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Aprendizagem

criativa NA PRÁTICA

ediç ã o l
esp ecia
DAC
BRASIL
2018 Projeto Fotografia,
Memória e Identidade:
olhares registram a
cultura quilombola do
Rio Grande do Norte
CAPA

Foto do projeto Fotografia,


Memória e Identidade
(Acervo Cecop)
sumário Clique o número
da página para ler

apresentação | CARO LE ITOR 5


introdução | UM MERGULHO NO 6
UNIVERSO DA APRENDIZAGEM CRIATIVA

glossário | PAL AVRAS & 8


E XPRESSÕES ESSENCIAI S

projeto 1 | Faróis do Saber e Inovação 12


À LUZ DA DESCOBERTA

projeto 2 | Alquimétricos 16
ESTRUTURAS ENCANTADORAS
AO ALCANCE DAS M ÃOS

projeto 3 | Escola de Aventureiros 20


GAMES E AVENTURA INSPIRAM

16
APRENDIZAGEM COL ABORATIVA

projeto | Centros Juvenis 24


Fotos: 1 Divugalção Olabi Makerspace. 2 Solange Daufembach Esser Pauluk. 3 Géshica Rodrigues. 4 Acervo Cecop

1 JUVENTUDE CRIATIVA
E TRANSFORM ADORA

projeto 5 | Ação Parceiros 28


EDUCAÇÃO PARA MUDAR A COMUNIDADE

projeto 6 | Ciências Cognitivas e Artes 32


Aplicadas à Promoção e Desenvolvimento
de Tecnologias para a Educação Inclusiva
UNIVERSIDADE E EDUCAÇÃO

12 36
INCLUSIVA M AIS PRÓXIM AS

projeto 7 | Mãos na Massa 36


2 3 O SABOR DE RECE ITAS
REGIONAIS E AFE TIVAS

projeto 8 | Fotografia, memória e identidade 40


OLHAR PARA VER E APRENDER

resultados | LEMBRANÇAS CHE IAS 44


DE DESCOBERTAS E INSIGHTS

48

40
conclusões| É HORA DE
BUSCAR NOVOS HORIZONTES

4 leituras recomendadas | QUER SABER MAIS? 50


3 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018
expediente

Realização
Rede Brasileira de Aprendizagem Criativa,
Fundação Lemann e MIT Media Lab

Supervisão
Leo Burd e Ann Berger Valente

Edição executiva, projeto editorial e edição de texto


Beatriz Vichessi

Projeto gráfico e design


Cláudia Calenda
e Marcelo Calenda

Reportagem e textos
Maggi Krause

Revisão
Sidney Cerchiaro

4 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018 Voltar para


o sumário
apresentação

Caro leitor,

V
ocê é nosso convidado especial para co- todos estão em constante transformação e
nhecer as oito iniciativas selecionadas aperfeiçoamento.
em 2018 pelo Desafio Aprendizagem Está pronto para embarcar numa expe-
Criativa Brasil (DAC Brasil), promovido pelo dição de conhecimento sobre criatividade e
MIT Media Lab e pela Fundação Lemann. educação? Aperte os cintos. Vamos decolar
Mais que um material sobre projetos de apren- logo mais. Para começar, conheça como fun-
dizagem criativa na prática, este é um livro ciona o DAC Brasil, realizado anualmente
para ser usado como inspiração para organi- para que os educadores selecionados partici-
zar trabalhos que façam do ambiente educador pem do Creative Learning Fellowship. Du-
um espaço de exploração, descoberta, engaja- rante o passeio, em caso de dúvidas, consulte
mento, mão na massa, ideias e, inevitavelmen- o glossário que preparamos com termos es-
te, erros – muito bem-vindos, que fique claro! senciais sobre aprendizagem criativa (pág. 8).
Nas páginas seguintes, você vai encontrar Depois do tour pelos oito projetos vencedo-
exemplos reais de como os alunos podem ser res da edição de 2018, a partir da página 12,
protagonistas do trabalho realizado, dividir você vai conhecer um pouco das aprendiza-
responsabilidades com os colegas, tentar, gens que cada fellow reconheceu ter alcan-
mudar de ideia, tentar de novo e errar sem çado (pág. 44) e os resultados gerais do DAC
medo, descobrir caminhos para responder (pág. 48). Para terminar a expedição, não
questões que eles mesmos levantam, cons- deixe de conferir nossas indicações de leitu-
truir coisas e pesquisar. Não existe mágica ra sobre aprendizagem criativa (pág. 50) para
nem segredo que impeça você de fazer o mes- mergulhar mais fundo no tema e se animar
mo. Os projetos foram desenvolvidos con- para juntar esforços com outros educado-
siderando o contexto local de cada grupo, o res empenhados em tornar a educação mais
interesse dos estudantes e a fundamentação criativa, relevante e divertida. Boa viagem!
teórica da aprendizagem criativa, baseada
nos 4 Ps: paixão, pares, pensar brincando
(play) e projeto. Longe de serem perfeitos, Abraços,

Ann Berger Valente Leo Burd


Coordenadora do Desafio Diretor do Programa Lemann
Aprendizagem Criativa Brasil de Aprendizagem Criativa

5 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018 Fotos: Acervo pessoal Voltar para
o sumário
introdução VIAGEM PARA BOSTON
Educadores
brasileiros visitam a
escola Acera

Foto: Talita Barbosa

Um mergulho no universo
da aprendizagem criativa
A incrível jornada de 12 educadores brasileiros selecionados
no Desafio Aprendizagem Criativa Brasil 2018

Q
uando se fala em aprendizagem criativa, alguns es- Norteadores e alicerce da aprendizagem criativa, os 4 Ps não
tereótipos podem vir à mente. Alunos brincando de precisam constar de forma obrigatória, o tempo todo, em pro-
forma espontânea, crianças montando protótipos e jetos dessa natureza. É preciso considerar o contexto, a turma,
trabalhos que sempre envolvem linguagem de programa- os objetivos. Apesar disso, é importante que, em algum mo-
ção, por exemplo. Ter essas ideias faz com que o conceito mento do projeto, todos os Ps apareçam porque favorecem a
pareça modismo. Mas quem se dedica ao estudo do tema reflexão de forma contínua do aprendiz e do educador. “É na
sabe: há mais de 50 anos, a teoria da aprendizagem criativa reflexão que o aluno pode se conscientizar sobre colaboração,
– em constante crescimento e aprimoramento – prova que construir algo significativo, explorar outros caminhos quando
tem consistência e é importantíssima. A abordagem educa- estiver perdido ou frustrado”, diz Leo. Um quinto P, de pro-
cional proposta por Mitchel Resnick, do MIT Media Lab, pósito, é uma característica ímpar de projetos brasileiros. Ele
tem como base as ideias construcionistas do matemático e aponta para uma benfeitoria para a sociedade – como atender
educador Seymour Papert, também do MIT, e quatro di- uma necessidade da comunidade local – e deixa claro que o
mensões-chave – os famosos “4 Ps”: paixão, pares, pensar que se aprende não pode estar desconectado da vida.
brincando (play) e projeto. “O aluno imagina o que quer
fazer, cria um projeto pessoal baseado na ideia, brinca e DAC Brasil 2018
explora suas criações, compartilha as ideias e produtos com Na busca por bons projetos de educação formal e informal no
os pares, reflete sobre as experiências, numa verdadeira es- país, anualmente e desde 2015, acontece o Desafio Apren-
piral criativa”, explica Leo Burd, diretor do Programa Le- dizagem Criativa Brasil (DAC Brasil), promovido pelo MIT
mann de Aprendizagem Criativa. Media Lab e pela Fundação Lemann. Os selecionados são

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o sumário
introdução

TROCA DE IDEIAS
No Parts and Crafts,
com Will Macfarlan
(à direita, em pé)

Foto: Talita Barbosa

convidados para o time da Creative Learning Fellowship, no O Fellowship


Massachusetts Institute of Technology (MIT), nos Estados A agenda do Creative Learning Fellowship da edição 2018
Unidos. Os educadores escolhidos (fellows) que participam foi organizada ao redor de três grandes encontros presen-
da vivência têm a oportunidade de aperfeiçoar suas práticas ciais entrelaçados por reuniões virtuais e trocas informais
e aprofundar o que já sabem sobre aprendizagem criativa. contínuas. O primeiro foi em São Paulo, em março. Os
Além disso, exercem um papel essencial na Rede Brasilei- fellows tiveram uma agenda intensa. No primeiro dia, se
ra de Aprendizagem Criativa (RBAC), ajudando a divulgar apresentaram e explicaram as iniciativas de aprendizagem
a metodologia no Brasil e contribuindo para a melhoria da criativa. O momento foi organizado como uma mostra in-
educação. Muitos são desbravadores em termos de território terativa para representantes da Fundação Lemann e da As-
geográfico e novas significações de aprendizagem criativa. sociação Nova Escola, fellows de edições anteriores do DAC
“O processo de seleção tem rubricas claras e é árduo. Que- e outros membros da Rede de Aprendizagem Criativa. No
remos selecionar projetos com potencial em diversos aspectos segundo dia, participaram de oficinas com membros senio-
e educadores que já trabalhem, de alguma forma, na pers- res da Rede (Introdução à Aprendizagem Criativa e Scratch
pectiva da aprendizagem criativa”, diz Ann Berger Valente, para Educadores). Por fim, visitaram a Feira Brasileira de
coordenadora do Desafio Aprendizagem Criativa Brasil. Ciência e Engenharia (Febrace) e o Festival de Invenção e
Entre as características procuradas no processo seletivo, estão Criatividade (FIC).
trabalhos realizados com comunidades vulneráveis (de baixa O segundo grande encontro foi a tão esperada e celebrada
renda, com grandes desafios sociais, de difícil acesso geográ- viagem de uma semana para Cambridge (Estados Unidos), en-
fico, ou com pessoas com deficiências, que configuram uma tre 6 e 13 de maio, para participar do Creative Learning Insti-
situação de marginalização). Além disso, quanto mais inédita tute no MIT Media Lab. Na programação, um tour pelo Media
é a proposta na região, maior é a chance de ser escolhida. Lab, conversas com membros do Lifelong Kindergarten, e vi-
Para a edição 2018 do DAC, foram enviadas mais de 200 sitas a algumas experiências (NuVu, Parts and Crafts, South
propostas de educação formal e informal. E selecionadas oito End Technology Center e Acera). Os fellows também foram
delas, desenvolvidas por 12 educadores (conheça cada projeto em convidados a apresentar as iniciativas para toda a equipe do Li-
detalhes a partir da página 11): felong Kindergarten. Isso permitiu que eles refinassem os pla-
• ALQUIMÉTRICOS – Fernando Daguanno nos de projeto e interagissem com a equipe, ao mesmo tempo
• AÇÃO PARCEIROS – Raimundo das Graças Lima Xavier que os membros da equipe puderam conhecer um pouco mais
e Sebastião Borges Fonseca sobre aprendizagem criativa no Brasil.
• APRENDIZAGEM CRIATIVA NA REDE DOS CENTROS JUVENIS Por fim, o terceiro encontro aconteceu no segundo semes-
DE CIÊNCIA E CULTURA DO ESTADO DA BAHIA – Elmara tre de 2018, durante a 1a Conferência Brasileira de Aprendi-
Pereira de Souza e Iuri Oliveira Rubim zagem Criativa (CBAC), de 26 a 28 de setembro, na capital
• CIÊNCIAS COGNITIVAS E ARTES NO DESENVOLVIMENTO paranaense. Foram dias de muitas trocas, reflexões sobre os
DE TECNOLOGIAS PARA A EDUCAÇÃO INCLUSIVA – sucessos, os desafios atuais, o que se aprendeu durante esse
Eduardo Bento Pereira e Marco Antônio Silva Alvarenga tempo todo, as oportunidades futuras e sugestões para me-
• ESCOLA DE AVENTUREIROS – Gislaine Batista Munhoz lhoria do fellowship. Todos os projetos, de acordo com Ann
• FARÓIS DO SABER E INOVAÇÃO – Thais Eastwood Vaine Berger Valente, continuam em evolução. “Por isso a troca de
• FOTOGRAFIA, MEMÓRIA E IDENTIDADE – Talita Barbosa ideias constante entre os fellows é preciosa. Eles se revelam
de Souza e Raimundo Melo muito generosos e corajosos ao compartilhar experiências
• MÃOS NA MASSA – Ellen Regina Romero Barbosa inacabadas, em transformação”, diz.

7 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


glossário

Palavras &
expressões essenciais
No dia a dia do trabalho com aprendizagem
criativa, alguns termos são de uso obrigatório.
Saiba o significado de cada um deles

APRENDIZAGEM CRIATIVA
Abordagem educacional proposta por Mitchel Resnick,
do MIT Media Lab, baseada nas ideias construcionistas do
matemático e educador Seymour Papert, também do MIT.
A aprendizagem criativa foca na construção de ambientes teoria construtivista de Jean Piaget, psicólogo que estudava
de aprendizagem centrados em quatro dimensões-chave, o desenvolvimento infantil e com quem Papert trabalhou
os chamados 4 Ps da aprendizagem criativa: paixão, pa- durante vários anos antes de chegar ao MIT. Enquanto o
res, pensar brincando (play) e projeto. Resnick integra essas construtivismo de Piaget defende que as pessoas aprendem
noções por meio da espiral de aprendizagem criativa, em interagindo com o mundo, o construcionismo de Papert
que a criança imagina o que quer fazer, cria um projeto defende que elas aprendem ainda melhor se estiverem en-
baseado na ideia dela, brinca e explora com suas criações, volvidas na criação de um produto (seja ele qual for: um
compartilha as ideias e produtos com seus pares, reflete a programa de computador, um jogo, um castelo de areia)
respeito das experiências – tudo isso, por sua vez, a ajuda significativo para elas e, ao mesmo tempo, compartilhável
imaginar novas ideias e novos projetos. À medida que os com o grupo. A construção de objetos significativos promo-
alunos passam por esse processo, aprendem a desenvolver ve um maior nível de engajamento por parte do aprendiz,
as próprias ideias, testá-las, experimentar alternativas, ob- e também ajuda a materializar o pensamento, facilitando a
ter informações com outras pessoas e gerar ideias com base colaboração e a reflexão sobre processo e produto. O cons-
em suas experiências. E mais: se desenvolvem como pensa- trucionismo também pode ser considerado premissa da
dores criativos. linguagem de programação Logo, base do Scratch.

CONSTRUCIONISMO ERRO
Base da aprendizagem criativa, é uma abordagem educa- No sistema tradicional de educação, o erro é punitivo e
cional concebida por Seymour Papert na década de 1960. visto como uma falha humana. Na aprendizagem criativa,
É possível considerar o construcionismo uma extensão da é visto como parte natural do processo de aprendizagem.
Diretamente ligado à liberdade de arriscar, o erro reflete
o entendimento atual que temos do mundo e serve de base
para novas reflexões e explorações.

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o sumário
glossário

to. O trabalho mão na massa permite ao aluno vivenciar e


testar, experimentar, em vez de, simplesmente, ouvir falar
sobre uma determinada técnica ou assunto. Toda atividade
de aprendizagem criativa deve ter, necessariamente, a carac-
ESPAÇO MAKER terística mão na massa – mas é essencial considerar que nem
Espaço físico com ferramentas tradicionais (martelo, tudo o que é mão na massa é, necessariamente, uma atividade
serra etc.), tecnologias de ponta e materiais diversos, à de aprendizagem criativa. Por exemplo, em aulas de labo-
disposição dos aprendizes para que desenvolvam projetos. ratório de ciência tradicionais, ainda que os alunos toquem
Com novas tecnologias, como impressoras 3D e cortadoras diretamente nos materiais e equipamentos, a expectativa é de
a laser, o espaço maker é visto como potencial meio para re- que sigam instruções passo a passo, em vez de explorar mais
volucionar os processos de manufatura e produção. Em ati- livremente os recursos disponibilizados pelo educador.
vidades de aprendizagem criativa, deve ser usado como um
ambiente que incentive a experimentação e o pensamento
lúdico, a colaboração e a reflexão. Ao conceber a criação de
um espaço maker, é fundamental ir além da lista de ferra-
mentas e materiais e pensar na pedagogia, na concepção de PAIXÃO
educação que se deseja explorar. É um dos 4 Ps da aprendizagem criativa e diz respeito ao
engajamento e interesse dos envolvidos nas atividades. Em
vez de trabalhar em tarefas fechadas e impessoais, como as
normalmente encontradas em ambientes escolares tradicio-
nais, os alunos são incentivados a focar em questões e temas
MICROMUNDOS DE APRENDIZAGEM que lhes interessem. O resultado final geralmente é uma sala
Espaços que incentivam a exploração e a construção li- com uma turma envolvida e uma gama de projetos bem va-
vres ao redor de temas específicos. São “micro” no sentido riados. Ao se concentrar em temáticas e materiais relevantes,
de delimitar alguns aspectos e tema central e, com isso, os estudantes tendem a se aprofundar nas áreas cobertas por
permitir que os aprendizes possam ir a fundo de forma seus projetos, persistir diante de desafios e conectar as novas
mais focada. Compostos de ferramentas e materiais sele- aprendizagens com outros aspectos de sua vida.
cionados e dispostos de forma criteriosa, a interação com
os micromundos cria condições para a geração de hipóteses,
construção e exploração de coisas novas e interpretação do
resultado. Assim, os aprendizes acabam se aprofundando
nos temas de forma natural e significativa. Diferentemente PARES
do ensino tradicional em que conceitos complexos são frag- Outro dos 4 Ps da aprendizagem criativa. O desenvolvi-
mentados e distribuídos sequencialmente, os micromundos mento de projetos de significado pessoal é enriquecido com
preservam a complexidade e interdisciplinariedade dos te- interações sociais positivas. Ao trabalhar em projetos indi-
mas e incentivam a autonomia de cada aluno em relação ao viduais e colaborativos em um ambiente respeitoso e inspi-
seu próprio modo de aprender. rador, os estudantes se sentem motivados para externalizar
as ideias e os processos por trás de suas invenções, fornecer
e receber críticas, construir com base no trabalho dos de-
mais colegas, e se inspirar nas criações de outras pessoas.
Ambientes colaborativos também proveem um contexto ge-
MÃO NA MASSA nuíno para que os alunos aprendam sobre diferentes pers-
Um dos conceitos centrais do construcionismo, tem a ver pectivas voltadas a temas semelhantes, compartilhem recur-
com a exploração ativa das coisas e com a vivência por conta sos, e trabalhem em ideias que podem ser muito difíceis de
própria. É um dos pontos fortes da aprendizagem criati- implementar sozinhos.
va, a qual incentiva um processo educacional centrado na
construção e exploração livre (ou seja, sem passos predefi-
nidos), autoral (liderado pelo próprio indivíduo) e sempre
acompanhado pelo ato de refletir sobre o que está sendo fei-

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glossário

PENSAR BRINCANDO (PLAY)


Segundo Mitchel Resnick, é uma das dimensões mais im-
portantes e incompreendidas da aprendizagem criativa. Um
dos 4 Ps da aprendizagem criativa, é o espírito da exploração
e experimentação livres (tinkering) que ocorre quando as crian-
ças brincam com materiais não estruturados e de imaginação.
Em tais situações, não há certo ou errado, e novos caminhos
são constantemente descobertos na interação com o entorno.
O lúdico dá permissão às pessoas e as convida a tentar coi- tudantes como meio para a construção de seus projetos. A
sas novas, testar limites, assumir riscos e reiterar o processo tecnologia digital, especificamente, amplia o repertório de
repetidas vezes. Enquanto os projetos motivam explorações objetos de aprendizagem (objects to think with), abordando no-
mais profundas em uma determinada direção, o brincar am- vos conceitos e fenômenos. Concretiza conceitos sofistica-
plia o horizonte do que está sendo explorado em áreas que tal- dos (de física, eletricidade, programação etc.) tornando-os
vez sejam mais inovadoras ou inesperadas. Não devendo ser manipuláveis e transparentes. Dependendo da situação, a
confundido com a motivação externa gerada pelos sistemas de aprendizagem criativa também pode e deve ser implemen-
pontuação e pelos efeitos especiais normalmente encontrados tada usando materiais comuns, como papelão, madeira ou
nos joguinhos eletrônicos. tecido. Tudo depende dos objetivos e do contexto das ativi-
dades desenvolvidas.

PROJETO
Mais um dos 4 Ps da aprendizagem criativa. O bom pro- TINKERING
jeto mobiliza um processo de construção de algo em torno Sem tradução para o português, pode ser associado à ideia
de uma ideia, considerando que as pessoas aprendem me- de exploração criativa ou exploração lúdica de ideias, mate-
lhor quando envolvidas na criação de um produto que pode riais. O percurso não é necessariamente planejado e racio-
ser compartilhado com outras. O produto pode ser físico nal, os aprendizes trabalham no clima de experimentação,
ou virtual, como um carrinho de madeira, um programa erro e acerto, o famoso “vamos ver no que é que vai dar”.
de computador ou uma peça de teatro. Na perspectiva da Na aprendizagem criativa, a aceitação do erro está vincula-
aprendizagem criativa, a atividade de projeto não tem a da diretamente ao tinkering - e ambos conceitos fazem parte
ver com o encerramento de uma unidade de ensino ou um de um dos Ps da aprendizagem criativa (pensar brincando).
prêmio. É a condutora da busca por informações, que se
tornam significativas para os aprendizes porque ajudam a
resolver problemas.

SCRATCH
Linguagem de programação que incentiva a expressão
pessoal de crianças e jovens com base na criação e remixa-
TECNOLOGIA gem de jogos, arte interativa, histórias, poemas, simulações
Não é vista pela aprendizagem criativa como fim, mas, e outros projetos no computador. Inspirado na linguagem
sim, como suporte, ferramenta para construir, refletir, Logo da década de 1970 e enriquecido com o potencial da
colaborar e explorar livremente. Deve ser usada pelos es- tecnologia moderna, o Scratch inclui uma interface gráfica
e uma série de ferramentas de mídia, colaboração e cone-
xão com mundo físico criadas especialmente para viabilizar
o desenvolvimento de atividades de aprendizagem criativa
com o computador. Foi desenhado para ter pisos baixos
(para permitir fácil acesso), tetos altos (possibilitar pro-
jetos bem profundos e complexos) e paredes amplas (para
trabalhar com temáticas bem diversas).

10 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


projetos

8
projetos
inspiradores
Conheça as inciativas assinadas
por 12 educadores do Brasil
e selecionadas no
Desafio Aprendizagem
Criativa Brasil 2018

- 11 -
projetos

À luz da descoberta
Os Faróis do Saber e Inovação, em Curitiba,
abrigam estúdios de criação para desenvolver projetos
que estimulam a colaboração e a aprendizagem

DEPOIS DA PESQUISA
Os alunos se lançam
a desafios diversos no
contraturno escolar

Foto: Solange Daufembach Esser Pauluk

D
urante uma pesquisa sobre o Fa- dos os materiais para erguê-las? Então,
rol de Alexandria, um grupo de a turma resolveu se dedicar ao desafio de
estudantes ficou conhecendo a construir trenós (com protótipos modela-
Ilha de Faro via Google Earth e visitou dos em 3D) e testá-los na areia seca. Essas
museus e monumentos em explorações atividades foram realizadas por um gru-
virtuais. As descobertas despertaram al- po de alunos do Ensino Fundamental da
gumas curiosidades na garotada: como rede pública de Curitiba. Imersos em um
eram feitas as construções antigas na era ambiente propício para experimentação e
pré-cristã? De que forma eram carrega- descobertas, eles ainda recriaram o pri-

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o sumário
projetos

MIL MANEIRAS
Os aprendizes são
convidados a trabalhar
com várias linguagens

1
PROJETO
PONTO DE ENCONTRO
Em Curitiba, são nove
Faróis. Para 2019, a Faróis do Saber
previsão é de mais 22 e Inovação
O QUE É
Espaços não formais
de ensino que
oferecem oficinas no
contraturno escolar.

OBJETIVO
Funcionar como
oficinas de ideias e
polos de disseminação
da cultura maker e da
2
Fotos: 1 Solange Daufembach Esser Pauluk 2 Daniel Castellano / SMCS aprendizagem criativa,
valorizando a criação,
a colaboração, o
meiro guindaste de que se tem registro na protótipos usando computação criativa, pensamento crítico
antiguidade e se lançaram a replicar uma aprendem sobre modelagem 3D, criam e a autonomia dos
frequentadores.
miniatura de guindaste hidráulico, cons- jogos e animações na linguagem de pro-
truído com papelão, seringas e água. A gramação Scratch e montam instalações ONDE  
montagem passou por erros e dificuldades, artísticas. Tudo usando ferramentas tra- Curitiba.
mas resultou num objeto criado, testado e dicionais, como martelo e pregos e tec-
aprovado coletivamente. nologia de ponta, entre outros subsídios. QUEM PARTICIPA
Estudantes, professores
Isso tudo aconteceu em um espaço
e funcionários da
maker de uma das unidades dos Faróis Espaços para criação rede municipal de
do Saber e Inovação. Lá, tal como esses “O projeto tem como princípio metodoló- ensino de Curitiba e a
alunos, outros se dedicam a desenvolver gico a experiência de aprendizagem criativa comunidade local.

13 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


projetos

Os Faróis promovem a jeto. Os Faróis promovem a aprendizagem

aprendizagem de forma
de forma flexível e com tempo de interação
variável. É um esquema oposto ao da esco-

flexível e com tempo de la, mais hierárquica e burocrática, e que


funciona num sistema de progressão. Ao
interação variável. mesmo tempo, vale destacar que os Faróis
costumam estar associados a escolas e as
complementam de várias formas.
e imersiva, tornando as bibliotecas públicas Em 2018, Curitiba tinha nove faróis e
centros de pesquisa e produção, um verda- a proposta para 2019 é a implantação de
deiro ambiente para descoberta, exploração outros 22. Todas as unidades são aber-
e encantamento”, explica Thais Eastwood tas para estudantes da rede de ensino de
Vaine, responsável pela iniciativa. “E nada segunda a quarta-feira. Às quintas, para
melhor do que um estúdio de criação, um toda a comunidade. Sábados e domingos,
espaço de criatividade dentro de uma bi- os Faróis estão fechados.
blioteca, lugar que permite pesquisa e
muita inspiração, para serem criados mi- Disparar ideias e interesses
cromundos”, observa ela. A dinâmica de trabalho nos Faróis fun-
Nos anos 1990, os Faróis do Saber ainda ciona assim: para iniciar o processo com
não atuavam sob a perspectiva da inova- os alunos, o mediador pergunta o que eles
ção. Eram bibliotecas e funcionavam como gostam de fazer, o que têm curiosidade de
centros de pesquisa. Nos anos 2000, tam- saber, quais seus interesses, o que querem
bém passaram a possibilitar o acesso à in- criar e se há algo que poderiam melho-
ternet, em uma época em que a tecnologia rar no entorno. Outra forma de disparar
ainda não era acessível para todos via celu- ideias é sugerir temas baseados em micro-
lar. Nessa versão atual, acrescentar o item mundos e narrativas divertidas e com isso
“inovação” foi importante para resgatar a estimular os estudantes. Feito esse levan-
importância dos Faróis, que estavam dei- tamento, o educador orienta o grupo para
xando de ser frequentados pela população. selecionar as ideias que vão servir de base
O conceito de aprendizagem criativa se para o desenvolvimento do projeto e aí tem
encaixou perfeitamente à proposta do pro- início a pesquisa que possibilita planejar e
FAZER E SABER
As atividades nascem estruturar a atividade mão na massa. Por
de ideias dos alunos fim, o grupo compartilha o que criou com
e dos educadores os colegas e o que aprendeu, podendo en-
volver a comunidade também.
Quem participa ou observa as atividades
sendo desenvolvidas nos Faróis descobre o
professor como um personagem que é um
facilitador e designer de experiências de
aprendizagem. Ele dá autonomia e apoia
os alunos ao mesmo tempo que também
faz o papel de aprendiz. As oficinas são
ricas oportunidades para exercer o pro-
tagonismo, a colaboração, o intercâmbio
de habilidades evidente na cultura de pa-
res. Também são livres e acolhem todo o
tipo de problematização e interesse, ali-
mentando a paixão de seus participantes.
Giram em torno de projetos, pois algo vai
Foto: Solange Daufembach Esser Pauluk

14 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


projetos

ESPAÇO MAKER
As bibliotecas públicas
também são polos de
inovação e criatividade

LEITURA E ESTUDO
Livros à disposição
em sinergia com a
demanda de pesquisa

Fotos: Patrícia Zeni de Sá

Thais ser criado, construído, compartilhado, danças sociais e ambientais positivas”,


Eastwood Vaine evidenciando a importância do proces- conta Thais, explicando o último P da
so (muito mais do que o produto final). aprendizagem criativa, de propósito.
FORMAÇÃO ACADÊMICA Sendo lugar de acesso a diferentes ferra- Para fazer a cultura da aprendizagem
Mestre em Formação mentas e materiais, tecnologias e recur- criativa ecoar nas escolas públicas curiti-
Científica, Educacional
sos, os Faróis oferecem o ambiente ideal banas, a energia e a circulação de ideias
e Tecnológica
para experimentação e brincadeira, para dos Faróis precisam ser cobiçadas pelos
o aprender brincando, fomentando o play. educadores. “O próximo passo é ampliar
PAPEL NO PROJETO
Responsável pela parte
“Queremos que as ideias e objetos desen- a participação dos professores das escolas
pedagógica volvidos possam ajudar outras pessoas, vinculadas. Nossa ambição é que o que
ralmente impactem a escola e as crianças, acontece no espaço maker que criamos
estendam para o entorno e levem a mu- transborde para a comunidade”, diz.
Foto: Acervo Pessoal

15 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


projetos

WORKSHOP
Trabalho com
peças geométricas
interligadas

Foto: Insituto de Eventos Ambientais (IEVA)

Estruturas encantadoras
ao alcance das mãos
Em encontros de criação coletiva propostos por Alquimétricos,
materiais simples viram kits de construção para montar
brinquedos, objetos decorativos e o que mais a imaginação permitir

O
nome da iniciativa fundada pelo nas estruturas criadas por quem participa
maker e artista argentino Fer- dos workshops, tão variados que divertem
nando Daguanno por si só já é crianças e adultos, promovem formação
instigante: Alquimétricos. Uma fusão de professores e são geradores de perfor-
de alquimia (que remete a tudo o que é mances sonoras e visuais.
mutante, mágico e transformador) com Alquimétricos abraça tantas possibilida-
métrica (que engloba medida, exatidão e des que não tem uma definição única. O
técnica). Arte e tecnologia estão presentes próprio Daguanno descreve o projeto como

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o sumário
projetos

MÃOS EM AÇÃO
A colaboração entre
pares implica
criação coletiva
1

Fotos: 1 Akira Band e Catu Riso. 2 Floriza Ríos e Fernando Daguanno


PROJETO

tanto estruturas geométricas básicas quanto Alquimétricos


complexas cúpulas geodésicas”, explica. As O QUE É
peças podem ser produzidas artesanalmente Iniciativa maker de
ou projetadas e criadas com ferramentas de blocos de montar faça
fabricação digitais como cortadora a laser. você mesmo focada
em matemática,
geometria, arquitetura,
Universo maker para todos mecânica e artes.
2 A ideia foi nascendo aos poucos. Aos 30
anos, Daguanno fundou um makerspace OBJETIVO
em Buenos Aires com sócios. Tempos de- Diminuir a barreira do
aberto e colaborativo, focado na sustentabi- pois, em um ano sabático dedicado a pro- acesso a brinquedos
e materiais didáticos
lidade econômica e ambiental e empreendi- jetos artísticos, descobriu que queria tra- desenvolvidos com
mento social. Isso porque os encontros têm balhar com criatividade e sustentabilidade. materiais reciclados.
como objetivo a construção de brinquedos “As tecnologias digitais, como impressoras
didáticos e ecotecnológicos que abrangem 3D e cortadoras a laser, têm alto custo. En- ONDE
conteúdos educacionais voltados para o tão, pensei em como levar o universo maker Itinerante.
Base: Rio de Janeiro.
STEAM (Ciência, Tecnologia, Engenharia, de um jeito barato e acessível a todos”, diz.
Arte, Matemática). “Usando um conjunto O objetivo de Alquimétricos é reduzir QUEM PARTICIPA
simples de peças interligadas, construímos ao mínimo as barreiras de acesso e impul- Pessoas de 3 a 80 anos.

17 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


projetos

O conceito de projeto é intrínseco Estruturas encantadoras


O mote da alquimia, que é transformar
a Alquimétricos, que tem chumbo em ouro, casa muito bem com

um enfoque claramente o propósito da iniciativa de Daguanno.


“Usamos materiais que seriam jogados
construcionista. fora e o transformamos em arte, objeto
útil ou brinquedo didático-tecnológico
para ser manipulado por quem não tem
acesso ao Lego, por exemplo”, explica ele.
sionar a educação criativa e as disciplinas Tanto para crianças como para adultos, as
STEAM com estratégias lúdicas e um en- esculturas criadas nas oficinas funcionam
foque construcionista. A iniciativa resolve como um jogo, uma brincadeira de mon-
dois grandes problemas da sociedade: o tar, é um aprender brincando (play) que
excesso do lixo e a falta de programas edu- leva ao protagonismo.
cativos focados em tecnologia low-tech. A estrutura das criações é encantadora
Não é preciso mais do que materiais como e tem algo de mágico e místico, já que o
câmara de carro e embalagens tetrapack, corpo volumétrico de 20 faces do icosa-
palitos de bambu para churrasco e elásti- edro funciona quase como uma manda-
cos, componentes eletrônicos baratos e de la 3D. Com base nessas esculturas geo-
aparelhos obsoletos. Em oficinas de duas désicas, é possível fazer diversas coisas e
hora, todos podem construir casas de bo- muitos têm vontade de estruturar arma-
necas, castelos e naves e usar materiais de duras ou vestir os objetos que criam. “É
reciclagem para fazer presentes para a fa- uma paixão, pois é esteticamente boni-
mília como luminárias, esculturas e ma- to e o fazer funciona como um mantra
quetes. Em outro encontro, de quatro ho- ou uma brincadeira que exige atenção e
ras, é possível aliar tecnologia e mecânica a concentração”, diz Daguanno. A estru-
estruturas para criar robôs dançantes. tura geodésica convida a olhar de dentro,
interagir, e essa prática se repete espon-
taneamente nos workshops. “Também
convido a todos para tirar fotos de dentro
da bola geodésica e enviar para o proje-
to, que é colaborativo”, explica ele. Essa
colaboração entre pares é um dos Ps fa-
voritos do fundador de Alquimétricos, e
ele engloba não apenas o fazer junto, mas
considera que as pessoas criam conteú-
dos novos e têm prazer em compartilhar
– também de forma virtual. “Minha ideia
é que a prática ganhe escala e seja comu-
nicada o máximo possível”, diz ele, que
fica muito animado ao ver professores se
apropriarem e ensinarem os alunos.
O conceito de projeto é intrínseco a Al-
quimétricos, que tem enfoque claramente
construcionista. Há vários desafios antes
TECNOLOGIA
de construir uma bola geodésica. É possí-
As peças são
produzidas vel fazer pirâmides ou tetraedros e muitos
artesanalmente e grupos começam a montar estruturas geo-
por vias digitais métricas do seu jeito, usando a técnica bá-
Foto: Akira Band e Catu Riso

18 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


projetos

SUSTENTABILIDADE
1
Foco no excesso de lixo
e na falta de iniciativas
educacionais low-tech

2
3 Fotos: 1 Divugalção Olabi Makerspace. 2 Fernando Daguanno

Fernando sica. “Já vi projetos com assimetria e com um convite para participar de uma exposi-
Daguanno movimento. Quem participa vislumbra ção e oficinas em Shenzhen, na China, e
FORMAÇÃO ACADÊMICA
um universo de possibilidades e me mostra hoje se comunica com professoras daquele
Técnico em eletrônica,
diversos caminhos.” país. Entre os próximos passos: lançar um
maker e designer Em 2018, Daguanno confirmou o po- crowdfunding para manter a sustentabili-
autodidata tencial de Alquimétricos transbordar as dade do projeto, editar e publicar um guia
oficinas locais. Assim, surgiu uma comu- detalhado de tecnologia (de código aberto),
PAPEL NO PROJETO nidade de colaboradores interdisciplinar e projetos e atividades e montar uma plata-
Fundador internacional focada em disponibilizar o forma de projetos online e um cardápio de
recurso didático para contextos socioeco- conteúdos em sinergia com o currículo ofi-
nômicos cada vez mais diversos. Ele recebeu cial do ensino brasileiro e do argentino.
Foto: 3 Felipe Gabriel / Red Bull
Content Pool

19 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


projetos

Games e aventura inspiram


aprendizagem colaborativa
A Escola de Aventureiros é um micromundo de criação
de jogos para estimular a criação de histórias e desafios
em tabuleiros com recursos digitais ou analógicos

E
m encontros na casa da professo-
ra Gislaine Batista Munhoz, jo-
vens construíram em seis meses
um jogo que explicava a gamificação ten-
do como pano de fundo a série do dese-
nho animado Hora da Aventura (criada por
Pendleton Ward para o Cartoon Network).
Personagens e elementos foram trabalha-
dos com exploração do ambiente com QR
Codes, jogos com Scratch, kits de robóti-
ca, bonecos de feltro e tecido, e um cenário
em que o jogador entrava e participava da
aventura. O jogo fez sucesso na primeira
vez que foi apresentado para professores
na 1ª Mostra de Tecnologia da Secretaria
Municipal de Educação de São Paulo. E as-
sim nascia a Escola de Aventureiros. “Foi o
primeiro passo para inserir a gamificação
como política pública na rede paulistana,
em 2016”, conta ela, que na época era ges-
tora do Núcleo de Tecnologia para Apren-
dizagem da Secretaria Municipal.
Com o crescimento do número de con-
vites para levar o Escola de Aventureiros
para eventos como a Campus Party, a so-
lução foi passar os elementos do universo
fantástico do cenário para um tabuleiro.
“Defendo a gamificação com estratégia di-
dática para dar voz, protagonismo e auto-
nomia para os alunos, partindo da criação
de narrativas e histórias”, diz Gislaine.
Crianças e jovens usam o universo riquís-
POLÍTICA PÚBLICA
simo dos games, desenhos e filmes juvenis
Na capital paulistana,
a gamificação está – um repertório que não é utilizado na es-
no projeto da rede cola, mas que pode ser perfeitamente rela-
cionado ao currículo.
Foto: Gislaine Batista Munhoz

20 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018 Voltar para


o sumário
projetos

MATERIAIS
Diversidade
para criar
tabuleiros

PROJETO

Foto: Gislaine Batista Munhoz Escola de


Aventureiros
A professora explica que um dos desa- Como e por que criar uma história
O QUE É
fios é fazer os educadores entenderem que “Sempre fui refratária a dar instruções para Invenção de tabuleiros
não se trata apenas de um jogo. “Jogo tem os alunos, então a lógica da autonomia cria- gamificados ou
um fim em si mesmo, é um produto com tiva fez todo sentindo para mim”, relata ela. gamificações com
intencionalidade e, quando termina, está O insight aconteceu durante a palestra de base em histórias
fechado”, explica ela. Já a gamificação é Leo Burd, diretor do Programa Lemann de construídas ou recriadas
pelos participantes.
uma proposta mais aberta, com uma in- Aprendizagem Criativa, no FIC São Paulo,
tencionalidade definida, mas que permite em 2016. Foi quando Gislaine concluiu que OBJETIVO 
a criação de outras narrativas, aventuras. suas práticas já davam vazão à autonomia Ser um recurso potente
O jogo inicial serve apenas como um in- criativa. Ela também percebeu que criar o de aprendizagem
que crie experiências
sight: o que é construído em seguida é o tabuleiro era um processo muito mais em- que provoquem
mais potente. A ideia é que os educadores polgante do que participar do jogo. Adultos engajamento e imersão.
desenvolvam, em conjunto com os estu- e crianças ficam imersos e encantados pelos
ONDE 
dantes, seus enredos e façam um remix do micromundos e o jogar é um convite para a
São Paulo, Guarulhos (SP)
tabuleiro. “É um processo contínuo. O ta- diversão e o entretenimento, ou seja, dá va- e Curitiba.
buleiro que criamos, por exemplo, já está zão ao play, o aprender brincando. A paixão,
na quinta versão”, diz ela. Figuras (como outro P da aprendizagem criativa, não resi- QUEM PARTICIPA
dinossauros e cavalinhos), brinquedos, de apenas em curtir o jogo, mas também em Alunos e professores do
Ensino Fundamental,
blocos de Lego, pistas com QR Code ou construir a história considerando elemen- alunos do Ensino Médio
recursos analógicos (como cartas e mensa- tos que se gosta. No caso de um professor, e coordenadores
gens cifradas) enriquecem as histórias. mesmo que não tenha a ver com sua disci- pedagógicos.

21 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


projetos

APRENDIZAGEM
O conteúdo gamificado
pode ou não estar
atrelado ao currículo

Fotos: Gislaine Batista Munhoz

plina diretamente, é uma forma potente de a dificuldade de um adulto se ver como cria-
expressar o que é significativo para ele, o tivo”, diz Gislaine.
que o apaixona. Na gamificação, a parceria
é inerente, não há como construir ou jogar Educadores aventureiros
individualmente. E é isso que transforma o Na iniciativa das oficinas de aprendiza-
processo em uma constante troca de conhe- gem criativa para formação de professores
cimentos. No projeto, o enfoque principal é que introduzem a lógica da gamificação, os
a necessidade de se fazer entender pelo ou- participantes são divididos em equipes, que
tro, seja construindo o enredo ou as regras demoram cerca de 15 minutos para jogar
do jogo, e isso aumenta o protagonismo dos usando o tabuleiro-base desenvolvido pela
participantes. “O gostoso é ver materiali- Escola de Aventureiros. “É rápido porque a
zada a história criada. Muitos professores ideia é apresentar a importância dessa cria-
contam que não se achavam capazes ou se ção. Com base na experiência, o educador
surpreendiam com o resultado. Isso mostra entende o que pode inserir no próprio jogo,
e a criação não tem limites, pois a proposta
é de construção colaborativa com os alu-
Na gamificação, a parceria nos”, conta a professora.
Nas oficinas para docentes, com quatro
é inerente, não há como horas de duração, a proposta é imagi-
nar histórias interessantes e desenvolver
construir ou jogar tabuleiros. É possível organizá-los sem
compromisso com conteúdos curricula-
individualmente. res ou pensando em incluí-los. Gislaine

22 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


projetos

CAMPUS PARTY
Idealizadores
do tabuleiro Terra
de Aventura

RECURSOS PARA CRIAR


Pistas com QR Codes
ou analógicas desafiam
os participantes

explica que, no segundo caso, os tabulei-


ros ficam ricos em conteúdo, mas o lado
imaginário e fantástico perde um pouco.
Ainda assim, ambos caminhos são váli-
dos: o maior desafio é deixar o professor
em contato com um repertório que ele
não detém por completo. Só mesmo a ex-
periência de fazer junto é que dá conta de
Fotos: Gislaine Batista Munhoz
inseri-lo na prática da gamificação.
Gislaine Batista Atualmente, Gislaine é coordenadora
Munhoz pedagógica na EMEF Professor Rivadavia As formações preencheram o calendário
Marques Junior, em São Paulo, e implanta de 2018 e já surgiram novas ideias. Além
FORMAÇÃO ACADÊMICA um projeto de aprendizagem criativa em de transformar a Escola de Aventureiros
Licenciada em colaboração com os professores. “Come- em um curso de extensão presencial para
Geografia e çamos montando uma sala específica e al- educadores pela Universidade Federal de
Pedagogia, mestre
guns já querem ter aulas duplas. Fico feliz São Paulo (Unifesp), Gislaine planeja or-
em Educação e
especialista em porque a aprendizagem criativa serve de ganizar um banco de dados virtual com as
Design Instrucional base para o currículo, amarra situações de gamificações e os micromundos criados e
aprendizagem”, diz. Uma professora suge- remixados. O primeiro tabuleiro (A Ter-
PAPEL NO PROJETO riu fazer um jogo sobre um feudo. Outra, ra da Aventura) já tem um roteiro e é base
Criadora deu a ideia de elaborar um jogo sobre hi- para que os professores se inspirem nos
droelétrica. O importante é reunir mate- recursos, adaptem e criem suas próprias
riais que inspirem os alunos. histórias com os alunos.
Foto: Acervo Pessoal

23 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


projetos

Juventude criativa
e transformadora
Na Bahia, os estudantes dos Centros Juvenis aprendem
se divertindo. Eles se destacam pela autoria de projetos com
potencial de transformar sua realidade e da comunidade

A
lunos finalistas de maratonas de Laboratórios de inovação pedagógica, eles
tecnologia, vencedores de prê- promovem o acesso dos estudantes a temas
mios de criatividade e inovação, contemporâneos no contraturno da esco-
ganhadores de bolsa de incentivo à pesqui- la regular, por meio de cursos, oficinas,
sa ou com projeto selecionado para o Ban- atividades culturais e de incentivo ao co-
co de Práticas Inovadoras do Ministério da nhecimento científico. Na rede de CJCC,
Educação. Ter equipes que alcançam esses que em 2018 abrangeu cinco centros – Sal-
méritos é o resultado de atividades ofe- vador, Vitória da Conquista, Barreiras,
recidas pelos Centros Juvenis de Ciência Itabuna e Senhor do Bonfim - um desa-
e Cultura (CJCC) em cidades da Bahia. fio é comum a todos. Como a frequência

GUERREIRO CRIATIVO
O aluno Paulo Abraão
com a fantasia de
samurai que ele criou

Foto: Amanda Oliveira

24 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018 Voltar para


o sumário
projetos

INOVAÇÃO PEDAGÓGICA
Os aprendizes têm
contato com questões
contemporâneas

PROJETO

A Aprendizagem
Criativa na rede
MIL E UMA MANEIRAS dos Centros
Dá até para aprender
matemática com
Juvenis de
moda e fotografia Ciência e
Cultura (CJCC)
O QUE É
Fotos: Equipe do Centro Juvenil de Vitória da Conquista Oficinas de robótica,
programação e
reinvenção das
bens e utilização de transporte. De acordo coisas e formação
com as respostas marcadas por quem acio- de professores
na o questionário, surgem informações na nessas áreas.
tela sobre desperdício de água, por exem- OBJETIVO
plo. A animação ajudou a mensurar a es- Proporcionar aos alunos
cassez de práticas sustentáveis entre os alu- das escolas públicas
nos de um colégio da localidade e instigou o desenvolvimento de
professores a planejar temas relacionados à criatividade, autonomia
e autoria, ao aventurar-
conservação dos recursos naturais. A ani- se por investigações e
mação interativa de Renata foi escolhida criações próprias.
é opcional, as equipes pedagógicas estão para ser apresentada na Feira Brasileira de
sempre inventando novas formas de atrair Ciências e Engenharia (Febrace) em 2018 ONDE 
o jovem, fazendo-o apostar em seus inte- e a aluna mereceu uma bolsa do Conselho Bahia.
resses e incentivando a inovação. Nacional de Desenvolvimento Científico e QUEM PARTICIPA
Renata Gondim Valença, 16 anos, alu- Tecnológico (CNPQ Júnior). Estudantes e professores
na do Ensino Médio, participa da incu- da rede pública dos
badora de projetos no CJCC de Vitória da O prazer da descoberta anos finais do Ensino
Conquista e aprendeu programação para Orientadora da aluna no projeto, Elmara Fundamental e Ensino
Médio, em Salvador,
desenvolver uma animação interativa com Pereira de Souza é vice-diretora e pro- Barreiras, Itabuna,
sete perguntas relacionadas ao consumo de fessora do CJCC de Vitória da Conquista Vitória da Conquista
água, energia, descarte de lixo, consumo de desde 2016. Segundo ela, os jovens são e Senhor do Bonfim.

25 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


projetos

EM REDE
Os Centros são uma
iniciativa da Secretaria
Estadual da Educação

TODOS JUNTOS
Os alunos trabalham
em equipes e
aprendem a cooperar

existe desde o início, assim como com os


projetos. As atividades da incubadora,
por exemplo, se organizam em torno dos
projetos que os estudantes elegem para re-
alizar. Como eles se organizam em equi-
pes, os pares também são valorizados:
2 acontece trabalho conjunto, cooperação e
Fotos: 1 Equipe do Centro Juvenil de Barreiras. 2 Equipe do Centro Juvenil de Vitória da Conquista
socialização de práticas. Paixão é o moti-
vo principal para que o aluno esteja ativo
motivados a participar pelo prazer da des- – ele precisa estar ali por desejo próprio e
coberta. “Eles escolhem quando e como se envolver. Nas oficinas, os estudantes e
vão fazer e as propostas dos professores são professores desenvolvem habilidades e ati-
variadas. É possível estudar História e Ge- tudes na perspectiva do aprender fazendo,
ografia com produções de sucesso, como mão na massa e aprendizagem criativa.
Star Wars. Ou entender conceitos de mate- Entre elas, se destacam: trabalho em equi-
mática e geometria por meio de fotografia, pe, raciocínio lógico, criatividade, auto-
culinária ou moda”, conta Elmara. nomia, liderança, argumentação, escrita
Nos CJCC se assume que aprender é e atitude empreendedora. O propósito
divertido, portanto a conexão com o play ainda é alvo de reflexão e discussão. “Ele
é muito intrincado com autoria, com per-
mitir o jovem criar e ter suas ideias. Tem
“É possível estudar História um objetivo de transformação de vida, de
melhora de autoestima e de empodera-
e Geografia com produções mento, mas também pode ser aproximar a
Educação Básica da Universidade, ou ten-
de sucesso, como Star tar resolver problemas da comunidade com
criatividade e inovação”, diz Iuri Rubim,
Wars”, conta Elmara coordenador estadual dos CJCC .

26 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


projetos

CAMINHO LIVRE
Uma câmera escura
gigante para explorar
conceitos de ótica

Elmara Pereira
de Souza
FORMAÇÃO ACADÊMICA
Mestre em Educação
e doutora em Difusão SEM FRONTEIRAS
do Conhecimento Alunos do CJCC
já viajaram para
os Estados Unidos
PAPEL NO PROJETO
Responsável pela parte
pedagógica e de
metodologia
1

2
Fotos: 1 Karla Lima. 2 Amanda Oliveira

Iuri Oliveira
Rubim Em 2017, Elmara e Iuri tiveram o pri- participação de Elmara e Rubim no DAC
meiro contato com a aprendizagem criativa 2018. Muitas práticas pedagógicas ti-
FORMAÇÃO ACADÊMICA na Conferência Scratch Brasil, onde co- nham a ver com a aprendizagem criativa,
Graduação em
nheceram Leo Burd, diretor do Programa enquanto outras, não. Um exemplo de
Comunicação/
Jornalismo e mestre Lemann de Aprendizagem Criativa. Mas só mudança de estratégia aconteceu duran-
em Educação depois da seleção para o DAC Brasil 2018 te um curso de robótica livre com Ardu-
começaram a imersão na metodologia. íno. Antes, o professor determinava o
PAPEL NO PROJETO “Logo percebemos que tínhamos de com- que seria feito e ensinava num esquema
Coordenador dos preender e identificar o que já fazíamos e passo a passo. Agora, dá aos alunos a li-
CJCC, organizador ressignificar algumas práticas. É como se o berdade para escolher e isso ampliou de
de cursos sobre que pensamos para a parte teórica dos cen- forma surpreendente a criatividade dos
aprendizagem criativa
e articulador da rede
tros correspondesse às premissas da apren- projetos. “Como o interesse dos jovens é
de AC na Bahia dizagem criativa”, conta Elmara. essencial, temos de nos reinventar cons-
A revisão crítica das atividades dos tantemente e a aprendizagem criativa casa
Centros foi uma das consequências da com essa necessidade”, observa Iuri.

27 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


projetos

Educação para
mudar a comunidade
Em Santa Bárbara, cidade localizada no Pará, 40% dos
habitantes são crianças. Formar essa geração para enfrentar
problemas é o trunfo do projeto Ação Parceiros

INICIATIVA CIDADÃ
O projeto explora
robótica, mas também
trata de valores

Foto: Projeto Social Ação Parceiros

E
ntre os 30 mil habitantes do mu- Belém. Mas, desde 2003, o Projeto Social
nicípio paraense, apenas 150 têm Ação Parceiros, iniciativa de Raimundo
formação em nível superior e as das Graças Lima Xavier, o Xavier, fala de
crianças são 40% da população. Na locali- Educação para a comunidade local. Em
dade, faltam saneamento, oportunidades, 2011, foi possível adquirir uma sede e, em
escolas... À situação socioeconômica, pior 2014, estruturar salas com ambiente edu-
do que a da capital do estado e do que a cacional para acolher famílias e crianças.
média das cidades brasileiras, somam- “As iniciativas de educação criativa e ino-
-se altos índices de violência e consumo vação são raras na nossa região e inexis-
de drogas. Essa é a realidade do municí- tentes nas localidades mais pobres do in-
pio de Santa Bárbara, a 45 quilômetro de terior do Pará”, descreve Sebastião Borges

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o sumário
projetos

AÇÃO CRIATIVA
Espaço mão na massa,
trabalho entre pares e
com itens de baixo custo

CONCEITO E PRÁTICA
Scratch e Arduíno PROJETO
chegam para mudar
a educação local
Ação Parceiros:
Robótica
Educacional
em uma
Comunidade
Ribeirinha no
Interior do Pará
O QUE É
Projeto social focado
Arduíno, ao custo de 35 reais, chamaram em educação com
a atenção para o trabalho, que levou o ter- brinquedos feitos
de pneus e outros
ceiro lugar nacional no Prêmio Betinho de materiais de baixo
Cidadania 2017. “É uma iniciativa cidadã, custo na área
que promove o básico para essas pessoas. externa e espaço
Durante a participação no Scratch Day, em mão na massa.
Belém, arrecadamos quase 450 quilos de
OBJETIVO
alimentos para a comunidade”, diz Xavier. Ensino da robótica
educacional para
Ação social população de
Fotos: Projeto Social Ação Parceiros
No primeiro semestre de 2018, cerca de 120 baixa renda.
crianças participaram de oficinas, ativida-
ONDE 
Fonseca, o principal colaborador do Ação des lúdicas e usaram a sala de leitura. Havia Santa Bárbara (PA).
Parceiros. A ideia do projeto é transmitir turmas pela manhã e à tarde (às segundas,
conhecimento usando o brincar para tor- quartas e sábados). A iniciativa é movi- QUEM PARTICIPA
ná-lo mais atrativo. “Além de marcenaria, da pela paixão de transformar a vida das Alunos do Ensino
eletrônica e matemática, trabalhamos va- crianças. E o gosto e o interesse delas pelo Fundamental,
professores escolares,
lores e cidadania”, conta Xavier. Cursos de que fazem no projeto são mostrados a pais, coordenadores
programação com Scratch e um robozinho mães e responsáveis nos encontros com as pedagógicos e
feito com garrafa PET e movimentado com famílias. A leitura comunitária, a robótica diretores de escola.

29 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


projetos

educacional e os cursos que acontecem no a ganhar com os saberes sobre a apren-


espaço são segmentados em projetos. Além dizagem criativa adquiridos em Boston.
do mais, a origem de tudo é um projeto de “Nunca pensei que iria sair do meio da
ação social. A sede conta com área exter- floresta para ir aos Estados Unidos”, conta
na bem provida de brinquedos (balanços, Xavier. Foi de lá que ele e Sebastião volta-
trepa-trepas e outros que promovem desa- ram cheios de ideias para colocar em prá-
fios de vários tipos) e salas em que o mote tica. Inspirados pelas visitas a escolas, em
é aprender brincando. Todo o ambiente foi junho fecharam a sede para uma extensa
pensado para estimular o play. A sensação reforma, que adicionou 17 brinquedos na
de que é preciso ajudar a comunidade e parte externa e refez a estrutura de salas,
despertar o olhar pelo outro dá margem ao transformando o espaço em um grande
trabalho entre pares. Principalmente para galpão com prateleiras, painéis para su-
que as crianças trabalhem juntas com o porte de ferramentas e kits de materiais.

SIMPLES E INTELIGENTE
Robótica de baixo
Foto: Projeto Social Ação Parceiros
custo é um dos pilares
do projeto paraense

objetivo de, no futuro, solucionar proble- A bolsa do fellowship ajudou na refor-


mas da própria comunidade. Já o propósito ma e deu origem ao primeiro espaço de
abraça a ação toda. Desde o início, segundo aprendizagem criativa no Pará. Durante
Xavier, quem participa precisa sentir que, os seis meses da reforma, os dois não fica-
por meio do aprendizado, tem a perspec- ram parados. Pelo contrário: divulgaram
tiva de uma vida melhor. “Há famílias que a aprendizagem criativa no estado pro-
não têm o que comer. O projeto, além de movendo palestras e oficinas temáticas.
diminuir essa necessidade, dá perspectiva Incentivaram outras pessoas a participar
de futuro”, diz Xavier. do curso online LCL e estão estruturando
As atividades desenvolvidas no contra- uma rede local de interessados no assun-
turno escolar pelo Ação Parceiros só têm to. “Também estamos desenvolvendo um
conjunto de atividades para professores e
uma grade de cursos, e planejamos dispo-
“Há famílias que não têm o que nibilizar o ambiente também para visitas
e oficinas de terceiros”, conta Sebastião.
comer. O projeto, além de A própria metodologia da aprendizagem
criativa é ponto de partida para que a
diminuir essa necessidade, Ação Parceiros consiga recursos para dar
sustentabilidade ao projeto. Uma ideia é
dá perspectiva de futuro.” organizar oficinas pagas de aprendiza-

30 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


projetos

BRINQUEDOS
Com materiais
simples, divertem e
promovem desafios

Raimundo
das Graças
Lima Xavier
FORMAÇÃO ACADÊMICA
Técnico em Eletrônica,
tecnólogo em
Processamentos de
Dados e especialista
em Robótica
Educacional

PAPEL NO PROJETO
Fundador e
coordenador-geral

BEM-VINDOS
Os 4 Ps da
Sebastião aprendizagem criativa
Borges Fonseca dão o tom à iniciativa

Fotos: Projeto Social Ação Parceiros


FORMAÇÃO ACADÊMICA
Mestre em
Computação
Aplicada, especialista gem criativa e de Scratch para professo- e tecnologia e queira entender a metodo-
em Engenharia de res, para que levem a prática consigo. A logia da aprendizagem criativa. “Não será
Sistemas, bacharel outra é criar produtos vendáveis como só para professores, e sim para quem ti-
em Ciência da uma tábua geoplano, que ajuda a cons- ver capacidade de conduzir as oficinas e
Computação e
truir figuras geométricas, ou o kit para atuar como orientador educacional”, diz
licenciado em
Matemática fazer o robozinho de garrafa PET com Xavier. O desafio agora é formar pessoas
LED, bateria e clipe e outros protótipos para trabalhar com as crianças seguindo
PAPEL NO PROJETO
educativos e vendáveis. Um dos próximos a metodologia da aprendizagem criativa
Principal colaborador passos é abrir uma seleção na comuni- na escola maker batizada de Espaço de
dade para quem goste de trabalhar com Aprendizagem Criativa Comunitária da
projetos que envolvam arte, engenharia Ação Parceiros.

31 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


projetos

CAPACIDADE
Dislexia e deficiências
diversas não são
barreiras para aprender
e desenvolver projetos

Foto: Eduardo Bento Pereira

Universidade e educação
inclusiva mais próximas
Em São João del-Rei (MG), Ciências Cognitivas alia
robótica e psicologia para ajudar alunos a recuperar
a autoestima em um núcleo de aprendizagem criativa

O
que acontece quando a engenha- robótica”, explica Marco Antônio Silva
ria elétrica se encontra com a Alvarenga, professor do departamento de
psicologia, mediada pela robóti- psicologia, que trabalha em parceria com
ca educacional? Muita coisa, na Universi- Eduardo Bento Pereira, coordenador do
dade Federal de São João del-Rei (UFSJ). Programa de Extensão da Olimpíada Bra-
“O desenvolvimento de robôs exige ha- sileira de Robótica (OBR). Em resumo, as
bilidades cognitivas e competências so- aulas de robótica trabalham com a inte-
ciais, então o primeiro passo foi entender ração social por meio de peer-instruction,
quais seriam as competências que iríamos ou seja, monitores auxiliam e interagem
mensurar antes e depois das oficinas de com os participantes. São desenvolvidas

32 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018 Voltar para


o sumário
projetos

PROJETO

Ciências
Cognitivas e
Artes Aplicadas
à Promoção e
Desenvolvimento
de Tecnologias
para Educação
Inclusiva
O QUE É
Oficinas maker de
robótica para alunos
SEM MUROS e capacitação
Alvarenga e Pereira de professores no
fizeram o mundo maker desenvolvimento
entrar a universidade de aulas criativas.
Foto: Divulgação
OBJETIVOS 
Ajudar alunos
habilidades de instrução, avaliação, pla- aprendizagem e comportamento, dislexia com dificuldade
nejamento, criatividade, busca de solução e transtornos diversos. A segunda ação, de aprendizagem
e comportamento
de problemas, apoio na resolução de tare- formar professores da rede pública para
a perceber que, no
fas e construção coletiva. Tudo isso causa desenvolver aulas criativas com recursos ambiente adequado,
impactos positivos na aprendizagem e na alternativos como objetos reutilizáveis, eles são capazes
motivação e aumenta a autoestima. softwares livres e materiais de arte e artesa- de construir robôs
O trabalho de Eduardo, que focava na nato. E, a terceira, oferecer cursos online. e projetos.
robótica educacional desde 2009 (ele é
ONDE 
responsável pelo Núcleo de Robótica e Arte e robótica: tudo a ver
São João del-Rei (MG).
Tecnologias Assistivas – CyRoS), e de Al- Em 2017, depois de conhecerem a expres-
varenga se entrelaçou em uma experiência são aprendizagem criativa em um evento
QUEM PARTICIPA
com alunos com síndrome de Down, cujos em Curitiba, Eduardo e Marco Antônio Estudantes do
pais precisavam de apoio psicológico, em perceberam que já trabalhavam com ele- Ensino Fundamental,
2015. Juntos, escreveram um projeto que mentos da metodologia. Aos poucos, os professores,
propunha três ações. A primeira era abrir laboratórios de extensão, antes focados coordenadores
pedagógicos,
as portas dos espaços maker da UFSJ para na robótica, se tornaram espaços maker.
professores de apoio
alunos atendidos pelo Centro de Referên- Uma oficina de reciclagem de material para a inclusão de
cia em Educação Inclusiva (Cerei) da cida- eletrônico, por exemplo, virou estúdio de alunos com deficiência
de – crianças e jovens com dificuldades de aprendizagem criativa. Parte dos labora- da rede pública local.

33 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


projetos

“Pensamos em atividades que


dialogam com a realidade
dos participantes”,
explica Marco Antônio.

tórios da psicologia também era utiliza- atividade interdisciplinar que lida com
da com os alunos do Cerei. Lá acontece mecânica, eletrônica, programação e ar-
o encontro da universidade com a escola. tes. “O projeto também funciona melhor
Estudantes e bolsistas de várias discipli- se você começar imaginando, aí criar,
nas da UFSJ trabalham com as crianças brincar e compartilhar, para então refle-
que têm dificuldade de aprendizagem e de tir sobre sua criação. Ou seja, se for apli-
comportamento, dislexia e transtornos cada a espiral da criatividade”, diz Marco
diversos nesses espaços, reformulados e Antônio. O brincar é a grande diferença
rebatizados de fablabs e estúdios. “O uso que permeia tudo e torna a atividade lúdi-
da arte suaviza algumas ações da robóti- ca. Já o propósito das oficinas conduzidas
ca”, diz Eduardo. As ideias dele e de Mar- segundo a metodologia da aprendizagem
co Antônio tiveram uma melhora consi- criativa é dar autonomia e empodera-
derável após a participação no DAC Brasil mento para crianças e professores.
2018. “Pensamos em atividades que dia- O objetivo dos fellows com a participa-
logam com a realidade dos participantes. ção no DAC 2018 era expandir suas ações.
Não em processos estruturados. Também “Tudo mudou, desde a nossa postura até a
mudou a percepção de orientador para maneira como organizamos as reuniões.
facilitador. E o enfoque na satisfação dos Os estudantes da engenharia elétrica e da
alunos e diferença entre ideias substitui a psicologia passaram a ser mais ativos na
necessidade de obter produto final defi- construção de oficinas. Reformulamos os
nido”, explica Marco Antônio. espaços para que se tenha acesso aos ma-
A robótica tem os 4 Ps da aprendizagem teriais de forma mais visual e intuitiva”,
criativa. Mas o psicólogo Marco Antônio
questionava um pouco a paixão envolvida Foto: Eduardo Bento Pereira

no projeto, pois é algo que nem todos os


alunos demonstravam. Só que ele desco-
briu, por meio de avaliações de processos
psicológicos, que os participantes das ofi-
cinas desenvolveram uma paixão autênti-
ca pela atividade e descobriram o prazer
de aprender. O P de play também não é
necessariamente presente, já que pode
nem ser divertido se for um ensino dire-
cionado ou em projeto sem uso de apren-
dizagem criativa. Portanto, o aprender
brincando se encaixa dependendo do
NO LUGAR CERTO
tipo de robótica educacional proposto.
Etiquetas nos
A aprendizagem entre pares é algo que materiais que
acontece naturalmente durante as ofici- indicam o uso dão
nas do projeto, até mesmo por ser uma autonomia aos alunos

34 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


projetos

TROCA DE SABERES
Estudantes e bolsistas
da UFSJ trabalham com
alunos da rede pública

Eduardo Bento
Pereira 1
Fotos: 1 e 2 Eduardo Bento Pereira
FORMAÇÃO ACADÊMICA
Graduado em
Engenharia Industrial
Elétrica, mestrado
e doutorado em
Engenharia Eletrônica
e Computação

PAPEL NO PROJETO
Idealizador e 2

responsável pela
parte de robótica
“O enfoque na satisfação dos alunos
e na diferença entre ideias substitui
a necessidade de obter um produto
final definido”, diz Marco Antônio.

conta Eduardo. Etiquetas agora marcam reflexão e sem o lúdico. Foi preciso ver de
ferramentas e materiais: verde pode ser perto que ela funciona e agora estão sen-
usado à vontade, amarelo necessita a ajuda do estudados os elementos que a tornam
4 do coordenador, vermelho tem a ver com eficaz. O olhar da academia e o desejo de
itens que só podem ser usados por adultos aprender mais levou a dupla buscar um
Marco Antônio responsáveis e roxo determina uso em pro- diálogo interdisciplinar que se formali-
Silva jetos específicos. Os espaços maker tam- zou em agosto de 2018, com a criação de
Alvarenga bém têm uma prateleira da sustentabilida- um núcleo para difundir aprendizagem
de, com materiais reciclados e outros para criativa, com pessoas de todas as áreas e
FORMAÇÃO ACADÊMICA reutilização. Isso leva para outra iniciativa de cidades mineiras. O Núcleo Vertentes,
Doutorado em da dupla – criar um programa municipal começou com oito pessoas e deve chegar a
Psicologia
de coleta seletiva, que ainda não é realiza- 20 no primeiro semestre de 2019. “Fo-
da no município de São João del-Rei. mos apresentando os 4 Ps e a espiral da
PAPEL NO PROJETO Eduardo e Marco Antônio repensa- criatividade aos poucos. Abrimos diálogo
Idealizador e
responsável pela parte
ram o projeto durante três meses depois sobre como trabalhar com os elementos
de Psicologia de voltarem do MIT. Consideram que o da aprendizagem criativa estabelecendo
primeiro desafio foi quebrar o paradig- uma formação profissional colaborativa e
ma da aprendizagem mão na massa sem a lúdica”, diz Eduardo.
Fotos: 3 e 4 Divulgação

35 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


projetos

O sabor de receitas
regionais e afetivas
Ao participar de atividades do Mãos na Massa, alunos
exercitam a criatividade e constroem conhecimentos ao
preparar pratos típicos da culinária do Mato Grosso do Sul

SABOR DO FUTURO
Alguns alunos fazem
a disciplina porque
querem seguir carreira

Foto: Géshica Rodrigues

36 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018 Voltar para


o sumário
projetos

Fotos: Ellen Regina Romero Barbosa

NA MEDIDA CERTA
Durante as aulas, são
vistos conteúdos de
Matemática também

P
PROJETO
anelas, talheres, forno, fogão, in-
gredientes culinários, disposição
CADERNO DE SABORES Mãos na Massa:
e vontade de aprender. O cená-
rio é a cozinha da EE Maria Constança,
Algumas tarefas Desbravando
levaram ao estudo do
onde os alunos do Ensino Médio Integral gênero textual receitas a Cozinha da
se encontram uma vez por semana à tarde Escola
para a disciplina eletiva de gastronomia
O QUE É
criada pela professora de Física Ellen Re- Para participar da eletiva, os alunos ti- Atividade semanal
gina Romero Barbosa. São muitas as com- nham de demonstrar interesse por meio na cozinha da escola
petências desenvolvidas com a iniciativa: de uma carta. “Cada um revelou uma abordando um de
conhecimento regional, histórico e lin- motivação: aprender a cozinhar e não ter dois eixos temáticos:
regional ou afetivo.
guístico, pensamento científico, crítico e tempo para isso, seguir carreira na área
criativo, autoconhecimento, autocontrole ou aprender a fazer os quitutes da famí- OBJETIVO
e autocuidado, cooperação, responsabili- lia”, conta Ellen. Conhecer as razões da Fomentar o interesse
dade e cidadania, empatia, autonomia e turma e entender os gostos e preferências dos estudantes
trabalho em equipe. foi essencial para organizar as aulas. Ela pelas quatro áreas
do conhecimento
Para organizar a eletiva, primeiro El- conta que esse hábito foi aprendido com
(Linguagens,
len pesquisou bastante. Descobriu apenas seu mentor na faculdade, que sempre a Ciências da Natureza,
material sobre nutrição ou cultivo de hor- incentivou ir em busca de suas vontades Ciências Humanas e
ta e pouca coisa que relacionasse receitas e paixões. Apesar de ter aberto 20 vagas Matemática) por meio
à Matemática. Então, resolveu pensar por para a eletiva em 2017, a professora não da gastronomia.
si mesma quais as relações do fazer culi- deixou de fora nenhum dos 25 adolescen-
ONDE  
nário com os conteúdos curriculares e as tes interessados. Campo Grande.
competências socioemocionais da Base De certa forma, os 4 Ps da aprendiza-
Nacional Comum Curricular (BNCC). gem criativa fizeram parte do projeto desde QUEM PARTICIPA
Depois, buscou o apoio de colegas – os a concepção. A começar pela paixão, que Estudantes do Ensino
Médio de tempo
primeiros a abraçar a ideia foram as pro- move a iniciativa e incentiva a participação.
integral de escolas
fessora de Biologia e Pedagogia e o pro- O projeto, que antes compunha a estrutu- da capital da rede
fessor de Matemática –, e conversou com a ração da disciplina eletiva, hoje pode-se di- estadual de Mato
coordenação e a direção da escola. zer que está no cerne das criações realizadas Grosso do Sul.

37 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


projetos

TÁ NA MESA
Mais que o produto final,
o importante é o processo
de aprendizagem

Fotos: Ellen Regina Romero Barbosa

pelos alunos, que se organizam em equipes.


Isso já dá margem aos pares, que não se re-
sumem aos estudantes, mas à interação com
professores e pessoas da comunidade, como
familiares, chefs regionais e parceria com
universidades locais que abriram espaço
para acolher a turma, incentivando a car-
reira de gastronomia no futuro. O play, des-
de o começo, embasa a estrutura de apren-
MIL MISTURAS dizagem. “Todas as ações são pensadas para
A cozinha da escola aprender brincando, fazer, experimentar,
é lugar de teste e testar e errar. Além de reconstruir e apren-
experimentações der a lidar com o erro”, diz Ellen.
A professora conta que, certa vez, um es-
tudante quis saber porque a massa de um
“Todas as ações são pensadas colega tinha crescido mais do que a feita por
ele. Com esse viés de curiosidade e inves-
para aprender brincando, tigação, os alunos foram seguindo seu ca-
minho. Isso revela o propósito do projeto.
fazer, experimentar, testar Também vale destacar que os jovens cria-
ram um novo vínculo com a escola. Ao se-
e errar”, diz Ellen. rem questionados sobre o que gostariam de

38 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


projetos

SEM PERDER O PONTO


Temperatura, espessura
e rendimento são
temas de pesquisa

Fotos: Ellen Regina Romero Barbosa

fazer pela instituição, eles começaram um


movimento de valorização das cozinheiras,
que foram chamadas para compartilhar sa-
beres. E uma discussão sobre os valores da
alimentação levou os estudantes a colaborar
QUE DELÍCIA
com as profissionais, preparando o lanche Os jovens são
junto, criando cardápios, expondo o pro- desafiados a variar os
cesso de produção e os custos. Ao expor os sabores dos pratos
dados para os colegas, a ideia foi combater
o desperdício e valorizar as cozinheiras que
Ellen Regina trabalham na escola. berdade de espaço e tempo permitiu que os
Romero Barbosa alunos se dedicassem e soltassem a criativi-
O sabor do desafio dade”, nota Ellen.
FORMAÇÃO ACADÊMICA O fellowship inspirou Ellen a criar mi- Com a bolsa do fellowship, a professora
Licenciatura em Física croprojetos semanais. Por exemplo, ao pôde comprar equipamentos importantes
trabalhar como fazer panquecas, a turma para as criações culinárias – de utensílios
PAPEL NO PROJETO discutiu sobre temperatura, espessura, de cozinha até uma impressora 3D para
Idealizadora,
rendimento e sobre a propriedade an- desenvolvimento de novos instrumentos,
coordenadora-geral
e professora tiaderente das frigideiras. Passadas duas como moldes de biscoitos e fôrmas.
semanas, já conhecendo um pouco sobre A experiência do projeto foi tão intensa
o assunto, as equipes tinham de criar os que Ellen está escrevendo um livro para
projetos de grupo, usar a criatividade para documentá-la e inspirar outros profes-
inventar receitas variando o sabor da mas- sores. Nele, apresenta as receitas feitas,
sa e do recheio. Para isso, tiveram de usar conteúdos das disciplinas, o que deu certo
o gênero textual receita e sua linguagem e e errado durante os processos e o que os
organização própria, além de fazer testes docentes fizeram para ajudar os alunos a
para ver se as ideias davam certo e com- resolver. Na companhia de uma professora
partilhar suas ações com todos. A turma se de Biologia, ela ainda tem planos de mon-
envolveu, foi buscar elementos disponíveis tar um grupo de interessados na rede de
na escola, como as árvores frutíferas, para aprendizagem criativa existente no Mato
acrescentar os frutos às produções. “A li- Grosso do Sul.

39 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


projetos

PONTOS DE VISTA
Quilombolas
fotografam as próprias
comunidades

Foto: Acervo Cecop

Olhar para ver e aprender


Olhares apurados do projeto Fotografia, Memória e Identidade
promovem registros da cultura quilombola no Rio Grande do Norte

U
ma imagem guarda lembranças do segundo ciclo do Ensino Fundamental
e ajuda a valorizar o que passou e a importância da fotografia como registro
projetar o futuro. Dessa maneira se histórico. O projeto desenvolvido por Rai-
constrói, de forma coletiva, a história con- mundo e Talita Barbosa, da ONG Centro
tada de uma comunidade. É em rodas de de Documentação e Comunicação Popular
memórias, em escolas públicas, como as da (CECOP) e da Rede Potiguar de Televisão
comunidade quilombola Agrovila Picada, Educativa e Cultural, é realizado em par-
em Ipanguaçu, a mais de 200 quilômetros ceria com a Secretaria de Estado da Educa-
de Natal, que se apresenta para os alunos ção e da Cultura do estado. Alia educação,

40 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018 Voltar para


o sumário
projetos

O OLHAR DO OUTRO
Costumes e saberes
quilombolas são
registrados em fotos

PROJETO

Fotografia,
Memória e
Identidade
CLIQUES CRIATIVOS
Os alunos da rede O QUE É
pública exploram a Articulando fotografia,
linguagem fotográfica memória e identidade
e o uso das TIC,
Fotos: Acervo CECOP dá ênfase
ao protagonismo
de crianças,
nidade da Agrovila Picada para a temática adolescentes
da memória local usando a fotografia como e jovens de
forma de registro, preservação e difusão do escolas públicas
cotidiano das pessoas e da cidade. e comunidades
Num primeiro momento, o projeto foi quilombolas.
desenvolvido com jovens (alguns deles ex- OBJETIVO
-alunos da escola) e adultos da comunidade. Trabalhar a produção
O trabalho resultou na documentação dos e difusão do
costumes e saberes quilombolas. A segunda conhecimento de
novas tecnologias de informação e comuni- parte aconteceu na única escola pública do forma colaborativa
para incentivar a
cação (TIC) a ações que contribuem para o lugar. Lá, o projeto estimulou práticas ino- formação integral
fortalecimento de organizações populares, vadoras e criativas, organizadas em conjun- e mão na massa dos
como as comunidades quilombolas. “É um to com professores das disciplinas de Artes, participantes e a
processo educativo e cultural. Consegui- Língua Portuguesa, História, Geografia e criação de museus
mos, em 2016, fortalecer a Rede de Pontos Ciências. As crianças do 6o ano trabalha- comunitários.
de Memória e Museus Comunitários do Rio ram com a identidade cultural africana e, ONDE  
Grande do Norte”, conta Raimundo. O Ce- antes de passar à fotografia, fizeram vi- Rio Grande do Norte.
cop também foi reconhecido e premiado em vências de pintura corporal e produção de
2017 pela experiência comunitária do Mu- turbantes. A iniciativa rendeu a exposição QUEM PARTICIPA
seu Nísia Floresta. No projeto enviado ao fotográfica Beleza Negra e Identidade Cultural. Alunos do segundo
ciclo do Ensino
DAC Brasil 2018, Raimundo e Talita apre- “Em paralelo, os jovens da comunidade Fundamental,
sentaram uma metodologia que já haviam foram convidados a registrar os costumes professores de escolas
utilizado com sucesso em outras comuni- e os saberes quilombolas, com câmeras e públicas e membros
dades potiguares. Dessa vez, o intuito era celulares, fazendo valer o ponto de vista de comunidades
sensibilizar e mobilizar a escola e a comu- deles”, conta Raimundo, que é professor e quilombolas.

41 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


projetos

O interesse pela fotografia e terceiro é o trabalho com base na narrativa

pelas redes sociais é o que


das histórias locais para fortalecer a iden-
tidade cultural e os museus comunitários.
determina a paixão para Os 4 Ps da aprendizagem criativa se en-
trelaçam fortemente com a prática dos en-
os jovens aprendizes. contros (que acontecem durante e fora do
horário de aulas). O processo de mobiliza-
ção da comunidade é muito importante no
projeto, pois Raimundo e Talita propõem
fotógrafo. Ele e Talita se reuniam com essa a ideia e socializam com as pessoas para
turma de 30 jovens em encontros quinze- que se torne um projeto coletivo. “Não tem
nais divididos em etapas como definição de como executar algo sem a comunidade se
pautas, formação técnica em fotografia, se- sentir parte, sem levar em conta interesses
leção de imagens, produção de documentos temáticos de cada um dos envolvidos no
e acervos, e também expressão da opinião processo. Todos precisam se sensibilizar
do aluno sobre sua produção de forma oral e se identificar”, diz Talita. Segundo ela,
e escrita. As atividades duraram um semes- a ideia vai se moldando de acordo com as
tre e resultam em uma exposição final sobre preferências das pessoas. O interesse pela
a comunidade qilombola Agrovila Picada. fotografia e pelas redes sociais é o que de-
termina a paixão para os jovens. E o traba-
Mergulho na história lho em equipe, a socialização de vivências,
Os objetivos do projeto Fotografia, Me- a interação dos estudantes e os relatos de
mória e Identidade se desdobram em três. experiência, fortalecem as parcerias.
O primeiro é a mobilização do público O play é bem cuidado durante os en-
(crianças, adolescentes, professores e adul- contros. Fotografia faz parte da realidade
tos da comunidade) para o uso da foto- deles, mas as oficinas acontecem de forma
grafia como ferramenta de pesquisa e de leve e lúdica, a sala se organiza em círculo
conhecimento. O segundo é o desenvolvi- ou em mesas coletivas, acontece a brinca-
mento de processos educativos e culturais deira de separar as fotos. “Não ficamos só
de forma mais inovadora, criativa e praze- na digital, também ampliamos algumas
rosa, sempre estimulando o protagonismo para que se visualize uma sequência de
CENAS DO PASSADO e a atuação para mudar a comunidade. E o imagens”, conta Talita. Dentro desse con-
A identidade cultural texto, ela e Raimundo sempre ressaltam
africana foi um dos
para os estudantes que se pode errar, aper-
focos de pesquisa
feiçoar, entender melhor a intenção e con-

RAZÃO PEDAGÓGICA
Fotografia é ferramenta
de investigação e de
conhecimento
Fotos: Acervo Cecop

42 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


projetos

CENAS DO PRESENTE
Narrativas das histórias
locais fortalecem a
identidade cultural

Raimundo Melo

FORMAÇÃO ACADÊMICA
Graduado em Letras
Fotos: Acervo Cecop
e pós-graduado em
Ciências Sociais
seguir uma foto de acordo com o objetivo, Começamos a espalhar fotos no chão, para
PAPEL NO PROJETO que tudo pode ser melhorado e vale a pena propor outro jeito de iniciar a montagem
Idealizador e
ouvir críticas e contribuir para o trabalho de uma história”, relata Talita. Na meto-
coordenador
dos outros. “Quando sabem que o erro é dologia, procuraram enfatizar a experi-
parte da aprendizagem, e que se busca o mentação e criaram situações para que
processo de aperfeiçoamento, de conheci- os adolescentes se expressassem de forma
mento e de experiência, passam a brincar livre – em linguagem visual, falada ou es-
e a interagir”, diz Raimundo. crita, buscando um desenvolvimento mais
Fazem parte do projeto o acesso a bens integral. Por meio do DAC Brasil, Talita
culturais e TICs, além de um processo e Raimundo, acostumados à exigência de
educativo mais dinâmico, prazeroso e planejamento escolar, perceberam que ele
que faça sentido para os estudantes. “O não precisa ser seguido à risca e vai sendo
próprio processo, quando se constrói, modificado pelas interações dos alunos.
tem o propósito concreto de montar uma Outra consequência da participação no
exposição”, diz Raimundo. Em alguns ca- DAC 2018 foram os festivais de invenção
sos, a comunidade cria espaços de memó- e criatividade (FIC), da Rede Brasileira de
ria. “Na Agrovila Picada será construído Aprendizagem Criativa. “Realizamos dois
Talita Barbosa
um museu com o material das oficinas em menos de seis meses”, conta Raimun-
de Souza
de fotografia e um acervo de objetos do- do. Ele considera que os FIC trazem mais
FORMAÇÃO ACADÊMICA ado pela comunidade”, diz Talita. A ação ações e atores para a aprendizagem criativa
Graduada em Nutrição revela como o projeto acontece de forma e articula iniciativas. De certa forma, tan-
e pós-graduanda colaborativa, nascido na escola e benefi- to os FIC como as exposições – a feita pela
em Nutrição Clínica ciando e valorizando a comunidade. comunidade quilombola Negros do Ria-
Funcional
Depois da visita a Boston, a dupla passou cho foi exposta na Pinacoteca do Estado
a dar mais atenção ao espaço físico, com – são maneiras de sistematizar e socializar
PAPEL NO PROJETO
vistas a criar um ambiente descontraído, a experiência e incentivar a continuidade.
Idealizadora e
coordenadora lúdico e menos formal, que estimule di- O desafio é que as práticas sejam incorpo-
nâmicas. “Colocamos os alunos para con- radas ao cotidiano e cheguem a outras es-
versar entre eles, favorecendo a interação. colas e comunidades.

43 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


resultados

Lembranças cheias
de descobertas e insights
O universo da aprendizagem criativa revela ser
só a ponta do iceberg quando os fellows contam
e refletem sobre tudo o que vivenciaram

A
TURMA CRIATIVA
Os educadores o compartilhar experiências no fellowship, conhecer
brasileiros
repensaram
cases de educação formal e não formal e visitar o Life- Foto: Divulgação / Rede Brasileira
de Aprendizagem Criativa
seus projetos long Kindergarten, os 12 educadores brasileiros vence-
dores de 2018 do Desafio Aprendizagem Criativa Brasil (DAC
Brasil) tomaram mais consciência de suas iniciativas. Também
tiveram chance de revisar conceitos. As conversas com pessoas que
trabalham no MIT Media Lab ainda renderam para que todos se
apropriassem de teorias e exemplos que mostram ser possível fazer
muito com simplicidade e dando autonomia para os aprendizes.

44 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018 Voltar para


o sumário
resultados

“Participar do fellowship deixa claro que o que fazemos tem


potencial para mudar a educação brasileira. Conhecer
outras iniciativas ajudou a ter ideias para resolver problemas que temos. ”
TALITA BARBOSA DE SOUZA,
projeto FOTOGRAFIA, MEMÓRIA E IDENTIDADE

“Fiquei impressionada “Fiquei impressionado É inspirador


com a Acera School, com a ideia do
conhecer
uma escola conforme jardim de infância
o trabalho
os padrões, mas onde para a vida
do Lifelong
as crianças têm inteira, espaço que
Kindergarten,
acesso a tudo precisa ser alimentado
onde tantas
e a informação é e retomado em outras
disponibilizada fases da vida. Vamos
pessoas
e reconstruída de incorporar em nosso
de áreas
distintas
várias formas. ” ”
projeto.
interagem.
ELLEN REGINA RAIMUNDO MELO,
E, mesmo
ROMERO BARBOSA, projeto FOTOGRAFIA,
projeto MÃOS NA MASSA MEMÓRIA E IDENTIDADE
já tendo o
costume de
reciclar coisas
eletrônicas,
“Como resultado do fellowship, aprovamos fiquei
dois projetos de extensão para 2019-2020 impressionado
que envolvem aprendizagem criativa. Um deles vai com a
trabalhar com criatividade e aprendizagem inclusiva magnitude
para estudantes com diagnóstico de transtornos desse hábito lá.”
neurodesenvolvimentais. ” EDUARDO
MARCO ANTÔNIO SILVA ALVARENGA, BENTO PEREIRA,
projeto CIÊNCIAS COGNITIVAS projeto CIÊNCIAS
COGNITIVAS

45 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


resultados

“Ferramentas e materiais que podem ser


acessados com facilidade dão autonomia
e estabelecem uma relação de confiança e de
Eu costumava
responsabilidade com os participantes.
pensar e planejar
muito antes de
Em Curitiba, orientei as professoras a fazer o mesmo. ”
executar THAIS EASTWOOD VAINE,
projeto FARÓIS DO SABER E INOVAÇÃO
e entendi que
muitas soluções
e criações
surgem durante “Um de meus ganhos foi a formalização
o fazer. do projeto, que em nenhum momento seguiu
Perdi o medo o caminho tradicional e acadêmico, e
de começar: a definição de objetivos. ”
agora faço, FERNANDO DAGUANNO,
experimento. projeto ALQUIMÉTRICOS
Sem a pretensão
de que fique
perfeito. ” “Ao encontrar um grupo de pessoas que pensa
como eu, ganhei forças para afirmar minha
SEBASTIÃO BORGES
FONSECA,
linha de atuação, a aprendizagem criativa. ”
projeto AÇÃO GISLAINE BATISTA MUNHOZ,
PARCEIROS projeto ESCOLA DE AVENTUREIROS

“A vivência no Media Lab e visitas a ONGs e espaços educativos


em Boston me deixaram ainda mais incomodado com o isolamento
das escolas no Brasil. Há formas diferentes e possíveis de atuar
e que permitem mais colaboração entre as instituições.
Quero buscar parcerias com universidades para quebrar
barreiras entre o Ensino Médio e as graduações.”
IURI OLIVEIRA RUBIM,
projeto A APRENDIZAGEM CRIATIVA NA REDE DOS CJCC

46 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


resultados

MÃO NA MASSA
Os fellows enfrentaram
desafios de
aprendizagem criativa

Foto: Divulgação / Rede Brasileira de Aprendizagem Criativa

“Foi inspirador conhecer o


“O fellowship foi quase trabalho de um educador dos
uma incubadora: tivemos Estados Unidos, Mel King, com
insights sobre questões alunos líderes comunitários.
como sustentabilidade e Eles recebem formação
ampliação do alcance das na área de tecnologia,
nossas ações. O maior resultado depois desenvolvem e
pode ser visto em nosso novo realizam um projeto
espaço. Tudo está de acordo com de intervenção na
o que vimos e aprendemos. ” comunidade.”
RAIMUNDO DAS GRAÇAS ELMARA PEREIRA DE SOUZA,
LIMA XAVIER, projeto A APRENDIZAGEM
projeto AÇÃO PARCEIROS CRIATIVA NA REDE
DOS CJCC

47 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


conclusões

É hora de buscar
novos horizontes
Bastante trabalho para os fellows de 2018 e para a turma
do Desafio Aprendizagem Criativa Brasil 2019

M
uito aconteceu com os educadores do DAC 2018 Valente, coordenadora do Desafio Aprendizagem Criativa
desde que se reuniram pela primeira vez em São Brasil, logo no início é fundamental que os fellows com-
Paulo, no início do ano. Dúvidas pairavam no ar, preendam que todos os projetos estão em andamento e pre-
e a responsabilidade e o peso de ser um fellow do MIT eram cisam ser repensados para melhorar. “Eles continuam em
grandes. Com o passar do tempo, o grupo estreitou laços e evolução, a troca de ideias é preciosa”, explica. “Ao mesmo
aprendeu que, independentemente do contexto de cada par- tempo os fellows refletem sobre isso e caminham fazendo
ticipante, todos tinham muito a aprender uns com os outros mudanças e aprimoramentos, contribuem com a equipe que
e os projetos desenvolvidos. “O fellowship é um momento organiza o DAC. Eles abrem fronteiras sobre o que é apren-
rico para o amadurecimento das propostas selecionadas dizagem criativa, já que cada um vem de um lugar, apresenta
no DAC e para descobrir mais a fundo o que é aprendiza- uma realidade, um contexto diferente, vivido por uma po-
gem criativa, como ela pode ser usada para trabalhar com pulação ímpar”, ressalta Ann.
os alunos”, diz Leo Burd, diretor do Programa Lemann A generosidade e a coragem dos fellows em compartilhar
de Aprendizagem Criativa do MIT. Segundo Ann Berger experiências em transformação é fundamental para disse-

IDEIAS COLORIDAS
Em mais de 100 post-its,
os fellows registraram
o que aprenderam
durante o fellowship

Foto: Sebastião Borges

48 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018 Voltar para


o sumário
conclusões

minar a abordagem da apren-


dizagem criativa no Brasil e co-
nectar pessoas. “Precisamos de
um grande salto no país para a
aprendizagem criativa se tornar
prática comum. Atualmente, é
encarada como algo especial e
nossa ambição é que as pessoas
cheguem às escolas e encon-
trem a abordagem incorporada
ao dia a dia”, explica Leo. Por
causa da implementação da
Base Nacional Comum Curri- A TURMA DE 2019
cular (BNCC), esse é um mo- No primeiro encontro,
mento fértil para engajar mais os fellows ficam por
dentro do fellowship
educadores nessa perspectiva de
trabalho. “Conteúdos e prática Foto: Iuri Oliveira Rubim
estão sendo repensados. E os

O que vem pela frente


fellows revelam um pouquinho do que é possível fazer para
mudar o jeito de ensinar e de aprender, deixando crianças e
jovens mais livres para experimentar, fazer, refazer e refle-
tir”, conta Leo. Para a quarta edição do DAC Brasil, foram inscritas 326
Diversos momentos durante o fellowship proporcionaram propostas e 51 foram escolhidas para a fase final, sendo sete
reflexões e a busca por horizontes. Depois das visitas a NuVu, delas selecionadas para o Creative Learning Fellowship.
Acera e Parts and Crafts and South End Technology Center, Como resultado, 11 educadores brasileiros foram esco-
todos tiveram a tarefa de sistematizar observações e discutir lhidos para serem os fellows do DAC 2019. As propostas
impressões em relação a uso do espaço físico, entre explora- passaram pelo crivo de 31 avaliadores além da equipe do
ção livre e sistematização curricular, papel da avaliação, ma- MIT Media Lab e da Fundação Lemann. Critérios como
teriais de apoio e formação de professores/agentes, sustenta- diversidade geográfica, relevância, viabilidade, inovação
bilidade e escalabilidade da organização e uso da tecnologia. e, evidentemente, alinhamento com a aprendizagem cria-
Tudo foi anotado em post-its coloridos e apresentado ao gru- tiva foram tomados como base. Vamos conhecê-los?
po para debate, em resposta à seguinte provocação: “Cerca de
dois meses depois, olhando para todos as observações, como • MINHA ESCOLA CRIATIVA – Carla Priscila Antunes
elas relacionam com a implementação atual dos projetos?”. dos Santos, Amapá
Com o fim da edição de 2018, inevitável refletir sobre sua • MAKERSPACE ITINERANTE: INSPIRAR, CRIAR, RECRIAR,
missão no Brasil. Segundo Leo, é um programa de formação INOVAR E COMPARTILHAR – Sandreliza Pereira Mota
profundo e de qualidade, mas ainda contempla pouca gente. e Silvia Fernanda Gonçalves Serra, Maranhão
Para ele, uma das maiores tarefas é encontrar mecanismos • FAÇAMOS NÓS MESMOS – Soraya Lacerda
para compartilhar e disseminar os conhecimentos produzi- e Daniela Lyra, Distrito Federal
dos e as práticas com mais pessoas. “Esse material, que reúne • APRENDER FAZENDO PROGRAMAÇÃO E ROBÓTICA –
as experiências da turma de fellows 2018, é um convite para Thiago Ferreira da Silva e Alberto Henrique Ferreira
que os leitores coloquem as ideias apresentadas em ação, im- Cunha, Minas Gerais
plementem as práticas de um jeito que faz sentido para o seu • IMPRENSA JOVEM - AGÊNCIAS DE NOTÍCIAS NA
contexto, fazendo um remix das iniciativas. Assim, um nú- ESCOLA –Carlos Alberto Mendes de Lima, São Paulo
mero cada vez maior de crianças e jovens poderão vivenciar • ROBÓTICA COM SUCATA, PROMOVENDO
a aprendizagem criativa”, diz ele. Para ir mais fundo nesse A SUSTENTABILIDADE - Débora Dias Garofalo, São Paulo
universo, também fica o convite para que você, leitor, par- • CLUBES DE COMPUTAÇÃO CRIATIVA – CULTURA, ARTE,
ticipe da Rede Brasileira de Aprendizagem Criativa. Há nú- TECNOLOGIA E INOVAÇÃO – Tiago Thompsen Primo
cleos regionais espalhados por todo o Brasil. e Kelen Silveira Bernardi, Rio Grande do Sul

49 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018


leituras
recomendadas

Quer saber mais?


Quatro indicações para entender com mais
profundidade o universo da aprendizagem criativa
e ficar por dentro das novidades da área

www.media.mit.edu/projects/
creative-learning-in-brazil/ www.aprendizagemcriativa.org learn.media.mit.edu/lcl/

Página da Aprendizagem Criativa Site da Rede Brasileira de Curso online Aprendendo


no Brasil hospedada no site do MIT Aprendizagem Criativa. O internauta Aprendizagem Criativa
Media Lab. Apresenta em detalhes pode participar de um fórum organizado por pesquisadores
o Programa Lemann de sobre o tema e conhecer escolas do Lifelong Kindergarten Group,
Aprendizagem Criativa, parceria públicas e fundações, entre outras, do MIT Media Lab. Com vídeos
da Fundação Lemann com o MIT que participam da rede. Tem uma e um fórum sobre o tema.
Media Lab. Consulta obrigatória para biblioteca com referências brasileiras Durante seis semanas, o aprendiz
educadores de escolas públicas e de e estrangeiras sobre aprendizagem desvenda algumas das ideias e
espaços de educação não formal criativa e permite trocas de princípios que fundamentam a
que querem concorrer a uma vaga experiências e participação nos aprendizagem criativa e trabalha
na Creative Learning Fellowship. núcleos regionais e grupos de em projetos pessoais.
Em português. trabalho da rede. Em português. Em português.

Lifelong Kindergarten: Cultivating Creativity Through Projects,


Passion, Peers, and Play (Ed. MIT Press)
O livro é de autoria de Mitchel Resnick, professor do MIT Media Lab e
expert em tecnologias educacionais. Ele convida os leitores a refletir
sobre a importância do pensamento criativo nos dias de hoje e o tanto
de contribuições que o jardim de infância pode dar para o restante da
escolaridade. Isso porque Mitchel defende que os alunos devem imaginar,
criar, brincar, compartilhar e refletir mais, tal como fazem os pequenos no
início da vida escolar. Enfatiza, ainda, a importância da aprendizagem
entre pares formando uma comunidade de aprendizes. Na obra, são
apresentadas novas tecnologias e estratégias para envolver a escola e
os espaços de educação não formais no mundo de experiências criativas
de aprendizado. Em inglês.

50 | Aprendizagem Criativa na Prática | DAC Brasil 2018 Voltar para


o sumário
ABAC – Associação Brasileira de
Aprendizagem Criativa. Aprendizagem
Criativa na Prática: A Experiência do
Desafio de Aprendizagem Criativa Brasil
2018. São Paulo, 2019. Disponível em
http://aprendizagemcriativa.org/dac2018
Acesso em: 29 jan. 2019.

ABRIL 2019
Aprendizagem
criativa
NA PRÁTICA

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