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Apesar das inúmeras diferenças entre as teorias de Rawls, Nozick e Sandel, para definir
uma sociedade justa, verifica-se que estes concordam na defesa dos ideais democráticos.
Enquanto os dois primeiros valorizam mais a liberdade individual, tendo sobre a
igualdade perspetivas diferentes, o último enfatiza a importância da comunidade e o
valor da solidariedade.
De acordo com John Rawls, para que seja possível construir uma sociedade justa,
teremos de garantir que os direitos fundamentais de cada indivíduo são respeitados e
que a cooperação social traz o máximo de benefícios a todos de uma forma justa.
Rawls defende que o tratamento social deve ser equitativo, ou seja, ponderado em
função das características e necessidades de cada um.
A posição original e o véu de ignorância
Para que fosse possível ao ser humano definir os princípios da justiça de forma
totalmente imparcial, Rawls sugere que é necessário imaginarmo-nos numa situação
anterior à constituição da própria sociedade; uma posição original em que todos
estariam numa situação de plena igualdade
Nesta situação, de modo a garantir que na construção dos princípios que irão aplicar-se
à sociedade os interesses particulares não se sobrepõem à justiça, Rawls sugere que o
ideal seria estarmos cobertos por um véu de ignorância que nos vedasse o acesso a
qualquer informação que pudesse condicionar as nossas escolhas. Assim, cobertos por
este véu de ignorância, os seres humanos desconheceriam inclusivamente as suas
aptidões naturais. Isto daria lugar a uma distribuição imparcial dos direitos e deveres
pelas várias posições ou funções existentes na sociedade.
Rawls recorre a esta situação de modo a assegurar que os princípios são escolhidos com
imparcialidade.
O véu de ignorância é uma situação imaginária na qual, desconhecendo as
características particulares da sua situação, os indivíduos poderiam imparcialmente
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encontrar os princípios mais justos. Cobertos pelo véu de ignorância, os indivíduos
desconheceriam:
• a sua posição social;
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Esta posição mostra a oposição frontal de Rawls aos sistemas totalitários. Também o
princípio da igualdade equitativa de oportunidades é, para Rawls, prioritário em relação
ao princípio da diferença.
Assim, para John Rawls uma sociedade é justa se seguir os seguintes três princípios: 1-
Princípio da liberdade: a sociedade deve assegurar a máxima liberdade para cada pessoa
compatível com uma liberdade igual para todos os outros; 2- Princípio da oportunidade
justa: deve-se promover a igualdade de oportunidades, e as desigualdades na
distribuição de riqueza são aceitáveis apenas na medida em que resultam desta
igualdade de oportunidades. 3- Princípio da diferença: a sociedade deve promover a
distribuição igual da riqueza, exceto se a existência de desigualdades económicas e
sociais gerar o maior benefício para os menos favorecidos.
Para Michael Sandel a justiça traduz-se na preocupação com o bem-comum e no cultivo
da virtude. Quer isto dizer que uma sociedade justa reclama por um sentimento de
comunidade, que resulta da preocupação em cultivar nos cidadãos que a integram um
sentimento de pertença, de cuidado e dedicação ao bem-comum - ao todo social –
afastando-se, assim, das conceções de vida boa individualistas e, por isso, egoístas. Este
autor considera que as desigualdades sociais debilitam a solidariedade inerente a uma
cidadania democrática, corroendo a virtude cívica.
Por seu turno, Nozick é um defensor do libertarismo. De acordo com esta perspetiva
política, o Estado deve ter um papel muitíssimo limitado. Deve servir essencialmente
para garantir a segurança das pessoas (através das forças policiais) e para resolver
conflitos (através dos tribunais). O Estado não deve, por exemplo, providenciar
educação ou cuidados de saúde aos cidadãos. De acordo com os libertaristas, cobrar
impostos para providenciar estes serviços é interferir indevidamente na liberdade das
pessoas. O Princípio da Diferença está em conflito com o libertarismo. Este princípio,
diz- -nos Nozick, é um exemplo de uma conceção padronizada da justiça, pois afirma
que a riqueza deve estar distribuída de um certo modo, isto é, de acordo com um
determinado padrão: as desigualdades de riqueza só se justificam se melhorarem a
situação dos mais desfavorecidos.
Segundo Nozick, para implementar o Princípio da Diferença, o Estado terá de
redistribuir constantemente a riqueza. Terá de forçar algumas pessoas a pagar impostos,
retirando-lhes parte do que ganharam legitimamente, para que outras pessoas sejam
beneficiadas. Nozick, baseando-se no pensamento de Kant, considera que isso é
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eticamente inaceitável- uma vez que assim estaríamos a tratar as pessoas como meros
meios, violando os seus direitos de propriedade.
Robert Nozick, considera absolutos direitos individuais como a liberdade e a
propriedade. A distribuição da riqueza será apenas baseada no mérito dos indivíduos
defendendo que cada um de nós tem direito ao que herdou, recebeu ou ganhou
legitimamente – seja muito ou pouco - e esse direito de propriedade não deve ser
violado pelo Estado. Esta perspetiva diz que tudo o que é ganho honestamente através
do esforço individual e de acordos justos é nosso. Se alguém ganhou legitimamente o
que tem, então a distribuição que daí resulta é justa — independentemente de poder ser
desigual. Ainda que outros tenham muito menos, ninguém tem o direito de se apropriar
das posses alheias.
Constatamos assim que as propostas e ideias sobre o que é uma sociedade justa variam
nos três autores. Enquanto para o primeiro o sistema deve atingir um equilíbrio
reflectido, baseado num princípio de equidade, para o segundo a desigualdade é vista
como natural, decorrendo apenas do mérito dos indivíduos e do direito inabalável de
reunir por herança ou ganho legítimo bens. No caso dos dois autores valoriza-se o
individuo, ainda que existam diferenças profundas na forma como se defende a primazia
do individuo perante a justiça social. Já o terceiro autor, isto é Sandel, a primazia não é
a do individuo, mas sim o bem-comum da comunidades a que o individuo pertence.
A reflexão sobre o pensamento dos 3 autores permite compreender que as conceções de
sociedade justa são muito variáveis, colocando ora a primazia no individuo, ora na
comunidade.
A vida quotidiana mostra-nos que as diferenças entre indivíduos nem sempre decorrem
da capacidade individual de, perante as mesmas circunstâncias, fazerem escolhas
melhores, isto é - o mérito individual.
Na verdade constata-se que nem todos têm as mesmas oportunidades – essa diferença
depende de circunstâncias como por exemplo o país onde se nasce e a pertença
sociedades democráticas e igualitárias Isto condiciona o acesso a diferentes recursos,
sejam naturais, sejam à educação, aos cuidados básicos como alimentação, higiene e
saúde. Veja-se a este propósito a situação de milhares de migrantes refugiados que
procuram melhores condições de vida longe do seu país de origem, ou a situação de
minorias étnicas, de género e de orientação em muitos países.
Mesmo entre indivíduos nascidos em sociedades democráticas, onde se promove o
acesso universal a serviços tão essenciais como educação e a saúde, as circunstâncias
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individuais nem sempre permitem que esse acesso produza os mesmos resultados. A
família a que se pertence, o nível socioeconómico e cultural que esta detém, interfere
muitas vezes no sucesso alcançado. Exemplo ilustrativo disso são os resultados
escolares, embora a escola tenha como ambição promover um acesso igual a todos, os
diferentes recursos de cada uma tem implicações nos resultados obtidos.
Assim, para lá dos direitos individuais e do mérito de cada um para alcançar “sucesso”,
uma sociedade justa é aquela que promove de forma assertiva o bem-comum, a
igualdade de acesso, que consegue repartir recursos por forma a dotar os que tem menos
das mesmas oportunidades. É uma sociedade algo utópica, em que todos têm acesso às
mesmas condições de partida e onde os indivíduos apenas se distinguiriam por mérito
pessoal e não por desigualdade de nascimento ou pertença.
Essa repartição de recursos não pode, no entanto, significar um desvalorizar do mérito e
da qualidade, que imponha aos indivíduos reprimir a sua capacidade de fazer escolhas e
de obter mais, ou menos sucesso, de acordo com essas escolhas.
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