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UNIVERSIDADE FEDERAL DE CAMPINA GRANDE

CCJS – CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS


UAD – UNIDADE ADMINISTRATIVA DE DIREITO

ANDRÉ LUIZ ANDRADE MENDES

ATIVIDADE REFERENTE AO 2º ESTÁGIO – EXERCÍCIOS DOMICILIARES


PROCEDIMENTOS DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA

Sousa
2019
Os Procedimentos de Jurisdição Voluntária (Capítulo XV do CPC/15)

1. Breve Introito

Dentre as divisões da jurisdição, a talvez mais clássica seja a divisão entre


jurisdição contenciosa e jurisdição voluntária. Esta última é de caráter excepcional
frente à diversidades de ações de jurisdição contenciosa, haja vista que, em regra
geral, o conflito de pretensões resistidas que foi judicializado é contencioso.

2. Da Natureza

Muito embora nomeada de voluntária a jurisdição, parcela considerável da


doutrina considera que, em verdade, não se trata de jurisdição, mas de administração
pública de interesses privados, cometida ao Poder Judiciário. Prevalece entre estes
doutrinadores a concepção de que na jurisdição voluntária, o estado-juiz não é
acionado para resolução de conflito de pretensões resistidas.

A doutrina mais moderna sobre a jurisdição voluntária a aponta como jurisdição


em sua plenitude, haja vista que administração é tutela de interesse público, enquanto
jurisdição voluntária tutela o interesse privado. Muito embora não sejam interesses
contrapostos entre atores processuais, são interesses insertos em situação
conflituosa, motriz de insatisfação que somente o poder judiciário pode solucionar.

3. Das diferenças entre a jurisdição voluntária e contenciosa

Algumas diferenças práticas marcam as distinções entre a jurisdição voluntária


e a jurisdição contenciosa. Diferentemente da jurisdição contenciosa, em que o juiz
decidirá o mérito que favorecerá um dos lados, fundamentando porque alguém tem
razão e o outro não, na jurisdição voluntária, requer-se ao juiz que adote as
providências necessárias para a tutela requerida por um ou mais sujeito da relação
processual.
A obtenção de uma determinação judicial, que vincule a parte derrotada ao
cumprimento de uma obrigação, é a finalidade primeira das ações de jurisdição
contenciosa. Por outro modo, na jurisdição voluntária a ação tem como objeto uma
situação de interesse privado do autor, ainda que litisconsortes ativos. Isto posto,
pode-se inferir que a sentença na jurisdição contenciosa favorece uma das partes e
desfavorece outra em razão do confronto de interesses, ao passo que na jurisdição
voluntária a sentença objetiva ser benéfica a todas os interessados.

4. Das Características da Jurisdição Voluntária

Os procedimentos de jurisdição voluntária são mais sumários do que processos


de jurisdição contenciosa. Em algumas situações, como abertura e cumprimento de
testamentos e arrecadação de herança jacente, o juiz pode iniciar o processo de ofício,
situação que configura a jurisdição voluntária como de aplicação mitigada do princípio
da demanda.

Nas ações de jurisdição voluntária, não há de se aplicar o princípio da


legalidade estrita, e pode adotar a solução que julgue mais adequada à situação posta,
conforme positivado no art. 723, parágrafo único, do Código de Processo Civil, in
verbis:

Art. 723. O juiz decidirá o pedido no prazo de 10 (dez) dias.


Parágrafo único. O juiz não é obrigado a observar critério de legalidade
estrita, podendo adotar em cada caso a solução que considerar mais
conveniente ou oportuna.

É característica marcante das sentenças de ações de jurisdição voluntária o


trânsito em julgado formal, não formando coisa julgada material. O trânsito em julgado
meramente formal permite que fatos supervenientes sejam capazes de modificar a
sentença. Ocorre em razão de modificação da realidade dos fatos pós-sentença, como
no caso de um interditando que, após trânsito em julgado da sentença que o submeteu
à curatela, tem evolução no quadro clínico ou situação responsável pela declaração
de sua incapacidade civil, poderá então pedir o levantamento da interdição.
5. Das Regras Gerais do Procedimento de Jurisdição Voluntária

A Seção I, do Capítulo XV do Código de Processo Civil versa sobre as


Disposições Gerais aplicáveis aos procedimentos de jurisdição voluntária, contanto
que inexista disposição em contrário em lei especial que a defina.

5.1 Da Legitimidade

À legitimidade, em geral, se aplicam as mesmas normas inerentes aos


procedimentos de jurisdição contenciosa, à exceção de procedimentos que podem ser
promovidos de ofício pelo juiz - como é o caso da abertura e cumprimento de
testamento e arredação de herança jacente, bens de ausentes ou coisas vagas - ou
Ministério Público, em casos de interdição, por exemplo.

5.2 Da Petição Inicial e Da Citação

Da mesma maneira como ocorre com as disposições sobre legitimidade, a


petição inicial deverá suprir os elementos indispensáveis contidos no art. 319 do
Código de Processo Civil. O autor deverá informar com precisão sobre o que pretende
e informar os fundamentos que lastreiam o direito reclamado. Deverá ainda, o autor,
atribuir o correto valor da causa relativa ao teor econômico do direito reclamado.

A citação ocorrerá tal como se dá no procedimento comum, previstos no art.


721 do Código de Processo Civil, Os emolumentos do processo judicial devem ser
adiantas pelo requerente e rateadas entre os demais interessados.

5.3 Da Intervenção do Ministério Público

A intervenção do parquet não deve ser desarrazoada, devendo ser manifesta


quando hipótese contida no art. 178 do Código de Processo Civil ocorra, situação em
que deve manifestar-se em quinze dias. Assim sendo, o Ministério Público não deve
intervir em todos os procedimentos de jurisdição voluntária.

5.4 Da Resposta à Ação

Ainda que inexistente o conceito de lide na ação, enquanto confronto de


interesses resistidos, o interessado do pólo passivo deve ser citado para apresentar
resposta à ação, no prazo de quinze dias.
Não é necessariamente adequada a definição da resposta do réu como sendo
uma contestação, haja vista a não litigiosidade que se pressupõe, ao menos
teoricamente, as ações de jurisdição voluntária, não haveria na contestação um teor
belicoso com o fito de destituir as alegações autorais.

Na resposta à ação, o réu poderá invocar as preliminares que julgar adequadas,


previstas no art. 337 do Código de Processo Civil, à exceção de temas inerentes à
convenção de arbitragem, por serem incabíveis em ações de jurisdição voluntária. As
preliminares mantêm sua força tal qual no procedimento comum, tendo capacidade
de extinguirem o processo sem exame de mérito.

O Réu poderá discutir o mérito e a pretensão manifestada pelo autor. Caso


abstenha-se de responder à ação, será revel, mas sua revelia possui efeitos
mitigados, haja vista o supramencionado princípio da não observação compulsória da
legalidade estrita. A reconvenção não se aplica ao regime de jurisdição voluntária.

5.5 Da instrução e da sentença

As ações de jurisdição voluntária possuem procedimento concentrado, de forma


que após a resposta do réu, tendo replicado o autor sobre as preliminares aventadas
e fatos trazidos na resposta, o magistrado deverá determinar a produção de provas
que julgue necessárias, ex officio ou sob iniciativa dos interessados, optando ou não
por audiência de instrução e julgamento.

O juiz poderá prolatar a sentença na própria audiência ou em até dez dias após
esta. A sentença possui estruturação simples, com relatório do processo,
fundamentação e dispositivo. Como o princípio da legalidade estrita é de aplicação
mitigada, o juiz poderá dar a solução que melhor lhe convier e fundamentar.

Como já mencionado, não forma coisa julgada material, de forma que a sentença
transita em julgado de maneira meramente formal, de forma que fatos supervenientes
podem mudar posteriormente o teor do decisum.

5.6 Dos Recursos

Os recursos contra decisões exaradas em ações de jurisdição voluntária não


possuem diferenciação quanto aos recursos do procedimento comum. O recurso
cabível contra decisão interlocutória será o agravo de instrumento, conforme rol
taxativo do art. 1.015 do Código de Processo Civil. Da sentença caberá apelação. O
interessado inconformado com alguma omissão, contradição, obscuridade ou erro
material, poderá opor Embargos de Declaração.

6. Dos pedidos somente tramitáveis por procedimento de jurisdição


voluntária

O Código de Processo Civil, em seu artigo 725, positiva rol de pedidos


submetidos aos ditames do regime de jurisdição voluntária, in verbis:

Art. 725. Processar-se-á na forma estabelecida nesta Seção o pedido


de:
I - emancipação;
II - sub-rogação;
III - alienação, arrendamento ou oneração de bens de crianças ou
adolescentes, de órfãos e de interditos;
IV - alienação, locação e administração da coisa comum;
V - alienação de quinhão em coisa comum;
VI - extinção de usufruto, quando não decorrer da morte do usufrutuário,
do termo da sua duração ou da consolidação, e de fideicomisso, quando
decorrer de renúncia ou quando ocorrer antes do evento que caracterizar
a condição resolutória;
VII - expedição de alvará judicial;
VIII - homologação de autocomposição extrajudicial, de qualquer
natureza ou valor.
Parágrafo único. As normas desta Seção aplicam-se, no que couber,
aos procedimentos regulados nas seções seguintes.

A listagem acima não configura um rol taxativo, sendo admitidas outras


modalidades de ação de jurisdição voluntária, como a ação de suprimento de
consentimento para o casamento, ação de suprimento judicial de outorgar uxória,
dentre outros.
7. DOS PROCEDIMENTOS ESPECÍFICOS DE JURISDIÇÃO
VOLUNTÁRIA

7.1 Das ações consensuais de divórcio, separação judicial, extinção de


união estável e alteração de regime de bens do casamento.

Nos artigos 693 e seguintes e 731 e seguintes, o Novo Código de Processo


Civil trouxe a resposta para a dúvida que desde 2010 permeou as doutrinas jurídicas.
Teria a ação de separação judicial sido extinta quando da edição da Emenda à
Constituição nº 66/10? Conforme a primeira oração, não.

A separação consensual é via adequada para pôr fim à sociedade conjugal de


duas pessoas em comum acordo, sem a dissolução do casamento. Muito embora
sejam extintas as obrigações conjugais, o separando não pode contrair novas núpcias,
relegando à morte ou ao divórcio o papel de dissolver o casamento.
Os interessados devem apresentar acordo com termos definidos entre si, sem
atribuição de culpa mutuamente, ou indicação de motivo da separação. Difere-se,
pois, da separação litigiosa, em que um dos separandos atribui as falhas e culpa pelo
fim da relação ao outro.
O direito de ação é de titularidade exclusiva, pessoal e intransferível. A morte
de um dos interessados impõe a extinção do processo, não se transmitindo sua
titularidade aos herdeiros. A morte põe fim ao casamento, razão que faz perder o
objeto da separação.
Os procedimentos de separação consensual, divórcio consensual, com vistas
à dissolução do matrimônio, reconhecimento e extinção consensual de união estável
e alteração de regimes de bens estão previstos a partir do artigo 731 e seguintes do
Código de Processo Civil, e devem observar o procedimento do regime de jurisdição
voluntária.

7.1.2 Dos Requisitos

A homologação da minuta do acordo da separação, divórcio, reconhecimento


e extinção de união estável e alteração de regime de bens demanda que o
consentimento seja manifestado livremente por ambos os cônjuges. Que ambos
estejam em comum acordo sobre o fim do matrimônio, da sociedade conjugal, da
união estável ou sobre a alteração de regime e que o acordo preserve os interesses
dos filhos menores e dos cônjuges.

7.1.3 Procedimento do Divórcio e Separação Consensuais e da extinção


da união estável requerida em juízo

7.1.3.1 Petição Inicial

A exordial deve ter seus pedidos formulados em comum acordo por ambos os
cônjuges ou companheiro. A não assinatura de ambos na petição implicará
reconhecimento de discordância e a separação consensual não procederá.

A peça vestibular deve indicar os bens sujeitos à partilha comuns do casal, a


forma da partilha, as disposições de guarda dos filhos menores, o valor necessário a
título de alimentos para manutenção da prole ou do separando incapaz de se
sustentar. Indicará a manutenção ou alteração do nome de casada da separanda, de
forma que a não manifestação implica presunção de manutenção do nome.

A não manifestação não implica em irreversível impossibilidade de voltar ao


uso de nome de solteira, de forma que a única cláusula que se admite alteração
unilateral é sobre o uso do nome de solteira ou casada.

A exordial deverá ser instruída pela certidão de casamento, pacto antenupcial,


caso haja, bem como certidões de nascimento dos filhos e títulos que comprovem
propriedade.

Se a petição inicial estiver perfeita, havendo manifestação do Ministério Público


para resguardo de eventuais direitos de incapazes, e não havendo pendências a
serem saneadas, o juiz deverá homologar os pedidos do acordo e decretar o fim da
sociedade conjugal, ou o divórcio, reconhecimento e extinção da união estável, sem
que seja realizada qualquer audiência de conciliação e mediação.

Caso o juiz negue-se à homologação por não verificar o preenchimento de


todos os requisitos, caberá o aditamento ou apelação.

7.2 – Da Alteração do regime de bens do casamento

É lícita conforme o art. 1.639 do Código Civil e deve conter pedido formulado
em comum acordo com ambos os conjugues. É necessária a fundamentação exigida
pelo Código Civil e preservar-se-á direitos de terceiros.
Assim que recebida a ação, o juiz instará o Ministério Publico a se manifestar e
determinará afixação de edital que torne pública a pretensão dos interessados. Após
30 dias de publicação em edital, deverá o juiz decidir. A sentença transitada em
julgado deverá ser averbada no Registro Civil e de Imóveis, e caso sejam os
interessados empresários, no Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades
Afins.

7.3 DA INTERDIÇÃO

Quando acometidas de situações que retirem da pessoa o pleno discernimento


para a prática dos atos civis cotidianos, deverá ser submetida à curatela por meio de
ação de interdição.
As causas que permitem a nomeação de curador para pessoa com declarada
incapacidade civil são elencadas no artigo 4º do Código Civil, com a redação dada
pela mesma lei instituidora do Código de Processo Civil.
7.3.1 Procedimento
A declaração da incapacidade para prática de atos para a vida civil é o objetivo
da ação de interdição. Após a promulgação do estatuto da pessoa com deficiência, a
incapacidade declarada será a de efeitos relativos, preservando-se parte dos direitos
de esfera pessoal, excluindo-se direitos patrimoniais.
O juiz determinará a juntada de documentos médicos suficientes à
comprovação da incapacidade, ou ainda determinará perícia médica para aferição.
O interditando será citado a responder à ação, onde pode negar incapacidade
física e arguir preliminares.
O órgão de saúde do tribunal deve exarar parecer multidisciplinar para afirmar
ou refutar a incapacidade.
O juiz designará audiência de interrogatório pessoal ao interditando, caso não
possa este último comparecer, deverá o juiz acompanhado do escrivão realizar a
audiência in loco, onde o interditando estiver.
A sentença declaratória da interdição fixará a maneira como dar-se-á a curatela
de um responsável sobre o curatelado.
A competência é a do foro do interditando, sendo competência relativa. A vara
de família, caso haja, será a responsável por processar e julgar a demanda, caso não
haja, a vara comum.
A legitimidade é do cônjuge, companheiro, parentes ou tutores, representantes
de entidade onde se encontra abrigado o interditando e o próprio Ministério Público,
vide artigo 747 do Código de Processo Civil.
A petição deverá preencher os requisitos do artigo 318 do Código de Processo
Civil, fazendo prova de legitimidade, existência de doença ou situação incapacitante
e laudo médico competente.
Em quinze dias após a entrevista, poderá o interditando impugnar a ação, caso
em que será constituído curador especial.
7.4 Levantamento da Interdição
O interditando poderá requerer o levantamento da interdição caso demonstre
que esta cessada a causa da incapacidade. Ele é legítimo a formular o pedido em
nome próprio, assim como seu curador e o parquet. Novamente equipe multidisciplinar
vai exarar parecer médico psiquiátrico e o Ministério Público dará seu parecer final,
pelo deferimento ou não do pleito.
Com o trânsito em julgado da sentença que levantou a interdição, conforme art.
755, proceder-se-á com a averbação devida no Registro de Pessoas Naturais.
Referências Bibliográficas

GONÇALVES, Marcus Vinícius Rios. Direito Processual Civil Esquematizado: 9. ed.


São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil – Volume


único: 8. ed. Salvador: JusPodivm, 2016.

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