Autores: Jerto Cardoso da Silva e Edna Linhares Garcia
Questões que emergem na atualidade:
Que diferenças conceituais são possíveis de se identificar nas noções de subjetividade e de sujeito? Estas concepções são contraditórias, complementares e/ou coincidentes? As concepções de subjetividade anulam as noções de sujeito? Temos a concepção de sujeito, sustentada desde Freud, que concebe o sujeito que se estrutura ao longo de um percurso histórico singularizado pelo cotidiano. Do sujeito que se constitui a partir do outo, que é sempre social e externo, mas que inscreve neste seu contexto imediato, pela via do cuidado, dos primeiros cuidados maternos inscritos numa trama familiar, na qual estão em jogo modos de subjetividade e efeitos inconscientes. Para Freud, temos o sujeito que, que carrega consigo marcas do discurso social e a partir delas se reinventa e se subjetiva, ao mesmo tempo em que encobre essa identificação. Neste sujeito, todos os processos históricos-sociais, grupais acontecem no seu interior, daí decorrendo uma construção do sujeito que é em parte consciente e de outra parte inconsciente, reprimida e distanciada desse consciente (sujeito construído pelo inconsciente). Por outro lado, temos a concepção do sujeito que ressalta a dimensão da produção da subjetividade, como um acontecimento atrelado a um determinado momento histórico e social. O sujeito produzido a partir de dobras produzidas numa torção dentro (sujeito) e fora (tessitura social), como afirma Deleuze (sujeito histórico). O sujeito entrelaçado ao discurso social que opera na sua própria construção. Para González-Rey, a noção de subjetividade é um sistema complexo e plurideterminado, afetado pelo curso da sociedade e das pessoas que as constituem, dentro de um contínuo movimento das redes de relações que caracterizam o desenvolvimento social. Os autores destacam da noção de subjetividade, a capacidade de mediatizar e de projetar-se num futuro através de um ideal, ou seja, um ser criativo senhor do seu destino e com a possibilidade de se inventar. Ou seja, a capacidade de construir a própria história e até de se reinventar. A psicanálise surgiu como a invenção de uma nova subjetividade, delineada num modelo que tem a falta como referência e a culpa como operador, isto é a produção de subjetividade se dá em torno da interdição e do desejo. Que traz um sujeito que deve seu advento ao narcisismo parental e que, como os pais, terá de aceitar as interdições que a castração simbólica lhe impõe (PINHEIRO, 2003). Ou seja, o sujeito que pensava ser senhor de suas vontades [é revirado pela teoria freudiana, que acrescenta a este sujeito algo que lhe é exterior e ao mesmo tempo lhe constitui. O sujeito é constituído na e pela linguagem, que faz a torção dentro-fora no sujeito, interior-exterior constitutivo. Na construção do sujeito contemporâneo constatamos uma pulverização na pluralidade dos modos de subjetivação e, embora em domínios diferentes, na visão dos autores, subjetividade e sujeito se entrelaçam . Assim não se pode pensar o sujeito apenas como resultado de uma estrutura, que se reinventa a partir de marcas estruturantes ou apenas daquele que se inventa a cada momento, sem as marcas do seu passado e de sua história pessoal e coletiva. Não nos produzimos espontaneamente, como quem se fabrica a sim mesmo. Somos atravessados por um sujeito do inconsciente que não é avesso à dimensão social, pois nos espelhamos nela e ao mesmo tempo desdobra-se em nós uma instância de singularização. Somos restringidos e produzidos por um desejo social que orienta nossa subjetivação e, simultaneamente vemos ser inscrita, nessa sujeição uma instância construída por dimensões simbólicas, imaginárias e reais que fazem um voltar-se da pulsão sobre si mesma, produzindo simultaneamente e reciprocamente, o desejo e o desejante. A estruturação do sujeito se dá num movimento de busca por uma subjetividade que se constitui em torno de um sentido, que vai em direção a outra significação, em direção ao encerramento, mesmo que ilusório, da significação de si (LACAN, 2002). Desse modo, respondendo objetiva e resumidamente: Que diferenças conceituais são possíveis de se identifica nas noções de subjetividade e de sujeito? Temos segundo as teorias visitadas pelos autores, o sujeito construído pelo inconsciente e o sujeito histórico. E temos a subjetividade como um sistema complexo e plurideterminado, afetado pelo curso da sociedade e das pessoas que as constituem, dentro de um contínuo movimento das redes de relações que caracterizam o desenvolvimento social. E temos também a subjetividade que tem a falta como referência e a culpa como operador, e cuja produção se dá em torno da interdição e do desejo. Estas concepções são contraditórias, complementares e/ou coincidentes? Na visão dos autores, fundamentados nas teorias visitadas essas concepções se entrelaçam e se complementam. As concepções de subjetividade anulam as noções de sujeito? As concepções de subjetividade não anulam as noções de sujeito e, ao contrário, a estruturação do sujeito se dá num movimento de busca por uma subjetividade.