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justiça e equidade
1.1.O problema da legitimidade da autoridade do Estado
Vivemos num mundo organizado politicamente, de tal modo que uma parte da nossa vida é estruturada e
controlada pelas decisões do Estado.
Mas será legítima esta interferência e controlo do Estado? Teremos sempre o dever de obedecer ao
Estado? Haverá situações em que é legítimo desobedecer ou mesmo revoltarmo-nos contra o Estado?
Qual é o fundamento da autoridade do Estado?
O problema da legitimidade do Estado assume particular relevância no início da Idade Moderna,
com a progressiva secularização1 da vida político-social.
Para esta secularização contribuíram vários fatores. Destes destacam-se os movimentos da
Reforma/Contra Reforma e a guerra civil inglesa, que puseram fim à crença no “direito divino dos reis”.
Até ao Séc. XVI, o exercício do poder, nas sociedades europeias tinha origem divina, segundo a qual o
poder do Estado era recebido diretamente de Deus pelo soberano ou diretamente para o povo que
delegava no soberano.
A partir do Séc. XVI assiste-se, com a teorização de Maquiavel, à autonomização progressiva da
política face à religião e ao surgimento das teorias contratualistas.
Thomas Hobbes (1588-1679) , John Locke (1632-1704) e Jean Jacques Rosseau (1712-1778) são os
mais famosos filósofos do contratualismo.
As teorias contratualistas tentam explicar o que levou as pessoas a formarem Estados e/ou manterem a
ordem social. Para os filósofos contratualistas o Estado não é uma forma natural de os indivíduos
organizarem a sua vida em sociedade, mas sim uma construção humana, o resultado de um contrato
social.
O contrato social2 é um acordo pressuposto entre indivíduos e o Estado que traz implícito que as pessoas
abrem mão de certos direitos para um governo ou outra autoridade a fim de obter as vantagens da ordem
social. Nesse aspeto, o contrato social seria um acordo entre os membros da sociedade, pelo qual
reconhecem a autoridade, igualmente sobre todos, de um conjunto de regras, de um regime político ou de
um governante.
O ponto inicial da maior parte dessas teorias é o exame da condição humana na ausência de qualquer
ordem social estruturada, normalmente chamada de “estado de natureza”. Nesse estado, as ações dos
indivíduos estariam limitadas apenas pelo seu poder e consciência. Desse ponto em comum, os
proponentes das teorias do contrato social tentam explicar, cada um a seu modo, como foi do interesse
racional do indivíduo abdicar da liberdade que possuiria no estado de natureza para obter os benefícios da
ordem política.
Recentemente, a tradição das teorias do contrato social ganhou nova força, principalmente nas obras do
filósofo político norte-americano John Rawls (1921-2002) sobre as questões da justiça distributiva e nas
dos teóricos das 'escolhas racionais públicas' dos governantes e homens públicos, que discutem os limites
da atividade do Estado.
A legitimidade universal dos princípios básicos assenta no facto de terem sido escolhidos e reconhecidos
consensualmente através de um acordo ou contrato social celebrado na posição original sob o efeito do
véu de ignorância numa situação equitativa.
Só nestas circunstâncias os indivíduos seriam capazes de realizar uma escolha:
- imparcial pois, não conhecendo nem as suas caraterísticas pessoais, nem os seus interesses e objetivos
particulares, nem o seu estatuto social, escolheriam para todos o que desejavam garantir a si próprios;
- universal, dado que essa escolha é aceite e reconhecida por todos como sendo a que melhor serve os
seus interesses.
Princípios de justiça
Primeiro: Princípio da liberdade igual para todos
Cada pessoa deve ter um direito igual ao mais extenso sistema de liberdades básicas que seja compatível
com um sistema de liberdades idêntico para as outras.
John Rawls, Uma teoria da Justiça, Lisboa; Presença
O princípio da liberdade igual para todos diz que a sociedade deve garantir a máxima liberdade
para cada pessoa compatível com uma liberdade igual para todos os outros.
O princípio da igual liberdade tem prioridade em relação aos restantes. As liberdades básicas devem
ser respeitadas incondicionalmente, não podem ser violadas/postas em causa sob quaisquer condições ou
circunstâncias.
Rawls tem uma concepção deontológica da moral que considera o indivíduo, a priori, como portador de
direitos. Não se pode violar/desrespeitar a liberdade de nenhum indivíduo em benefício de outrem. A
obtenção de maiores benefícios económicos e sociais não pode servir de argumento para a violação do
direito a iguais liberdades básicas.
Entre as liberdades básicas incluem-se a liberdade política (traduz-se no direito de votar e concorrer a
cargos públicos), a liberdade religiosa, a liberdade de expressão e reunião, a liberdade de consciência e
pensamento, “as liberdades da pessoa”(proibição de agressão e prisão arbitrária, direito à propriedade).
No entanto, nenhuma destas liberdades é absoluta, qualquer uma pode ser limitada para assim se garantir
a liberdade de todos. Por exemplo, limitar a liberdade de expressão, pela proibição de difusão de ideais
extremos ou intolerantes pode ser justificável para proteger a liberdade de todos.