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Raymundo de Lima*
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acreditam mais nos milagres da não esconde ser uma produção
pseudociência facilmente acessível pela demasiadamente humana, e como tal
impressa popular do que as descobertas sua mira na objetividade é mais um
verdadeiramente científicas cujo otimismo epistêmico do que uma
discurso científico é marcado pelo realidade de fato do fazer ciência.
hermetismo, prudência e ceticismo. Contudo, sem ser simpático ao
Apesar dessa dificuldade, é possível que neopositivismo, parece consenso que a
uma pandemia de gripe faça os ciência é o conhecimento que melhor
governos procurarem orientação sustenta confiabilidade e credibilidade,
científica visando prevenção e pelo menos pela população mais
tratamento numa linguagem direta e esclarecida. Curiosamente, os Estados
simples, como: devemos lavar as mãos, Unidos, que possuem uma ciência e
evitar aglomerações, observar os tecnologia mais avançada do mundo,
sintomas, etc. Mas milhares de pessoas 95% da população é “cientificamente
não descartam uma fezinha na analfabeta”, observa Carl Sagan (1996).
pseudociência, para explicar as causas O autor observa ainda que o norte-
ou divulgar uma prevenção infalível americano médio acredita em
produzido por anônimos da astrologia, numerologia, grafologia,
pseudociência: comer ou beber isso ou borra de café, Nostradamus, técnica
aquilo, usar um protetor (patuá) etc. advinhatória com pirâmides, cristais,
As pseudoterapias têm o poder de terapia de vida passada, cirurgia
despertar fascínio popular, eliminam espiritual, ufologia e extraterrestres (que
dúvidas, sustentam esperanças, vivem entre nós disfarçados de gente),
prometem curas rápidas e milagrosas. Já etc. No Brasil, também a pseudociência
as terapias baseadas nos pressupostos da atrai um grande número de farsantes e
ciência trabalham com probabilidade de espertos explorando milhares de
cura, ou o tratamento é uma ingênuos e incautos, apesar de existir
possibilidade de a doença ser uma lei...
controlada, não curada. No campo Há uma linha demarcatória, simples,
teórico, a ciência busca explicações entre ambas: enquanto a pseudociência
dentro dos critérios de racionalidade foge de participar das discussões em
que geralmente frustram os ingênuos e foruns adequados e de testar suas
dogmáticos. Principalmente, depois dos hipóteses, a ciência se oferece sempre
efeitos colaterais da ciência aplicada para discussão em fóruns adequados.
(talidomida, acidentes nucleares, danos Seu processo de investigação é
ao meio ambiente etc.), hoje existe sistemático, visando
desconfiança saudável em relação à explicar/compreender os fenômenos
ciência. Afinal, a ciência não resolve a naturais, sociais, psicológicos. Ela “é
‘questão humana’. Ainda, a ciência não mais do que um corpo de
é neutra e os cientistas não estão isentos conhecimentos, é um modo de pensar”
de interesses pessoais, políticos e (SAGAN, op.cit.). Uma verdadeira
ideológicos, conforme as análises de ciência deve estar sempre aberta a novas
Thomas Khun, Pierre Bourdieu e Bruno investigações e debates, enquanto que
Latour. as pseudociências tendem a afirmações
Parece que a pseudociência sustenta marcadas por certezas ou dogmas.
uma aura divina, como que fosse uma Ainda, as teorias genuinamente
produção transcendental. Já a ciência científicas são aproximações da
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verdade, e jamais “a” verdade. Não Atentar apenas para a formação com
existem certezas absolutas na ciência, senso crítico parece-nos insuficiente
mas discussão sistemática e pluralista para formar uma nova geração de
sobre problemas reais ou abstratos. Esse docentes, mais prudentes e pautados nas
simples critério demarcatório de discussões epistemológicas no ato de
abertura ao debate e a capacidade de ensinar conteúdos programáticos.
argumentação de demonstração, que faz
lembrar o critério demarcatório de
Popper, também nos leva a situar Referências
algumas teorias humanas como “menos COLUCCI JR, J. A arte de ter razão.
ciência e mais ideologia” (LAKATOS, Disponível em:
ver nas referências). http://www.observatoriodaimprensa.com.br/imp
rimir.asp?cod=347AZL004
Atualmente a pseudociência vem GOMES, W. Falsas ciências e teorias
invadindo as escolas e universidades, pseudocientíficas. Disponível em:
sobretudo as particulares, com cursos de http://www.observatoriodaimprensa.com.br/ofjo
extensão, palestras, e até reivindicam r
status de ciência nos currículos LAKATOS, I. Ciência e pseudociência.
convencionais dos cursos de formação. Disponível em:
É o caso do movimento do “design http://www.aartedepensar.com/leit_lakatos.html
inteligente”, que quer ser incluído no NEVES, M.C.D; PARRILHA DA SILVA, J.A.
campo científico e no currículo de Evoluções e revoluções: o mundo em transição.
Biologia. Na verdade o DI não passa de Maringá: Massoni, 2008, p. 289-287.
convicções subjetivas baseadas na REIS, Widson P. A pseudociência nas
tradicional fé religiosa. universidades brasileiras. Disponível em:
http://elusion-
No Brasil, os professores não estão bem pedion.blogspot.com/2008/04/pseudocincia-nas-
preparados para ensinar os universidades.html
conhecimentos científicos, e livros SAGAN, C. O mundo assombrado pelos
didáticos2 são adotados cujo conteúdo demônios. A ciência vista como vela no
confunde ciência e pseudociência. escuro. São Paulo: C. Letras, 1996.
*
RAYMUNDO DE LIMA é Doutor em Educação (USP) e docente no Departamento de
Fundamentos da Educação da Universidade Estadual de Maringá.
1
Ver no Wikipédia: http://pt.wikipedia.org/wiki/Design_inteligente
2
Ler texto-conferência publicado no JC-Online (Jornal da Ciência), da SBPC, n.3455, de 22/02/2008. Tb.
publicado no livro organizado pelo autor (NEVES E PARRILHA SILVA, 2008).
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