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MODELO DE PETIÇÃO PARA INTERNAÇÃO

COMPULSÓRIA DE DEPENDENTES QUÍMICOS


Antes de copiar o modelo peço a todos(as) que leiam este post. Obrigada!

Alguns esclarecimentos:

A internação compulsória é determinada em casos de processos criminais onde o


réu sofre medida de segurança. No caso de internação involuntária, com base em
relatório médico devidamente fundamentado, havendo risco para o paciente ou
para terceiros em função do surto pelo qual passa o paciente, o próprio médico
pode internar involuntariamente com autorização de familiares, quando então
deverá comunicar o Ministério Público. Contudo, aquelas pessoas que não
aceitam tratamento voluntário e o médico entende que não é caso de internação
involuntária referida pela Lei 10.216 (Lei de Proteção ao Doente Mental), a
situação passa pela capacidade da pessoa, de modo que é necessária a interdição,
ainda que provisória, com pedido de internação com fulcro no artigo 1.777 do
Código Civil.

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ____ª VARA


ESPECIALIZADA DA FAMILIA E DAS SUCESSÕES DA COMARCA DE CUIABÁ –
MATO GROSSO

URGENTE !
O ser humano é a única razão do Estado. O Estado está conformado para servi-lo,
como instrumento por ele criado com tal finalidade. Nenhuma construção artificial,
todavia, pode prevalecer sobre os seus inalienáveis direitos e liberdades, posto que
o Estado é um meio de realização do ser humano e não um fim em si mesmo' (Ives
Gandra da Silva Martins, in 'Caderno de Direito Natural – Lei Positiva e Lei
Natural', n. 1, Centro de Estudos Jurídicos do Pará, 1985, p. 27).

E, brasileira, solteira, do lar, portadora do RG nº e do CPF nº, residente e


domiciliado nesta Capital, na Rua, pela DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO, cujo
Defensor Público no uso de suas atribuições institucionais de assistência jurídica a
esta subscreve (intimações e demais comunicações processuais de praxe, para o
órgão de atuação perante este juízo, cujo gabinete localiza-se no Núcleo Cível da
Defensoria no Fórum), vem à presença de Vossa Excelência requerer

MEDIDA PROTETIVA PARA INTERNAÇÃO INVOLUNTÁRIA

(COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA)

em face de XXXXXXXXXXX, brasileiro, solteiro, pintor de paredes, residente e


domiciliado também nesta cidade e comarca, no mesmo endereço da Autora, pelos
motivos fáticos e jurídicos a seguir expostos.

I - DOS FATOS:

A Requerente é mãe de XXXXXX, o qual é usuário e dependente de substâncias


químicas e/ou entorpecentes, já tendo consumido, entre outras, maconha, cola,
“crack” e cocaína.

Devido ao quadro dependência química, o requerido, por diversas vezes, furtou


bens de valores de sua própria casa para vendê-los a fim de adquirir tóxicos para
seu consumo. Também já teve passagens pela polícia, por porte de drogas e prática
de pequenos furtos, tendo cumprido pena inclusive.

Ademais, nos últimos tempos tem se comportado de forma agressiva agindo com
violência contra a sua mãe, irmãos menores que com ele residem e até mesmo
contra terceiros. Quando não consegue adquirir drogas e/ou permanecer por breves
momentos em abstinência destrói os móveis da casa e ameaça seus familiares. E,
quando fora de casa, perturba os vizinhos, fazendo gestos obscenos, coagindo os
mesmos a lhe fornecerem alimentos, dinheiro e bebidas alcoólicas. Em razão deste
comportamento, sua mãe, ora requerente, seus irmãos e até os vizinhos vivem em
verdadeiro estado de pânico.

Na verdade, apesar deste quadro grave para sua saúde física e mental, bem como
para seu convívio em família e na própria sociedade, o interditando recusa-se a
aceitar qualquer proposta de auxílio clínico, tratamentos ou internações, fato este
provado através dos documentos anexos.

Malgrado todos os esforços, todas as vezes em que a família consegue levá-lo até o
único nosocômio desta Capital (CAPS Adauto Botelho) que atente doentes mentais
pelo SUS, o atendimento é limitado a internação breve para medicação de urgência,
de modo que o paciente recebe alta sem estar apto para o convívio familiar e social.
Tal situação tem redundado em verdadeira negativa de prestar a devida assistência
à saúde do doente mental, deixando-o aos cuidados exclusivos da família, mesmo
quando o tratamento domiciliar não se mostra adequado ou efetivo.

II – DOS DIREITOS

O reconhecimento de um direito pela norma jurídica de um Estado, especialmente


quando se trata de direito fundamental diretamente vinculado com a dignidade da
pessoa humana e com a própria vida, careceria de sentido se não fosse dado ao ser
humano igual direito a um provimento judicial que possibilitasse seu efetivo
cumprimento em caso de violação ou omissão; nesse sentido, o Sistema Justiça
assume relevante papel para a efetividade dos direitos reconhecidos pelo sistema
legal, e deve, por isso mesmo, atuar no sentido de dar a devida proteção ao cidadão
titular de tal direito, ainda mais quando se trata de pessoa em estado de
vulnerabilidade, como é o caso daqueles que necessitam se socorrer da via
judiciária para fazer valer seu direito constitucional à devida assistência a sua
saúde.

Ora, se a Constituição da República afirma que a saúde é direito de todos e dever do


Estado (art. 196 da CF), erigindo tal direito à categoria de direito social,
fundamental, inalienável e indisponível (Art. 6º da CF), é imperioso que tal
imposição legal implique em conseqüências práticas, sobretudo no que tange à sua
efetividade.

De fato, o art. 6º da Magna Carta garante o direito à saúde como postulado


fundamental da ordem social brasileira. Os arts. 196 a 200 trazem ínsitos os
devidos esclarecimentos quanto ao papel reservado ao Estado no que tange ao
direto de assistência à saúde, cabendo destacar que o art. 198 define o Sistema
Único de Saúde - SUS. É possível afirmar que se trata do principal direito
fundamental social albergado pela nossa Constituição.

Ademais disso, a nossa Constituição Brasileira tutela a "dignidade da pessoa


humana" (art.1º, III, C.F.) como princípio-mor do ordenamento jurídico pátrio, de
modo que a tutela do direito à saúde deve ser vista, também, sob a ótica de tal
princípio.

Não bastasse isto, tal direito encontra guarida na própria Declaração Universal da
Organização das Nações Unidas (ONU), de 1948, que declara expressamente que a
saúde e o bem-estar da humanidade são direitos fundamentais do ser humano. No
mesmo sentido, nas convenções e nos tratados internacionais, reconhecidos e
ratificados pelo Brasil, também são encontradas referências ao direito à saúde como
direito social fundamental.

Destaque-se ainda que os "Princípios para a Proteção de Pessoas Acometidas de


Transtomo Mental e para a Melhoria da Assistência à Saúde Mental" aprovados em
17.11.91, pela Organização das Nações Unidas, contemplam a questão em foco,
consagrando a necessidade do consentimento esclarecido (consentimento obtido
livremente, sem ameaças ou persuasão indevida, após esclarecimento apropriado
com as informações adequadas e inteligíveis) para a administração de qualquer
tratamento, admitindo, porém, entre poucas exceções, no caso da recusa irracional
do paciente em submeter-se ao tratamento, que o consentimento seja suprido por
um representante pessoal ou por uma autoridade independente, em ambas as
situações estando estes de posse das seguintes informações:

a) avaliação diagnóstica;

b) o propósito, método, duração estimada e benefício esperado do tratamento


proposto;

c) os modos alternativos de tratamento, inclusive aqueles menos invasivos;

d) possíveis dores ou desconfortos, riscos e efeitos colaterais do tratamento


proposto.

Também não se pode olvidar de que a lei 10.216/2001 assegura ampla proteção ao
doente mental, especialmente no que diz com o seu tratamento médico. Nesse
sentido, vejamos os principais dispositivos da referida lei, in verbis:
Art. 2o Nos atendimentos em saúde mental, de qualquer natureza, a pessoa e seus
familiares ou responsáveis serão formalmente cientificados dos direitos
enumerados no parágrafo único deste artigo.

Parágrafo único. São direitos da pessoa portadora de transtorno mental:

I - ter acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, consentâneo às suas


necessidades;

II - ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar


sua saúde, visando alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e
na comunidade;

(...)

V - ter direito à presença médica, em qualquer tempo, para esclarecer a necessidade


ou não de sua hospitalização involuntária;

Art. 3o É responsabilidade do Estado o desenvolvimento da política de saúde


mental, a assistência e a promoção de ações de saúde aos portadores de transtornos
mentais, com a devida participação da sociedade e da família, a qual será prestada
em estabelecimento de saúde mental, assim entendidas as instituições ou unidades
que ofereçam assistência em saúde aos portadores de transtornos mentais.

Art. 4o A internação, em qualquer de suas modalidades, só será indicada quando os


recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes.

§ 1o O tratamento visará, como finalidade permanente, a reinserção social do


paciente em seu meio.

§ 2o O tratamento em regime de internação será estruturado de forma a oferecer


assistência integral à pessoa portadora de transtornos mentais, incluindo serviços
médicos, de assistência social, psicológicos, ocupacionais, de lazer, e outros.

Art. 5o O paciente há longo tempo hospitalizado ou para o qual se caracterize


situação de grave dependência institucional, decorrente de seu quadro clínico ou de
ausência de suporte social, será objeto de política específica de alta planejada e
reabilitação psicossocial assistida, sob responsabilidade da autoridade sanitária
competente e supervisão de instância a ser definida pelo Poder Executivo,
assegurada a continuidade do tratamento, quando necessário.

Art. 6o A internação psiquiátrica somente será realizada mediante laudo médico


circunstanciado que caracterize os seus motivos.

Parágrafo único. São considerados os seguintes tipos de internação psiquiátrica:

I - internação voluntária: aquela que se dá com o consentimento do usuário;


II - internação involuntária: aquela que se dá sem o consentimento do usuário e a
pedido de terceiro; e

III - internação compulsória: aquela determinada pela Justiça.

(...)

Art. 9o A internação compulsória é determinada, de acordo com a legislação


vigente, pelo juiz competente, que levará em conta as condições de segurança do
estabelecimento, quanto à salvaguarda do paciente, dos demais internados e
funcionários.

IIII - DA COMPETÊNCIA DO JUIZO DE FAMILIA

No caso em apreço pede-se a medida protetiva ou autorização judicial para


internação involuntária do requerido em razão de sua atual incapacidade de
discernimento para atuar com autonomia de vontade; o requerido nega-se a se
submeter ao tratamento médico necessário para o restabelecimento de sua saúde
mental, embora não esteja munido de plena capacidade de tomar tal decisão.

Nesse sentido, vale consignar que o artigo 1.777 do Código Civil traz a
possibilidade/dever de se promover a internação do interdito em estabelecimento
adequado, até que haja recuperação de sua saúde mental que lhe permita voltar ao
convívio doméstico e social.

Também é importante asseverar que a profilaxia mental, a assistência e a proteção


à pessoa e aos bens dos psicopatas por doença mental, toxicomania ou intoxicação
habitual também encontra guarida no Decreto nº 24.559/34 e no Decreto-Lei nº
891/38.

O art. 32 do Decreto-Lei nº 891/38 estabelece que a competência para deliberar


sobre a internação é do “Juízo de Órfãos”, de modo que atualmente tal competência
é das Varas de Família.

Nesse sentido o Conflito de Competência nº 70007364599 - RS (3.12.03, Rel. Desª.


Maria Berenice Dias), “não há como negar que a demanda principal diz respeito à
capacidade da pessoa quando se busca, pela via da internação compulsória, sua
proteção”.

No mesmo TJRI, o Dr. Ney Wiedmann Neto, atuando na 6ª Câmara Cível, em


decisão monocrática (CC 70007999360, 20.1.04), sinalou que a ação que objetiva
internação compulsória perquire, direta ou indiretamente, com o estado ou
capacidade da pessoa. Em tais condições, considerando que o objetivo da demanda
diz com matéria afeta ao Direito de Família, manifesto-me pela declinação de
competência para uma das Câmaras integrantes do 4º Grupo Cível.

Quanto à possibilidade de internação compulsória ou involuntária, apontamos o


seguinte entendimento do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

TIPO DE PROCESSO: APELAÇÃO CÍVEL

NÚMERO: 70000301093

RELATOR: JOSÉ CARLOS TEIXEIRA GIORGIS

EMENTA: INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA DROGADITO. CABIMENTO. E


CABIVEL PEDIDO DE INTERNACAO DE ALCOOLISTA, QUE SE REVELA
VIOLENTO, DEVIDAMENTE ATESTADO POR MEDICO, QUANDO A FAMILIA
SEJA IMPOTENTE PARA FAZE-LO. APELO PROVIDO. (APELAÇÃO CÍVEL Nº
70000301093, SÉTIMA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS,
RELATOR: JOSÉ CARLOS TEIXEIRA GIORGIS, JULGADO EM 01/12/1999)

TRIBUNAL: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS

DATA DE JULGAMENTO: 01/12/1999

ÓRGÃO JULGADOR: SÉTIMA CÂMARA CÍVEL

COMARCA DE ORIGEM: SAPUCAIA DO SUL

SEÇÃO: CIVEL

REVISTA DE JURISPRUDÊNCIA: SEGREDO DE JUSTICA.

IV – DA TUTELA DE URGÊNCIA

A tutela de urgência tem o sentido de dar resposta rápida às situações ou demandas


com fundamento na urgência, como ocorre com as ações onde se busca a tutela do
direito à saúde.

Os requisitos para a antecipação, nestes casos, são a relevância do fundamento da


demanda e o receio de ineficácia do provimento final. Nesse sentido, o receio de
ineficácia relaciona-se mais diretamente ao perigo na demora na prestação
jurisdicional.

A gravidade da situação de saúde do Requerido, somado a sua recusa em se


submeter ao tratamento médico necessário exige providências imediatas. Diante
disso, se impõe a efetivação imediata da providência requerida, por meio de medida
judicial de urgência, autorizando a internação involuntária preferencialmente no
Hospital Adauto Botelho ou, não havendo vagas, em qualquer hospital da rede
pública de saúde, assim como a nomeação de curador especial para acompanhar a
presente ação e a internação involuntária.

V - DOS PEDIDOS

Diante do exposto pede tutela específica de urgência, liminarmente, no sentido de


autorizar e determinar, como medida protetiva de urgência, a internação
involuntária do requerido no Hospital Adauto Botelho (referência em tratamento
de transtornos mentais) ou, na hipótese de falta de vagas, em qualquer outro
Hospital da Rede Pública de Saúde ou Particular, por ser tal internação necessária
de acordo com recomendação médica. Finalmente pede a total procedência do
pedido, no sentido de autorizar, como medida protetiva, a internação do requerido
em local apropriado à realização do tratamento médico demandado, requerendo
ainda:

a) A gratuidade das custas processuais, nos termos da lei e da declaração de


hipossuficiente inclusa;

b) A nomeação de curador provisório para o requerido, especialmente para


acompanhamento da presente ação e da internação involuntária.

c) A notificação do Hospital Adauto Botelho quanto à autorização de internação


involuntária e para que tome as providências necessárias para tanto;

c) A citação do Requerido, para contestar a presente ação no prazo legal, sob pena
de revelia.

Finalmente requer a intimação pessoal do Defensor Público que oficia perante este
juízo para todos os termos e atos do processo (artigo 128, inciso I, da Lei
Complementar Federal 080/94 e art. 5º, parágrafo 5º, da Lei Federal nº 1060/50).

Protesta pela produção de todas as provas admitidas em direito, especialmente


pelos documentos inclusos e, se for necessário, realização de perícia médica. Atribui
à causa o valor de R$ 415,00 (quatrocentos e quinze reais).
Termos em que pede e espera deferimento.

Cuiabá – Mato Grosso, 23 de junho de 2010.

Carlos Gomes Brandão

Defensor Público do Estado

9ª Defensoria de Atendimento Especializada nos direitos relativos à saúde

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