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Teste de avaliação de Português, 11.

º Ano
(Aluno ao abrigo do Decreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de janeiro)

Unidade 4 Eça de Queirós, Os Maias

Utiliza apenas caneta ou esferográfica de tinta azul ou preta.


Não é permitida a consulta de dicionário.
Não é permitido o uso de corretor. Deves riscar aquilo que pretendes que não seja classificado.
Para cada resposta, identifica o grupo e o item.
Apresenta as tuas respostas de forma legível.
Ao responderes, diferencia corretamente as maiúsculas das minúsculas.
Apresenta apenas uma resposta para cada item.
As cotações dos itens encontram-se no final dos mesmos.

GRUPO I (100 PONTOS)

A
Lê o texto a seguir transcrito. Em caso de necessidade, consulta o vocabulário apresentado.

Eram quatro horas, o sol curto de inverno tinha já um tom pálido.


Tomaram a tipoia. No Rossio, Alencar, que passava, que os viu – parou, sacudiu ardente-
mentea mão no ar. E então Carlos exclamou, com uma surpresa que já o assaltara essa manhãno
Bragança:
5 – Ouve cá, Ega! Tu agora pareces íntimo do Alencar! Que transformação foi essa?
Ega confessou que realmente agora apreciava imensamente o Alencar. Em primeiro
lugar,no meio desta Lisboa toda postiça, Alencar permanecia o único português genuíno.
Depois,através da contagiosa intrujice, conservava uma honestidade resistente. Além disso,
havianele lealdade, bondade, generosidade. O seu comportamento com a sobrinhita era
10 tocante.Tinha mais cortesia, melhores maneiras que os novos. Um bocado de piteirice não lhe ia
malao seu feitio lírico. E por fim, no estado a que descambara a literatura, a versalhada do
Alen- cartomava relevo pela correção, pela simplicidade, por um resto de sincera emoção. Em
re-sumo,um bardo1 infinitamente estimável.
– E aqui tens tu, Carlinhos, a que nós chegámos! Não há nada, com efeito, que
15 caracterizemelhor a pavorosa decadência de Portugal, nos últimos trinta anos, do que este
simples facto:tão profundamente tem baixado o carácter e o talento, que de repente o nosso
velho Tomás,o homem da Flor de Martírio, o Alencar de Alenquer, aparece com as proporções
de um génioe de um justo!

Encontros• Português, 11.º ano ©Porto Editora


Ainda falavam de Portugal e dos seus males, quando a tipoia parou. Com que
20 comoçãoCarlos avistou a fachada severa do Ramalhete, as janelinhas abrigadas à beira do
telhado, ogrande ramo de girassóis fazendo painel no lugar do escudo de armas! Ao ruído da
carrua- gem,Vilaça apareceu à porta, calçando luvas amarelas. Estava mais gordo o Vilaça – e
tudo nasua pessoa, desde o chapéu novo até ao castão de prata da bengala, revelava a sua
importân- ciacomo administrador, quase direto senhor, durante o longo desterro de Carlos,
25 daquelavasta casa dos Maias. Apresentou logo o jardineiro, um velho, que ali vivia com a
mulher e ofilho, guardando o casarão deserto. Depois felicitou-se de ver enfim os dois amigos
juntos. Eajuntou, batendo com carinho familiar no ombro de Carlos:
– Pois eu, depois de nos separarmos em Santa Apolónia, fui tomar um banho ao Central
enão me deitei. Olhe que é uma grande comodidade, o tal sleeping-car2! Ah, lá isso, em pro-
30 gresso,o nosso Portugal já não está atrás de ninguém!… E Vossa Excelência agora
precisademim?
– Não, obrigado, Vilaça. Vamos dar uma volta pelas salas… Vá jantar connosco. Às seis!
Mas às seis em ponto, que há petiscos especiais.

QUEIRÓS, Eça de (2016). Os Maias. Porto: Porto Editora [pp. 722-724]

1. bardo: trovador; poeta. 2. sleeping-car: carruagem-cama (carruagem de comboio cujos compartimentos têm camas).

Apresenta, de forma bem estruturada, as tuas respostas aos itens que se seguem.
1. Localiza o excerto lido na estrutura interna de Os Maias. (20 pontos)

2. Identifica o valorde Alencar enquanto personagem-tipo. (20 pontos)

3. Indica três características psicológicas de Carlos, neste momento da ação. (20 pontos)

Apresenta, de forma bem estruturada, as tuas respostas aos itens que se seguem.
4. A morte é uma consequência da vida. No entanto, é sempre dolorosamente
aceite, quando surge comoconsequência do desencanto dessa mesma vida. (20 pontos)

4.1. Identifica uma personagem de Os Maias em que a morte surge como resultado
evidente dessedesencanto
4.2. Explicita o percurso dessa personagem. (20 pontos)

G R U P O II (50 PONTOS)

Lê o texto seguinte.

Eu conheci Tomás de Alencar. Conheci-o na província, donde nunca saiu, quando ele já tinha o seu
longo bigode romântico embranquecido pela idade e amarelecido pelo cigarro, como n’Os Maias. Não
era este homem profissionalmente um poeta – quero dizer, nunca fabricara livros de versos para vender
a editores. Fazia, porém, versos, que apareciam num jornal de ***. E era ainda poeta pela sua maneira
5 especial de entender a vida e o mundo. Desde o primeiro dia que o tratei, senti logo nele uma soberba
encarnação do lirismo romântico. E desde logo tive o desejo, a fatal tendência, de convertê-lo num

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personagem. Já, com efeito, este homem perpassa n’O Crime do Padre Amaro – tão rapidamente,
porém, que o tipo vem todo condensado numa só linha. Ninguém hoje se lembra já d’O Crime do Padre
Amaro, por isso cito esse episódio. É na praia da Vieira, uma praia de banhos ao pé de Leiria, à hora do
10 banho: “As senhoras sentadas em cadeirinhas de pau, de sombrinhas abertas, olhavam o mar palrando;
os homens, de sapatos brancos, estendidos pelas esteiras, chupavam o cigarro, riscavam emblemas na
areia – enquanto o poeta Carlos Alcoforado, muito fatal, muito olhado, passeava só, soturno, junto à
vaga, seguido do seu terra-nova.” Mais nada.
Não volta mais em todo o livro. Mas nessa curta linha passa ele real, como era, tão vivo que o revejo
15 agora, magro, com a grenha sobre a gola, fatal e soturno, admirado das mulheres, seguido do seu terra--
nova. E revejo-o ainda, como numa das derradeiras vezes, anos depois, passeando rente de um muro de
cemitério, ao cair da tarde, numa quieta vila de província, mais grisalho, mais soturno, falando de
versos e das tristezas da vida, com o chapéu desabado sobre os olhos, embrulhado num xale-manta
cinzento, seguido do seu terra-nova.
20 O meu trabalho n’Os Maias foi transportá-lo para as ruas de Lisboa, acomodá-lo ao feitio de Lisboa,
começando por o desembrulhar do seu xale-manta, e separá-lo do seu cão – porque estes dois atributos
não se coadunam com os costumes da capital. Completei-o também dando-lhe esse horror literário do
naturalismo, que Alcoforado nunca tivera – porque nesses tempos ditosos ainda não se parolava em
Portugal acerca do naturalismo, nem o nosso bom Chagas conhecia ainda, para dele se rir, de alto
25 parabaixo, o épico d’O Germinal.
Em todas as feições fundamentais, porém, ele permaneceu no romance exatamente como foi
navida.
Era dele a solenidade do Alencar. Dele a voz cavernosa e lenta. Dele o hábito (que o ajudou a
matar)de atirar às goelas copinhos de genebra. Dele o costume de empregar o invocativo filhos! – tão
30 inveteradoque este plural vinha mesmo quando se dirigia a uma só pessoa, como se em espírito falasse
auma descendência de espíritos. Eram dele, enfim, a lealdade, a honestidade impecável, a bondade,
agenerosidade, a alta cortesia de maneiras: e é bem petulante que alguém tente à força encafuar-se
dentrodestas nobres qualidades, e procure resplandecer perante a multidão com o brilho que elas irra-
diam,repetindo assim a fábula sempre grotesca e sempre irritante da gralha que se reveste com aspenas
35 melhores do pavão!

QUEIRÓS, Eça de (2000). Notas Contemporâneas. Lisboa: Livros do Brasil [pp. 157-159]

1. Para responderes a cada um dos itens de 1.1. a 1.7., seleciona a opção correta.
Escreve, na folha de respostas, o número de cada item e a letra que identifica a opção
escolhida.

1.1. Neste texto, Eça de Queirós (5 pontos)


a. dá a conhecer a génese da personagem Alencar.
b. caracteriza minuciosamente, em termos físicos, psicológicos e sociais, a entidade real quedeu
origem à personagem Alencar.
c. critica asperamente o perfil psicológico dos poetas Carlos Alcoforado e Alencar.
1.2. No primeiro parágrafo, Eça de Queirós refere-se a (5 pontos)
a. um poeta real.
b. uma entidade marcada pela veia romântica.
c. um artista de renome no século XIX.
1.3. Na linha 7, o conector “com efeito” desempenha uma função (5 pontos)
a. contrastiva.
b. de confirmação.
c. contra-argumentativa.
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1.4. O discurso reproduzido nas linhas 10 a 13 é apresentado sob a forma de (5 pontos)
a. discurso direto.
b. discurso indireto.
c. citação.
1.5. Com a expressão “Completei-o também dando-lhe esse horror literário do
naturalismo” (ll. 22-23),Eça de Queirós (5 pontos)
a. demonstra a sua repulsa pelo Naturalismo.
b. atribui uma característica psicológica à personagem Alencar.
c. alude a Carlos Alcoforado como poeta que segue a estética do Naturalismo.
1.6. Na linha 30, a conjunção “que” introduz uma oração (5 pontos)
a. coordenada explicativa.
b. subordinada adverbial comparativa.
c. subordinada adverbial consecutiva.

1.7. Na última frase do texto, a referência à “gralha” e ao “pavão” baseia-se (5 pontos)


a. na metáfora.
b. no eufemismo.
c. na sinestesia.

2. Responde ao item apresentado. (15 pontos)


2.1. Considerando a frase abaixo, faz corresponder a cada constituinte frásico (coluna A)
arespetiva funçãosintática (coluna B).
Escreve, na tua folha de respostas, as letras e os números correspondentes. Utiliza cada
letra e cada númeroapenas uma vez.

O meu trabalho n’Os Maias foi transportá-lo para as ruas de Lisboa, acomodá-lo
ao feitio deLisboa, começando por o desembrulhar do seu xale-manta, e separá-lo
do seu cão – porque estesdois atributos não se coadunam com os costumes da
capital. Completei-o também dando-lheesse horror literário do naturalismo, que
5 Alcoforado nunca tivera – porque nesses tempos ditososainda não se parolava em
Portugal acerca do naturalismo, nem o nosso bom Chagas conheciaainda, para dele
se rir, de alto para baixo, o épico d’O Germinal. (ll. 20-25)

Coluna A Coluna B
a. “lo” (l. 1) 1. Sujeito
b. “estes dois atributos” (l.3) 2. Complemento direto
c. “que Alcoforado nunca tivera” (ll. 4-5) 3. Complemento oblíquo
d. “em Portugal” (ll. 5-6) 4. Modificador (do grupo verbal)
e. “dele” (l. 7) 5. Modificador apositivo do nome

G R U P O III (50 PONTOS)

Em Os Maias sente-se, desde o início, o peso de um destino “fatal” que se abate sobre as
personagens,arrastando-as para a destruição.
Redige uma exposição sobre este tema, com um mínimo de cem e um máximo de
duzentaspalavras.
Encontros• Português, 11.º ano ©Porto Editora

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