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PSICOPATOLOGIA E EXAME PSIQUIÁTRICO

 Psicopatologia: conjunto de conhecimentos referentes ao adoecimento mental do ser humano.


 O exame do estado mental é uma avaliação do funcionamento mental do paciente no momento do exame.
Com o objetivo de facilitar a descrição, o exame do estado mental é organizado por áreas (funções psíquicas),
embora exista uma grande inter-relação entre estas diferentes áreas.
CONSCIÊNCIA
 Chama-se consciência o conhecimento que temos de nós mesmos e do mundo externo, e é resultado
da atuação simultânea de um conjunto de fenômenos psíquicos. É o todo momentâneo da vida psíquica.
 É o estado de estar desperto, e de entrar em contato com a realidade, de perceber e conhecer os objetos.
 Vai desde a consciência plena (percebe o que ocorre a sua volta e responde à sua percepção) até o
coma (não responde à estimulação em diferentes graus).
 É explorada apenas por meios indiretos. Alguns sintomas e sinais podem significar alteração da
consciência:
- Expressão fisionômica: fisionomia pode estar fatigada, sonolenta e com tendência a fechar os olhos;
- Desinteresse frente ao mundo externo;
- Fatigabilidade da atenção, com diminuição da capacidade de concentração;
- Desorientação;
- Incoerência de ideias;
- Incapacidade de memorizar;
- Incapacidade de raciocinar.
(Perceba que envolve outras funções psíquicas)
 Sonolência: lentificação geral dos processos ideacionais, com predisposição para dormir, na ausência
de estimulação.
 Obnubilação da consciência: diminuição do nível de vigília, acompanhado da dificuldade em focalizar
a atenção, perceber estímulos e manter um pensamento.
 Estupor: grau mais avançado de comprometimento do nível de consciência, em que há diminuição da
resposta até mesmo para estímulos dolorosos.
 Delirium (estado confusional agudo): rebaixamento do nível de consciência, acompanhado de
alterações cognitivas e perceptuais: ilusões, alucinações, desorientação, déficit de memória e delírios.
 Estado crepuscular: estreitamento do campo da consciência, que pode se restringir a um
comportamento motor organizado. Ocorre principalmente ligado a epilepsias.
ATENÇÃO
 É a capacidade de dirigir e concentrar o foco da atividade psíquica em determinado setor do campo da
consciência. A chamada vigilância refere-se ao estado de alerta para estímulos vindos do ambiente,
enquanto que a tenacidade é definida como a capacidade de manutenção da atenção (concentração).
 Pode-se pedir para o paciente dizer os meses do ano e dias da semana em ordem inversa, ou para
subtrair 7 sucessivamente a partir do 100.
 Os seguintes conceitos, de cada coluna, são parecidos e estão relacionados:
Hipoprosexia: diminuição global da atenção Hiperprosexia: estado de atenção exacerbado
Distração: supercontração sobre determinados Distraibilidade: é uma instabilidade e mobilidade
objetos ou pensamentos, com inibição do restante. acentuada da atenção voluntária, de modo que a
Logo é uma hipertenacidade associado a uma atenção é facilmente desviada. Apresenta
hipovigilância. Encontrado em quadros obsessivos e hipotenacidade e hipervigilância. Ocorre nos estados
síndromes depressivas. maníacos e situações de intensa ansiedade
Manutenção prejudicada: dificuldade de manter a
Focalização prejudicada: dificuldade de focalizar
atenção sobre os estímulos mais relevantes,
sobre os estímulos mais relevantes do meio
desviando para estímulos irrelevantes
 Desatenção seletiva: desatenção frente a temas que gerem intensa ansiedade (como a morte).
ORIENTAÇÃO
 É a capacidade de uma pessoa saber quem ela é (orientação autopsíquica) e de se orientar no tempo e
no espaço (orientação alopsíquica ou temporoespacial). Onde o senhor está? Que dia é hoje?
 Geralmente a orientação temporal é a primeira a ser perdida
 Pacientes deprimidos, por falta de interesse, podem parecer estarem desorientados
 Dia do mês e dia da semana possuem menor valor semiológico que o ano, época do ano e parte do dia.
 Na desorientação espacial, em geral ele não sabe onde se encontra e porque está ali. Às vezes, pode
tentar justificar com argumentações frágeis.
 A orientação autopsíquica é aúltima a ser comprometida. Paciente não sabe seus dados pessoais (idade,
estado civil e nome). Em pacientes esquizofrênicos, pode acontecer a dupla orientação: sabe seus dados
de identidade, mas afirma que é o presidente da república; sabe o nome do hospital e nele consegue se
orientar, mas afirma que não é um hospital, e sim seu palácio presidencial.
 Existem os chamados distúrbios da consciência do eu (ou da orientação do eu):
- Sentimento de despersonalização: sabe quem é, mas se sente estranho, mudado e diferente.
Sentimento de estranheza a respeito da própria imagem. Sentimento de desrealização: o mundo parece
estranho, diferente e distante. Sinto como se estivesse vendo um filme ou sonhando.
- Perda do sentimento de existência: paciente acha que partes do seu corpo não existem.
- Perda de controle da atividade do eu e da oposição do eu em relação ao mundo: paciente tem a
impressão de que não consegue controlar suas funções psíquicas, de que pensamentos, movimentos ou
fala são controlados ou influenciados por outras pessoas ou aparelhos. Pode-se perder o limite que
existe entre o indivíduo e o meio externo, levando a sentimentos de pensamento roubado e vivência de
publicação (o que o paciente pensa é ouvido pelos outros, levando-o a ficar calado diante de uma
pergunta, como se os outros já soubessem a resposta).
SENSOPERCEPÇÃO
 A percepção é a tomada de consciência, e atribuição de significado, dado a um estímulo sensorial.
Tanto a sensação (fenômeno elementar) quanto a percepção dependem da integridade das vias
neurológicas, e são influenciados pelas funções psíquicas.
 Ilusões: percepções deformadas de um objeto real. Pode acontecer em situações normais e tem pouco
valor semiológico. Exemplos:
- Estado de exaustão: motorista cansado que confunde uma árvore com uma pessoa;
- Estado de tensão emocional (ilusão catatímica): paciente com muito medo que vê num galho de uma
árvore um braço de um ladrão;
- Ilusão autoprovocada: tentar enxergar formas nas nuvens.
 Alucinações: vivência de percepção de um objeto, que efetivamente não está presente. Tipos:
- Alucinações auditivas: podem ser elementares (apenas ruídos) ou complexas (frases e diálogos). Pode
estar ligada ao humor (paciente depressivo que ouve frases como você é um merda) ou não (paciente
esquizofrênico que ouve vozes que comentam seu comportamento ou falam do paciente em terceira
pessoa – o que vamos fazer com ele?).
- Alucinações visuais: muito ligada a distúrbios orgânicos. Podem ser amedrontadoras. Um tipo
especial é a autoscopia, na qual o paciente vê o próprio corpo e o ambiente como se estivesse fora dele.
- Alucinações olfatórias e gustativas, muito presente em quadros orgânicos;
- Alucinações táteis, sendo muito comum sentir insetos que caminham na pele (delirium tremens);
- Alucinações extracampinas: paciente percebe objetos fora do seu campo perceptivo, como um
esquizofrênico que afirma ter visto o diabo na sala ao lado;
- Alucinações que precedem o sono (hinagógicas) ou o despertar (hipnopômpicas);
- Alucinações cinestésicas (percepção de movimento corporal – exemplo: corpo flutuando),
cenestésicas (alteração do esquema corporal – exemplo: minha cabeça está aumentando) ou
sinestésicas (percepção de múltiplos sentidos);
- Alucinações funcionais: desencadeada por estímulo sensorial (exemplo: paciente que ouve vozes
quando abre o chuveiro);
 Alucinações são examinadas a partir de relatos espontâneos, observação de comportamentos
sugestivos ou por perguntas diretas sobre alterações perceptuais.
MEMÓRIA
 É a capacidade de registrar, manter e evocar fatos e conceitos.
 É dividida em memória de fixação (capacidade de registrar e fixar o material mnêmico) e memória de
evocação (capacidade de retornar à consciência o que foi apreendido e conservado). Pode ser dividida
também temporalmente, segundo o tempo de duração da lembrança:
- Memória imediata: capacidade de reter a informação imediatamente após ter sido recebida; recordar
o que aconteceu nos últimos minutos. Pode ser avaliada pelo teste de recordação de três objetos, ou
prova de repetição de números (em ordem direta e ordem inversa);
- Memória recente ou de curto prazo: reter a informação por um período curto, de minutos e horas a
poucos dias). O que você comeu ontem?;
- Memória remota ou de longo prazo: capacidade de evocação de acontecimentos ocorridos no passado,
após meses ou anos. Qual o nome da sua mãe?
 Hipermnésia: aumento da memória (sem muito valor semiológico), em que as representações afluem
em grande quantidade, sem funcionalidade, perdendo em grande parte a clareza e precisão. Está
relacionada a uma aceleração psíquica global.
 Amnésia, que pode ser anterógrada (fixação) ou retrógrada (evocação). As amnésias também podem
ser lacunares, caracterizando-se pelo esquecimento de um determinado período de tempo, bom boa
evocação para acontecimentos antes ou depois.
 Lei de Ribot: a memória para fatos recentes é a primeira a ser comprometida, ficando preservadas as
lembranças mais remotas.
 O paciente pode não valorizar o seu déficit, como na síndrome demencial, ou supervalorizá-lo, como
na pseudodemência depressiva (déficit de memória por atenção e concentração reduzida).
 Existem as chamadas paramnésias, isto é: alterações qualitativas da memória, que não correspondem
à sensopercepção original:
- Ilusão mnêmica: acréscimo de elementos falsos a uma lembrança verdadeira
- Confabulação: o paciente com amnésia pode preencher o seu déficit com recordações falsas e
fantasiosas (confabulação).
- Déjà vu (sensação de que algo inédito já foi visto) e jamais vu (sensação de que algo já conhecido é
inédito).
AFETIVIDADE
 De difícil conceituação, pode-se dizer que compreende os fenômenos psíquicos que são
experimentados e vivenciados na forma de emoções e sentimentos. Inclui sensações de prazer e
desprazer, até sentimentos complexos, como religiosos e estéticos.
 Dentro da afetividade, está o humor (ou estado de ânimo), que é a tonalidade afetiva básica, o estado
afetivo predominante.
- Humor normal (eutimia): não apresenta variações afetivas persistentes, e não é polarizado;
- Distimia: qualquer alteração do humor. Não confundir com o sintoma com o transtorno distimia
(depressão leve e crônica)
- Humor diminuído (hipotimia): redução global das emoções, podendo estar associado a tristeza, tédio,
inibição, pessimismo e desânimo. Característico da depressão e pode estar associado a ideação suicida;
- Humor elevado (hipertimia): acentuação global das emoções, podendo estar associado a alegria,
otimismo, profunda sensação de bem-estar e alegria imotivada (às vezes fúria e irritabilidade).
Característico da mania;
- Humor ansioso: reação temerosa “sem saber o quê”, apreensão negativa em relação ao futuro e
sensação de desconforto;
- Disforia: tonalidade afetiva desagradável, mal-humorada e irritável, como na tensão pré-menstrual.
 Além do estado afetivo básico, podem ocorrer alterações na capacidade de variar, modular e controlar
as respostas afetivas:
- Labelidade afetiva: instabilidade emocional, com mudanças súbitas e imotivadas (riso alternado com
choro). É um tipo de hipermodulação do afeto (fortes oscilações);
- Incontinência afetiva: não consegue conter suas emoções (ri ou chora por longos períodos, diante de
um pequeno ou nenhum estímulo);
- Incongruência afetiva (inadequação afetiva ou paratimia): ocorre quando a resposta é inadequada a
um relato ou situação (paciente que ri enquanto narra uma cena trágica);
- Embotamento afetivo: ausência de resposta afetiva, perda profunda de todo tipo de vivência afetiva.
Ao contrário da apatia, que é subjetiva, o embotamento afetivo é perceptível pela mímica, postura e
atitude do paciente.
- Indiferença afetiva (bela indiferença): frieza afetiva diante dos sintomas que o paciente apresenta,
mostrando-se indiferente, por exemplo, diante de uma paralisia das suas pernas;
- Apatia: diminuição da excitabilidade emocional e afetiva. Pacientes queixam-se de não sentir alegria,
nem tristeza, nem raiva em nada. Aproxima-se da anedonia

- Anedonia: incapacidade total ou parcial de obter e sentir prazer com determinadas atividades e
experiências de vida, anteriormente fontes de prazer;
- Ambivalência afetiva: situação de coexistência de estados emocionais incompatíveis (amor e ódio,
por exemplo);
 A afetividade deve ser avaliada pelo conteúdo verbalizado, pelo tom da voz, expressão facial, postura
corporal, relatos ou perguntas direcionadas. Lembrar que nem sempre o relato do paciente condiz com
seu estado de humor (um paciente maníaco não percebe o caráter patológico da sua alegria).
PENSAMENTO

Fonte usada: Porto, artigo da USP de semiologia psiquiátrica e MEDCURSO.

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