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FCT. Ciências Biológicas. 4º Ano, 2019-2020. Ética e Deontologia Profissional.

Sobre
as Origens, Evolução e os Significados da Bioética.

“Primeiro aprende o significado do que dizes, depois diz”. Epictetus (55-135 d.C.), filósofo estóico.

Texto 1: “Após seis décadas de observação, proclamo que a bioética global, como uma nova ciência da
ética, é uma necessidade para a sobrevivência humana a longo prazo (...) Mas antes da bioética global
surgiu a bioética ponte (Cf. POTTER, V. R. Bridge Bioethics, 1971). A “bioética ponte” é o símbolo para
a visão que cristalizei com a palavra “bioética”, quando a cunhei em 1970. Esta visão é captada ao colocar
juntas as palavras “ponte” e “bioética”. A palavra “ponte” é usada porque a bioética era vista como uma
nova disciplina que construiria uma ponte entre a ciência biológica e a ética, portanto, bioética. Essa ponte
era somente um meio para um fim. O fim era... construir a bioética como uma outra ponte, como uma ponte
para o futuro (...) Penso a bioética ponte dessa maneira: (a) Função primordial: bioética como uma ponte
para o futuro; b) Função capacitadora: bioética como uma ponte entre as várias diciplinas. (in, POTTER,
Van Rensselaer (1998). Biética Global e Sobrevivência Humana, IV Congresso Mundial da Bioética, 4-5
Novembro, Tóquio, pp.1-2).

Texto 2: “A bioética, vocábulo inventado, em 1970, pelo cancerólogo americano V. R. Potter para exprimir
o processo para a sobrevivência humana e o “bem-estar” num meio natural graças ao progresso, utilizou,
com a ética, multíplas definições e controvérsias ainda atuais”. (in, REDE EUROPEIA, Medicina e
Direitos do Homem. (2001). A Saúde face aos Direitos do Homem à Ética e às Morais, trad. de Mª T. Serpa.
Lisboa: I. Piaget, p. 32).

Texto 3: “A palavra «bioética» designa um conjunto de investigações, de discursos (monografias, teses,


artigos, obras...) e de práticas (Comissões, Conselhos, função, profissão, conhecimentos especializados),
geralmente pluridisciplinares (Medicina, Biologia, com as suas múltiplas especializações, Sociologia,
Psicologia, Ciência Política, Psicanálise, Ética, Direito, Filosofia, Teologia...), tendo como objecto
clarificar ou resolver questões de alcance ético suscitadas pelo avanço e a aplicação das tecnociências
biomédicas”. (HOTTOIS, G. e MISSA, J-N. (2003). Nova Enciclopédia da Bioética. Medicina, Ambiente e
Biotecnologia, trad. de Maria Vcarvalho. Lisboa: I. Piaget, p. 109).

Texto 4: “O termo bioética é de uso recente. Nascido no ambiente anglosaxão, encontrou um favorável
acolhimento das restantes áreas linguísticas (...) A composição de raíz grega alude a duas realidades de
notáveis significações: bios (vida) e ethos (ética). O propósito geral da bioética é captar a adequada
«composição» entre essas duas realidades de vida e da ética: uma composição, que não seja meramente
justaposição, mas autêntica intereração – que serve – no sentido de Potter, das ciências biógicas para
melhorar a vida humana”. (VIDAL. M. (1994). Bioética. Estudos de Bioética Racional. Madrid: Tecnos, p. 15).

Texto 5: “Bioética é uma palavra etimologicamente formada por dois étimos gregos: bio(s) e ethike. A esse
neologismo foi imputada uma tríplice paternidade e um triplo local de nascimento: Van Rensselaer Potter
em Wisconsin; Shriver e Hellegers, em Washington; e Fritz Jahr, em Halle an der Saale (Alemanha). Potter
se preocupava, em princípio, com o meio ambiente e a sustentabilidade da vida humana no planeta; o grupo
de Washington, principalmente com os problemas e desafios éticos impostos à Medicina pelas novas
tecnologias; e Fritz Jahr, com as relações éticas dos humanos com animais e plantas. A Bioética nasce
trazendo na memória os experimentos desumanos realizados em pessoas vulneráveis durante a Segunda
Guerra Mundial e cresce lado a lado com um grande desenvolvimento científico e tecnológico. Essa mesma
tecnologia que aumenta as potencialidades da Medicina traz consigo sérios desafios de ordem moral que a
ética hipocrática tradicional tem dificuldades de responder. Tudo isso acontecendo ao mesmo tempo em que
pessoas lutam também por mais autonomia e direitos. Refletir sobre esse contexto e identificar as melhores
alternativas de conduta é um dos papeis da Bioética (...) O estudo etimológico revela que a Bioética é
formada por dois étimos gregos: bio(s) – utilizado inicialmente no sentido de vida humana e, mais tarde,
por extensão, aplicado a todos os seres vivos; e ethike – significando ética (...)
Atribui-se a Van Rensselaer Potter, bioquímico e oncologista americano que trabalhou na Faculdade de
Medicina da Universidade de Wisconsin, a criação do termo Bioética. Ele aparece inicialmente no artigo
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FCT. Ciências Biológicas. 4º Ano, 2019-2020. Ética e Deontologia Profissional. Sobre
as Origens, Evolução e os Significados da Bioética.
“Bioethics, the Science of Survival”, publicado em 1970, na revista Perspectives in Biology and Medicine
(1970; 14: 127-153), e, posteriormente, no seu livro Bioethics: Bridge to the Future, publicado em 1971.
São publicações que expressam grande preocupação de Potter: o conhecimento científico crescendo
exponencialmente, sem se acompanhar de adequada reflexão sobre o seu uso e possíveis consequências
para a sobrevivência do homem. Na tradução de Ferrer e Álvares, lê-se textualmente:
Há duas culturas – ciências e humanidades – que parecem incapazes de falar uma com a outra
e, se esta é parte da razão de o futuro da humanidade ser incerto, então possivelmente
poderíamos fabricar uma ponte para o futuro, construindo a disciplina da Bioética como a ponte
entre essas duas culturas. Os valores éticos não podem ser separados dos valores biológicos. A
humanidade necessita urgentemente de uma nova sabedoria que lhe proporcione o entendimento
de como usar o conhecimento para a sobrevivência do homem e a melhoria da qualidade de
vida. Para Potter, a Bioética combina então conhecimentos biológicos (bios) com um sistema
de valores humanos (ética). (Daí, a ideia da Bioética Global desenvolvida por V. R. Potter
(1998) no texto Bioética Global, Construindo sobre a Herança de Aldo Leopold).

Há uma segunda paternidade, não pela originalidade do termo, mas pela ênfase em um sentido específico.
Bioética como uma reflexão mais voltada para a análise dos problemas relacionados ao desenvolvimento
da Biomedicina. Ela teria surgido também em 1970 e de modo independente numa conversa envolvendo,
entre outros, Sargent Shriver, marido de Eunice Kennedy Shriver, e André Hellegers, obstetra holandês,
sobre a possibilidade de a Fundação Joseph P. Kennedy Jr. patrocinar, na Universidade de Georgetown,
um instituto voltado para o estudo dos aspectos religiosos e éticos dos avanços nas ciências biológicas,
aplicando aos dilemas médicos o raciocínio da filosofia moral. A partir dessas conversas, criam, em 1971, o
The Joseph and Rose Kennedy Institute for the Study of Human Reproduction and Bioethcis, hoje
conhecido como Kennedy Institute of Ethics. É a primeira vez que a palavra bioética vai figurar como
nome de uma instituição.
O terceiro lugar de origem da palavra bioética, Halle an der Saale, Alemanha, veio à luz em uma
conferência em 1997, por Rolf Lother, e vem sendo gradualmente investigado. Nesse caso, a fonte que cita
a palavra bioética é um editorial da Revista Kosmos, de 1927. Seu autor é o alemão Fritz Jahr (1895 –
1953), filósofo, educador e pastor protestante. O artigo original foi traduzido para o português sob o título:
“Bioética – revendo as relações éticas dos seres humanos com os animais e plantas” e pode ser
encontrado nos anais do VIII Congresso Internacional de Bioética Clínica, realizado em maio de 2012 na
cidade de São Paulo. Numa analogia a Kant, Fritz Jahr propõe um imperativo bioético: Respeite cada ser
vivo por questão de princípio e trate-o, sempre que possível, como tal. Se Immanuel Kant formulou seu
imperativo categórico baseado na dignidade do ser humano, Fritz Jahr fundamenta o seu na compaixão.
Rincic e Muzur comentam algo aparentemente paradoxal acontecendo simultaneamente: ao mesmo tempo
em que Jahr advoga a extensão do imperativo categórico de Kant também para os animais e plantas, o
Nazismo, na Alemanha, o restringe aos arianos, em detrimento dos demais. Albert Jonsen, no seu livro The
Birth of Bioethics, considera que o neologismo bioética ganha status canônico em 1974, quando é
catalogado e colocado como termo de entrada na Livraria do Congresso Americano. A justificativa para
essa entrada teria sido o artigo Bioethics as a Discipline, de Daniel Callahan (filósofo e um dos fundadores
do The Hustings Center: Institute of Society, Ethics and Life Sciences, juntamente com o psiquíatra W.
Gaylin em 1969), publicado em 1973 no primeiro número do Hastings Center Studies. Lavra-se assim,
oficialmente, a certidão de nascimento da palavra bioética”. (in LOPES, J. A. (2014). Bioética – uma breve
história: de Nuremberg (1947) a Belmont (1979), Revista Médica de Minas Gerais, 2014, nº 24 (2), pp. 262-273).

Texto 6: “A Bioética é o “estudo sistemático das dimensões morais (incluindo a visão, decisão, conduta e
normas morais) das ciências da vida.”. (POST, Stephen G. (1995). Enciclopedia of Bioethics, p. XXI).

Questões para discussão: (1) Como e porquê surgiu a Bioética? (2) O que distingue e aproxima as ideias de
bioética de Potter, S. Shriver/ A. Hellegers e Friz Jahr? (3) Que princípios éticos e valores devem nortear a
bioética? (4) Quais são as competências da bioética? (5) Quais são as raízes remotas e recentes da bioética?
(6) Quais foram/são as instituições mundiais mais importantes da bioética? (7) Quais são, para si, os
princípios éticos mais relevantes da Declaração Universal sobre a Bioética e Direitos Humanos (2005)?
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