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GRANDE LOJA DO PARANÁ

VIII Curso para Aprendizes


e Companheiros
2015

Princípios
E
Ética Maçônica

Palestrante: Ir.´. Francisco Cezar de Luca Pucci

Curitiba, 2015
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PRINCÍPIOS E ÉTICA MAÇÔNICA

Etimologicamente falando, ética vem do grego "ethos", e tem seu correlato no latim
"morale", ambos os conceitos com o mesmo significado: conduta, ou relativo aos costumes.
Podemos concluir que, etimologicamente, ética e moral são palavras sinônimas. Contudo, os
filósofos distinguem os dois conceitos. Para muitos estudiosos:
1. Ética é princípio, moral são condutas específicas;
2. Ética é permanente, moral é temporal;
3. Ética é universal, moral é cultural;
4. Ética é valor, moral é regra;
5. Ética é teoria, moral é prática.
Dessa forma, o estudo da ética maçônica se confunde com o estudo de seus princípios
fundamentais e a moral é o conjunto de comportamentos esperados, quer dizer: socialmente
construídos, de quem adota esses princípios.
Isso não é apenas um jogo de palavras. Lembro-me de minha época de criança, no
interior do Estado, que quando os adultos falavam que alguém era maçom, isso significava
quase que um atestado de probidade. A conduta esperada de um maçom era de integridade,
dedicação à comunidade, respeito às pessoas e amabilidade no trato. Essa conduta derivava de
valores, implícitos ou explícitos: honestidade, espiritualidade, etc.
Hoje, podemos falar, grosso modo, de três concepções da ética:

Ética Normativa Ética Teleológica Ética Situacional


Baseada em Valores Baseada em Objetivos Circunstancial
Baseia-se em princípios e regras Baseia-se na ética dos fins: “Os fins Baseia-se nas circunstâncias. Tudo é
morais fixas justificam os meios”. relativo e temporal.

Ética religiosa Lucro Bateu


e também maçônica e Poder Valeu
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Quando nos referimos aos princípios fundamentais da Maçonaria Moderna, os princí-


pios fundantes de sua ética e, consequentemente, de sua moral, os encontramos no lema LI-
BERDADE, IGUALDADE E FRATERNIDADE, que, conquanto não tenha sido original-
mente maçônico, foi se construindo na nossa história e hoje resume o ideal da Arte Real em
todo mundo.
Quando nos atemos aos Landmarks, muito embora ainda constituam a infra-estrutura
da Ordem e balizem muitos aspectos de sua organização, nos deparamos com princípios éti-
cos absolutamente situacionais (vide quadro acima) ou teleológicos. Nem sempre os land-
marks são utilizáveis em nossos tempos.
Os "deveres", segundo figuram no manuscrito "Beswicke-Royuds", um dos antigos
documentos que compõem o conjunto de textos que compõem nossos Landmarks, apresentam
como primeiro ponto a cumprir que você "seja um homem sincero para com Deus e a Santa
Igreja e não cairá na heresia ou em erro por opinião própria ou por ensino de um homem
imprudente". Ora, esse "dever" é próprio a uma época em que a Maçonaria de ofício estava
fortemente ligada à Igreja, e nem poderia ser diferente, uma vez que a absoluta lealdade ao
Estado e à Igreja eram questão de sobrevivência física naquela época. É óbvio que esse "de-
ver" se contrapõe fundamentalmente ao princípio de Liberdade de Consciência e Tolerância,
tal como vieram a ser admitidos em 1717 pela Constituição da Moderna Maçonaria.
O mesmo pode ser dito do segundo "dever": "também você será um vassalo sincero
para com o Rei, sem traição ou falsidade, e se você conhece alguma traição a corrigirá se
puder, ou, se não puder, avisará ao Rei ou ao seu Conselho".
Já os outros "deveres" dos sete que compõem esse manuscrito, são absolutamente pra-
ticáveis na modernidade. Por exemplo: "também serão sinceros uns com os outros, isto é, com
cada mestre e companheiro do Ofício de maçonaria que sejam Maçons autorizados, e você os
tratará como gostaria de ser tratado por eles. E também que cada Maçom mantenha verda-
deiramente o segredo da Loja e da câmara e todo segredo que deva ser mantido a bem da
Maçonaria. E também que nenhum Maçom seja um ladrão em sua companhia. E também que
você seja sincero para com o senhor e mestre a quem serve e verdadeiramente procure seu
proveito e benefício. Também que não seja feita nenhuma coisa desprezível na casa do Ofício
que possa injuriá-la". Todos são condições ou decorrências da Fraternidade.
O que pretendeu instituir a Maçonaria em 1717? Princípios de uma ética normativa,
baseada em valores, não em dogmas, que pudesse ser universal e praticável por qualquer pes-
soa, de forma coerente com a nova realidade cultural, científica e econômica que se apresen-
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tava. Se por um lado a Maçonaria não precisava mais ser secreta e tomava a decisão histórica
de manifestar-se ao mundo, tinha que considerar que esse mundo se abria para a modernidade.
E o que mais profundamente caracterizava essa modernidade? O desenvolvimento da ciência;
o rompimento com o absolutismo político e religioso; a multiculturalidade; um sistema eco-
nômico dominado por uma burguesia esclarecida. Isso punha uma questão nova para uma
ética do relacionamento: como conciliar a universalidade dos valores com a diversidade de
pensamento?
No plano institucional o debate está mais vivo do que nunca. Uma medida recente
tomada pelo Governo da França, vetando a utilização de signos religiosos ostensivos, como a
burca para muçulmanas ou o crucifixo em ambientes de governo, provocou e ainda provoca
calorosos debates. Não é questão de fácil solução.
Aos poucos, porém, vai se tornando evidente que o princípio da igualdade, em qual-
quer de suas vertentes, veio para ficar. Associado, na esfera dos valores, à dignidade, suplan-
tou a honra, com sua pressuposição hierárquica e aristocrática. Como dizia Rousseau (O Con-
trato Social), o problema está em "encontrar uma forma de associação que defenda e proteja
com toda a força comum a pessoa e os bens da cada associado e pela qual cada um, unindo-
se a todos, não obedeça, porém, senão a si próprio e permaneça tão livre quanto antes; este,
o problema fundamental cuja solução é dada pelo contrato social".
Mas sem um elevado grau de tolerância, é absolutamente impossível se aceitar o direi-
to à diferença, especialmente das minorias. O princípio de Rousseau tende a gerar uma "dita-
dura da maioria", uma tendência homogeneizadora, a menos que se acrescente a ele o princí-
pio da tolerância.
Mas de que tolerância se fala? Herbert Marcuse, um dos membros da chamada "Escola
de Frankfurt" e guru dos movimentos de maio de 1968, efetuou, em 1965, uma crítica da no-
ção de tolerância. Seu argumento é o de que, em uma sociedade violenta, repressiva ou desi-
gual, defender a tolerância em termos absolutos equivale a legitimar essa sociedade, o status
quo. Dito de forma mais simples: a tolerância absoluta deve envolver também a tolerância
com ditaduras e ditadores.
Um exemplo bem próximo que põe à prova os limites da tolerância na sociedade de-
mocrática é a exibição do polêmico filme "A Paixão de Cristo", de Mel Gibson. Sob pretexto
de fidelidade ao Antigo Testamento, Mel Gibson acaba reproduzindo uma versão da vida de
Jesus que provocou críticas e até violência. Como proceder diante desse filme? Como defen-
der o direito à sua apresentação aceitando, implicitamente, a atitude anti-semita que ele gera-
ria colateralmente?
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Mas este é apenas um exemplo dos dilemas enfrentados pelas sociedades democráticas
contemporâneas diante da idéia da tolerância. A questão reside em saber até onde se pode
tolerar sem recair na omissão ou no relativismo.
Outros teóricos, não necessariamente marxistas, defenderam que se passe dos direitos
formais para a efetividade dos direitos. É o caso de Norberto Bobbio. Em A Era dos Direitos
afirma que, hoje, já se deve passar da luta pelo reconhecimento dos direitos para a luta por sua
implantação. Isso significa a luta pela igualdade de direitos e pela justiça. Considerando-se
que propugnar pela liberdade e pela tolerância é admitir, por pressuposto, que as pessoas são
diferentes, de que igualdade se fala? Pelo fato de a Maçonaria defender que a humanidade é
uma condição comum a todos, independentemente de sexo, raça, religião ou posição social,
decorre que, em primeiro lugar, ela se propõe a defender a igualdade de condições. Esse é um
valor universal, embora as condições possam mudar a cada época. Hoje, reconhecemos como
fundamentais os direitos à educação, à saúde, à moradia e à vida, por exemplo. Essas são con-
dições humanas fundamentais. Além daí, é necessário considerar que deve haver direitos
iguais para pessoas em situação social igual. Não há justiça, por exemplo, no fato de que indi-
víduos que desempenhem a mesma função no mesmo sistema recebam salários diferenciados
por conta de seu sexo, cor ou preferência política.
Isso coloca uma questão importante para a ética, especialmente maçônica: adotar valo-
res e princípios, defendê-los nas discussões, sem que se atue no sentido de implementar as
condições para o real exercício desses valores e princípios, é absolutamente inócuo. Nossa
doutrina não fala em "defender" valores, mas em "construir" Templos às Virtudes e Masmor-
ras aos Vícios. Não adianta nada, por exemplo, termos em tese liberdade de deslocamento se,
na prática, por condições financeiras, dificuldades de transporte ou outros obstáculos não po-
demos de fato nos deslocar. Como falar em liberdade de escolha de ocupação em situação de
elevado desemprego? Como falar, por exemplo, em igualdade racial em um país em que a cor
é levada em conta na hora de selecionar para um emprego? Como falar de igualdade no traba-
lho quando as mulheres continuam ganhando menos do que os homens, sujeitas a assédio
sexual e profissional? Como falar em direitos do trabalhador quando se sabe que, na prática,
as pessoas que estão empregadas trabalham cada vez mais, sem ganhar horas extras?
CONCLUSÃO: a Maçonaria Moderna, herdeira direta da visão de mundo do Ilumi-
nismo, tem como objeto de sua doutrina a Humanidade. Como ética ou princípio, a busca das
condições fundamentais de Igualdade, Liberdade e Fraternidade para todos os Homens. Como
método, propõe o esforço progressivo do ser humano em busca da aquisição e fortalecimento
de valores, atitudes e hábitos que induzam seus membros a se engajarem na luta por condi-
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ções sociais, culturais e econômicas cada vez mais propícias ao desenvolvimento desses ide-
ais.
Esses princípios, por serem paradigmáticos, não excluem outros, desde que esses ou-
tros não estejam em contradição com eles. Dessa forma, a Maçonaria consegue colocar-se
valores universais que se adequam às variadas condições de tempo e espaço em que existem
as sociedades "reais", ao mesmo tempo em que servem de orientação a todos os obreiros do
orbe.
Albert Schweitzer: "ética é a ilimitada veneração diante da vida e o respeito diante de cada ser".

Ir.·. Francisco Cezar de Luca Pucci.

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