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Tratamento

não cirúrgico da
Obesidade do Adulto
RECOMENDAÇÕES DA SOCIEDADE PORTUGUESA
PARA O ESTUDO DA OBESIDADE (SPEO)

2018
TRATAMENTO
NÃO CIRÚRGICO DA
OBESIDADE DO
ADULTO

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ÍNDICE

PREFÁCIO 7

INTRODUÇÃO 11

CAPÍTULO I
EPIDEMIOLOGIA DA OBESIDADE: CONTEXTUALIZAÇÃO DE
ALGUNS INDICADORES PARA PORTUGAL 13

CAPÍTULO II
COMO DIAGNOSTICAR? 21
CAPÍTULO III
AVALIAÇÃO ANTROPOMÉTRICA E DA COMPOSIÇÃO CORPORAL 27
CAPÍTULO IV
REGULAÇÃO DO BALANÇO ENERGÉTICO E DETERMINAÇÃO DA
ALTERAÇÃO PONDERAL 43
CAPÍTULO V
ABORDAGEM PSICOLÓGICA E PSIQUIÁTRICA 49
CAPÍTULO VI
ABORDAGEM NUTRICIONAL 81
CAPÍTULO VII
ABORDAGEM DA ATIVIDADE FÍSICA, DO COMPORTAMENTO
SEDENTÁRIO E DO SONO 105
CAPÍTULO VIII
TRATAMENTO FARMACOLÓGIO DO EXCESSO DE PESO E
OBESIDADE 153

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PREFÁCIO

A Organização Mundial de Saúde (OMS) definiu a obesidade como uma doença em que
o excesso de gordura corporal acumulada pode atingir graus capazes de afectar a saúde.
O facto de a obesidade ter enorme prevalência, que tem vindo a aumentar ao longo dos
anos, levou a OMS a considerá-la uma doença crónica e a epidemia global do Século
XXI.

A obesidade é considerada, neste século, depois do tabagismo, a segunda causa de


morte de possível prevenção. A abordagem mais importante na luta contra a obesidade
é a prevenção.

Em 2005, por despacho ministerial, nasce o Programa Nacional de Luta Contra a


Obesidade, da Direcção Geral da Saúde (DGS). Os membros escolhidos para trabalhar
nesse Programa publicaram um documento, o Programa Nacional de Combate à
Obesidade, com um conjunto de estratégias para a prevenção da obesidade. Esse texto
foi mais tarde traduzido para inglês. Infelizmente das estratégias reveladas no Programa
poucas foram implementadas.

No combate contra a obesidade a Sociedade Portuguesa para o Estudo da Obesidade


(SPEO) publicou dois consensos intitulados “Obesidade e sua Terapêutica” (1995-2001)
e, posteriormente, um livro baseado nas conclusões da Conferência de Consenso
organizada por peritos da SPEO, com o título “Obesidade – Prevenção e Terapêutica”
(2006-2008), destinado ao grande público.

Passados todos estes anos desde o último relatório (2008) achou a SPEO ser importante
editar um manual de Recomendações - “Tratamento não Cirúrgico da Obesidade do
Adulto “(2018). São bem-vindas estas Recomendações pois muitos capítulos dos
anteriores textos estavam desactualizados.

O capítulo “Epidemiologia” (de Andreia Oliveira) discute o aumento da prevalência


e incidência da obesidade e pré-obesidade na população portuguesa, em homens e
mulheres, de todas as faixas etárias.

No capítulo “Como Diagnosticar?” (de Carolina Moreno e Dircea Rodrigues) são dadas
algumas luzes sobre o diagnóstico e as comorbilidades ligadas à obesidade.

A “Avaliação Antropométrica e da Medição da Composição Corporal” (de Analiza Silva et.


al) discute e documenta processos de avaliação antropométrica e os diferentes métodos

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de avaliação da composição corporal, importante no diagnóstico e monotorização da
obesidade.

Nos últimos capítulos aborda-se quatro importantes intervenções na terapêutica da


obesidade e pré-obesidade nas vertentes– nutrição, psicologia, actividade física e
terapêutica farmacológica.

O capítulo “Abordagem Psicológica e Psiquiátrica” (de Eva Conceição et al.) trata do


diagnóstico e da intervenção psicológica e tratamento psiquiátrico do doente obeso.
Termina com um resumo das recomendações da abordagem do tratamento do sujeito
obeso.

No que se refere à “ Abordagem Nutricional” (de Carla Pedrosa et al.) são discutidos
os vários tipos de dieta: dieta equilibrada, dieta de baixo valor energético, dieta de
muito baixo valor energético e o grupo das “dietas da moda”. É feita uma avaliação e
comparação entre todas.

No capítulo da “Abordagem da Actividade Física, do Comportamento Sedentário e do


Sono (de Sandra S. Martins et al.) comprova-se cada vez mais o importante papel da
actividade física no tratamento do doente obeso: na perda de peso, na manutenção da
perda de peso e no aumento da massa muscular. A avaliação da aptidão à actividade
física que analisa o comportamento sedentário, o sono, a motivação para a prática de
actividade física e a qualidade de vida, é revista em pormenor.

O último texto trata do “Tratamento Farmacológico do Excesso de Peso e da Obesidade”


(de Selma B. Souto et al.) de uma maneira muito clara e actualizada. São descritos todos
os fármacos importantes no tratamento do doente obeso. Os diversos fármacos são
apresentados em 3 grupos, permitindo saber se existem ou não em Portugal, sendo de
grande ajuda para a prática clínica: 1. fármacos disponíveis em Portugal; 2. fármacos
aprovados pela EMA e/ou FDA e não disponíveis em Portugal; 3. outros fármacos
associados a perda ponderal disponíveis em Portugal e não aprovados para o tratamento
da obesidade.

A publicação destas recomendações da SPEO – 2018 é de saudar pois vem substituir os


antigos consensos e será de grande utilidade no tratamento não cirúrgico da obesidade
do adulto.

Na sequência deste livro permitam-me que proponha que o próximo documento


produzido pela SPEO seja sobre Prevenção da Obesidade e Pré-obesidade da criança,
adolescente e adulto.

A.Galvão-Teles
5-11-2018

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INTRODUÇÃO

A Obesidade é uma doença crónica, complexa e multifatorial, com impacto elevado na


morbilidade, mortalidade, qualidade de vida e económicos A obesidade é, sem qualquer
dúvida, o distúrbio nutricional major da sociedade ocidental e também da sociedade
Portuguesa.

De acordo com o Inquérito Alimentar Nacional e de Atividade Física, que recolheu


informação entre 2015-2016 para todos os segmentos etários da população Portuguesa
não institucionalizada (dos 3 meses aos 84 anos de idade), incluindo as Regiões
Autónomas, aproximadamente 6 em cada 10 Portugueses apresentam obesidade ou
pré-obesidade. De acordo com estes dados, estima-se que a prevalência de obesidade
generalizada em Portugal seja de 22,3% e a prevalência de pré-obesidade é de 34,8%.
Face a este enorme problema, foi objetivo desta Direção da Sociedade Portuguesa
para o Estudo da Obesidade (SPEO) promover a discussão entre os vários profissionais
de saúde que devem integrar a equipa multidisciplinar para o tratamento médico da
obesidade. Assim, este documento pretende apresentar uma breve revisão atualizada
sobre dados epidemiológicos da obesidade em Portugal e sobre a abordagem acerca do
diagnóstico e tratamento da obesidade nas vertentes da Nutrição, Psicologia, Atividade
Física e Médica, com destaque para o tratamento farmacológico da obesidade.

Numa era onde a informação e desinformação estão ao alcance de um clique, onde


abundam a pseudociência e os pseudotratamentos, sentimos necessidade de elaborar
este documento para fornecer aos colegas das várias áreas de conhecimento no
tratamento da obesidade, conteúdos científicos baseados na melhor e na mais recente
evidência científica acerca da abordagem integrada desta patologia.

O nosso objetivo é disponibilizar conhecimento atualizado a todos os profissionais


de saúde e fornecer-lhes um instrumento que permita levar a cabo a árdua tarefa de
tratamento da obesidade. Desejamos que as informações que se seguem nos ajudem a
todos a alcançar o sucesso!

Pela Direção da SPEO, a presidente, Paula Freitas

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CAPÍTULO I

EPIDEMIOLOGIA
DA OBESIDADE:
CONTEXTUALIZAÇÃO DE
ALGUNS INDICADORES
PARA PORTUGAL

12 13
EPIDEMIOLOGIA DA OBESIDADE: entre 2008 e 2016, verificou-se uma redução de 7,2% (37,9% para 30,7%) e 3,6% (15,3%
para 11,7%) nas respetivas prevalências em crianças desta faixa etária específica [3].
CONTEXTUALIZAÇÃO DE ALGUNS As mulheres apresentam-se com uma maior prevalência de obesidade, enquanto os homens
INDICADORES PARA PORTUGAL têm prevalências de pré-obesidade mais elevadas. A associação inversa, já reconhecida na
literatura, entre obesidade e estatuto socioeconómico foi corroborada por ambos os estudos
[1, 2] e um deles concluiu maiores prevalências nos indivíduos casados [2]. Um dos resultados
interessantes é que apesar de existirem algumas disparidades nas prevalências de obesidade
Andreia Oliveira* por região (7 NUTS II), estas não se mostraram significativamente relevantes [1], pelo que
EPIUnit – Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto uma estratégia nacional (contudo, salvaguardando as particularidades de cada região) deverá
Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, Departamento de Ciências da Saúde Pública e ser adotada.
Forenses e Educação Médica, Unidade de Epidemiologia
Estes Inquéritos produziram igualmente estimativas de obesidade central na população
adulta. Com base nos dados do IAN-AF [1], aproximadamente 50% da população com 18 ou
O conhecimento da prevalência e incidência de obesidade e fatores associados permite a mais anos apresenta um risco muito aumentado de obesidade abdominal (razão perímetro
quantificação da magnitude deste problema de Saúde Pública, reconhecido a nível mundial, cintura-anca ≥0,85 nas mulheres e ≥0,90 nos homens). Esta prevalência é muito superior
bem como a identificação de potenciais grupos de risco. Recentemente, dois Inquéritos de nos homens (62,0% vs. 39,2%) e aumenta drasticamente se considerarmos apenas os
representatividade nacional produziram estimativas de prevalência de obesidade para a indivíduos a partir dos 65 anos (80,2%, IC 95%: 75,7-84,6). A região Norte (47,9%) e a Área
população Portuguesa [1, 2]. De acordo com o Inquérito Alimentar Nacional e de Atividade Metropolitana de Lisboa (45,5%) são as que apresentam prevalências padronizadas para
Física (IAN-AF), que recolheu informação entre 2015-2016 para todos os segmentos etários sexo e idade abaixo da estimativa nacional. Segundo os dados do INSEF, publicados em
da população Portuguesa não institucionalizada (dos 3 meses aos 84 anos de idade), incluindo relatório sumário de resultados [4] e usando o mesmo critério de classificação de obesidade
as Regiões Autónomas, aproximadamente 6 em cada 10 Portugueses são obesos ou pré- abdominal, as prevalências são ligeiramente superiores: 65,2% a nível nacional; 55,3% nas
obesos. A prevalência de obesidade generalizada é de 22,3% (intervalo de confiança a 95% mulheres e 76,2% nos homens; 88,1% nos indivíduos dos 65-74 anos.
(IC 95%): 20,5-24,0) e a prevalência de pré-obesidade é de 34,8% (IC 95%: 34,6-42,1) [1]. A
elevada magnitude da prevalência de obesidade é concordante com a informação recolhida Embora estes sejam os estudos mais recentes de prevalência de obesidade para Portugal,
no 1º Inquérito Nacional de Saúde com Exame Físico (INSEF), que estimou para o mesmo outros, de reconhecido mérito, têm mostrado ao longo do tempo que estas prevalências
horizonte temporal (ano de 2015) que 28,6% (IC 95%: 26,7-30,6) dos adultos com idades dos são particularmente altas no nosso país. Serão de realçar os trabalhos pioneiros de
25 aos 74 anos apresentam obesidade e 39,1% (IC 95%: 37,0-41,2) pré-obesidade [2]. Ambos representatividade nacional da Professora Isabel do Carmo [5, 6], que estimou numa amostra
os Inquéritos baseiam-se em medidas objetivas de peso e estatura medidos por observadores de adultos dos 18 aos 64 anos, residentes em Portugal, avaliada entre 2003 e 2005, que 14,2%
treinados e definem estas prevalências utilizando o critério de classificação da Organização dos indivíduos apresentavam obesidade e 39,4% pré-obesidade (critério de classificação da
Mundial de Saúde (OMS). OMS, com base em medidas objetivas) [5], e que esta prevalência conjunta (53,6%) aumentou
desde a 1ª avaliação datada de 1995-1998 [7], na qual se estimou uma prevalência de
Estes Inquéritos recentes identificam os idosos a partir dos 65 anos de idade como o segmento sobrecarga ponderal (pré-obesidade e obesidade) de 49,6%. Em 2009, um estudo transversal
etário da população com maior prevalência de obesidade e pré-obesidade, alcançando 80% numa amostra representativa de adultos Portugueses dos 18-93 anos, estimou-se ainda que
da população [1, 2]. É de facto notório o aumento das estimativas ao longo da vida, no entanto 10,8% apresentavam obesidade e 40,0% pré-obesidade [8]. Em 2012, um outro trabalho do
a realidade é já alarmante na população infantil, estimando-se que 25,0% das crianças (<10 Professor Luís Sardinha numa amostra com 18 ou mais anos de idade, representativa de
anos) e 32,3% dos adolescentes (10-17 anos) Portugueses já possuem critérios de obesidade Portugal Continental [9], estimou prevalências de pré-obesidade e de obesidade (ajustadas
ou pré-obesidade, a maioria pré-obesidade (17,3% e 23,6% respetivamente para crianças e para a escolaridade) de 66,6% nos homens e 57,9% nas mulheres dos 18-64 anos. Nos
adolescentes) [1], o que reforça a necessidade de implementação de estratégias de prevenção indivíduos mais velhos (+65 anos), as prevalências foram ainda mais elevadas: 70,4% nos
primária de obesidade em fases precoces da vida. O estudo COSI (WHO European Childhood homens e 74,7% nas mulheres.
Obesity Surveillance Initiative), tem vindo a monitorizar a evolução da obesidade infantil em
crianças dos 6 aos 8 anos de idade em Portugal e na Europa, e tem reportado que nos Importa referir a importância das estimativas procedentes dos vários Inquéritos Nacionais de
últimos anos, Portugal tem vindo a mostrar uma tendência invertida nas prevalências de pré- Saúde [10-13], que embora baseadas em informação auto-reportada, pelo que inevitavelmente
obesidade e obesidade infantil [3]. De acordo com os mais recentes dados do COSI Portugal, produz uma subestimativa do índice de massa corporal, forneceram durante a década de

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90 importante informação para o nosso país, nomeadamente sobre tendências temporais pessoas afetadas. O custo indireto estimado foi de 199,8 milhões de euros (58,4% devido à
[14]. Também uma revisão sistemática incluindo estudos publicados entre 1995-2005 com mortalidade e 41,6% devido à morbilidade, essencialmente devido a absentismo laboral). O
parâmetros de peso e estatura medidos na população Portuguesa concluiu que a prevalência estudo concluiu que os custos indiretos da obesidade representam 40,2% do total dos custos.
de obesidade e pré-obesidade aumentou consideravelmente em Portugal nestes 10 anos, Com base num estudo prévio dos mesmos autores [24], que estimou que 3,5% dos gastos
especialmente nas mulheres e nos indivíduos mais jovens [15]. Esta informação é transversal totais em saúde em 1999 eram relativos à obesidade, estimou-se ainda que os custos diretos
a várias populações do mundo; uma análise sistemática das prevalências de obesidade e da obesidade, isto é estimados diretamente através das despesas reais, representariam 59,8%
pré-obesidade concluiu que estas têm vindo a aumentar a nível mundial desde 1980 a 2013 e do total de custos em 2002, repartidos por custos em ambulatório (16,6%), internamentos
reforça a importância da monitorização da obesidade infantil [16]. (17,5%) e medicamentos (25,8%). Ressalva-se que despesas com a prevenção, formação
e investimento em saúde não tiveram contributo relevante. Os mesmos autores reportaram
Alguns estudos em Portugal, com o apoio da OMS-Europa, têm avaliado a prevalência de que os custos diretos com a obesidade, na componente internamento para o ano de 2008
obesidade infantil a nível nacional, nomeadamente realizando estimativas transversais ao foram de 85,9 milhões de euros, o que corresponde a 0,92% da despesa total em saúde e
longo do tempo, como o estudo COSI, já referido anteriormente, que pretende criar uma rede que o impacto económico relativo ao internamento da obesidade diminuiu em Portugal [25].
sistemática de recolha, análise, interpretação e divulgação de informação descritiva sobre Dados mais recentes serão importantes para reposicionar a obesidade como fonte de gastos
as características do estado nutricional infantil de crianças em idade escolar do 1º Ciclo do importantes em saúde.
Ensino Básico e comparar estes indicadores com outros países Europeus [17, 18] e que
atualmente já concluiu a 4ª ronda, e o estudo HBSC (Health Behavior in School-aged children) A obesidade representa um importante fator de risco para a carga global de doença. Em
em adolescentes [19, 20], embora este último usando informação auto-reportada. Também Portugal, no ano de 2016, a obesidade posiciona-se como o 6º fator de risco para mortalidade
um outro estudo, de representatividade nacional, publicado em 2008 incluindo adolescentes total e o 5º fator responsável por mais anos totais de vida saudável perdidos (DALYs) (11,5%),
dos 10-18 anos estimou que 23,1% das raparigas e 20,4% dos rapazes têm pré-obesidade precedido apenas pelo uso de álcool e drogas (11%), os hábitos alimentares inadequados
e 9,6% e 10,3% obesidade, respetivamente [21], estimativas que vão de encontro às mais (10%), a hipertensão arterial (10,0%) e o tabagismo (9%) [26].
recentes publicadas no âmbito do IAN-AF [1]. Vários outros trabalhos estimam a prevalência
de obesidade infantil, contudo sem representatividade nacional ou para segmentos etários A Direção-Geral da Saúde, com base em informação do Instituto Nacional de Estatística
muito específicos. (INE) descreve alguns indicadores de mortalidade relativos a obesidade e outras formas de
hiperalimentação para Portugal Continental, concluindo um aumento do número de óbitos
Embora haja alguns estudos que avaliam segmentos da população Portuguesa em diferentes entre 2009 (153 óbitos - códigos da CID 10: E65-E68) e 2013 (210 óbitos), bem como das
períodos de tempo, estes não permitem contudo o cálculo da incidência de obesidade, para o taxas de mortalidade [27].
qual seria necessário ter informação longitudinal sobre o número de novos casos-ano, como
a existente em estudos de coorte. Na coorte EPIPorto, estimou-se a incidência de obesidade Segundo a mesma fonte [27], os padrões de morbilidade relativos a “Peso a mais e
em adultos residentes na cidade do Porto entre duas avaliações 1999–2003 e 2005–2008 [22] Obesidade” indicam para Portugal Continental, entre 2010 e 2014, uma redução do número
e concluiu-se que a obesidade desenvolve-se rapidamente, particularmente nas mulheres de dias de internamento (de 12 762 para 10 937), mas um aumento do número de utentes
(taxa de incidência ajustada para a idade (TI) 1,70 por 100 pessoas-ano, IC95%: 1,34–2,19 que permaneceram no internamento por período inferior a um dia (day cases: 105 para 163)
nas mulheres e TI=1,08, IC95%: 0,73–1,64 nos homens), e especialmente a obesidade e dos casos de ambulatório (de 29 para 33). No caso da morbilidade relativa a “Adiposidade
central (calculada com base no perímetro da cintura >88cm nas mulheres e >102cm nos localizada” ocorreu uma diminuição do número de dias de internamento e aumento dos
homens) (TI=5,97, IC95%: 5,09–7,03 e TI=2,38, IC95%: 1,81–3,20 para mulheres e homens, day cases, sendo as estimativas de magnitude inferior às reportadas para Obesidade
respetivamente) [22]. (generalizada), exceto no que concerne à redução do número de casos de ambulatório, que
são em número absoluto, o dobro dos de Obesidade (60 vs. 33 para o ano de 2014).
Dada a elevada prevalência e incidência da obesidade, este é um problema de Saúde Pública
com impacto económico considerável. Os obesos têm um risco aumentado de desenvolvimento Todos estes indicadores imprimem à Obesidade uma relevância inquestionável a nível de
de outras doenças e de mortalidade prematura devido a co-morbilidades associadas como a saúde pública e saúde individual. A implementação de estratégias que previnam ou reduzam
diabetes mellitus, a hipertensão arterial e o acidente vascular cerebral. Em 2002, um estudo a incidência e prevalência de obesidade em Portugal, e que desta forma reduzam os custos
avaliou o custo económico indireto associado à obesidade em Portugal (isto é, através de diretos e indiretos da patologia na economia da sociedade e promovam a redução dos
estimativas de produção perdida) [23], tendo para isso calculado as proporções de doença padrões de mortalidade e morbilidade do país, bem como a sustentabilidade do Sistema de
e morte prematura atribuíveis à obesidade na população dos 15-65 anos e multiplicado as Saúde, deve ser prioritária.
estimativas populacionais encontradas pelo valor da produtividade económica potencial das

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Referências bibliográficas 17. Rito A, Wijnhoven TM, Rutter H, Carvalho MA, Paixao E, Ramos C et al. Prevalence of obesity
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obesity in Portugal (1995-2005): a systematic review. Public Health Nutr 2012; 15(6): 972-81.
*Andreia Oliveira (ORCID ID: 0000-0002-6714-5939) é financiada pelo Contrato-Programa Investigador FCT
16. Ng M, Fleming T, Robinson M, Thomson B, Graetz N, Margono C et al. Global, regional, and IF/01350/2015, com Fundos FEDER através do Programa Operacional Competitividade e Internacionalização
national prevalence of overweight and obesity in children and adults during 1980-2013: a systematic e Fundos Nacionais através da FCT - Fundação para a Ciência e a Tecnologia, cofinanciado pelo Programa
analysis for the Global Burden of Disease Study 2013. Lancet 2014; 384(9945): 766-81. Operacional Potencial Humano (POPH/FSE).
Email de contacto: acmatos@med.up.pt

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CAPÍTULO II

COMO
DIAGNOSTICAR?

20 21
COMO DIAGNOSTICAR? vez que nestes casos a obesidade será apenas mais um sinal clínico de baixo valor preditivo
positivo, a acrescentar aos estigmas da respetiva endocrinopatia. O rastreio bioquímico com
doseamentos hormonais estará indicado apenas em doentes que apresentem um quadro
clínico altamente suspeito.

Carolina Moreno A obesidade é uma doença que constitui um fator de risco importante para outras comorbilidades
Serviço de Endocrinologia do Centro Hospitalar Universitário de Coimbra; Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra
que reduzem a qualidade de vida e aumentam a morbimortalidade [11] tais como:

Dircea Rodrigues
Comorbilidades associadas a obesidade
Serviço de Endocrinologia do Centro Hospitalar Universitário de Coimbra; Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra
Síndrome Metabólica
Doenças metabólicas e
Diabetes mellitus tipo 2
endócrinas
Dislipidemia
Hipertensão arterial
DIAGNÓSTICO
Doença cardiovascular Doença coronária isquémica
Na maior parte dos casos, pode considerar-se a obesidade como uma doença multifatorial, que Doença cerebrovascular
resulta de um desequilíbrio entre o aporte e o gasto energético, nos indivíduos geneticamente
Doença pulmonar restritiva
suscetíveis.
Doença pulmonar Síndrome de hipoventilação-obesidade
A modificação dos hábitos alimentares, com ingestão de alimentos altamente calóricos, bem Síndrome de apneia obstrutiva do sono
como as alterações ambientais e sociais, relacionadas com a inatividade física, o sedentarismo
Hiperuricemia e gota
associado a muitas profissões, modificação dos tradicionais meios de transporte e urbanização Doença musculoesquelética
crescente proporcionam um crónico balanço energético positivo.1 Osteoartrose
Cancro da mama (pós-menopausa)
Em casos muito raros, a obesidade pode ter uma etiologia monogénica, estando diretamente
Cancro do endométrio
correlacionada com a alteração molecular originada pela mutação em causa. São exemplos Cancro
destas condições a deficiência de leptina [2], insensibilidade do receptor de leptina [3], mutação Cancro da próstata
no gene codificante da pro-hormona convertase (PCSK1) [4], mutação no gene codificante Cancro colo-rectal
da pro-opiomelanocortina (POMC) [5], insensibilidade do receptor da melanocortina 4 Doença de refluxo gastro-esofágico
(MC4R) [6] e, mutação do receptor da neurotrofina (TrkB) [7]. Estes casos são habitualmente
Litíase biliar
diagnosticados na infância devido a obesidade severa com associação a outros estigmas Doença gastrointestinal
clínicos, neurológicos e comportamentais, bem como história familiar sugestiva. Dada a baixa Pancreatite
prevalência destas doenças, não está indicado fazer o rastreio de obesidade monogénica na Doença hepática
avaliação clínica de rotina do obeso, além de casos excepcionais e altamente sugestivos.
Depressão Major
A obesidade pode ainda ser originada por rearranjos cromossómicos, constituindo parte Demência
integrante de uma apresentação sindrómica. São os casos da Síndrome de Prader-Willi Doença neurológica
Doença de Alzheimer
(obesidade infantil, atraso cognitivo, baixa estatura e hipogonadismo hipogonadotrófico) [8] e
Doença de Parkinson
da mutação do gene SIM1 (obesidade infantil, dismorfia facial e craniana, atraso cognitivo) [9].

Por último, há que considerar a obesidade como uma eventual manifestação clínica de Na elaboração da história clínica ao doente obeso devem ser abordados todos os sinais
patologia endócrina, tal como a síndrome de Cushing, acromegalia, hipogonadismo e e sintomas típicos de cada uma das comorbilidades, bem como a requisição dos exames
hipotiroidismo grave [10]. Salienta-se a necessidade de uma exaustiva avaliação clínica, uma complementares que permitem diagnosticar cada uma destas patologias associadas, para
que se possa oferecer tratamento dirigido atempadamente.

22 23
Referências bibliográficas

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24 25
CAPÍTULO III

AVALIAÇÃO
ANTROPOMÉTRICA E DA
COMPOSIÇÃO CORPORAL

26 27
AVALIAÇÃO ANTROPOMÉTRICA E DA gorda (MG) face à massa isenta de gordura (MIG).

COMPOSIÇÃO CORPORAL Existem variadíssimas tecnologias para a avaliação da CC, que variam em função da
sua complexidade e do nível de análise. De acordo com o Wang e colaboradores[1] as
várias componentes corporais podem ser organizadas em cinco níveis: atómico, molecu-
lar, celular, tecidular e corpo inteiro. Associado a cada um dos níveis de análise existem
Analiza M. Silva
Laboratório de Exercício e Saúde, CIPER, Faculdade de Motricidade Humana, Universidade de Lisboa
métodos e técnicas que permitem determinar com um grau diferenciado de validade as
Pennington Biomedical Research Center, Baton Rouge, LA, USA várias componentes.

Bruno Sousa Em virtude da dificuldade em contexto clínico de se utilizarem tecnologias dispendiosas,


Serviço de Saúde da Região Autónoma da Madeira complexas e que requerem técnicos especializados, este capítulo apresentará os méto-
Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias 
dos e técnicas disponíveis ao nível do corpo inteiro para estimar componentes do nível
molecular como a MG, MIG, água corporal total (ACT) e os seus compartimentos hídricos
Carla Pedrosa
intra (AUC) e extracelulares (AEC), e ao nível tecidular, metodologias que permitam esti-
Serviço de Nutrição, Centro Hospitalar do Baixo Vouga EPE
Sociedade Portuguesa de Ciências da Nutrição e Alimentação mar tecido muscular (TM) e tecido adiposo visceral (TAV).

Flora Correia As próximas secções focar-se-ão sobre a antropometria, bioimpedância eléctrica (BIA)
Centro Hospitalar do São João e duas novas tecnologias com potencial de serem usadas em contexto clínico no futuro,
Faculdade de Ciências da Nutrição e Alimentação da Universidade do Porto designadamente a digitalização corporal tridimensional e a ultrassonografia.
Sociedade Portuguesa de Ciências da Nutrição e Alimentação

Liliana Sousa
Serviço de Nutrição, Unidade Local de Saúde de Matosinhos EPE
AVALIAÇÃO ANTROPOMÉTRICA
Sandra S. Martins
Faculdade de Ciências da Saúde e do Desporto, Universidade Europeia A antropometria é considerada um método simples para avaliar a composição corporal em
Instituto de Saúde Ambiental (ISAMB), Faculdade de Medicina, Universidade de Lisboa contexto real. Na pessoa com obesidade, a avaliação das pregas adiposas deve ser evitada
Associação Portuguesa de Fisiologistas do Exercício (APFE)
pelo que as medições incluem altura, peso e sobretudo os perímetros da cintura e anca,
medidos com uma fita antropométrica flexível. A composição corporal é avaliada através da
inclusão de algumas destas variáveis como preditoras em equações de regressão[2]. As
medidas antropométricas são consideradas fáceis, seguras e muito pouco dispendiosas para
avaliar a pessoa com obesidade[2]. No entanto, a precisão, designadamente pela avaliação
do erro intra e inter observador, depende das competências dos técnicos envolvidos nas
medições. Limitações específicas da utilização da antropometria na pessoa com obesidade
INTRODUÇÃO incluem a incapacidade de distinguir gordura subcutânea de gordura visceral, que é útil na
avaliação do risco cardiometabólico[3-4].
Dependendo das informações necessárias, vários métodos de avaliação da composição
corporal (CC) podem ser utilizados, desde que estejam clarificadas as vantagens e as
As avaliações antropométricas devem, idealmente, ser efectuadas com o mínimo de roupa
limitações. No adulto aparentemente saudável, e não considerando períodos especiais
possível (sem cintos e sem sapatos), de preferência apenas com uma bata. É importante não
como a gravidez e o aleitamento na mulher, ou o processo de envelhecimento, altera-
existir qualquer tipo de pressão na zona abdominal. A avaliação do perímetro da cintura não
ções na CC ocorrem durante processos de perda ou ganho do peso, seja através de
deve ser realizada por cima de qualquer peça de roupa.
intervenções no estilo de vida (dieta, exercício, combinação dieta e exercício), seja atra-
vés do recurso a fármacos ou, de forma mais invasiva, à própria cirurgia bariátrica. Em
O indivíduo deve manter uma posição vertical e imóvel, com os braços estendidos ao longo
virtude de uma exposição contínua a um balanço energético positivo, tem-se assistido
do corpo e com as palmas das mãos voltadas para dentro.
a um aumento gradual do peso, sobretudo associado a um aumento relativo da massa

28 29
Em avaliações subsequentes, estas devem preferencialmente, ser efetuadas à mesma hora, escala, movimentando-a lentamente até comprimir o cabelo e tocar o vértex (ponto mais
seguindo os mesmos procedimentos e com os mesmos instrumentos. alto do crânio), sendo que o profissional de saúde deverá subir ou descer o necessário
para que a sua observação da escala se efectue em posição perpendicular;
e) registar o resultado no final de uma expiração normal, aproximado a 0,1 cm.

III. Perímetro da cintura (PC)


INSTRUMENTOS DE AVALIAÇÃO A medição do PC requer um procedimento padronizado. Assim, as seguintes considera-
ções deverão ser seguidas para uma correta avaliação do PC:
Para a avaliação antropométrica são necessários instrumentos específicos, devendo os
profissionais de saúde respeitar as regras gerais de utilização, e salvaguardar sempre as a) deve ser marcado e avaliado no ponto médio entre o bordo inferior da grelha costal;
especificidades técnicas.
b) o bordo superior da crista ilíaca, com a fita métrica colocada em plano paralelo ao
Estadiómetro - pode ser fixo, portátil ou acoplado à própria balança, sendo essencial que solo, no momento final de uma expiração normal; a fita métrica deve estar ajustada, sem
seja montado da forma correta e colocado numa superfície plana e firme. Deve ainda ser comprimir;
garantida a estabilidade, principalmente no caso de se tratar de um estadiómetro portátil.
c)  registar o resultado aproximado a 0,1 cm.
Balança - antes da medição deve ser garantida que a balança está calibrada e que está
colocada numa superfície estável e rígida. IV. Perímetro da anca (PA)
A circunferência da anca também disponibiliza uma indicação de adiposidade embora
Fita métrica - deve ser utilizada uma fita antropométrica flexível, não elástica, com comprimento o seu valor na predição de risco associado à saúde não seja claro na mortalidade por
adequado às características do utente. todas as causas[5]. Resultados de uma meta-análise indicam uma relação significativa
e inversa entre a circunferência da anca e o risco de diabetes tipo 2[6]. Este efeito pro-
tector parece ser mais forte em populações oriundas dos EUA e Ásia face à população
Europeia. Na medição do PA, e de forma a estandardizar o procedimento, as seguintes
considerações devem ser seguidas:
PROCEDIMENTOS ANTROPOMÉTRICOS
a) deve ser avaliado na zona da circunferência máxima das nádegas;
Na pessoa com obesidade, os parâmetros antropométricos habitualmente recomendados
incluem o peso, a estatura, o perímetro da cintura e o perímetro da anca. b) a fita métrica deve estar ajustada, sem comprimir a pele e colocada num plano para-
lelo ao solo;
I. Peso
a)  a pessoa deve subir devagar para a plataforma, com o peso igualmente distribuído c)  registar o resultado aproximado a 0,1 cm.
ao centro;
b)  No caso da balança utilizada não aferir uma precisão de valores da ordem dos 100g,
deve ser registado aos 0,5 a 1kg mais próximo.

II. Estatura CLASSIFICAÇÃO


a)  juntar os calcanhares e colocar as pontas dos pés afastadas a 60°;
b)  colocar a região gemelar, a cintura pélvica, a cintura escapular e a região occipital em O IMC representa o rácio do peso face ao quadrado da estatura (peso em quilogramas
contacto com a parede ou com o estadiómetro, e de forma a manter o equilíbrio; / altura em metros quadrados) sendo a medida mais utilizada para classificar a obesida-
c)  colocar a cabeça no plano horizontal de Frankfurt (linha imaginária que passa pelo de (Tabela 1) [7]. O IMC é uma ferramenta aceitável para o rastreio da obesidade e no
bordo inferior da órbita e pelo bordo superior do meato auditivo externo) e manter o olhar acompanhamento do peso ao longo do tempo. No entanto, é um indicador inespecífico
fixo; da CC uma vez que não disponibiliza informação sobre os contributos da massa isenta
d)  realizar a avaliação com a craveira do estadiómetro num ângulo de 90° em relação à de gordura e massa gorda para o peso corporal[16], nem identifica a distribuição de gor-

30 31
dura [17], não se configurando como uma solução na avaliação da CC da pessoa com Considerando a importância do tecido adiposo visceral (TAV) na saúde metabólica, em 2004
obesidade. foram desenvolvidas equações para estimar o TAV em adultos (17-65 anos) com um poder
explicativo de 78% e 73% para homem e mulher, respetivamente[13].

Tabela 1. Índice de massa corporal (IMC) [8,9] Para mulheres a equação para estimar o TAV inclui as seguintes variáveis:
IMC = Peso (em quilogramas) /Estatura2 (em metros) LnTAV** = 0.33 + 0.05*IMC + 1.85*(PC/PA) + 0.02*Idade + 0.22*Etnia (se Cauc = 1; se
Designação IMC (kg/m2) Negro=0)
Magreza < 18.5
Magreza severa < 16.0 Para homens esta estimativa do logaritmo do TAV inclui:
Magreza média 16.0 – 16.9 LnTAV **= - 0.70 + 0.05*IMC + 3.20*(PC/PA) + 0.02*Idade + 0.36*Etnia (se Cauc = 1;
Magreza moderada 17.0 – 18.5 se Negro=0)
Peso adequado 18.5 – 24.9
Excesso de Peso ≥ 25.0
Pré-obesidade 25.0 – 29.9 Onde, Ln TAV representa o logaritmo do tecido adiposo visceral (na resolução do LnTAV deve
Obesidade ≥ 30.0 ser usada a função exponencial), IMC representa o índice de massa corporal, PC/PA diz
Obesidade grau I 30.0 – 34.9 respeito à razão do perímetro da cintura pela anca, e na Etnia deverá considerar-se o valor 0
Obesidade grau II 34.9 – 39.9 para Negros e 1 para Caucasianos.
Obesidade grau III ≥ 40.0
Os autores propuseram um valor de corte para risco aumentado de anomalia metabólica
De salientar que em indivíduos com idade superior a 65 anos, se define como peso normal um quando o LnTAV > 4.5 (o que representa um TAV > 130 cm2).
IMC entre 22.0-27.0 kg/m2 e como excesso de peso um IMC superior a 27 kg/m2[10]
Quando se selecciona a antropometria para avaliação da pessoa com obesidade, é
fundamental respeitar o protocolo de medição que foi definido, incluindo uma verificação do
erro de medição, assim como requer uma boa compreensão das limitações práticas e teóricas
por parte dos profissionais de forma a garantir uma correta interpretação dos resultados. Mais
RISCO METABÓLICO investigação é necessária para delinear valores de corte específicos para a população obesa,
sobretudo envolvendo critérios relacionados com a saúde metabólica, de forma a melhorar
O perímetro da cintura fornece um indicador de adiposidade central, facilmente obtido, e o contributo da antropometria como metodologia na prevenção e tratamento da pessoa com
sobre o qual se reconhece uma elevada capacidade de predição da morbidade e mortalidade obesidade.
cardiometabólicas[5].

Tabela 2. Valores de corte associados ao Risco metabólico

Designação Pontos de corte Risco


AVALIAÇÃO DA COMPOSIÇÃO CORPORAL POR BIOIMPEDÂNCIA
Perímetro da cintura
> 94 cm (H); > 80 cm (M) Aumentado Para além da avaliação antropométrica anteriormente descrita, na obesidade também é
(em cm) (8)
importante estimar a composição corporal, isto é, o contributo ao nível molecular, da MG e
Perímetro da cintura a MIG e ao nível tecidular, do TM e do TAV. Esta avaliação e distinção dos componentes
> 102 cm (H); > 88 cm (M) Muito aumentado
(em cm) (8) corporais que se alteram como resposta a processos de intervenção com vista à redução
Relação cintura/anca do peso (dieta, exercício, uso de fármacos ou cirurgia) é fundamental para compreender a
≥ 0,90 (H); ≥ 0,85 (M) Muito aumentado qualidade da perda de peso, isto é, o rácio de energia na composição do peso (contributo da
(em cm) (8)
MG e MIG e cada kg de peso perdido).
Perímetro da cintura/
> 0,5 Aumentado
estatura (em cm) [11, 12]) A análise através da bioimpedância elétrica (BIA) é amplamente utilizada no estudo da CC

32 33
humana como instrumento prático, pouco dispendioso e com análises que exigem participação expressas como índice de TM (iTM).
mínima de técnicos. Quando uma corrente eléctrica alternada de baixa intensidade é aplicada
através de um membro, a condutividade reflete as características dos tecidos que foram Tecido Muscular = 0.401 × Estatura (cm)2/R+3.825 × sexo−0.071 × Idade +5.102
atravessados​[14]. Fluídos e tecidos moles ricos em eletrólitos, particularmente o tecido
muscular, são altamente condutores em comparação com a baixa hidratação de tecidos como Onde, o Sexo é representado como 1 se homem e 0 se mulher, R é a resistência em ohms
o adiposo e o ósseo. obtida pelo equipamento.

Existem vários sistemas de BIA disponíveis, desde a emissão de uma frequência única à Esta equação de BIA utilizada foi desenvolvida e validada tendo como referência a ressonância
emissão de frequências múltiplas e medidas segmentares ou de corpo inteiro. magnética de corpo inteiro.

Todos os sistemas BIA medem a impedância e/ou os seus dois componentes, resistência e Hoje em dia, vários sistemas de BIA comercializados disponibilizam estimativas do tecido
reactância. Essas propriedades elétricas, por sua vez, podem ser incorporadas em modelos muscular apendicular e até do corpo inteiro, usualmente tendo como referência a DXA para
de estimação da composição corporal que podem ter bases empíricas e/ou teóricas. Equações estimativas das extremidades. Contudo, a maioria dos sistemas comerciais da BIA não
de predição desenvolvidas em pessoas com peso normal através de BIA baseiam-se no disponibilizam as equações de predição da MG e TM, incorporadas nos seus equipamentos.
pressuposto de que a hidratação da MIG é um valor constante de 73,2%[15]. No entanto,
na obesidade, essa hidratação da MIG tende a ser maior (aproximadamente 74-77%)[4, 16]. No que concerne à determinação do TAV, não está disponibilizada na literatura qualquer
equação preditiva para estimar este componente tecidular a partir de parâmetro brutos da
A diferente estrutura corporal da pessoa com obesidade também afeta a precisão da BIA, já BIA. Contudo, existem equipamentos de fabricantes que disponibilizam a quantificação deste
que o tronco é curto e largo em diâmetro, levando potencialmente a uma diferente distribuição componente, pese embora o seu algoritmo seja desconhecido. Estudos de validação[24]
de água corporal comparativamente com indivíduos magros[15]. Como resultado dessas do TAV obtido por alguns equipamentos de BIA não apresentam uma validade aceitável na
variações, equações com base na BIA para avaliar a composição corporal de pessoas com determinação do TAV tendo como referência a ressonância magnética.
obesidade originam uma subestimação da gordura corporal[15, 17, 18]. Idêntico resultado
ocorre quando são utilizadas equações desenvolvidas em populações não-obesas para avaliar Face às características específicas do método de BIA e, ainda, às condições que podem
a composição corporal em pessoas com obesidade[15, 17, 18]. Por estes motivos, devem ser interferir nos resultados, os seguintes pré-requisitos devem ser tidos em consideração para
seleccionadas as equações que foram desenvolvidas e validadas para populações adultas garantir uma medição mais válida:
e com obesidade, destacando-se as equações de Segal et al. com um poder explicativo de
~90%[19]. a) a avaliação deve ser efectuada à temperatura ambiente (22-23ºC);

Homens: b) o indivíduo deve esvaziar a bexiga 30 minutos antes da avaliação;


MIG (kg) = 0.0008858*(E2) – 0.02999*R + 0.42688*P – 0.07002*Idade+ 14.52435
c) não estar em contacto com nenhum metal (por exemplo: anéis, pulseiras entre outros)
Mulheres: nem ser portador de dispositivos médicos eléctricos ou metálicos (por exemplo: pacemaker,
MIG (kg) = 0.00091186*(E2)–0.01466*R+0.2999*P–0.07012*Idade+9.37938 próteses, entre outros);

Onde, MIG representa massa isenta de gordura, E, estatura em cm, R, resistência em ohms d) os membros superiores devem estar afastados relativamente ao tronco num ângulo de
e P, peso em kg. aproximadamente 30º;

O avanço mais importante em relação à estimativa do tecido muscular foi reportada por e) não deve comer ou beber até, pelo menos, 8 horas antes da avaliação;
Organ e colaboradores[20]. Estes autores descreveram pela primeira vez um método de seis
elétrodos para BIA segmentar que permitiu o isolamento de propriedades elétricas separadas f) não ingerir bebidas alcoólicas nas 24 horas anteriores;
de cada extremidade e do tronco. Vários anos e inovações posteriores, em 2000, Janssen
e colaboradores[23] desenvolveram uma equação preditiva do tecido muscular a partir da g) não realizar qualquer atividade física nas 12 horas anteriores;
BIA usando a ressonância magnética como método de referência. Utilizando BIA, a massa
muscular absoluta ao invés da massa muscular apendicular foi prevista e as estimativas foram h) se mulher, não deve ser avaliada durante o período menstrual.

34 35
Em avaliações subsequentes, estas devem preferencialmente, ser efetuadas à mesma hora, tais como aumento de citocinas pró-inflamatórias, stress oxidativo, resistência à insulina e
seguindo os mesmos procedimentos e com os mesmos instrumentos (2). diminuição da atividade física, subjazem à estreita relação entre sarcopenia e obesidade. É
expectável um circulo vicioso entre a acumulação de gordura ectópica e a perda de TM dada
a influência recíproca que apresentam[26]. A sarcopenia reduz a atividade física conduzindo a
uma diminuição do gasto energético e risco aumentado de obesidade[27]. Por outro lado, um
aumento na adiposidade visceral induz inflamação, o que contribui para o desenvolvimento
BIA E ÂNGULO DE FASE de sarcopenia[28].

Além das estimativas disponibilizadas pela BIA, este equipamento também fornece medidas Para o diagnóstico da síndrome de obesidade sarcopénica é necessária a identificação da
de qualidade e função muscular. O ângulo de fase (AnF) pode ser avaliado diretamente a condição de sarcopenia e de obesidade. O Grupo de Trabalho Europeu sobre Sarcopenia em
partir da relação entre os valores da resistência (R) e da reatância (Xc) medidos (Ângulo de Pessoas Idosas (EWGSOP)[29] propõe um algoritmo para identificação da sarcopenia que
fase (°) = arco-tangente (Xc / R) × (180 / π)). inclui a velocidade de marcha, força de preensão manual e índice de TM. Valores de corte
para velocidade da marcha (<1,0 m / s[30] ou <0,8 m / s[31]) e força de preensão (homens
O ângulo de fase não só fornece uma indicação da composição corporal mas também reflete a <30 kg[31]) foram definidos de acordo com resultados de estudos anteriores[30, 31]. Os
função da membrana celular, apresentando-se como um indicador de prognóstico clínico[40]. pontos de corte para classificar sarcopenia moderada com base no iTM a partir da BIA são
Apesar de mecanismos biológicos subjacentes ao AnF não estarem bem definidos, um de 8,51 a 10,75 kg/m2 para homens e de 5,76-6,75 kg/m2 para mulheres. Para identificação
estudo[40] sugere que a idade é o principal determinante após o ajuste para outras covariáveis. de sarcopenia severa consideram-se valores ≤8.5 kg/m2 para homens e ≤5.75 kg/m2 para
Dados de vários estudos epidemiológicos em diferentes países e grupos étnicos mostram um mulheres[32, 33].
padrão consistente com valores de AnF que atingem o pico durante o início da idade adulta
e, em seguida, diminuem gradualmente com a idade, independentemente da composição No que respeita à definição de obesidade, existem três tipos de avaliações aplicadas para a
corporal[40]. obesidade sarcopénica: (a) o método baseado no IMC, (b) abordagens de avaliação de MG, e
(c) circunferência da cintura ou avaliações da gordura visceral abdominal[34]. Em consonância
A base deste declínio no AnF ao longo da idade não é bem entendido embora mudanças com os critérios da OMS, abordagens baseadas no IMC para populações caucasianas utilizam
paralelas tenham sido observadas por ultrassonografia ao tecido muscular, designadamente um ponto de corte de 30 kg/m2. Os pontos de corte para a %MG são menos consistentes, até
ecogenicidade[41], uma descoberta que sugere que as alterações anatómicas no músculo pela diversidade de metodologias disponíveis, variando entre 20,2% e 37,2% em homens e
podem explicar em parte os efeitos observados. Basile e colaboradores[42] relataram de 31,7% a 42,9% em mulheres[34]. Finalmente, também os valores de corte do perímetro da
efeitos independentes da força de preensão e tecido muscular no AnF medido em um circunferência podem ser utilizados, variando entre etnias; no entanto, para uma população
coorte de idosos; um baixo AnF associou-se com uma redução da força de preensão. Slee e caucasiana, 88 cm (mulheres) e 102 cm (homens) é especificado [26].
colaboradores[43] avaliaram uma coorte de pacientes idosos com fragilidade e hospitalizados,
alguns desnutridos, e observou um baixo AnF em comparação com valores de referência
em idosos saudáveis[43]. Mudanças relacionadas com a idade que afetam a resistência
e reactância da BIA, assim como combinações com frequências diferentes também são
reconhecidas. Estas observações sugerem que a BIA pode fornecer informações sobre a OBESIDADE OSTEO-SARCOPÉNICA
qualidade do músculo esquelético, que se pode traduzir em informação clínica relevante para
tomadas de decisão terapêutica. A obesidade osteo-sarcopénica significa uma síndrome que compromete o tecido muscular,
ósseo e adiposo como consequência final do envelhecimento[35]. Esta síndrome pode ser
desenvolvida pela presença inicial de pré-obesidade / obesidade perpetuada por um quadro
de inflamação crónica associado ao estilo de vida[35, 36]. A conexão estreita entre osso e
músculo foi reconhecida e abordada nos últimos anos[37, 38]. Osso e massa muscular / força
OBESIDADE SARCOPÉNICA diminuem com a idade, enquanto a MG aumenta. Estas mudanças na composição corporal
são acompanhadas pelo aumento da inflamação crónica e declínio da atividade física, uma
A síndrome de obesidade sarcopénica foi inicialmente definida por Baumgartner[25] como combinação que favorece o desenvolvimento desta síndrome[35, 36].
a co-presença de sarcopenia e obesidade, medida através de densitometria radiológica
de dupla energia (DXA). A complexa interação de mecanismos comuns patofisiológicos, A identificação e diagnóstico propostos para a síndrome de Obesidade Osteo-sarcopénica

36 37
inclui a determinação da composição corporal, designadamente, tecido muscular, MG e massa Vários parâmetros e índices de espessura do tecido adiposo foram introduzidos e testados, e
óssea. Para a classificação de obesidade e estimação do TM podem ser usados os critérios correlacionados com parâmetros clínicos e laboratoriais. Os depósitos de gordura intracelular
apresentados anteriormente (1.4 obesidade sarcopénica). Contudo, dada a necessidade de também podem ser avaliados em outros órgãos (por exemplo, fígado, músculo). No entanto,
se avaliar a massa óssea, o diagnóstico necessita de recorrer à utilização da DXA, sendo a precisão dos procedimentos padronizados, designadamente na reprodutibilidade dos
definida a Osteopenia / Osteoporose quando a densidade mineral óssea (DMO) apresenta procedimentos, requer mais investigação.
um 𝑇-score ≤ −1.0 desvio padrão (SD) no colo femural, fémur proximal, ou coluna lombar, com
base nos critérios de diagnósticos para osteopenia / osteoporose[39].

CONCLUSÃO
DIGITALIZAÇÃO CORPORAL TRIDIMENSIONAL (DC3D)
Este capítulo disponibiliza diferentes ferramentas para a avaliação da composição corporal
No método DC3D é efectuado um scanner para capturar a topografia da superfície na pessoa com obesidade. Muitas das ferramentas e métodos revisitados têm limitações e
corporal[44] e geometria de superfície através de técnicas digitais[45]. As diferentes técnicas devem ser usados com cautela. Métodos emergentes prometem avaliações mais precisas,
que foram desenvolvidas com sucesso para avaliar a composição corporal incluem técnica embora ainda sejam necessários estudos de validação na população com obesidade. Ao
fotogramétrica, técnica laser e técnica de stereovision[44, 46]. Um scan gera milhões de escolher um método para avaliar a composição corporal, investigadores, clínicos e outros
pontos num campo de digitalização e, em seguida, o software conecta os pontos criando uma profissionais devem considerar os recursos financeiros disponíveis, assim como os objetivos
imagem corporal em 3-D, incluindo valores de volume corporal total e regional[46]. Medições da sua avaliação. Com o crescente aumento da obesidade ao nível global, a avaliação da
da circunferência da cintura e da anca, diâmetro abdominal sagital, volumes segmentares e composição corporal continuará a ser importante tanto na prevenção como na avaliação e
área de superfície corporal são gerados em segundos[46]. A %MG pode ser calculada através acompanhamento de tratamentos no âmbito da gestão e controlo do peso da população com
de uma equação de predição[46]. obesidade.

O método DC3D mede com precisão a forma do corpo, incluindo na pessoa com obesidade[44,
46], sendo um método seguro e que não requer condições especiais nem suporte técnico
intensivo[44]. Os participantes devem usar roupas apertadas e permanecer imóveis por
10 segundos[46]. A monitorização das medições das formas corporais de pessoas com
obesidade, ao longo do tempo, pode ajudar a acompanhar e avaliar o processo de ganho ou Referências bibliográficas
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O uso do ultrassom para medir a espessura da gordura em humanos data de meados da
4. Das, S.K., Body composition measurement in severe obesity. Curr Opin Clin Nutr Metab Care, 2005. 8(6): p.
década de 60 [12, 13]. Apesar de ter sido usado para medir o tecido adiposo subcutâneo, 602-6.
esta tecnologia parece ser muito menos utilizada do que os métodos mencionados
5. Taylor, A.E., et al., Comparison of the associations of body mass index and measures of central adiposity and
anteriormente para avaliação da composição corporal, sendo que diversos investigadores
fat mass with coronary heart disease, diabetes, and all-cause mortality: a study using data from 4 UK cohorts.
e clínicos não estão familiarizados com sua utilidade e versatilidade como ferramenta de Am J Clin Nutr, 2010. 91(3): p. 547-56.
avaliação da composição corporal. A ultrassonografia é uma ferramenta não invasiva, rápida,
6. Janghorbani, M., F. Momeni, and M. Dehghani, Hip circumference, height and risk of type 2 diabetes:
pouco dispendiosa e disponível para estimar a adiposidade na prática clínica e em diversos
systematic review and meta-analysis. Obes Rev, 2012. 13(12): p. 1172-81.
contextos de investigação. Não expõe os pacientes a riscos de radiação ionizante, tornando o
método ideal para a avaliação em pacientes jovens, na gravidez e para estudos de follow-up. 7. Romero-Corral, A., et al., Accuracy of body mass index in diagnosing obesity in the adult general population.

38 39
Int J Obes (Lond), 2008. 32(6): p. 959-66. 27. Zamboni, M., et al., Sarcopenic obesity: a new category of obesity in the elderly. Nutr Metab Cardiovasc Dis,
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25. Baumgartner, R.N., Body composition in healthy aging. Ann N Y Acad Sci, 2000. 904: p. 437-48.
46. Wang, J., et al., Validation of a 3-dimensional photonic scanner for the measurement of body volumes,
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J Cell Biochem, 2015. 116(7): p. 1171-8.

40 41
CAPÍTULO IV

REGULAÇÃO DO
BALANÇO ENERGÉTICO
E DETERMINAÇÃO DA
ALTERAÇÃO PONDERAL

42 43
REGULAÇÃO DO BALANÇO ENERGÉTICO E A componente dispêndio energético total (DET) é composta pelo dispêndio energético em
repouso (DER), efeito térmico dos alimentos ou termogénese induzida pela dieta, dispêndio
DETERMINAÇÃO DA ALTERAÇÃO PONDERAL energético em AF e ainda por uma componente mais recente designada por termogénese
induzida pelo frio [1]. O DER representa cerca de dois terços do DET. Depende da composição
corporal, da dimensão corporal e do próprio desequilíbrio energético variando intra e inter
Analiza A. Silva individualmente. Ao nível molecular, a massa isenta de gordura (MIG) é a maior determinante
Laboratório de Exercício e Saúde, CIPER, Faculdade de Motricidade Humana, Universidade de Lisboa do DER. Ao nível tecidular, o contributo para o DER advém dos tecidos magros com pequenas
Pennington Biomedical Research Center, Baton Rouge, LA, USA contribuições do tecido adiposo (5 kcal.kg-­1.dia-­1)[1].

Sandra S. Martins O efeito térmico dos alimentos representa o DE associado aos processos de digestão dos
Faculdade de Ciências da Saúde e do Desporto, Universidade Europeia alimentos ingeridos. Apesar de alguns desvios intra e inter individuais ocorrerem, um valor
Instituto de Saúde Ambiental (ISAMB), Faculdade de Medicina, Universidade de Lisboa
Associação Portuguesa de Fisiologistas do Exercício (APFE) assumido de ~10% é frequentemente utilizado na contribuição desta componente para o DET
[1].

O dispêndio energético em AF representa o DE associado às atividades diárias e pode ser


INTRODUÇÃO dividido no DE em exercício e na atividade termogénica que não é exercício[3].

A obesidade, na ausência de doença, ocorre como resultado de um balanço energético (BE)


positivo crónico entre o consumo energético (CE) e o dispêndio energético (DE) conduzindo
a uma acumulação excessiva de gordura. O armazenamento do excesso energético como PREDIÇÃO DAS ALTERAÇÕES DO PESO
massa gorda (MG) constitui uma resposta biológica normal ao BE positivo. Contrariamente, a
perda de peso, na ausência de doença ou intervenção cirúrgica, irá ocorrer como resultado de É reconhecido que caraterísticas individuais como o sexo, a estatura, o peso inicial e a idade
um BE negativo crónico entre o CE e o DE [1]. são componentes essenciais na modelação das alterações de peso, embora as alterações
do DE devido à perda de peso devam, também, ser consideradas na predição do modelo de
cálculo a utilizar. De facto, as caraterísticas individuais e as alterações no DE que ocorrem
constantemente pela perda de peso, contribuem para a natureza dinâmica destes modelos
REGULAÇÃO DO BALANÇO ENERGÉTICO [1].

A prescrição de intervenções na perda de peso envolve a determinação de uma adequada Com o objetivo de predizer alterações no peso corporal e, embora inapropriadamente, tem
alteração do peso. A primeira lei da termodinâmica aplica-­se à fisiologia humana e é formulada sido amplamente utilizada a regra de Wishnofsky, publicada em prestigiadas revistas desde
do seguinte modo: 1958[1]. A origem desta regra é baseada no pressuposto de um défice energético cumulativo
de 7700 kcal por kg de peso perdido. Esta regra prevê um conteúdo fixo na perda de peso,
BE = CE -­DE originário exclusivamente do tecido adiposo cuja constituição ao nível molecular é de 87% de
MG e 13% de MIG[4] .
Onde BE representa a componente balanço energético calculada pela diferença entre as
componentes consumo (CE) e dispêndio (DE) energético [1]. A predição da alteração do peso a partir desta regra, confere uma noção inválida de que a
alteração do peso é linear e acontece num período extensivo em resposta a uma intervenção
Considerando esta equação, a componente CE representa a energia metabolizada obtida permanente no BE, ou seja, assistir-­se-­ia a uma perda de peso constante e irreal. O que na
como a diferença entre o total de macronutrientes e da energia associada com as perdas realidade acontece, e é esperado durante uma intervenção desta natureza, é uma alteração do
observadas na urina e fezes. As densidades energéticas observadas inicialmente por peso que desacelera com o tempo devido a compensações passivas e ativas nas alterações do
Atwater[2] no final do século XIX continuam a ser comummente consideradas: 4 kcal.g-­1 para DE, mesmo que a adesão (à dieta e/ou AF) seja assegurada ou que nenhuma compensação
os hidratos de carbono, 4 kcal.g-­1 para a proteína e 9 kcal.g-­1 para a gordura. Estes valores comportamental ocorra durante a intervenção [1]. Compensações durante a fase de perda de
representam uma média da energia metabolizável, isto é, do combustível disponível para os peso podem incluir um decréscimo do DER e do DET para além do que era esperado com
processos biológicos celulares [1]. base nas alterações do peso e da composição corporal[5]. A adaptação termogénica [5] ou

44 45
adaptação metabólica[6] tem sido o conceito associado a estas observações. mais elevada for a magnitude da restrição energética[10]. Uma calculadora simples da MIG
está disponível no endereço eletrónico https://www.pbrc.edu/research-­and-­faculty/calculators/
A utilização desta regra, para além de não contemplar a adaptação termogénica, também fat-­free-­mass/.
assume que o conteúdo energético da perda de peso é constante (7700 kcal.kg-­1) por advir
exclusivamente do tecido adiposo. Visto que se consideram duas fases distintas na perda de
peso[7], uma fase rápida e uma fase lenta, também se constatam diferentes contributos da
MIG e da MG na perda de peso.

Na fase rápida (geralmente, de uma até 4 a 6 semanas) o contributo da MIG para a perda de CONCLUSÃO
peso reflete os contributos combinados de perdas de água/electrólitos, glicogénio, proteína
e MG (e com menor extensão o próprio mineral ósseo). Na fase lenta observa-­se um maior A perda de peso é um processo dinâmico resultante de intervenções no BE e como tal requer
contributo da MG para a perda de peso. Estes contributos não estáveis da MG e MIG na perda modelos preditores quer da perda de peso, quer do seu conteúdo energético. Embora existam
de peso conduzem a uma variabilidade no conteúdo energético por cada kg de peso perdido. diferenças entre os modelos dinâmicos propostos por Thomas e colaboradores[9] e Hall e
Verifica-­se um conteúdo energético mais baixo na fase rápida comparativamente à fase lenta colaboradores [8], as suas estimativas são próximas e estão em concordância. A utilidade
de perda de peso, já que a densidade energética da MIG é substancialmente mais baixa do destes modelos tem sido comprovada na definição de objetivos na gestão do peso e para
que a densidade energética da MG (1,0 kcal.g-­1 vs. 9,5 kcal.g-­1)[1]. testar a adesão a intervenções clínicas no BE (dieta e/ ou exercício), incluindo tratamento
farmacológico. Clínicos, fisiologistas do exercício, nutricionistas e investigadores beneficiarão
Para se adequar a este processo dinâmico, os modelos matemáticos mais recentes já ajustam da utilização das metodologias propostas na sua prática diária de conceção e monitorização
para os efeitos compensatórios no DE. Hall e colaboradores [8] desenvolveram uma nova de programas de gestão do peso [1]. A pessoa com obesidade que participe neste tipo
regra simples para a predição da perda de peso na pessoa típica com peso excessivo: por de programas, também, deve ser informada acerca dos efeitos previsíveis de modo a ter
cada redução permanente de 22 kcal por dia no CE será alcançada uma alteração de 1 kg de expectativas realistas relativamente ao seu programa de perda de peso.
peso quando a massa corporal atingir um novo estado de equilíbrio. Durará cerca de um ano
até alcançar 50% (0,5 kg) e três anos para chegar aos 95% (0,95 kg) dessa perda de peso3.

1. Silva, A. and L.B. Sardinha, O erro de Wishnofsky. Uma nova abordagem na programação e gestão do
Traduzindo esta regra num exemplo mais claro: peso. Revista Factores de Risco, 2017(43): p. 55-­60.

2. Atwater, W., How food nourishes the body. The Century Illustrated Magazine, 1887(34): p. 249-­50.
Para uma estimativa individual mais válida das alterações do peso num dado período,
considerando um decréscimo em particular do CE, devem ser privilegiados os modelos 3. Levine, J.A., N.L. Eberhardt, and M.D. Jensen, Role of nonexercise activity thermogenesis in resistance
to fat gain in humans. Science, 1999. 283(5399): p. 212-­4.
de Hall e colaboradores [8] ou de Thomas e colaboradores [9] que estão disponíveis nas
seguintes páginas eletrónicas: 4. Wishnofsky, M., Caloric equivalents of gained or lost weight. Am J Clin Nutr, 1958. 6(5): p. 542-­6.
https://www.niddk.nih.gov/bwp [8]3; https://www.pbrc.edu/research-­and-­faculty/calculators/
5. Rosenbaum, M. and R.L. Leibel, Adaptive thermogenesis in humans. Int J Obes (Lond), 2010. 34 Suppl
weight-­loss-­predictor/ [9]. O primeiro modelo tem em consideração as alterações da AF inicial 1: p. S47-­55.
na predição da perda de peso. Profissionais que trabalham na área da gestão do peso e
que precisam de prescrever objetivos realistas nas alterações do peso, podem usar livre 6. Redman, L.M., et al., Metabolic and behavioral compensations in response to caloric restriction:
implications for the maintenance of weight loss. PLoS One, 2009. 4(2): p. e4377.
e gratuitamente estas ferramentas para adequar intervenções no BE de acordo com as
necessidades individuais de cada pessoa com obesidade [1]. 7. Heymsfield, S.B., et al., Voluntary weight loss: systematic review of early phase body composition
changes. Obes Rev, 2011. 12(5): p. e348-­61.
O rácio de partição de energia na composição corporal durante a perda de peso varia consoante 8. Hall, K.D., et al., Quantification of the effect of energy imbalance on bodyweight. Lancet, 2011.
os valores iniciais de MG e de MIG. Pessoas com valores iniciais de MG mais elevados, 378(9793): p. 826-­37.
quando submetidas a um BE negativo, tendem a poupar MIG, ou seja, o contributo da MIG
9. Thomas, D.M., et al., A Simple Model Predicting Individual Weight Change in Humans. J Biol Dyn, 2011.
é menor por cada kg de peso perdido comparativamente a uma condição normoponderal. 5(6): p. 579-­599.
Inversamente, o contributo da MIG na perda de peso é maior quando o valor de MG inicial
é menor. Acresce ainda o facto da fração de MIG na perda de peso ser tanto maior quanto 10. Forbes, G.B., Lean body mass-­body fat interrelationships in humans. Nutr Rev, 1987. 45(8): p. 225-­31.

46 47
CAPÍTULO V

ABORDAGEM
PSICOLÓGICA E
PSIQUIÁTRICA

48 49
ABORDAGEM PSICOLÓGICA E O PAPEL DA PSICOLOGIA E DA PSIQUIATRIA NO TRATAMENTO DA OBESIDADE

PSIQUIÁTRICA A obesidade, sendo uma condição de etiologia complexa e multifatorial,[1] exige também
abordagens complexas e que integrem os múltiplos elementos que contribuem para uma
gestão de peso adequada. Apesar das diretrizes claras e amplamente divulgadas, para o
estabelecimento de estilos de vida saudáveis é fundamental considerarmos a pessoa, bem
Eva Conceição
Escola de Psicologia, Universidade do Minho
como a forma como a sua complexidade psicológica tem impacto na adesão às prescrições
necessárias ao sucesso das intervenções. As intervenções que não consideram a componente
Ana Rita Vaz psicológica acabam, ainda que indiretamente, por assumir a pessoa como alguém que vem
Escola de Psicologia, Universidade do Minho “em branco” para a consulta, e como um simples recetor de orientações a pôr em prática.

André Ferreira Tendo em conta o exposto, o psicólogo tem como principal papel facilitar a mudança
Hospital do Espírito Santo de Évora - EPE comportamental e a sua manutenção a longo-prazo, tendo em conta motivações, barreiras,
emoções e atitudes, aspetos estes que podem não só estar na origem do problema, como,
Dulce Bouça principalmente, estar a contribuir para a sua manutenção.[2,3]
Consulta de comportamento Alimentar, Hospital CUF Descobertas
Já o psiquiatra, na tentativa de facilitar a mudança comportamental, tem um papel fundamental
Eliana Carraça no controlo dos quadros psiquiátricos habitualmente associados à condição de obesidade
CIPER-Self-regulation Group, Faculdade de Motricidade Humana; Faculdade de Educação Física e Desporto, ULHT. (depressão, ansiedade, perturbação bipolar ou alimentar). Além do mais, compete-lhe
monitorizar os efeitos iatrogénicos da medicação psiquiátrica que, em alguns casos, pode
Isabel Brandão estar associada a uma acentuada dificuldade de controlo de peso.
Faculdade de Medicida da Universidade do Porto; Hospital de São João

Isabel Silva
Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Fernando Pessoa/ Hospital-Escola da Universidade Fernando O IMPACTO PSICOLÓGICO DA OBESIDADE
Pessoa

O impacto da obesidade na saúde física encontra-se bem definido. No entanto, o seu impacto
Lara Palmeira
CINEICC - Centro de Investigação em Neuropsicologia e Intervenção Cognitivo-Comportamental, Faculdade de
ao nível do bem-estar psicológico é ainda pouco claro. Em particular, a associação entre a
Psicologia e Ciências da Educação da universidade de Coimbra obesidade e as perturbações mentais é complexa e deve ser considerada tendo em conta a
enorme heterogeneidade dos doentes.
Marlene Silva
CIPER-Self-regulation Group, Faculdade de Motricidade Humana; Faculdade de Educação Física e Desporto, ULHT; A investigação é relativamente consensual quanto a considerar a existência de uma associação
Programa Nacional de Promoção de Atividade Física, Digeral Geral da Saúde.
entre o excesso de peso e/ou obesidade e o humor depressivo ou perturbação depressiva,
ainda que alguns dos estudos apenas encontrem esta associação em mulheres,[4,5] ou
em doentes com obesidade mórbida que procuram tratamento.[6] Existe igualmente uma
associação entre o excesso de peso e/ou obesidade e perturbações da ansiedade,[7] incluindo
a perturbação de pânico,[5] fobias específicas,[4] perturbação de ansiedade generalizada[5]
e fobia social.[4,5]

A prevalência de perturbações alimentares é significativamente superior nas pessoas com


obesidade, comparativamente às pessoas normoponderais.[8] Nas pessoas com obesidade,
destaca-se a prevalência de Perturbação de Ingestão Alimentar Compulsiva, de Bulimia
Nervosa, e de Síndrome de Ingestão Noturna.[9]
Os sintomas de psicopatologia – sintomas de depressão, somatização, obsessivo-compulsivos,

50 51
sensibilidade interpessoal, ansiedade, hostilidade, ansiedade fóbica, ideias paranoides e tratamentos alternativos, ao invés de serem sujeitos a mais um processo inconsequente e
psicoticismo - são mais frequentes nas mulheres com obesidade que procuram tratamento frustrante, que se sabe à partida ter pouca margem de sucesso.
para a perda de peso, sobretudo quando estas apresentam perturbação de ingestão alimentar
compulsiva,[10] sendo a sua presença muito evidente nos indivíduos que procuram a cirurgia
de obesidade como opção de tratamento, grupo em que as taxas de perturbação psiquiátrica Preditores pré-tratamento
parecem variar entre cerca de 40 e 70% para presença de psicopatologia atual ou passada,
respetivamente.[11] Uma revisão sistemática recente sintetizou exatamente o estado do conhecimento no campo
dos preditores pré-tratamento da perda e manutenção do peso perdido,[3] tendo identificado
Parece consensual o reconhecimento de que a associação entre as perturbações psíquicas e um menor número de tentativas de perda de peso como o preditor mais consistente de maior
obesidade é complexa e bidirecional.[12] A obesidade encontra-se associada a um aumento sucesso. Os mecanismos subjacentes a esta associação permanecem pouco estudados.
do risco de diagnóstico de perturbação psíquica, seja de forma directa ou pelas atitudes Naturalmente, não se podem excluir razões de ordem genética[17] ou fisiológica,[18] mas
sociais em relação a estes doentes e à doença, e, por sua vez, as perturbações mentais (e os uma das explicações mais plausíveis prende-se com o facto de uma história recorrente
efeitos iatrogénicos de alguns dos seus tratamentos) podem precipitar e perpetuar o aumento de tentativas de perda de peso poder estar relacionada com um perfil psicológico mais
de peso e a obesidade.[13] vulnerável ao insucesso, caracterizado por distorções da imagem corporal, depreciações do
autoconceito, atribuições causais pessimistas e sentimentos de descrença aprendida.[19]
A obesidade tem, ainda, um impacto substancial sobre a capacidade funcional e sobre a Apesar de não haver evidência suficiente destas variáveis como preditores pré-tratamento,[3]
qualidade de vida,[14] encontrando-se associada a um funcionamento físico, social e sexual, a sua presença pode traduzir-se numa obsessão com a comida, despoletando episódios de
autoestima e trabalho mais pobres,[15] com repercussões ao nível psicológico, social, familiar, ingestão compulsiva e oscilações cíclicas de peso.[20]
do emprego/escola, ocupação de tempos livres e abandono de atividades consideradas
prazerosas,[6] sendo que quanto mais grave é a obesidade, maior é o comprometimento Esta revisão revelou ainda que várias características, muitas das quais previamente
nesses domínios.[15] consideradas barreiras para o sucesso na perda de peso, foram identificadas como não
preditores de pré tratamento.[3] Entre estas, incluem-se variáveis como a auto-eficácia para a
Estas consequências psicológicas negativas da obesidade parecem decorrer não só alimentação e para o exercício, voracidade alimentar (ingestão alimentar compulsiva), restrição
do impacto da doença a nível físico, mas também, em parte, de atitudes negativas e alimentar cognitiva e desinibição alimentar. Não se trata de afirmar que características prévias
comportamentos discriminatórios da sociedade em geral, de entidades empregadoras e dos ligadas, por exemplo, a mais episódios/crises de voracidade alimentar não são elementos
próprios contextos e dos profissionais de saúde em relação às pessoas com obesidade Estas fundamentais a ter em conta, mas que a sua presença no início do tratamento não tem que
atitudes acabam por ser internalizadas pelos próprios doentes6 e que põem em causa a condicionar o sucesso do mesmo. Uma explicação possível passa exatamente pelo efeito
justiça social no acesso aos cuidados de saúde.[16] positivo que as intervenções comportamentais têm sobre estas variáveis. No entanto, são
necessários mais estudos de qualidade científica elevada para confirmar estes resultados.

Preditores ligados ao tratamento: Pistas para a Intervenção


INVESTIGAÇÃO-AÇÃO EM GESTÃO DO PESO:
A IMPORTÂNCIA DOS FATORES PSICOSSOCIAIS PREDITORES DE SUCESSO Poucos estudos têm analisado por que razões, ou através de que mecanismos, as intervenções
são eficazes para alguns indivíduos e não tanto para outros. Existe, portanto, claramente
Atualmente, o grande desafio que se coloca recai não só sobre como melhor apoiar a pessoa uma necessidade de se identificarem preditores (ou mediadores) da perda e manutenção
em processo de gestão do peso corporal, mas principalmente sobre como melhor potenciar a sustentadas do peso.
manutenção do peso perdido e a prevenção do reganho de peso a longo prazo. Para otimizar
o sucesso das intervenções, torna-se fundamental compreender e identificar, por um lado, as O sucesso e o insucesso na autorregulação dos comportamentos de saúde implicados
características individuais presentes no início do tratamento e sob que condições, funciona a na gestão do peso pode envolver múltiplos fatores psicológicos e comportamentais
intervenção (preditores pré-tratamento), e por outro, processos ou mecanismos suscetíveis (mediadores). Uma revisão sistemática recente procurou identificar quais destes fatores
de explicar por que razão/como são alcançados determinados resultados (preditores ligados são mais relevantes para a gestão eficaz do peso em intervenções comportamentais de
ao processo de tratamento-mediadores). A identificação destas características favorece uma tratamento da obesidade.[21] Apesar da evidência ser limitada, este estudo identificou como
melhor alocação de recursos e a identificação de utentes que poderão beneficiar mais de mediadores mais importantes na gestão eficaz do peso a médio/longo-prazo a presença de

52 53
motivações autónomas, maior auto-eficácia (e menores barreiras percebidas), competências Sucesso terapêutico nas intervenções para a obesidade
autorregulatórias (ex., auto-monitorização, definição de objetivos, planeamento de ações),
restrição alimentar flexível e imagem corporal positiva. Mais importante, sendo que são centrais para os resultados de tratamento as questões
ligadas ao tipo de motivação, ao desenvolvimento de competências autorregulatórias, à
De forma relacionada, uma outra revisão conceptual sobre constructos chave da manutenção satisfação com a imagem corporal e ao comportamento alimentar, até que ponto não devem
de alterações comportamentais sublinhou 5 áreas centrais a ter em conta no desenvolvimento elas próprias constituir critérios de sucesso por si?
de intervenções comportamentais: 1) a importância da autorregulação e 2) do desenvolvimento
de recursos psicológicos; 3) o tipo de motivos na base da alteração de comportamentos; 4) a Contrariamente ao paradigma dominante em que o sucesso nas intervenções para a gestão
criação de rotinas e hábitos e 5) o trabalho ao nível das influências sociais e do meio físico.[22] do peso é apenas medido pelos kg perdidos/mantidos, a evidência acumulada tem apontado
para a importância de se encararem outros indicadores de sucesso.[26] Um peso saudável
Explorando um pouco mais como é que o tipo de motivos pode influenciar a manutenção será a consequência de um estilo de vida equilibrado mas também de uma saúde mental
bem-sucedida da perda de peso, uma outra revisão conceptual,[23] assentando na evidência positiva, suportada numa boa imagem corporal, autoestima, confiança em si próprio e nas suas
científica proveniente da aplicação da Teoria da Auto-Determinação ao campo da gestão do capacidades de planeamento e regulação comportamental, assim como numa capacidade
peso e da saúde, analisou os vários processos envolvidos.[24] De forma simples, motivos para para fazer face a pressões internas e externas, sustentando a motivação para a mudança em
a perda de peso de ordem mais controlada (i.e. assentes em pressões externas ou internas), razões intrínsecas, consentâneas com verdadeiros valores e aspirações.
vão diminuir a probabilidade de satisfação de necessidades psicológicas básicas ligadas à
perceção de autonomia, competência e relacionamento positivo, conduzindo a um processo
autorregulatório mais rígido e mais desgastante para a pessoa em processo de gestão do
peso. De facto, motivações de ordem mais controlada vão conduzir a mais sentimentos de
pressão e coerção, mais obstáculos percebidos, maior vulnerabilidade a impulsos e tentações AVALIAÇÃO
(e.g. estímulos alimentares, influências sociais negativas), a maior conflito interno, stresse
e maior sentimento de fracasso. Tudo isto estará também ligado a um funcionamento mais Viver bem com o peso do seu corpo pode ser um grande desafio na vida. O que procuramos é
rígido e dicotómico (uma abordagem aos problemas como tudo bem/tudo mal), o que vem ter em conta que o bem-estar deve ser físico, psicológico, emocional e relacional no contexto
criar menor sentimento de congruência e maior luta interna. Estes processos contribuem para familiar, profissional e social.
o desgaste da energia psíquica, diminuindo as probabilidades de que a pessoa em processo
de gestão do peso os consiga manter como sustentadores de mudanças comportamentais Tem vindo a aumentar a sensibilidade para a importância de que a pessoa com obesidade
duradoiras. De forma bem diferente, a evidência tem demonstrado que motivações mais seja quem mais se tenha de empenhar nas mudanças que o tratamento da obesidade exige.
autónomas (ligadas a motivações de ordem mais intrínseca ou identificada com valores A melhoria não é isenta de dificuldades nem de conflitos ou tensões. As dificuldades em
pessoalmente relevantes) estão associadas a maior satisfação das referidas necessidades conseguir uma redução de peso através de mudanças de comportamento alimentar e/ou de
psicológicas básicas, e consequentemente, a um processo autorregulatório pautado por hábitos de vida são muito frequentes. Estas dificuldades podem relacionar-se com o facto
maior sentimento de integridade e coerência (“há uma ligação entre o meu comportamento e o de existir uma profunda perda de significado para tal mudança, perda esta, que é a dupla
que realmente quero para mim”), maior prazer e satisfação com o processo (p. ex. “a atividade experiência de ser e de se ter um corpo. Para Merleau-Ponty nós somos o nosso corpo,
física não é só algo que tenho de fazer para gastar calorias; é, antes, algo que gosto realmente estamos e percebemos o mundo através dele.[27]
de fazer, que me tem trazido momentos de grande desafio e satisfação”), e de sentimentos
de mestria, em que a pessoa se sente com competências e capacidades acrescidas.[25] Uma pessoa pode comer por ter fome, pelo prazer do paladar, por ser a hora da refeição, por
Tudo isto contribui para um processo de gestão do peso em que a vulnerabilidade a impulsos gostar da companhia, ou para atenuar a ansiedade ou a tristeza e ainda, pode comer sem que
e influências do meio é menor e se percecionam menos obstáculos, sendo estes geridos e tenha nenhuma explicação ou razão para tal. Estas sensações só muito poucas vezes são
ultrapassados com maior facilidade dada uma maior flexibilidade e capacidade de coping identificadas pelo próprio e implicam uma dedicação a conhecer-se em relação ao que sente,
(p.ex. “eu já não procuro fazer “tudo bem”, quando como mais do que o planeado; ao invés de como age, e ao seu lugar entre quem e o que o rodeia. Identificar estas diferenças pode ser
sentir que já estraguei tudo e desistir, aceito o que aconteceu como fazendo parte do processo um processo longo, mas é útil e necessário para a mudança do comportamento alimentar.
e volto ao meu plano, fazendo pequenos ajustes”). Todo este processo, porque envolve menos
desgaste psicológico, tem muito mais probabilidade de ser mantido, traduzindo-se em maior
manutenção das alterações comportamentais necessárias (alimentação e atividade física) e,
consequentemente, maior probabilidade de perda de peso e manutenção dessa perda.

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AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA DA PESSOA COM OBESIDADE É a entrevista que também nos permite interpretar verdadeiramente o significado dos resultados
obtidos através de outras ferramentas de recolha de dados para avaliação, nomeadamente
Na desafiante tentativa de compreender e tratar a obesidade, importa ter em consideração que, através de questionários, escalas, inventários e checklists, contextualizando as respostas e,
nesta doença, existem várias dimensões psicológicas envolvidas,[28] para além dos fatores por isso, tornando-as efetivamente interpretáveis.
genéticos, nutricionais, de atividade física, socioeconómicos, farmacológicos, hormonais, e
biológicos.[1] Por sua vez, a obesidade não está apenas associada a comorbilidades médicas O papel do psiquiatra na equipa multidisciplinar para o tratamento da obesidade, dirige-se ao
e físicas. Estudos reportam frequentemente outros problemas psicológicos associados, como diagnóstico da psicopatologia em comorbilidade com a condição de obesidade, que se insere
as perturbações do humor, da alimentação, e insatisfação com a imagem corporal.[29] na sua história pessoal e nos seus traços de personalidade, focalizando-se na motivação para
perder peso e nas dificuldades que refere na modificação de um padrão alimentar que se
Os vários tipos de intervenções psicológicas para o tratamento da obesidade, globalmente instalou ao longo do tempo e que levou ao peso em excesso. A avaliação psiquiátrica deve
procuram reduzir as barreiras psicológicas à mudança e manutenção do comportamento.[30] ser proposta pelo internista/ endocrinologista que conduzem a intervenção médica, passando
Desta forma, torna-se central conhecermos essas barreiras e termos ferramentas validadas a haver uma articulação que agilize um tratamento global para uma perturbação de multi-
para a avaliação das mesmas. causalidade, bio-psico-social.

Os profissionais de saúde mental podem desempenhar um papel importante na avaliação e


tratamento das pessoas com obesidade.[28] O principal objetivo do processo de avaliação
psicológica no âmbito do tratamento da obesidade será a recolha de dados relevantes sobre o O uso de intrumentos de auto-relato
funcionamento psicológico de quem procura tratamento, facilitando assim a conceptualização
de cada caso e respetiva intervenção. De seguida, elencam-se alguns dos aspetos psicológicos Pela sua rapidez e facilidade de aplicação, as medidas de auto-relato têm auxiliado os clínicos
mais relevantes, que importa avaliar no contexto do tratamento da obesidade. Paralelamente, na avaliação de diferentes domínios do funcionamento psicológico da pessoa com obesidade.
apresentam-se exemplos de instrumentos de avaliação, os quais foram objeto de algum tipo Em baixo descrevemos os mais usados em Portugal, fazendo, sempre que disponível, a
de estudo psicométrico na população portuguesa. referência ao estudo de validação para amostra portuguesa.

Na avaliação da relação entre vários problemas de saúde mental, nomeadamente depressão,


ansiedade ou outras perturbações psiquiátricas, e a obesidade, recorre-se habitualmente
A entrevista de avaliação psicológica e psiquiátrica a questionários desenhados para a população geral. Os que descrevemos em baixo têm sido
extensivamente usados na população com obesidade. Alguns dos instrumentos de avaliação
A entrevista clínica constitui a mais importante ferramenta de avaliação dos aspetos disponíveis são o Beck Depression Inventory-II (BDI-II),[31] a Depression, Anxiety and Stress
psicossociais na consulta com pessoas com obesidade, podendo ser operacionalizada de Scales (DASS-42)[32], e o Revised NEO Personality Inventory (NEO PI-R).[33]
diversas formas de acordo com o contexto da sua realização, mas, sobretudo, dependendo
do indivíduo entrevistado. Poderão ser utilizados no processo de avaliação do comportamento alimentar questionários
que avaliam diferentes dimensões ou comportamentos problemáticos. O Dutch Eating Behavior
Entre os domínios que serão importante incluir nesta entrevista contam-se os seguintes: Questionnaire (DEBQ)[34] avalia as dimensões alimentação externa, alimentação emocional
motivo do atendimento (apresentado pelo profissional que o orientou para a consulta e pelo e restrição alimentar. O Three-Factor Eating Questionnaire Revised-21 (TFEQ-R21),[35] avalia
doente); contactos anteriores com profissionais de saúde mental; medicação psiquiátrica atual restrição cognitiva, alimentação emocional e comer descontrolado. O Eating Disorder Inventory
e passada; comportamento alimentar (incluindo padrão alimentar anterior e atual, fatores – 2 (EDI-2)[36] é constituído pelas sub-escalas tendência para emagrecer, bulimia, insatisfação
precipitantes de comportamento alimentar disfuncional ou atípico no passado e na atualidade, corporal, ineficácia, perfecionismo, desconfiança interpessoal, consciência interoceptiva,
relação com a alimentação e com os alimentos); história da obesidade e suas consequências medo da maturidade, ascetismo, regulação dos impulsos e isolamento social). A Binge Eating
psicossociais; história das tentativas de tratamento para perda de peso e seus resultados; Scale (BES)[37] avalia a ingestão compulsiva. O Eating Disorders Examination Questionnaire
relação com o corpo, imagem corporal e sexualidade; presença de sintomas de perturbação (EDE-Q)[38] ou o Eating Disorders 15[39] avaliam restrição cognitiva, preocupação com a
psíquica; acontecimentos de vida marcantes e presença de stressores atuais que possam forma, peso corporal e alimentação. O Repetitive Eating Questionnaire[40] avalia petisco
comprometer os resultados; situação familiar, social e profissional; expectativas e motivações contínuo compulsivo e comer repetitivo. A Loss of Control Eating Scale[41] avalia a perda de
para o tratamento atual; medos e preocupações associados ao tratamento; redes de apoio controlo sobre a alimentação.
social.

56 57
Muitas das pessoas com obesidade apresentam um historial de tratamentos falhados,[42] apresentados anteriormente auxiliará certamente o profissional de saúde mental durante as
pelo que a sua noção de autoeficácia se reveste de especial importância, podendo ser várias fases do tratamento.
utilizada no processo de avaliação a Escala de Auto-Eficácia Alimentar Global (EAEAG).[43]
Além das medidas de auto-relato, têm sido utilizadas também as entrevistas correspondentes
para avaliação de psicopatologia do comportamento alimentar (Eating Disorders Examination)
[44] e petisco contínuo (Repetitive Eating Interview).[45] O psiquiatra na consulta multidisciplinar: a primeira consulta

As pessoas com obesidade tendem a apresentar dificuldades na maioria das atividades Na primeira consulta com o psiquiatra, o enfoque inicial deverá ser na motivação para perder
quotidianas, frequentemente exacerbadas consoante a gravidade da sua obesidade. Estas peso, sendo que na maioria dos casos a ideia de perder peso se encontra idealizada, vista
podem passar por dificuldades na higiene pessoal,[46] até dificuldades acrescidas em encontrar como a solução para todos os problemas, logo com a expectativa que seja um processo rápido
emprego.[47] Estando a autoestima relacionada com a autoavaliação de uma pessoa sobre o e sem retrocesso. Frequentemente as razões apresentadas para a procura de tratamento são
seu valor, não é de estranhar que as pessoas com obesidade apresentem, frequentemente, externalizadas nas indicações médicas para melhoria da saúde ou tratamento de doenças em
resultados baixos.[48] A autoestima poderá ser avaliada através da Rosenberg Self-Esteem curso ou, ainda, como prevenção de patologias futuras resultantes da obesidade instalada.
Scale (RSES).[49]
O psiquiatra avaliará a história de vida do doente, com enfoque nos hábitos alimentares
Tendo em conta que a obesidade acarreta um impacto relevante no funcionamento e desde a infância, procurando trazer ao consciente memórias da alimentação ao longo da
bem-estar psicológico,[29] esta afeta também a qualidade de vida (QdV) de quem tem vida e relacionando-as com emoções e afetos familiares ou outros. Nesta narrativa pessoal e
obesidade,[16] sendo vários os estudos que têm demonstrado a relação entre a obesidade e a única para cada indivíduo, surgem com frequência referências a momentos ou períodos em
baixa qualidade de vida relacionada com a saúde (QdVRS).[50] Os questionários para avaliar que o padrão alimentar se alterou, por vivências que podem ser, ou não, perturbadoras ou
a QdV podem ser divididos em questionários generalistas de qualidade de vida relacionada traumáticas, que se caracterizaram por um recurso indiscriminado à comida. Nalguns casos,
com a saúde (QdV) e específicos para problemas de obesidade. Sugere-se o uso combinado a alimentação excessiva foi um meio encontrado para acalmar ou anestesiar emoções, de
de um instrumento genérico e de um específico - esta estratégia permite comparar a QdV das modo não consciente e que se perpetuou no tempo.
pessoas com obesidade com as da população em geral e avaliar aspetos muito específicos da
doença e/ou tratamento. As medidas generalistas de QdV para pessoas com diagnóstico de As memórias da comida, trazidas ao consciente, facilitam que o doente assuma a sua
obesidade usadas e validadas em Portugal incluem Nottingham Health Profile,[51] o Sickness participação no processo passado, envolvendo-se com um papel ativo no processo de
Impact Profile[52] e o MOS 36-Item Short-Form Health Survey (SF-36)[53] ou o EQ-5D,[54] tratamento que está a iniciar. Permite-lhe ainda integrar as modificações dos seus hábitos
que permite gerar um índice representando o valor do estado de saúde de um indivíduo. Para alimentares na sua história pessoal, favorecendo a sua auto-determinação para o fazer. Nesta
avaliar a QdV especificamente relacionada com a obesidade, estão disponíveis o Impact of procura de memórias alimentares com o doente, umas positivas a reforçar, outras negativas
Weight on Quality of Life Questionnaire (IWQOL),[55] o World Health Organization Quality of a modificar, o psiquiatra tem acesso às características de personalidade, do humor e do nível
Life – Bref (WHOQOL-BREF),[56] Moorehead–Ardelt Quality of Life Questionnaire II (MA-II) de ansiedade, ao modo de lidar com a frustração, assim como da competência emocional
[57] e o Obesity Related Well-Being Revised (ORWELL-R).[58] que a pessoa tem, ou não, para se comprometer no processo de tratamento, explicando
ao doente que será sempre um processo lento mas progressivo, portanto, des-idealizando
Um construto que também importa ter em consideração no contexto da obesidade, é o de objetivos rápidos de perda de peso.
imagem corporal, sendo que parece existir relação entre a obesidade e a insatisfação com
a imagem corporal. Os dados de uma revisão sistemática e meta-análise recente sobre Para finalizar a primeira consulta o psiquiatra reforçará a ideia de que o tratamento da
imagem corporal, indicam que as pessoas com obesidade apresentam maior insatisfação obesidade deve ser uma escolha livre e consciente, para ter resultados que se mantenham e
com a imagem corporal, comparativamente às pessoas normoponderais.[59] Para avaliar a que, para tal, deve basear-se num compromisso pessoal assumido com a equipa, sem o qual
imagem corporal poderão ser utilizados questionários, como o Body Shape Questionnaire os resultados são incertos.
(BSQ),[60] ou escalas de silhuetas, como a Escala de Silhuetas para Cirurgia da Obesidade
(ESCO)[61] (criada no âmbito da cirurgia bariátrica, mas que pode ser utilizada com vários O psiquiatra deve trabalhar em estreita relação com os outros elementos da equipa
Índices de Massa Corporal.). multidisciplinar, em especial com o psicólogo. A partir da primeira consulta com o psiquiatra
será organizada uma articulação entre os elementos da equipa, com avaliação dos resultados
O processo de avaliação psicológica, no âmbito do tratamento da obesidade, poderá não ser atingidos, feita periodicamente (periodicidade a definir pela equipa) e com uma partilha regular
restrito à sua fase inicial. Contudo, o conhecimento prévio dos vários aspetos psicológicos de informação.

58 59
TRATAMENTO Em pessoas que sempre se consideraram ansiosas, particularmente com sintomas
compatíveis com a perturbação de ansiedade generalizada, pode instalar-se a associação
da ansiedade a comportamentos de ingestão de alimentos como solução. É um mecanismo
Benefícios do tratamento para o excesso de peso e obesidade: de coping que responde a estímulos quer internos quer externos de alívio do mal-estar e que
predispõe e mantém a obesidade.[70]
Melhoria das condições psicológicas associadas ao tratamento da obesidade
É conhecido que as pessoas que sofrem de doença mental têm maior prevalência de
Vários estudos demonstram os efeitos positivos dos tratamentos para a obesidade no bem- obesidade, dislipidemia, hipertensão arterial, doenças cardiovasculares e diabetes do
estar dos doentes, alguns deles revelando que esses efeitos podem estar presentes mesmo que a população em geral.[71] As alterações metabólicas da obesidade são também mais
na ausência de perda de peso, o que sugere que as respostas psicossociais aos tratamentos prevalentes nas pessoas com doença psiquiátrica grave do que na população em geral, e
podem não depender inteiramente da perda de peso.[62] estudos recentes de vários países referem uma prevalência de 28,4% a 62,4%, em doentes
com esquizofrenia ou doença esquizoafectiva, respectivamente.[72]
São inúmeros os estudos que demonstram que os tratamentos para perda de peso resultam
numa redução dos sintomas de depressão e ansiedade, desconstruindo a ideia de senso Nas perturbações afetivas, particularmente na depressão, as alterações metabólicas relativas
comum de que estes tratamentos resultam no agravamento desses sintomas.[62–64] Tal não à obesidade são muito prevalentes (45%), assim como acontece na doença bipolar (37,8%).
significa, porém, que não possam ocorrer sintomas de disforia em algum momento ao longo [73]
desse tratamento.[65]
Os antipsicóticos predispõem a aumento de peso, chegando a ser melhor tolerados pelos
A literatura demonstra também, de forma consistente, que a perda de peso após tratamento doentes os efeitos secundários extra-piramidais do que o peso excessivo, que é bastante
para a obesidade está associada a uma melhoria da autoestima[62] e da assertividade, limitador do dia-a-dia. Os psicofármacos com maior impacto no peso são os neurolépticos
diminuição do distresse e da passividade, e presença de diagnóstico de perturbação sedativos e os antipsicóticos, quer os mais antigos como o haloperidol ou a clozapina, quer os
psiquiátrica menos frequente,[66] bem como a uma melhoria da qualidade de vida.[63] de segunda geração, como a risperidona e a olanzapina.[71]

Relativamente à satisfação com a imagem corporal, esta parece melhorar após a perda de No tratamento da depressão e da doença bipolar, o ganho de peso é um efeito colateral
peso nas pessoas com início da obesidade em idade adulta, mas o mesmo parece não se muito importante. No tratamento da doença bipolar, sendo efetuado ao longo de vários anos,
verificar quando esse início se dá na infância ou adolescência, sugerindo uma cristalização de o uso crónico de lítio ou valproato de sódio associa-se a aumento de peso. Com alguns anti-
uma imagem corporal negativa nestas últimas.[64] A investigação sugere que as mudanças depressivos, como é o caso da mirtazapina, é, também, frequente o aumento de peso sendo
no peso e na imagem corporal co-ocorrem durante o tratamento, influenciando-se, muito que o doente tem muita dificuldade em debelar este efeito iatrogénico do medicamento.[71]
provavelmente, de forma mútua.[67] Na doença bipolar, as opções por estilos de vida não saudáveis tendem também favorecer
o aumento de peso, particularmente quando não complementadas com tratamento nem
psicoeducação.

A problemática da obesidade nos doentes psiquiátricos

As alterações metabólicas da obesidade podem ser potencialmente preditivas para o


desenvolvimento de depressão quando são consideradas as anomalias neuroendócrinas TRATAMENTO PSIQUIÁTRICO:
e inflamatórias desta doença. No entanto, não são suficientemente conhecidos os aspetos SINTOMAS A CONTROLAR E PSICOFÁRMACOS A USAR
etiopatogénicos e patofisiológicos da depressão.[68]
A perturbação de ingestão compulsiva evolui habitualmente com elevados níveis de ansiedade
Por outro lado, o corpo na sua dimensão psicossomática de ligação estreita e recíproca com e stresse que levam a instabilidade ou mesmo desregulação do humor, frequentemente com
o psíquico acaba por sofrer as consequências do sofrimento psicológico, quer por exaustão, procura de acalmia na ingestão alimentar compulsiva. A falta de controlo na cessação deste
quer por inércia ou descuido. A apatia e a alteração do apetite das depressões graves e das comportamento é habitualmente seguida de auto culpabilização com anedonia, que por
psicoses, assim como os efeitos iatrogénicos dos psicofármacos, são fatores determinantes sua vez agrava o humor e aumenta o stresse na pessoa. O tratamento desta perturbação
da obesidade na população psiquiátrica.[69] implica portanto, a par da reestruturação dos hábitos alimentares, a estabilização do humor

60 61
e a redução da ansiedade, bem como a melhoria do padrão do sono, que quase sempre se adesão a padrões de alimentação e exercício físico saudáveis.[82,83]
encontra alterado, com insónia inicial ou intermedia. Destes despertares noturnos podem
resultar episódios de ingestão noturna que agravam o ciclo da patologia. A fundamentação teórica das abordagens comportamentais, cognitivo-comportamentais e das
terapias de 3ª geração utilizadas no tratamento da obesidade será oportunamente descrita,
Os medicamentos utilizados para a melhoria do humor são os inibidores selectivos da apresentando-se algumas das estratégias que podem ser usadas para atingir os objetivos da
recaptação da serotonina (ex: fluoxetina, fluvoxamina), em monoterapia ou associados a um intervenção. Cabe ao clínico procurar formação, treino e supervisão especializados para o uso
estabilizador do humor (ex: topiramato, lamotrigina). A melhoria do padrão do sono tem boa correto destas estratégias. Importa ainda salientar que a intervenção psicológica deve ser feita
resposta aos antidepressivos atípicos com ação ansiolítica (ex: trazodone). É desaconselhado no contexto do acompanhamento multidisciplinar, acompanhando as dificuldades da pessoa
o uso de ansiolíticos senão por curtos períodos, pelo risco de desenvolvimento de dependência. com obesidade nas consultas das restantes especialidades. Também, o clínico deve estar
atento a condições psicológicas que mereçam atenção clínica direcionada. Em particular, a
Na perturbação de ingestão compulsiva ou obesidade associada a doença bipolar, é mandatário presença de sintomatologia depressiva, ansiosa ou de ingestão alimentar compulsiva, entre
que primeiro se estabilize a perturbação bipolar antes de iniciar o acompanhamento cognitivo outras, são comuns entre indivíduos com obesidade e podem comprometer em grande
comportamental. Sem estabilização do humor não haverá adesão continuada ao processo medida a perda de peso.[84–86] Neste caso, deve o clínico solicitar apoio no sentido de uma
terapêutico, nem modificação consistente dos hábitos alimentares. Também neste caso deve ajuda focada na resolução destes problemas.
evitar-se medicação com ansiolíticos, pela dependência e tolerância a estes fármacos.

Objetivos da intervenção psicológica


INTERVENÇÃO PSICOLÓGICA NA OBESIDADE
Independentemente da abordagem terapêutica elegida pelo clínico, a intervenção psicológica
As intervenções com vista à comportamental do estilo de vida são recomendadas como o deve ter como objetivos centrais a promoção de uma alimentação regular e saudável e de
primeiro passo no tratamento da obesidade.[42] um estilo de vida ativo. A Tabela 1 reúne diferentes objetivos específicos que têm vindo a ser
identificados na literatura.
Porém, a eficácia destas intervenções parece ser modesta e resultar apenas em pequenas
alterações comportamentais.[74] A abordagem psicológica no tratamento da obesidade
pretende promover a adesão a estilos de vida saudáveis e a sua manutenção a longo-prazo.
A adesão a uma alimentação regular e saudável e a promoção de uma vida mais ativa são Tabela 1 – Descrição de objetivos de intervenção psicológica
pontos centrais da gestão de peso.[75,76] As estratégias usadas para este fim podem basear-
Objetivo Descrição
se em diferentes correntes da psicologia, sendo a literatura mais consistente no estudo e na
procura de evidência científica de estratégias cognitivo-comportamentais para a mudança de Promoção da motivação intrínseca para a perda de peso, ou
comportamento. Não obstante, a eficácia destas estratégias é limitada e a manutenção dos seja, a perda de peso enquanto um objetivo fundamental para
Desenvolvimento de motivação para
resultados a longo-prazo continua a ser um problema, pois uma grande maioria das pessoas melhorar a saúde e qualidade de vida do indivíduo e não ape-
a intervenção: motivação intrínseca
que perdem peso recuperam o peso perdido a longo-prazo. Efetivamente, a investigação nas para diminuir a discriminação, crítica dos outros ou diminuir
a insatisfação corporal.
mostra que cerca de 50% dos indivíduos que se envolveram num programa de perda de
peso não cirúrgico acaba por recuperar a totalidade do peso perdido, ou mais, num espaço Promoção de estratégias adaptativas de regulação emocional
de cinco anos.[77] Neste contexto, investigação mais recente tem vindo a salientar o papel de que permitam gerir o comportamento em função dos objetivos
Promoção de comportamento
abordagens alternativas que parecem complementar a intervenção psicológica no tratamento que se pretende alcançar e não em função das experiências
autorregulado
da obesidade. A Terceira vaga da Terapia Cognitivo-Comportamental inclui um conjunto de internas (pensamentos, emoções, impulsos). Desenvolver
modelos terapêuticos dos quais se destaca a Terapia da Aceitação e Compromisso (ACT),[78] competências de controlo de impulsos.
a Terapia Comportamental Dialética (DBT),[79] a Terapia Cognitiva baseada no Mindfulness
(MBCT)[80] e a Terapia Focada na Compaixão (CFT).[81] Estudos recentes têm vindo a
salientar a eficácia destas estratégias no tratamento da obesidade, comparando-a à das
abordagens comportamentais ou cognitivo-comportamentais no seu propósito de promover a

62 63
Estabelecimento de objetivos e expectativas realistas e Preparar e antecipar situações potenciais de recaída.
ajustados ao processo de perda de peso pessoal. Centrar Estabelecer um plano de manutenção dos resultados.
Prevenção de recaída
no estabelecimento de objetivos comportamentais e de ade- Promover motivação para a adesão a comportamentos
são a estilos de vida saudáveis. A perda de peso deverá ser alimentares e de exercício saudáveis a longo prazo.
Objetivos e expectativas realistas uma consequência da adesão às recomendações médicas/
nutricionais e a novos estilos de vida. O estabelecimento de
objetivos de perda de peso sob a forma de “um valor final”
deve ser evitado, sendo preferível a avaliação da trajetória
de perda de peso. Formulação teórica da abordagem terapêutica comportamental ou cognitivo-
comportamental no tratamento da obesidade
Compreender de que forma as emoções se associam à ingestão
Ingestão emocional exagerada e trabalhar estratégias para alterar o comportamento Enquanto a abordagem comportamental pressupõe a mudança de comportamentos, a teoria
em situações de emocionalidade elevada. cognitivo-comportamental foca, não só a mudança do comportamento alimentar ou de atividade
física, mas dá ênfase à mudança dos pensamentos que mantém estes comportamentos.[87] A
Resolução de problemas e gestão Treino de competências de resolução de problemas no dia-a-
abordagem comportamental segue orientações nutricionais e de exercício físico estruturadas
de stresse dia.
tendo em conta as recomendações para um estilo de vida saudável. A Teoria Cognitivo
Comportamental (TCC) pressupõe que os pensamentos da pessoa (a avaliação que faz da
Promoção de uma postura ativa no Promover uma atitude ativa no dia-a-dia e diminuir o envolvi-
situação) estejam intimamente relacionados com a forma como se vai sentir relativamente à
dia-a-dia mento em comportamentos sedentários.
situação e, consequentemente, com o seu comportamento. Deste pressuposto advém que,
trabalhando a forma como a pessoa interpreta a situação (modificando os seus pensamentos),
Facilitar o envolvimento em atividade física estruturada e a sua
Promoção de exercício físico poderemos desencadear também comportamentos mais ajustados. Estas estratégias devem
manutenção a longo-prazo.
ser utilizadas pelo clínico segundo a sua avaliação do caso, podendo completar-se ao longo
Facilitar escolhas alimentares saudáveis e o estabelecimento da intervenção.
Promoção de alimentação saudável de refeições regulares e o cumprimento das recomendações
nutricionais.

Identificação de comportamentos Identificação de problemas do comportamento alimentar e lidar


Estratégias TCC no tratamento da obesidade
alimentares problemáticos com situações alimentares difíceis.
Existem várias estratégias comportamentais e TCC que podem ser usadas. Aquelas que mais
Promover o desenvolvimento de uma alimentação mais tem vindo a ser estudadas na literatura estão descritas na Tabela 2.[76]
consciente e escolhas alimentares mais saudáveis, através
Promoção de um estilo alimentar
do treino de mindfulness que permite estar mais consciente
mais consciente (mindful)
dos estados emocionais e dos sinais fisiológicos de fome e Tabela 2 – Estratégias comportamentais e cognitivo-comportamentais no tratamento da
saciedade. obesidade

Promover a auto-estima, trabalhando o auto-conceito Descrição Exemplos


Promoção de imagem-corporal,
expandindo o sistema de avaliação pessoal, a forma como se
auto-estima, auto-conceito e auto- PSICOEDUCAÇÃO
lida com a imagem corporal, desenvolvendo o auto-cuidado
cuidado
pessoal. Educação do doente sobre os aspetos
psicológicos envolvidos no desenvolvimento
e manutenção do problema, com recurso a Ex: Devolução da formulação clínica do
Identificar pessoas centrais que representem diferentes tipos
informação sistemática, estruturada e didática, problema. Esclarecimento sobre a relação entre
de apoio (emocional, instrumental, informativo, companhia).
Apoio social e relações interpessoais com o objetivo de aumentar o conhecimento do pensamentos, emoções e sentimentos.
Promover a rede de suporte social. Gerir problemas
doente (e familiares) e esclarecer crenças/dúvidas
interpessoais.
frequentes.

64 65
AUTO-MONITORIZAÇÃO RESTRUTURAÇÃO COGNITIVA E DEBATE COGNITIVO

Registo de todos os eventos e do contexto Uso de auto-registos alimentares diários com Identificação de pensamentos desadaptativos
associado. O registo deve ser feito imediatamente identificação de: dia/hora; alimentos/bebidas; local; para a mudança de comportamento e promoção
Identificação de vieses de pensamento (ex:
depois o evento alimentar e em todos eles, companhia; grau de fome; planeamento anterior; de alternativas de pensamento mais funcionais. O
catastrofização, generalização, pensamento
evitando a recuperação de informação por contexto emocional/cognitivo/ situacional. doente percebe como os seus pensamentos influ-
dicotómico, etc..). Questionar a evidência, o que
recordação. Auto-registo de actividade física e de peso. enciam o seu comportamento, e como formas de
outros pensariam, pensamento colorido.
pensamento mais adaptativas facilitam a adesão
ESTABELECIMENTO DE OBJETIVOS a estilos de vida saudáveis.

Estabelecer objetivos realistas e os diferentes Objetivos SMART – Específicos; Mensuráveis;


passos/etapas a percorrer para os alcançar. Atingíveis; Relevantes; Temporizáveis.

REFORÇO
Alguns autores sugerem ainda que se estabeleçam estratégias para uma fase de manutenção
Lista de elementos reforçadores definida para de peso, a desenvolver depois da fase de perda de peso ativa. De acordo com estes autores
Identificação comportamentos/objetivos atingidos/ as estratégias mais pertinentes nesta fase estão descritas na Tabela 3.[76]
cada etapa/objetivo alcançada(o). Os objetivos
milestones a reforçar e dos respetivos elementos
devem ser comportamentais e não focados no
reforçadores, de forma a reforçar/aumentar ou
peso (“fazer exercício X vezes/semana por X
manter o comportamento desejado.
semanas” vs “pesar XX Kg”).
Tabela 3 – Estratégias comportamentais e cognitivo-comportamentais de manutenção de peso
CONTROLO DE ESTÍMULOS
Descrição Exemplos
Identificação de estímulos favoráveis e desfa- Facilitação de estímulos favoráveis e/ou elim- FACILITAR ACOMPANHAMENTO CONTINUADO
voráveis para o comportamento (alimentar/exer- inação/controlo dos estímulos desfavoráveis
cício físico) a promover/manter. (pessoas, atividades, contextos). Desenvolver formatos de acompanhamento Desenvolvimento de sessões mais esporádicas
continuado para a apoiar a manutenção e manter de longo-prazo. Uso de novas tecnologias para
RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS a motivação para comportamentos saudáveis. receber informação do progresso do doente.
Passos na resolução de problemas: Identificação
Estratégia mental que implica a identificação de ESTABELECIMENTO DE UM INTERVALO DE MANUTENÇÃO DE PESO E DE MONITORIZAÇÃO
e fracionamento do problema; criar soluções
problemas/obstáculos à alteração comportamen- DE PESO A LONGO PRAZO
alternativas (brainstorm); descrever e implemen-
tal, e a análise e teste de diferentes alternativas
tar o plano de resolução; avaliar os resultados e Alguns autores recomendam a pesagem
para resolver/facilitar o problema.
revisão da solução. frequente (ex. 1 vez por mês) para permitir a
Uma vez que a monitorização frequente de peso
interpretação de variação do peso ao longo do
ESTRATÉGIAS DE RELAXAMENTO E GESTÃO DE STRESSE está associada a melhor manutenção do mesmo,
tempo. Os doentes devem ser encorajado a
o comportamento de pesagem regular do peso
Treino de estratégias de relaxamento para serem manter o seu peso num intervalo de 2-3 Kg do
Respiração diafragmática, relaxamento muscular deve ser incentivado.
implementadas diariamente ou como recurso em seu peso a manter, para permitir a flutuação
progressivo, relaxamento imagético, etc… Gestão natural e expectável do peso.
situações de difíceis. Treino de competências
de tempo, assertividade, etc...
adaptativas de gestão de stresse. DESENVOLVIMENTO DE UMA POSTURA DE GESTÃO DE PESO A LONGO-PRAZO
COMPORTAMENTOS ALTERNATIVOS
Estratégias cognitivas para promoção de moti-
Projetar-se a 5-10 anos.
Ex: lista de atividades a por em prática nas vação interna para adesão a comportamentos
Definir objetivos comportamentais a longo-prazo,
Identificação de comportamentos adaptativos a situações difíceis (e.g. final do dia associado a saudáveis a longo-prazo. Desenvolvimento cola-
assim como estratégias para lidar com aumento
pôr em prática como alternativa ao comportamen- ingestão excessiva; refeições familiares) de modo borativo clínico-doente de um plano a longo-prazo
de peso acima de um limite definido.
to a mudar. a prevenir o envolvimento em comportamentos de manutenção das mudanças.
alimentares problemáticos. Adaptado de Dalle-Grave R, et al (2013)76

66 67
Terapias de 3ª geração no tratamento da obesidade (ACT) internas. O mindfulness promove o aumento da consciência dos estados emocionais e de
sinais fisiológicos de fome e saciedade, frequentemente ignorados,[92] fomentando uma
Tal como a TCC clássica, estas abordagens assentam na mudança comportamental. Não alimentação mais consciente e escolhas alimentares mais saudáveis.[91] Por outro lado, o
obstante, em vez de procurarem modificar ou eliminar a forma e conteúdo das experiências desenvolvimento da autocompaixão é fundamental para diminuir os níveis de vergonha e
internas (pensamentos, emoções, impulsos), estas novas abordagens pretendem alterar autocriticismo em pessoas com excesso de peso e obesidade, uma vez que estes estão
o modo como as pessoas se relacionam com essas mesmas experiências através do inequivocamente associados a um comportamento alimentar perturbado e a psicopatologia.
desenvolvimento de uma atitude de não julgamento, abertura e aceitação, promovendo o [93,94]
bem-estar e uma vida mais valorizada.[78]

De acordo com o modelo da ACT, as estratégias comportamentais clássicas existentes para a


perda de peso são fundamentais mas insuficientes para manter a longo-prazo a adesão a uma Tabela 4 – Descrição de estratégias terapêuticas de 3ª Geração
alimentação e estilo de vida saudáveis,[77] uma vez que não promovem o desenvolvimento
Descrição Exemplos
das competências psicológicas necessárias para lidar com o ambiente obesogénico em que
vivemos atualmente.[88] ACEITAÇÃO DA EXPERIÊNCIA INTERNA

Através do uso de metáforas e exercícios experienciais
Deste modo, estas abordagens pretendem ajudar os indivíduos a “mudar o que se pode
pretende-se que o doente compreenda a ineficácia das
mudar (comportamentos) e aceitar o que não se pode mudar”. Assim, mantém as estratégias Metáfora da areia movediça; Metáfora
tentativas de controlar ou suprimir experiências internas
comportamentais da TCC procurando alterar comportamentos pouco saudáveis e promovendo dos passageiros no autocarro;
negativas (pensamentos e emoções), uma vez que
ações comprometidas ao serviço de valores de vida e incluindo novas estratégias focadas Exercícios chinese finger traps
estas têm um efeito paradoxal, acabando por tornar as
no aumento da consciência, disponibilidade, tolerância e aceitação de todas as experiências experiências mais intensas, frequentes e duradouras e com
(internas), mesmo as desagradáveis e indesejadas.[89] De um modo geral, as intervenções maior influência no comportamento, limitando as escolhas.
baseadas no mindfulness e na aceitação pretendem ajudar os indivíduos a mudar o seu
comportamento alimentar, a desenvolver estratégias mais adaptativas para lidar com DESFUSÃO COGNITIVA
problemas emocionais e a desenvolver uma relação mais positiva, consciente e de aceitação
Aprender a olhar “para” os pensamentos em vez de
com a comida, alimentação e imagem corporal que, por sua vez, promovem mudanças “através” dos pensamentos, ou seja, reconhecendo-os
ponderais.[90,91] enquanto produtos impermanentes da mente e não como
a verdade ou factos. O doente é incentivado a abandonar
Exercícios: Nomear os pensamentos,
as tentativas de modificar ou eliminar os pensamentos,
levar a mente a passear, desfusão em
Estratégias terapêuticas de 3ª geração aprendendo a observá-los e a distanciar-se deles, sem ter
frente ao espelho
que lhes reagir automaticamente. O doente desenvolve
Para além das estratégias cognitivo-comportamentais acima descritas (por ex., psicoeducação, uma relação mais distanciada com o conteúdo das suas
auto-monotorização, controlo de estímulo, estabelecimento de objetivos, etc.), as terapias da experiências internas, de modo a que estas detenham uma
influência menor no comportamento.
3ª geração focam-se no desenvolvimento de um conjunto de competências fundamentais
para a adoção e manutenção de um estilo de vida saudável e de uma relação mais positiva MINDFULNESS
com a alimentação, imagem corporal e peso. Estas encontram-se descritas na Tabela 4.
No treino de mindfulness estão
Pretende-se desenvolver uma alimentação mais incluídas as práticas de meditação
Estas abordagens têm como objetivo o desenvolvimento de uma atitude de aceitação,
consciente através do desenvolvimento da capacidade formal (e.g., mindfulness da respiração,
disponibilidade e tolerância ao desconforto. Assim, o objetivo central da ACT é criar
de notar a experiência tal como ela é, sem julgar, e de body-scan) e informal (mindfulness de
flexibilidade psicológica, mostrando que as tentativas de controlar, modificar ou eliminar as
nos distanciarmos das nossas experiências internas (por atividades diárias), bem como práticas
experiências internas negativas (embora compreensíveis e lógicas) são parte do problema. exemplo: fome, impulsos para comer, cansaço) e externas especificamente focadas no treino
Assim, a aceitação surge como a única alternativa às estratégias de controlo ineficazes (ver e cheirar comida saborosa) sem necessitar de evitar, de uma alimentação mais consciente
e problemáticas. Ao ser mais flexível, ou seja, ao estar disponível e aceitar todas as suprimir ou reagir automaticamente às mesmas (o exercício da passa; comer em
experiências tal como elas se apresentam, é possível escolher livremente as ações, em vez mindfulness).
de estas serem excessiva e indevidamente influenciadas pelo conteúdo das experiências

68 69
FORMATOS DE INTERVENÇÃO/ACOMPANHAMENTO
TOLERÂNCIA AO DESCONFORTO

Pretende-se aumentar a disponibilidade e capacidade A intervenção psicológica na obesidade acontece tradicionalmente num formato individual,
para tolerar experiências internas negativas (e.g., impulsos Exercício eyes on; surfar na onda do sendo realizada por clínico especializado em intervenções psicológicas para a obesidade.
alimentares, emoções negativas e fadiga) que surgem impulso. Acontece, habitualmente, com uma frequência semanal (terapia cognitivo-comportamental),
quando se adotam comportamentos saudáveis. justificada pela necessidade de conseguir uma mudança comportamental e de padrão
CLARIFICAÇÃO DE VALORES DE VIDA
alimentar que conduza a perda de peso, bem como promova a rápida adesão dos doentes.
[95] Num ambiente de recursos limitados e dada a elevada prevalência de obesidade, as
Os valores representam direções de vida valorizadas,
intervenções grupais são também referidas na literatura como formas eficazes de intervenções
ou seja, são como uma bússola que indica o que é
na obesidade.[96] As intervenções grupais apresentam enormes vantagens, nomeadamente
verdadeiramente importante nas nossas vidas. Pretende-se
no que se refere à diminuição dos sentimentos de vergonha pela situação de excesso de
ajudar a pessoa a clarificar o que valoriza nas diferentes Exercício da pedra tumular; exercício
áreas da sua vida. Uma vez definidos os valores, são do 100º aniversário; plano da peso e obesidade, melhoraria das capacidades de interação social e sentimento de pertença
estabelecidos objetivos, identificados obstáculos e ações disponibilidade e da ação. a grupo. No entanto, envolvem também necessidades adicionais de manejo clínico por parte
concretas, específicas e atingíveis. Neste sentido, promove- do técnico, nomeadamente na sua capacidade em lidar com diferentes evoluções ao longo
se a motivação intrínseca para a mudança comportamental do trabalho em grupo, lidar com sentimentos de frustração e desenvolver a capacidade de
sustentada. perceber padrões individuais importantes na manutenção de padrões alimentares, muitas
(AUTO)COMPAIXÃO vezes difíceis de aceder na dinâmica grupal.

Pretende-se promover o desenvolvimento de uma relação Nos últimos anos, assiste-se a uma enorme proliferação de estudos e intervenções com
Exercícios: lugar seguro, pausa
interna baseada numa atitude de cuidado, suporte, gentileza recurso a novas tecnologias nos cuidados de saúde com bons resultados com diversas
compassiva, o “eu” compassivo, carta
e na coragem necessária para lidar com os momentos
compassiva. populações. Estas intervenções são muitas vezes designadas por e-health e incluem o
difíceis, através de exercícios de autocompaixão.
uso de tecnologias de comunicação, como a internet e a utilização de smartphones como
forma de intervenção, que facilitam a mudança comportamental e melhorias do estado de
saúde. Estas ferramentas permitem ainda complementar e, em alguns casos, substituir
as tradicionais abordagens face a face, com uma relação de custo eficácia otimizada. Os
programas de intervenção através da internet permitem a sua disseminação em larga escala,
Avaliação crítica integrativa o que, no contexto da intervenção psicológica na obesidade, apresenta um enorme potencial.
As novas tecnologias na saúde oferecem enormes vantagens na sua utilização, destacando-
As diferentes correntes descritas devem ser usadas pelo clínico em função da sua avaliação se a facilidade de utilização, a disponibilidade e acessibilidade, o baixo custo e a redução da
do caso e da sua preferência. Importa salientar que, embora estas correntes pareçam estigmatização na medida em que permitem a procura de tratamento de um modo anónimo.
abordar mecanismos diferentes e, por vezes, aparentemente contraditórios (ex., controlar Não obstante, existem também desvantagens que devem ser consideradas, nomeadamente
pensamentos vs aceitar emoções), a integração destas estratégias é possível. Numa questões de privacidade na utilização da internet ou a garantia de proteção de dados,
perspetiva de que devemos procurar “mudar o que se pode e aceitar o que não se pode redução do contato clínico-doente, contribuindo para um aumento da frustração em relação
mudar”, as abordagens comportamentais ou TCC auxiliam em grande medida na mudança ao tratamento no caso de intervenções ineficazes. Na área da gestão de peso e obesidade,
comportamental necessária, numa fase inicial, sendo que as abordagens de 3ª geração são vários os estudos e intervenções com base nas novas tecnologias que têm vindo a ser
permitem uma mudança no modo como a pessoa se relaciona com as experiências negativas, desenvolvidas. De acordo com Arem e Irwin (2011)[97], apesar do potencial das intervenções
que não podem ser controladas, de modo a promover a manutenção da perda de peso. Além através da internet na gestão do peso, esta forma de intervenção tem sido pouco utilizada sob
disso, promovem a motivação intrínseca para a manutenção das mudanças a longo prazo, a forma de intervenção empiricamente validada havendo necessidade de estudos adicionais
que tem sido apontada como uma limitação central das abordagens tradicionais sobre a sua eficácia. Um importante aspeto a considerar nas intervenções online na gestão
de peso referem-se ao elevado abandono da intervenção, com baixa adesão terapêutica,
o que obviamente coloca em causa o potencial clínico e de difusão de tratamento destas
intervenções. Por outro lado, a ampla difusão online de intervenções de gestão de peso não
testadas e pouco eficazes coloca questões no aumento da frustração com o tratamento para
a perda de peso, e possibilidade de recorrer a ajuda futura. Neve e colaboradores (2010)[98]

70 71
realizaram uma revisão sistemática em relação às intervenções baseadas na internet para a • A entrevista de avaliação deve abordar experiências pessoais associadas ao peso, características
perda e manutenção de peso, e chamam a atenção para a multiplicidade e variabilidade de de personalidade, psicopatologia atual e passada, motivação para o tratamento, padrões
alimentares, sistema de apoio interpessoal, etc…
componentes (por exemplo, auto-monitorização, prescrição de plano alimentar, prescrição de • O uso de instrumentos de auto-relato permite a avaliação de variadas dimensões do
atividade física, feedback, sessões de chat ou contacto via e-mail) incluídos em diferentes funcionamento psíquico, de forma rápida e de fácil administração.
programas de perda de peso, o que deve ser levado em consideração aquando da avaliação
da eficácia destas intervenções. • As alterações metabólicas da obesidade estão associadas ao desenvolvimento de psicopatologia.
• Os psicofármacos com maior impacto no peso são os neurolépticos sedativos e os antipsicóticos,
quer os mais antigos como o haloperidol ou a clozapina, quer os de segunda geração, como a
Apesar da investigação mostrar que as intervenções através das novas tecnologias risperidona e a olanzapina.
apresentam resultados para a perda de peso, os resultados são menos evidentes no que diz • Os medicamentos utilizados para a melhoria do humor são os inibidores da recaptação da
respeito a intervenções que visem a manutenção do peso perdido.[99] serotonina, em monoterapia ou associados a um estabilizador do humor.
• O padrão do sono tem boa resposta aos antidepressivos atípicos com ação ansiolítica.
• É desaconselhado o uso de ansiolíticos por períodos longos, tendo em conta o risco de
De acordo com o exposto ao longo deste capítulo, o papel do psicólogo e do psiquiatra no desenvolvimento de dependência.
tratamento da obesidade tem como objectivo a facilitação da mudança comportamental e • Na perturbação de ingestão compulsiva ou obesidade associada a doença bipolar, é mandatário
adesão às prescrições dos restantes profissionais. Para tal, existem diferentes técnicas que primeiro se estabilize a perturbação bipolar antes de iniciar o acompanhamento cognitivo
comportamental.
terapêuticas e de avaliação que o clínico pode escolher em função da sua preferência e da
sua avaliação do caso que se lhe apresenta. Poder-se-á, também, fazer uso de diferentes • As intervenções de modificação comportamental do estilo de vida são recomendadas como o
formatos de intervenção para facilitar a acessibilidade e disseminação da mesma. Psicólogos primeiro passo no tratamento da obesidade.
• As abordagens cognitivo-comportamentais e as terapias de 3ª geração têm-se assumido como
e psiquiatras devem, em todas as circunstâncias, trabalhar em conjunto com a restante equipa abordagens de referência no tratamento psicológico da obesidade.
multidisciplinar para o tratamento da obesidade • A abordagem comportamental pressupõe a mudança de comportamentos. A teoria cognitivo-
comportamental (TCC) foca a mudança comportamental, mas dá ênfase à mudança de
pensamentos que mantém estes comportamentos.
• As terapias de 3ª geração (como a ACT) pretendem alterar o modo como as pessoas se
relacionam com as suas experiências de vida através de uma atitude de não julgamento, abertura
e aceitação promovendo o bem-estar e uma vida mais valorizada.

• A intervenção psicológica pode ser conduzida em formato individual, grupal ou com recurso à
tecnologia.
SÍNTESE DAS RECOMENDAÇÕES MAIS IMPORTANTES DA ABORDAGEM • A utilização de programas de intervenção através de tecnologia permite a sua disseminação em
larga escala e a integração de uma multiplicidade de componentes.
PSICOLÓGICA/PSIQUIÁTRICA NO TRATAMENTO DA OBESIDADE

• O psicólogo tem como principal papel facilitar a mudança comportamental e a sua manutenção a
longo-prazo.
• Psiquiatra tem um papel fundamental no controlo dos quadros psiquiátricos habitualmente
associados à condição da obesidade, e que interferem na gestão de peso.

• Existe uma associação entre o excesso de peso e/ou obesidade e o humor depressivo ou
perturbação depressiva, perturbações da ansiedade e da alimentação.
• Existe uma associação com um funcionamento físico, social e sexual, autoestima e trabalho mais
pobre, com repercussões ao nível psicológico, social, familiar, do emprego/escola, etc…
• Existem consequências psicológicas decorrentes, em parte, de atitudes negativas e
comportamentos discriminatórios da sociedade em geral.

• Menos tentativas de perda de peso apresenta-se como o preditor pré-tratamento de maior


sucesso terapêutico mais consistente.
• Os factores mais importantes para o sucesso durante o tratamento incluem a presença de
motivações autónomas, maior auto-eficácia, competências autorregulatórias, restrição alimentar
flexível e imagem corporal positiva.
• Devem ser considerados como indicadores de sucesso ter comportamentos de saúde e saúde
mental positiva, imagem corporal, autoestima, confiança em si próprio, etc…

72 73
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78 79
CAPÍTULO VI

ABORDAGEM
NUTRICIONAL

80 81
ABORDAGEM NUTRICIONAL
INTRODUÇÃO

O excesso de peso resulta de uma acumulação anormal ou excessiva de gordura corporal.


Carla Pedrosa
Nutricionista
Esta condição, sobretudo quando atinge maior gravidade (obesidade), representa um risco
Serviço de Nutrição e Alimentação, Centro Hospitalar do Baixo Vouga EPE para a saúde, sendo o principal fator de risco para um conjunto de doenças crónicas, como a
Sociedade Portuguesa de Ciências da Nutrição e Alimentação
Diabetes Mellitus tipo 2, as doenças cardiovasculares e alguns tipos de cancro [1].

Bruno Sousa Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), mais de 50% da população europeia tem
Nutricionista excesso de peso (IMC > 25 kg/m2) e mais de 20% é obesa (IMC > 30 kg/m2) [2]. Em Portugal,
Serviço de Saúde da Região Autónoma da Madeira
Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias segundo os resultados do Inquérito Nacional de Saúde de 2014, mais de metade (52,8%,
correspondendo a cerca de 4,5 milhões de pessoas) da população residente com idade igual
Flora Correia ou superior a 18 anos tem um IMC correspondente a excesso de peso [3].
Nutricionista
Centro Hospitalar do São João O emagrecimento tem de ser acompanhado por modificações no estilo de vida, envolvendo
Faculdade de Ciências da Nutrição e Alimentação da Universidade do Porto
Sociedade Portuguesa de Ciências da Nutrição e Alimentação nomeadamente a alimentação saudável e a prática de exercício físico. Embora nem sempre
seja um processo rápido e fácil, sabe-se que uma perda ponderal de cerca de 10% é um
Fernando Pichel objectivo mais facilmente atingível, resultando na melhoria de diversos parâmetros clínicos [4].
Nutricionista
Serviço de Nutrição e Alimentação, Centro Hospitalar do Porto,E.P.E Assim, a intervenção nutricional / alimentar tem de ser realizada em todos os indivíduos com
excesso de peso ou obesidade. Esta deve ter em conta o estilo de vida, o seu ambiente familiar
José Camolas e social, o meio que o rodeia, entre outros aspectos que podem variar consideravelmente
Nutricionista
Serviço de Endocrinologia, Hospital de Santa Maria, CHLN
de indivíduo para indivíduo. As estratégias e terapêutica a implementar devem por isso ser
Laboratório de Nutrição, Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa individualizadas de modo a promover uma melhor adesão e consequente sucesso, com
ganhos em saúde para o doente [5,6]. Diferentes abordagens nutricionais são bem sucedidas,
Lia Vieira Jesus em diferentes graus, em indivíduos diferentes [7]. Além do valor energético, a distribuição
Nutricionista pelos macronutrientes, a seleção dos alimentos, a distribuição das refeições, e muitos outros
Serviço de Endocrinologia, Hospital de São Bernardo, Centro Hospitalar de Setúbal EPE
factores devem ser adaptados para tornar o plano alimentar mais adequado para o indivíduo.
Nenhuma dieta funciona de igual modo para todos [7].
Liliana Sousa
Nutricionista
Serviço de Nutrição, Unidade Local de Saúde de Matosinhos EPE Tão importante como o emagrecimento é a manutenção da perda ponderal atingida. Assim,
é importante que o indivíduo entenda que, à semelhança de outras doenças crónicas, na
Rui Poínhos obesidade a adesão à terapêutica e às mudanças implementadas deve-se manter de forma
Nutricionista sustentada. Essa é a chave para uma perda ponderal bem sucedida.
Faculdade de Ciências da Nutrição e Alimentação da Universidade do Porto

82 83
DIAGNÓSTICO Vantagens Limitações
Não requer literacia Depende da memória

AVALIAÇÃO ANTROPOMÉTRICA E AVALIAÇÃO DA COMPOSIÇÃO CORPORAL Não altera os hábitos alimentares Requer entrevistador treinado
Resposta aberta Dificuldade em estimar quantidades
A determinação dos parâmetros antropométricos e da composição corporal da pessoa com
obesidade é fundamental na definição das estratégias e terapêutica nutricional a instituir.
Esta avaliação deve ser realizada de acordo com os procedimentos anteriormente descritos O Diário Alimentar permite a recolha detalhada da ingestão alimentar de vários dias, com
(Capítulo III). descrição do consumo total de alimentos, por refeição, incluindo a confecção culinária [8,9].
Na tabela seguinte apresentam-se algumas vantagens e limitações deste método.

AVALIAÇÃO DA INGESTÃO ALIMENTAR

A avaliação da ingestão alimentar reveste-se de particular importância, fornecendo dados Vantagens Limitações
sobre o consumo alimentar / hábitos alimentares do indivíduo.
Existem vários métodos, nomeadamente Inquérito às 24 horas anteriores, Diário alimentar, Permite quantificar os alimentos Requer literacia
História alimentar e Questionário de frequência alimentar. A escolha do método depende da Não depende da memória Pode alterar os hábitos
capacidade intelectual/literacia do doente ou do prestador de cuidados, da motivação e da alimentares
precisão desejada, devendo ser efetuado por profissionais treinados para o efeito. Deve-se Resposta aberta Maior encargo
ter em atenção a existência de algumas limitações associadas, nomeadamente a perda da
memória, dificuldade de quantificação e diminuição da capacidade visual e auditiva [8,9].
Na recolha da informação sobre a ingestão alimentar é relevante ter em consideração:
O Inquérito às 24 horas anteriores é um método retrospectivo, que recolhe pormenorizadamente
toda a ingestão alimentar que o indivíduo fez nas últimas 24 horas. A quantificação poderá ser ‒ O horário e número das refeições;
realizada através da utilização de medidas caseiras, ou de modelos ou manuais de fotografias ‒ A quantidade de alimentos ingeridos;
de alimentos [8,9]. Na tabela seguinte apresentam-se algumas vantagens e limitações deste ‒ A composição das refeições, nomeadamente o tipo de sopa/acompanhamento
método. sobremesa/bebida e confecção culinária utilizada;
‒ A frequência de consumo de determinados alimentos/bebidas, nomeadamente:
‒ doces (pastelaria e confeitaria, entre outros);
‒ bebidas alcoólicas;
Vantagens Limitações
‒ refrigerantes/sumos;
Não requer literacia Depende da memória ‒ água;
‒ alimentos ricos em gordura (batatas fritas, rissóis, croquetes, folhados e
Não altera os hábitos alimentares Requer entrevistador treinado
outros);
Resposta aberta Dificuldade em estimar quantidades ‒ enchidos e fumados.
‒ Os alimentos preteridos;
‒ O comportamento alimentar (compulsão alimentar/fome/saciedade);
A História Alimentar é um método retrospetivo, utilizado para obter informações sobre o ‒ A existência de alergia/intolerância alimentar.
consumo alimentar habitual. Para a quantificação, podem ser utilizadas medidas caseiras
e modelos ou manuais de fotografias de alimentos [8,9]. Na tabela seguinte apresentam-se
algumas vantagens e limitações deste método.

84 85
BENEFÍCIOS DA TERAPÊUTICA NUTRICIONAL Tabela 1: Benefícios de intervenções nutricionais personalizadas (ensaios clínicos) em
indivíduos com peso excessivo, risco aumentado ou comorbilidades da obesidade.
Amostra Sumário dos resultados Ref.
O objetivo da terapia nutricional poderia resumir-se a inverter o balanço energético positivo DIABETES TIPO 2 Risco elevado de Redução de 58% (vs. placebo)
Finnish Diabetes Prevention diabetes tipo 2 na incidência de diabetes de
resultante de uma ingestão energética excessiva relativamente ao dispêndio, e o seu sucesso
Study tipo 2
ser aferido apenas pela variação ponderal. Em sentido estrito, sabemos que a redução de 15
- Follow-up médio: 3,2 anos
peso resulta da restrição energética imposta, independentemente da composição da dieta
- Redução média peso:
(i.e. da proporção de macronutrientes) [10]. Os fundamentos da intervenção nutricional e, 4,7±5,4%
naturalmente, os indicadores da sua eficácia, decorrem de um rigoroso exercício de integração
DIABETES TIPO 2 Risco elevado de Redução de 58% (vs. placebo)
da evidência científica e clínica. Neste desígnio, o objetivo de uma redução de peso relevante
Diabetes Prevention diabetes tipo 2 na incidência de diabetes de
e sustentável, não pode ser sinónimo da imprescindibilidade do atingimento do “peso ideal” a Program tipo 2 16
“qualquer custo”. - Follow-up médio: 2,8 anos
- Redução média peso: 5,6kg
O impacto da redução ponderal per si nos eventos cardiovasculares, foi avaliado no estudo HIPERTENSÃO ARTERIAL PAS <160mmHg e Redução de 5,5mmHg na PAS
Look AHEAD. Tratou-se de um estudo multicêntrico e aleatorizado, cuja pretensão foi avaliar Dietary Approaches to Stop PAD: 80-95mmHg e de 3,0mmHg na PAD 17
se a redução intencional do peso (pelo menos 7% do peso inicial) se traduzia numa diminuição Hypertension (DASH)
da morbilidade e da mortalidade cardiovascular em indivíduos obesos e diabéticos [11]. Os HIPERTENSÃO ARTERIAL PAS: 120-159mmHg e Redução na PAS de
resultados preliminares revelaram uma maior eficácia da abordagem intensiva (o grupo Dieta DASH + Restrição de PAD: 80-95mmHg 11,5mmHg em hipertensos e
18
controlo apenas recebeu apoio e educação), tanto na redução ponderal, como no controlo Sódio (<2,3g/dia) de 7,1mmHg em indivíduos
metabólico (controlo glicémico, da pressão arterial, do colesterol HDL e triglicéridos) [12]. sem HTA
Não obstante, o estudo foi terminado precocemente aos 9,6 anos de duração, com base no HIPERTENSÃO ARTERIAL Excesso de peso, Redução PAS: 16,1mmHg
critério de futilidade, com a conclusão de que a intervenção não reduziu a taxa de eventos Estudo ENCORE PAS: 130-159mmHg e e PAD: 9,9mmHg no grupo
19
cardiovasculares [13]. Estes resultados justificam a incerteza, relativamente à relevância da (Dieta DASH + redução PAD: 85-99mmHg DASH + RP
redução ponderal como objetivo terapêutico primordial e são sugestivos de que os benefícios peso) - Redução 8,7kg DASH+RP
das intervenções mais abrangentes no padrão alimentar transcendem o benefício decorrente EVENTOS CARDIOVAS- DM2 ou pelo menos Redução de cerca de
do impacto no peso corporal. Note-se, inclusivamente, que mesmo nos casos mais extremos, CULARES 3 fatores de risco 30% no risco de eventos
nomeadamente nos processos de avaliação para tratamento cirúrgico da obesidade, é PREDIMED (Dieta mediter- (tabaco, HTA, LDLc cardiovasculares nos braços
exigido ao clínico que esclareça o utente relativamente aos pressupostos de uma alimentação rânica) elevado, HDLc baixo, de intervenção (vs. dieta 20
saudável e do seu potencial impacto no sucesso do procedimento terapêutico [14]. A excesso de peso, controlo)
história familiar de - HR: 0.51 (0.37–0.71) no
complexidade fisiopatológica da obesidade faz com que um suporte nutricional personalizado
doença coronária. subgrupo com obesidade
se possa traduzir em ganhos em saúde significativos (Tabela 1) com reduções pequenas a
moderadas do peso corporal. PAS: Pressão arterial sistólica; PAD: Pressão arterial diastólica; HTA: hipertensão arterial; RP:
Redução de peso; HR: Hazard ratio

Tendo em consideração o objetivo da redução de 10% do peso inicial e a sua manutenção


durante pelo menos 1 ano, cerca de 20% dos indivíduos são bem sucedidos a longo
prazo [21]. Enquanto referencial modulador do discurso e dos contornos da intervenção, é
fundamental a adequação das expectativas, relativamente à redução ponderal desejável, Resumindo, no que respeita à questão dos referenciais para avaliação do sucesso
tanto para os indivíduos com obesidade, como para os profissionais de saúde. Importa terapêutico no excesso de peso e na obesidade, será necessário ter em conta as
desmistificar as expectativas irrealistas, no que concerne aos resultados passiveis de seguintes questões:
serem obtidos, de forma segura e sustentável [22]. a) considerando que os efeitos nefastos para a saúde individual aumentam com
o grau de sobrecarga ponderal, a própria manutenção do peso pode ser aceite
como critério de sucesso [1];

86 87
b) existe evidência de que, mesmo quando são inferiores a 10% do peso inicial, • Dieta de alto teor proteico (25% do VET em proteína, 30% do VET em gordura e 45%
as reduções de peso sustentadas se traduzem em benefícios significativos do VET em hidratos de carbono), com restrição de energia prescrita.
relativamente às comorbilidades [16,19,23];
• Dieta com baixo teor de hidratos de carbono (inicialmente <20 g/dia de hidratos de
c) uma redução sustentada de 5 a 10% do peso inicial pode ser considerada “a carbono), com restrição de energia prescrita.
meta” inicial, no que respeita ao sucesso terapêutico das intervenções não
cirúrgicas direcionadas à redução ponderal, ainda que reduções suplementares • Dieta de baixo teor de gordura (20% do VET), com restrição de energia prescrita.
possam ser equacionadas depois de aquela ter sido atingida [21];
• Dieta do tipo High-protein Zone ™ (5 refeições/dia, cada com 40% do VET em
d) sobretudo nos casos de obesidade severa, a meta do “peso ideal” será uma hidratos de carbono, 30% do VET em proteína e 30% do VET em gordura), com
utopia para a maioria dos indivíduos, pelo que, tê-lo como objetivo pode restrição de energia prescrita.
contribuir para a multiplicação das tentativas frustradas de perda peso, com
consequências profundamente nefastas a nível físico (i.e. deterioração da • Dieta Ovo-lacto-vegetariana, com restrição de energia prescrita.
composição corporal, com agravamento da relação massa gorda/massa
magra) e psicológico (i.e. reforço da auto-perceção de incapacidade, redução • Dieta Vegetariana com baixo teor de gordura (10% a 25% do VET), com restrição
da perceção de autoeficácia e da autoestima)[1]. de energia prescrita.

• Dieta Mediterrânica, com restrição de energia prescrita.

• Etapa 1 da Dieta da American Heart Association (restrição de energia prescrita - 1500


a 1800 kcal / dia, <30% do VET em gordura, <10% do VET em gorduras saturadas).
TERAPÊUTICA NUTRICIONAL PARA A PERDA DE PESO
E MANUTENÇÃO DO PESO

DIETA EQUILIBRADA
As recomendações para o suprimento das necessidades nutricionais estão definidas e
publicadas por diversas sociedades científicas e entidades oficiais de saúde de diversos
Uma dieta equilibrada considera as características do indivíduo, como idade e estádio países.
de desenvolvimento, preferências de gosto e hábitos alimentares, práticas culturais Qualquer um dos seguintes métodos pode ser usado para reduzir a ingestão de alimentos e
e tradições familiares, e condições socioeconómicas.  Depende da disponibilidade de de energia [26,27]:
alimentos e instalações de armazenamento e preparação.  Inclui a energia e todos os
nutrientes em quantidades e proporções adequadas [24]. Assim, de acordo com o Food a) Prescrição de 1200-1500 kcal/dia para mulheres e 1500-1800 kcal/dia para
and Nutrition Board (FNB) do Institute of Medicine (IOM), deve ser feita uma escolha homens (os valores do VET geralmente são ajustados para o peso corporal do
variada de alimentos, de forma a fornecer quantidades adequadas de nutrientes cujos indivíduo); ou
efeitos biológicos podem influenciar a saúde e suscetibilidade à doença [25].
b) Prescrição de um défice de energia de 500 kcal/dia ou 750 kcal/dia; ou
Actualmente existem diversas abordagens que podem produzir perda ponderal em
adultos com excesso de peso e obesidade. Enumeram-se em seguida algumas destas c) Prescrição de dieta baseada em evidências que restrinjam certos tipos de alimentos
[26,27]: (como alimentos ricos em hidratos de carbono, pobres em fibra alimentar ou com alto
teor de gordura) que promovam um défice de energia por diminuição da ingestão
• Distribuição por macronutrientes (15% ou 25% do Valor Energético Total (VET) em alimentar.
proteína; 20% ou 40% do VET em gordura; 35%, 45%, 55%, ou 65% do VET em
hidratos de carbono) com restrição de energia prescrita.

88 89
Devem-se ter em conta os seguintes requisitos: Assim, como referido para os hidratos de carbono, os seus efeitos potencialmente prejudiciais
relacionar-se-ão, sobretudo, com a sua contribuição para a densidade energética dos
- Valor Energético: deve promover um balanço negativo, em que a ingestão energética total alimentos que integram e por contribuírem significativamente para uma maior apetência para o
é inferior à energia dispendida. consumo eventualmente excessivo dos mesmos. Contudo, devem ser incluídas quantidades
moderadas de gorduras vegetais (fontes de gordura maioritariamente insaturada) [28].
- Macronutrientes

Proteínas: - Micronutrientes:

O suprimento das necessidades proteicas para adultos varia entre os 0,8 g/kg/dia a 1,5 g/kg/ Uma dieta com valores energéticos inferiores a 1800Kcal por dia pode não suprir as
dia, sendo que consumos proteicos equivalentes ao dobro do aporte mínimo aconselhado não necessidades nutricionais recomendadas, quer pelas Reference Daily Intake (RDI), quer pelas
estarão associados a riscos acrescidos. No entanto, consumos muito elevados, na ordem de Recommended Dietary Allowances (RDA). Assim, é importante ter em atenção o equilíbrio
3-4 vezes o aporte mínimo indicado, podem estar muito próximos do máximo tolerável e, por nutricional da dieta, evitando a restrição excessiva de um ou mais grupos alimentares. Como
isso, acarretar riscos para a saúde [28]. tal, no sentido de minorar o risco de défices de micronutrientes, estas dietas devem ser
No que respeita ao contributo das proteínas para a ingestão energética global, as proporções elaboradas por um nutricionista [27,29].
habitualmente apontadas são de 10 a 15% do VET. Esta proporção poderá ser excessivamente
conservadora, principalmente quando se prescrevem dietas hipoenergéticas (sobretudo nas
de mais reduzido valor energético), pelo que as recomendações atuais variam entre 10 e os - Número de Refeições
25% do VET [28,29].
Uma das características potencialmente relevantes do padrão alimentar é a distribuição das
refeições ao longo do dia. Sendo este um dos postulados mais discutidos para o controlo
Hidratos de Carbono: do peso, o fracionamento alimentar é habitualmente proposto como estratégia favorável
à redução ponderal e respetiva manutenção [28]. Em teoria, o fracionamento da ingestão
O aporte mínimo recomendado é de 130 gramas de hidratos de carbono por dia, quer para alimentar promove o aumento do metabolismo basal, reduz a sensação de “fome” (regulando
o sexo masculino quer para o feminino, para a faixa etária superior aos 19 anos de idade o binómio apetite/saciedade) e melhora o controlo metabólico, fatores que beneficiariam a
[29]. Ponderados os potenciais impactos no peso corporal, morbilidade e mortalidade, as regulação do peso corporal [31].
referências propostas pela EFSA de 45-60% do VET (30), e pelo FNB de 45 a 65% do VET
[25], serão adequadas para indivíduos com excesso de peso ou obesidade. Num estudo realizado em homens adultos saudáveis, foi demonstrado que o fracionamento
das refeições pode contribuir para um maior controlo da ingestão alimentar nas refeições
O tipo de hidratos de carbono e/ou as características dos alimentos devem ser tidos em subsequentes [32]. Ainda assim, a associação inversa entre o número refeições e a obesidade,
consideração. Assim, no que concerne aos hidratos de carbono refinados e açúcares, os pode representar um fenómeno de causalidade reversa, i.e., o facto de os indivíduos com
seus efeitos potencialmente prejudiciais relacionar-se-ão, sobretudo, com a sua contribuição peso excessivo suprimirem refeições com o intuito de perder peso [28].
para a densidade energética dos alimentos que integram e por contribuírem significativamente O número de refeições aconselhado é de 3 refeições principais (Pequeno Almoço, Almoço
para uma apetência para o consumo eventualmente excessivo dos mesmos. Assim, o seu e Jantar) e 2 a 3 merendas intermédias (Meio da Manhã, Lanche e Ceia) de acordo com os
consumo deve ser inferior a 10 % do VET. Em contrapartida, parece fundamentada a inclusão gostos, hábitos alimentares, horários laborais e rotinas de vida [28,29].
nos planos alimentares de cereais completos, frutos, hortícolas e leguminosas, enquanto
alimentos fornecedores de hidratos de carbono com maior densidade nutricional [25,28,30]
- Roda dos Alimentos

Gorduras: A utilização da Roda dos Alimentos como um material didático de referência, é adequada
quer para aconselhamento alimentar quer para o cumprimento de uma dieta equilibrada. Está
O aporte recomendado para as gorduras é de 20-35% do VET. Adicionalmente é necessário desenvolvida de modo a que sejam suprimidas as necessidades nutricionais, de acordo com
ter em consideração as características dos alimentos fornecedores da gordura e as as RDIs e RDAs, definindo um intervalo de porções (mínimo e máximo) recomendado e cujo
características bioquímicas das mesmas [29,30]. aporte energético diário varia entre 1300Kcal a 3000Kcal, sendo a quantidade intermédia

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correspondente a um plano alimentar de 2200Kcal [33]. Uma das vantagens apontadas a estas dietas é o facto de a sua composição ser exacta e
invariável, ou seja, conhece-se exactamente a composição nutricional da refeição. No entanto,
são descritas como desvantagens uma má relação custo/benefício, sendo possível conseguir
a mesma composição e, como tal, os mesmos resultados, recorrendo a alimentos comuns.
A dieta equilibrada é aquela que garante o fornecimento de nutrientes, quer macro quer
micronutrientes, de modo a suprir as necessidades do indivíduo. Deve fornecer no mínimo
0,8 g/kg/dia de Proteína e 130 g/dia de Hidratos de Carbono. A distribuição energética dos Para além disso, são conhecidas diversas contra-indicações ao seu uso, nomeadamente:
macronutrientes deve situar-se nos intervalos de 10 a 25% do VET para Proteínas, 25 a 35%
do VET para Gorduras e 45 a 65% do VET para Hidratos de Carbono.
• Infância, adolescência, gravidez, aleitamento e idade geriátrica;
Deve-se seguir um padrão alimentar que garanta a escolha de alimentos mais “saudáveis”,
seguindo como exemplo o padrão mediterrânico e servindo-se da roda dos alimentos como
material didático de apoio.
• Antecedentes de doença psiquiátrica ou alteração severa do comportamento
Esta dieta deve ser elaborada e o seu seguimento acompanhado por um profissional de saúde (alimentar, alcoolismo e/ou abuso de drogas);
de nutrição, preferencialmente com competências especificas na área da obesidade.
• Condições clínicas: insuficiência renal, cardíaca ou hepática; Diabetes Mellitus tipo
1, doença cerebrovascular, angina instável, enfarte agudo do miocárdio recente;

• IMC inferior a 30 kg/m2.

RESTRIÇÃO ENERGÉTICA: DIETAS DE BAIXO VALOR


ENERGÉTICO E DIETAS DE MUITO BAIXO VALOR ENERGÉTICO
Outra questão muitas vezes reportada é o facto de apesar de as DMBVE induzirem perdas
A obesidade é considerada uma doença crónica, pois “é uma doença de longo curso, de peso de cerca de 15 a 20% em 12 a 16 semanas de tratamento, esta perda de peso
frequentemente associada à incapacidade ou à ameaça de complicações graves que reduzem geralmente não ser mantida [36].
assim a qualidade de vida dos doentes” [34].
Como já referido, estas dietas pretendem produzir perda de peso rápida, tentando preservar a
Ao longo dos anos têm sido várias as abordagens desenvolvidas para proporcionar uma massa não gorda. Isto é conseguido fornecendo grande quantidade de proteína, tipicamente 70
perda de peso nesta população específica. Nesta secção vamos dedicar-nos a reflectir um a 100 g/dia ou 0,8 a 1,5 g por quilo de peso corporal correspondente à normoponderabilidade
pouco sobre as dietas de baixo valor energético (DBVE) ou de muito baixo valor energético [37]. A proteína pode ser obtida a partir de um pó à base de ovo, leite, e soja, que é misturado
(DMBVE). Estas dietas começaram a ser usadas nos anos 70 do século passado com a com água e consumido como dieta líquida. Fornecem até 80 g de glícidos e 15 g de gordura
intenção de induzir uma rápida perda de peso, tendo a sua popularidade aumentado muito por dia e incluem 100% da dose diária recomendada de vitaminas e minerais essenciais
nos Estados Unidos a partir de 1988. Posteriormente, a moda para a utilização deste tipo de [38,39].
dietas alargou-se, tendo passado para a Europa, onde ainda hoje são largamente usadas.
Quer as DBVE quer as DMBVE requerem que os doentes façam uma ingestão abundante de
Como se definem então estas dietas? Foi convencionado por um painel de especialistas nesta água; em particular, no que respeita às DMBVE os doentes obrigatoriamente devem ingerir 2
área do National Heart, Lung, and Blood Institute (NHLBI) defini-las da seguinte forma [4,35]: litros por dia de líquidos não energéticos [37].

Uma questão que se coloca com a utilização destas dietas é que, eventualmente, o valor
• DBVE contêm 800 a 1500 kcal/dia e são geralmente fórmulas líquidas ou em
energético pode não atingir as necessidades mínimas relativas ao metabolismo de repouso
barras em combinação com a comida tradicional ou a combinação destas três
do indivíduo, acarretando graves prejuízos metabólicos. Assim, há quem defina DMBVE com
possibilidades;
base no valor de energia correspondente a 50% do metabolismo de repouso do indivíduo
em causa [40]. Obviamente que prejuízos metabólicos podem acontecer na mesma, mas a
• DMBVE contêm 450 a 800 kcal /dia e são geralmente hiperproteicas (70 a 100 g/dia)
sua ocorrência e gravidade será diferente caso a dieta forneça 450 ou 800 kcal/dia para um
e com baixo teor em gordura (< 15 g/dia). Estas dietas são consumidas sob a forma
indivíduo cujo metabolismo de repouso seja de 1600 kcal. Para que fique clara a necessidade
de fórmulas líquidas e barras.
de um cuidado extremo aquando da utilização deste tipo de tratamentos é útil recordar a

92 93
proporção do gasto energético de repouso pelos diversos órgãos no adulto, e que evidencia DIETAS “DA MODA”
os potenciais riscos associados a aportes energéticos inferiores a esse valor (Tabela 1).

Dieta Cetogénica
Tabela 1 – Proporção do gasto energético de repouso (Adaptado de (40))
A dieta cetogénica tem sido usada desde 1921 como protocolo anti convulsionante no
tratamento da epilepsia [45]. Esta terapêutica define-se como um regime alimentar rico
Órgão Gasto energético de repouso (%)
em lípidos e pobres em hidratos de carbono e proteínas que tem como objectivo induzir
a cetose (considerada como cetonemia >1.5 mM ou cetonúria >80 mg/dl), aumentando a
Fígado 29
concentração de corpos cetónicos no sangue através da via metabólica da 3–hidroxi–3-
Cérebro 19 metilglutaril CoA. O acetoacetato, ß-hidroxi-butirato e acetona são posteriormente usados
Coração 10 pelo fígado como substrato energético. A dieta Cetogénica “Clássica” consiste em 4 partes de
Rim 7 lípidos, maioritariamente triglicéridos de cadeia longa, e 1 parte de hidratos de carbono e de
Músculo esquelético (em repouso) 18 proteínas (ou seja, um rácio de 4:1). Este rácio pode ser modificado em função dos resultados
alcançados pelo doente e da sua capacidade cetogénica, sendo também comum um rácio
Restantes 17
de 3:1. Assim, diversas variantes desta dieta têm sido testadas de forma a melhorar quer a
eficácia quer os efeitos secundários deste tratamento [46,47].

Doentes em programas de DMBVE com supervisão médica nos Estados Unidos são
Estudos recentes relacionam o uso desta dieta com o tratamento de cancro, diabetes,
monitorizados por um médico em cada 2 semanas durante o período de perda de peso
síndrome de deficiência em GLUT-1 e obesidade [47]. No que diz respeito à perda de peso,
rápida (isto é, 1,5 a 2,5 kg por semana). Durante esse período, correm o risco de litíase biliar,
alguns estudos referem que a perda de peso é maior nos indivíduos sujeitos a dietas pobres
intolerância ao frio, alopecia, cefaleia, fadiga, tonturas, depleção de volume (com alterações
em hidratos de carbono e proteína, sendo que estes resultados perdem evidência científica
electrolíticas), cãibras musculares e obstipação [37,41-43].
a longo prazo quando comparados após 2 anos com indivíduos sujeitos a dietas pobres
em gordura. De realçar que a taxa de abandono e a percentagem de efeitos secundários
Parretti e colaboradores [44], na sequência de uma revisão sistemática da literatura, sugerem
(problemas gastro-intestinais tais como dor abdominal, diarreia) nos indivíduos sujeitos a
que as DBVE devem ser usadas para tratar a obesidade somente quando se pretende uma
estas dietas é grande [48].
perda de peso rápida, salientando a preocupação com a recuperação rápida do peso perdido.
As diferenças nos resultados do uso destas dietas não apresentam a magnitude que seria de
esperar. Os autores analisaram ensaios em que a intervenção incluiu um grupo que utilizava
Dietas “Low Carb”
as DBVE e um grupo onde não se verificou esta utilização e, embora a perda de peso seja
superior nos doentes que usaram as DBVE, as diferenças médias foram de apenas 3,9 kg ao
A relação entre os hidratos de carbono (HC) e a obesidade baseia–se no facto de a ingestão
fim de 12 meses e 1,4 kg ao fim de dois anos.
em grande quantidade deste nutriente se relacionar com hiperinsulinemia e aumento da
massa gorda [49]. A estratégia de reduzir a percentagem deste macronutriente já remonta
No entanto, e sendo esta também a opinião de vários autores, a questão mais importante
a 1972 com a criação da famosa “dieta de Atkins” em que se limitava a ingestão de HC a
e transversal na utilização destas dietas é que não permitem uma verdadeira educação
≤ 20% do valor energético diário tendo como limite máximo 100-125 g de HC /dia [50]. O
alimentar, que permita a manutenção da perda de peso e dos ganhos para a saúde associados
fundamento desta dieta será a promoção da rápida perda de peso, à custa de perda de água
de forma sustentada.
associada à diminuição dos HC ingeridos, e a diminuição de apetite originado pela cetose [51].
Investigações que relacionam dietas pobres em HC com a diminuição de peso referem que os
resultados na perda de peso se atenuam após 12 meses (pouca adesão a longo prazo) e a
que a perda de peso é semelhante a outras estratégias alimentares (dietas pobres em gordura
e dieta Mediterrânica) [52]..

94 95
Dieta do Paleolítico cumprimento das doses diárias recomendadas de nutrientes e colocando esta população,
já malnutrida, em risco de desnutrição [61]. Outros fatores potencialmente contribuidores
A dieta do Paleolítico tenta simular a dieta praticada pelos indivíduos que viviam no terão a ver com as alterações metabólicas, o estado de inflamação crónica e o sedentarismo
Paleolítico e consiste na ingestão de carne magra, peixe e marisco, fruta, vegetais, ovos, associados a esta situação clínica [58].
frutos oleaginosos e sementes. Exclui tubérculos, cereais e leguminosas, produtos lácteos,
alimentos processados, açúcares refinados e sal. A percentagem de proteína existente nesta Existe, no entanto, um paradigma que se prende com a hipótese de alguns défices nutricionais
dieta é ligeiramente superior à recomendada para população geral o que poderá ter benefícios poderem ser não o resultado, mas sim uma potencial causa da obesidade [62,63]. Diversos
em termos de saciedade e desse modo ser usada como estratégia no que diz respeito à perda estudos indicam que níveis insuficientes de determinados micronutrientes no organismo
de peso. A eliminação dos tubérculos, cereais e leguminosas torna este tipo de dieta de difícil podem estar associados ao aumento da acumulação de gordura corporal. Essas mesmas
adesão [53]. deficiências exercem prejuízo sobre uma série de funções fisiológicas, comprometem o
sistema imunitário e aumentam o risco de comorbilidades. Existem ainda indícios de que estes
Alguns estudos a curto prazo mostram benefícios no que diz respeito a “biomarcadores” como défices possam promover o balanço energético positivo, sempre que o consumo energético é
HbA1c e triglicéridos, no entanto a evidência científica a longo prazo é insuficiente [54,55]. superior ao gasto. Os micronutrientes mais estudados, a este nível, são as vitaminas A, C e D
e ainda o cálcio, o ferro, o magnésio e o zinco [60,62,64-69].

Dieta sem glúten De uma forma geral, as vitaminas são necessárias quer como transportadores quer como
cofatores importantes nos diversos processos metabólicos, assumindo-se, de acordo com
A dieta sem glúten é determinante no tratamento da doença celíaca, excluindo todos os cereais este pressuposto, que a ingestão adequada destes micronutrientes poderá constituir uma
contendo glúten ou outros alimentos contaminados com esta proteína. Evidências recentes medida preventiva para reduzir a elevada prevalência de obesidade [60,70]. Serão, no
sugerem que o glúten poderá ter um papel importante e desencadeador de sintomatologia entanto, necessárias mais pesquisas para confirmar esta hipótese [64].
gastrointestinal em indivíduos com intolerâncias, sensibilidades e alergias mas sem doença
celíaca [56]. No que diz respeito ao cálcio, acredita-se que a deficiência neste mineral aumenta o risco de
obesidade [64], havendo estudos epidemiológicos e em animais que associam a ingestão de
Apesar de não existirem estudos científicos que suportem vantagens ou desvantagens no cálcio à perda de peso [62,65]. Quanto ao ferro, a sua deficiência pode estar associada à baixa
uso deste tipo de dieta, a eliminação desta proteína por parte da população em geral tem sido ingestão [70], aliada a necessidades aumentadas em função da inflamação crónica associada
utilizada nos últimos anos como fazendo parte de um estilo de vida “gluten-free”. Trabalhos à obesidade [66]. O défice em magnésio está relacionado com diversas comorbilidades
que tiveram por objectivo estudar a associação entre o consumo de dietas sem glúten e a comuns a esta doença, como a hiperglicemia, a hipertensão arterial, a hipertrigliceridemia e
diminuição de IMC e/ou perímetro da cintura não obtiveram resultados suficientemente fortes a resistência à insulina [65], levantando-se a hipótese de uma eventual relação causal entre
[57]. o défice deste mineral e a obesidade. No que respeita ao zinco, parece ser reconhecida a
associação entre a sua deficiência e a redução na concentração de leptina [60,68,69]. Este
oligoelemento, como cofator de inúmeros processos metabólicos, parece também ter uma
relação direta com o processo inflamatório [69]. Estudos realizados em animais indicam ainda
que o défice em zinco pode levar à redução da massa magra corporal e ao aumento da
DESNUTRIÇÃO NA PESSOA COM OBESIDADE gordura, fatores de risco para a instalação da obesidade [60,68,69].

A obesidade associa-se com frequência a estados de desnutrição, que maioritariamente Finalmente, existem ainda alguns estudos que sugerem que a desnutrição proteica durante
atingem as reservas corporais proteicas e de micronutrientes [58,59]. a infância e a idade jovem programa o metabolismo para favorecer o desenvolvimento da
obesidade em adulto [63].
Sendo, na generalidade dos casos, o resultado de uma ingestão energética excessiva [58,60],
quase parece paradoxal [58] que entre obesos seja comum um estado de défice nutricional. Independentemente de a desnutrição poder constituir causa ou consequência da obesidade, o
É, porém, consensual que o aumento exponencial verificado nos casos de obesidade a nível mais importante será, acima de tudo, a reflexão sobre o estado atual da população [58,62,70].
mundial nos últimos anos se deve a alterações nos padrões alimentares de consumo, que Torna-se assim urgente o combate à fome na abundância.
se caracterizam por um aumento da ingestão de alimentos processados [60], de elevada
densidade energética [58,60] e baixa qualidade nutricional [58,61], conduzindo assim ao não
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COMENTÁRIOS FINAIS Referências Bibliográficas

As modificações no estilo de vida, nomeadamente uma alimentação saudável e a prática de


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acompanhados por um nutricionista. As estratégias e a terapêutica nutricional a implementar
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As DBVE e as DMBVE são muitas vezes utilizadas com o intuito de obter uma rápida perda de 9. Lee RD, Nieman DC. Nutritional Assessment. 4th ed. New York: McGraw-Hill Companies, 2007.
peso. Porém, além de o peso perdido ser rapidamente recuperado, estas dietas apresentam
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diversas contra-indicações e efeitos laterais.
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and the evidence supporting it. Obesity (Silver Spring). 2006 May;14(5):737–52.
“famosas”, tais como a dieta cetogénica, a dieta low-carb, a dieta sem glúten, ou mais
recentemente a dieta do paleolítico, entre outras. A maior parte destas consiste na restrição 12. The Look AHEAD Research Group. Long Term Effects of a Lifestyle Intervention on Weight and
Cardiovascular Risk Factors in Individuals with Type 2 Diabetes: Four Year Results of the Look AHEAD
marcada de alimentos ricos em hidratos de carbono com o objectivo de uma rápida perda Trial. Arch Intern Med. 2010;170(17):1566–75.
de peso. São geralmente de difícil adesão, desequilibradas, e o peso perdido é rapidamente
13. Wing RR, Bolin P, Brancati FL, Bray G a, Clark JM, Coday M, et al. Cardiovascular effects of intensive
recuperado.
lifestyle intervention in type 2 diabetes. N Engl J Med. 2013; 369(2):145–54.

A obesidade é um estado de malnutrição, ao qual acresce ainda o risco de desnutrição 14. Direcção-Geral da Saúde. Boas práticas na abordagem do doente com obesidade elegível para
cirurgia bariátrica. Vol. 2. 2012.
associada à ingestão excessiva de alimentos processados, de elevada densidade energética e
baixa qualidade nutricional, que conduz ao não cumprimento das doses diárias recomendadas 15. Tuomilehto J, Lindstom J, Eriksson J, Valle T, Hämäläinen H, Ilanne-Parikka P, et al. Prevention of Type
2 Diabetes Mellitus by Changes in Lifestyle Among Subjects With Impaired Glucose Tolerance. N Engl
de nutrientes. O défice de vitaminas A, C e D, bem como de cálcio, ferro, magnésio e zinco são J Med. 2001;344(18):1343–50.
dos mais descritos nesta população.
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102 103
CAPÍTULO VII

ABORDAGEM DA
ATIVIDADE FÍSICA, DO
COMPORTAMENTO
SEDENTÁRIO E DO SONO

104 105
ABORDAGEM DA ATIVIDADE FÍSICA, DO INTRODUÇÃO

COMPORTAMENTO SEDENTÁRIO E DO SONO A obesidade é uma patologia crónica com efeitos nefastos na vida dos sujeitos e das
populações estando associada a um conjunto vasto de morbilidades que exigem uma ação
concertada no sentido da sua prevenção e /ou terapêutica. Um estudo realizado recentemente
em Portugal indica que a prevalência da obesidade em praticantes recreativos é cerca de
Sandra S. Martins três vezes inferior à prevalência na população em geral. Através de registos nacionais de
Faculdade de Ciências da Saúde e do Desporto, Universidade Europeia
Instituto de Saúde Ambiental (ISAMB), Faculdade de Medicina, Universidade de Lisboa perda de peso, incluindo o registo português, constata-se a dificuldade em perder peso e,
Associação Portuguesa de Fisiologistas do Exercício (APFE) sobretudo, manter o peso perdido sem recurso ao aumento dos níveis de atividade física.
Estão hoje razoavelmente bem identificados os mecanismos – fisiológicos, psicológicos
Armando Raimundo
e comportamentais – através dos quais a prática regular de exercício e atividade física
Departamento de Desporto e Saúde, Escola de Ciências e Tecnologia – Universidade de Évora
Research Center in Sports Sciences, Health and Human Development (CIDESD) promove a obtenção e/ou manutenção de um peso saudável. Finalmente, não faltam estudos
Comprehensive Health Research Center (CHRC) experimentais a demonstrar que, quando os níveis de exercício físico atingem os valores
prescritos, é mais fácil a perda de peso, sobretudo no sexo masculino. Por estas razões, e
António L. Palmeira
considerando também os seus “efeitos secundários” positivos (p.e., na saúde mental e bem-
Faculdade de Educação Física e Desporto da Universidade Lusófona
CIPER, Faculdade de Motricidade Humana, Universidade de Lisboa estar, na gestão de comorbilidades tipicamente associadas à obesidade, e no aumento das
International Society of Behavioral Nutrition and Physical Activity (ISBNPA) oportunidades de socialização), todas as recomendações institucionais para a prevenção
da obesidade, e também para o seu tratamento, incluem o aumento da atividade física, e
Jorge Mota
Centro de Investigação em Atividade Física, Saúde e Lazer (CIAFEL), Faculdade de Desporto, Universidade do Porto
mais recentemente também a redução dos comportamentos sedentários, como elementos
essenciais.
Paulo N. Vieira
Faculdade de Ciências da Saúde e do Desporto, Universidade Europeia Não obstante este “estado da arte”, subsistem as questões às quais os profissionais que
trabalham com pessoas com obesidade procuram respostas atualizadas pelo conhecimento
Pedro Júdice
científico. Que tipo de exercício / atividade física é mais aconselhável? Com que que duração
Laboratório de Exercício e Saúde, CIPER, Faculdade de Motricidade Humana, Universidade de Lisboa
Bolseiro da Fundação Portuguesa para a Ciência e a Tecnologia (bolsa de pós-doutoramento SFRH/ e intensidade? Individualmente ou em grupo? Como lidar com questões como a auto-imagem
BPD/115977/2016) ou auto-perceção física, frequentemente alteradas na obesidade? Existem limitações de
natureza músculo-esquelética (devido ao excesso de peso) que devem ser consideradas na
Pedro J. Teixeira
prescrição e controlo do programa de exercício? E quando a pessoa tem outros fatores de
Faculdade de Motricidade Humana, Universidade de Lisboa
CIPER, Faculdade de Motricidade Humana, Universidade de Lisboa risco ou outras condições/doenças, como deve ser modificado o programa? É mais importante
o aumento da atividade física na fase de perda ou após a perda de peso? Estão a perceção
Rute Santos de esforço e a resposta hedónica ao exercício alteradas na pessoa com obesidade? Existem
Instituto Universitário da Maia
Centro de Investigação em Atividade Física, Saúde e Lazer (CIAFEL), Faculdade de Desporto, Universidade do Porto
questões de natureza motivacional que são específicas a estes utentes / clientes e devem ser
Early Start, University of Wollongong, Australia consideradas? Qual o efeito do exercício regular no apetite e regulação do comportamento
alimentar? E qual o efeito na composição corporal, independentemente do peso?
Susana Veloso
Faculdade de Educação Física e Desporto da Universidade Lusófona
Associação de Terapia do Comportamento (APTC/EABCT) O tempo de se considerar a obesidade como resultando essencialmente de falta de disciplina
e autocontrolo terminou. Sendo a obesidade hoje considerada uma doença crónica, existe a
natural obrigação dos sistemas de saúde de oferecer respostas aos cidadãos para a prevenir
e reduzir. Como devemos incluir o aconselhamento para a atividade física e a prescrição de
exercício físico nos sistemas de saúde tendo o apoio ao doente com obesidade como meta?
À semelhança da intervenção e prescrição nutricional para o apoio ao tratamento de doenças
crónicas, a prescrição de “exercício clínico” será uma evolução natural nas ofertas dos
serviços de saúde, públicos e privados. Este caso é particularmente relevante nas doenças

106 107
cardiometabólicas, onde podemos incluir a obesidade, a diabetes, a hipertensão, e as - Intensidade (exigência do esforço requerido na prática de AF; pode quantificar-se através
doenças cérebro- e cardiovasculares. Existe hoje um corpo de conhecimentos cientificamente da frequência cardíaca, equivalente metabólico – MET – ou escalas de perceção subjetiva
consolidados bem como uma rede de profissionais de exercício físico cada vez mais preparada do esforço);
para esta emergente missão. Falta agora consolidar os elos de ligação, e a confiança, entre - Tempo (duração de cada sessão de AF);
o sistema (e os profissionais) de saúde, os profissionais de exercício físico, e os programas e - Tipo (AF a realizar – aeróbia, de força, flexibilidade, neuromotora);
ofertas de exercício / atividade física na comunidade. - Volume (duração total – min.sem-1, dispêndio energético diário ou semanal – kcal.d-1 ou kcal.
sem-1, ou intensidade absoluta – MET minuto.sem-1);
Neste contexto, este capítulo pretende sintetizar a evidência acerca dos efeitos do exercício - Progressão (aumento gradual da intensidade e do volume), isto é, seguindo o princípio
/ atividade física, bem como da redução dos comportamentos sedentários, na pessoa com FITT-VP (Frequência, Intensidade, Tempo, Tipo, Volume e Progressão) [1].
obesidade. Pretende-se também apresentar procedimentos de avaliação, diagnóstico e
intervenção mais indicados para a alteração eficaz e sustentada destes comportamentos. Exercício físico – Atividade física que consiste na realização de movimento corporal
planeado, estruturado e repetitivo, que visa melhorar ou manter alguma(s) das componentes
da aptidão física [3].

Exercício aeróbio – Atividades/exercícios que mobilizam a maior parte dos grandes grupos
CONCEITOS UTILIZADOS NAS CIÊNCIAS DO DESPORTO E DO musculares em simultâneo, colocando uma solicitação marcada ao nível cardiorrespiratório
EXERCÍCIO (p.e., caminhar, correr, andar de bicicleta, remar, entre outros), ou seja, atividades/exercícios
que mantêm ou melhoram a aptidão cardiorrespiratória [5].
É importante que todos os elementos de uma equipa multidisciplinar de saúde tenham
uma linguagem comum. Sendo as ciências do Desporto e do Exercício uma das áreas de Exercício de equilíbrio – Exercícios cujos movimentos desafiam em segurança a postura
intervenção no âmbito do tratamento da obesidade, apresenta-se em seguida a definição de corporal e que melhoram a capacidade de resistir a forças internas e externas que podem
alguns conceitos utilizados neste âmbito. provocar quedas (p.e., apoio unipedal em pé, andar com apoio do calcanhar até à ponta do
pé, usar plataformas instáveis, entre outros) [6].
Aptidão física – Conjunto de atributos ou características que os indivíduos possuem
ou adquirem, que se relaciona com a sua capacidade para realizar atividade física. As Exercício de flexibilidade – Exercícios em que se pretende atingir a maior amplitude articular
componentes da aptidão física relacionadas com a saúde incluem a composição corporal, possível, solicitando também a capacidade de alongamento muscular (p.e., espargata, tocar
aptidão aeróbia, força, força resistente e flexibilidade. Das componentes da aptidão física com as mãos nos pés mantendo os joelhos em extensão, entre outros) [7].
relacionadas com a habilidade fazem parte a agilidade, coordenação, equilíbrio, força potente,
tempo de reação e velocidade [1]. Exercício de força – Exercícios em que os músculos têm que vencer uma resistência durante
a contração, podendo ser realizados com o peso do próprio corpo (p.e., agachamentos,
Aptidão funcional – Capacidade para realizar as tarefas da rotina diária com vigor e mantendo extensões de braços, saltos, entre outros) ou com resistências externas (p.e., halteres, bola
o estado de alerta, sem a ocorrência de fadiga, com energia para retirar partido do tempo de medicinal, máquinas de musculação, entre outros) [7].
lazer e, também, para responder a emergências imprevistas [2].
Exercício neuromotor – Exercícios que combinam agilidade, coordenação e equilíbrio,
Atividade física (AF) – Qualquer movimento corporal voluntário produzido pela contração permitindo alterar a posição do corpo no espaço, utilizando os sentidos em conjunto com
da musculatura, que resulta num acréscimo substancial do dispêndio energético acima dos diferentes partes do corpo, para realizar movimentos de forma precisa, ao mesmo tempo que
valores de repouso [3]. se mantém o equilíbrio (p.e., fintar e rematar no Futebol, tai chi, dança, entre outros) [1].

Comportamento sedentário - Caracteriza-se pela ausência ou redução de atividade física, Inatividade física – Característica de pessoas que não cumprem as recomendações da
em que o dispêndio energético seja igual ou inferior a 1,5 METs, p.e., em atividades realizadas atividade física moderada e vigorosa, definidas pelas instituições internacionais [8].
na posição de sentado ou deitado, como ver televisão, jogar computador ou andar de carro [4].
MET (equivalente metabólico) – Permite caracterizar a intensidade absoluta da AF. 1 MET é
Dose de atividade física – Resulta da caracterização dos seguintes indicadores: o equivalente metabólico ao gasto energético em repouso. Qualquer atividade física será um
- Frequência (número de sessões de AF por semana); incremento a esse valor, definindo-se que AF com intensidade leve requer 1,5-2,9 METs, AF

108 109
com intensidade moderada requer 3,0 a 5,9 METs e AF vigorosa a partir de 6,0 METs [1]. Pode características do sucesso na manutenção ponderal [13]. No entanto, a dose de AF necessária
ser utilizado para calcular o volume semanal de AF expressando-se em MET minuto.sem-1. parece ser superior aquela recomendada para a perda de peso [11].

COMPOSIÇÃO CORPORAL
BENEFÍCIOS DA PRÁTICA REGULAR DE ATIVIDADE FÍSICA (AF)
PARA A OBESIDADE NO ADULTO Relativamente às alterações da composição corporal, a combinação de exercício com
dieta aumenta a mobilização de gordura para a produção de energia e contribui para uma
maior redução das reservas de massa gorda. O exercício promove, ainda, a manutenção
Existe evidência robusta que demonstra que indivíduos adultos fisicamente ativos com ou diminuição da perda de massa isenta de gordura (MIG) que ocorre quando apenas se
obesidade apresentam benefícios semelhantes aos verificados em sujeitos normoponderais, faz dieta [14]. Estes resultados parecem ser potenciados quando o exercício consiste na
em resultado da prática regular de AF. Para além do contributo para a gestão do peso, esses conjugação de exercício aeróbio e de força, juntamente com a dieta [14].
benefícios podem ocorrer ao nível da prevenção ou redução de comorbilidades da obesidade
que se manifestam no aparelho circulatório, respiratório, metabolismo, osteoarticular,
psicossocials, composição corporal, aptidão física e funcional, entre outros. Estas melhorias da
saúde vão, por sua vez, ter impacto na redução do risco relativo de mortalidade por qualquer APTIDÃO FÍSICA
tipo de causa, incidência e mortalidade por doença cardiovascular, bem como na melhoria da
qualidade de vida, constituindo benefícios da prática regular de AF, independentes do estatuto Evidência crescente, epidemiológica e clínica, tem vindo a demonstrar que níveis mais
ponderal [7]. Apresentam-se em seguida alguns dos benefícios da AF para a obesidade. elevados de aptidão física, particularmente da aptidão cardiorrespiratória, estão associados à
redução da mortalidade por qualquer tipo de causa, da mortalidade por doença cardiovascular
e do risco de desenvolver um espectro amplo de doenças não transmissíveis, entre as quais
o cancro e a obesidade [15].

PERDA DE PESO E PREVENÇÃO DA RECUPERAÇÃO PONDERAL


A aptidão física pode influenciar os resultados na saúde, incluindo a condição de obesidade,
A gestão do peso corporal, na ausência de comorbilidades, está dependente do balanço através de 4 vias (Figura 1):
energético que é determinado pelo consumo energético (CE) e pelo dispêndio energético
(DE) . Intervenções do estilo de vida que combinam reduções do CE com aumentos do DE A. A aptidão física inicial pode ter um efeito moderador nas respostas às intervenções para
através do exercício e de outras formas de AF resultam frequentemente numa redução inicial aumentar a AF, originando resultados diferentes em função da presença de uma menor ou
do peso corporal entre 5%-10%. Revisões de intervenções de perda de peso têm permitido maior aptidão física inicial. Por exemplo, uma menor aptidão física inicial pode requerer um
verificar que programas que combinam dieta e exercício resultam numa perda de peso ~20% aumento mais gradual da intensidade e da duração para que os benefícios do exercício
superior à verificada apenas com restrição alimentar [9, 10]. No entanto, este efeito tende a se manifestem.
desaparecer se o CE for severamente reduzido [11]. A prática de AF e a restrição alimentar
podem proporcionar perdas de peso comparáveis se promoverem níveis semelhantes de B. A aptidão física pode ser um mediador das respostas na saúde/obesidade derivadas de
balanço energético negativo [11]. No entanto, devido aos baixos níveis de aptidão física, pode aumentos da AF, ou seja, um aumento da AF pode originar alterações dos resultados na
ser difícil para a pessoa com obesidade realizar o volume de AF requerido para atingir uma saúde/obesidade apenas se a aptidão física melhorar.
perda de peso clinicamente significativa. Assim, a combinação de reduções moderadas no
CE com níveis adequados de AF maximiza a perda de peso em indivíduos com obesidade [1]. C. A AF pode estar associada a respostas na saúde/obesidade através de vias que não
envolvem modificações da aptidão física.
A manutenção do peso e a prevenção da recuperação ponderal são desafiantes, com
a recuperação ponderal a atingir entre 33%-50% da perda de peso inicial no período de 1 D. Um aumento da aptidão física representa só por si um importante resultado para a
ano após terminar o tratamento [1]. A prática de AF parece ser determinante para prevenir saúde/obesidade.
a recuperação ponderal [12], sendo os níveis elevados de DE na prática de AF uma das

110 111
imediatamente após um episódio de AF moderada a vigorosa: a pressão arterial sistólica
diminui e a sensibilidade à insulina aumenta. Outros benefícios, como a redução do risco de
doença cardiovascular, diabetes, quedas nos adultos idosos e a melhoria da função física
manifestam-se à medida que a AF aumenta, maximizando após alguns meses, permitindo
que estas adaptações passem de agudas a adaptações crónicas. Por exemplo, a pressão
arterial de sujeitos com obesidade e pré-hipertensão ou hipertensão pode passar a manter-se
dentro de intervalos saudáveis durante a maior parte do dia ou durante todo o dia. Idênticas
adaptações têm sido observadas relativamente a outros indicadores, como a redução da
ansiedade, melhoria do sono e da função executiva [7].

Figura 1. O contributo da aptidão física ao longo de várias vias entre a AF e os resultados na saúde/obesidade Os benefícios da AF para a saúde da pessoa com obesidade ocorrem de forma independente
(Adaptado de PAGAC, 2018 Physical Activity Guidelines Advisory Committee Scientific Report. 2018, U.S. De- da perda de peso, pelo que, mesmo na ausência da redução do peso corporal, a prática regular
partment of Health and Human Services: Washington, DC) [7]. de AF permite ao indivíduo com obesidade usufruir dos benefícios que esta proporciona e que
vão muito para além do peso.

A melhoria da aptidão física, geralmente, é detetada prontamente pelos indivíduos que


aumentaram a sua AF, pelo que pode ser útil como um recurso para o reforço positivo
da pessoa com obesidade que adotou um nível mais elevado de AF, promovendo a sua
adesão ao mesmo. Apesar da AF constituir o principal indicador a considerar para a
saúde pública, a aptidão física consiste numa informação importante enquanto sinal vital
para a saúde. COMPORTAMENTO SEDENTÁRIO E OBESIDADE NO ADULTO

O tempo excessivo passado em comportamento sedentário (CS) deve ser encarado como
um problema da sociedade atual, no qual o desenvolvimento da tecnologia tem tido uma
APTIDÃO FUNCIONAL influência direta (o desenvolvimento dos motores a vapor, gás e elétricos; os carros, comboios
e outros meios de transporte), ou por outro lado, de uma forma mais subtil e complexa
Indivíduos com peso em excesso fisicamente ativos conseguem realizar as tarefas da (computadores, TV, jogos eletrónicos, internet, equipamentos de comunicação sem fios) [16].
rotina diária sem a ocorrência de fadiga precoce. Entre os adultos mais velhos, tanto os Períodos prolongados em CS, como sentado no trabalho ou a ver televisão, podem constituir
estudos observacionais como os experimentais demonstram que, maiores volumes de fatores de risco para a saúde, independentemente dos níveis de AF praticados. [17, 18].
AF se associam a melhor função física e ao retardar da perda de função física associada
à idade. As melhorias incluem maior velocidade de marcha, melhor equilíbrio, maior Presentemente, as condições de trabalho em muitas profissões implicam a manutenção da
capacidade para se levantar a partir da posição de sentado e para manter a autonomia posição de sentado durante grande parte do período laboral. A realização de intervenções
na realização das tarefas diárias, como tomar banho, vestir, arranjar-se e comer. Em direcionadas para este grupo alvo tem promovido a redução do CS, sobretudo quando se
todas as idades, para um determinado volume de AF, as melhorias relativas da função incluem modificações físicas dos postos de trabalho (i.e., colocação de secretárias altas),
física são maiores nos indivíduos que não tenham sido fisicamente ativos [7]. conjuntamente com apoio educativo e comportamental [7]. A modificação das condições de
trabalho permite, ainda, aumentar o dispêndio metabólico no local de trabalho promovendo,
principalmente nos sujeitos com obesidade, adaptações fisiológicas muito positivas em
QUANTO TEMPO DEMORAM OS BENEFÍCIOS DA ATIVIDADE FÍSICA A indicadores de saúde (p.e., redução do C-LDL e do C-Total, aumento do C-HDL e redução do
MANIFESTAR-SE? perímetro da cintura) [19].

Alguns benefícios ocorrem imediatamente após uma sessão de AF moderada a vigorosa, Entre outros fatores, as implicações do desenvolvimento tecnológico têm levado a que
sendo denominados por adaptação aguda à AF. O perfil cardiometabólico apresenta melhorias um adulto despenda em média cerca de 9 h.dia-1 em CS, sendo que na população idosa

112 113
este número é ainda superior. Apesar da forte evidência científica que relaciona o CS com SONO E OBESIDADE NO ADULTO
o aparecimento de doenças e a própria mortalidade [20-22], o seu papel relativamente à
obesidade é inconclusivo e inconsistente [23-25], embora exista evidência mais consistente
para a associação entre o tempo de ecrã (principalmente a ver TV), sobretudo entre adultos Tem-se verificado que a duração do sono vem diminuindo ao mesmo tempo que a prevalência
idosos e em pré-adultos, nos quais o CS aumenta o risco de obesidade na idade adulta [26]. da obesidade tem aumentado. A combinação da ocorrência destes fenómenos com evidência
patofisiológica sugeriu que o sono e a obesidade podiam estar relacionados. Presentemente,
No que diz respeito à obesidade, propõe-se que o CS não seja visto como um todo, mas sim existe literatura extensiva sobre esta associação, incluindo várias revisões sistemáticas e
como a soma das partes [26]. Em adultos, o foco deverá estar na forma de acumulação do meta análises [38-40], que colocam em evidência o facto do sono, tal como a dieta e a AF,
CS mais do que no tempo total (volume) passado neste comportamento [26]. Interromper o influenciar fortemente muitos aspetos da saúde incluindo a obesidade.
CS está associado a valores mais baixos de IMC [27-29] e perímetros da cintura também
mais reduzidos [30], sugerindo a sua associação ao estatuto ponderal. Levantar regularmente Uma duração reduzida do sono está associada ao aumento do risco de desenvolver obesidade
e movimentar-se também vai resultar num maior dispêndio energético através da ativação (odds ratio [OR] = 1.45, 95% intervalo de confiança [IC] 1.25-1.67) [41]. Quando se considera
dos grandes grupos musculares, representando um efeito independente da frequência dos a idade observa-se que, entre adultos jovens, mais tempo a dormir está associado com
intervalos ativos [31]. Outros benefícios podem ser observados ao introduzir vários períodos condições de IMC mais baixas; entre adultos de meia idade, tanto durações de sono curtas
de 5 min de AF espaçados ao longo do dia, os quais se podem traduzir na redução dos níveis como longas associam-se a valores de IMC mais elevados; entre adultos idosos, apenas se
de glicose plasmática em sujeitos com obesidade [32]. observam relações para durações reduzidas de sono [39]. No entanto, outras características
como a qualidade e profundidade do sono, também, parecem desempenhar um papel
Nos adultos idosos, a evidência aponta para que ambos os domínios do CS (tempo total e importante nesta relação [39].
modo de acumulação) tenham importância no risco para a obesidade [33, 34]. A redução da
quantidade de CS em sujeitos idosos com obesidade, promove melhorias na saúde física Os mecanismos subjacentes à associação entre o sono e a obesidade ainda não estão
geral, aumento da capacidade de movimento, redução da rigidez muscular, melhoria no completamente compreendidos. Existem vários potenciais mecanismos através dos quais a
equilíbrio e na sensibilidade à dor crónica consequente de diferentes condições de saúde redução do sono pode aumentar o risco de obesidade [42]. Por um lado, a evidência indica
[35]. Além dos efeitos diretos sobre a saúde mental e física, outro aspeto a realçar foram as que uma restrição crónica do sono origina alterações nos níveis das hormonas reguladoras do
melhorias provocadas no aumento da AF diária e nos hábitos regulares de prática de exercício apetite como a grelina e a leptina, as quais levam a um aumento do apetite e subsequentemente
[35]. a uma maior ingestão alimentar [43, 44]. Um maior período de tempo acordado permite
mais oportunidades para comer [45]. Por outro lado, uma menor duração do sono tem
Face ao exposto há que implementar intervenções que permitam que tanto na população sido associada a fadiga e redução significativa da AF [42]. No entanto, não foi encontrada
adulta, como na população mais idosa, se consiga obter uma redução no CS. Efetivamente, associação entre uma duração longa do sono e a obesidade. Outras características como
quando as intervenções são bem delineadas, essa alteração de comportamento tem sido a qualidade e profundidade do sono, também, parecem desempenhar um papel importante
eficaz [26, 36]. No entanto, a relação entre CS, ganho de peso, perda de peso e recuperação nesta relação [39].
ponderal ainda requer mais investigação [37], sendo necessária produção científica no sentido
de gerar diretrizes sustentadas para o CS. Avaliações laboratoriais do sono utilizando polissonografia demonstram que volumes mais
elevados de AF moderada a vigorosa estão associados a uma redução da latência do sono
(demorar menos tempo para adormecer), melhoria da eficiência do sono (maior percentagem
Atualmente, não existe evidência suficiente que permita concluir acerca da existência de uma do tempo passado na cama a dormir, de facto), melhoria da qualidade do sono e mais tempo
associação causal entre o comportamento sedentário e a obesidade. No entanto, para a in-
em sono profundo. A investigação utilizando avaliações de auto-relato do sono indica que um
tervenção na obesidade, a maior frequência de interrupções do comportamento sedentário
maior volume de AF moderada a vigorosa está associado a menor sonolência durante o dia,
parece ser um indicador mais relevante para a redução do IMC, que o tempo total passado
melhor qualidade do sono e redução da frequência de utilização de medicação para ajudar
em comportamento sedentário.
a dormir. Estas melhorias no sono são reportadas por indivíduos com insónia crónica, bem
como por pessoas sem diagnóstico de desordens do sono [7].

114 115
A prática habitual de AF ajuda a regular a duração e qualidade do sono, o que pode contribuir O agrupamento e as interações entre comportamentos com e sem movimento sugerem que
para uma melhor gestão do peso. todas as componentes do continuum de 24 horas de movimento devem ser visadas para
maximizar os benefícios de saúde [48]. Esta abordagem vai permitir avançar numa perspetiva
integrada de vida ativa saudável e tem potencial para contribuir significativamente para a
melhoria da obesidade, da saúde em geral e do bem-estar.

REALOCAÇÃO DO TEMPO PASSADO EM ATIVIDADE FÍSICA, Assim, tem-se verificado que a realocação de 30 minutos de CS, AF com intensidade leve
COMPORTAMENTO SEDENTÁRIO E SONO ou sono, para AF moderada a vigorosa (aumentando o movimento) está associada reduções
do IMC e do perímetro da cintura, sendo que este efeito foi maior em indivíduos mais velhos
e/ou com obesidade. A mudança de CS ou sono para AF com intensidade leve associou-
O tempo passado a dormir, em AF e em CS é mutuamente exclusivo pelo que, como o tempo se a menores magnitudes dos indicadores de obesidade (IMC e perímetro da cintura) em
disponível num dia é finito, estas atividades influenciam-se ou competem entre si, com as adultos com obesidade, bem como em adultos dos 50 a 79 anos [49]. No entanto, o perímetro
tarefas laborais, a rotina diária e o lazer a incluir comportamentos de AF e/ou sedentários. Um da cintura aumentará caso a realocação ocorra em sentido inverso, isto é, através de uma
dia habitual contém tempo para o sono, CS, AF com intensidade leve e AF ou exercício com redução de 10 minutos da AF moderada a vigorosa e respetivo aumento em CS [50].
intensidade moderada a vigorosa. Como estão disponíveis apenas 24 horas por dia, aumentar
qualquer uma destas componentes implica diminuir uma ou mais das restantes. Esta informação, também, tende a suportar o criticismo que envolve o facto das atuais
recomendações de AF não contemplarem os benefícios para a saúde provenientes de
Enquanto as associações entre cada um destes fatores e a saúde têm sido examinados doses e intensidades muito modestas de AF, sobretudo nas populações mais idosa ou com
em separado, tem aumentado o interesse nas relações entre a saúde e comportamentos obesidade [51].
que envolvem movimento [46]. Isto advém do reconhecimento de que a participação numa
intensidade específica de movimento implica não participar noutra, o que significa que os
benefícios de diferentes atividades dependem não só da atividade específica, mas também Realocar o tempo passado em comportamento sedentário em AF leve, moderada a vigorosa
da atividade que deslocam [47]. Importa, então, adotar um paradigma que integre (e não que ou sono permite reduzir o IMC e o perímetro da cintura, ao mesmo tempo que melhora a
segregue) os comportamentos que envolvem movimento (Figura 2). perceção geral de saúde na pessoa com obesidade e idosa. Há necessidade de recomendações
internacionais para gerir a interação destas variáveis na Obesidade.

AUTO-REGULAÇÃO DO COMPORTAMENTO DE ATIVIDADE FÍSICA

Porquê falar de auto-regulação? A razão pela qual a atividade física é o mais forte correlato
de sucesso de um programa de perda de peso [52, 53] deve-se mais à sua associação com
mudanças psicossociais, como a autorregulação, humor, imagem corporal e autoeficácia [54]
do que ao dispêndio energético. De facto, as reconhecidas mudanças benéficas induzidas
pelo exercício no humor e auto-eficácia são mediadoras significativas da relação entre a auto-
regulação para a AF e a auto-regulação para a alimentação [55, 56]. Estes resultados têm
implicações que se traduzem num desvio à utilização típica da AF em programas de perda
de peso, passando do foco no dispêndio energético para o foco nas melhorias psicológicas.

Figura 2. Interações entre comportamentos com movimento e sem movimento para influenciar coletivamente a saúde
(Adaptado de Chaput, J.P., et al., Importance of all movement behaviors in a 24 hour period for overall health. Int J Environ O auto-estigma do peso (i.e., auto-desvalorização e medo da descriminação) [57] é considerado
Res Public Health, 2014. 11(12): p. 12575-81)[48]. um grande obstáculo da eficácia das intervenções de perda de peso, associando-se à menor

116 117
adesão ao tratamento, ao evitar procurar cuidados médicos, a maiores taxas de desistência (compassivo) em relação aos fenómenos internos e externos.
e piores resultados de perda de peso [58, 59]. Este provém da internalização das mensagens
negativas existentes na sociedade [57, 60] (i.e., os estereótipos e atitudes negativas face - A aceitação é a disposição ou tolerância a todas as experiências (internas e externas) mesmo
a pessoas com obesidade) por vezes aceites, ou mesmo encorajadas, como formas de as desagradáveis e indesejáveis [66].
“combater a obesidade”. Por outro lado, as pessoas são “falsamente” encorajadas com as
mensagens de marketing repletas de sugestões para uma perda de peso ou outros benefícios - A autocompaixão é a capacidade da pessoa demonstrar bondade e apoio, e de se auto-
para a saúde e aptidão física alcançáveis sem a componente de esforço ou “desconfortável” motivar a persistir nos comportamentos saudáveis, principalmente quando experimenta
do exercício [61]. recaídas, sendo este o verdadeiro “antídoto” da habitual vergonha e autocrítica.

Face a estas evidencias, os profissionais envolvidos na gestão do peso, deveriam ser a Aplicando ao contexto de AF, e ao contrário dos métodos tradicionais de terapia
‘primeira linha’ no reconhecimento do desafio social (estigma relativo ao peso) e evolucionário comportamental baseados nas tentativas de controlar estados internos desagradáveis, as
que enfrentamos: um cérebro que não evoluiu para nos permitir a restrição calórica, e um estratégias baseadas nestes três conceitos concentram-se na aceitação experiencial, definida
corpo preparado para o movimento mas construído para maximizar a poupança de energia, como a aproximação (versus evitamento) às experiências da prática de AF, psicologicamente
com vista a garantir sobrevivência. Ou seja, se a maioria dos indivíduos tem uma capacidade aversivas, fazendo a escolha consciente de se manter nelas. Neste sentido, a capacidade de
intrínseca de ceder aos estímulos do ambiente obesogénico é natural que falhem na tentativa revelar compaixãoa pelos indivíduos com obesidade, ampliará a capacidade de intervenção
de lhes resistir, e desta forma a quantidade insuficiente de AF pode ser entendida como uma dos profissionais para promover nos praticantes com obesidade uma atenção mindful e a
falha de auto-regulação. Então, como podem os profissionais garantir a eficácia da promoção aceitação experiencial, permitindo que eles exprimam livremente os pensamentos, emoções
da auto-regulação da AF? e comportamentos negativos sem os julgar, facilitando neles a capacidade de ‘responder’
(conscientemente) em vez de ‘reagir’ (automaticamente) aos ameaçantes pensamentos de
Para responder a esta questão é importante considerar que iniciar a prática de AF, é para incapacidade, sentimentos de desvalorização ou frustração e comportamentos de desistência,
muitos “experienciar” dor, rigidez, sofrimento, baixa auto-eficácia, e outras qualidades que surgem na prática momento a momento [61].
negativas, especialmente entre aqueles que se debatem com obesidade e/ou estigma do
peso. Estas experiências desagradáveis promovem o evitamento, podendo explicar as
baixas taxas de adesão e manutenção [62]. O comportamento de auto-regulação representa Através de uma atitude mindful, não julgadora e de aceitação às inevitáveis tendências inatas
o que o individuo escolhe fazer, apesar dos pensamentos, emoções, sensações corporais dos praticantes de AF com obesidade, o profissional pode promover, progressivamente, o
que surgem automaticamente, não facilitadores do comportamento mais eficaz para obter grau de tolerância às experiências desagradáveis ou menos agradáveis.
o resultado esperado (i.e.. a capacidade de um indivíduo com excesso de peso decidir ir ao
ginásio, apesar do pensamento ‘apetece-me descansar’, de sentir o cansaço físico dum dia a
Compaixão é a sensibilidade ao sofrimento de si e dos outros, com um profundo compromisso de tentar aliviá-lo
de trabalho, e ter alguma vergonha de enfrentar o reflexo no espelho da sua forma corporal). (Dalai Lama, 1995).

As novas abordagens da auto-regulação baseada na aceitação e no mindfulness (citadas


no capítulo Abordagem Psicologica e Psiquiátrica) vêm responder a este desafio [63],
na medida em que se concentram em mudar a maneira como as pessoas se relacionam
com a sua experiência interna e em promover uma vida valiosa e significativa. Isto parece
fundamental na gestão do peso, pois a manutenção de comportamentos saudáveis depende
do desenvolvimento da capacidade de estar consciente, aberto e tolerar experiências internas
desagradáveis (pensamentos, emoções e impulsos). Outro conceito das novas abordagens é
a auto-compaixão que tem sido associada ao bem-estar, à motivação intrínseca e à capacidade
de manter comportamentos saudáveis, mesmo diante de falhas e retrocessos [64]. Veja-se:

- O mindfulness ou “atenção plena” é uma consciência que emerge intencionalmente


prestando atenção à experiência presente de um modo não julgador [65]. Ou seja, uma mente
“mindful” reúne simultaneamente características atencionais e atitudinais, autorregulando a
atenção para a experiência direta do momento presente, e uma atitude num tom não crítico

118 119
DIAGNÓSTICO FAZ EXERCÍCIO REGULARMENTE ?
(actividade física estruturada polo menos 30 minutos em intensidade
A avaliação constitui uma etapa determinante para uma correta caracterização do estado moderada, 3 ou mais dias por semana, nos últimos 3 meses)
de saúde e estilo de vida da pessoa com obesidade, definição dos objetivos a atingir a
curto, médio e longo prazo, bem como para o aconselhamento de AF e para a prescrição
de exercício individualizados. Assim, apresentam-se em seguida propostas de avaliação SIM NÃO
da aptidão física, atividade física, comportamento sedentário, sono, motivação para a
prática de AF e qualidade de vida.
Tem doença cardiovascular, Tem doença cardiovascular,
metabólica ou renal metabólica ou renal
(ou sinais ou sintomas sugestivos) ? (ou sinais ou sintomas sugestivos) ?

AVALIAÇÃO DA APTIDÃO FÍSICA


SIM NÃO SIM NÃO
A avaliação da aptidão física é uma prática apropriada, comum nos programas de exer-
cício de prevenção e tratamento de morbilidade. Os testes de avaliação da aptidão física Tem doença mas Pode continuar Aprovação médica Começar com
devem ser confiáveis e válidos, e, idealmente, pouco dispendiosos. sem sintomas ? exercício recomendada exercício leve ou
moderado ou moderado. Pode
vigoroso progredir para
vigoroso, se
bem tolerado
A avaliação da aptidão física da pessoa com obesidade deve incluir:
SIM NÃO

a) Consentimento informado Pode continuar Tem sinais ou sintomas de


exercício moderado. doença cardiovascular,
E progredir para metabólica ou renal?
A obtenção do consentimento informado dos participantes previamente ao início da ava- vigoroso, se sem
liação da aptidão física constitui uma importante consideração ética e legal. É, acon- alteração de sintomas
selhável consultar os órgãos competentes do hospital, clínica, clube, ou outro, para e com aprovação
médica nos ultimos
determinar o conteúdo apropriado ao formulário de consentimento informado. Também NÃO
12 meses SIM
é fundamental assegurar a proteção da privacidade da informação recolhida de cada
participante [1].
Não realizar esercício Pode continuar
até aprovação médica exercício moderado ou
vigoroso
b) Avaliação do risco para a realização de atividade física e exercício

As orientações mais recentes para a avaliação do risco previamente ao início da AF e/


ou exercício [67] focam-se na avaliação de: nível atual de AF praticada pelo indivíduo; Aspetos a considerar antes de realizar exercício ou mudar a intensidade:
presença de sinais ou sintomas e/ou doença cardiovascular, metabólica, ou renal co- 1 - Nível de atividade física atual
nhecida; e, na intensidade adequada do exercício desejável. Estes três fatores têm sido 2 - Sinais e sintomas de algumas doenças
identificados como importantes moduladores do risco de eventos cardiovasculares rela- 3 - Intensidade do exercício a realizar
cionados com o exercício, estando também aconselhada a sua utilização para a popula-
ção com obesidade. O algoritmo simplificado pode ser observado na Figura 3. Figura 3. Algoritmo para avaliação do risco previamente ao início do exercício (Adaptado de Riebe, D., et al.,
Updating ACSM’s Recommendations for Exercise Preparticipation Health Screening. Med Sci Sports Exerc, 2015.
47(11): p. 2473-9) [67].

120 121
Devido às comorbilidades que acompanham a obesidade, a avaliação clínica pode requerer dos a níveis aumentados de AF habitual, os quais estão por sua vez relacionados com muitos
a realização de exames complementares de diagnóstico específicos, avaliação psicossocial, benefícios para a saúde, incluindo na pessoa com obesidade. Trata-se, assim, de uma parte
caracterização detalhada do estilo de vida, entre outras, realizadas pelos especialistas respe- importante da avaliação da aptidão física, sendo as competências para a sua avaliação e
tivos. Este procedimento de avaliação do risco antes de iniciar um programa de exercício deve interpretação uma responsabilidade importante do fisiologista do exercício.
ser distinguido do exame médico periódico, o qual deve ser encorajado como parte da rotina
de manutenção da saúde. A decisão de utilizar um teste de esforço máximo ou submáximo depende grandemente das
razões para a sua realização, nível de risco da pessoa com obesidade, disponibilidade do
Os Fisiologistas do Exercício podem solicitar aos participantes num programa de exercício, equipamento e profissionais adequados. A realização de testes de esforço máximo requer que
uma autorização escrita elaborada pelo prestador de cuidados de saúde, juntamente com in- os participantes se exercitem até ao ponto da fadiga volitiva, o que pode não ser apropriado/
dicações ou restrições especiais (p.e., intensidade do exercício). A manutenção continuada da seguro para alguns indivíduos e requer a supervisão de um clínico especialista, bem como
comunicação com os prestadores dos cuidados de saúde é fortemente encorajada, sobretudo do equipamento de emergência apropriado. Os fisiologistas do exercício têm autonomia para
na presença de comorbilidades da obesidade [1]. realizar e interpretar testes de esforço submáximo. O objetivo principal destes testes consiste
em determinar a resposta da frequência cardíaca a uma ou mais taxas de trabalho e utilizar
os resultados para predizer o VO2max, usando essa informação para individualizar a prescrição
c) Avaliações de repouso do exercício aeróbio [1].

A avaliação da aptidão física inclui a medição da frequência cardíaca e da pressão arterial É importante obter indicadores adicionais da resposta da pessoa com obesidade ao exercício,
de repouso. Ao chegar ao local da avaliação, é importante permitir ao participante descansar pelo que o fisiologista do exercício deve utilizar a frequência cardíaca, a pressão arterial, a
durante, pelo menos, 5 minutos para possibilitar a estabilização destes dois indicadores fisio- carga de trabalho, a escala de perceção subjetiva do esforço ou outros índices subjetivos
lógicos. A frequência cardíaca pode ser estimada por palpação, auscultação com um estetos- como informação muito relevante acerca da adaptação fisiológica ao exercício. Este conheci-
cópio (durante 30 seg x 2, ou 60seg) ou com um monitor de frequência cardíaca [1]. mento permite garantir a segurança do participante durante a prática de exercício, avaliar res-
postas submáximas ao longo do tempo e introduzir modificações na prescrição de exercício.
A pressão arterial pode ser avaliada com esfigmomanómetro analógico e estetoscópio ou esfig- Uma das escalas de perceção subjetiva do esforço mais utilizada e recomendada, é a escala
momanómetro digital. Apresentar consistentemente valores da pressão arterial sistólica de 120- de Borg de 0-10, cuja utilização pode ser previamente ensinada à pessoa com obesidade
139 mm Hg e/ou da pressão arterial diastólica de 80-89 mm Hg indicia pré-hipertensão e requer a para controlar a intensidade do esforço durante a prática de exercício, ou até noutras tarefas
promoção de modificações do estilo de vida, entre as quais a prática regular de AF, para prevenir da vida diária [68].
o desenvolvimento de hipertensão. Quando as intervenções do estilo de vida (dieta e AF) não são
efetivas para alcançar este objetivo, adiciona-se a terapia farmacológica [1]. Algumas sugestões de protocolos de teste de esforço submáximos adequados à pessoa com
obesidade incluem:

d) Avaliação antropométrica e da composição corporal - Protocolo do teste de caminhar 6 min [69]: Teste de campo incluído na Senior Fitness Test
Battery, particularmente adequado nos casos em que a aptidão física funcional esteja reduzi-
As indicações e os procedimentos para a realização da avaliação antropométrica e da com- da ao ponto de comprometer a autonomia na realização das tarefas da rotina diária, situação
posição corporal na pessoa com obesidade podem ser consultados no capítulo “Avaliação esta mais comum na condição de obesidade severa (IMC ≥ 40 kg.m-2), ou na presença de
Antropométrica e da Composição Corporal” deste manual. limitações funcionais associadas a comorbilidades da obesidade (i.e., osteoartrose). Em al-
ternativa ao percurso de 50 m, este teste também pode ser aplicado individualmente numa
passadeira.
e) Avaliação da aptidão cardiorrespiratória
- Protocolo de Ebbeling [70]: Teste realizado na passadeira, em marcha, constituído por 2
A aptidão cardiorrespiratória é considerada uma componente da aptidão física relacionada patamares com a duração de 4 min cada um (já inclui o aquecimento).
com a saúde pois [1]: a) níveis baixos de aptidão cardiorrespiratória têm sido associados a
um aumento marcado do risco de morte prematura por qualquer tipo de causa e por doença - Protocolo de Astrand-Ryhming [71]: Teste realizado num cicloergómetro, constituído por um
cardiovascular; b) aumentos da aptidão cardiorrespiratória associam-se à redução da morta- único patamar com a duração de 6 min.
lidade por todas as causas; e c) níveis elevados de aptidão cardiorrespiratória estão associa- - Protocolo do teste de step de Chester [72]: Teste alternativo para ser aplicado quando o

122 123
tempo disponível, o espaço, ou as condições atmosféricas, não permitirem a realização das g) Avaliação da flexibilidade
restantes propostas aqui apresentadas.
A manutenção da flexibilidade de todas as articulações facilita o movimento desempenhando
Recomenda-se que a interpretação dos resultados do VO2max obtidos no teste selecionado um papel importante na realização de exercício e das atividades da vida quotidiana. A flexibi-
seja efetuada através dos valores normativos de referência [73]. lidade depende de diversas variáveis específicas incluindo: a) distensibilidade da cápsula ar-
ticular; b) aquecimento adequado; c) viscosidade muscular; d) estado dos tecidos tendinosos
e ligamentares [1].
f) Avaliação da aptidão muscular
A avaliação da amplitude do movimento articular pode ser realizada na maior parte das articu-
A Aptidão muscular consiste numa das componentes da aptidão física relacionada com a saú- lações anatómicas, seguindo procedimentos rigorosos e utilizando um goniómetro apropria-
de que pode contribuir para a melhoria de [1]: a) Massa óssea, a qual está relacionada com do. Identificar caso a caso as articulações alvo da pessoa com obesidade de acordo com a
a osteoporose; b) Massa muscular, relacionada com a sarcopenia; c) Tolerância à glucose, a eventual limitação funcional presente, proceder à avaliação da amplitude articular respetiva e
qual desempenha um papel importante na diabetes; d) Integridade musculotendinosa, relacio- à interpretação dos resultados através da comparação com os valores normativos, vai permitir
nada com um menor risco de lesão e redução da dor lombar; e) Capacidade para realizar com efetuar um plano de treino adequado às necessidades observadas e acompanhar a evolução
autonomia as atividades da rotina diária, qual está relacionada com a perceção de qualidade ao longo do tempo [1]. Outras avaliações da flexibilidade que podem ser adequadas incluem
de vida e com a auto-eficácia, entre outros indicadores de saúde mental; f) Massa isenta de o teste de elevação do membro inferior em extensão [74] e o teste de flexibilidade dos ombros
gordura e metabolismo de repouso, os quais estão relacionados com a gestão do peso. [69].

O excesso ponderal e a presença de limitações musculoesqueléticas, ortopédicas e/ou funcio-


nais podem requerer modificações dos procedimentos dos protocolos de avaliação standard h) Avaliação neuromotora
utilizados para a população adulta aparentemente saudável. Assim, indicam-se em seguida
alguns protocolos de avaliação da aptidão muscular mais adequados para a pessoa com A componente neuromotora combina equilíbrio, agilidade e propriocetividade, assumindo par-
obesidade. ticular relevo com o aumento do grau de obesidade e/ou com o avançar da idade. Os testes
de levantar e caminhar permitem avaliar o equilíbrio dinâmico e a agilidade, constituindo um
- Força resistente dos membros superiores: Teste modificado de extensão de braços, realiza- indicador da aptidão funcional.
do mantendo as mãos, os joelhos e os pés em apoio durante a execução, seguindo os pro-
cedimentos de administração são os mesmos do teste de extensão de braços tradicional [1]. Um dos protocolos existentes para este tipo de teste [69] implica levantar de uma cadeira e
Nos casos em que a condição ponderal ou a baixa aptidão física não permita a realização do realizar um percurso de ida e volta de 2,44 m caminhando o mais rápido possível.
teste na posição horizontal, aconselha-se que o mesmo seja realizado na posição vertical ou
diagonal (à parede ou numa superfície alta estável e segura). O teste de flexão do cotovelo em
30 seg constitui outra alternativa para a avaliação da força resistente dos membros superiores i) Avaliação postural
[69], quando a aptidão funcional da pessoa com obesidade está comprometida.
Na pessoa com obesidade é comum verificarem-se alterações no alinhamento postural, o que
- Força resistente abdominal: Optar pela prancha frontal sem ou com apoio (joelhos, pernas pode comprometer a eficiência neuromuscular, e a realização de movimento de forma eficaz
e pés), podendo ser realizada na posição vertical, diagonal ou horizontal (à parede ou numa e segura, pelo que se recomenda a realização da avaliação postural estática e/ou dinâmica.
superfície alta estável e segura), dependendo da aptidão física individual da pessoa com obe- Os pontos críticos a avaliar correspondem às principais articulações do corpo humano: tibiotá-
sidade e registando o tempo até à ocorrência de fadiga.
 rsica; joelho; complexo lombar-pélvis-anca; glenoumeral; articulações entre a coluna cervical
e a cabeça, os quais devem ser todos avaliados nos planos frontal anterior, sagital e posterior.
- Força resistente dos membros inferiores: Teste de levantar e sentar na cadeira em 30 seg.
O desempenho neste teste está associado à melhoria da força nos extensores e flexores do Na avaliação postural estática, as alterações posturais mais comuns na obesidade incluem:
joelho, capacidade para subir/descer escadas, velocidade de marcha e risco de quedas, além Síndrome de distorção-pronação (caracterizada pela pronação dos pés juntamente com a
de ser sensível na deteção dos efeitos do treino [69]. adução e rotação interna dos joelhos – joelho valgo);
Síndrome cruzada superior (caracteri-
zada pela projeção anterior da cabeça e protração dos ombros) [75]. Também se recomenda
a realização da avaliação postural dinâmica, em particular nos movimentos de agachar, puxar,

124 125
empurrar e equilíbrio. Os protocolos para a avaliação postural podem ser consultados em Existem vários métodos para avaliar a AF e o CS (Tabela 4). Os questionários são métodos
NASM Essentials of Personal Training (2018) [75]. subjetivos de avaliação do CS e da AF frequentemente utilizados, por serem de simples apli-

 cação e com uma boa relação custo-benefício; no entanto, por dependerem da memória dos
Para a realização da avaliação da aptidão física e para a prática de exercício na pessoa com respondentes estão sujeitos a enviesamentos de resposta. Dentro destes métodos o Global
obesidade, importa considerar ainda: a) A medicação prescrita para tratamento de comorbili- Physical Activity Questionnaire [77], tem sido frequentemente usado e conta com uma ver-
dades, incluindo a dose, frequência e motivo, de modo a conseguir identificar a influência da são validada para a população portuguesa (http://www.who.int/ncds/surveillance/steps/GPAQ/
mesma nas respostas fisiológicas ao exercício e na capacidade de realização do mesmo; b) en/). Este questionário tem poucos itens de resposta e oferece uma visão geral do tempo
Importância de dar particular atenção à pessoa com obesidade que apresenta hipertensão despendido quer em AF com diferentes intensidades, quer em CS, que a pessoa com obesi-
arterial e/ou dislipidemia e/ou diabetes mellitus tipo 2, assegurando-se em cada sessão de dade realiza ao longo de um dia típico, permitindo classificar os indivíduos como ativos (i.e.,
exercício que a mesma reúne as condições necessária para a realização de exercício em atingem as recomendações de AF da OMS ou insuficientemente ativos (i.e., não atingem as
segurança; c) Por motivos de segurança e, também, de calibração, garantir que os equipa- recomendações de AF da OMS)
mentos utilizados são apropriados para as especificidades ponderais da pessoa com obesi- (http://www.who.int/ncds/surveillance/steps/resources/GPAQ_Analysis_Guide.pdf).
dade, particularmente no que diz respeito à adequação das características ergonómicas dos
mesmos [1].

 Tabela 4. Métodos para avaliar a AF e o CS.
Os resultados da avaliação da pessoa com obesidade devem ser interpretados por um fisio- Instrumento Baixo Enviesamento Monitorização De simples Adequados
logista do exercício especialista nesta patologia e transmitidos ao participante. Esta informa- custo de respostas individual de utilização para utilização
ção, em combinação com a anamnese médica e do exercício da pessoa com obesidade, é atividade em meio clinico
utilizada para [1]:
Global Physical X X X X X
Activity Ques-
- Caracterizar o nível inicial e educar os participantes acerca do seu estatuto de aptidão física
tionnaire
relativamente às referências para a sua idade e sexo;
Registos do X X X X
paciente
- Fornecer dados úteis para o desenvolvimento individualizado da prescrição de exercício
direcionados para as componentes de saúde/aptidão física específicas de cada caso; Pedómetros X X X X
Acelerómetros X X
- Recolher dados de acompanhamento que permitam avaliar a evolução relativa ao programa Sensores de X X
de exercício e a longo prazo, à medida que o tempo e a idade vão avançando; movimento
(wearables)
- Motivar os participantes através da definição de objetivos a curto e longo prazo realistas para
a sua saúde/aptidão física. Adaptado de Ainsworth B, Buchholz SW. How to Assess Physical Activity in Clinical Practice and for Scholarly
Work. J Nurse Pract. 2017;13(1):14–20.e2.

AVALIAÇÃO DA ATIVIDADE FÍSICA E DO COMPORTAMENTO SEDENTÁRIO


Para além dos métodos subjetivos de avaliação do CS e da AF, existem outros instrumentos
que estimam o CS e a AF de forma objetiva [78]. Os sensores de movimento detetam objetiva-
A AF pode ser avaliada em termos de frequência (número de vezes por semana), duração
mente e com precisão (in)atividade física realizada no dia a dia oferecendo, assim, particula-
(tempo em minutos ou horas), volume (quantidade de passos, p.e.), tipo (p.e., caminhar, cor-
res vantagens sobre os métodos de auto-resposta, uma vez que não dependem da memória
rer, fazer jardinagem, nadar, etc) e intensidade. O CS pode igualmente ser quantificado em
dos indivíduos. Os pedómetros mais simples são sensores de movimento que quantificam
termos de frequência, duração e tipo (p.e., ver televisão, ler, trabalhar sentado, etc). Conforme
apenas a AF em termos de volume (número de passos dados num dia, p.e.) sem quantificar
já foi referido no ponto 1 deste capítulo (“Conceitos utilizados nas Ciências do Desporto e do
a sua intensidade. Estes instrumentos podem ser muito úteis para avaliação simples e direta
Exercício”) intensidade da atividade física pode ser expressa em equivalentes metabólicos
da AF da pessoa com obesidade e um auxílio na monitorização e motivação de indivíduos
(METs), [76], podendo ser igualmente útil a utilização da escala de perceção subjetiva da
envolvidos em programas de aumento da AF (Tabela 5).
intensidade esforço de Borg [68].

126 127
Tabela 5. Classificação do nível de AF através do número de passos diários. ao longo do tempo.
Adultos Número de passos por dia*
Existem diversos instrumentos para a avaliação do sono, dos quais se podem relevar o Índice
Insuficientemente ativo < 9 999
de Qualidade do Sono de Pittsburgh (IQSP) [84] e o Índice da Saúde do Sono (ISS) [85]. A
Ativo 10 000 – 12 500
seleção de um instrumento para a avaliação do sono vai, em última análise, depender dos
Muito ativo > 12 500 objetivos subjacentes à sua aplicação. Se o interesse for a saúde do sono em geral, o ISS
* baseado numa média de ≥100 passos por minuto pode ser a melhor opção. Caso a utilidade seja a aplicação numa população clínica, como na
Adaptado de Ainsworth B, Buchholz SW. How to Assess Physical Activity in Clinical Practice and for Scholarly obesidade, o IQSP pode ser a solução mais adequada.
Work. J Nurse Pract. 2017;13(1):14–20.e2. [78].

Os acelerómetros podem, também, ser utilizados para monitorizar de forma objetiva vários
parâmetros relacionados com o sono, entre os quais a duração e qualidade do sono, recorren-
Os acelerómetros são outro instrumento de avaliação objetiva de CS e de AF, mais complexos
do a algoritmos desenvolvidos especificamente para essa finalidade [86, 87].
de análise e interpretação dos seus dados, pois requerem software e utilização de pontos de
corte adequados. Podem ser muito úteis quando se pretende uma quantificação bastante
precisa da (in)atividade física dos pacientes em termos de frequência, duração, volume e
intensidade.
AVALIAÇÃO DA QUALIDADE DE VIDA
Hoje em dia é possível encontrar no mercado outros sensores de movimento com um bom
Vários artigos de revisão reforçam a importância de avaliar a qualidade de vida na condição
grau de precisão [79] na maior parte dos telemóveis ou nos denominados wearables (i.e.,
de obesidade visando a melhoria da eficácia e a individualização do processo de tratamento
equipamentos que podemos “vestir”), como pulseiras, relógios ou os smartphones de média e
[88, 89]. Perder peso pode ser bastante difícil para algumas pessoas, no entanto, a diminuição
topo de gama mais recentes. Estes sensores alimentam apps que procuram facilitar a adoção
do peso corporal, mesmo que corresponda a uma perda de peso ligeira ou moderada, origina
de um estilo de vida ativo representando, assim, um potencial aliado para o trabalho com os
uma melhoria da qualidade de vida relacionada com a saúde [88, 90] e, também, uma melhor
pacientes. Foi utilizada propositadamente a palavra “potencial”, pois concorda-se com Wyatt
perceção da qualidade de vida específica, i.e. relacionada, com o peso [91]. Assim, enfatizar
e colaboradores quando referem que é preciso ter cuidado com o apptimism - a noção de que
os ganhos de qualidade de vida como um benefício acrescido pode constituir um fator moti-
as apps vão revolucionar os tratamentos [80]. Certamente que estes sensores e apps facilitam
vacional para manter a adesão ao programa até se verificar a perda de peso redefinindo, ao
a auto-monitorização - a observação e registo dos comportamentos pelos próprios indivíduos
mesmo tempo, o sucesso no controlo do peso [92].
- da AF e tempo em CS, um processo que está associado a bons resultados na adoção de um
estilo de vida mais ativo [81]. A qualidade de vida geral pode ser avaliada através do Short Form Health Survey SF-36 [93],
na versão portuguesa Questionário do Estado da Saúde (QES), desenhado para ser utilizado
Porém, esta informação não é, por si só, suficiente para modificar o comportamento [82], em investigação e na prática clínica, avaliação de políticas de saúde e em investigação da
devendo ser integrada em planos de ação e planos de contingência. Por exemplo, procure população em geral [94]. Tem o objetivo de avaliar o impacto do nível de saúde na qualidade
ajudar a pessoa com obesidade a estabelecer planos de ação que incluam o que vai fazer, de vida de um indivíduo, traduzindo-se em dois resultados finais, componente física e compo-
onde, como, com quem e quando (pode pesquisar apps que sigam esta lógica). Mas não fique nente mental, expressos numa escala de 0 a 100 [95]. Valores mais elevados indicam melhor
por aqui, estabeleça logo em seguida planos de contingência - semelhantes aos anteriores perceção da qualidade de vida relacionada com a saúde.
mas que são desenhados para os dias em que o indivíduo indica ter menos tempo, a meteoro-
Existem igualmente questionários específicos para avaliar áreas de funcionamento relevan-
logia não ajudar ou a pouca vontade espreitar. A informação envolvida com estas estratégias
tes de uma determinada patologia. O questionário Impact of Weight on Quality of Life_Lite
aumenta significativamente a probabilidade da execução do comportamento planeado [83].
(IWQOL-Lite) [96], na versão portuguesa Impacto do Peso na Qualidade de Vida-reduzido
(IPQV-r) [97], inclui domínios que expressam as experiências específicas da pessoa com obe-
sidade. Todas as questões se iniciam com a expressão ‘Devido ao meu peso, ...’, garantindo
a especificidade em relação ao impacto do peso na vida dos indivíduos. O score total pode
AVALIAÇÃO DO SONO
variar entre 0 e 100, correspondendo os valores mais elevados a melhor perceção de qualida-
de de vida relacionada com o peso [98].
Devido à influência que o sono apresenta na obesidade e aos efeitos benéficos que a AF re-
gular parece ter naquela necessidade fisiológica, importa avaliar e monitorizar a sua evolução

128 129
ABORDAGEM TERAPÊUTICA RECOMENDADA PARA A PERDA prazo (≤3 meses) na composição corporal, aptidão cardiorrespiratória e em biomarcadores
DE PESO E PREVENÇÃO DA RECUPERAÇÃO PONDERAL cardiometabólicos, semelhantes ou superiores às verificadas com o treino contínuo com
intensidade moderada a vigorosa, sendo também recomendado para indivíduos com
A proposta terapêutica para a perda de peso e prevenção da recuperação ponderal a elaborar obesidade [101].
pelo fisiologista do exercício deve levar em consideração os resultados dos vários parâmetros
apresentados no ponto 7 (“Diagnóstico”) do presente capítulo, analisando os mesmos e deci- O método HIIT (treino intervalado de intensidade muito vigorosa), consiste numa
dindo acerca das opções a colocar em prática para cada caso particular da pessoa com obesi- abordagem avançada do treino intervalado o qual, na pessoa com obesidade, parece
dade. A proposta terapêutica a efetuar neste âmbito deverá incluir a proposta de prescrição de promover melhores resultados relativamente à composição corporal, sensibilidade à
AF e exercício, juntamente com a sugestão de estratégias para o CS, sono e auto-regulação insulina e pressão arterial [7], com a vantagem destes benefícios ocorrerem mais cedo
do comportamento de AF. Sendo a obesidade uma doença crónica multifatorial na sua etiolo- no tempo [102]. No entanto, importa realçar que, devido à elevada exigência fisiológica
gia e manifestação clínica, qualquer proposta terá que ser complementada com a intervenção que este método de treino implica, só deverá ser utilizado na pessoa com obesidade
dos especialistas das restantes áreas temáticas que compõem o presente manual (clínica, que possua uma aptidão física e condição clínica que permitam a sua realização em
nutrição e psicologia). segurança e com benefícios para a saúde.

No que diz respeito à gestão do peso, a prática de exercício durante a fase de perda
ativa de peso permite, por um lado, maximizar a quantidade de dispêndio energético
ATIVIDADE FÍSICA E EXERCÍCIO para promover a quantidade de redução ponderal pretendida e, por outro lado, integrar
o exercício no estilo de vida da pessoa com obesidade para preparar o sucesso da
Quando é atingida a dose adequada de AF moderada a vigorosa, esta vai resultar na perda de manutenção do peso após a perda [1].
peso e na prevenção da recuperação ponderal, após a perda de peso inicial [7]. A evidência
demonstra que a AF apresenta um efeito aditivo na perda de peso quando é combinada com b) Prevenção da recuperação ponderal
uma restrição alimentar moderada, comparada com a restrição alimentar per se [99].
A prática regular de AF parece ser necessária para a maioria dos indivíduos com
Para que a prescrição do exercício na obesidade seja eficaz e segura, é necessário levar em obesidade que perderam peso conseguirem evitar a recuperação ponderal, mas ainda é
consideração a caracterização e os resultados obtidos na avaliação da aptidão física do indiví- necessária investigação que clarifique a dose necessária para esta finalidade. No entanto,
duo. O estado da arte atual permite apresentar propostas para o planeamento e prescrição do a evidência atual sugere que pode ser necessário um volume de AF superior ao das
exercício para a perda de peso, e para a prevenção da recuperação ponderal na obesidade. recomendações de saúde pública de 150 min.sem-1 na maior parte dos dias da semana.
Alguns estudos propõem ~200-300 min.sem-1 de AF durante a fase de manutenção para
reduzir a recuperação ponderal após perda de peso e parece haver uma relação de
a) Perda de peso dose resposta: “mais é melhor” [11]. A proposta de recomendações para a prevenção da
recuperação ponderal após perda de peso está apresentada na tabela 7.
É reconhecida a existência de uma relação de dose resposta entre os níveis de AF e a
magnitude da perda de peso. De acordo com a tomada de posição do ACSM sobre AF e perda Aconselha-se a monitorização do exercício da pessoa com obesidade, particularmente,
de peso [11]: a) um volume <150 min.sem-1 promove uma perda ligeira de peso; b) >150 min. na presença de comorbilidades para obter informação relevante acerca da resposta
sem-1 resulta numa perda de peso modesta (~2-3 kg); c) >225-420 min.sem-1 origina de 5-7,5 adaptativa ao exercício. Importa salientar que as recomendações apresentadas são
kg, para um período estimado até 6 meses. Os programas de exercício para a obesidade apenas orientações que deverão sempre ser ajustadas à medida de cada caso individual
beneficiam da inclusão do exercício de força, preferencialmente em circuito, para a melhoria da pessoa com obesidade, pelo que nem sempre será possível a sua aplicação direta.
da força muscular, função física e indicadores clínicos, como também para a prevenção da Esta realidade, realça a relevância da avaliação e prescrição de exercício ser efetuada
recuperação ponderal [100]. As recomendações para a prescrição de exercício aconselhadas por um fisiologista do exercício especialista em obesidade, que possua competências
para a perda de peso estão apresentadas na tabela 6. para analisar, também, a informação clínica do indivíduo e interagir com a equipa
multidisciplinar de saúde que o acompanha, prestando o melhor serviço possível a cada
Relativamente aos métodos de treino a utilizar para a prescrição de exercício e no que pessoa com obesidade.
se refere ao exercício aeróbio, o treino intervalado tem vindo a reunir cada vez mais
evidências favoráveis à sua utilização. O treino intervalado promove melhorias a curto
130 131
Tabela 6. Recomendações baseadas na evidência para a prescrição de exercício Tabela 7. Recomendações baseadas na evidência para a prescrição de exercício
aeróbio, de força, flexibilidade e neuromotor para a perda de peso, utilizando o aeróbio, de força, flexibilidade e neuromotor para a prevenção da recuperação ponderal,
acrónimo FITT-VP [1]. As componentes ”volume” (V) e “progressão” (P) estão inseridas utilizando o acrónimo FITT-VP [1]. As componentes ”volume” (V) e “progressão” (P) estão
nas restantes. inseridas nas restantes.
Recomendações baseadas na evidência Recomendações baseadas na evidência
FITT-VP Flexibilidade e FITT-VP Flexibilidade e
Aeróbio Força Aeróbio Força
neuromotor neuromotor
Frequência - ≥ 2-3 dias /semana, Frequência - ≥ 2-3 dias /semana, em
em ambos ambos
- 2-3 d.sem-1 (principais - Progredir em ambos
- ≥5 d.sem-1 - ≥2 d.sem-1 (principais
grupos musculares) aumentando a - 5-7 d.sem-1 - Progredir em ambos
grupos musculares)
frequência ao longo do aumentando a
tempo frequência ao longo do
tempo
Intensidade - Leve (40-50% 1-RM) - - Alongar até ao ponto
idosos e iniciados no treino de desconforto, sem Intensida- - Alongar até ao ponto
da força sentir dor - Moderada (40%-59% - Vigorosa (70-85% de desconforto, sem
de 1-RM) - praticantes sentir dor
- Moderada (50-70% RFC)
- Moderada (40%-59% 1-RM) - praticantes no - Exercícios de com experiência de
RFC) nível intermédio de treino equilíbrio com treino da força
intensidade leve a - Progredir para vigorosa - Exercícios de equilíbrio
da força
moderada (≥60% RFC) para maiores com intensidade leve a
- Progredir para vigorosa - Seguir
(≥60% RFC) para maio- - Vigorosa (70-85% benefícios de saúde e moderada
1-RM) - praticantes com recomendações gerais
res benefícios de saúde e manutenção do peso
perda de peso experiência de treino da nas restantes situações
força
- Progredir gradualmente Tempo - Manter o alongamento
para aumentar força e estático ou dinâmico
massa muscular - 2 séries – treino com- durante 10-30 seg; 2-4
- ≥35 min.d-1 repetições para cada
Tempo - Manter o alongamento binado (tradicional ou
- 2-3 séries – treino com- estático ou dinâmico em circuito) exercício
- Inicialmente, progredir binado durante 10-30 seg; 2-4 - Progredir para ≥250 min.
até 30 min.d-1 repetições para cada sem-1 (≥2000 kal.sem-1) - Progredir em ambos
- 6-10-RM
- 3 séries – treino combi- exercício aumentando a duração
- Após atingir o objetivo nado com treino da força ao longo do tempo
anterior, progredir para em circuito - Progredir em ambos
≥60 min.d-1 aumentando a duração Tipo - Alongamento: estático,
- 6-12-RM ao longo do tempo dinâmico e outros tipos
de alongamento; yoga
- Atividades rítmicas,
Tipo - Alongamento: estático,
dinâmico e outros tipos prolongadas, solicitando - Neuromotor (sobretudo
- Calisténico, bastões,
de alongamento; yoga os principais grupos mus- para adultos mais
- Atividades rítmicas, elásticos, pesos livres,
culares (i.e., caminhar, velhos): apoio bi
prolongadas, solicitando máquinas, etc.
- Neuromotor (sobretudo andar de bicicleta, nadar, e unipedal em pé,
os principais grupos - Calisténico, bastões,
para adultos mais dançar, etc) exercícios utilizando
musculares (i.e., elásticos, pesos livres,
velhos): apoio bi equipamentos para o
caminhar, andar de máquinas, etc. e unipedal em pé, equilíbrio, tai-chi, ou
bicicleta, nadar, dançar, exercícios utilizando outros
etc) equipamentos para o
equilíbrio, tai-chi, ou Nota: RFC – Reserva da frequência cardíaca; RM – Repetições máximas (Adaptado de: American College of
outros Sports Medicine (2018). Guidelines for exercise testing and prescription. Tenth edition. Philadelphia, PA, Wolters
Kluwer Health).
Nota: RFC – Reserva da frequência cardíaca; RM – Repetições máximas (Adaptado de: American College of
Sports Medicine (2018). Guidelines for exercise testing and prescription. Tenth edition. Philadelphia, PA, Wolters
Kluwer Health).

132 133
Para facilitar e permitir a realização dos volumes de exercício recomendados para a perda COMPORTAMENTO SEDENTÁRIO
e manutenção do peso, o indivíduo com obesidade pode repartir a AF ou o exercício por
vários períodos ao longo do dia com uma duração mínima de 10 min, até acumular a A evidência existente indica que vários tipos de intervenções podem ser eficazes na
quantidade visada. Outra alternativa consiste em aumentar o volume de AF com intensidade redução do CS, sendo possível apresentar recomendações para ajudar na gestão do peso na
moderada integrada no estilo de vida. A acumulação de períodos intermitentes de exercício obesidade e melhorar, também, o estado de saúde gera (tabela 9).
pode aumentar o volume de AF em sujeitos previamente inativos e promover a adoção e
manutenção da AF ao longo do tempo [103].
Tabela 9. Recomendações para reduzir o comportamento sedentário.

- Limitar o tempo passado em comportamento sedentário a um máximo de 6-8 h.dia-1


c) Atividade física integrada no estilo de vida - Implementar estratégias para reduzir o comportamento sedentário no trabalho e transportes.

- Reduzir o tempo de TV a um máximo de 3-4 h.dia-1.


O aumento da AF integrada no estilo de vida da pessoa com obesidade (i.e., caminhar para
e do local de trabalho, realizar tarefas domésticas, jardinagem, passear o cão, entre outras), - Se não conseguir reduzir o tempo passado sentado, LEVANTE-SE e caminhe durante pelo
incrementa o dispêndio energético diário e deve ser encorajado como parte de um estilo de menos 2 min a cada 30 min (no trabalho e em casa).
vida mais ativo para a gestão do peso no indivíduo com obesidade. Este tipo de atividade, - Quanto mais vezes interromper o comportamento sedentário, com uma frequência não inferior
também, pode constituir a abordagem inicial junto de indivíduos fisicamente inativos e que a 10 min, melhores serão os benefícios para a obesidade.
não possuam uma aptidão física adequada ou estejam relutantes em praticar exercício - Promover junto da entidade patronal a aquisição de secretárias que permitam estar em pé ou
estruturado. sentado.

- As alterações ao comportamento sedentário adicionam, mas não substituem os benefícios da


O pedómetro constitui um dispositivo de fácil utilização que pode ser obtido através de uma prática de exercício físico.
das diversas apps disponíveis gratuitamente para smartphone. O pedómetro, dependendo
da versão da app, pode incluir a identificação da AF com intensidade leve, moderada e
vigorosa, fazendo com que o número de passos que seriam equivalentes a 150-300 min.sem-
1
possam variar de indivíduo para indivíduo e ficar abaixo dos 10,000 passos.d-1 habitualmente
recomendados [104]. Assim, as recomendações para a AF integrada na rotina diária tendo
como referência o tempo passado em AF com intensidade moderada a vigorosa podem ser SONO
consultadas na tabela 8.
Há cada vez mais investigação a interligar o sono e a obesidade, através de associações
que envolvem uma duração insuficiente do sono, qualidade e eficiência do sono,
sonolência diurna, entre outros [41, 105]. Assim, importa conhecer as orientações para a
Tabela 8. Equivalência entre o número de passos diários e o tempo em AF com intensidade duração do sono na idade adulta e boas práticas que possam contribuir para a saúde do
moderada a vigorosa (AFMV). sono, com potencial para impactar de forma benéfica a obesidade.

Tempo em AFMV Nº de passos


Homens - 7,900 passos.d-1 a) Adultos dos 18-25 anos
30 min.d-1
Mulheres – 8,300 passos.d-1
De acordo com as recomendações da National Sleep Foundation [106], em adultos jovens
150 min.sem-1 8000 passos.d-1 (ou 49,000 passos.d-1)
(18-25 anos), 7 a 9 horas de sono por dia são recomendadas para manter a saúde
Adaptado de Tudor-Locke, C., et al., Accelerometer steps/day translation of moderate-to-vigorous activity. Prev em geral, bem como as componentes cognitiva, emocional e física da saúde. Neste
Med, 2011. 53(1-2): p. 31-3 [104]. intervalo etário, padrões de sono saudáveis promovem a adaptação e o desempenho no
prosseguimento de estudos.

134 135
b) Adultos dos 26-64 anos REALOCAÇÃO DO TEMPO DIÁRIO

Para os adultos em geral, a duração aconselhada para o sono, também, é de 7 a 9 horas A realocação do tempo diário ocupado pela AF, CS e sono pode promover alterações em
diárias. A privação do sono está a aumentar na população adulta afetando particularmente o indicadores da obesidade e da saúde. O conhecimento atual ainda é escasso pelo que se
intervalo etário dos 45 aos 54 anos de idade, período em que o tempo de trabalho geralmente apresenta nas figuras seguintes um exercício com propostas para a utilização desta estratégia
atinge o seu pico no ciclo de vida, com efeitos adversos no desempenho multitarefa, como complemento das recomendações apresentadas anteriormente neste capítulo para
regulação do peso, segurança no trabalho, saúde mental, glicemia, pressão arterial e saúde aquelas variáveis comportamentais [49].
cardiovascular, sobretudo com durações reduzidas do sono durante os dias úteis [106]

c) Adultos ≥65 anos

Sete a 8 horas de sono por dia constitui a recomendação para adultos idosos [106],
associando-se a melhor desempenho cognitivo, menores taxas de doença mental e física, e
melhor qualidade de vida quando comparada com durações de sono mais curtas ou longas.
Uma duração excessiva do sono em adultos idosos pode ser um sinal da necessidade de
avaliação médica, neurológica ou psiquiátrica.

d) Boas práticas para a saúde do sono

Apesar de uma boa higiene do sono nem sempre ser suficiente para tratar desordens de
insónia, a evidência sugere um conjunto de boas práticas que podem melhorar e contribuir
para manter a saúde do sono em geral (tabela 10) [39].

A avaliação e monitorização do sono permite ao fisiologista do exercício promover ajustamentos


no programa de exercício que possam ter um efeito benéfico nesta componente, promovendo
um eventual efeito aditivo na gestão do peso e na saúde em geral. A persistência de
desregulações no sono ao longo do tempo na pessoa com obesidade, possibilitará a sua
referenciação para acompanhamento clínico especializado.

Tabela 10. Recomendações de boas práticas para a saúde do sono.

- Manter um horário regular de sono e de rotina de deitar (mesmo ao fim de semana.


- Procurar a exposição a luz brilhante durante o dia (sobretudo de manhã) e evitar luz brilhante à
noite (principalmente a meio da noite).
- Manter o quarto fresco, escuro e confortável.
- Evitar cafeína, nicotina, álcool e medicação estimulante à noite.
- Evitar comida e líquidos em excesso à noite.
- Evitar fazer sestas (especialmente quando existe dificuldade em adormecer à noite).
- Evitar olhar obsessivamente para o relógio durante a noite.

Figura 6. Proposta de realocação do tempo com impacto em indicadores de obesidade - IMC e perímetro da cintura
Adaptado de Grandner, M.A., Sleep and obesity risk in adults: possible mechanisms; contextual factors; and (Adaptado de Colley, R.C., I. Michaud, and D. Garriguet, Reallocating time between sleep, sedentary and active
implications for research, intervention, and policy. Sleep Health, 2017. 3(5): p. 393-400 [39]. behaviours: Associations with obesity and health in Canadian adults. Health Rep, 2018. 29(4): p. 3-13) [49].

136 137
demais profissionais): sair da tradicional tendência de prescrever e controlar a prática de AF
regular focada na perda de peso, que ‘mina’ as competências de auto-regulação; passar para
uma atitude compassiva baseada no mindfulness e aceitação, que sustenta a capacidade dos
praticantes com obesidade utilizarem estratégias de auto-regulação que melhor sustentam as
suas escolhas num ambiente obesogénico.

Algumas estratégias poderão passar por:

- Clarificar valores e comprometer-se com comportamentos neles baseados: o profissional


pode ajudar a clarificar as escolhas comportamentais dos praticantes entre o permanecer
comprometido com os valores versus o desejo mais imediato de diminuir um estado aversivo
(ou aumentar um prazeroso) [108]. É menos provável que alguém se levante cedo para andar,
a menos que esteja claramente consciente e se comprometa com um valor como “ser um pai
fisicamente ativo e apto”.
Figura 7. Proposta de realocação do tempo com impacto no estado de saúde geral (Adaptado de Colley, R.C., I. Michaud,
and D. Garriguet, Reallocating time between sleep, sedentary and active behaviours: Associations with obesity and health
in Canadian adults. Health Rep, 2018. 29(4): p. 3-13) [49]. - Consciência metacognitiva (treino de mindfulness): o profissional pode utilizar uma
confrontação amável para amplificar a consciência contínua da pessoa com obesidade no
comportamento atual e suas consequências, e esperar ‘compassivamente’ que ela decida
entre manter comportamentos sedentários “inconscientes” versus compreender a necessidade
e valor do comportamento mais saudável (consciência metacognitiva).

- Capacidade de tolerar o sofrimento experiencial e a redução de prazer: Esforços para


evitar/escapar de experiências internas negativas (i.e. fadiga ou suor, tédio ou ansiedade)
são reforçados negativamente por reduções temporárias do desconforto, mas isto tende a
intensificar a angústia com o passar do tempo, trazendo culpa. Igualmente, a tolerância às
Figura 8. Proposta de realocação do tempo com impacto no estado de saúde mental (Adaptado de Colley, R.C., I.
Michaud, and D. Garriguet, Reallocating time between sleep, sedentary and active behaviours: Associations with obesity experiências menos prazerosas, perante uma alternativa mais hedonista, é outra competência
and health in Canadian adults. Health Rep, 2018. 29(4): p. 3-13) [49]. de auto-regulação. Por exemplo, alguém que escolhe desligar a televisão e sair para passear
aceita o prazer reduzido (ou pelo menos a antecipação de prazer reduzido) que acompanha
a caminhada versus a televisão, mas isso não implica que a caminhada seja considerada
Estes estudos sugerem que a AF com intensidade leve pode ser importante para subgrupos da angustiante [63].
população que considerem difíceis de adotar e manter os programas de exercício constituídos
em grande parte por AF com intensidade moderada a vigorosa [107]. São necessários mais
estudos que permitam obter evidência robusta conducente à elaboração de recomendações Para realizar plenamente estes objetivos é necessário que os locais de prática de AF ofereçam
de saúde pública relativamente à realocação do tempo diário em diferentes comportamentos, um ambiente acolhedor que limite as situações de estigmatização, assegurando que pessoas
contemplando, também, grupos específicos em função da idade, estatuto ponderal, ou outros. de todos morfologias corporais possam ser motivadas a exercitar-se livres de formas diretas
e indiretas de descriminação.

A alternativa da prática outdoor pode satisfazer as necessidades da pessoa com obesidade.


INTERVENÇÃO NA AUTO-REGULAÇÃO DO COMPORTAMENTO DE ATIVIDADE FÍSICA O green exercise ou AF/exercício que ocorre na presença da natureza, como por exemplo,
andar de bicicleta ou caminhar num parque urbano ou floresta [109], constitui uma atividade
Na sequência dos conteúdos abordados no ponto 6 do presente capítulo (“Auto-regulação alternativa à prática indoor reunindo os benefícios da exposição simples à natureza [110] com
do comportamento de atividade física”), reforça-se a importância da emergência de uma os benefícios da prática regular de AF. Pode facilitar a adesão à AF pelo facto de estar associada
mudança de paradigma para os fisiologistas do exercício envolvidos na gestão do peso (e a menores níveis de perceção de esforço, de stress e fadiga mental, levando à melhoria do

138 139
humor (p.e., reduzindo tensão, raiva e depressão), da auto-estima e da perceção do estado isbnpa.org/) têm vindo a ganhar relevância na promoção e divulgação da evidência produzida
de saúde [111]. Assim, a prescrição e supervisão desta prática, ou apenas o acesso de uma nesta área. Como resultado, pode resumir-se o estado-da-arte na frase “é difícil, mas possível”
pessoa a espaços verdes poderia, assim, ser um dos recursos importantes do ambiente vivo modificar os comportamentos de saúde.
para aumentar as contribuições da AF, reduzir a obesidade e melhorar a saúde [112].
Segundo os trabalhos de Susan Michie e colaboradores [117], os elementos estruturantes
da modificação comportamental são as Teorias da Modificação Comportamental e as
Técnicas de Modificação Comportamental. Estes autores criaram uma taxonomia que facilita
ADESÃO A PROGRAMAS DE GESTÃO DO PESO E DE ATIVIDADE a identificação das teorias e técnicas que têm vindo a ser usadas com maior sucesso nas
FÍSICA intervenções. Como resultado, ficou claro que as que têm maior sucesso, sejam presenciais
ou digitais, utilizam explicitamente um racional teórico completo (ao invés de usar apenas
Drugs don’t work in patients who don’t take them… uma ou duas ideias da teoria) como pano de fundo da escolha das técnicas de modificação
Osterberg L, Blaschke T. Adherence to medication. N Engl J Med 2005;353:487-97. comportamental.

A adesão aos comportamentos de saúde, seja em contextos de tratamento, seja em contextos Seguidamente, apresenta-se uma das propostas de racional teórico que melhores resultados
de prevenção, é uma das maiores preocupações dos profissionais de saúde. No caso específico tem obtido: o modelo COM-B [118], sabendo que outros racionais, como a Teoria da Auto-
da obesidade, os medicamentos a que se referem os autores do artigo, transformam-se em Determinação [119] ou a Teoria Socio-Cognitiva [120] seriam abordagens igualmente eficazes
comportamentos de AF e alimentação que sofrem, também eles, de problemas de adesão e seguras.
(veja-se o caso das denominadas dietas “iôiô”, que encontram reflexo nas situações de AF e
exercício “iôiô” ou sazonal).
Um modelo de intervenção
Nestes comportamentos, os dados de adesão mostram que apenas 4 de cada 10 novas
inscrições nos ginásios em Portugal renovam o seu compromisso para além do 1º ano (dados A teoria COM-B está representada na Figura 9. A Competência representa a ideia de “Quanto
de 2014), resultado este em tudo semelhante ao obtido noutros países. No caso da adesão sou capaz”, a Oportunidade a ideia de “Tempo e espaço”, a Motivação representa os “Porquês”
a programas de perda de peso verificam-se números igualmente preocupantes, desde 1 dos Comportamentos (Behaviours) de AF e alimentação.
pessoa em cada 10 após um ano em contextos comerciais [113], até 7 pessoas em cada
10 em contextos de investigação, onde os recursos disponíveis para o acompanhamento Competência
dos participantes são normalmente bastante superiores aos disponíveis em programas
comunitários ou comerciais [114, 115].

Com o advento das novas tecnologias, integrando programas de mHealth ou eHealth, gerou- Oportunidade Behaviour (Comportamento)
se a expectativa de que se poderia conseguir replicar o acompanhamento das intervenções
que apresentam os melhores resultados, que incluem sessões presenciais. No entanto, e
até ao momento, os estudos meta-analíticos demonstram que há muito pouco impacto da
utilização destes recursos na adesão a longo prazo [116]. Motivação

Figura 9. Modelo de intervenção para a adoção e manutenção da adesão a comportamentos de AF e de alimentação


(Adaptado de Michie, S., M.M. van Stralen, and R. West, The behaviour change wheel: a new method for characterising
and designing behaviour change interventions. Implement Sci, 2011. 6: p. 42).
MODIFICAÇÃO COMPORTAMENTAL: A EVIDÊNCIA NA ÁREA DA ATIVIDADE FÍSICA E
NUTRIÇÃO

Em contra-corrente a estes dados pouco animadores, surge um conjunto de ideias resultantes Caso deseje realizar uma avaliação mais completa destas variáveis, pode dirigir-se ao
de (dir-se-á... finalmente) algum financiamento disponível para a investigação na área da Repositório de Instrumentos de Avaliação Psicossocial (http://repositorio.fmh.ulisboa.pt), uma
modificação comportamental. Diversas iniciativas (https://scienceofbehaviorchange.org/ ou iniciativa que tem vindo a catalogar questionários em português.
http://www.ucl.ac.uk/behaviour-change) e sociedades científicas internacionais (https://www.

140 141
Recomenda-se que, durante a vossa intervenção, se procure avaliar cada uma das INTERVENÇÃO MULTIDISCIPLINAR – CONTRIBUTO DO
componentes deste modelo, de forma a que possam dedicar a vossa atenção a ajudar a FISIOLOGISTA DO EXERCÍCIO
pessoa com obesidade a melhorar os eventuais pontos fracos. Note-se o sublinhado, o
indivíduo é o diretor das suas ações, encontrando as suas próprias soluções, com a ajuda do
fisiologista do exercício ou outros profissionais. Tipicamente, somos tentados a prescrever a Sendo a obesidade uma doença crónica de etiologia multifatorial e com um impacto
solução e cede-se ao “reflexo de correção” (que surge na presença de um potencial erro por sistémico no organismo, requer o envolvimento de equipas multidisciplinares capazes
parte da pessoa com obesidade): “não faça isso, faça antes isto”, quando o erro pode ser uma de desenvolver programas de tratamento que incluam: a) acompanhamento alimentar e
ótima oportunidade para mostrar novos caminhos. Estas e outras técnicas de entrevista foram nutricional ajustado às necessidades e preferências da pessoa com obesidade; b) exercício
desenvolvidas na entrevista motivacional, que já apresenta vasta evidência em contextos de estruturado individualizado; c) psicoterapia, tendo em vista alterações amplas no peso através
saúde [121], sendo por isso uma boa ferramenta para as intervenções em modificação de da avaliação, gestão e otimização da saúde dos pacientes [125, 126]. Paralelamente, existe
comportamento. também a necessidade de tratamentos seguros e eficazes que possam ir para além das
opções agora disponíveis.
Ao seguir o COM-B ficará com uma perceção do estado de prontidão da pessoa com
obesidade, ou, no caso de já estar ativamente a realizar os comportamentos, do seu grau de Deste modo, uma equipa multidisciplinar que inclua o clínico especialista em farmacoterapia,
sustentabilidade. enfermeira, nutricionista, fisiologista do exercício e psicólogo pode oferecer um programa
de perda de peso que combine intervenções eficazes de cada área profissional. Estes
É neste enquadramento que surgem as técnicas de modificação comportamental (TMC), profissionais devem ser especialistas certificados em obesidade que proporcionem tratamento
definidas como componentes desenhadas no sentido de mudar comportamentos e que são baseado na evidência e individualizado [127].
observáveis e replicáveis. Como exemplos: o estabelecimento de objetivos, os planos de ação,
e a procura de informações representam componentes que visam mudar o comportamento e Ao fisiologista do exercício competirá avaliar, planear, prescrever, conduzir e acompanhar
que se pode observar e replicar. Reforça-se a noção que estas TMCs devem ser aplicadas de programas e iniciativas de promoção da atividade física/exercício e de estilos de vida ativa,
acordo com um racional teórico. interagindo com os restantes elementos da equipa multidisciplinar para o alcance dos objetivos
comuns. Será, também, da competência do fisiologista do exercício identificar serviços locais,
Interessa agora conhecer quais delas estão associadas a melhores taxas de adesão na AF e instalações ou grupos que possam ser incluídos no apoio local ao tratamento da obesidade,
alimentação. Diversas meta-análises têm sido publicadas sobre este tema [122-124]. Delas ir ao encontro das necessidades de diferentes grupos e direcionar para determinantes mais
emergem as seguintes TMC, que estão consistentemente associadas à adesão a longo-prazo: amplas da saúde (p.e., grupos comunitários de caminhada, programas de exercício, projetos
de jardinagem, etc) [128].
1. Automonitorização (self-monitoring BCT 2.3)
2. Estabelecimento de objectivos (goal setting BCT 1.1)
3. Planos de acção (action planning BCT 1.4)

CONCLUSÃO
Recomenda-se, portanto, que a pessoa com obesidade desenvolva competências na
utilização destas TMC. E se se está a questionar o que significam as siglas BCT 2.3, 1.1
ou 1.4, elas representam os códigos da taxonomia criada por Michie e que está disponível A AF e o exercício são reconhecidos como uma componente importante de um programa de
gratuitamente numa app (procure por “BCT taxonomy” no seu smartphone). É um ótimo gestão do peso. Todos os indivíduos com obesidade devem beneficiar do aconselhamento
recurso para aprofundar o tema. de AF e da prescrição de exercício como parte da gestão do peso e da saúde em geral.
As recomendações e precauções específicas vão variar consoante as características da
Necessariamente, a melhor recomendação que se pode deixar é: procure saber mais sobre obesidade, a idade, os hábitos de AF, comportamento sedentário e sono, juntamente com a
o que afeta a adesão ao comportamento. Este texto deixou-lhe várias pistas para o ajudar, ausência/presença de comorbilidades.
mas o próximo passo está do seu lado. Procure dá-lo em breve, para que possa estar melhor
preparado a ajudar as pessoas que o procuram a mudar o comportamento. O presente capítulo apresenta um conjunto de recomendações baseadas na evidência atual,
as quais requerem adequação individualizada a cada adulto com obesidade que pretenda
iniciar ou já pratique AF, de modo a ir ao encontro das necessidades específicas de cada caso.
142 143
Para além da prática regular de AF, todas as pessoas com obesidade devem ser encorajadas Referências Bibliográficas
a reduzir o tempo passado em CS, bem como a interromper frequentemente o tempo
despendido na posição de sentado, realizando períodos curtos de AF ou intercalando períodos 1. Medicine, A.C.o.S., ACSM’s guidelines for exercise testing and prescription Tenth edition ed. 2018,
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dos indivíduos com obesidade. A alteração e adoção de novos comportamentos é difícil,
assumindo particular relevância a promoção da auto-regulação e da adesão aos mesmos de 3. Caspersen, C.J., K.E. Powell, and G.M. Christenson, Physical activity, exercise, and physical fitness:
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Face à complexidade que caracteriza a obesidade, a avaliação e enquadramento por uma 36(4): p. 173-8.
equipa de saúde multidisciplinar é fundamental. Na constituição desta, recomenda-se a 5. Cooper, K.H., Aerobics. 1969, Philadelphia, PA: Bantam Books.
inclusão de um Fisiologista do Exercício, com formação especializada para intervir junto da
pessoa com obesidade, assegurando-se, assim, uma avaliação, planeamento, prescrição e 6. Lesinski, M., et al., Effects of Balance Training on Balance
acompanhamento no âmbito da AF adequados a esta doença crónica. Performance in Healthy Older Adults: A Systematic Review and Meta-analysis. Sports Med, 2015. 45(12):
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150 151
CAPÍTULO VIII

TRATAMENTO
FARMACOLÓGICO DO
EXCESSO DE PESO E
OBESIDADE

152 153
TRATAMENTO FARMACOLÓGICO DO INDICAÇÕES PARA TRATAMENTO FARMACOLÓGICO

EXCESSO DE PESO E OBESIDADE A terapêutica farmacológica deve ser considerada, em associação às medidas de estilo de
vida, em todos os indivíduos com IMC ≥ 30 Kg/m2 ou IMC entre 27 e 29,9 kg/m2 e pelo menos
uma comorbilidade associada, que não tenham atingido o objetivo da perda de peso (perda
de pelo menos 5% do peso corporal total em 3 a 6 meses) com medidas de intervenção do
estilo de vida.
A decisão de início de terapêutica farmacológica deve ser individualizada e efetuada apenas
Selma B. Souto
após avaliação cuidadosa dos riscos e benefícios de todas as opções terapêuticas.
Serviço de Endocrinologia do Hospital de Braga
Caso não tenha havido uma perda de, pelo menos, 5% do peso corporal após três meses,
deve ser considerada a interrupção do fármaco.
Carolina Moreno
Serviço de Endocrinologia do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, E.P.E.
Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra

Dircea Rodrigues FÁRMACOS DISPONÍVEIS EM PORTUGAL PARA TRATAMENTO DA OBESIDADE:


Serviço de Endocrinologia do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, E.P.E. ORLISTATO, LIRAGLUTIDO E BUPROPIOM/NALTREXONA DE LIBERTAÇÃO
Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra PROLONGADA.

Gustavo Rocha O orlistato, o liraglutido e a associação de bupropiom/naltrexona são os únicos fármacos que,
Serviço de Endocrinologia do CHVNG/E estando aprovados pela EMA e FDA, estão disponíveis em Portugal.

M Helena Cardoso
Serviço de Endocrinologia do Centro Hospital do Porto
Professora Associada de Endocrinologia do ICBAS
ORLISTATO
José Silva Nunes
O orlistato é um inibidor reversível das lipases gástrica e pancreática, inibindo a absorção da
Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo do Centro Hospitalar de Lisboa Central
NOVA Medical School / Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa gordura alimentar em 30%. A sua absorção é mínima (<1%), sendo metabolizado em dois
Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Lisboa (Instituto Politécnico de Lisboa) metabolitos inativos na parede gastrointestinal, e a sua eliminação é essencialmente fecal
(97%) [1].
Maria Lopes Pereira
Serviço de Endocrinologia do Hospital de Braga A sua eficácia na perda de peso tem sido demonstrada em diversos estudos randomizados e
meta-análises [2-12]. Uma meta-análise de 12 estudos com orlistato associado a intervenção
Paula Freitas comportamental apresentou perdas de peso, em doentes diabéticos e não diabéticos, de 8%
Serviço de Endocrinologia do Centro Hospitalar São João em relação ao peso inicial em 12 meses, com manutenção do peso perdido durante 24 a 36
Faculdade de Medicina da Universidade do Porto
meses de tratamento [12]. No estudo XENDOS, que envolveu 3304 doentes, dos quais 21%
tinham alteração da tolerância à glicose, nos primeiros 12 meses houve uma perda ponderal
Teresa Azevedo
de 11%, comparativamente com 6% no grupo placebo, com um pequeno reganho de peso
Serviço de Endocrinologia do Centro Hospitalar do Baixo Vouga
nos 3 anos seguintes, traduzindo-se por uma perda de peso no final de 6,9% em relação ao
peso inicial, comparativamente com 4,1% no grupo placebo [2].

O estudo XENDOS é o estudo mais longo realizado com orlistato (4 anos) e demonstrou que
a associação do orlistato à alteração do estilo de vida permitiu uma menor progressão para
diabetes tipo 2, em comparação com o placebo (taxa de incidência cumulativa de diabetes
tipo 2 de 2,9% com orlistato versus 4,2% para o placebo), com redução da conversão de

154 155
alteração da tolerância à glicose para diabetes de 37% [2]. Este estudo também demonstrou antagonistas da vitamina K [1]. A solução para contornar este problema passa por administrar
uma melhoria precoce e significativa do perímetro da cintura, da hipertensão arterial (HTA) e o fármaco em causa (sobretudo ciclosporina e levotiroxina) no mínimo 3-4 horas antes ou
dislipidemia. após a administração do orlistato.

Em estudos que envolveram doentes diabéticos, a terapêutica com orlistato promoveu uma
maior perda de peso e diminuição da HbA1c aos 12 meses comparativamente com o placebo
[4, 8, 9]. Mensagens chave:

Numa meta-análise de 4 estudos envolvendo doentes obesos hipertensos, o orlistato O orlistato é um inibidor reversível das lipases gástrica e pancreática, inibindo a absorção da
promoveu uma maior perda de peso (diferença média ponderada de -3,7 kg), com redução gordura alimentar em 30%, mecanismo pelo qual induz balanço energético negativo e perda
significativa da pressão arterial sistólica e diastólica (diferença média ponderada de -2,5 ponderal.
mmHg e – 1,9 mmHg, respetivamente), em comparação com o placebo [13].
A dose recomendada é 120 mg imediatamente antes, durante ou até uma hora após cada
O orlistato tem um bom perfil de segurança cardiovascular, com efeitos benéficos na refeição principal, associada a uma dieta moderadamente hipocalórica.
concentração do colesterol total e LDL [3, 14]. Para além da perda de peso, esta melhoria do Os efeitos secundários são predominantemente gastrointestinais.
perfil lipídico está provavelmente relacionado com a perda fecal de gordura. Outros estudos São contra-indicações a gravidez, síndrome de malabsorção crónica, antecedentes de litíase
demonstraram uma redução da hipertrigliceridemia pós-prandial associada a esta terapêutica renal por oxalatos e colestase. Não está recomendado em doentes com compromisso renal
[15]. e/ou hepático e idosos.

Em Portugal, o orlistato está disponível em cápsulas de 120 mg (sob prescrição médica, com
o nome comercial de Xenical® e formulação genérica) e de 60 mg (venda livre, com o nome LIRAGLUTIDO
comercial de Alli®). A dose recomendada é 120 mg tomada com água imediatamente antes,
durante ou até uma hora após cada refeição principal, associada a uma dieta moderadamente O péptido-1 semelhante ao glucagon (glucagon-like peptide 1 - GLP-1) foi descoberto no
hipocalórica. Se for omitida uma refeição ou se esta não contiver gordura, a dose de orlistato início da década de 1980 e demonstrou atuar como hormona incretina. Contudo, o GLP-1 é
deve ser omitida [1]. rapidamente destruído pela enzima dipeptidilpeptidase-4 (DPP-4), tendo uma semivida de 1-2
minutos. Com o intuito de desenvolver um agonista do recetor GLP-1 de ação prolongada,
Não foi estudado o efeito do orlistato em doentes com compromisso renal e/ou hepático e a sequência peptídica foi modificada no terminal N para estabilizar a molécula contra a
idosos [1]. degradação pela DPP-4 e cadeias laterais de ácidos gordos foram adicionadas (cadeia de
ácido palmítico de 16 carbonos) para aumentar a ligação às proteínas e prolongar a sua
Os efeitos adversos principais são os efeitos gastrointestinais, nomeadamente: corrimento semivida, sendo criada a molécula do liraglutido, com uma homologia estrutural de 97% com
anal oleoso (4-27%), dor abdominal (<26%), flatulência com descarga fecal (2-24%), urgência o GLP-1 humano [18-20].
intestinal (3-22%), esteatorreia (6-20%), náuseas (4-8%), incontinência fecal (2-8%), diarreia
infeciosa (<5%) e dor retal (3-5%) [1]. O GLP-1 tem um efeito supressor de apetite através de mecanismos periféricos e por ação
no sistema nervoso central. A nível periférico, o GLP-1 atua sobre a motilidade intestinal
São contra-indicações para o uso do orlistato a gravidez (não recomendado na amamentação), promovendo atraso no esvaziamento gástrico. A distensão gástrica resultante estimula os
síndrome de malabsorção crónica, antecedentes de litíase renal por oxalatos, colestase e sinais aferentes vagais dirigidos ao trato solitário, à área postrema e aos centros hipotalâmicos
hipersensibilidade conhecida ao orlistato [1, 16, 17]. para induzir a saciedade [21-23].

São necessários alguns cuidados, relacionados com interações medicamentosas: o orlistato O GLP-1 endógeno é secretado pelas células L do intestino delgado e atua nos seus recetores
pode diminuir a concentração de fármacos, tais como amiodarona, anticonvulsivantes, anti- expressos, predominantemente, no trato gastrointestinal superior, ilhéus pancreáticos e nervos
retrovíricos, propafenona, ciclosporina, levotiroxina e nutrientes lipossolúveis (beta-caroteno e viscerais. No sistema nervoso central, o GLP-1 é secretado como um neurotransmissor por
vitaminas A, D, E, K) [1]. Os doentes devem ser fortemente encorajados a fazer suplementação neurónios em várias áreas do cérebro, incluindo o hipotálamo. Os recetores do GLP-1 estão
vitamínica com vitaminas lipossolúveis pois demonstrou-se que o orlistato reduz a absorção amplamente distribuídos por todo o cérebro e densamente expressos em núcleos hipotalâmicos
de algumas vitaminas e beta-caroteno.O orlistato pode potenciar o efeito anticoagulante dos envolvidos na regulação do apetite, como os núcleos paraventricular e arqueado. Estima-se

156 157
que 10-15% do GLP-1 endógeno pode atingir a circulação sistémica e atravessar a barreira comparação com o placebo (p<0,001 para todos). A frequência cardíaca foi ligeiramente maior
hematoencefálica ativando os seus recetores hipotalâmicos. Adicionalmente, o liraglutido no grupo sob liraglutido (cerca de 2-3 batimentos por minuto acima do grupo placebo, p<0,001).
demonstrou estimular os neurónios hipotalâmicos produtores de pró-ópiomelanocortina Houve também uma melhoria significativa no perfil lipídico (triglicerideos e colesterol total,
(POMC) e inibir a expressão de neuropéptido Y e de péptido relacionado com a proteína HDL e LDL) nos doentes tratados com liraglutido (p variando entre 0,02 e <0,001). A incidência
Agouti (Agouti-related peptide – AgRP), resultando em supressão do apetite. Essas ações de neoplasias foi semelhante em ambos os grupos. Em doentes com hiperglicemia intermédia
também podem ocorrer noutras áreas do cérebro, como o sistema mesolímbico, resultando pré-existente, foi documentado o efeito do liraglutido na redução do risco de diabetes tipo 2
na redução dos sinais de recompensa induzidos pela ingestão alimentar, com subsequente ao fim do primeiro ano (4 vs 14 doentes evoluíram para diabetes) e ao fim dos três anos (à
redução do aporte calórico [24-34]. semana 160, 1,8% no grupo sob liraglutido desenvolveram diabetes tipo 2 vs 6,2% no grupo
placebo). Tal corresponde a uma redução do risco de desenvolver diabetes tipo 2 de 79%
Não está claro se o GLP-1 influencia o gasto energético. Estudos em ratos demonstraram mediante terapêutica com liraglutido (hazard ratio de 0,21; p<0,001) e o tempo estimado para
aumento da termogénese mediante administração de liraglutido; nos humanos, esse efeito o desenvolvimento da diabetes tipo 2 foi 2,7 vezes maior no grupo sob liraglutido do que
não foi demonstrado de forma inequívoca [35-38]. naquele sob placebo (intervalo de confiança de 95%;1,9 a 3,9). Também a perda de peso foi
significativamente superior no grupo sob liraglutido, ao fim dos três anos de seguimento (-6,1
Foi desenvolvido um plano de ensaios clínicos com utilização do liraglutido 3,0 mg - o programa Kg vs -1,9 Kg; p<0,001)
SCALE (Satiety and Clinical Adiposity - Liraglutide Evidence). Este programa, englobando
quatro estudos, avaliou a eficácia do liraglutido 3,0 mg na perda de peso e o seu potencial Os resultados deste estudo confirmaram o valor do liraglutido como agente farmacológico com
no retardamento da evolução para diabetes de doentes com pré-obesidade/obesidade e eficácia terapêutica na perda de peso, na melhoria de vários parâmetros cardiometabólicos e
hiperglicemia intermédia (SCALE Obesity and Prediabetes), a eficácia na perda ponderal que pode prevenir a diabetes tipo 2.
em doentes com diabetes tipo 2 (SCALE Diabetes), a melhoria do quadro respiratório em
doentes com síndrome de apneia obstrutiva do sono (SCALE Sleep Apnea) e a eficácia na
manutenção do peso perdido mediante intervenção no estilo de vida ou a perda ponderal SCALE Diabetes [41]
adicional (SCALE Maintenance).
Este foi um estudo randomizado, duplamente cego, controlado por placebo, com o objetivo
primário de avaliar a eficácia do liraglutido, ao fim de um ano, em doentes com diabetes
SCALE Obesity and Prediabetes [39, 40] tipo 2 e pré-obesidade/obesidade. Foram randomizados 846 indivíduos com IMC de, pelo
menos, 27 kg/m2 e diabetes tipo 2 (com HbA1c entre 7,0 e 10,0%) na proporção de 2:1:1
Este foi um estudo randomizado, duplamente cego, controlado por placebo, realizado durante para liraglutido 3,0 mg, liraglutido 1,8 mg e placebo. A titulação das doses seguiu o protocolo
um período de três anos (período de estudo inicial de 56 semanas, seguido de uma extensão recomendado e todos os participantes foram encorajados a aplicar intervenções sobre o estilo
de 2 anos) com o objetivo primário de avaliar a eficácia do liraglutido 3,0 mg, comparado de vida ao longo do estudo. Os restantes objetivos primários foram: a) alterações no peso
com o placebo, na indução e manutenção da perda de peso. Como objetivo secundário, corporal, b) proporção de participantes que perdeu, pelo menos, 5% do peso corporal e c)
propunha-se avaliar a eficácia, a longo prazo, no atraso de desenvolvimento de diabetes tipo proporção de participantes que perdeu, pelo menos, 10% do peso corporal.
2 em doentes com obesidade/pré-obesidade e hiperglicemia intermédia e comorbidilidades
(dislipidemia e/ou HTA). Indivíduos com IMC ≥ 30 kg/m2 ou ≥ 27 kg/m2 com dislipidemia ou No final das 56 semanas, os doentes sob liraglutido 3,0 mg, liraglutido 1,8 mg e placebo
hipertensão foram randomizados na proporção de 2:1 para receber, diariamente, liraglutido apresentaram perdas médias de peso corporal na ordem dos 6,0% (6,4 kg), 4,7% (5,0 kg) e
3,0 mg ou placebo. Ambos os grupos receberam aconselhamento sobre modificações no 2,0% (2,2 kg), respetivamente. A perda de peso verificada com ambas as doses de liraglutido
estilo de vida. Na avaliação à semana 56, os restantes objetivos primários foram: a) alterações foi significativamente maior do que aquela verificada sob placebo (p<0,001). A proporção
no peso corporal, b) proporção de participantes perdendo, pelo menos, 5% de peso corporal de participantes que perdeu 5% ou mais do seu peso corporal foi significativamente maior
e c) proporção de participantes perdendo, pelo menos, 10% de peso corporal. No final das 56 naqueles sob liraglutido 3,0 mg do que sob placebo (54,3% vs 21,4%; p<0,001). O mesmo foi
semanas, os doentes randomizados para liraglutido tiveram uma redução significativamente verificado na proporção de participantes que perdeu, pelo menos, 10% do peso corporal (25,2%
maior no peso corporal (8,0% vs 2,6%, p<0,001). O grupo sob liraglutido teve uma maior com liraglutido 3,0 mg e 6,7% com placebo; p<0,001). A perda média de peso e a proporção
proporção de doentes que perderam, pelo menos, 5% do peso corporal (63,2% vs 27,1%) de doentes que perdeu, pelo menos, 5% ou 10% do peso corporal foram significativamente
e 10% do peso corporal (33,1% vs 10,6%) em comparação com o placebo (p<0,001 para menores no grupo sob liraglutido na dose de 1,8 mg do que na dose de 3,0 mg. O perímetro
ambos). O grupo sob liraglutido teve uma diminuição significativa no IMC médio, perímetro da cintura, IMC, pressão arterial sistólica, HbA1c, glicemia de jejum e pós-prandial, níveis de
da cintura, HbA1c, glicemia e insulinemia de jejum, pressão arterial sistólica e diastólica, em glucagon e de pró-insulina foram significativamente menores no grupo sob liraglutido 3,0 mg

158 159
do que naquele sob placebo (p<0,001). Também a proporção de doentes que alcançou uma semanas foram: a) alterações no peso corporal, b) proporção de participantes que mantiveram
HbA1c abaixo de 7,0% foi significativamente maior no grupo sob liraglutido 3,0 mg do que a redução de peso corporal superior a 5% alcançada no período de run-in, c) proporção de
naquele sob placebo (69,2% vs 27,2%, p<0,001). Os efeitos secundários gastrointestinais participantes que perderam, pelo menos, 5% adicionais do seu peso corporal e d) proporção
foram mais comuns no grupo sob liraglutido 3,0 mg mas a taxa de hipoglicemia também foi de participantes que perderam, pelo menos, 10% adicionais do seu peso corporal. Foram
maior neste grupo, sobretudo se associado a fármacos hipoglicemiantes (44,5% vs 27,4%). randomizados 422 participantes (que perderam mais de 5% do peso corporal inicial) para
Este estudo evidenciou que o liraglutido 3,0 mg, em doentes com diabetes tipo 2, é um agente liraglutido 3,0 mg ou placebo, na proporção de 1:1. O grupo sob liraglutido apresentou uma
igualmente eficaz na indução de perda de peso. diminuição significativamente maior do peso corporal do que o placebo (6,2% vs 0,2%,
p<0,001). Uma proporção significativamente maior de doentes tratados com liraglutido obteve
uma perda de peso de, pelo menos, 5% (50,5% vs 21,8%) e 10% do peso corporal (26,1%
SCALE Sleep Apnea [42] vs 6,3%) e manteve a perda de peso de 5% alcançada durante o período de run-in (81,4% vs
48,9%) do que os doentes sob placebo (p<0,001 para todos).
Este estudo randomizado, duplamente cego e controlado por placebo, avaliou, durante 32
semanas, o efeito da terapêutica com liraglutido 3,0 mg sobre o índice de apneia-hipopneia. Este estudo mostrou que o liraglutido pode ser útil para manter a perda de peso obtida
Doentes não diabéticos com diagnóstico de apneia obstrutiva do sono moderada ou grave mediante medidas não farmacológicas e promover perdas ponderais adicionais.
e que não estavam dispostos ou que eram incapazes de usar CPAP e que apresentavam
um IMC ≥ 30 kg/m2 foram randomizados, numa proporção de 1:1, para terapêutica diária
com liraglutido 3,0 mg ou placebo. A titulação seguiu o protocolo recomendado e ambos os O liraglutido 3,0 mg, encontra-se disponível com o nome comercial de Saxenda®, para
grupos receberam aconselhamento sobre modificações no estilo de vida. Um estudo do sono administração diária por via subcutânea [39, 41-46]. De forma a minimizar a sintomatologia
foi realizado no início do ensaio, às 12 e às 32 semanas. O objetivo primário foi a alteração gastrointestinal está recomendado iniciar com dose diária de 0,6 mg e aumentando em 0,6 mg
no índice de apneia-hipopneia mas as alterações no peso corporal foram, igualmente, a intervalos de, pelo menos, uma semana até atingir a dose terapêutica (3,0 mg) [23].
avaliadas. Os doentes randomizados para o grupo sob liraglutido 3,0 mg tiveram uma redução
significativamente maior no peso corporal (5,7% vs 1,6%), apresentaram maior proporção de Os principais efeitos secundários são do foro gastrointestinal, sobretudo náuseas, vómitos
doentes que perderam pelo menos 5% do peso corporal (46,3% vs 18,5%) e 10% do peso diarreia ou obstipação. Outros sinais e sintomas, como xerostomia, dispepsia, epigastralgias,
corporal (23,4% vs 1,7%) em comparação com o placebo (p<0,001 para todos). O grupo cólica biliar, aumento da frequência cardíaca ou aumento das enzimas pancreáticas (amilase
sob liraglutido 3,0 mg apresentou uma redução significativa no índice de apneia-hipopneia e lipase), também poderão ocorrer [23].
em comparação com o placebo (12,2 vs 6,1 eventos por hora, p=0,015). A HbA1c média e a
pressão arterial sistólica foram significativamente reduzidas no grupo liraglutido (p <0,001). O liraglutido 3,0 mg está contraindicado em casos de insuficiência renal grave (TFG < 30 mL/
min/1,73m2), insuficiência hepática grave, gravidez, amamentação e hipersensibilidade ao
fármaco ou aos excipientes [6]. A experiência é limitada em situações de insuficiência cardíaca
SCALE Maintenance [43] classe III e IV da NYHA, idades abaixo dos 18 anos ou acima dos 75 anos e em doentes com
doença inflamatória intestinal ou gastroparésia diabética, pelo que não se recomenda a sua
Este estudo foi, igualmente, randomizado, duplamente cego, controlado por placebo e realizado utilização nestes casos.
em doentes com obesidade (IMC ≥ 30 kg/m2) ou IMC ≥ 27 kg/m2 com uma comorbilidade
associada, desenhado para avaliar a eficácia do liraglutido na manutenção do peso perdido,
previamente, através de dieta de baixo valor calórico. Para serem randomizados (numa
proporção de 1:1 para liraglutido 3,0 mg ou placebo), os participantes tinham que perder, Mensagens chave:
pelo menos, 5% do seu peso corporal durante um período inicial (run-in) de 4 a 12 semanas
de dieta de baixo valor calórico. O liraglutido foi titulado para a dose de 3,0 mg segundo O liraglutido promove redução do apetite por ação direta a nível do SNC e do trato
esquema recomendado. Para este estudo foram excluídos indivíduos com diabetes tipo 1 gastrointestinal.
ou 2, glicemia em jejum igual ou superior a 126 mg/dL, sob terapêutica que causasse perda/
ganho de peso ou outros análogos do recetor de GLP-1, história prévia de cirurgia bariátrica, Administra-se diariamente por via subcutânea, numa dose inicial de 0.6 mg, com titulação
pancreatite aguda ou crónica, transtorno depressivo major ou outra doença psiquiátrica grave progressiva até 3,0 mg.
ou doença cardiovascular clinicamente ativa. Durante todo o tratamento, os participantes
receberam aconselhamento sobre intervenção no estilo de vida. Os objetivos primários às 56 Os principais efeitos secundários são gastrointestinais.

160 161
São contra-indicações absolutas a insuficiência renal e hepática graves, gravidez e a bupropiom 360 mg LP, ao longo de 56 semanas, em indivíduos com DM2 e excesso de peso
amamentação. ou obesidade com e sem fármacos antidiabéticos orais. A terapêutica com NB nos doentes
com DM2 e excesso de peso/obesidade esteve associada a maior redução do peso, com uma
A terapêutica com liraglutido 3,0 mg diários constitui uma opção eficaz na indução e maior proporção de doentes que atingem perda de peso ≥ 5% comparativamente ao placebo.
manutenção de perda de peso em indivíduos obesos/pré-obesos, incluindo aqueles com A terapêutica NB associou-se ainda a melhoria do controlo glicémico e dos factores de risco
diabetes tipo 2, hipertensão arterial, dislipidemia e apneia obstrutiva do sono. cardiovasculares. [51].

Cada comprimido de naltrexona/bupropiom contem 8 mg de naltrexona e 90 mg de bupropiom


de libertação prolongada [47]. Após o início do tratamento, a dose deve ser aumentada ao
NALTREXONA/BUPROPIOM DE LIBERTAÇÃO PROLONGADA longo de um período de 4 semanas, como a seguir descrito: Semana 1: Um comprimido de
manhã; Semana 2: Um comprimido de manhã e um comprimido à noite; Semana 3: Dois
A bupropiom é um inibidor seletivo da recaptação da dopamina e norepinefrina aprovado comprimidos de manhã e um comprimido à noite; Semana 4 e seguintes: Dois comprimidos
como um antidepressivo e como fármaco para a desabituação tabágica [47, 48]. A naltrexona de manhã e dois comprimidos à noite [52]. A dose diária máxima recomendada é de dois
é um antagonista opioide aprovado para o tratamento da dependência do álcool e dos comprimidos, em duas tomas por dia, perfazendo uma dose total de 32 mg de cloridrato de
opiáceos [47, 48]. Esta combinação de naltrexona/bupropiom de libertação prolongada (LP) naltrexona e 360 mg de cloridrato de bupropiom. A necessidade de tratamento contínuo deve
é uma associação de dois fármacos, que atuam no sistema nervoso central utilizando uma ser avaliada após 16 semanas e reavaliada anualmente. Em caso de omissão de uma dose,
abordagem dupla. A associação naltrexona/bupropiom LP foi desenvolvida com base em os doentes não devem tomar uma dose adicional, mas tomar a dose seguinte prescrita à hora
evidência de que estes dois fármacos atuam em conjunto no SNC tendo como alvo duas vias, habitual.
uma responsável pela fome e outra pelo comportamento causado pela recompensa, para
reduzir a ingestão de alimentos. Os comprimidos devem ser engolidos inteiros com um pouco de água, e devem ser
preferencialmente tomados com alimentos [52].
O bupropiom estimula a atividade dos neurónios POMC e a libertação de α-MSH, que se liga a
recetores que conduzem a uma menor ingestão de alimentos e, potencialmente, ao aumento Os principais efeitos secundários são reações de hipersensibilidade tipo urticária, anorexia,
do gasto energético. Por outro lado, pensa-se que a naltrexona e o bupropiom têm efeitos ansiedade, insónia, cefaleias, palpitações, dor abdominal, náuseas, vómitos, obstipação,
nos circuitos mesolímbicos que influenciam as vias de recompensa, o que poderá reduzir os artralgias e mialgias [52].
desejos por alimentos (cravings).
A associação deve ser utilizada com precaução em doentes com idade superior a 65 anos e
O estudo COR-I avaliou o efeito da combinação naltrexona/bupropiom LP no peso corporal não é recomendada em doentes com mais de 75 anos [52].
de doentes com excesso de peso e dislipidemia ou HTA e em doentes obesos, num estudo
randomizado, duplamente cego em 34 locais nos EUA. Os participantes foram submetidos a A terapêutica está contra-indicada, em doentes com compromisso hepático ou renal grave,
uma dieta hipocalórica e exercício físico e randomizados 1:1:1 para: (i) naltrexone LP 32 mg/ HTA não controlada, convulsões, tumor do sistema nervoso central, síndrome de abstinência
dia e bupropiom 360 mg/dia LP, em terapêutica combinada fixa (NB32); (ii) naltrexona LP 16 aguda de álcool ou benzodiazepinas, doença bipolar, dependência crónica de opiáceos,
mg/dia e bupropiom LP 360 mg/dia em terapêutica combinada fixa (NB 16) e (iii) placebo, tratamento concomitante contendo bupropiom ou naltrexona e em doentes sujeitos a
duas vezes dia per os durante 56 semanas. A variação no peso corporal foi de -1,3% no grupo administração concomitante de inibidores da monoamina oxidase (IMAO) [52]. Deve haver
placebo, -6,1% no grupo naltrexona 32 mg e bupropiom (p< 0.0001 vs. placebo), e -5.0% no um intervalo mínimo de 14 dias entre a descontinuação dos IMAO e o início do tratamento
grupo naltrexona 16 mg e bupropiom (p<0.0001 vs. placebo [49]. com a associação naltrexona/bupropiom LP.

No estudo COR-II, duplamente cego, com 1496 doentes obesos ou com excesso de peso e
dislipidemia e/ou HTA, os participantes foram randomizados para: (i) naltrexona LP 32 mg/
dia e bupropiom LP 360 mg/dia ou (ii) placebo, durante 56 semanas. Nos doentes sob NB Mensagens chave:
constatou-se melhoria significativa do peso e dos marcadores de risco cardiometabólicos,
bem como na qualidade de vida e controlo do apetite. [50]. O mecanismo pelo qual a combinação de naltrexona/ bupropiom LP induz perda de peso não
é totalmente compreendida.
O estudo COR- Diab, avaliou a eficácia da terapêutica com 32 mg de naltrexona LP e

162 163
Administra-se diariamente por via oral, na dose de um comprimido por dia de manhã, A fentermina apresenta efeitos secundários significativos, tais como cefaleias, alterações
aumentando 1 comprimido por semana até uma dose máxima de 2 comprimidos bid (32/360 cognitivas de humor, tonturas, irritabilidade, palpitações, insónia, trémulo, xerostomia,
mg). Os comprimidos devem ser engolidos inteiros com um pouco de água, preferencialmente náuseas, obstipação e alteração da líbido [53, 54, 56].
tomados com alimentos.
Está associada a aumento da pressão arterial e da frequência cardíaca, pelo que não
Os principais efeitos secundários são reações de hipersensibilidade tipo urticária, anorexia, está recomendada a sua utilização em pessoas com doença cardiovascular estabelecida,
ansiedade, insónia, cefaleias, palpitações, dor abdominal, náuseas, vómitos, obstipação, hipertensão arterial não controlada, história de arritmia cardíaca ou convulsões [53, 54, 56].
artralgias e mialgias. Esta classe deve também ser evitada em doentes sob inibidores seletivos da recaptação
da serotonina ou inibidores da recaptação de serotonina-noradrenalina [56]. São ainda
São contra-indicações a insuficiência renal ou hepática graves, HTA não controlada, contraindicações para a sua utilização glaucoma, hipertiroidismo, gravidez ou amamentação,
convulsões, tumor do sistema nervoso central, síndrome de abstinência aguda de álcool ou perturbações da ansiedade ou administração concomitante de inibidores da monoamina
benzodiazepinas, doença bipolar, dependência crónica de opiáceos tratamento concomitante oxidase[53, 56].
contendo bupropiom ou naltrexona, tratamento e em doentes sujeitos a administração
concomitante de inibidores da monoamina oxidase (IMAO).

Mensagens chave:

A fentermina é um agonista adrenérgico com ação anorexiante, que tem aprovação apenas
FÁRMACOS APROVADOS PELA EMA E/OU FDA E NÃO DISPONÍVEIS EM PORTUGAL para tratamentos a curto prazo.
PARA TRATAMENTO DA OBESIDADE:
A grande limitação na sua utilização reside nos seus efeitos secundários significativos.
- MONOTERAPIA: FENTERMINA, LORCASERINA

- TERAPÊUTICA COMBINADA: FENTERMINA/TOPIRAMATO DE LIBERTAÇÃO


PROLONGADA
LORCASERINA

A lorcaserina é um agonista da serotonina, que atua nos recetores 2C da 5-hidroxitriptamina


FENTERMINA (5-HT2C) nos neurónios POMC hipotalâmicos promovendo o seu efeito anorexigénico [57].
Apresenta uma seletividade para os recetores 2C de aproximadamente 15 a 100 vezes
A fentermina é um fármaco simpaticomimético que aumenta o dispêndio energético e diminui relativamente aos recetores 2A e 2B, reduzindo os efeitos secundários cardíacos descritos em
o apetite através da sua ação agonista sobre o sistema nervoso central [53]. agonistas serotoninérgicos não seletivos mais antigos como a fenfluramina e dexfenfluramina
[58, 59].
Está aprovada pela FDA para o tratamento da obesidade desde 1959 [53]. Em monoterapia,
esta aprovação é apenas para tratamentos a curto prazo (máximo de 3 meses), uma vez que A eficácia clínica do fármaco foi avaliada em 3 ensaios clínicos randomizados duplamente
não existem estudos de segurança a longo prazo. Assim, muitos clínicos optam por fazer cegos (BLOSSOM, BLOOM e BLOOM-DM) que envolveram um total de 7794 doentes
terapêuticas intermitentes, ou então utilizam a fentermina a longo prazo off-label. A dose inicial com excesso ponderal e obesidade. A percentagem média de perda de peso foi de -2,8%,
deve ser de 7,5 ou 15 mg/dia e a dose máxima recomendada é de 30 mg/dia [54]. Estão -4,7% e -5,8% respetivamente para o grupo placebo, doentes sob lorcaserina 10 mg id e 10
descritas perdas ponderais que podem chegar aos 6% do peso corporal em 28 semanas com mg 2id. Relativamente à manutenção da perda ponderal após 1 e 2 anos, os doentes que
15 mg/dia [55]. A vantagem da utilização da fentermina reside no seu baixo custo e na sua continuaram o tratamento com lorcaserina atingiram -5,8Kg após 1 ano e -8,1Kg após 2 anos,
eficácia [54]. comparativamente a -2,2Kg e -3,3Kg no grupo placebo [60, 61]. Os doentes com diabetes
mellitus e excesso ponderal ou obesidade, medicados com metformina e/ou sulfonilureia
Não está recomendada a sua utilização em doentes com doença renal terminal ou doença (BLOOM-DM) atingiram perda ponderal de -5,0% e -4,5% para lorcaserina 10mg 2id e 10 mg
hepática grave [56]. id respetivamente, em comparação com -1,5% no grupo placebo, com redução da HbA1c em

164 165
média de 0,5% [62]. fazem com que se atinja mais cedo um plateau na perda ponderal e ainda a possibilidade de
usar dosagens inferiores de cada fármaco minimizando-se assim a probabilidade e intensidade
A dose de lorcaserina indicada para a perda de peso é de 10 mg uma ou duas vezes ao dia. dos efeitos secundários de cada um. Há, porém, desvantagens da terapêutica combinada
Não deve ser administrada com outro fármaco da classe dos análogos da serotonina devido como a interação indesejada entre os fármacos, mais contraindicações no seu uso, custos
ao risco de síndrome maligno dos neurolépticos [58]. mais elevados, e a inflexibilidade nas dosagens de cada fármaco individualmente [63].

A lorcaserina foi aprovada pela FDA em 2012, até à data sem aprovação pela EMA cujo A associação fentermina/topiramato LP combina o efeito da libertação imediata da fentermina
parecer negativo foi justificado pelo potencial risco carcinogénico em estudo animais e pela com a libertação mais prolongada do topiramato. A fentermina é um análogo atípico das
reduzida eficácia [57]. anfetaminas com ação no sistema nervoso central. Atua por inibição da recaptação de
noradrenalina o que por sua vez vai ativar os neurónios hipotalâmicos do núcleo arqueado
Os efeitos adversos reportados mais frequentemente (>2% doentes medicados) são produtores de pro-opiomelanocortina (POMC) e dessa forma induzir uma diminuição do
cefaleia, tonturas, náusea, xerostomia e obstipação. Em doentes com diabetes refere-se apetite. Tem um efeito menos pronunciado sobre os níveis de serotonina e dopamina e pensa-
ainda episódios de hipoglicemia. A incidência de valvulopatia de novo ou agravamento de se que tal efeito não será determinante para a sua ação sobre o peso [63, 64]. A fentermina
insuficiência mitral ou aórtica pré-existente não foi significativamente superior em doentes sob tem uma semi-vida de 20 horas, cerca de 70 a 80% do fármaco é excretado na urina na sua
lorcaserina versus placebo [58]. forma inalterada e é metabolizada a nível hepático pelo citocromo P450 havendo baixo risco
de interações com outros fármacos que seguem a mesma via de metabolização [64]. Embora
A terapêutica com lorcaserina está contra-indicada em doentes com insuficiência renal com se possa pensar que o efeito catecolaminérgico da fentermina faça aumentar o risco de
clearance de creatinina <30ml/min e na gravidez [57]. eventos cardiovasculares adversos, a noradrenalina a nível cerebral atua pré-sinapticamente
diminuindo o efeito simpático, o chamado efeito clonidina-like [63]. Em relação ao topiramato,
os mecanismos que levam à supressão do apetite e perda de peso que lhe estão associados
Mensagens-chave: ainda não são bem conhecidos. Sabe-se que potencia os efeitos do neurotransmissor GABA
modificando o estado de excitabilidade dos canais de sódio e cálcio voltagem-dependentes,
A lorcaserina é o único fármaco da classe dos agonistas serotoninérgicos disponível para o é um inibidor fraco da enzima anidrase carbónica, melhora a resistência hipotalâmica
tratamento da obesidade, mas apenas nos EUA. Atua através da estimulação do receptores à leptina e insulina e ainda aumenta os níveis de proteínas de desacoplamento no tecido
5-HT2C. adiposo castanho com possível efeito sobre o gasto energético neste tecido [63, 64]. Esta
formulação de libertação prolongada de topiramato faz com que tenha uma semi-vida de
Após um ano de terapêutica com a posologia habitual (10 mg 2id) estima-se uma perda 24H, é metabolizado por hidroxilação, hidrólise e glucoronidação no fígado e excretado pela
ponderal média de 3,8% do peso corporal versus placebo. urina [64]. Dado que ambos os fármacos são metabolizados no fígado e excretados por via
renal será necessário ajuste de dose perante a insuficiência renal ou hepática e nenhum dos
Os efeitos secundários frequentes são: cefaleias, astenia, xerostomia, obstipação e fármacos foi até à data testada na insuficiência hepática grave nem na insuficiência renal
hipoglicemia em doentes com diabetes mellitus. Recomenda-se precaução na administração terminal. Nesta associação a fentermina tem uma rápida libertação e por isso o seu efeito
com outros agonistas serotoninérgicos ou antidopaminérgicos. Está contra-indicada na supressor sobre o apetite faz-se notar mais precocemente do que o do topiramato que se faz
grávida e doentes com insuficiência renal crónica. sentir no final do dia. Desta forma consegue-se um controlo do apetite ao longo de todo o dia.
A eficácia da fentermina/topiramato LP na perda de peso ficou demonstrada em dois ensaios
que duraram 1 ano, randomizados, duplamente cegos e com comparação com grupo placebo,
os estudos EQUIP e CONQUER. Outro ensaio relevante foi a extensão do CONQUER por
mais 56 semanas, o estudo SEQUEL. O estudo CONQUER randomizou 2487 doentes com
FENTERMINA/TOPIRAMATO DE LIBERTAÇÃO PROLONGADA um IMC médio de 36,6 Kg/m2 e comorbilidades como hipertensão arterial, dislipidemia,
diabetes mellitus tipo 2 ou pré-diabetes e/ou obesidade abdominal para integrarem um de
A associação fentermina/topiramato de libertação prolongada foi a primeira combinação três grupos: placebo, fentermina/topiramato LP 7,5/46 mg por dia ou fentermina/topiramato
farmacológica aprovada pela FDA para o tratamento prolongado da obesidade em Julho LP 15/96 mg por dia. Observou-se uma perda de 7,8 e 9,6% nas doses de 7,5/46 mg e 15/92
de 2012, não estando aprovado na Europa. Entre as principais vantagens da terapêutica mg, respetivamente, em comparação com redução de apenas 1,2% no grupo placebo. O
combinada de dois fármacos pode-se citar a maior eficácia devido à sinergia e efeito aditivo estudo SEQUEL demonstrou persistência da perda de peso às 108 semanas com perdas de
dos fármacos usados, o bloqueio de efeitos compensatórios que nas terapêuticas isoladas 9,3 e 10,5% nos grupos tratados com as doses de 7,5/46 mg e 15/92 mg, respetivamente, em

166 167
comparação com perda de 1,8% no grupo placebo [53, 63-66]. Até à data esta combinação Os efeitos secundários são dose dependentes e os mais comuns são: xerostomia, tonturas,
farmacológica demonstrou ser a mais eficaz no tratamento de longa duração da obesidade obstipação, disgeusia e parestesias. Este último efeito secundário e as insónias são os
[65, 67]. Cerca de metade dos doentes que participaram nos estudos alcançaram uma perda principais responsáveis pelo abandono terapêutico (2%) [63]. Uma das maiores preocupações
ponderal superior a 10% [63]. com fármacos catecolaminérgicos é o risco de adição, embora os estudos não o comprovem.
O topiramato tem efeitos cognitivos tais como perturbações de memória, estados confusionais
Esta combinação farmacológica, deve ser administrada pela manhã com ou sem alimentos e e dificuldades na linguagem [63]. Contudo os sintomas depressivos não agravaram no estudo
não à noite de forma a se evitarem insónias induzidas pela fentermina [53]. CONQUER e não foi identificado um agravamento da tendência suicida [63]. No âmbito
da segurança renal, o topiramato pode aumentar a formação de cálculos renais, acidose
Existem 4 dosagens diferentes de fentermina/topiramato LP: 3,75/23 mg, 7,5/46 mg, 11,25/69 metabólica, risco de hipocaliemia e agravamento da função renal. Nas insuficiências hepática
mg e 15/96 mg e deve-se começar pela dose mais baixa durante os primeiros 14 dias de e renal ligeiras não há necessidade de ajuste posológico [65].
tratamento, após os quais se aumenta para a dose de 7,5/46 mg, a dose farmacológica mais
recomendada. Se ao fim de 12 semanas com a dose de 7,5/46 mg não se alcançou uma Esta combinação está contraindicada na insuficiência hepática e renal graves, no uso
perda de peso de pelo menos 3% continua-se a aumentar a dose progressivamente em concomitante com outros fármacos simpaticomiméticos e com inibidores da monoaminaoxidase
intervalos de 14 dias e se ao fim de 12 semanas com a dose máxima de 15/96 mg não houver (iMAO), na gravidez (risco de desenvolvimento de fenda palatina e lábio leporino) e glaucoma
perda de pelo menos 5% do peso o tratamento deve ser descontinuado de forma progressiva de ângulo fechado [53].
reduzindo-se a dose em intervalos de 3 a 5 dias de forma a se evitarem crises convulsivas
pela diminuição rápida da dose de topiramato [53, 54, 64]. Há relatos de diminuição da eficácia dos anticoncepcionais orais e agravamento do efeito
depressor sobre o sistema nervoso central de outras substâncias (incluindo o álcool) [65].
Outra questão importante é a segurança cardiovascular. Após 56 semanas de tratamento Não se recomenda no hipertiroidismo [53] e em doentes com patologia cardiovascular pré-
verificou-se um aumento da frequência cardíaca até 0,6 batimentos por minuto (bpm) existente [65, 70].
na dose intermédia de 7,5/46 mg e de 1,6 bpm na dose máxima de 15/92 mg. Este efeito
aparentemente deletério poderá ser suplantado pela redução da pressão arterial que se
observou nos estudos e esta descida foi proporcional ao peso perdido. Assim, nos indivíduos
que perderam entre 5 e 10% do peso a pressão arterial sistólica diminuiu 7,5 mmHg e a Mensagens chave:
diastólica 5,9 mmHg e os indivíduos que perderam mais de 15% de peso tiveram uma
redução de 11,8 mmHg na pressão sistólica e 7,8 mmHg na diastólica [68]. Constatou-se a A combinação fentermina/topiramato é eficaz no tratamento a longo prazo da obesidade em
presença de efeitos benéficos dose-dependentes também sobre os níveis de colesterol-HDL associação às alterações de estilo de vida.
(+2 a 4 mg/dL), triglicerídeos (- 17 a 24 mg/dL) e um efeito neutro sobre o colesterol-LDL (-4 a
+6 mg/dL) ([65] 16). No que diz respeito ao controlo glicémico verificou-se também descidas É a combinação farmacológica mais eficaz no tratamento desta condição.
globais de HbA1c de 0,1 a 0,2%. Nos doentes diabéticos a redução média da HbA1c foi de
0,4% e houve de forma significativa menor necessidade de introdução de novos fármacos Exerce efeito benéfico sobre vários fatores de risco cardiovascular.
para controlo da diabetes [69]. Uma análise do estudo SEQUEL demonstrou uma redução
de 78,7% na incidência anual de novos casos de diabetes nos doentes com pré-diabetes ou O seu uso está contraindicado na gravidez, insuficiência renal e hepática graves, glaucoma,
síndrome metabólico. Em relação aos parâmetros inflamatórios houve no estudo CONQUER hipertiroidismo e uso concomitante de iMAO/outros simpaticomiméticos,.
uma descida da proteína C reactiva ultra-sensível (PCRus) em 1,75 mg/L e uma subida dos
níveis de adiponectina em 1,75 μg/mL e a sua extensão, o estudo SEQUEL confirmou a Os efeitos secundários mais frequentes são xerostomia, tonturas, obstipação, disgeusia e
subida dos níveis de adiponectina e nenhum efeito sobre a PCRus. Em relação ao SAOS, em parestesias.
comparação com o grupo placebo houve uma redução de 14,9 no índice de apneia-hipopneia
correlacionado com a perda ponderal alcançada. Nos doentes que participaram nestes
estudos a taxa de eventos cardiovasculares foi baixa e em nenhum houve relato de eventos OUTROS FÁRMACOS ASSOCIADOS A PERDA PONDERAL, DISPONÍVEIS EM
cardiovasculares major. Estes estudos, contudo, não foram desenhados para avaliação dos PORTUGAL E NÃO APROVADOS PARA TRATAMENTO DA OBESIDADE: METFORMINA,
outcomes cardiovasculares, aguardando-se estudos com essa finalidade para se poderem INIBIDORES SGLT2 (DAPAGLIFLOZINA, EMPAGLIFLOZINA, CANAGLIFLOZINA),
tirar conclusões quanto à segurança cardiovascular desta associação farmacológica. OUTROS AGONISTAS DO RECETOR DO GLP-1 (EXENATIDO LAR, DULAGLUTIDO),
ANTIEPILÉPTICOS (TOPIRAMATO, ZONISAMIDA), FLUOXETINA

168 169
METFORMINA glicose, ajudam os esforços de perda de peso, uma vez que há menos glicose disponível para
armazenamento no tecido adiposo. Ao aumentar a oxidação dos ácidos gordos e diminuir
A metformina é um fármaco antidiabético oral com mais de 60 anos de uso na prática clínica. É a lipogénese, ocorre menor deposição de lípidos no fígado e no músculo esquelético. Além
utilizada como agente de primeira linha no tratamento da diabetes tipo 2 devido ao baixo risco disso, a metformina, tal como a atividade física, parece aumentar o metabolismo energético
de hipoglicemia, ao facto de não promover aumento de peso, à durabilidade dos seus efeitos através da fosforilação do sistema de proteína cinase ativado por AMP (AMP-cinase). Esta via
anti-hiperglicémicos e à sua segurança cardiovascular [71-73]. está ligada à lipogénese, biogénese mitocondrial, secreção de insulina, oxidação de ácidos
gordos a nível hepático e muscular, bem como a captação de glicose pelo músculo e tecido
A terapêutica com metformina encontra-se aprovada para doentes com diabetes tipo 2 com, adiposo. Independente da ativação da via AMP-cinase, a metformina mostrou promover a
pelo menos, 10 anos de idade e desde que estes não apresentem condições que constituam libertação de irisina do músculo esquelético, mimetizando os efeitos benéficos do exercício
contraindicação para o seu uso [71]: sobre o metabolismo. Por outro lado, a metformina parece restaurar a sensibilidade à leptina,
• hipersensibilidade à metformina ou aos excipientes; corrigindo a leptinorresistência característica da obesidade, permitindo que ocorra a sua ação
anorexígena a nível hipotalâmico. Também há evidências de que a metformina diminui os
• cetoacidose diabética; níveis de ghrelina, o que, junto com o aumento dos níveis de GLP-1, pode contribuir ainda mais
• compromisso grave da função renal (clearance da creatinina < 30 mL/min; entre para aquele efeito anorexígeno. Por último, a metformina pode atuar de forma centralizada
30 e 60 ml/min há necessidade de proceder a ajuste da dose mas a metformina para ajudar a diminuir o apetite e a ingestão de alimentos, aumentando a expressão de pró-
não se encontra contraindicada) ou situações agudas com potencial para alterar opiomelanocortina (POMC) e diminuindo a expressão de neuropéptido Y. [16-25]
a função renal (por exemplo: desidratação, infeção grave, choque ou administração
endovenosa de meios de contraste iodados); Os efeitos de perda de peso com metformina foram estudados em indivíduos obesos
• qualquer doença, aguda ou crónica, suscetível de provocar hipóxia tecidular (por normoglicémicos. Num estudo de 6 meses sob terapêutica com metformina (titulada para
exemplo: insuficiência cardíaca ou respiratória, enfarte agudo do miocárdio recente, 2500 mg por dia, conforme tolerado) versus placebo, uma perda média de peso de 5,8 kg
choque); foi obtida no grupo sob metformina, enquanto que o grupo placebo demonstrou um aumento
médio de 0,8 kg. Por outro lado, 47,4% dos indivíduos sob metformina perderam mais de
• compromisso da função hepática, alcoolismo crónico ou intoxicação alcoólica 5% do peso corporal e 16,2% dos indivíduos perderam mais de 10%. Esta maior perda de
aguda; peso foi verificada nos indivíduos com maior grau de insulinorresistência. Outros estudos e
• gravidez e aleitamento (embora, nos últimos anos, se tenha generalizado o seu uso meta-análises demonstraram perdas ponderais médias entre 1,1 kg e 3 Kg nos indivíduos
durante a gravidez). sob metformina (corrigido para placebo). No estudo Diabetes Prevention Program (DPP), foi
demonstrado que o uso de metformina em indivíduos com hiperglicemia intermédia e pré-
obesidade/obesidade poderia promover perda de peso significativa (2,1 Kg), além de reduzir
a progressão para diabetes em 31%. Embora as mudanças intensivas no estilo de vida se
A metformina exerce a sua ação anti-hiperglicémica por um conjunto variado de mecanismos tenham mostrado mais eficazes, 29% dos indivíduos no grupo metformina perderam mais
ainda que todos não sejam totalmente conhecidos. Assume-se como mecanismos de 5% do peso corporal inicial ao fim de 1 ano, em comparação com 13% no grupo placebo.
atribuídos à sua ação, diminuição da produção hepática de glicose, aumento do consumo Após 2 anos de seguimento, as taxas foram de 26% e 14%, respetivamente. Na extensão do
intestinal de glicose, alteração da flora intestinal, aumento da síntese e sensibilidade á estudo DPP, avaliando os efeitos a longo prazo (10 anos) do uso de metformina, esta induziu
ação do GLP-1, inibição da sinalização do glucagon e aumento da captação da glicose a uma perda de peso altamente significativa e durável ao longo do estudo.[18,26-34]
nível periférico [3-14] . Pode ocorrer perda de apetite de uma forma dose-dependente, daí
ser considerada como tendo efeito neutro ou promotor da perda ponderal. O aumento da Atualmente, existem em Portugal as seguintes formulações de cloridrato e embonato de
sensibilidade à ação da insulina, parece estar subjacente a um dos seus principais efeitos metformina. A metformina deve ser administrada durante ou no fim das refeições principais,
sobre o peso corporal. O aumento da sensibilidade à ação da insulina com a subsequente começando com uma dose baixa e aumentando, progressivamente, até à dose diária
redução dos níveis circulantes de insulina (melhorando o hiperinsulinismo compensatório pretendida. A dose máxima recomendada da terapêutica com metformina é de 3.000 mg
da insulinorresistência), está associada a subsequente perda ponderal, dado a insulina ser diários [71, 74].
uma hormona anabolizante. Adicionalmente, o aumento da sensibilidade à ação da insulina,
atenua a hipoglicemia pós-prandial que pode ocorrer em estados de insulinorresistência, Comparativamente com as formulações que utilizam o cloridrato de metformina, a formulação
diminuindo a necessidade de compensação através do consumo de hidratos de carbono. de embonato de metformina está associada a uma melhor tolerabilidade gastrointestinal à
Tanto a diminuição da absorção de glicose intestinal como a inibição da produção hepática de metformina.

170 171
Os efeitos secundários mais frequentes do tratamento com metformina são do foro Conclusão
gastrointestinal: desconforto/dor abdominal, náuseas, vómitos e diarreia. Contudo, estes
sintomas são, na grande maioria das vezes, transitórios. A probabilidade de ocorrência desta A metformina é um fármaco antidiabético com longa utilização na prática clínica, seguro e
sintomatologia estará reduzida se se atender à necessidade da administração da metformina relativamente bem tolerado quando utilizado de forma judiciosa, com cumprimento das
durante ou após as refeições principais e à necessidade na titulação diária até à dose diária particularidades posológicas e de todas as situações de contraindicação. Como agente
pretendida. Adicionalmente, a opção pela utilização da formulação do embonato de metformina insulinossensibilizador, apresenta um potencial de utilização nas várias condições que cursam
diminui a probabilidade de ocorrência dos sintomas gastrointestinais. Uma outra situação, com insulinorresistência, como é o caso da obesidade.
reportada com alguma frequência nos doentes tratados com metformina, é acordar com a
sensação de um sabor metálico na boca. Na terapêutica prolongada com metformina pode, Embora não haja consensualidade sobre o potencial da metformina na indução da perda
igualmente, ocorrer redução nos níveis séricos de vitamina B12. Embora, geralmente, esta ponderal, esse efeito parece ser dose-dependente e, em termos teóricos, encontra-se bem
redução não condicione o desenvolvimento de anemia megaloblástica, existe esse risco pelo sustentado no conhecimento atual daqueles que parecem ser os mecanismos de ação
que se deverá estar atento ao hemograma das pessoas com diabetes que se encontram sob daquele fármaco.
terapêutica com metformina. Pelo seu mecanismo de ação, a metformina não é considerada
um fármaco hipoglicemiante mas, antes, anti-hiperglicemiante face ao risco praticamente
nulo de indução de hipoglicemia. Ao invés dos efeitos secundários gastrointestinais e
hematológicos que, geralmente, não comportam grande gravidade, a classe das biguanidas INIBIDORES SGLT2 (dapagliflozina, empagliflozina, canagliflozina)
associa-se a um risco acrescido de desenvolvimento de uma situação clínica com um DAPAGLIFLOZINA, EMPAGLIFLOZINA, CANAGLIFLOZINA
prognóstico bastante reservado: a acidose láctica. Comparativamente à metformina, o risco
de acidose láctica associada à terapêutica com a fenformina era, incomparavelmente, superior Classe farmacológica que atua através da inibição dos co-transportadores de sódio e glicose
(3-9 casos/100.000 pessoas/ano vs. 40-64 casos/100.000 pessoas/ano) razão porque esta foi 2 (SGLT2), que são expressos fundamentalmente no rim, promovendo o transporte de glicose
proscrita do arsenal terapêutico. Pode afirmar-se que o risco de desenvolvimento de acidose do lúmen para o interior da célula tubular renal contra o seu gradiente de concentração
láctica induzida pela metformina é mínimo desde que sejam, estritamente, cumpridos os [75]. Os seus efeitos clínicos são: a excreção do excesso de glicose na urina através de
critérios de contraindicação para o seu uso. um mecanismo independente da insulina (promovem uma glicosúria de cerca de 60-80g/dia
que representa uma perda calórica de 200-300Kcal/dia), efeito natriurético ligeiro e diurese
Os clínicos deverão estar atentos ao desenvolvimento de condições agudas que possam osmótica [76].
implicar a suspensão daquela terapêutica. Para minimizar o risco de acidose láctica, deve ser
monitorizada a função renal antes da introdução da terapêutica com metformina e, depois, Em Portugal estão disponíveis a dapaglifozina, a empaglifozina e mais recentemente a
anualmente (caso a função renal se mantenha normal) ou a cada 3 a 6 meses (caso haja canagloflozina.
compromisso da função renal).
A dapaglifozina, administrada numa dose de 10mg id demonstrou, em estudos realizados em
Outra das situações que merece especial cuidado é a das pessoas medicadas com doentes com DM2 randomizados e comparativos com placebo tanto em monoterapia como
metformina e que vão ser submetidas a técnicas imagiológicas com utilização de meios de em terapêutica add-on com metformina, uma redução ponderal progressiva que acompanha
contraste iodado. Pelo risco de induzir compromisso da função renal, deve-se suspender a melhoria do controlo glicémico. A perda ponderal conseguida foi, em média, de 2-3Kg versus
a terapêutica com metformina antes da realização da técnica e ser reiniciada, pelo menos, placebo, sustentada ao longo de 6 meses a 2 anos [77]. As perdas de peso foram associadas
só 48 horas depois. Idealmente, dever-se-ia efetuar avaliação da função renal antes da a reduções do perímetro abdominal e, em estudos com avaliação da composição corporal foi
sua reintrodução. Também na programação de uma cirurgia eletiva está recomendada a reportada redução da massa gorda, particularmente do tecido adiposo visceral [78].
suspensão da terapêutica com metformina 48 horas antes e reintrodução 48 horas depois
de terminada a cirurgia, com verificação de que a função renal não está comprometida. Esta A empaglifozina tem demonstrado resultados semelhantes ao nível da perda ponderal. Num
recomendação aplica-se não só às cirurgias com anestesia geral mas, também, às cirurgias estudo randomizado duplamente cego controlado por placebo realizado em doentes obesos
eletivas efetuadas sob raquianestesia ou anestesia epidural [64, 73]. com DM2 insulinotratado, a empaglifozina 10mg e 25mg originou uma redução do peso de
-2,4 e -2,5Kg respetivamente, às 52 semanas, versus placebo [79].

A canagliflozina também demonstrou reduzir a hiperglicemia, pressão arterial, albuminúria


e o peso corporal em doentes com diabetes mellitus tipo 2 {Neal, 2017 #101}. O programa

172 173
CANVAS integrou dados de dois ensaios clínicos que envolveram um total de 10,142 semanas, mostrou uma redução de peso de 2,9 Kg (IMC prévio médio de 33,5 kg/m2) [83].
participantes com diabetes mellitus tipo 2 e alto risco cardiovascular. A média de idade dos Não está recomendada a utilização de exenatido LAR nem de dulaglutido em doentes com
participantes era de 63,3 anos, 35,8% eram mulheres, com uma duração média de diabetes taxa de filtração glomerular inferior a 30 mL/min/1,73 m2. Esta classe farmacológica também
de 13,5 anos, e 65,6% tinham história de doença cardiovascular. A diferença média de peso não deve ser utilizada na gravidez ou amamentação [84, 85].
corporal foi de –1.60 kg (95% CI, –1,70 to –1,51). As reações adversas foram consistentes
com as previamente descritas para os inibidores dos SGLT2, exceto um aumento do risco de
amputações (6,3 vs. 3,4 participantes por 1000 doentes-ano; hazard ratio, 1,97; 95% CI, 1,41
a 2,75) e as amputações eram primariamente a nível dos dedos dos pés ou metatársicos. ANTIEPILÉPTICOS (TOPIRAMATO, ZONISAMIDA)
Os efeitos secundários mais frequentes são infeções genito-urinárias (vulvovaginite, balanite
e infecção do trato urinário) e bacteriúria assintomática,hipovolémia com desidratação e O topiramato é um fármaco aprovado para o tratamento da epilepsia e profilaxia da enxaqueca
hipotensão devido à diurese osmótica. Menos frequentemente, observa-se aumento do risco e o seu efeito sobre a perda ponderal foi observado nos doentes que o utilizavam para o
de episódios de hipoglicemia em doentes tratados simultaneamente com sulfonilureias ou controlo dessas patologias neurológicas [86].
insulina.
Em relação aos mecanismos pelos quais induz perda de peso ainda não são inteiramente
Como o efeito glicosúrico dos i-SGLT2 está diretamente dependente da filtração glomerular, conhecidos. Há várias hipóteses explicativas que passam pelo aumento do gasto energético
não estão recomendados em doentes com taxa de filtração glomerular <60 mil/min/1,73m2. dos adipócitos e diminuição de triacilglicerol no fígado e músculo esquelético (4).
Estão igualmente contra-indicados na gravidez e amamentação [80].
Há relatos em meta-análises com utilização de topiramato de perda de cerca de 7% do
peso corporal e estudos randomizados que demonstraram uma perda entre 6 e 8 Kg em 24
semanas com efeitos benéficos também sobre o controlo glicémico, perfil lipídico e pressão
OUTROS AGONISTAS DO RECETOR DO GLP-1 (exenatido LAR, dulaglutido) arterial, contudo os seus efeitos secundários neuropsiquiátricos que são dose-dependente
EXENATIDO LAR, DULAGLUTIDO têm limitado o seu uso isolado no tratamento da obesidade [53, 66, 86]. Os dados existentes
relacionam a eficácia do topiramato na perda ponderal com o índice de massa corporal (IMC),
Os agonistas do recetor do GLP-1 (glucagon-like peptide-1) têm efeito sobre o peso através ou seja, IMC maiores são os que obtêm maior redução de peso mas em relação à dose de
dos mecanismos amplamente descritos no subcapítulo do liraglutido. De uma forma fármaco (que pode ir até valores elevados como 200 mg/dia) os relatos não são concordantes,
simplificada, o GLP-1 diminui o apetite através de mecanismos periféricos (destacando-se o uns descrevem uma relação positiva, outros não encontram qualquer relação [87].
atraso do esvaziamento gástrico) e também por ação a nível do sistema nervoso central [81].
Os principais efeitos laterais são gastrointestinais, em especial náuseas, vómitos e/ou diarreia O topiramato será mais útil nos pacientes obesos com ingestão compulsiva (binge eating).
[82, 83]. O topiramato reduz a sensação de recompensa associada à ingestão de grandes volumes
de determinados alimentos e diminuiu também o estado de impulsividade associado a este
Em Portugal, para além do liraglutido, estão disponíveis outros dois agonistas do recetor do distúrbio do comportamento alimentar [88].
GLP-1: exenatido de libertação prolongada (LAR) e dulaglutido. Embora estejam aprovados
para o tratamento da diabetes mellitus tipo 2, não estão aprovados para o tratamento da No que diz respeito às doses de topiramato a usar no tratamento da obesidade, há relatos
obesidade. contraditórios no que diz respeito à associação positiva entre dose de topiramato e quantidade
de peso perdido. A maior parte dos estudos foram realizados com doses máximas próximas
O exenatido LAR é administrado semanalmente de forma subcutânea na dose fixa de 2mg. dos 200 mg/dia repartidos em duas tomas diárias. Uma dose entre os 50 e os 100 mg/dia é
Nos estudos DURATION (Diabetes Therapy Utilization: Researching Changes in A1c, Weight menos propensa a originar os efeitos secundários neuropsiquiátricos [87]. No tratamento de
and Other Factors Through Intervention With Exenatide One Weekly), com 1195 doentes com certos distúrbios alimentares como o binge eating as doses de topiramato podem ser bastante
IMC prévio de 32,5 kg/m2, verificou-se uma redução média de peso corporal de 2,5 kg após superiores [88].
24 a 30 semanas sob exenatido semanal [82].
Os efeitos secundários mais frequentes são parestesias, a disgeusia e dificuldades na
O dulaglutido é também administrado de forma subcutânea uma vez por semana na dose concentração/atenção [88]. Está contra-indicado no glaucoma angulo fechado e gravidez.
fixa de 1,5 mg. O estudo AWARD-6 (Assessment of Weekly AdministRation of LY2189265 Zonisamida
(dulaglutide) in Diabetes-6) com 299 doentes sob dulaglutido semanal e duração de 26

174 175
Tal como o topiramato a zonisamida é um agente anti-epilético tendo como efeito secundário Este fármaco tem como efeitos adversos fotossensibilidade cutânea, alterações da motilidade
frequente uma perda ponderal [89]. Exerce também um efeito inibidor sobre a enzima anidrase gastro-intestinal, cefaleia, ansiedade, disfunção sexual, perturbação do sono. Está contra-
carbónica e tem um perfil de efeitos secundários muito semelhantes ao topiramato. São indicada em doentes sob terapêutica com inibidores da monoamino oxidase devido a risco de
poucos os estudos randomizados sobre este fármaco no que diz respeito à redução de peso, síndrome serotoninérgico e, na amamentação. A fluoxetina pode ser utilizada com precaução
talvez o mais conhecido seja o realizado por Gadde et al que avaliou o efeito da zonisamida durante a gravidez, com especial cuidado no 3º trimestre devido a efeitos serotoninérgicos e/
ao longo de um ano na perda de peso de doentes obesos já sob aconselhamento prévio ou síndrome de abstinência no recém-nascido[97].
nas áreas da alimentação e exercício físico [90]. Este estudo randomizado, duplamente cego
distribuiu os participantes em três grupos, placebo, zonisamida 200 mg/dia e zonisamida 400
mg/dia. As principais conclusões foram que a dose de zonisamida 400 mg/dia permitiram uma
perda ponderal superior em comparação com os grupos placebo e zonisamida 200 mg/dia
(7,3 vs. 4 e 4,4 Kg respetivamente) correspondendo a perdas percentuais de 6,8, 3,7 e 3,9%
nestes três grupos. Cerca de 54,7% dos doentes que tomaram 400 mg/dia de zonisamida
perderam mais de 5% do seu peso inicial em comparação com 31,1% dos doentes no grupo
placebo e 34,2% no grupo zonisamida 200 mg/dia. Trinta e dois porcento dos doentes que
tomaram a dose mais elevada perderam pelo menos 10% do seu peso inicial. Constataram-se
efeitos benéficos sobre a pressão arterial, o perfil lipídico e sobre a glicemia em jejum mas não
houve diferença entre os três grupos do estudo. Embora a dose de 400 mg/dia tenha levado a
uma descida estatisticamente significativa da HbA1c, esta não alcançou qualquer relevância
clínica. Embora a zonisamida na dose de 400mg/dia tenha permitido a obtenção de resultados Referências bibliográficas
moderadamente satisfatórios na perda de peso, semelhante a outros fármacos como a
lorcaserina e o orlistato os efeitos secundários neuropsiquiátricos foram mais frequentes do
que no grupo placebo. Serão necessárias mais avaliações deste fármaco no que diz respeito 1. Infarmed, Orlistato: resumo das características do medicamento. 2012.
ao risco-benefício de forma a melhor definir o seu papel no tratamento da obesidade. 2. Sjostrom, L., et al., Randomised placebo-controlled trial of orlistat for weight loss and prevention of
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da serotonina, que é utilizada em doentes com obesidade pelo seu efeito secundário
anorexigénico. A redução do apetite é atribuível ao aumento da concentração da serotonina 5. Hill, J.O., et al., Orlistat, a lipase inhibitor, for weight maintenance after conventional dieting: a 1-y study.
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para o transportador da 5-hidroxitriptamina (5-HT) [91]. 6. Hauptman, J., et al., Orlistat in the long-term treatment of obesity in primary care settings. Arch Fam
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A eficácia da fluoxetina na perda ponderal em indivíduos obesos foi analisada há mais de 7. Rossner, S., et al., Weight loss, weight maintenance, and improved cardiovascular risk factors after 2
duas décadas em estudos randomizados, controlados por placebo [92-95]. Uma meta-análise years treatment with orlistat for obesity. European Orlistat Obesity Study Group. Obes Res, 2000. 8(1): p.
destes resultados revela a eficácia da fluoxetina na perda ponderal a curto prazo, após 12 49-61.
semanas, de -4,8Kg versus -2Kg no grupo placebo, efeito que se esbate a longo prazo, com 8. Kelley, D.E., et al., Clinical efficacy of orlistat therapy in overweight and obese patients with insulin-
perda de -2,5Kg versus -1,8Kg no grupo placebo às 60 semanas [96]. treated type 2 diabetes: A 1-year randomized controlled trial. Diabetes Care, 2002. 25(6): p. 1033-41.

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perda ponderal esteja apenas demonstrada com doses de 60mg id [96]. 10. Torgerson, J.S., et al., XENical in the prevention of diabetes in obese subjects (XENDOS) study: a
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