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LEBRUN, G. A filosofia e sua história. São Paulo: Cosacnaify, 2006.

“Reconhecemos a obra de arte pelo fato de que nenhuma ideia que ela suscita em nós,
nenhum ato que ela nos sugere pode esgotá-la ou concluí-la [...] e não há lembrança,
pensamento ou ação que possa anular-lhe o efeito ou libertar-nos inteiramente do seu
poder.” (VALÉRY apud LEBRUN, G. A filosofia e sua história. São Paulo: Cosacnaify,
2006, p. 327)

“A aura designa o fato de que a coisa se dá como enigmática o bastante para que
nenhuma contemplação possa esgotar sua significação.” (LEBRUN, G. A filosofia e sua
história. São Paulo: Cosacnaify, 2006, p. 327)

“Habermas mostrou bem, no seu livro a Mudança estrutural da esfera pública, como os
concertos abertos a um público pagante, os museus, as exposições (coisas que, hoje, nos
parecem tão óbvias) foram, no século XVIII, conquistas políticas da burguesia. E esta
observação vai muito além da sociologia da arte: diz respeito à própria essência da obra
de arte. Não se pinta para o mercado como se pintava para um mecenas. Não se concebe
o centro Beaubourg como se concebia um castelo de recreação do reia. As palavras
‘pintura’, ‘arquitetura’, ‘decoração’ podem permanecer, mas não se trata mais od
mesmo tipo de produção.” (LEBRUN, G. A filosofia e sua história. São Paulo:
Cosacnaify, 2006, p. 329)

“tal preocupação (tantas vezes de origem comercial) de exibir e divulgar é incompatível


com a conservação do halo religioso, com a manutenção da aura.” (LEBRUN, G. A
filosofia e sua história. São Paulo: Cosacnaify, 2006, p. 329)

“A obra não é mais um hic et nunc que se deve visitar no seu antro, experimentar no seu
ambiente. O modelo do objeto único oferecido num único lugar (‘Ame o que nunca
serávisto duas vezes’) é substituído pelo da partitura musical, que pode ser executada
por uma infinidade de orquestras. Omodelo do ‘monstro sagrado’ que era preciso ver,
pelo menos uma vez, ‘em carne e osso’, no palco, é substituído pelo da imagem fílmica,
espalhada em mil cópias. Como, nessas condições, poderia continuar funcionando o
critério da autenticidade? Mas com isso, acrescenta Walter Benjamin, ‘toda função da
arte é subvertida’. A arte, por princípio, não é mais uma forma da cultura que nos
convoca à contemplação e ao recolhimento. Isso é o sinal da sua degenerescência? Isso
quer dizer que nossa época, ‘materialista’ e ‘tecnicista’, só poderia deixar eclodir uma
arte de diversão, completada por algumas elucubrações de estetas?” (LEBRUN, G. A
filosofia e sua história. São Paulo: Cosacnaify, 2006, p. 330)

“a arte, como era compreendida por nossos ancestrais, é coisa que não existe mais. Está
sendo substituída por outra coisa, que pode continuar com o mesmo nome, mas não tem
mais nada em comum com ela quanto ao referente.” (LEBRUN, G. A filosofia e sua
história. São Paulo: Cosacnaify, 2006, p. 331)

“É fato que a arte não garante mais esta satisfação das necessidades espirituais que
outros tempos buscaram nela, e que outros povos só encontraram nela [...] Os belos dias
da arte grega e a Idade de Ouro da Baixa Idade Média se foram. Hoje, a cultura
reflexiva da nossa vida é tal [...] que são as formas universais, as leis, os deveres, os
direitos, as máximas que valem como motivos e têm preponderância. [...] A arte é para
nós, quanto à destinação suprema, coisa do passado. [...] Tudo o que ela tinha de
autenticamente verdadeiro e vivo se perdeu para nós e, em vez de afirmar a sua
necessidade no reale ocupar neste o lugar mais alto, agora é apenas algo relegado à
nossa representação.” (HEGEL apud LEBRUN, p. 331)

“É Kant que, em 1790, determina o caráter ‘estético’ de um objeto pelo fato de ser este
capaz de dar-me, quando o percebo, um prazer puro, isto é, um prazer independente de
qualquer motivação interessada (ideológica, utilitária, erótica etc.). A partir desse
momento, a obra de arte enquanto tal ganha um estatuto. A palavra designa um produto
que é destinado a gerar, no receptor, um prazer puro, ou ainda: a ser contemplado.”
(LEBRUN, G. A filosofia e sua história. São Paulo: Cosacnaify, 2006, p. 332)

“No quadro de um mestre holandês, não é a exata reprodução dos objetos que nos
agrada: é que ‘a magia da cor e da iluminação’ transfigura | as pobres coisas naturais
que são apresentadas; é que as cenas prosaicas de quermesses e bebedeiras são
metamorfoseadas num ‘domingo da vida’; é que a ‘bela aparência’ torna fascinante o
que, na vida, nos deixava indiferentes. Assim, a representação artística é, à sua maneira,
uma negação sorrateira do sensível: ante nossos olhos, o sensível torna-se aquilo que ele
não é. Mas, é claro, é sempre ante nossos olhos que se efetua essa transmutação; é
sempre no sensível que a arte critica o sensível — e, porque a obra de arte de apresenta
necessariamente numa matéria sensível, ela não pode ser ‘o modo de expressão mais
elevado da verdade’. O fato de a obra de arte se dirigir à aísthesis constitui, para Hegel,
tanto a sua essência como a sua limitação.” (LEBRUN, G. A filosofia e sua história. São
Paulo: Cosacnaify, 2006, p. 332-333)

“observemos que Nietzsche entreviu tal possibilidade ao falar do ‘empobrecimento


sensual da grande arte’. Nossos sentidos, diz, se intelectualizaram; indagam ‘o que isso
significa, e não mais o que isso é’.” (LEBRUN, G. A filosofia e sua história. São Paulo:
Cosacnaify, 2006, p. 334)

“Basta pensar nessas queixas perpétuas, contra a rapidez da vida moderna, ou a


nocividade desses anestésicos barulhentos que seriam — ao que parece — os meios de
informação; contra todas essas coisas que impediriam o espírito de recolher-se.”
(LEBRUN, G. A filosofia e sua história. São Paulo: Cosacnaify, 2006, p. 335)

“Quando utilizamos um instrumento, não o visamos como um objeto útil: simplesmente


nos servimos dele, sem pensar muito — executando os gestos que ele exige de nós,
fazendo-o dar o desempenho que esperamos dele. Igualmente, quando leio um livro, não
tenho consciência de estar diante de um objeto, assim como não tenho consciência
clara, quando escrevo, de estar diante da máquina, assim como o pianista experiente não
tem consciência clara de ‘estar ao piano’. Esses instrumentos (no caso: esses sistemas de
signos) apagam-se na sua utilização — e só readquirem sua independência quando
deixam de funcionar.
Ora, a presença específica de uma obra de arte (tema de tantas meditações
filosóficas) não viria do fato de que essa obra, antes de mais nada, se dá como um guia
que se oferece ao usuário? E a sua originalidade ontológica não se deve ao fato de nós a
praticarmos bem depressa, como um instrumento que nos é familiar? A obra de arte não
seria, antes de mais nada, algo a utilizar?” (LEBRUN, G. A filosofia e sua história. São
Paulo: Cosacnaify, 2006, p. 335)
“o cinema e a televisão só constituem verdadeiramente espetáculos para o filmólogo,
que faz projetar várias vezes o mesmo filme e o estuda enquanto um objeto. Mas, para o
usuário, as imagens não aparecem enquanto imagens (a não ser que o filme seja
enfadonho): ele as vive como veículos de informação. E é por isso que a parte essencial
do trabalho fílmico é a montagem, que regula o ritmo segundo o qual é passada a
informação.” (LEBRUN, G. A filosofia e sua história. São Paulo: Cosacnaify, 2006, p.
336)

“A maior parte do tempo, uma imagem nos interessa porque indica alguma coisa que
não está na imagem: pelo que nos deixa adivinhar, ou pelo que continua a ocultar.
Somos muito mais os detetives do sensível que os seus voyeurs, Platão dizia que a
contemplação das imagens nos distrai da contemplação das Ideias.” (LEBRUN, G. A
filosofia e sua história. São Paulo: Cosacnaify, 2006, p. 336)

“Pierre Francastel recorda-nos que, ‘durante muito tempo, leram-se os textos em voz
alta, mesmo a sós. Pode-se pretender que uma sociedade em que todas as crianças
aprendem a ler com os olhos conserve o mesmo sistema figurativo da Idade Média e dos
Tempos Modernos?’ Essa reflexão é rica de prolongamentos. O que dizer então de uma
sociedade em que as crianças, para dar só um exemplo, sentem a velocidade a partir da
experiência dos bólidos e dos jatos?” (LEBRUN, G. A filosofia e sua história. São
Paulo: Cosacnaify, 2006, p. 339)

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