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Fisioterapia e saúde coletiva:

ARTIGO ARTICLE
desafios e novas responsabilidades profissionais

Physiotherapy and collective health:


challenges and new professional responsibilities

José Patrício Bispo Júnior 1

Abstract The physiotherapist is destining its at- Resumo O fisioterapeuta vem destinando sua
tention almost exclusively on the cure of patients atenção, quase que exclusivamente, à cura de do-
and their rehabilitation. However, the new epi- entes e à reabilitação de sequelados. No entanto, o
demic profile and the new logic of organization of novo perfil epidemiológico e a nova lógica de or-
the health system suggest the restructuring of this ganização do sistema de saúde sugerem a reestru-
professional practices and the re-definition of the turação das práticas profissionais e a redefinição
field of the physiotherapist’s performance. In this do campo de atuação do fisioterapeuta. Neste sen-
sense, this article aims to discuss the reorienta- tido, esse artigo tem por objetivo discutir a reori-
tion of the field of the physiotherapy professional entação do campo de atuação profissional da fisi-
performance and the new possibilities of acting at oterapia e novas possibilidades de atuação no SUS.
the Unified Health System (SUS). The article Inicialmente, realiza-se um debate sobre as tran-
starts with a debate about the demographic, epi- sições demográfica, nutricional e epidemiológica
demiological and nutrition transitions and the e as novas demandas profissionais diante dos no-
new professional demands before the new atten- vos modelos assistenciais. Tomando como referên-
dance models. Taking as reference the model of cia o modelo de Vigilância em Saúde e a atenção
health surveillance and the primary attention as básica como eixo de reestruturação do sistema de
a restructuring axis of the health system, it is saúde, evidencia-se a necessidade de superação da
highlighted the overcome of the rehabilitation as reabilitação como único nível de atuação profis-
only level of professional performance and showed sional e apresenta-se o modelo da fisioterapia co-
the collective model of the physiotherapy as an letiva como instrumento para reorientação da
instrument of reorientation of the physiothera- atuação do fisioterapeuta. Por fim, apresentam-
pist’s performance. Finally, it is presented some se algumas possibilidades de atuação do fisiotera-
possibilities of the physiotherapist’s performance peuta na atenção básica e no âmbito coletivo.
in the basic attention and in the collective ambit. Palavras-chave Fisioterapia, Saúde coletiva, Sis-
Key words Physiotherapy, Physical therapy, tema Único de Saúde, Vigilância à saúde, Pro-
1
Collective health, Unified Health System, Health moção da saúde
Instituto Multidisciplinar
de Saúde, Universidade surveillance, Health promotion
Federal da Bahia. Av. Olívia
Flores 3000, Candeias.
45055-090 Vitória da
Conquista BA.
jpatricio@ufba.br
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Bispo Júnior JP

Introdução atuação à restauração, desenvolvimento e con-


servação da capacidade física, ou seja, o profissi-
A implantação do Sistema Único de Saúde (SUS) onal deve atuar apenas sobre a capacidade física,
e a busca dos objetivos da universalidade, inte- não sendo sua responsabilidade atuar para o
gralidade e equidade têm suscitado diversas ela- desenvolvimento da qualidade de vida e saúde de
borações e proposições referentes aos modelos forma plena. Observa-se, ainda, possibilidade de
assistenciais adotados, à lógica de financiamento atuação limitada, em virtude da prática desse
e às práticas profissionais. No que tange à atua- profissional estar voltada apenas para atenção
ção profissional, tem se tornado crescente o de- ao paciente, isto é, aos indivíduos já cometidos
bate em torno da necessidade de adequação das por algum tipo de distúrbio que interferem em
profissões à realidade epidemiológica e à nova sua capacidade física, restringindo a atuação a
lógica de organização dos sistemas de serviços de outros níveis que não seja a reabilitação.
saúde. Nesse sentido, o presente trabalho busca Levando-se em consideração o contexto his-
refletir sobre a atuação da fisioterapeuta no SUS. tórico do período de publicação do referido decre-
Desde a sua origem, a fisioterapia tem um to-lei, pode-se tolerar que as condições de saúde
caráter essencialmente curativo e reabilitador. Em da população e a própria lógica de organização do
decorrência das guerras e do alto índice de aci- sistema de saúde vigente corroboravam essa for-
dentes de trabalho, gerou-se grande número de ma de atuação. No entanto, as mudanças no perfil
óbitos e mutilados, em sua maioria de homens epidemiológico e as transformações no sistema de
em idade produtiva, desencadeando uma baixa saúde brasileiro, com destaque para a implanta-
na força de trabalho. Essa situação fez surgir a ção do SUS, impõem novos desafios à fisioterapia
necessidade de reinserir indivíduos lesionados e e novas responsabilidades aos profissionais.
mutilados ao setor produtivo. Daí, surgiram os Diante disso, esse artigo tem por objetivo dis-
centros de reabilitação, com o intuito de restau- cutir a reorientação do campo de atuação pro-
rar a capacidade física dos acidentados e mutila- fissional da fisioterapia e novas possibilidades de
dos, e quando não mais possível restaurar a ca- atuação no SUS. Inicialmente, realiza-se um de-
pacidade física original, desenvolver a capacida- bate sobre as transições demográfica, nutricio-
de residual, adaptando-a para outra função1. nal e epidemiológica e as demandas profissio-
A fisioterapia foi instituída no Brasil como nais diante dos novos modelos assistenciais. A
profissão de nível superior em 1969, através da seguir, discute-se a fisioterapia coletiva, como
publicação do Decreto-Lei no 938/692. Anterior- novo modelo de atuação profissional. E, por fim,
mente a esse período, a ocupação de fisiotera- apresentam-se algumas possibilidades de atua-
peuta era de nível técnico e sua função era de ção do fisioterapeuta na atenção básica e no âm-
executar técnicas, prescritas por médicos, com bito coletivo.
objetivo de reabilitar pessoas lesionadas. Com a
publicação do Decreto-Lei no 938/69, o fisiotera-
peuta ganha status de nível superior e autonomia Novo perfil epidemiológico
profissional; no entanto, sua atuação continua e os novos modelos assistenciais
destinada, quase que exclusivamente, às ações
reabilitadoras. Para entender o papel da fisioterapia na socieda-
Rebellato e Botomé3, ao analisarem a legisla- de brasileira, quais são suas responsabilidades e
ção que regulamenta a profissão, observam li- quais são seus desafios, é necessário conhecer o
mitações nas possibilidades de atuação em ou- perfil epidemiológico da população, ou seja, quais
tros níveis de atenção. Apontam restrições à prá- são as principais causas de morbidade e morta-
tica profissional impostas pelo Decreto-Lei no lidade da população. De maneira geral, a maio-
938/69 que institui “atividade privativa do fisio- ria dos países tem passado por um processo cha-
terapeuta executar métodos e técnicas fisioterá- mado de transição epidemiológica, definida como
picas com a finalidade de restaurar; desenvolver mudança nos padrões de morte, morbidade e
e conservar a capacidade física do paciente”. Um invalidez, que caracterizam uma população es-
profissional de nível superior, especialmente da pecífica e que, em geral, ocorrem em conjunto
área de saúde, não pode restringir-se a apenas com outras transformações demográficas, so-
executar métodos e técnicas. Deve ter a capaci- ciais e econômicas4.
dade de mais do que executar procedimentos, Embora existam diferenças consideráveis en-
analisar e produzir novos saberes. Outra ques- tre os tipos básicos de transição epidemiológica,
tão que também merece destaque é a restrição da Barreto e Carmo5 descrevem que, em maior ou
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menor proporção, na maioria dos países, esse cargas de DIP e as DAC, NEO e CE12. O quadro
processo caracteriza-se por diminuição na mor- mórbido apresenta-se extremamente complexo,
talidade e natalidade e mudança na carga da do- em que se passou a conviver com as doenças da
ença, diminuindo a prevalência de óbitos por modernidade, sem haver um recrudescimento
doenças infecto-contagiosas e aumentando a car- das DIP, sempre presentes diante da pobreza e do
ga por doenças crônico-degenerativas. subdesenvolvimento. Essa situação, presente não
No Brasil, como na maioria dos países lati- só no Brasil, mas também na maioria dos países
no-americanos e em desenvolvimento, a transi- subdesenvolvidos, é denominada por Frenk13
ção epidemiológica ocorreu de forma complexa, como acumulação epidemiológica.
não como uma mudança de uma carga de doen- Esse quadro epidemiológico, aliado a outras
ças para outra, mas como uma sobreposição de razões ideológicas, econômicas e políticas, tem
fatores. Conforme afirmado por Omram 4, o motivado a reestruturação dos modelos de aten-
desenvolvimento desse novo perfil epidemioló- ção à saúde e consequente redefinição das res-
gico ocorre em concomitância com outras con- ponsabilidades e da prática do profissional fisio-
dições, a exemplo da transição demográfica e a terapeuta. A organização dos sistemas de servi-
transição nutricional. ços de saúde tem sido um dos temas centrais do
O elevado crescimento populacional, o au- debate conceitual no âmbito do Sistema Único
mento da taxa de urbanização e a crescente expec- de Saúde (SUS)14. Os sistemas de saúde têm se
tativa de vida caracterizam a transição demográ- constituído como campo de disputa, onde se en-
fica brasileira6-8. A questão nutricional também frentam atores com interesses e matizes ideoló-
interfere sobremaneira no perfil epidemiológico gicas diversas, a fim de conformar o sistema para
de uma população. O Brasil apresenta mudanças atendimento de interesses diversos.
significativas no perfil nutricional da população, A forma de organização dos serviços de saúde
com a gradativa superação da fome endêmica e no Brasil é objeto de análise de Paim15, que identi-
epidêmica e a crescente prevalência da obesidade, fica dois principais modelos de atenção à saúde, o
migrando a principal preocupação da fome/des- modelo médico-assistencial privatista e o modelo
nutrição para o sobrepeso/obesidade9-11. Essas sanitarista. No entanto, essas formas de organi-
mudanças constituem-se em grande preocupa- zação apresentam-se limitadas e incapazes de aten-
ção para as autoridades sanitárias, visto que a der as reais necessidades de assistência a saúde da
obesidade apresenta-se como importante fator população. Diante dessa limitação e com o ad-
de risco para problemas de saúde como hiperten- vento do SUS, surgem novas proposições de or-
são, diabetes, hipercolesterolemia, etc. ganização da atenção à saúde, fundamentada nos
Ao analisar o perfil de mortalidade da popu- princípios da universalidade, integralidade e equi-
lação brasileira no decorrer do século XX, obser- dade, e objetivando consolidar os pressupostos
va-se a principal característica da teoria da tran- do Movimento da Reforma Sanitária Brasileira.
sição epidemiológica: diminuição da mortalida- Dentre as proposições dos modelos assistên-
de por doenças infecciosas e parasitárias (DIP) e cias, o modelo de vigilância à saúde16 destaca a
aumento dos óbitos por doenças do aparelho regionalização e a hierarquização como princí-
circulatório (DAC), por doenças neoplásicas pios estratégicos e define a atenção básica como
(NEO) e por causas externas (CE)5,11. No come- eixo de reestruturação do sistema. A atenção bá-
ço do século passado, doenças infecciosas como sica, mais do que o oferecimento de uma assis-
varíola, sarampo, malária e tuberculose foram tência primária, constitui-se como eixo estrutu-
responsáveis por quase metade de todos os óbi- rante do sistema, devendo inclusive os outros
tos ocorridos no Brasil. Isso devido, principal- níveis de atenção serem planejados a partir das
mente, às péssimas condições de higiene e saúde demandas emanadas desse primeiro nível14.
e à baixa cobertura da assistência médica6. No Diante desse cenário, cabe à fisioterapia uma
decorrer do século, essa carga de doenças altera- releitura de seus fundamentos e análise de sua
se com a diminuição gradativa dos óbitos por prática, com vistas a adaptar-se a essa realidade
DIP e o aumento dos óbitos pelas chamadas do- e contribuir para a mudança do quadro social e
enças da modernidade, DAC, NEO, CE. sanitário do país. Em consonância com os prin-
O perfil de morbidade da população não se cípios propostos pelo modelo de vigilância à saú-
transformou na mesma cadência do perfil de de16, o fisioterapeuta deve ser inserido em outros
mortalidade, ou seja, a substituição de uma car- níveis de atenção e desenvolver suas ações de acor-
ga de doença por outra. O atual perfil de morbi- do as diretrizes da territorialização e da adscri-
dade caracteriza-se pela superposição entre as ção de clientela.
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Com a atuação dentro de um território esta- apenas quando a doença já está instalada e, na
belecido e como uma população definida, o fisio- maioria dos casos, de forma avançada. Nesse caso,
terapeuta passa ter a possibilidade de acompa- destacam-se como locus de atuação o hospital e a
nhar mais proximamente e ser responsável pela clínica de reabilitação, espaços tradicionalmente
saúde da população adscrita. A lógica da respon- estabelecidos e popularmente valorizados para a
sabilização estimula o desenvolvimento de no- prática fisioterapêutica. A priorização desses es-
vas relações entre profissionais e usuários, com paços condiciona e restringe as possibilidades de
o estabelecimento de vínculos, e a possibilidade intervenção em apenas um nível de atenção, a re-
de um acompanhamento continuado, o que po- abilitação. Tal situação impõe à população gran-
tencializa o desenvolvimento de ações promocio- de carga de doenças e sequelas, que poderiam ser,
nais e preventivas16,17. em muitos casos, evitadas. Os conhecimentos ine-
rentes à fisioterapia também podem contribuir
para prevenção de doenças e sequelas, quando
Fisioterapia coletiva: utilizados em outros níveis de atenção.
novo modelo de atuação profissional Segundo o modelo da história natural da
doença, proposto por Leavell e Clark18, os níveis
A Figura 1 apresenta uma representação esque- de prevenção são hierarquizados em prevenção
mática da limitada área de atuação da fisiotera- primária, secundária e terciária, a depender do
pia reabilitadora. Pela sua própria concepção e momento da intervenção. Ao relacionar a atua-
sua conformação ao modelo assistencial curati- ção do fisioterapeuta com esses níveis de preven-
vo, a fisioterapia destinou-se, quase exclusiva- ção, observa-se uma atuação destinada ao con-
mente, ao controle dos danos de determinadas trole de danos (doenças, sequelas e agravos), ou
doenças. A atuação na fisioterapia reabilitadora seja, restringindo-se ao nível da reabilitação.
é destinada à cura de determinadas enfermida- Embora, nos últimos anos, a fisioterapia te-
des e/ou a reabilitação de sequelas e complica- nha ampliado e aprofundado seus conhecimen-
ções. Seu objeto de intervenção é o sujeito indivi- tos técnicos e alargado sua área de atuação, a
dualizado, quando não, apenas partes ou órgãos exemplo da acupuntura, estética, Pilates, RPG,
isolados do corpo. fisioterapia desportiva e fisioterapia respirató-
Esta atuação direcionada apenas para o con- ria, essa ampliação ocorreu, majoritariamente,
trole de danos impõe restrições à prática do pro- no nível terciário. Mesmo com a ampliação das
fissional fisioterapeuta, que se limita a intervir possibilidades de atuação do profissional, ainda
predomina uma atenção destinada à recupera-
ção de distúrbios ortopédico-traumatológicos e
neurológicos. Como em sua gênese, a fisiotera-
pia ainda concentra seu foco na reabilitação de
indivíduos vítimas de doenças ocupacionais, le-
sões por traumas e acidentes, sequelados de do-
Fisioterapia reabilitadora enças isquêmicas ou cerebrovasculares e distúr-
bios do sistema nervoso central e periférico.
Diante dos novos desafios da sociedade bra-
Controle de danos sileira, com profundas mudanças na organiza-
ção social, no quadro epidemiológico e na orga-
nização dos sistemas de saúde, surge a necessi-
X Cura dade do redimensionamento do objeto de inter-
venção da fisioterapia, que deveria aproximar-se
do campo da promoção da saúde e da nova lógi-
Casos X Sequela ca de organização dos modelos assistenciais, sem
abandonar suas competências concernentes à
reabilitação. Esse redimensionamento do objeto
X Reabilitação de intervenção e da praxis profissional conduz às
mudanças mais profundas, de natureza episte-
mológica, na concepção e atuação do profissio-
nal fisioterapeuta.
Figura 1. Diagrama do modelo da fisioterapia Frente a esses desafios e necessidades, surge a
reabilitadora. proposição do modelo da fisioterapia coletiva19
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como base para reorientação do foco de atenção
e da prática profissional do fisioterapeuta. A fisio-
terapia coletiva engloba e amplia a fisioterapia Fisioterapia coletiva
reabilitadora, possibilitando o desenvolvimento
da prática fisioterapêutica tanto no controle de Controle de risco Controle de danos
dados quanto no controle de riscos. A Figura 2
apresenta uma esquematização desse modelo da
atuação da fisioterapia, que contempla a fisiote- X Exposição X Cura
rapia reabilitadora e alarga as possibilidades de
atuação para além do nível terciário.
Enquanto a fisioterapia reabilitadora concen- Coletividades Casos
X Necessidades X Reabilitação
tra sua atuação, quase que exclusivamente, no
controle de danos, seja buscando a cura de de-
terminadas doenças que restringem a locomo-
X Determinantes X Sequela
ção humana, seja reabilitando sequelados de pa-
tologias diversas ou desenvolvendo a capacidade
residual funcional de indivíduos que tiveram le-
sões irreparáveis de determinadas funções, a fisi-
Figura 2. Diagrama do modelo da fisioterapia coletiva.
oterapia coletiva possibilita e incentiva a atuação
também no controle de risco, ou seja, no contro-
le de fatores que potencialmente podem contri-
buir para o desenvolvimento da doença.
Aqui reside a diferença crucial entre os obje-
tos de intervenção dos dois modelos de atuação
profissional, o momento da intervenção. En- lismo da prática fisioterapêutica reabilitadora,
quanto no controle de danos a intervenção ocor- emergindo uma nova lógica de atuação em equi-
re quando a doença já está instalada, e muitas pe multiprofissional e interdisciplinar. O profis-
vezes em estado avançado, no controle dos ris- sional fisioterapeuta deve interatuar não só com
cos, a intervenção ocorre antes da doença acon- profissionais da área de saúde, como médicos,
tecer, ou seja, antes do aparecimento de sequelas enfermeiros, psicólogos, agentes comunitários de
e complicações limitadoras do movimento. saúde, nutricionistas, etc., como também com
Com relação ao sujeito da intervenção, no profissionais de outras áreas do saber, como so-
controle de danos, a atuação é direcionada ao in- ciólogos, antropólogos, historiadores, estatísti-
divíduo doente; já no controle de riscos, a atua- cos, engenheiros, educadores, dentre outros.
ção é direcionada aos grupos populacionais do- No que se refere aos conhecimentos necessá-
entes e não doentes, mas com risco potencial de rios à nova prática profissional, o fisioterapeuta
adoecer15. Esse direcionamento da atuação para deve aproximar-se de saberes da epidemiologia,
o nível primário e destinado ao coletivo de pesso- que poderá oferecer conhecimentos quanto à dis-
as potencializa os resultados das ações de saúde, tribuição das doenças nas coletividades, sua mag-
pois além de inibir o surgimento e desenvolvi- nitude e potenciais fatores de risco, e das ciências
mento de doenças evitáveis, busca transformar sociais, que poderão desvelar os fatores cultu-
as condições de vida dos grupos populacionais. rais, comportamentais e religiosos do processo
Os riscos a que está exposta a população po- saúde-doença, bem como subsidiar a contextua-
dem ser de natureza comportamental, educacio- lização da realidade histórico-social na determi-
nal, social, econômica, biológica, físico-química, nação do risco.
dentre outros15,16. Para a identificação desses ris- Com relação à interação com outros campos
cos, duas necessidades impõem-se ao profissio- da área de saúde, torna-se necessária uma apro-
nal fisioterapeuta: atuação em equipe multidisci- ximação da fisioterapia com a vigilância sanitá-
plinar e utilização de conhecimentos de outras ria, vigilância epidemiológica, vigilância nutricio-
áreas do saber, como a epidemiologia, a geografia nal, vigilância à saúde do trabalhador e vigilância
e as ciências sociais. ambiental, com vistas à identificação e acompa-
Os conhecimentos relativos à fisioterapia tra- nhamento de problemas que requerem atenção
dicional são, por si só, insuficientes para os diag- contínua, ação sobre territórios definidos e arti-
nósticos da situação/condição de risco. Há ne- culação entre as ações promocionais, preventi-
cessidade de romper o isolamento e o individua- vas, curativas e reabilitadoras16.
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Assim, deve ser destacado que o modelo da ciedade, como infraestrutura, economia, educa-
fisioterapia coletiva não visa extinguir as ações ção e habitação, em ações desenvolvidas em con-
de cura e reabilitação característica da fisiotera- junto e com a participação da sociedade.
pia reabilitadora, mas sim acrescentar novas Quanto ao modelo de prestação de serviços
possibilidades e necessidades de atuação do fisio- de saúde, esse deve ser descentralizado e hierar-
terapeuta frente ao atual quadro sanitário e da quizado, e organizado em níveis crescentes de com-
nova lógica de organização do SUS. plexidade14-16. O sistema deve estruturar-se de
As definições e proposições aqui expostas não forma a oferecer uma ampla cobertura da aten-
dizem respeito à mera adjetivação – reabilitado- ção básica, contemplando grandes parcelas da
ra ou coletiva – da profissão de fisioterapia, mas população. A atenção básica deve ser resolutiva,
sim à adequação e redefinição da praxis profissio- solucionar os problemas de saúde mais prevalen-
nal e do seu objeto de trabalho. O objeto da atu- tes na população e encaminhar para outros níveis
ação da fisioterapia continuará sendo o movi- os problemas não solucionados em seu âmbito.
mento humano; no entanto, essa atuação não se Essa lógica de estruturação do sistema obje-
dará, exclusivamente, no indivíduo doente e se- tiva o oferecimento de uma assistência integral à
quelado; antes, porém, a atuação será direciona- população. E integralidade não é apenas diretriz
da às coletividades humanas, buscando trans- do SUS, integralidade é “bandeira de luta”, é um
formar hábitos e condições de vida, promoven- conceito que permite uma identificação dos su-
do saúde e evitando, consequentemente, distúr- jeitos como totalidades. A assistência integral ex-
bios do sistema locomotor. trapola a estrutura organizacional da assistência
A fisioterapia necessita romper com as bar- de saúde e prolonga- se pela qualidade real da
reiras do modelo biologicista-curativo em que atenção individual e coletiva assegurada aos usuá-
sempre se apoiou e se aproximar da saúde cole- rios do sistema de saúde22. Ainda segundo o con-
tiva, que valoriza o social como categoria analíti- ceito de integralidade, as pessoas são encaradas
ca do processo saúde-doença e propõe novas for- como sujeitos, a atenção deve ser totalizadora e
mas de organização do setor saúde20. A aproxi- levar em conta as dimensões biológica, psicoló-
mação entre fisioterapia e saúde coletiva possibi- gica e social, visto que o homem é um ser indivi-
litará novas reflexões sobre o papel da fisiotera- sível e não pode ser explicado pelos seus compo-
pia no atual quadro epidemiológico e na nova nentes considerados separadamente23.
lógica de organização dos serviços de saúde, com Para atingir a assistência integral, é necessá-
grande potencial para a redefinição epistemoló- rio ampliar a capacidade do sistema, com garan-
gica do campo científico da profissão, tornan- tia do acesso à atenção primária, secundária e
do-a cientificamente mais fundamentada, sani- terciária, sem perder de vista as ações promocio-
tariamente mais contextualizada e socialmente nais e de controle de riscos. No entanto, os mu-
mais comprometida. nicípios têm demonstrado dificuldades para ga-
rantir o acesso da população aos outros níveis
de assistência, especialmente no nível secundá-
Fisioterapia e atenção básica: rio24. Os municípios, especialmente os de peque-
novas possibilidades de atuação no e médio porte, têm conseguido, relativamen-
te, ampliar a cobertura do Programa de Saúde
Com a definição da atenção básica como eixo cen- da Família (PSF); no entanto, têm encontrado
tral de reestruturação do modelo assistencial bra- dificuldades no estabelecimento de um sistema
sileiro, impõem-se uma nova lógica de organiza- regionalizado de referência e contrarreferência
ção dos serviços e uma redefinição na atuação que garanta uma assistência integral à popula-
dos profissionais de saúde. Esse novo modelo ção. Segundo Alves25, a expansão do PSF tem fa-
busca romper com o curativismo do modelo vi- vorecido a equidade e universalidade da assis-
gente, reestruturando e articulando a assistência tência, uma vez que as equipes têm sido implan-
com ações de promoção da saúde, controle de tadas, prioritariamente, em comunidades antes
risco e prevenção de doenças. Cabe destacar o restritas quanto ao acesso aos serviços de saúde.
enfoque que deve ser dado às ações intersetoriais, Todavia, a integralidade das ações continua a ser
visto da incapacidade do setor saúde de reverter, um problema para o sistema de saúde.
isoladamente, os determinantes mais gerais e es- Diante desse contexto, a aproximação entre a
truturais das condições de vida21. Estes determi- fisioterapia e o nível primário apresenta-se como
nantes só poderão ser transformados com a arti- alternativa capaz fortalecer a atenção básica, au-
culação dos diversos setores do governo e da so- mentando a resolutividade do sistema e contri-
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buindo para a garantia da integralidade na assis- mento das condições de saúde nos âmbitos mu-
tência. A fisioterapia, embora historicamente te- nicipal, estadual e federal, subsidiando a defini-
nha se mantido no nível da reabilitação, possui ção de políticas públicas.
competências e habilidades suficientes para a atu-
ação em outros níveis. Neste sentido, apresen-
tam-se algumas possibilidades de atuação do fi- Orientações posturais
sioterapeuta na atenção básica e em ambiente
comunitário. A questão da postura deve ser difundida em
âmbito coletivo não apenas como questão esté-
tica, mas como atitude corporal inerente a uma
Vigilância dos distúrbios cinesiofuncionais vida saudável e fator preventivo para diversas
doenças. No âmbito da atenção básica, o fisiote-
A vigilância dos distúrbios cinesiofuncionais rapeuta deve atuar preferencialmente com gru-
constitui-se em subárea da vigilância epidemio- pos populacionais, orientando sobre as postu-
lógica responsável pelo acompanhamento e mo- ras mais adequadas para cada grupo ou para
nitoramento da integridade físico-funcional e dos cada situação. A prática da educação em saúde
distúrbios relacionados à locomoção humana. não deve e não pode ser entendida como ação
Essas ações de vigilância devem ocorrer a partir vertical e unidirecional, do profissional que sabe
da atenção básica e com a participação do fisio- para a população que não sabe26. O processo de
terapeuta, ou fazendo parte da equipe de saúde educação e orientação postural deve ser construí-
da família ou interatuando com essa. A equipe do coletivamente, levando-se em consideração
de vigilância tem a responsabilidade pela saúde quais os hábitos, costumes e crenças com poder
cinesiológica e funcional de determinadas popu- de influência na postura daquela comunidade.
lações em territórios definidos. Nesse sentido, dentre as possibilidades de atua-
De acordo ao atual cenário epidemiológico, ção do fisioterapeuta na orientação postural, no
algumas condições apresentam maior potencial âmbito da atenção básica, destaca-se a atuação
para a limitação da capacidade funcional das em grupos de escolares, de gestantes e de idosos.
populações, a exemplo das patologias relaciona- O desenvolvimento de hábitos posturais sau-
das ao aparelho cardiocirculatório, às causas ex- dáveis deve começar ainda na fase da infância. A
ternas e ao aumento da população idosa. As do- percepção e a conscientização da postura corpo-
enças cerebrovasculares quase sempre deixam ral, se iniciadas quando da formação dos concei-
sequelas que levam à limitação da locomoção tos iniciais da criança, podem acompanhá-la
humana ou incapacidade física. Os episódios de durante toda vida, desenvolvendo nos cidadãos
violência, especialmente os acidentes de tráfego, consciência da própria postura. Desta forma, o
além de produzirem considerável número de fisioterapeuta deve atuar na orientação postural
óbitos, possuem grande poder incapacitante e têm de crianças, em especial de escolares, instituindo
gerado grandes contingentes de sequelados. uma cultura de valorização e cuidado com a pos-
A saúde da população idosa merece especial tura corporal. A educação postural de escolares
atenção, em virtude da longevidade trazer consi- deve ser uma atividade continuada, articulada
go limitações na funcionalidade do aparelho lo- entre os setores de educação e saúde, com desta-
comotor, restringindo a deambulação e marcha cada participação dos professores, e que valorize
dos idosos. Essa situação torna-se digna de ser o espaço da escola e o mundo da criança como
monitorada, visto que a restrição à mobilização locus preferencial de atuação.
dos idosos ou o confinamento no leito apresen- O período de gestação gera importantes re-
tam-se como fatores de risco para o desenvolvi- percussões na postura corporal, na marcha e no
mento de uma série de outras doenças. retorno venoso, além de desencadear dores lom-
Desta forma, a vigilância e o acompanhamen- bares e desconforto respiratório27. Em virtude
to dos distúrbios cineticofuncionais têm por ob- dessas alterações, o fisioterapeuta deve atuar em
jetivo fornecer dados e informações relevantes grupos de gestantes, organizados a partir de cada
para as equipes de saúde, tanto na definição do PSF, orientando quanto às posturas corporais,
perfil epidemiológico da população, como sub- exercícios de alongamento, relaxamento e auxí-
sidiando as atividades de planejamento e inter- lio ao retorno venoso, orientações sobre exercí-
venção. Todavia, essa vigilância não deve se res- cios respiratórios, além de incentivo ao aleita-
tringir aos limites da atenção básica. Deve cons- mento materno e orientações dos cuidados com
tituir-se como instrumento para o monitora- o bebê. Deve-se destacar a importância do de-
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senvolvimento de atividades em grupo, que além de saúde, com população e território adscritos.
da realização das atividades anteriormente des- A exemplo dos conselhos municipais de saúde,
critas, possibilita um espaço de partilha de me- os conselhos locais devem ser compostos por
dos, inseguranças, expectativas e experiências. representantes dos usuários, dos profissionais
No que se refere à população idosa, a atua- de saúde e dos gestores, e devem ter a responsa-
ção do fisioterapeuta na atenção básica possibi- bilidade de discutir os principais problemas de
lita o desenvolvimento de ações relacionadas à saúde da localidade, definindo estratégias a se-
melhoria da postura, o estado físico-funcional, rem implementadas em nível local e elaborando
além de estimular o desenvolvimento da autoes- proposições para discussão no âmbito munici-
tima e bem-estar. O fisioterapeuta deve traba- pal e regional.
lhar com grupos de idosos, realizando as seguin-
tes atividades: orientação da postura corporal;
exercícios de relaxamento, alongamento e auxí- Desenvolvimento de ambientes saudáveis
lio ao retorno venoso; caminhadas e atividades e incentivos a estilos de vida saudáveis
físicas moderadas; orientação quanto ao posicio-
namento adequado do mobiliário do lar, banhei- A atuação do fisioterapeuta no desenvolvimento
ros e dispositivos auxiliares; dentre outros. de ambientes saudáveis perpassa por ações de-
senvolvidas junto aos indivíduos, as famílias e a
comunidade, objetivando promover condições
Desenvolvimento dignas de vida e saúde. O fisioterapeuta deve pro-
da participação comunitária mover a conscientização e a mobilização da co-
munidade em defesa de moradias dignas e con-
O envolvimento e a participação da comunidade dições estruturais básicas, como abastecimento
têm sido cada vez mais utilizados como instru- de água, esgotamento e tratamento dos dejetos
mento para elevação dos níveis de saúde. Além sanitários, coleta de lixo e pavimentação de ruas;
disso, a participação comunitária propicia a va- identificar barreiras arquitetônicas e mobilizar a
lorização da cidadania e elevação do capital so- comunidade para reversão dessas barreiras; sen-
cial28. O ser humano é, em essência, um ser parti- sibilizar a comunidade para defesa do meio am-
cipativo e a prática da participação facilita o cres- biente, a exemplo de preservação de áreas verdes
cimento da consciência crítica, fortalece o poder e mananciais, além de estar atento para os níveis
de mobilização e interação para o entendimento e de educação, lazer e condições de trabalho da
condução de sua vida social29. Desta forma, o fisio- população.
terapeuta deve atuar no âmbito comunitário, in- No que tange ao desenvolvimento de habili-
centivando e estimulando a participação da co- dades pessoais, o fisioterapeuta atuará, princi-
munidade nas questões relacionadas à saúde. palmente, no desenvolvimento de hábitos de vida
Deve-se buscar o despertar da comunidade saudáveis tais como incentivo à prática da ativi-
para a valorização da saúde individual e coletiva dade física regular; adoção de hábitos alimenta-
e conscientizar a população sobre o seu protago- res saudáveis; combate ao tabaco, ao álcool e às
nismo na condução do sistema de serviços de drogas ilícitas; desestímulo à promiscuidade e
saúde. Nesse sentido, a participação lograria a estabelecimento de relações parentais estáveis;
identificação dos principais problemas que atin- educação sexual para jovens e adultos; e incenti-
gem a comunidade; a corresponsabilização pela vo à valorização e corresponsabilização da pró-
saúde; a participação no planejamento e defini- pria saúde e saúde da comunidade. Desta forma,
ção das ações de saúde; a fiscalização dos recur- o fisioterapeuta contribuiria ao desenvolvimen-
sos da saúde; a identificação de crenças e hábitos to da promoção da saúde, tanto no desenvolvi-
prejudiciais à saúde, estimulando hábitos de vida mento de habilidades individuais, quanto nas
saudáveis; a mobilização da comunidade para a questões estruturais condicionantes das condi-
realização de campanhas de vacinação, preven- ções de vida.
ção de doenças, aleitamento materno, etc.
Apresenta-se aqui os conselhos locais de saú-
de como importante instrumento para potencia- Considerações finais
lizar a participação da comunidade. O fisiotera-
peuta, juntamente com os demais componentes Esse trabalho apontou algumas possibilidades
da equipe, deve estimular a criação desses conse- de atuação do fisioterapeuta no SUS, com desta-
lhos, tendo como referência uma unidade básica que para o nível primário. No entanto, deve ser
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Ciência & Saúde Coletiva, 15(Supl. 1):1627-1636, 2010


destacado que ele não esgota os limites da práti- zes, as complicações dos distúrbios musculoes-
ca fisioterapêutica na atenção básica, existindo queléticos ou o agravamento de incapacidades
muitas outras possibilidades que devem ser apre- relacionam-se ao desenvolvimento de hábitos
sentadas e debatidas em outros estudos. não saudáveis ou apenas à impossibilidade de
Deve ser destacado que os profissionais en- custear o transporte até o serviço de fisioterapia.
frentarão dificuldades para atuação na atenção Como síntese, apresentam-se alguns princí-
básica e no desenvolvimento de atividades pre- pios que devem nortear a atuação do fisiotera-
ventivas e promocionais. A grande demanda por peuta no nível primário. O fisioterapeuta deve
assistência em reabilitação apresenta-se como atuar em equipe multiprofissional e com abor-
fator limitante para o exercício em outros níveis. dagem interdisciplinar, objetivando a integrali-
A dificuldade de acesso da população aos níveis dade da assistência. Deve seguir a lógica da terri-
secundários de assistência ocorre também nos torialização, adscrição da população e responsa-
serviços de fisioterapia, desencadeando num bilização, inserindo a prática do cuidado conti-
grande contingente de cidadãos com limitações nuado. A atuação deve ocorrer, preferencialmen-
na saúde físico-funcional desassistidas, o que vai te, no âmbito coletivo, com o envolvimento e a
agravando cada vez mais sua saúde motora. O participação da população. As ações devem ser
atendimento a essa demanda reprimida tende a articuladas com diversos setores da sociedade e
sufocar as possibilidades de desenvolvimento de dos governos, primando pela reversão dos de-
outras atividades no nível primário. terminantes e condicionantes sociais da saúde.
Cabe ao fisioterapeuta, em consonância com Por fim, destaca-se a importância da formação
a equipe de saúde e com os gestores locais, plane- profissional para consolidação do modelo de fisi-
jar e desenvolver estratégias para contemplar tan- oterapia coletiva. O fisioterapeuta possui forma-
to as ações de reabilitação, que não podem dei- ção curativo/reabilitadora, biologicista e pautada
xar de ser desenvolvidas, quanto as ações de pro- em princípios flexnerianos, o que condiciona as
moção da saúde e prevenção de doenças. A atua- concepções e as práticas profissionais à fisioterapia
ção do fisioterapeuta na atenção básica não deve reabilitadora. Nesse sentido, a mudança na for-
corresponder ao exclusivo desenvolvimento de mação profissional, com a gradual substituição da
ações de reabilitação no PSF, o que corresponde- ênfase curativo/reabilitadora para uma lógica pro-
ria à simples reprodução do modelo biomédico- mocional/preventiva, apresenta-se como condição
curativo na comunidade, mas sim constituir-se indispensável à implementação de um novo mo-
de nova força para a transformação da realidade delo de atuação. A formação deve incluir e valori-
social e epidemiológica. zar os conhecimentos inerentes à saúde coletiva, ao
As desigualdades sociais em saúde e a exclu- SUS e às ciências sociais. A formação aqui sugerida
são social devem permear as prioridades da atu- não diz respeito, unicamente, aos atuais estudantes
ação do fisioterapeuta na saúde coletiva. A de- de graduação e futuros profissionais, mas tam-
manda reprimida de deficientes e pessoas com bém deve contemplar o grande contingente profis-
limitações físico-motoras têm forte relação com sional em pleno exercício da profissão, com uma
a exclusão socioeconômica, em que, muitas ve- educação continuada e transformadora.
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Bispo Júnior JP

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