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As especulações sobre o futuro da companhia inundaram os corredores internos e o mercado

de investidores após o pronunciamento e comunicação da presidente da HP, Carly Fiorina,


sobre a polêmica fusão com a Compaq. O objetivo era o fortalecimento das marcas e expansão
dos negócios por conta do momento delicado que as duas empresas ultrapassavam.
Funcionários da HP temiam um choque de cultura organizacional e o mercado e investidores
avaliavam a fusão como uma manobra desesperada.

Fundada em 1939 pelos colegas de Stanford Bill Hewlett e Dave Parkard a HP era conhecida
pelo desenvolvimento de produtos progressistas e confiáveis, como por exemplo o oscilador
de áudio, instrumento bastante utilizados por engenheiros de som. Inovação e tecnologia de
ponta proporcionavam uma margem de lucro mais alta. A HP também era conhecida pelo
legado desenvolvido através de boas práticas de gestão conhecida como HP Way, foco nos
lucros e nas pessoas.

Nos seus primeiros 40 anos de existência, a HP comercializava principalmente equipamentos


de teste e mensuração e durante esse período surgiu o conceito de gestão HP Way. Em 1970 a
empresa entra para o segmento de computadores e impressoras primeiramente para atender
seus negócios e depois para o uso doméstico. A entrada nesse mercado foi encarada como um
desafio para a marca devido o segmento de computação demandar mais investimentos em
pesquisa e desenvolvimento, a divisão da empresa em diversos setores fazendo com que a
margem de lucro diminuísse. Nos anos de 1980 e 1990 a HP alcança um nível de produção
estável e com know how suficiente para desenvolver computadores com tecnologia de ponta,
agregando mais valor ao produto e com isso o aumento das margens de lucro. No mesmo
período a HP passou a construir computadores com margem de lucros mais baixas, e apesar
das dúvidas de seus fundadores quanto a entrada em um mercado mais acessível, tornou-se
uma das principais empresas de tecnologia do mundo – líder de mercado tanto em
impressoras e computadores UNIX, além de ser uma das potências na área de PC’s.

No início da década de 90 a HP estruturava-se em três áreas principais. A primeira:


Instrumentos de Teste e Mensuração – venda de diversos instrumentos com elevada margem
para engenheiros, além de ser a área que se mantinha mais fiel ao HP Way também era a que
mais sofria pelas outras atividades desenvolvidas pela HP; a segunda: Unidade de
Computadores – projetos e venda de sistemas operacionais UNIX de alto desempenho a
empresas que não podiam arcar com o custo de computadores de grande porte dedicados ao
alto processamento de dados da IBM, sua principal concorrente; a terceira: Impressoras –
venda de impressoras de ponta fabricadas pela japonesa Canon e impressoras mais baratas
que usavam tecnologia Canon. Logo em seguida passou a vendar impressoras jato de tinta com
sua própria tecnologia, um modelo de negócio totalmente diferente das áreas anteriores que
provocou a reclamação de engenheiros e vendedores quanto a uma possível violação da
crença dos fundadores em inovação e do conceito HP Way com a venda de consumíveis
altamente lucrativos em larga escala com custos mais baixos.

O faturamento da HP cresceu rapidamente entre os anos de 1992 a 1996, junto com a


preocupação sobre a dependência de PC’s de baixa margem e de lucros advindos das
impressoras. As discussões sobre entre os executivos sobre o fato de computadores serem
porta de entrada para outros produtos ou se o segmento de impressoras seria impactado de
alguma forma com os PC’s, contribuiu para que a margem bruta da HP em computadores
caísse de 31% para 19% enquanto outros concorrentes do setor lutavam por mais participação.
O ano de 95 chegou e com ele a dúvida de seguir ou não no segmento de computadores.
Houve um questionamento sobre seu futuro em relação ao que seria mais importante,
computadores de alto padrão ou computadores pessoais. Computadores UNIX permitiam
maiores margens e consentia que a HP continuasse líder no desenvolvimento de tecnologia,
essa divisão da empresa crescera 25% no ano de 92 e provocava indagações se o mercado de
computadores como esses continuaria a sustentar as altas taxas de crescimento de vendas nos
anos subsequentes.

Entre todas discussões e dúvidas, o CEO Lew Platt formou uma equipe de executivos para um
mapeamento global da empresa no tocante as projeções de crescimento e pontos fracos. Se as
perspectivas se mantivessem a HP chegaria a marca de U$ 80 bilhões de receita anual no ano
2000 e U$ 250 bilhões em 2006, algo considerado improvável por Platt. O estudo revelou que
empresas de grande porte passaram por grandes quedas no lucro, capitalização de mercado e
emprego e nunca mais retomaram suas posições, com a exceção do Wal-Mart. A análise se
tornava extremamente oportuna devido ao período de grandes decisões estratégicas a serem
tomadas e impedir que a empresa entrasse para a estatística dos grandes que não voltaram a
suas posições.

Duas mudanças no mercado mudaram a dinâmica no final da década de 90, fazendo com que
as empresas do segmento mudassem suas estratégias e organizações. Grandes compradores
empunhavam o fornecimento de soluções de tecnologia, o que significava manter o alto nível
de coordenação entre as atividades comerciais. Uma onda bem surfada pela IBM com uma
estratégia de solução que agregava computadores, softwares, produtos e serviços a fim de
atender à necessidade demandavam em solução integrada. Por fim a internet, que através de
seus usuários demandavam soluções que facilitassem a usabilidade na realização de
transações online e se comunicação na rede. Ou seja, o progresso de produtos portáteis e cada
vez mais tecnológicos que se comunicassem com outros dispositivos oferecidos por outros
fabricantes. A Dell, uma das principais concorrentes da HP, oportunamente lançou um serviço
de venda de computadores e produtos correlatos pela internet, desenvolvendo um modelo de
negócio que barateava seu custo por meio de uma estrutura mais leve. Entre os anos de 97 e
98, a HP começa a fraquejar por conta da concorrência e a crise econômica asiática. Seus
lucros advinham principalmente das impressoras enquanto computadores empatavam ou
perdiam receita ao mesmo tempo que o setor diminuía cada vez mais frente a outras
atividades da empresa.

A dificuldade no setor de computadores provocou a demissão do CEO John Yong em 1992


motivada pela indicação de Hackborn para seu lugar, que também acumularia a função de
presidente. Hackborn, havia levado a HP para liderança no segmento de impressoras pelo
desenvolvimento de tecnologias inovadoras e era visto com um visionário e um grande gestor
do dia a dia. De fato, uma excelente alternativa para tentar virar o jogo com uma pessoa
estratégica e dedicada aos princípios da empresa, mas Hackborn não aceitou as propostas de
primeira fazendo com que o conselho colocasse Platt como CEO e Packard como presidente.
Várias modificações foram feitas no intuito de reverter o quadro de instabilidade e retomada
de posição no mercado, inclusive no segmento virtual e a contratação da consultoria Mckinsey
& Company a fim de encaixar soluções estratégicas. Houve um mapeamento de algumas ações
que envolviam a dissolução de algumas áreas da HP.

No fim de 98 Platt externou a membros do conselho sua incapacidade na retomada de


crescimento da HP, o que motivou a contratação de um consultor para uma revisão da cultura
da empresa. Em uma assembleia, realizada em janeiro de 99, este consultor relatou que a
empresa estava bem em termos de integridade corporativa, mas precisava fortalecer sua
agressividade e autoconfiança. Nessa mesma reunião, identificaram a necessidade de uma
nova liderança e a um consenso sobre o perfil deste personagem, ele teria de ser carismático,
ter capacidade de elevar o perfil da empresa, experiência em marketing e vendas e força para
desafiar a cultura da HP. Foram especulados alguns nomes internos, mas todos careciam de
experiência e estavam aquém das expectativas. O conselho constatou que se recorressem a
um CEO de fora, o mercado de investidores e a mídia de negócios, aceitariam com bons olhos.
Algumas questões surgiam durante o processo de escolha, principalmente o que seria feito
com a HP Way, até a escolha de Carly Fiorina, formada em história medieval e filosofia por
Stanfor, onde conquistou a reputação de ser inteligente, uma pessoa que gostava de enfrentar
o pensamento convencional e que gostava de desafios intelectuais. Conquistou um MBA
defendendo uma tese baseada na melhoria da moral e produtividade através da força de
trabalho para introduzir mudanças nos processos empresariais. Fiorina tinha preferência por
cargos difíceis e desafiadores na AT&T, onde pudesse desenvolver trabalhos considerados
impossíveis pela grande maioria em um programa altamente competitivo de desenvolvimento
gerencial. Depois de conquistar uma prestigiosa sloan Fellowship no Massachusetts Institute of
Technology, aceitou um emprego na Divisão de Sistemas de Rede da AT&T e continuou
construindo uma carreira fundamentada em superação de expectativas e metas de
crescimento de vendas, o que a levou a liderança de vendas na América do Norte, ficando
conhecida como a maior vendedora da empresa. Foi uma figura totalmente estratégica
quando a AT&T anunciou cindir sua unidade de equipamentos, liderando a caravana na venda
da ideia a investidores. Teve seu primeiro desafio na posição de gestora geral, enquanto
encabeçava a divisão de produtos de consumo da Lucent quando concordou com uma joint
venture com a Philips Electronics.

Em julho de 99 a HP anunciou a nomeação de Fiorina como nova CEO, gerando uma reação de
entusiasmo internamente, sendo tudo que a HP não era. Fiorina recebeu um pacote de
remuneração grandíssimo, nada comparado com movimentações anteriores. O pacote foi
defendido em observância ao alinhamento a outros CEO’s do setor de tecnologia da época. Ao
mesmo tempo o conselho elegeu Hackborn como seu novo presidente, que ocupara uma
posição no conselho de diretores da empresa. Fiorina promoveu mudanças significativas após
sua chegada na HP, a começar pela reformulação da imagem da empresa com a logomarca HP,
reduziu o número de agências de publicidade para focar na mensagem da empresa. Implantou
uma mudança organizacional radical que gerou suspeita e desconfiança de muitos funcionários
mais tradicionalistas, além de dirigir uma série de modificações estratégicas com o objetivo de
acompanhar as tendências do setor, deu mais importância ao marketing e sua gestão tinha
uma inclinação favorável a aquisição de novas empresas.

Em 2001, o CEO da Compaq propôs uma fusão a Fiorina que levou a proposta ao conselho, que
avaliara como um negócio favorável com exceção de Hewlett, insuficiente para interromper o
início das negociações. A fusão foi anunciada em setembro do mesmo ano e foi muito criticada
por muitos, inclusive por David Woodley Packard, filho do cofundador e alguns analistas de
Wall Street. Após os comentários e projeções negativistas, Hewlett protocolou uma moção
junto à Comissão de Valores Mobiliários alegando que a aquisição colocaria a HP em risco.
Após um processo de votação marcado pela especulação de uma possível fraude, a aquisição
da Compaq foi anunciada em 19 de março de 2002.

Oportunamente acreditava-se que a empresa resultante dessa fusão teria mais capacidade de
enfrentar às mudanças pelas quais o segmento ultrapassava. Existia um otimismo no tocante a
redução de receitas através de movimentos anunciados pelas duas empresas antes da
aquisição e, às estratégias motivadoras da combinação relacionadas ao potencial de mercado
em suas especialidades. Em 2003 obtivera triunfo em algumas áreas, mas deixava a desejar em
outras. Conseguiu superar algumas metas de redução de custos antes mesmo do que se
especulava pelo mercado surpreendendo até mesmo os analistas de Wall Strret, que ainda
projetavam uma insuficiência de manter a saúde financeira por muito tempo. Podemos
considerar que a maior derrota da HP foi não estar relacionada entre as 100 melhores
empresas para se trabalhar, após 2 anos de ilegibilidade durante o processo de fusão. A HP
Way se fora junto com a cultura de alto comprometimento original.

O desempenho financeiro confuso nos últimos anos demonstrava a instabilidade e fragilidade


econômica pela qual a empresa passava. Ao ter informações financeiras publicadas durante
esse período, viu o valor de sua ação cair 10% ao mesmo tempo em que notícias eram
particularmente ruins nos segmentos de computadores pessoais e sobre os baixos lucros. Além
de cortes agressivos prosseguir a concorrência com a Dell, que em contrapartida não parava
de crescer e aumentar sua participação no mercado.

Fica um questionamento final a respeito da ideia de sucesso nessa operação, no meu


entendimento interpreto como fracassada. Fiorina logrou êxito ao longo de sua trajetória, seja
na caminhada corporativa em busca de seus objetivos e metas pessoais, como na posição de
gestora geral – líder. Vejo como prejudicial às estratégias de prevalecimento dos seus próprios
pensamentos, nítidos através da leitura de suas ações. Comprometeu um modelo de gestão
dedicado à valorização do funcionário e desestabilizando uma cadeia de integração
organizacional sem levar em conta a visão principal da HP e deveria ter promovido uma
transição menos agressiva aos modelos de gestão da empresa, algo que ficará marcado no
legado de sua gestão, como a pessoa que tirou a HP do ranking das 100 melhores empresas
para se trabalhar. É claro e notório a valorização da cultura organizacional por valorizar às
diferenças entre as pessoas que compõem uma sociedade. Nessa aquisição houve um choque
entre dois modelos de gestão sem considerar a promoção da integração, visando apenas
resultados econômico-financeiros.

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