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Transcendendo as galáxias e o plano Absoluto de näo-diferenciaçäo, a Alma Suprema

venerada em inúmeros planetas de Vaikuntha. Ela penetra e permeia o cosmos como


controladora suprema e habita no coraçäo de todos, como o eterno bem-querente, testemunha e
orientador. Acima de Vaikuntha, o Senhor aparece em Ayodhya como Sri Ramachandra, e mais
acima ainda fica a morada de Dvaraka onde o Senhor Krishna visto em roupas e humor régios.
Mas ultrapassando a majestade do Senhor Absoluto, a forma mais original de Deus Krishna -
a Realidade do Belo, o vaqueirinho transcendental de Vrindavana. Ali, Ele o filho de Nanda
e Yasoda, e Ele o amado das mocinhas lideradas por Srimati Radharani.

Krishna o oceano de harmonia - a encarnaçäo do êxtase divino. Ecoando at este plano, a doce
cançäo da flauta de Krishna revela Seus passatempos sagrados na Terra. O Senhor do amor com
olhos de lótus estendeu Seu raio at ao campo de batalha. Como o amigo transcendental de
Dvaraka de Arjuna, Ele (o Senhor, conhecido como Bhagavan) entoa Sua divina cançäo (ou
"Gita", por isso Bhagavad-gita), revelando o significado oculto de todas escrituras.

Os Upanishads säo uma vaca;


o vaqueirinho Sri Krishna,
Arjuna o bezerro
que bebe o néctar original;
o leite o néctar
do Bhagavad-gita,
e todos devotos puros
bebem da doçura deste tesouro.
Glórias do Gita, 6

Assim, o Tesouro Oculto do Doce Absoluto a chave de ouro para a senda do amor divino
conforme retratada no Maha-purana, Srimad Bhagavatam, que saboreado pelos devotos
paramahamsa do Senhor.

devam divya-tanum suchanda-vadanam balarka-celancitam


sandrananda-puram sad-eka-varanam vairagya-vidyabudhim
sri-sriddhanta-nidhim subhakti-lasitam sarasvatanam-varam
vande tam subhadam mad-eka-saranam, nyasisvaram sridharam

1
Sri G.S. Vidyaranjan

Caio aos pés de Srila Sridhara Deva,


cuja encantadora expressäo canta suas cançöes de doce néctar.
Vestido com finas roupas como o sol recém-nascido,
ele o verdadeiro santo, escolhido pelos devotos.
Seu desapego e conhecimento säo assim como um oceano,
tesoureiro da conclusäo completa, perfeita.
Radiante nos passatempos de devoçäo amorosa,
morada do puro êxtase, doador da boa fortuna;
principal seguidor fiel de Sri Bhaktisiddhanta,
grande general principal de toda ordem renunciada,
meu senhor e meu mestre, meu único refúgio,
adoro seus pés, Srila Sridhara Deva.

Sua Divina Graça Srila Bhakti Raksaka Sridhara Deva Goswami Maharaja (fundador-
acharya do Sri Chaitanya Saraswat Math) um mestre asceta veterano na sucessäo divina do
Senhor Sri Chaitanya Mahaprabhu. Sua singular versäo do puro pensamento Vaisnava
forma a síntese das verdades ontológicas mais elevadas. Seu divino fluir de contínua
retórica espiritual evidencia seu tesouro de experiência devocional, escritural e prática.
Sua representaçäo dinâmica corrobora a presença viva do Supremo Autocrata, Sri
Krishna, como a fonte de todo êxtase transcendental e o Objetivo Supremo do mundo
consciente. Assim, devido a seu profundo fundamento filosófico, tradicional e devocional,
por unanimidade Srila Sridhara Maharaja tem sido declarado o maior mestre e autoridade
entre todos seus colegas na escola de nobres, eruditas personalidades e grandes almas.

Sua Divina Graça um autor prolífico e comentador da literatura devocional pura, e compôs
inúmeras oraçöes devocionais exclusivas, versos, e cançöes em sânscrito e bengali. Devido
a sua pureza dentro da linha de Srila Rupa Goswami, recebeu de seu mestre espiritual, Srila
Bhaktisiddhanta Saraswati Goswami Thakura Prabhupada, o título de "Bhakti Raksaka"
(guardiäo da devoçäo).

INVOCAÇÄO

om parthaya pratibodhitam bhagavata narayanena svayam

2
vyasena grathitam purana munina madhye maha-bharate
advaitamrta-varsinim bhagavatim astadasadhyayinim
amba! tvam anusandadhami bhagavad-gite bhavad-vesinim

Meditaçäo no Sri Gita


" Bhagavad-gita, cantado pelo próprio Senhor Supremo, concedeste a iluminaçäo a Arjuna.
Foste incluído na escritura Mahabharata de Sri Vedavyasa, o escritor dos Puranas. Em
seus dezoito capítulos, és a chuva de néctar que flue infinitamente, e a todo-poderosa potência
do Senhor Supremo que liberta todo mundo material do sofrimento. " Mäe, mantenho-Te em
meu coraçäo para sempre.

namo 'stu te vyasa visala-buddhe


phull-aravindayata-atra-netra
yena tvaya bharata-taila-purnah
prajvalito jnana-mayah pradipah

Reverências a Srila Vyasadeva


" mestre de grande, formidável inteligência, Srila Vyasadeva, cujos olhos se parecem a
longas pétalas da flor de lótus desabrochando, e que ascendeu a lamparina do
conhecimento que estava cheia do óleo do Mahabharata - ofereço minhas respeitosas
reverências a ti.

prapanna parijataya, totra-vetraika-panaye


jnana-mudraya krsnaya, gitamrta-duhe namah

Reverências ao Senhor como quadrigário de Arjuna


Ofereço minhas respeitosas reverências ao Supremo Senhor Sri Krishna, que realiza todos
desejos de Seus devotos rendidos. Ele empunha uma vara de quadrigário numa das mäos
enquanto a outra faz o gesto de instruçäo, e Ele quem extrai o néctar do Gita.

sarvopanisado gavo, dogdha gopala-nandanah


partho vatsah sudhir bhokta, dugdham gitamrtam mahat

A glória do Gita
As jóias da coroa dos Vedas, os Upanishads, säo como uma vaca, e aquele que ordenha esta
vaca o Senhor Sri Krishna, o filho de Nanda Maharaja. Arjuna o bezerro, o néctar do Gita o
leite, e os devotos virtuosos säo os bebedores e desfrutadores desse leite.

vasudeva-sutam devam, kamsa canura-mardanam


devaki-paramanandam, krsnam vande jagad-gurum

Reverências ao Senhor Sri Krishna


Ofereço minhas respeitosas reverências aos pés de lótus do Senhor Sri Krishna, que o filho de
Vasudeva, o conquistador dos demônios como Kamsa e Canura, e quem expande o divino
êxtase de Mäe Devaki, e o Supremo Deus de todos deuses, e o guru de todo universo.

bhisma-drona-tata jayadratha-jala gandhara nilotpala

3
salya-grahavati krpena-vahani karnena-velakula
asvatthama-vikarna-ghora-makara duryodhanavartini
sottirna khalu pandavai rana-nadi karvartakah kesavah

O campo de batalha representado como um rio


Este rio, cujas margens säo Bhisma e Dronacharya; cuja água Jayadratha, e os filhos de
Gandhari säo a flor de lótus azul, e Salya o crocodilo, cuja corrente Kripa, e cuja mar que
sobe e desce sempre modificando-se Karna; Asvatthama, Vikarma e companhia säo os
amedrontadores tubaröes, e Duryodhana o redemoinho - Sri Keshava o pescador de tal rio
de batalha, que foi atravessado pelos irmäos Pandavas.

parasarya-vacah sarojam-amalam gitartha-gandhotkatam


nanakhyanaka kesaram hari-katha sambodhanabodhitam
loke sajjana sat-padair ahar-ahah pepiyamanam muda
bhuyad bharata pankajam kali-mala pradhvamsi nah sreyase

O Mahabharata como uma flor de lótus


As palavras de Sri Krishna Dvaipayana Vyasadeva, o filho de Parasara Muni, säo uma flor
de lótus pura. O significado do Gita a fragância deste lótus que vai longe, e as várias
narrativas säo seus estames. As revelaçöes de Hari-katha, narrativas sobre o Supremo Senhor,
säo o rio. Nesse mundo, os devotos puros säo as abelhas que estäo constantemente absorvidas
em beber este néctar da flor de lótus. Que essa flor de lótus Mahabharata, que a
conquistadora de todos males nesta era de Kali, graciosamente conceda-nos auspiciosidade.

yam brahma varunendra-rudra-maruta stunvanti divyaih stavair


vedaih sanga pada-kramopanisadair gayanti yah samagah
dhyanavasthita tad gatena manasa pasyanti yam yogino
yasyantam na viduh surasura-gana devaya tasmai namah

Reverências ao Supremo Senhor


Ofereço minhas respeitosas reverências ao Supremo Senhor cujas glórias säo cantadas com
oraçöes celestiais pelo Senhor Brahma, Senhor Varuna, Senhor Indra, Senhor Rudra, e os
Maruts, e cujas glórias säo recitadas por todos Vedas, junto com suas seis divisöes
subsidiárias e os Upanishads; que visto dentro dos coraçöes dos yogis absorvidos em transe
meditativo, e cujas infinitas glórias näo podem ser conhecidas, seja pelos deuses ou pelos
demônios. (Bhag. 12.13.1)

narayanam namskrtya, naram caiva narottamam


devim sarasvatim vyasam, tato jayam udirayet

Antes de recitar ou estudar as escrituras, deve-se oferecer respeitosas reverências às


seguintes encarnaçöes do Senhor: Nara-Narayana Rishi de Badarikashrama, a Suprema
Personalidade de Deus Sri Krishna, a deusa da fala Saraswati, e o escritor das escrituras,
Srila Vyasadeva.

PREFACIO

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Srimad Bhagavad-gita singular em sua vasta publicaçäo e extensa circulaçäo. Junto com os
comentários de grandes santos do passado bem como de sábios modernos, este clássico
aparece em vários idiomas, tanto na India quanto em outros países. Os comentários de
grandes acharyas vaisnavas como Srimat Ramanuja, Srimat Madhvamuni, e Sri Sridhara
Swamipada merecem mençäo especial, enquanto que entre os proponentes de jnana-marga,
ou senda escolástica, os comentários de Srimat Shankaracharya e Sri Madhusudana Saraswati
säo proeminentes. Os comentários de Sriyuta Bala Gangadhara Tilak e Sri Aurobindo
favorecem a escola karma-yoga, ou senda da açäo, e também säo familiares aos eruditos
modernos. Além do mais, grandes pensadores tanto do oriente como do ocidente cantaram
ardorosamente as glórias de Sri Gita, inspirados pelos ideais de seus ensinamentos. Porém
pessoas afortunadas de fino intelecto teísta experimentaräo o acintya-bhedabheda-siddhanta,
ou axioma de inconcebível simultânea unidade e diferença - ilustremente promulgado
pelos seguidores autênticos de Sri Chaitanya Mahaprabhu, gaudiya-acharyas Srila
Visvanatha Chakravarti e Srila Baladeva Vidyabhusana - com eminente fidelidade devoçäo
exclusiva pelo Senhor Supremo . Os devotos eruditos e fiéis também säo inspirados no
âmago de seus coraçöes pelo comentário Bengali sobre Sri Gita feito por Srila
Bhaktivinoda Thakura, compreendendo que um tesouro completamente harmonioso de amor
divino pelo Senhor Sri Krishna (krsna-prema), que a quinta e última meta da vida,
transcendental religiosidade, economia, desfrute dos sentidos, e liberaçäo.

Na introduçäo presente ediçäo meu venerável divino mestre, Sri Gurupadapadma Om


Vishnupada Paramahamsa Parivrajakacharya Sri Srimad Bhakti Raksaka Sridhara Deva
Goswami Maharaja revelou lindamente aos leitores a profunda realizaçäo interna devocional
em sua versäo. Entre as numerosas ediçöes do Sri Gita atualmente disponíveis, pode-se dizer
que poucas alimentam fielmente a devoçäo pura de acordo com as conclusöes perfeitas do
parampara, ou sucessäo discipular fidedigna. Portanto, nosso presente esforço justifica-se.
Consideraremo-nos abençoados se nossos leitores cuidadosos aceitarem em seus coraçöes a
essência vital e completamente auspiciosa desta tentativa sincera.

Sri G.S. Vidyaranjan, Secretário


Sri Chaitanya Saraswat Math, Navadwip

Todas as Glórias a Sri Sri Guru e Gauranga

INTRODUÇÄO

vande sri-guru gaurangau, radha-govinda-sundarau


sa-gunau giyate catha, gita-gudhartja-gauravam

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Curvando-me perante os sagrados pés de Sri Guru, Sri Gauranga, e Sri Sri Radha-
Govindasundara, todos acompanhados por Seus associados, cantarei a grande glória do
tesouro oculto de Srimad Bhagavad-gita.

Srimad Bhagavad-gita bem conhecida pelos sábios. Portanto,


inicialmente devemos dar alguma explicaçäo sobre o procedimento adotado pelo editor desta
ediçäo. O editor pertence à escola de pensamento que descende da linhagem discipular de Sri
Chaitanya Mahaprabhu. Portanto cabe-nos destacar que a presente ediçäo se baseia nos
comentários sobre Sri Gita conforme dados pelos eminentes, exaltados sri gaudiya
vaisnava acharyas, Sri Visvanatha, Sri Baladeva, e Srila Bhaktivinoda Thakura. Pela graça
manifestada de nosso venerável mestre espiritual, Om Vishnupada Srila Bhaktisiddhanta
Saraswati Goswami Prabhupada, e por alusöes feitas pelos ante-mencionados grandes devotos
puros, alguma nova luz revelada aqui, desenvolvendo significados mais profundos através do
texto. O leitor devocional ir apreciar particularmente esta distinçäo ao ver o significado dos
quatro versos (10.8-11) que foram explicados por Sri Visvanathapada como sendo os essenciais
deste libro (catuh-sloki).

Em geral, Sri Gita conhecido como um excelente estudo da ciência da religiäo. A


linguagem do Sri Gita simples e doce; seu humor grave, extensivo, e fundamental; seu
pensamento breve, distinto e imparcial; e sua lógica sólida e natural. O prólogo, epílogo,
exposiçäo, revisäo, análise, síntese, e a arte de apresentaçäo do Sri Gita näo tem
precedentes e säo extremamente encantadores. Sri Gita ativaçäo para o preguiçoso,
coragem para o covarde, esperança para o desesperado, e vida nova para os moribundos. Sri
Gita unifica e sustenta todos alas, seja dos revolucionários, ocultistas, otimistas,
renunciantes, liberacionistas, ou teístas plenos. Desde o ateísta de visäo toscamente
grosseira at o mais elevado santo - os conceitos essenciais de todas classes de filósofos säo
tratados com lógica clara e poderosa. O trabalhador fruitivo, o sábio erudito, e o praticante de
yoga (karmi, jnani, e yogi) e o devoto do Senhor aqui encontraräo uma exposiçäo
compreensiva e iluminadora sobre a substância de suas respectivas filosofias, e assim o livro
altamente estimado por todos. Os ensinamentos essenciais dos Vedas e Upanishads dos
arianos säo explicados diretamente, e com um pouco mais de observaçäo, o cerne de várias
doutrinas näo-arianas também podem ser detectadas no texto. No significado de Sri Gita
descobrimos que a purificaçäo da consciência através da sabedoria surge por realizar-se
sem motivaçäo material os deveres recomendados pelas escrituras, o que resulta em auto-
conhecimento - conhecimento existencial absoluto, ou realizaçäo divina. Em sua plena
maturidade, esta percepçäo pura, imaculada culmina na busca pelo serviço amoroso em puro
conhecimento, no reino divino extático.

Na análise de sambandha-jnana, ou conhecimento da relaçäo divina, Sri Gita revelou que a


natureza da verdade mais original uma personalidade transcendental omnisciente. Na
análise de prayojana, ou o objetivo supremo, a inspiraçäo interna de amor puro na busca da
Realidade Suprema Absoluta tem sido mencionada como a meta da perfeiçäo. E na análise de
abhidheya, ou o método para alcançar a meta desejada, o primeiro estágio revelou-se como
oferecer todas açöes ao Senhor Supremo, e a seguir cultivar o auto-conhecimento interno, o
qual surge de acordo com a progressiva realizaçäo do Senhor. Finalmente, abandonando
todos outros esforços, a pessoa rende-se exclusivamente ao Senhor Supremo, Sri Krishna.

6
Em outras palavras, por refugiar-se na pura f sem misturas, a pessoa se situa em sua
identidade divina perfeita e se ocupa em divino serviço amoroso ao Senhor, que a meta final
de todas práticas devocionais.

Sri Gita distingue e delinea claramente as características das sendas näo-devocionais


baseadas na açäo (karma) e conhecimento (jnana) e seus correspondentes objetivos
alcançáveis de desfrute sensorial (kama) e liberaçäo (moksa). Portanto, os inteligentes
poderäo notar que através desta declaraçäo, yo yac chraddhah sa eva sah, "identificamo-nos
pela nossa f em particular", Sri Gita faz uma comparaçäo objetiva das diferentes sendas e suas
metas, assim desarmando e expondo aqueles que criam confusäo ao apoiarem a invençäo de
que as muitas sendas e metas säo "todas uma coisa só". Nesse respeito, os seguintes versos
(6.46 e 47) merecem atençäo especial:

tapasvibhyo 'dhiko yogi, jnanibhyo 'pi mato 'dhikah


karmibhyas cadhiko yogi, tasmad yogi bhavarjuna

yoginam api sarvesam, mad-gatenantaratmana


sraddhavan bhajate yo mam, sa me yuktatamo matah

Tyaga ou renúncia tem sido completamente condenada, e sua futilidade enfaticamente


asseverada. Esta proclamaçäo demonstra a dádiva conclusiva, intrínsica do Sri Gita. Karma-
yoga, ou oferecer suas açöes ao Senhor Supremo sem interesse provinciano preferível a
karma-tyaga, ou renúncia da açäo; e finalmente, plena auto-rendiçäo ao Senhor Supremo, Sri
Krishna, em que cada açäo dedicada por inspiraçäo divina a seu serviço amoroso, o que
constitue o ensinamento final e supremo do Sri Gita. Por meio de um estudo profundo e
meticuloso de Sri Gita, descobriremos que trata-se do rei de todas escrituras por
conceder a mais elevada devoçäo. Em sua natureza plenamente desenvolvida, esta devoçäo
o mais supremo amor divino, amor pela todo-atrativa Suprema Personalidade - Sri Krishna,
a Realidade do Belo.

Sarva-dharman parityajya, mam ekam saranam vraja - o chamado grandioso, vibrante e


ressoante do clarim de Sri Gita proclamou as glórias do objetivo super-excelente da vida.
Foram revelados o tesouro oculto, mais oculto e o mais oculto dos ocultos, desde o cantar
congregacional dos santos nomes do Senhor (sankirtana) at a devoçäo espontânea (bhava-seva)
na vida de total dedicaçäo cultivaçäo de consciência de Krishna com rendiçäo exclusiva.
Esta a conclusäo consistente e unânime do puro parampara, ou sucessäo discipular
descendente, conforme corroborado pelos seguidores genuínos dos passos de lótus de Sri
Chaitanyachandra, o Senhor Supremo original, que desce para salvar as almas caídas da Kali-
yuga, esta era de ferro da discussäo e contenda.

Que esta ediçäo possa ser uma oferenda ao Senhor Sri Krishna.

Swami B.R. Sridhara


Sri Chaitanya Saraswat Math
Navadwip

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Srimad Bhagavad-gita-mahatmyam

A GLORIA DO SRIMAD BHAGAVAD-GITA

(extraído do Sri Vaisnavya-tantra-sara)


Traduzido por Indumukhi devi dasi, Curitiba, março 1995

Verso 1

Os sábios disseram: " Suta, por favor repita para nós as glórias do Gita, como foram faladas
bem antigamente em Narayana-kshetra pelo grande Srila Vyasadeva.

Verso 2
Suta Goswami disse: " seres veneráveis, certamente fizesteis a mais gloriosa das perguntas.
Verdadeiramente, quem pode descrever a suprema, grande glória do Gita, o mais oculto de
todos tesouros?

Verso 3
Certamente o Senhor Sri Krishna tem pleno conhecimento desta glória; Arjuna, o filho de
Kunti, sabe algo desse fruto; e Vyasadeva, Sukadeva, Yajnavalkya, e o santo Rei Janaka -
todos estäo mais ou menos familiarizados com isto também.

Verso 4
Além deles, outros que ouviram uns dos outros sobre o mesmo estäo ocupados em cantar as
glórias de uma pequena fraçäo de sua grandeza.

Verso 5
Todos Upanishads säo a vaca personificada, e o vaqueirinho Sri Krishna seu ordenhador. O
filho de Prtha o bezerro personificado, esta ambrósia do Gita o leite superexcelente, e as
almas virtuosas altamente inteligentes säo os degustadores.

Verso 6
Para começar, ofereço minhas reverências ao Senhor Sri Krishna que aceitou a posiçäo de
quadrigário de Arjuna, s" para distribuir esta ambrósia do Gita para o benefício de todos três
mundos.

Verso 7
Uma pessoa que queira atravessar o pavoroso oceano do sofrimento material pode faz-lo mui
facilmente ao abrigar-se no barco do Bhagavad-gita.

Verso 8
Aquele tolo que quer alcançar a liberaçäo através da prática constante da yoga sem ouvir a
sabedoria do Gita, merece que at mesmo uma criança ria dele.

Verso 9
Quem ouve e recita o Gita dia e noite nunca deve ser considerado um mero ser humano. Sem
nenhuma dúvida, ele um verdadeiro deus.

8
Verso 10
A fim de iluminar Arjuna através do conhecimento do Gita, o Senhor Krishnachandra cantou
as glórias do supremo princípio da devoçäo, tanto relativa como absoluta.

Verso 11
Desta maneira, o coraçäo purificado pelo conhecimento do Gita, a escada de dezoito capítulos
que refuta todas doutrinas que propalam o gozo dos sentidos e a liberaçäo (bhukti-mukti).
Passo a passo, desenvolve-se a qualificaçäo para se praticar o serviço devocional amoroso.

Verso 12
Banhando-se nas águas puras do Gita, os devotos säo liberados da contaminaçäo deste mundo
mundano. Porém tal tentativa por parte das pessoas sem f totalmente inútil, assim como o
banho de um elefante que imediatamente após, rola na sujeira.

Verso 13
Uma pessoa que näo sabe nada sobre aprender e ensinar o Gita fracassou em cumprir o dever
de sua forma humana de vida.

Verso 14
Portanto, näo existe ninguém mais caído do que aquele que näo conhece os ensinamentos do
Gita. Sua família, suas práticas, seus conceitos, e seu nascimento humano estäo todos
condenados.

Verso 15
Näo eixiste ninguém mais caído do que aquele que näo conhece o significado do Gita. Seu
belo corpo, personalidade, opulência e vida matrimonial estäo todos condenados.

Verso 16
Näo h ninguém mais caído que a pessoa que näo conhece a escritura Bhagavad-gita. Seus
empreendimentos estäo condenados, sua reputaçäo est condenada, e sua adoraçäo, caridade, e
boas qualidades estäo todas condenadas.

Verso 17
Uma pessoa que näo liga para o sagrado Gita deve ser conhecida como um fracasso em
todos sentidos. Seu professor est condenado, seus votos estäo condenados, e sua
convicçäo, austeridade, e fama estäo todas condenadas.

Verso 18
Näo h ninguém mais caído do que aquele que näo estuda o significado do Gita, e aquele
conhecimento que näo cantado no Gita deve ser conhecido como inútil, irreligioso, ofensivo
aos Vedas e ao Vedanta, e demoníaco.

Verso 19
Portanto devemos oferecer ao Gita nosso respeitos em todos momentos e em qualquer
lugar, pois o inaugurador de toda sabedoria religiosa e a essência imaculada de todas
escrituras sagradas.

9
Verso 20
A pessoa que estuda o Gita por ocasiäo da data de festivais santos, especialmente no dia de
jejum conhecido como Ekadasi - tal pessoa, esteja acordada ou dormindo, em movimento ou
parada, nunca derrotada por inimigos.

Verso 21
Quem recita o Gita na presença de Salagrama-sila, ou num templo do Senhor Supremo, ou num
templo do Senhor Shiva, num local santo de peregrinaçäo, ou às margens de um rio sagrado -
tal pessoa torna-se qualificada para se tornar o receptáculo de toda boa fortuna.

Verso 22
O filho de Devaki, o Supremo Senhor Krishna, näo pode ser satisfeito pelo estudo dos
Vedas, caridade, sacrifício, peregrinaçäo, ou votos, tanto quanto fica satisfeito pelo recitar do
Gita.

Verso 23
O estudo dos Vedas e dos Puranas - na verdade o estudo de todas escrituras - completado em
todos sentidos por aquele que estuda o Gita com devoçäo.

Verso 24
A mais alta perfeiçäo de vida alcançada por aquele que recita o Gita num local onde se realiza
meditaçäo yoga, num local sagrado exaltado, perante Salagram-sila, e durante a realizaçäo de
um sacrifício, e especialmente, na associaçäo dos devotos.

Verso 25
Grandes sacrifícios tais como o Asvamedha, junto com suas recompensas, säo
naturalmente alcançados por aquele que diariamente ouve e recita o Gita.

Verso 26
Quem com atençäo ouve ou canta as glórias do significdo do Gita, ou repete este significado
para outros - tal pessoa alcança o destino supremo.

Verso 27, 28
Quem com respeito e devoçäo, e de acordo com as regras escriturais presenteia este livro
sagrado, o Gita - tal pessoa ter uma esposa devotada, e sem dúvida alcançar fama, fortuna, e
boa saúde. Além disso, tornar-se- extremamente querida daqueles que lhe säo próximos e
amados, e desfrutar de grande felicidade.

Verso 29
A miséria ocasionada por uma praga ou rituais negros nunca poder entrar naquela casa onde o
Gita adorado.

Verso 30
Naquela casa nunca existe sofrimento pelas triplas misérias, tampouco existe medo de
qualquer tipo de doença, maldiçäo, pecado, ou desgraça.

10
Verso 31
Naquela casa, ninguém nunca nasce com um corpo infectado ou deformado, e aqueles que ali
residem alcançam devoçäo exclusiva e contínua no humor de servidäo aos pés de lótus do
Senhor Sri Krishna.

Verso 32
Uma pessoa que est devotada a estudar o Gita, adquire uma disposiçäo amigável para com
todos seres viventes, ainda que tenha acumulado as reaçöes de suas açöes prévias neste mundo.

Verso 33
Tal pessoa liberada e feliz. Embora agindo neste mundo, ela näo est envolvida. Mesmo se
por acaso uma pessoa que estuda o Gita vier a cometer um pecado extremamente horrível, näo
poder ser afetada por isto, assim como uma folha de lótus näo pode ser tocada mesmo por uma
gota d'água.

Verso 34, 35
Pecado oriundo de comportamento ou fala ofensiva, a ofensa de se comer coisas proibidas, e
atividades pecaminosas provocadas pelos sentidos e cometidas sabidamente ou sem saber
durante as atividades rotineiras - todos tipos de pecados säo erradicados imediatamente pela
recitaçäo devocional do Gita.

Verso 36
Embora possa aceitar alimentos em todos locais ou caridade em todas cricunstâncias, o
recitador devotado do Gita distinto no sentido de que ele permanece totalmente näo-envolvido
pelas açöes em qualquer momento.

Verso 37
Mesmo aquele que, contra as injunçöes das escrituras, aceita como caridade tantas jóias
preciosas quantas cobririam toda superfície da Terra e dos oceanos - tal pessoa torna-se täo
imaculada como puro cristal simplesmente por recitar devocionalmente o Gita apenas uma
vez.

Verso 38
Uma pessoa cujo coraçäo est sempre absorto no Gita certamente deve ser aceita como
supremamente completa na realizaçäo de sacrifícios e na repetiçäo constante dos santos nomes
ou mantras (japa). Todas suas açöes estäo ajustadas corretamente, e ela realmente erudita
(pandita).

Verso 39
Certamente ela digna de ser vista (i.e. para receber darshana), ela realmente afortunada, um
yogui, e um verdadeiro sábio. Conhece o sacrifício, realiza sacrifício e conhece todos Vedas.

Verso 40
Todos locais sagrados neste universo tais como Prayaga, estäo eternamente presentes onde o
Gita, o livro eterno da cançäo divina, est presente.

Verso 41

11
Os protetores do corpo, na forma dos semideuses, Rishis, ou yoguis, todos residem dentro do
corpo daquele que constantemente estuda o Gita, e eles estäo presentes at mesmo na hora em
que abandonar o corpo.

Verso 42
Acompanhado por Seus associados tais como Narada e Dhruva, o menino vaqueirinho
Senhor Sri Krishna pessoalmente aparece como guardiäo onde quer que o Gita esteja presente.

Verso 43
Com supremo êxtase, o Supremo Senhor Sri Krishna e Sua divina consorte Sri Radhika estäo
misericordiosamente presentes onde quer que a concepçäo da escritura Gita for discutida,
estudada e ensinada.

Verso 44
O Senhor Supremo disse: " Partha, o Gita Meu coraçäo, o Gita Minha essência suprema, e o
Gita conhecimento intenso, imperecível sobre Mim.

Verso 45
O Gita Meu refúgio supremo, o Gita Minha morada suprema, o Gita Meu tesouro mais
oculto, e especialmente, o Gita Meu guru supremo.

Vreso 46
Estou presente no Gita, e o Gita Minha residência suprema. Somente pelo conhecimento do
Gita mantenho os três mundos.

Verso 47
Saiba sem nenhuma dúvida que o eternamente inefável Gita, como Meu outro Ser, Minha
sabedoria suprema sobre o Absoluto personificado.

Verso 48
" Pandava, agora pronunciarei aqueles santos nomes do Gita que quando cantados,
imediatamente destroem todos pecados. Ouça de Mim agora estes nomes confidenciais.

Verso 49 - 51
Ganga, Gita, Savitri, Sita, Satya, Pativrata, Brahmavali, Brahmavidya, Trisandhya, Mukta-
gehini, Ardhamatra, Cidananda, Bhavagni, Bhranti-nasini, Vedayatri, Parananda, e
Tatvartha-jnana-manjari. Uma pessoa que, com a mente sóbria, continuamente pronuncia estes
santos nomes confidenciais, alcança a perfeiçäo do conhecimento divino, e no final atinge o
destino supremo.

Verso 52
Deve-se recitar ao menos a metade do Gita se for impossível recitar o texto todo de uma vez
só. Entäo sem dúvida, alcança-se o mérito que acumulado por se doar vacas em caridade a
receptores dignos.

Verso 53
Alcança-se o fruto do sacrifício Soma por recitar um terço do Gita, e o resultado de banhar-se

12
no sagrado rio Ganga alcançado por falar um sexto dele.

Verso 54
Quem regularmente recita dois de seus capítulos com plena convicçäo, sem dúvida obter
residência no planeta do Senhor Indra por um milênio (kalpa).

Verso 55
Quem recita com devoçäo um capítulo por dia perpetuamente ser considerado no mesmo
nível de deuses conhecidos como Rudra, e assim se alcança o planeta do Senhor Shiva.

Verso 56
Uma pessoa que regularmente recita meio ou um quarto de capítulo alcançar residência no
planeta solar pela duraçäo de cem Manus.

Verso 57
Uma pessoa que fielmente recita dez, sete, cinco, três, um ou at mesmo s" meio verso deste Gita,
alcançar residência na lua por dez milhöes de anos.

Verso 58
Quem, na hora da morte, lembrar da metade do Gita, um quarto do Gita, um capítulo do Gita,
ou at mesmo um verso do Gita - tal pessoa atinge o destino supremo.

Verso 59
Por falar ou ouvir o significado do Gita na hora da morte, mesmo uma pessoa seriamente
pecaminosa se torna digna da liberaçäo.

Verso 60
Quem tiver uma conecçäo devocional com um livro do Gita, na hora da morte alcançar
Vaikuntha e residir com o Supremo Senhor Vishnu em divino êxtase.

Verso 61
Quem dirigir sua concentraçäo mesmo num s" capítulo do Gita, alcançar um nascimento
humano após a morte. Entäo, por novamente estudar o Gita, alcança a liberaçäo final.

Verso 62
Mesmo se na hora da morte a pessoa simplesmente pronunciar a palavra Gita, obter um
destino feliz.

Verso 63
Certamente todas açöes realizadas junto com a recitaçäo do Gita tornam-se purificadas e entäo
säo completadas com perfeiçäo.

Verso 64
Uma pessoa que recita o Gita durante a realizaçäo de cerimônias de exequias(shradha) satisfaz
seus antepassados. Deixando o inferno, eles ascendem ao paraíso.

Verso 65

13
Os antepassados, tendo recebido libaçöes de exéquias pela recitaçäo do Gita, oferecem suas
bençäos àquele filho, e ascendem ao plano celestial conhecido como Pitr-loka.

Verso 66
Presentear o Gita junto com um abano de rabo de iaque (chamara), permite a um homem
alcançar completo sucesso naquele dia.

VBerso 67
Quem doar um Gita folheado a ouro a um brahmana erudito, nunca mais volta a nascer no
mundo material.

Verso 68
Quem doar como caridade cem cópias do Gita, alcança o plano do Absoluto, de onde raramente
se volta a renascer.

Verso 69
A potência de se dar o Gita como um presente tal, que uma alma, tendo alcançado um lugar no
planeta do Senhor Vishnu por um período de sete milênios, entäo se associa com aquele
Supremo Senhor Vishnu em divino êxtase.

Verso 70
Uma pessoa realiza todas suas aspiraçöes por agradar ao Senhor Supremo, se, após ouvir
plenamente o significado do Gita, ele der o livro de presente a um brahmana.

Verso 71
A pessoa que näo recita e nem ouve o Gita, que a encarnaçäo da ambrósia, derrama néctar de
sua mäo a fim de beber veneno.

Verso 72
Tendo descoberto o Gita e bebendo de sua ambrósia, pessoas afligidas pela miséria desse
plano mundano, mortal, refugiam-se na devoçäo ao Supremo Senhor e tornam-se
verdadeiramente felizes.

Verso 73
Muitos reis santos tais como o Rei Janaka refugiaram-se no conhecimento do Gita e,
permanecendo sem pecado, alcançaram o destino supremo.

Verso 74
Ao recitar o Gita, näo se considera nascimento elevado ou baixo. S" os fiéis que estäo
qualificados a recitar o Gita, porque de todo conhecimento, o Gita a encarnaçäo do Absoluto.

Verso 75
Uma pessoa que por egoísmo ou orgulho vilipendia o Gita, ter de residir no pavoroso inferno
at a hora do grande cataclisma universal.

Verso 76
O tolo que, inflado por egoísmo, insulta o significado do Gita, deve permanecer fervendo no

14
óleo do inferno chamado Kumbhipaka, at a aniquilaçäo ao final do milênio.

Verso 77
Apesar de cantar as glórias do significado do Gita de maneira conscienciosa, a pessoa que
näo ouve sobre esse significado, repetidamente volta a nascer em ventres de porcos.

Verso 78
A pessoa que obtem o livro do Gita através de roubo näo ser bem sucedida em todos seus
empreendimentos, e mesmo seu estudo e recitar do livro s" um desperdício de tempo.

Verso 79
Quem näo experimenta êxtase divino mesmo após ouvir o Gita, simplesmente se esforça
infrutíferamente tal como o trabalho forçado de um louco.

Verso 80
A fim de agradar o Senhor Supremo, após ouvir o Gita, deve-se oferecer ouro, comestiveis, e
tecido de seda a um Vaisnava brahmana.

Verso 81
Para o prazer transcendental do Supremo Senhor Hari, deve-se adorar o orador do Gita com
devoçäo, oferecendo-lhe tecido e muitos tipos de presentes adoráveis.

Verso 82
Suta Goswami disse: Quem, depois de cantar o Gita, cantar esta eterna Glória do Gita,
conforme foi falada pelo Supremo Senhor Sri Krishna - tal pessoa, conforme dantes
mencionado, pode desfrutar do fruto do Gita.

Verso 83
Após cantar o Gita, quem näo cantar as Glórias do Gita perde o fruto de seu cantar. Torna-se
apenas um tanto de esforço inútil.

Verso 84
Quem, com fé, recita ou ouve o Gita completo com as Glórias do Gita, certamente alcança o
destino transcendental supremo.

Verso 85
Aquele que com verdadeira f sublime
ouve este profundo, significativo Gita - A Cançäo Divina,
seu mérito puro e sagrado
traz toda sua vida ao plano
de júbilo, doçura e encanto oni-penetrantes.

Assim se completam as Glórias do Sri Gita.


Que isto possa ser uma oferenda ao Senhor Sri Krishna.

Nota da tradutora: os shastras recomendam certos atos de prayascitta (expiaçäo) para


libertar a pessoa das ofensas na adoraçäo: pode-se ler um capítulo do Bhagavad-Gita,

15
oferecer oraçöes a Tulasi-devi, ou plantar uma semente de tulasi... O ponto essencial de tais
atividades lembrarmos que somos servos do Senhor.

16
Todas as glórias a Sri Sri Guru e Gauranga

SRIMAD BHAGAVAD-GITA

O TESOURO OCULTO DO DOCE ABSOLUTO

por Sua Divina Graça


Srimate Bhakti Raksaka Sridhara
Deva Goswami Maharaja

traduzido por Indumukhi d.dasi


Curitiba, maio de 1996

CAPITULO UM
Saynia-darsana

OBSERVANDO OS EXÉRCITOS

Verso 1
Dhrtarastra disse: " Sanjaya, que fizeram meus filhos e os filhos de Pandu, após reunirem-se
para a batalha no local sagrado de Kuruksetra?

Verso 2
Sanjaya disse: Verificando os soldados e exércitos dos Pandavas organizados em formaçäo
militar, o Rei Duryodhana aproximou-se de Dronacharya e falou o seguinte:

Verso 3
" mestre, por favor observe os grandes exércitos dos Pandavas, organizados em formaçäo
militar por seu inteligente discípulo, Dhrstadyumna.

Versos 4 a 6
Entre esses soldados estäo os arqueiros peritos Bhima e Arjuna, bem como outros igualmente
peritos, tais como Satyaki, o Rei Virata, o grande guerreiro Drupada, Dhrstaketu, Cekitana,
o poderoso herói Kasiraja, Purujit, Kuntibhoja, o nobre Rei Saibya, o valente Yudhamanyu, o

17
heróico Uttamauja, Abhimanyu, e os filhos de Draupadi - todos eles certamente grandes
guerreiros.

Verso 7
" melhor dos nascidos-duas-vezes, por favor também fique informado quanto aos
grandes heróis e líderes de nossos exércitos. Descrevê-los-ei agora para sua consideraçäo.

Versos 8 e 9
Além do senhor mesmo, que sempre sai vitorioso na batalha, e Bhisma, Karna, Krpacharya,
Asvatthama, Vikarna, Saumadatti (Bhurisrava), e Jayadratha, h muitos outros heróis peritos
na arte de guerrear; estäo todos armados com diversas armas e determinados a entregar suas
próprias vidas por mim.

Verso 10
Nosso exército, chefiado por Bhisma, inadequado, enquanto que o exército dos Pandavas,
protegido por Bhima, competente.

Verso 11
Portanto, permanecendo em suas respectivas divisöes nos pontos estratégicos da formaçäo, por
favor coopere para proteger o Av Bhisma.

Verso 12
Entäo, com um grito de guerra semelhante ao rugido de um leäo, Bhisma, o poderoso general
dos Kurus, soprou alto sua concha para encorajar Duryodhana.

Verso 13
Imediatamente, conchas, tambores grandes e pequenos, berrantes, e outros instrumentos
soaram repentinamente, produzindo uma vibraçäo tumultuosa.

Verso 14
Do outro lado, o Senhor Sri Krishna e Arjuna, numa grande quadriga puxada por cavalos
brancos, resoaram suas conchas divinas.

Verso 15
Hrisikesa soou Sua concha, Panchajanya; Dhananjaya soou a sua, Devadatta; e Bhismasena,
o realizador de tarefas poderosas, soprou a grande concha chamada Paundra.

Verso 16
O Rei Yudhisthira, filho de Kunti, soprou a Anantavijaya, enquanto Nakula e Sahadeva
soaram as conchas chamadas Sughosa e Manipuspaka respectivamente.

Versos 17 e 18
" senhor da Terra, o arqueiro perito Kasiraja, o grande guerreiro Sikhandi, Dhrstadyumna, o Rei
Virata, o inconquistável Satyaki, o Rei Drupada, os filhos de Draupadi e o poderoso filho
de Subhadra, Abhimanyu - todos soaram suas respectivas conchas.

Verso 19

18
O som tremendo destas conchas resoando através da terra e dos céus, perfurou os coraçöes dos
filhos de Dhrtarastra.

Verso 20
" Rei, naquele momento, Dhananjaya (Arjuna), montado numa quadriga decorada com a
bandeira de Hanuman, estava pronto a soltar suas armas. Vendo Duryodhana e sua companhia
prontos para a batalha, ele pegou seu arco e falou o seguinte para Sri Krishna:

Versos 21 a 23
Arjuna disse: " Krishna, por favor coloca minha quadriga entre os dois exércitos, a fim de que
eu possa observar os guerreiros com os quais terei de brigar neste campo de batalha, e que
vieram lutar para a satisfaçäo do malvado Duryodhana.

Versos 24 e 25
Sanjaya disse: " descendente de Bharata, depois que o vigilante Arjuna falou estas palavras,
Sri Krishna (o Senhor de todos sentidos) manobrou a grande quadriga entre os exércitos, frente
a Bhisma, Drona, e todos imperadores. O Senhor disse entäo: " Partha, observa os Kauravas
reunidos aqui para a batalha.

Verso 26
Ali, entre ambos exércitos, Arjuna podia de fato ver anciöes paternais, avôs, mestres, tios
maternos, irmäos, filhos, netos, sogros, amigos, e outros entes queridos.

Verso 27
Portanto, vendo seus próprios familiares presentes no campo de batalha, o filho de Kunti,
Arjuna, arrasado pela tristeza e tomado de grande compaixäo, falou as seguintes palavras:

Verso 28
Arjuna disse: " Krishna! Vendo diante de mim meus próprios parentes todos prontos para
guerrear, sinto a força em meus membros esvair-se e minha boca est seca.

Verso 29
Todo meu corpo est tremendo e arrepiado. Meu arco Gandiva est escapando das mäos e minha
pele arde.

Verso 30
" Kesava! Näo consigo mais conter-me. Minha mente est confusa, e s" vejos sinais hostis
cheios de mal.

Verso 31
Tampouco vejo qualquer bem em matar meus próprios parentes nessa batalha. " Krishna, näo
tenho desejo algum pela vitória, reinados, ou felicidade.

Versos 32 a 34
" Govinda, de que vale esse nosso reino? Qual o propósito da felicidade e do desfrute, se
aqueles por quem desejamos tudo isso - mestres, anciöes paternais, filhos, avôs, tios
maternos, sogros, netos, cunhados, e outros parentes - hoje chegaram para a batalha, prontos a

19
sacrificar suas próprias vidas e posses? Portanto, " Madhusudana, mesmo que eles queiram
tomar minha vida, näo quero mat -los.

Verso 35
" Janardana, mesmo se conquistarmos a soberania dos três mundos, sem falar em governar a
Terra, que felicidade obteremos por matar Duryodhana e companhia?

Verso 36
S" nos caber o pecado se assassinarmos nossos mestres e guardiöes, mesmo que sejam
nossos agressores. Näo podemos tomar a vida de nossos próprios parentes, os filhos de
Dhrtarastra. " Madhava, como poderemos ser felizes matando nossos próprios parentes?

Versos 37 e 38
Embora esses homens, cujos coraçöes estäo afligidos de cobiça, näo conseguem enxergar o
grave pecado de lutar com amigos e matar membros da família, porque, " Janardana, näo
deveríamos abster-nos desse ato hediondo, estando plenamente conscientes das graves
consequências?

Verso 39
Com o declínio da dinastia, as tradiçöes religiosas da família säo interrompidas. Quando as
práticas religiosas säo desta forma interrompidas, toda dinastia restante tomada pela irreligiäo.

Verso 40
" Krishna, descendente da dinastia Vrsni, quando na família entäo predomina a irreligiäo, as
mulheres da família tornam-se depravadas, e do adultério, surge a progênie indesejada e
desvirtuosa.

Verso 41
Prole indesejada força tanto a família quanto seus destruidores, a uma condiçäo infernal. A
mesma sina recai sobre os antepassados de tal família, pois as oferendas regulares de
alimento e água a esses ancestrais säo interrompidas.

Verso 42
Os atos hediondos de tais destruidores da dinastia causam um alastramento de progênie
mestiça. Por tais atos, a eterna tradiçäo familiar e elevada linhagem da nobreza säo
completamente devastadas.

Verso 43
" Janardana, ouvimos que pessoas cujas tradiçöes familiares, sociais e religiosas säo
destruídas, sempre residem no inferno.

Verso 44
Ai de nós! Que grave pecado decidimos cometer. Levados por nossa cobiça pela
insignificante felicidade real, estamos a ponto de matar nossos próprios parentes.

Verso 45
Se, desarmado e sem opor resistência, eu fosse morto neste campo de batalha pelos filhos de

20
Dhrtarastra, entäo isso seria muito mais auspicioso para mim.

Verso 46
Sanjaya disse: Tendo assim falado no campo de batalha, Arjuna deixou de lado seu arco e
flechas, e sentou-se na quadriga, com o coraçäo atormentado pela lamentaçäo.

CAPITULO DOIS
Sankhya-yoga

A CONSTITUIÇÄO DA ALMA

Verso 1
Sanjaya disse: o Senhor Supremo, Madhusudana, entäo falou as seguintes palavras para
Arjuna, que estava cheio de tristeza e compaixäo, e cujos olhos transbordavam lágrimas.

Verso 2
O Senhor Supremo disse: " Arjuna, porque tal ilusäo tomou conta de ti neste momento crítico?
Isso impróprio para um homem nobre (ariano). um obstáculo para alcançar o céu, e destrói o
bom nome e fama.

Verso 3
" filho de Kunti, abandona esta covardia, pois näo te fica bem. " grande herói, rejeita essa
mesquinha fraqueza de coraçäo e levanta-te para a batalha!

Verso 4
Arjuna disse: " Madhusudana, matador do inimigo, como posso contra-atacar, atirando
flechas em meu general Bhisma e mestre Drona, que säo dignos de minha adoraçäo?

Verso 5
melhor viver nesse mundo mendigando, sem tomar as vidas de nossos grandes, nobres
anciöes e mestres. Senäo, ao mat -los apenas viveremos nesse mundo para desfrutar da
fortuna e bens deles, manchados com seu sangue.

Verso 6
Näo conseguimos compreender o que ser melhor para nós - vitória ou derrota - porque esses
filhos de Dhrtarastra, que se os matassemos näo desejaríamos mais viver, agora estäo diante de
nós no campo de batalha.

Verso 7
Agora estou confuso. Qual meu verdadeiro dever? Cheio de apreensäo pela queda de nossa
dinastia, imploro-Te que por favor me diga claramente qual curso de açäo mais benéfico para
mim. Sou Teu discípulo rendido. Por favor instrue-me.

Verso 8
Mesmo se obtivermos um império em expansäo, sem rivais na Terra, e supremacia sobre o reino
dos céus, näo consigo encontrar nada para mitigar esta tristeza que est me deixando sem

21
sentidos.

Verso 9
Sanjaya disse: desta forma, o castigador do inimigo, o intensamente alerta Arjuna,
dirigiu-se a Krishna que o Senhor dos sentidos de todos seres. Entäo ele declarou: "Govinda,
näo vou lutar," e quedou-se em silêncio.

Verso 10
" Bharata, depois disso Sri Hrsikesa, no meio de ambos exércitos, dirigiu-se sorridente ao triste
Arjuna da seguinte maneira:

Verso 11
O Senhor disse: " Arjuna, estás te lamentando por aquilo que näo digno de pesar, e no
entanto falas palavras de sabedoria. Porém os sábios näo se lamentam nem pelos vivos nem
pelos mortos.

Verso 12
Nunca houve um tempo em que Eu, tu ou estes reis näo existissem. Como somos agora no
presente, assim também fomos no passado, e continuaremos a ser no futuro.

Verso 13
Conforme o ser vivo encarnado gradualmente passa neste corpo da infância para a juventude at
a velhice, assim também essa alma obtém outro corpo na morte. Os sábios näo se iludem ante
tais transformaçöes.

Verso 14
" filho de Kunti, s" pela identificaçäo dos sentidos com seus objetos que surgem as sensaçöes
de frio, calor, prazer, e dor. Porém esses efeitos säo temporários - eles vem e väo. Portanto, "
Bharata, deves tolerá-los.

Verso 15
" mais nobre entre os homens, uma pessoa de inteligência constante, equilibrado diante do
prazer ou da dor, que näo se perturba pelas experiências sensuais, certamente qualifica-se
para a liberaçäo.

Verso 16
Naquilo que mutável, tal como o corpo, näo existe existência eternamente duradoura; para
a alma eterna, näo existe tranformaçäo ou destruiçäo. Aqueles que viram a verdade assim
verificaram e analisaram a natureza tanto da realidade temporária quanto da ilusäo temporária.

Verso 17
Saiba que a alma que permeia todo corpo imperecível. Ela imutável e eterna, e ninguém
pode destruí-la.

Verso 18
Somente estes corpos físicos da alma eterna, indestrutível, e imensurável, estäo sujeitos
destruiçäo. Portanto, lute, " Bharata, e näo abandone teus princípios religiosos naturais.

22
Verso 19
Aqueles que pensam que o ser vivo um assassino, e os que pensam que foi assassinado, ambos
ignoram a verdadeira natureza da alma - a alma näo assassina nem assassinada.

Verso 20
A alma nunca nasce e nunca morre, nem vem a ser repetidamente ou se expande, porque näo-
nascida e eterna. Ela inexaurível -sempre jovem, embora antiga. Apesar do corpo estar sujeito
ao nascimento e morte, a alma nunca destruída.

Verso 21
" Partha, como pode uma pessoa que sabe que a alma constante, indestrutível, sem
nascimento e inexaurível, matar alguém ou causar a morte de alguém?

Verso 22
Assim como uma pessoa aceita uma roupa nova, rejeitando aquela que est gasta e velha, assim
também a alma continua a aceitar um novo corpo, abandonando aquele que velho e inútil.

Verso 23
As armas näo conseguem ferir a alma, nem o fogo consegue queim -la. Ela näo se molha com
água, nem se seca com o ar.

Versos 24 e 25
A alma indivisível e näo se queima, molha, ou seca. Ela eterna, constante, imóvel, e
sempre existente. Nada pode obstruir sua passagem. Esta alma imperceptível, inconcebível,
e inafetada pelas seis mutaçöes (nascimento, existência, crescimento, maturidade,
diminuiçäo, e destruiçäo). Portanto, conhecendo a alma desta maneira, näo conseguirás
mais te lamentar.

Versos 26 e 27
E, " melhor dos guerreiros, mesmo que penses que a alma est perpetuamente sujeita ao
nascimento e morte, ainda assim näo tens razäo para te lamentar. Para aquele que nasce, a morte
certa, e aquele que morre, ter de renascer para se submeter às reaçöes de suas açöes pretéritas.
Portanto, näo deves lamentar-te pelo inevitável.

Verso 28
" Bharata, se todas entidades vivas säo imanifestas antes do nascimento, manifestas entre o
nascimento e a morte, e novamente imanifestas na morte, porque lamentar-te por elas?
(Esta conclusäo näo corroborada pelas autoridades santas; porém se for aceita guisa de
argumento, teu dever ainda assim lutar - a fim de manter teus princípios religiosos naturais).

Verso 29
Alguns percebem a alma como espantosa, outros descrevem-na como espantosa, alguns ouvem
sobre ela como espantosa, enquanto ainda outros, mesmo após ouvir sobre ela, nem mesmo
conseguem compreend-la.

Verso 30

23
" Bharata, a alma que habita dentro dos corpos de todos seres vivos eterna e näo pode ser
assassinada. Portanto näo deves lamentar por ninguém.

Verso 31
Além do mais, considerando seu svadharma, näo tens razäo de titubear, j que nenhuma açäo
mais benéfica para um ksatriya do que lutar pela justiça religiosa.

Comentário

Svadharma, ou o dever natural da entidade viva, de dois tipos, de acordo com a condiçäo de
seu aprisionamento ou liberaçäo. No estado liberado, svadharma destituído de cor ou
ímpeto supérfluos tal como se encontra no svadharma do enredamento material. Na
verdade, svadharma, sudha svadharma, a absorçäo da alma liberada em comprometer cada
uma de suas açöes para o divino prazer do Senhor Supremo. Por outro lado, a alma
aprisionada na matéria aceita vários nascimentos entre 8,400,000 espécies de vida conforme os
frutos de suas açöes passadas, at que em virtude de açöes piedosas ou virtuosas, ela alcança
um nascimento humano; entäo, conforme sua natureza particular e movimentos, adota uma
posiçäo no daiva-varnashrama, o sistema classificado sócio-religioso centrado em Deus,
como um meio favorável de se atingir o svadharma puro do estado liberado. Assim, a
prática desse meio favorável também conhecida como svadharma de uma forma geral. Em
outras palavras, assim como o fogo encoberto pela fumaça ainda assim chamado de fogo,
independente de estar encoberto, semelhantemente, embora o sudha svadharma original da
alma possa parecer estar ligeiramente encoberto, apesar disso ainda conta como svadharma,
dentro da consideraçäo do sistema sócio-religioso centrado em Deus, varnashrama-
dharma.

Verso 32
" Partha, uma batalha assim, por si s" presente como as portas abertas do paraíso, s" pode
ser ganha pelo mais afortunado dos guerreiros.

Verso 33
De fato, se escolheres näo ocupar-te nesta guerra de justiça religiosa, teus princípios
religiosos se perderäo, a fama te desertará, e o pecado ir vencer-te.

Verso 34
As pessoas falaräo de tua infâmia por todos tempos, e para os famosos, a infâmia pior que a
morte.

Verso 35
Aqueles grandes guerreiros que te honraram ridiculariz -lo-äo, considerando que tiveste medo
de lutar.

Verso 36
Teus inimigos faräo pouco de tuas habilidades com muitas palavras insultantes. Que poderia
ser mais doloroso?

Verso 37

24
" Kaunteya, se fores morto na batalha, alcançarás o céu, e se fores vitorioso, desfrutarás
da Terra. Portanto, estando confiante quanto ao sucesso, ergue-te para a batalha!

Verso 38
Sabendo que o prazer e a dor, perdas e ganhos, e vitória ou derrota säo uma e mesma coisa
- lute. Näo serás afetado pelo pecado.

Verso 39
Acabo de explicar-te a sabedoria do conceito da realidade. Agora ouça sobre o conceito do
serviço devocional, ou bhakti-yoga. " Partha, pela budhi-yoga, ocupando tua inteligência em
devoçäo, serás capaz de cortar completamente as amarras da açäo.

Comentário

"Aqui ser demonstrado que budhi-yoga um caminho singular. Quando observamos que
essa bhudhi-yoga limitada pelo ideal da açäo, conhecida como karma-yoga; quando ela se
estende além do karma at o limite máximo do conhecimento, conhecemo-la como jnana-
yoga, ou sankhya-yoga; e quando, transcendendo as limitaçöes tanto de jnana quanto de
karma, ela alcança bhakti, ou devoçäo, entäo conhecida como bhakti-yoga, ou budhi-yoga
completa e perfeitamente pura."
- Srila Bhaktivinoda Thakura

Verso 40
Mesmo um pequeno começo nesse serviço devocional näo passa em väo, nem se sofrer
alguma perda. A prática mais insignificante de tal serviço devocional salva a pessoa do
devorador mêdo de repetidos nascimentos e morte nesse mundo.

Comentário

Em geral, maha-bhaya significa o medo que tudo devora, de renascer e morrer


repetidamente nesse mundo de exploraçäo. Porém maha-bhaya também se refere a sayujya-
mukti, a liberaçäo de se fundir na consciência impessoal näo-diferenciada de Brahmaloka,
Viraja ou samadhi. Renúncia leva a sayujya-mukti, o ponto final do nascimento e morte, mas
näo leva a uma vida no plano positivo. Nos leva a um permanente sepultamento em
Brahmaloka. O demônio de mukti devorar a pessoa integralmente, e por isso at mais perigoso
do que essa vida mundana comum de açäo e reaçäo. Mukti significa uma greve no sistema
orgânico, portanto deve ser evitada. Tanto abusar dos deveres numa fábrica quanto declarar
uma greve pela cessaçäo dos deveres, anormal. Bhukti, exploraçäo, e mukti, renúncia,
ambas säo fantasmas pavorosos. Portanto, maha-bhaya significa a grande apreensäo de se
tornar presa seja do fantasma da exploraçäo que leva a repetidos nascimentos e morte, seja
do fantasma de se cometer suicídio através da fusäo no impersonalismo de ser encarcerado
em Brahmaloka - medo de ambos: bhoga-bhumi, o plano da exploraçäo, e tyaga-bhumi, o
plano da renúncia. No Bhakti-rasamrta-sindhu declara-se:

bhukti-mukti sprha yavat, pisaci hrdi vartate


tavad bhakti-sukhasyatra, katham abhyudayo bhavet

25
"Enquanto os dois fantasmas da exploraçäo e da renúncia continuarem assombrando o
coraçäo, o êxtase da devoçäo por Krishna nunca despertar ali." (B.r.s. 1.2.22)

anyabhilasita sunyam jnana-karmady anavrtam


anukulyena krsnanusilanam bhaktir uttama

"A mais elevada devoçäo aquela que agrada exclusivamente ao Senhor Supremo, Krishna, e
destituída de qualquer desejo além de Seu serviço. Ela näo garantida pela açäo dos
deveres diários ou costumeiros (karma), nem pelo conhecimento que busca o aspecto impessoal
näo-diferenciado do Absoluto (jnana), nem pela tentativa meditativa de tornar-se uno com o
Senhor (yoga)". (B.r.s. 1.1.9)

S" o Senhor Supremo abhaya, além da apreensäo. Portanto, s" a participaçäo em Seu serviço
pode nos libertar dos fantasmas da exploraçäo e da renúncia, bhukti e mukti. Se subtrairmos
bhukti e mukti, entäo s" resta a bhakti positiva, devoçäo. Logo, sem bhakti tudo maha-bhaya,
grande perigo.

Verso 41
" descendente da dinastia Kuru, a inteligência ocupada em devoçäo exclusiva a Mim uni-
direcionada e firmemente situada em Mim, j que sou sua única meta. Porém a inteligência
daqueles que evitam a devoçäo exclusiva a Mim dividida e carateriza-se por intermináveis
desejos devido a sua absorçäo em inumeráveis objetos dos sentidos.

Versos 42 a 44
" Partha, aquelas pessoas lascivas e ignorantes que näo possuem conhecimento de que o
propósito principal dos Vedas alcançar a Verdade Suprema, sempre estäo preocupadas com
interpretaçöes de seus aspectos indiretos, triviais. Dizem: "Näo h nada que valha a pena
conhecer além disso". Desejando desfrutar dos frutos de suas açöes e buscando alcançar o
céu, estes tolos säo atraídos pelas palavras aparentemente encantadoras (porém afinal
venenosas) da seçäo karma-kanda dos Vedas, onde se descreve muitos processos de sacrifício
e outros rituais que proporcionam fortuna, desfrute sensual, bom nascimento, e os frutos de
nossas açöes. Iludida por estas palavras floridas e enamorada dos prazeres mundanos e
opulência, a inteligência de tais pessoas indiscriminadas näo chega a determinaçäo resoluta da
dedicaçäo exclusiva e ininterrupta ao Senhor Supremo.

Verso 45
" Arjuna, ao definir sendas näo-devocionais baseadas na açäo e conhecimento, os Vedas
lidam com os três modos da natureza material. Homens tolos, cuja inteligência est encoberta
pela exploraçäo e renúncia, ocupam-se no cultivo da açäo e do conhecimento. Assim,
permanecem ignorantes do principal objetivo dos Vedas, que transcender os três modos da
natureza material. Mas Arjuna, fique livre da dualidade, viva na associaçäo de Meus devotos
eternos, e abandona toda busca por ganhos e preservaçäo. Entäo, pela budhi-yoga, dedicando
tua inteligência a Mim, alcança aquele plano que est livre das qualidades materiais, e situa-te
naquela transcendência que o objetivo dos Vedas. Em outras palavras, deixando do cultivo da
açäo e do conhecimento, ocupa-te exclusivamente na senda da devoçäo conforme comandado
pelos Vedas.

26
Verso 46
Todos propósitos aos quais se destinam diversos laguinhos podem ser cumpridos melhor de
uma s" vez por um grande lago. Semelhantemente, os resultados obtidos por adorar
diversos semideuses através das respectivas oraçöes védicas podem ser ultrapassados de uma
s" vez pela devoçäo exclusiva a Mim. Tal devoçäo a primeira e única direçäo dos Vedas. Uma
pessoa auto-realizada que dessa forma est em pleno conhecimento da essência dos Vedas,
realiza todas necessidades através da adoraçäo exclusiva ao Senhor Supremo em devoçäo.

Verso 47
Agora descreverei niskama karma-yoga - a senda da açäo desinteressada. Tens o
direito de realizar teus deveres prescritos naturais, porém näo tens o direito a quaisquer
frutos dessa açäo. Näo deves agir nem com desejo de desfrutar dos frutos de teu trabalho,
nem, como resultado, deves ficar apegado a negligenciar teus deveres.

Verso 48
" Dhananjaya, após abandonar o desejo pelos frutos da açäo, situa-te na senda da
devoçäo (bhakti-yoga)). Com igual disposiçäo perante o sucesso e o fracasso, cumpre teus
deveres prescritos de acordo com tua natureza. Permanecer equilibrado tanto no sucesso
quanto no fracasso do resultado de tua açäo certamente conhecido como yoga.

Verso 49
" Dhananjaya, a açäo fruitiva extremamente abominável comparada buddhi-yoga, ou
equilíbrio em açäo desinteressada. Aqueles que almejam os frutos de suas açöes säo uns
miseráveis - säo uns depauperados, estando cheios de desejos. Portanto, busca o refúgio
da inteligência cuja meta e objetivo a açäo desinteressada.

Verso 50
Uma pessoa que näo est motivada pelo desejo de desfrutar os frutos de suas açöes livra-se
tanto dos bons como dos maus atos ainda nesta vida. Ocupa-te, pois, na senda da
açäo desinteressada, j que tal buddhi-yoga, ou equilíbrio na açäo desinteressada,
certamente a arte da açäo.

Verso 51
Homens sábios, de inteligência constante, liberam-se do cárcere do nascimento, renunciando
aos frutos que surgem da açäo. Assim, eles entram naquele estado de tranquilidade divina que
só devotosalcançam.

Verso 52
Portanto, quando tua inteligência emergir plenamente da densa floresta da ilusäo, serás
indiferente a todas trivialidades dantes ouvidas ou a serem ouvidas no futuro.

Verso 53
Depois disso, quando tua inteligência näo mais se perturbar pelas várias interpretaçöes dos
Vedas, entäo, permanecendo naturalmente fixo no transe indesviável (samadhi), alcançarás a
senda da devoçäo pura.

Verso 54

27
Arjuna disse: " Keshava, quais säo os sintomas de pessoas corretamente ajustadas que
estäo absortas em meditaçäo perfeita? Que dizem e como respondem aos objetos dos sentidos
externos, tanto em público como na privacidade? Desejo saber como se conduzem em seus
empreendimentos.

Verso 55
O Senhor Supremo disse: " Partha, aquele que, tendo abandonado todas aspiraçöes
mundanas, saboreia o êxtase da plena auto-satisfaçäo interna dentro de seu casto
coraçäo, deve ser conhecido como uma pessoa de sabedoria corretamente ajustada.

Verso 56
Aquele que näo se perturba com as triplas misérias, näo se interessa pelos prazeres
mundanos, e que est livre de apego, medo e ira, conhecido como um sábio de
inteligência corretamente ajustada.

Verso 57
Aquela pessoa livre de afeiçäo mundana, que näo se regozija nem se ressente em face de
bençäos mundanas ou maldiçöes, certamente uma pessoa cuja inteligência est firmemente
estabelecida em transe divino.

Verso 58
Ao controlar seus sentidos retraindo-os totalmente dos objetos dos sentidos por meio da
vontade, assim como a tartaruga retrai seus membros em seu casco, entäo a inteligência
dela se estabelece perfeitamente.

Verso 59
Embora a pessoa de consciência corporal grosseira possa evitar os objetos dos sentidos através
da renúncia externa, sua avidez pelo desfrute dos sentidos permanece internamente. Entretanto,
apego interno aos objetos dos sentidos denunciado espontaneamente pela pessoa de
inteligência corretamente ajustada, devido àquela pessoa j ter tido um vislumbre da beleza
todo-atrativa da Verdade Suprema.

Verso 60
" filho de Kunti, mesmo a mente de um homem de säo juízo que aspira liberaçäo,
forçosamente arrebatada pelos sentidos mentalmente agitantes (contudo näo existe tal
possibilidade para aquele cujo coraçäo se tornou atraído por Mim).

Verso 61
Através da prática da devoçäo perfeita a Mim, o bhakti-yogi coloca seus sentidos sob
controle adequado. Aquele cujos sentidos estäo controlados verdadeiramente inteligente.

Verso 62
Por outro lado, quando uma pessoa que experimenta a senda näo-devocional da renúncia
contempla os objetos dos sentidos, gradualmente ela se apega a estes e nasce o desejo. O
desejo surge do apego, e quando o desejo impedido por força, nasce a ira.

Verso 63

28
Da ira, surge a ilusäo, e o poder da ilusäo causa esquecimento; esquecimento destroi a boa
inteligência, e quando a inteligência falha, perde-se tudo.

Verso 64
Contudo, um verdadeiro devoto na senda da renúncia em devoçäo (yukta-vairagya) age
exclusivamente para Minha satisfaçäo transcendental. Abandonando o apego e a inveja,
embora aceitando os objetos dos sentidos com seus sentidos controlados, ele atinge o pleno
contentamento do coraçäo.

Verso 65
Quando se consegue o contentamento do coraçäo, todas misérias säo vencidas. A inteligência
de uma pessoa assim breve se torna plenamente fixa na sua meta desejada. Portanto,
somente pela bhakti, devoçäo, pode-se obter um coraçäo tranquilo.

Verso 66
Uma pessoa com os sentidos sem controle, näo tem poder para julgar, e seus pensamentos
säo sem sentido. Quem näo tem pureza de pensamento näo consegue alcançar a paz, e sem paz
de espírito, como pode alguém esperar atingir verdadeira felicidade?

Verso 67
Assim como um barco no oceano empurrado para l e para c pelos ventos desfavoráveis,
similarmente, a mente que corre atrás dos sentidos que vagam pelos objetos sensuais, rouba a
inteligência da pessoa desajustada, desocupada.

Verso 68

Portanto deves saber, " conquistador do inimigo, que aquele cujos sentidos foram
completamente retraídos dos objetos dos sentidos através da renúncia em devoçäo, yukta-
vairagya, certamente um homem de inteligência perfeitamente ajustada.

Verso 69
Ao passo que consciência espiritual como a noite para os seres vivos encantados pelo
materialismo, a alma auto-realizada permanece desperta, saboreando diretamente o divino
êxtase de sua ininterrupta inteligência espiritual. Pelo contrário, a consciência da pessoa
materialista viciada em desfrute sensorial como a noite para a pessoa auto-realizada que
completamente indiferente a tais atividades. As almas realizadas, indiferentes ao mundano,
estäo sempre cheias de júbilo no extático plano divino, enquanto a massa geral se encanta
por caprichos mundanos passageiros destituídos de júbilo espiritual. (Este o significado
essencial)

Verso 70
O oceano incomensurável, sempre pleno em si, nunca se perturba embora muitos rios e
córregos entrem nele. Semelhantemente, uma pessoa de inteligência constante nunca se agita
se tentaçöes sensuais provocantes penetrarem nela. Portanto, s" ela alcança a paz, que para
sempre inalcançável para os buscadores dos prazeres.

Verso 71

29
Abandonando todo tipo de desejos sensuais, desapegada dos objetos dos sentidos, livre do
falso-ego e falso sentido de posse, certamente uma pessoa assim obtem a tranquilidade, tendo
entrado em seu relacionamento divino com a Verdade Absoluta.

Verso 72
" Partha, isto conhecido como o estágio positivo de realizaçäo da Verdade Absoluta Eterna,
que ao ser alcançada, permite que a pessoa nunca mais se iluda pelo curso da existência
mundana. Mesmo na hora da morte, o simples alcançar momentaneamene este estado j leva
a pessoa morada divina.

CAPITULO TRES
Karma-yoga

A SENDA DA AÇÄO

Verso 1
Arjuna disse: " Janardana, " Keshava, se consideras que inteligência espiritual resoluta e
determinada (vyavasayatmika-buddhi) melhor que açäo em bondade e paixäo, entäo porque
me ocupas na violenta atividade da guerra?

Verso 2
Minha inteligência est confusa por Tuas palavras. Parecem ambíguas, às vezes
apoiando açäo e às vezes apoiando conhecimento. Entäo por favor instrui-me sobre
qual dessas duas sendas mais benéfica para mim.

Verso 3
O Senhor Supremo replicou: J descrevi os dois tipos de f que encontramos no mundo.
Estabeleci que os sábios que estäo conscientes do mundo consciente, e aqueles que estäo
ativos principalmente no plano mundano, ambos se ocupam na (rudimentar) prática da senda
da devoçäo (sadhana bhakti-yoga) ao seguirem respectivamente a senda do conhecimento e
a senda da açäo desinteressada oferecida ao Senhor. De fato, a escada que leva terra da
dedicaçäo uma, enquanto que s" a f de dois tipos, conforme o degrau alcançado pelos
aspirantes.

Verso 4
Sem realizar deveres recomendados pelas escrituras näo se pode obter conhecimento que leve
libertaçäo da açäo e reaçäo. Como pode uma pessoa de coraçäo impuro obter perfeiçäo por
abandonar seus deveres prescritos?

Verso 5
Ninguém pode permanecer sem agir mesmo por um momento sequer. Todos säo forçados a
agir inevitavelmente, estimulados pelos modos da natureza material. Portanto, incorreto
para uma pessoa de consciência impura, rejeitar os deveres purificatórios prescritos nas
escrituras.

30
Verso 6
Aquele que externamente restringe suas mäos, pernas, e outros sentidos de açäo, mas cuja
mente permanece nos objetos dos sentidos, um tolo. Saiba que um hipócrita.

Verso 7
" Arjuna, a pessoa casada que j controlou seus sentidos através da mente, e que, sem apego,
começou a realizar karma-yoga através de seus sentidos ativos, muito superior a um tal
hipócrita.

Verso 8
Realiza tuas abluçöes, adoraçäo, e outros deveres diários. J que at mesmo a manutençäo do
corpo näo possível sem açäo, melhor para uma pessoa desqualificada realizar seu dever, em
vez de renunciar ao mesmo. Abandonando atividades fruitivas e realizando regularmente
teus deveres obrigatórios diários, teu coraçäo ser gradualmente purificado. Entäo,
ultrapassando o plano da renúncia, alcançarás a devoçäo pura, além do plano mundano.

Verso 9
O dever desinteressado realizado como uma oferenda ao Senhor Supremo chama-se yajna,
ou sacrifício. " Arjuna, toda açäo realizada por qualquer outro motivo a causa do
aprisionamento neste mundo de repetidos nascimentos e mortes. Portanto, permanecendo
desapegado dos frutos da açäo, realiza todos teus deveres dentro do espírito de tal sacrifício.
Açäo desse tipo o meio para se entrar na senda da devoçäo, e com o despertar da verdadeira
percepçäo do Senhor, tornar possível obter devoçäo pura, sem mistura, livre de todas
qualidades materiais (nirguna-bhakti).

Verso 10
No início da criaçäo, o Senhor Brahma criou o povo junto com os sacrifícios ao Supremo
Senhor Vishnu. Brahma instruiu assim: "Refugiando-vos nesse princípio de sacrifício,
prosperai e florescei. Possa este sacrifício realizar todos vossos desejos."

Verso 11
"Propiciai os semideuses através desse sacrifício - e aqueles deuses, assim satisfeitos,
poderäo satisfazer-vos concedendo-vos todo sucesso desejado. Dessa forma, através da
boa-vontade mútua, sereis receptáculos de grande auspiciosidade."

Verso 12
Os semideuses, que säo partes integrais de Minha manifestaçäo externa, certamente
concedem todas vossas necessidades, estando satisfeitos pela realizaçäo de sacrifício. Pela
graça dos semideuses, que estäo todos sob Minha proteçäo, h suficiente chuva, luz do sol,
e outros elementos para prover amplos artigos de alimentaçäo. Aquele que desfruta
egoísticamente dessas dádivas sem oferec-las aos deuses (geralmente através dos cinco grandes
sacrifícios) incorre em todos pecados do ladräo.

Verso 13
Almas virtuosas libertam-se de todos pecados decorrentes dos cinco diferentes tipos de
violência contra todas entidades vivas, por aceitarem os restos dos alimentos dos cinco
grandes sacrifícios oferecidos aos semideuses universais (*).

31
(*) Os restos de alimentos aqui mencionados näo säo o mesmo que a prasada, ou alimento
santificado aceito pelos devotos exclusivos do Senhor Supremo, Sri Krishna. Todos comestíveis
aprovados dos devotos puros primeiramente säo oferecidos ao Senhor, e assim estes näo
acumulam nem piedade nem pecado. Vide capítulo 9.20-26.

Verso 14
A partir do alimento, surgem os seres vivos, e das chuvas, se produz o alimento. Pela
realizaçäo de sacrifício, ocorrem as chuvas, e o sacrifício nasce da açäo.

Verso 15
A açäo surge dos Vedas, e estes se originam no Akshara, o Uno Infalível. Portanto, o omni-
penetrante, infalível Senhor Supremo est eternamente situado dentro dos atos de sacrifício
oferecidos a Ele.

Verso 16
" Arjuna, um homem quer esteja no estágio da açäo ou do conhecimento, que näo segue
esse sistema causal cíclico diretamente estabelecido pelo Supremo Senhor, certamente leva
uma vida pecaminosa. Tal desfrutador compulsivo dos sentidos mantém sua vida em väo.

Verso 17
Entretanto näo h dever pendente para quem se deleita dentro do Eu Interior, somente se
regozija no Eu Supremo, e est plenamente satisfeito internamente. Este trabalha apenas pelas
necessidades mínimas de manutençäo do corpo.

Verso 18
Neste mundo, uma pessoa auto-realizada que se regozija na alma näo acumula piedade
através da realizaçäo de açöes, nem incorre em pecado por abster-se de seus deveres. Dentre
todas entidades vivas, desde as mais elevadas formas de vida do planeta do Senhor Brahma at
ao mundo dos organismos imóveis, ela nunca depende de ninguém para qualquer necessidade
pessoal.

Verso 19
Portanto, abandonando qualquer apego aos frutos da açäo, sempre realiza tuas atividades
prescritas como uma questäo de dever. Pela realizaçäo contínua da açäo sem apego, uma
entidade viva alcança a liberaçäo. E a verdadeira liberaçäo o estado de devoçäo
exclusiva, alcançado na maturidade final da açäo desinteressada (nota da tradutora: i.e.
sem ego).

Verso 20
O rei Janaka e outras personalidades eruditas alcançaram a perfeiçäo por realizar esses
deveres prescritos. Portanto, correto realizares teu dever para a instruçäo das massas.

Verso 21
As massas em geral imitam os modos de grandes homens. Elas seguem aquilo que a grande
personalidade aceita como a conclusäo correta.

32
Verso 22
" Arjuna, Eu, o Senhor Supremo, näo possuo qualquer tipo de dever nos três mundos, j que näo
h nada que Me seja necessário obter ou que Me falte obter; e contudo, pessoalmente, sou ativo.

Verso 23
" Arjuna, se Eu Me abstiver da atividade, entäo todos homens, seguindo Meus passos,
abandonaräo seus deveres.

Verso 24
Se Eu näo realizar deveres, entäo, seguindo Meu exemplo, todos habitantes destes mundos
renunciaräo a seus deveres e em decorrência advir a ruína. Portanto serei a causa de
tumulto social devido populaçäo desvirtuosa, e dessa forma, serei responsável por arruinar
a posteridade.

Verso 25
" Arjuna, assim como as pessoas ignorantes, apegadas, tem que trabalhar, os sábios também
tem que trabalhar, porém sem apego, a fim de proteger o svadharma ou princípios religiosos
daqueles que säo competentes para seguirem a senda da açäo. A diferença näo est nas açöes
destas duas classes de homens, mas em suas respectivas atitudes de apego e indiferença.

Verso 26
Os sábios defensores da senda do conhecimento näo devem confundir os homens ignorantes,
apegados, desviando-os com o conselho para deixarem de lado a açäo e cultivarem o
conhecimento. Em vez disso, controlando suas próprias mentes, os sábios devem realizar os
vários deveres todos sem desejar os resultados, e dessa forma, subsequentemente ocuparem a
seçäo comum em açäo.

Verso 27
As várias atividades todas säo de qualquer maneira executadas pelos (sentidos ativados
pelos) modos da natureza material. Porém um homem iludido por se identificar com seu
corpo e suas extensöes pensa: "Eu estou realizando isto sozinho."

Verso 28
Contudo, " Arjuna dos braços poderosos, aquele que tem pleno conhecimento da
classificaçäo dos modos materiais de bondade, paixäo, e ignorância, e suas respectivas
funçöes pertinentes aos semi-deuses, os sentidos, e os objetos dos sentidos - este näo se afirma
falsa e egoisticamente como o realizador da açäo, sabendo muito bem que os sentidos (ouvidos,
pele, olhos, língua e nariz) distribuídos pelas deidades que os controlam, estäo simplesmente se
ocupando com seus respectivos objetos dos sentidos desejáveis (audiçäo, tato, visäo, paladar e
olfato).

Verso 29
Uma pessoa influenciada pelos modos da natureza material como um homem possuído por
um fantasma. Completamente cativada, ela fica viciada no desfrute sensual de vários objetos
dos sentidos. Quem goza de plena sabedoria näo deve agitar tais pessoas ignorantes, de
mente obtusa (e desqualificada) revelando-lhes verdades filosóficas. Em vez disso, deve
instru!-los na realizaçäo da açäo destituída de desejo pelo desfrute sensorial, porque tal açäo

33
anula o encanto dos modos da natureza.

Verso 30
Entrega todas tuas atividades a Mim com a seguinte compreensäo: "Todas minhas açöes
estäo sob o controle do Senhor que habita meu interior." Em tal consciência, livre de toda
sensaçäo de posse e lamentaçäo, recorra batalha (como teu svadharma, dever natural).

Verso 31
Homens fiéis e sem inveja ou m vontade que constantemente praticam esta senda da yoga
da açäo desinteressada conforme favorecida por Mim, alcançam a liberaçäo do enredamento
pela açäo - embora sejam ativos.

Verso 32
Entretanto aqueles que, por inveja, näo seguem estes Meus ensinamentos, estäo
destituídos de toda razäo. Reconheça que tais homens säo completamente ignorantes e
fadados ruína.

Verso 33
Mesmo uma pessoa sábia tende a agir conforme sua natureza, isto é, suas más inclinaçöes
inerentes. Portanto, o resultado dos esforços das entidades vivas para agirem dessa forma
tornarem-se escravizadas por tais inclinaçöes. Entäo, näo conseguem mais ser disciplinadas
pelo temor seja das puniçöes escriturais ou legais.

Verso 34
Embora os sentidos sejam inevitavelmente atraídos ou repelidos por seus vários respectivos
objetos dos sentidos, näo seja subjugado por tais caprichos - eles säo o maior inimigo do
candidato auto-realizaçäo (Aqui näo se indica o apego devocional e desapego).

Verso 35
melhor realizar nossos próprios deveres um tanto imperfeitamente que realizar
impecavelmente o dever de outrem. Saiba que mesmo a morte auspiciosa no
desencargo de nossos deveres apropriados a nossa posiçäo natural dentro do sistema ordenado
sócio-religioso, pois seguir o caminho de outrem perigoso.

Comentário

Devoçäo pura a Adhoksaja, o Senhor que est além do escopo da compreensäo sensual, a
super-excelente funçäo natural eterna da alma. Portanto, mesmo se tal funçäo parecer
externamente abominável, sempre bem superior conduta considerada boa segundo
estimativa da moral mundana, que sempre prejudicada pelos modos materiais da bondade,
paixäo, e ignorância. Na companhia de verdadeiros santos, a prática progressiva do cultivo
de tal devoçäo pura que concede o mérito máximo, mesmo se ocorrer a morte. Como a
intuiçäo baseada na ignorância que leva a realizar práticas "boas" imprevisíveis, ilegítimas
ainda permanece em dvityabhinivesa, ou seja, absorçäo em qualquer outro objeto sem ser o
Senhor Supremo, tais práticas säo bhayavah - simplesmente levam ao mêdo.

bhayam dvityabhinivesatah syad-

34
isad apetasya viparyayo 'smrtih
tan mayayato budha abhajet tam
bhaktyaikayesam guru-devatatma
(Bhag.11.2.37)

"Porque as pessoas que säo aversivas ao serviço devocional do Senhor Supremo se


esqueceram de suas próprias identidades internas (de servos do Senhor) devido açäo de
maya, a potência ilusória do Senhor, elas permanecem no falso ego de considerarem o corpo
como seu eu. Quando a atençäo est absorta em objetos mundanos exclusäo do Supremo
Senhor Sri Krishna, a pessoa experimenta medo devido ao corpo, família, amigos, possessöes,
e assim por diante. Portanto, uma pessoa de inteligência refinada adorar o Senhor com
exclusiva devoçäo, sabendo que o guru näo diferente do Senhor como Seu mais querido servo."

Verso 36
Arjuna indagou: " descendente dos Vrshnis, quem compele a entidade viva a cometer
atividades pecaminosas, mesmo contra sua própria vontade?

Verso 37
O Senhor Supremo respondeu: certamente a luxúria, que nasce do modo da paixäo, que induz
uma pessoa a cometer pecados. A luxúria a base do desejo para desfrute sensorial, e
em diferentes situaçöes essa luxúria se transforma em ira. totalmente insaciável e
extremamente maliciosa. Saiba que essa luxúria por si s" a maior inimiga da entidade viva
neste mundo.

Verso 38
Assim como o fogo toldado pela fumaça, tal como um espelho com grossa camada de poeira,
e como o embriäo que permanece completamente encerrado no ventre, semelhantemente,
essa luxúria encobre a consciência da entidade viva em três graus de intensidade,
conforme os três modos da natureza material - bondade, paixäo, e ignorância,
respectivamente.

Verso 39
" Arjuna, essa luxúria com sua nesciedade subjacente a perpétua inimiga do homem de
conhecimento. Como o fogo que nunca est satisfeito (por oferendas de manteiga clarificada),
ela encobre o bom senso de julgamento do ser humano.

Verso 40
dito que os sentidos, a mente, e a inteligência säo os ninhosfavoritos dessa terrível inimiga
chamada luxúria. Encobrindo o bom senso da entidade viva, a luxúria o engana através
desses canais, e o lança no atoleiro do materialismo grosseiro.

Verso 41
Portanto, " mais nobre dos Bharatas, tratando de primeiro trazer seus sentidos sob controle,
desfere abertamente o golpe mortal nessa luxúria, a encarnaçäo do pecado que arruina tanto
jnana (conhecimento discriminativo do Eu e do näo-eu, conforme delineado nas
escrituras) e vijnana (subsequente realizaçäo em consciência divina).

35
Verso 42
Os sábios proclamam que os sentidos säo superiores aos objetos inertes, a mente superior
aos sentidos, e a faculdade da inteligência resoluta superior mente. E aquele que
superior inteligência a própria alma.

Verso 43
" poderoso Arjuna! Sabendo que a alma portanto distinta da inteligência, estabiliza tua
mente com inteligência resoluta e destrói a implacável inimiga, luxúria.

CAPITULO QUATRO
Jnana-yoga

A SENDA DO CONHECIMENTO DIVINO

Verso 1
O Senhor Supremo disse: Antigamente, passei a Surya esta imutável senda do
conhecimento, que se alcança pela açäo desinteressada (nota da tradutora: sem falso-
ego). Surya, a deidade que preside o sol, passou-a para seu filho Vaivasvata Manu,
exatamente como tinha ouvido de Mim. Depois disso, Manu instruiu o mesmo conhecimento a
seu filho Iksvaku.

Verso 2
" conquistador do inimigo, dessa forma, os reis santos como Nimi, Janaka, e outros,
aprenderam essa senda do conhecimento através da sucessäo divina. Atualmente, depois de
ter passado longo período de tempo, esse ensinamento foi quase que completamente perdido.

Verso 3
Agora, vou passar-te esse ensinamento eterno. Porque és Meu devoto e amigo, essa senda
suprema, oculta hoje, est sendo revelada por Mim a ti.

Verso 4
Arjuna disse: Vivasvan, o Deus-Sol, nasceu na antiguidade, e Tu nasceste s" recentemente.
Portanto, como se pode acreditar que antigamente foste Tu quem deu instruçäo a ele
nesses ensinamentos?

Verso 5
O Senhor Supremo disse: " Arjuna, castigador do inimigo, tanto tu como Eu passamos por
muitos nascimentos anteriormente. Devido a Minha posiçäo como o controlador supremo, sou
capaz de lembrar todos esses nascimentos, enquanto que tu, uma entidade viva de consciência
finita, näo o consegues.

Verso 6
Embora Minha forma eterna seja transcendental ao nascimento e morte, e Eu seja o
controlador de todos seres, apareço no mundo em Minha forma original, por Minha própria
doce vontade, estendendo Minha potência interna de yoga-maya.

36
Verso 7
" Bharata, sempre que existe um declínio da religiäo e um aumento da irreligiäo, apareço
pessoalmente, como um ser nascido neste mundo.

Verso 8
Apareço em cada era a fim de salvar os devotos santos, derrotar os descrentes pecaminosos,
e para estabelecer firmemente a verdadeira religiäo.

Verso 9
" Arjuna, quem realmente percebe Meu sobre-humano nascimento e atividades encenados
por Minha doce vontade, näo ter que se submeter a novo nascimento. Depois de abandonar
seu atual corpo, tal pessoa Me alcança. Tendo se tornado subserviente para Meu divino
prazer (hladini-shakti) na forma de Minha potência divina revelada, tal alma alcança serviço
devocional eterno a Mim.

Verso 10
Livres da paixäo mundana, temor, e ira, muitas pessoas tem se refugiado em Mim,
absorvendo seus coraçöes em ouvir sobre Mim, cantar Minhas divinas glórias, e lembrar de
Mim. Tendo se tornado profundamente purificadas pelo conhecimento sobre Mim e pela
penitência tolerada por amor a Mim, elas alcançaram amor divino por Mim.

Verso 11
Conforme uma pessoa se refugia em Mim, respondo-lhe de acordo. Sendo a meta final de
todas filosofias e doutrinas, Eu sou o objetivo a ser atingido por todos. Certamente, " Partha,
todos homens seguem Meus vários caminhos.

Verso 12
Pessoas mundanas que desejam sucesso fácil na vida material adoram Indra e outros
semideuses. Tal adoraçäo rapidamente proporciona o fruto de seu esforço nesse mundo, como
por exemplo alcançar o céu.

Verso 13
S" Eu criei na sociedade humana as quatro divisöes do varna (brahmana, etc.) de acordo
com a graduaçäo apropriada das qualidades materiais (bondade, etc.) e deveres (controle
dos sentidos, etc.). Em todo mundo, näo existe outro criador parte de Mim. Näo obstante,
embora Eu seja o criador da graduaçäo natural da sociedade humana (varna-dharma),
deves conhecer-Me como näo-agente pois sou superior, transcendental aos modos da natureza
material, e imutável.

Verso 14
Nunca sou envolvido pela lei do karma, a qual criei para realizar os destinos das entidades
vivas, tampouco jamais aspiro aos resultados da açäo. (Como sou o Senhor Supremo repleto
de todas seis opulências em toda plenitude, os mesquinhos frutos das açöes mundanas säo para
Mim totalmente insignificantes). Quem aprecia esse conceito de Minha singular independência
das açöes dos seres desse mundo, e que portanto consegue compreender Minha existência
imutável - tal pessoa nunca enredada por qualquer açäo. Por praticar serviço devocional
puro, certamente ela vem a Mim.

37
Verso 15
Conhecendo esse princípio básico, liberacionistas de épocas passadas renunciaram a toda
açäo fruitiva, e sem interesse provinciano realizaram todas suas atividades como uma
oferenda a Mim. Assim também, deves adotar esta senda da yoga da açäo desinteressada
(nota da tradutora: destituída de falso-ego) como o fizeram as grandes personalidades santas
do passado.

Verso 16
Mesmo homens muito sábios se confundem ao averiguarem a natureza da açäo e da inaçäo.
Alguns näo conseguem compreender a açäo, enquanto que outros näo conseguem
compreender a inaçäo. Portanto, agora vou ensinar-te sobre essa açäo e inaçäo,
conhecimento este, pelo qual obterás a liberaçäo desse mundo vil.

Verso 17
Deve-se compreender a açäo prescrita pelos Vedas, açäo proibida pelas escrituras e a renúncia
da açäo. A realizaçäo de deveres conhecida como açäo (karma); a realizaçäo de açöes
proibidas pecaminosa (vikarma); e a näo-realizaçäo da açäo, ou renúncia a açäo, conhecida
como inaçäo (akarma). extremamente difícil realizar o princípio interno de karma, vikarma e
akarma.

Verso 18
Quem compreende que a açäo desinteressada realizada pelo homem de pura sabedoria nunca
est sujeita ao enredamento e que portanto de fato inaçäo, ao passo que a abnegaçäo
praticada por um renunciante de coraçäo impuro a causa funesta de enredamento - este é,
dentre os homens, o yogi inteligente e de fato executor de todas obras.

Verso 19
Aquele cuja açöes todas säo destituídas de desejo fruitivo, e que imola todas açöes prescritas e
proibidas no fogo do conhecimento puro, descrito pelos conscienciosos como um homem de
verdadeira sabedoria.

Verso 20
Renunciando ao apego pelos frutos da açäo, plenamente contentes no êxtase eterno interno,
e indiferentes segurança das aquisiçöes mundanas e preservaçäo - tal pessoa näo faz
nada, embora esteja plenamente ocupada. Isto é, ela nunca est enredada pelos frutos de
suas açöes.

Verso 21
Tendo renunciado a todas aspiraçöes pelo desfrute fruitivo e todos esforços excessivos pela
aquisiçäo mundana, mantendo sua mente e corpo subjugados pela inteligência (desenvolvida),
se tal pessoa at mesmo se ocupar de açäo ilegítima para seu sustento corpóreo mínimo,
nenhuma reaçäo pecaminosa ou piedosa decorerr para ela.

Verso 22
Satisfeita com aquilo que estiver prontamente disponível, e nunca subjugada pela dualidade
baseada no prazer e na dor ou no apego e no ódio, tal pessoa se precav contra o desejo.

38
Ela equilibrada, näo se exalta, e nem se deprime diante do sucesso ou insucesso. Portanto,
ela nunca se enreda por qualquer açäo.

Verso 23
Todas açöes säo perfeitamente dissipadas quando realizadas dentro do espírito de sacrifício,
pelas almas desapegadas, liberadas, iluminadas. (As açöes do trabalhador na senda da
açäo
sem interesse próprio näo levam consequência de apurva, conforme postulado pela seçäo
karma-mimamsaka)

Comentário

Segundo a ideologia ética porém ateísta, os filósofos karma-mimamsaka (racionalistas


mundanos) afirmam que açöes piedosas produzem uma potência invisível, sutil, conhecida
como apurva, a qual deve frutificar na hora apropriada após a morte. O conceito deles de que
esse fruto mais tarde pode ser partilhado pelos outros, destina-se a demonstrar a eternidade do
karma, ou açäo, porém negligencia a presença do Supremo Autocrata. Assim a declaraçäo
de Sri Krishna, samagram praviliyate, "Todas açöes säo dissipadas" näo deve ser mal
interpretada como significando que as açöes das almas liberadas causaräo alguma remota
consequência mundana, ou apurva. Em vez disso, o Senhor aponta claramente que as açöes
puras a Ele oferecidas pelo karma-yogi puro e sem interesse próprio, näo causam qualquer
reaçäo subsequente a ser desfrutada ou sofrida pelos outros nesse plano mundano.

Verso 24
Segundo os princípios básicos do sacrifício, a colher sacrificial, a concha, e outras
parafernálias, as várias oferendas com manteiga clarificada, o fogo sacrificial, o
sacerdote que est realizando o sacrifício, e o ato de oferecer o sacrifício e sua recompensa -
todos säo da natureza de Brahman, o Absoluto. Uma pessoa que, com esta compreensäo,
est constantemente absorta em açäo divina com atençäo uni-direcionada, certamente
alcança o plano divino do Absoluto.

Verso 25
Outros karma-yogis realizam sacrifício em adoraçäo aos semideuses tais como Indra e Varuna.
Outros jnana-yogis, simplesmente por vibrarem o pranava-mantra, Omkara, oferecem a alma
individual (como a manteiga clarificada sacrificial) Superalma (como o fogo sacrificial).

Verso 26
Celibatários estritos oferecem seus sentidos da audiçäo, tato, visäo, paladar e olfato dentro
do fogo sacrificial do controle mental. Chefes-de-família ocupados em seus deveres
naturais (svadharma) oferecem como sacrifício os objetos sensoriais do som, tato, forma,
paladar e olfato dentro do fogo dos sentidos.

Verso 27
Os yogis monistas (liderados pela escola de Patanjali) que aspiram alcançar o estado de
retraimento da alma dos objetos sensoriais (pratyagatma), oferecem todos sentidos e suas
funçöes de ouvir, ver, etc., bem como todas dez vitais correntes de vida (nota da tradutora: os

39
dez ares vitais da yoga, ou pranas) e suas funçöes ao fogo da auto-purificaçäo aceso pelo
conhecimento.

Verso 28
Algumas pessoas inclinam-se a realizar sacrifício dando artigos em caridade, algumas por
penitências rígidas encabeçadas porchandrayana, algumas por adotar a prática da yoga
mística óctupla, e ainda outras, pelo recitar e estudo das escrituras védicas. Todas essas
pessoas säo muito diligentes em suas práticas e adotam votos estritos.

Verso 29
Outros praticam o controle da respiraçäo. Travando a narina direita e inalando através da
esquerda, elas fazem com que o ar ascendente entre em uniäo com o descendente; fechando a
narina esquerda e exalando pela direita, semelhantemente elas oferecem o ar descendente ao
ascendente; e por fim, tapando ambas narinas, elas param tanto o ar ascendente quanto o
descendente. Ainda outros aspirantes ao auto-controle oferecem todos sentidos ao ar-vital
diminuindo sua ingestäo de alimentos.

Verso 30
Todas essas pessoas conhecem bem os princípios do sacrifício. Tendo se purificado dos
pecados pela realizaçäo do sacrifício, elas desfrutam de seus restos na forma de prazer dos
sentidos, fortuna, e perfeiçöes yoguicas. E ao final, elas alcançam o plano eterno do
Absoluto, anteriormente mencionado.

Verso 31
" Arjuna, maior dos Kurus, uma pessoa que nunca realiza sacrifício nunca conseguir
obter os parcos prazeres desse mundo; como entäo seria possível a ela obter outros mundos, tais
como o céu?

Verso 32
Todas essas variedades de sacrifício säo mencionadas ou nos Vedas ou nas suas escrituras
ligadas. Todas nascem de açöes vocais, mentais, e corpóreas, e portanto sua origem a açäo.
Quando se consegue conceber o princípio da açäo (karma) dessa maneira, se pode obter
liberaçäo de seu enredamento.

Verso 33
" Arjuna, subjugador do inimigo, dentre esses vários sacrifícios, o sacrifício do conhecimento
conforme mencionado, brahmagnav apare... bastante superior ao sacrifício de vários
artigos, indicado pelo brahmarpanam brahma havih..., porque toda açäo afinal culmina em
conhecimento.

Verso 34
Serás capaz de obter todo esse conhecimento ao satisfazer o mestre espiritual iluminado com
reverências prostradas, perguntas relevantes, e serviço sincero. Grandes almas que säo
mais peritas no conhecimento das escrituras e dotadas de realizaçäo direta da Suprema
Verdade Absoluta ensinar-lhe-äo tal conhecimento divino.

Verso 35

40
" Pandava, após receber esse conhecimento da verdade conforme revelado pelo guru, näo
mais serás iludido. Conseguirás realizar que todas espécies de vida, seja o homem, aves ou
bichos, possuem em comum sua identidade individual de almas espirituais, ou jivatma.
Seus graus mundanos comparados s" säo devido a atributos externos, e estäo todas
situadas em Mim como efeito, j que sou a causa suprema.

Verso 36
Mesmo que tenhas levado a mais abominável vida pecaminosa, atravessarás o oceano de
todas misérias por embarcar no barco do conhecimento.

Verso 37
Assim como um fogo ardente reduz a madeira e tudo o mais que estiver nele a cinzas, "
Arjuna, assim também o fogo do conhecimento consome toda açäo.

Verso 38
Dentre as práticas ante-mencionadas de sacrifício, austeridade, e yoga, näo h nada täo puro
como o conhecimento divino. Após muito tempo, a pessoa que alcançou a perfeiçäo em sua
prática de açäo desinteressada (sem ego) realiza tal conhecimento espontaneamente
dentro de seu coraçäo.

Verso 39
Após purificaçäo interna através de açäo näo-fruitiva, surge o conhecimento genuíno. Tal
conhecimento obtido pelo teísta inteligente, de sentidos controlados, que aceita este
significado escritural, e que com sublime f permanece devotado senda da açäo
desinteressada (nota da tradutora: sem falso-ego). Rapidamente ele obtém a profunda
tranquilidade de erradicar o ciclo vicioso de nascimento e morte recorrente.

Verso 40
Quem for um tolo destituído de conhecimento das escrituras, igual a um animal ignorante; ou
quem, apesar de possuir conhecimento das escrituras, carente de f na substância delas, por
estar distraído por muitas filosofias diferentes; ou quem possue alguma fé, porém pensa: "Terei
sucesso ou näo?" - qualquer pessoa cujo coraçäo for assim tomado pela dúvida nunca poder
alcançar a verdadeira boa fortuna. Tal alma que duvida näo alcança a felicidade nem
nesta e nem na outra vida, j que a ansiedade da incerteza se sobrepöe sua paz.

Verso 41
" Dhananjaya, após renunciar a todas açöes seguindo a senda da açäo desinteressada (sem
falso-ego), quem destroi todas dúvidas ao seguir a senda do conhecimento divino e realiza sua
natureza divina interna, certamente nunca poder ser implicado por qualquer açäo.

Verso 42
Portanto, " Bharata, com a espada do conhecimento divino, despedaça todas essas
dúvidas em teu coraçäo, as quais nascem somente da ignorância. Refugia-te no dever
desinteressado (nota da tradutora: sem falso-ego, abnegado) e levanta-te para a batalha.

41
CAPITULO CINCO
Karma-sannyasa-yoga

A SENDA DA DIVINA HARMONIA

Verso 1
Arjuna disse: " Krishna, após me instruires na renúncia da açäo, estás novamente advogando a
senda da açäo desinteressada. Portanto, por favor d -me uma clara compreensäo quanto a qual
das duas mais benéfica para mim.

Verso 2
O Senhor Supremo disse: Tanto a renúncia da açäo e a senda da açäo desinteressada säo
altamente benéficas. Contudo, entre as duas, terás de compreender que a aplicaçäo da açäo
desinteressada superior.

Verso 3
Deve-se saber que aquele que est livre da dualidade da atraçäo e do ódio, e que nem deseja
nem abomina os frutos da açäo, permanece um renunciado muito embora ainda se ocupe
em atividades. Porque, " Arjuna de braços fortes, tal pessoa mui facilmente obtem liberaçäo
deste plano mundano de enredamento.

Verso 4
Os sábios näo apoiam a opiniäo dos racionalistas mundanos tolamente infantis
(conhecidos como karma-mimamsakas*) que sustentam que a senda da renúncia (sankhya-
yoga) e a senda da açäo (karma-yoga) säo separadas. Quem segue cuidadosamente
qualquer uma destas sendas alcançar o mesmo resultado.

* vide 4.23

Verso 5
A meta obtida pela renúncia à açäo também se alcança realizando açäo desinteressada (sem
falso-ego). Quem por meio de cuidadosa análise souber que ambas destas sendas säo uma e
mesma coisa só, certamente conhece o verdadeiro significado delas.

Verso 6
" poderoso herói, com excessäo da açäo desinteressada, a mera renúncia da açäo a causa do
sofrimento. Porém o homem sábio que se ocupa na açäo desinteressada alcança o Absoluto
mui rapidamente.

Verso 7
Ocupados na yoga desta maneira existem três tipos de chefes-de-família sábios (jnani-
grhastha): um de inteligência pura; um de mente controlada, e um de sentidos controlados.
Por suas práticas comparadas, os primeiros devem ser conhecidos como sendo superiores a este
último. Todos säo encarnaçäo da boa-vontade para com cada entidade viva. Embora
plenamente ativos, eles nunca säo implicados pela açäo.

Versos 8 e 9

42
Embora tal karma-yogi conhecedor da verdade realize todas atividades de ver, ouvir, tocar,
cheirar, comer, movimentar-se, dormir, respirar, falar, expelir dejetos, aceitar coisas, piscar os
olhos, e assim por diante, ele entende que: "Meus órgäos dos sentidos - olhos, ouvidos, pele,
nariz, e língua - estäo ocupados com seus respectivos objetos de forma, som, tato, olfato, e
paladar." Desta maneira, ele constantemente percebe que "Eu näo realizo nenhuma açäo."

Verso 10
Assim como uma folha de lótus näo se molha embora permaneça sobre a água, quem oferece
desinteressadamente todas suas açöes ao Senhor Supremo, permanece inafetado pelas reaçöes
pecaminosas ou piedosas.

Verso 11
Visando a purificaçäo da mente, karma-yogis abrem mäo de todos apego aos frutos da açäo e
realizam suas atividades com o corpo, mente, e inteligência. Ou de outra maneira, podem atuar
somente através de seus sentidos, com uma atitude de desinteresse.

Verso 12
O karma-yogi puro, sem motivaçäo material (niskama), abandonando o apego aos frutos de
sua açäo, obtém a paz constante, ou liberaçäo do trabalho reacionário. Mas o karmi
ambicioso (sakama), ou caçador de frutos, tem obsessäo pelo resultado de sua açäo, e torna-se
implicado por seus esforços.

Verso 13
Mentalmente renunciando todas açöes da maneira ante-mencionada, a alma de sentidos
controlados reside feliz dentro da morada corpórea de nove passagens - livre do falso-ego de
considerar-se o autor, embora externamente realize todas atividades - e livre do falso-ego de
considerar-se um inaugurador da açäo, embora ocupe os outros.

Verso 14
Devido tendência pela ignorância desde tempos imensuráveis, as entidades vivas agem,
considerando-se autoras ou inauguradoras da açäo. O Senhor Supremo näo gera esse conceito
equivocado de considerarem-se autores, e tampouco Ele gera as açöes delas ou seus apegos
pelos frutos destas açöes.

Verso 15
O plenamente auto-satisfeito Senhor Supremo tampouco aceita o pecado nem a piedade de
alguém. A consciência a natureza intrínsica das entidades vivas, mas elas ficam enamoradas
pelo corpo material, pensando que este seja elas próprias, devido ao fato que sua natureza
original est envolvida pela potência ilusória do Senhor.

Verso 16
O Conhecimento de dois tipos - prakrita, mundano, e aprakrita, divino. Conhecimento
mundano refere-se natureza material, e somente a nescidade das entidades vivas, ao passo
que o conhecimento divino genuína ciência. Para pessoas cujo conhecimento divino
despertou, o conceito mundano vencido e o supremo conhecimento delas, tal como um
poderoso sol nascendo, revela a Suprema Realidade.

43
Verso 17
Aqueles cuja ilusäo antes foi afastada pelo conhecimento, começam a saborear em seus
coraçöes o ouvir e cantar de Minhas infindáveis glórias, tendo devotado seus pensamentos
a Mim, meditado em Mim, e desenvolvido contínua devoçäo a Mim, o Senhor Supremo. E
entäo elas transcendem completamente este mundo.

Verso 18
As almas inteligentes que obtiveram qualidades divinas e abandonaram todo preconceito
mundano, percebem a transcendência absoluta dentro de todas entidades divinas - o humilde e
sábio brahmana, a vaca, o elefante, o cäo, ou o pária comedor de carne de cachorro. Portanto,
estas säo conhecidas como "panditas" - homens de verdadeira sabedoria.

Verso 19
Aqueles cuja mente equilibrada, j conquistaram esse mundo enquanto estäo nele
presentes, porque por seu equilíbrio espiritual estäo livres da atraçäo e da repulsa. Por isso,
embora permaneçam neste mundo, eles estäo eternamente situados na transcendência.

Verso 20
Plenamente situado na transcendência, dotado de inteligência constante, e livre da ilusäo de
pensar no corpo e parafernália associada como sendo "eu" e "meu", o conhecedor do Absoluto
nem se exalta demais por obter algo desejável, nem se abate por obter algo objetável.

Verso 21
Tal conhecedor da Verdade Absoluta, com a mente desapegada do prazer sensual,
inicialmente alcança a felicidade da auto-realizaçäo. Depois disso, ligando-se ao Absoluto,
ele alcança o júbilo inexaurível.

Verso 22
" filho de Kunti, todos prazeres que surgem do contato dos sentidos com seus objetos säo a
única causa do sofrimento, e estäo sujeitos a criaçäo e destruiçäo - säo todos temporários.
Uma pessoa ajuizada nunca se amarra em tais prazeres.

Verso 23
Saiba que aquele que, enquanto estiver vivo neste corpo, for capaz por meio da senda da yoga
da açäo desinteressada, de coibir os impulsos do desejo e da ira na raiz - tal pessoa est de fato
situada em uniäo com o Supremo, e conhece a verdadeira felicidade.

Verso 24
Tal seguidor da senda da yoga da açäo desinteressada que desfruta do êxtase interno, e que
experimenta auto-realizaçäo - obtendo percepçäo de sua identidade pura, consegue entrar no
plano do Absoluto.

Verso 25
Sem pecado, livres da dúvida, de mente controlada, e sempre ocupados em atividades para o
bem-estar das entidades vivas, aqueles que enxergam a verdade alcançam tal liberaçäo.

Verso 26

44
Aquelas pessoas da ordem renunciada que estäo livres do desejo e da ira, e que obtiveram
conhecimento da natureza original da alma, incondicionalmente alcançam liberaçäo tanto na
vida como na morte. Tal liberaçäo ocorre quando o corpo sutil mentalmente-incitado da pessoa
expira.

Versos 27 e 28
Expulsando da mente todos objetos externos dos sentidos do som, tato, forma, paladar e olfato,
fixando a vista num ponto a meio caminho entre as sombrancelhas, e praticando a disciplina
do equilíbrio suspendendo a inalaçäo e exalaçäo, subjugando os sentidos, mente, e
inteligência, assim nos dedicamos liberaçäo. Tendo vencido o desejo, temor, e ira, tal buscador
comtemplativo da alma sempre liberado, mesmo antes da morte do corpo.

Verso 29
Eu sou o desfrutador dos resultados de sacrifício realizado pelo caçador de frutos, bem como
dos resultados da austeridade realizada pelo que busca liberaçäo - Eu sou o único objeto
adorável deles; sou Narayana, o monitor imanente a todos planos da vida, e a Suprema
Personalidade Adorável que concede liberaçäo. E Eu sou o bem-querente de todos - Eu sou
Krishna, o amigo mais adorável dos devotos. A alma que dessa forma conhece Minha
verdadeira identidade, obtém o êxtase de conhecer sua própria identidade original divina.

CAPITULO SEIS
Dhyana-yoga

A SENDA DA MEDITAÇÄO

Verso 1
O Senhor Supremo disse: conheça o genuíno sannyasi e genuíno yogi como aquela pessoa
que realiza deveres obrigatórios conforme recomendado pelas escrituras, sem esperar os frutos
de suas açöes. Näo se sannyasi meramente por renunciar o sacrifício de fogo e outros deveres
prescritos, e näo se yogi meramente por se tornar fisicamente inativo.

Verso 2
" Arjuna, deves perceber a senda da açäo desinteressada louvada pelos sábios como abnegaçäo,
como sendo näo-diferente da senda óctupla da meditaçäo yoga. Isto porque sem renunciar ao
desejo fruitivo e sensual (que a característica essencial da senda da açäo desinteressada), nunca
se poder ser aceito como um yogi na senda da sabedoria ou um yogi na senda óctupla de
meditaçäo mística.

Verso 3
Inicialmente, dito que açäo por si s" a causa da elevaçäo do sábio desejoso de atingir
meditaçäo yoga constante. Quando ele consegue a meditaçäo contínua, a renúncia a toda
atividade delinea-se como a causa de seu perfeito transe em ioga.

Verso 4
Quando o praticante de yoga näo est mais viciado nos desfrutáveis objetos dos sentidos
como o som, tato, forma, paladar, e olfato, e quando ele näo se apega mais a qualquer açäo
procurando desfrutar da mesma, tendo alcançado completa renúncia de todos planos de tal açäo,

45
s" entäo que ele pode ser aclamado como alguém que verdadeiramente atingiu yoga.

Verso 5
A entidade viva precisa ser libertada do escuro poço da vida material por meio da mente
desapegada dos objetos dos sentidos, e nunca deve de maneira alguma ser lançada ao mundo
material pela mente encantada pelos objetos dos sentidos - porque a mente às vezes sua
amiga, e noutra situaçäo a mesma mente pelo contrário inimiga.

Verso 6
Para a alma que conquistou sua mente, esta sua amiga e bem-querente. Para uma pessoa
incapaz de control -la, sua própria mente permanece constantemente ocupada em seu des-
serviço, tal como um inimigo.

Verso 7
Livre da atraçäo e aversäo em face do frio e do calor, felicidade e infelicidade, honra ou insulto,
o yogi que dominou sua mente permanece profundamente absorto em transe yoguico.

Verso 8
Aquele que est sempre satisfeito internamente por força de sabedoria escritural bem como
pela realizaçäo direta, que est sempre situado em consciência divina, cujos sentidos säo
controlados, e que possue a visäo de igualdade tanto para um torräo de terra, uma pedra, e
ouro, conhecido como um yogi qualificado para a auto-realizaçäo.

Verso 9
E superior àquele que possue visäo equânime da terra, pedras e ouro, o yogi que capaz de
ver todas entidades vivas com inteligência equilibrada - um bem-querente natural, um bem-
querente afetuoso, um inimigo, uma pessoa indiferente, um mediador, alguém detestável,
um amigo, um santo, e um pecador.

Verso 10
Uma pessoa que est começando a prática da yoga deve sempre residir sozinha num local
solitário, e controlando sua mente e corpo, livre do desejo e de ocupaçöes sensuais, deve
ocupar sua mente no transe meditativo.

Versos 11 e 12
Num local puro, nem alto e nem baixo demais, o yogi deve estabelecer um assento seguro
feito de palha "kusha", pele de veado, e pano. Entäo, sentado sobre este assento, subjugando
toda atividade mental e sensual, e fixando sua mente num ponto único, deve praticar o transe
meditativo a fim de purificar seu coraçäo.

Versos 13 e 14
Tranquilamente mantendo seu tórax, cabeça e pescoço eretos e endireitados, equilibrado, o
yogi deve fixar sua mirada no topo de seu nariz sem lançar nenhum olhar em outra
direçäo. Tranquilo, destemido, e sereno no voto de celibato, ele deve entäo meditar em
Minha forma de quatro braços, Vishnu, e absorvendo-se em devoçäo a Mim, deve praticar
yoga.

46
Verso 15
Desta forma, absorvendo sua mente constantemente na yoga da meditaçäo (dhyana-yoga), o
yogi cujo coraçäo foi purgado dos desejos sensuais alcança a emancipaçäo da
mundaneidade por atingir o Brahman näo-diferenciado, a refulgência que emana de Minha
pessoa. Ele obtém liberaçäo do curso da existência mundana.

Verso 16
" Arjuna, a prática da yoga impossível para qualquer um que coma em excesso ou pouco
demais, que durma demais, ou a menos.

Verso 17
Para uma pessoa que come, relaxa e se exercita em todos seus deveres de maneira regulada,
e que adota horário regular adequado, a prática da yoga gradualmente se torna a fonte que
dissipa todo sofrimento mundano.

Verso 18
Quando um yogi, tendo coibido todas tendências mentais mundanas, situa sua mente sem
vacilar na concepçäo da alma, entäo, livre de desejos mundanos, diz-se que est de fato
situado em yoga, ou ligado ao Absoluto.

Verso 19
Saiba com certeza que assim como a chama de uma lamparina situada em local sem vento nunca
vacila, semelhantemente, a mente de um yogi absorto na concepçäo da alma nunca falha
em sua concentraçäo.

Versos 20 a 23
O estado de perfeito samadhi, ou transe, aquele no qual a mente disciplinada do yogi obtém
desapego at do mais tênue pensamento de conotaçäo mundana. O yogi permanece satisfeito
no Senhor apenas, tendo visto a Superalma diretamente devido a seu coraçäo purificado, e ele
experimenta essa felicidade que eterna, perceptível pela inteligência divina da alma, e livre de
contato com os sentidos ou objetos dos sentidos; ele nunca se desvia da natureza intrínseca da
alma. Atingindo tal estado, ele nunca considera qualquer aquisiçäo mundana como superior, e
em face de intolerável tribulaçäo seu coraçäo nunca vacila. Portanto, através do próprio
contato com o infortúnio, sobrevem sua ausência. Saiba que certamente tal estado de transe
perfeito se define como yoga. Tal yoga deve ser praticada com perseverança e um coraçäo
incansável.

Verso 24
Abandonando completamente todos desejos mentais junto com suas imagens mentais, em
plena consciência da futilidade da perspectiva mundana, deve-se retrair os sentidos de todos
objetos materiais e ocupar-se na prática da yoga antemencionada.

Verso 25
Com auxílio da inteligência controlada pelo dharana (o ramo da yoga óctupla na qual a
sede do intelecto levada concentraçäo), deve-se firmar a mente na alma. Entäo, pela
prática gradual, retraindo a mente dos objetos externos, deve-se entrar no transe de samadhi, e
näo se deve pensar em nada além da alma, nem mesmo por um segundo que seja.

47
Verso 26
A mente naturalmente volúvel e inconstante deve ser cuidadosamente retraída de
quaisquer objetos que persiga, e trazida de volta sob o controle do eu.

Verso 27
Livre da agitaçäo apaixonada, de coraçäo pacífico, livre das máculas do apego, medo, e ira, e
imbuído do conceito do Absoluto, tal yogi abençoado com a alegria de realizar a natureza
divina da alma.

Verso 28
Desta forma, através da constante realizaçäo de sua natureza divina interna, o yogi sem
pecado facilmente alcança o profundo êxtase da realizaçäo da Superalma. (Nesse ponto, a
prática de yoga aqui mencionada est de acordo com a senda da devoçäo (bhakti)).

Verso 29
De coraçäo unido com a consciência infinita, tal mestre da yoga percebe consciência em todos
seres. Ele v a Suprema Alma em todo mundo, e todo mundo dentro do Supremo.

Verso 30
Para aquele que Me v em tudo e v toda criaçäo somente em Mim, nunca fico invisível, e ele
nunca Me sai da vista - ele nunca deixa de pensar em Mim.

Verso 31
Embora uno, situo-Me separadamente dentro do coraçäo de toda entidade viva como a
Superalma, em Minha forma de quatro-braços que mede um pradesha (a distância que vai do
polegar ao dedo indicador). Compreendendo que Eu, Shyamasundara, näo sou diferente
da Superalma, o yogi que se rende a Mim e Me adora em devoçäo a começar por ouvir, cantar e
lembrar - independente de realizar deveres escriturais prescritos ou näo, reside em Mim
eternamente.

Verso 32
Considero mais elevado dentre os mestres de yoga, aquele que vê, como no teu próprio caso, a
felicidade e a infelicidade de todos seres como sendo igual - ele percebe a alegria e sofrimento
dos outros como sendo suas.

Verso 33
Arjuna disse: " Madhusudana, devido natureza volúvel da mente, näo consigo visualizar a
estabilidade infinita de tal estado de equilíbrio em yoga, conforme descrito por Ti.

Verso 34
" Krishna, a mente por sua própria natureza volúvel, origem de perturbaçäo em nosso
julgamento e agitaçäo dos sentidos e corpo. Ela inconquistável e extremamente obstinada.
Por isso, considero o controle da mente através da prática da yoga óctupla como sendo
praticamente impossível, assim como pelo mero controle da respiraçäo, näo se pode controlar o
vento que sopra pelos céus.

48
Verso 35
O Senhor Supremo disse: " heróico Arjuna, sem dúvida a mente volúvel e extremamente
difícil de controlar. Contudo, " filho de Kunti, ela subjugada pela prática repetida da yoga da
meditaçäo na Superalma conforme ensinada pelo mestre espiritual fidedigno e por se abandonar
o desfrute mundano dos sentidos.

Verso 36
Na Minha consideraçäo, sem dúvida a yoga descrita por Mim para controlar as faculdades
mentais difícil para a pessoa de mente irrestrita. Porém quem com zelo subjuga a mente
através da prática autêntica, definitivamente ter sucesso na yoga.

Verso 37
Arjuna disse: " Krishna, uma pessoa medíocre pode, devido a sua f nas escrituras, ocupar-se
na prática da yoga. Contudo, carecendo da devida prática e abnegaçäo, subsequentemente
se desvia devido a propensöes mundanas. Parece que tal pessoa certamente näo ter sucesso
na yoga. Entäo qual seu destino?

Verso 38
" poderoso herói, " Krishna, tendo se desviado da senda da yoga que visa alcançar o Absoluto,
sem abrigo e tendo caído tanto da senda da açäo quanto da meditaçäo, tal pessoa näo est
completamente perdida assim como uma nuvem fragmentada?

Verso 39
" Krishna! Ninguém além de Ti pode afastar essa minha dúvida. Por favor,
misericordiosamente destrói-a na raiz.

Verso 40
O Senhor Supremo disse: " Arjuna, filho de Kunti, o yogi sem sucesso näo sofrer ruína seja
nesta vida ou na próxima. Näo ser privado dos prazeres dos sistemas planetários celestiais
neste universo, tampouco ser-lhe- negada a chance de ver pessoalmente a Superalma no
reino divino. Isto assim, " Meu caro, porque uma pessoa que realiza açöes virtuosas nunca se
torna desafortunada.

Verso 41
Após residir durante muitos anos em todos esse planetas celestiais alcançáveis aos que
realizam grandes sacrifícios tais como o Asvamedha, o yogi sem sucesso tomar nascimento no
lar de pessoas honradas e prósperas dedicadas a práticas puras e honestas.

Verso 42
Por outro lado, se uma pessoa decair em sua tentativa de yoga após consideravelmente longo
período de prática, entäo certamente renascer no lar ou linhagem de mestres de yoga que
estäo absortos na prática de yoga. Saiba que o nascimento em tal local se obtém mui raramente.

Verso 43
" filho de Kuru, num desse nascimentos que acabo de descrever-te, tal yogi mal-sucedido
renascerá, devido às suas práticas da vida pretérita, com a inteligência centrada na adoraçäo
da Superalma. A partir dali, com renovado vigor, ele novamente busca a perfeiçäo de enxerg

49
-La.

Verso 44
Embora sem desej -lo devido a algum obstáculo, ele novamente se v atraído pela yoga, devido
prática em que se aplicou na última vida. E embora possa ser um praticante ainda se
esforçando pela perfeiçäo, ele ultrapassa a senda da açäo fruitiva mencionada nos Vedas, e
alcança um fruto bem superior.

Verso 45
Com empenho mais árduo que dantes, o yogi que purifica completamente sua
consciência rejeitando a escória de todos desejos mundanos e imagens mentais, finalmente
obtém o fruto de muitas vidas de prática de yoga. Da! por diante, ele alcança a meta suprema.

Verso 46
O yogi que um adorador da Superalma superior às pessoas envolvidas em severas
austeridades tais como o chandrayana, superior aos adoradores de Brahman, e superior aos
trabalhadores fruitivos. Saiba com certeza que est Minha conclusäo. Portanto, " Arjuna,
seja um yogi.

Verso 47
Dentre todos tipos de yogis, o mais elevado de todos o devoto que possue plena f nas puras
escrituras devocionais autorizadas, e que Me adora com todo seu coraçäo através de ouvir e
cantar Minhas divinas glórias, prestando todos serviços a Mim. Certamente esta Minha
opiniäo.

CAPITULO SETE
Jnana-vijnana-yoga

CONCEITOS DO ABSOLUTO
RELATIVOS E ABSOLUTOS

Verso 1
O Senhor disse: " Partha, ouça de Mim agora, como que com seu coraçäo devotado a Mim, o
Senhor Supremo, abandonando todas atividades näo-devocionais baseadas na açäo e
conhecimento, buscando refúgio em Mim e gradualmente alcançando Minha associaçäo,
certamente serás capaz de conhecer-Me, e a Minha sagrada morada, Minhas opulências, e
Meus associados.

Verso 2
Agora descrever-te-ei plenamente, com o sabor de Minha divina doçura, este conhecimento
de Meu grande esplendor majestoso e opulências. Depois de conhecer tudo isto, näo
restar absolutamente nada para conheceres, estando situado nesta senda lindíssima, jubilante e
vitoriosa.

Verso 3
Dentre incontáveis almas, algumas alcançaram a forma humana, e dentre muitos milhares de
seres humanos, alguns buscam a percepçäo da alma individual e da Superalma; e dentre

50
muitos milhares de tais buscadores que conseguiram ver a alma e a Superalma, somente
alguns poucos conseguem de fato perceber a Mim, Shyamasundara.

Verso 4
Minha potência ilusória neste mundo se divide de oito maneiras: terra, água, fogo, ar, éter,
mente, inteligência, e falso-ego.

Comentário

Nesse verso, o significado do que est sendo expressado que jnana, ou conhecimento, no
verdadeiro sentido da palavra e conforme os preceitos da devoçäo, na verdade bhagavad-
aisvarya-jnana, ou conhecimento da todo-poderosa, majestosa excelência do Supremo. Na
opiniäo dos eruditos geralmente conhecidos como jnani, conhecimento conhecimento da
alma, distinto do corpo e de outros elementos mundanos - porém isso näo verdadeiro
conhecimento. Portanto, a fim de confirmar o conceito de Sua majestade pessoal todo-
poderosa, o Senhor est revelando Suas várias formas e potências pessoais intrínsicas, bem
como Suas características.

"Meus diferentes aspectos säo Brahman, Paramatma, e Bhagavan. Destes, Brahman um


aspecto näo-diferenciado, sem forma de Minha potência. Paramatma, a Super-Alma, também
uma manifestaçäo de Minha potência (como fator fundamental em relaçäo ao universo), e esse
Meu aspecto näo eternamente manifesto. Portanto, s" Minha forma Bhagavan, o Senhor
Supremo, eternamente manifesta, e dentro dessa forma Minhas três potências eternas também
estäo presentes: antaranga ou cichakti - a potência divina interna; bahiranga ou maya-shakti
- a potência ilusória externa; e tatastha ou jiva-shakti - a potência marginal, que inclui os
inumeráveis seres vivos."

No verso 4, o Senhor descreveu Sua maya-shakti, ou Sua potência externa ilusória.

Verso 5
Oh poderoso herói, Arjuna, essa natureza mundana conhecida como externa, inferior. Porém
distinta dessa natureza, deves conhecer Minha potência marginal, composta das almas
individuais, como sendo superior. Esse mundo aceito por essa potência consciente superior
como um objeto de exploraçäo para desfrute dos sentidos, por meio das açöes de cada indivíduo
visando frutos e as reaçöes. O mundo divino emana de Minha potência interna e o mundo
mundano de Minha potência externa. A potência de todas entidades vivas conhecida como
marginal, devido sua adaptabilidade intermediária - podem escolher entre residir no plano
mundano ou no divino.

Verso 6
Saiba que todas espécies, sejam movéis ou estacionárias, säo produzidas destas duas
naturezas elementais, como a esfera da açäo e o conhecedor desta esfera. E somente Eu sou a
causa da geraçäo do mundo inteiro, e a causa de sua dissoluçäo também.

Verso 7
" Arjuna, näo existe nada superior a Mim. Como jóias ensartadas num fio, toda esta criaçäo
depende de Mim.

51
Verso 8
" filho de Kunti, através da potência do elemento primordial do paladar, estou situado como a
base do sabor da água; e através da opulência da refulgência, estou presente no sol e na lua.
Estou presente nos Vedas como sua vibraçäo sonora prímeva, a letra Om; estou presente na
atmosfera como o elemento primordial do som; e como o Macho Supremo, estou presente em
todos homens.

Verso 9
Permaneço na pura fragância da terra, e no brilho do fogo. Em todos seres, estou presente
como a duraçäo da vida, e nos ascetas, Eu sou o poder de tolerar a dualidade tal como o frio e
o calor.

Verso 10
" Partha, saiba que sou a causa primordial eterna de todas formas de vida. Nos inteligentes,
estou presente como a inteligência personificada, e nos valorosos, estou ali como a
destreza personificada.

Verso 11
" Arjuna, nos poderosos, estou presente como a força destituída de interesse egoísta e apego
mundano; e entre todas espécies de vida, estou presente como aquela uniäo sexual que est de
acordo com os princípios da religiäo.

Verso 12
Além disso, deves saber que todos objetos existentes - de natureza em bondade, paixäo e
ignorância - somente nascem de Mim. Näo obstante, Eu näo estou neles. Eles, sendo-Me
subordinados, existem em Mim.

Verso 13
O mundo inteiro de entidades vivas est completamente iludido por essa criaçäo da natureza
dos três modos materiais. Portanto, ninguém pode conhecer a Mim, o Senhor Supremo, que sou
superior a toda essa criaçäo, transcendental a esses modos, e imutável.

Verso 14
Essa Minha energia "trimodal" sobrenatural, (sedutora) e ilusória
praticamente intransponível. Contudo, aqueles que se rendem plena e exclusivamente a
Mim podem certamente transpor essa formidável fantasia.

Verso 15
Estes quatro tipos de mal-feitores näo se rendem a Mim: trabalhadores fruitivos, que säo
exatamente como animais; pessoas caídas que abraçam a senda superior, devoçäo, porém mais
tarde a rejeitam, considerando-a inadequada ou sem valor; aqueles cujo conhecimento
anulado pela potência ilusória, maya, apesar de seu conhecimento das escrituras, e que pensam
que somente a forma do Senhor Narayana adorável, enquanto que o Senhor Krishna, Senhor
Rama, e outras formas autênticas säo meramente humanas; e aqueles que possuem natureza de
demônios - os impersonalistas, que "desmembram" Minha forma através de suas "flechas"
de argumentos falsos e blasfemosos, e que säo assim como o demônio Jarasandha e outros.

52
Verso 16
" Arjuna, melhor dos Bharatas, quatro tipos de pessoas Me adoram: o aflito, o buscador de
conhecimento, o buscador de desfrute mundano ou supra-mundano, e quem tem alma pura e
enxerga a alma. Após obter suficiente mérito devocional (sukrti), estes se ocupam em Meu
servço devocional puro.

Verso 17
Entre esses quatro tipos de devotos, a alma iluminada, que Minha devota exclusiva e cuja
consciência est plenamente absorvida em Mim, o melhor de todos. Por que Eu em Minha
forma de Shyamasundara sou muito querido para esse sábio, ele também Me querido.

Verso 18
Como seus coraçöes estäo livres do nefasto egoísmo do vício nos prazeres sensuais, todas essas
pessoas certamente Me säo muito queridas. Porém devido a sua divina auto-realizaçäo, o sábio
de coraçäo puro se torna inseparável de Mim, e portanto Me muito caro. Isso certamente
Minha opiniäo, j que ele, tendo Me oferecido seu próprio coraçäo, provou que Eu,
Shyamasundara, sou a meta suprema da vida.

Vreso 19
Após muitos, muitos nascimentos, a pessoa sábia (que por ventura consegue obter a associaçäo
de tal devoto puro) finalmente passa a compreender que todo universo de seres móveis e
imóveis da natureza de Vasudeva somente, no sentido de que todos säo subordinados a
Vasudeva. Tendo captado essa concepçäo, ela se rende a Mim. Saiba que tal grande alma
extremamente rara.

Verso 20
Pessoas cuja boa inteligência foi estragada pelos desejos ilícitos de exploraçäo e
renúncia ou outras atividades cheias de duplicidade, adoram outras personalidades de
divindades tais como o Deus-sol e os muitos semi-deuses. Escravizadas por seu instinto, elas
portanto adotam as correspondentes regras e regulamentos para jejuns e princípios.

Verso 21
Conforme o semideus - que representa uma forma Minha - que determinado devoto
deseja adorar fielmente, Eu, como a Superalma que habita em seu coraçäo, fortaleço sua f na
deidade escolhida.

Verso 22
Após ser dotado dessa firme f por Meu intermédio, tal devoto continua a adorar a deidade de
tal semideus, e alcança todos objetos que deseja daquela deidade. Certamente isto se desenrola
somente através de Minha permissäo, j que sou a Superalma situada dentro do coraçäo do
semideus também.

Verso 23
Porém o fruto obtido por aqueles adoradores provincialmente interessados nos vários
semideuses temporário. Eles alcançam seus respectivos deuses, porém Meu devoto obtém a
Mim.

53
Verso 24
Minha super-excelente natureza, forma, qualidades, atividades, passatempos, e parafernália
associada säo todos transcendentais ilusäo. Porém homens sem inteligência, incapazes de
conhecer esta realidade, pensam em Mim dessa maneira: "Oh, o Brahman supramundano,
sem forma e impessoal, recentemente aceitou nascer numa forma ilusória no aposento de
Vasudeva."

Verso 25
Por Minha própria doce vontade, permanecendo oculto por uma imagem ilusória, näo Me
manifesto para todo e qualquer um. Portanto, nenhuma dessas pessoas tolas jamais
conseguir realmente conhecer-Me como o filho de Vasudeva, independente do nascimento
mundano e sempiterno em Minha divina forma pessoal Shyamasundara, de feiçöes belas
como uma nuvem enegrecida de chuva.

Verso 26
" Arjuna, somente Eu conheço tudo e todos, móveis ou imóveis, no passado, presente e futuro.
Mas devido a percepçäo obscurecida seja por Minha energia externa ilusória ou pela potência
interna de Minha doce vontade, certamente näo h ninguém - seja humano deste mundo ou
alguém do além - que possa conhecer Me como sou.

Verso 27
" Arjuna, castigador do inimigo, desde o próprio início da criaçäo universal, todas formas
de vida säo sobrepujadas pela ignorância oriunda da dualidade baseada em felicidade e
infelicidade, que se origina no desejo e aversäo por predileçöes sensuais.

Verso 28
Por outro lado, os que realizam atos virtuosos e que tiveram a oportunidade de se associar
com um de Meus devotos puros, se purificam de todo pecado. Livres da ilusäo oriunda da
dualidade baseada em felicidade e infelicidade, e firmemente estabelecidos em contínua
ocupaçäo a Meu serviço, eles ingressam na devoçäo pura a Mim.

Verso 29
Desejando liberaçäo da miserável corrente mundana do nascimento e morte que tudo devora,
aqueles que se refugiam em Mim e se ocupam em Meu serviço devocional conseguem conhecer
Brahman, as almas individuais, e os muitos tipos de karma ou açäo exploradora pelas quais as
almas repetidamente se prendem a este infeliz plano mundano.

Verso 30
E aqueles que Me conhecem como a base dos princípios universais do fenômeno, governo e
dispensaçäo - tais pessoas, seus coraçöes absortos em Mim, podem Me conhecer mesmo na
hora da morte. Aflitas em face da amedrontadora morte, elas näo se esquecem de Mim.

CAPITULO OITO
Taraka-brahma-yoga

A SENDA DA LIBERDADE ABSOLUTA

54
Versos 1 e 2
Arjuna indagou: " Purushottama, que Brahman, e que a alma? Que karma, e que
considerado como fenomenal? Outrossim, quem conhecido como o governante universal
que preside? " Madhusudana, quem o Senhor do sacrifício dentro desse corpo, e como Ele
se situa dentro do mesmo? E podes Me dizer como os auto-controlados Te conhecem na hora
da morte?

Verso 3
O Senhor Supremo disse: certamente Brahman a Verdade Absoluta, indestrutível, imutável, e
a alma espiritual pura a personalidade genuína da entidade viva. A palavra "karma" denota
abnegaçäo em prol dum semideus, o que produz os corpos de seres humanos e outras espécies,
criadas por intermédio de elementos materiais sutis e grosseiros; esta abnegaçäo se refere
realizaçäo de caridade, sacrifício, austeridade, e todos deveres realizados para propiciarem tal
divindade.

Verso 4
" mais elevada das almas, Arjuna, objetos perecíveis tais como o corpo material säo
conhecidos como fenomenais; o governo universal refere-se forma agregada universal que
engloba e governa todos semideuses, liderados pelos deuses solares, e somente Eu sou
conhecido como o Senhor de todo sacrifício - a Superalma situada dentro dos corpos de todas
entidades vivas e o ímpulso e recompensador de seus atos de sacrifício, caridade, e austeridade.

Verso 5
Aquele que continuamente pensa em Mim mesmo hora da morte, e que tendo deixado o corpo,
parte desse mundo, certamente chega Minha natureza. Quanto a isso näo h dúvida.

Verso 6
" filho de Kunti, no momento de deixar o corpo, qualquer objeto em que uma pessoa medite
ser obtido por ela, devido a sua constante contemplaçäo desse objeto.

Verso 7
Por isso lembra-te de Mim em todos momentos, e realiza teu dever natural de ocupar-te na
batalha. Dedicando tua mente e inteligência a Mim, obterás Meu refúgio ao realizares teu
dever. Quanto a isso näo h dúvida.

Verso 8
" Partha, com a mente indesviavelmente ocupada em meditaçäo, constantemente pensando
na refulgente Pessoa Suprema, o verdadeiro yogi certamente alcança o Senhor Supremo.

Versos 9 e 10
Ele, o Senhor Supremo, omniciente, sem começo, e quem misericordiosamente concede
os ensinamentos da devoçäo a Ele. Apesar de ser mais sutil que um átomo, Ele enorme, j que
o suporte de tudo. Sua forma divina, isto é, de tamanho médio, e no entanto, tal como o sol,
Sua natureza característica auto-iluminada e ilumina tudo. Ele completamente transcendental
ilusäo. Estando plenamente ocupado em contínua lembrança devocional desta Pessoa
Suprema por meio de uma mente indemovível fortalecida pela prática da yoga, aquele que na

55
hora da morte estabelece seu ar vital entre as sombrancelhas (no chakra ajna) e medita Nele,
certamente alcança aquele refulgente Senhor Supremo.

Verso 11
Junto com esse método de abord -la, descrever-te-ei aquela realidade alcançável - que
designada pelos conhecedores eruditos dos Vedas como a monosílaba OM, a representaçäo
sonora do Absoluto; na qual todos ascetas sem desejos penetram; e que por desejarem alcanç
-La os transcendentalistas devotos mantém o voto de celibato.

Versos 12 e 13
Fechando todos portöes de entrada sensoriais aceitaçäo de objetos dos sentidos, mantendo a
mente fixa dentro do coraçäo, estabelecendo o ar vital entre as sombrancelhas, e mantendo o
transe yoguico centrado na alma enquanto vibra esta monosílaba, Om, a representaçäo sonora
do Absoluto - aquele que continuamente se lembra de Mim ao deixar seu corpo, obtém
residência em Minha morada sagrada.

Verso 14
" Partha, tendo esvaziado sua consciência de todas aspiraçöes a empreender atividades näo-
devocionais motivadas pela exploraçäo ou renúncia para obtençäo das respectivas metas de
paraíso ou liberaçäo, quem constantemente se lembra de Mim internamente, permanecendo
indiferente a consideraçöes de santidade ou näo do tempo, lugar, ou circunstâncias, e que
constantemente aspira a um relacionamento divino Comigo em servidäo, amizade, parentesco, ou
matrimônio - certamente, para tal devoto, felizmente sou alcançável.

Verso 15
Os grandes devotos que alcançam o nível de participaçäo em Meus passatempos divinos, uma
vez que Me alcançaram, jamais aceitam novamente um nascimento transitório que a morada da
agonia.

Verso 16
" Arjuna, descendo a partir do planeta do Senhor Brahma, os residentes de todos planetas
estäo naturalmente sujeitos a repetidos nascimentos e mortes. Porém, " Kaunteya, ao chegarem
a Mim, näo h mais renascimento.

Verso 17
Um dia do Senhor Brahma dura mil chaturyugas (*) e sua noite da mesma duraçäo. Pessoas
que sabem disso possuem a verdadeira concepçäo do dia e da noite.

(*) uma yuga (era) no cálculo de tempo dos semideuses igual a quatro yugas ou uma
chaturyuga no cálculo de tempo da humanidade, ou seja 4.320.000 anos.

Verso 18
Com a chegada do dia para Brahma, toda progênie junto com seus respectivos corpos,
sentidos, objetos desfrutáveis, locaçöes provinciais e parafernália associada nascem do Senhor
Brahma, que acorda de seu sono. E novamente ao cair da noite, säo absorvidos nesse mesmo
Senhor Brahma, que conhecido como o "imanifesto".

56
Verso 19
" Partha, essa multidäo de formas de vida, sujeitas lei do karma, repetidamente nascem ao
alvorecer do dia do Senhor Brahma e säo dissolvidas no seu anoitecer. E novamente elas
nascem com a alvorada de um outro dia.

Verso 20
Porém muito superior àquele "imanifesto" Senhor Brahma (que conhecido como
Hiranyagarbha por ter nascido de dentro do ovo dourado, o universo), existe um outro
elemento que eterno e imperceptível aos sentidos dos seres vivos. Embora todas formas de
vida at Hiranyagarbha Brahma sejam aniquiladas, aquela verdade permanece inafetada.

Verso 21
Aquilo que descrito como o "invencível imanifesto" proclamado meta suprema (pelas escrituras
conhecidas como Vedanta), e tendo alcançado isso, näo se retorna de novo a este mundo
material. Saiba que esse destino supremo Minha morada sagrada.

Verso 22
" Partha, Eu, a Pessoa Suprema, em quem todas entidades vivas estäo situadas, e que
interpenetro todo este universo, sou alcançável apenas pela devoçäo exclusiva destituída de
qualquer toque de exploraçäo, renúncia, yoga mística, e outros métodos empíricos ou teóricos.

Verso 23
" Bharatarshabha, agora descrever-te-ei os caminhos, determinados pelo cálculo de tempo,
pelos quais os yogis ou trabalhadores fruitivos que os trilham obtém a liberaçäo ou
renascimento respectivamente.

Verso 24
Os seguidores da senda do conhecimento que possuem conhecimento do Absoluto obtém o
Absoluto por expirarem num momento do dia iluminado pelo fogo, sol e elementos
associados, na quinzena iluminada da lua durante a passagem de seis meses do sol pela órbita
nórdica.

Verso 25
Expirando numa noite escura da quinzena obscura da lua, durante a passagem de seis meses do
sol em sua órbita pelo sul, o trabalhador fruitivo na senda da açäo alcança o plano celestial,
porém subsequentemente tem de submeter-se a novo nascimento.

Verso 26
Estas duas sendas dos residentes desse mundo que estäo aptos a seguir os métodos de renúncia
e exploraçäo, ambos säo conhecidos respectivamente como as sendas clara e escura, e
säo universalmente aceitas como eternas. Pela senda clara se obtém a liberaçäo, e pela senda
escura se renasce nesse mundo material.

Verso 27
" Partha, apreendendo sobre estas sendas da iluminaçäo e da obscuridade, um devoto (bhakti-
yogi) nunca iludido. Portanto, " Arjuna, sempre ocupa-te em devoçäo exclusiva (ananya-
bhakti-yoga), que transcendental a ambas.

57
Verso 28
Passando a saber sobre Minha pre-eminência e a super-excelência da devoçäo a Mim, a alma
devotada ultrapassa todos frutos da piedade citados pelas escrituras que se obtém por
estudar e recitar os Vedas, realizar sacrifícios, praticar austeridades, e doar bens como caridade.
Entäo ela alcança Minha suprema morada sagrada - Meu dhama.

CAPITULO NOVE
Raja-guhya-yoga

O TESOURO OCULTO

Verso 1
O Senhor Supremo disse: agora conceder-te-ei, por estares destituído de inveja ou malícia,
este mais oculto dos tesouros, na forma da devoçäo pura a começar pelo cantar ou narrar de
Minhas glórias transcendentais, e a realizaçäo de serviços divinos relacionados - at o ponto
de percepçäo divina direta de Mim. Encontrando esse tesouro oculto, obterás liberdade deste
plano mundano - liberdade de todos males opostos devoçäo.

Verso 2
Saiba que esse conhecimento a sabedoria suprema e o tesouro oculto supremo.
perfeitamente puro, e embora esteja além do escopo das percepçöes sensoriais, o objeto de
percepçäo direta (daqueles sentidos que se dispöe zelosamente ao serviço devocional
[bhakti]). a própria eficácia da religiäo, felizmente acessível, e completamente destituído
de natureza mundana.

Verso 3
" conquistador do inimigo, homens que näo possuem f nesse tesouro oculto de sublime
amor puro por Mim säo incapazes de alcançar-Me, e assim eles permanecem vagando neste
plano mundano mortal.

Verso 4
De uma maneira imanifesta, Eu permeio este universo inteiro, e tudo que concebível situa-se
dentro de Mim - e no entanto, Eu näo estou situado nessa entidade total.

Verso 5
E novamente, ela também näo est situada em Mim. Apenas contemple Minha natureza
simultaneamente una e diferente (achintya-bhedabheda) como a origem perfeita,
omnipotente, omnisciente e Senhor do universo! Embora Meu próprio Ser seja o arrimo e o
guardiäo de todos seres, Eu näo estou implicado por eles.

Verso 6
O ar, embora massivamente expansivo por natureza, sempre se situa dentro da jurisdiçäo do
espaço, entretanto, o ar e o espaço permanecem distintos entre si. Similarmente, saiba que
todos seres estäo situados em Mim.

Verso 7

58
" filho de Kunti, no cataclisma universal, a multidäo de seres se funde em Minha natureza
ilusória, conhecida como maya. E com o início de um novo milênio, Eu crio todas espécies
distintas novamente.

Verso 8
Por intermédio de Minha potência da natureza material ilusória, repetidamente Eu crio todas
formas de vida conforme a natureza que adquiriram, que determinada pelos resultados de suas
açöes fruitivas e aspiraçöes de remotas eras passadas.

Verso 9
Profundamente desapegado e situado indiferentemente nesse plano explorador de geraçäo,
manutençäo e declínio, Eu, " conquistador da fortuna, näo posso ser implicado pela operaçäo
universal inteira da criaçäo, manutençäo, e aniquilaçäo.

Verso 10
" Kaunteya, Minha potência ilusória, sob Minha diretriz, gera este universo de seres móveis e
imóveis. E por esta razäo, isto é, como apenas um objeto criado est sujeito destruiçäo, este
universo criado de novo e de novo.

Verso 11
Incapazes de compreender Minha forma divina super-excelente de feiçöes humanas, homens
ignorantes blasfemam a Mim - o Senhor Supremo de todos seres - ao considerarem-Me um
mero ser humano.

Verso 12
Tais tolos estäo cheios de väs esperanças e sonhos em seus fúteis esquemas de caça aos frutos e
busca de conhecimento. Destituídos de todo bom-senso, adquirem a natureza ignorante e
apaixonada de seres demôníacos ateus, que a fonte da escuridäo da ilusäo.

Verso 13
Porém, " Partha, as grandes almas se refugiam na natureza divina e devotada. Com os
coraçöes unidirecionados, prestam serviço amoroso exclusivamente a Mim - Krishna, de
feiçöes humanas - sabendo que sou, nesta forma eterna, a causa primordial de todos seres.

Verso 14
Sem levar em conta a pureza ou impureza do tempo, lugar e circunstâncias, tais grandes
almas estäo constantemente absortas no cantar e narrar das glórias de Meu santo nome,
forma, qualidades, passatempos, e parafernália. Elas estäo atentas definiçäo irrevogável e
conclusiva de Minha natureza, personalidade, expansöes, e seguem estritamente as regras
e regulamentos para tomar o santo nome e observar dias santos tais como Ekadasi. Seguindo
todas práticas da devoçäo a começar por oferecer reverências a Mim, os devotos, ansiando
sinceramente por seu relacionamento eterno Comigo no futuro, Me adoram através da senda de
ocuparem-se em Meu transcendental serviço devocional.

Verso 15
E dentre aqueles que säo adoradores na senda do conhecimento, alguns estäo conscientes de
sua própria unidade Comigo, outros estäo conscientes da unidade dos semideuses Comigo, e

59
ainda outros estäo conscientes da unidade de Minha diversificada opulência universal
Comigo. De tantas maneiras - eles adoram s" a Mim.

Verso 16
Eu sou o sacrifício védico Jyotistoma e os cinco sacrifícios aos semideuses Visva-deva e
outros conforme recomendado nas escrituras Smrti. Eu sou a oferenda aos antepassados, a
oferenda auspiciosa das colheitas outonais, e o mantra. Sou os ingredientes do
sacrifício tais como o ghee (manteiga clarificada); sou o fogo consagrado, e somente Eu,
sou o ato de oferecer sacrifício.

Verso 17
Eu sou o pai deste universo, a mäe, aquele que concede os frutos de todas açöes, o
antepassado, e objeto de todo conhecimento. O agente purificante OM, o Rig, Sama e
Yajur-vedas - certamente sou todos estes.

Verso 18
E certamente sou de todos a meta, mantenedor, controlador, testemunha, refúgio, guardiäo, e
bem-querente incondicional. Eu sou a criaçäo, dissoluçäo, e manutençäo. Sou o reservatório e
a semente, como a Pessoa Suprema eterna.

Verso 19
" Arjuna, Eu, como o sol, proporciono calor durante o veräo, e durante a estaçäo chuvosa
envio as chuvas e às vezes retiro-as. Sem dúvida, sou a liberaçäo e a morte, e todas coisas
grosseiras ou sutis.

Verso 20
Pessoas que realizam os sacrifícios ritualísticos fruitivos prescritos em três dos Vedas
adoram o Senhor Indra e outros semideuses. Na verdade, elas adoram somente a Mim,
porém de maneira indireta. Elas bebem os restos sacrificiais da bebida Soma, purificam-se
do pecado, e oram para atingir o plano celestial. Como resultado de sua piedade, elas
alcançam o céu e desfrutam de prazeres celestiais.

Verso 21
Após desfrutarem desse grande deleite paradisíaco, ao esgotarem-se seus méritos piedosos,
aceitam nascer neste mundo mortal. Dessa maneira, pessoas luxuriosas que seguem regras
védicas de adoraçäo aos semideuses, väo e vem - elas nascem e morrem repetidamente -
neste mundo material.

Verso 22
Eu pessoalmente assumo toda a responsabilidade de adquirir e proteger as necessidades de
Meus devotos plenamente dependentes que estäo sempre absortos em pensamento apenas sobre
Mim, e que Me adoram exclusivamente em todos sentidos.

Verso 23
" Kaunteya, pessoas que desenvolveram alternativamente a f nos semideuses e que os adoram
com devoçäo certamente também adoram a Mim, porém impropriamente -

60
Verso 24
- Porque s" Eu sou o desfrutador e recompensador de todos sacrifícios. Mas como elas
näo conseguem conhecer-Me desta maneira, novamente se submetem a nascimento, doença,
velhice e morte.

Verso 25
Os adoradores de semideuses alcançam o semideus apropriado, os adoradores dos antepassados
väo para o plano de seus ancestrais, e os adoradores da seçäo fantasmagórica säo transferidos ao
plano dos fantasmas. Contudo, aqueles que Me adoram, certamente vem a Mim.

Verso 26
Certamente, se Me oferecerem com devoçäo uma folha, flor, fruto ou água, Eu aceito toda a
oferenda daquele Meu devoto afetuoso e de coraçäo puro. Com sincero amor, aceito
graciosamente.

Verso 27
" Kaunteya, qualquer que seja sua açäo, seja geral ou escritural, o que quer que comas, o que
ofereceres como sacrifício, o que doares como caridade, e qualquer voto que mantenhas - faça
tudo como uma oferenda a Mim.

Verso 28
Dessa forma, embora realizando deveres gerais ou escriturais, serás liberado do enredamento
por resultados auspiciosos ou inauspiciosos da açäo. E devido a permaneceres internamente
indiferente aos frutos de cada uma de tuas açöes, alcançarás distinçäo at mesmo entre as
almas liberadas, e virás diretamente a Mim.

Verso 29
Estou igualmente disposto para com todas almas, portanto ninguém Meu inimigo ou Meu
amigo. Contudo, para aqueles que prestam serviço devocional a Mim com amor, j que estäo
ligados pela afeiçäo por Mim, semelhantemente Eu também fico ligado pelo laço da afeiçäo por
eles.

Verso 30
Se mesmo uma pessoa de práticas extremamente abomináveis, abandonar todas atividades
näo-devocionais de exploraçäo e renúncia e se ocupar em Meu exclusivo e ininterrupto
serviço devocional, ela venerável como verdadeiro santo porque abraçou o plano revolucionário
da vida.

Verso 31
Aquela mais degradada entre as pessoas muito rapidamente se torna adornada com práticas
virtuosas e alcança a tranquilidade eterna. " filho de Kunti, declare - e proclame - que Meu
devoto nunca derrotado!

ou

" Arjuna, prometa ao público que Meus servos exclusivamente devotados nunca chegaräo
ruína. Quem declara isto em breve se torna virtuoso, e realmente alcança a graça divina eterna.

61
Comentário

A segunda interpretaçäo desse verso foi revelada por Srila Bhaktivinoda Thakura num
sonho.

No Srimad Bhagavatam 11.11.32, o Senhor Sri Krishna diz:

ajnayaivam gunan dosan, mayadistan api svakan


dharman samtyajya yah sarvan, mam bhajet sa ca satamah

"As melhores dentre as pessoas honestas säo aquelas que deixaram para trás os deveres que Eu
mesmo recomendo nas escrituras, para o público em geral. Embora seja Minha diretriz, elas
passam por cima dela e vem Me render serviço amoroso. Estes säo os verdadeiros homens
honestos."

Dentro da sociedade, deve-se obedecer a lei, mas existe também a situaçäo de se passar por
cima da lei a fim de demonstrar fidelidade ao rei. Se a pessoa arrisca sua vida e reputaçäo, e
infringindo a lei geral, entra no aposento real para combater um assassino, entäo ser
considerada, o melhor e mais leal servo. Semelhantemente, o Senhor est dizendo: "J dei
algumas diretrizes para o público em geral. Façam isto, näo façam aquilo, näo infrinjam
estas leis, etc.. Porém se, no Meu interesse, alguém arriscar cometer pecado, entäo deve
ser considerado o melhor dentre Meus devotos. Assim, Arjuna, vai e declara isso, prometa-o
em público que os ananya-bhak (9.30), pessoas exclusivamente devotadas, nunca chegaräo
ruína. Entäo tu receberás o benefício. Tu te tornarás dharmatma, religioso, e alcançarás
eterna bem-aventurança divina. Os ananya-bhak, devotos exclusivos, j cruzaram o
umbral do dharma, o padräo de obediência, e correram o risco de jogar-se completamente
em Meu serviço. sarva dharman parityajya mam ekam saranam vraja (18.66). Näo h
questäo de voltarem a ser virtuosos ou religiosos. Eles ultrapassaram dharma muito
antes, e aceitaram o risco e entraram em prema-dharma, Meu serviço amoroso, rejeitando
tanto a piedade quanto a pecaminosidade."

Verso 32
" filho de Prtha, pessoas de nascimento baixo e linhagem degradada, mulheres,
comerciantes, ou trabalhadores - estes também alcançam o supremo destino por
refugiarem-se plenamente em Mim.

Verso 33
Assim quem pode duvidar de que os devotos puros brahmanas e ksatriyas alcançaräo
esta meta suprema? Portanto, definitivamente ocupa-te em Meu serviço
devocional, j que obtiveste este miserável e temporário corpo humano após vagares por
muitos nascimentos.

Verso 34
D -Me teu coraçäo, seja dedicado a Mim em serviço devocional, e esteja absorto em Minha
adoraçäo. Ofereça reverências prostradas somente a Mim. Dessa maneira, com a mente e
corpo dedicados a Meu serviço, refugiando-te plenamente em Mim, certamente chegarás a

62
Mim.

63
CAPITULO DEZ
Vibhuti-yoga

O GRANDE TESOURO

Verso 1
O Senhor Supremo disse: " Arjuna de braços poderosos, ouça Minha divina exposiçäo
novamente. somente desejando o máximo benefício para ti, que Me és muito querido, que
vou falar.

Verso 2
Nem os semideuses e nem os grandes sábios conseguem compreender Meu singular, super-
excelente, divino nascimento neste mundo, porque em todos sentidos Eu sou a origem
primordial de todos aqueles seres celestiais e grandes sábios.

Verso 3
Quem conhece a Mim, o filho de Devaki, como näo-nascido, e origem de tudo, Senhor Supremo
de todos seres, dentre os homens näo ser iludido e ser liberado de todos pecados.

Versos 4 e 5
Inteligência, conhecimento, tranquilidade, tolerância, veracidade, controle externo dos
sentidos, controle interno dos sentidos, felicidade, infelicidade, nascimento, morte, medo,
coragem, näo-violência, equanimidade, satisfaçäo, austeridade, caridade, fama, e infâmia -
todos esses vários atributos das entidades vivas nascem apenas de Mim.

Verso 6
Os sete grandes sábios liderados por Marici, e antes deles, os quatro sábios brahmanas
liderados por Sanaka, e também os quatorze Manus ou progenitores encabeçados por
Svayambhuva - todos säo empoderados por Mim e nascem de Minha expansäo mental, o
Senhor Brahma, que conhecido como Hiranyagarbha. A populaçäo inteira do universo - sejam
brahmanas, ksatriyas, vaisyas ou sudras - descende destes patriarcas.

Verso 7
Quem de fato tem conhecimento de Minha supremacia todo-poderosa e de Meu serviço
devocional, se ocupa em Meu serviço, devido a sua concepçäo resoluta, absoluta. Quanto a isto
näo h dúvida.

Verso 8
Eu sou Krishna, o Doce Absoluto. Sou a causa-raiz do aspecto todo-compreensivo do
Absoluto, o aspecto omnipenetrante do Absoluto, e também o aspecto pessoal do Absoluto -
o Senhor de todas potências, que comanda o respeito de todos - o Senhor Narayana de
Vaikuntha. O universo de fluxo mundano e divino, cada tentativa e movimento, os Vedas e
escrituras ligadas que orientam a adoraçäo de todas pessoas - todos säo iniciados por Mim
apenas. Realizando esse tesouro oculto, as almas virtuosas que säo abençoadas com intelecto
refinado teísta, ultrapassam os padröes do dever e näo-dever, e abraçam a senda suprema do
amor divino, raga-marga, e Me adoram para sempre.

64
Comentário

Os verso 8 a 11 säo os quatro principais versos do Srimad Bhagavad-gita. A substância


ontológica do livro est contida nestes quatro versos essenciais, começando por aham
sarvasya prabhavo - "Tudo emana de Mim".

No Srimad Bhagavatam 1.2.11, os três principais conceitos do Absoluto säo dados como
Brahman, Paramatma e Bhagavan. Brahman o aspecto todo-compreensivo do Absoluto,
Paramatma o aspecto todo-permeante do Absoluto, e Bhagavan o conceito pessoal do
Absoluto. dada a definiçäo geral da palavra Bhagavan:

aisvaryasya samagrasya, viryasya yasasah sriyah


jnana-vairagyayos caiva, sanam bhaga itingana
(Vishnu Purana 6.5.47)

Bhagavan, o Senhor Supremo, portanto definido como "Aquele que est inseparavelmente
repleto das seis qualidades inconcebíveis de fortuna, poder, fama, beleza, conhecimento, e
renúncia."

A característica de Bhagavan, como Senhor Narayana, que todo tipo de potências säo
controladas pessoalmente por Ele. Contudo, Sri Jiva Goswami deu uma interpretaçäo especial
e particularmente refinada: Bhagavan significa bhajanya guna-visista. A natureza Dele tal
que quem quer que entre em contato com Ele näo consegue resistir serv!-Lo. Ninguém
consegue resistir o impulso de ser levado a adorar e venerar Sua charmosa personalidade.
Como o Senhor Krishna, Ele atrai o amor de todos.

Portanto, pela palavra sarvasya, o Senhor Krishna indica: "Eu sou svayam Bhagavan, o
próprio Senhor Supremo. Sou a origem näo s" de Brahman, o aspecto todo-compreensivo, e
Paramatma, o aspecto omnipenetrante, porém sou também a origem do Senhor de todas
potências, que comanda o respeito de todos, o Senhor Narayana de Vaikuntha."

Matah sarvam pravartate - "Toda tentativa e movimento principia em Mim, incluindo os


métodos pelos quais todo mundo Me adora e serve em devoçäo."

nayam atma pravacanena labhyo


na medhaya na bahuna srutena
yam evaisa vrnute tena labhyas
tasyaisa atma vivrnute tanum svam
(Kathopanisad 1.2.23)

"O Senhor näo pode ser conhecido por copiosa lógica, inteligência, ou estudo profundo
das escrituras. Porém Ele se revela pessoalmente para a alma que, tornando-se desejosa de
ocupar-se em Seu serviço devocional, ora a Ele por Sua misericórdia."

Dessa forma, matah sarvam pravartate - "Sou o primeiro a revelar ao público: "Adore-Me
desta maneira". Eu apareço como guru, e através dele, Eu adoro a Mim mesmo".

65
No Srimad Bhagavatam, o guru descrito pelo Senhor como Sua própria manifestaçäo direta.

acharyam mam vijaniyan, navamanyeta karhicit


na martya budhyasuyeta, sarva deva-mayo guruh
(Bhag. 11.17.27)

(O Senhor Krishna disse a Seu devoto, Udhava:) "Deves conhecer o mestre espiritual "bona-
fide" (fidedigno) como Meu próprio Ser. Nunca o deshonre. A natureza de gurudeva tudo que
divino, e ele nunca deve ser invejado por atribuirmos nosso próprio conceito mundano de
tempo, lugar e circunstância a ele."

Além disso, a potência mais refinada do Senhor Srimati Radharani. claro que h muitos
outros eternos associados, mas a ordem mais elevada de serviço devocional representada
por Srimati Radharani. Por isso, o Senhor est dizendo: "Minha adoraçäo mostrada por
Mim. Eu, como Minha potência mais refinada, adoro a Mim mesmo. Iti matva bhajante
mam - compreendendo esse conceito, Meu devoto vir adorar-Me, sempre sob a guia de
Meu melhor adorador - Minha potência e representaçäo mais refinada - Radharani, ou
gurudeva. Passando por cima Dela, a mais elevada e mais desejável forma de serviço a Mim näo
possível.

Radha-dasyam, a servidäo a Srimati Radharani, indicada aqui. Somente aqueles que säo
abençoados com divina inteligência seräo capazes de apreciar isto, e näo pessoas com
inteligência adquirida por si mesmas dessa área mayika, o mundo dos conceitos equivocados.
Nesse verso, a palavra budhah se refere a sumedhasah conforme descrito no Srimad
Bhagavatam 11.5.32: pessoas de inteligência teísta refinada oriunda do contato direto com o
plano transcendental. A orientaçäo e direçäo interna que recebem resultado de sukriti, mérito
divino adquirido através da associaçäo com devotos puros. Bhava-samanvitah significa
raga-samanvitah - anuraga - amor e atraçäo que säo afinidade, näo por seguir estritamente
regras escriturais, ou extraídas de qualquer plano de perdas e ganhos, mas de bhava,
inspiraçäo divina interna. Devoçäo desse tipo elevado completamente näo-calculista (jnana-
sunya-bhakti), conforme descrito por Srila Rupa Goswami no Sri Bhakti-rasamrita-sindhu:

anyabhilasita sanyam, jnana-karmady anavrtam


anukulyena krsnanusilanam bhaktir utama
(B.r.s. 1.1.9)

"A mais elevada devoçäo agrada aos desejos transcendentais do Senhor Krishna, e est livre
das coberturas externas de quaisquer
atividades baseadas na açäo ou conhecimento."

O mais raro e elevado estágio de devoçäo a linha da devoçäo espontânea, conhecida como
raga-marga. Dentro dessa linha, guiado pelo guru qualificado, um devoto puro elevado
poder gradualmente vir a prestar serviço ao líder de um dos grupos de associados pessoais de
Krishna, que servem o Senhor em Seus passatempos em amizade (sakhya-rasa), paternidade
(vatsalya-rasa), ou humor conjugal (madhura-rasa). Em Vrindavana, o Senhor est sendo
servido em devoçäo espontânea por Seus amigos tais como Subala Sakha, e por Seus pais,

66
Nanda Maharaja e mäe Yasoda. Gopis como Lalita e Visakha servem a Ele em amor conjugal.
Porém dentre todos Seus associados, e dentre todas as gopis, a mais alta ordem de serviço
amoroso divino prestada ao Senhor por Srimati Radharani. Portanto, o auge de raga-marga
prestar serviço a Radharani (Radha-dasyam). Essa a meta mais elevada da Rupanuga
Gaudiya Sampradaya, os seguidores da devoçäo pura conforme ensinada por Srila Rupa
Goswami Prabhupada, na linha do Senhor Sri Chaitanya Mahaprabhu.

Verso 9
Esses devotos rendidos Me aceitam como sua própria vida e alma, e continuam discutindo
Minhas narrativas ambrosíacas entre si, trocando informaçöes sobre os êxtases da devoçäo a
Mim. Eles constantemente saboream o néctar de seu relacionamento divino Comigo em
suas respectivas naturezas internas de servidäo, amizade, paternidade, e amor conjugal.

Comentário

O Supremo Senhor Krishna est falando sobre Seus devotos puros:

mac-cita mad-gata-prana...

"Eu estou no coraçäo de seus coraçöes, em cada um de seus pensamentos. Toda energia
deles - toda vida deles - dedicada Minha satisfaçäo. Na vida privada eles conversam sobre Mim
a fim de se esclarecerem mutuamente, e também na vida pública, eles sempre adoram falar
sobre Mim, e nada mais. Para cada tempo, lugar e circunstância, Eu sou o único assunto que
discutem."

Tusyanti ca - "Eles encontram muita satisfaçäo". At o relacionamento divino de


paternidade (vatsalya-rasa) h uma sensaçäo de satisfaçäo. Continuando, ramanti ca -
"Assim como uma esposa desfruta de um relacionamento conjugal com seu marido, os devotos
similarmente sentem tal êxtase na Minha companhia íntima ao falarem sobre Mim." Isso
também foi explicado por Srila Visvanatha Chakravarti Thakura, Srila Baladeva
Vidyabhusana, e Srila Bhaktivinoda Thakura.

Verso 10
Para aqueles devotos que constantemente se dedicam a Mim, e que se ocupam em Meu serviço
devido ao amor por Mim, Eu concedo a inspiraçäo divina interna através da qual eles podem se
aproximar de Mim, e prestar vários serviços íntimos a Mim.

Comentário

Neste verso, o Senhor diz: "O grupo mais elevado de Meus servidores (cujo sentimento
foi descrito no verso anterior através da palavra ramanti) säo aqueles que estäo
constantemente ocupados (satata-yukta) em Meu serviço em amor conjugal (madhura-
rasa) com amor sincero (bhajatam priti-purvakam)". E entäo Ele diz que lhes dar mais
inspiraçäo ou instruçäo interna "através do que poderäo vir a Mim" (yena mam upayanti te).
Como neste e no verso anterior o serviço dos devotos do Senhor foi descrito como eterno
(através das palavras nityam e satata yukta), a declaraçäo do Senhor Krishna parece
redundante. Por isso, na expressäo mam upayanti te ("Eles viräo a Mim"), a palavra

67
upayanti deve ser definida como parakiya-bhavena - upapati. Pati significa marido, e
upapati quer dizer amante.

"Para aqueles que j entraram em relacionamento divino Comigo como Minha esposa
(ramanti), Eu lhes dou inspiraçäo específica para virem a Mim como amantes (upapati)."

Em Vrindavana, o Senhor Krishna näo considerado o marido por lei, porém Ele o Senhor
do coraçäo, transcendental mesmo ao marido (parakiya-rasa). Enganando seus maridos, as
gopis de Vrindavana se unem a Krishna. Elas näo permitem que um segundo indivíduo fique
entre elas e Krishna. Elas näo conseguem permitir que mesmo as regras escriturais ou
a lei social interceptem isso, pois a posiçäo de Krishna absoluta, e um relacionamento
assim mais prazeroso para Ele. Isso Vrindavana bhajana *, e este o significado de
upapati.

*
vikriditam vraja-vadhubir idam ca visnoh
sradhanvito 'nusrnuyad atha varnayed yah
bhaktim param bhagavati pratilabhya kamam
hrd-rogam asv apahinoty acirena dhirah
(Bhag.10.33.39)

"Uma pessoa auto-controlada, de sentidos controlados, que, tendo sido dotada com
sublime f nos divinos passatempos transcendentalmente desfrutados pelo Senhor
Krishna com as gopis (Rasa-lila), e que, tendo ouvido esses passatempos divinos da boca
de lótus do guru bona-fide, continuamente canta ou narra as glórias deles - uma pessoa
assim logo alcança a mais elevada forma de devoçäo pura pelo Senhor, e prontamente se
torna capaz de parar a luxúria (doença do coraçäo)."

Em seus escritos, Srila Jiva Goswami frisou a palavra dhira, que significa "auto-
controlado". Para ouvir esses assuntos elevados, devemos entrar na cultura do controle dos
sentidos, senäo seremos destruídos.

naytat samacarej jatu, manasapi hy anisvarah


vinasyaty acaran maudhyad, yatharudro 'bhdi-jam visam
(Bhag.10.33.30)

"Ninguém deve jamais pensar em imitar esse comportamento do Senhor Supremo e das
gopis. Se por tolice grosseira alguém tentar imitar os passatempos do Senhor, ser
totalmente destruído, assim como se tentasse imitar o Senhor Shiva ao beber o veneno que
surgiu do oceano." (Em outra parte do Srimad Bhagavatam descreve-se que certa vez os
semideuses e demônios juntos se ocuparam em bater o oceano. Como resultado desse
bater, foram produzidos tanto o néctar, quanto o veneno).

"Meu relacionamento com eles independente de tudo que concebível. Passa por cima da
lei, sociedade, escrituras - tudo. muito inato e natural, e näo requer qualquer sançäo social
ou escritural. Digo a eles: "Podem demonstrar respeito formal a todas essas restriçöes e

68
viver na sociedade. Porém no coraçäo de seus coraçöes, vocês pertencem a Mim." Essa a
inspiraçäo especial e compreensäo intuitiva ("insight") que dou a tais devotos (yena mam
upayanti te).

"Externamente existem exigências sociais e escriturais, porém Minha posiçäo est acima e
além delas. Veda minha instruçäo para o benefício das massas, que se desviaram de Mim,
e a sociedade também est sob jurisdiçäo dessas instruçöes gerais dadas ao público por Mim.
Mas o Meu relacionamento divino com tudo intrínsico e independente. Näo requer
reconhecimento de ninguém. Tal relacionamento o mais elevado. a constante.
Sobrepöe-se a todas leis e sociedade guiados pelos Vedas; em vez disso, todos Vedas estäo
procurando por tal coisa."

Srutibhir vimrgyam (Bhag.10.47.61). Vishesha-mrgya - os Vedas estäo buscando por essa


posiçäo divina ideal. Na seçäo do Srimad Bhagavatam que lida com Rasa-lila, os Vedas
estäo pedindo perdäo.

"Em geral supostamente trazemos notícias sobre Ti, porém näo conseguimos descrev-Lo
como agora Te experimentamos aqui. Agora compreendemos que cometemos uma ofensa,
porque näo conseguimos distribuir esse Rasa-lila, esse Vraja-lila, às pessoas."

Como placas sinalizadoras, todas escrituras reveladas s" estäo mostrando a direçäo; mas
aonde, como? "Näo sabemos." Apenas, "Nessa direçäo pode ser que Ele esteja
disposiçäo."

Em todo e qualquer lugar, tudo pertence a Ele. Para quem sabe disso, todas possibilidades
de prazer sensual e exploraçäo säo desarraigadas. Por exemplo, uma mulher solteira pode
ter a possibilidade de ser abordada por muitos, mas h menos possibilidade para as
casadas, pois elas säo possuídas por alguém. Similarmente, quando conseguimos saber que
tudo apenas para a satisfaçäo de Krishna, entäo nos daremos conta de que todas nossas
tendências exploradoras teräo desaparecido para sempre. Näo restar nada a ser utilizado
para o prazer de nossa experiência sensual. Sentiremos muito profundamente em nossos
coraçöes que tudo possue sua existência para a satisfaçäo Dele, e que näo h espaço para
qualquer outra exploraçäo. E nós também estamos incluídos nisso - nossa existência também
somente para satisfaçäo Dele. Tudo se destina aos Seus passatempos divinos (lila), e näo
existe possibilidade para passatempos de outros. Todos se incluem naquela única lila. O
abuso desaparecer quando apreendermos a devida utilidade de tudo. Ele o dono, e Sua
propriedade absoluta. As escrituras, sociedade, e a lei designam: "Esse teu, aquele do
outro, ou aquilo l dum terceiro indivíduo." Isso algo como um empréstimo temporário,
mas a propriedade permanente em todos sentidos Dele. Todos outros - possuidor e
propriedade, paträo e servo - todos säo relativos, e s" säo sancionados por Ele por
enquanto. O Dono Absoluto, Proprietário e Desfrutador, s" Ele. Quando chegamos a
tal conclusäo, s" entäo que se torna possível a purificaçäo completa de nossos coraçöes.
Todo mundo est pensando em si mesmo como dono de muitas coisas, mas isso tudo doença
do coraçäo (hrd-rogam). Tudo isso concebido num estado de consciência adoentado. Num
estado saudável, quando o coraçäo est bem íntegro, podemos ver o Supremo todo, e
conseguimos enxergar que tudo se destina apenas satisfaçäo Dele.

69
Verso 11
Devido compaixäo por eles, Eu, situado dentro dos coraçöes de todos seres vivos, desfaço a
escuridäo da ignorância com o resplendor do conhecimento.

ou

Conquistado pelo amor daqueles devotos que, na mais elevada posiçäo de devoçäo
amorosa näo-calculista (jnana-sunya prema-bhakti), säo afligidos pela escuridäo que tudo
devora oriunda das dores agudas pela separaçäo de Mim, o Senhor deles - Eu,
concedendo a eles a iluminaçäo interna de encontrarem-Me pessoalmente, destruo a
escuridäo da agonia de separaçäo deles.

Comentário

A interpretaçäo geral sempre dada para este verso:


"Devido compaixäo por eles, Eu, situado dentro dos coraçöes deles, desfaço a escuridäo
da ignorância com o resplendor do conhecimento."

Mas se apreciarmos a devoçäo pura, näo-calculista (jnana-sunya bhakti), esta declaraçäo


do Senhor pode novamente parecer redundante e inconsistente. Se esses elevados devotos
j foram admitidos para realizar serviço contínuo e inadulterado, e mesmo acima disso, estäo
situados no plano do amor puro, espontâneo e automático (raga-marga), como se pode
harmonizar o fato de que o Senhor agora, no último estágio, destruir a ignorância (tamah)
deles oriunda de entendimento equivocado (ajnana-jam), dando-lhes conhecimento (jnana)?
Jnana somente uma cobertura - um conceito fútil, finito, do Infinito Absoluto
(jnana-karmady anavrtam... bhaktir utama). Se eles atingiram a devoçäo destituída da
cobertura do conhecimento (jnana-sunya bhakti), como que entäo teräo de retornar a
esse conhecimento (jnana)? Em seu comentário, Srila Visvanatha Chakravarti Thakura
mencionou que esse conhecimento extraordinário (vilaksanam), porém ele näo entrou em
detalhes específicos. Para esclarecer esse ponto, demos a seguinte explicaçäo:

Lamentaçäo e ilusäo em geral säo conhecidas como sintomas do modo da ignorância


(tamo-guna). Em jnana-sunya bhakti, os devotos elevados que tomam Krishna näo como
Deus Supremo, mas como amigo, filho, marido ou amante, viräo a experimentar
lamentaçäo e ilusäo, mas isso s" uma aparência externa de ignorância. De fato, a dor
da separaçäo divina. Eles lamentam: "Onde foste?"

Neste verso, a declaraçäo do Senhor, tesam evanukampartham em geral significa


"Afortunadamente para eles" ou "A fim de favorec-los (Eu afasto a escuridäo deles,
etc.)" Mas também pode ser interpretada como: "Quero o favor deles, aspiro ao favor
daqueles devotos da mais elevada ordem."

O Senhor também diz no Srimad Bhagavatam 10.82.44:

mayi bhaktir hi bhutanam, amrtatvaya kalpate


distya yad asin mat-sneho, bhavatinam mad-apanah

70
"Devoçäo a Mim o único meio para os seres vivos alcançarem a vida eterna. " Gopis, pela
fortuna de vocês, amor e afeiçäo de vocês por Mim a única razäo pela qual estäo tendo
Minha associaçäo."

Esse o sentido geral. Contudo, no Sri Chaitanya-Charitamrita, Srila Krishnadasa Kaviraja


Goswami extraiu o significado interno, que justamente o oposto:
"Através da devoçäo, todo mundo deseja que Eu os ajude a alcançar a mais alta posiçäo de
benefício eterno, e se possuem alguma conecçäo Comigo, consideram-se afortunados. Mas
Eu Me considero afortunado porque entrei em contato com a valiosa afeiçäo que encontrei
em seus coraçöes. Para Minha fortuna, obtive a associaçäo de vocês."

Portanto, aqui no Sri Gita, o Senhor est dizendo: "Tesam evanukampartham -


Conquistado pelo amor desses devotos, quando näo consigo tolerar as dores da separaçäo
que eles sentem, Eu imediatamente venho correndo satisfaz-los, e revelo a eles com luz
especial, consciência especial: "Voltei para vocês - agora vejam-Me." Com poderoso
resplendor (jnana-dipena) mostro-lhes Minha presença quando estäo muito necessitados
de Mim, e alivio sua dor da separaçäo."

Atma-bhava-sthah: Ele Se revela conforme o relacionamento divino de Seu devoto com Ele
(rasa): a um amigo, como amigo; a uma mäe, como filho; a uma esposa, como marido; e
às namoradas, como amante.

Depois que Sri Chaitanya Mahaprabhu deixou Seu lar e aceitou a ordem de vida
renunciada, sanyasa, mäe Sachi näo conseguia tolerar a profunda separaçäo, e começou
a chorar. Sachidevi preparava excelentes pratos, oferecendo-os Deidade, e chorava:
"Onde est Meu Nimai? Ele adora esses curries. Os pratos preferidos Dele, e Nimai
näo est aqui!" De repente, o Senhor Chaitanya veio e começou a comer. Sachidevi
exclamou: "oh, Nimai est comendo!" e por uns momentos sua separaçäo foi aliviada.
Momentos depois, ela reconsiderava: "Ser que vi Nimai comendo? Mas Ele agora
sanyasi em Jaganatha Puri, entäo como que Ele poderia estar aqui? Ser que servi a Ele?
Deve haver algum equívoco." Entäo ela examinou as panelas novamente para ver se
tinha comida dentro. Encontrando-as vazias, ela passou a conjeturar se mesmo algum
cachorro ou outro animal tinha vindo e comido tudo. Porém naquele momento, Nimai
tinha vindo de fato, e mäe Sachi O viu em plena luz do dia. Essa iluminaçäo
transcendental, e näo o "conhecimento" (jnana) que em geral conhecemos em nosso
vocabulário.

O auge do teísmo parakiya-rasa. Parakiya significa "de outra pessoa". Em qualquer


relacionamento divino (rasa), o Senhor cativa todos. Em toda Vrindavana, onde todos
seguem a senda do amor (raga-marga), est infundida essa parakiya-rasa. Os amigos de
Krishna às vezes dizem: "Algumas pessoas dizem que Krishna morador de Mathura.
Dizem que Ele filho de Vasudeva, e que brevemente ir para Mathura. Dizem que Ele näo
nosso amigo! Ser que realmente perderemos a companhia Dele? Entäo como seremos
capazes de viver nessa selva e apacentar as vacas?" Eles experimentam essa apreensäo -
"Podemos perd-Lo a qualquer hora." Isso intensifica o serviço amistoso deles ao Senhor.

Semelhantemente, mäe Yasoda diz: "Alguns dizem que Krishna näo meu filho, que filho de

71
Devaki. Que isso? Näo admito, Ele meu filho!" Essa idéia aumenta a afeiçäo de Yasoda
por Krishna: "Poderei perd-Lo? Entäo como irei viver?" Portanto, parakiya-rasa frisa a
raridade do relacionamento com Krishna, porque a possibilidade de perder Sua
companhia est sempre ali nos bastidores. Porém a maior intensidade de serviço
encontra-se no campo da madhura-rasa (amor conjugal). Nas outras rasas, existe a idéia
do suspense, que Ele possa "ir embora", mas no relacionamento conjugal na morada
divina de Vrindavana, os consortes infringem as diretrizes das escrituras e da sociedade, as
quais guiam todo mundo a permanecer como marido e mulher (svakiya)
("pertencentes"), porque a sançäo social e escritural geralmente um conceito velho.
Parakiya ou relacionamento de amante necessário para enganar aqueles que se
proclamam proprietários de outrem, tal como um marido e sua esposa, ou um pai e o filho.
No conceito normalmente aceito (svakiya) o relacionamento muito vulgar, porém infringir
a jurisdiçäo das escrituras e da sociedade, como amante, significa um risco maior, como se
cometesse pecado. Assim, esse relacionamento muito raro, e a raridade aumenta sua
intensidade e valor. A idéia de enganar o "possuidor" a fim de favorecer o "näo-possuidor",
um lindo conceito ornamental. De fato, no caso de Krishna näo pode existir qualquer
estado de amante, pois na verdade Ele o proprietário de tudo. Contudo, o arranjo divino
feito de tal forma para aumentar a devoçäo interna do devoto pelo Senhor, assim como o
alimento parece mais saboroso quando a fome est presente.

Nos planetas conhecidos como Vaikuntha, a natureza da adoraçäo do Senhor Vishnu


magnífica, majestosa, reverente, e inspira temor. Porém acima disso, o mais elevado conceito
de Deus assemelha-se forma e natureza humana. Declara o Sri Chaitanya-Charitamrita
nos ensinamentos a Sanatana Goswami:

krsnera yateka khela sarvotama nara-lila


nara-vapu tahara svarupa
gopa-vesa venukara nava-kisora natavara
nara-lila haya anurupa
krsnera madhura-rupa suna sanatana
ye rupera eka kana dubaya saba tribhuvana
sarva-prani kare akarsana

"A forma mais suprema de Deus Krishna, que brinca em Seus eternos passatempos
divinos igual a um ser humano. Um menino vaqueiro de juventude eterna, em Vrindavana,
Ele encena Seus passatempos sempre tocando Sua flauta. Sua beleza täo charmosa e doce,
que o universo inteiro inundado por apenas um átomo dela, e todos seres säo
irresistivelmente atraídos por Ele."

Todos podem se aproximar Dele. Podemos encontrar Deus mais perto - numa feiçäo
humana. Foi explicado como a natureza da feiçäo humana de Krishna a mais elevada
natureza do Absoluto, conforme o cálculo do êxtase (rasa), que o padräo comum para
medir todo escopo do Infinito. Desenvolvendo shanta -, dasya -, sakhya -, vatsalya -, e
madhura-rasa, e depois parakiya (paz, servidäo, amizade, paternidade, e amor
conjugal, e depois relacionamento de amante), isso fica comprovado científicamente, sem
f caprichosa ou cega. Se seguirmos a linha de Rupanuga-bhajana (devoçäo seguindo o
padräo de Srila Rupa Goswami) que se origina de Sri Chaitanyadeva, a base científica

72
poder ser apreciada. Os acharyas anteriores deixaram-nos instruçöes passo-a-passo, de
como poderemos seguir, conceber e atingir essas coisas.

Versos 12 e 13
Arjuna disse: " Senhor, és a Suprema Verdade Absoluta, o supremo refúgio, e o supremo
salvador. Todos sábios proeminentes tais como Devarishi Narada, Asita, Devala e Vyasa
descreveram-Te como a eterna Pessoa Suprema auto-iluminante, auto-manifesta, o
alicerce da majestade todo-poderosa, e a origem de cujo jogo divino tudo emana - e agora
estás declarando pessoalmente que isto verdade.

Verso 14
" Keshava, aceito totalmente como fato tudo que me disseste, a começar por Tua
declaraçäo: "na me viduh" - "Eles näo Me conhecem". " Senhor, agora fica
confirmado que ninguém, seja entre os semideuses ou entre os demônios, conhece Tua
identidade plenamente.

Verso 15
" Pessoa Suprema, pai universal, " Senhor de todos seres, Senhor de todos deuses, Senhor
do universo! Por Tua própria potência cognitiva, somente Tu podes conhecer-Te.

Verso 16
Por gentileza, descreva-me plenamente aquelas opulências pessoais sobrenaturais por meio
das quais permeias todos estes mundos.

Verso 17
" Senhor todo-poderoso da criaçäo, por favor diga-me como posso meditar em Ti
constantemente e em todos sentidos. Quais säo os elementos, qualidades, situaçöes, e formas
através das quais devo contemplar-Te em devoçäo?

Verso 18
" Janardana, por favor novamente descreva Tuas opulências majestosas e o processo de
devoçäo a Ti, desta vez de maneira elaborada, pois nunca me canso de ouvir Tuas
ambrosíacas palavras
e instruçöes.

Verso 19
O Senhor Supremo disse: " Arjuna, melhor dos Kurus, simplesmente descrever-te-ei as
Minhas todo-poderosas opulências proeminentes, manifestas, transcendentais que surgem de
Minha divina potência consciente, j que Minhas extensas glórias säo ilimitadas.

Verso 20
" Gudakesha, Eu sou a Superalma situada como o controlador dentro dos coraçöes de todas
almas, e sou a causa única do nascimento, manutençäo e aniquilaçäo de todos seres.

Verso 21
Dos doze Adityas, sou Vishnu; dentre os astros sou o grande sol radiante; dos Vayus sou
Marici, e entre as estrelas sou a lua.

73
Verso 22
Dos Vedas, sou o Sama-veda; entre os semideuses sou o Senhor Indra; dentre os sentidos
sou a mente, e sou a faculdade cognitiva de todos seres.

Verso 23
Dos onze Rudras sou Shankara; e entre a raça dos Yaksas e Raksasas sou Kuvera.
Dentre os oito Vasus sou Agni, e das montanhas sou Sumeru.

Verso 24
" Partha, deves conhecer-Me como o líder dos sacerdotes, Brhaspati; entre os generais
sou Kartikeya, e dos reservatórios sou o oceano.

Verso 25
Dos sábios, sou Bhrgu; das vibraçöes sonoras, sou o OM; de todos sacrifícios, a repetiçäo
dos santos nomes; e dos imóveis, os Himalayas.

Verso 26
Sou a Asvattha dentre as árvores, Narada entre os sábios divinos, Citraratha entre os
cantores divinos; e Kapila Muni entre os seres perfeitos.

Verso 27
Entre os cavalos, conheça-Me como Uccaihsrava, que nasce no momento em que se
batia o oceano de néctar; conheça-Me como Airavata entre os elefantes, e o rei entre os
homens.

Verso 28
Das armas, Eu sou o relâmpago, e das vacas sou a divina vaca que realiza desejos. Entre
os cupidos sou aquele que assegura progênie, e entre as cobras venenosas de uma cabeça
só, sou Vasuki, rei de todas serpentes.

Verso 29
Dentre as serpentes de muitas cabeças näo-venenosas, sou Ananta-naga, e entre as
aquáticas sou Varunadeva. Dos ancestrais deificados sou Aryama, e entre os executores da
lei sou Yamaraja, senhor da puniçäo.

Verso 30
Dentre os Daityas (descendentes de Diti) sou Prahlada Maharaja, e dos subjugadores Eu sou
o tempo. Entre todos animais sou o leäo, e das aves sou Garuda.

Verso 31
Entre os santificadores, ou entre os velozes, Eu sou o vento; dentre os heróis que manejam
armas sou o Senhor Parashurama; entre os peixes sou o tubaräo, e dos rios sou o Ganges.

Verso 32
" Arjuna, dentre os objetos criados, a começar pelo céu, somente Eu sou a criaçäo,
dissoluçäo e manutençäo. De toda sabedoria Eu sou o conhecimento da alma, e dos debates

74
e críticas dos logistas ou filósofos, sou a conclusäo demonstrada.

Verso 33
Entre as letras primárias do alfabeto Eu sou a letra "a" e das palavras compostas sou o
dual. Somente Eu sou o fluxo infinito do tempo, e dentre os criadores sou o Senhor Brahma
de quatro cabeças.

Verso 34
Dos que pilham, sou a morte, o destruidor de toda lembrança; e das seis transformaçöes
predestinadas das entidades vivas, sou o nascimento, a principal. Entre as senhoras, sou
as sete qualidades de uma boa esposa - graça, beleza, perfeita fala, lembrança,
inteligência, paciência, e perdäo.

Verso 35
De todos mantras no Sama-veda sou o Brhatsama mantra que entoado ao se orar ao
Senhor Indra, e dos mantras em perfeita métrica, sou o sagrado Gayatri mantra. Dos
meses, sou o principal, Agrahayana (ou Marga-sirsa), e das estaçöes sou a primavera.

Verso 36
Eu sou o jogar de dados dos jogadores que se enganam mutuamente, e a influência do
influente. Sou a vitória dos vitoriosos, a perseverança dos empreendedores, e a força dos
poderosos.

Verso 37
Dos Yadavas Eu sou Vasudeva, e dos Pandavas sou Arjuna; dos sábios sou Vyasadeva, e
entre os conhecedores eruditos das escrituras Eu sou Sukracharya.

Verso 38
Eu sou a puniçäo dada pelos castigadores, e a política diplomática dos que buscam
vitória. Sou o silêncio de todos segredos, e a sabedoria dos sábios.

Verso 39
" Arjuna, tudo que se tenha considerado como origem de todos seres - certamente sou isso.
Nenhum ser estacionário ou móvel, objeto ou alma, pode existir separadamente de Mim.

Verso 40
" conquistador do inimigo, näo h fim nas Minhas super-excelentes opulências. S" para tua
edificaçäo que descrevi algumas delas.

Verso 41
Saiba com certeza que tudo que sublime, lindo, e magnífico nasce de uma mera fraçäo de
Minha potência.

Verso 42
Porém Arjuna, qual a necessidade de se entender este elaborado conhecimento de Minha
grandiosidade todo-poderosa? Através de Minha expansäo plenária como a Suprema Alma
da natureza material, Maha-Vishnu (Karanarnavasayi Vishnu), permaneço sustentando este

75
universo inteiro de seres móveis e imóveis.

CAPITULO ONZE
Visva-rupa-darshana-yoga

A VISÄO DA FORMA UNIVERSAL

Verso 1
Arjuna disse: apenas por Tua misericórdia Teu tesouro oculto me foi revelado. Minha
ignorância de Tua natureza suprema agora foi completamente dispersa.

Verso 2
" lindo Senhor de olhos de lótus, agora ouvi Tua descriçäo elaborada e conclusiva sobre
a verdade concernente criaçäo e dissoluçäo das entidades vivas, e também ouvi sobre Tuas
glórias eternas, inesgotáveis.

Verso 3
" Senhor, Tua supremacia absoluta com certeza da maneira como a descreveste para Mim.
Porém anseio por realmente ver, " Purushottama, aquela Tua forma todo-poderosa.
Verso 4
" Senhor de todo poder místico, Te imploro, por favor exibe Tua todo-poderosa, imperecível
forma, se achas que conseguirei mir -La.

Verso 5
O Senhor Supremo disse: " Partha, serás capaz de mirar Minhas centenas de milhares
de expansöes divinas variadas, multicoloridas, e multiformes.

Verso 6
" Bharata, verás todas formas de Aditya, Vasu, Rudra, os gêmeos Asvini-kumara, as
quarenta e nove formas de Vayu, e muitas outras. Também verás todas muitas formas
maravilhosas dantes nunca vistas.

Verso 7
" vigilante Arjuna, o universo inteiro de seres móveis e imóveis, tua perspectiva futura de
vitória ou derrota, ou o que quer que desejes ver - verás simultaneamente nessa Minha forma
singular.

Verso 8
Näo conseguirás ver-Me através de teus olhos atuais, e por isso concedo-te visäo
sobrenatural com a qual enxergarás Minha todo-poderosa força suprema, absoluta.

Verso 9
Sanjaya disse: " Rei Dhrtarastra, falando assim a Arjuna, o Todo-Poderoso Omnipotente
Senhor Hari exibiu Sua forma de soberania suprema universal.

Versos 10 e 11
O Senhor Supremo exibiu Sua forma universal de ilimitadas faces e olhos, e infinitas

76
revelaçöes milagrosas. Muitos ornamentos deslumbrantes adornavam Seu corpo, e Ele
estava armado com muitas armas brilhantes. Soberbamente vestido com finas vestimentas,
resplandescentemente enguirlandado, e ungido com substâncias celestiais frangantes,
Sua estonteante refulgência e presença permeava tudo ao redor.

Verso 12O brilho de mil sóis alvorecendo poderia assemelhar-se um pouco refulgência
daquela forma universal do Senhor Supremo.

Verso 13
Naquele momento, ali no campo de batalha, Arjuna podia ver o universo inteiro
repousando num s" local, e no entanto dividido em muitas facetas, todas contidas na forma
do Senhor Sri Krishna, o Deus Supremo de todos deuses.

Verso 14
Vendo tal forma espantosa, o maravilhado Arjuna, seu corpo inteiro latejando de êxtase,
curvou sua cabeça em reverência ao Senhor Sri Krishna, o Deus Supremo de todos deuses.
Suas mäos postas em oraçäo, Arjuna começou a falar.

Verso 15
Arjuna disse: " Senhor de forma magnífica, em Teu corpo posso ver os semideuses, todas
espécies de vida, sábios transcendentais e serpentes, bem como Mahadeva, e o Senhor
Brahma que est sentado sobre a flor de lótus.

Verso 16
" Senhor do universo! " forma universal! Em todas direçöes vejo Teu corpo ilimitado de
muitos braços, barrigas, olhos e faces - contudo näo consigo obter um vislumbre de Teu
início, meio ou fim.

Verso 17
Resplandescente com coroas, manejando armas de maças e discos - em todo lugar! vejo
Tua imagem que tudo ilumina, refulgente, radiante como o fogo e o sol ardente, e por isso
muito difícil de mirar e completamente além da imaginaçäo.

Verso 18
És a personificaçäo da Verdade Suprema Absoluta que se pode conhecer através dos
Vedas. És o reservatório exclusivo deste universo, e o imperecível preservador da
religiäo eterna mencionada nos Vedas. Certamente és a Suprema Personalidade eterna, e
esta minha firme convicçäo.

Verso 19
Sem começo, meio ou fim, ilimitadamente poderoso e possuindo incontáveis braços, seus
olhos säo como o sol e a lua, e sua face como o fogo ardente - vejo-Te queimando o universo
através de Teu intenso brilho.

Verso 20
Somente Tu permeias todas direçöes e todo espaço entre o céu e a Terra. " forma universal,
ao ver esta Tua forma espantosa e aterradora, todos residentes dos três mundos ficam

77
cheios de temor.

Verso 21
Todos estes semideuses estäo entrando em Ti, alguns cheios de medo oferecem-Te oraçöes
de mäos postas. Os grandes sábios e seres aperfeiçoados estäo oferecendo oraçöes seletas,
cheias de adoraçäo a Ti, dizendo: "Que se manifeste toda auspiciosidade no universo."

Verso 22
Os semideuses conhecidos como Rudra, Aditya, Vasu, Sadhya, Visvadeva, os gêmeos
Asvini-kumaras, deidades do ar, deidades dos antepassados, as raças dos Gandharvas,
Yaksas, Asuras, e Siddhas - na verdade, todos estes Te miram maravilhados.

Verso 23
" Todo-Poderoso, ao ver Tua colossal forma de muitas faces, olhos, braços, pernas, pés, e
ventres, atemorizante com Seus numerosos dentes - todos seres, inclusive eu mesmo,
ficam aterrorizados.

Verso 24
" forma universal! Ao ver Tua radiante forma de míriades de cores que se alça aos céus,
com a boca entreaberta e gigantescos olhos fulgurantes, meu coraçäo tomado pelo medo e
näo consigo de maneira nenhuma permanecer composto ou calmo.

Verso 25
Apenas por ver Teus rostos que se assemelham ao fogo da aniquilaçäo universal,
aterrorizantes com todos aqueles dentes terriveis, näo consigo mais distinguir uma direçäo
de outra, nem tampouco consigo encontrar a paz de espírito. " Supremo Senhor de todos
deuses, " abrigo do universo, por favor seja misericordioso para comigo.

Versos 26 e 27
Os filhos de Dhrtarastra junto com seus reis, e Bhisma, Drona, aquele Karna - junto com
nossos principais guerreiros - todos estäo se precipitando para entrar em Tuas
aterrorizantes bocas que säo pavorosas com Seus dentes. E alguns se v com as cabeças
esmagadas presas entre Teus dentes.

Verso 28
Assim como as muitas correntes dos rios fluem para o oceano e finalmente entram nele,
assim estes heróis do mundo estäo entrando nas ardentes cavidades de Tuas bocas.

Verso 29
Assim como as mariposas irresistivelmente se arrojam no fogo ardente, da mesma
maneira todas estas pessoas estäo se precipitando loucamente para a morte certa,
entrando em Tuas bocas.

Verso 30
" Personalidade do Todo-Poderoso, que estás a ponto de engolir todas estas vitimas, Tuas
bocas ardentes estäo devorando tudo com voracidade. O universo inteiro est sendo
chamuscado por Tua brilhante refulgência pessoal omni-penetrante.

78
Verso 31
" temível Ser, por favor diga-me quem és. " Senhor dos senhores, presto minhas
reverências a Ti; por favor seja misericordioso para comigo. Desejo saber mais acerca de
Ti, a Pessoa original, j que me difícil compreender a intençäo subjacente às Tuas açöes.

Verso 32
O Senhor Supremo disse: Eu sou o tempo, a poderosa força que conquista tudo, e Minha
missäo devorar todos que residem neste mundo. De todos que lutam no partido inimigo,
mesmo se näo forem mortos por ti, ninguém ser poupado.

Verso 33
Por isso toma tua posiçäo para a batalha, aceite a glória, conquiste todos inimigos, e
desfrute de um reinado próspero. Na verdade, todos esses inimigos muito antes j foram
mortos por Mim. " Savyasacin, simplesmente aceite todo crédito por isso.

Verso 34
Mata (novamente) Dronacharya, Bhisma, Jayadratha, Karna, e os muitos guerreiros, que
todos j foram mortos por Mim. Näo hesite - lute! Sem dúvida, serás capaz de conquistar os
inimigos.

Verso 35
Sanjaya disse: Depois de ouvir todas essas coisas faladas pelo Senhor Keshava, Arjuna,
seu corpo tremendo, ofereceu seus respeitos a Ele de mäos postas. Com o coraçäo
temeroso, de novo curvando-se diante do Senhor, ele começou a falar com palavras
hesitantes.

Verso 36
Arjuna disse: " Hrishikesha, todo universo sente grande êxtase por cantar Tuas glórias, e
todos alcançam o amor a Ti. Com mêdo, os demônios fogem em todas direçöes, mas os seres
aperfeiçoados prestam respeitosas reverências a Ti. Certamente esta a verdadeira ordem
das coisas.

Verso 37
" poderosa personalidade, " Ser ilimitado, " Deus dos deuses, " morada do universo!
Porque, entäo, näo devem todos oferecer respeitos a Ti, que és o adorável pai at mesmo do
Senhor Brahma? Também és superior a Teu aspecto impessoal, que a causa e efeito
(geral) de tudo (no plano mundano).

Verso 38
És a origem eterna de todos semideuses, e o único refúgio deste universo. Somente tu és o
conhecedor e o cognoscível, e a encarnaçäo da transcendência. " Ser ilimitado, todo
este universo est permeado por Ti.

Verso 39
És os semideuses que presidem o ar, a morte, o fogo, o oceano, e a lua. És Brahma, que o
av de todos seres, e és também pai dele. Reverências a Ti milhares e milhares de vezes, de

79
novo e repetidamente.

Verso 40
" encarnaçäo de tudo, minhas reverências a Ti de frente, por trás, e por todos lados. "
infinito todo-poderoso, és tudo, pois por ilimitada potência estás penetrando o universo
inteiro.

Versos 41 e 42
Devido ilusäo e afeto tenho impulsivamente me dirigido a Ti como "Krishna", "Yadava",
ou "amigo", sem saber de Tuas glórias e dessa Tua poderosa forma universal. " infalivel,
também desrespeitei-Te com brincadeiras enquanto nos divertíamos, descansavamos,
sentavamos ou comíamos e assim por diante, seja sozinho Contigo ou diante de outros
companheiros. Portanto, estou implorando a Ti, que és inconcebivelmente poderoso, que
bondosamente me perdoe por todas estas ofensas.

Verso 43
" primeiro e único todo-poderoso, és o pai de todo mundo de seres móveis e imóveis, o objeto
de adoraçäo, o mestre - e és superior a todos estes também. Portanto dentro destes três
mundos ninguém consegue se igualar a Ti, e quanto mais superá-Lo.

Verso 44
" Senhor, como uma vara caída ao solo, prostro todo meu corpo diante de Ti, orando por
Tua misericórdia, j que és meu mestre adorável. Assim como um pai, amigo, ou amante
perdoa as ofensas de seu filho, companheiro, ou ser amado, por favor seja
misericordioso e da mesma forma perdoa minhas ofensas a Ti.

Verso 45
" Senhor, embora eu tenha me alegrado ao fitar essa Tua forma universal, que nunca
tinha visto antes, minha mente est aturdida de medo. Portanto, " Deus dos deuses, por
favor revela Tua anterior forma de quatro-braços. " Jagannivasa! Que possas ser cheio de
graça para comigo.

Verso 46
Desejo ver-Te conforme Te vi antes, com uma coroa em Tua cabeça, Tuas mäos segurando
uma maça e um disco. " Senhor de mil braços, " forma universal, que possais
misericordiosamente aparecer naquela forma de quatro braços.

Verso 47
O Senhor Supremo disse: " Arjuna, estando satisfeito contigo, hoje revelei esta forma
refulgente, omni-penetrante, ilimitada e primordial, por Minha divina potência. Esta
forma universal mais eminente nunca foi vista antes por mais ninguém.

Verso 48
" Arjuna, melhor dos Kauravas, neste mundo ninguém além de ti consegue ver esta
Minha forma universal, que näo pode ser percebida nem pelos realizadores de
sacrifícios védicos, caridade, estudo, rituais ou austeridades severas.

80
Verso 49
Näo permita que teu medo e perplexidade persistam, oriundos da visäo de Minha forma
universal aterradora. Com um coraçäo tranquilo, contente, veja de novo Minha forma de
quatro braços.

Verso 50
Sanjaya disse: Tendo dito isto a Arjuna, Krishna exibiu Sua forma (de quatro braços, a
fim de atender a oraçäo de Arjuna). Depois disso, o Senhor novamente revelou Sua doce
personalidade - o mais misericordioso Senhor, Sri Krishna (de feiçöes humanas
encantadoras, usando roupa amarela e reconhecivel por Suas feiçöes de divina beleza),
assim tranquilizando o temeroso Arjuna.

Verso 51
Arjuna disse: " Janardana, meu coraçäo est realizado por ver Tua encantadora forma de
feiçöes humanas. Meu temor dissolveu-se, e minha tranquilidade interior voltou.

Verso 52
O Senhor Supremo disse: " Arjuna, a oportunidade de ver-Me como estás vendo diante de ti,
muito, muito raramente obtida. Mesmo os deuses constantemente aspiram a um vislumbre
dessa forma da verdade, consciência e beleza, com aparência humana.

Verso 53
Nem pelo estudo dos Vedas, nem pela austeridade, caridade, ou sacrifício, se pode ver
Minha eterna forma da Verdade Suprema Absoluta com aparência humana (Parabrahman)
que agora estás vendo diante de ti.

Verso 54
" Arjuna, conquistador do inimigo, embora nesta Minha forma seja praticamente impossível
que Eu seja visto por todos outros métodos, os devotos puros, por sua devoçäo exclusiva a
Mim, säo capazes de realmente conhecer-Me, ver-Me, e entrar em Meus divinos
passatempos.

Verso 55
" Arjuna, quem realiza deveres exclusivamente s" para Meu serviço, Me aceita como o
refúgio supremo, se ocupa nas práticas devocionais, permanece desapegado do plano
mundano e livre de qualquer inimizade para com todos seres - tal pessoa certamente chega
a Mim.

81
CAPITULO DOZE
Bhakti-yoga

A SENDA DA DEVOÇÄO

Verso 1
Arjuna indagou: Acabas de descrever os devotos que se ocupam em Teu serviço devocional
exclusivo e Te adoram (como Shyamasundara, Tua forma original de aparência humana).
Também mencionaste outros que se concentram no aspecto impessoal do Absoluto. Por favor
diga-me, qual dos dois superior?

Verso 2
O Senhor Supremo disse: Aqueles que, com a f pura, sem misturas, absorvem plenamente sua
consciência em pensamentos sobre esta Minha forma divina Shyamasundara, e Me adoram
constantemente através da senda da devoçäo exclusiva, säo definitivamente os conhecedores
mais excelsos da unidade divina (yoga). De fato, esta Minha opiniäo.

Versos 3 e 4
Entretanto, aqueles que controlam plenamente seus sentidos, adotam a visäo equânime para
com tudo, ocupam-se em atos para o bem-estar de todos seres, e na adoraçäo do aspecto do
Absoluto que indefinível, sem forma, sem atributos, que nunca decresce ou aumenta, e omni-
penetrante e eternamente impessoal - estes também podem se aproximar de Mim. Isto é, eles
alcançam Minha ofuscante refulgência pessoal Brahman.

Comentário

A declaraçäo do Senhor de que "Os adoradores do Brahman impessoal certamente também Me


alcançam", näo deve ser mal interpretada como significando que os impersonalistas
(Mayavadis) estäo no mesmo nível com os devotos (Vaisnavas). A chave que revela como os
impersonalistas também podem alcançar Krishna foi dada por Srila Bhaktivinoda Thakura em
seu comentário sobre o Sri Gita:

"Uma pessoa atinge a liberaçäo do plano mundano por seguir a senda da açäo desinteressada
at o estágio da meditaçäo, conforme descrito nos primeiros seis capítulos do Gita. Depois
poder passar por grande dificuldade ao buscar o Senhor na senda do impersonalismo. Mas
quando ela progride ao estágio de dedicar-se a realizar trabalho assistencial para os outros
(sarva-bhuta-hite ratah), poder ter a chance de prestar serviço a um devoto puro.

Por exemplo, se nos ocuparmos no trabalho de assistência ao público geral tal como abrir e
manter um hospital, caso algum serviço seja prestado a um Vaisnava mesmo sem saber, a!
principia o mérito devocional da pessoa (a-jnata-sukrti). Através da associaçäo com um
devoto (sadhu-sanga) a pessoa desenvolve f na forma pessoal original, divina do Senhor e
automaticamente abandona a tentativa de alcançar o Brahman impessoal. Tendo se tornado fiel
na senda da devoçäo, a pessoa se refugia num guru bona fide, se ocupa nas práticas devocionais
baseadas em ouvir e cantar as glórias do Senhor e progride na senda de regresso ao lar, de
volta para o Supremo. Assim o Senhor Krishna est dizendo:

82
"Eu sou a meta final, e aquele Brahman somente uma posiçäo relativa. Näo o absoluto
final pois a posiçäo absoluta Minha. S" se os Mayavadis servirem aos outros e assim tiverem
a chance de servir um Vaisnava, que conseguiräo de fato chegar a Mim - pois a única
maneira de vir a Mim através de um Vaisnava."

rahuganaitat tapasa na yati


na cejyaya virvapanad grhad va
na cchandasa naiva jalagni-suryair
vina mahat-pada-rajo 'bhisekam

(O sábio Jada Bharata disse ao Rei Rahugana:)

"" Rahugana, sem banhar a alma na poeira dos sagrados pés dos devotos puros
(mahabhagavata vaisnavas), näo se pode conhecer o Senhor Supremo apenas por ter adotado
a vida religiosa de brahmacharya, grhastha, vanaprastha, ou sannyasa, ou por se adorar os
deuses da água, fogo, sol, etc." (Bhag.5.12.12)

naisam matis tavad urukramanghrim


sprsaty anarthapagamo yad arthah
mahiyasam pada-rajo 'bhisekam
niskincananam na vrnita yavat

(Prahlada Maharaja disse:)

"Enquanto a pessoa näo tiver sido banhada na poeira dos pés do devoto plenamente rendido do
Senhor Krishna, ela näo conseguir tocar os pés de lótus de Krishna, que säo os destruidores
de todos males." (Bhag. 7.5.32)

Considerar que o Senhor tomou os aspectos pessoal e impessoal como sendo iguais um
erro comumente muito cometido. Respondendo dúvida de Arjuna a esse respeito, o Senhor
replicou claramente que os personalistas säo superiores aos impersonalistas - contudo,
os impersonalistas também recebem uma chance de alcanç -Lo, porque sem Ele, näo existe meta
final. Sem chegar senda da devoçäo, os adoradores do Brahman impessoal alcançaräo aquele
Brahman, que a estonteante refulgência da forma divina do Senhor Sri Krishna.

Verso 5
Pessoas cujas mentes estäo apegadas ao Brahman impessoal experimentam excessiva
tribulaçäo, porque para as almas encarnadas, os meios e a meta do impersonalismo säo
alcançados de maneira infeliz.

Versos 6 e 7
Mas aqueles que oferecem cada uma de suas açöes a Mim, s" se refugiam em Mim, pensam
em Mim constantemente com devoçäo pura inadulterada pela exploraçäo e renúncia, e que
assim Me adoram e veneram - " Partha, em breve Eu salvo tais almas devotadas do
oceano mortal do sofrimento material.

Verso 8

83
Portanto, fixa tua mente exclusivamente em Mim - Shyamasundara - e lembra-te de Mim
constantemente. Quando tua inteligência estiver assim repousando em Mim, definitivamente
residirás Comigo após a morte. Quanto a isso näo h dúvida.

Verso 9
" Dhananjaya, e se näo conseguires estabelecer tua mente em Mim com f firme, entäo procura
alcançar-Me pela prática repetida de lembrar-se de Mim.

Verso 10
Se nesta prática também näo tiveres sucesso, entäo ocupa-te devotadamente em açöes
relacionadas a Mim. Certamente alcançarás a perfeiçäo mesmo ocupado em açöes, enquanto
estas forem
realizadas para Minha satisfaçäo e baseadas em ouvir e cantar devocionalmente as Minhas
glórias.

Verso 11
E se mesmo isto näo conseguires realizar, entäo executa cada uma de tuas açöes como uma
oferenda a Mim. Com a mente controlada, refugiando-te em tal convicçäo, abandona toda
consideraçäo dos frutos de tuas açöes.

Verso 12
A realizaçäo divina de Mim melhor que a tentativa de auto-exerçäo, e plena absorçäo do
coraçäo em pura meditaçäo devocional em Mim melhor que tal realizaçäo. Pela meditaçäo, o
desejo por felicidade celestial ou liberaçäo desfeito, e quando finalmente se passa a näo ter
desejos, a tranquilidade que surge da indiferença ao prazer mundano se torna manifesta.

Versos 13 e 14
Aquele Meu devoto destituído de violência para com todas entidades vivas, mas sim,
amistoso para com todas elas, que misericordioso para com os necessitados, livre de
apegos indevidos para com filhos, esposa, família e objetos associados, livre do orgulho egoísta
da identificaçäo corpórea, equilibrado tanto na felicidade quanto na infelicidade, sempre
contente com os resultados obtidos, ocupado em serviço devocional, dotado de fortaleza,
plenamente resolvido em devoçäo exclusiva, e cuja mente e inteligência estäo dedicadas a
Mim - certamente tal personalidade Meu amado.

Verso 15
Quem jamais perturba os outros, e que nunca se perturba com alguém, e que est liberado da
felicidade mundana, ira, medo e agitaçäo - certamente este Me muito querido.

Verso 16
Meu devoto que est livre de expectativas em suas atividades gerais, que desapegado,
externa e internamente puro, perito, imperturbado, e livre de todos tipos de atividades
exploradoras - certamente este Me muito querido.

Verso 17
Aquele que näo fica muito eufórico pelo ganho mundano nem amofinado pelo contato
com coisas indesejáveis, que nem se lamenta pela perda de quaisquer valores materiais nem

84
aspira a quaisquer objetos que falte obter, e que permanece desapegado tanto das açöes
piedosas, quanto das pecaminosas - uma personalidade verdadeiramente devotada com tal
natureza Me muito próxima e querida.

Versos 18 e 19
Uma pessoa que v com igualdade inimigos e amigos, honra e desonra; que mantém seu
equilíbrio na presença de frio, calor, prazer, e dor; que completamente livre de obsessäo;
que considera igualmente insultos e louvores; cuja fala controlada; que se contenta com o que
consegue sem esforço; que näo apegada ao lar; cuja inteligência est firmemente estabelecida no
divino, e que um verdadeiro devoto - certamente Me muito querida.

Verso 20
E aqueles devotos que se abrigam em Mim com sublime f e adoram esta senda ambrosíaca da
devoçäo, säo adorados por Mim como pertencendo a Mim mesmo.

CAPITULO TREZE
Prakriti-purusha-viveka-yoga

O PREDOMINADO E O PREDOMINADOR

Verso 1
Arjuna disse: " Keshava, gostaria de saber sobre os princípios do predominado, do
predominador, a esfera de açäo, o conhecedor dessa esfera, o conhecimento e o cognoscível.

Verso 2
O Senhor Supremo disse: " Arjuna, este corpo (grosseiro e sutil ou físico e mental) conhecido
como a esfera de açäo, ou ksetra. A entidade consciente (a alma) que experimenta a existência
deste corpo descrita pelos que enxergam a verdade como o conhecedor da esfera da açäo, ou
ksetra-jna.

Verso 3
" Bharata, deves conhecer-Me como o conhecedor de todas esferas de açäo (como a Superalma
situada no coraçäo de todas entidades vivas). Tal conhecimento fundamental e essencial da
esfera de açäo e os conhecedores dessa esfera (do conhecimento sobre o mundano, a alma, e
a Superalma) considero que seja conhecimento verdadeiro.

Verso 4
Agora ouça de Mim o resumo da substância e natureza desta esfera de açäo, e de que maneira
ela se produz. Também escute sobre a forma fundamental e potência do conhecedor da esfera da
açäo.

Verso 5
Esse princípio fundamental da esfera da açäo e seu conhecedor tem sido descritos de muitas e
muitas maneiras pelos Rishis, pelos diferentes aforismas védicos, bem como pelos
aforismas da escritura Vedanta-sutra, repleta de sólida lógica e conclusöes irrefutáveis.

Versos 6 e 7

85
Os cinco elementos principais (terra, água, fogo, ar e éter), o ego componente da
personalidade, o elemento do intelecto, o elemento primordial da natureza material, os cinco
sentidos de percepçäo (olho, língua, tato, nariz e ouvido), os cinco sentidos de açäo (voz,
mäos, pernas, ânus, e genitais), o sentido interno (mente), os cinco objetos aceitáveis dos
sentidos (forma, paladar, tato, olfato, e som), desejo, ódio, felicidade, infelicidade, o
corpo, a faculdade de perceber da mente, paciência, e as seis transformaçöes materiais do
nascimento, manutençäo, crescimento, maturidade, declínio, e destruiçäo - em resumo, todos
estes säo conhecidos como ksetra, a esfera da açäo.

Versos 6 a 12
Humildade, ausência de orgulho, näo-violência, tolerância, honestidade, serviço ao guru,
pureza, estabilidade, auto-controle, desapego dos prazeres sensuais, ausência de egoísmo,
uma visäo objetiva dos defeitos miseráveis da vida material, isto é, nascimento, morte, a
insegurança da velhice, doença, etc., estar livre da paixäo pela esposa, filhos, lar, etc., näo se
absorver na felicidade ou infelicidade de outros, manter a mente constantemente equânime
mesmo em contato com objetos desejáveis ou indesejáveis, possuir devoçäo infalível e
inadulterada por Mim, preferir a solidäo, ser indiferente ao convívio social mundano,
perceber a eternidade do auto-conhecimento, e realizar a meta do conhecimento divino -
certamente tudo isto tem sido declarado como conhecimento de fato, e o que näo faz parte
disto ignorância.

Verso 13
Agora descreverei jneya, o cognoscível, que ao ser conhecido revela o sabor ambrosíaco da
auto-satisfaçäo interna. Esse princípio elementar descrito como Brahman. Ele sem começo e
eterno. Subordinado a Mim, indescritível em termos de causa e efeito mundanos.

Verso 14
Esse princípio superior preside sobre todas direçöes, e permeia tudo no universo com Suas
mäos, pernas, olhos, cabeças, rostos, e ouvidos em toda parte (como Paramatma, a Superalma).

Verso 15
Embora esse supremo princípio o iluminador de todos sentidos e seus objetos, Ele est isento
de sentidos materiais; embora completamente distante, Ele o mantenedor de todos na forma
do Senhor Vishnu; e embora transcendental aos três modos da natureza material, Ele pode ser
servido por aquela natureza modal.

Verso 16
Presente dentro e fora de todos seres, o princípio supremo a totalidade de seres móveis e
estacionários (como transformaçäo energética). Imperceptível para a ciência material por ser
sutil ao extremo, Ele o mais íntimo, porém o mais distante.

Verso 17
Embora seja um elemento indivisível, Ele est situado dividido entre todas entidades vivas.
Embora situado como uma personalidade invididual junto com cada uma das almas, Ele o
observador que habita no interior de todos seres - o singular, indivisível, omnipresente,
agregado Senhor Supremo. Ele (na forma do Senhor Narayana) conhecido como o
mantenedor, aniquilador, e criador de todos seres.

86
Verso 18
Ele conhecido como o iluminador at mesmo dos astros. Ele conhecido como o imanifesto,
além at mesmo da escuridäo. Somente Ele o princípio fundamental do conhecimento e
do cognoscível, e Ele pode ser conhecido pelas práticas ante-mencionadas definidas como
conhecimento. Ele permanece situado dentro do coraçäo de todos como a Superalma,
Paramatma.

Verso 19
Assim, os princípios da esfera da açäo, conhecimento e do cognoscível (ksetra, jnana, e
jneya) foram descritas por Mim em resumo. (O cognoscível foi descrito como Brahman,
Paramatma, e Bhagavan). Compreendendo profundamente estas verdades, Meus devotos
alcançam bhavamaya-bhajana - eles Me adoram de todo coraçäo (tendo se tornado libertos
de qualquer conotaçäo de designaçöes).

Verso 20
Deves certamente estar ciente de que a natureza material e a alma säo sem começo; e todas
transformaçöes físicas, sensuais, mentais, intelectuais ou egoístas, bem como as
consequências da açäo dos modos materiais - baseadas em felicidade, infelicidade,
lamentaçäo, e ilusäo - provém da natureza material.

Verso 21
A natureza material tem sido descrita como responsável pela causa na forma da força
dominante dos sentidos, e como efeito na forma do corpo material; e a própria alma
(condicionada) sabe-se que responsável por sua felicidade e infelicidade acumulada.

Verso 22
Apenas por estar enfeitiçada pela natureza material (prakriti) que a pessoa (purusha) acumula
as diversas alegrias e tristezas dessa natureza. Sua paixäo pelas qualidades materiais a única
causa que a faz aceitar repetidos nascimentos nos ventres de formas de vida mais elevadas e
inferiores.

Verso 23
Dentro desse mesmo corpo (distinto da alma) a Suprema Pessoa ou Parama Purusha est
presente como a testemunha da alma, sua autoridade, seu apoio, guardiäo, e Senhor. Ele
conhecido como a Superalma.

Verso 24
Quem assim compreender estas verdades relativas aos modos da natureza material, da
alma predominada, e da Superalma predominadora - tal pessoa näo ter de nascer
novamente, independente de sua situaçäo material.

Versos 25 e 26
Algumas pessoas percebem diretamente a Superalma situada dentro de seus coraçöes por
força de sua realizaçäo divina, perfeita, pura. Algumas percebem-No pela discriminaçäo do
espírito e matéria, e algumas pela meditaçäo yoga ou pela senda yoga da açäo desinteressada.
Além disso, existem aqueles que, sem conhecer nenhum destes métodos, se ocupam na

87
adoraçäo após ouvir instruçöes de autoridades. Quando a f destes se aprofunda, através
deste ouvir eles certamente transcendem este mundo material de sofrimento mortal.

Verso 27
" Arjuna, melhor dos Bharatas, tudo que nasce no mundo, seja móvel ou estácionário, saiba
que provém da combinaçäo da esfera da açäo e seu conhecedor.

Verso 28
Quem v o Senhor Supremo (na forma da Superalma) situado igualmente dentro de todas
espécies, desde o Senhor Brahma at às formas de vida imóveis, e que v a natureza imperecível
do Senhor imanente no que perecível - tal pessoa de fato vê.

Verso 29
Quem assim percebe o pleno e imparcial domínio, näo se degrada com a maldade - mas sim
progride rumo ao destino supremo.

Verso 30
Quem v que toda açäo realizada pela natureza material (na forma do corpo, sentidos, e
parafernália ligada), de fato enxerga a si próprio, a alma espiritual pura, como o näo-agente.
Percebe que a alma espiritual pura näo possue qualquer natureza ou atividade mundana.

Verso 31
Quando uma pessoa realmente perceptiva consegue compreender que a diferenciaçäo das
várias espécies de vida ocorre somente dentro da natureza material (ou distinçäo corpórea), e
que todos se expandem novamente da mesma natureza (na hora da criaçäo universal),
entäo ela experimenta a realizaçäo do Brahman, enxergando com igualdade todos
conhecedores da esfera da açäo (dentro da relatividade da natureza).

Verso 32
" Arjuna, j que a Superalma por natureza sem começo, transcendental, e eternamente
perfeita, embora Ela esteja situada no corpo (junto com a alma), Ela näo realiza nenhuma açäo
nem se torna implicada pela natureza da esfera da açäo (tal como a alma condicionada o faz).

Verso 33
Tal como o éter se situa em todo lugar (assim como na lama) e no entanto devido a sua
natureza sutil näo se mistura com nada, semelhantemente, embora permeie o corpo inteiro,
a alma discriminante näo se mistura com a natureza do corpo.

Verso 34
" Bharata, assim como um sol ilumina o universo inteiro, assim também o conhecedor da
esfera da açäo, a Superalma, ilumina o universo todo (e as almas dentro dele); e assim o
conhecedor da esfera da açäo, a alma, ilumina o corpo inteiro.

Verso 35
Aqueles que, pela visäo do conhecimento, conseguem distinguir entre a esfera da açäo e seus
dois conhecedores, e que dessa forma conseguem conhecer a senda da liberaçäo da alma da
matéria - tais pessoas alcançam a atmosfera transcendental.

88
CAPITULO QUATORZE
Gunatraya-vibhaga-yoga

A DIVISÄO TRIPLICE DOS MODOS DA NATUREZA MATERIAL

Verso 1
O Senhor Supremo disse: Agora descrever-te-ei novamente aquela suprema sabedoria, cujo
conhecimento fez todos sábios atingirem a suprema perfeiçäo além deste plano mundano.

Verso 2
Por refugiar-se neste conhecimento, a alma obtém uma natureza (predominantemente)
semelhante Minha. Entäo ela nem renasce na hora da criaçäo universal, nem experimenta as
dores da morte na hora da aniquilaçäo universal.

Verso 3
" Bharata, a natureza material, conhecida como pradhana, o ventre no qual lancei a semente
(na forma da alma individual que nasce da potência marginal). Daquele local, todos
seres liderados pelo Senhor Brahma säo gerados.

Verso 4
" Kaunteya, Brahman personificado como a mäe natureza a progenitora de todos diversos
corpos que nascem dentro de todas espécies de vida, chefiadas pelos semideuses e seres
humanos - e Eu (como a consciência causal) sou o pai que d a semente.

Verso 5
" poderoso herói, Arjuna, estes três modos materiais da natureza - bondade, paixäo e
ignorância - que se manifestam da natureza material, säo a causa pela qual a imutável
alma espiritual encarnada fica escravizada pelos sentimentos mundanos baseados em
felicidade, infelicidade, e ilusäo.

Verso 6
" ente sem pecado, devido a sua natureza comparativamente mais pura entre estes três modos
materiais, o modo da bondade um iluminador da natureza das coisas e duma natureza
tranquila. Ele escraviza a alma espiritual pelo apego felicidade e conhecimento.

Verso 7
" filho de Kunti, deves saber que o modo da paixäo a encarnaçäo da obsessäo pelo desfrute
sensual. Origem do desejo de posse e sentimento apaixonado, ele escraviza a alma pelo apego
açäo.

Verso 8
E, " Bharata, deves saber que o modo da ignorância nasce da escuridäo, e o ilusionista de
todos seres. Este modo da ignorância cativa os seres encarnados através do descuido,
preguiça, e sonolência.

Verso 9

89
" Arjuna, a bondade condiciona a alma felicidade, e a paixäo condiciona-a açäo. Porém o
modo da ignorância, encobrindo a sabedoria da entidade viva, condiciona-a indolência,
desleixo e sonolência.

Verso 10
" Bharata, a bondade supera a paixäo e a ignorância, a paixäo supera a bondade e
ignorância, e a ignorância supera a bondade e paixäo. Cada modo por sua vez conquista
os outros numa infindável batalha pela supremacia.

Verso 11
Quando o conhecimento da natureza verdadeira dos objetos dos sentidos aparece
abundantemente dentro da percepçäo dos sentidos desse corpo, deves com certeza saber que
isto o característico desenvolvimento do modo da bondade. Isto ser reconhecido pelo
antemencionado sintoma da felicidade.

Verso 12
" Arjuna, mais nobre da dinastia Bharata, saiba que a cobiça, excesso de esforço,
tentativas ambiciosas, prazer sensual incessante, e desejo nascem quando o modo da paixäo
se desenvolve numa pessoa.

Verso 13
" Kurunandana, com a influência do modo da ignorância, todos sintomas da falta de juízo,
desalento, indolência, e mentira se tornam manifestos.

Verso 14
Se qualquer alma sucumbir às mandíbulas da morte num momento quando o modo da
bondade estiver influenciando-a predominantemente, ela ir para os planetas puros dos
adoradores de Hiranyagarbha (Brahma) e outros deuses.

Verso 15
Quando uma pessoa morre no modo da paixäo, ela volta a nascer na sociedade karmi de
homens viciados no trabalho fruitivo. Se morrer no modo da ignorância, voltar a nascer
entre os animais ou outras espécies grosseiramente ignorantes.

Verso 16
Os sábios eruditos proclamam que as boas obras concedem um resultado de paz e
felicidade; obras apaixonadas resultam em miséria, e obras ignorantes resultam na escuridäo
e mortalidade.

Verso 17
A partir do modo da bondade, surge o conhecimento; do modo da paixäo, surge cobiça; e do
modo da ignorância, a insanidade, ilusäo e tolice.

Verso 18
Pessoas no modo da bondade ascendem (at Satyaloka); aqueles no modo da paixäo
permanecem na regiäo intermediária (ou sociedade humana), e entes abomináveis de natureza
ignorante decaem aos planos inferiores (de sofrimento infernal).

90
Verso 19
Quando uma pessoa percebe que além dos três modos da natureza näo existe outra causa para
a açäo neste mundo modal, e quando consegue conhecer o Senhor dos três modos, que
transcendental aos mesmos, ela se torna divinamente inspirada com amor por Mim.*

(*) O assunto da inspiraçäo divina no serviço devocional elaboradamente tratado no


comentário do autor sobre os quatro principais versos do Sri Gita (vide versos 10-8 a 11).

Verso 20
Quando a alma transcende estes três modos da natureza material a partir dos quais o corpo
produzido, e se torna absolutamente liberada do nascimento, morte, velhice, e miséria, ela
entäo prova do néctar do amor divino sem mistura com os modos da natureza.

Verso 21
Arjuna disse: " Senhor, (1) por quais sintomas pode uma pessoa transcendental a estes três
modos na natureza material ser identificada? (2) como ela se comporta?, e (3) como
ela transcende estes modos?

Versos 22 a 25
O Senhor Supremo respondeu: " Pandava, (1) aquele que näo se resente pelo aparecimento
da revelaçäo (efeito do modo da bondade), ativaçäo (efeito do modo da paixäo), e
estupefaçäo (efeito do modo da ignorância), nem almeja que cessem; (2) aquele que permanece
perfeitamente equilibrado, situando-se indiferente e imperturbável pelos efeitos dos modos
(baseados na felicidade ou infelicidade), lembrando: "os modos säo atraentes (com seus
respectivos objetos)"; aquele que se dispöe igualmente para com a alegria ou o sofrimento; que
se situa em contínua auto-percepçäo; que enxerga um torräo de terra, uma pedra, ou um
pedaço de ouro com a visäo da igualdade; que se mantém equilibrado ao receber seja coisas
desejáveis ou indesejáveis; que inteligente, e permanece situado em equilíbrio em face de
injúrias ou louvores, honra ou desonra; que v com igualdade tanto o amigo quanto inimigo;
e que est completamente além de todas causas da obsessäo e abnegaçäo - certamente tal
pessoa deve ser conhecida como tendo transcendido os três modos da natureza material.

Verso 26
(3) Uma pessoa que presta serviço exclusivamente a Mim (em minha forma de
Shyamasundara) através da senda da devoçäo pura (inadulterada por todas tentativas
espúrias baseadas na exploraçäo e renúncia), absolutamente transcende estes três modos da
natureza material. Assim ela se torna qualificada para conhecer sua identidade divina
interna.

Verso 27
Somente Eu sou o esteio original da vitalidade divina näo-dividida, o néctar inexaurível, os
passatempos atemporais, e a doçura da ambrósia do profundo amor divino.

CAPITULO QUINZE
Purushottama-yoga

91
A PESSOA SUPREMA

Verso 1
O Senhor Supremo disse: as escrituras sagradas proclamam que esse mundo material como
uma imutável árvore Banyan com suas raízes voltadas para cima e seus galhos para baixo,
conhecida como uma árvore Asvattha (transitória). Seus nutrientes säo os aforismas védicos,
aqui representados por suas folhas. Quem conhecer esta árvore desta maneira um genuíno
conhecedor dos Vedas.

Comentário

O significado da declaraçäo de que a árvore desse mundo mundano tem suas raízes voltadas
para cima, que a causa-raiz da criaçäo se encontra na morada suprema, superior e sagrada.
Portanto, ela emana - e subsequentemente se afasta - do Senhor Supremo. A declaraçäo de
que seus galhos estäo voltados para baixo indica que devido às reaçöes aos atos
exploradores, nascimentos progressivamente mais e mais baixos - desde os animais at às
espécies mais degradadas - se ramificam desta árvore. Portanto, a árvore Banyan deste
mundo temporal conhecida como "Asvattha", que significa "efêmera" ou "aquilo que näo
permanece at amanhä". Contudo, ela eterna no sentido de que constantemente aparece
em virtude do fluxo da corrente de causa e efeito. As folhas da árvore que representam a seçäo
dos Vedas que sustenta o mundo (conhecida como karma-kanda), significa que assim como as
folhas de uma árvore a nutrem e embelezam, esta seçäo dos Vedas semelhantemente nutre o
mundo, causando sua expansäo e florescer. Concluindo, embora este mundo mundano
evolva da eterna potência ilusória do Senhor (maya), ele perecível; e embora seja nutrido
pela seçäo fruitiva dos Vedas (karma-kanda), ele iluminado pelas declaraçöes indiretas,
veladas (paroksha-vada) dos Vedas. Quem conhece o significado dos Vedas desta maneira
um genuíno conhecedor da essência deles.

No Srimad-Bhagavatam 11.3.43-46 cita-se o seguinte:

karmakarma vikarmeti, veda-vado na laukikah


vedasya cesvaratmatvat, tatra muhyanti surayah

paroksa-vado vedo 'yam, balanam anusasanam


karma-moksaya karmani, vidhatte hy agadam yatha

nacared yas tu vedoktam, svayam ajno 'jitendriyah


vikarmana hy adharmena, mrtyor mrtyum upaiti sah

vedoktam eva kurvano, nihsango 'rpitam isvare


naiskarmam labhate siddhim, rocanartha phala srutih.

"As concepçöes de açäo, inaçäo, e açäo proibida säo delineadas pelos Vedas. Porque os
Vedas säo a encarnaçäo do Senhor Supremo, mesmo grandes sábios ficam maravilhados ao
determinarem seu significado. O significado védico apresentado de maneira indireta,
velada, a fim de instruir pessoas indisciplinadas, infantis e tolas. Assim como um pai induz

92
um filho doente a tomar remédio mostrando doces, as escrituras semelhantemente mostram
os frutos celestiais de atos piedosos, com o propósito subjacente de efetuar a cessaçäo da açäo
mundana."

Verso 2
Alguns de seus galhos se estendem para cima (aos planetas dos semideuses e seres
celestiais), alguns dos galhos se estendem para baixo (aos planetas dos seres humanos,
animais, e espécies inferiores), e sua natureza madura (dos três modos da natureza) e meta e
objeto (de audiçäo, olfato, tato, paladar, e forma) säo seus brotos frescos, novos. Algumas
raízes aéreas também se estendem para baixo a fim de enraizarem-se na terra da
exploraçäo, dentro do plano humano.

Comentário

Dentro da manifestaçäo em geral deste mundo material "perecível porém constante", alguns
dos seres vivos, nutridos pelos modos da bondade, estäo vagando através dos sistemas
planetários superiores, tendo sido envolvidos pelo conceito egoísta de deuses e seres celestiais.
Outros, influenciados pelos modos da paixäo e ignorância, estäo vagando pelos planetas dos
homens, animais,
árvores, e outras espécies inferiores, tendo sido envolvidos pelos conceitos egoístas de tais
espécies. Os objetos dos sentidos - som, olfato, tato, paladar, e forma - säo
representados por novos brotos fresquinhos nos galhos da árvore desse mundo material, j que
säo meramente transformaçöes dos cinco elementos primários sem mistura (panca-
tanmatra) que evoluem a partir do conceito egoísta das entidades vivas deste plano. Além
do mais, embora a raiz principal esteja situada voltada para cima (invertida, e em oposiçäo
ao Senhor Supremo), algumas das raízes aéreas subsequentes descendentes da árvore
Banyan permanecem enraizadas no solo do plano humano da terra da exploraçäo. Isso indica
que a tentativa de se desfrutar dos frutos de nossas açöes na vida humana - ou a
mentalidade exploradora do interesse separado - est fornecendo a seiva nutritiva na forma
de uma causa secundária, separada para a árvore desse mundo material.

Versos 3 e 4
No plano humano, essa forma invertida da árvore Banyan que representa o mundo material
näo pode ser conhecida, e sua origem, fim e fundamento näo conseguem ser percebidos (exceto
por meio do conhecimento védico). Pela associaçäo com verdadeiros santos, obtém-se o
machado afiado do intenso desapego pelo mundano. Usando esta arma para derrubar essa
árvore Banyan ilusória (de nossa própria existência mundana) que est obstinadamente
enraizada na aversäo ao Senhor Supremo, alcançaremos o plano de näo-retorno, que näo
outro senäo os pés de lótus do Senhor. Entäo, pelo método da devoçäo exclusiva,
ininterrupta, deve-se chegar perto para se refugiar nos sagrados pés de lótus do Supremo
Senhor Vishnu, e orar: "Agora estou me rendendo a essa Pessoa Original, o Senhor Supremo
de todos, de cuja potência ilusória (maya) esta perpétua árvore do mundo material emanou e
se expandiu."

Verso 5
Destituídas de vaidade e ilusäo, acima das companhias que näo säo santas, dedicadas
realizaçäo do eterno Eu interior ("self"), livres de desejos luxuriosos, liberadas das alegrias e

93
tristezas da dualidade, e liberadas da ignorância, estas almas rendidas alcançam o destino
supremo.

Verso 6
Minha suprema morada sagrada aquele local que as almas rendidas alcançam, para nunca
mais retornarem. Nem o sol, nem a lua, nem o fogo - nada consegue iluminar essa suprema
morada todo-iluminante.

Verso 7
A alma uma parte de Mim (como Minha partícula ou potência fragmentária separada).
Embora seja eterna, ela adquire a mente e os cinco sentidos da percepçäo, os quais säo partes
da natureza material (como criaçöes de maya, Minha potência ilusória).

Verso 8
A alma (jiva) a proprietária do corpo e sua parafernália. Quando ela parte do corpo, leva
todos esses sentidos a entrarem num outro corpo, assim como o ar carrega a fragância de uma
flor.

Verso 9
Adotando o ouvido, olho, pele, língua e nariz carnal, e também aceitando a sutil mente, esta
alma explora os objetos dos sentidos - som, forma, tato, e paladar.

Verso 10
Homens tolos näo conseguem perceber nada quando a alma parte do corpo, sua residência no
corpo, ou sua exploraçäo dos objetos sensuais. Contudo, aqueles que estäo dotados dos
olhos da sabedoria säo capazes de observar toda a operaçäo.

Verso 11
Mesmo alguns yogis assíduos conseguem de fato ver a alma presente dentro do corpo. Porém
pessoas tolas de coraçöes impuros nunca conseguem ver a alma, apesar de suas tentativas.

Verso 12
Aquela refulgência que emana do sol e ilumina todo o universo, e que est presente na lua e no
fogo - com certeza deves saber que surge de Minha refulgência pessoal.

Verso 13
Aparecendo no solo da Terra, Eu mantenho todos seres através de Minha potência; e na
forma da nectárea lua, Eu alimento todas colheitas (tais como arroz e cevada).

Verso 14
Entrando no corpo da entidade viva como a força da digestäo, Eu digiro os quatro tipos de
alimentos (mastigáveis, chupáveis, lambíveis e bebidas), por intermédio dos ares vitais
ascendentes e descendentes.

Verso 15
Estou situado (como a Superalma) dentro do coraçäo de todas almas, e de Mim surge a
lembrança da alma, seu conhecimento, e o dissipar-se de ambos (conforme o karma, ou

94
açäo no plano mundano). Eu sou o exclusivo princípio (extático) cognoscível dos Vedas.
Sou o autor do Vedanta - Vedavyasa, que expôs o significado cognoscível dos Vedas. E
certamente sou o conhecedor do significado dos Vedas.

Verso 16
Neste mundo, existem dois tipos de almas: as falíveis e as infalíveis. Todos seres desde o
Senhor Brahma at as mais baixas formas de vida estacionárias, säo conhecidos como falíveis
(por terem se desviado de sua natureza intrínseca). Porém as personalidades que estäo
eternamente situadas em sua natureza divina säo conhecidas como infalíveis (associados
pessoais do Senhor).

Verso 17
Porém totalmente distinta desses dois tipos de almas, existe a Pessoa Suprema, que
conhecida como Paramatma, a Super-alma. Ele o Senhor Supremo. Penetrando nos três
mundos em Sua forma eterna, Ele mantém todos seres no universo.

Verso 18
Porque sou transcendental às almas falíveis e também superior a Meus associados eternos
infalíveis, Minhas glórias säo cantadas no mundo e nas escrituras como Purushottama, a
Pessoa Suprema.

Verso 19
" Bharata, aquele que sem equívoco Me conhece em Minha forma eterna, extática,
consciente de tudo, como sendo essa Pessoa Suprema, o conhecedor perfeito do pleno teísmo,
e Me adora em todos sentidos (nos humores devocionais da tranquilidade, servidäo,
amizade, paternidade, e amor conjugal).

Verso 20
" Arjuna de coraçäo puro, assim te expliquei este mais oculto dos tesouros de todas escrituras.
" Bharata, abraçando este néctar no âmago de seus coraçöes, as almas virtuosas se rejubilam
na perfeiçäo do supremo sucesso.

CAPITULO DEZESSEIS
Daivasura-sampad-vibhaga-yoga

OS TEMPERAMENTOS - DO DEVOTO E DO IMPIO

Versos 1 a 3
O Senhor Supremo disse: " Bharata, todas essas qualidades aparecem num homem dotado
com uma natureza virtuosa e devota - destemor, misericórdia, absorçäo no auto-conhecimento,
caridade, controle dos sentidos externos, sacrifício, estudo dos Vedas, austeridade,
sinceridade, näo-violência, veracidade, estar livre da ira, desapego pelo mundano,
tranquilidade, näo possuir inclinaçäo para ver as falhas dos outros, compaixäo pelos outros,
estar livre da cobiça, gentileza, modéstia, constância, vigor, perdäo, paciência, limpeza,
ausência de inveja, e estar livre do egoísmo.

Verso 4

95
" Partha, estas qualidades pervertidas encontram-se num homem de mentalidade demoníaca:
arrogância, orgulho, egoísmo, ira, falta de misericórdia e de juízo.

Verso 5
As qualidades virtuosas e devotas foram descritas como causa da liberaçäo e as demoníacas
tem sido descritas como causa de enredamento certo. " Pandava, näo precisas preocupar-te,
pois tua natureza devota e virtuosa desde o nascimento.

Verso 6
" Partha, verifica-se que as entidades vivas neste mundo podem ser de duas naturezas -
devotas e demoníacas. J descrevi elaboradamente a natureza do devoto para ti; agora ouça
de Mim sobre a natureza demoníaca.

Verso 7
Os demoníacos näo conseguem entender a inclinaçäo religiosa ou irreligiosa. Nem um
traço de pureza, práticas boas, ou veracidade pode ser encontrado neles.

Verso 8
As pessoas de natureza demoníaca dizem que o universo näo mais que imaginário, sem base,
sem deus, e que surge de sua coabitaçäo mútua. Concluem que o mundo inteiro foi criado
apenas para a luxúria.

Verso 9
Apoiando tal conceito, os demônios, que säo menos inteligentes, desprovidos de auto-
conhecimento, e que säo a encarnaçäo de atos medonhos e inauspiciosidade, se tornam
poderosos simplesmente com o propósito de aniquilar o mundo.

Verso 10
Recorrendo a insaciáveis desejos luxuriosos, totalmente obsedados e preocupados com suas
atividades sensuais, tais demônios, num louco frenesi de arrogância e orgulho, ocupam-se
em medonhas práticas maldosas.

Versos 11 e 12
At ao último suspiro eles permanecem assolados por ilimitados medos e ansiedades. Estäo
convencidos que a gratificaçäo de sua luxúria a meta máxima. Enredados por centenas de
múltiplos desejos e tomados pela luxúria e ira, continuam tentando acumular fortuna
ilegalmente - s" com o propósito da gratificaçäo sensorial.

Verso 13
As pessoas demoníacas dizem: "Hoje consegui o que queria e amanh conseguirei o que
quero. Tudo isso minha fortuna, e no futuro, mais e mais ser meu."

Verso 14
"Matei um inimigo, e matarei outros. Sou o senhor de tudo que observo. Sou o desfrutador.
Sou bem-sucedido, poderoso e feliz."

Versos 15 e 16

96
"Quem poder igualar minha fortuna e aristocracia? Vou realizar sacrifício e dar caridade aos
necessitados, e assim desfrutarei." Iludidos pela ignorância, cheios de ansiedade, vitimados
pelos atrativos, e viciados no desfrute sensorial, tais pessoas demoníacas estäo fadadas a
detestáveis infernos como o Vaitarani.

Verso 17
Sempre orgulhosos, impertinentes, e intoxicados pela fortuna e grandeza, todos esses
demônios (fazem a maior demonstraçäo de que) realizam pseudo-sacrifícios näo-escriturais.

Verso 18
Imersos em egoísmo, loucos pelo poder, e tomados pela luxúria e ira, desdenhando totalmente
a Mim que estou situado no corpo deles e dos outros como a Superalma, atribuem suas falhas
a todas boas qualidades (dos verdadeiros santos).

Verso 19
Porque tais demônios säo invejosos, cruéis, maus e decadentes, continuamente Eu os lanço
em pedaços para que revolvam no ciclo de nascimento e morte, nos ventres de espécies
demoníacas, despicáveis.

Verso 20
" Kaunteya, tomando nascimentos repetidamente nas espécies demoníacas, tais tolos näo
conseguem chegar a Mim, a encarnaçäo da Divindade. Assim, descendem mais e mais baixo at
a condiçäo de vida mais vil e degradada.

Verso 21
Os três portöes suicidas que levam ao inferno säo a luxúria, a ira, e a cobiça. Portanto,
devem ser abandonados completamente.

Verso 22
" Kaunteya, quem de fato liberado destes três portöes do inferno, age em seu próprio
interesse. Assim, alcança o destino supremo.

Verso 23
Uma pessoa que transgride as injunçöes das escrituras e se comporta caprichosamente
nunca alcança a perfeiçäo, felicidade, ou o destino supremo.

Verso 24
Portanto, as injunçöes escriturais concernentes ao que dever e näo dever säo teu único
precedente. Tendo compreendido o comando escritural neste plano de açäo - isto é,
agir exclusivamente para o prazer do Senhor - seria conveniente agora aplicares tais
ensinamentos na prática.

CAPITULO DEZESSETE
Shraddhatraya-vibhaga-yoga

A DIVISÄO TRINA DA FÉ

97
Verso 1
Arjuna indagou: " Krishna, qual a posiçäo daqueles que realizam adoraçäo com fé,
porém negligenciam as injunçöes das escrituras? Isto considerado como sendo em bondade,
paixäo ou ignorância?

Verso 2
O Senhor Supremo disse: Tal f de três tipos, conforme as tendências desenvolvidas
anteriormente pela alma encarnada - boas, apaixonadas, ou ignorantes. Agora por favor Me
ouça sobre isto.

Verso 3
" Bharata, todos homens possuem um tipo particular de f conforme suas mentalidades
individuais. A própria natureza da entidade viva baseada na f - a natureza interna e externa
delas modelada conforme sua fé. Portanto, sua natureza pode ser discernida conforme a
forma de adoraçäo ou reverência na qual elas têm fé.

Verso 4
Pessoas dotadas com a natureza da bondade adoram os semideuses afáveis; pessoas de
natureza apaixonada adoram os apaixonados semideuses Yaksas e demônios canibais
Rakshasas, enquanto aqueles que têm f ignorante adoram os fantasmas e os mortos, no plano da
escuridäo.

Versos 5 e 6
Néscios arrogantes e pretenciosos provocam o desarranjo dos elementos naturais do corpo e
atormentam a alma que habita nele, e que Minha partícula espiritual fragmentária.
Motivados por intenso desejo de demonstrar suas proezas mentais e físicas, eles realizam
austeridades näo-escriturais atrozes. Deves saber que säo demônios confirmados de primeira
classe.

Verso 7
De acordo com os três modos da natureza material, existem também três preferências
alimentares. Da mesma maneira, existem três tipos de sacrifício, três tipos de austeridade, e
três tipos de caridade. Agora ouça sobre todos estes.

Verso 8
Alimentos comestíveis ou que podem ser oferecidos que aumentam a longevidade, entusiasmo,
força, saúde, felicidade e satisfaçäo, e que säo suculentos, leitosos, saudáveis, e atraentes -
säo queridos por pessoas de natureza bondosa.

Verso 9
Comestíveis queridos por pessoas de natureza apaixonada säo amargos demais (nimba,
etc.), ácidos demais, salgados demais, quentes demais, pungentes demais (pimenta malagueta,
etc.), secos demais (gräo-de-bico seco torrado, etc.) e quentes demais (semente de
mostarda, etc.). Tais alimentos causam infelicidade, sofrimento e doença.

Verso 10
Estes alimentos agradam aos ignorantes: alimento frio demais, por ter sido cozido mais do

98
que três horas antes; alimento sem gosto, que exala mau odor, ou foi cozido no dia anterior;
restos dos outros ( exceçäo dos restos deixados pelo guru da pessoa); e alimentos impuros (tais
como carne, vinho, e cebolas).

Verso 11
Sacrifício da natureza da bondade est de acordo com as injunçöes escriturais, e realizado com
um sentido resoluto de dever por uma pessoa desprovida de desejo fruitivo.

Verso 12
Mas, " Bharata, saiba que o sacrifício realizado com expectativas fruitivas e meramente como
demonstraçäo de pompa e grandeza, sacrifício da natureza da paixäo.

Verso 13
E aquele sacrifício que ignora as injunçöes da escrituras, que realizado sem a distribuiçäo de
dádivas tais como alimentos, sem pronunciar os mantras apropriados, sem ser apresentado ao
guru, e sem fé, conhecido como sacrifício em ignorância.

Verso 14
Adoraçäo Deidade, aos brahmanas, ao mestre espiritual, e alma iluminada, bem como
limpeza, simplicidade, celibato, e näo-violência - todos estes constituem austeridade do corpo.

Verso 15
A fala que näo perturba ninguém, que veraz, agradável e no entanto beneficia, bem como o
recitar regular dos Vedas - todos estes säo conhecidos como austeridade verbal.

Verso 16
Auto-satisfaçäo, gravidade graciosa, firmeza, auto-controle, e purificaçäo da consciência säo
todos conhecidos como austeridade mental.

Verso 17
Quando realizadas por uma alma sem desejos, devotada e com sublime f no Senhor
Supremo, tal austeridade trina da natureza da bondade.

Verso 18
Aquela austeridade infindável e incerta que se realiza orgulhosamente s" pelo lucro,
adoraçäo, nome e fama, conhecida como austeridade da natureza da paixäo.

Verso 19
Aquela austeridade que realizada com preocupaçäo total e desajuizada, provocando auto-
tortura ou destinada a prejudicar outros, conhecida como austeridade da natureza da
ignorância.

Verso 20
Caridade que se d sem esperar retorno, como uma questäo de dever, com a devida
consideraçäo de tempo, lugar, e recipiente, considerada como sendo da natureza da bondade.

Verso 21

99
Outrossim, caridade dada com mentalidade agitada, na antecipaçäo de receber algo em troca,
ou com o desejo de conseguir entrar no plano celestial, conhecida como caridade da natureza
da paixäo.

Verso 22
Caridade dada desrespeitosamente ou cheia de desdém a um recipiente indigno num local
e horário impróprio conhecida como caridade da natureza da ignorância.

Verso 23
A frase "Om Tat Sat" mencionada nas escrituras como indicando Parabrahman, o Espírito
Supremo. Na época da criaçäo universal, os brahmanas, os Vedas, e sacrifícios foram
ordenados por essa combinaçäo trinária.

Verso 24
Por essa razäo, os seguidores dos Vedas sempre principiam a realizaçäo de seus deveres
escriturais recomendados baseados em sacrifício, caridade, e austeridade, pronunciando a
vibraçäo "OM", que representa Brahman, o Absoluto.

Verso 25
Vibrando a palavra "TAT", que também representa Brahman, o Absoluto, e rejeitando o
desejo pelos frutos de suas açöes, os que buscam liberaçäo conduzem a realizaçäo de
diferentes tipos de sacrifícios e austeridades, e executam o dever de dar caridade.

Verso 26
" Partha, a palavra "SAT" indica a verdade, bem como pessoas que säo servos dedicados da
verdade. Também se aplica na realizaçäo de atividades auspiciosas.

Verso 27
A palavra "SAT" empregada para indicar tanto a eternidade do objeto do sacrifício,
austeridade e caridade, como do dever realizado para satisfaçäo do Senhor Supremo.

Verso 28
" Partha, sacrifício, caridade, e austeridade, ou qualquer dever realizado sem f no objetivo
supremo, conhecido como "asat" ou depravado. Tais obras nunca poderäo conceder
resultado auspicioso, seja neste mundo ou no próximo.

CAPITULO DEZOITO
Moksa-yoga

A META SUPREMA DA LIBERDADE DIVINA

Verso 1
Arjuna disse: " Mahabaho, Hrsikesha, Kesinisudana, desejo saber a distinçäo entre o
princípio da renúncia açäo e o princípio da renúncia aos frutos da açäo.

Verso 2
O Senhor Supremo disse: De acordo com os sábios, o abandono de todas açöes

100
materialmente desejáveis se chama renúncia (sannyasa), e o abandono dos frutos de todos
tipos de açäo (seja diariamente, incidental, ou baseado no desejo material) se chama desapego
(tyaga).

Verso 3
Alguns eruditos (da escola Sankhya) sustentam que a açäo (devido a suas falhas tais como a
violência) deve ser renunciada. Outros (da escola Mimamsaka) sustentam que deveres
(recomendados pelas escrituras) baseados no sacrifício, caridade, e austeridade nunca devem
ser abandonados.

Verso 4
" melhor dos Bharatas, agora ouça Minha conclusäo perfeita com relaçäo renúncia. "
maior dentre os homens, ficou definido claramente que a renúncia de três tipos.

Verso 5
Deveres baseados no sacrifício, caridade e austeridade nunca devem ser abandonados. Tais
deveres devem ser realizados, porque servem para purificar os coraçöes dos inteligentes.

Verso 6
Além do mais, " Partha, todas essas açöes devem ser realizadas como uma questäo de dever,
abandonando todo apego e desejo fruitivo. Saiba que esta Minha conclusäo
irrevogável, perfeita, suprema.

Verso 7
Renúncia aos deveres diários nunca desejável. Abandonar os deveres rotineiros por ilusäo
falsa renúncia, ou renúncia de natureza ignorante.

Verso 8
Aquele que abandona seus deveres rotineiros por medo de desconforto físico,
considerando-os a causa da inconveniência, realiza renúncia da natureza da paixäo. Assim,
tal pessoa näo obtém (o conhecimento, que é) o fruto do desapego genuíno.

Verso 9
" Arjuna, aquele que realiza trabalhos rotineiros como uma questäo de dever, e abandona
o apego e desejo fruitivo - tal pessoa realiza renúncia de natureza bondosa. Esta Minha
opiniäo.

Verso 10
Uma pessoa renunciada de aguda inteligência, dotada com uma natureza bondosa, e que
est livre de todas dúvidas, nem se resente pelos deveres trabalhosos, nem se apega às obras
que trazem felicidade.

Verso 11
Na realidade, impossível para a alma encarnada renunciar completamente toda açäo.
Portanto, verdadeiramente renunciado aquele que renuncia aos frutos de suas açöes.

Verso 12

101
Pessoas que aspiram aos frutos de suas açöes adquirem três tipos de recompensas após a
morte - boas, más e mixtas. Porém um verdadeiro renunciado (sannyasi) nunca toca tais
frutos da açäo.

Verso 13
" poderoso herói, na escritura conhecida como Sankhya, ou Vedanta, estas cinco causas da
realizaçäo de todas açöes foram descritas, e agora podes aprender Comigo sobre elas.

Verso 14
(Com o auxílio destes cinco fatores, todas açöes säo efetuadas:) O corpo, ego (na forma do n"
de espírito e matéria), os sentidos separados, as diferentes atividades, e o destino, ou
intervençäo do Supremo Controlador Universal.

Verso 15
A açäo que um homem realiza com seu corpo, mente, ou fala, seja legal ou ilegal, causada por
estes cinco elementos.

Verso 16
Portanto, um indivíduo mau que se considera como sendo o único realizador da açäo, nunca
conseguir perceber a situaçäo de fato, devido a sua concepçäo irracional.

Verso 17
Aquele que est livre de egoísmo (oriundo da aversäo ao Absoluto), e cuja inteligência näo
est implicada (em atividades mundanas) - mesmo que mate cada entidade viva do mundo
inteiro, näo estar matando de fato, e nem sofrer as consequências de um assassino.

Verso 18
Conhecimento, o cognoscível, e o conhecedor - estes três säo o ímpeto para a açäo. A
tentativa, a obra, e o realizador - estes três formam a base da açäo.

Verso 19
Na escritura Sankhya, conhecimento, açäo, e o realizador tem sido classificados conforme suas
naturezas (na bondade, na paixäo, ou ignorante). Agora ouça de Mim sobre estas categorias.

Verso 20
Aquele conhecimento por meio do qual se v que um s" princípio divino imperecível e indiviso
(Minha potência superior divina) est presente em todas diversas entidades vivas, conhecido
como conhecimento de natureza da bondade.

Verso 21
No mundo das entidades vivas, aquele conhecimento através do qual se experimenta múltiplas
tentativas separadas (de natureza conflitante, devido a interesses individuais separados) e
muitos conceitos separados (independentes) da verdade - tal conhecimento conhecido como
sendo da natureza da paixäo.

Verso 22
E aquele conhecimento pelo qual a pessoa se torna atraída por trivialidades (assuntos

102
insignificantes), considerando-os como sendo o todo de tudo (o máximo), e que irracional,
destituído de deliberaçäo escritural, e bitolado (como de um animal) - tal conhecimento
conhecido como sendo da natureza da ignorância.

Verso 23
Aquela açäo que executada constantemente por uma pessoa desapegada que indiferente
obsessäo e aversäo, certamente açäo da natureza da bondade.

Verso 24
E aquela açäo que realizada com tremendo esforço por uma pessoa ambiciosa e egoísta,
conhecida como açäo da natureza da paixäo.

Verso 25
E a açäo de natureza ignorante aquela que, por ilusäo, empreendida sem consideraçäo de
suas consequências, seus efeitos deletérios, sua maldade, e a capacidade para se realizá-la.

Verso 26
Um trabalhador de natureza bondosa aquele que plenamente desapegado, näo egoísta
mas paciente e entusiasmado, e inafetado em face do sucesso ou insucesso.

Verso 27
Um trabalhador de natureza da paixäo aquele obsessivo, caçador dos frutos, cobiçoso,
violento, ocupado em práticas näo-escriturais ou abomináveis, e dominado pelo
regozijo e lamentaçäo.

Verso 28
Um trabalhador de natureza ignorante possui mente volúvel, mentalidade grosseira,
pretencioso, fraudulento, dado a insultar os outros, preguiçoso, mal-humorado, e costuma
adiar.

Verso 29
" Dhananjaya, ouça-Me atentamente. Vou descrever claramente os três diferentes tipos de
inteligência e determinaçäo, classificados conforme os modos da natureza.

Verso 30
" Partha, inteligência boa aquela pela qual se consegue perceber na realidade a
natureza intrínsica da inclinaçäo (religiosa) e desinclinaçäo (irreligiosa), dever e näo-
dever, temor e coragem, bem como enredamento e liberdade (e todas distinçöes como estas).

Verso 31
" Partha, inteligência apaixonada aquela pela qual a natureza intrínsica da religiäo,
irreligiäo, dever, e näo-dever s" podem ser averiguadas parcialmente.

Verso 32
Inteligência arruinada pela ignorância aquela percepçäo iludida pela qual se toma a
irreligiäo como religiäo, e tudo tomado por seu oposto.

103
Verso 33
" Partha, determinaçäo de natureza bondosa aquela determinaçäo uni-direcionada que
continuamente controla a mente, as forças vitais, os sentidos, e todas suas atividades.

Verso 34
" Partha, " Arjuna, determinacäo de natureza apaixonada aquela que, por desejo fruitivo,
sempre recorre religiäo ritualística com o propósito de acumular fortuna na tentativa de
realizar desejos mundanos.

Verso 35
Determinaçäo de natureza ignorante aquela através da qual uma pessoa sem inteligência näo
abandona o sono, medo, lamentaçäo, abatimento, e orgulho.

Versos 36 e 37
" Bharatarshabha, agora ouça de Mim sobre os três tipos de felicidade. Aquilo que ao ser
cultivado faz nascer o prazer enquanto causa a morte de todas misérias, que no início
molesta como veneno e subsequentemente nos agrada como o néctar, e que surge do puro
auto-conhecimento - tal felicidade dito ser de natureza bondosa.

Verso 38
A felicidade de natureza da paixäo dito ser aquela que nasce do contato dos sentidos com
seus objetos, e que no início percebida como néctar, porém subsequentemente igual ao
veneno.

Verso 39
Felicidade de natureza ignorante aquela que do princípio ao fim produz ilusäo da alma, e surge
do sono, preguiça, e negligência.

Verso 40
Seja na Terra (entre todas formas de vida, lideradas pelos seres humanos) ou no plano
celestial entre os deuses celestiais, ninguém e nada est livre destes três modos que
surgem da natureza material.

Verso 41
" Parantapa, de acordo com os modos (da bondade, paixäo e ignorância) que nascem de
suas naturezas, todos deveres das sessöes brahmana, ksatriya, vaisya, e sudra estäo divididos
de maneira projetada (numa classificaçäo graduada).

Verso 42
Controle interno e externo dos sentidos, austeridade, pureza, tolerância, sinceridade,
conhecimento, realizaçäo, e teísmo - certamente estes säo todos deveres naturais da seçäo
dos brahmanas.

Verso 43
Bravura, entusiasmo, fortaleza, perícia, coragem durante a batalha, disposiçäo caridosa, e
liderança - certamente estas säo todas açöes características da seçäo ksatriya.

104
Verso 44
Agricultura, criar vacas, e o comércio o trabalho natural para a seçäo vaisya; e natural para
os sudras prestar serviço seçäo brahmana, ksatriya e vaisya (dando assistência em seus
vários trabalhos).

Verso 45
O auto-conhecimento obtido por uma pessoa que se dedica açäo apropriada prescrita para
sua qualificaçäo natural. Agora ouça de Mim como se consegue a perfeiçäo desta maneira.

Verso 46
Um homem alcança a perfeiçäo pela realizaçäo dos deveres apropriados prescritos para
ele conforme sua qualificaçäo. Pela execuçäo de seus deveres, ele adora o Senhor Supremo,
de quem surge a geraçäo e o ímpeto de todos seres, e que permeia e penetra esse
universo inteiro (exercitando Sua Suprema qualificaçäo de Senhor de tudo e todos).

Verso 47
Embora possa haver imperfeiçöes na execuçäo desses deveres, melhor permanecer fiel aos
próprios deveres naturais prescritos do que realizar o dever de outrem imaculadamente.
Nunca se incorre em pecado ao ater-se aos próprios deveres naturais.

Verso 48
" Kaunteya, apesar de imperfeiçöes em sua execuçäo, deveres prescritos conforme nossa
própria natureza näo devem ser abandonados. Verdadeiramente, toda açäo (karma)
(mais ou menos) coberta de imperfeiçöes, assim como o fogo se cobre de fumaça.

Verso 49
Mantendo sua inteligência desapegada de todos objetos mundanos, a pessoa auto-controlada e
sem desejo obtém a perfeiçäo máxima de cessar o trabalho reacionário - por abandonar os
frutos de todas suas açöes.

Verso 50
" Kaunteya, agora ouça de Mim o resumo de como uma pessoa que chegou perfeiçäo de
cessar todo trabalho reacionário, alcança o plano divino do Absoluto, meta suprema do
conhecimento (divino auto-perceptivo).

Versos 51 a 53
Dotado de inteligência de natureza bondosa, mentalmente controlado com determinaçäo
de natureza bondosa, desapegado dos objetos dos sentidos como o som, tato, forma, paladar, e
odor, livre da obsessäo ou aversäo, distanciado da associaçäo com pessoas materialistas,
alimentando-se com temperança, controlando o corpo, mente e fala, constantemente absorvido
em pensamentos sobre o Senhor Supremo, profundamente desapegado do mundo
mundano; näo-egoísta, destituído de despotismo, vaidade, luxúria, ira, e aceitaçäo de serviço
dos outros - tal indivíduo, desprovido de todo sentido de possessividade e absorvido em
divina tranquilidade, certamente qualificado para alcançar divina auto-percepçäo.

Verso 54
A alma auto-satisfeita de coraçäo imaculadamente puro que j chegou sua divina natureza

105
consciente, tampouco se lamenta nem almeja nada. Vendo todos seres com igualdade (na
concepçäo de Minha energia suprema), gradualmente alcança a suprema devoçäo (prema-
bhakti) a Mim.

Verso 55
Pela potência dessa devoçäo suprema, torna-se capaz de conhecer completamente Minha
Natureza de Senhor Omni-potente e majestade (aisvaryamaya-svarupa). Depois disso,
adquirindo percepçäo de seu divino relacionamento Comigo, ingressa em um grupo de Meus
associados pessoais íntimos, cuja natureza näo diferente de Mim.

Verso 56
Embora sempre ativos no realizar de todo tipo de deveres, aqueles que escolheram o refúgio
exclusivo em Mim alcançam o plano eterno do serviço que floresce, por Minha graça.

Verso 57
Pela arte da conecçäo do serviço, oferecendo todas tuas açöes a Mim na compreensäo de que
somente Eu sou a meta suprema, refugia-te aliando tua inteligência Comigo (tornando-te
desapegado dos deveres gerais) - e assim devota-te fielmente a Mim sempre.

Verso 58
Quando tiver devotado teu coraçäo a Mim, serás capaz de ultrapassar todo tipo de
obstáculos e adversidades formidáveis por Minha graça. E se devido arrogância näo
escutares Minhas palavras, certamente colherás a ruína.

Verso 59
Devido arrogância estás pensando: "Näo vou lutar", mas tal decisäo certamente ser em väo
porque tua natureza (que cabe a um ksatriya) certamente compelir-te- a te ocupares na batalha.

Verso 60
" Kaunteya, sendo compelido pela tendência de tua natureza, aquele mesmo dever que
por ilusäo agora estás evitando (brevemente) ser inevitavelmente executado por ti.

Verso 61
" Arjuna, o Senhor Supremo que habita internamente, pela potência de Sua energia ilusória, faz
com que as entidades vivas fiquem vagando aqui e acol (em muitas posiçöes), como se cada
uma fosse meramente um marionete, girando num carrossel. Na verdade, esse Senhor habita
dentro do coraçäo de todas entidades vivas.

Verso 62
" Bharata, rende-te a Ele em todos sentidos. Por Sua graça obterás a paz suprema e a
morada eterna.

Verso 63
Acabo de revelar-te mais e mais tesouros ocultos. Lembra-te de tudo isso, e entäo faça como
quiseres.

Verso 64

106
Agora novamente ouça Meu supremo ensinamento, o mais oculto de todos tesouros
escondidos. Me és extremante querido, e realmente por isso que estou explicando isto para teu
real benefício.

Comentário

Segundo Srila Bhaktivinoda Thakura, a instruçäo oculta (guhyam) do Senhor Sri Krishna
encontra-se no segundo e terceiro capítulos do Sri Gita. Ali se declara que a ocupaçäo
na açäo desinteressada (sem falso-ego) gradualmente leva às sendas do conhecimento e da
contemplaçäo. Sua instruçäo mais oculta
(guhyataram) encontra-se no sétimo e oitavo capítulos, onde o Senhor Supremo concede
conhecimento sobre Si mesmo que gera devoçäo. No capítulo nove, a instruçäo mais oculta
(guhyatamam) começa. O Senhor descreve os sintomas de devoçäo exclusiva (kevala-
bhakti), a qual näo vem misturada com açäo, conhecimento, ou meditaçäo abstrata.

Porque Seu devoto Arjuna Lhe muito querido, o Senhor agora repete Seu ensinamento
oculto para benefício de Arjuna. Desta vez, entretanto, Ele revela Seu mais oculto dentre todos
tesouros escondidos (sarva-guhyatamam) - Seu conselho mui afetuoso: "Arjuna, tu Me és
muito querido, portanto agora divulgarei toda verdade a ti."

Verso 65
Pensa em Mim, sirva a Mim, adora a Mim, ofereça teu próprio ser a Mim, e certamente Me
alcançarás. Sinceramente, esta Minha promessa a ti porque és Meu querido amigo.

Verso 66
Abandonando totalmente todos tipos de religiäo, rende-te exclusivamente a Mim. Eu te
libertarei de todo tipo de pecados, portanto näo te desesperes.

Comentário

Aqui, a glória do propósito oculto no Bhagavad-gita cantada (gita-gudartha-gauravam):


"Abandona todos compromissos e venha a Mim. Näo precisarás arrepender-te, Arjuna, porque
sou tudo para ti, e tu és tudo para Mim. Esta a mais oculta de todas verdades ocultas.
Que mais posso dizer? E encontrarás isso em Vraja (Vrindavana)."

Na retórica sânscrita (alankara) a sugestäo ornamental através da qual o som duma palavra
ecoa seu sentido, conhecida como dhvani. Aqui, se d tal pista. Mam ekam saranam
"vraja": "Poderás chegar a Vraja, e l encontrarás a mais oculta de todas verdades ocultas
(sarva-guhyatamam). O segredo mais profundo do coraçäo interno amoroso aqui se revela
plenamente: estou além de todos conceitos de religiäo, sociedade, amigos - tudo. Minha
posiçäo est acima de tudo, e no coraçäo do coraçäo de tudo. Na terra eterna de Vraja,
experimentarás a concepçäo inteira da beleza. Esqueça todos outros compromissos e
perspectivas, e venha a Mim somente. Teu anelo interior ser realizado além de tuas
expectativas. Encontrarás tal dignidade em Mim, que estarás além da reaçäo e do
arrependimento. Este o significado mais profundo da glória mais elevada."

Se chegarmos a tal concepçäo, tudo o mais ser visto como pecado (aham tvam sarva-

107
papebhyo, moksayisyami). Tudo que concebemos como dever ou pureza neste mundo
material ser visto como pecaminoso, e todos conceitos de religiosidade seräo reduzidos ao
nível de pecado. No plano absoluto, tudo e todos pertencem integralmente a Krishna, e o
menor desvio deste ideal näo melhor que cometer pecado. Mero esquecimento de si mesmo
leva ao impersonalismo e culmina em sono profundo. Porém esquecer de si (sarva-dharman
parityajya) no serviço a Krishna (mam ekam saranam vraja) positivo e vivo. o plano absoluto,
completo, da vida.

O tesouro oculto atrai nossos coraçöes. Temos sido privados do interesse mais profundo de
nossos coraçöes. Embora seja nosso por direito natural, tem estado oculto para nós
(srutibhir vimrgyam). De forma sem paralelo, Sri Gita considera todos esses aspectos e nos
dirige ao sentido e conclusöes corretas de todos Upanishads. Neste ponto, começa o Srimad
Bhagavatam.
Verso 67
Nunca deverás revelar este tesouro oculto a quem prefere a vida fácil, aos infiéis, aos que tem
aversäo pelo Meu serviço, ou àquelas pessoas maliciosas que possuem inveja de Mim.

Verso 68
Aquele que reconta as glórias deste mais oculto de todos tesouros ocultos aos Meus devotos -
tal pessoa, alcançando a suprema devoçäo por Mim, chegar a Mim sem nenhuma dúvida.

Verso 69
Na sociedade humana näo existe ninguém que Me agrade tanto através de suas açöes
quanto aquele (que prega as glórias desse Bhagavad-gita: o Tesouro Oculto do Doce
Absoluto), e (no futuro) nunca haver ninguém mais querido por Mim no mundo inteiro, além
dele.

Verso 70
E aquele que regularmente lê, contempla, ou canta com coraçäo devotado esta sagrada
conversa entre nós, assim fazendo estar Me adorando através do sacrifício da
sabedoria. Certamente esta Minha opiniäo.
Verso 71
E os fiéis e devotos que simplesmente ouvirem este texto sem inveja tornar-se-äo liberados,
e alcançaräo as moradas auspiciosas adequadas aos que possuem o mérito da virtude
suprema (sukrti).

Verso 72
" Partha, ouviste tudo isso com singular atençäo? " Dhananjaya, desfez-se a escuridäo de tua
ilusäo?

Verso 73
Arjuna disse: " Ser infalível, por Tua graça Minha ilusäo desfez-se. Agora consigo
lembrar-me quem sou eu, e todas minhas dúvidas foram-se, e sinto repouso na rendiçäo a
Ti. Agora seguirei Tua ordem.

Verso 74
Sanjaya disse: Desta maneira ouvi esta conversa admirável, extática entre a Suprema Alma

108
Vasudeva e Arjuna.

Verso 75
Pela misericórdia de Srila Vyasadeva, ouvi este mais oculto dos tesouros que emanou
diretamente da sagrada boca de lótus do Senhor Supremo de todo poder místico, o próprio
Senhor Sri Krishna.

Verso 76
" Rei, ouvindo repetidamente esta incrível conversa divina do Senhor Sri Krishna e
Arjuna, meu coraçäo se regozija renovadamente.

Verso 77
" Rei, e agora lembro repetidamente - fico maravilhado ante aquela espantosa, tremenda
forma universal do Supremo Senhor Hari, e todo meu ser estremece de emoçäo.

Verso 78
Onde quer que o Senhor Supremo de todo poder místico, o próprio Senhor Sri Krishna estiver,
e onde quer que esteja o conquistador da fortuna que carrega o arco, que o próprio Arjuna -
nesse mesmo lugar a deusa da boa fortuna, a deusa da vitória, a prosperidade florescente,
e a virtude suprema prevaleceräo. Certamente esta minha firme resoluçäo.

(assim encerra-se
a sagrada conversa
entre Sri Krishna e Arjuna
na Escritura de Vedanta Yoga
Srimad Bhagavad-gita Upanishad
do Bhisma Parva de Sri Mahabharata,
a Escritura da Lei Sagrada compilada
em cem mil versos por Srila Vyasadeva)

109

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