vide certidão do oficial de justiça).

Além do mais, é de causar estranheza ter dois PM´s lotados funcionalmente


na Cidade em que o Dr. Kato é prefeito, o Município de Santa Izabel, no mesmo dia do

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flagrante e se consultando no citado consultório, presumindo-se, pois, uma tentativa de


ludibriar a justiça com o fito de sustentar uma criação audaciosa de um flagrante preparado.

XI. DO CORPORATIVISMO POLICIAL

A escrivã da DECRIF, chamada ELLEM, atestou que recebeu as fotos


coloridas, porém, ressaltou, sem razão, que as imagens não estariam relacionadas às vítimas e
ainda frisando que somente 8 das 17 fotos estariam sem assinatura e carimbo do perito (fls.
159).

Não há necessidade de perícia, ensina a medicina legal, para confirmar que as


imagens dizem respeito às vítimas, nem mesmo carimbo, assinaturas e a necessidade de
especificar a vinculação a um determinado laudo, até porque nos três laudos constam
expressamente “segue fotos em anexo”, além do que as imagens são claramente reflexos do
ocorrido e atestam as descrições contidas nos referidos laudos (vide fls. 160 a 162).

De maneira inexplicável, a Delegada responsável pelo inquérito na DECRIF,


Bela. Marcia Contente se valeu dessa situação e, mesmo vendo a filmagem que mostra
visivelmente a truculência dos policiais, preocupou-se em isentar qualquer responsabilidade
criminal aos agentes públicos envolvidos, portanto, em clara demonstração de corporativismo.

Causa espanto, o fato da responsável pelo inquérito na DECRIF fazer


ressaltar divergência em relação ao local de ocorrência e quantidade de policiais agressores
entre os dois laudos de pericia de lesão corporal realizados na vítima ELZA (vide fls. 157 e
160).

Além de ser obvio não poder ter ocorrido em uma clínica do presídio de
Santa Izabel, a simples análise da solicitação da perícia faz constar o real local de ocorrência
(fls. 154), e ainda, os próprios laudos das outras vítimas, Dirceu Jr e Elgids, fazem constar
corretamente o local de ocorrência (vide fls. 156 e 158).

Na verdade isso é mais uma prova do descaso quando da realização da


primeira perícia (fls. 157), posto que somente na segunda perícia constou-se corretamente o
local de ocorrência (fls. 160), apesar da notória constatação apenas dos erros irrelevantes nos
laudos da vítima.

A DECRIF não se preocupou em verificar quais divergências nos laudos


periciais dos dois policiais acerca do número de agressores, posto que constam no laudo dois
agressores presos (vide fls. 339 e 341), portanto, em clara contradição. Entretanto, não há
contradição com outro laudo pericial, mas com o próprio relatório policial da mesma DECRIF
(vide fls. 187/188).

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Da mesma forma, apesar de ter sido solicitado pelas vítimas no procedimento


administrativo instaurado contra os policias, também, na mesma DECRIF, o policial Carlos
Ferreira não foi devidamente chamado a figurar como investigado no inquérito policial que
veio servir para o início da presente ação penal pelo crime de tortura e falsidade ideológica. O
mesmo deveria inarredavelmente responder em concurso com os demais policiais pelo crime de
tortura, sendo que o policial Ferreira na instrução figurou como testemunha.

Alias, nesse ponto, é de se ressaltar que o Del. EDER MAURO, perante o


Ministério Público, afirmou que havia determinado que os policiais Samuel, Geraldo e Gilberto
fossem para o consultório (vide termo de depoimento), enquanto que, em verdade, foram os
policiais Samuel, Geraldo e Ferreira, conforme, aliás, chegou a informar a DECRIF (vide fls.
35 dos autos e auto de prisão em flagrante). O policial Gilberto surgiu, posteriormente, já
durante as vítimas estarem na DEPOL/Marco.

XII. CONTRADIÇÕES ENTRE O DR. KATO E SUA SECRETÁRIA

O dentista Kato, em seu depoimento, destaca dois momentos, início de


agosto e 14 de agosto, em que supostamente a vítima Elza teria lhe proferido fortes ameaças
(vide fls. 126 e 127).

A secretária do Dr. Kato, Ângela, ressalta que, desde abril do ano de 2009,
supostamente Elza teria agido de forma agressiva e proferido fortes ameaças, dizendo que isso
se intensificou posteriormente e que, a partir da semana que antecedeu o flagrante, esta estava,
inclusive, sob a proteção de um segurança (vide fls. 120 e 121).

O dentista Kato agiu com frieza, pois estava seguro na preparação de um


flagrante ilegal e forjado, tendo por “iscas” dessa armadilha as vítimas Elza e seus 2 filhos,
Dirceu Jr e Elgids, já que a primeira vítima se dirigiu ao consultório por imaginar receber parte
da dívida conforme encaminhado pelo Dr. César.

XIII. DA TENTATIVA DO DR. CÉSAR E DO PREFEITO DR. KATO DE SE


LIVRAREM DE SUAS CONDUTAS IRREGULARES

Apesar de ser injustificável, o Dr. César, na qualidade de Juiz de Direito, tem


a obrigação de explicar o porquê dele não ter sequer registrado os fatos que alega em desfavor
da vítima Elza.

O meritíssimo, Dr. César, alega que vítima Elza, supostamente,


aproveitando-se de sua condição de credora, pois fazia do crédito que tinha o que rotula de
“moeda de troca” com os políticos de todas as Comarcas, onde passou e exerceu sua função
de magistrado, ou seja, Alenquer, prefeito João Piloto, Tucumã, prefeito Alan de Azevedo, e
Santa Izabel do Pará, prefeito Mario Kato (vide fls. 110).

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Ora é inconcebível que um juiz de direito, que deve velar rigorosamente por
sua honestidade e moral em prol de preservar a nobre e digna imagem da função jurisdicional,
não tome qualquer atitude contra qualquer fato que possa lhe comprometer, ainda mais quando
consistirem em circunstâncias graves e inaceitáveis.

Até porque, se o art. 301 do Código de Processo Penal, ao tratar sobre


legitimidade de prender alguém em flagrante delito, possibilita isso de forma facultativa a
qualquer do povo e de modo obrigatório a um policial, ressalvando situações de
impossibilidade, como no caso da inviolabilidade de domicílio, é lógico e razoável que esse
mesmo dever se estenda com mais rigor a um juiz de direito.

A verdade é que o próprio Dr. César arregimentava terceiros com a


finalidade de pagarem suas dívidas, até porque sua dívida exorbita o seu próprio subsídio,
supostamente, fazendo acertos com os referidos políticos em troca de determinadas decisões
judiciais.

Tanto é verdade que Kato deixa implícito isso em seu depoimento ao afirmar
que no mês de maio, três meses antes do flagrante, poderia ajudar a vítima Elza posteriormente
a pedido do magistrado (vide fls. 126).

Da mesma forma, é inconcebível um juiz de direito, em procedimento


administrativo perante a Corregedoria de Justiça do Interior, poder arrolar como testemunhas
para depor a seu favor os prefeitos das Comarcas que exerceu magistratura (Alenquer,
Tucumã e Santa Izabel), mormente pelo fato destes, de maneira inacreditavelmente leviana e
sórdida, advogarem, repita-se, a seu favor, e tentarem transferir a responsabilidade de suas
irregularidades cometidas para a vítima Elza.

Salta aos olhos o conluio existente entre o juiz Cesar e os prefeitos dos
Municípios onde exerceu a magistratura. Se supostamente esses fatos graves se dessem da
forma invertida como querem fazer parecer, por que só posteriormente vieram com essa
criação absurda e não tomaram, anteriormente, juntos ou separadamente, a devida providência
judicial ou extrajudicial de forma imediata?

Como já dito, novamente isso demonstra a tentativa desenfreada do Dr.


Cesar tentar a todo custo se livrar de suas condutas ilícitas tentando transferi-las para outras
pessoas com argumentos e fatos que só fazem revelar sua incompatibilidade com a função
nobre que exerce, cuja veracidade das suspeitas deve ser apurado pelo órgão correcional.

É patente e não tem como não haver vestígios de seu envolvimento com
faltas disciplinares, tanto é que até as notas promissórias têm por emitente o próprio Dr. César
e avalista o prefeito do Município de Alenquer, João Piloto, comarca onde exerceu a
magistratura, revelando de forma clarividente existência de indícios indevida e ilícita de relação
comercial.
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Como disse Francisco Bilac Moreira Pinto: “toda vez que a corrupção
pública e administrativa passa a constituir vício generalizado, cria, em torno do governo,
um odor de escândalo e provoca a indignação da opinião pública, pois cada cidadão se
sente lesado pelo enriquecimento ilícito daqueles que mantêm conduta imprópria no
exercício de cargos ou funções públicas.” 1

XIV. DO COLUIO ENTRE O DR. CESAR E O DR. KATO NO FLAGRANTE


PREPARADO. MUDANÇA DE DEPOIMENTO DO DR. KATO PARA
ATENDER INTERESSE DO DR. CESAR. PEDIDO DE DESTRANCAMENTO.
CONDUTA DO ASSESSOR DO DR. CÉSAR, SR. WALTER

Na DECRIF, Mario Kato, demonstrando certa preocupação em afastar o


envolvimento do Dr. César no caso, faz destacar o nome da ex-mulher deste último como a
pessoa responsável por sua dívida, já que não mencionou isso no auto de flagrante (vide fls.
vide fls. 126).

Por outro lado, o fato de Mario Kato, na DECRIF, no dia 15.10.09, ressaltar
o mesmo argumento dito pelo Dr. César, vinte dias antes, também na DECRIF, no dia
25.09.09, de que o flagrante não seria preparado e sim esperado (vide fls. 111/128).

No mínimo é de se estranhar, o porquê do mesmo advogado que


acompanhou o Dr. Kato, na DECRIF, Manoel de Jesus, não ter usado esse mesmo
argumentado no depoimento colhido, no dia do flagrante, ou então até antes de ser trancado o
respectivo inquérito policial. (vide fls. 128).

Seria coincidência de mais para ser verdade, mesmo porque Cesar e o Kato
negam ter havido comunicação entre ambos. Consequentemente, o que se deduz, a partir da
análise dos depoimentos, é que houve mudanças significativas entre os depoimentos do Dr.
Kato, de forma a ficar em sincronia com o do Dr. César, tornando-se implícito daí a ligação
entre ambos. (vide fls. 110, 126 e 128).

Se o Dr. César nega o seu envolvimento ou participação com a ocorrência


do flagrante, então, deve explicar o porquê do seu interesse no procedimento investigatório,
mormente ao fato de ter, inclusive, tentando o destrancamento do inquérito, isso através de
petição de sua própria lavra endereçada à Vara de Inquéritos Policiais (vide documento
anexo).

Pode um juiz postular em causa própria para a mesma instituição em que é


membro e ainda alegando não ter interesse?

1
Francisco Bilac Moreira Pinto, “Enriquecimento Ilícito no Exercício de Cargos Públicos”, Ed.
Forense, Rio, p. 77.
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Ademais, se desconhecia até então o flagrante e não tinha nele nenhum


envolvimento, Cesar deve esclarecer como e por que, então, foi informado do flagrante por seu
próprio assessor Walter Elias, a pedido de EDER MAURO, levando em conta que este último,
Del. EDER MAURO, na DECRIF, disse vagamente que apenas ouviu falar que,
provavelmente, o caso envolvia um juiz sem saber ou precisar qual, tanto que em seu
depoimento, nem se menciona o nome Cesar! (vide fls. fls. 34, 110 e 111).

Por sua vez, EDER MAURO deve explicar o porquê do assessor Walter não
ser ouvido e sequer ter sido mencionado em seus depoimentos, e ainda, como conseguiu
contato com este referido assessor. Na verdade, isso nem poderia ser possível porque o
referido assessor na ocasião do flagrante estava afastado de suas funções por estar em
tratamento de saúde.

XV. DO FLAGRANTE PREPARADO

Desde a suposta comunicação policial já se encontram presentes indícios até


mesmo de fraude, pois Kato afirma ter registrado, na DEPOL/Marco, porém, o suposto BOP
foi registrado na DEAM (especializada em atendimento à mulher), às 10h05min, da manha do
dia do flagrante em Ananindeua, ou seja, em Município de outra jurisdição, em Delegacia
especializada imprópria e ainda 30 minutos antes da vítimas chegarem no consultório (vide fls.
18 e 127), posto que o próprio Kato afirma que as mesmas chegaram por volta de 10:30,
portanto, totalmente improvável de ter havido realmente uma formalização lícita de um
registro policial.

Por outro lado, a secretária do Dr. Kato, Ângela Miraci, disse que
supostamente teria avisado a vítima Elza que aquele só lhe atenderia na sexta (fls. 135), ou
seja, no dia seguinte e que ocorreu o flagrante, portanto, daqui já se percebe certa provocação
em espécie de convite por parte do Dr. Kato, atraindo sua “isca” para uma armadilha que
preparava, inclusive, com a ideia de filmar o que poderia ocorrer.

Reforça, ainda, a preparação do flagrante o fato de o próprio Kato afirmar


que quando a vítima Elza adentrou na sala onde ocorreu a abordagem, os policiais já estavam
em uma antessala (vide fls.127), ou seja, seria impossível ocorrer nessa situação um crime,
tampouco se acreditar que Kato cederia uma quantia de dinheiro como forma de atender uma
exigência e ser um produto de extorsão.

Por outro lado, na verdade, foi o próprio Cesar que encaminhou a vítima
Elza que se dirigiu, inocentemente, ao Consultório para que recebesse parte da dívida do
magistrado.

Portanto, resta claro que Elza foi atraída ao encontro para cair na armadilha
arquiteta pelo Dr. César, pelo Dr. Kato e pelos policiais.
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A doutrina e a jurisprudência consideram que o flagrante preparado ocorre


quando o agente é induzido ardilosamente a praticar o fato. Logo, no caso concreto, quando
há hipótese da figura de um provocador, que atua para que um agente pratique um delito, isso
enseja a configuração do flagrante preparado, só sendo esperado quando absolutamente
inexistir a figura desse provocador, conforme escólios a seguir.

HABEAS CORPUS Nº 52.980 - SP (20060011569-0)


RELATOR: MINISTRO OG FERNANDES
IMPETRANTE: MÁRCIO TADEU RODRIGUES
IMPETRADO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
PACIENTE: EMERSON LUIZ DOS PRAZERES (PRESO)
PACIENTE: JOSÉ AUGUSTO DOS SANTOS (PRESO)
EMENTA
HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O
TRÁFICO. ALEGAÇÃO DE FLAGRANTE PREPARADO.
IMPROCEDÊNCIA. COMPROVAÇÃO DAS CONDUTAS 'GUARDAR' E
'TER EM DEPÓSITO' ENTORPECENTE. VIOLAÇÃO AO ART. 384, DO
CPP. INEXISTÊNCIA. HIPÓTESE DE EMENDATIO LIBELLI. TESE
DE NULIDADE DA SENTENÇA POR NÃO ENFRENTAMENTO DE
ALEGAÇÕES DEFENSIVAS. DESCABIMENTO. CERCEAMENTO DE
DEFESA. AUSÊNCIA. ACUSADOS QUE FORAM DEVIDAMENTE
INTIMADOS PARA TOMAR CIÊNCIA DAS PROVAS PRODUZIDAS
NOS AUTOS. MATÉRIA NÃO APRECIADA PELA INSTÂNCIA
ORDINÁRIA EM SEDE DE WRIT ORIGINÁRIO. SUPERVENIÊNCIA
DE ENFRENTAMENTO DA QUESTÃO POR MEIO DE APELAÇÃO
DEFENSIVA. ABERTURA DA COMPETÊNCIA DESTE TRIBUNAL.
1. O fato de os agentes policiais simularem a compra da droga somente
evidencia que os acusados guardavam e tinham em depósito os
entorpecentes, condutas previstas no tipo penal que lhes é imputado.
Inexistência de flagrante preparado.
2. Improcede a alegação de nulidade da sentença quando todas as teses
defensivas foram devidamente enfrentadas na decisão.
3. Há emendatio e não mutatio libelli quando o Magistrado dá nova
capitulação jurídica aos fatos já narrados na denúncia.
4. No caso, o Juiz do processo considerou, com base no que fora descrito na
denúncia e confirmado pelo conjunto probatório, que a associação delitiva
era permanente e não apenas eventual. Daí a razão para se afastar a
majorante prevista no art. 18, III, da Lei nº 6.36876 e entender configurado
o delito previsto no art. 14, também da Lei Antidrogas.
5. Havendo nos autos a comprovação de que a defesa técnica foi
devidamente intimada e tomou ciência das provas produzidas, descabe falar
em constrangimento ilegal decorrente de cerceamento de defesa.
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6. Considerando-se a grande quantidade de entorpecente apreendido - mais


de 10 (dez) quilos de cocaína - aliada à existência de condenação anterior,
também por tráfico de drogas, justificada está a fixação da pena-base em
patamar superior ao mínimo legal. Assim, não há constrangimento ilegal a ser
sanado.
7. Ordem denegada.

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por
unanimidade, denegar a ordem de habeas corpus , nos termos do voto do Sr.
Ministro Relator. Os Srs. Ministros Celso Limongi (Desembargador
convocado do TJSP), Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do
TJCE) e Maria Thereza de Assis Moura votaram com o Sr. Ministro Relator.
Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura.
Brasília, 17 de fevereiro de 2011 (data do julgamento).
Relator: MINISTRO OG FERNANDES

HABEAS CORPUS Nº 52.980 - SP (20060011569-0)


RELATÓRIO DO SR. MINISTRO OG FERNANDES: Trata-se de habeas
corpus substitutivo de recurso ordinário, com pedido de liminar, impetrado
em favor Émerson Luiz dos Prazeres e José Augusto dos Santos, que
denegou a ordem lá impetrada.
Consta dos autos que os pacientes foram denunciados pela suposta prática
dos delitos previstos no art. 12, cc o art. 18, III, da Lei nº 6.36876, além do
art. 1º da Lei nº 2.25254.
Ao final da instrução, sobreveio sentença absolvendo-os em relação ao delito
de corrupção de menores e condenando-os como incursos nas penas dos
artigos 12 e 14 da Lei Antidrogas.
Ao paciente Émerson foi aplicada a pena de 12 (doze) anos de reclusão, a ser
cumprida integralmente em regime fechado, além de 200 (duzentos) dias-
multa, enquanto o paciente José Augusto recebeu sanção de 14 (quatorze)
anos de reclusão, mais pagamento de 233 (duzentos e trinta e três) dias-
multa.
Irresignada, a defesa interpôs apelação e concomitantemente impetrou
habeas corpus.
Denegada a ordem, sobreveio a impetração do presente writ.
Alega o impetrante ser nula a sentença por não terem sido apreciadas as teses
defensivas.
Sustenta, mais, a ocorrência de mutatio libelli, sem que tenham sido adotadas
as providências elencadas no art. 384, parágrafo único, do CPP.

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Diz, ainda, haver cerceamento de defesa, porque supostamente não


intimados os patronos anteriores, "acerca da juntada de documentos
relevantes e que deram suporte à condenação" (fl. 10).
Aduz, outrossim, erro na dosimetria da pena e a existência de flagrante
preparado, o que tornaria impossível a prática do delito.
Pleiteia, ao final, seja anulada a sentença, ou, subsidiariamente, seja reduzida
a pena.
Em 18.1.06, a liminar foi indeferida pelo então Presidente.
Ouvido, o Ministério Público Federal opinou pelo conhecimento parcial da
ordem e, nessa extensão, pela denegação da ordem.
Atribuído o feito em 27.6.08, vieram-me conclusos os autos.
Há notícia de que, em 5.6.07, a Corte Bandeirante deu parcial provimento ao
apelo defensivo, tão-somente para afastar a vedação legal à progressão de
regime prisional.
É o relatório.

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VOTO; O SR. MINISTRO OG FERNANDES (Relator): São várias as
alegações vazadas na impetração. Assim, melhor sejam elas apreciadas em
separado.
I - nulidade da sentença, por violação ao disposto no art. 384, III, do CPP:
Ao contrário do que fora ventilado na inicial, a situação dos autos aponta
para o procedimento previsto no art. 383, do Código de Processo Penal
(emendatio libelli). Com efeito, limitou-se o Magistrado a dar o melhor
enquadramento jurídico aos fatos narrados na peça acusatória.
Veja-se, por oportuno, o que consta no mencionado dispositivo:
Art. 383. O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou
queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em
consequência, tenha de aplicar pena mais grave.
§ 1º Se, em consequência de definição jurídica diversa, houver possibilidade
de proposta de suspensão condicional do processo, o juiz procederá de
acordo com o disposto na lei.
§ 2º Tratando-se de infração da competência de outro juízo, a este serão
encaminhados os autos.
No caso, o Juiz do processo considerou com base no que fora descrito na
denúncia e confirmado pelo conjunto probatório, que a associação delitiva
era permanente e não apenas eventual. Daí a razão para se afastar a
majorante prevista no art. 18, III, da Lei nº 6.36876 e entender configurado
o delito previsto no art. 14, também da Lei Antidrogas ,confira-se, a
propósito, o que consta na sentença (fls. 173174): Entendo possível, ainda, a
condenação dos acusados pela prática do art. 14 da Lei de Tóxicos, vez que
cristalina a realização dessa outra conduta criminosa, lembrando que resta
comprovado que já se conheciam, que houve negociação da droga dias antes
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e que houve convergência das condutas de cada um dos réus para obtenção,
guarda, depósito e transporte de grande quantidade de cocaína.
Ressalte-se que a associação para o tráfico está devidamente narrada na
denúncia (fls. 03: ' Consta, ainda, que nas mesmas circunstâncias de data e
local, os denunciados... associaram-se para o cometimento de tráfico acima
descrito. '), nos moldes do tipo penal previsto no art. 14: Associarem-se uas
ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos
crimes previstos nos arts. 12 ou 13 desta Lei.
Uma vez descrita a conduta, os réus tiveram a possibilidade de se defender
dos fatos, podendo o Juiz dar classificação jurídica diferente ainda que tenha
que aumentar a pena, por autorização do art. 383, do Código de Processo
Penal), como no caso em tela.
II - nulidade da sentença, por não enfrentamento de todas as teses
defensivas: Nesse ponto, cabe recuperar o que escreveu o Relator do writ
originário (fls. 190): Outrossim, tendo em vista as alegações finais das partes
e pela leitura da r. decisão de primeiro grau, observa-se que referida decisão
relatou as teses defensivas, bem como analisou exaustivamente as provas
existentes contra os pacientes, notadamente tendo em conta as súplicas dos
doutos Defensores. Portanto, não se observa nulidade processual manifesta
por cerceamento de defesa.
Quando do julgamento da apelação, o tema voltou a ser enfrentado pela
Corte Bandeirante, que consignou: Outra questão prejudicial, refere-se ao
argumento de que as diversas teses defensivas não foram integralmente
rebatidas - obviamente não implica em nulificação dos atos processuais. Com
efeito, a opção do Magistrado por uma das teses existentes nos autos não
tem o condão de invalidar a sentença. É diverso o termo "não apreciar" de
"não acolher", pois somente a primeira anula o julgado.
Na espécie, o dedicado MM. Juiz sentenciante, analisou os fatos de maneira
pormenorizada e demonstrou sua convicção para embasar a condenação no
artigo 12 e no artigo 14, ambos, da Lei de Tóxicos, rejeitando,
implicitamente, as pretensões defensivas absolutórias, respeitado o princípio
do livre convencimento fundamentado.
Nesse sentido: "Inocorre nulidade da sentença por ausência de apreciação de
tese esposada pela parte se o julgador encerra conclusão inconciliável com a
mesma, sendo desnecessário que o Juiz afaste argumento por argumento da
defesa ou acusação." (TACRIM, Rev. 301574, julgada em 22.5.97).
A partir da leitura das alegações finais e também da sentença, vê-se que
todas as teses arguidas pela defesa foram apreciadas pelo julgador. Assim,
não há o constrangimento ilegal invocado. Nesse sentido:
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. (...). APRECIAÇÃO
DE TODAS AS TESES DEFENSIVA PELA SENTENÇA.
OCORRÊNCIA. NULIDADE INEXISTENTE. EXCESSO DE PRAZO.
ALEGAÇÃO PREJUDICADA.
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1. A prova emprestada de outra ação penal somente pode ser valorada se


ambas as partes tiveram integral ciência e a possibilidade do exercício do
contraditório.
2. A vedação da presença de advogado não constituído ao interrogatório de
co-réu em ação conexa que corre sob sigilo não constitui cerceamento de
defesa se não restou comprovado em que medida a prova influenciou no
julgamento, não se evidenciando qualquer prejuízo.
3. Não há nulidade na sentença que analisa todas as teses defensivas,
rebatendo-a pontualmente.

(RHC 20.372SP, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJ de


11.6.07) CRIMINAL. HC. NULIDADE. OMISSÃO DA SENTENÇA
CONDENATÓRIA. INOCORRÊNCIA. TESES DEFENSIVAS
ABORDADAS EM 1º GRAU. EVENTUAL OMISSÃO SANADA EM 2º
GRAU. ORDEM DENEGADA.
I. Não há ilegalidade na sentença condenatória, se evidenciado que o
decisum abordou todas as teses defensivas. (HC 22.308MG, Relator
Ministro Gilson Dipp, DJ de 10.3.03)
III - cerceamento de defesa, em virtude de a defesa técnica não ter sido
intimada acerca de provas juntadas aos autos:
Uma vez mais, sem razão o impetrante. Sobre o tema, adiro às elucidativas
ponderações feitas pelo douto parecerista, que assim se manifestou (fls. 221):
No que tange à alegação de cerceamento de defesa, fundada na ausência de
intimação dos patronos constituídos acerca da juntada de documentos
relevantes, esta também não merece prosperar, haja vista que o impetrante
não apresentou qualquer prova capaz de elidir a certidão de fls. 87 (frente e
verso), que atesta terem sido intimados os advogados dos pacientes sobre a
juntada do resultado de interceptação telefônica.
De fato, há certidão nos autos noticiando a ciência da defesa técnica em
relação aos documentos apontados. Veja-se, ainda, que o Tribunal de origem
explicitou o seguinte: "os defensores foram devidamente intimados acerca
dos documentos juntados posteriormente às alegações finais. E mais, essa
nulidade apenas ocorreria se resultasse prejuízo para a Defesa, o que não
restou demonstrado" (fls. 189190).
IV - da existência de flagrante preparado: Diz o impetrante que a existência
de flagrante preparado tornaria impossível a prática do delito. Tal alegação,
entretanto, não encontra amparo nos autos, pois o fato de os agentes
policiais simularem a compra da droga somente evidencia que os acusados
guardavam e tinham em depósito os entorpecentes, condutas previstas no
tipo penal que lhes é imputado.
Em casos análogos, esta Corte vem assim decidindo:
PENAL E PROCESSUAL. HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS.
FLAGRANTE. EXAME DE PROVAS.
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I - As condutas delituosas nas formas de "ter em depósito", "transportar",


"trazer consigo", "guardar" inseridas no tipo misto alternativo do art. 12 da
Lei nº 6.36876 apresentam forma típica congruente em que o tipo subjetivo
se esgota no dolo, despiciendo qualquer especial fim de agir.
II - A eventual simulação na compra de tóxicos, por parte de policial, sendo
precedida ela da posse por parte do paciente, não tem o condão de
descaracterizar a conduta deste último como incurso nas sanções do art. 12 .
Outras circunstâncias fáticas questionadas escapam dos limites do habeas
corpus.
(HC 11.099SP, Relator Ministro Felix Fischer, DJ de 28.2.00)
CRIMINAL. RHC. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PRISÃO EM
FLAGRANTE. ALEGAÇÃO DE FLAGRANTE PREPARADO.
INOCORRÊNCIA. FLAGRANTE ESPERADO. RÉS PRESAS NA POSSE
DE SUBSTÂNCIA ILÍCITA. CRIME CONSUMADO NO NÚCLEO
"TRAZER CONSIGO". (...).
I. Não há que se confundir flagrante forjado com esperado, em que a polícia
tão-somente espera a prática da infração, sem que haja instigação e
tampouco a preparação do ato, mas apenas o exercício de vigilância na
conduta do agente criminoso.
II. O delito de tráfico de entorpecente consuma-se com a prática de
qualquer umas das dezoito ações identificadas no núcleo do tipo, todas de
natureza permanente que, quando preexistentes à atuação policial, legitimam
a prisão em flagrante, sem que se possa falar em flagrante forjado ou
preparado.
III. Hipótese em que as pacientes não foram apreendidas no momento em
que comercializavam a droga, o que teria sido obstado pela presença dos
policiais, tendo o delito sido deflagrado em momento anterior, pelo núcleo
"trazer consigo" substância entorpecente, razão pela qual se tem como
descabida a aplicação da Súm. nº 145 do STF, a fim de ver reconhecido o
crime impossível.
(RHC 20.283SP, Relator Ministro Gilson Dipp, DJ de 4.6.07)
Essa também é a orientação perfilhada na Suprema Corte. Vejamos:
Habeas corpus . Tráfico de entorpecentes. Art. 12, caput da Lei nº 6.36876.
Flagrante preparado. Não ocorrência. Paciente que, no momento dos fatos,
se encontrava em local considerado ponto de tráfico, tendo ido buscar a
droga após a solicitação de compra. A ser verídica a versão dos policiais, o
paciente, após o pedido, teria ido buscar a droga em local onde a estava
depositando, conduta que incidiria no art. 12, caput da Lei nº 6.36876, na
modalidade "ter em depósito", como capitulado na denúncia, inexistindo o
flagrante preparado porque, a exemplo do entendimento esposado no HC nº
72.824SP (Min. Moreira Alves), o crime, de caráter permanente, já se teria
consumado. Se verídica a versão do paciente apresentada no interrogatório
em juízo, seu comportamento incidiria, em tese, na hipótese do art. 16 do
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mesmo diploma legal, dando azo a uma eventual desclassificação, nos termos
do art. 383 do Código de Processo Penal, o que, no entanto, se mostra
inviável nesta sede diante da disparidade de conteúdo dos elementos
apresentados. (STF - HC 81.970SP, 1ª Turma, Relator Ministro Gilmar
Mendes, DJ de 30.8.02)

HABEAS-CORPUS . CRIME DE TRÁFICO DE ENTORPECENTES.


CONDENAÇÃO EM SEGUNDA INSTÂNCIA: ALEGAÇÃO DE FALTA
DE JUSTA CAUSA; NULIDADES. 1. Justa causa: a condenação tem
outros fundamentos suficientes, além da confissão perante a autoridade
policial e depois retratada em juízo, com alegação de que houve coação. 2. O
Estado não tem o dever de manter advogados nas repartições policiais para
assistir interrogatórios de presos; a Constituição assegura, apenas, o direito
de o preso ser assistido por advogado na fase policial. 3. Não ocorre, no
caso, a hipótese de flagrante preparado, mas a de esperado; não tem
aplicação a Súmula 145 porque o art. 12 da Lei de Tóxicos prevê diversos
tipos penais, entre eles a posse da substância entorpecente, suficiente para
consumar o crime de tráfico, sendo irrelevante que a sua venda tenha se
consumado ou não . 4. Nulidades ocorridas durante o inquérito policial não
contaminam o processo penal, eis que após a prolação da sentença
condenatória, esta é que deve ser atacada por eventuais nulidades. 5. "
Habeas-corpus " conhecido, mas indeferido."
(STF - HC 73.898SP, 2ª Turma, Relator Ministro Maurício Corrêa, DJ de
16.8.96)
V - da exacerbação na aplicação da pena:
Por fim, é de ver que esse ponto não foi apreciado pela Corte Estadual,
quando do julgamento do writ originário, o que inviabilizaria, num primeiro
momento, a apreciação do pedido.
Essa foi a opinião do representante do Parquet Federal. Confira-se (fls. 221):
Quanto à alegação de que a dosimetria da pena não observou o critério
trifásico, impende observar que o conhecimento dessa irresignação implicaria
em supressão de instância, na medida em que a Corte de Origem não
apreciou a questão, remetendo-a ao julgamento das apelações interpostas
(fls. 190191).
De todo modo, considerando-se a quantidade de droga apreendida mais de
10 (dez) quilos de cocaína não se mostra desarrazoada a fixação da pena-
base acima do patamar mínimo.
Foi também com base na elevada quantidade de droga utilizada que o
Tribunal de origem, em sede de apelação, apreciou - e refutou - o pedido de
redução das sanções recaídas sobre o ora paciente.
Além disso, apontou-se, em relação ao paciente José Augusto, a existência
de condenação anterior, igualmente por crime de tráfico de drogas. Assim,
inexiste o constrangimento ilegal propalado.
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A propósito:
Mantida a condenação, avalia-se a dosimetria penal aplicada e o regime
prisional imposto.
Fixou-se a pena-base acima dos patamares mínimos, na proporção do triplo,
levando-se em consideração que foi apreendida grande quantidade de droga
em poder dos apelantes.
De fato, a apreensão de mais de dez quilos de cocaína constitui fator
indicativo de maior intensidade dolosa da conduta criminosa .
Não se pode comparar o ato de vender pequenas porções individuais, em
plena via pública, com a distribuição no atacado de fabulosas quantidades de
entorpecente.
Merece maior censura e reprovação a conduta daqueles que se dedicam ao
nefasto comércio de drogas, com intenção nítida de dominar a rede de
distribuição, em busca do enriquecimento ilícito rápido. Não há, pois,
reparos a serem feitos.
.................................................................................................................
De igual maneira, deve ser mantida fixação da pena-base do apelante
José Augusto pouco acima do patamar mínimo, adotado como referencial o
coeficiente de 16 (um sexto), tendo em vista a sua condenação pretérita pela
prática de trafico ilícito de drogas.
Pelo exposto, voto pela denegação da ordem.
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
SEXTA TURMA- Número Registro: 20060011569-0

HC 52.980 SP- MATÉRIA CRIMINAL


Números Origem: 4702004 8443053
EM MESA JULGADO: 17022011
Relator Exmo. Sr. Ministro OG FERNANDES- Presidente da Sessão
Exma. Sra. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. EITEL SANTIAGO DE BRITO PEREIRA
Secretário- Bel. ELISEU AUGUSTO NUNES DE SANTANA
AUTUAÇÃO- IMPETRANTE : MÁRCIO TADEU RODRIGUES
IMPETRADO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
PACIENTE : EMERSON LUIZ DOS PRAZERES (PRESO)
PACIENTE : JOSÉ AUGUSTO DOS SANTOS (PRESO)
ASSUNTO: DIREITO PENAL - Crimes Previstos na Legislação
Extravagante - Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas - Tráfico
de Drogas e Condutas Afins CERTIDÃO. Certifico que a egrégia SEXTA
TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data,
proferiu a seguinte decisão:
"A Turma, por unanimidade, denegou a ordem de habeas corpus, nos
termos do voto do Sr. Ministro Relator."
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Os Srs. Ministros Celso Limongi (Desembargador convocado do TJSP),


Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJCE) e Maria Thereza
de Assis Moura votaram com o Sr. Ministro Relator.
Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura.
Brasília, 17 de fevereiro de 2011
ELISEU AUGUSTO NUNES DE SANTANA- Secretário
Documento: 1038740 Inteiro Teor do Acórdão - DJe: 01/01/2011

Ora, há inúmeras formas de provocações.

Além de ter sido supostamente avisada pela secretária do Dr. Kato de que
este a atenderia na sexta, o próprio Cesar lhe orientou que assim o fizesse.

Quando do encontro com o dentista em seu consultório, o mesmo agiu de


forma dissimulada como se nunca lhe tivesse conhecido e se prontificando em pagar parte da
dívida do Dr. César. Inclusive, de forma extremamente fria e torpe, Kato de todo meio
instigava a vítima Elza para que viesse a falar sobre um valor para lhe deixar em paz, bem
como lhe provocava de modo a exaltar o seu ânimo pela forma que estava sendo moralmente
destratada.

O dentista Kato tentava de varias maneiras, como se não conhecesse a vítima


Elza, pois insistia que a mesma lhe dissesse quanto ela queria para deixá-lo em paz e
claramente ela apenas lhe respondia que estava lá a mando do Dr. César, que a conhecia e que
estava aguardando, por isso não entendia sua maneira de agir.

Tanto é, alias, que o próprio Kato afirma “insistiu para que ela (Elza) falasse,
pois a posição da câmera não dava para registrar os valores que estavam no papel” (vide fls.
127 e 128).

De forma maquiavélica, Kato, pelo fato de, em nenhum momento, ter


conseguido obter a resposta que tanto provocava e queria ouvir da vítima Elza,
insistentemente, ainda tentou, novamente sem êxito, fazer transparecer que a ofendida
estivesse lhe agredido e recebido de si uma quantia.

O mesmo Kato, por não ter novamente conseguido sua pretensão de


manipular a situação, inacreditavelmente, ainda tenta disfarçar seu fracasso dizendo que a
câmera não registrou o momento da suposta entrega do dinheiro.

Todavia, sua pretensão foi completamente infrutífera. A própria filmagem


serviu para que a verdade dos fatos fosse descoberta, pois em nenhum momento a vítima Elza
propôs valor ao qual Kato a instigava.

XVI. DO FLAGRANTE FORJADO


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Por que Kato sacaria do banco R$ 4.000,00 (quatro mil reais) e usaria mais
R$ 2.000,00 (dois mil reais), advindos de seu consultório, para supostamente se ver livre da
vítima Elza? O próprio dentista afirma que estava sob proteção policial e que ficou de
sobreaviso e, inclusive, tinha ciência de que os policiais já estavam prontamente na antessala
quando as vítimas entraram na sala onde foram abordadas e presas (vide fls. 127).

O Dr. Kato cumpriu a ordem judicial advinda do Juízo da Vara de Inquéritos


Policiais de depositar os R$ 6.000,00 (seis mil reais) para que ficassem apreendidos até o
esclarecimento dos fatos? (vide fls. 74).

O mesmo não deveria ao menos comprovar o suposto saque que diz ter feito
no valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais)?

Cumpre ressaltar ser impossível a alegação do Dr. Kato de que teria sacado
do banco R$ 4.000,00 e completado com R$ 2.000,00 dos serviços do consultório.

Ora, pelo horário em que Kato e sua secretária afirmam que a vítima Elza
teria comparecido no seu consultório, no dia anterior ao flagrante, os bancos já teriam
encerrado expediente, às 16 horas, e o flagrante ocorreu no dia seguinte, por volta de 10h30m,
pois o expediente bancário começa às 10h, e Kato estava no consultório atendendo clientes,
logo não teria como ocorrer o dito saque, até porque pelo valor, como é consabido, haveria
necessidade de prévio agendamento bancário para o setor da tesouraria da agência do banco.

Por que não houve o correto procedimento na apreensão de dinheiro, com


discriminação das cédulas apreendidas e indicação de número de série?

Imperioso ressaltar, que quando, do pedido de liberdade provisória, o juiz


plantonista, Dr. Elder Lisboa Ferreira da Costa, salientou que sequer constava nos autos do
flagrante, a peça relativa do termo de apreensão de dinheiro. Mais um fato que salta aos olhos
para comprovar tamanha irregularidade ocorrida.

No caso além de preparado, o flagrante foi forjado, pois, parte desse dinheiro
que foi usado para somar aos 6 mil que seriam o suposto produto de extorsão, muito
provavelmente era da própria vítima Elza.

Tanto é que pouco antes do flagrante ocorrer, a vítima Elza, junto com a sua
genitora, teria sacado o valor de 4 mil reais, na Caixa Econômica Federal, Agência Braz de
Aguiar, o qual, inclusive, seria utilizado para custear despesas da viajem programada para a
noite desse mesmo dia do flagrante, se as vítimas não tivessem sido presas injustamente.
(conforme comprovante de saque).

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Parte desses R$ 4.000,00 (quatro mil reais) foram na verdade subtraídos das
vítimas da seguinte forma: R$ 2.070,00 (dois mil e setenta reais) retirados da bolsa que estava
dentro do carro (vide fls. 27), juntamente com outros pertences (joia, lente, óculos, bíblia,
escrituras públicas), dentre os quais os documentos originais que comprovavam a dívida do
Dr. César. E mais R$ 1.210,00 (um mil duzentos e dez reais), retirados do bolso da calça da
vítima Dirceu Jr pelo policial Samuel, o qual, no caminho do IML, teria percebido o volume do
dinheiro que fazia em sua vestimenta (vide fls. 31).

O Dr. Kato afirma ter tido a ideia de filmar o flagrante preparado e forjado
(vide fls. 127), o vídeo comprova que, sequer Elza estava de bolsa dentro do consultório, bem
como comprova que muito menos existiu o suposto recebimento de 6 mil reais que exigia, pois
a bolsa estava no carro (vide fls. 05 e 290).

Sem contar que ainda houve o dinheiro indevido e forçosamente adquirido


pela advogada Carla, que cobrou a título de honorários profissionais 4 mil reais, sendo que sua
petição afirmou alguns fatos de maneira invertida e para claramente atender a pretensão dos
policiais (vide fls. 93/100).

XVII. DA PROCRASTINAÇÃO DO FEITO

Qual a explicação plausível para justificar que a advogada do acusado EDER


MAURO ter ficado com o processo de tortura a mais de 1 (um) ano em seu poder,
tumultuando o andamento da ação (fls. 221/222 e 224).

A informação de que os réus são primários não é verdade (vide fls. 231),
conforme será comprovado com a juntada de antecedentes criminais de todos os acusados,
inclusive, alguns respondendo por crime de consunção.

XVIII. DO CRIME DE TORTURA

Nesse episódio, as vítimas foram submetidas a intenso sofrimento físico,


mental e moral, sendo as mesmas extremamente humilhadas e torturadas. Além de serem
ofendidas moralmente e agredidas fisicamente pelos policiais, as mesmas ainda ficaram presas
injustamente durante duas noites e dois dias, ainda figuraram como indiciados em crimes que
não praticaram de extorsão, lesão corporal e desacato.

Como ficaram essas vítimas depois de todo esse processo de desumanidade,


marginalização e humilhação? Uma senhora trabalhadora e dois filhos universitários presos,
sendo a primeira em um presídio (Centro Recuperação Feminino – CRF) e os outros na cela da
DEPOL/Marco, injustamente ambos em cárceres horrendos com mais de dez pessoas, durante
duas noites e dois dias?

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Ressalte-se que, por intervenção divina, quando do cárcere, apesar de


estarem com outros presos que praticaram crimes graves como homicídio, tráfico de drogas,
roubo e outros com emprego de violência e grave ameaça, essas pessoas rotuladas como
“bandidas” ou “criminosas” foram as que agiram com senso de humanidade para com as
vítimas que estavam em estado de desespero, oferecendo pomadas para aliviar a dor e inchaço
dos ferimentos em seus corpos, orando, dizendo palavras de conforto, no domingo dividindo
alimentação que os familiares costumam levar aos mesmos (vide depoimento das vítimas).

Enquanto que os policiais, esses que têm o dever de proteger e zelar pela
integridade física e moral da sociedade, mesmo na situação constrangedora que estavam,
desumanamente, atormentavam ainda mais as vítimas, chegando amedrontá-las dizendo até que
dentro do cárcere seriam destratadas e violentadas!

É certo que jamais as vítimas poderão se recuperar por completo e ser


reparadas por todas as humilhações que passaram. Estarão traumatizadas para sempre por tudo
o que sofreram.

Lamentavelmente, estamos diante de um caso em que policiais


desrespeitaram os seus deveres de proteger a sociedade, de estabelecer a ordem e a paz,
agindo de maneira totalmente arbitrária e truculenta, tanto é que estes não tiveram compostura
e respeito em uma audiência, junto a DECRIF, no procedimento administrativo (PAD), para
apuração de suas condutas ilícitas, perante a Del. Rosalina Aguiar, ocasião em que proferiram
palavras inapropriadas e como se não tivessem limites no poder que a sociedade lhes confia
(conforme depoimentos).

As vítimas tem o direito de invocar em proveito delas o posicionamento


recente do STJ que definiu as hipóteses quando o dano moral já é presumível pela força dos
próprios fatos (in re ipsa), incluindo a hipótese de procedimento policial arquivado quando
cabalmente instaurado de forma injusta e de má fé, acarretando danos pessoais, familiar, social,
laboral, isto na ocasião da prolatação de sentença condenatória, conforme arts. 63, 64 e 387,
inc. IV, do CPP, que fixará valor mínimo a título de reparação de dano, podendo
posteriormente prosseguir em proceder a liquidez do dano na seara cível. Vejamos:

STJ DEFINE EM QUAIS SITUAÇÕES O DANO MORAL PODE SER


PRESUMIDO
Diz a doutrina – e confirma a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça
(STJ) – que a responsabilização civil exige a existência do dano. O dever de
indenizar existe na medida da extensão do dano, que deve ser certo (possível,
real, aferível). Mas até que ponto a jurisprudência afasta esse requisito de
certeza e admite a possibilidade de reparação do dano meramente
presumido?
O dano moral é aquele que afeta a personalidade e, de alguma forma, ofende
a moral e a dignidade da pessoa. Doutrinadores têm defendido que o prejuízo
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moral que alguém diz ter sofrido é provado in re ipsa (pela força dos
próprios fatos). Pela dimensão do fato, é impossível deixar de imaginar em
determinados casos que o prejuízo aconteceu – por exemplo, quando se
perde um filho.
No entanto, a jurisprudência não tem mais considerado este um caráter
absoluto. Em 2008, ao decidir sobre a responsabilidade do estado por
suposto dano moral a uma pessoa denunciada por um crime e posteriormente
inocentada, a Primeira Turma entendeu que, para que “se viabilize pedido de
reparação, é necessário que o dano moral seja comprovado mediante
demonstração cabal de que a instauração do procedimento se deu de forma
injusta, despropositada, e de má-fé” (REsp 969.097).
Em outro caso, julgado em 2003, a Terceira Turma entendeu que, para que
se viabilize pedido de reparação fundado na abertura de inquérito policial, é
necessário que o dano moral seja comprovado.
A prova, de acordo com o relator, ministro Castro Filho, surgiria da
“demonstração cabal de que a instauração do procedimento, posteriormente
arquivado, se deu de forma injusta e despropositada, refletindo na vida
pessoal do autor, acarretando-lhe, além dos aborrecimentos naturais, dano
concreto, seja em face de suas relações profissionais e sociais, seja em face
de suas relações familiares” (REsp 494.867). (Disponível em:
http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.t
exto=106255. Publicado em: 01/07/2012. Acessado em: 02/07/2012).

O que não se pode jamais permitir é que a polícia exista para investigar,
buscar e reproduzir a realidade dos fatos, ao invés disso, a própria instituição funciona
forjando e distorcendo a verdade, como infelizmente ocorreu no presente caso a pedido de,
supostamente, um prefeito e um juiz.

A conduta dos acusados, além de causarem danos irreparáveis às vítimas,


também acarretaram prejuízos ao próprio Estado, pois utilizaram do poder de policia de
maneira indevida e arbitrária.

Quanto custou para os cofres públicos a apreciação dos procedimentos


policiais irresponsavelmente instaurados por um delegado que sabia que estava agindo de
maneira ilícita juntamente com os demais policiais reproduzindo fatos mentirosos criados e
forjados por eles mesmos para atender pedido do gestor publico, Kato, e do magistrado,
Cesar, ambos sendo conivente com tudo isso?

Quanto custou os procedimentos policiais e a movimentação do Poder


Judiciário, do Ministério Público e demais Órgãos essenciais à Justiça?

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É inadmissível dentro de um Estado Democrático de Direito, em pleno


século XXI, haver casos de grave violação aos direitos humanos, como a prática de tortura,
praticados pelos próprios agentes estatais ficarem impunes.

Por que no presente caso houve uma diligência eficiente da policia, porém,
para fazer uma injustiça, enquanto que, quando uma pessoa comum do povo realmente precisa
recorrer a essa instituição, depara-se diante de uma situação de falta combustível para
movimentar as viaturas policiais, de falta de um investigador ou escrivão? No presente caso
eram mais de seis investigadores! Porque todo esse aparado?

Já ressaltando, para que não paire dúvida, e se alegue o argumento


inconsistente de resistência, desde o início já eram cinco investigadores. Portanto, imperioso e
inarredável é a aplicação da reprimenda penal, pois além de ser medida de justiça se faz
necessário até mesmo como meio pedagógico com fito de coibir que fatos com a presença de
arbitrariedade policial se repitam, em que se tem como refém a própria sociedade, quando a
mesma arca com custo alto de tributos para ter proteção e respeito aos seus direitos
assegurados por lei por esses agentes de segurança.

XIX. DOS INDÍCIOS DA AUTORIA E DA PROVA DA MATERIALIDADE

Alega o nobre e culto magistrado que não foram arregimentadas ao feito


provas consistentes no sentido de um decreto condenatório em uma das sanções penais
cabíveis, pois os acusados, em sede dos direitos e garantias constitucionais negaram
peremptoriamente o crime, mas a tese de negativa de autoria por eles proclamada não merece
prosperar.

Toda a argumentação despendida para absolver os apelados da acusação de


crime de tortura e outros é descabida e não tem o condão de afastar uma eventual sentença
condenatória em uma das sanções penais cabíveis porque há indícios satisfatórios da autoria e
prova da materialidade do crime pelo exame de corpo de delito direto de fls. e indireto, ou
seja, o depoimento das vítimas e das testemunhas.

A sentença condenatória em uma das sanções penais cabíveis é proferida


quando o juiz se convence da existência de indícios suficientes da autoria e prova da
materialidade de crime de tortura e outros, na sua forma consumada ou tentada.

Trata-se de sentença terminativa, pois põe fim ao processo com julgamento


do mérito. A sentença condenatória julga o mérito, uma vez que consiste na aceitação da
acusação que foi considerada manifestamente procedente.

A sentença condenatória faz coisa julgada material com seu trânsito em


julgado, não podendo ser instaurada nova persecução pelo mesmo crime mesmo que sejam
encontrados novos indícios suficientes da autoria e novas provas da materialidade da infração.
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O recurso cabível da sentença condenatória é a Apelação, perante o Tribunal


de Justiça, no prazo de 5 dias, contados da ciência dada as partes (CPP, art. 593).

A petição do apelo deve ser dirigida para o juiz do processo que determinará
que assinado o termo de apelação, o apelante e, depois dele, o apelado terão o prazo de 5 dias
cada um para oferecer razões.

No caso concreto, a materialidade e nexo de causalidade em relação ao crime


de tortura e outros estão bem fixados pericialmente. Indiscutível a autoria do crime, embora os
apelados a neguem peremptoriamente em juízo.

Como disse o douto magistrado “julgo improcedente a pretensão acusatória


deduzida na denúncia ministerial de fls. 02/15, e, em consequencia, absolvo os acusados
adotando os seguintes fundamentos: em relação aos réus MIGUEL FERNANDO DE SOUZA
PINTO e AMARILDO com suporte no art. 386, inciso V, do CPP; em relação aos acusados
JOSÉ GERALDO DA SILVA, LUIZ MIGUEL CASTRO DE CARVALHO e SAMUEL
GONÇALVES BARROS com fulcro no art. 386, VII, do CPP; em relação ao réu EDER
MAURO CARDOSO BARRA, com espeque no ar. 386, VII, do CPP, para ambos os delitos
que lhe são imputados (art. 1º, §§ 2º e 4ª, inciso I, da Lei n º 9455/97 em concurso material
com o art. 69, c/c art. 299, do CPB)”.

A decisão prolatada não foi baseada na lei vigente e não foi proferida com
base no conjunto probatório. Existem nos autos elementos de prova inequívoca da autoria e da
materialidade de crime de tortura e outros que autorizariam o MM. Julgador a condenar os
acusados com incurso nas sanções punitivas do art. art. 1º, inciso II, da Lei n º 9455/97 c/c art.
29, do CPB entre outros.

Se no processo não existissem indícios suficientes da autoria e prova da


materialidade de crime de tortura e outros, o próprio Ministério Público, em sede de Alegações
Finais, haveria pedido a absolvição dos acusados. Neste caso, os acusados seriam absolvidos
em relação ao crime descrito na denúncia, em respeito ao princípio do in dubio pro reo.

No entanto, para que houvesse a absolvição, haveria a necessidade de


ausência total da materialidade ou insuficiência evidente e irrefutável de indícios de autoria do
delito o que, no caso presente, não se acha configurada.

Impende registrar, por oportuno, que, embora não existam outras


testemunhas oculares, além dos ofendidos, os policiais que prestaram depoimento, adentraram
no ambiente sacaram e exibiram suas armas de fogo e deram voz de prisão às vítimas sob o
argumento que cometeram crime de extorsão previsto no art. 158, do CP. Logo o depoimento
da ofendida e dos seus filhos não elide a veracidade das provas que foram carreadas aos autos,
dada a credibilidade que deve ser conferida à palavra da vítima nos crimes cometidos às
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escondidas, tal qual ocorre em algumas espécies de crimes de tortura e abuso de autoridade,
em que os autores buscam agir longe das vistas de testemunhas.

A jurisprudência pátria é remansosa neste sentido:

“Em se tratando de crime de tortura a palavra da vítima, a quem nada


aproveita uma falsa e leviana incriminação de inocente, tem capital
importância como elemento probatório, prevalecendo inclusive sobre a
palavra dos acusados”. ( RJDTACRIM, 43/235).

“Considerando que a tortura dificilmente conta com testemunhas, a palavra


da vítima assume importância, principalmente quando se mostra segura e
coerente”. (JTACRIM, 51/423).

“No campo probatório, a palavra da vítima de um crime de abuso de


autoridade é sumamente valiosa, pois, incidindo sobre o proceder de
desconhecido, seu único interesse é apontar os verdadeiros culpados e
narrar-lhes a atuação e não acusar inocentes.” (RT, 484/320).

Com base na decisão acima, é válido frisar que, a palavra da vítima é de


grande importância nesse caso, principalmente porque se trata de crime de torura praticado
contra ofendido possuidor de menor resistência em virtude do recurso da surpreza empregado,
que tornou impossível a defesa do titular do bem jurídico.

O magistrado alega ausência da prova da materialidade e de indícios


suficientes da autoria e justifica a absolvição na insuficiência de provas contida nos
depoimentos dos policiais para demonstrar a autoria da conduta criminosa, não restando outra
saída a não ser a absolvição com base no art. 386, V e VII, do CPP. Tal argüição se apresenta
vazia de conteúdo fático no campo da probabilidade, conforme jurisprudências a seguir:

AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.


PENAL. CONDENAÇÃOPOR ABUSO DE AUTORIDADE E LESÃO
CORPORAL. PLEITO MINISTERIAL DERECONHECIMENTO DO
CRIME DE TORTURA. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE
DEREVOLVIMENTO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. ENUNCIADO
N.º 7 DA SÚMULA DESTACORTE. AGRAVO DESPROVIDO.
1. As instâncias ordinárias, soberanas na análise das circunstâncias fático-
probatórias da causa, concluíram que não houve o cometimento do crime de
tortura, e sim, a prática de abuso de autoridade e lesão corporal. Assim, para
se firmar entendimento diverso, seria necessário reapreciar as provas
produzidas, o que encontra óbice no enunciado n.º 7 da Súmula desta Corte.
2. Decisão que se mantém por seus próprios fundamentos.
3. Agravo regimental desprovido.
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Acórdão
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da QUINTA
TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das
notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao agravo
regimental. Os Srs. Ministros Jorge Mussi e Março Aurélio Bellizze votaram
com a Sra. Ministra Relatora.
Dados Gerais
Processo: AgRg no AREsp 107958 SC 2012/0014168-6
Relator(a): Ministro JORGE MUSSI
Julgamento: 27/11/2012
Órgão Julgador: T5 - QUINTA TURMA
Publicação: DJe 03/12/2012
Ementa
PENAL E PROCESSO PENAL. CRIME DE TORTURA.
DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA. IMPOSSIBILIDADE NESTA
INSTÂNCIA EXTRAORDINÁRIA. NECESSIDADEDE
REVOLVIMENTO DO MATERIAL PROBANTE. SÚMULA 7/STJ.
AGRAVO NÃOPROVIDO.
1. Concluída a configuração do crime de tortura pelo Tribunal de piso, não
há desconstituir o julgado na via eleita, dada a necessidade de revolvimento
do material probante, procedimento de análise exclusivo das instâncias
ordinárias e vedado ao Superior Tribunal de Justiça, a teor da Súmula 7/STJ.
2."É assente que cabe ao aplicador da lei, em instância ordinária, fazer um
cotejo fático e probatório a fim de analisar o adequado enquadramento da
conduta ao tipo legalmente previsto. Incidência da Súmula 7 desta Corte"
(AgRg no Ag 1285273/MG, Rel. Ministra MARIATHEREZA DE ASSIS
MOURA, Sexta Turma, DJe 13/08/2012) 3. Agravo regimental não provido.
Acórdão
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da QUINTA
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das
notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao agravo
regimental. Os Srs. Ministros Março Aurélio Bellizze, Campos Marques
(Desembargador convocado do TJ/PR), Marilza Maynard (Desembargadora
convocada do TJ/SE) e Laurita Vaz votaram com o Sr. Ministro Relator.
Dados Gerais
HC 106007 MS 2008/0099325-
Processo:
0
Relator(a): Ministro OG FERNANDES
Julgamento: 17/08/2010

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Órgão Julgador: T6 - SEXTA TURMA


Publicação: DJe 06/09/2010
Ementa
HABEAS CORPUS. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. TORTURA,
CORRUPÇÃO PASSIVA, EXTORSÃO, PECULATO, FORMAÇÃO DE
QUADRILHA E RECEPTAÇÃO. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA
DEFERIDA PELO PRAZO DE TRINTA DIAS CONSECUTIVOS.
POSSIBILIDADE. PRECEDENTE DO STF. DILAÇÃO TEMPORAL
JUSTIFICADA NA NECESSIDADE DE APURAÇÃO DOS INÚMEROS
CRIMES PRATICADOS, NA COMPLEXIDADE E PERICULOSIDADE
DA QUADRILHA, CUJOS INTEGRANTES SÃO, EM GRANDE PARTE,
POLICIAIS CIVIS.
1. A Lei nº 9.296/96 autoriza a interceptação telefônica apenas quando
presentes indícios razoáveis de autoria ou participação em infração penal
punida com reclusão e quando a prova não puder ser obtida por outros
meios disponíveis. Estabelece também que a decisão judicial deve ser
fundamentada e a interceptação não pode exceder o prazo de quinze dias,
renovável por igual período, caso comprovada a sua indispensabilidade.
2. Na hipótese, insurge-se o impetrante tão somente contra o pressuposto de
cunho temporal, sustentando a ilegalidade das interceptações telefônicas
prorrogadas pelo período de 30 (trinta) dias consecutivos, por afronta ao que
preconiza o art. 5º da Lei nº 9.296/96. 3. Entretanto, a excepcional
prorrogação das interceptações telefônicas pelo prazo de 30 (trinta) dias, a
despeito de contrariar a literalidade da Lei nº 9.296/96, mostra-se razoável
quando as peculiaridades da causa exigi-la. Precedentes do STF: RHC
88.371, DJe de 2.2.07, decisão unânime; e desta Corte: HC 138.933/MS,
DJe 30.11.09, decisão unânime. 4. Durante as investigações realizadas pela
Polícia Federal e denominadas de "Operação Xeque-Mate", constatou-se a
ocorrência de vários crimes supostamente praticados pelo paciente, policial
civil, e pelos corréus – alguns deles também policiais –, a saber, a prática de
tortura, corrupção passiva, extorsão, peculato, formação de quadrilha e
receptação. 5. As várias denúncias ofertadas pelo Ministério Público
Estadual afirmam se tratar de quadrilha, em grande parte formada por
policiais civis que, aproveitando-se da função pública, praticava tortura e
extorsões; facilitava a exploração de jogos de azar e o desmanche de veículos
furtados, tudo mediante o recebimento de propina; além de agenciar serviços
advocatícios no distrito policial, visando se beneficiar de parte dos
honorários auferidos pelo defensor. 6. Não se pode negar que o fato de
policiais civis integrarem a quadrilha dificulta demasiadamente a colheita da
prova, razão pela qual se deve ponderar os interesses envolvidos a fim de
que o evidente interesse público se sobreponha, ainda mais em se tratando de
quebra de sigilo telefônico efetuado com autorização judicial devidamente
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fundamentada. 7. Dessa forma, atendendo aos ditames de proporcionalidade


e ponderação de interesses e sopesando as circunstâncias que revestem o
caso em análise – quais sejam, a complexidade e a periculosidade da
organização criminosa, o elevado número de integrantes, dentre estes
policiais civis, e a grande quantidade de crimes supostamente cometidos –,
não há se falar em constrangimento ilegal na prorrogação das interceptações
telefônicas pelo prazo de 30 (trinta) dias contínuos. 8. Ordem denegada.
Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por
unanimidade, denegar a ordem de habeas corpus, nos termos do voto do Sr.
Ministro Relator. Os Srs. Ministros Celso Limongi (Desembargador
convocado do TJ/SP), Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do
TJ/CE) e Maria Thereza de Assis Moura votaram com o Sr. Ministro
Relator. Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis
Moura.

Dados Gerais
Processo: HC 90099 RS
Relator(a): Min. CELSO DE MELLO
Órgão Julgador: Segunda Turma
DJe-228 DIVULG 03-12-2009 PUBLIC 04-12-2009
Publicação:
EMENT VOL-02385-03 PP-00472
VALDECIR VERSA
SERGIO PEDROSA MARTIRENA
Parte(s): JUAREZ FRANCISCO MENDONÇA
ADRIANA REGOSO
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Ementa
"HABEAS CORPUS" - CRIME DE TORTURA ATRIBUÍDO A
DELEGADO E A AGENTES POLICIAIS CIVIS - POSSIBILIDADE DE
O MINISTÉRIO PÚBLICO, FUNDADO EM INVESTIGAÇÃO POR ELE
PRÓPRIO PROMOVIDA, FORMULAR DENÚNCIA CONTRA
REFERIDOS INTEGRANTES DA POLÍCIA CIVIL - VALIDADE
JURÍDICA DESSA ATIVIDADE INVESTIGATÓRIA - CONDENAÇÃO
PENAL IMPOSTA AOS POLICIAIS CIVIS - LEGITIMIDADE
JURÍDICA DO PODER INVESTIGATÓRIO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
- MONOPÓLIO CONSTITUCIONAL DA TITULARIDADE DA AÇÃO
PENAL PÚBLICA PELO "PARQUET" - TEORIA DOS PODERES
IMPLÍCITOS - CASO "McCULLOCH v. MARYLAND" (1819) -
MAGISTÉRIO DA DOUTRINA (RUI BARBOSA, JOHN MARSHALL,
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JOÃO BARBALHO, MARCELLO CAETANO, CASTRO NUNES,


OSWALDO TRIGUEIRO, v.g.) - OUTORGA, AO MINISTÉRIO
PÚBLICO, PELA PRÓPRIA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, DO
PODER DE CONTROLE EXTERNO SOBRE A ATIVIDADE POLICIAL
- LIMITAÇÕES DE ORDEM JURÍDICA AO PODER
INVESTIGATÓRIO DO MINISTÉRIO PÚBLICO - "HABEAS CORPUS"
INDEFERIDO. NAS HIPÓTESES DE AÇÃO PENAL PÚBLICA, O
INQUÉRITO POLICIAL, QUE CONSTITUI UM DOS DIVERSOS
INSTRUMENTOS ESTATAIS DE INVESTIGAÇÃO PENAL, TEM POR
DESTINATÁRIO PRECÍPUO O MINISTÉRIO PÚBLICO.
- O inquérito policial qualifica-se como procedimento administrativo, de
caráter pré-processual, ordinariamente vocacionado a subsidiar, nos casos de
infrações perseguíveis mediante ação penal de iniciativa pública, a atuação
persecutória do Ministério Público, que é o verdadeiro destinatário dos
elementos que compõem a "informatio delicti". Precedentes.
- A investigação penal, quando realizada por organismos policiais, será
sempre dirigida por autoridade policial, a quem igualmente competirá
exercer, com exclusividade, a presidência do respectivo inquérito.
- A outorga constitucional de funções de polícia judiciária à instituição
policial não impede nem exclui a possibilidade de o Ministério Público, que é
o "dominus litis", determinar a abertura de inquéritos policiais, requisitar
esclarecimentos e diligências investigatórias, estar presente e acompanhar,
junto a órgãos e agentes policiais, quaisquer atos de investigação penal,
mesmo aqueles sob regime de sigilo, sem prejuízo de outras medidas que lhe
pareçam indispensáveis à formação da sua "opinio delicti", sendo-lhe vedado,
no entanto, assumir a presidência do inquérito policial, que traduz atribuição
privativa da autoridade policial. Precedentes. A ACUSAÇÃO PENAL,
PARA SER FORMULADA, NÃO DEPENDE, NECESSARIAMENTE, DE
PRÉVIA INSTAURAÇÃO DE INQUÉRITO POLICIAL.
- Ainda que inexista qualquer investigação penal promovida pela Polícia
Judiciária, o Ministério Público, mesmo assim, pode fazer instaurar,
validamente, a pertinente "persecutio criminis in judicio", desde que
disponha, para tanto, de elementos mínimos de informação, fundados em
base empírica idônea, que o habilitem a deduzir, perante juízes e Tribunais, a
acusação penal. Doutrina. Precedentes. A QUESTÃO DA CLÁUSULA
CONSTITUCIONAL DE EXCLUSIVIDADE E A ATIVIDADE
INVESTIGATÓRIA.
- A cláusula de exclusividade inscrita no art. 144, § 1º, inciso IV, da
Constituição da República - que não inibe a atividade de investigação
criminal do Ministério Público - tem por única finalidade conferir à Polícia
Federal, dentre os diversos organismos policiais que compõem o aparato
repressivo da União Federal (polícia federal, polícia rodoviária federal e
polícia ferroviária federal), primazia investigatória na apuração dos crimes
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previstos no próprio texto da Lei Fundamental ou, ainda, em tratados ou


convenções internacionais.
- Incumbe, à Polícia Civil dos Estados-membros e do Distrito Federal,
ressalvada a competência da União Federal e excetuada a apuração dos
crimes militares, a função de proceder à investigação dos ilícitos penais
(crimes e contravenções), sem prejuízo do poder investigatório de que
dispõe, como atividade subsidiária, o Ministério Público.
- Função de polícia judiciária e função de investigação penal: uma distinção
conceitual relevante, que também justifica o reconhecimento, ao Ministério
Público, do poder investigatório em matéria penal. Doutrina. É PLENA A
LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DO PODER DE INVESTIGAR
DO MINISTÉRIO PÚBLICO, POIS OS ORGANISMOS POLICIAIS
(EMBORA DETENTORES DA FUNÇÃO DE POLÍCIA JUDICIÁRIA)
NÃO TÊM, NO SISTEMA JURÍDICO BRASILEIRO, O MONOPÓLIO
DA COMPETÊNCIA PENAL INVESTIGATÓRIA.
- O poder de investigar compõe, em sede penal, o complexo de funções
institucionais do Ministério Público, que dispõe, na condição de "dominus
litis" e, também, como expressão de sua competência para exercer o controle
externo da atividade policial, da atribuição de fazer instaurar, ainda que em
caráter subsidiário, mas por autoridade própria e sob sua direção,
procedimentos de investigação penal destinados a viabilizar a obtenção de
dados informativos, de subsídios probatórios e de elementos de convicção
que lhe permitam formar a "opinio delicti", em ordem a propiciar eventual
ajuizamento da ação penal de iniciativa pública. Doutrina Precedentes: RE
535.478/SC, Rel. Min. ELLEN GRACIE - HC 91.661/PE, Rel. Min.
ELLEN GRACIE - HC 85.419/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO - HC
89.837/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO. CONTROLE
JURISDICIONAL DA ATIVIDADE INVESTIGATÓRIA DOS
MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO: OPONIBILIDADE, A ESTES,
DO SISTEMA DE DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS, QUANDO
EXERCIDO, PELO "PARQUET", O PODER DE INVESTIGAÇÃO
PENAL.
- O Ministério Público, sem prejuízo da fiscalização intra--orgânica e daquela
desempenhada pelo Conselho Nacional do Ministério Público, está
permanentemente sujeito ao controle jurisdicional dos atos que pratique no
âmbito das investigações penais que promova "ex propria auctoritate", não
podendo, dentre outras limitações de ordem jurídica, desrespeitar o direito
do investigado ao silêncio ("nemo tenetur se detegere"), nem lhe ordenar a
condução coercitiva, nem constrangê-lo a produzir prova contra si próprio,
nem lhe recusar o conhecimento das razões motivadoras do procedimento
investigatório, nem submetê-lo a medidas sujeitas à reserva constitucional de
jurisdição, nem impedi-lo de fazer-se acompanhar de Advogado, nem impor,

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a este, indevidas restrições ao regular desempenho de suas prerrogativas


profissionais (Lei nº 8.906/94, art. 7º, v.g.).
- O procedimento investigatório instaurado pelo Ministério Público deverá
conter todas as peças, termos de declarações ou depoimentos, laudos
periciais e demais subsídios probatórios coligidos no curso da investigação,
não podendo, o "Parquet", sonegar, selecionar ou deixar de juntar, aos autos,
quaisquer desses elementos de informação, cujo conteúdo, por referir-se ao
objeto da apuração penal, deve ser tornado acessível tanto à pessoa sob a
investigação quanto ao seu Advogado.
- O regime de sigilo, sempre excepcional, eventualmente prevalecente no
contexto de investigação penal promovida pelo Ministério Público, não se
revelará oponível ao investigado e ao Advogado por este constituído, que
terão direito de acesso - considerado o princípio da comunhão das provas - a
todos os elementos de informação que já tenham sido formalmente
incorporados aos autos do respectivo procedimento investigatório.
Decisão
A Turma, por votação unânime, indeferiu o pedido de habeas corpus, nos
termos do voto do Relator. Ausentes, justificadamente, neste julgamento, a
Senhora Ministra Ellen Gracie e o Sr Ministro Cezar Peluso. Presidiu, este
julgamento, o Sr Ministro Celso de Mello. 2ª Turma, 27.10.2009.

A sentença condenatória deveria ter sido proferida porque estão plenamente


demonstrados todos os seus elementos constitutivos: 1) indícios da autoria; 2) prova da
materialidade; e 3) regularidade processual ou ausência de nulidades.

Portanto, in casu, não deveria ser proferida sentença de absolutória, pois


decorreu genuína certeza estar o processo envolto pela mantilha dos indícios da autoria e
prova da materialidade.

Como se vê o recurso do apelante é consistente, quer por preencher os


requisitos objetivos da lei processual penal, quer por estar embasados em argumentos sólidos e
associados com lógica jurídica.

XX. DO CONCEITO DE PROVA SUFICIENTE PARA A CONDENAÇÃO

A propósito do conceito de prova suficiente para autorizar a condenação no


crime de tortura, no processo penal, de rigor transcrever a lição do Juiz Corrêa de Morais,
extraído de julgamento de caso análogo:

É necessário ter bem presente no espírito que todos os processos criminais


exibem, em maior ou menor escala, algum coeficiente de impureza

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dubitativa. É fenômeno sacramentalmente relacionado com nossas limitações


epistemológicas.

Esta premissa assentada segue-se, como corolário, que é despropositado


exigir, para o acolhimento da pretensão punitiva, grau absoluto de certeza.

A solução condenatória reclama, tão-só, prova suficiente, que não se


identifica com prova maciça, incontrastável, reflexo sem distorções da
realidade. Prova tal apenas idealmente se pode conceber. Inexiste no plano
fenomênico.

Em suma: prova suficiente é a que, reduzindo ao mínimo desejável a margem


de erro, conduz à formulação de juízo de certeza possível. Significa dizer:
juízo revestido de confortadora probabilidade de exatidão (AC nº
1.061.609/3 - TACRIM/SP - 7ª Câmara - j. em 14.08.97).

Na mesma direção à orientação do Juiz Souza Nery, igualmente lançada em


caso assemelhado ao tratado nestes autos, ou seja:

Ora, o conceito de suficiência, não se confundindo, para efeito condenatório,


com isenção total de eiva debutativa, consiste, pois, na forte possibilidade de
afirmação da realidade do fato imputado e de definição de sua autoria, no
contexto das comprimidas fronteiras humanas da capacidade de apreensão
dos elementos probatórios e de reconstituição do episódio delituoso.

Prova suficiente não é nem pode ser penhor de certeza plena, de que somente
os deuses são senhores. Daí que se afigura irreal e meramente retórico o
emprego de expressões como "prova categórica, prova cabal, prova
inconcussa e outros do gênero".

Invertendo os termos do problema: prova insuficiente é aquele e só aquela a


tal ponto inquinado de dúvida invencível que radicalmente impossibilita ter-
se o fato verificado e ter se o apelante por seu autor.

Não se revelando insuperável, ou, dito de outro modo, revelando-se passível


de ser reduzida a proporções não significativas, graças ao uso adequado dos
métodos analíticos ordinariamente aplicados, não será de considerar razoável
a dúvida. E, na ausência de dúvida razoável, a inevitável carga debutativa
não será óbice a que se repute suficiente a prova.

Com a ressalva de que esta ordem de ideias se situa do plano da generalidade


teórica, sem ter em vista qualquer exemplo concreto, cabe advertir que não
saia o juiz, para dissimular paralisante dificuldade na imposição de
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reprimenda, a farejar a todo o transe a poeira da dúvida fatalmente


encontrável nas dobras das palavras e nas rugas da evidência. Isso se não
quiser perjurar em face do compromisso, solenemente prestado no ato da
posse, de observar e fazer cumprir as leis do País (AC nº 1.096.262-0 -
TACRIM/SP - 7ª Câmara - j. em 13.08. 98).

De outra banda, não socorre aos apelados, o fato da vítima possuir eventuais
imperfeições descritivas em seus depoimentos, pois segundo se nota de seu perfil psicológico,
trata-se de uma senhora e seus filhos com repressões emocionais, portanto tímida, embora sem
comprometimento de sua personalidade.

Ademais, a versão apresentada pelos apelados afigura-se por demais pueris,


pois além de contrária à evidência dos autos, é despropositada em relação à realidade fática
apurada. Em outras palavras, não parece razoável se prevalecer de que, além dos apelados e
dos ofendidos ninguém mais presenciou os fatos para negar a autoria dos crimes descritos na
exordial e na tortura praticada mediante violência.

Como noticiado, na denúncia, e, segunda as coesas declarações da vítima e


das testemunhas, nas oportunidades em que foram ouvidas, adentraram os apelados no
ambiente sacaram e exibiram suas armas de fogo e deram voz de prisão às vítimas sob o
argumento que cometeram crime de extorsão previsto no art. 158, do CP.

XXI. CONCLUSÃO

Da análise detida dos autos, é cristalino que os acusados agiram com


truculência contra as vítimas para satisfazer interesse do juiz Cesar e do prefeito Kato, os
policiais colocaram em prática um plano para livrar a dívida que aquele possuía com a vítima
Elza, com a intervenção deste último.

O plano consistiu em concretizar um flagrante de extorsão. Contudo, através


de uma filmagem feita pelo próprio Kato, pode se verificar que na verdade tratava-se de um
flagrante preparado e forjado, pelo que foi o respectivo inquérito policial devidamente
trancado por ordem judicial, bem como ainda mostra prática de tortura, policiais agredindo
com socos e tapas nos rostos das vítimas que estavam algemas, além de ofensas morais com
palavras de baixo calão.

De todo o exposto, o Ministério Público requer a total procedência do


recurso de apelação a fim de reforma a sentença que absolveu os acusados adotando os
seguintes fundamentos: em relação aos réus MIGUEL FERNANDO DE SOUZA PINTO e
AMARILDO com suporte no art. 386, inciso V, do CPP; em relação aos acusados JOSÉ
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GERALDO DA SILVA, LUIZ MIGUEL CASTRO DE CARVALHO e SAMUEL


GONÇALVES BARROS com fulcro no art. 386, VII, do CPP; em relação ao réu EDER
MAURO CARDOSO BARRA, com espeque no ar. 386, VII, do CPP, para ambos os delitos
que lhe são imputados (art. 1º, §§ 2º e 4ª, inciso I, da Lei n º 9455/97, em concurso material
com o art. 69, c/c art. 299, do CPB), para que os inculpados sejam condenados nas referidas
sanções penais, por ser ato da mais lídima justiça.

Belém, 25 de outubro de 2013.

FRANKLIN LOBATO PRADO


PROMOTOR DE JUSTIÇA

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