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Monsenhor TIHAMÉR TÓTH

P ro fesso r d a U niversidade de B udapest

A’ Juventude Católica

A CASTA
ADOLESCÊNCIA
rrTTTm

1938
N IH IL OBSTAT
T aubaté, die 9 J a n u a rii 1938
P. F e r d . B a u m i i o f f S . C . J.
Censor ad hoc

IMPRXMATUR
T aubaté, die 9 Ja n . 1938.
t Andreas Eppus Taub.

IM PR IM I POTEST
T aubaté, in festo P urific. B. M. V.
an n i 1938
P .e P . S to rm s
P raep. prov. brasil.
http://alexandriacatolica.blogspot.com

APR ESEN TAÇ AO

Quem é o autor deste livro?


Quem é Mons. Tihamér T óth?
M ons. Tiham ér T ó th é um dos maiores lum i­
nares da atual Hungria católica, um dos maiores pré-
gadores da Europa hodierna e um dos melhores edu­
cadores do m undo.

M O N S. T IH A M É R T Ó T H E ‘ U M P R É G A D O R
G E N IA L E A B E N Ç O A D O .

Por certo, o padre catolico não é só depositário


e ministro das graças sacramentais. E ‘, sim, aquilo
que é em sua pessoa pelo gráu de santidade que reali­
za. Mas, além de tudo isso, vale para o povo tanto
quanto ele lhe ajuda a sair das dificuldades, das
suas misérias espirituaes e temporais. Ajuda-lhe devé-
ras pelos conselhos e orientações que lhe dá, mór-
mente nas prêgações. Por eles, torna-se conselheiro e
guia do povo.
Não se nos afigura bom prégadot aquele que,
como um m oinho, remóe sempre a mesma farinha.
A semente da palavra de Deus deve brotar-lhe na
6 Mons. Tóth é prégador abençoado

mente, luminosa, variada e viva, sob a ação fecun-


dante do divino Espirito Santo. Deve ele aparecer
quasi como um profeta do outro m undo, não cheio
de si, porém cheio de Deus. Deve falar como ver­
dadeiro apostolo, enlevado e inspirado por Deus.
T a l parece a oratoria de M ons. Tihamér T ó th .
Quanto á sua capacidade natural, não ha negar que
seja homem de m uito talento e de elevada ilustração.
Mas quem examinar os pormenores nas suas magní­
ficas pregações, deverá reconhecer que estas são m uito
mais resultado da cooperação divina do que fruto de
talento e esforço humanos. Nelas cabe visivelmente a
Deus a honra de principal agente, cabendo porém ao
nosso herói a de instrumento habil, bem sujeito á
ação da graça.
O desenvolvimento de T ó th como orador pren­
de-se intimamente ao da sua personalidade (Cfr. "Le
Christ et la Jeunesse” ■.p. 139 “U appel du Seigneur”;
e p. 143 “Je dois aller. Le Seigneur m ’a appelé ” ).
Parece que nele a graça chegou a elevá-lo acima da
natureza desde a mocidade. Cedo entregou-se a
Deus sem reserva, de corpo e alma, com todas as suas
faculdades, para ser sacerdote verdadeiro. Desde essa
orientação, tomada resolutamente, começou T ó th a
ser personalidade vigorosa, unida em si e com Deus, e
portanto capaz de galgar as culminancias da eloquên­
cia e de enfrentar o mundo. Desde então o amor de
Deus e das almas venceram as demais afeições natu-
cais, e foi esse duplo amor que se tornou a móta mes­
tra de sua eloquência. A í está o segredo da sua elo­
quência, a causa profunda do seu exito extraordinário.
Mons. Tóth é prégador abençoado 7

A oratocia de Tiham ér T ó th é uma maravilha


de exposição luminosa, viva, concreta e intuitiva da
verdade. Dirige-se á inteligência, á vontade e ao co­
ração dos ouvintes, não na forma de argumentação
cientifica, nem na de dialética cerrada, mas expondo
as verdades em relevo tocante, de m odo o mais con­
creto e evidente possível. Aproveita-se ele profusamen­
te da imaginativa para aproximar as verdades ás fa­
culdades humanas, aos espíritos mais humildes como
aos mais renitentes. Aproveita-se do que cái sob a
vista, do que está no primeiro plano de visão e com­
preensão humana, para torná-las mais compreensíveis.
Faz compreender o invisível pelo visível, o espiritual
pelo corporal, apresentando as idéas como que corpo-
rificadas em imagens sensíveis, ao alcance de todos.
Eis aí a primeira qualidade distintiva da pre­
gação de T ó th : o seu estilo simples e intuitivo, a sua
linguagem concreta. E ’ isto o que lhe fundamenta
propriamente a popularidade que desfruta. Mas como
T ó th se distingue pela simplicidade e concretização
na forma, não menos se distingue peta simplicidade
da matéria, da doutrina que propõe, como pelos ar­
gumentos com que a prova — Evita toda especula­
ção inútil, todas as argucias. Expõe a doutrina cató­
lica do catecismo, a de que precisa o cristão para viver
e morrer bem. Contenta-se com salientar-lhe intuiti­
vamente a beleza, a racionabilidade e superioridade
em todos os sentidos. Expõe a doutrina como ela apa­
rece no primeiro plano da conciencia popular. A s
provas que aduz para defendê-la contra os ataques
costumam ser as do bom senso. A í está a segunda
8 Mons. Tóth c prégador abençoado

prerogativa que, juntamente com a primeira, assegura


ao celebre prégador a sua grande popularidade e fama
mundial.
Prova inegável de que o de. Tiham ér T ó th
realiza o melhor padrão possível da prégação popu­
lar, conjugando de modo admiravel a simplicidade
da exposição com a sublimidade da doutrina, está
precisamente no resultado que ele tem obtido e con­
tinua a obter em todas as camadas da sociedade, entre
grandes e pequenos, entre ricos e pobres, entre pessoas
cultas e incultas, e em todos os paizes do mundo.
Não só os estudantes da Universidade de Budapest
ficam encantados e fascinados pelas prégações do seu
exim io professor, como também o povo simples da
cidade.
N ão é prosa seca a leitura dos livros do grande
prégador. Quem lê as suas praticas e as deixa atuar
sobre si, experimenta-lhes os salutares efeitos. Fica
cativo da sua beleza, repleto de admiração e ufanía
pela superioridade da nossa santa religião, e em o­
cionado no intim o do coração pelo bom senso que
ele tão exuberantemente desenvolve em favor de uma
religião melhor praticada, em favor de Nosso Senhor
mais e melhor amado. Sente facilmente nessa leitura
o sopro, a unção do Espirito Santo.
Si, porém, a simples leitura das prégações do
grande mestre não ê prosa seca, quanto menos a sua
palavra viva, inspirada! A s prégações de T ó th , ainda
que só escrita, são de fato m uito mais poesia, e poesia
admiravel, do que prosa. Quando podem sê-lo e o
assunto a tal se presta, são m uito mais ainda; são
I)R. TIHAMÉR TÓTH
P ro f. d a U n iv ersid ad e de B u d ap est
H e ito r do S e m in á r io C e n tr a l da H u n g r i a
Mons. Tóth é pregador genial D

musica sacra, celestial, que encanta, enleva, melhora,


transforma.
Os 300 brasileiros que em breve seguirão viagem
para assistir ao Congresso Eucaristico Internacional
em Budapest, terão a ventura de vêr e ouvir o nosso
grande pregador. Sem duvida ê M ons. T ó th um dos
maiores promotores e organizadores do Congresso
Eucaristico Internacional deste ano, e será ele um dos
maiores atores e pregadores das solenidades do mes­
m o, como uma das maiores glorias da Igreja Católica
ali representada. C om toda certeza os nossos peregri­
nos não deixarão de verificar como exatos os altos
merecimentos do nosso herói, como pregador e con-
ferencista, e de incentivar em seguida no nosso Bra­
sil o aproveitamento das suas produções literários, a
exemplo do que tem ocorrido nos demais paizes. A
respeito dele incumbe-nos dizer ainda mais alguma
coisa aos nossos leitores.

N o começo desta apresentação apontámos Mons.


Tihamér T ó th não só como orador sacro de grande
talento, mas também como prêgador genial. Queremos
dizer que ele é pregador original, e não copiador de
outros prêgadores, não trilhando tão pouco caminhos
batidos por outros. Foi ele, pelo contrario, quem, na
pregação, descobriu e abriu caminhos novos, os da
verdadeira pregação, os de uma prégação mais per­
feita, no sentido que precisaremos mais adiante. Vão
10 Mons. Tóth é pregador genial

aqui entretanto, primeiramente, algumas sentenças dos


críticos sobre o ponto que abordámos.
“M ons T ó th tem sido saudado pela crítica como
mestre da homilía, mas entendam bem, da homilia
moderna. Importante prefacio, o de "Os 10 Manda­
mentos de Deus”, intitulado: " A pregação nova”; a
qual indica o escopo do autor: instruir os catolicos
do seu tempo, dar-lhes resposta aos problemas sus­
citados tanto do ponto de vista religioso como do
economico, social rríoral” (Pierre V E rm ite).
M ons. Tiham ér T ó th tentou empreender a re­
forma da ciência da palavra de Deus, e o conseguiu
plenamente" ( “Les Annales des Prêtres adorateurs).
“Schoenere Z u k u n ft" salienta como especiali­
dade dele a real compreensão do tempo e do homem
modernos, surpreendente atualidade e proximidade
da vida contemporânea.
"E c c l e s i a “T ó th tem o grande merecimento
de saber adaptar-se ás necessidades e desejos das almas
do seu tempo. Ãpostolo moderno e dominado pela
idéa fixa de interessar, de fazer-se compreender e de
instalar a verdade nos espíritos e nos corações”.
Resumindo e aprofundando o que os críticos
assinalam como grande mérito de Mons. T ó th , é de
salientar que lhe cabe a honra da renovação da ver­
dadeira pregação, da prégação do bom senso, da pré-
gação adaptada ás necessidades presentes do auditorio,
da prégaçãó livre de m uito lastro inútil e até da
antiga forma, tão rígida, da oratoría cientifica e es-
colastica dos grandes oradores sacros françççes, T ó th
Mons. Tóth é prégador genial 11

restaurou a oratoria evangélica e apostólica, a préga-


çJo do evangelho em toda a sua simplicidade e subli­
midade.
M uitos pregadores parecem pregar quasi coagi­
dos pelas circunstancias, proferindo o que em cada
ocasião lhes vem á mente, sem se preocupar bastante
com de onde vem e para onde vai a palavra de Deus,
sem se preocupar m uito com o duplo contacto in­
dispensável á bôa e verdadeira prêgação, o contacto
com Deus, fonte original de onde derivam as aguas
vivas da salvação, e o contacto com os ouvintes, com
as disposições e necessidades peculiares a eles, falando
aéreamente, sem proveito algum.
A lém de procurar sempre o contacto, a união
mais intima possível com Deus, e de sujeitar-se á
orientação e inspiração de Deus, M ons. T ó th foi
reatando e restabelecendo nas suas pregações o contacto
vivo com o povo, contacto que os demais prégadores ti­
nham perdido total ou parcialmente, ou tinham ne­
gligenciado ou pouco apreciado. M ons. T ó th iniciou
esse regresso á antiga tradição, essa reforma indis­
pensável, tornando-se mestre e modelo da verdadeira
prêgação, da prêgação simples, pratica, popular, in­
tuitiva, vibrante, nutrida pela Sagrada Escritura, pro­
curando ele conservar-se sempre instrumento habil e
dócil da inspiração divina, recebendo de Deus o que
devia transmitir ao povo. Foi neste sentido que Mons.
T óth resolveu praticamente o grande problema da
pregação,
12 Mons. Tóth é um educador ideal

M O N S. T IH A M É R T Ó T H É U M E D U C A D O R
C A T O L IC O ID E A L

Do mesmo modo que M ons. T ó th se revelou pré-


gador-mestre, revelou-se igualmente educador-mestre
da mocidade.
Na Universidade de Budapest desempenha ele o
cargo de professor de oratoria sacra. C om o tal, e
quando lhe é possivel, nunca deixa de pregar nas
ocasiões que se lhe oferecem. Mas o ideal da sua vida
é mais sublime ainda : é a educação da mocidade. A
ela se consagrou por amor a Deus e á patria; a ela
se dedica de corpo e alma. Sendo um verdadeiro edu­
cador, educador de grande pulso e abençoado por
Deus, a autoridade eclesiástica chamou-o ao posto
mais proeminente do paiz, ao cargo de maior respon­
sabilidade, ou seja o de reitor do Seminário Central
húngaro, afim de formar ali os futuros educadores do
povo, os candidatos ao sacerdócio.
A falência da educação ê incontestavelmente a
principal, sinão a unica fonte dos males hodiernos.
Ora, a falência da educação ê, por seu lado, a con­
sequência desastrosa da falta de educadores apro­
priados, sobretudo de sacerdotes educadores. A form a­
ção destes em numero suficiente impõe-se como de
primeira necessidade para um paiz como para a pró­
pria Igreja. E’ a unica esperança de nos salvarmos
das dificuldades e misérias presentes e futuras.
Desde a sua mocidade, reconheceu M ons. T ó th a
Verdadeira origem dos nossos males, e teve a coragem
de empreender-lhes a cura, e a necessária confiança em
Mons. Túth é um educador genial 13

Deus para se dedicar com toda urgência a essa tarefa


grandiosa, mas dificiíima.
T o m o u como lema da sua vida: Salvar a m o­
cidade para salvar o povo, para salvar o paiz, para
salvar a própria Igreja. Os meios que tem empregado
na realização deste ideal provam até d evidencia o
seu amor a Deus e á patria, os inúmeros benefícios
que presta a ambos. O seu otim ismo invencível e o
seu idealismo levaram-no a superar as dificuldades.
Crê em Deus e na obra de Deus; crê na mocidade e
faz esta crer em si própria, crêr em Deus, crêr na
Igreja e crêr nos ideais: eis aí a chave magica que lhe
abre os corações juvenis, o segredo do seu estupendo
exito na educação da mocirade!
Eis aí também a marca, o sinal distintivo, a
prova inequívoca do verdadeiro educador! Distingue-
o, como o dia da noite, dos deseducadores, dos mi-
santropos, pessimistas e critiqueiros negativos que só
sabem tirar da mocidade a coragem e esmagar a bôa
vontade. E quantos não ha, nos nossos dias, desses
educadores falhos! Provam-no a abundancia das fa­
lências espirituais e morais que por aí andam, a falta
total de personalidades integras e completas, o sem
numero de existências falhas, de personalidades fal­
seadas!
Outra qualidade completiva do bom educador
que encontramos em T ó th é que ele orienta e dirige
a mocidade exteriormente, isto é, sem dispensar nem
suplantar a iniciativa própria de cada um, levando-o,
pelo contrario, a governar-se pela própria conciencia,
que ele procura despertar e formar com todo carinho
Í4 Aíons. Tóth é ura educador ideal

e empenho. Por este m otivo torna-se mais um con­


selheiro esclarecido da mocidade, do que censor de­
sagradável e importuno, e consegue formar homens
e personalidades que sabem governar-se por si pró­
prios. — Tornou-se assim o maior bemfeitor, o me­
lhor amigo, o guia ideal da mocidade húngara.
Mais ainda. Por seus livros, revelou-se Tihamér
T ó th ao mundo catolico um dos melhores educadores,
um escritor notável da mocidade. Escreveu para os
pais, como para a própria mocidade. Publicou as con­
ferências, exortações e orientações que lhes dirigiu, para
torná-las acessíveis ao maior numero possível de m o­
ços. Queira Deus que um dia possamos editar não só
os livros de T ó th que interessam á educação da m o ­
cidade, como também os numerosos volumes das suas
prégações! Seria otima iniciativa e imenso beneficio
para o Brasil.
Considerando de primeira necessidade para o
nosso pais o livro de T ó th intitulado: "A Casta
Adolescência”, foi este que resolvemos editar em pri­
meiro lugar, fazendo-lhe seguir quanto antes: “Cristo
e a Juventude”, " A Religião e a Juventude”, “O
Carater do Jovem ”, livros todos que interessam su­
mamente á educação, e que não são apenas livros de
primeira necessidade, mas também de primeiro valor.
Desde que escolhemos o primeiro para abrir a série,
incumbe-nos apresentá-lo aqui sumariamente ao pu­
blico, depois de lhe havermos apresentado o autor,
digno dos maiores elogios* elogios que, uma vez ve­
rificados na sua justiça e inteira razão de ser, dis­
pensam pormenorizada analise do livro, pois as ex-
“ A Clasta Adolescência’’ 15
cetvndas do autor a ele também se referem e nele se
refletem.

"A C A S T A A D O L E S C Ê N C IA ”

Este livro, de acordo com seu titulo, dirige-se


á mocidade colegial, mórmente masculina, expondo-
lhe o dever da castidade, a natureza das faltas que
lhe são contrarias, os perigos que ameaçam a ino­
cência e as consequências desastrosas do vicio impuro.
A exposição do livro não excede o âmbito do
titulo. N ão foi ele escrito para intelectuais, mas para
a mocidade; nem foi escrito para educadores, mas para
educandos: para estes resolve o problema, atinge a fi­
nalidade. Leva em exata conta todas as dificuldades
que a mocidade experimenta nessa matéria, e resolve-as
com m uito bom senso e tacto.
M ons T ó th é um dos melhores conhecedores da
mocidade: compreende-a e ê por ela compreendido.
Milhares de universitários escutaram avida e grata­
mente as suas conferências sobre o problema sexual,
e nelas encontraram a desejada orientação e o devido
entusiasmo para lutarem contra a hidra da luxuria.
O que a eles tanto agradou e serviu, vem exposto
neste livro. E m todos os paizes seguiram-se rapida­
mente as edições dele, uma após outra. Prova evi­
dente do acolhimento, otim o que logrou! N ão ha
necessidade de impingí-lo aos moços. Ele proprio se
recomenda, e um moço o recomendará a outro:
“Leia este livro! E ' preciso lê-lo. Esse homem nos
compreende1“
l('i *A Casta Adolescência”

Oxalá que os nossos jovens acolham e apreciem


esta nossa edição com o mesmo entusiasmo! Oxalá
aproveitem dela e se mostrem gratos ao autor não
menos do que os outros moços estrangeiros m en­
cionados nas duas recomendações do livro que seguem
abaixo, e que por si sós valem volumes.
U m leitor húngaro escreveu ao autor o seguinte
trecho: “Queira Deus abençoar V . Revma. tantas
vezes quantas as letras que V . Revma. escreveu no
seu livro!" Quão merecido é este voto!
“O livro de M ons. T ó th merece o seu lugar ao
lado dos melhores escritos sobre o mesmo assunto.
E ’ que, sem duvida alguma, entre os jovens leitores
haverá mais de um para quem este livro marcará o
inicio de uma nova vida. Todos os educadores ficarão
contentes em conhecê-lo!” (Revue des Auteurs).

P . L acroix

http://alexandriacatolica.blogspot.com
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P R O E M I O

Meu filho!

Junto á minha secretária vêm não raro sentar-sc


.1 u vens estudantes.

Apenas começado o ano escolar, começam tam­


bém para mim as visitas dc jovens. Os novatos batem
timidamente á porta, os antigos, os conhecidos, batem
rom alegria e ousadia.
Sentam-se junto á minha secretária, e, na calma
e no recolhimento do meu quarto, abre-se o precioso
reino, fechado por mil fechaduras, duma alma de
jovem. Quando eles contam os seus aborrecimentos,
b<-m pequenos (mas que eles enxergam com abatimen­
to infinito), quando se lamentam sobre as suas mil
dbiculdadesinbas (mas que tomam terrivelmente a
sério), quando põem a nú a sua jovem alma com
as suas grandes tempestades, com seus profundos pro-
h! -mas, e quando, de olhos arregalados, dizem com
í.-.msísorte: Dê-me um conselho, que devo fazer?:
■ ■-:■«! momentos inspirados que tenho aprendido
i . •- h rer que a alma do jovem é um imenso campo
, spirituais que encerra ama promessa
18 Proémio do autor

de desenvolvimento futuro ilimitado, e para nós, os


adultos, é não sómente um santo dever, mas tambefll
grande honra, contribuir para esse desenvolvimento.
Aquele que não se ocupa da juventude, não sus­
peita a quantas questões, combates, passos em falso
— e certamente também naufrágios definitivos —
está exposto o desenvolvimento das vossas almas, ó
jovens, nem quanto, nas tempestades da primavera
da vida, o batei da voss’alma precisa duma mão ro­
busta para governar na bôa direção.
Quando tenho querido fortificar os que estão
em plena luta, acalmar-lhes as tempestades d’alma,
aliviá-las com os meus conselhos nas suas duvidas,
retirá-las do Iodo com mão firme, tem-me parecido
que não sómente um jovem estudante estava sentado
junto a mim, mas que milhares de jovens de alma
atraente, de olhar penetrante, estavam em todo o nos­
so pai/, a braços com as mesmas graves questões, e
talvez não soubessem onde achar resposta, conso­
lação, conselho, esclarecimento, e assim, abandonados
a si mesmos, eram obrigados a sustentar uma luta
difficil na idade critica da adolescência.
Taes fôram as ideas que deram a lume esta
série de obras dedicadas “ A’ JU V EN TU D E CATÓLI­
C A ". ( 1 ) .
Bem sei que a palavra impressa não tem o
poder da palavra viva, mas talvez não seja inútil

(1) Desta serie foram igualmente publicadas: Cristo e a


Juventude, A Religião e a Juventude e O Carater do Jovem.
Proémio do autor 19

reunir parcialmente nalguns livros os pensamentos


que costumo expôr aos meus alunos.
Não sei como te chamas. Não sei que escola
frequentas: si o colégio, a escola primaria, superior,
a cscóla industrial, a escola de comercio, a escola nor­
mal ou talvez a Universidade. De ti só sei uma unica
coisa. E’ que és um jovem estudante, que trazes
n‘alma a sorte futura da nação, que te preocupas
com graves problemas aos quaes temos o santíssimo
dever de dar respostas sérias. Porquanto não ha nada
mais nobre nesta vida do que abrir a fonte da verdade
eterna ás almas sequiosas. Fundar reinos não póde
ter maior mérito perante a humanidade, levantar
igrejas não póde ser mais agradavel a Deus, do que
preservarmos da ruína, por nossos conselhos, uma
só alma de jovem, a principal esperança dos estados,
o “templo vivo” de Deus.
Cada letra deste livro foi escrita por amor de
tu’alma e pela persuação de que encher de sublime
ideal uma jovem alma encerra em si um valor eterno.
Esse amor merece que reflitas sériamente sobre o que
pudéres lêr neste livro. E a maior recompensa dos
meus esforços seria que estas Inhas pudessem repôr
ou manter no bom caminho uma só alma que fôsse.
de adolescente.
O A utor
http://alexandriacatolica.blogspot.com

P R E F A C I O

DA QUARTA EDIÇÃO HÚNGARA

Este livro atingiu em seis semanas a segunda


edição e, dois mezes mais tarde, a terceira. Sucesso
extraordinário para uma obra pedagógica. Prova do
gosto da nossa juventude pelos livros sérios de edu­
cação.
A primeira edição foi recebido em todo o paiz
com o maior entusiasmo. O ministro da Instrução
recomenda-o á atenção dos Estabelecimentos secun­
dários. A Federação dos Escoteiros húngaros reco­
mendou-o como leitura escoteira. O “comitê" das
Leituras para a juventude recomendou-lhe a compra
ás bibliotecas escolares. Ele foi traduzido em varias
linguas européas (1 ), e a própria Obra de educação
dos cegos da capital fê-lo transcrever em parte em ca-
ratéres Braille.
Porém o autor achou a sua maior alegria nas nu-

(1) O presente volume foi traduzido cm alemão, inglês,


francês, italiano, hespansol, holandês, slovaco, polonês, lituano,
sloveno e croata.
22 Prefacio da 4.* edição húngara

merosas cartas de agredecímento que recebeu de jo­


vens leitores desconhecidos de todo o nosso paiz.
“O bom Deus o abençoe, Monsenhor, escreve
um jovem ao autor, i.mtas vezes quantas letras ha no
seu livro: não, tantas vezes quantos suspiros o seu
livro tem feito exalar do coração da juventude. E’
o anhélo afetuoso dum jovem que lastima apenas não
lhe tenha a sua obra vindo ás mãos dez anos mais
cedo”.
Hoje em dia, que no terreno economico, político
e moral o mundo inteiro está abalado e ameaçado de
ruína, o renascimento da sociedade só poderá vir da
disciplina moral e duma vida ideal e pura.
E agora endereço este livro, na décima quarta
edição, á nossa juventude húngara, não tanto para
lhe despertar suspiros no coração quanto para lhe fa­
zer crescer n'alma apaixonada de ideal o desejo duma
vida pura e bem temperada.
O A utor
OS D O I S L A G O S

Quando eu era jovem estudante, ia muitas vezes


passear á beira dum lago na montanha. Os raios do
sói dansavam-lhe alegremente no espelho cristalino.
A sua onda pura deixava perceber a vida buliçosa dos
seres que lhe povoam o fundo de cascalho. Alegres
peixinhos nadavam aqui e acolá, mal podendo conter
a sua alegria ao contacto dos cálidos raios do sói.
Na margem, os miosotis de olhos azues sonha­
vam, e os nenúfares montavam guarda gravemente
com as suas folhas em lamina de sabre. A' superfície
d’agua, os salgueiros inclinavam-se com dignidade,
e com ar meditativo fruíam do céu sorridente e sem
nuvem que se refletia na superfície. Uma haura de ar
fresco circulava através dos ramos, e os caniços baixa­
vam a cabeça á sua passagem, a lagoa da montanha
era como uma alma de jovem transbordante de vida,
de sorriso, de ventura, como um olho de criança ar­
regalado, brilhante qual uma estrela.
Ultimamente, após longos anos, meu caminho
levou-me outra vez até lá.
Foi com espanto que vi o que era feito do meu
caro lago. Um atoleiro lodoso dum amarelo esver­
deado. A agua estava-lhe turva e suja. O que elle
24 Os dois lagos

encerrava, não se via, por causa das ervas, mas o


ar pestilencial que dele se desprendia traía a podridão
que nele se achava. Da vasa ascendia o coaxar dórmi-
tante das rãs de olhos á flôr da testa; quando um
viajante passava, répteis hediondos pulavam assus­
tados nas ervas e na agua fétida.
Onde estão os nenúfares que montavam altiva­
mente guarda?
Para onde se fôram os salgueiros da margem que
balouçavam as suas coroas de folhagem?
Para onde se foi o céu azul que sorria, que se
refletia na superfície d’agua?
Tudo, tudo desapareceu. E’ debalde que os ca-
niços brotam na margem: inclinam-se frouxamente
ao menor vento. Por toda parte é só podridão e
desolação.
E o coração se me confrangeu: era então aquele
0 belo lago cristalino da minha juventude?
*

Os olhos dos jovens são tão belos quanto o


miosotis, e a alma deles c como um belo lago cris­
talino da montanha.
Ai! quantos mais tarde sc tornam pantanos lo­
dosos!
*

Foi para que tu ’alma permaneça sempre pura


como um cristal, meu filho, que escreví este livro.
Porque conservar pura a própria alma e assim chegar
1 idade de homem, ê a mais bela tarefa da vida.
A CASTA ADOLESCÊNCIA

PRIMEIRA PA R T E

OS PLANOS DO CREADOR

“ E Deus creou o homem á


sua imagem; crcou-o á imagem
de D eus: creou-os homem e
mulher. E Deus abençoou-os,
e lhes disse: Crescei, multipli­
cai-vos e enchei a te rr a ” (G e-
nese , I, 27- 28) .

Havia milênios que a terra proseguia a sua róta


em torno do sói. Dentro dela refervia a lava incan­
descente; com estalidos tremendos quebrava ela a
crosta exterior endurecida, mas o esfriamento pro­
seguia incessantemente. . . Na superfície do globo ver-
dejava já a floresta virgem. A primavera florescia com
aspecto deslumbrante; as aves cantavam alacremente
na asa dos ventos. Era em toda parte a vida, a força,
a energia, a atividade. . . Sómente, faltava ainda
alguma coisa.
Alguma coisa ou, antes, alguém.
Não havia ninguém para escutar o canto do
rouxinol. Não havia ninguém para respirar o perfume
das fíôres. Não havia ninguém para saborear os fru

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26 A Casta Adolescência

tos. Faltava o sêc inteligente e conciente que absor­


vesse toda aquella beleza imensa numa alma ávida,
que não fôsse apenas uma peça do grande mecanismo
da natureza, mas que se volvesse concientemente para
todos aqueles cantos de aves, para todos aqueles mur­
múrios de regatos, para o perfume das flores, para
o ciciar das florestas, para a dignidade severa dos
massiços nevosos, para o zumbido das abelhas, e que
elevasse com amor para o Creador de todas aquelas
coisas, nas asas da gratidão, uma alma inebriada das
belezas da natureza.

1. O prim eiro homem e a prim eira mulher.

Foi então que Deus creou o primeiro casal hu­


mano. Um homem e uma mulher. O homem e a
mulher são dois sêres completos em si mesmos, e no
entanto devem-se completar um ao outro. Nos dois
sexos o Creador realizou conjuntamente de modo
completo a idea de "hom em ". Cada sexo tem o seu
carater peculiar, porém o homem e a mulher, com­
pletando-se mútuamente, dão a idéa completa de
“hom em ” .
O cunho característico do homem é o trabalho
creador que reclama coragem e atividade. A sua von­
tade é forte, o seu carater firme, perseverante nas re­
soluções. Dele se enche de alegria quando póde afron­
tar vitoriosamente, com fronte dura como o granito,
as mil tempestades do combate da vida.
A mulher seria esmagada na luta contínua pela
Os planos do Creador 27

vida. O terreno melhor para ela é o dôce ninho da


familia, onde, com amor inexaurivel e com dedica­
ção incessante cuida do lar, dos filhos, e desenruga
com um sorriso os traços severos do esposo que entra
de um trabalho penoso. A sua força creadora não é
tão elevada quanto a do homem, mas a sua paciência
e a sua perseverança são maiores.
Deus realisou para a humanidade o mais belo
ideal creando dois sexos. Fundou sobre a diferença dos
sexos o encanto inesgotável da vida familiar, o amor
do esposo e dos filhos, e mesmo, em parte, o amor do
paiz.
São precisos, pois, no mundo o homem e a mu­
lher. Faz-se mister a força do homem ao lado da ter­
nura da mulher. E' preciso a energia ardente do ho­
mem ao lado da ternura da mulher. E' preciso a
energia ardente do homem ao lado do amor, da be­
leza e da sensibilidade mais profunda da mulher.
Os dois sexos são inseparavelmente feitos um para o
outro. Foi por isto que o Creador colocou a pri­
meira mulher ao lado do primeiro homem, e foi por
isso que fundou desde o começo da humanidade a pri­
meira familia.

2. Os planos do Creador.

Creando, porém, os dois sexos, Deus tinha ainda


desígnios mais profundos e mais santos. Com a união
dos dois sexos deu Ele também aos homens uma
força creadora. Queria que eles tivessem parte na sua
28 A Casta Adolescência

obra creadora, c que preenchessem por uma geração


nova o vácuo que a morte cava entre os homens. Foi
esse o plano infinítamente sublime e misterioso do
Creador fundando o matrimônio. Segundo a intenção
de Deus, devemos encarar o jovem e a jovem pleni­
tude da sua integridade e da sua força, como uma
incorporação da idéa creadora divina.
Todos vós aprendestes no catecismo que o pro-
prio Deus creou diretamente os dois primeiros seres
humanos, Adão c Eva. Porém mais cedo ou mais
tarde todo menino faz a si a grande pergunta: Quem
então creou os outros homens? Deus não os creou di­
retamente, como aos primeiros homens; então como
vieram eles á terra? E como foi que eu proprio vim
á terra? Emfim, como é que vêm ao mundo as
criancinhas?
Certamente é uma questão extremamente grave.
E todo menino, mais cedo ou mais tarde, é agitado
pelo desejo de saber. Prefiro responder-te a te deixar
inquirir os outros.
Presta, pois, bem atenção, meu caro filho.
Sabes certamente muito bem que os sábios dividem
o conjunto das creaturas do universo em duas grandes
classes: os sêres orgânicos e os sêres inorgânicos. Deus
não sómente creou os sêres pertencentes á primeira
classe (as plantas, os animaes e o homem), porém
os proveu duma parcela da sua própria força creado­
ra, de tal arte que esses sêres, graças a essa força ge­
radora, pódem dar a vida a pequenos seres vivos se­
melhantes a eles. A planta produz uma nova planta.
Os planos do Creador

o animal dá á luz o seu petiz, e o homem dá nas­


cimento a criancinhas.
Aos sêres inorgânicos (o sói, as estrelas, os mi­
nerais, as montanhas, o mar, etc.) Deus não deu a
força creadora. E porque? Porque eles não perecem
tão facilmente quanto os sêres vivos, e assim não
precisam chamar á existência outros sêres pequenos
em seu lugar. Mas isso é necessário para os sêres or­
gânicos. O peixe c a ave, a arvore e a planta, o ani­
mal e o homem envelhecem, perecem, cessam de exis­
tir — e isto aos milhões ano por ano. Porém si
isso durasse assim continuamente e não houvesse
outros sêres novos no lugar deles, rapidamente a vida
cessaria na terra. E’ verdade que Deus podería, no
lugar de cada sêr vivo desaparecido, crear Ele proprio
diretamente um novo. Mas a sua santa e misteriosa
vontade realizou coisa ainda mais grandiosa: a cada
sêr vivo deu Ele a força de poder ele proprio dar a
vida a outros, porém de maneira tão misteriosa que
até agora os homens mais sábios do mundo não lhe
conseguiram penetrar os segredos.
Já viste, meu filho, durante o inverno, na ar­
vore adormecida, o botão apenas visivel? Cada botão
é o ninho dum rebento novo, duma flôr nova, dum
novo fruto, duma nova arvorezinha. Os botões agu­
ardam só a caricia dum raio de sói primaveríl para
se pôrem a abrir, a crescer; a florir; as flores espe­
ram pela visita dos insétos de maio ou dum vento
leve, aguardam que as asas do vento, as patas das
abelhas tragam o polen másculo e o semeiem no pis-
tilo chima flor femea. Quando o polen atinge o pis-
30 A Casta Adolescência

tilo, as duas flores nesse instante sáo unidas, por


assim dizer, por um amor reciproco. O pistilo fe­
cundado começa a crescer, e aumentar. Torna-se cada
vez maior, cada vez mais desenvolvido, até que fi­
nalmente — ao cabo dalgumas semanas ou de um
par de mezes — chegando á maturidade, cái-nos di­
ante dos pés um fruto maduro e no fruto uma se­
mente nova, germe do nova arvore, de nova vida. E'
assim que o Creador cuida de que a natureza se re­
nove continuamente a si própria.

3. A fon te da vida.

E’ do mesmo modo que Ele quer velar também


pela renovação, pela conservação da humanidade.
Deu ao homem uma força creadora: força misteriosa,
propriamente falando faculdade realmente divina em
virtude da qual póde ele dar ao mundo uma vida
nova, um homem novo. Colocou no homem uma
força creadora, uma semente vital, e na mulher um
germezinho humano, afim de que da reunião dos dois
surja um novo sêr vivo, um novo homem. Essa força
geradora, essa semente de vida e esse germe dormitam
durante anos na criança sem que esta tenha disso
conciencia, como os botões das arvores durante o frio
do inverno. Mas a primavera da vida chega, quando
o menino se faz jovem, quando a menina se faz
donzela; o raio de sói sorridente e vivifícador põe-se
a brilhar, o jovem sc inllama de amor pela jovem,
toma-a por esposa e, no santuario da vida conjugal,
Os planos do Creador 31
verdadeiramente unidos um ao ontro, unem eles as
duas almas e os dois corpos. E essa união corporal,
esse amor que une os esposos, não só os enchem a
ambos de alegria, porém fazem agir o germe que dor­
mitava até então na mulher, e nesse instante o germe-
zinho humano começa a viver, o botãozinho humano
começa a avolumar, a crescer, a desenvolver-se, e ao
cabo de nove mezes está bastante forte para cair como
um fruto da casca, separar-se da arvore nutriz ma­
terna, e nós dizemos que um novo homem veiu ao
mundo. Um novo menino um novo homenzinho
que não é nem o pai nem a mãe em ponto pequeno,
mas que reúnem o pae e a mãe; um terceiro sêr
humano, cuja vida entretanto já está predetermina­
da em muitos pontos pelo genero de vida anterior
do pai e da mãe, pela vida anterior honesta ou peca-
dora. Mas também não ha maior amor no mundo do
que o dos pais aos filhos que, no sentido mais exato
da palavra, lhes saíram da carne e do sangue.

4. A mãe e o filho.

Escuta esta conversa, cheia de abandono, entre


um rapazinho e uma mãe de família razovel que
prefere responder ela própria francamente ás perguntas
do filho, a deixal-o pedir explicações a camaradas
duvidosos.
"Mamãe querida, perguntava á mãe um cole-
gialzinho, como é que eu era quando ainda era bem
pequenino?
32 A Casta Adolescência
Quando eras pequenino? Oh! eras como um pon­
to. Menor que uma cabeça de alfinete. Só te poderíam
vêr com uma lente.
Meu Deus! diz o menino. Mas então qualquer
um podería esmagar-me!
Certamente, respondeu 3 mãe. Todo sêr vivo é
no começo um pontinho, um germenzinho, uma se-
mentezinha, que é preciso esconder, como a semente
debaixo da terra, afim de que fique protegida quando
começa a desenvolver-se. E, estás vendo? Deus tomou
cuidado de ti afim de que não sofresses nenhum dano
emquanto eras tão pequenino. E no meu corpo, por
baixo do meu coração, fez Ele um lugarzinho para ti.
Um ninho bem quente, bem macio, bem protegido,
para que nele pudesses brotar e crescer em segurança.
E eu ali podia alimentar-me, mamãe? E respirar?
Eu fazia tudo isso por ti. Naquele momento eu
comia mais, para ser mais forte e tc fazer aproveitar
da minha força. O que eu comia transformava-se em
sangue, e o sangue corria em ti e te alimentava.
Mamãe, e a Snra. sabia que eu estava ali naquelle
esconderijo?
Si o sabia? Oh! meu filhinho, como o sabia!
Ã's vezes tú te mexias, e a cada vez me punha a
conversar contigo. Bom dia, meu filhinho. Estás acor­
dado? E tua mamãe velava por ti e pensava em ti. Cres­
ce e fortalece-te para teres em breve bastante força,
para saíres do teu esconderijo e eu te poder avistar
com grande alegria.
E agora me ólhas com grandes olhos, como si
até agora nada soubesses dc tudo isso. Entretanto o

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Os planos do Crendor 33
sabias. mas apenas não o compreendias. Bem sabes
< 1 1 1 0 cad.t dia nós recitamos juntos na Ave-Maria:
" c bendito é o fruto do vosso ventre, Jesús".
I «t.is vendo? Do mesmo modo que a maçã é o fruto
d.i macieira, assim também a criancinha é o fruto de
mu mamãe. Mas a criancinha tem mais valor que a
maça, e foi por isso que o bom Deus quiz tomar
muito mais cuidado dela. E’ por isso que ela fica
tanto tempo escondida no seu quente c macio esconde­
rijo, debaixo do coração da sua mamãe.
E quanto tempo fiquei ali, mamãe querida?
Bem o sabes. Quando é o dia da Anunciação.
c'\a festa em que o anjo saudou a Virgem Maria e
Ihc* anunciou que ela teria um filho? E ’ a 25 de
março, não é? E quando é que se celebra o nasci­
mento do Menino Jesús? A 25 de dezembro. Qual é
0 intervallo entre esses dois dias? Nove mezes. T am ­
bém sabes qual é o dia da Immaculada Conceição da
Yrirgem Maria. 8 de Dezembro. E o dia do seu nas-
■miento? 8 de Setembro. O intervalo entre esses dois
dias ainda é de nove mezes. Pois bem! até agora
fínhas ouvido falar de tudo isto, mas não lhe pres­
tavas atenção, e eu não te falava disso emquanto não
1k asses rapazinho. Agora o sabes, meu filho, porém
n.io fales disso aos outros meninos. As pessoas gran­
des também não têm o direito de falar disso sem mo­
t i v o . E porque? é uma coisa muito santa e sublime,
c. si não se prestar atenção ás coisas belas e santas,
• l «s depressa são poluidas.
E durante esses nove mezes rezei muito, por-
,iu' queria que te tornasses um menino bem piedoso e
34 A Casta Adolescência

amante de Deus. Estava sempre de bom humor e


sorridente, porque queria que assim também estives­
ses. Quando ficaste bastante forte, um dia a porta
fechada abriu-se e tú saíste, naceste. Certamente
isso me causou atrozes dores, mas que importa! Por­
que mal apareceste á luz, soltaste grandes gritos,
choraste, te debateste, colocaram-te nos meus bra­
ços e eu te estreitei contra mim, chorei também, po­
rém de alegria, e te beijei, e te beijei, e agora, meu
filho sabes porque é que te amo tanto.
Sim, mamãe, e sei porque é que eu também amo
minha mãezinha mais do que a qualquer outra pes­
soa no mundo — disse o menino, e com lagrimas
de gratidão nos olhos beijou a mãe” .

5. Santa gravidade.

Não precisamos mais do que refletir um pouco


para que uma emoção e uma admiração imensas se
nos apoderem d'alma ante o pensamento grandioso
de Deus. Como é sublime o plano divino, de não
querer crear especialmente o homem num estado de
desenvolvimento completo como Adão e Eva! Efe­
tivamente, como o mundo inteiro seria completa­
mente outro, estranho, frio, deserto, si assim não
fôsse! Não se cogitaria de familia, porquanto a fa­
mília é constituída pelo pai, pela mãe e pelos filhos.
Não teriamos então nem pae nem mãe, nem irmãos,
nem irmãs, nem parentes. Cada qual seria sosinho
no mundo. Então ninguém amaria o seu proximo,
Os planos do Creador 35

ninguém saberia a quem fazer compartir as suas ale­


grias, a quem confiar as suas penas.
Não havería criancinhas no mundo. Vem-me
esta idea singular: cada um seria grave adulto, tio
barbudo ou tia idosa, e a casa não retiniría dos fol­
guedos e risos argentinos das crianças. Não haveria
crianças, e seriam desconhecidas a despreocupação e a
alegria dos anos de infancia.
Vê como é inexprimível o amor de Deus na ma­
neira que Ele escolheu de assegurar a perpetuidade da
humanidade. Só creou diretamente os dois primeiros
homens, um homem e uma mulher: e desses dois, e
por eles, todos os outros. Comunicou-lhes uma par­
cela da sua força creadora, de tal sorte que eles pró­
prios darão aos demais homens a vida do corpo.
Corno é maravilhoso, como é santo, como é
nobre o plano do Creador! Como é infinitamente
digna de veneração a Sua vontade que, na obra de
renascimento continuo da humanidade — obra re-
almcnte creadora — deixou uma parte aos homens!
Mas, ao mesmo tempo, que mandamento severo e es­
tritamente obrigatorio que o orgão corporal de que,
com sabia previdência, Ele proveu o homem, seja em ­
pregado unicamente na finalidade santa que Ele pres­
creveu (que por um amor mútuo do homem e da
mulher um novo homem venha ao m undo), e só­
mente no quadro que Ele estabeleceu desde o começo,
estando o homem e a mulher unidos num matrimô­
nio indissolúvel!
Em toda a natureza a força mais nobre mais
santa é o poder de dar a vida. O homem possúe, com
3G A Casta Adolescência
a natureza, o poder de dar a vida a novos seres hu­
manos; porém, do mesmo modo que a alma humana
se eleva a uma altura a perder de vista acima de qual­
quer outro sêr creado, assim também cumpre con­
siderar essa faculdade creadora com a mais delicada
observância das leis moraes, transportando-a da esfera
material para o mundo espiritual. Renunciaríamos ao
nosso mais belo privilegio, á “nossa natureza ra­
cional”, si houvesse em nós siquer uma só manifes­
tação da nossa vida fisica pela qual nos não distin-
guissemos e elevássemos completamente acima da ac-
tividade ínteíramente animal.
Portanto, meu filho nunca penses nesse orgão
sinão com a mais santa gravidade, não escutes jámais
uma conversa de duplo sentido a esse respeito, não
fales dele tú mesmo, não o ólhes, não o toques (e
conserva-te sempre purot Os teus pulmões, o teu cere-
bro, o teu coração, não os pódes tocar (quando a
isso pudesses chegar) ; assim também, não tens o di­
reito de por brinquedo, poc leviandade, tocar ou
excitar esse orgão. Effectivamente, o plano do Creador
é que até o casamento cada um conserve sem ex­
ceção numa pureza sem mancha seu corpo e sua alma:
e, si para um fim mais elevado — por exemplo o
sacerdote catolico para a salvação das almas ou um
grande sábio no interesse da sua obra cientifica —
alguém não se casar, viva assim na pureza até á morte.
Deus não permite, pois, a união fisica dos sexos
a não ser sob a forma legal por Ele fixada, a união
indissolúvel concluída para a vida, e só de modo que
dela possa resultar o nascimento de filhos. Quem
Os planos do Crcador 37
quer que, neste mundo, utilize esse orgão corporal
de qualquer outra maneira (seja só, seja com outros)
por sensualidade e gozo, péca gravemente contra si
proprio e contra a santa vontade do Creador.
Alguns jovens pódem perguntar-se como é pos­
sível que a vida sexual seja uma coisa bôa e santa
no casamento, e que, contrariamente, a mesma coisa
fóra do casamento seja má e um grande pecado. Como
é possível? — argumentam eles. Ou bem é sempre
pecado ou bem nunca o é.
Facilmente, porém, póde-se achar a resposta.
Sim, Deus creou os orgãos sexuaes, o instinto sexual
e a vida sexual; logo, esse instinto é santo e o seu
exercício não é máu (aquilo que Deus creou não
póde ser m áu), porém é máu o homem que faz uso
dele em circumstancias em que D eus não o permite.
Ora, é mais claro que o sói que, segundo a vontade
de Deus, é só no matrimônio que se tem o direito
de fazer uso do instinto sexual e, mesmo no ma­
trimônio, sómente de maneira que filhos possam vêr
a luz.
Porque dispoz Deus assim? — poder-se-ía ainda
perguntar. Porque? Poderiamos responder: Deus é
o Senhor absoluto; a ninguém deve contas das suas
leis. Aquelle que construiu uma maquina é quem
melhor sabe o que a esta é necessário para bem fun­
cionar e não se estragar. Deus concebeu e creou o ho­
mem, e é quem melhor sabe como a humanidade deve
viver para não perecer.
Porém si refletirmos um pouco, a nossa razão
nos mostrará que só no casamento a vida sexual póde
38 A Casta Adolescência

manifestar-se sem degradar o homem e sem dimi­


nui-lo a seus proprios olhos. Só no casamento é que
a vida sexual é "santa", porque só nele é que não
sofre dano algum a parte mais nobre do homem, a
alma. E’ só no casamento que o instinto sexual não
se torna uma pura procura do gozo, porém, um de­
sabrochar de novos germes humanos, o nacimento
de novos filhos cuja educação só no casamento in­
dissolúvel póde ser assegurada. Em definitivo, o es­
tado e a sociedade não poderíam subsistir si Deus
não tivesse ligado o uso da vida sexual exclusivamen­
te ao matrimônio indissolúvel.
Aquelíe que satisfaz o seu instinto sexual fóra
do casamento, quer tocando o seu proprio corpo para
excitar em si mesmo gozos impuros, quer tendo re­
lações com uma mulher antes de a haver associado a
si como esposa perante o altar para toda a vida, é o
algoz da própria honra e da própria felicidade, para
si mesmo e para os outros.

6. O pecado de impureza.

E no entanto. . . e no entanto. . . não haverá


dom de Deus de que o homem tenha abusado com
mais ingratidão e maldade; com tristeza infinita po­
demos dizer que a humanidade nunca talvez desviou
tanto da sua destinação original um só plano divino
quanto o respeito da pureza d’alma, as verdadeiras
relações reciprocas do homem e da mulher.
O despertar dunja nova vida anda em toda
Os planos do Creador 39
parte de par com uma grande alegria, vê só na pri­
mavera, na renovação da natureza, como o rouxinol
canta, como o vento cicia, como a abelha zumbe
como o regato murmura, como tudo se rejubíla com
a vida nova. O comercio sexual do homem e da mu­
lher donde deve nascer uma vida nova, o Creador
uniu-o ao prazer para que o homem tome sobre si
os numerosos sacrificios que vão de par com a edu­
cação dos filhos.
O plano divino ahí está diante de nós perfeita-
mente claro: a união dum homem e duma mulher
numa vida conjugal indissolúvel, no intuito de as­
segurar á humanidade novos sucessores. Em com­
pensação, o teatro, o cinema, os quadros, as fotogra­
fias, os romances, os artigos de jornaes, os livros,
milhares e dezenas de milhares de falsos prophetas
anunciam á sociedade que o homem e a mulher,
mesmo antes do casamento, mesmo numa idade insu-
ficíentemente avançada e sem fundar mais tarde uma
familia, seja sós, seja com outros, têm o direito de
proporcionar-se esses prazeres do corpo que, segun­
do o plano do Creador, só deveríam conhecer no
santuario da vi-la familiar.
Meu filho, não pódes passar como um surdo
diante desses acentos sedutores.
Assim que o teu corpo, na idade de treze a
quatorze anos, se tornar mais forte e se desenvolver,
cada dia mais has de sentir quantas manifestações
da nossa vida social de hoje são poluidas por essa
concepção imoral. Nas ruas, no teatro, nos livros,
na sociedade dos teus camaradas, em toda parte en-
40 A Casta Adolescência

contrarás o desprezo contristador dos planos do


Creador, incessantemente a tentação erguerá contra
ti o monstruoso dragão da impureza, da impureza
d’alma. Livros taes cair-te-ão nas mãos, levar-te-ão
a semelhantes teatros, induzir-te-ão em semelhantes
sociedades. E até — escrevo estas linhas de coração
confrangido — quantos meninos, desde a sua jovem
idade, quiçá já na cscóla primaria têm sido iniciados
nessas coisas por camaradas corrompidos, nessas coisas
cuja idea lhes não deveria ter vindo sinão alguns
anos mais tarde. Grande numero cái assim victima
das seduções dos companheiros. Taes camaradas apro-
ximar-se-ão de ti para te falar com bôea impura do
despertar dos gozos do corpo, da origem da vida,
do nascimento da criança, camaradas que já estão cor­
rompidos por uma chaga hedionda da nossa época,
chaga que degrada, pelo vergonhoso meio da depra-
vação, os planos sublimes do Creador.

7. O santo m istério.

Porém já vês, meu filho, quanto são de lastimar


esses infortunados. Porque, si conhecessem o santo
dever, a nobre tarefa que Deus ligou a esse instinto
humano, não falariam dele com tão desfaçada gros­
seria.
Julga tú mesmo, meu filho, que vulgar maneira
de pensar, que degradação da alma é precisa para in­
ventar e espelhar pilhérias porcas sobre um dos mais
santos e mais nobres privilégios de que o Creador
quiz revestir o homem.
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Os planos do Creador 41

"Não sabeis que sois o Tem plo do Espirito-


Santo que habita em vós?” diz a Sagrada Escritura
(1.* Corintios, V I, 19). Num templo cada lugar c
santo, no nosso corpo também tudo é santo, pois
ele vem de Deus. Mas em cada templò ha uma parte
que é especialmente santa: o tabernaculo onde o pro-
prio Senhor habita no Santíssimo Sacramento e do
qual só nos devemos aproximar inclinando a ca­
beça, ajoelhando-nos com profundo respeito; no cor­
po humano também ha um lugar particularmente se­
creto ■— não é o coração, não é o cerebro — porém
o orgão onde habita uma parcela da força creadora
do Onipotente e no qual não devemos pensar sinão
com profundo respeito.
Com quanto mais respeito pensares na santa
força creadora que acorda em ti entre os quatorze e
os dczeseis anos, tanto mais claramente tomarás con-
cíencia de que no teu corpo, consoante a admiravel
vontade de Deus, dormitam a vida, a felicidade e o
futuro de toda uma geração, tanto menos troçá-la-ás,
tanto menos sorrirás dela, e mesmo dela absolutamen­
te não falarás.
De feito, o nascimento da vida é na natureza
inteira um segredo. Segredo santo e impressionante.
Lá onde começa uma nova vida, o Deus Creador
lança sempre um véu. A borboleta esconde-se num
casúlo quando muda de fórma, ninguém a vê. E
quem jámais viu a semente germinar? Ninguém.
Profundamente escondida no seio da terra, ella surge
para uma nova vida. Quem jámais viu o cristal da
ametista azul e do rubi vermelho formar-se no si-
42 A Casta Adolescência
lendo absoluto das profundesas misteriosas dos ro­
chedos? Ninguém. O começo, o nascimento, a origem
da vida estão por toda parte misteriosamente ocultos.
Em vão o homem investiga o começo da vida; o
maior sábio finalmente percebe haver chegado ao
limiar dum santuario fechado. Um passo mais e — é
Deus que se ergue diante dele .
E eis que os teus camaradas falam desse sublime
segredo com lingua impura, e esse instinto destinado
a assegurar a conservação da raça humana, e que é
talvez o pensamento mais santo, mais nobre do
Creador, torna-se para eles um objeto de brinquedo
frivolo, de gozo e de gracejos sordidos!
Já sabes, porém, agora que alta missão te re­
serva o futuro. Sabes que um dia — si segundo os
planos divinos te casares — chamarás á vida germes
humanos e beijarás na fronte a bela adormecida no
bosque. Sentes a imensa responsabilidade que te pésa
nos hombros e que reclama que até esse santo m o­
mento conserves as forças do teu corpo numa pureza
total, e que não desperdices as forças do teu organis­
mo, Sabes que satisfazeres os teus instintos fóra do
casamento equivale a profanar em ti a dignidade hu­
mana. Sabes que em todo jovem e em toda jovem
estão ocultos um pai e uma mãe, mas aquele que não
pôde viver casto antes do casamento, tão pouco po­
derá permanecer fiel e honesto durante o casamento.
A sorte de gerações inteiras depende da maneira por
que puderes estar um dia com pureza total entre os
obreiros do Creador.
As raízes da arvore estão ocultas na silenciosa
Os planos do Creador 43

profundidade do sólo, e enviam ao tronco e ao cimo


a força vivificadora que a desenvolve; si expusermos
as raizes á luz do sói, a arvore secará. A idade viril,
o desenvolviemnto do instinto sexual devem produ­
zir-se num silencio igualmente misterioso, numa
s^nta reserva, sem olhares nem pensamentos curiosos.
Por isto, nunca falarás dessas coisas, por curiosidade,
com teus camaradas, pois aquilo que a sabedoria di­
vina mantém oculto diante de nós, a curiosidade hu­
mana não deve exhibil-o á luz do dia. Por isto, con­
siderarás o orgão da geração demasiado nobre para
que o profanes por teu gozo pessoal, contrariamente
aos desígnios do Creador. Efetivamente, nos teus jo­
vens anos não sómente constróes ou destróes no teu
proprio corpo e na tua alma, mas também para as
gerações futuras. Não escutarás a sedução, mesmo si
ela vier sob a mascara da literatura ou da arte; pois
bem sabes: ai daqueles viajores que o fogo fátuo
desvia da róta para os pantanos lodosos: desaparecem
irremediavelmente no pantano.
O desenvolvimento dessa semente vital que agora
apenas amadurece em ti, póde orientar-se em bôa ou
má direção, conforme a tua conduta e o teu modo
de viver nos teus jovens anos, de sorte que serás
uma benção ou uma maldição para tua futura fa­
mília. Não esqueças que um bando inumerável de
meninos necropatas, doentes, cégos de nascença
idiotas, paralíticos, criminosos, loucos, maldizem os
pecados de juventude, os excessos de seus pais.
A tua bôa vontade presente, as tuas idéias sãs
vão ser, infelizmente, postas á prova pelas mil teu-
44 A Casta Adolescência

taçõcs da tua juventude e do mundo. Livros, gra­


vuras, peças de teatro, filmes, anúncios, cartões ilus­
trados, folhas humorísticas, cantigas, comédias, vi­
trines de livreiros, artigos de jornais, etc. precipitar-
se-ão sobre ti aos milhares e te gritarão aos ouvidos
“Não sejas um santarão”, "não sejas um atrasado,
com a mentalidade da idade media”, "não sejas cri­
ança” , não esperes até o casamento” , ou então "não
sejas fiél no casamento, mas porporciona-te os gozos
do corpo, os prazeres dos sentidos, tanto quanto e
onde quer que seja possível. No mundo inteiro atual
tão transtornado, ouvirás incessantemente repetir que
o amor e o gozo são a finalidade uníca da vida.
E lá estás, com a cabeça atordoada, no meio
desse barulho de feira.
Não sabes que fazer, a que te apegares, que con­
duta seguir.
Chegas ao cruzamento dos caminhos onde vae
decidir-se a tua sorte, a sorte de toda a tua vida.
E para ti se erige a questão, a importante questão que
aguarda uma resposta urgente: Para onde me devo
dirigir?

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SEGUNDA PA R T E

PARA ONDE IREI?

“ Sêde senhor da vossa von­


tade, escravo da vossa consciên­
cia. ”
(M aria von E b.ner-E schekbach).

“ Engana-se aquele que crê


que, em se mostrando fraco na
juventude, poderá ter caráter
mais firme uma vez chegado á
idade d’homcm. ”
( J osé E õtvõs).

Conheces a historia de Hercules, o maior herói


do mundo lendário grego? Era ele o ideal personifi­
cado da força viril e da coragem. Seu inimigo quiz
fazê-lo perecer desde o berço: colocou duas serpentes
ao lado dele, mas o menino robusto esganou as ser­
pentes. A sua vida é cheia das mais belas façanhas.
Matou a hidra de Lerna, domou o touro de Créta,
venceu as Amazonas, limpou as estribarías de Augias,
roubou o pomo de ouro das Hesperides. . . E no
entanto esse herói fabuloso não escapou á prova que
46 A Casta Adolescência

— é a verdade — nenhum homem póde evitar: tam­


bém ele chegou um dia á encruzilhada dos caminhos
onde irrevogavelmente ha que tomar uma decisão ca­
pital: para onde irei? que caminho hei de seguir?

8. No cruzamento tios caminhos.

Este episodio passou-se na sua juventude, quan­


do de menino principiava ele a se fazer jovem. Um
dia em que estava sozinho, mergulhado em si mesmo,
duas mulheres apresentaram-se de repente diante delle.
Uma poz-se-lhe a falar assim:
Vejo, Hercules, que tu te perguntas que estrada
deves seguir na vida. Si me escolheres por compa­
nheira, conduzir-te-ei por uma estrada agradavel onde,
durante toda a tua existência, só acharás prazer e
nenhuma pena. Não terás outro cuidado sinão sa-
beres o que comerás e beberás e como darás satis­
fação aos teus sentidos. . . Si me pertenceres, terás
todas as alegrias sem trabalho e sem dôr. . .
Então Hercules interrompeu-a:
Mulher, que nome é o teu?
Meus amigos chamam-me "Felicidade” — res­
pondeu a mulher — , e meus inimigos dão-me o nome
de "Vicio".
Entrementes a outra mulher se aproximara.
Eu, não te quero enganar — diz ela. Afirmo-te
que os deuses não dão nem grandeza nem bem sem
trabalho e sem dôr. Si me seguires, certamente terás
muito que trabalhar. Si quiseres que toda a Grécia
Para onde irei? 47
te louve por causa das tuas façanhas, esforça-te por
fazer bem a toda a Grécia. Si quiseres que teu campo
dê frutos abundantes, trabalha o teu campo. Si te
quiseres tornar um guerreiro celebre, aprende essa
ciência junto aos homens capazes. Si te quiseres tor­
nar robusto, habitua teu corpo a obedecer á razão,
a suportar o trabalho penoso e a pena. . .
O Vicio interrompeu:
Ouviste, Hercules, por que caminho penoso essa
mulher te quer conduzir? E como eu te levo facil­
mente á ventura?
Misera! — exclamou a Virtude. Que ventura
podes dar? Póde haver ventura mais miserável que
a tua, já que nada fazes para adquiri-la? Comes
antes de teres fome, bebes antes de teres sede. No
verão suspiras pelo gelo e pela neve. Desejas o sono,
não porque muito hajas trabalhado, mas porque nada
fizeste. Impeles ao amor os teus partidários, antes
que a natureza o reclame, e conspurcas a natureza
pelo abuso dos dois sexos. Os teus fiéis estão habi­
tuados a fazer coisas vergonhosas durante a noite, e a
dormir bôa parte do dia. Posto que sejas imortal,
os deuses excluiram-te do seu meio e os homens de
bem te desprezam. Os teus jovens amigos arruinam
seus corpos, e os mais idosos perdem a alma. Na ju ­
ventude, rebolcaram-se nos gozos até o enjoo, e agora,
numa idade avançada, arrastam-se suspirando. En­
vergonham-se das ações passadas, e agora a fadiga
da sua vida malbaratada pésa-lhes nos hombros. Eu,
ao contrario, habito com os deuses e no meio dos
homens melhores. Sem mim, nada de nobre se pro-
4tf A Casta Adolescência

duz no mundo. Os deuses e os homens me honram.


Os artistas amam-me como a sua auxiliar, os pais de
família como guardiã do seu lar. Para os que me
seguem, a comida e a bebida são coisa agradavel, por­
que elas só as usam quando delas precisam . O sono
c-lhes mais dôce que ao preguiçoso, e eles não lhe
sacrificam um só dos seus deveres. Os amigos os
estimam e a patria os honra. E, finalmente, quando
lhes é chegado o ultimo momento, eles não descem
ás trevas do esquecimento, porém a usa lembrança
continúa a viver gloriosamente nos lábios das ge­
rações porvindouras. Hercules, filho de ilustres pais,
si agires assim, chegarás a ama gloria eterna. . .

Eis aí como li a historia de Hercules num velho


escritor grego, Xenofonte, no terceiro livro da obra
intitulada “De Cyri expeditione". E agora escrevi-a
para ti, meu filho, porque um dia também chegarás
certamente ao cruzamento dos caminhos, quando to­
mares conciencia desta averiguação impcrecivel da
Sagrada Escritura: A carne tem desejos contrários
aos da alma" (Gaiatas, V, 17) — e também tiveres
que fazer a tua escolha.
Presta bem atenção!

9. Da infancia ú adolescência .

Desde os teus quatorze ou dezeseis anos —


quiçá até já mais cedo — sentes em ti mesmo coisas
Pnra onde irei? 49

novas, extraordinárias. Teu corpo e tua alma co­


meçam a transformar-se a fermentar: novas idéias,
novos pensamentos, novos esforços, desejos ainda não
sentidos antes, acordam dentro de ti. E ’s como o
suco de uva que se põe a fermentar para depois virar
um vinho generoso. O periodo de transição levanta-
se para ti; o menino inconciente torna-se o jovem
que toma conciencia de si mesmo.
Essa importante transformação é acompanhada
de tais manifestações, que abala e põe em movimento
as mais pequenas partes do teu sêr. Eu quasi diria que
o menino condenado a desaparecer luta dentro de
ti com o jovem em via de nascer. Do mesmo modo
que na primavéra a força vital se põe em movimento
nos galhos adormecidos das arvores, e a seiva nova
faz desabrochar os botões, assim também referve den­
tro de ti o sangue ardente da primavera da vida,
pulsa nas tuas veias, transtorna-te desejos e pensa­
mentos.
E tú?
Meio desconcertado, perturbado e incerto, con­
templas em tua alma o turbilhão de sensações novas,
sentes-te quasi estranho a ti mesmo em face do teu
antigo eu. Como as aves migratórias aos primeiros
raios do sói de outono, verdadeira febre e inquietação
apossam-se de ti.
Dize-me, não é assim?

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50 A Casta Adolescência

10. Teu organismo desenvolve-se.

Primeiramente teu corpo cresce. Teus membros


se alongam. Seguramente tens ás vezes um porte um
pouco comico. Não sabes mais que fazer dos teus
grandes braços — a não ser que metas as mãos nos
bolsos. Como a tua primeira calça fica depressa cur­
tíssima, não é? As férias vêcm te crescer dez centí­
metros, em dois ou tres anos atinges estatura des-
mesurada. Já não corres tão depressa quanto os pe­
quenos, mas também não pódes andar tão facilmente
quanto os grandes. Teus pulmões se dilatam, teus
ossos tornam-se mais fortes, teu peito se alarga. Os
primeiros traços viris e graves desenham-se-te no
rosto de menino. A tua bela voz de soprano desapa­
rece. E, quando ninguém te vê, ensaias diante dum
espelho si já pódes torcer o bigode que começa a
nascer.
Dize-me, não é assim?
Tudo isso mostra que estás na primavera da
vida. Ora, a primavera é um tempo infinitamente
precioso: decide de toda a colheita do ano. Depois
de uma primavera infeliz, o verão não tem fruto e o
outono é horroroso.
Ora, não é só o teu exterior que muda, mas
também dentro de ti se desenvolvem orgãos mais
nobres. Teu coração, teus pulmões, teu cerebro, todo
o teu sistema nervoso desenvolvem-se também por
um trabalho interior, para se tornarem instrumento
apropriado ao teu organismo que creceu.
Essa passagem da infancia para a adolescência
Para onde irei? 51

6 uma verdadeira tempestade, um a revolução. A ’s


vezes tens dores de cabeça, vertigens, hemorragias na-
saes; e o teu coração põe-se a bater de modo assus­
tador. Não tenhas medo, isso vae de par com o de­
senvolvimento da tua natureza. Com alimentação
conveniente, sono, passatempos, poderás cuidar da
tua saúde.
Presta, porém, bem atenção a que essa época,
“a idade ingrata“, é a época mais importante de toda
a tua vida terrena.
Mas ai! quantos ha que, na sua inconcíencia.
estragam irremediavelmente esse periodo tão impor­
tante da sua existencial

11. Quando abril estiver dentro de ti.

Teu estado d’alma será também mui variavel,


caprichoso, facilmente egoísta, teimoso, irritável, não
reconhecendo nenhuma autoridade, pondo-te acima
de tudo, buscando honras e considerações. Essas mu­
danças têm o seu lugar no teu estado de humor. E’
realmente abril que chega em ti: pela manhã o sói
sorri com alacridade feérica, e meia hora mais tarde
estás molhado até os ossos na rua, e, quando entras
em casa descontente, o sói se põe de novo a brilhar.
Cáes também sob o domínio de impressões passa­
geiras. Ora és dum entusiasmo que te transporta até
o céu, ora um sentimento de amargura e de decepção
te lança por terra; mas tú mesmo não sabes a razão
nem o porque, Um desejo de viajar apodéra-se de
52 A Casta Adolescência

ti. Suspiras pelas aventuras, pela gloria, queres fazer


grandes coisas (ás vezes alguns jovens fogem de
casa).
E' nesses mezes, nesses anos, que tua alma, está
verdadeiramente indefluxada. A menor corrente de ar
faz-lhe mal, e apanhas uma inflamação. Não dos
bronquios, mas da alma. Alta febre apodéra-se de ti:
murmuras, ficas descontente, acrimonioso. Entras em
suor: dizes tolices, essa febre alta quasi te impede de
falar — convenientemente: falas grosseiramente, dan­
do dc hombros, com arrogancia. Em particular um
grave desejo apodéra-se ás vezes da juventude: si ao
menos eu já fôsse um homem! Que não daria eu para
ter apenas mais quatro ou cinco anos! Porém si ainda
não és homem, ao menos queres parecê-lo. — E
coisa maravilhosa — não são as virtudes e boas ações,
porém as coisas exteriores da vida das pessoas gran­
des, que tú imitas: as roupas, o andar, o chapéu, as
conversas, e evidentemente fumas e bebes como elas.
Aquele que não compreende esse periodo, ri de
ti por falta de tacto, e zomba de ti e da tua falta
de geito. Talvez tua própria mãe não te compreenda.
Antes, eras tão obediente, e ela não apreende porque
agora lhe respondes, porque és suceptivel. Os pequenos
te temem, os grandes enfadam-se contigo, e tudo isso
te azeda.
Efetivamente, és um mistério para ti mesmo, e
haveria não que te menosprezar, porém que te ajudar.
Oh! como é feliz aquele que nessa época acha
um guia sabio e maduro ao qual póde confiar com
toda segurança cada uma das suas dificuldades! Oh!
Para onde irci? 53

como é infeliz aquele que, com as suas duvidas e pro­


blemas angustiosos, se volve para as explicações cruéis
dc camaradas corruptos!

12. Idéias novas, desejos desconhecidos.

Porém tú sentes, descobres outra coisa mais em


ti mesmo. Na tua alma — que até então era talvez
uma alma de criança, clara, harmoniosa, alegre, des­
preocupada — produzem-se mudanças não menos im­
portantes. Perturbação estranha invade-a, como si
nuvem informe se te estendesse por sobre a alma.
Pensamentos, desejos surgem de profundezas desco­
nhecidas de que até agora não tinhas a menor idéia,
e que, agora que pela vez primeira as encontras, te
perturbam realmente. Com ansiedade pensas nas tuas
disposições tranquilas e calmas de ha um par de annos
apenas, e na perturbação desses novos pensamentos
surge em ti este pensamento terrível: Que é isto?
estarei moralmente corrompido?
Assim não é, porém. Posso tranquilizar-te:
atualmente ainda não tens nenhum motivo de te
assustares.
Entretanto eu gostaria de te fazer uma reco­
mendação, a saber, que o teu futuro, toda a tua vida
moral dependerão do modo por que passares esses
anos, esse período a que se chama "a idade ingrata”,
E' agora que a gente se dá conta de si a alma, que
é a unica chamada a mandar em ti, póde ser senhora
dos teus baixos instintos, si serás um cavalheiro de
54 A Casta Adolescência

nobres sentimentos e de espirito elevado, ou então


mísero escravo de hábitos pecaminosos. O que escrevi
nas paginas que seguem é destinado aos jovens que
chegaram a esse gráu de desenvolvimento fisicos, a
essa "idade ingrata” , sem terem sofrido a menor in­
fluencia nociva de fóra. Ai! ha tantos que fôram
postos ao corrente dessas coisas por camaradas cor­
rompidos, quando o desenvolvimento do organismo
e a ordem da natureza só agora lhes deveríam ter
sido revelados ao espirito, de sorte que eles passaram
por essa crise mais rapidamente, porém não sem
dano.
Uma força começa a fazer-se sentir em ti, a qual
até agora não sabias que estava em ti: é isso a que
se chama "o instinto sexual” .
E' maravilhoso o magnífico plano de Deus. A
criancinha vem ao mundo impotente, e é só pouco
a pouco, lentamente, que adquire as capacidades de
que ha mistér, a seguir, na existência. A principio
não tem dentes, mas estes não lhe são necessários.
Porém depois do primeiro ano, para comer, ela pre­
cisa já poder mastigar, e lhe nasce um ou dois dentes.
Pouco a pouco vêm outros dentes, na medida em
que são necessários a essa época. Os germes de todos
os dentes já se achavam sem duvida no momento do
nascimento, porém aguardaram precisamente sob a
gengiva, chegasse o momento em que fossem necessá­
rios.
O instinto sexual, do mesmo modo, dormita
tranquilamente no jovem, até aos quatorze ou quinze
anos. Até então este nem síquer sabia que elle existia
Para onde irei? 55

(a menos que camaradas corrompidos lhe tivessem


falado dele gracejando). Mas é justamente nessa épo­
ca que essa força começa a despertar-se e a inquietar
os jovens concicnciosos. Essa maturidade dura apro­
ximadamente dos quatorze ou quinze anos até os
vinte e cinco, e atinge o seu naximo entre os quinze
e os dezoito.
Que nova coisa é, porém, essa que começas agora
a sentir?. . .
Cada vez mais verificas este fato (que sempre
verificaras até então, mas que te não impressionara
tanto), que a humanidade se compõe de dois sexos.
O sexo masculino e o sexo feminino.
Bem o tinhas visto até aqui, mas não te
preocupavas muito com isso. Só te ocupavas das me­
ninas talvez para lhes puxares as tranças brincando,
e te divertires muito quando elas se punham a gritar
de susto.
Mas agora já não o farias por coisa alguma do
mundo. Quando brincas ou falas em companhia de
moças, algo de particular, um constrangimento que
até então não experimentaras, um ardor e um pra­
zer apodéram-se de ti. Esforças-te por pareceres di­
ante delas tanto mais belo, tanto mais inteligente,
falas-lhes dos teus predicados verdadeiros ou imagi­
nários, das tuas capacidades, e, longe de puxar pelos
cabelos, — Deus me defenda — , ofereces-lhes, ao
contrario, generosamente, “os teus serviços cavalheires­
cos”, e, si com abundancia de curvaturas pódes apa­
nhar uma luva caída no chão, nadas numa alegria
$em limite.
58 A Casta Adolescência

13. O prim eiro amor.


E quando estás em casa no meio dos teus li­
vros — pois estás no terceiro ou no segundo ano
— certa força de vontade te é necessária para apren­
deres a lição de amanhã. Estudas como se deve elevar
ao quadrado e como se deve extrair uma raiz quadra­
da. . . mas. . . eis. . . que de repente a raiz quadra­
da vira uns olhos, umas orelhas, uma bôea e — nem
tú mesmo sabes como -— uma moça bonita.
Agora, tomas a gramatica. Estudas a lição de
prosodia do dia seguinte, e talvez fôsse bom experi­
mentar si poderías realizar na pratica as regras apren­
didas. Mordes a extremidade do lapis, as estrofes pas­
sam uma após outra ao papel, e numa demão eis os
teus primeiros versos, — versos de amor. O pro­
fessor de prosodia acharia talvez que essa “obra-
prima” é uma sobrevivência da idade da pedra, as
rimas, o ritmo são acidentados qual veiculo numa
estrada pedregosa, mas estás persuadida de que teus
versos ultrapassam as poesias dos Dante e dos Petrar-
cas reunidos.
E ainda é só o começo.
Pouco a pouco tomas conciencia de que esses
pensamentos e outros semelhantes te ocupam a mente
e te invadem cada vez mais. Tens que confessar-te:
estás enamorado. E a tua conciencia delicada co­
meça a inquietar-se, e tú mesmo não te pódes dar
conta do que é feito de ti. Uma seára misteriosa
começa a brotar em tí, cuja semente até agora dor­
mia nas profundezas de tua alma, sem que dela ti-
Para onde ir ei? 57
vcsses conciencia, seára que teus olhos de menino sem
experiencia olham talvez com espanto: será trigo ou
ai forra?

14. Esse desenvolvimento faz parte


do plano divino.
Repito, meu filho, até agora não ha mal. Tudo
isso é coisa natural, que sucederá portanto a cada um
mais cedo ou mais tarde. E mesmo — para falar
completamente claro — essas emoções c sensações
sexuaes produzem-se em ti pela vontade de Deus.
Lembra-te apenas do que eu te disse no capitulo
primeiro sobre o “plano do Creador”, segundo o
qual a vocação da maioria dos homens é cuidar da
propagação da especie humana. Leste com que mara­
vilhosa e santa sabedoria regulou Deus a continuação
da humanidade. E ’ sua santa vontade que o amor
mútuo do jovem e da jovem os reúna no santuario
da vida familiar, e que, pelo fruto da união de dois
corpos e do amor de duas almas, a humanidade se
adicione continuamente novas unidades que substi­
tuam as que a morte faz desaparecer da terra. Essas
sensações novas surgem, pois, em tí comformemente
ás leis da natureza: ora, as leis da natureza são santas,
e santas ficam sendo, emquanto o homem não as
polúe com mão pecadora. Noss'aIma é santa si vive
conformemente ás leis de Deus, e nosso corpo também
é santo, essa morada tão bela preparada para nossa
alma.
Eis aí, pois, meu filho, o plano do Creador.
E ’ em conformidade com a sua vontade que sucede
58 A Casta Adolescência
despertar-se, no jovem que cresce, o interesse, o de­
sejo pelas moças, entre as quaes encontrarás um dia
uma companheira para a vida. O amor isto é, atração
mútua de dois sexos — a tempo e a proposito —
não só não é pecado, mas, ao contrario, é um dos
mais belos dons de Deus.
Mas o amor também é ao mesmo tempo uma
fóssa tenebrosa.

15. Puro até o altar, fié l até o tum ulo .

Conformemente á santíssima e imutável von­


tade de Deus, não pódes satisfazer esses instintos que
começam agora a manifestar-se em ti pela primeira
vez, e que em seguida se tornarão cada vez mais fortes,
sinão no casamento, isto é, na instituição que o
Creador destinou á conservação da especie humana.
Porém ainda estás longe do casamento, não é exato?
Mas até que ponto?
E \ portanto, o teu mais santo dever conservar
esses desejos e esses instintos na sua pureza e inte­
gridade até o dia em que conduzires a tua branca
noiva perante o altar do Senhor. Antes do teu ca­
samento jámais tens o direito de dar satisfação a es­
ses instintos, sob pretexto algum, nem só nem com
outros. Todo homem que não é casado comete um
pecado grave si, voluntária e concientemente, se entre­
ga a pensamentos, sentimentos, ações que se rela­
cionem com isso a que se chama “vida sexual”.
Fica, pois, alerta, e não dês jámais lugar vo ­
luntariamente a esses pensamentos, olhares, palavras,
Para onde irei? 59
ações. Porem si no curso do desenvolvimento do teu
organismo te viérem á imaginação tais pensamentos,
então — mal te deres conta deles — enxóta-os por
outros pensamentos, e não te esqueças de que, em-
quanto não prestares juramento com tua noiva pe­
rante o altar, não tens o direito de te abandonares a
essas sensações. Si agires assim, estarás no bom ca­
minho. E’ da maior importância que não esqueças
esta verdade.
O grande perigo, nesses anos, reside particular­
mente na tua imaginação. Nessa idade todo jovem é
mais ou menos sonhador. Toma, porém, cuidado de
não caires na desgraça de tantos jovens que, durante
semanas, mezes, sonham com qualquer outra coisa
que não as suas lições, que vivem de romances in­
teiros na sua imaginação e se forjam um futuro fan­
tástico, descurando os seus deveres e trabalhos, e fi­
cando para trás em todos os terrenos. Portanto, aten­
ção para que os devaneios sentimentaes não te para­
lisem a alma.
Repito-te o que já disse. Esses desejos novos,
esses sonhos, esses instintos depertam em cada ado­
lescente, sem exceção. Esse instinto sexual que sentes
em ti é santo, pois é uma participação misteriosa da
força creadora de Deus. O seu aparecimento não deve,
pois, inquietar-te. Esses signaes indicam que começas
a ficar homem e que, consoante os desígnios de Deus,
se congregam as força? que te preparam para o teu
papel futuro de pai de família. Quanto mais tarde
essa sensação se manifestar em ti, tanto melhor. Os
meninos doentios e nervosos experimentam muito
60 A Casta Adolescência

cedo essa crise (desde os doze ou treze anos), os que


são sadios mais tarde (pelos dezeseis e dezesete anos).
Alegrate, pois, si ainda és "menino” , pois tanto mais
tranquilamente poderás desenvolver-te. Os fructos
precoces são sem valor. T ú proprio já pudeste fazer
a experiencia disto. Vaes a um jardim: o pomar está
carregado de frutos. Estes ainda não estão maduros,
mas aqui e acolá ha alguns pomos vermelhos. Tomas
um com alegria, pois ele é belo. E o mordes, e o
jogas fóra: está bichado e máu. Pensa no provérbio:
as coisas bôas precisam de tempo.
Mas quando o teu desenvolvimento fisico che­
gar ao termo, então é um dever sagrado para ti não
despertar esse instinto por leituras sensuaes, conver­
sas, olhares, pensamentos, ações, mas, em vista do
combate que deves mover contra ele, haure força na
convicção de que, segundo os planos de Deus, uma
santa tarefa te aguarda um dia.

16. No perigo , na tempestade.


Eis, meu filho, que o teu crescimento também
te traz á encruzilhada dos caminhos. O Vício e a
Virtude aparecem diante de ti, como diante de Her­
cules, e te convidam a lhes seguir o caminho. O Vicio
posta-se diante de ti, encantador, e te oferece a man­
cheias os prazeres sensuaes.
Teus instintos de que falei mais acima querem,
no curso dos anos (mórmente nos teus anos de uni­
versidade) , comandar-te de modo cada vez mais tirâ­
nico,
Para onde irei? 61
Assim como os gritos contínuos das hienas e dos
chacacs sanguisedentos fazem tremer as caravanas do
Saára no silencio da noite, assim também os ataques
do instinto sexual perseguir-te-ão ate ao fim dos teus
anos de juventude. O prazer mostra-se diante de ti
sob roupagem atraente, sob a roupagem do gozo
que te promete a satisfação imediata dos teus ins­
tintos sexuaes. Continuamente tentações convidar-
te-ão a abandonares o caminho da pureza moral; é
como um demonio desencadeado em ti que pede, pro­
mete, escarnece, excita: vai pois, vai para entre os
prazeres que os desejos sensuaes prometem.
E, nessa terrível tempestade, a custo repararás
no nobre semblante da Virtude, a custo lhe ouvirás
a voz em meio ás exigências dos sentidos: Meu filho,
não te fies no Vicio. Conserva tua alma pura. Não
peques contra a pureza de tua alma nem siquer por
um só pensamento. Conserva intactos teu corpo e
tua alma segundo'o mandamento de Deus, conserva-
os para tua noiva futura. Crê-me, só assim serás um
dia um homem honesto, energico e feliz.
Mas a tempestade continúa a bramir. Sobretudo
entre os dezoito e os vinte e quatro anos. E tá, meu
filho, cumpre que fiques com alma intrépida, sem
cambalear, no meio das vagas espumantes. Durante
anos terás que suportar valentemente a luta contra
as paixões, e esses anos são anos de guerra que re­
almente "contam dobrado” . Dobrado, porque o teu
caráter fica formado de modo definitivo. E’ agora
que se regúla o destino de toda a tua vida. Quaes
grandes marteladas, resôam estas palavras do pagão
62 A Casta Adolescência

Ovidio: “N ulla repacabilis arte Ixsa pudicita est:


deperit illa semel” (Ovidio Her. V, 103, 104), a
pureza, uma vez ferida, não póde ser restaurada,
morre só uma vez. Ai de ti si caíres uma vez; afun-
dar-te-ás cada vez mais. Só se torna homem de ca­
ráter aquele que, na juventude, soube trazer ajoujadas
as suas paixões. T anto é facil cair, tanto é dificil
tornar atrás. Atualmente ainda não fazes mais que
lutar, — não ha mal nisso. Tom a cuidado para não
seres um dia obrigado a chorar as alegrias da ino­
cência perdida de tu'alma.
Meu filho, queres ficar firme? Já pudestes ve­
rificar que os desejos que despertam na época do teu
crescimento não têm o direito de ser satisfeitos, visto
serem atualmente méros sinaes precursores da obra
creadora a que Deus te destinou para o futuro? Que­
res proteger o jardim florido de tu'alma contra as
devastações da geada de maio? Queres com mão ro­
busta manter em brida os teus instintos corporais?
Queres pôr ordem nos teus pensamentos? Queres-te
manter firme qual um rochedo, e não correr atrás
dum clarão enganador? Queres acorrentar os baixos
instintos da tua natureza á nobre razão humana,
quando arde nas tuas veias o fogo devorador das
paixões? M eu filho, meu caro filho, queres ficar puro
durante a tua juventude?
Ha uns — ai! — ha muitos — que não prestam
atenção, que avançam, sem tomar cuidado, pela la­
deira da imoralidade. Mas ái daquele que avança por
essa ladeira. . . Ai daquele cuja alma em flôr é colhida
pela geada duma noite de maio!
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TERCEIRA PA R TE

NO DECLIVE

Integritas vwrum juvenem


facit esse decorum.
" A pureza dos costumes é a
fonte da beleza do jovem. ”

Um dia achar-te-ás também na encruzilhada dos


caminhos. Presta atenção, meu filho, não tomes a
senda atraente. Aquele que se mete pela ladeira, difi­
cilmente póde parar. Encara sómente a sorte desse
inditoso joven que enveredou pela estrada escorrega­
dia da leviandade dos costumes.
Nelle como em todo homem despertaram-se um
dia os novos instintos e os novos desejos de que tra­
támos no capitulo precedente. Também nele se des­
pertou uma curiosidade indefinivel relativa ao mis­
tério da origem da vida, o desejo de satisfazer os
seus instintos nascentes, e tanto mais quer elle entrar
cm relações com aqueles que lhe poderíam contar
muita coisa a esse respeito.
Lê apenas o caso dum jovem estudante.
(54 A Casta Adolescência

Tinha ele talvez quatorze ou quinze anos, quan­


do foi um dia ao cinema. Exibiam ali um estúpido
drama de amor; num “cabaret” homens e mulheres
se divertem, os homens chafurdam-se nos prazeres,
as mulheres estão escassamente vestidas, dansa-se, sor­
ve-se de um trago o champagne. . . na alma do in-
ditoso jovem agitam-sc sentimentos até então des­
conhecidos, desejos, pensamentos, e é como si ao mes­
mo tempo dentro dele desmoronasse qualquer coisa
de grande. Que era que caía? Quem o sabe? Uma
fortaleza, todo um mundo desmoronou-se nele.
Dize lá, e si nós experimentássemos também?
— diz-lhe agora ao ouvido o vizinho, um jovem
grande de olhos inflamados.
“Sim!” clama alguma coisa nele. "Não!" clama
logo outra voz dentro dele. Mais um “sim” , mais um
“não". Porém ele nada responde. Só faz olhar, olhar,
de olhos fixos na téla, a cena exitante. O rosto tor-
na-se-lhe rubicundo, o sangue ferve-lhe nas veias,
mas quando finalmente ele sáe para a rua e o ar
fresco lhe bate no rosto, uma tristeza sem nome in­
vade-lhe de chôfre a alma: “Acabo de cometer um
pecado mortal”.
Entrou ele em casa. Quiz estudar a lição do dia
seguinte. Foi em vão. A mente não aprendia nada,
a alma estava-lhe conturbada. “Vou ter com o meu
confessor” . E ele só torna a achar a calma quando as
meigas palavras do seu pai espiritual lhe acalmam a
alma inquieta: De agora em diante seja mais pru­
dente, meu filho.
Prometo-o, não o farei mais.
No declive (15
Desgraçadamente, um par de mezes mais tarde
cie foi ao teatro. O titulo era inofensivo: “O des­
pertar da primavera”. Quem podería suspeitar que
nessa peça jovens e donzelas fossem ostentar em cena
coisas vergonhosas? Si eles fizessem aquilo na rua, a
policia imediatamente os prendería. E rcpresentava-se
aquilo por dinheiro. Ele já não é senhor de si. Os
olhos quasi lhe sáem das órbitas, tanto ele olha para
a scena. O coração bate-lhe fortíssimo. Voltando a
casa, pensamentos impuros atravessam-lhe a mente.
Só quando quer deitar-se e principia a sua oração da
noite, como de costume, é que ele é tomado de in­
quietação: "Cometi mais um pecado". Toda a noite
não póde dormir. A alma lhe chóra amargamente.
“Amanhã irei confessar-me”, finalmente adormece
com essa resolução pela madrugada . . .
Mas, quando acórda, já não quer ir. E até tenta
tranquilizar-se. "Afinal, já estou no segundo ano.
I bom que saiba isso. Já não sou menino. Em par­
ticular, só me interesso por tudo aquilo do ponto de
vista cientifico".
Algumas semanas mais tarde» um camarada do
“primeiro" puxa-o á parte durante dez minutos no
corredor e insinúa-lhe nas mãos lama pequena bro­
chura: “Toma, é o "suco", cheio de fotografias ar­
tísticas". Na calma da noite a conciencia lhe fala ainda
«Ir quando em vez, porém a voz dela é já cada vez
mais fraca, o seu protesto é cada vqz mais impotente,
i linalmente ela se cala um dia. E" a calma na alma
.1.. jovem. . . A calma mortal do fcumulo. . .
Mas era justamente o que el« desejava: queria
G6 A Casta Adolescência

que ninguém lhe barrasse o caminho, queria viver


sua vida.
E o jovem "vivia sua vida” . . .

17. Na ladeira.
Elle já ouviu, leu, viu e fez tanto! Pouco a
pouco ficou um moço "em dia” . Nos primeiros me-
zes contentou-se com poesias amorosas que compôz
com perseverança incansável. A principio rimou ape­
nas nos momentos livres, sobre um novo “sói” que
se tornara a sua “palida lua” ; mas a pouco e pouco
só sonhou com "Ela”, e mesmo acordado ainda sonha
com Ela. Quando devería estudar, dá tratos á bóia
para achar rimas, ou então pensa no passeio da noite
na avenida, onde as moças ficarão doidas com o seu
terno da ultima moda e com a sua gravata de gosto.
De fato, o nosso estudante está continuamente
na avenida. Toda tarde póde-se vê-lo "bancar” o
elegante (no minimo ele assim o crê) com o seu re­
quinte de vestuário, com a sua "pose” de "gentle-
man” . . . Ao lado dele o príncipe de Galles é quasi
um rústico. . . Quando o professor passa perto dele,
não póde imaginar donde provém aquela nuvem per-
fumosa que invade a rua. Como, aliás, podería ele
adivinhar que seu aluno, que na aula nunca póde
responder, tenha virado aquele sonhador ao luar,
aquele peralvilho enamorado e suspirante? “Como
sou chicl”, pensa ele de si proprio. E não pensa em
que uma arvore pôdre também brilha na escuridão.
No declive 67

•Vou fazer conquistas” , pensa o jovem; “polichine­


lo*, suspiram os transeuntes sérios. “Como sou ele­
gante!— ”, pensa ele de si proprio; “que bela mas­
cara”, dizem as pessoas grandes. Que sorte o não se
trr ainda achado um instrumento para poder lêr na
alma humana! A’i! ái! Sabeis o que se veria então
alt Oh! “Bela cabeça, mas sem miôlo” .

18. Com os companheiros.

E’ assim que ele perambúla pelas ruas com ca­


maradas que se parecem com ele, e a sua “conversa
edificante” segue seu curso. A ’i daquela jovem que
o acaso traz perante o pequeno bando! Já de longe
a penetram eles com seus olhares indiscretos e ávidos;
quando ela lhes passa ao lado, fazem eles em voz alta
uma reflexão sobre ela e riem da sua tirada espirituosa,
até encontrarem uma nova vitima.
Entrementes um deles conta que o belchior tem
leituras apetitosas; o grupo entra e pede avidamente
os livros "do genero”. "O snr. póde vender-nos os
livros, porque não somos mais crianças” . Com o di­
nheiro que surripiaram da comoda da mãe, pagam
aquelas sordicias, e em seguida vão para uma taberna
mais afastados. Ali estão tranquilos, os professores lá
não vão. "Garçon, duas garrafas de cerveja!”
Puxam cigarros apanhados nos balsos dos pais,
e põem-se a lêr as brochuras obcenas que acabaram
de comprar, e, tocando os copos, encetam uma con­
versa "distinta”, esmaltada de anedotas licenciosas.
68 A Casta Adolescência

Os porcos, espojando-se no lamaçal, raramente fazem


saltar tanta lama quanta esses jovens revolvem numa
meia hora com a lingua. E quando esvaziaram o seu
"stock” de pilhérias de sentido ambiguo e gastaram
em bebida todo o dinheiro surrripiado, entram emfim
em casa, ás vezes até cambaleando.
Eis ahi uma cena frequente entre os galopins.
Outros jovens cáem noutro caminho; alguns ha que
cáem por si mesmos no pecado que a principio en­
caravam como um brinquedo inocente. A maioria,
porém, envereda pelo caminho do vicio por força dos
conselhos e seduções de camaradas já corrompidos.

19. A crise.

Mas á noite o sono não vem fechar os olhos ao


nosso pobre jovem. O que o inquiéta agora não é
a sua composição do dia seguinte, que nem siquer
ainda está esboçada. Finalmente, com uma pequena
mentira a coisa será logo explicada. Mas é a conversa
da tarde, o que elle ouviu dizer pelos camaradas
sobre os prazeres que se pódem despertar em si mes­
mo, é isso que lhe fermenta na imaginação e lhe
espanta o sono.
O seu cerebro é atravessado por pensamentos
cuja evocação lhe faria horror ha uns dois anos. O
coração começa a bater-lhe fortemente, o sangue lhe
ferve e entra em ebulição. Ele quisera saber si o gozo
é realmente tão grande quando o homem se setve do
seu orgão genesico. “Estou só, ninguém me vê” ; e
No declive 69
arde nele o desejo de experimentar a coisa; e comete
no seu proprio corpo uma ação vergonhosa que ele
bem sabe ser um pecado contra Deus, contra sua pró­
pria honra e contra a dignidade humana; mas quem
é que se inquieta com o pecado quando o instinto
exerce o seu império, esse instinto que durante toda
aquela tarde foi inflamado pelas conversas, pelas
leituras e pelas cantigas. . .

20. A ruina do tem plo.

O primeiro pecado solitário acaba de ser come­


tido. O infeliz jovem atirou-se a si proprio na lama,
— a si proprio se sujou. Todo o “gozfo” durou tal­
vez meio minuto. A primeira brecha foi aberta na
muralha. . . Ela começa a destemperar naquelle jo­
vem a força, o ardor para o trabalho e o entusiasmo.
A conciencia adormecida solta imediatamente um
grande grito. Ei-la desperta. Dirige amargas expro-
brações ao jovem mal a coisa foi feita. Num instante
ele recorda, como num relampago, sua alma até entlo
tão pura, e agora após a primeira queda, a sua ima­
ginação espantada fal-o enxergar tantos belos sonhos
aniquilados.
Foi assim que Napoleão deve ter contemplado,
de braços cruzados, Moscou em chamas na planície
russa coberta de neve. Foi assim que chorou Jeremias,
o profeta, sobre as ruínas da capital judia e do Tem ­
plo. Si num enterro nós choramos sobre um corpo,
porque a alma o deixou, quanto mais não deveriamos
70 A Casta Adolescência

chorar sobre uma alma que Deus abandonou! A h !


si siquer esse jovem derramasse lagrimas, lagrimas de
sangue, sobre a ruina do templo de sua alma! Porque
m il igrejas são sem valor em comparação com o tem ­
plo vivo de D eus: uma alma pura de adolescente.
Era nisto que pensava S. Paulo quando escrevia aos
Corintios: "Não sabeis que sois um templo de Deus
e que o Espirito de Deus habita em vós? Si alguém
destruir o templo de Deus, Deus o destruirá. Porque
o templo de Deus é santo, e é isso que vós mesmos
sois” (I.* Corintios, III, 16-17).
Mas essas reflexões não duram mais que um par
de dias. Logo se encontra ele de novo na sua antiga
companhia. Sabe de novos acontecimentos. Ouve
novas coisas, ri-se de novas pilhérias, ao cabo duma
semana rccáe no pecado do outro dia, e a semana se­
guinte ainda, e em seguida cada vez mais frequente­
mente: a sua conciencia defende-se ainda um pouco,
qual tição que vae apagar-se, como uma caça apanhada
na armadilha, mas em seguida se esgota. . . cala-se.
T ú não me escutas, p'ra que te hei de falar?
Pobre, pobre jovem!. . . A imensa energia dos
teus jovens anos, a força da tua vontade ahi estão
espatifadas no pó. Emquanto bebes o mél a copo cheio,
não percebes que veneno bebes no fundo desse copo.
Ah! si aos quinze anos visses as lagrimas amargas que
as consequências malditas do pecado te farão derramar
aos vinte! Ah! si aos quinze anos visses a pesada lava
que vae queimar, depois do pecado, o teu coração até
agora fresco e rubro! Ah! si aos quinze anos visses
a que aviltamento um par de anos mais tarde o peca­
Xo declive 71

do terá reduzido a tua alma pura como a neve! Ah!


•.i visses como has de dizer um dia: “Que desgraça
I»ai .1 mim!"
Quando no jogo de xadrez cometes uma falta,
<«'tiras a tua pedra dizendo "não vale” ; porém os erros
moraes jámais pódem ser considerados como não su-
t cdidos.

21. Juventude andrajosa.

Em seguida o carater! Bravura, grandeza d’al#na,


amor da patria, respeito dos pais, nobre altivez, cor-
tezia, heroísmo e todas as demais belezas da alma
humana, cédem lugar em tal jovem, cédcm lugar a
uma indiferença saturada na alma de um tal ado­
lescente. Póde-se vêr alguma coisa de mais triste do
<|uc uma jovem arvore — que devería estar em plena
floração — sem brotos, sem folhagem, com o tronco
tristemente curvado, com os galhos arrastando em
terra? O mesmo se dá com o adolescente que perdeu
a sua inocência sob o vendaval das paixões desenca­
deadas. A arvore mais robusta perde as folhas, os
galhos lhe sécam, si lhe fizermos uma ferida no tronco
i a seiva sair por ele. O pecado secreto produz as mes­
mas devastações naquele que se lhe tornou escravo.
A pureza d'alma é semelhante ao orvalho ma­
tinal que brilha como diamantes sobre as pétalas das
llôres que acordam. E ’ uma simples gota d'agua que
untila tão feérícamente: mas si um dia alguém, pot
descuido, tocar, no cálice da flôr, todos os oceanos
d<< mundo não a pódem substituir.
72 A Casta Adolescência
Já ouviste falar, meu filho, daquela mulher
maravilhosamente bela da antiguidade, Pandora, que
dera ao marido como dóte uma magnifica caixa de
ouro. Mas quando ele abriu a caixa de ouro, a mi­
séria, a dôr, a doença se espalharam por toda a terra.
Meu filho, os gozos carnaes proibidos são semelhantes
a cofres de ouro — exteríormente. Ai, porém, dos
jovens que abrem estouvadamente a caixa de Pandora!
Acreditas talvez que — ainda que seja á custa
da paz de sua alma — esse jovem é pelo menos feliz?
Absolutamente não. Do contrario ele se não vol­
vería para novos prazeres. Seu corpo a que ele já va­
rias vezes permitiu gozos proibidbs, torna-se duma
exigencia insuportável. Nunca está satisfeito, mesmo
si ele lhe concede gozo sobre gozo, mesmo si lhe sa­
crifica inteíramente sua alma. Sim, o fim duma vida
de gozo é que a alma se torna, por assim dizer, carne:
egoista, insensível, impiedosa. A alma fica sombria,
abatida, vazia; porém no seu corpo as forças demo­
níacas desencadeadas se assanham, perseguem-se umas
ás outras. Que profunda decadência para o homem! o
animal não se entrega á imoralidade, mas só o homem
creado á imagem de Deus, dotado de razão e de von­
tade livre.
Aquelle que, sem prestar atenção, tomou siquer
uma gôta do veneno dos gozos interditos, torna-se
como o rato que comeu uma isca envenenada: fogo
espantoso arde-lhe dentro, ele corre para um lado e
para outro para achar agua; bebe, engole tudo o
que acha no caminho, mas — ai! — o fôgo não se
apaga cmquanto o animal envenenado não morre. E'
No declive 73

um semelhante fôgo devorador que o jovem atéa em


si proprio pelos atos culposos. "O gozo diverte, mas
o fim dele faz mal”. O prazer, o gozo brincam conti­
go, mas o fim deles é a ruina, a miséria.

2 2 . No caminho da perdição.

Quando o adolescente chegou até ahi, quer co­


nhecer ainda mais a fundo o mistério da natureza hu­
mana. Agora ele já quizera saber tudo o que concerne
á vida sexual, á origem da vida humana. Ele, o "alu­
no das classes superiores”, já está bastante maduro
para esquadrinhar o mundo inteiro. Para esquadri­
nhar as coisas que a santa vontade do Creador ocultou
nas profundezas do santuario familiar. Quer, desde
agora, antes do casamento, saber e praticar essas coi­
sas. Os seus camaradas já estão iniciados. Com alegria
levam o inditoso jovem aos antros do pecado, a essas
casas onde mulheres ainda mais decaídas que eles o
iniciam nos segredos que ele quer conhecer. E, muitas
vezes, ele não precisa de camaradas. Porque em certas
ruas da capital um jovem não pôde circular á noite
sem que o mais miserável rebotalho da humanidade,
as mulheres decaídas, o abordem, o envolvam e o
atráiam para o tremendo abismo. . .
O espetáculo das ruínas é em toda parte depri­
mente. E’ triste vêr as ruínas que a rajada dos com­
bates causou numa magnífica igreja. Mil vezes mais
triste é, porém, quando esse ato de vandalismo se
produz no templo duma jovem alma onde brilhava,
7t A Casta Adolescência

ainda ha pouco tempo, o altar de mármore branco


do amor de Deus, e onde ardia a santa chama do en­
tusiasmo pelo ideal.
Mas agora já não ha segredos para ele. Agora
ele já ouviu tudo, viu tudo, degustou tudo, experi­
mentou tudo. E agora é ele feliz?
Ou não o é? Porque essa fúnebre tristeza nos
seus olhos? Que sombra lugubre é essa que lhe som­
brea os traços? Porque é que os seus olhares evitam
os olhares das pessoas honestas? Porque é que os seus
estudos são cada vez mais negligenciados? Por onde
lhe vagamundêa o espirito durante a aula? Que ser­
pente aperta com suas dobras essa jovem alma para
sufocal-a? Porque se sente ele como um estranho no
meio dos seus condiscípulos cândidos? Porque não
acha mais prazer nos jogos deles? Acaso ele não sabe
"tudo” ?
Sim, sabe tudo, e é por isto que não é feliz.
Porque a felicidade que ele procurou á custa da sua
inocência, do seu carater, da sua honra, procurou-a
em vão. Procurou-a lá onde ela não está. Quando
aproximamos do ouvido um buzio marinho, sáe dele
o barulho magnifíco do mar, sua antiga patria; assim
também, nas horas de solidão desse jovem resôam os
nobres esforços, desejos, sofrimentos duma alma tor­
turada. Quando, de rosto em fogo e com o coração a
bater bom fortemente, procurava ele avidamente a bor­
boleta multicôr duma felicidade imaginaria, a bor­
boleta evolava-se para mais longe, e não restava mais
nas mãos do infortunado jovem sinão o pó cinzento
duma asa de borboleta sem valor.
No declive 75

Mas a borboleta levou consigo o repouso, o fu­


turo, a felicidade da alma do adolescente. E que foi
que ficou no lugar do ditoso paraiso anterior? Um
vácuo enorme, um vazio sem esperança, sem alegria,
sem fulgor, glacial e negro. . . Com um roçar de
fantasma, grasnam gralhas ness'alma de adolescente
onde devería ecoar o canto melodioso do rouxinol.
Cactos I V , rei da Hungria, quando jazia no
leito de morte na ilha da Madeira, fez esta oração por
seus sete filhos: "Senhor, tirae-lhes antes a vida, si
eles vos têm de ofender por um pecado mortal”.
Branca de Castela, rainha de França, dizia um
dia a seu filho, o futuro São L u iz : “Meu filho, amo-
te mais que a mim mesma. E's o meu unico consolo
na terra; és a esperança do reino, e entretanto — eu
preferiría vêr-tc morto a saber de ti que cometeste
voluntariamente um pecado mortal".
'Antes no tum ulo do que estar em estado de pe­
cado mortal. Ah! como seriam amargas as lagrimas
dos pais ansiosos, como o coração amante duma mãe
ficaria dilacerado sob o peso da dôr, como a alma
dum pai seria estrangulada por uma muda dôr, si
eles vissem o pecado do filho, si conhecessem a queda
do seu desventurado filho!
E tú, filho cruél, porque não poupas esse sofri­
mento d’alma a teus pais, que tanto trabalharam
por ti.
Leonidas, um dos primeiros mártires christãos,
brijava com veneração o peito de seu jovem filho
adormecido, Origines, porque sabia que naquele cora­
ção puro habitava o Eterno. E tú, infeliz, tú arrastas
70 A Casta Adolescência
na lama tua alma outrora branca como a neve e olente
como uni canteiro de flores na primavera, o mais belo
templo de Deus.
Contudo, ainda é só a primeira parte da ladeira..
Ainda não estamos no fundo do abismo.

23. A lei da gravidade.

Ha uma lei de física segundo a qual um corpo


que cáe não se precipita para a terra com velocidde
igual, mas é com uma velocidade acelerada de segundo
em segundo que ele cáe no fundo a que o atráe uma
força misteriosa.
A lei da gravidade não existe só para a natureza
material, mas também para a vida da alma. No
fundo de cada alma estão ocultas espantosas forças
demoníacas que, quando, para nossa desgraça, se tor­
nam senhoras, arrastam a alma, com força cada vez
mais irresistível para as profundezas do pecado. Uma
só leviandade, a primeira queda — e a lei da gravi­
dade começa a realizar-se.
Por toda parte onde o pecado de impureza pas­
sa com os seus terríveis companheiros, o sólo lhe séca
sob os pés, as jovens cabeças que até então se man­
tinham bem erectas se inclinam, os dorsos altaneiros
se abatem, as rosas da face empalidecem, o carater se
debilita. Não ha mais sinão uma folhagem seca onde
deveríam estar flores sorridentes; não ha mais sinão
pó onde cias deveríam desabrochar no frescor.
Meu filho, cães famelicos, chacaes sanguiseden-
No declive 77

estão ocultos no fundo da natureza humana de­


caída. Não dês de comer a esses chacaes — eles têm
sêde de sangue, do teu sangue fresco e jovem. Não
desates a corrente desses cães rugidores, eles te mor­
deríam, e enodoariam a pureza de tu’alma.
"Qualquer pecado que o homem comete, escreve
S. Paulo, esse pecado é fóra do corpo; mas aquele
que se entrega á impureza peca contra seu proprio
corpo" (I.° Corintios, VI, 18).

24. Nos lagos Mazurianos.

Durante a grande guerra, o exercito russo sofreu


uma terrível derrota nos lagos pantanosos de Mazuria.
O general alemão Hindenburg, que conhecia como
a palma das mãos as menores partes daquela re­
gião pantanosa, fez metodicamente recuar as tro­
pas russas para os lagos. Mal a frente russa vacilou
e começou a deslocar-se, os Alemães lançaram-se sobre
os Russos com arrojo impetuoso. Os Russos não ti­
veram tempo de refletir, e tiveram de precipitar a
sua marcha. Diante deles os atoleiros intransponí­
veis, por detrás os Alemães que os perseguiam.
Mas a perseguição não durou muito tempo.
O exercito perseguidor parou de repente.
Como si o exercito alemão tivesse tomado raiz,
toda a tropa estacou diante do espetáculo pavoroso
ipii' se ostentava diante dela. Os Russos, que tinham
prtdido a cabeça fugindo, precipitaram-se sobre aquele
»(Mn verde jante que parecia terra firme; mas por baixo
78 A Casta Adolescência

da erva ocultava-se um pantanal sem fundo, e as


tropas alemãs lançadas em sua perseguição, pregadas
ao sólo de espanto, viram os Russos desaparecerem
numa morte tremenda: os pés, as pernas, o corpo.
Depois surgiram as mãos; semblantes decompostos
pelo terror. . . uivos assombrosos. . . gritos de so­
corro que davam arrepios. . . Nem uma só alma que
pudesse ajudá-los. E o abismo arrastou-os para o
fundo.

Pensa, meu filho, no que ha de ser dum jovem


que põe o pé no pantanal lodoso da impureza, e se
afunda nas profundezas do abismo.

http://alexandriacatolica.blogspot.com
http://alexandriacatoiica.blogspot.com

Q U A RTA PA R TE

NO FUNDO DO ABISMO

“ Nem siquer se ouça dizer


que haja entre vós fornicação,
impureza de qualquer so rte ...
tal como convém a santos. Na­
da de palavras deshonestas, nem
chocarrices, nem gracejos gros­
seiros, coisas essas todas que
são impróprias ”.
(S. P aulo, Epístola aos Eíe-
sios, V, 3 e 4).

“ A parte dos impudicos é


no tanque ardente de fogo e
de enxofre”.
(S. J oão, Apocalipse, X, 8).

Não ha adolescente a cujos ouvidos não resôem,


mais cedo ou mais tarde, os cantos sedutores ou as
palavras exigentes dos desejos sensuaes. A sua sã ra­
zão, a sua alma honesta, o seu coração puro, o seu
idealismo, tudo isso protege-o, defende-o contra a
queda; a sua concíencia — qual sino de alarme —•
não cessa de clamar-lhe no peito; “Não o faças, não
80 A Casta Adolescência

o faças!", e no entanto eis que se faz ouvir diante


dele o canto de sereia dos sentidos, cativante, feiti­
ceiro, encantador, e os desejos sensuaes cegam a pobre
alma que luta com a alegria momentânea dos gozos
que se oferecem. O que sucede após esse instante em
que te engolfaste, o que perdeste, o que te aguarda, o
que te arruina o sistema nervoso, te suja e te enfraque­
ce o carater, — de tudo isto não entendes nada, tudo
isso te está oculto. Do mesmo modo que, no cinema,
nossos olhos se prendem ao filme que passa na téla
e naquelle instante nada mais vemos ao redor de nós,
assim também o desejo dos gozos sensuaes cega o
jovem, e ele não pensa mais em nada, não cuida mais
de nada, ségue cégamente.
Desce a ladeira.*. .
Ai, porem, daquele que desce a ladeira!

2 5 . O carvalho partido.

Não ha no mundo prazer, gozo mais efemeros


do que os frutos da impureza; mas também não os
ha mais caros, pois o homem os paga ao preço de
seu corpo e de sua alma. Sem o menor exagero, quero
descrever diante de ti, em toda verdade, a triste sorte
desse jovem. Talvez este quadro te pareça incrível.
Pensarás que elle é exagerado; um só pecado, o pecado
de impureza, não pódc entretanto ter tão pesadas con­
sequências; miséria tão incomensuravel não póde en­
tretanto resultar dum só pecado! Meu filho, o que
escrevo aqui não é nem síquer um quadro completo
Xo fundo do abismo 81

di ruína imensa e da ruína fisica e moral que a im­


pureza acarreta muitas vezes sobre toda uma vida
lmmana, mesmo sobre a vida de gerações inteiras, em
resgate de alguns instantes de prazeres sensuaes.
Não pretendo que o pecado solitário acarrete a
ruína do organismo fisico. Qualquer, porém, que seja
a idade do escravo desse pecado, o sistema nervoso é
abalado, e quanto mais jovem fôr ele, e quanto mais
fortemente cair sob o jugo do pecado, tanto mais
rapidamente lhe é arruinada a força fisica.
Em todo caso, a ruina da alma é absolutamente
segura. M esmo no jovem de organismo fisico o mais
robusto, a alma sofre indizivelmente sob o efeito do
pecado. Meu filho, não te deixes iludir pela aparência
robusta de tal pecador. O rosto *dele póde persistir
roseo, a sua força não parece diminuída, porém o
vigor da sua mente certamente é minorado, a sua me­
mória é enfraquecida, as suas faculdades intelectuaes
são reduzidas. O espirito geme sob esse montão de
ruínas, e a alma, chamada a reinar, definha sob o
jugo miserável das paixões. Esse pecado é enganador
e traidor. Com um sorriso astuto promete-te céu e
terra — emquanto o não cometes; e despoja-te da
mais santa joia de tua alma, deixando-te nas torturas
do desespero — quando te abaixas a te lbe tornares
escravo.
E o que é talvez o mais triste de tudo é que
esse pecado é dificílimo de curar. Aquele que o co­
meteu um certo tempo, vê a própria alma tornar-se
tão insensível a toda influencia moral, que as pala­
vras súplices dum pai amante, ou as palavras cheias
82 A Casta Adolescência
de autoridade dum sacerdote, resvalam sem efeito
sobre ele. A vontade desse jovem está aniquilada.
Desde a manhã ele perde um tempo precioso até se
decidir a sair da cama. Quando se põe ao trabalho,
reflete longamente si quer começar. Bocejando, folhea
ora um livro ora outro, mas não estuda, é incapaz
de tomar uma resolução séria. A's vezes suspira com
franqueza: “Ah! si fôsse assim!” Ele bem quisera não
ser assim, mas não faz nada para isso. E’ como um
soldado em imagem: brande sempre a espada para
ferir, mas nunca fére. A ’s vezes, após algum aconte­
cimento maior na sua alma, ele se comove subita­
mente: “Agora vou emendar-me. De agora em diante
tudo vae mudar”. E depois nada muda; o foguete é
lançado, e depois a escuridão é maior. Esse jovem não
póde ser salvo, porque ele proprio não quer mais ser
salvo.

26. “ Uma vez só?” .

No capitulo precedente viste o jovem na trilha


do primeiro pecado. Póde ser que só a curiosidade o
tenha impelido pela primeira vez a esse declive; e
ilusão enganadora: “Farei isso uma vez”, uma vez
só, para fazer a experiencia. Ele não sabe que o pri­
meiro pecado é o mais difícil; o seguinte ocorre mais
facilmente, e finalmente o carro desce irresistivelmente
a ladeira.
Todavia, não creias que, si as tentações fôrem
violentíssimas e te assediarem quasí vitoríosamente,
devas finalmente ceder-lhe, para que elas te deixem
No fundo do abismo 83

tranquilo. Ha jovens que acreditam libertar-se da ten­


tação cometendo o pecado. Que terrivel ilusão! O
primeiro pecado de impureza enche-lhes a imagina­
ção de imagens obcenas que lhes penetram na me­
mória com tanta força e tão depressa provocam no­
vamente ao pecado, que já se não póde cogitar de
trabalhar agora. Só agora o inditoso jovem com­
preende que os chacaes famintos que surgiam dentro
dele antes do pecado estavam, não obstante, acorren­
tados, ao passo que o primeiro pecado os soltou e
lhes açulou as exigências atrevidas. Os leõezinhos
não são perigosos enquanto não veem sangue; porém
si um dia provarem carne fresca, acabou-se. Tornam-
se féras sedentas de sangue.
“Uma vez só, para saberes!”, diz a tentação
antes do pecado. Mas, si lhe obedeceres, ela acres­
centa: "Agora que começaste, pouco importa quantas
vezes o faças”.
Sê, portanto, forte desde o primeiro instante,
porque “se engana aquele que acredita que, si se mos­
trou covarde na juventude, poderá tornar-se na idade
d'homem um carater de tempera.
O remedio chega tarde demais, si já gemes na
escravidão dum longo habito.
Quem é que póde dizer quando começa o outo­
no? Primeiramente algumas folhas cáem das arvores,
depois os galhos são desnudados, e eis que de re­
pente um vento de inverno assobia através das ar­
vores da floresta. E ’ assim que avançamos no pecado,
quasi sem reparar, indo dum pequeno a um maior.
Ai daquele que brinca com o pecado solitário ou com
84 A Casta Adolescência

as relações sexuaes, e quer fazer "uma vez só" aquilo


que só no casamento é permitido! Ai! quantos jovens *
de alma partida têm prometido, chorando, que viam
a que destino iam e que de então por diante queriam
concentrar todas as suas forças e não mais cometer
esse pecado! A promessa deles era sincera; porém,
uma vez deixados a si proprios e surgida novamente
a tentação, a vontade deles é tão fraca que eles recáem,
por assim dizer, sem resistência, sem recurso.

27. O prim eiro passo em falso.

Como foi que o desgraçado jovem chegou ate


aí? Não foi bastante forte no primeiro momento.
Não sabia que a vida do homem c como o jogo
de xadrez, onde todo passo em falso se vinga mais
cedo ou mais tarde. Pouco a pouco as suas conversas
obcenas, suas leituras e ações tornam-se cada vez
mais frequentes, quasi um habito quotidiano. Ele não
pensa mais sériamente em tentar libertar-se deste, sua
alma não está mais inquieta, e mesmo — confesse-
xno-lo — si ele o quisesse realmente, ser-lhe-ia precisa
uma força de vontade gigantesca para poder sacudir
a escravidão dos sentidos que exercem sobre ele ver­
dadeira tirania. O habito torna-se um tirano tão ter­
rível que, quando, por ordem do medico, ele se qui­
sesse libertar do pecado solitário, teria, de alguma
sorte, que atar as mãos, pois o habito o leva quasi
inconcientemente ao pecado. Quanto mais ele céde ao
pecado, tanto mais exigente este se torna; a repetição
No 1'tirulo do abismo 85
frequente vira habito, e o habito uma necessidade. O
pecado entrou nele uma primeira vez, por acaso,
durante a noite, como um viajor; em seguida tornou-
se um visitante; e agora é o dono da casa. A lenda
grega conta que Anteu, quando lutava com Hercules,
encontrava novas forças cada vez que seu pé tocava
a terra. A paixão pecaminosa torna-se tambtm tanto
mais forte contra nós quanto mais frequentemente
noss’alma tóca o lodo e a lama. E o inditoso jovem,
ainda quando quisesse desvencilhar-se desse fardo ter­
rível, debate-se impotente sob o peso dessa maldição.
Consoante a mitologia grega, Prometeu roubou
o fogo do Olimpo, e em punição os deuses o prende­
ram num rochedo do Caucaso. Todo dia uma aguia
vinha devorar-lhe o fígado. No dia seguinte o figado
havia crescido novamente, mas a aguia voltava. . . E’
a imagem tremenda do jovem que ateou em si mesmo
o fogo da impureza; seus atos acorrentaram-no ao
rochedo da vida de pecado, e o “gozo” pecaminoso
dilacera-lhe cada dia a pobre alma. Quanto mais fre­
quentemente executa ele essa ação, tanto mais irresis­
tivelmente ruge nele a paixão: mais!, mais! Esse jo-
jcm torna-se como um tonel sem fundo; constante­
mente derramam neste agua e ele nunca fica cheio.
O pecado torna-se realmente uma necessidade vital,
como a nicotina, o álcool, o opio se tornam necessi­
dades para aquele que faz uso deles.
7 'ercivel situação : o pecado, necessidade vital!
Os exploradores da África do Sul falam duma
curiosa especie de serpentes que, por um simples olhar,
í.v in.Mii os passaros. Essa serpente olha simplesmente
86 A Casta Adolescência

a sua vitima, c o desventurado passaro salta algum


tempo de galho em galho, mas é em vão, não póde
resistir, tem incessantemente que olhar para os olhos
da serpente, algo o atráe, o hipnotiza, os olhos má­
gicos da serpente captaram-lhe a vontade e ele tem
que se aproximar do réptil. . . cada vez mais p’ra
perto, até que com golpe rápido este se lance e trague
a sua presa.
Eis aí a imagem frisante da alma que se debate,
uma vez caída nas garras da impureza.
Comtudo, o infeliz talvez só tenha começado
por leviandade ou por ignorância. Em muitos jovens,
não era a principio um pecado voluntário. Pondo-se
a cavalo numa estaca, ou trepando numa arvore, ele
sentiu pela primeira vez um prazer sensual, e julgou
que era apenas um brinquedo agradavel. E quando
soube que era um pecado contra a natureza, já era
demasiado tarde; já não podia libertar-se daquele
triste habito proseguido havia anos. Outro aprendeu
talvez ainda bem pequeno, por um camarada já vi­
ciado, como podia proporcionar-se esse “gozo” . Ime­
diatamente, sem duvida, sentiu que o que o seu cama­
rada lhe ensinou não estava em ordem, que era um
pecado, pois ele nunca o faria á vista de seu pai ou de
sua mãe. A própria natureza insinou-lhe que era um
pecado, e que se fazia mister dissimulá-lo. E ele pre­
feriría cortar as mãos a deixar sua mãe, seus irmãos
e irmãs vêrem o máu habito que ele contraiu.
Já ouviste falar de plantas insetívoras, não é?
O inseto, sem desconfiança, vem pousar sobre as fo­
lhas peludas, mas desde esse instante é preso, e a folha
No fundo do abismo 87

*e fecha avidamente. Quando alguns dias depois ela


«e torna a abrir, do desgraçado inseto não restam mais
que tristes destroços; a planta sugou-lhe toda a força,
t<ida a vida. . .
Assim também, o pecado de impureza suga a
força d’alma dum jovem, que sem desconfiança, se
lhe lança nas garras.
E’ por isso que, no carater e no procedimento,
mesmo não raro na saúde fisica lhe aparecem mu­
danças tão visíveis, que lhe é impossível — embora o
queira — ocultá-las aos outros. Porquanto a aguía
já não pode voar tão bem quando molhou as asas
na lama.

2 8 , Descensus averni.

Por suas ações impuras, o jovem diminuiu ir­


remediavelmente as suas forças físicas e intelectuaes.
I-orças que, nos anos de juventude, clle deveria em­
pregar para assegurar a felicidade do seu futuro. Seus
mestres, seus camaradas, seus parentes vêem nele essa
grande mudança, como num ano ou dois aquele jo­
vem tão vivo, tão vigoroso, tão inteligente, mudou,
em seu desproveito. Veem-no e se admiram.
Admiram-se de que ele, que era ate então um
bom, quiçá um excellente aluno, decline lenta mas
continuamente. Ele que estava dantes entre os pri­
meiros, agora, nas classes superiores, não leva mais
bóas notas para casa. Sem duvida mantem-se tran­
quilo na aula, mas quem lhe olhar nos olhos bem
eí que o seu pensamento revolutêa ao longe. D u­
88 A Casta Adolescência

rante a lição os olhos lhe são perdidos no vago. Ele


arma planos de divertimentos para a tarde. Si é in­
terrogado, córa subitamente e se sobresalta. Vê-se
que ele tem de reconduzir de longe as suas idéias. O
menor trabalho intelectual fa-lo suar.
Em seguida, torna-se mais tibio nas relações
com seus bons camaradas de dantes. Responde-lhes aos
gracejos mais inocentes. Tem só um ou dois confi­
dentes; os que se lhe assemelham. Mas com estes, cm
cada recreio e no caminho da escola para casa, arma
planos em grande mistério. Si por acaso um "que não
está ao corrente” se lhes intromete no grupo, eles lhe
fazem tão má cara, que ele os deixa rapidamente.
Em qualquer coisa que diga o professor, não
lhe acha ele mais interesse. Quando o quizesse, não
podería mais refletir bastante tempo num assunto.
O director, que o conhece e o ama ha anos, verifica
com espanto surpreender frequentemente em flagrante
delito de mentira aquele aluno dantes tão franco.
Ai! aquele cuja alma está esmagada por um grande
pecado, não se preocupa mais com os pequenos. O
olhar não se lhe turva mais, o rosto já lhe não córa,
quando ele mente. Ele proprio sente o quanto é
suja a sua vida intima; é por isto que mente, que
mente sem cessar, para que diante das pessoas possa
ao menos guardar as aparências duma vida honesta.
Mente constantemente aos camaradas e mestres, tal
como aos pais em casa. Efetivamente, a franqueza é
filha da pureza d’alma, e a mentira é irmã da im­
pureza.
Mas, com a franqueza, desaparecem ao mesmo
No fundo do abismo 89

tempo as outras virtudes da juventude: a prestabi­


lidade, a candura, a gratidão, o apêgo, o entusiasmo
pelo belo e pelo bem. De feito, a pedra de tóque da
firmeza moral é justamente a pureza de vida. Sem
ela a alma caminha para a sua perda. Que vale uma
maçã vermelha, si um bicho a róe no interior? Que
vale um ataúde dourado cheio de podridão? Todo o
carater do jovem torna-se grosseiro, a sua fineza de
antígamente desaparece como o perfume da rosa cujas
folhas fôram quebradas por dedos grosseiros.
Ele vegéta sem fito nem vontade.
Perto de Roma estendiam-se vastos brejos até
estes últimos tempos. As suas emanações envenenavam
o ar de toda a região e tornavam doentes os habi­
tantes. Aqueles homens de tez cerulea e de olhar me­
lancólico trabalhavam com indiferença por cima da-
quellas aguas lodosas; e quando(um estrangeiro lhes
perguntava amigavelmente: Come sta? (Como vae?)
— em toda a Italia responderíam: Si vive (Vive-se)
— mas naquela triste região respondiam: Si muore
(morre-se).
Si muore, si muore! poderiam dizer de si pró­
prios muitos jovens.
Mas é natural. Os carvalhos não medram de­
baixo dos túneis e as rosas não desabrocham em
socavões escuros. Quando muito aparecem aí algumas
plantas acaçapadas que definham no meio de insetos
horrendos. “Aquele cuja alma está cativa — escreve o
«onde Estevão Széchenyi num capitulo do seu
"diário'’ — não vê florescer em si as virtudes moraes,
c cada um dos seus passos deixa a marca dum prazer
90 A Casta Adolescência

insípido’’. E’ por isto que o semblante, dantes riso­


nho, do menino, se entristece. D 'aí as rugas daquela
jovem fronte. Ah! que tristeza o vêr começar a em­
palidecer o delicioso arco-iris!
Depois, não é ele mais tão delicado a respeito
da propriedade. Evidente, para comprar as revistas
levianas, para ir ao teatro (ou ao cinema, sobretudo
quando o cartaz reza: “proibido para menores de
dezesseis anos), é preciso dinheiro, e a mãe se queixa
sem cessar de que hoje em dia os criados são ladrões.
Tais jovens naturalmente não pódem mais
achar prazer no estudo e nos trabalhos sérios. São
incapazes de receber novas impressões inteletuaes
(portanto de estudar sériamente, de fazer progressos).
A sua sensibilidade se embota, se enfraquece, e em
breve dá lugar á dureza. Eles estão bem perto do
desespero. Não conhecem mais a alegria que propor­
ciona o trabalho. A sua atividade está quebrantada,
eles não pódem mais concentrar as ideas num escopo,
e não progridem em nenhuma carreira. A sua ima­
ginação está exclusivamente ocupada com representa­
ções obscenas. Eles não têm mais interesse por outra
coisa. A sua energia está paralisada. A sua vontade
não passa dum fantoche. Eles se tornam jovens co­
vardes, mentirosos, hipócritas, sonsos, sem carater.
Por onde quer que passem, sente-se após eles um inco­
modo. Nas paredes, nos livros, nas privadas, nos ga­
binetes de banho, em toda parte deixam eles dese­
nhos obscenos. São de insuportável nervosismo, e o
seu cerebro é atravessado por idéias insensatas.
Não póde ser doutro modo. Dizei a um fogo ar­
No fundo do abismo 91

dente que não queime; — não o póde. Dizei a um


mar impetuoso que fique liso como um espelho; —
não o póde. O ladrão toma aos outros; mas o im-
pudíco rouba a si proprio ; rouba os seus tesouros
mais preciosos, despoja-se da sua força d’alma. "Des-
census A verni” . . . Está no caminho do inferno. . .

2 9 . Os alunos “ao corrente

Mas quando o carater está inteiramente arruina­


do, e as boas qualidades desapareceram umas após
outras, chega a "dissolução” moral total, e a própria
incredulidade.
Si a coisa não fôsse tão grave e tão funesta, a
gente teria vontade de rir em ouvindo garotos zom­
barem e falarem com meneios de hombro, da moral,
da religião, de Deus, ou então das coisas ante as
quais os melhores e mais eminentes representantes da
humanidade sempre se inclinaram com o maior res­
peito. Entre os alunos dos liceus não suscita mais
admiração si tal ou tal dos seus camaradas proclama
abertamente que o professor não o “engana" mais,
que ele está “ao corrente”, que "aprendeu muita
coisa” , que não ha nem céu nem condenação, nem
Deus nem alma imortal.
Que pódem ser, pois, “essas coisas” que apren­
deu esse adolescente feito incrédulo, e que não são
conhecidas dos representantes mais ilustres das ci­
ências naturais e das demais ciências? Porquanto os
chefes intelectuaes da humanidade também estudaram
e aprenderam alguma coisa, não c verdade?
92 A Casta Adolescência

Lembro-me do epitáfio que o ilustre inventor


Franklin compôs para si mesmo. A tradução dimi-
núe-lhe um pouco a magnitude, mas nestas poucas
linhas acha-se um pensamento sublime:

A q u i jaz, pasto dos vermes,


O corpo de Benjamin Franklin,
Com o a capa de um livro
A que arrancaram as paginas.
Mas esse livro, ele o espera,
N ão se perdería eternamente;
Porém, revisto e corrigido,
E m edição nova e mais bela
Reaparecerá um dia a lume.

Aquelle que espera inabalavelmente após a sua


morte uma vida nova, mais bela, não é um incrédulo,
não é exato?
E depois, um Kcpler, um Newton, um Boyle,
um Linné, um Herschel, um Leverrier, um Fresnel,
um Fraunhofer, um Foucault, um Faraday, um La-
voisier, um Liebig, um Pascal, um Ampère, um Gal-
vani, um Volta, um Pasteur, etc. (cujos nomes ilus­
tres encontraste no curso dos teus estudos secundá­
rios) não sabem porventura tanto quanto teus ca­
maradas do segundo ano? Como é então que esses
homens, todos sábios de renome mundial, eram crentes
de fé robusta, e alguns até fervorosos catolicos, ao
passo que teu camarada teria sido levado á incre­
dulidade pela ciência?
Como é que Pasteur, por exemplo — para só
No fundo do abismo 93

citar um — pôde dizer um dia: "E' porque eu es­


tudei muito que tenho a fé dum camponês bretão;
c si mais tivesse estudado, teria a fé da camponesa
bretã” ?
Não, não foi a ciência que levou teu camarada
á incredulidade, não é verdade? Que ciência pôde lá
haver numa cabeça de quinze anos?
Mas eu bem sei que ha grandes sábios que se
declararam incrédulos. Não o nego; ha-os com efeito.
Mas sou curioso de uma coisa. Sou curioso do dia do
juizo final, que tirará o véu dos nossos pensamentos
mais ocultos. Como ficaremos estupefactos de reco­
nhecer tantos escravos do pecado que, durante a vida,
sustentavam que não podiam fazer concordar os “re­
sultados da ciência” com os ensinamentos da fé, e
que só por esta razão se haviam tornado descrentes!
Não, meu filho, a própria ciência nunca é perigosa,
- só os que a ensinam é que o pódem ser. A ciência
séria leva sempre a Deus; mas o coração corrompido
afasta dele.
São tão verdadeiras estas palavras da Sagrada
I íscritura:
“O homem natural não percebe as coisas do
Espirito de Deus"! (I Corintios, II, 14.)

30. Porque ê que “ não ha Deus” ?

Foi a corrupção do coração que levou teu ca­


n a rada á incredulidade. Essa contradição contínua
<i=i« ellc acha entre a fé e sua própria vida, o remorso
94 A Casta Adolescência
perpetuo que ele sente n’alma, a angustia incessante
a este pensamento: Si ha um Deus, si ele me pedir
uma dia conta dos meus atos, dos meus pensamentos,
ái de mim! Como seria bom que não houvesse Deus...
Talvez não haja. . . Sim, não ha, não. . . não ha
Deus.
Posso dizer com toda certeza que, si as leis mo­
raes graves e austeras emanassem não da religião, po­
rém da algebra ou da física, ninguém no mundo seria
descrente, antes, pelo conrtario, haveria alguns para
duvidar dos princípios da algebra e da fisica, em
nome do "progresso”.
Que a incredulidade seja a resultante da deca­
dência moral, é uma averiguação provada pelo fato
de a descrença andar de parelha com os anos de ju ­
ventude, com a idade das paixões, e desaparecer com
estas ultimas. A criança não é descrente; sente-se
mesmo tão feliz com Deus! O velho quasi não é
descrente, a religião e a fé são-lhe a ultima esperança.
Mas o entre-tempo é a época procelosa das paixões, á
qual convém bem esta afirmação de Pascal: “O co­
ração tem razões que a razão não conhece”. Sim,
o coração corrompido póde ser incrédulo, mas a razão
esclarecida nunca o é. Ninguém fica ateu, mas só
aquele que tem razões para que não haja Deus.
O jovem que na idade do seu desenvolvimento
fisico sabe conservar a pureza de sua alma, permanece
isento de duvidas contra a fé. Mas, em compensação,
confesso que aquele que leva uma vida impura, não
tem mais gosto pela oração, acha incomodas as pra­
ticas religiosas, depois a religião no seu conjunto, e
No fundo do abismo 95

finalmente perde a fé. Infalivelmente tem que perder a


fé. A ruína moral que se produz dentro dele, a sua
vida depravada, ele se esforça por justifical-as com
0 auxilio de maximas filosóficas, de livros, de so-
fismas, de teorias cientificas; busca nos livros, como
consequência, uma justificação teórica do seu ateísmo,
ateísmo que, em face do Deus santo que pede a cada
um de nós a santidade, ele já pratica ha muito tempo
por uma vida de pecado,
A vida pura não é só uma consequência, mas
também uma condição da fé. Para que a razão não
se torne pagã, é necessário que o coração já o não
seja antes. “Conservai voss’alma em estado de desejar
a existência de Deus, e não lhe duvidareis da existên­
cia” , (Rousseau).
Já ouviste o que dizem do avestruz? Quando
ele é perseguido, esconde a cabeça na areia, e, como
não vê o seu inimigo, crê que este não existe. Não
sei si esses jovens “descrentes” não escondem a ca­
beça diante de Deus: não vêem a Deus, não querem
vêl-O; mas isto não quer dizer que de fato não ha
1 >eus. Quantos jovens não se compelem realmente á
descrença, unicamente para não serem obrigados a
mudar de vida? Porque é que o pecador não quer
pensar cm Deus? Porque sente que contraiu grandes
dividas para com Deus; cada qual evita ansiosamente
a rasa do seu credor.
Contrariamente, o jovem de alma pura como
um lirio manifesta uma fé ardente, porque repousa
•l>n- o peito do Senhor Jesus. Um grande conhece­
do r da humanidade, La Bruyère, escreveu (Caracté-
m A Casta Adolescência

res, 16) : "Eu quizera vêr um homem sóbrio, mo­


derado, casto, equitativo, pronunciar que não ha
Deus; falaria pelo menos sem interesse: mas esse ho­
mem não se acha” .
Para quantos jovens se tem renovado literal­
mente aquilo que o celebre escritor François Coppée
escreveu, após a sua conversão, no prefacio do seu
livro "Dôr bendita” : Fui educado cristãmente e, de­
pois da primeira comunhão, cumprí os meus deveres
religiosos durante vários anos com ingênuo fervor.
Fôram, digo-o francamente, a crise da adolescência e
a vergonha de certas confissões que me fizeram re­
nunciar aos meus hábitos de piedade. Muitos homens
que estão neste caso conviríam, si fôssem sinceros, em
que o que os afastou primeiro da religião foi a regra
severa que ella impõe a todos, do ponto de vista
dos sentidos, e que só mais tarde foi que eles pediram
á razão e á ciência argumentos metafísicos que lhes
permitissem não mais se incomodarem” .
"Bemaventurados os que têm o coração puro,
porque verão a Deus”, disse Nosso Senhor. E os que
têm o coração corrompido? Só verão do mundo os
gozos sensuaes, a podridão, as espurcicias, as libertina-
gens, as batalhas.
"Senhores, dizia o ilustre escritor Chateaubciand
numa sociedade cultivada; ponde a mão no coração
e dizei-me por vossa honra; não terieis a coragem
de crêr si tivesseis a coragem de viver castos?"
Cada vez que ouço falar dum jovem descrente,
do seu “juizo esclarecido”, sou obrigado a me lem­
brar desta palavra de Santo Agostinho: Nem o incre-
http://alexandriacatolica.blogspot.com
No fundo do abismo 97

dulus, nisi impucus. Ao moço descrente posso dar,


com toda tranquilidade este conselho de Pascal; "Si
quizerdes ficar convencidos das verdades eternas, não
multipliqueis as provas, mas estirpae as vossas
paixões” . Rom pei com o pecado —■e amanhã teceis
uma fé robusta.

3 1 . Será alegria? Será felicidade?

E agora és ao menos feliz, meu pobre amigo?


Pagaste-a bem caro, mas adquiriste a felicidade. D i­
ze-me, é certo? Dize-me a verdade, és feliz?
E respondes: "Sou, Quando menos vi alguma
coisa da vida”.
Devagar, meu filho, devagar. Não; não o creio.
Tú te logras a ti mesmo. Não és franco para con­
tigo mesmo. Porquanto, si és feliz, porque é que em
certas horas um aborrecimento inexprimivel te invade
a alma? Horas em que não pódes achar prazer em
nada, absolutamente em nada. Em nada deste mundo.
Porque é que ficas tantas vezes sentado diante dos teus
livros, com olhos perdidos no vácuo? Não te atingem
dúvidas o coração? Passas na fronte palida uma mão
cansada e tremula: querias levar "vida alegre” ; e
porque estás agora tão triste? Que vácuo é esse aberto
rui tu’alma, essa cabeça tristemente pendida, essa se­
cura inconsolável? Que é esse soluço, de fender o
«oração, que se parece com o chôro duma ave? Da
«ara avezinha que se chama "vida pura” e que, em-
quanto não fôra expulsa do ninho bem quente de
98 A Casta Adolescência

tu’alma, espalhava, com seu meigo gorgeio, a alegria


na tua vida. Bem vês, em certos momentos, que ‘‘no
teu passado não ha alegria, nem esperança no teu fu­
turo” . Porque assim é? Porque com uma das mãos a
impureza dá um gozo de um instante, mas com a
outra nos rouba, em troca, uma coisa mil vezes mais
preciosa.
E que é da tua energia? Da tua actividade que te
insinuava ao ouvido: "Sê livre” ? Pois bem! eis-te
livre, alforriado das leis do Creador, porem escravo
das tuas paixões. Vês como teus camaradas sabem rir
alegremente? Si pudesses uma bôa vez ser franco para
contigo mesmo! Si reconhecesses com franqueza que,
buscando a alegria em caminhos interditos, em vez
da alegria bebeste, na tua cegueira, todo o fél dos
infernos!

3 2 . A arvore roida pelos vermes.

Não é esse ainda sinão o primeiro castigo do


pecado de impureza. A ruina da alma que fere todo
pecador, sem exceção. Esse castigo tremendo, a “mo­
léstia da falta de caráter” , nenhum pecador a evita.
Mas pódc suceder que outro castigo fira o pecado:
a punição fisica. “O salario do pecado é a morte”
(Romanos, VI, 2 3 ); a morte da alma sempre, a do
corpo também ás vezes. Ha jovens cuja constituição
forte lhes defende a saúde contra o pecado; ha-os,
porém, igualmente que, ao cabo de anos, sofrem dele
no corpo.
Já ouviste a lenda da Atlantida, aquele conti-
Xo fundo do abismo 99

ncnte tragado pelas ondas? Dizem, quando a agua


está clara, póde-se vêr, no fundo do mar, onde desa­
pareceu aquele vasto continente. Torres, cupolas, ca­
sas esquisitas assustam o navegante que passa por
cima, c o coração lhe freme em vendo surgir assim
do abismo a misteriosa beleza dum mundo devorado.
Na vida de quantos jovens essa triste lenda não
i uma terrível realidade? Quantos jovens, de esperança
partida, choram a beleza da sua alma irremediavel­
mente perdida, tragada nos abismos do pecado.
Já te disse, meu filho, que o pecado de impu­
reza é um verdadeiro atentado contra os planos do
( ireador. Desconcerta-lhe os planos. Aquele que co­
mete esse pecado, afronta as leis da natureza. Mas
isto não póde fazer-se impunemente. Não é possível
transgredir impunemente as leis da natureza.
Isto nos é frequentemente atestado pelas con­
sequências fisicas que resultam habitualmente duma
vida de impureza. Todo pecado vulnéra a nossa dig­
nidade de homem, mas esse póde1também arruinar-nos
a saúde fisica. Eis aí um pecado que acha o seu castigo
neste mundo, e esse castigo é pavoroso. A justiça hu­
mana não alcança esse pecado, mas a natureza é mais
severa que os juizes desta terra. Foi por isso que os
homens fôram' tragados pelo dilúvio; foi por isso
que os habitantes de Sodoma fôram devorados pelo
l<>Ko; e é por isso que uma multidão de jovens de
hoje em dia são punidos com uma pena mais terrível
<lo que a gua e o fogo: a decadência física desde a
juventude.
Meu filho, si sentires por vízes que a tentação
100 A Casta Adolescência

é demasiado violenta, si te parecer que as considera­


ções moraes ficam impotentes ante a tempestade fu­
riosa das paixões, lembra-te, rogo-te, do que eu qui­
sera vêr escrever em letras de fôgo na tua memória:
a natureza vinga-se horrivelmente daquele que, por
uma vida impura, põe em perigo a pureza da raça
humana. A vida impura póde debilitar a saúde física,
arruiná-la, e ás vezes conduzir a um fim miserável,
levar ao tumulo em plena juventude, entre os vinte
e quatro e vinte e cinco anos.

33. Castigos físicos.

Aquele que abaixa os designios de Deus á ca


tegoría de regras dos gozos físicos, paga-o carissimo.
Estás agora cheio de confiança nas tuas jovens forças.
Agora bebes ccgamente na taça dos prazeres, e não
pensas que em breve — talvez dentro de alguns me-
zes, — chegarás ao fundo, á bôrra amarga e nause­
ante. E isto não te faz nadai1 Acreditas que pódes
fazer “grátis" grandes despesas? Breve olharás com
espanto, quando a natureza te apresentar a conta.
Porque é fato medicalmente certo que os jovens que
se casam cedo demais (aos vinte anos por exemplo)
e satisfazem assim os seus instintos no casamento —
portanto de maneira licita — morrem ordinariamente
cedo, assim como os filhos. O organismo precisa,
efetivamente, para o seu completo desenvolvimento,
da seiva que o jovem gastou no seu casamento pre­
maturo.
No fundo do abismo 101
Quanto mais delicado, complicado e desenvol-
é um organismo, tanto mais tempo necessita a
ireza para construí-lo; o corpo humano, esse or-
ismo maravilhosamente delicado, precisa de mais
vinte anos para o seu perfeito desenvolvimento,
rante mais de vinte anos a natureza trabalha dia
noite, em silencio, nessa obra-prima; e o mais im-
rtante é que o orgão que deve servir para perpetuar
humanidade possa desenvolver-se sem perturbação,
anquilamente.
Si um jovem cortasse cada semana um pedaci­
nho dos pulmões, dize-me, que sucedería com ele
dentro de um, ano ou dois? Pensa pois, meu filho,
no efeito desastroso produzido no organismo quando
um jovem excita, martiriza o orgão que deveria de-
íenvolver-se na maior calma e num repouso absoluto,
e quando na idade de quatorze a deseseis anos ele
desperdiça as jovens forças que a natuerza reunia
nele para os vinte e quatro ou vinte cinco anos, cm
mira ao casamento. Pensa em que a seiva desperdi­
çada numa vida pecaminosa era necessária para a ali­
mentação da medula espinhal e dos^nervos; pensa
em que a excitação violenta inflamada pelo pecado
no jovem organismo, e o estado convulsivo em que se
acham os nervos após o pecado, exercem uma reper­
cussão prejudicial em todo o sistema nervoso; e então
compreendes porque é que se vêcm tantas vezes hoje
cm dia jovens de tez palida, de faces encovadas, de
olhos vidrados, de olhares furtivos, de mãos tremu­
las, dc dorso curvado, jovens cujo olhar perdeu o
Irescor, sinal exterior da alma candida, jovens em
102 A Casla Adolesccncia

cujo semblante a custo achamos um trajo viril, si


bem que o rubor da juventude haja dele desapare­
cido; jovens cujos musculos estão paralisados, que
estão incessantemente fatigados, cujo sistema nervoso
está inteiramente arruinado e que estão ameaçados de
locura.
Eles trazem sobre si mesmos a marca publica da
sua impureza secreta. “E’ justiça na terra que os es-
piritos se esprimem nos semblantes”, disse Goethe, e
jámais palavras são mais verdadeiras do que essas a
proposito das forças destrutivas do ato impuro.
Nada leva tanto á tisica o organismo como esse
pecado. Qual sanguessuga insaciável, ele tira do co­
ração o bom humor, arranca do rosto as rosas da
juventude, extingue a chama nos olhos.
Efetivamente, essa perda de matéria, desperdi­
çada pelo pecador, causa no organismo um enfraque­
cimento equivalente á perda de vinte vezes outro tanto
de sangue; essa matéria é realmente a própria força
vital que — consoante a ciência medica — é absolu­
tamente necessária para o desenvolvimento interno e
externo do organismo, para a modalidade dos mus­
culos, para a força dos ossos, para o brilho dos olhos,
para a acuidade e faculdade de conceber da razão.
Eis porque esse jovens ficam pouco a pouco para trás
em tudo: tal como se modera a marcha duma loco­
motiva cujo maquinista atira o carvão á beira da
estrada, e não na caldeira.
De acordo com as ultimas averiguações medicas,
o estado da alma póde influir no do corpo. Um novo
método terapêutico, a psicoterapia, tenta precisamente
Xo fundo do abismo 10?

sobre essa base a cura do organismo. E ’ agora evi­


dente que o máu humor constante desses inditosos
jovens reage-lhes também sobre o sistema nervoso.
A tensão contínua dos nervos e o desperdício
durante anos da força vital, não pódem ficar sem
pesadas consequências. Durante certo tempo, o or­
ganismo trata de substituir a matéria perdida, mas
pouco a pouco essa substituição não se faz mais sinão
ás custas do organismo. Com efeito, nenhuma fun­
ção do nosso organismo reage tanto sobre o sistema
nervoso como o funcionamento dos orgãos sexuaes.

34. Podridão viva.


A frequentação impura das mulheres perdidas
acarreta moléstias extremamente graves. Meu filho,
a pena me treme na mão, ao descrevê-los, pois preciso
falar-te da tragédia final de tantas jovens vidas, coisa
de que talvez ainda não tenhas ouvido falar, mas
sou obrigado a fazer menção delas, para que vejas
aonde póde conduzir um só ato imprudente. Para que
não sejas — como milhares já — obrigado a maldizer
o instante em que fostes procurar um gozo pecami­
noso no antro do vicio, no meio das mulheres per­
didas.
Sabes, meu filho, que pelas relações sexuaes com
essas mulheres perdidas pódes contrair uma moléstia
• e uma só ocasião basta —- moléstia que durante
anos exercerá suas devastações no teu corpo, que setá
incurável toda a tua vida, que realmente te infectará
104 A Casta Adolescência

o sangue e — si um dia fundares um lar — passará


como herança maldita a tua esposa, a teus filhos, a
teus netos, a toda a tua descendencia, Estes a con­
trairão, e maldirão a memória de seu pai, cujas li-
bertinagens de juventude lhes deixaram tão triste he­
rança.
E sabes, meu filho, como esse mal se espalha por
entre os homens? Aquele que péca com uma dessas
mulheres perdidas está, segundo as averiguações me­
dicas, quasi certo de contrair uma ou outra variedade
das moléstias venéreas. Sabes que a sociedade honesta
actual, terríficada, procura meios de se proteger contra
o contagio, e já cogitou de fazer examinar medical-
mente os habitantes do paiz e a marcar os que são
acometidos dessa moléstia, para proteger os homens
honestos e lhes dar este aviso : fugi dos que estão
marcados com este sinal! Ha tres cspecies de moléstias
venéreas. E sabes que uma dessas moléstias, a sifilis,
faz sozinha mais vitimas entre os homens do que a
peste, o cólera e a febre amarela juntas? Entretanto,
com que pavor não pensamos na peste e no cólera,
não é verdade?
Aquele que tem justamente essa moléstia, mesmo
si consegue curar-se, abrevia a vida de pelo menos
dez anos, segundo as estatisticas das companhias de
seguros de vida.
A sifilis — chegada á terceira fase — cobre o
corpo de úlceras, dá febre, faz dôr nos ossos, irrita
os musculos, provoca atrozes enxaquecas, causa mo­
léstias de pele, das palpebras, das mucosas, dos in-
No fundo dt^ abismo 105

testínos; o doente sente-se cansado, quizeta dormir e


todavia é torturado pela insônia.
As doenças mais diversas brincam verdadeira­
mente contigo, não tens mais a menor força de re­
sistência. Si o mal continua a progredir, o céu da
bôca é perfurado pelas úlceras, não raro o osso nasal
apodrece e o rosto do doente assemelha-se a um es­
pectro horrendo. Os ossos também amolecem.
O mal peóra quando o coração enfraquece e as
artérias são tomadas; si a moléstia ataca a aorta, esta
não póde resistir á pressão do sangue, entumesce até
finalmente romper-se. E o pobre doente busca socorro
de todos os lados, quizera sarar. Parece mesmo, fre­
quentemente, que está completamente livre do seu
mal. O medico também o crê. E, de repente, — vá­
rios anos depois — quando ele talvez já nem pense
na sua moléstia de outrora, ela irrompe de novo com
violência incrivel. porque os bacilos que se acham
no organismo retomaram uma vida nova. Consump-
ção dorsal “tabes dorsal is”, loucura, paralisia, céguei-
ra chegam em seguida. E ’ impossível falar duma cura
certa e completa dessa moléstia. E o homem que na
juventude autoriza talvez as mais belas esperanças,
perece miseravelmente, como um refugo da humani­
dade e de sua familia.
Não quero falar ainda mais dos sofrimentos
atrozes que acompanham a consumpção dorsal, nem
do progresso alucinante que faz cada dia a paralisia
até sobrevir finalmente a loucura. A hí si siquer cada
adolescente visse ele proprio essa terrível tragédia antes
.1. querer pela primeira vez "proporcionar-se esse
106 A Casla Adolescência

gozo"! Um “gozo” de algum instantes em troca da


consumpção dorsal e da loucura. . . Verdadeiramente
não é bom negocio.
E não creias que eu exagero e que te quero apenas
meter medo. Não digas que, si essa moléstia tivesse
efeitos tão perniciosos, dever-se-ia ouvir dizer mais
a miúde que tal ou tal morreu. Pois é muito natural
que aquele que sofre desse mal o oculte a toda gente.
Mas essa moléstia leva as suas vitimas muitas vezes
sob nome bem diverso; só os médicos são testemunhas
dessa terrível tragédia que se desenrola entre os ho­
mens; só eles pódem dizer quantas tuberculoses, do­
enças de figado, arterio-sclerose, doenças do cerebro e
dos ossos têm tido realmente a sifilis por causa.
As velhas lendas gregas falam dum monstro de
touro c de corpo de homem que o rei Minos manti­
nha encerrado num labirinto da ilha de Créta, e ao
qual lançavam cada semana em alimento sete moços
e sete moças de Atenas. E' méra lenda. Mas todas
as devastações causadas por esse monstro fabuloso não
são nada ao lado das ruínas provocadas pelo pecado
de impureza entre a juventude atual.
Um medico francês, um dos maiores especialistas
em moléstias venéreas, dizia: "Aquele que não teme
a Deus , teme a sifilis”; e que a sifilis seja verdadeira­
mente um flagelo, sabem-no os infelizes que a con­
traíram, sabem-no ainda melhor os médicos que, em
centenas de casos e junto a centenas de doentes, têm
visto as tristes e deploráveis consequências da sifilis.
Conhecemos casos em que a sifilis hereditária
fjçou çomo que adormecida durante 30 a 40 anos,
No fundo do abismo 107

e depois despertou sob forma de consumpção dorsal


ou de paralisia.
Certamente já ouviste o nome dum dos mais
ilustres pintores do mundo, Leonardo da Vinci. Por
certo já viste uma reprodução de um dos seus quadros
mais famosos, “A ultima Ceia". Mas provavelmente
não ouvistes falar da ocurrencia terrível que se liga
a essa pintura. O artista preocupava-se com achar um
modelo para pintar, o sublime semblante de Nosso
Senhor, quando, com grande alegria sua, notou numa
igreja, entre os cantores, um jovem de maravilhosa
beleza. Pietro Bandinelli — era este o nome do jovem
— aceitou alegremente servir de modelo para o rosto
de Cristo. Semanas e mêses se passaram, pois anos
eram já decorridos, c Leonardo percorria as ruas de
máu humor, porque não achava modelo conveniente
para Judas. Procurava alguém em cujo rosto se pu­
desse lêr a celeralez sob a qual se representa habi­
tualmente Judas. Finalmente achou um jovem cujo
rosto prematuramente envelhecido revelavam a ruína
da alma. Mas quando esse homem foi posto em pre­
sença d “’A ultima Ceia” e o artista começou a pintar
o rosto de Judas, ele se poz a chorar com toda a
sua alma. O estranho outro não era sinão Pietro
Bandinelli; entregara-se a uma vida de devassidão, e,
em dois anos dessa exístencia pecaminosa, o seu sem­
blante de Cristo déra lugar aos traços de Judas. E
si só se tratasse duma mudança fisica! Mas se tratava
também da sua alma!
A h ! si as tumbas silenciosas dos cemitecios pu­
dessem falar! Essas lousas mudas debaixo das quais
108 A Casta Adolescência
o pecado de impureza encerrou prematuramente tan­
tas vidas jovens que prometiam tão belas esperanças!
Fecha um instante este livro, meu filho, e pensa,
rezando, nas palavras eternamente verdadeiras da Sa­
grada Escritura: “Si alguém destruir o templo de
Deus, Deus o destruirá. Porque o templo é santo,
e é isso que vós mesmos sois! I.° Corintios, III, 17).

35. Terrível responsabilidade.

Si ainda só perdesses a ti! Porém, do mesmo


modo que um só prazer proibido basta para que o
bacilo dessa tcrrivel moléstia se introduza em ti, assim
também milhares de perigos ameaçam igualmente as
pessoas da tua roda, emquanto eles, os innocentes.
recebem de ti, o culpado, os germens dessa moléstia
contagiosa. Pondo a tua mão contaminada na maça­
neta duma porta, ou talvez apertando a mão do teu
melhor amigo, pondo o teu lapis no bolso e outro
pegando nele depois, cortando-te o cabeleireiro os
cabelos ou barbeando-te, si antes tocou um sifilitico,
a tua colhér, o teu copo, a tua escova de dentes, a tua
toalha de mãos, tudo isso póde transmitir a doença.
Perpetuamente és um perigo temível para o teu pro-
ximo inocente com o qual a tua existência te põe
em relações.
Num colegial de quinze anos a sifilis perfurou
o véu palato e roeu as carnes entre a cavidade bucal
e o nariz. Entretanto o inditoso era puro, mas sómen­
te, durante as férias, bebera num copo de que se
No fundo do abismo 109

haviam servido uns pedreiros que estavam acometidos


desse mal.
Si ainda houvesse em ti sombra de honestidade,
<lrverias repelir tua mãe e gritar-lhe: Mamãe, afasta-
te e não me beijes, tenho o inferno dentro de mim.
"Ii quando talvez após o teu bacharelato entras em
rasa c tua mãe toda feliz te aperta nos braços, beijan­
do a transmites a tua mãe querida o bacilo dessa ver­
gonhosa moléstia. E o que torna a coisa ainda mais
perigosa é que, no inicio, a moléstia passa desperce­
bida; não se sente nenhuma dôr, muitas vezes é só
por acaso que se percebe que alguma coisa não está
direito. Sentes a responsabilidade que te pésa sobre a
alma? Ah! maldita e miserável primeira noite peca-
dora!

36. Teus pobres filh os!

E si ousares, com semelhante moléstia, fundar


uma familia? O rubor não te sóbe ao rosto em pen­
sando que, com essa triste moléstia, prendes a ti para
sempre uma jovem inocente? Uma jovem que, durante
ioda a sua juventude, sonhava com santo pudor no
seu futuro cavaleiro, de alma branca, no esposo ideal,
no caráter viril? E tú, ruina humana, preposto do
inferno, prendes a ti para sempre pelo matrimônio
essa inocente donzela, e a contaminas para toda a
sua vida, a ela cuja alma pura merecería um jovem
igualmente puro?
A vida apresenta-nos casos espantosos disto. Ha
donzelas de alma delicada que contráem algumas se­
110 A Casta Adolescência
manas após o casamento essa hedionda moléstia, e
durante anos, dezenas de anos, sofrem e deperecem,
arrastando o mais belo período da sua vida na do­
ença que apanharam junto ao esposo que viveu no
pecado antes do casamento.
E em breve terás filhos. Pobres creaturas ino­
centes, si ao menos nunca tivessem nascido! No se­
gundo ou terceiro mez da sua existência, já aparecem
os sintomas da sifilis hereditária, e na maior parte
elas morrem aos seis mezes. Ou então, si ficam em
vida, as consequências da moléstia manifestam-se
mais tarde entre os dez e os vinte anos, eles serão
magros, fracos, com os olhos doentes, e os filhos deles
também recolherão essa triste herança, e a sangrenta
maldição da tua vida pecaminosa passará ainda sobre
teus netos.
Outra doença venérea, a blenorragia, entre
outras consequências malditas, priva uma multidão
de homens do maior tesouro, a vista. Si o bacilo
dela, o gonococus, entra nos olhos, uma forte infla­
mação se declara neles, e logo depois o indivíduo fica
cégo (blennorhoea neonatorum). No instituto dos
cegos de Munich, 73,8% dos casos provêm, dc in­
fecção blenorragica. Conheço uma familia em que o
primeiro filho ficou cégo logo após o nascimento.
Quando um segundo filho nasceu, também ficou cégo
de um dia p ’ra outro. O terceiro igualmente. Os pais,
no desespero, ignoravam o que pudésse ser causa disso.
Mas quando o pai — que se havia esquecido dos seus
pecados da mocidade — se deu conta de que tinha
blenorragia, foi acometido de loucura ao pensamento
No fundo do abismo 111
tlc que os seus pecados de juventude tivessem privado
para sempre seus tres filhos da claridade do sói do
bom Deus.
Bastas vezes visitei o instituto dos cégos Joseph
Nador, em Budapest, á rua Santo Estevão, mas cada
vez que passeio pelo meio dos duzentos meninos
cégos que buscam ás apalpadelas o seu caminho, com
as pupilas queimadas e vazias, penso sempre com
horror: Meu Deus! A maioria desses infelizes me­
ninos não estariam cégos, si os pais tivessem levado
uma vida pura durante a juventude!
A multidão horrivel dos habitantes dos asilos
de alienados, de meninos idiotas, mirrados, aleijados,
dá a triste certeza das devastações causadas pelos pe­
cados duma mocidade caída no antro do vicio.
E toda essa imensa miséria, essa penúria duma
multidão de famílias, essa destruição da felicidade fa­
miliar, por causa talvez duma relação sexual interditai.
M eu filho, um prazer fisico dum instante vale
tal preço? Como tinha razão o pagão Demóstenes
de responder ao convite sedutor duma mulher per­
dida: “T a n ti poenitere non em o”. Não, não compro
um pesar tão enorme por um prazer dum instante.
E’ literalmente verdadeiro que os pecados do
pai passam para os filhos até á terceira e mesmo á
quarta geração. Mas, em compensação, aquele que
conservou puro o seu sangue, aquele que por uma
vida casta antes do casamento evitou todo contagio,
deixa só por isso aos filhos uma herança maior do
cpie si lhes legasse milhares de contos. “Quando meu
filho me olha com seus olhos claros — escreve-me
112 A Casta Adolescência

um pai dc família — quanto o meu coração sc enche


de alegria á vista do seu corpo robusto e da sua agi­
lidade, quando se entornam sobre mim a sua graça e o
seu frescor infantis, então não lamento nem um ins­
tante o haver lutado durante anos, pois sei que não
foi só para minha própria vantagem, mas também
para a geração seguinte, que eu fiz o que era digno
das minhas penas e suores".

37. Esperanças partidas.

Uma manhã eu contemplava a Tisza; uma


onda de agua lodosa corria ao longo das suas mar­
gens. Donde vem esta massa de lama? — perguntei-
me. Não tinha chovido entre nós, nem em parte
alguma na região, havia vários dias. Foi só no dia
seguinte que lí no jornal que bem longe de nós, na
fonte da Tisza, tivera lugar uma violenta borrasca,
e o rio rolava consigo a lama e a vasa que achara lá
bem longe, “na sua juventude” , quando ainda não
passava dum pequeno córrego insignificante. E de
nada servira que no seu curso médio e inferior ele
não tivesse recebido nenhuma lama nova. E ele não
pudera reencontrar a sua pureza, malgrado as aguas
claras dos seus afluentes.
Meu filho, eis ai uma imagem infinitamente gra­
ve da vida manchada pelo pecado nos anos de juven­
tude e de que o homem maduro não póde mais apa­
gar a mancha. Rogo-te, guarda a lembrança dela; é
muito mais facil conservar pura a própria alma do
No fundo do abismo 113

que lavar, para fazel-a alva como a neve, uma vida


ouirora manchada.
Desde que as primeiras edições do meu livro se
tRpalharam entre os estudantes por todo o paiz, o
correio não tem cessado de me trazer cartas dos meus
jovens leitores. Após a leitura de algumas elas quasí
mc têm caído das mãos, e só tenho tido força para
olhar para o Cristo que está aqui na minha mesa de
trabalho.
“Senhor Jesus, vinde em socorro dessas pobres
almas em desespero!”
Que misérias! Que lutas! Que tragédias! Que es­
peranças partidas! E a maioria chóra o seu primeiro
passo em falso, os primeiros mezes em que eles apren­
deram a conhecer o pecado e em que não havia nin­
guém ao pé deles para retê-los no declive!
Eis aqui sem alteração algumas dessas cartas;
•penas suprimi os nomes dos seus autores. Faça o
Céu, meu filho, que nunca sejas obrigado a escrevê-las
semelhantes.

M o n sen h o r,
Não sei por onde começar. Uma força irresistí­
vel impéle-me a escrever. Monsenhor, escute-me. Vou
•.dvez explicar-me um pouco longamente, porém si
V Rcvma. me escutar, restituirá a felicidade e a es-
pt.mça a uma alma quebrantada.
Lu era a esperança de minha mãe, que é viúva.
' '".indo deixei a casa, ha dois anos, ela me beijou e
i •hii ao bom Deus que me tomasse sob a sua pro-
1! o bom Deus me veiu em socorro. Ha tres
.... . minhas notas eram excelentes. E este ano? Meu
114 A Casta Adolescência

Deus, fui reprovado em tres matérias. E Porque?


Caí em poder dum pecado, duma maldição de que
não sei como dizer o nome tão triste. Tornei-me es­
cravo dele. Ele se apossou das minhas forças, de todo
o meu sêr. Durante as férias de Natal, vi em casa de
um amigo — que Deus o abençoe — o seu livro.
“A Casta Adolescência”. Lí-o, Monsenhor, que foi
que sentí? Minh'alma estava em efervescencia. E sob
a influencia desse livro tomei uma santa resolução.
Esse bando de alvura de lirio acolher-me-á talvez
também, por mais indigno que eu seja, entre seus
membros. E tive forças p ’ra isso; já estamos em abril,
e não pequei mais uma só vez, desde que tive seu
livro em mão, e o tenho ainda hoje.
Temos aqui uma vida bem triste. Muitos jo ­
vens escrutam os mais profundos mistérios da natu­
reza. Vários já lêram seu livro, e tomámos esta santa
resolução: não, não, nunca!
Monsenhor, escreva-me. Minha carta é desali­
nhada, mas o meu estado d’alma é semelhante.
Escreva mesmo só algumas palavras. Fará a felicidade
duma alma.
A carta seguinte é dum aluno que havia esque­
cido as minhas lições.

M o nsenhor,

Lá fóra o vento Norte silva nos galhos desnu­


dados, cá dentro o fogo crepita, e eu, com olhos
febris, revolvo o meu passado. Procuro o meu bom
humor de dantes, procuro o meu antigo timbre de
voz, a imagem sorridente dos meus camaradas, pro­
curo a primavera florida da minha vida.
Como isso está longe! Depois, manchas parda-
centas e sujas vieram desbotar o azul celeste da mi­
nha vida, meu rosto murchado envelheceu prematu­
No fundo do abismo 115

ramente, a minha voz cristalina se quebrou, e, ai!,


as brancas flores da primavera caíram na lama.
Gosto de arrancar-me a esta grande desolação que
quasi sufoca com seus braços gélidos, e de andar pelas
campinas floridas do passado. E’ como si fôsse
hontem . . . E já me sinto velho, bem velho, aos vinte
e dois anos.
Do meu cofre de cartas sinto sair como uma
aura do tempo passado. Como os fragmentos em côr
dum caleidoscopio, desfilam diante de mim, em fan-
tastica variedade, os meus sonhos e projetos de futuro,
agora todos desaparecidos. O vento Norte passou
depois sobre o campo semeado da minha juventude
e carregou tudo.
Uma carta de V. Revma., Monsenhor, acha-se
nele. E é essa carta que me faz tomar da pena. Não
posso resistir ao desejo de escrever-lhe alguma coisa
a respeito da minha imensa angustia. Si ao menos eu
o tivesse feito mais cedo! Mas eu não ousava des­
vendar a outrem as nódoas de minh’alma. Entretan­
to bem sabia que V. Revma. me mostraria com amor
a estrada que conduz a uma vida nova. Mas não
tinha mais força p ’ra isso. Cada vez mais me pusera
a amaldiçoar os homens, o ar, a luz. Andam como
alguém que, vendo flores num pantano, adianta-se
para colhê-las, e pouco a pouco se sente afundar len-
tamente no abismo.
Ah! si alguém me tivesse agarrado com mão
lirme e me tivesse conduzido á piscina de Siloé, para
que eu avistasse a estrada que leva á felicidade! Mas
não, não havia ninguém. Toda a minha vida fiquei
m> E’ verdade que, no meu orgulho insensato, não
pedí o auxilio de ninguém; queria libertar-me a mim
pioprio. Queria, ai! quantas vezes quis! Porém o
fumo do sacrifício da minha vontade nunca chegou
116 A Casta Adolescência

até o céu. Algum obstáculo tornava a atiral-a sempre


na lama.
Com a confiança dum antigo aluno, volvo-me
para V. Revma., Monsenhor, para lhe pedir conselho!
Só lhe peço algumas linhas, mas essas poucas linhas
— acrcdito-o — darme-ão uma força nova, como um
copo d’agua fresca a um viajor morto de sêde.

Eis aqui uma terceira carta:

M o n senhor,

Não sei como exprimir os meus sentimentos de­


pois de Iêr a obra intitulada “A Casta Adolescência"
e refletir no que nela é dito. Bem mais, ouso escrever
esta carta com escrita agitada. Poder falar! Que fe­
licidade! Um livro que leva ao arrependimento e á
conversão. V. Revma. sabe, o que eu desejo dizer
com isto. . . “Ah! quantos jovens têm soluçado de­
sesperadamente no silencio da noite, porque ninguém
os avisara das consequências terríveis desse pecado. . . ”
Oh! como é verdade! Eu também tenho sofrido. Ge­
mia sob o jugo desse funesto habito que um des­
graçado me ensinara.
Ah! Monsenhor, dê um conselho a um pobre
moço que de ha muito tempo procurava o caminho
da salvação e o achou graças ao seu livro!
Eu, Monsenhor, que dantes aprendia, trabalha­
va tão bem, envergonho-me de ter podido, por um
prazer dum instante, abandonar a minha bela tare­
fa. . . Mas onde quer que a paixão lavra, a razão
emudece, não é exato?
Na esperança duma resposta, etc. . .

Mais outra carta:


No fundo do abismo 117

M e u c a r o P a i e s p ir it u a l ,

Meu quarto ecoa ainda dos meus soluços, as


paginas do vosso livro bemdito ainda estão molhadas
das minhas lagrimas, a pena recusa ainda obedecer-
me aos dedos, respiro ainda com dificuldade, agora
que tento traçar estas poucas linhas, porém si V.
Revma. as julgar dignas disto, leia-as. . . escute-me.
Ah! meu Pai, como direi? ha cinco anos houve
em minha vida um instante maldito. A corda me­
lodiosa do meu violino partiu-se. O carvalho esbelto
que prometia tanta coisa partiu-se ao meio. A escu­
ridão invadiu o céu da minha vida. Ah! si ao menos
essa escuridão tivesse sido total! Ah! si ao menos o
carvalho tivesse sido quebrado em dois troncos, talvez
não tivesse havido tanta amargura, tantas lagrimas.
Mas são só continuos estalidos. Ha tanto tem po. . .
ver o céu da minha vida anuviar-se!
Porém o mais triste é que eu sabia o que é o
pecado. Sabia que ha alguém que podia socorrer-me,
que Nosso Senhor Jesus Cristo me oferecia a salva­
ção. Mas ai! não pude agarrar-me a ele, e no entanto
não houve uma só quéda que não me tivesse logo
inquietado, e á primeira eu já dizia: é “a ultima” .
Mas ái! ái! não tive força.
Ah! meu Pai! Meu Pai espiritual! Não desde­
nhe, si lhe dou este nome, aquele a quem já múltiplas
vezes V. Revma. lançou o salva-vida e que. perdido
cm aparência, se debate num pelago assustador.
Minha chaga ardente já se abranda ao pensa­
mento de já haver eu podido fazer-lhe a confissão
nalgumas palavras truncadas (o que a ninguém havia
ou feito até aqui).
Desde que cometí esse espantoso pecado, ime­
diatamente mesmo, não pqde mais ser franco para
iom ninguém. . . evitei a sociedade das pessoas ho­
118 A Casta Adolescência

nestas, não me sentia á vontade com elas; nos meus


estudos, não me adiantava um passo; não estava con­
tente com coisa alguma, minha vida não era mais
que uma luta terrível; si não me enforquei, si lhe
não puz o ponto final, foi porque bem longe na
minha cara Transilvania, uma mãe amante pelo ca­
minho (ah! si ela soubesse!), mas é bom que ela
não o sabia, seu coração poderia fender-se, enquanto
eu lhe escrevo que vou bem. . .
Fiz-me escoteiro, na esperança de mc sair da
dificuldade, mas não, não me sentira á vontade no
meio daqueles rostos ainda radiantes. Não me atrevia
a entrar no lar paterno. . . não me sentia bem em
parte alguma, e agora, agora longe da minha terra,
do meu caro paiz, próstro-me diante de Deus c bal­
bucio com reconhecimento os louvores do seu santo
nome, porque, por intermédio da mão e da pena de
V. Revma., Ele me quer salvar. Porque V. Revma.
se digna de escrever-me: ha um retorno. . . ainda não
c o fundo do abismo. . . ainda hoje posso começar
uma "vida nova”, si quiser. Ah! meu Pai, do con­
trario eu não teria força: mal lhe ponho a mão tre­
mula na mão e com confiança olho-o nos olhos mur­
murando: com o auxilio de Deus quero. . . quero. . .
de novo, si ainda sou digno, pôr-me na ultima fila
do baritio de alvura lirial. . . Senhor Jesus, ajudaí-me,
quero ser casto.

Não quero continuar. Contudo, mais uma carta.


E' um joven que escreve a um camarada que aconse­
lhara a esse pobre moço caído no pecado dirigir-se a
mim, si eu lhe pudesse ir em auxilio. Eis aqui a res­
posta consternadora;
No fundo do abismo 119

M e u c a r o a m ig o ,

Sei que me esperaste c cu não vim. Não me


queiras mal, si porventura te fiz esperar, porquanto cu
j proprio já me não dou conta do meu estado d’alma,
todos os meus sentimentos estão embotados.
Não vim porque renunciei definitivamente a me
converter, e confio as consequências ulteriores á lei
natural do esquecimento. Posso já facilmente contar
meus dias, pelo menos não posso mais contar com
uma melhora mesmo espiritual. Vejo que já é a
condenação eterna que principia na terra, pois é mis-
tír que cu esteja pronto para a morte não só do
corpo, mas também da alma. Quisera arrepender-mc,
mas não tenho mais força nem fc. Durante dois me-
7 es subi o calvario do sofrimento, mas não me pude
converter.
Mostrei uma pequena mudança na minha vida
espiritual, mas era só por temor. Agora o mundo
me é completamcnte indiferente, e aguardo o cair do
pano.
Não te incomodes mais comigo, só Deus póde
vir-me em auxilio.
Teu amigo (si ainda me tens como tal).

Alguns mezes depois o moço estava morto.

38. Suicídios de estudantes.


Eis aí diante de ti uma magnífica vocação —
esborada no pó; uma aguia creada para voar nas al­
turas — debate-se num paúl com as asas quebradas;
um caráter viril — partido em dois pedaços; uma
jovem vida ruída, quebrada. Eis ahi um adolescente
I!
120 A Casta Adolescência

que na sua jovem imaginação sonhava talvez salvar


o mundo, e agora a se debater nos grilhões da es­
cravidão, numa miséria incurável. Essa alma que
outrora ardia de ideal, onde fervilhavam tantos pla­
nos de futuro, — está agora curvada, lassa, desespe­
rada, sob o peso duma maldição, porque não pre­
servou das geadas de maio os tenros brotos duma
primavera cheia de esperança.
Juntam-se a isso as exprobrações que mais cedo
ou mais tarde surgem da concíencia, o temor das con­
sequências físicas e morais das suas ações, e por aí
se compreende que a. melancolia e o desespero páirem
como aves negras sobre essa alma. E esse pobre jo­
vem, alquebrado de corpo e de alma, ainda só viveu
dezoito ou vinte anos. . . Ahl é já aqui na terra que hV
se realiza o que a Sagrada Escritura, propriamente fa­
lando, diz unicamente dos castigos do outro mundo:
“A parte dos impudícos será no lago ardente de fogo
e de enxofre” (Apocalipse, XXI, 8 ).
Ha jovens que, quando sofrem as tristes conse­
quências do seu maldito habito, já desperdiçaram a
sua força de vontade a ponto de as suas resoluções
mais fortes serem carregadas tal qual como uma ponta
de papel pelo furacão do seu habito pecaminoso.
Quando, após cada resolução, o pecado é cometido de
;' novo, uma amargura sem nome apodéra-se-Ihe da
alma, e verdadeiramente eles fariam em pedaços o que
í lhes caísse nas mãos, — mas é debalde, é debalde.
não pódem libertar-se.
Lê esta carta espantosa que um estudante escreve
a um camarada seu:

í L
No fundo do abismo 121
" . . . Na minha grande tristeza fôste sempre
amavel para comigo, e te admiras de que eu seja in­
consolável. Mas não conheces a fase mais terrível
que está em mim. Quiz ás vezes falar-te dela, porém,
a confissão não me chegou até os lábios. Mas agora
escuta-me e — despréza-me. Meu Deus, como te hei
de escrever! Emquanto cada qual me cumulava de
elogios e me cercava de afeto, eu me poluía em segredo
pelo habito dum pecado infame. E' esta, estás vendo/
a minha moléstia. A mais sombria melancolia me
tortura, e eu suportaria como expiação todos os so­
frimentos fisicos, porém o transtorno de minh’alma,
eis o mais espantoso. Não posso mais siquer pensar.
O trabalho cientifico é um martirio, as idéias me va-
guêam ao léo, a imaginação me divaga, e sou tor­
turado por imagens horrendas que não me deixam
repouso, posto que eu grite, gema, me insurja contra
elas. Onde caí eu! Certamente me dirás que reze; fal-o-
ia de bom grado, mas não posso. Não me podem
mais socorrer. Muitas vezes já fixei o dia, a hora e o
lugar onde farei saltar os miolos; mas então me apa­
rece diante d’alma a imagem de meus pais. Meus caros
pais, meus irmãos e irmãs não desconfiam a que in­
digno déram o seu amor. Vou lançá-los nessa magua
indizivel de verem seu filho suicidar-se? E ’ o que me
retém. Vem visitar-me quanto antes —- não, não
venhas, não o mereço. Reza por mim, que Deus se
compadeça de mim, si ainda ha compaixão para
mi m. . . ”

Já leste sem duvida que aqui e acolá jovens de


dezeseis a dezoito anos se têm suicidado "por des­
gosto da vida". Aos dezeseis anos desgosto da vida!
Pensa um pouco nisto! Um jovem que em verdade
mal conhece alguma coisa da vida e por quem só agora
122 A Casta Adolescência

esperam os graves deveres dignos dum homem —


desgostoso da vida! A explicação da maioria dos suicí­
dios dos jovens é a queda moral. A bala que sáe da
arma do jovem suicida põe triste fim a uma vida
falha.
Escuta este caso que se passou ultimamente. Um
moço era o unico arrimo e o ganha-pão duma pobre
viúva. Era um moço sério e de caráter. O prestigio da
sua gravidade moral afastava as frequentes solicita­
ções dos seus camaradas, quando procuravam arrastá-
lo para um antro de vicio. As exortações do capelão e
as palavras do Deus vivo eram-lhe o broquél. Porém
os companheiros não o deixavam tranquilo. E’ muito
natural: aquele que está no pecado é induzido inces­
santemente pela sua má conciencia a arrastar para a
lama aquele que ainda está inocente. A cada instante
os camaradas o solicitavam. . . ridicularizavam-no, in­
centivavam-no . . . finalmentc ele cedeu. Isso não du­
rou muito tempo, e a sombria moléstia marcou com
seu horrível cunho a alma e o corpo, dantes cheios
de forças, daquele jovem. Ele não pôde suportar
longo tempo aquele fardo apavorante, e deu cabo da
vida. Junto ao seu cadaver achava-se este bilhete —
uníca herança deixada á sua pobre mãe: — "Mamãe,
perdôa-mc c reza por mim".
As pessoas lamentaram aquele infeliz, mas tú
sabes que ele proprio foi a causa da sua ruína: quis
colher rosas proibidas, e em lugar delas a héra he­
dionda do inferno enlaçou-lhe a alma com amplexo
mortal. Ele se insurgira audaciosamente contra as
leis que o proprio. Creador escreveu na alma humana,
No fundo do abismo 123

'• contca as quais ninguém póde insurgir-se impune­


mente; contra o mandamento do Creador: Luxurioso
não serás. . .

O jovem carvalho que sc arrojava para o céu —


partido ao meio; o arco-iris que se estendia bem alto
no céu — tombado na lama; a beleza dum futuro
cheio de esperanças — velada para sempre. . .
Agora estamos no fundo do abismo.
Triste sorte, triste fim.

http://alexandriacatolica.blogspot.com
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Q U IN TA PAR TE

A L U TA CO NTRA O DRAGÃO DE SETE


CABEÇAS

Meu filho, olha para mim, que eu te possa lêr


nos olhos. Bem. . . Vês? é o que eu esperava. Uma
firme coragem brilha-te nos olhos. Teu coração pulsa
de graves e santas resoluções. Teus lábios mudos tre­
mem ao peso de pesadas decisões. Teu olhar inflama­
do e teu coração ardente confiam-me, em lugar de teus
lábios mudos, as santas resoluções concebidas agora
no fundo de tu'alma: “Pois bemí si Deus quiser,
não chegarei até lá. Si o mundo desabasse, si a terra
me vacilasse debaixo dos pés, si as estrelas me caíssem
em cima, até lá, não! N ão! não! nunca ! . . . M aio
mori quam foedaci. Prefiro morrer a me conspurcar!”
Bem, meu filho, é o que esperava de ti. E' por
isto que repito: olha para mim. Não queres chegar
até lá? Não queres cair prematuramente como um
fruto bichado da arvore da humanidade? Não queres
esmagar com sapatos de ferro o jardim florido de tua
alma”? Não queres fugir, de olhar hesitante, aos olhos
interrogadores de tua mãe e de tua irmã? Não te
A luta contra o dragão 125

queres tornar uma ameaça perpetua de infecção para


o teu proxímo sadio de corpo e de alma? Não queres
arrastar através da vida o teu jovem corpo arruinado
por vergonhosa devassidão? Não te queres abaixar até
virares um trapo, um molambo? Não queres perder a
saúde, o caráter, a honra? N ão; é o que não queres!
I.eio-o nos teus olhos.
Meu caro filho, não temas. Si em ti a vontade
fôr tão forte quanto a tua santa resolução de agora
— não chegarás até lá.

39. Retorno possível.

Mas talvez seja outra coisa que eu leio nos teus


olhos. Vejo nelas uma sombra — da tristeza, da
dôr. Vejo-lhes uma lembrança, — assustadora, depri­
mente. A lembrança maldita dum pecado cometido na
ignorância, e o poder do habito do pecado retêm-te
por mil laços. Uma tristeza sem nome chóra-te
n alma; ah! porque não li este livro ha dois ou tres
anos? Vejo tudo isso, vejo a tua luta desesperada,
vejo as suas hesitações, vejo o teu abatimento, a tua
abdicação, a tua tristeza.
Graças ao capitulo precedente, nova luz te bri­
lhou n ’alma que te fez talvez lembrar de que já na
tua infancia, quiçá na escola primaria, em compa­
nhia de máus camaradas, fizeste qualquer coisa cuja
malícia então não adivinhavas e cuja fealdade só
agora aparece diante de ti. Talvez que surja brusca­
mente em teu cerebro este pensamento desalentador:
Então ha muito tempo que estou perdido! Então ha
126 A Casta Adolescência

longo tempo que o templo de minh’alma tombou em


ruínas!. . . Não, não, meu caro filho, não deves per­
der o animo. Só somos responsáveis pelos nossos atos
na medida em que tínhamos conciencia da malícia
deles na época em que focam, cometidos. Só o Todo-
Poderoso sabe si os passos em falso da tua infancia
podem ser, e em que medida, considerados como pe­
cados. Mas agora não tc lamentes sobre as tuas quedas
inconcientes de outr’ora, mas prepara-te para uma
vida nova e ideal. Não te atormentes sobre o que se
passou até aqui, mas alegra-te com a vida pura que vai
seguir. Não és um adolescente caído definitivamente,
e o templo de tua alma não está definitivamente
arruinado. Apenas, não pronuncies a palavra que te
surge quasi nos lábios: Não, não o admito.
Palavra tal não existe. Pelo menos não existe
para um jovem. N ão pronuncies jamais esta palavra
terrivel “tarde demais”, “é tarde demais para m im ”.
Sei o que entendes por isso; mas não é verdade, não
é tarde demais. Estás um pouco atrasado, razão a
mais para te apressares.
Conheces a parábola de Nosso Senhor sobre o
Filho prodigo? Fala-se nele dum pai de família cujo
filho mais moço reclamou o seu quinhão de herança,
deixou a casa, desperdiçou o seu dinheiro, foi forçado
pela fome a fazer-se porqueiro, chegou até a invejar
a comida dos seus animaes. . . e então, na penúria do
seu imenso abaixamento, passou-lhe no cerebro uma
derradeira esperança: “Levantar-me-ei. Irei para meu
pai, talvez ele se compadeça de mim".
E vês, o pai covardemente abandonado recebeu-o
A luta contra o dragão 127

ftos braços, estreitando ao coração o filho prodigo


que voltava.
Foi nesscsario ao filho prodigo para essa dili­
gencia uma vontade firme, uma resolução inabalavel.
Efetivamente, o lamaçal retinha-o, as hervas do ato-
leiro puxavam-no, guardavam-no, o poder do habito
pesava sobre ele como um peso enorme; mas ele se
desprendeu daquele charco infecto, reergueu-se (mas
quem sabe após quantos esforços), e com resolução
inabalavel, arrimado á esperança dum futuro mais
puro, poz-se em marcha para casa — para a casa pa­
terna. Em todo homem — mesmo o mais decaído —
arde ainda uma fraca centenlha de bem, mas só se dá
conta dela aquele que ama o bem e tem confiança cm
si. Meu filho, quaisquer que sejam as tuas quedas,
por mais vezes que tenhas dilacerado a alma, quando
o lugar do antigo templo fôsse um montão de ruinas,
pedir-te-ei primeiro: tem confiança em ti! Uma con­
fiança inabalavel! Que esta palavra do filosofo Seneca
fortifique a tua confiança: "Paes sanitatis velle sanari
fu it ”, aquele que que r sarar já está em parte curado.

4 0 . Incitamento á luta.

Deixa-me dirigir algumas palavras de incitamen­


to áquelles a quem o meu livro — infelizmente —
chegou demasiado tarde, àqueles que, meninos irrefle-
tidos ou seduzidos por camaradas pervertidos, se tor­
naram fracos, caíram, talvez mesmo muitas vezes, mas
128 A Casta Adolescência

agora querem emfím reerguer-se e sustentar vitoriosa-


mente a luta duma vida pura.
Os que sucumbiram muitas vezes vêem o quanto
é difícil renunciar a um pecado de habito. Lutam
por vezes durante anos com animo heróico, e con­
tudo recácm continuamente. Eu quizera incentivar
esses corajosos lutadores.
Meu filho, si sucumbires de quando em vez, não
é um pecado a mais, como antigamente. Nosso Se­
nhor sabe que agora não o querias mais (como dantes
o querias), que é só um antigo e triste habito que aí
decide, e do qual, com todas as tuas forças, com toda
a tua vontade e com toda a resolução de tua alma. te
quiseras descartar. Não temas, não te exasperes por­
que recáis. Sómente, continua a lutar corajosamente;
sómente, apressa a vitoria final após a qual não ha­
verá mais uma só recaída.
Eu mesmo conheço muitos jovens, nas classes
superiores dos colégios e na universidade, aos quais,
na sua jovem idade, camaradas viciosos ensinaram o
pecado. Os infelizes no inicio acreditavam que era um
simples brinquedo inocente, e quando tiveram claro
conhecimento do horror dos seus atos, o poder imenso
do habito já se estendera sobre eles. Mas, que importa!
Lançaram-se a essa luta dificil. Combateram longo
tempo. Recaíram. E agora, aos quinze, dezoito ou
vinte anos, ao cabo duma luta heróica sem duvida,
porém após uma vitoria triumfal, levam uma vida
pura, para reparar o que fizeram na sua ignorância
de meninos. E que alegria inconcebível transporta
essa alma convertida! Eu não daria um dia da minha
A luta contra o dragão 120

um jovem após a sua conversão. Aquele que volta


a tempo ao Iirio imaculado, á pureza de vida, não
deve receiar as consequências nocivas da sua inconti-
nencía: um organismo jovem restaura-se tanto mais
depressa desses efeitos nocivos mais cedo tem lugar a
conversão. "Um ato irrefletido basta para arruinar
definitivamente a nossa felicidade” , — escreve no seu
diário o Conde Estevão Ezechenyi. Mas logo acres­
centa, á guisa de incitamento: “Um homem jámais
cái tão baixo que nunca mais possa melhorar. Todo
póder reerguer-se”.

4 1 . A aguia liberta.

Li algures uma fabula comovente a proposito


duma aguia. Ainda pequena, caiu ela nas mãos dum
máu garoto que lhe poz uma correntinha na pata
e a prendeu a uma rocha. Quanto bater de asas, quan­
tos esforços, quantas tentativas da parte da pobre
ave para libertar-se, mas em vão! Afinal cansou-se
daquela luta desesperada que durava havia um ano,
e o sentimento do seu horrendo cativeiro apossou-
se inteiramente dela. Um dia um élo da corrente
quebrou-se, mas a pobre aguia não reparou nisso.
Ficou ainda durante semanas sem se mexer, de olhos
cerrados: diante dela o vasto céu, no seu coração o
desejo ardente da liberdade, nas asas a força — mas
em vão, pois cia de nada sabia. Ah! si ela tivesse
siquer dado um passo á frente! Si tivesse feito uma só
tentativa! Si tivesse feito só um remigio!
H

130 A Casta Adolescência

Como vês, meu filho, creio firmemente que, si


até aqui foste um filho de rei acorrentado ao pecado,
quando acabares este livro as malhas da tua corrente
de escravidão se desprenderão.
Mas agora, pr’a adiante! A mim as alturas da
pureza!
Eu também posso corrígir-me? — Posso.
E quero corrigir-me? — Oh! quero.
Então principio!
Quando? Mais tarde? Não; mais tarde não!
Hoje mesmo!
Ouviste falar daquele heróe grego, Aquiles, a
quem a mãe, no seu temor, vestira como menina e
fizera educar no meio de moças, para que ele não
fôsse obrigado a ir para a guerra. Mas quando Ulisses
fez soar a tuba belicosa diante do palacio e as verda­
deiras moças fugiram espavoridas, a natureza viril
intrépida surgiu em Aquiles e ele tomou as armas.
Como vês, meu filho, quando os teus instintos se-
xuaes te atacarem ainda, não fujas covardemente
deles, não te rendas a eles, porém, olha-os virilmente,
afoitamente, nos olhos, e trava combate com eles.
Mesmo si de ha muito te debates entre os tentáculos
da sensualidade pecaminosa, bate com punho energico
dizendo: N ão é verdade. N ão é tarde demais. Levan­
to-me, volto p'ra casa. . . volto á vida pura, á ju ­
ventude casta, a um futuro mais belo, cheio de pro­
messas.
Bem sabes, e posso dízê-lo antecipadamente,
que, si ha bastante tempo és escravo desse pecado, a
tua libertação será dificil, dificílima talvez. Quantas
A luta contra o dragão 131

vezes o desespero te pesará n'alma, quando notares


com amargura que o teu desejo de te corrigires e que
as resoluções saídas do fundo de tu ’alma estão cons-
lantemente sem efeito! Será quasi com desespero que
ficarás desarvorado entre o teu desejo do bem e o
habito que pésa sobre ti com força gigantesca. Caí
de novo, e no entanto quantas vezes prometi que
isto nunca mais sucedería. . .
Nas ultimas dezenas de anos, homens corajosos
se têm cada vez mais votado á exploração do pólo
norte ou do pólo sul, e á custa de privações sobre­
humanas têm atravessado extensões incomensuraveis
de neve e de gêlos e — nenhum ainda atingiu a méta.
E sempre novos exploradores se põem a caminho.
Entretanto, quando a méta fôsse atingida, que utili­
dade resultaria daí para a humanidade? Apenas a
sensação de haver pousado pé lá onde ninguém ainda
tinha ido. E por uma sensação tão insignificante não
se teme afrontar múltiplas vezes a morte. Então tens
tú, nessa luta perpétua contra os sentidos, o direito
de perder o animo, nessa luta que sustentas não para
a conquista dum pólo norte coberto de neve, mas
para a conquista da paz da alma, para a conquista du­
ma vida pura, alva como a neve?
Sim, meu filho, uma luta penosa te aguarda,
mas repito-te: Não percas animo. Si quiseres, pódes
tornar a ser puro. Todas as potências do inferno não
podem levar-te ao pecado, si o não quiseres, e triun­
farás si não desanimares, si tiveres dentro de ti o
desejo de vencer e a energia que supéra tudo. Consegue
sómente passar sem pecado algumas semanas, um ou
132 A Casta Adolescência

dois mêses. Então a tua causa está ganha. Porque


estás convencido de que ainda tens uma vontade e de
que podes tomar de novo resoluções solidas como
aço.
Meu caro filho, si tua alma ainda está intacta,
agradece de joelhos ao Creador e guarda com animo
forte o teu precioso tesouro; porém si já caíste, meu
filho, suplico-te de mãos postas, trava a luta contra
o dragão de sete cabeças da impureza. E ’ de ti que
dependem igualmente o futuro da nossa cara patria e
a salvação de tua alma. Não posso, dizer-te maiores
coisas, não é?

4 2 . Pelo futuro da patria.

Meu filho, és um filho fiél da tua patria, ufano


da tua raça. Isto me agrada. Sabes, porém, que a ju ­
ventude que rejeita a pureza de sua alma comete uma
vergonhosa traição para com o porvir da sua patria?
Sabes que a força vital futura da raça depende em
bôa parte da escolha que a juventude atual fizer entre
uma vida morigerada e o resvalar pela escarpa da im­
pureza nessa quéda inevitável em que os propagan-
distas (inimigos do nosso povo) de imagens, de pu­
blicações, de livros ímoraes querem arrastar, com in­
tuito definido, a juventude vulnerada na sua integri­
dade física e moral? Realmente, um trabalho subter­
râneo opera-se na sociedade toda, nos teatros, nos ci­
nemas, nos livros e nos jornais, contra a pureza da
vida da raça, e os que empreendem essas maquinações
bem sabem que, si um dia chegarem a corromper a
A luta contra o dragão 133

raça moralmente — e, o que vae de par — fisicamen­


te, poderão sem resistência repartir entre novos ha­
bitantes a nossa terra. A juventude atual é o futuro
do pais.
E’ uma verificação quotidiana que os filhos e
netos dos ricos que só tiveram em herança a fortuna,
c não uma vida moral, se arruinam em pouco tempo.
O mesmo sucede com povos inteiros cuja ruina, por
causa da sua imoralidade crescente, não póde ser
sustida por medida alguma legal (H ilty ).
Lê sómente o que Tácito escreve sobre a tumba
do orgulhoso povo romano que outrora conquistara
todo o mundo conhecido. Lê sómente como sobre essa
tumba a que seu genero imoral de vida atirou os
Romanos, resôa vitoriosamente o elogio da vida pura
dos Germanos pagãos:
"Saepta pudicitia agunt, nullis spectaculorum in-
lecebris, nullis conviviorum irritationibus corruptas...
Paucissima in tam numerosa gente adulteria, quorum
poena praesens et maritis permissa, abscisis crinibus
nudatam coram propinquis expelit domo maritus ac
per omnem vicum verbere agit; publicatae enim pu-
dicitiae nulla venia; non forma, non aetate, non opi-
bus maritum invenerit. Nemo enim illic vitia ridet
nec corrumpere et corrumpi saeculum vocatur" (T á ­
cito, Germania, X IX ). “A mulher ali vive sob a pro­
teção de costumes puros e não é corrompida por espe­
táculos excitantes ou com repastos voluptuosos. . .
O adultério é rarissimo entre aquele povo, o castigo
dele é reservado ao esposo, que o aplica imediatamen­
te: em presença dos seus proximos a mulher culpada
134 A Casta Adolescência

é expulsa de casa, depois de ter os cabelos cortados e


de ser despojada das vestes; é em seguida levada, a
chicotadas, através da aldeia; a que perdeu a virgin­
dade não é perdoada; nem a beleza nem a juventude
nem a fortuna pódem proporcionar-lhe um esposo.
Efetivamente, ninguém rí desses crimes, e não se cha­
ma espirito do século ao corromper e se deixar corrom­
per”.
Custa crêr que os Germanos pagãos tenham sido
submetidos a tão austera concepção moral. Mas em
todo caso convém que nós, cristãos, povo civilizado,
coremos de vergonha em vendo entre nós tamanha
imoralidade, ao lado de tão nobre maneira de pensar
dum escritor pagão.
M eu filho, si amas a patria, si te inquiétas com
a sorte futura da nação, tem em estima o sangue puro
que corre dentro de ti, a tua juventude imaculada, e
não tomes em mãos as produções de autores não cris­
tãos, essas obras imoraes que visam o enfraqueci­
mento da raça. "A base e a pedra angular de todo
paiz são os bons costumes; quando estes desaparece­
ram, Roma caiu e foi reduzida á escravidão” . No altar
do patriotismo só é agradavel o sacrifício dos bravos
que se venceram a si proprios.
Satanaz passava um dia em revista as suas tro­
pas — li eu numa poesia. Cada um gabava o seu po­
der. Os demonios da cólera, da inveja, da embriaguez,
do jogo e outros máus espíritos disputavam-se o pri­
meiro lugar na arte de fazer mal á humanidade. Fi­
nalmente Satanaz outorgou o primeiro lugar ao de-
monio da impureza, dizendo; “E’ ele quem tem a
A luta contra o dragão 135

,«spada mais cortante e o veneno mais mortal, pois


tem o poder de arruinar nações inteiras”.
Deves, pois, estar triste? Absolutamente não.
Aquele que está na sua primavera deve ter a alma
cheia de frescor. Quero que no teu coração impaciente
pulse a energia da grande vocação que te espera. Quero
que te tornes um homem. Olho sempre com respeito
para a juventude. “Res sancta puer " . Achas-te diante
dc grandes deveres, — é por isto que eu te estimo.
Porém graves perigos turbilhonavam diante de ti ■ —
e é por isto que receio por ti. Essa estima e este receio
sugérem-me juntos este pensamento: Meu filho, res­
peita a chama divina que arde em ti: tua alma. A
formação de tua alma é uma tarefa maior do que
qualquer arte, pois os artistas só trabalham com um
pincel, com côres, com um cinzel, tú com uma alma
viva.

4 3 . Pela integridade do lirio.

Jovem, sê portanto ufano e intrépido! A todo


pecado, a toda baixeza, responde A d majora natus
sum. Não suportes mais que a juventude patria viva
no pecado na idade de quinze anos que esteja en­
velhecida aos dezoito anos e paralisada acs vinte e
um. Pois, si assim fôra, a bandeira da patria seria
dcshonrada. Quero que se possa dizer de vós todos:
sois cheios de esperanças, de frescura, a vossa vida não
está alquebrada. Sois impelidos a um trabalho creador
pela "inexhausta pubertas” (T ácito), pela força viril
não desperdiçada. Os vossos musculos ainda são elas-
138 A Casta Adolescência

ticos, a vossa fronte ainda lisa, o brilho dos olhos


ainda cintilante; a patria repousa em vós os seus olhos
banhados em lagrimas. Aprendei a ser aplicados ao
trabalho, entusiastas da virtude e pacientes na luta. A
sorte da patria depende de vós — e temos uma só
patria.
Acima das leis da estética ha as leis da moral,
tudo o que favorece a força moral do homem é um
ato patriótico; tudo o que a ataca é uma infame
traição. O sexto mandamento é um broquél para as
forças duma nação. Também para nós se verifica o
que Salviano disse do império romano; Seus inimigos
não puderam vencê-lo, só o pecado o pôde. Perdemos
muito sangue na guerra; porém o envenenamento do
sangue é cem vezes peor. No festim de Baltazar em
Babilônia, onde se profanavam as coisas santas, apa­
receu uma escrita aterradora. Aquela mão ainda hoje
escreve a historia do mundo.
Lê sómente com que santa gravidade o Guia
dos Escoteiros húngaro comenta o décimo manda­
mento da lei escoteira ( “O escoteiro é puro de corpo
e de alma” ) : “A pureza do sangue é a base da força
e da grandeza duma nação. A impureza polúe no ho­
mem a imagem de Deus, arruina o corpo, suja a
imaginação, embóta a memória, mata o caráter e
apodrece a nação. Com santo amor proprio guarda a
pureza de tua alma. Nada de impuro te ilaquêe: por
mais brilhante que lhe seja o exterior, oculta no in­
terior sordicia e podridão. Evita com desprezo a so­
ciedade das pessoas corruptas, as conversas porcas ou
de duplo sentido, os livros, as representações, em
A luta contra o dragão 137

suma tudo o que leva á impureza. Procura o que dá


a força, a sobriedade, um trabalho sério, distrações
convenientes, uma renuncia viril, uma amizade real:
tudo isto é um auxilio eficaz” .
Meus filhos, hoje a patria sois vós. A patria
não é uma carta geográfica, não é uma montanha,
uma planície, A semente do futuro da patria pulsa
no vosso sangue, educa-se para a vida, torna-se real­
mente viva, ou então vae á ruína ao lado das vossas
jovens forças desperdiçadas. A integridade da patria
só será reconquistada por uma juventude que souber
ser forte e combater pela beleza de sua alma, pela
integridade do lirio.

4 4 . O gladio flam ejante da naturesa.

A natureza póde vingar-se terrivelmente com


um gladio de fogo. Já Tácito indicava a fonte mais
poderosa da força germanica a "inexhausta pubertas",
a juventude intacta. A salvação e a felicidade de toda
a geração futura dependem do fato de o homem e a
mulher se terem doravante reciprocamente na mais
santa estima, ou então continuarem a descer a escarpa
assustadora em que uma literatura e uma opinião
nem nacionais nem cristãs arrastam o povo, e sobretu­
do a classe intelectual.
Meu filho, não vês que hoje em dia a patria tão
provada precisa de todos os seus filhos, de todas as
forças físicas e morais de cada um de seus filhos? O
almirante inglês Nelson, antes do combate de Tra-
138 A Casta Adolescência

falgar, deu esta ordem do dia á frota: “England ex-


pecte evecy man to do his du ty (A Inglaterra espera
que cada um de seus filhos cumpra o seu dever). A
patria pôde, pois, esperar de cada um de seus filhos
que ele conserve sua jovem alma na pureza, as suas
jovens forças na integridade. O fogo sagrado, penhor
da existência de Roma, estava confiado á guarda das
Vestaes; mas a nossa pobre patria espera, da chama
que arde na tua alma pura, milhares de anos novos.
Conviría que cada adolescente se tornasse uma
arvore de frutos copiosos, têm, porém, frutos as ar­
vores onde não ha flores?. . . V oltar do combate com
o corpo ferido é um sacrifício perante Deus e um
mérito perante a patria; porém ser arruinado moral
e fisicamente por uma vida impura é um pecado in­
fame contra Deus e contra a patria.
“Cumpre que a juventude que ama a patria e
é dotada de inteligência — escreve o Dr. Luiz Nékam,
professor de medicina na universida de Budapest —■
pense assim: Empregarei todas as minhas forças em
me tornar um membro física e intelectualmente util á
sociedade. Para poder chegar a isto e não me tornar
prematuramente um degenerado, na época do cresci­
m ento praticarei uma continência total, e endurecerei
o corpo, fortificarei a vontade, multiplicarei os meus
conhecimentos. Em seguida, si fôr chamado a fundar
um lar, esforçar-me-ei por educar cidadãos corajosos
e úteis á patria, e poderei levar com minha família
uma vida sã e feliz” .
Sabes, meu filho, o que quer dizer esta maxima:
“Um estudante não é nada e póde tudo?” Isso quer
A lata contra o dragão 139

dizer que tú, meu filho, és o futuro da patria; tú


que lês este livro; tú que pela tua atividade bôa ou
má semêas e colhes a ventura ou a desventura. E ’s
preserítemente o germe da patria futura, e serás o heróe
ou o coveiro do futuro da Patria.

4 5 . Para a felicidade de tua alma.

Tristes experiencias têm ensinado á humanida­


de que os planos do Creador ainda sáo os melhores.
“Que importa a Deus que sejas justo — diz a Sa­
grada Escritura — , que ganha ele si és integro nos
teus caminhos?” (Job, XXII, 3 ). Certamente nada.
De que observes o sexto mandamento, meu filho,
Deus não tira nem lucro nem prejuízo. Seus desíg­
nios eternos serão, não obstante, realizados. Mesmo
sem ti. Mesmo contra ti. Mas, em compensação, é
para ti de extrema importância que vivas segundo
as suas leis, pois a tua vida nesta terra e a tua vida
futura dependem disto. A sorte de tua alma, o desen­
volvimento harmonioso de tua vida no futuro depen­
dem da luta que moveres contra o dragão da impure­
za. De feito, quem póde esperar uma maturidade séria
dum jovem que passou a juventude no pecado? "Qui
non assuescit virtuti dum juvenescit, a vitiis nescit
desciscete quando senescit*.
Conheço-te bem, meu filho. Tens por ideal o
caráter viril; queres-te tornar um verdadeiro cava­
lheiro, um homem “completo". Mas é precisamente
por isto que eu te peço considerares bem que, para
140 A Casta Adolescência

chegarmos a um caráter perfeitamente viril, faz-se


mister uma forte vontade, uma força de vontade que
seja capaz de sempre submeter os nossos baixos in s­
tintos á melhor parte da nossa natureza, ás nossas
faculdades intelectuaes. Sabes que o instinto sexual
cedo se manifesta, mesmo muito antes do casamento.
mas não é para que o satisfaças .Elle não tem o direito
de exigí-lo.
Si quiseres atingir um dia esse caráter viril que
hoje não é em ti mais que uma imagem ideal, nota
bem que será preciso merecel-o por um penoso tra­
balho. E' por esta belíssima palavra de ordem: "ser
um homem de carater” , que te cumpre trabalhar. O
caráter não é um presente de festa depositado pronti-
nho na mesa, porém uma joia creada por um tra­
balho voluntário.
Quando galgas uma alta montanha, estás em
suor antes de atingir o cimo. Quanto mais elevada é
a méta a que se aspira, tanto mais esforços são ne­
cessários para attingí-la. Porém um jovem não se
póde propôr escopo mais elevado do que a formação
dum caráter sem mancha.
Para atingir esse ideal, tens que travar uma luta
de vida e de morte.

46. Para a vida — para a m orte!

E’ uma luta de vida ou de morte. A grave


questão que se formula a cada adolescente é esta:
Permitirás que teu corpo conduza tua alma á morte,
A luta contra o dragão 141

ou então que tua alma dome o teu corpo? Permitirás


que teus baixos instintos te induzam á ruina como
uma náu sem leme, ou então, como mão vigorosa,
tomarás do leme e conduzirás a tua náu pelo meio
dos cantos sedutores das sereias? Ou a tua alma con­
seguirá conduzir sã e salva a tua juventude por entre
os mil escolhos das violentas tentações, e então, para
além desta vida austera da tua juventude, uma su­
blime vocação te aguardará; ou então naufragarás
nos bons costumes sobre o mar tempestuoso da ju ­
ventude, e neste caso arrastarás contigo, por toda a
tua vida, as consequências funestas duma adolescência
malbaratada.
Porém, de resto, faço mal em te formular estas
questões. Com efeito, agora que te ólho nos olhos,
vejo neles a resolução séria, a força de vontade que
promete a vitoria. Ouço, por assim dizer, a tua res­
posta: Estou resolvido a aceitar essa luta ardente.
Apenas quereria conhecer as armas com que sustenta­
rei vitoriosamente esse combate que decidirá da sorte
dos meus jovens anos.
Está bem, meu filho, é o que amo em ti. No
capitulo seguinte poderás lêr mais a esse respeito.
Sómente, eu quisera ainda insistir neste ponto: não
percas animo si, após milhares de provas, sentires
que o combate é sempre igualmente penoso e que,
malgrado milhares de vitorias, tens sempre que sus­
tentar uma luta violenta.
Nota bem que um dragão de sete cabeças, no
sentido literal da palavra, assalta a pureza de tua alma,
e emquanto um sangue cheio de juventude te correr
142 A Casta Adolescência

nas veias, não poderás fazel-o desaparecer. Quando


lhe cortes uma cabeça, outro bróta no lugar. Si hoje
alcançaste a vitoria, não sabes por que lado serás
atacado amanhã. Entre os deseseis e os vinte e quatro
anos estarás quasi sem trégua na batalha. Mais tarde
a tentação será menos frequente, porém nunca cessa­
rá inteiramente , e quando o sério da idade madura
tiver arrefecido o ardor do teu sangue, ainda te terás
que manter alerta para conservares o teu precioso te­
souro. Tem, porém, sempre diante de ti esta santa
convicção, de que ao prazer dum instante que pro­
porciona o pecado é mil vezes preferivel possuir, al­
cançando a victoría sobre o mal, a estima própria e a
paz da conciencia.
Lembra-te dos tres jovens que o rei de Babilônia
mandára lançar na fornalha por causa da sua fidelida­
de á religião. Um fogo de inferno ardia em redor
deles, e aqueles jovens heróis, iam e vinham sem ne­
nhum dano pelo meio daquele mar de chamas, e um
hino de vitorias saía-lhes dos lábios. Pensa sempre
na vitoria, quando o fogo das tentações carnaes flame­
jar-te nas veias.
Queixas-te de seres obrigado a dar tantos com­
bates pela pureza de tua alma? Porém não vês que a
vida inteira, em derredor de nós, não passa de uma
luta perpetua? O que não luta, o que quer ficar tran ­
quilo, o que não se mexe, enferruja-se, mófa e desa­
parece. Si combatemos por cada coisa, havemos de
achar excessivo lutar pela pureza de nossa alma?
Fortifica-te sempre ao pensamento de que sem
duvida terás tentações durante toda a vida , mas que
A luta contra o dragão 143

ninguém te póde constranger a entregar as armas, si


tú mesmo o não quiseres.
Retoma forças, nesta convicção de que a luta
nunca é desesperada. Si tua alma ainda está intacta
e pura, pódes conservar-lhe a pureza, mas, é verdade,
não será sem combate; si já tiveste que derramar la­
grimas sobre graves extravios, e mesmo si caiste na
lama — é verdade que terás necessidade de esticar toda
a tua força de vontade — poderás reerguer vitoriosa­
mente a cabeça e tornar a dar uma vida nova á tua
alma humilhada, porém purificada.
Combater contra si ptoprio, ê a mais penosa
das lutas, porém triunfar de si mesmo é a mais gloriosa
das vitorias.

4 7 . Resiste.

Teus “camaradas” não tardarão a notar teu fir­


me proposito; talvez que ha muito tempo atolados
na lama, não pensem mesmo em sair mais dela. No­
tarão que as tuas concepções morais começam a ser
diferentes das deles, que não queres romper com o
modo de viver de outrora, que não mais queres es­
pojar-te com eles na lama. Não tardarão a notar tudo
isso e — vai começar agora*contra ti a mais forte
ofensiva. Far-te-ão uma verdadeira caçada de galgos.
Hão de insultar-te, zombar de ti, perseguir-te a cada
passo.
Vê bem; se te falo nisso com minúcias é porque
apreciável numero de generosas intenções já nafraga-
144 A Casta Adolescência
ram neste ponto, quando o moço se viu exposto ao
fogo dos gracejos, e o respeito humano lhe venceu
as melhores resoluções.
— Eu não sabia que eras assim tão carola
— dir-te-á um zombador — Vejam só que bêbêzi-
nho! Nunca tentou ainda ser um homem. Bom, que
não nos acompanhe aquele que tem medo.
— Quem, eu? um carola? um bêblzinho? — e
o sangue ferve-te nas veias — Pois eu irei também.
Ah! quantas boas resoluções foram assim des­
pedaçadas! quantos jovens cairam pela primeira vez
nos braços do pecado, unicamente porque os “ca­
maradas" para o pecado os haviam impelido! Mas,
pela segunda, pela terceira vez não tinham mais ne­
cessidade de ser estimulados.
E ' o perigo particularmente grave quando as
condições da existencía te obrigam a habitar com ca­
maradas cuja moralidade é inferior ás tuas nobres ins­
pirações (por exemplo, nos internatos, no quartel).
Porque ser bom no meio dos bons ainda vai. Mas,
ficar lim po no meio da lama, ser lirio no charco —
para isso é preciso ter um carater bem temperado e
uma vontade viril . E muitos jovens, que no entanto
souberam com admiravel heroismo conservar pureza
fisica e moral durante todos os anos do colégio —
cairam no pecado por ocasião do banquete de despedi­
da, na epoca do serviço militar ou á sua chegada á
universidade, diante das zombarias dos camaradas.
Effectivamente, eles não queriam passar por hipócri­
tas diante dos outros.
No entanto. . . Se refletisses um instante apenas:
A luta contra o dragão 143

onde está a verdadeira coragem e onde está a ver­


dadeira covardia?

4 8 . Quem. é o covarde?.

Portanto, tu és um covarde, tu és um poltrão!


Seja, seja! Está bem, eu sou um covarde. Eu sou
um pateta, eu sou um hipócrita — mas tu não me
farás perder a cabeça. Pensa apenas onde se faz pre­
ciso ter mais coragem e vontade: para resistir inque-
brantavelmente ao mais violento dos instinto, ao ins­
tinto sexual, ou para se inclinar de todos os lados
como um caniço ao sopro dos mais baixos desejos?
Qual é melhor cavaleiro: o que com mão de
ferro conduz seu animal para onde muito bem quer,
ou o que se deixa guiar pelas fantasias dele e final­
mente cai na lama do vaiado? Ora, tu sabes muito
bem que uma vida impura é mais lamacenta que o
valo da estrada.
Far-te-ão esta censura: que poltrão és tu em
"não ousar isso" 1 Mas serei eu acaso uma verdadeira
criança? Efetivamente, virilidade quer dizer dominio
de si mesmo e vontade forte. E, pelo contrario, não
será um fraco aquele cuja alma é joguete dos ins­
tintos carnais que a atiram de um e outro lado, como
a fumaça de um vapor no oceano?
Sê um homem e não um boneco. Quem mais se
imporá, mesmo ás pessoas de respeito, como esse moço
bem temperado que se não deixa amedrontar pelos
yracejos e zombarias dos camaradas e que com uma
inquebrantavel vontade segue o caminho que esco-
146 A Casta Adolescência

theu após madura reflexão? Eu tiro o chapéu diante


de tal adolescente e lhe aplico este magnífico elogio da
Sagrada escritura: “Fecit enim mirabilia in üita sua".
(Eclesiástico XXr, 9 ) : "pois ele fez maravilhas em
sua vida”, quando, com um intrépido gesto, afastou
de si a tentação de um camarada corrompido.
E, quando todos os meus camaradas caíssem nes­
se pecado — eu não o faria, e exclusivamente por causa
disso.
Minha alma sofre quando vejo moços deixarem-
se levar, como carneiros, para o pecado, pela mão dos
grandes palradores. Só imitar — é privilegio dos si-
mios; moço de carater é apenas aquele dotado de
bastante coragem para nadar contra a corrente. M uda
frequentemente de camisa, mas de carater — nunca!
E porque haverías de consentir que tuas nobres
idéias sofressem a influencia de tais rapazes? Que
valor moral é o seu? Zero.
Não te lembras como numa fabula os animais
zombavam do homem porque este anda de cabeça
erguida e não inclina para a terra como eles? Para
os animais, é coisa ridícula que alguém marche assim
de cabeça erguida. E já não ouviste dizer que no hos­
pício de alienados os doentes gritam atrás do medico?
e acreditas que o medico se preocupe com isso? Achas
então que és covarde só porque evitas os prazeres das
devassidões? mas é covarde a humanidade quando
teme e evita os bacilos da cólera? E' bravo o teu ca­
marada que, ao ver uma poça de agua suja e con­
taminada, nela põe corajosamente lingua e olhos?
Lê o que dizia um filosofo pagão: "Se fazes uma
A luta contra o dragão 147

coisa de que estejas firmemente persuadido de que é


necessário faze-la, não receies faze-la abertamente,
mesmo que o povo pense de outro modo a tal respeito.
Se agires mal, então envergonha-te dos teus atos;
mas, se procederes bem, porque temes os que injusta­
mente te censuram?” (Epicteto).
Dize-me: que é mais facil, resistir com firmeza
de caracter aos ataques cegos do instinto ou ceder a
eles? Mas o espirito e o corpo travam precisamente
o seu mais duro combate no terreno da moralidade.
Só pode dizer de si mesmo que tem verdadeiramente
um carater viril aquele que nesse terreno se houver
tornado vitorioso. Infelizmente, uma parte da juven­
tude nunca pode andar pelos seus proprios pés; ja­
mais pensa na direcção da sua vida e, como folhas
mortas, é arrastada pelo turbilhão das opiniões de
camaradas corrompidos.
Disse um dia a Diogenes Alexandre Grande:
— Sou senhor do mundo.
Respondeu-lhe então o filosofo cinico:
— Em verdade, tu não passas de escravo dos
meus escravos, pois eu sou o senhor de todas as
paixões de que tu és escravo.
Pois bem, eu não quero uivar com os lobos.
Não quero nadar no sentido da corrente. N ão quero
ser um homem qualquer. Nasci para coisas maiores.

4 9 . Deixa-os!

Pode dar-se que não te reste outra alternativa


senão romper definitivamente com os teus antigos ca-
148 A Casta Adolescência
maradas. Em certas ocasiões, basta que não tenhas
sorrido aos seus gracejos e ditos espirituosos. Por
‘‘espiritual" que seja a palestra deles, o teu rosto im­
passível e frio fa-los-á compreender que as tuas con­
vicções te levam a considerar uma pilha de estrume
como uma pilha de estrume, mesmo que aspergissem
nela perfumes, e que não tens prazer algum em re­
mexer nela. Poderás dizer ás vezes abertamente a teu
amigo que ele te fere as convicções morais e que,
quanto a ti, consideras uma vergonha queira esse
amigo discorrer contigo em semelhantes coisas. Pois
é realmente uma ofensa a ti o ele supor que tenhas
prazer em tais assuntos. O conde Estevão Széchenyi,
não a proposito de uma conversa inconveniente, mas
de uma leve incorrecção, assim se exprimia: "E‘ uma
fraqueza, uma falta inevitável para um mortal, mas,
com falar assim, fica-se á beira da mais profunda
ruina”. Alexandre Grande, na epoca em que realizou
os seus mais belos feitos, era um modelo de pureza
de alma. Durante a campanha da Asia, alguém lhe
escreveu em carta palavras dúbias, e o jovem prín­
cipe exclamou então, indignado: “Que coisas ver­
gonhosas pode ele saber de mim para ousar escrever-
me de tal modo?” Considerarás insulto em plena face
querer alguém manter tais palestras em tua presença.
Afirma corajosamente que elas ferem a tua delicadeza
e convicções. Realmente, o dominio do espirito é bem
extenso e oferece muitos assuntos para palestra; terás
então disposição para falar não importa do que, exceto
de uma coisa, de uma coi&y só. que exclues das tuas
conversas.
http://alexandriacatolica.blogspot.com
A luta contra o dragão 149
Se ele não atende á tua grave observação, lem­
bra-te, nesse caso, de que um príncipe vestido de bran­
co dos pés á cabeça nada tem que fazer no meio de
criados sujos e, por antiga que seja a amizade que a
esse teu amigo te prenda, rompe com ele.
Pensa nestas severas palavras de Nosso Senhor:
“Se o teu olho te escandaliza, arranca-o e joga-o
para longe de ti; vale-te mais entrar na vida com
um olho apenas do que ser lançado com os dois nas
geenas do fogo" (S. M atth. X V III, 9 ). Se teu ami­
go te escandaliza, deixa-o, pois vale-te mais chegar
só á felicidade eterna do que ser condenado eterna­
mente com ele. Sei muito bem que isso te custa, mas
lembra-te de que aquele que não estima bastante
as tuas convicções mais sãs e as tuas mais nobres
ideas, para não as insultar continuamente com os
seus lábios, impuros, não é digno de que o chames
"amigo". Pode ser teu "companheiro” , mas não ami­
go, como os membros de uma quadrilha de ladrões
não são amigos uns dos outros, mas apenas com­
panheiros.
Ser homem significa trazer acorrentado o ani­
mal bravio que dentro de nós existe. Ser jovem sig­
nifica fazer brilhar em seus olhos a alegria deslum­
brante da primavera da vida humana. Ser um homem,
no sentido viril da palavra, significa dirigir com mão
de ferro todos os seus baixos instintos e ser mais se­
vero para consigo mesmo do que o cirurgião para o
membro doente. Permitte uma comparação um tanto
extravagante: se alguém estraga o estomago e se põe
a vomitar, um homem de espirito normal não verá
150 A Casta Adolescência

nisso coisa alguma de que se possa regosijar. E, se


um jovem de alma enferma se põe a vomitar em
palestra uma multidão de imundicies que corrompem
as almas, um homem honesto não poderá ouvil-o. O
medico examina a lingua do doente e logo vê o que
ha; também tú podes sentir imediatamente, pela sua
linguagem e conversa, se o teu camarada traz a alma
doente.
O pagão Plutarco, numa de suas obras, refere-se
a certo filosofo que perguntou a um jovem por que
motivo andava na rua tão afobado:
— De que estás fugindo?
— De um homem que me quer conduzir ao mal.
— Tem vergonha — replicou o filosofo —
não vá ser ele que foge de ti.
Quando o pequeno exercito de Alexandre Grande
se pôs a tremer diante do imenso exercito persa, sabes
como o estimulou o conquistador?
— Porque temeis? Não ha duvida que estamos
diante de muitos inimigos, mas de poucos soldados.
Que o autorizava a se pronunciar assim? E'
porque sabia que os persas levavam uma vida de de­
vassidão. Sc, portanto, maus camaradas vieram “ex­
plicar-te” as coisas, resiste corajosamente. Sim, meu
filho, coragem! Um olhar severo basta muitas ve­
zes para tapar a boca dos que rebolassem na vasa da
imoralidade, e a quem o pagão Horacio dedicava este
epiteto: “amica luto sus" (Epístolas 1,2). Não te­
nhas, pois, medo deles.
A luta contra o dragão 151

50. Isso a m im não faz mal!


Náo te deixes engodar com a frequente escapa­
tória de que este ou aquele mau livro, uma gravura
indecente, uma comedia imoral, um mau camarada
não te prejudicam. Lamentável erro é esse. Se assim
falas, é porque não conheces a força do espirito de
imitação que ba no homem. Turbilhões existem que
o melhor remador se esforça por evitar, mas ninguém
por isso ha de dizer que ele seja um covarde.
Seja o que for que fizermos, nós nos pergunta­
mos inconcientemente se um outro agiria da mesma
forma. Ninguém se pode subtrair completamente á
lei da imitação. Quando um moleque chupa um limão
diante de uma banda militar constituída unicamente
de clarins, sente cada um, involuntariamente, que a
saliva lhe sobe á boca, e imediatamente a musica para
— assim também nossas leituras, olhares, conversas
e amizades exercem uma influencia irresistivel e ine­
vitável em nossa vida moral.
Nenhum homem no mundo se pode libertar to­
talmente da influencia do meio ambiente. Perto do
fogo toda a madeira arde. E tu ainda pretendes que
o exemplo dos maus camaradas não atua sobre ti.
O moleiro que m oi todo o dia em seu m oinho pode-
derá dizer que não está enfarinhado? E tu podes
dizer que um limpador de chaminés não ande coberto
de fuligem? Não te fies, pois, em ti mesmo. Grande­
mente verdadeiro é este velho provérbio: E’ forte
aquele que sabe que é fraco. "Fortis est qui se negat
esse for tem ".
152 A Casta Adolescência

51. O único rem edio: evita o peéado.

Talvez haja entre os teus camaradas quem te


convide ao pecado dizendo que hoje em dia não ha
mais razão para se recear qualquer moléstia, uma
vez que se vendem remedios seguros contra o contagio
e que, mesmo que apanhasses o mal, muitos médicos
ha que curam com segurança as enfermidades secretas.
Creio bem, meu filho, que não é o receio da
doença, mas as tuas convicções morais que te afastarão
desses pecados; no entanto, bom é saberes que, segun­
do o testemunho de médicos sérios, ainda não apareceu
até agora um unico remedio infalível contra esse con­
tagio, e os teus camaradas, se assim falam, é para se
enganarem a si mesmos, como a criança medrosa que
se põe a assobiar num quarto escuro para criar co­
ragem. Só a propaganda dos jornais conhece reme­
dios infalíveis contra esse mal — iças a ciência não
o conhece. Um longo e doloroso tratamento pelo
mercúrio, pelo iodo, pela salvarsan pode aliviar o
doente; mas o "exito certo” com que os teus cama­
radas te encorajam para o pecado raramente significa
uma cura completa e as mais das vezes só os sintomas
da moléstia é que desaparecem: mas a própria doença
continua a dissimular-se no organismo. Estarei curado
se acabo com a febre, mas se os bacilos continuam
a viver em mim e prosseguem em sua acção perniciosa?
'Lê, o que a tal respeito escreve um medico: "Não
se pode negar que em muitos casos a cura não é senão
aparente. Apesar de cuidados minuciosos, depois de
meses e anos os sintomas reaparecem, prova de que o
A luta contra o dragão 153

veneno da sifilis ficára no corpo, em que se achava


“latens” , segundo a terminologia medica. Se o me­
dico intervém imediatamente, pode acontecer que de
novo desapareçam esses sintomas durante certo tempo,
a sifilis torna-se "Iatens”, m3S frequentemente só
com tanto resultado como da primeira vez (Dr. H.
Pauli, "Halte deine Jugcnd rein” ! pag. 29).
E, mesmo que se obtivesse a cura, torna-se o
organismo tão enfraquecido, tanto pela própria do­
ença como pelos remédios, que aquele que se curou
da sifilis fica ainda exposto a outras doenças. O ce­
lebre medico de Munich, Gruber, verificou que, nas
grandes cidades e com os homens de vinte e seis a
sessenta anos, a porcentagem de obitos era muito
maior que no campo. A principio, não se poude dar
causa alguma a este fato curioso, pois numa grande
cidade não se descobriu epidemia especial que tivesse
feito devastações. Mas de repente tudo se esclareceu:
esses homens da cidade, que morriam na flor da idade,
eram sifiliticos na mocidade. Seguramente que tinham
sido curados, mas também não tinham recuperado a
sua força vital de outrora.
Distinto jovem obteve aos trinta anos bela co­
locação c quiz casar. Mas, precisamente antes do ca­
samento, e de repente, terrível moléstia o vitimou.
Nem ele conhecia a causa dessa moléstia nem o me­
dico compreendia coisa alguma do que arruinava fisica
e moralmente esse jovem robusto, que parecia cheio
de saude. Finalmente, disse-lhe o medico que os sin­
tomas indicavam uma doença que era, por sua vez,
consequência de um ato impuro. O infeliz derramou
154 A Casta Adolescência

abundantes lagrimas e nos soluços reconheceu que


dezeseís anos antes, pela unica vez em toda a sua vida,
caíra no pecado, e o medico verificou que por essa
ocasião o terrível bacilo se introduzira em seu orga­
nismo, nele se desenvolvera, e agora, dezeseis anos
depois, começava o seu trabalho destruidor. O infeliz
abandonou a colocação que tinha, rompeu o noivado
e abandonou o paiz.
Também eu digo, por minha vez, a todos
aqueles que descobrem em si o sinal dessa doença, que
procurem um medico condencioso, pois, não só os
que cometeram a ação impura, mas até inocentes po­
dem, por contagio, ser vitimas desse mal. A vergonha,
a dissimulação do mal diante do medico só poderíam
agravar a doença. E ’ verdade que um tratamento me­
dico começado a tempo pode impedir um desenvol­
vimento funesto da doença. Mas, segundo as verifi­
cações cientificas, só ha um remedio seguro contra a
doença. Nada mais que um ! Será preciso nomea-lo?
O preservativo perfeito, a vida pura — eis o unico
remedio seguro.
Como afirma claramente um medico alemão, “o
jovem não pode evitar com segurança as doenças
venereas senão por meio de uma castidade absoluta e
total" (Dr. H. Pauli).

52. Uma vassourada , por favor!

Mas, meu filho, tambem tu poderías fazer al­


guma coisa contra o progresso da corrupção moral.
Sabes o que é a "boycottage* ? Achas que não teria
A luta contra o dragão 155

resultado — sobretudo nas cidadesinhas em que ha


poucas livrarias — a acção concertada de um grupo
de moços honestos e energicos que tomassem para lema
"uma vassourada, por favor?’". Mas com isso não
pensamos apenas no lixo, nas varreduras, nas pontas
de charutos, nos bacilos. Pedimos a limpeza das ruas,
no sentido de afastar dos quiosques, das livrarias,
dos pontos de jornais esses montões de sujeira que,
sob o pretexto de “arte” , se oferecem aos transeuntes.
Quando a peste alastra por qualquer logar, sabes como
nos devemos defender dela? Começa-se por acabar com
os ratos, que são os propagadores do mal. Seria pre­
ciso, pois, exterminar também os ratos da peste moral.
Seria sinal de fraqueza e de covardia deixar que
se especule com os baixos instintos do publico ex­
pondo á venda romances de amor e historias perver­
sas. Acrescentarei mesmo que as obras classicas dos
grandes pintores podem tornar-se ocasião de pecado
quando expostas em logares em que os respectivos
autores não as teriam colocado. Porque não temos
nós a coragem de recorrer a esse meio de legitima
defesa, á “boycottage” contra esses piratas da rua
cujas vitrinas são outros tantos insultos á moralidade
publica?
E' realmente lamentável que o pecado se exiba
sempre com mais audacia que a virtude. Seguramente
que também temos direitos na rua. A lei, num outro
sentido, é verdade — reconhece-nos esses direitos na
rua e vela por que ninguém atente contra eles. Mas eu
também tenho o direito de exigir de cada um uma ati­
tude conveniente. E, se alguém se apresentasse na rua
156 A Casta Adolescência

mais ou menos como é visto em livros e imagens de


vitrinas, a policia interviria imediatamente. Mas,
porque é então que tantos moços e moças, mulheres
honestas e homens sérios se vêem obrigados a desviar
os olhos das vitrinas de mercadores sem consciência,
para não ter que corar das ímundicies que pisam as
leis morais e se acham expostas sob o nome de “car­
tões artísticos?" Policia e limpeza das ruas. E “boy-
cottage” pela sociedade moralmente sã. Se vês num
mostruario cartões obcenos, dize ao comerciante que
nada mais comprarás. Se encontrares um livro obceno
em qualquer livraria, dize ao livreiro que não porás
mais os pés em sua casa. Meu filho, não vás comprar
numa farmacia onde se vende veneno para a alma e
para os costumes!
Se eu fosse temperar minha pena em o fogo da
maior indignação, ela não podería descrever, mesmo
aproximadamente, o oceano de miséria moral em que
esses livros e essas gravuras já fizeram mergulhar a
juventude.

5 3 . Contra a corrente.

E ’ possível que sejas frequentemente obrigado,


por causa de tuas convicções, a nadar contra a cor­
rente: mas é certo que o que nada com a corrente
acabará sendo arrastado por ela. Resiste á opinião —
ai! tão frequente na atual sociedade — que nada vê
de condenável no aviltamento da mulher. Eu sei que
seria necessária uma revolução para modificar a opi­
nião frívola atual, e também sei que aquele que quiser
A luta contra o dragão 157
operar essa modificação terá necessidade de mais co­
ragem do que para escalar barricadas. Mas, esperemos
que ha de vir uma epoca em que terá fim a iniqua
inconsequencia em vigor na opinião publica moderna,
que despreza e afasta aquele que cometeu o menor
desvio ou o mais insignificante furto, mas, ao con­
trario, tolera ou mesmo celebra como herói aquele que
roubou a honra de uma mulher. Trabalha pelo teu
proprio exemplo para o advento dessa epoca em que
a delicadeza d'alma dará o tom e não a grosseria ou
a obcenidade. Sê um verdadeiro "gentleman” , isto é,
um “jovem cavalheiresco”, um moço de nobres pen­
samentos, que vê uma degradação na menor palavra,
num gracejo picante e na menor expressão dubia. Sê
nobre em teus pensamentos, isto é, irrepreensivel.
Também eu acredito no que escreve um dos
mais celebres pedagogos da nossa epoca, Foerster: "Os
atos sexuais de muitos jovens modernos não se pa­
recem realmente com o modo de viver de um bando de
ciganos que vagabundeiam e dormem ao ar livre, no
meio de um mundo civilizado? Tempo virá em que
a ordem c a pureza, também neste dominio, perten­
cerão á definição de um homem correto, como a ho­
nestidade nas questões de dinheiro; e em que um me­
dico não mais aconselhará a um moço relações sexuais
fora do casamento por motivo de “higiene", como
não aconselharia um operário a que roubasse generos
para obter melhor alimentação” (Erzíchung und
Selbsterziehung-Zurich, 1917, pag. 230).
158 A Casta Adolescência

54. Sob o fogo da mofa.


Talvez venham a zombar da tua atitude reser­
vada, de não te sentires á vontade no meio de con­
versas indecentes e de corares logo com a primeira
palavra imprópria. M eu filho, orgulha-te disso! Or­
gulha-te de poderes córarl O' pudor em nós não é
"criancice”, "tartufice", "hipocrisia" — como eles
dizem — mas um valor incalculável, uma arma re­
cebida da natureza, que defende, quasi sem que disso
nos demos conta, a parte mais nobre da nossa pessoa
contra os maus pensamentos. Para o jovem, o pudor,
que defende quasi instintivamente contra a impureza
a sua alma delicada, é um precioso tesouro. E ’ um
poderoso dique contra as ondas da imoralidade que
de todos os lados rebentam contra a nossa alma. Até
o poeta pagão Plauto sentia “estar perdido aquele
que não tem mais pudor”. “Ego illum periisse duco
— escreve ele — cui periit pudor “ . Prefere que te tra­
tem como tartufo, como louco, os teus camaradas,
a procurar merecer a sua estima á custa da pureza da
tua alma. Lembra-te desta bela maxima de Santo
Agostinho: “Não odeies os homens por causa dos seus
erros e das suas faltas, mas não ames as faltas e os
erros por causa dos homens”.
E' um covarde aquele que não sabe suportar
para as suas convicções algumas contrariedades, quando
debeis crianças, sem dizer palavra e por amor a Cristo,
se deixaram despedaçar por animais ferozes. Aos
quatorze anos, S. V it sorria quando o mergulhavam
em azeite fervente — por causa de Cristo; e aos treze
A luta contra o dragão 159

anos Pclagio podia suportar que durante seis horas


lhe arrancassem os membros, um após outro, — por
causa de Cristo.
As zombarias e chalaças de teus camaradas com-
preendem-se muito bem. A tua presença é uma ofensa
aos que se espojam na lama. B como eles olham com
raiva para o homem que não quer deitar-se ao lado
deles no lodo! A rã, mesmo que estivesse sentada
num tronco saltaria de novo para o pantano, pois só
ali é que se sente á vontade. Talvez conheças esta
velha maxima: “Sunt, a quibus vituperari laudari
est " ; ha pessoas cuja censura é para nós o maior
louvor. E podes crer que, se o asno injuria a rosa, é
porque esta não usa ferros. Pois são estes que lhe
agradam.
Sempre me admirei muito de que se pudesse dar
importância ao julgamento dessas almas desviadas.
Certamente, já ouviste falar que em Pisa, na Alta-
Italia, a torre da catedral é inclinada. Mas, se essa
torre inclinada de Pisa pudesse pensar, certamente,
que desprezaria todas as outras torres do mundo: ‘‘E’
admiravel que, de todas as torres, seja eu a uníca em
boa posição!"
Não ouviste falar no que aconteceu a uma al-
deiazinha oculta na montanha, onde todos os habitan­
tes eram papeirentos por causa da agua e da vida que
levavam? Certo dia, alguns turistas passaram por ali.
Apresentavam otima saude; mas os papeirentos cor­
reram atrás deles com grande ruido, rindo e zomban­
do, aos gritos: "Vede só. . . homens que não teem
papeira!".
100 A Casta Adolescência
Em todas as lutas fortifica em ti esta santa re­
solução: aquele que quer perder o seu carater e a dig­
nidade da sua pessoa, e tornar-se o escravo dos seus
instintos, que se entregue aos prazeres proibidos. Mas
aquele que dá importância ao carater e quer desenvol­
ver harmoniosamente a sua personalidade, que vele,
como se se tratasse de um tesouro, pela sua integri­
dade fisica e moral até ao sacramento do matrimônio,
que Deus instituiu para ele. “E' valente o que triunfa
de um leão — escreve Herder — é valente o que sub­
mete o mundo, mais valente ainda é aquele que se
vence a si mesmo” . O teu bigode cresce por si mesmo,
as tuas pernas por si mesmas se tornam mais com­
pridas, mas um verdadeiro carater viril não se desen­
volve por si mesmo. Assim também deves lutar e
arrancar cada dia um pedaço á nossa fraqueza inata,
por meio de uma seria abnegação e de um trabalho
concíente.

5 5 . Não é verdade! Mil vezes, não!

Que é que não é verdade? O que os teus cama­


radas querem ainda dizer para quebrantar a tua firme
resolução, quando veem que nenhum dos seus esfor­
ços te poude fazer renunciar á vida casta e á continên­
cia, Apoiando-se em sua própria experiencia e no que
ensinam alguns médicos, cochicham aos teus ouvidos,
até que fiquer aturdido: "Tartufo, hipócrita, é em vão
que te esforças por manter castidade até ao casamento;
isso é um absurdo, é impossível! T u queres o impossí­
vel. E’ preciso gozar a mocidade. E’ nestes anos que
A luta contra o dragão 161

nos devemos divertir. Só idéias retrogadas podem


exigir uma juventude casta. Um corpo moço, bem
desenvolvido, transbordante de força, é incapaz disso.
O desejo sexual é como a respiração, as pulsações do
coração. Vem por si mesmo, nada poderás contra ele.
Não pode ser prejudicial aquilo a que a natureza im­
pele, e não é permitido resistir-lhe. Porque te has de
fazer violência a ti mesmo? Cairás doente! Ficarás
nervoso. Tornar-te-ás anêmico se abafares as exigên­
cias dos teus instintos, se ficares esperando pelo casa­
mento. Vê, João e Paulo foram consultar o medico
e ele recomendou que se entregassem aos prazeres se­
xuais ousada, mas razoavel e prudentemente”.
E ’ isso que não é verdade. Não é verdade que
devas passar a tua mocidade pelo modo que os teus
camaradas entendem. Efetivamente, a Igreja catholica
exige dos seus padres a continência durante toda a sua
vida eles não ficam doentes por isso (em media vi­
vem mesmo muito mais que os outros homens). Ser-
te-ia impossivel então conservar a castidade, não du­
rante toda a tua vida, mas apenas até ao casamento?
Digo-te que não é verdade. N ão é verdade que um cor­
po moço, bem desenvolvido, não seja capaz de guar­
dar a continência. E tão pouco é verdade que uma vida
casta tenha como consequência uma doença qualquer.
Então, que é que é verdade?

56. Não brinques com o fogo,

O que é verdade é que aquele que é de palha


deve afastar-se do fogo. O que é verdade é que o cano
162 A Casta Adolescência

de uma carabina Flaubert de calibre seis explodirá


se se lhe aplicar uma bala de nove. O que é verdade
é que o fio eletrico funde quando o raio lhe cai em
cima. O que é verdade é que o tubo do orgâo racha
se se lhe introduzir ar em demasia. O que é verdade é
que o cavalo mais manso desabala se se lhe coloca
nas orelhas qualquer objeto inflamado; e ainda é
verdade que os teus camaradas que assim falam, talvez
desde ha muito e em consequência do habito do pe­
cado, arruinaram de tal modo a sua força de vontade
que agora lhes parece impossível uma vida casta.
No museu nacional de Berlin está exposto um
quadro comovedor; ninguém pode parar diante dele
que não o assalte uma onda de tristeza. Ao fundo
de uma garganta de terrível profundidade ruge im­
petuosa torrente; uma ponte atravessa o abismo mas
essa ponte torna-se cada vez mais estreita a ponto de
bem no meio não consistir em mais do que uma sim­
ples tabua — e por tal ponte avança um jovem ca­
valeiro de faces abrazadas e olhos brilhantes.
Não vê, o abismo nem a estreita pinguela; só vê
uma coisa: a fada encantadora dos gozos sensuais,
que lhe acena lá muito em baixo, perto de um roche­
do, do outro lado. Só vê a ela e continua em seu ca­
minho com uma sinistra cegueira — ao lado dele
avança a morte ameaçadora, com a foice na mão des­
carnada. Os grãos de areia desceram pouco a pouco, o
jovem cavaleiro está quasi tocando a tabua estreita,
cai — em baixo as ondas espumantes. . . a guela
hiante do inferno.
Sim, o que se empenha pela encosta da impure­
A luta contra o dragão 163

za com dificuldade susterá os passos — eis o que é


verdade.
Os antigos falam muitas vezes numa montanha
dotada de terrível força magnética, que avança para
o meio do mar. Quando um navio, impelido pela tem­
pestade, dela se aproxima, a montanha atraía-o com
irresistível força, e ele se despedaçava e afundava. T am ­
bém falam muito das sereias de cantos sedutores que
atraíam para a sua ilha o viajante cativado pelo seu
encanto, e o matavam implacavelmente. Sem duvida
que, nem essa montanha magnética nem as sereias
existem realmente; mas corre um perigo mais terrível
que o da montanha lendaria e dos cantos das sereias
aquele que se põe a brincar com as seduções da vida
impura — eis o que é verdade.
O que é ainda verdade é que, se os teus camara­
das, desde a primeira tentação, se tivessem mostrado
mais severos para com os seus maus desejos, a sua
vontade não oscilaria hoje á menor tentação como um
trapo sem valor. A principio, esses desejos são ainda
timidos e menos violentos; é então que se lhes tor­
naria preciso mostrar força de alma, e não seriam agora
obrigados a disfarçar suas faltas com vãos pretextos.
Pois tu sabes muito bem que se podem guiar as pró­
prias feras mais selvagens; o domador chega a enfiar
a cabeça na bocarra do leão e nem por isso se fere.
Como não poderiamos nós dominar nossas próprias
paixões?
O proprio instinto não é invencível ; mas uma
vontade enfraquecida não domina mais o instinto
artificialmente excitado.
164 A Casta Adolescência
Não queres ficar doente? Então porque intro­
duzes em ti mesmo bacilos? Não queres ter tifo? Então
porque bebes agua contaminada?
“No entanto, se é a própria natureza que impele
para a vida sexual, não se pode abafar esse instinto?
“Lê tão sómente a resposta do professor de medicina
da universidade de Budapest, Leão Liebermann:
“Respondamos agora àqueles que, fiando-se sem
reserva nos instintos postos em nós pela natureza,
sustentam não poder ser nociva a satisfação de não
importa que instinto da natureza.
Nós lhes respondemos que a natureza dotou o
homem de diversos instintos; cada um deles responde
a tal ou qual fim, pois um só instinto não bastaria
aos diferentes fins da natureza. U m dos fins da na­
tureza é que o homem se perpetue, é porque ela o
dotou do instinto sexual; um outco fim é que a sua
posteridade se desenvolva sanmente e que o individuo,
na qualidade de seu criador direto, conserve a sua inte­
gridade e saude. Mas, como a satisfação desse instinto
sexual, que serve á propagação da especie, podería fa­
cilmente tornar-se prejudicial ao outro fim, somos do­
tados de um outro instinto que regula o primeiro, e
que poderiamos chamar instinto de reflexão.
Aliás, os instintos mui frequentemente se reve­
lam enganadores.
Depois de uma febre tifoide, o convalescente
sempre tem fome, a ponto de chorar e suplicar um
pouco de alimento. Talvez que o instinto da alimen­
tação nunca se manifeste com tanta força como nessa
hora. E, no entanto, que acontece se, por compaixão,
A luta contra o dragão 165
se cede ás suas suplicas e se lhe dá o que ele reclama?
Exposto fica ao maior dos perigos. Com as suas cha­
gas mal cicatrizadas, o doente, reclamando alimento,
não se acha em estado de o suportar, as chagas rea­
brem-se, e, quando um desses infelizes chega á mesa
de operações, vê-se que o alimento tão desejado o
matou e que ele está inteiramente crivado de buracos.
Quem já não foi impelido pelo seu instinto a
beber um copo de agua fria ou a tomar um banho
frio, quando está suado e a ponto de sufocar? Mas
toda a gente sabe que perigosas consequências pode ter
essa acção irrefletida, e esse é o motivo porque nos
abstemos dela. Todos veem, pois, a exatidão das nos­
sas afirmações: que o instinto se pode enganar e tem
necessidade de ser refreado" (Liebermman, "Aos alu­
nos da universidade e dos liceus”, Budapest, 1912,
pag. 11-12),
Sim, o animal não age senão segundo o seu ins­
tinto, e o instinto nunca o arrasta por um caminho
falso. Mas no homem a razão controla o instinto;
e muitas vezes a razão contradiz as exigências do ins­
tinto.

5 7 . A p r o v e ita a m o c id a d e .

Sim, é preciso aproveitar a mocidade, tirar dela


bom partido. Mas sem soltar as redcas dos instintos;
mas de tal modo que — tendo consciência da impor­
tância dos seus verdes anos — se trabalhe com santa
gravidade para formar em si um carater viril. Se as
tuas jovens forças se distendem em ti até estoirarem,
166 A Casta Adolescência

se um sangue borbulhante anda em tuas veias, então


atira-te ao trabalho e utiliza essa energia para cumprir
o mais exatamente possivel os teus deveres de cada
dia. Possa a parte mais nobre da nossa pessoa, o nosso
espirito, florescer e chegar ao papel de guia, e ensinar
aos nossos desejos sensuais a submissão e a obediência.
E's livre — dir-te-ão; "liberdade” , "indepen­
dência” — palavras encantadoras para a mocidade.
Sê livre e independente, mas sê ao mesmo tempo pru­
dente e razoavel. Como em a natureza também no
mundo moral ha leis a observar, e não é impune­
mente que as desprezamos. Quando fazes uma excur­
são para uma alta montanha e encontras uma bar­
reira ao longo de um perigoso atalho — ainda que
sejas livre e independente — não irás derriba-la, sob
o pretexto de que “é um obstáculo á tua liberdade”.
Ou então, se a derrubas, cairás irremediavelmente no
abismo. As leis morais também são barreiras que em
tua juventude te podem parecer entraves isuporta-
veis, mas que na realidade te impedem de cair no abis­
mo. Portanto, aproveita a vida, mas não calques aos
pés as leis morais. Sê livre, mas, pela nobreza da
tua vida, consuma a vontade do Criador.
"Mas, abafando assim os nossos instintos, con­
trariando as nossas disposições, extirpando as nossas
más inclinações, agímos contra a natureza” — so-
prar-te-ão aos ouvidos. Contra a natureza? As Ordens
Religiosas da Idade Media derribaram as matas vir­
gens, frutos da natureza, mas apenas para criarem em
logar delas a civilização.
"Vive, pois, a tua vida! Díverte-te” — eis o
A luta contra o dragão 167

que ouves de todos os lados. Bem. Nosso Senhor não


o proibe. Ele não te pede que te comprimas, que
não vivas a tua vida. Apenas exige uma coisa: Vive
a tua vida, mas não fiques na lama, não desças, ao
contrario, sobe, sempre mais para cima. Vê como a
roseira se desenvolveu livremente enquanto pequena
(o jardineiro deixou-lhe complacentemente todos os
renovos e “ladrões'') ; terá ela força para dar sempre
flores? Nunca. Pois as forças mais preciosas da sua
juventude foram desperdiçadas nos "ladrões" selva­
gens. Mea filho, tu é que és o jardineiro responsável
pela roseira da tua alma.
Ah! quantos moços já derramaram lagrimas de
desespero no silencio da noite: porque ninguém me
avisou a tempo das consequências deste pecado! do
primeiro pecado! do primeiro!

58. Castidade e saude.


Mas, ainda devo dizer uma palavra dos camara­
das de conciencia larga e mesmo dos médicos que por
leviandade — não ousarei dizer por espirito de ga-
nancia — te afirmam que a “castidade é prejudicial”.
Naturalmente, tais afirmações agradam aos moços, que
nelas encontram excusa aos seus pecados. Que haja
desses médicos, eu bem o creio: mas os médicos sé­
rios consideram-nos charlatães. “Todo o medico que
dá tais conselhos comete uma infamia" — diz o pro­
fessor Ziemssen.
E’ quasi incrivel que excelentes moços se deixeiq
168 A Casta Adolescência

desconcertar pela afirmação aerea de que aquele que


pratica a castidade adoece e passa a sofrer do sistema
nervoso. Camaradas já corrompidos te falam nisso
tanto que tu inconcientemente começas a ficar abalado
em tuas convicções: e se em qualquer noite acordas,
seja porque estás com dor de cabeça, seja porque o
coração te pulsa mais aceleradamente; ou então se a
cabeça se vira um pouco mais ou o teu rosto apre­
senta alguns botões. ímediatamente te surge este pen­
samento: “E’ isso mesmo! Sim, é verdade! Estou
sofrendo do sistema nervoso”.
Meu caro filho, não creias nessas tolices! Mas,
mesmo que fosse verdade! Não é a saude o maior te­
souro que existe á face da terra. O caracter, a honra,
a pureza da alma são-lhe superiores. E, mesmo que
devesses sofrer realmente, uma pequena dor de cabeça,
algumas tonteiras, sec-te-ia permitido por semelhante
bagatela destruir como um farrapo a pureza da tua
alma? Ser-te-ia permitido pizar os direitos da alma
para evitar um pequeno incomodo?
Mas não é verdade. Não é verdade que uma vida
casta venha a causar o menor mal á saude. Mostrem-
me uma unica obra, de medicina, uma obra seria, cujo
autor esteja pronto a provar o que afirma, mostrem-
me um só medico, que compreenda seriamente a sua
profissão, e que possa dizer de uma só doença que seja
consequência da castidade. N ão o encontrarão em
parte alguma do m undo inteiro. Pelo contrario, ha
milhares de livros que tratam das terríveis devastações
da impureza. Sem duvida que existem por aí desses
"médicos" que favorecem as inclinações sexuais
A luta contra o dragão 169

mocidade — isso favorece também o comercio! — e


aprovam em palestras particulares a violação da moral;
m.is os especialistas nestes domínios, as primeiras au­
toridades, pronunciam-se de modo muito diferente.

59. O que diz a ciência medica.

O irmão de um aluno do ginásio, estudante na


universidade, dizia-lhe, depois de haver lido o meu
livro: “Está bem. Mas a coisa não é assim tão grave.
E’ belíssimo o que se lê nesse livro. Mas só os padres
dizem isso. E’ verdade que se não deve começar a coisa
muito cedo. Mas, uma vez que se chegue aos vinte
anos "
E’ isso, meu filho? "São os padres que o dizem” ?
Se não te aborrece, lê as seguintes declarações,
não de sacerdotes, mas de médicos de reputação mun­
dial.
Segundo Krafft-Ebing, todo o homem normal-
mente desenvolvido pode viver em castidade sem que
a sua saude sofra a menor alteração após a sua con­
tinência ( “Psychopathia sexualis”, 1876, pag. 104).
Forel, o celebre neurologo de Zurich, escreve em
seu livro "Die sexuelle Frage” : "Em circunstancias
normais, para um moço normal que trabalha com
seriedade, intelectual e sobretudo fisicamente, e que se
abstem dos narcóticos que paralizam a vontade e a
memória, assim como das bebidas alcoólicas, a con­
tinência não é de modo algum impossível.
... ..Sua saude não sofre com ela. . . Jamais
170 A Casta Adolescência

encontrei uma doença nervosa como resultado da


continência, mas sim muitas causadas pela sifilis e
outros desregramentos. Sustentamos mesmo que, para
os jovens, a castidade até ao casamento é, náo só moral
e esteticamente, mas também higienicamente, o melhor
modo de viver” ,
O dr. Rossier escreve: “Também eu me sinto
feliz em ser contado no meio daqueles que teem a co­
ragem de afirmar não prejudicar a castidade, de modo
algum, a saude do jovem. Gostaria de dizer a cada um
em particular: Não creias nos médicos que te desa­
conselham a viver castos antes do casamento, pois esse
parecer é erronco e prejudicial",
No segundo Gongresso Internacional da Profi-
laxia Sanitaria, que se realizou em Bruxelas de 1 a
6 de setembro de 1902, foi adotada a seguinte re­
solução: “Deve-se sobretudo ensinar á mocidade que
a castidade não é absolutamente nociva á saude, mas
chega a ser recomendável sob o ponto de vista medico”.
E diz o dr. Surbled: Viver casto é possível e
nunca perigoso. A devassidão pode causar muitos ma­
les, mas a castidade nunca. O que o prova é o fato
de muitas obras tratarem das doenças que resultam
dos excessos sexuais, ao passo que as doenças que se­
riam causadas pela continência ainda esperam o seu
historiador”.
A Faculdade de Medicina da Universidade de
Cristiania fez a seguinte declaração: "Nestes últimos
tempos foi afirmado pela imprensa e mesmo em con­
gressos que a vida moral e a continência sexual são
prejudiciais á saude. Ora, isso é uma afirmação inteira­
A luta contra o dragão 171

mente falsa. Não conhecemos doença alguma ou fra­


queza que seja permitido ou possível atribuir a uma
continência perfeita e a uma vida moral. "Assinaram
essa declaração: J. Nikolayson, E. Winge, Jokmann,
J. Heiberg, J. Ijort, J. Wann, Mueller, E. Schoen-
berg, professores na Faculdade de Medicina da U ni­
versidade de Cristiana.
M antegazza, fisiologo italiano, escreve igualmen­
te: “Todos os homens, e sobretudo a juventude, po­
dem fazer em si mesmos a experiencia dos benefícios
da castidade. A memória é docil e solida, o pensamen­
to vivo e fecundo, a vontade robusta, e o carater atin­
ge uma energia que os depravados não conhecem. Nada
nos mostra o que nos rodeia em cores tão celestiaes
como o prisma da castidade, que projeta o seu arco-
iris sobre todas as coisas do mundo e fornece um con­
tentamento sem a menor sombra" (Foerster: “Ju-
gendlehre” , 1913, p. 625).
Eulenbucg, professor de psiquiatria na Univer­
sidade de Berlin, escreve: “Duvido que qualquer pes­
soa tenha jámais ficado doente, e sobretudo neuraste-
nicamente, unicamente por causa da continência ligada
a uma vida razoavel. Considero esta afirmação, tantas
vezes repetida, como uma parolagem vazia e insigni­
ficante” ( Foerster, ibid.).
Oesterlen, em sua obra intitulada "Handbuch
der Hygiene” , afirma: “Que o jovem e do mesmo
modo a jovem pratiquem a continência até que chegue
a sua epoca. Isso não lhes será dificil, se refletirem em
que todo o seu futuro, principalmente a sua felicidade
no casamento, depende do modo como tiverem vivido
172 A Casta Adolescência

na juventude. Devem os moços saber que uma saude


florescente, a energia e uma conciencia viril são os
ricos e belos frutos da continência juvenil".
"A continência é possível — escreve a dra. Ema-
nuele Meyer — é possível sem prejuízo da saude; de­
monstraram-no centenas de milhares de pessoas" (E.
Meyer: “Vom Maedchen zur Frau". Stuttgart, 1917,
pag. 121).
"Os médicos que aconselham os jovens a que pro­
curem fora do casamento a satisfação do instinto sexual
tornam-se culpados de uma leviandade imperdoável.
Quando um moço se queixa de dores de cabeça, pulsa­
ções cardíacas, deve ser submetido a um minucioso
exame, para saber se não se entrega demais ao álcool,
ao chá, ao café ou ao fumo. Deve também averiguar-
se se leva uma vida regular ou se outro motivo existe
para o seu mal estar. Mas um conselho tão despido
de escrupulo não deve ser dado” (Hersen, professor
de medicina em Lausane).
Eis um punhado de afirmações de médicos sérios.
Repito-o; não são padres que assim falam, mas emi­
nentes médicos. Acrescenta a isso um sem-numero de
misérias, ruinas e doenças que marcham ao lado da
impureza; isto faz com que, em consequência de uma
sú noite, milhares e milhares-de moços sejam esmagados
pelo peso de uma doença vergonhosa por muitos anos,
ou até complctamentc arruinados de corpo e alma —
c repete-o aos camaradas que te veem falar das conse­
quências prejudiciais c da impossibilidade da castida­
de. Mostrar-lhes esses numerosos hospitais e asilos,
em que se agitam milhares de desgraçadas vitimas da
A Juta contra o dragão 173
impureza; e, ao contrario, pede-lhes que te mostrem
se forem capazes — um unico hospital em que se
tratem aqueles que adoeceram em consequência da sua
continência. Que te mostrem apenas um!
E o que nós vemos nos indivíduos manifesta-se
do mesmo modo nos povos. A historia fala de gran­
des povos que desapareceram por causa da sua vida
dissoluta, mas não conhece um só que tenha sido
levado á ruina pela sua vida pura.

60. Deus e a natureza.

Efetivamente, não pode ser de outro modo.


Visto que as santas leis do Criador reclamam a con­
tinência perfeita antes do casamento. Mas eu afirmo
tranquilamente: se Deus não tivesse dado senão leis,
sem ter cuidado ao mesmo tempo por que aquelles
que as observassem não viessem a sofrer coisa alguma
em sua saude, então Deus estaria em contradicçâo
consigo mesmo — o que é impossível. Os filologos
fizeram uma interessante comprovação, ao descobri­
rem que nas línguas germânicas as palavras "são”
“santo" teem a mesma raiz; isto é, que aquele que
age segundo a vontade de Deus não pode prejudicar
a sua vida fisica. E, se a vida casta fosse prejudicial,
porque havia a natureza de punir com tão terríveis
doenças precisamente a vida imoral? A natureza nunca
está em contradição consigo mesma. Não é um mero
acaso, mas sinal manifesto da natureza não haver nos
animais vestígios de doenças venereas, porque eles são
174 A Casta Adolescência

incapazes de qualquer desordem sexual — eis o triste


privilegio da vontade humana.
Nós, os homens, esforçamo-nos em tudo por
ser mais distintos que os animais: não devoramos,
mas comemos; não mugimos, mas conversamos; não
temos focinho, mas um rosto — só num ponto, no
dominio sexual, é que podemos descer mais baixo
mesmo que os animais.
A nenhum dos seres criados forneceu Deus ins­
trumentos tão magníficos como a mão do homem.
Se a nossa mão não fosse um instrumento tão ma­
ravilhoso, mal a poderiamos fazer prevalecer sobre
os animais. E’ com a nossa mão que preparamos o
alimento, que esculpimos estatuas, que nos vestimos,
que preparamos remedios, que escrevemos livros, que
dirigimos os navios, que conduzimos os trens — to­
das as coisas de que o animal é incapaz. A mão fala
da grande confiança de Deus em nós. Não era acaso
necessário que o homem se servisse dela para se elevar
acima do animal? E, pelas suas ações pecadoras e
as suas torpezas, resvala profundamente abaixo da
besta.
E não se vê, claro como a luz do sol, — ser
um castigo divino o fato de precisamente esta força
criadora que — utilizando-a segundo a vontade de
Deus — deveria ser uma fonte de vida nova, tornar-
se, por causa deste uso pecador, a ruin3 de tantos ho­
mens? Podctá a natureza protestar contra as relações
sexuais fora do casamento mais fortemente do que
ferindo com tão terríveis doenças a vida imoral? A
própria natureza se defende, defende as suas santas
A luta contra o dragão 175

leis como pode: com um exercito de milhões de ba­


cilos destruidores, lança-se sobre aqueles que violam
as suas leis. E não é mero acaso, mas sinal manifesto
da natureza que só a contingência absoluta ou só o
casamento monogamo constituem uma segurança
perfeita contra essas moléstias.

61. Quem não pode ficar puro?


Sustento que aquele que não quiser afastar-se
senão dos atos imorais externos, mas pelo pensamen­
to se abandona aos desejos impuros, mais tarde ou
mais cedo passará também ao ato. Porque neste terre­
no em declive não se pode parar. A alma e o corpo
agem um sobre o outro, e a infecção da alma enfra­
quece o corpo.
Aqui não se pode ser indulgente; aqui não se
pode regatear. Aqui não nos podemos tranquilizar
dizendo: “não irei pelo pensamento senão até ao pon­
to justo em que começa o pecado; daí por diante
nem um passo mais”. E’ em vão. O que é volunta­
riamente impuro em seus pensamentos, é como se ti­
vesse cometido o pecado por acção. Como escreve
Juvenal em uma das suas satiras (XIII, 209) ; “Nam
scelus intra se tacitum qui cogitat ullum , facti crimen
habet" .
Também é importante ser casto já nos proprios
pensamentos. Já o pensamento culpado pode pôr em
efervescencia todo o nosso organismo; pois a excitação
cerebral passa automaticamente á medula espinal e
I
17C A Casta Adolescência
dali aos orgãos dos instintos. Mas o instinto excitado
impele á ação pecaminosa. Que não possas mais abafar
este fogo devorador, eu o compreendo; mas não foste
tu que ateaste a primeira chama?
Lê apenas o que a tal respeito pensa o celebre
professor da medicina da universidade de Budapest,
dr. Liebermann:
"Aquele que leva uma vida sóbria, que trabalha
seriamente e evita as companhias levianas, as leituras
livres, as representações chocantes, etc., tudo quanto
excita as paixões, o que não despreza os exercícios
fisicos, sofrerá m uito pouco as excitações do instinto
e facilmente triunfará com um pouco de força de von­
tade” (Liebermann, "Aos alunos dos liceus e aos es­
tudantes", Budapest, 1912, pag. 11).
Sabias que um animal feroz dormitava dentro
de ti, porque o despertaste?
Sabias ser de natureza inflamável, porque brin­
caste com o fogo?
Sabias muito bem que se não deve lidar com
fogo de artificio perto de um paiol.
Aquele que em seus pensamentos, palestras, lei­
turas, na frequência aos teatros e cinemas peca contra
a pureza e tolera que pensamentos desordenados o
dominem, creio que também em seus atos não pode
levar uma vida casta. Mas que o moço puro em seus
pensamentos e em toda a sua concepção da vida es­
teja exposto a sofrer em sua saude mesmo pouquissi-
mo dessa vida casta, eu o nego — não é verdade, m il
vezes n ã o !. . .
http://alexandriacatolica.blogspot.com

SEXTA PA R TE

L U T A E TE M CONFIANÇA

Fortior est, qui se, quarn qui


fortíssima vincit moenia, nec
virtus altíus iri potest.

“ Aquele que se vence a si


mesmo é mais valente do que
o que assalta as mais fortes
muralhas; e a bravura não po­
de ir mais acima!”

Repito o que dizia no capitulo precedente: Meu


filho, mesmo que tenhas uma natureza de fogo, mes­
mo que sintas dentro de ti as exigências dos teus baixos
instintos, e que estes se lancem sobre ti com a im­
petuosidade do touro e a raiva do lobo, eles não te
vencerão se não quiseres tornar-te seu escravo. Se
tens um carater robusto, se tens uma vontade firme.
T u o sabes muito bem: pode-se fazer avançar o barco
contra o vento, se a corrente é forte. Efetivamente,
todas essas misérias que leste nos capítulos precedentes
eu não as descreví senão com um unico fim: para
que estremeças e te lances — a um mais belo futuro.
178 A Casta Adolescência

Mas, has de perguntar: que devo então fazer?


T u sabes que, se se quizer guardar um grande
tesouro, é necessário aplicar á porta um bom ca­
deado. E, quanto maior for o tesouro que guarda­
mos, com tanto maior segurança aferrolharemos a
porta contra os ladrões. O teu maior tesouro é a pu­
reza da tua alma; guarda, pois, com incansável per­
severança, as portas pelas quais o inimigo poderia
entrar para te arrebatar a alma. Vigia os teus sen­
tidos.
Presta atenção aos teus pensamentos, a cada uma
de tuas palavras, aos teus olhares, ás tuas ações, e
sobretudo toma bastante cuidado com o teu primeiro
passo em falso, porque a primeira queda moral é fa­
cilmente seguida de dez outras. Sei muito bem que
precisamente neste periodo de efervescencia, cuja cha­
ma se arroja como um vulcão em tuas veias, é ne­
cessário que te guardes perpetuamente a ti mesmo,
se queres conservar o equlibrio da tua alma. Sabes
agora que é todo o teu futuro que está em jogo; e
alguns anos de luta durante os quais te deves mostrar
corajoso, encontrarão recompensa assegurando-te este
grande tesouro: a formação de um carater viril.

62. Vida pura! alma pura!

Sei que estás resolvido a combater, guarda in­


tacta a pureza da tua alma. Do mesmo modo que o
aceio é necessário á vida do corpo — é preciso aceio
em casa, no ar, no vestir, no alimento — assim tam-
Luta e tem confiança 179

hem a alma exige, como primeira condição, uma vida


moral pura.
Quando se lava uma escada, deve-se começar
pelo degrau superior; se queres levar uma vida pura,
deves começar pelos pensamentos. Não só em tuas
palestras, em tuas acções, mas em todos os teus pen­
samentos, conserva a pureza, pois aquele que contra
ela peca, mesmo que seja apenas em pensamento, mina
o edifício que abriga o tesouro da alma, e é uma sim­
ples questão de tempo a ruina total e irremediável.
"Bemaventurados os que teem o coração puro, pois
verão a Deus" (S. Matth, V, 8 ). A pureza da alma
é tão frágil como um vaso de cristal que o menor cho­
que reduz a estilhas. Deves ser totalmente puro —
mesmo nos pensamentos — ou de contrario sucum­
birás. Não ha meio termo neste dominio. Não se pode
mercadejar com a pureza mais do que com a honra;
não se pode ser honesto pela metade, não se pode tão
pouco ser puro pela metade. E mesmo a impureza de
pensamento e de imaginação é muitas vezes mais pe-
rigorosa para a saude que tal ou qual ato. “Guarda o teu
coração com cuidado, pois é dele que brota a vida”
(Provérbios, V, 23).
Santo Agostinho que, em súa juventude, antes
de se converter, estivera exposto a grandes tentações
carnais e caira muito por baixo, assim explica esta
triste situação: quando o primeiro casal humano não
tinha ainda cometido o pecado de desobediência, era
perfeitamente senhor do instinto sexual, como hoje
em dia somos senhores, por exemplo, dos nossos de­
dos. O homem mexe com os dedos como e quando
180 A Casta Adolescência

quer. Sem a sua vontade, não se movem. Mas nas


coisas sexuais — ai! — já não acontece a mesma coisa.
Os pensamentos, as sensações, os desejos, as emoções,
surgem em nós quando não o queremos e não desa­
parecem mesmo que o queiramos. E, seja o que for
que eu faça para os expulsar da minha cabeça, não
sou capaz de fazer com que obedeçam. Os homens,
— escreve Santo Agostinho — foram bastante loucos
no paraiso terrestre em não obedecer ao Senhor.
Agora, pune-os Deus pelo seu pecado: uma parte do
seu ser — o instinto sexual — não obedece mais
ao homem, mas segue o seu caminho contra a razão
e a inteligência do homem.
E agora, que resulta de tudo isso? E' que não
tens o direito de provocar voluntariamente em ti essa
onda devastadora e, se ela se arremessa por si mesma,
não tens o direito de permitir que te domine. A prin­
cipio, ela não faz senão mover-se, tu ainda a podes
conter, afastar dela a tua atenção — e estás salvo.
Mas, se cedes ao primeiro pensamento, a força escapa
de tuas mãos e não mais poderás prever como as
coisas vão acabar.

63. Sem a vontade, não ha pecado.

São talvez os teus pensamentos que surgem de


improviso e os teus desejos incomodos que te darão
mais inquietação, pois não somos senhores deles. Mas
eu quero precisamente tranquilizar-te neste ponto,
afim de te preservar de inquietações supérfluas. A in­
I.uta e tom confiança 181

clinação para o mal, que no homem existe, não é em


si mesma um pecado. Está na alçada da tua vontade;
se te tornas senhor dela, demonstras a tua força de cara-
ter; se por ela te deixas dominar, tornar-se-á uma
paixão.
Nós não somos responsáveis pelos nossos pensa­
mentos senão desde o momento em que eles são per-
feitamente concientes em nós. Não antes.
Ainda assim, em teu período de crescimento,
verificarás muitas vezes que de repente — durante o
estudo, brincando, lendo, rezando — surgirão em teu
espirito pensamentos que se referem ao pecado, e a
tua conciencia delicada perguntar-se-á com inquieta­
ção se eles não feriram a pureza da tua alma. Fica
tranquilo. Uma vez que não tenhas pensado nisso,
não és responsável. Não podemos impedir que os
pardais adejem ao redor da nossa cabeça, mas sim
que construam seu ninho ao alto de nossa cabeça. E
sómente agora, neste instante, que podes ser forte, e
imediatamente, sem esperar um m inuto, apanha com
firmeza os teus pensamentos e expulsa da cabeça esses
hospedes indesejáveis.
Como faze-lo? T rata de fazer alguma coisa, de
te ocupar, não importa de que maneira, para que no
logar dos maus pensamentos fiquem outros inofen­
sivos. Faze uma leitura interessante, vai brincar, tra­
balha —• fatiga-te, estuda, reza, muda de ocupação,
até que a imaginação fique limpa desses pensamentos
chocantes. Mas tudo isso pausadamente, sem medo,
sem que te enerves. Verás que esses pensamentos
são como moscas importunas e ousadas. Não nos de­
182 A Casta AdoJescencia
sembaraçamos das moscas agitando-nos, porque elas
voltam logo sem cerimônia. Mas é preciso acertar o
golpe e mata-las. Não entres em luta direta com esses
pensamentos; basta que te voltes contra eles — mesmo
com a idea de lutar — para que se tornem mais fortes.
O melhor é desvíar-te deles, deixa-los de lado. Eles
batem, fazem barulho, rosnam á porta da tua alma?
Nâo te preocupes com isso. Repete contigo mesmo:
não hão de entrar. Expulsa-os logo que apareçam;
pois, se com eles discutes, tornar-sc-ão ousados. Não
os receies e continua tranquilamente o teu caminho.
Os cães ladram tanto mais atrás do transeunte quanto
mais este com eles se preocupa. Mas, se ele passa com
calma e indiferença, abaixam a cauda e voltam para
o seu canto. Mostra esse desdem em face dos maus
pensamentos: "Que fazeis em minha cabeça? Pois é
impossível que eu pense deliberadamente em um pe­
cado qualquer”.
Não desesperes, mesmo que te fosse preciso lutar
dez vezes por dia ou por hora contra esses pensa­
mentos e desejos. A mocidade de conciencia delicada
desperdiça muita energia e caí na melancolia, numa
luta espiritual mal dirigida. A maturidade sexual em
ti está conforme a santa vontade de Deus; portanto,
se semelhantes pensamentos te aparecerem, é uma con­
sequência muito natural do teu desenvolvimento,
não é um pecado nem mesmo uma tentação. Mas, para
que se não tornem pecados, não penses neles. Não te
aflijas, debatendo-te com pés e mãos contra eles (de
contrario cada vez mais se apegam), mas repete com
suavidade: "Senhor Jesus, socorrei-me!”. Não te in-
Luta c tem confiança 183

crepes com inquietação: "Ai! talvez que eu tenha con­


sentido neste pensamento” . E não desanimes se de
tempos a tempos perceberes que os teus esforços são
vãos e que não conseguistes expulsar da cabeça esses
pensamentos. Uma tentação que se repete não significa
absolutamente que cometeste o pecado, mas antes a re­
sistência da tua alma; efetivamente, o inimigo ataca
de novo e sem cessar a fortaleza enquanto ela perma­
nece intacta. O soldado assaltado pelo inimigo não
deve envergonhar-se por isso, mas sómente aquele que
cede covardemente diante do ataque. Tem coragem
na convicção de que, se por acaso te houvesses es­
quecido em um tal pensamento, tudo depende da
vontade; e, se eu não quero manchar a minha alma
e eu não o quero — se quero conservar pura a minha
alma — e eu o quero — então sairei vencedor de não
importa que luta. N on nocet sensus, si deest consensus
(S. Bernardo). Enquanto lutas, não ha pecado. O pe­
cado começa onde a vontade abandona a luta. Eu não
sou responsável pelo que acontece fora da minha von­
tade ou sem que de tal me dê conta, pois não é um
pecado. Por exemplo, eu não sou responsável pelo
que me acontece durante o sono ou em sonho (se eu
pelo menos não provoquei esses sonhos com uma con­
duta leviana, em o dia precedente).
Portanto, desviar-nos do caminho se chega um
cão enraivecido. Não prestar atenção aos teus de­
sejos, dirigir para outro ponto os teus pensamentos.
Porque? E’ que se trata de uma coisa execrável, des­
prezível? Não. Trata-se de um santo pensamento de
184 A Casta Adolescência

Deus Criador, que tu preservas assim da profanação,


' da mancha.

64. Justifica-te tu m esm o .

Ao sul da África vive o pequeno povo dos Boers.


Durante muito tempo quasi nada se soube a seu res­
peito, mas ha algumas dezenas de anos adquiriram
mundial fama pela sua bravura na guerra anglo-boer.
A causa desta guerra foi a tentativa, feita pelos in­
gleses, de se apoderarem dos terrenos diamantiferos
dos boers. Estes nem mesmo chegavam a saber, a
principio, que riquezas naturais possuíam. Um viajan­
te inglês vira com espanto as criancinhas boers brin­
carem na poeira da estrada com diamantes. Mas este
povo intrépido, logo que teve conhecimento das suas
riquezas, ergueu-se heroicamente contra a hegemonia
'} inglesa.
Uma mina de diamantes tão preciosa — ou,
antes, mil vezes mais preciosa — está oculta na alma
de cada adolescente, mas a desgraça está em que muitos
moços nada sabem disso e brincam na poeira da es­
trada com esse tesouro infinitamente precioso da sua
alma. Quantos que arrastam pela lama a sua alma
outrora tão pura e branca como a neve! Quantos a
expõem facilmente ao perigo! Quantos perdem o seu
tesouro, brincando!
Nas grandes cidades ha entre duas ruas uma pas­
sagem subterrânea. Essas passagens encurtam o tra­
jeto de uma rua á outra. Mas, nelas não se pode ga-
|r;/v rantir o aceio do calçado. As pessoas que por ali tran-
íp -'
Luta c Icm <-niifiança 185

iitnm deixam muita lama. Quantas almas de moços se


parecem com estas passagens! Pensamentos, desejos,
palavras, olhares entram e saem, á vontade. E’ de
surpreender que tanta sujeira se amontoe aí?
Um jovem prudente zela pela sua casa. A’ porta
coloca uma sentinela (uma vontade disciplinada) e
exige um salvo-conduto a quem queira entrar. Passa,
por exemplo, na rua, diante de uma vitrina. A curiosi­
dade o convida a parar. Mas, de repente, vê uma ima­
gem obcena. A sentinela lhe grita: “Não tem o direito
de entrar em minha casa”. Afasta-se dessa imagem.
Exige assim um salvo-conduto para qualquer pensa­
mento, palestra, peça de teatro, leitura, antes que lhes
permitas entrem no templo da tua alma. Se és con-
ciencioso, nada tens que temer: és um herói de alma
pura, mesmo que te fosse preciso fugir cem vezes por
dia dos maus pensamentos. Nessas coisas, o valente é
o que sabe fugir.
Em resumo, jámais toleres voluntariamente, por
um só instante, pensamentos impuros em tua cabeça.
Em outro qualquer negocio, para vencer, é preciso
pensar; aqui, o exito tem por condição saber não
mais pensar em semelhantes coisas. Quando passeias
por um jardim e uma repelente lagarta te cai nas
mãos, não tens necessidade de refletir por muito tem­
po para a esmagar, antes que ela te emporcalhe. Se
cai uma fagulha em tua roupa, não te pões a olhar
tranquilamente para ela até que a queimadura se ex-
tenda mais, mas logo tratas de a apagar, pois de outro
modo pegaria fogo a tua roupa. Expulsa da cabeça e
abafa teus pensamentos tentadores.
186 A Casta Adolescência

Chamo agora tua atenção para uma coisa que


pode causar inquietações inúteis a um jovem conci-
encioso — se é que ele ainda não ouviu falar nela.
Com o tempo, pelos dezeseis ou dezesete anos, o teu
desenvolvimento fisico chega a um grau em que o
organismo — geralmente durante o sono — segrega
um certo liquido e provoca ao mesmo tempo em ti
uma excitação dos sentidos. Não te perturbes. — Se
isso não acontecer por demais (mais que uma vez
por semana), não é nem doença nem pecado, mas
sinal do desenvolvimento do teu organismo. Mas, se
isso acontece muito frequentemente, não é sinal de
doença, mas de fraqueza dos nervos ou de excessiva
fadiga, ou ainda de qualquer perturbação moral. Esse
corrimento não depende de ti, tal como a pulsação
do coração ou a respiração, é, portanto, uma coisa
perfeitamente natural. Trata-se da grandiosa sabedo­
ria do Criador regulando as coisas de modo a que o
que ha de supérfluo no organismo (supérfluo atual­
mente, pois o espermen que é expulso cpm o humor é
ainda muito fraco e só daria vida a crianças enfermas)
saisse por si mesmo.
Mas a sensação, o prazer que o acompanha não
é um pecado? Não, porque não excitaste em ti esse
prazer, é apenas um pecado, se aí encontras natural­
mente prazer ou se, de qualquer maneira, provocas
deliberadamente essa manifestação. Se acordares nessa
hora, ergue tua alma para Deus por meio da oração,
pensa em outra coisa e fica tranquilo até adormeceres
de novo. T ua alma ficará assim sã e salva.
Na epoca do crescimento, acontecer-te-á fre-
Luta e tem confiança 187

quentemente que o orgão sexual seja excitado durante


o dia e sem razões especiais. Se acontecer apenas isso,
também evita apenas usar roupas brancas muito aper­
tadas e quentes, a calça colada, não fiques muito tem­
po sentado, não faças movimentos estouvados, con­
tactos inúteis; não provoques artificialmente essa ex­
citação, pois a excitação sensual intencionalmentc pro­
curada é um pecado grave.
Repito o que já te disse; tudo depende da von­
tade, do consentimento. Mas ha no homem uma von­
tade chamada fisica, á qual nem sempre se pode opor
a nossa vontade espiritual. Visitas, por exemplo, uma
galeria de quadros e imediatamente, por acaso, teus
olhos caem sobre uma pintura imoral. A vontade fi­
sica desperta nesse instante, perturba-te e impele-te ao
pecado. Não é ainda um ato procurado, pois não és
responsável por ele. Mas a tua alma logo se apercebe
do que se prepara contra ti e, se desviares os olhos para
um outro quadro e se expulsares da cabeça a lem­
brança do quadro precedente, não pecaste. Para um
pecado, sempre se faz mister vontade e pleno consen­
timento.

6 5 . O contagio da imoralidade.

A imaginação é o campo de batalha cm que ge­


ralmente se trava o combate decisivo pela pureza da
alma. E’ o vidro de aumento que em geral atiça o pri­
meiro fogo; a palavra e a ação representam um re­
bato cuja nascente jorra das profundidades do pen-
vunento. Quem quer ser senhor da sua própria casa.
188 A Casta Adolescência

dos seus pensamentos, evitará que outros venham


destruir o seu jardim florido. Não te esqueças de
que o contagio moral se propaga mais depressa que
a mais perigosa peste ou o cólera. Faz-se mister que
nos imunizemos dele como das moléstias contagiosas,
cujo melhor preservativo — tu bem o sabes — é o
aceio. Onde o cólera levanta a cabeça, logo no dia
seguinte aparecem cartazes avisando toda a população
de que devem empregar o mais rigoroso aceio. Não
levar a mão á boca, não comer frutos que não estejam
bem maduros, lavar muitas vezes as mãos, não deixar
que as moscas pousem nos pratos de comida, etc. As­
sim também eu queria gravar com letras de fogo na
alma de cada adolescente: Meu filho, toma cuidado
com os bacilos da impureza. Eles rodam de todos os
lados. Pode-se deter um exercício com fios de arame
farpado, pode-se impedir uma inundação com diques,
mas o contagio da imoralidade é mais forte que os
exercitos, mais periogoso que uma inundação des-
truidora.
"Sim, prestarei atenção. Mas não sabe em que
mundo pecaminoso e desequilibrado vivemos hoje?” —
pergunta-me um excelente moço. “Zelar pela pureza
da minha alma? Mas ao redor de mim espumam mi­
lhares de tentações que a cada passo ameaçam prejudi­
car a alvura da minha alma".
E' com emoção que ouço esta terrível queixa tão
justificada, que salta dos lábios de tantos adolescen­
tes de nobre carater, contra a atual vida pecadora.
Sinto, meu filho, que tens razão e no entanto é pre­
ciso que resistas, ê preciso que conserves a pureza da
Luta e tem confiança 189

tua alma. Nos milhares de tentações da vida? Sim.


Nessa multidão de ocasiões de pecado? Sim.
"Mas, representam-se hoje tantas sujeiras nos
cinemas! Tantas obcenidades se apresentam nas cenas
dos teatros!" — mas quem te obriga a ir lá?
“Mas nos "music-halls” fazem rir a gente com
tantas grosserias!” — quem tc obriga a ir ouvi-las?
"Mas ha tanta nudez nos cartazes, tantas ima­
gens obcenas!” — Quem te força a contempla-las?
“Mas nas ruas as moças perdidas vos cercam e
convidam ao pecado!" — Quem te força a ouvi-las
ou a passar precisamente pelas ruas que elas frequen­
tam?
“Mas no colégio os meus camaradas mais velhos
proferem a cada instante imundicies!” — Quem te
obriga a tomar parte nas suas conversas ou mesmo a
ouvi-las?
Por numerosos que sejam os moços corrompidos
que conheces, crê-mc, meu filho, ainda ha hoje, mais
do que pensas, moços que levam uma vida pura e
que são obrigados a combater como tu, mas nisso mos­
tram coragem e força. Toma-os por amigos, a essas
almas heróicas.
Muitos estudantes se lamentam diante de mim:
"Que desgraça não causa em mim o instinto que
dviperta! Quantas tentações perturbam meus anos de
inventude! Porque não despertam em nós mais tarde
r.scs desejos? Porque surgem com tamanha força,
i|uando ainda não posso pensar no casamento? Esses
i«>vi-ns mal pensam quanta razão lhes assiste em falar
Realmente, o instinto sexual desperta hoje
190 A Casta Adolescência

nos moços bem mais cedo do que o comporta o desen­


volvimento normal. A razão está em que o modo de
viver atual afastou-se muito da natureza. Os teatros e
os cinemas, as leituras e os cartazes excitantes, os di­
vertimentos, a vida sedentária, a falta de exercício fí­
sico, a alimentação muito condimentada, etc., desper­
tam no corpo enfraquecido e arruinado do estudante
das cidades muito mais cedo e fortemente esses desejos
que no moço do campo, que se fatiga pelo trabalho
do corpo e leva uma vida mais natural e mais sim­
ples. O estudante ocupado em um trabalho intelectual
tem muito mais tentações que o rapaz do campo.
Daí decorre a necessidade, tanto maior, em que
estás, de fugir a todas as ocasiões que te possam ex­
citar os instintos.

66. Tuas leituras.

Presta atenção também aos olhos! Não permitas


jámais, seja qual for o pretexto, que eles reparem em
alguma coisa que prejudique, por pouco que seja, a
pureza da tua alma. Não esqueças, meu filho, que no
mundo atual uma verdadeira multidão de inimigos
te espreitam de todas as partes. Nos jornais, livros,
ruas, teatros, cinemas, a cada passo podes ver ou ler
coisas que escondem cm si, ás centenas, os bacilos
contagiosos. Defende-te, — pois, em todas as cir­
cunstancias e sê circunspecto em tuas leituras.
Primeiramente, algumas palavras sobre essas
leituras. Quantos livros que são uma vergonha, não
só para a moral, mas tantas vezes para o estilo! Se
Luta e tem confiança 191

eu te aconselho a ler muito (pois isso é necessário,


para uma solida formação), aconselho-te com insis­
tência a que não toleres em tuas leituras um só livro
que zombe da moral e, quer abertamente, quer por
termos dúbios, ensine a leviandade ou a licença dos
costumes. Esses livros são em geral, mesmo sob o
ponto de vista do estilo, os resíduos da literatura,
e por esse motivo já seria um prejuízo perder teu tem ­
po com eles. T al “literatura” não é terreno favoravel
á tua cultura, mas um cemiterio nos tumulos do qual
são sepultados: a esperança dos pais e o nobre ideal da
juventude.
Infelizmente, mesmo entre os mestres do estilo e
da novela, ha quem não tenha vergonha de molhar a
pena talentosa, que receberam de Deus, no lodo da
imoralidade, e descrevem, ensinam e publicam perfída-
mente as “belezas” , as “alegrias", os “prazeres” de uma
vida imoral. T anto mais perigosos são, pois pelo poder
da pena, arrastam também a alma dos seus leitores á
sua própria decadência moral. "Muito talento e pouco
carater” poder-se-ia escrever na frente dos livros des­
ses escritores, pois eles se consideram a si mesmos como
semi-deuses, e antes são verdadeiros porcos. Por ar­
tisticamente que seja fabricada a pistola que tens na
mão, nem por isso metes uma bala na cabeça, não
c verdade? Faze igualmente por não introduzir a
morte em tua alma com essas “obras primas” . Por­
que rebolar nesses montes de imundicie (mesmo que
af se encontrem palhetas de ouro) quando em nossa
literatura, graças a Deus, podes encontrar verdadeiros
diamantes?
192 A Casta Adolescência

E’ triste ser-se obrigado a verificar que a lite­


ratura “moderna” atual em grande parte exalta os
abusos do amor, as aberrações da vida sexual. Se as
elocubrações dos nossos romancistas e dos nossos
poetas fossem verdadeiras, teriamos que admitir dever
ser o homem ufano, não dos seus pensamentos ele­
vados nem das suas aspirações ideais, mas unicamente
dos seus instintos fisicos, dos seus desejos sensuais,
pelos quais ele se assemelha inteira mente ao animal.
Toma, pois, cuidado contigo mesmo e sê cir­
cunspecto em tuas leituras. Com que tristeza me es­
creve um jovem: “Primeiramente procurei nos ro­
mances o prazer sensual, e depois na realidade” . Não
imites esses jovens que leem tudo quanto lhes cai nas
mãos. Pois não é certo que aquele que come tudo
quanto encontra diante de si arruina o estomago?

67. Livros.

Não penso aqui, em primeiro logar, em Nick


Carter, Fantomas e outros romances policiais. E’ mau
le-los. Superexcítam a tua imaginação e enchem-te o
espirito de ideas romanescas, quando inúmeros li­
vros bons esperam que os leias; é uma verdadeira
loucura perderes teu tempo, com tais inepcias. Mas
penso mais nessa baixa literatura, nessas folhas humo­
rísticas, nesses opusculos em serie e nesses livros que
o teus companheiros já pervertidos lêem a um canto
do parque ou da casa, com o sangue fervendo, o cora­
ção pulsando, a imaginação em febre. Essas leituras
Luta e tem confiança 193

fazem tanto mal — ou mesmo mais — ao sistema


nervoso como o álcool, a nicotina, a cafeina. Sei
que recusarias com indignação se qualquer camarada
te propusesse semelhante leitura e quisesse iniciar-te
nos mistérios desses livros.
Estes e aqueles moços teem extranhos raciocínios
em tal domínio. Leem tudo quanto lhes cai nas mãos,
sabendo mesmo que o livro ofende a religião ou a
moral. "Só quero saber o que escrevem aqueles que
teem outra opinião./sso não me fará mal, não o leio
com má intenção”. Estou em crer que ele não lê re­
almente com má intenção apenas por curiosidade —
mas não creio que isso não lhe faça mal. Achas que
eu ficaria vivo se fosse a uma farmacia provar de
todos os venenos, "não por má intenção", mas "para
conhecer sómente os seus efeitos"? Ora, meu filho,
certos livros são para a alma do leitor veneno mais
violento que o arsênico.
Certos homens são incompreensíveis: se encon­
tram um cabelo na sopa, não podem mais comer: se
o ar num quarto é viciado, não podem mais demorar-
se lá — mais devoram e absorvem, sem dizer palavra,
os livros mais infectos.
Que a tua conciencia delicada seja sempre, por­
tanto, o melhor guia das tuas leituras. Seja qual fôr
o livro que tomes em mãos (mesmo que fosse um
livro reputado como obra prim a), se no acharaes
uma passagem que ofenda, mesmo em ponto menor,
a pureza da tua alma, mune-te de bastante vontade
para voltar a pagina sem a ler; e se semelhantes pas-
194 A Casta Adolescência
sagens se apresentarem frequentemente nesse livro, fe­
cha-o e acaba com a leitura .
Se já estiveres nas classes superiores, além de
Julio Verne e Karl May, e tantos romances e livros
científicos, é absolutamente necessário que também
leias alguns livros sérios que form em o carater e a
vontade; isto é, que se trate menos de os ler de um
trago (como um romance) do que refletindo e me­
ditando. Verás que benefica influencia exercerão estes
livros sobre a tua vontade. Naturalmente, só os me­
lhores livros correspondem verdadeiramente a este
fim.
Como exemplo: o Novo Testamento, principal­
mente os evangelhos: a "Imitação de Cristo", de
Tomás de Kempis; a “Introdução á vida devota” ,
de S. Francisco de Sales; a "Vida de Jesus”, de Wil-
liam; "Para se tornarem homens”, do Padre Guil-
laume; e os meus volumes “A' Juventude católica” .
Não quero enganar-te; não é uma leitura facil,
pois encerram abundancia de pensamentos sérios. Mas,
se em cada dia puderes consagrar a um ou a outro
nem que sejam dez ou quinze minutos, depressa de­
sempenharás a missão com um ardor c energia novos.
Seria também um belo habito ler cada dia, depois
da oração da noite, alguns versículos do evangelho
e medita-los. Tenta-o e verás que efeitos salutares
essa leitura terá em tua alma.
Luta e tem confiança 195

68. Jornais.
Escolhe também o teu jornal. Certamente que
a tua formação intelectual não sofreria se durante os
estudos secundários não lesses absolutamente jornal
algum. Terás tempo para isso mais tarde. Mas agora
a leitura dos jornais está tão difundida que talvez
também te interesses habitualmente pelos aconteci­
mentos de cada dia.
Enfim, se dispões de tempo, podes faze-lo; só­
mente, sê circunspeto a respeito dos jornais.
O maior numero das gazetas está em mãos de
editores que pensam primeiramente no maior proveito
material possível, mas ao contrario pensam muito
pouco se a parte literaria da sua folha está de acordo
com a moral. Os folhetins, os contos dos jornais (sem
falar das correspondências dos “pequenos anúncios")
estão cheios de historias de amor que, de modo aberto
ou velado, pregam e favorecem a imoralidade. Meu
filho, tu bem sabes qual o teu dever a esse respeito.
Ha jornais e revistas de primeira ordem cuja secção
literaria podes ler com toda a tranquilidade; mas, se
fores obrigado a ler, por qualquer motivo, outros
jornais, sê circunspecto com respeito aos contos e
romances. Realmente, de que vale fugir de uma cobra
quando já se está mordido?

69. Quadros.
Sê circunspecto para não importa que quadro.
Pinturas, esculturas ou outro qualquer espectáculo
196 A Casta Adolescência

não são dignos de teus olhares senão no caso de des­


pertarem nobres pensamentos em tua alma. Se tua
alma se chocar, por pouco que seja — mesmo tra­
tando-se da famosa Venus de Milo — conheces qual
o teu dever, deves desviar o olhar para outra coisa. Que
dizer então dos cartões postais chamados "artisticos",
que os estudantes passam ás mãos uns dos outros,
sob o pretexto de estudarem a "historia da arte” ?
Certamente que esses cartões postais impelem frequen­
temente ao pecado infame.
Os artistas da antiguidade ou da Idade Media
representam sem duvida o corpo humano em sua nu­
dez, mas essas imagens não excitam a sensualidade
como as nudezas atuais; ao contrario, fazem cintilar
a potência do espirito, que domina o corpo do homem.
Essas nudezas são idealizadas, e a expressão grave do
rosto abafa qualquer sensualidade.
Pode ocorrer que antigas estatuas perturbem tua
alma delicada — nesse caso não fixes os olhos nelas.
Mas fica certo de que a maior parte dos artistas mo­
dernos, com as suas nudezas, só querem excitar as
paixões, e mesmo certos pintores fazem uso do nú
unicamente para dissimularem a sua falta de talento.
Não te fies no que alguns dizem para desculpar
a sua falta: “O corpo do homem foi criado por Deus;
não pode, pois comportar inconveniente que se não
tenha o direito de olhar” . Sem duvida, mas sê se­
veríssimo em teus olhares para contigo mesmo (por
exemplo, quando tomas banho) e não contemples
o que possa perturbar a tua alma. Certamente, foi
Deus que criou o corpo do homem, e o corpo hu-
Luta e tem confiança 197

mano é verdadeiramente uma obra prima. E’ nele


que se observa a sabedoria admiravel e amante do
Criador mais do que em não importa que outra
criatura do mundo. N ão é no corpo humano que está
a falta, mas na fraqueza da nossa alma. Qualquer
que seja o valor artístico de um quadro, de uma es­
tatua, de um filme, se impelem ao pecado, não podem
ser verdadeiras obras de arte. Pois a verdadeira obra
prima deve poder ser contemplada, sem risco de ex­
citação culposa. A tranquilidade da alma pertence,
sem contestação, ao gozo estetico.
Sim, o corpo humano é santo para nós, e pode
ser para nós um objeto de interesse, mas apenas en­
quanto instrumento da alma e com a condição de re­
velar os sentimentos e as vontades da alma. Mas, desde
que o artista representa o corpo para ele mesmo, re­
duz a alma ao papel de escravo c desperta em nós o?
baixos instintos.
Não só as leis da moral, mas também as da es-
ictica pedem que a nudez não seja representada senão
para exprimir as qualidades da alma, nunca para ela
mesma. E’ uma vergonha para a humanidade que os
escultores pagãos e romanas tenham sido bem mais
loncienciosos neste ponto que os pintores e os esculto-
ies da nossa epoca cristã. As estatuas antigas — mes­
mo as nuas — produzem a maior parte do tempo uma
impressão tão espiritual e delicada que não escanda-
h -.im. Em comparação com elas, os nús modernos
•iti.tsi não passam de um convite intencional a pen-
imenlos e desejos impuros.
Tens, pois, o direito de examinar um quadro,
198 A Casta Adolescência

uma estatua despida? A resposta depende de duas cir­


cunstancias: 1) qual era o fim do artista, represen­
tando em sua nudez o corpo humano? 2) qual é o
teu temperamento? Se o artista teve por fim despertar
as paixões impuras e os desejos carnais (ah! é o caso
dos nús modernos), passa com asco diante desse
quadro. Mas, se o corpo é representado nú para expri­
mir mais fortemente um movimento da alma (pensa,
por exemplo, no famoso grupo do Laocoonte), então
podes contemplá-lo. Mas, aqui, presta também aten­
ção a outra circunstancia: qual é o teu temperamento?
Ha naturezas mais frias ou juvenis que á força de
vontade se dominam o bastante para não se deixarem
perturbar por espectáculos desse genero; podem olhar,
sem prejuizo para a sua alma (o melhor seria que
todos os moços pudessem chegar a tal insensibilida­
de). Outros, a principio, não pensam no mal, mas
só um pouco mais tarde; desde que esses pensamentos
lhes surgem, devem desviar o olhar de tais quadros
ou estatuas. Enfim, ha-os de temperamento tão sen­
sual que não podem mesmo contemplar uma obra
prima sem mau pensamento — esses não teem o di­
reito de olhar.
Qual é, pois, a regra a seguir? Jamais contem­
plar o que te cause maus pensamentos, que não possas
imediatamente dominar. Não esqueças uma coisa: ha
quadros e estatuas que ferem qualquer homem honesto.

http://alexandriacatolica.blogspot.com
Luta e tem coufiança 199

70. Teatro e cinema.


Também é necessário que eu te advirta a res­
peito dos perigos do teatro e do cinema. A critica
dramatica dos jornais, que na sua maior parte é lar­
gamente paga pelos autores ou diretores de teatro,
leva atualmente aos píncaros da lua cada peça, se
bem que te seja por assim dizer impossível saber se
com o dinheiro que dispendes a tua alma não ficará
durante tres horas encharcada de grosserias.
Críticos ilustres e imparciais comprovaram que
o teatro atual quasi mais nada tem de comum com
a arte.
Aliás, também tu o pudeste verificar. De fato,
repara ao redor de ti: em que teatro se desempenham
atualmente peças dos grandes autores drama ticos? pe­
ças classicas celebres? em parte alguma ou apenas
muito raramente.
Ao contrario, representam-se todos os dias as
peças "modernas” com suas grosserias, adultérios, se­
duções de moças, eternos amores ocultos. Agradam
mais ás massas dos nossos dias e rendem mais di­
nheiro — reconheço-o; mas então que não se pro­
nuncie a palavra sagrada “arte" a proposito dessas
peças de teatro.
Efetivamente, se se pudesse seguir os autores
dramáticos e os romancistas atualmente em voga, se­
ria preciso reconhecer com espanto que o fim mais ele­
vado e mais nobre que possa ser proposto á vida
humana é a satisfação dos seus mais baixos instintos.
Onde ha hoje peças sem historia de amor ou
200 A Casta Adolesccncia
sem situações diretamente pecaminosas? E ’ aí que os
espectadores aprendem ser o amor o fim mais impor­
tante da vida humana. Mas, que grande mentira,
não é certo? Com efeito, o amor só ocupa alguns anos
na vida do homem e não passa de uma só das nume­
rosas coisas importantes de que o homem se deve
ocupar.
Sim, noutros tempos, o teatro era um meio de
cultura em que os homens se iam purificar das suas
paixões. Hoje, é totalmente um logar de divertimen­
to que não faz senão atiçar mais violentamente as
paixões humanas. Realmente, os cartazes gritantes de
certos filmes, o titulo de certas peças já são uma
provocação ao mal.
Catão o Antigo não suportava teatro permanen­
te, porque levava o povo á ociosidade. E Seneca, ba­
seando-se na experiencía, escreve: "Nada ha mais no­
civo aos costumes que a frequentação dos teatros.
E' aí que os pecados, sob o véu do prazer, nos atacam
tanto mais facilmente. Quando saio do teatro, fico
mais cupido, mais orgulhoso, mais sensual, mais cruel,
mais inhumano" (Dollinger, Heídentum und Juden-
tum , pag. 727). Ai! nada podemos tirar a este ju l­
gamento severo de outros pagãos quando considera­
mos os teatros atuais.
No entanto, não quero dizer com isso que a li­
teratura dramatica atual nada produza de valor.
E ’ apenas lamentável que as produções literá­
rias sérias sejam como que abafadas em consequência
da falta de uma crítica competente, ao lado de livros e
de peças sem valor, que fazem o objeto de um re­
Luta e tem confiança 201
clamo insensato e ruidoso. Se, por consequência, as­
sistes a uma peça “moderna” , se lês a literatura "mo­
derna", e se ouves dizer constantemente que tudo
isso pertence á cultura "moderna”, não esqueças um
m inuto que a sujeição do puro ideal do homem á
sensualidade — mesmo por processos artísticos —
não è, nem cultura nem arte, mas um injusto aten­
tado contra o nivel da humanidade.
Estes escritores, á custa do nome da arte, não
fazem senão dissimular a imoralidade que não ousam
ainda vender abertamente hoje. Não receies, pois.
ficar para trás no domínio da arte e da cultura, se
fazes uma escolha severa entre as peças de teatro ou
os filmes que queres ver e os livros modernos que
queres ler. Muitas vezes o proprio titulo te advertirá
de que cairias na imundicie. Sei que não irás.
Mas, que fazer se, por acaso e de boa fé, caes
em semelhante peça? Não podes abandonar a represen­
tação sem escândalo; mas podes sem escandalo — e
deves faze-lo — fechar os olhos até que esteja acabada
a cena ou até que tenha passado a parte inconveniente
do filme. Preservar-te-ás de muitas tentações supér­
fluas, se não fizeres ouvidos moucos a este conselho
e se souberes vencer a curiosidade que então se des­
perta. Quando se trata de defender a pureza da tua
alma, toma em geral por principio que é preferível
ser prudente a ser audacioso.
202 A Casta Adolescência

71. A dama.
Depois do teatro c do cinema, tenho a dizer-te
algumas palavras sobre a dansa. Estás certamente com
receio de que eu vá proibir-ta.
Pois bem, atende um pouco.
E’ certo que a loucura da dansa, que faz furor
na sociedade atual, não convem absolutamente a pes­
soas graves e que pensam seriamente. Ha muita ver­
dade na apreciação severa dos antigos romanos que
classificavam as dansas entre as coisas inconvenientes
a um homem livre. E muitos jovens que sofrem da
doença da dansa fariam bem em ler estas palavras
de Cícero com que ele defendia o cônsul Murena,
acusado de haver dansado: "Não se tem o direito de
erguer levianamente uma tal acusação a um cônsul
romano; que crime cometeu ele para que se lhe possa
imputar semelhante coisa? Efetivamente, ninguém
dansa sem estar embriagado ou louco" (Pro Murena,
V I, 13).
Ainda que rodar com as pernas durante horas
inteiras numa sala de baile superaquecida e em atmos­
fera cheia de poeira não seja a mais sã das distrações,
no entanto — não tenhas medo — sou mais indul­
gente que Cicero e não condenarei totalmente a dansa.
Conforme o tempo e logar, pode ser uma distração
honesta para os maços dt carater.
Vais talvez perguntar com espanto porque colo­
car o carater e a dansa no mesmo pé de igualdade.
Ora, é na dansa que se revela o carater viril ou a
fraqueza voluptuosa de cada um. Em parte alguma
Luta e tem confiança 203

talvez mais facilmente que aí. A dansa é a verdadeira


pedra de toque de um carater viril. Cada movimen­
to, cada olhar, cada palavra mostram o que vales
interiormente. Um carater fraco aproveita esta ocasião
para satisfazer seus baixos instintos e sua leviandade.
Um moço de carater não esquece um só instante que
é o "cavalheiro” da sua dama; ora o cavalheiro não
só defende a sua dama contra os ataques dos outros,
mas em primeiro logar contra os pensamentos ou
os desejos menos nobres da sua natureza e dos seus
proprios instintos.
O jovem de carater que defende o seu par não
só contra as correntes de ar mas também contra o
calor excessivo do seu temperamento, que presta aten­
ção não só á dansa em regra, mas ao apuro da con­
versa; não tem que recear escorregar no assoalho en­
cerado nem encerrar o seu prazer com uma queda
moral. Pelo contrario, o carater fraco só se preocupa
em não cair ao chão e não sabe que ao mesmo tempo
seria preciso preservar-se duplamente da queda moral.
Posso afirmar ousadamente que a atitude de um
jovem durante a dansa é uma das melhores pedras
de toque da sua firm eza de carater e do seu espirito
cavalheiresco.
No entanto, continua verdadeiro o provérbio
alemão: “No baile é o diabo que toc* o violino” .
E* verdade que a dansa continua sendo sempre uma
ocasião perigosa para a alma do jovem. Portanto,
não te entregues jámais ao prazer da dansa, sem ter
pedido a Deus, numa rapída oração, que proteja dê
qualquer modo a brancura da tua alma. Depois de
204 A Casta Adolescência
haveres pesado o pró e o contra, verás sc podes razoa­
velmente tomar parte na dansa.
Um estudante, depois de haver lido este capitulo
numa precedente edição do meu livro, escreveu-me,
dizendo em tom de censura que eu deveria comdenar
absolutamente o modo de dansar “atual", pois a
dansa "moderna” outra coisa não é senão uma pro­
vocação voluntária aos instintos sensuais. Evídente-
mente, não tenho necessidade de dizer que não per­
mito senão dansas convenientes. Pois ha dansas que
devem ser implacavelmente "boycottadas” e deixadas
aos macacos, ás cabras e aos “homens" que ha muito
tempo ultrapassaram a linha de demarcação de uma
conduta honesta.

72. Sê cavalheiresco.
Como a historia dos heróis te inspira respeito,
não é verdade, meu filho? Um Aníbal, um Alexandre
Grande, um Julio Cesar, um Napoleão. No entanto,
não ha no m undo herói maior, maior vencedor que
aquele que sabe submeter seus baixos instintos ás leis
da razão; do mesmo modo, ao contrario, não ha mais
vil escravidão para o homem chamado ao dominio
intelectual do que gemer nas algemas das paixões
cegas. Procura pensar nisso nos momentos dificeis em
que te seja preciso de novo sustentar luta contra os
baixos instintos.
Atem-se a sempre manifestar um espirito verda­
deira mente cavalheiresco para com as mulheres. Não
te limites a mostra-lo, mas sente-o de fato.
Luta e tem confiança 205
Não penso aqui nos modos afetados, nesses eter­
nos cumprimentos que os peralvilhos modernos cha­
mam conduta cavalheiresca, mas penso nos verda­
deiros cavaleiros da Idade Media cuja espada estava
sempre pronta a proteger os fracos e cujo coração
estava sempre disposto a defender a honra das mu­
lheres. O verdadeiro cavaleiro é o que protege a m u ­
lher em primeiro logar contra os desejos desregrados
do seu proprio corpo e contra um jogo frívolo. O
verdadeiro cavalheiro é o que descobre em cada mu­
lher, mesmo nas infelizes mais decaidas, a imagem de
sua mãe e de suas irmãs, e evita aproximar-se delas
com desejos impuros, do mesmo modo que não tole­
raria que outros se aproximassem de sua mãe ou de
sua irmã com intenções deshonestas. Respeita a mu­
lher como se respeita a flor que não deve secar para
que possa dar frutos.

73. Em companhia das mulheres.

Se assim pensas a respeito das mulheres, é o que


se ha de observar em tuas palestras. Aliás, tu não
procuras hoje a companhia das mulheres, mas, se com
elas te encontrares, nem por isso fiques perturbado.
Teus nobres sentimentos serão a garantia da tua con­
duta irrepreensível. Em tuas palavras, olhares, jogos,
etc., nunca percas de vista os teus deveres cavalheires­
cos. E nunca te permitas, na presença de uma moça,
o que não gostarias que outro rapaz fizesse diante
de tua irmã. E, se sentes que, por exemplo, as di­
206 A Casta Adolescência

versões a que neste momento te entregas não são ape­


nas simples passatempo, mas também ocasiões de pe­
cado (por exemplo: se for preciso resgatar uma pren­
da por um beijo), sê bastante habil e trata de passar
a outro divertimento.
Cuida sobretudo em que o teu cacatec viril não
amoleça sob o efeito das carícias, das gentilezas, dos
afagos femininos, mesmo de teus pais ou de tuas
irmãs.
Uma vontade de ferro, um carater inflexível,
uma energia viril — eis o que se te deve impor.
As eternas ternuras, os abraços, as carícias, nas
mulheres ainda passam!, mas nas veias de um rapaz
deve correr um sangue viril, jamais sangue de nabo
ou de limonada. "Os sonhadores vendem por vil pre­
ço a sua vida” , Certos rapazes, na adolescência, so­
nham durante uma semana inteira em um personagem
de romance, formam imensos projetos de futuro e não
chegam a aperceber-se quando essa sentimentalidade
se transformou em sensualidade.
Podes compreender desde logo o meu desejo de
que o rapaz, enquanto não pode pensar seriamente
no casamento, não frequente o mundo feminino. Isso
o efeminaria. O seu carater, desenvolvendo-se em se­
melhantes condições, perdería toda a característica de
virilidade. O amor não é um brinquedo de criança
e os anos de juventude não são para as aventuras
frívolas.
Um conhecimento mais íntimo com uma mulher
só será permitido quando puderes pensar seriamente
Luta e tem confiança 207
no casamento. Qualquer outro namoro é jogo frívolo
com a pureza e a honestidade.

74. Tua noiva pura.

Serás preservado de muitos passos em falso se,


na idade ingrata, pensares algumas vezes na inocente
jovem á qual, segundo os planos de Deus, has de um
dia jurar perpetua fidelidade e que agora roga an-
ciosamente que nenhuma mancha moral venha enxo­
valhar o seu véu branco de noiva, e que — em qual­
quer logar desconhecido guarda com cuidados pudicos
a sua inocência virginal para o futuro cavalheiro.
E's tu esse cavalheiro, meu filho.
T ua alma é realmente também candida?
Teus pensamentos são também puros?
Conserva todas as tuas forças, todos os teus pro­
jetos, todos os teus pensamentos para o grande e unico
amor que te deve unir, até á sepultura, á futura noiva.
Que a imagem dela flutue diante de ti como
um anjo da guarda e proteja o teu tesouro, a pureza
da tua alma, da qual deve sair um dia a flor do teu
amor e brotar a felicidade da tua vida familiar. A
tua atual vida imaculada e pura terá como recompensa
os beijos de uma esposa virginal.
Pois o dote mais precioso é um corpo casto e
uma alma imaculada, e um homem digno deste nome
não quer conquistar senão uma só mulher — a sua
futura companheira.
Sabes que a tua vida familiar 'não poderá ser
208 A Casta Adolescência
feliz se antes do casamento a vida de celibatário
não tiver sido pura. Mas daí resulta, não é verdade f,
que o conhecimento e o trato com uma moça não
podem ser honestos, bons e permitidos senão numa
idade conveniente e com fins de casamento; outro na­
moro é frívola diversão e uma leviandade que indica
falta de carater.

75 . Ama a decencia.

Ao lado dos conselhos que te dei, deixa-me que


te ofereça outros ainda, eminentemente práticos. Ama
também a decencia, o aceio. Lava-te varias vezes por
dia, e toma banho tantas vezes quantas possas. Pela
manhã lava-te com agua fria até á cintura. A ordem
exterior ajuda muito a ordem na alma. Não quero
dizer que a alma de todo jovem elegantemente ves­
tido esteja em ordem. Não! Mas, ao contrario,
é um fato que o exterior reage sobre a alma
e que um adolescente de cabelos hirsutos, de hábitos
pouco aceados, de cara suja, de unhas mal tratadas,
é mais facilmente levado aos pensamentos, as con­
versas malsãs e mesmo a atos de graves consequências.
Em compensação, o aceio exterior é muitas vezes
penhor do aceio interior: aumenta a nossa tendencia
para tudo quanto é puro e previne-nos contra o que
podería manchar a nossa alma. Coisa notável: o que
toma banho muitas vezes também fica mais facil­
mente puro na alma, como se o seu corpo bem aceado
fosse protestar contra toda a mancha da sua alma.
Luta e tem confiança 209

7 6 . Morre e ressuscita!

Não quero enganar-te, — meu filho e eu to digo


francamente: a educação perfeita da vontade, de modo
que obedeça como um cordeiro a cada um dos nossos
pensamentos, é certamente dificil. E'-te necessário,
pois, recorrer de boa vontade a todos os meios que
te ajudem a atingir esse fim. Um dos meios mais
eficazes neste dominio é a mortificação.
A mortificação? — Brr! — exclamam muitos
moços ouvindo esta palavra. Que obscurantismo me­
dieval! Vive-se hoje numa epoca de “positivismo",
hoje não se pode falar senão numa "vida de pro­
gresso”. Hoje cada um quer "viver a sua vida”, e
não diminui-la e sacrifica-la.
Atende um pouco! Que vem a ser a mortifica­
ção? Um meio de adquirir a vontade forte de que te­
mos absoluta necessidade se queremos adquirir a no­
breza de carater, A mortificação é o abafamento dos
desejos e das inclinações desordenadas e desregradas
do corpo. Portanto — compreende bem — a mor­
tificação não esmaga a nossa natureza, não violenta
a nossa natureza nem as nossas faculdades naturais
(pois sem estas ultimas não teriamos valor algum),
mas apenas os nossos desejos desordenados e exa­
gerados, que são perigosos para a nossa existência.
Todos nós estamos cheios de defeitos, portanto
temos necessidade da mortificação. A mortificação dá-
nos o dominio de nós mesmos; mas está perdido o
jovem que as paixões arrastam porque lhe falta o
dominio de si mesmo. A mortificação dá-nos a pa-
210 A Casta Adolescência

ciência para comnosco mesmos e para com o nosso


proximo; sem ela não nos podemos sair bem na so­
ciedade. A mortificação dá a vitoria sobre si-mes-
mo, e sem ela não pode existir ideal nobre e ele­
vado, nem personalidade, nem carater, nem cultura,
nem civilização, nem progresso.
Tudo isso não se pode realizar senão empre­
gando violência contra os nossos maus instintos. Essa
violência, a que chamamos mortificação, não é um
fim em si; é apenas um meio, um instrumento de
passagem para a vitoria, para a alegria que enche
uma vida formada por uma mão feliz. Ao contrario,
os que falam do “direito de viver do instinto", de
“viver a sua vida”, e se inclinam covardemente diante
de cada um dos seus desejos desregrados, perdem a
predisposição para a verdadeira alegria e arruinam
a sua própria vontade, carater e saude, assim como
a cultura humana.
“Devemos marchar no progresso”, muito bem,
mas o progresso não consiste em ceder ás exigências
dos nossos instintos, antes em suste-los com firmeza.
Assim como a agua, sob forte pressão, atinge uma
força incrível, e na prensa hidráulica levanta como
uma pena fardos consideráveis, assim também a mor­
tificação ergue a natureza humana decaída.
T al é o sentido desta frase, bem conhecida, de
Goethe: "Stirb und werde” ! Morre e ressuscita!
Luta e tem confiança 211

77. O raquitismo da alma.


Já viste crianças de rosto pálido, cujas pernas,
ou pescoço ou costas, são mantidos num aparelho,
e que se arrastam tão tristemente curvadas? Todos
olham para elas com piedade: "Infelizes raquitico-
zinhos!"
Pois bem, se tivéssemos uma lampada, como o
Aladino da fabula, com que pudéssemos ver uma
alma humana, então só gritaríamos a cada passo:
“Pobres almas raquíticas!’’
Que veem a ser essas almas raquíticas?
São almas que milhares de comodidades da vida
civilizada c a preguiça enraizada em nossa natureza
tornaram moles e covardes, almas que teem horror
a qualquer esforço, almas que estremecem logo que
ouvem falar em trabalho, dever, dominio de si mesmo,
mortificação. Tais almas podem desenvolver-se, sua
inteligência pode cultivar-se, mas a vontade delas —
que lhes será constantemente necessária durante a vida
petmanece definhada, adoentada, anêmica, inútil.
Pobres almas raquíticas! Meu filho, também
queres ficar assim?
Ficar? — perguntas tu. Pertencerei, neste mo­
mento, ao numero de tais almas?
Sim, pertences. O raquitismo físico — graças a
Deus! — é uma doença bem rara nas crianças, mas
o raquitismo da alma — justamente por causa da
fraqueza da nossa vontade — é inato em nós, e é
preciso que nos curemos dele, que nos desembaracemos
dele.
212 A Casta Adolescência

Tens um irmãosinho de quatro anos? Pois bem:


observa a sua conduta, como a vida física o domina.
Se o teu bolo, á refeição, é um centimetro maior que
o dele, como chora, como se lamenta! como é incapaz
de re ' tir a qualquer dos seus desejo* e de se refrear!
A vontade dele ainda é raquitica.
Pois bem; tu já viste que uma vontade forte
dormira em cada um de nós, mas esta faculdade de­
vemo-la despertar por meio de um trabalho conciente,
perseverante e quotidiano. Começa desde hoje a edu­
cação da tua vontade. Quanto mais cedo começares,
mais isso te servirá. Quando fores maior, tua vontade
será indócil e dura como uma velha arvore. Dificil­
mente se encontra um adolescente que queira cair no
pecado. No entanto, muitos ha que nele caem contra a
sua vontade. Porque? Porque a vontade deles é fraca.
Por consequência, é de extrema importância o meu
conselho de que fortifiques a vontade com exercidos
repetidos.

78. Fortifica a vontade.

No dominio moral caem muito cedo os que se


conduzem passivamente para com os seus desejos sen­
suais e não passam de frágil joguete dos seus instin­
tos. Quero chamar tua atenção para este ponto. Ha­
bitua teu corpo a pequenas mortificações. Experi­
menta uma vez ou outra renunciar a alguma coisa
que agrade aos teus sentidos e te não seja proibida.
Não muitas vezes, mas de tempos a tempos,
para experimentar se trazes bem segura a alma, pro-
Luta e tem confiança 213
eura, por exemplo, durante um quarto de hora, não
beber, quando entrares em casa, morrendo de sede,
após uma escursão. Quando encontrares ao almoço o
teu bolo predileto, deixa um bom pedaço, não o
comas todo, e se um prato está acaso queimado, come
dele sem uma palavra de comentário. E, se cbe;;ares
tarde do colégio, e com fome, não atormentes com
queixas os ouvidos de tua mãe, sob o pretexto de
que vais morrer de fome, se o almoço não for ime­
diatamente servido. Apresentada a sopa, qualquer que
seja o teu apetite, não a devores com uma avidez ani­
mal, mas domina o teu estomago esfaimado. Se pas­
sares em frente a uma confeitaria, cuja atraeme vi­
trina te faz saltar o dinheiro da algibeira, piocura
dizer um "não” algumas vezes. Se, ao te lavares, o
sabão te escorregar das mãos, não te irrites, mas sorri
e apanha-o de novo. Se se rompem os cordões do teu
sapato, quando estás com pressa de te vestir e prepa­
rar, não atires longe o ‘ calçado, mas assobia alegre­
mente, concertando os cordões. Se o teu embrulho
de livros de aula te escorrega do braço, não praguejes,
mas abaixa-tc de bom humor e cantarola alegrerrente.
Se não puderes desmanchar um nó, não vás buscar
imediatamente um faca mas esforça-te pacientemente
por desatar sem gladio o nó gordio. . .
E, quando o sol de maio brilhar resplandecente,
poderás estudar tranquilo junto aos teus livros e
não correr atrás dos brinquedos em vez de ficar perto
dos estudos? E de manhã, quando chegar a hora de te
levantares, poderás saltar imediatamente da cama, de
bom humor, sem bocejar e te estirares, apesar da atra­
214 A Casta Adolescência

ção de um quente cobertor e de um macio travesseiro?


E se, depois de um grande passeio, os joelhos esti­
verem por assim dizer despedaçados de fadiga, poder-
te-ás inteiriçar e andar de porte ereto? Diante de uma
vitrina que excita a tua curiosidade, poderás deixar de
olhar para ela? Com um condiscipulo que te é “an­
tipático”, poderás mostrar-te amavel? Quando te
derem uma ordem, poderás, — por desagradavel que
ela seja — executa-la imediatamente sem comentário?
Se as coisas não te correm imediatamente como
queres, és capaz de não te enervar; se zomba de ti,
de não responder ás zombarias; se a porta se abre.
de não olhar imediatamente; e, quando recebes uma
carta, és capaz de não a abrir? Se alguém te ofende,
és capaz de conter a cólera, que te queima como a
febre? E, se alguma novidade te faz cócegas, és capaz
de a guardar em segredo durante um dia? E’s capaz,
quando te pões a estudar depois do almoço, de deixar
em cima da mesa dois ou tres bon-bons de chocolate,
e de os abandonar assim diante de ti, sem que neles
toques até á noite, apesar dos sobresaltos da gula,?
E, quando leres alguma coisa interessantíssima, és ca­
paz de fechar o livro na passagem mais palpitante e
não continuar a leitura senão no dia seguinte? A'
mesa, durante o almoço, ou em aula no teu banco,
poderás ficar sentado tranquilamente, sem te mexeres?
E conservar-te sempre em boa posição, mesmo que te
sintas fatigado? E assim por deante. . .
Vais dizer-me: são minúcias. E’ verdade. Mas
não sabes que as grandes coisas são feitas de minúcias
e que os arranha-céus de Nova Iorque, de cincoenta
Luta e tem confiança 21õ

andares, foram construídos com pequenos tijolos?


São estas pequenas vitorias quotidianas que farão au­
mentar a confiança em ti mesmo, e então não recuarás
assim facilmente diante das dificuldades que encontra­
res pela existência afora. Porque aquele que souber
ganhar a mais difícil das vitorias — a vitoria sobre
si mesmo — poderá também ganha-la em todas as
lutas da vida. Dir-se-á dele que é um "homem de
carater” . A menor mortificação com que habitues o
corpo a obedecer á alma é uma inapreciavel fonte de
energia para o tempo das tentações que reclamam uma
seria resolução, tal como se pode com pequenas cen­
telhas eletricas reunir grandes forças eletricas nos
acumuladores. São estas minúcias que te hão de de­
monstrar que só o espirito é capaz de dominar a ma­
téria.
Uma juventude conservada pura é um nobre e
sublime ideal. Mas é somente com progressos contí­
nuos e repetidos esforços que se pode chegar ás alturas.
Roma não foi construída num dia e o carater não é
uma sorte grande que nos cai por acaso.

7 9 . A alegria da vitoria.

Em geral, tua vitoria será mais certa se te forti­


ficares contra os ataques das paixões sensuais, não
travando a luta diretamente contra elas, mas — por
assim dizer — dando uma volta pela retaguarda.
Quer dizer, não reflitas por m uito tempo nestas
coisas, mas expulsa-as o mais possível do domínio da
216 A Casta Adolescência
tua atenção; em compensação empanha-te na luta
contra os teus hábitos prediletos e contra as tuas fra­
quezas. Quanto maior for o exito que alcançares na
luta contra as tuas inclinações para a preguiça e a
inexatidão, tanto mais tc habituarás ás provações, ao
silencio, á paciência, etc., e tanto mais forte serás con­
tra as exigências ilegítimas dos teus instintos natu­
rais. Daquele que jamais repeliu uma coisa permitida
não podes esperar que também evite tudo o que c
proibido. Não se faz mister esforço para pecar, nós
caimos; mas não ha carater sem uma vontade forte.
Muito melhor poderás fortificar a vontade con­
tra os instintos carnais, se num outro terreno te pre­
paraste a vencer-te e privar-te. Quanto mais exerci­
tamos nossos musculos, mais fortes eles se tornam, e,
quanto mais exercitarmos a nossa vontade, mais se­
nhores dela nos tornaremos e mais fáceis nos serão as
boas ações; e uma alegria indescritível nos invadirá
sobre a impressão da vida espiritual que vai desabro­
char em nós. Aquele que, como criança, adolescente,
moço, soube, em pequenas cousas aparentemente in­
significantes, triunfar da curiosidade, da gula, da pre­
guiça; aquele que, dentes cerrados e cabeça erguida,
o peito arqueado, os olhos brilhantes, sabe suportar
o frio c o calor, a fome e a sede; aquele que sabe calar-
se e dominar os seus olhares, aquele que abafa a có­
lera que o queima; — esse não creio eu que ceda ás
exigências dos seus instintos. Pois no instante de­
cisivo, a uma ordem imperativa severa, repelirá os
instintos mais exigentes, como se- fossem pequenos
cães em furia. Aquele que aos dez anos se pode privar
Luta e tem confiança 217

voluntariamente de um pedaço de bolo, também aos


dezeseis poderá resistir valentemente ás tentações dos
sentidos,
Não ha duvida que será preciso lutar; mas a
própria luta vem acompanhada de alegria. De fato,
são precisamente os moços que mais gostam de lutar
entre si e de ostentar a sua força. Mesmo nos jogos,
preferem aqueles em que possam mostrar habilidade
e força. Pois bem; eis aí tens ocasião de mostrar a tua
força de vontade ou ainda de aumentá-la ou fortifi­
cá-la. Limita-te a fazer scriamente essas pequenas ex­
periências de vontade, que enumerei acima. Não ape­
nas hoje ou amanhã, mas continuamente. Estou certo
de que te agradarão. Já esta mesma luta, esta prova
da tua força te encherão de alegria; e, se um dia se
acender em ti uma energia capaz de triunfar sobre
todos os obstáculos, que sensação benefica de vitoria
e que doce alegria após a primeira batalha ganha
sobre a tua vontade rebelde, os teus caprichos, as exi­
gências do teu corpo!
A alegria do triunfo impele á perseverança. As­
sim também — se deves lutar contra um pecado de
habito já enraizado — agirás mui prudentemente
não tomando resolução a principio senão por pouco
tempo, digamos quatro ou cinco dias: poderei muito
bem ficar sem pecado durante esse tempo. Depois do
quinto dia vês que foste feliz. . . "Meu Deus, ainda
tenho um pouco de vontade. Na próxima semana é
preciso triunfar mais uma vez". Se ainda vences, então
já contas com duas semanas de vitoria atrás de ti.
e isso te encoraja a prosseguir na luta.
218 A Casta Adolescência

Entre os naturais das ilhas Sandwich reina a


crença de que, quando matam alguém, a força da vi­
tima passa para eles. E’ superstição. Mas não é mais
superstição, é pura verdade que, todas as vezes que
triunfas das exigências dos teus instintos, torna-se-te
mais forte a vontade. Efetivamente, o que experi­
mentou um dia esse prazer sente em si mesmo uma
energia que o impele para as maiores vitorias, e certa­
mente virá a ser muito mais feliz do que aquele que
se inclina sem força perante os desejos carnais como
um frágil caniço agitado pelo vento.
Lê, meu filho, a seguinte carta que me foi man­
dada por um estudante:

“M o n s e n h o r ,

. . . achei, enfim, um quadro de orientação.


Chama-se "A casta adolescência’’.
Todas as letras desse livro borbulham em mim.
Erguem uma fortaleza na minha alma, a fortaleza
inexpugnável das minhas resoluções. Fito vossos olhos
e digo-vos: Padre, eu quero. Quero por causa da
patria, por causa de mim mesmo. Quero ser contado
entre os que querem, os que se erguem.
Recebei, monsenhor, a expressão do meu reco­
nhecimento. Sempre repetirei: que Deus vos abençoe!"

Quando acabei de ler esta carta, recordei-me


dessa magnífica verdade do pagão Boecio”. “Superata
tellus sidera donat”, triunfa da terra e alcançarás as
estrelas do céu.

i
Luta e tem confiança 219
E não penses que, se deves estar sempre prepa­
rado, ser-te-á a vida cheia de amargura, e que o do­
mínio de si mesmo e a renuncia serão pesados para
teus hombros. Um peso, sem duvida, mas um peso
que leva para as alturas. As asas também são um
peso para as aves, mas, se lhas tirares, poderão elas
voar? Em qualquer luta — também nas lutas da
alma — o ataque é a melhor defesa. Pelo fato de já
haveres temperado a tua vontade, antes que os baixos
instintos te hajam atacado, deles estarás antecipada­
mente preservado.
Realmente, o encarniçamento da vontade terá
com o tempo uma recompensa particular. O que traz
consigo uma vontade fraca, o que a cada passo é
obrigado a observar, tremulo, as próprias palavras
e olhares, passa uma vida realmente penosa; mas tu,
por meio de uma continua gínastica da vontade, che­
garás a ponto de ver essa vontade obedecer como um
cordeiro ao primeiro sinal e a prevenir-se contra qual­
quer pensamento ou desejo impuro, já por si mesmo,
por uma especie de reflexo, tal escudo solido conjo
granito. Quando a poeira da rua quer penetrar em
teus olhos, os cilios se contraem instintivamente para
o impedir, não é verdade? E será a mais bela recom­
pensa do teu trabalho, a tua vontade forte defender,
mesmo sem disso se aperceber, como uma couraça in­
visível e invulnerável, o teu precioso tesouro, a pu­
reza da tua alma.

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220 A Casta Adolescência

8 0 . Na terra , mas não da terra.

Sei muito bem que pensas com terror: Hoje


náo se pode mais realizar esse belo ídcal. Se algucm
se retirasse para as grutas do Bakony e nelas vives­
se longe do mundo, trabalhando para o aperfeiçoamen­
to da sua alma e para a formação do seu carater —
então talvez que a coisa fosse bem. Mas viver neste
mundo em efervescencia, ir á aula, ficar cm contacto
com grande numero de colegas (que talvez tenham
idéias muito diferentes), ir ao teatro, ao cinema,
parar no tumulto das ruas, na vida atordoante da
grande cidade moderna, e não ter vertigens — quem
o poderá fazer?
Vê, meu filho, que eu não quero expulsar-te
para a solidão, contento-me em repetir-te que espero
de ti tudo o que acabo de escrever. Não vás para o
Bakony viver como eremita diante de Deus, mas deixa-
te ficar aqui mesmo, entre nós, nesta multidão ruidosa
de tentações, mas, como uma roseira, espalha o bom
perfume do carater viril e dos costumes cristãos.
Já reparaste na roseira? Suas raizes estão na
terra, no frio, nas trevas, e no entanto como suas
pétalas aveludadas são puras como o orvalho! Con­
serva tc na lama, mas não fiques enlameado; sai da
poeira, mas não fiques coberto de pó. Marcha pela
terra, mas que a tua alma não cheire a terra; que
os raios de sol do teu ideal te aqueçam a alma e nela
façam florir as rosas sobrenaturais de um carater in-
quebrantavel. Ainda que sejas feito de lama, conserva-
te limpo. Ainda que todo o m undo ao teu redor esteja
Luta e tem confiança 221
no lodo. não o estarei eu. Mesmo que todos vivam no
vicio, eu não o farei. Antes morrer, antes ser despe­
daçado, esmagado — mas por preço algum ceder o
quer que seja das suas nobres convicções.

“Justum ac tenacem propositi virum


si fractus illabatur ordis,
impavidum ferient ruinae"

Nas frias tardes de inverno, podia eu olhar, á


margem de um poço, para um pardalzinho. Faz frio,
neva, toda a gente tirita com dez graus de frio, e eis
como a avezinha ri desse terrivel tempo. Vento, podes
soprar; neve, podes cair — ouço, por assim dizer,
as palavras dele — quando todo o mundo estiver
gelado, tenho dentro de mim um mundozinho vivo,
um coraçãozinho bem quente; ninguém entra nele.

8 1 . O que não sabe m entir.

O amor inquebrantavel da verdade também te


pode ajudar nas luta. Não te direi agora quanto é
indispensável á formação do teu carater dizeres sem­
pre e sem reserva a verdade, e quanto é incompleta
a honra daquele em cuja pabvra não se pode crer
cegamente. Apenas quero lembrar-te que aquele que
nunca mente também mais dificilmente cai no pan-
tano da impureza. O caminho da conciencia pura e
da verdade é sempre reto, aberto, claro; a astúcia, a
dissimulação e a mentira começam quando se teem
222 A Casta Adolescência

pensamentos a ocultar e ações de que se tem vergonha.


O que mente deshonra a sua pessoa, o sen carater, a
sua alma, e não receará profanar o propric corpo por
meio da impureza. Ao contrario, o que se respeita
bastante para se erguer contra a mentira e não a to­
lerar, também achará maior facilidade em se defender
contra os instintos carnais. Habitua-te, portanto, a
jámais proferir a menor mentira, de modo que se
possa, em qualquer circunstancia, acreditar em tuas
palavras como na Sagrada Escritura. Empenha-te em
te tornares realmente incapaz de mentir. Que magní­
fico elogio se pudesses dizer com justiça, de ti mesmo:
sou um moço que não sabe mentir! Mas o que não
sabe mentir não pode engolfar-se na impureza se
prevenirá contra qualquer pensamento e ação que o
obrigassem a mentir.

82. Fortifica teu corpo.

Ein seguida, fortifica também teu corpo. A gi­


nástica razoavel pode do mesmo modo fortificar-te a
alma, corno também ao contrario a negligencia dos
cuidados corporais pode ser muitas vezes causa da
queda moral (por exemplo, ficar na sujeira, dor­
mir em cama bem fofa ou bem quente, uma alimen­
tação por demais abundante, enfraquecem o sistema
nervoso). Ama os desportos que não ofereçam pe­
rigo á tua saude. Não fiques muito tempo sentado,
porque isso prejudica a circulação do sangue. Tom a
por maxima: fatigar o corpo todos os dias. Tem
Luta e tem confiança 223

sempre em mente deitar-te muito fatigado, para que


possas adormecer o mais depressa possível. Muitos pe­
cados são cometidos no leito por se estar ainda acor­
dado nele. Faze desporto, não só para fortificar os
musculos, ainda menos para te tornares um atleta e
esmagares os outros, mas na convicção de que um
corpo são, bem desenvolvido, é um instrumento m uito
mais apto para realizar os desígnios sublimes da alma,
que um corpo enfermo, definhado, e que aquele que
dá assim ao seu corpo ocupações regulares terá menos
dificuldades com os desejos desregrados. Um corpo
moço, robusto, habituado ás privações, enrijado, é
decerto um excelente preservativo natural contra o
pecado da moleza. Não faças, pois, desporto com
fins de lucro ou de gloria, mas unicamente com este
escopo: chegar a submetter cada parte do meu corpo
á minha vontade.
Não sejas por demais apurado quanto ás roupas
que vestes. Quando vejo moços a cada passo preocupa­
dos com o termômetro, o vento, a chuva, a neve, o
sol: ‘‘hoje sairei de sobretudo, depois um “cache-
nez", porque venta, depois as galochas, e uma capa,
etc. ■— quando vejo isso não posso ímpedír-me de
recear pela sua saude moral. Um corpo moço e enri­
jado sente mais calor que a mais cara capa forrada;
mas o que desperdiça as forças com a impureza não
deve admirar-se de que os nervos, a epiderme, as ar­
térias não funcionem regularmente, que qualquer cor­
rente de ar lhe seja prejudicial, que se veja rapida­
mente assaltado pelas moléstias contagiosas, e que ti-
rite de frio mesmo debaixo de uma capa de peles.
224 A Casta Adolescência

Admiramos os heróis antigos. Como consegui­


ram eles realizar suas façanhas? Donde provinha a
sua força? Do fato de não a haverem estragado na
juventude. Sabes qual é o adolescente que se torna
grande homem? E’ exclusivamente aquele que — se­
gundo a maxima do velho Horacio — suporta, age,
súa, trabalha e evita a impureza:

Multa tulit fecitque puer, sudavit et alsit,


abstinuit Venere et víno. . .

Uma tempestade imprevista surpreende certo dia


um grupo alegre de estudantes num barco ao meio do
lago Balaton. Os jovens desamparados olhavam com
terror um para o outro... uns pálidos de medo, outros
desvairados. Deles só conhecia um, José, meu aluno,
alma branca como a neve. Foi o primeiro a recon­
quistar a presença de espirito. Os outros estavam ainda
desvairados. José salta para o leme e, com uma voz
que dominava a tempestade, pôs-se a gritar esta ordem:
“Vamos, meus amigos, que cada um faça o que eu
disser, se não estaremos perdidos”, E todos obedecem
enquanto José sustenta o leme com ambas as mãos.
Por fim, o barco atinge a margem e os moços soltam
um suspiro de alivio.
De todo este grupo de estudantes quem foi o
mais corajoso? Meu aluno de alma pura. E quem
não chegou a apanhar um resfriado no dia seguinte?
Ainda o meu aluno de alma pura, aquecido, sob um
aguaceiro gelado, pelas forças vitais que não desperdi­
çara no pecado.
r Luta e tem confiança

"Entrega a espada!" — ordenava-se a Skan-


225

derbeg, vencido pelos turcos. “Entrego a minha espa­


da " — respondeu ele — mas não é nesta espada, é no
meu braço que está o segredo da minha força, não é
mesmo no meu braço, é no meu sangue”. Num sangue
puro e são que não foi contaminado pela impureza.
Que seja, pois, teu ideal Godofredo de Bouillon,
o ilustre cavaleiro cristão que tendo cortado até á
cintura, com um só golpe de espada, o seu adversário,
ergueu a mão e exclamou: "Esta mão nunca foi man­
chada por um pecado de impureza".

8 3 . A resistência na dor.

Aprende também a suportar com alma forte a


dor fisica e moral. Não convem a um carater viril
gemer, rangendo os dentes, nas maiores ou menores
adversidades da existência ou aos golpes da sorte, e su­
portá-los, de boa ou má vontade, mas deve-se uti-
liza-Ios a empregar nossas forças para a construção
harmoniosa do nosso ideal moral. Se sofres dos den­
tes, se estás doente, se as coisas não correm á medida
dos teus desejos, se és vitima de uma injustiça, de
uma repreensão não merecida — nem por isso desa­
nimes ou te entristeças. O pagão Epicteto já havia
descoberto que a mortificação e o sofrimento são o
caminho da virtude. "Abstine, sustine” — era a sua
divisa. Efetivamente cai muito facilmente no pecado
aquele que manifesta uma indiferença passiva diante
dos instintos e das forças ocultas em si. Esforça-te,
226 A Casta Adolescência

pois, por intervir ativamente em todas as circunstan­


cias da tua vida; se tens inimigos, se estás doente, se
te esqueceste de alguma coisa, se te molestam, não te
aborreças com isso nem fiques amargurado, não mor­
das os lábios, não feches os punhos, mas esforça-te
por tirar proveito de tudo isso. Proveito? Como? U ti­
lizando a tristeza para educar a alma. Quando o
pesado martelo bate o ferro avermelhado pelo fogo,
dele tira o aço; e, quando os golpes da vida te fe­
rirem brutalmente, não os recebas com um sentimen­
to doloroso de impotência e abdicação, mas levanta
a cabeça e utiliza essas misérias para dar uma for­
mação ideal ao teu carater. O que assim aprende a
fazer aproveitar a alma os acontecimentos da sua vida
fisica jamais trairá sua alma com as inclinações car­
nais.
Esforça-te por bem fazer o que te for pedido.
"Age quod agis” . Se um dia a vida te for amarga e
penosa, não suportes com amargura a provocação
(que te é impossível evitar), mas com uma grandeza
d'alma que nada pode despedaçar.
Não creias que, pela utilização volunatriamente
aceite da força educadora da dor, vás estragar as ale­
grias dos teus anos de juventude. Pelo contrario, for-
jar-te-ás uma couraça de aço para o futuro.
Aprende — sobretudo na idade ingrata tão pro­
picia á teimosia -— a dobrar-te diante da vontade dos
outros, por penoso que isso seja á tua natureza obs­
tinada.
Respeita o teu corpo, mas não o estragues. A
respeito do corpo, lembra-te das palavras profunda­
JFT
Luta e tem confiança 227

mente verdadeiras de S. Francisco de Assis, que lhe


chamava "irmão asno”. Um “irmão”, não um ini­
migo; é um companheiro na estrada da vida, um
precioso tesouro, tal como o asno é um companheiro
precioso para o viajante italiano; entretanto, não
passa de um "asno” , não senhor, mas servo, feito,
não para mandar, mas para obedecer. O que muito
bem cuida do seu corpo, o enche continuamente de
alimentos ou guloseimas, o que nada sabe recusar ás
exigências do seu estomago, vê naturalmente o corpo
tornar-se senhor da alma. Que farias tu, meu filho,
se um belo dia saisses para a rua e visses com espanto
os cocheiros atrelados ao carro e os cavalos sentados
nele? Cuidado, não faças sentar-se no trono que está
dentro de ti essa natureza material cuja obediência é
a regra, e não subjugues a alma, que é chamada a
governar.

84. Um genero de vida higiênica.

Bem farás — tanto quanto isso depende de ti


•— em regular razoavelmente o teu regimen alimentar.
Uma alimentação demasiada torna o corpo insolente
c efeminado ao contrario, com uma prudente tem­
perança farás com que os desejos carnais formulem
em ti cada vez menos exigências. A alimentação por
demais condimentada excita os nervos; ora, nervos
excitados não obedecem facilmente. Não te sirvas de
pratos contendo muita albumina, nem muita carne,
•obretudo á tarde. Prefere os legumes verdes, as fru­
228 A Casta Adolescência

tas, as massas. Sê sobrio principalmente á refeição


da tarde. O que é sobrio no comer é um bom medico
para si mesmo: “modicus cibi, medicus sibi” . Não
te vás deitar logo depois do jantar, com o estomago
cheio, mas pelo menos duas ou tres horas depois, e
abandona qualquer estudo serio uma hora antes de te
deitares.
A ’ refeição da tarde, ou depois, serve-te o me­
nos possível de liquidos, e antes de te deitares toma
precauções; durante o dia, a intervalos de tres a seis
horas. Convem que vás regularmente á privada. O
corpo humano é como uma estufa: é preciso ali­
menta-lo, para que possa aquecer. Alimenta-se a es­
tufa com carvão e o nosso corpo com comida. O
carvão depressa se consome no fogão, o alimento con­
some-se lentamente no corpo. Uma pequena parte dos
produtos queimados sai como fumo pela chaminé,
mas a maior parte fica como cinza na grelha do
fogão, e deve ser tirada dia a dia, senão a grelha
entope e o fogo se apaga. Em nosso corpo também
se encontram muitas matérias consumidas. Uma pe­
quena parte delas vai pelos poros da pele como suor
(eis por que se deve limpar os poros com banhos
frequentes, isto é, conserva-los abertos). Mas a maior
parte das matérias inutilizaveis — o que o corpo não
pode assimilar — fica em nós como cinza. E’ im­
prescindível que nos desembaraçemos dela dia por dia
(de preferencia todas as manhãs), pois o contrario
poderia dar causa a perturbações, dores de cabeça e
até doenças mais graves. Nisso também deves dar uma
prova de regularidade. Se vais regularmente á privada,
Luta e tem confiança 229

sem faltar um dia só, contribuirás muito para o


desenvolvimento da tua saude.
Muitos jovens se preocupam muito com isto,
porque ninguém para tal lhes chamou a atenção.
Jamais te sirvas, na juventude, de bebidas al­
coólicas. A maior parte dos atos imorais são come­
tidos em consequência do abuso das bebidas alcoóli­
cas. Não é sem motivo que a Sagrada Escritura nos
adverte: “Nolite inebriari vino, in quo est luxuria”
(Efesos, V, 18), não vos embriagueis, pois a em­
briagues leva á impureza. E numa outra passagem:
“O vinho leva á luxutia e a embriagues ao tumulto:
quem quer que a ele se entregue não é assisado"
(Provérbios, XX, I ) . Já os Romanos sabiam que
onde entra Baco, deus do vinho, não tarda a aparecer
Venus, deusa da impureza. E quantos jovens que,
durante anos, souberam, com um trabalho heroico,
conservar a inocência da sua alma, a perderem quan­
do, esquentados pelo vinho, os instintos lhe assalta­
ram a vontade enfraquecida com o álcool!
Muitos jovens perderam o uso da razão por
causa da bebida e logo a seguir, na mesma noite, a
pureza da alma.
Ai! quanto é terrivelmente verdadeira esta frase
da Sagrada Escritura: “Fornicatio et vinum et cbrietas
auferunt cor” (Oséas, IV, 11) a luxuria, o vinho e
.i embriagues fazem perder a razão.
De um modo geral, não te esqueças de que o
<mdado exagerado e a superalimentação do nosso
<• i po excitam fortemente em nós os baixos instintos.
230 A Casta Adolescência

O animal revolta-se no homem, quando muito afa­


gado.
Que as tuas calças não sejam muito estreitas,
para não te apertarem, pois isso poderia ser causa de
excitação. Cruzar as pernas estando sentado, pôr as
mãos nos bolsos das calças, ficar sentado por muito
tempo (sobretudo em cadeira bem macia), tudo isso
é também fonte de excitação. A ' noite, não te vás
deitar senão quando estiveres cansado, e pela manhã,
logo que acordares, não te deixes ficar na cama. Que
o teu pijama ou camisa de dormir seja de preferencia
grosseiro (portanto nem macio de mais, nem quente
de mais, em todo o caso nunca de lã) e o mais fol­
gado possivel. Não uses roupas de baixo que sejam
de lã, o calor exagerado delas é causa de excitação.
Usa suspensórios e não cinto, que prejudicaria a cir­
culação. Que a tua cama seja mais dura que macia,
mais fria do que quente. Faze uma experiencia: quan­
to mais dura for a cama, muito mais facilmente re­
primirás teu corpo. O fim de cobertores e cobertas é
conservar no corpo o calor que os movimentos e as
roupas manteem durante o dia. Se lhe dás mais calor
do que aquele que tinha durante o dia, este excesso
provocará nos nervos uma excitação febril e desperta­
rá fortes tentações. A cama quente e macia demais é
uma fonte de e litação dos desejos sexuais. Conserva
as mãos fora dos cobertores. Procura dormir num
ambiente puro, ;e for possivel com as janelas abertas.
O ar fresco c um banho para os pulmões, como a
agua pura o é para o corpo. Como acorda eletrizado
por uma nova força aquele que dorme em ar puro
F
Luta e tem confiança 231

(sobretudo ao ar livre), e como é diferente daquele a


quem é preciso despertar pela manhã num dormitorio
infetcionado! Deita-te sempre sobre o lado direito.
N5o de peito para cima, porque o calor da coluna
vertebral excita o sistema nervoso; não sobre o lado
esquerdo, porque comprimirías o coração. Pela m a­
nhã. logo que acordes, não continues na cama. Posso
afirmar, como uma regra quasi sem exceção, que
aquele que fica algum tempo na cama depois de acor­
dado, comete por assim dizer inevitavelmente o pe­
cado solitário. Já o pagão Horacio apresentava esta
questão: os bandidos levantam-se de noite para matar
os homens, e tu não poderías levantar-te para te sal­
var?
“U t jugulent homines, surgent de nocte latrones,
ut te ipsum serves, non expergiscaris?”
(Horacio, Epístola, I, 3 ).

O demonio é um grande senhor, levanta-se tarde


— dizia um pregador. Quando começa o seu giro,
os homens ativos já estão trabalhando ha muito
tempo, e ele não lhes pode fazer mal. Mas ai dos
preguiçosos a quem encontra na cama! Engana-os,
sedu-los, até que se tornem seus escravos.
O sono da manhã não é mais que uma modorra
em que a vontade é como manteiga derretida: cai sem
resistência em poder da bestialidade. O que fica na
cama depois de acordado repousa no travesseiro de
Satanás. Se nada tens que fazer com urgência, dorme
o tempo que puderes; mas, uma vez acordado, salta
imediatamente da cama. Eis aí uma regra importante,
232 A Casta Adolescência

mesmo durante as ferias, mesmo se nada de extraordi­


nário te obrigar a agir com presteza. Lava-te com
agua fria. Não receies a agua fria. Se puderes, faze
pela manhã, com a janela aberta um quarto de hora
de exercicios físicos; em seguida toma um banho geral
com agua fria, e depois faze-te energicas fricções. Esta
ginastica matinal e estas abluções frias fortificarão
muito o teu sistema nervoso.
Presta particular atenção, meu caro filho, no
caso de a doença te obrigar a ficar na cama alguns
dias. Durante a doença, ocupa-te com alguma coisa
facil (rezando, lendo); pois é triste ver muitos jovens
cometerem em seu leito de enfermos pecados de pen­
samento ou de acção, quando esperam da bondade de
Deus justamente a saude do corpo.

85. Nunca estejas ocioso.

Não é sem motivo que se chama á ociosidade o


travesseiro de Satanás. Nunca me cansarei de te dar
este conselho: nunca estejas inactivo. Mesmo em fe­
rias.
Quando passeio pela montanha, paro sempre
com emoção para sonhar á margem de um desses re­
gatos que descem serpenteando. Que trabalho come­
tem esses filetes de agua! Como eles furam a rocha,
como abrem caminho cm seu leito! Não teem repouso,
não param um momento. E, embora saíam de um
solo lodoso e carreiem destroços de rochas, a agua
deles conserva-te limpida como cristal. Mas quando
Luta e tem confiança 233
chegam á planície, onde tudo corre ás mil maravilhas,
náo ha mais "tanto trabalho”, tornam-se preguiço­
sos, espalham-se e ficam sujos. Mas não vale a- pena
dizer que charco lodoso e fétido vai ficando o regato
mais puro á medida que suas aguas param nas pro­
fundezas de uma lagoa.
A inacção, a imobilidade são sinais de morte
em a natureza e promotoras de ruina na vida da alma.
Enquanto o moço, com um trabalho serio, fura e
despedaça os rochedos que se erguem no caminho da
vida enquanto, á custa de um trabalho cheio de sa­
crifícios. abre caminho para um belo futuro, sua alma
pode mais facilmente ficar pura. Mas o perigo de
cair está proximo, quando essa força, em vez de
trabalhar seriamente, para na indolência c na pre­
guiça. Não era sem razão que Ovidio dizia: "Vennus
otia amat” ; a madraçaria sustenta a imoralidade.
Quando te assaltar uma fortíssima tentação e
receares não poder resistir ao pecado, não fiques só.
Levanta-te imediaíamente, deixa o teu quarto e vai
para junto dos outros homens, para perto dos teus
pais, dos teus irmãos. E' o que recomendava Ovidio,
aliás bem frivolo que ele era:

“Quisquis amas, loca sola nocent, loca sola caveteí


Quo fugis? In populo tutior esse potes".

Um outro distico faz a mesma recomendação:


Se te achares em presença de Venus (a imoralidade),
que fazer? Não fiques sentado, mas vai-te embora,
para que não morras por causa dela.
234 A Casta Adolescência

"Quíd facies, facies si Vencris vencris ante?


Ne sedeas, sed eas; ne per eas pereas!"

A mó moe bom grão e, se não tem grão, mo-se


a si mesma; a alma humana também se estraga a si
própria, se não se emprega em trabalho util. Toma,
portanto, muito cuidado contigo durante as ferias,
quando tantos jovens não se fazem só queimar pelo
sol (o que não é um mal, antes um bem ), mas ene­
grecem a alma na lama da imoralidade.
A perdição de muitos moços começou pela ociosi­
dade durante as ferias grandes. Aquele que nada faz
aprende a fazer mal; e a Sagrada Escritura diz muito
apropriadamente; "A ociosidade ensina muito mal"
(Ecclesiast., XXXIII, 2 9). A ociosidade é particular­
mente perigosa durante o repouso depois do almoço,
dado que, depois de termos comido, estamos mais
sujeitos ao pecado. Toma também cuidado — salvo
se estás doente — em não te extenderes numa cama
estando acordado, pois o calor excita a coluna verte­
bral e por ela os baixos instintos. Não é sem razão
que um provérbio diz; "O demonio se encarrega de
dar trabalho aos que nada fazem” . A alma humana
quer constantemente uma ocupação, está em conti­
nua atividade, e se um moço nada faz comete de or­
dinário pecados, pois a alegria de viver condenada
á ociosidade abrirá caminho para a imoralidade, como
um abcesso. O pensamento leva ao desejo, o desejo
ao alo, o ato á ruina, á perdição. “O trabalho é o
sal da vida, que preserva da corrupção” (Trom pa).
Esmaga, portanto, com o trabalho as exigências dos
Luta c tem confiança 235

teus instintos e das tuas inclinações. Faze não im­


porta o que — mas conserva-te sempre ocupado!
Que cada adolescente tenha a sua ocupação pre­
dileta que lhe dê mais prazer e na qual utilize o ex­
cesso da sua força vital. Um é apaixonado pelo seu
herbário, outro pelo recorte, um terceiro entrega-se
a experiencias de fisica ou á fotografia. Um outro
cria pombos ou coelhos, outro coleciona pedras, e ha
ainda quem se dedique á jardinagem. Uns se entregam
ao estudo das linguas extrangeiras, ou fazem musica,
encadernação ou se entregam ao radio, etc.
Em todo adolescente bem comportado ha cer­
tamente um excesso de forças. Os que são arrastados
pela corrente do mundo estragam essas forças no pe­
cado. Os que, ao contrario, refletem, sabem que o
excesso de ativo que aparece num balanço não deve
ser delapidado, mas deve passar para outra rubrica;
noutros termos, devem empregar num trabalho pre­
cioso esse excesso de energia. Quanto mais lutares for­
temente contra os teus instintos, mais te entregarás
com ardor ao trabalho; afoga ceaimente no trabalho
a supecabundancia das tuas forças vitais. E' por aí
que te prepararás o melhor futuro.

8 6 . Ama a natureza.

Ainda chego a fazer-te uma pergunta: amas a


natureza? Qualquer homem pode achar uma inesgo­
tável alegria nas belezas da natureza; mas ninguém
pode sentir a alma inundada de alegrias mais puras,
236 A Casta Adolescência

á vista dos esplendores da natureza, que a juven­


tude. Gostas de respirar a plenos pulmões o ar puro
e são das florestas? Gostas de ouvir o zumbido do
inseto á margem de silencioso regato que deslisa pela
planicie deserta? Gostas de te extender sobre a verde
e macia relva e receber o sorriso acariciante dos raios
do sol? Gostas, sonhando ao pé de um bosquezinho,
de ouvir o canto do rouxinol, o trinado da cotovia?
Gostas de mergulhar incansavelmente os olhos nas
profundezas cristalinas de um lago de montanha, di­
zendo de ti para contigo: as profundezas da minha
alma também podem ser puras como o cristal? Gostas
de embalar tua alma ao ritmo do murmurio de um
regato? Gostas de cantar para o vento que leva do­
cemente a tua canção? Gostas de escalar, com o rosto
abrazeado, as montanhas e extravasar em alegres can­
tos a felicidade que reina em tua alma? Amas a na­
tureza? Ou preferes chapinhar dia a dia no asfalto
das calçadas e respirar o ar viciado das ruas?
A vida do estudante é evidentemente sedentá­
ria. Mas este desterro continuo enfraquece a alma.
Quando tiveres ocasião, sai de teu quarto e vai para
o bosque, pata as montanhas. Um moço correto não
pode ficar tranquilamente numa valeta, quando vê
a montanha diante de si.
Efetivamente, has de verificar que, banhando
os pulmões 1 1 a onda de ar puro da floresta, e do mes­
mo modo o coração c os nervos durante um par de
dias, torna-se-te muito mais facil o estudo. Não for­
tificaste apenas a tua saude fisica, mas tua energia
moral tornou-se mais destra e mais resistente.
Luta c tem confiança 237

O adolescente que não sabe tomar parte nos


jogos alegres dos seus companheiros, mas fica desen­
xabido e sonhador a um canto, trate de procurar o
medico, porque está doente, ou antes, vá procurar
o seu diretor espiritual, porque então é a alma que
está doente. E’ ridículo ver um homem maduro con-
duzír-se como uma criança, mais ridículo ainda é
ver um jovem dar-se um ar importante e apresentar
um aspecto de envelhecido.
Os rapazes que com o seu ardor na diversão e os
seus cantos alegres alteram a calma das florestas são-
me as vezes mais caros que os que se arrastam pelas
ruas, ou ficam sentados, tristes e lerdos, por detrás
de suas janelas, os rins e a alma despedaçados. . .
e quem sabe o que se está passando pela cabeça deles!
Meu ideal é o adolescente de saude, alegre, trans-
bordante de força, de coração ardente, alma vibrante,
que sabe rir com todo o seu coração, o estudante de
senso moral delicado, que tem confiança em si, mas
sem presunção.

87. Alguns conselhos médicos.

Em 1932, verificou-se em Budapest uma expo­


sição de higiene social. A associação medica húngara
de etica sexual afixou entre outras coisas dois quadros,
cujas palavras todos são dignas de um espirito medico
seriamente cristão.
No primeiro quadro podia-se ler:
238 A Casta Adolescência

OS DEZ M ANDAM ENTOS DA CONTINÊNCIA


1. — Não comas por demais de uma vez. Janta
tres horas antes de te deitares; serve-te, ao
jantar, de alimentos leves e de facil digestão.
2. -—■ Não bebas licores fortes, nem muito chá ou
café; não comas pratos muito condimenta­
dos nem carne demais.
3 . -— Vai regularmente á privada todos os dias,
a prisão de ventre envenena o sangue.
4 . — Dorme num quarto fresco, sobre um leito
duro, do lado direito, com uma leve manta
ou cobertor; não te sirvas de coberta quente,
e jamais de “edredon”.
5. — Evita ficar na cama pela manhã; levanta-te
logo que acordes; evita a moleza.
6. — Fiscaliza particularmente o aceio da pele,
toma banho o mais que puderes. Um banho
tépido á noite torna o sono pacífico.
7. — Faze muito movimento, ama a natureza, pra­
tica um desporto sem perigo, faze cada dia
pelo menos uma hora de marcha.
8. — Evita os livros, as revistas e os quadros
obcenos, os companheiros de conversas imo­
rais, os logares de diversão e as dansas imo­
rais.
9. - Esforça-te por criar em ti e em volta de ti
atmosfera de pureza moral; é o mais seguro
preservativo das tentações.
Luta e tem confiança 239
10. — Pede a Deus que estejas intimamente unido
a Ele, toma resoluções, conta com a graça
divina, vive na convicção da presença de
Deus.

O outro quadro estava concebido nos seguintes


termos:

OS DEZ M ANDAM ENTOS DO CASAMENTO

1. — Desde que o teu corpo está suficientemente


desenvolvido e que te achas em condições
materiais para manter modestamente uma
familia, casa-te o mais cedo possivel.
2. — Emprega teus anos de mocidade de modo a
ficares o mais preparado possivel para as
grandes lutas da existência.
3 . — Antes do casamento, gasta o menos possivel
em diversões e põe de lado o dinheiro assim
poupado, para constituir o teu lar. Não
bebas licores fortes, não fumes.
4 . — Não encares o casamento como uma fonte
de prazeres, em que tudo é permitido, pois
a vida conjugal tem as suas dificuldades,
tentações e lutas.
5. — O casamento implica em graves obrigações
para toda a vida, um sem-numero de de­
veres, é um campo de batalha para um
carater viril.
6. — Não escolhas a companheira da tua vida por
causa das vantagens materiaes, pois uma má
24Ü A Casta Adolescência

administração ou a falta de sorte podem


chegar a fazer perder uma grande fortuna.
Basearás tua vida material no trabalho e na
economia.
7. — Que as vantagens fisicas não sejam para ti
o principal, pois a beleza acaba e, mesmo
quando existe, é tesouro de valor duvidoso;
anda ligada a muitas tentações.
8. — Em tua companheira procura qualidades mo­
rais, a fidelidade, o amor ao trabalho, a
economia, a ternura, a paciência, a pureza —
e tem tu proprio essas mesmas virtudes.
9. — Não te precipites na escolha de tua compa­
nheira, aprende a conhecer a fundo aquela
que escolheste na vida de todos os dias e
não te decidas á custa de uma impressão de
momento.
10. — Que não seja longa demais a duração do teu
noivado, evita intimídades impuras, prepa­
ra-te com uma santa gravidade para a grande
missão que te espera; a união harmoniosa
de duas almas que crêem em Deus.

Podes verificar que a seria ciência medica pres­


creve c reclama tudo quanto a moral cristã te impõe
para a tranquilidade da tua conciencia e o desenvolvi­
mento do teu carater.
O décimo artigo de cada um destes quadros sug-
gerc uin pensamento sublime a respeito do qual gos­
taria eu de conversar contigo mais calmamente; é a
relação entre a religião e a pureza.
Luta e tem confiança 241

8 8 . Um pai e um amigo.

Procura um pai espiritual. Nunca discutas coisas


«cxuais, mormente com teus companheiros. Se um
cego conduz um cego, ambos acabam caindo num
fosso. Como poderia esclarecer-te a respeito deste
grande problema aquele proprio que geme ao peso de
questões semelhantes e que provavelmente hauriu seus
conhecimentos em fontes suspeitas, numa literatura
de baixa escala e em conversas do mesmo genero?
Esses camaradas falam em geral tão brutalmente, tão
grosseira e tão levianamente dessas coisas infinitamen­
te serias que, depois da conversa deles, tua alma fica
ainda mais inquieta, tua imaginação mais perturbada
e mais cheia de imagens excitantes. A Sagrada Es­
critura diz com muita propriedade: "Não consultes
um homem sem religião a respeito das coisas santas,
um homem injusto sobre a justiça, um covarde sobre
a guerra, um homem deshonesto sobre a honestidade,
um escravo da preguiça a respeito de uma grande ta­
refa ; não os ouças para conselho algum. Mas interroga
frequentemente um homem piedoso, o que tu conhe­
ces em condições de marchar no temor de Deus” (Eccl„
XXXVII, 12.15).
Não procures solução ás tuas duvidas nos di­
cionários e nos pretensos livros de medicina. Os que
se vendem com este titulo são geralmente brochuras
que não querem fornecer serio ensinamento, mas antes
excitam as imaginações juvenis já de si tão inflamá­
veis. Nesse terreno, como tantas vezes lembrei, não é
a ciência que decide do combate, mas a vontade. Po­
242 A Casta Adolescência

derá quem quer conhecer o funcionamento do orga­


nismo humano e os perigos que aguardam os que abu­
sam dele até nas próprias minúcias; não obstante
de conhecel-os a fundo poderá ainda entregar-se a
uma vida imoral, se n5o tiver uma vontade forte
formada e avisada.
No entanto, eu te recomendo que não fiques só
nas tuas duvidas. “Infeliz daquele que está só —
lemos na Sagrada Escritura — pois, se cai, não tem
ninguém que o levante” (EccI., IV, 10).
A quem has de pedir então esclarecimentos se te
invadirem duvidas serias? Em primeiro logar, inter­
rogarás teu pai, tua mãe ou teu professor de religião...
Se teus pais não tiverem tempo ou se receares não ser
complctamente franco com eles, sempre te poderás
dirigir muito á vontade a qualquer sacerdote ou ao
teu professor de religião. Mas sê inteiramente franco
com ele e has de sentir que só em lhe expores tuas
lutas, tuas duvidas, a alma te ficará aliviada e com
a vitoria em meio. Não penses que ele vá abusar da
tua confiança, quando lhe escancarares a alma em efer-
vcscencia. Não te ha de desprezar por causa das tuas
lutas; ao contrario, sentír-se-á honrado pelo fato de
lhe expores tão abertamente teu estado de alma. Ele
sabe que, se não atender ás tuas dificuldades, acabarás
por procurar por ti mesmo uma resposta, com que
não has de ficar satisfeito. Ele sabe que nas lutas da
idade ingrata andas á aventura como um viajante
perdido na estrada por uma noite sem estrelas. Mas,
o qm- aprenderes dele não o vás transmitir logo aos
teus camaradas; lembra-te de que este conhecimento
Luta c tem confiança 243

é um tesouro sagrado que seria talvez prematuro re­


velar aos outros; que tens uma faca bem afiada que
não te fere, mas que pode ser perigosa para teus
companheiros.

8 9 . Nas fontes de uma vida nova .

Mas antes de mais nada tens um inapreciavel


arrimo nas lutas da tua juventude: a confissão e a
comunhão. Não quero falar-te mais minuciosamente
a respeito destes poderosos meios de educação e de
"controle’' de si mesmo, de força, de reerguimento
e de protecção. A criancinha tem medo da agua; a
criança espiritual tem medo do banho da alma. Os
que não estão ainda espiritualmente desenvolvidos es­
tremecem com espanto diante da confissão; mas eu
suponho que tu sabes apreciar a força profundamente
educativa da confissão. Não só a aprecias mas fazes
uso dela; espontaneamente e não compelido. Um cor­
po intoxicado não pode achar tranquilidade enquanto
o veneno não tiver sido expulso dele, o corpo arruina-
se. Do mesmo modo se arruinará a alma que conservar
em si as matérias envenenadas que nela foram introdu­
zidas, isto é, o pecado. Quanto mais violentas foram
as tuas lutas, mais vezes te deves confessar, tanto
quanto possível sempre com o mesmo confessor.
Mas, confessa-te com sinceridade — e com a
firme resolução de melhoria. Desde o momento em
que expões tuas lutas ao pai espiritual, já dás um
grande passo para essa melhoria, pois triunfastes das
244 A Casta Adolescência

repugnancias da tua natureza com uma atitude que


ela não queria. Aí encontrarás uma mão paternal que
tira o espinho. Aí encontrarás um balsamo que cura
a ferida. Aí encontrarás um pai indulgente que aperta
com alegria contra o seu peito o filho que julgava
perdido. E ’ humano a gente enganar-se, mas reco­
nhecer o erro com a vontade de se corrigir c sinal de
coragem viril. Que preciosas fontes de forças brotam
em tua alma quando ajoelhas ao confessionário e
abres tua alma palpitante! Descobres as manifestações
mais secretas das tuas paixões, a inicial acção des-
truidora dos teus pecados, a tempestade furiosa das
tuas tentações, as chagas vivas da tua alma, diante do
confessor que, não só com a mansuetude e experiencia,
mas com uma força curativa provinda de uma sublime
missão divina, tocará tuas chagas.
“Eis aí, meu pai, contra o que eu pequei, caí
tantas vezes; fiz tal e tal esforço. Que fazer para
me tornar mais forte? Que fazer, visto como tam­
bém eu quero libertar-me do pecado?" E então ouvirás
os conselhos de um guia espiritual experimentado, e,
quando saires do confessionário, teu rosto brilhará
como as velas da missa da Meia Noite, respirarás lon­
gamente, um peso imenso caiu da tua alma. Agora,
graças a Deus, vou começar uma vida nova. Não
recairei mais no meu antigo pecado. N ão, não. Nunca
mais!
Quem poderá contar o numero de todos aqueles
a quem a confissão e subsequente comunhão salvou
de uma terrível escravidão? Gostaria muito, caro
filho, que aproveitasses o seguinte conselho: Aquele
Luta e tem confiança 245
que, desde a juventude, na adolescência e durante toda
a sua vida, conserva o beto habito de se confessar to­
dos os meses,, voluntariamente, e com alegria, não me
preocupo com a alma dele. E ’ possível que ele ás vezes
ainda escorregue, é possível mesmo que caia — mas le-
vantar-sc-á de novo e não permanecerá no pecado.

90. O Senhor está comigo.

O organismo pode vencer os bacilos da moléstia,


se um sangue novo e quente passar por todo o corpo
e vivificar as menores células. Assim também os ba­
cilos das enfermidades morais desaparecem da tua alma
quando, depois da santa comunhão, o sangue sagra­
do de Nosso Senhor Jesus Cristo circular em ti e,
com a fonte oculta entre as mãos, dirigires a Cristo,
que vive em ti, esta deliciosa suplica: “Alma de Cristo,
santificai-me. Corpo de Cristo, salvai-me. Sangue de
Cristo, embriagai-me. Agua do lado de Cristo, lavai-
me. Paixão de Cristo, fortíficaí-me. O ’ bom Jesus,
ouvi-me. Em vossas chagas ocultai-me. Não permi­
tais que me separe de Vós. Do espirito do mal, defen­
dei-me. A ' hora da morte, chamai-me. Mandai que eu
vá a Vós, afim de que com os vossos santos Vos
louve pelos séculos dos séculos”.
Santa Teresa queria construir um claustro, mas
não tinha mais do que tres moedas. Disse: tres moedas
e Teresa — é pouco. Mas tres moedas, Teresa e o
bom Deus — é demais. E o convento foi construído.
Talvez já o tenhas tentado por mais de uma vez.
246 A Casta Adolescência

Só, sou incapaz de tal. Mas, com a minha boa von­


tade e o auxilio da graça de Deus — vencerei. Não
é sem razão que um velho provérbio diz: “Deo fa-
vente navigas vel vim ine", se Deus incha a vela, atra­
vessarás o oceano, mesmo que seja num cesto. Toma
o mais frequentemente possível o "pão dos anjos” , o
"pão dos fortes”, Nosso Senhor Jesus Cristo na santa
communhão. Recebe o mais frequentemente possível
o Senhor em tua alma, em tua barca, e, qualquer que
seja a violência da tempestade, pede como os aposto-
los em sua barca perseguida pela tempestade: "D o­
mine, salva nos, perimus ”, Senhor, salvai-nos, que
perecemos (S. Math., V III, 25).
As convicções religiosas e sinceras são aliás o me­
lhor apoio, em nossas lutas continuas, para a pu­
reza da nossa alma. Diante de toda a gente se apre­
senta esta questão: “Porque não sou eu livre de fazer
o que a natureza me pede tantas vezes e tão instan­
temente. "E só pode dar uma resposta satisfatória e
encorajante aquele que compreende que acima da na­
tureza ha a ordem sobrenatural e que o dever mais
sublime da vida do homem é chegar lá.
Do mesmo modo que do centro de um circulo
um caminho traçado em todas as direcções imaginá­
veis conduz á sua circumferencia, assim também todas
as manifestações, todos os acontecimentos da tua vida
te levam ao grande centro do mundo, a Deus. Esfor­
ça-te, pois, meu filho, por travar com Nosso Senhor
Jesús Cristo uma amizade tão intima, tão profun­
da quanto possivel. Em todas as coisas, volta-te para
Ele com um amor sincero e vivo. A pessoa de Cristo
Luta e tem confiança 247

n ío é uma imagem qualquer do passado, mas Ele é


hoje ainda e será eternamente o teu Salvador, que faz
raiar a vida, ama e fortifica a tua alma. Portanto, não
tf esqueças de que Ele não está diante de ti como uma
imagem apagada, mas que é a Verdade viva, com a
qual deves discutir cada um dos teus projetos, para o
qual deves voltar todas as tuas esperanças e de quem
tu sabes que se regosija contigo por todas as tuas
vitorias e que se entristece com as tuas quedas even­
tuais.
Todo o adolescente deseja uma amizade ideal;
é dela que nasce também o primeiro amor. Se assim
me posso exprimir, que Cristo seja o teu primeiro
amor; debalde procurarás no mundo ideal mais nobre,
amigo mais seguro, protetor mais poderoso que Ele.
Habítua-te ao pensamento de que Nosso Senhor está
em toda a parte e sempre contigo. De manhãzinha
cedo até á noite, Ele te acompanha por toda a parte;
na rua, na aula, nas diversões, no cinema, qundo es­
tudas, quando estás só, quando te divertes, e quando
á noite te vais deitar, Ele se senta ao pé de teu leito,
te olha com amor e te felicita; Meu filho, hoje com­
bateste bem.
Aprende a orar nesse estado de espirito. Dize-
me, meu filho, tens o habito de rezar regularmente?
Regularmente! Quer dizer, de manhã e á noite, mas
rezar bem, com piedade, com amor, de todo o coração,
com toda a tua alma? Se não regares as flores, elas
secarão; as flores da tua vida moral também secarão
se não as regares regularmente com a agua pura da
oração. E’ rezando assim que sentirás a realidade da
248 A Casta Adolescência

eternidade, é rezando assim que ajoelharás diante do


trono do Todo-Poderoso, em que se apazígua toda a
tempestade, em que se desmancham as ondas da alma
atormentada ou pelo menos retoma coragem aquele
que luta.
Dize-me, meu filho, sabes orar assim? Nunca
o soubeste? Então, aprende. Já perdeste o habito de­
pois de tanto tempo? Recomeça. Mas não amanhã.
Hoje mesmo. Hoje á noite. E, depois — sempre.
Certo homem desejava entrar para uma Ordem
Religiosa muito severa. Mas, antes de o admitirem,
quizeram por-Ihe á prova a vocação. Conduziram-no
á capela, onde ele teria que ficar em vigília á noite,
durante horas. Mostraram-lhe o refeitório, onde de­
veria mais jejuar que comer. Experimentou o leito
duríssimo onde teria que, antes ficar sem dormir, do
que passar a noite serenamente. Por fim, perguntaram-
lhe: Muito bem! que pensa disto? ainda tem vontade
de ingressar? Suportará esta vida? O homem conten­
tou-se em perguntar: haverá um crucifixo cm minha
cela? ■—■Sim. — Então creio que tudo ira bem —
respondeu, e entrou para o convento.
Meu filho, poderás tu amar assim a Nosso Se­
nhor? De modo tal que, sejam quais forem as ten­
tações que te assaltem, possas pensar nele, dizendo:
tudo irá bem?
Sem o socorro da religião, quasi não é possivel
ficar puro na juventude. Aquele que quisesse levar
uma vida pura sem religião faria como o que quisesse
voar sem azas, tirar agua de um rochedo, cavar um
poço com as próprias mãos. O sabio rei Salomão já
Luta c tem confiança 249

confessava isto: “Era eu uma criança de bom natural


e recebera uma boa alma, mas, logo que soube não
poder ter sabedoria senão dando-ma Deus, dirigi-me
ao Senhor e lha supliquei" (Sabedoria, V III, 12.21).
Santo Agostinho também verifica com acerto que ou
é o amor de Deus que reina em nossa alma ou a sen­
sualidade: “Regnat carnalis cupiditas, ubi non est
Dei caritas”.
Não se pode levar uma vida pura senão com
a ajuda de Nosso Senhor Jesus Cristo. . . per Do-
m inum nostcum Jesum Christum.
Olha de frente para Jesus crucificado, como a
avezinha olha para sua mãe, que voa por cima dele.
Sê a avezinha da Pureza eterna, sê o seu adorador,
leva sempre Cristo em tua alma, e sentirás com ale­
gria que com Ele a pureza não é impossível,
Meu caro filho, algumas vezes as tentações car­
nais lançar-se-ão sobre ti como um fogo devorador,
como um mar espumante que quer devorar tudo; mo­
mentos chegarão em que has de julgar que todo pen­
samento, entusiasmo, ambição morreram em ti, que
só a vida animal te governa e te leva a pancadas:
nesses momentos só a mão poderosa do Salvador te
pode tirar são e salva do perigo.
Não posso, pois, dar-te melhor conselho do que
o de Santa Catarina de Gênova a seu afilhado: “Que
Jesus esteja em teu coração, a eternidade em teu es­
pirito, o mundo a teus pés, a vontade de Deus em
teus atos, e que acima de tudo o seu amor brilhe em
ti”.
250 A Casta Adolescência

91. “E depois?”
E, se tudo quanto acabo de expor não poude
causar bastante impressão em tua alma, para te fazer
romper definitivamente com o pecado, lê ao menos
esta pequena historia, depois fecha o livro e reflete.
Certo dia, um rapaz precipitou-se com entusiasmo
para casa de S. Filipe de Neri. “Que se passa contigo
que estás tão alegre? perguntou-lhe o santo. Porque
estou alegre? Acabo de falar com meu pai e ele me
permitiu estudar advocacia. — Muito bem, far-te-ás
advogado. E depois? — Depois, ganharei muito di­
nheiro. Sim, ganharás muito dinheiro. E depois? —
Depois? — respondeu o rapaz — quando tiver muito
dinheiro, terei tudo quanto me é preciso para viver
tranquilamente na minha velhice. — E depois? per­
guntou o santo. — O rapaz foi ficando triste: "De­
pois? — respondeu lentamente — depois, terei cer­
tamente que morrer. — E depois? perguntou pela ul­
tima vez o santo. Que te acontecerá depois da morte?
"E desde então Francisco Spazzara (era este o nome
do rapaz) viveu toda a sua vida na honestidade e na
virtude, pois nunca mais se esqueceu de que um dia
lhe seria necessário dar contas a Deus de toda a vida
que levara.
Meu caro filho, se nada te pode desviar dos teus
hábitos pecadores já antigos, reflete neste ponto infi­
nitamente grave: E depois? que te acontecerá depois?
quando tiveres que prestar contas a Deus justo, que
sabe tudo e tudo vê? “Pensa no teu ultimo fim e não
mais pecarás”, diz a Sagrada Escritura (Ecd. V II,
Luta e tem confiança 251
4 0 ). "Para viver na morte, viveu como alguém que
devia morrer” — está escrito numa velha pedra tu-
mular; “U t moriens viveret, vixit ut moriturus". Que
profunda sabedoria nestas poucas palavras!
Lembra-te de que Deus um dia te pedirá contas,
não só das tuas acções, mas de cada uma das tuas me­
nores palavras, e mesmo dos teus mais secretos pen­
samentos. E esse Deus te viu, enquanto ninguém te
via; viu-te na obscuridade do teu quarto de dormir;
viu-te sob os cobertores da tua cama, viu-te no teu
esconderijo do jardim. Ouviu as tuas conversas con­
fidenciais. Atravessou teus pensamentos. Meu filho,
queres apresentar-te manchado de corpo e alma, no
dia da grande prestação de contas?
Certamente que não.
T u queres, não é assim?, ficar um rapaz de alma
pura!

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SÉTIM A PA R TE

A ALMA SORRIDENTE. — OS OLHOS


BRILHANTES

“ Uma conciência pura é


uma sensação celeste; sem ela,
o trono real é um deserto; com
ela, o cavalete c o patíbulo não
são terrificos ”,
(Conde Estevão S zéciienyi).

Deixou-nos o Senhor tres lembranças do pa­


raíso terrestre: o brilho das estrelas, a beleza das flo­
res e os olhos brilhantes de um rapaz de alma pura.
E, dos tres, é o ultimo o mais belo. Pois o rapaz de
alma pura é um herói, Um verdadeiro herói, cujas
lutas são mais asperas que as batalhas mais violentas,
mas cujos louros não são manchados pelo sangue do
inimigo, mas dourados pelo esplendor da alma hu­
mana triunfante. E' o puro esplendor de uma con-
cicncia em paz. Em consequência da união intima que
existe entre o nosso corpo e a nossa alma, a serenidade
da alma reflete-se em nosso corpo, em nossos olhares:
a alma sorridente acende uma chama nos olhos .
A alma sorridente — Os olhos brilhantes 253

9 3 . A maior vitoria.

A maior vitoria consiste em nos podermos ven­


cer a nós mesmos. E’ nesta convicção que o paganismo
já cumulava de honrarias os que pudessem submeter
á sua vontade o mais forte dos instintos, o instinto
sexual. E, a muito longe que remontem os documen­
tos escritos, por toda a parte se encontra nos antigos
o respeito á castidade. Cicero escreve: "Nihil est vir-
tute amabilius” , nada é mais amavel que a virtude.
Em Roma erigira-se um templo á Pudicitia, deusa
da pureza, e Tibulo proclama altivamente: “Casta
placent superis” , a castidade é agradavel aos deuses.
Diante das Vestais romanas marchavam — sinal de
grande honra — os litores, como diante dos côn­
sules. E, se uma Vestal encontrasse por acaso um con­
denado á morte, seria ele indultado. Assim como em
Roma as Vestais, também na Galia os druidas e os
sacerdotes do Nilo, no Egito, eram cercados de gran­
des honrarias por causa da sua castidade. O Sabio
do Antigo Testamento exclama com espanto: “Ha tres
coisa que eu não compreendo e uma quarta que me
excede completamente: como a aguia voa attavés dos
céus, como a serpente deslisa através dos rochedos,
como o navio flutua sobre o mar — e como o homem
atravessa são e salvo as estradas perigosas da juven­
tude" (Provérbios, XXX, 18-19).
Ainda hoje o proprio homem que escorregou pelo
declive da impureza experimenta involuntariamente
uma certa emoção e um certo respeito diante daqueles
que conquistaram a vitoria da castidade.
254 A Casta Adolescência

O proprio negador cinico dos valores morais não


se pode subtrair ao poder da superioridade moral, que
emana de um jovem casto. Efetivamente na Terra
inteira não se encontra um valor maior que um ca-
rater viril de uma moralidade perfeita. A mais bela
joia da coroa da humanidade é o moço casto que al­
cançou a vitoria sobre si mesmo. E’ o mais forte pilar
da sociedade, pois com a juventude moralmente de­
caída a própria sociedade marcha para a ruína; é o
penhor, o clarão de esperança de um mais belo futuro
para a humanidade.

94. Ah! como é bela a geração dos castos!

Em nossos dias, fala-se enormemente da beleza


do corpo humano. Na verdade, o homem é o remate
da criação, mas não tanto pela beleza do corpo como
pela nobreza da alma. Efetivamente, que é a encanta­
dora cabeça loura de uma criança, que é o brilho dos
seus grandes olhos abertos, que são os seus lábios
vermelhos que chalram continuamente — que é tudo
isso se consideramos que o templo de Deus se ergueu
no corpo humano imaculado e que por detrás dos
olhos sorridentes e cândidos desses homens se ergue
um altar em que o Eterno estabeleceu a sua morada?
Afirma um velho provérbio que os olhos são o espelho
da alma. Ora, nenhuma outra beleza da alma se pode
refletir mais triunfalmente nos olhos do homem como
a pureza no rosto de um jovem. “Bemaventurados os
que teem o coração puro, porque verão a Deus”.
A alma sorridente — Os olhos brilhantes 255

Ha uma idéa profunda e interessante no fato de


se dar o nome de virgem a toda a beleza da natureza
que tenha conservado sua integridade e frescura. E’
assim que falamos de "floresta virgens” . Esta doce,
piedosa e santa emoção que surge em nossa alma á
vista das belezas virginais da natureza, cresce mais
no homem á vista de um adolescente de alma “virgi­
nal” . E’ como se uma voz misteriosa cochichasse
então: "Tira o teu calçado e fala só respeitosamente,
porque esta alma é uma terra santa” .
Repara nessa alegria de viver, nessa energia
pronta para a ação, nessa alacridade perpetua, prima­
vera cheia de esperança, que brotam desses olhos bri­
lhantes como uma vela entumecida por uma brisa
fresca, como o anuncio da aurora, como um hino ce­
lestial. Nesses verdes anos cheios de promessas nascem
cada dia novas forças, revelam-se energias ocultas, e
a alma estremece numa santa espectaculação. Efetiva­
mente, a potência genital conservada intacta, recon­
quistada e transportada para um outro terreno, o ter­
reno espiritual, torna-se fonte dessas obras criadoras
que exigem do homem a maior energia. Essa alegria
transbordante de viver, esses planos e esses desejos in­
flamados são a prova — coisa confirmada, aliás,
pela experiencia dos homens que conceberam e execu­
taram grandes obras — de que a continência tem
uma influencia misteriosa e benefica sobre o progres­
so da nossa atividade intelectual. A primavera canta
nele a graça, a alegria, as esperanças, as ambições da
juventude, e, enquanto os seus infelizes companheiros
transviados delapidaram a melhor parte das suas for-
256 A Casta Adolescência

ças espirituais e viris na impureza e agora choram,


sobre as ruinas da sua alma, a vida tão cedo des­
pedaçada, o coração lhe pulsa de alegria, os olhos azues
lhe brilham como um miosotis impelido a um mundo
superior, e as forças se entesam ao peso das resoluções
que o levam aos grandes atos. Os excessos sexuais ar­
ruinam o espirito e o organismo, a continência dá-lhes
força e frescura. Para tal adolescente não ha dever
mais facil que a observância do grande mandamento
divino: "Amarás ao Senhor teu Deus, com todo o
teu coração, com toda a tua alma, com todas as tuas
forças” .
Com uma força selvagem o regato da montanha
muge através dos rochedos. Se tivesse liberdade, faria
terríveis devastações. Mas a inteligência humana man­
tem-no entre represas poderosas, dirige-o com tubos
de aço para turbinas, e eis essa força selvagem trans­
formada em luz e em energia eletricas. O instinto
sexual no homem é também uma força natural de
selvagens impulsos. Se o deixares livre, causará terrí­
veis devastações em teu idealismo, nos teus trabalhos,
no teu corpo e na tua alma; mas, se o mantiveres no
tubo de aço da continência, até ao momento em que
puderes utilizal-o de conformidade com os sublimes
desígnios de Deus Creador no sacramento do matri­
mônio, então se tornará fonte de uma vida familiar
radiante de felicidade.
A pureza da alma dá á vontade humana uma
força vitoriosa contra todas as baixezas; também é
a pureza o verdadeiro fundamento de um carater fir­
me. A pureza é a criadora da virilidade. O que sabe
A alina sorridente <— Os olhos brilhantes 257

vencer-se ninguém o pode vencer. Os heroicos mártires


do cristianismo primitivo eram as mais das vezes, e
não por acaso, virgens, e receberam este título magní­
fico: Virgo et martyr.
Em Lucerna ergue-sc um magnífico monumento
(Obra de Thorwaldscn) em honra dos setecentos
suissos que morreram em defesa de Luís XVT; um
leão em agonia defende com a pata direita um lirio,
emblema dos Bourbons; em baixo ha esta inscrição:
"Helvetiorum fidei et virtu ti", á fidelidade e á cora­
gem dos suissos.
Meu caro filho, em tua alma também floresce
o lirio da pureza; se o conservares, não é Thorwaldsen
que te erguerá um monumento, mas receberás em re­
compensa uma vida de concordia e de felicidade.
Magnífico desabrochar de uma vida moça cheia
de esperançai Esperanças, desejos, aspirações celes­
tes de uma alma humana nascida para a eternidade!
A h como é bela a geração dos castos! “Nenhuma com­
pensação — exclama a Sagrada Escritura — é digna
da alma casta” (Eccl., XXXVI, 2 0 ). “A pureza é a
fonte de toda a beleza" (Conde Estevão Széchenyi.
Memórias, 36).
Ahí se os moços soubessem que fonte maravi­
lhosa de forças é a castidade conservada intact2 , como
não a repeliríam tão levianamente!

95. Liberdade, liberdade querida!

A liberdade causa impressão nos moços. Certo,


é também o que lhes convem. Mas haverá homem
258 A Casta Adolescência

mais livre do que aquele que com superioridade põe


ordem no santuario da sua alma e a preserva dos mo­
vimentos inferiores? Haverá no mundo escravo mais
miserável do que aquele que os instintos cegos do
corpo, o pecado de impureza, jogaram ás cadeias da
mais penosa escravidão? Realmente, não c um ho­
mem livre aquele que faz o que quer, mas sim aquele
que pode querer o que deve fazer, o que pode gover­
nar-se a si mesmo e em consequência pode obedecer ás
suas ordens.
Viver na imoralidade — é isso liberdade? Sabes
qual o povo que seria então mais livre? Um rebanho
de porcos numa manga.
Quantos moços repetem: "liberdade, liberdade
querida”, mas só o adolescente de vida pura pode
apreciar e compreender a verdadeira liberdade, pois
a verdadeira liberdade consiste na liberdade da alma.
Ah! meu caro filho, se pudesses conservar sem­
pre tua alma pura! Se pudesses permanecer sempre o
guerreiro vitorioso dessas lutas pela liberdade da tua
alma!
Conserva este livro, também para mais tarde.
Quando estiveres na universidade ou tiveres chegado
a certa situação, toma-o contigo e, se as tentações te
cercarem, relê-o. Muitos jovens aqui hauriram força,
coragem e perseverança para ficarem puros.
E oxalá venhas tu a ser, no meio dos outros,
o propagandista destes magníficos sentimentos! Re­
para, meu filho, quantos não ha que se debatem,
afundam e abafam neste triste pecado. Talvez conhe­
ças alguns no meio dos teus camaradas. Ah! sê para
A alma sorridente — Os olhos brilhantes 259

eles o anjo da guarda. Põe este livro nas mãos do


maior numero possível de moços! Quem sabe quantos
poderás salvar assim da perdição! Quando um dia
notares, no curso da tua vida, a multidão imensa
dos propagandistas, dos companheiros, dos auxiliares
do pecado, da imundicie, da impudicicía; quando vi­
res um dia a multidão dos corrutores das almas e dos
apostolos da imoralidade, como ficarás inflamado de
santa indignação e de energica resolução: "Se outros
podem corromper as almas, eu tentarei tornal-as me­
lhores. Se outros podem perder as almas, eu tentarei
salva-las. Algumas vezes ha jovens que fazem este
respeito mais do que qualquer outra pessoa. Pof-
que ainda és moço, os outros jovéns mais facil­
mente abrem a alma diante de ti. Desde que comecem
a falar-te pela primeira vez em coisas imorais ou mes­
mo que lhes façam simples alusão, tu, de aspecto in­
finitamente grave, com uma santa emoção, mas tam­
bém com firmeza, advertí-los-ás; pode ser que pre­
serves assim teus camaradas da primeira queda. E que
mais nobre alegria se pode abrir em teu coração, quan­
do á noite puderes agradecer a Deus em tuas preces:
“Eu vos agradeço, Senhor, por ter podido salvar
hoje uma alma". Fala a teus camaradas com uma ca­
lorosa convicção, mas, sobretudo, com o exemplo da
tua pureza de vida. Uma grande alegria queira inun­
dar-te a alma no pensamento de que, pelas pa­
lavras, pelos exemplos ou pelo simples empréstimo
de “A casta adolescência”, podes conservar um mem­
bro util á patria e uma alma imortal para a vida da
graça.
260 A Casta Adolescência

96. Vontade. — Força. — Vitoria.

A nobreza e a liberdade d’alma dão ao olhar da


criança inocente tal encanto que os maiores pintores
do mundo, quando querem representar os anjos, por­
tanto uma beleza sobrenatural — deram-lhes rostos
de crianças. Esses traços sorridentes são um orvalho
refrigerante nos botões nascentes da humanidade.
Sim, no rosto de um adolescente de alma pura, de
vida pura, reflete-se a beleza do céu; e o pagão Pla­
tão já escrevia; "Que nos faz preciso para ver a
Deus? A pureza e a morte”. O céu sem nuvens não
tem o mesmo sorriso ao romper do dia; as estrelas não
teem o mesmo brilho á noite; as pérolas do rocio ma­
tinal não teem o mesmo esplendor; o regato da m o n ­
tanha não tem a mesma pureza de cristal — talvez
fosse semelhante o olhar dos anjos se tivessem corpo.
A alma de um- anjo coberta com flores da primavera
aparece nesses olhos; a serenidade de uma alma pura,
que a poeira não desbota, brilha nesses olhos cândi­
dos. E, se o reflexo da inocência natural involuntária
c da pureza da alma num rosto de criança é tão belo,
quanto mais comovente o é num moço cuja virtude
deve ter sido adquirida ao preço de rudes combates
sustentados virilmente! Conheces estas graves palavras
de Goethe; "Grandes pensamentos e um coração puro,
eis o que deveriamos pedir a Deus" (Wilhelm Meis-
ters Wnndcrjahrc, 1.10). A vida casta cria a harmo­
nia entre a parte inferior e a parte superior do homem.
A alma pura é o mais precioso tesouro do homem, a
A alma sorridente — Os olhos brilhantes 261

base de uma vida heróica, uma faisca, c a mais bela


manifestação da semelhança com Deus.
E ‘ dificit achar no m undo coisa mais santa que
um jovem coração preservado do pecado.

97. Mantem-te acordado.

E’ possível, meu filho, que regresses de longe


e que o espectro dos anos passados no pecado te es­
pante. Se um dia tiveres encontrado de novo o Se­
nhor, fica sempre com Ele. Se despertaste de um
sonho terrível, continua desperto. J,ê esta carta, trans-
bordante de imensa alegria, que me escreveu um jovem
soldado, quando, depois de anos seguidos de quedas
morais, achou de novo ao Senhor Jesus:
" . . . Caía sempre cada vez mais baixo. Entrei
pela primeira vez para um hospital: não foi bastan­
te; voltei uma segunda vez; ainda não foi suficiente;
voltei uma terceira vez. . . Disse então para comigo:
será a ultima.
Quando saí do hospital, dírigi-me ao confes­
sionário. Foi a minha resurreição. Meu Deus, que
confissão! Toda a felicidade deste mundo, milhares
dc anos de gozos não podem alcançar tanta felicidade
como a que eu senti após a santa comunhão. Levei até
ao fim a minha penosa missão; voltei tres vezes ao
confessionário; mas, eu queria ter bom exito. era pre­
ciso. Sou um soldado de coração rude, e, no entanto,
diante do altar, pús-me a chorar. Fora do hospital,
procurava a felicidade no pecado; quando alcançava
262 A Casta Adolescência

por instantes o que acreditava fosse a felicidade, sen­


tia-me depois cem vezes mais infeliz. Faltava-me al­
guma coisa, e procurei onde jámais a acharia.
Agora, encontrei uma felicidade duradoura. Mi­
nha felicidade, querería faze-la sentir aos meus jovens
camaradas transviados, derrama-la na alma deles, para
que eles vejam que felicidade trocam por um vil pra­
zer de momento. Meu irmão, é indescritível a felicida­
de que experimento. Nos dias que antecedem a santa
comunhão, estou impaciente, só tenho um pensamen­
to, o Santíssimo Sacramento. Depois, é como se o
meu peito fosse despedaçar-sc, e repito, prostrado em
terra: Senhor, como aqui é bom. . . Quereria entor­
nar minha alma na tua, irmão infeliz. Será que o
mundo já te deu alguma vez semelhantes alegrias?
Eu também passei pelo mesmo calvario, isto é, o pe­
cado, isto é, a lama, que tu (Meu Deus, se eu só não
pudesse dizer isso de m im !), mas depois desses ins­
tantes de gozo, olhava fixamente o futuro e procurava
saber onde se achava uma felicidade mais longa, mais
duradoura., . Agora, o triste passado não me parece
mais que um sonho mau: nesse sonho, o meu sorriso,
a minha alegria desapareceram, e o meu aspecto era
cheio dc tristeza, mas essa felicidade não se apresen­
tava como a de outrora; é a dor de antes haver co­
metido tantos pecados. Sou como um homem que
acorda de um sonho mau e digo: “Meu Deus, foi
bom ter despertado. . . Meu irmão, mantem-te acor­
dado!"
Mantem-te acordado e sê feliz, alegre, de bom
humor! A alegria pura e verdadeira é um excelente
A alma sorridente — Os olhos brilhantes 263

auxiliar em nossas lutas contra a impureza. Onde não


brilham os raios de sol, aparece o mofo, a atmosfera
torna-se carregada de miasmas, e bandos de bichos de
conta e outros insetos formigam em abundancia. O
mofo do pecado, o ar empestado da devassidão, os bi­
chos de conta da impureza, surpreendem mais fa­
cilmente a alma triste e lerda. Quanto mais pura for
a tua alma, mais o bom humor se deve traduzir num
riso argentino em teus lábios. Pois, quem poderia estar
de melhor humor que um moço de alma pura. de
pensamentos voltados para o ideal e amando a Deus!
Jovens, desmenti essa idea errônea de que o pecado dá
a alegria e de que um moço deve recorrer ao pecado
se quer ter prazer. Ah, meu caro filho, experimenta
apenas, c verificarás que todos os prazeres prometi­
dos pelo pecado e pelos seus enganadores atrativos
nada são ao lado da doçura da alegria, da paz, que
se espalham pela alma de um moço casto. De um
moço que, de alma tranquila, ousa fitar nos olhos
a Nosso Senhor Jesus Cristo.

98. Tu o farás , não?

A ultima palavra que neste livro te quero diri­


gir, meu filho, não pode ser senão esta: guarda o
teu precioso tesouro, a pureza da tua alma juvenil.
Se no passado foste obrigado a deplorar quedas, co­
meça desde agora uma nova vida. Não esqueças as
minhas palavras: ninguém está irremediavelmente per­
dido salvo aquele que abdica. Por mui profundamente
264 A Casta Adolescência

que tenhas caido, meu filho, sempre é possível re­


erguer-te. Pois, se podemos dominar as ondas elétri­
cas, podemos incontestavelmentc submeter ás nossas
ordens as vagas das nossas paixões.
Conserva pura a tua alma, como a mais preciosa
joia que tens. As pérolas e as pedras preciosas, a es­
meralda, a safira, o rubi, são extremamente delicados;
se os usarmos muitas vezes, se lhes tocarmos, se os
expusermos aos raios do sol — perdem o seu brilho
e a sua cor. Por isso se conservam guardadas num
movei especial. A pureza da tua alma se embaciará
também, se não a guardares. Todos, durante a juven­
tude, são lançados aos combates pela natureza que
neles se expande. Este moço atravessa com bastante
facilidade as dificuldades da adolescência, aquele já
não o faz senão com rudes combates. Os instintos
rebentarão talvez contra ti com tal furor que ficarás
quasi paralizado de espanto: é impossível guardar a
pureza da minha alma. Não, meu filho, não fales
assim. T u bem sabes que podes alcançar vitoria, que
podes chegar ao altar do teu casamento, puro de
corpo c de alma. T u o podes — mas á custa de um
trabalho duro. A' custa de generosos sacrifícios, de
uma vigilância perpetua, de uma perseverança incan­
sável. Tom a por lema o que a província holandesa
da Zelandia, em luta perpetua com o mar, inscre­
veu cm suas armas: "Luctor et emergo”, luto mas
sempre levanto vitoriosamente a cabeça acima das
vagas.
Este livro falou-te com toda a franqueza; tu
podes viver casto, deves viver casto, mas não é coisa
A alma sorridente — Os olhos brilhantes 265

assim tão facil. E ’ preferível saberes antecipadamente


que o homem não nasceu casto, mas se tornou casto á
custa de duros combates, isto é, que no mundo atual
só uma luta heróica lhe pode permitir conservar a
castidade total até ao casamento. Bem que te diz a
razão: conserva-te puro; a religião te diz: conserva-
te puro; mas o mundo atual, as frívolas idéias atuais,
os milhares de tentações atuais, os instintos da tua
natureza inclinada ao pecado te segredam aos ouvidos:
não fiques, não fiques.
No entanto, é preciso que fiques puro, pois a
recompensa que te espera é digna dos maiores comba­
tes. A mais bela recompensa da coragem, a ordem de
Maria Teresa, não pode ser ganha senão em batalha.
O caminho que conduz ás alturas, ás alturas da alma,
já Seneca reconhecia não ser facil: “Non est ad astra
mollis e terris via” . Mas a força moral que terás ad­
quirido durante a juventude aureolará de alegria e
felicidade a tua idade madura.
Que nas tentações mais violentas tires desse pen­
samento a tua força de resistência. Nesse momento,
não é só por mim que luto, mas também pelos meus
descendentes. Ah! que grande alegria para mim quan­
do, vinte cinco ou trinta anos mais tarde, meu filho,
na adolescência, puder dizer-me:
“Agradeço-te, querido pai, o haveres lutado tão
duramente a juventude contra as tentações impuras,
e me haveres tornado assim a luta mais facil.
Agradeço-te o haveres conservado a tua pureza
juvenil e teres assim alimentado em mim a santa cha­
ma do desejo de uma vida casta.
2(16 A Casta Adolescência

Agradeço-te o haveres cuidado da alvura da tua


alma, e é ás tuas lutas vitoriosas que devo os meus
olhos sorridentes.
Agradeço o haveres contido com mão firme os
teus instintos durante a juventude e é a ti que devo
os meus musculos de aço, os meus nervos solidos, a
minha boa saude”.
Os jornais estão cheios de reclames de fortifi-
cantes e depurativos: “Tomai bioforina, hemoglo­
bina, etc. . . e vivereis muito tempo”. Sabes qual c
a melhor garantia de uma boa saude e de uma longa
vida? E ‘ uma juventude casta e que não tenha sido
desbotada pela impureza .
Penso que pudeste ve-lo bem claramente em
meu livro: a vida sexual não é uma invenção diabó­
lica, nem uma coisa vergonhosa, mas ao contrario
um dom nobre e sagrado de Deus Criador, um sinal
de grande confiança no homem. Se é um dom de Deus,
não pode ser um pecado, mas somente uma coisa san­
ta. E tua vigilância e lutas perpetuas durante a ju ­
ventude não são dirigidas contra as coisas sexuais como
tais, mas para as conservar puras e sem mancha, até
ao momento em que, de conformidade com a vonta­
de de Deus, tiveres o direito de te servir delas, até ao
casamento.
E, se agora seguires os conselhos deste livro, mais
tarde, quando o teu sangue ardente tiver esfriado após
a experiencia da idade madura, pensarás com reconhe­
cimento que outrora, em tua juventude, leste um
livro, de cujo autor não te recordarás mais, cujo ti­
A alma sorridente — Os olhos brilhantes 267

tulo não mais te ocorre, mas que te preservou de


graves erros e da ruina moral.
Meu caro filho, passei anos no meio da juventu­
de. Vi muitos jovens crescer como botões transbordan-
tes de seiva: vi moços atirar-se para as alturas como
carvalhos cheios de promessas; vi tantas dessas belas
promessas reduzidas a pó, ai!, vi esses vigorosos bo­
tões, esses carvalhos altos roidos por um verme mis­
terioso. Ora, muitos deles não tinham dado ainda os
primeiros passos no caminho do pecado senão por ig­
norância e leviandade, porque não houvera quem os
avisasse a tempo. Mas creio firmemente que haverá
moços na vida dos quais as paginas serias deste livro
marcarão uma volta decisiva, a rutura com o pecado
e ema nova vida: a vida idealmcnte bela da “casta
adolescência”.

9 9 . Uma geração nova.

Uma epoca se aproxima do declínio. A epoca


que orgulhosamente gravou na fronte as palavras “ci­
ência" e "industria". Tinha por maxima: a ciência e
só a ciência. Mas essa ciência despedaçou muitos dos
nossos valores.
Que venha agora uma nova geração, Uma ge­
ração moça que leve na fronte o sinal da beleza de
alma e cujos olhos tragam a chama da pureza moral.
Que venha essa juventude, e que nós possamos saudar
o seu triunfo!
Talvez que alguns camaradas pervertidos ve­
nham tentar desanimar-te: "não vale a pena fazer
268 A Casta Adolescência

tantos esforços, não vale a pena. . . Não ha juventude


casta no mundo. . . Um caí desde o colégio, outro
na universidade. . . mas hoje ninguém mais se con­
serva casto até ao casamento. . . “Meu filho, acredita
no que escrevo neste momento: Sim, ha moço no co­
légio, na universidade, e moços que conquistaram
seus diplomas, que dia a dia lutam sem desfaleci-
mentos pela sua castidade. Sim, ha-os — e o numero
deles cresce de ano para ano — que sabem passar
com a alma imaculada através das mil tentações do
mundo atual, e que, no dia do seu casamento, le­
varão, á sua branca noiva, não um corpo arruinado,
nem um sangue estragado, nem uma alma murcha,
mas a coroa da vitoria, ganha triunfalmente nas lutas
espirituaes: um corpo jovem e robusto, uma saude de
ferro, um coração ardente, uma alma cheia de ideal.
Sim, esses moços tornar-se-ão cada vez mais nu­
merosos; essa santa chama, outrora timida, extende-
se cada vez mais; o bom odor de Cristo faz-se sentir
cada vez mais; sim, a casta adolescência já é hoje uma
acebatadova, uma grande, uma sonta realidade. De­
pende de ti, meu filho, que o numero desses heróis
se torne maior ainda.
O ’ pureza moral, o mais belo ornamento da alma
humana! Triunfa dos milhares de laços dos prazeres
sensuais e coloca sob teu jugo suave o nosso precioso
tesouro, essa juventude de corpo robusto, de alma de
uma beleza ideal. Meus amigos, de pé sob o estan­
darte do lirio da pureza pela vossa felicidade física e
moral, pelo vosso futuro, pela vossa geração, pela nos­
sa patria!
A alma sorridente — Os olhos brilhantes 269

100. A santa vontade .

Quando na China uma jovem morre virgem,


seus pais teem o direito de erguer em sua honra um
arco de triunfo com esta inscrição: “Schoeng Dsche” ,
quer dizer: "a santa vontade". Esse arco de triunfo
significa que a santa vontade conduziu a jovem sã
e salva através da vida. Essa forte e santa vontade
é o bom genio de todo o adolescente que quer con­
servar uma pureza inalterável nas lutas da sua juven­
tude. Merece bem que se lhe erga um arco de triunfo,
quando entrar com a alma imaculada na patria da
eterna pureza.
Tens tu, meu filho, essa “santa vontade” ? A
santa vontade de combater com uma perseverança
inquebrantavel, uma coragem indomável, nas fileiras
dessa casta juventude que, de rosto abraseado pela
vitoria, brande contra toda a impureza e toda a le­
viandade morais o estandarte branco como a neve de
uma pureza sem macula; ou então conbates num
outro campo, entre os que arripiaram caminho e se
querem corrigir, que, á custa das suas tristes quedas,
sabem amar agora mais do que a outra qualquer coisa
a felicidade sem exemplo da vida casta? Tens esta
santa vontade? Ou então, se a perdeste, acha-la-ás
de novo, não é verdade?
Serás forte, meu filho. Zelarás pela pureza da
tua alma. Sim, não é verdade?
Vê, a vida pura é a força; a vida pura é a
alegria; a vida pura é a nobreza; a vida pura é a li­
270 A Casta Adolescência

berdade; a vida pura é a beleza — vale, pois, a pena


lutar por ela.
Quando te imagino assim diante de mim e, em
sinal de adeus, te encaro ainda uma vez, profunda­
mente, e te vejo como uma vela impelida pelo vento,
como a promessa de uma bela aurora, mas prcvejo
grandes tempestades morais, provações e tentações que
cairão sobre ti no decorrer da tua juventude, do meu
coração brota esta fervente prece:

"T u és puro, belo, intacto,


como a rosa;
quando te olho, minha alma chora
e meus olhos ficam cheios de lagrimas.
Ponho minha mão na tua cabeça, e peço
ao Pai Celeste
que conserve puro e branco como a neve
o lirio do teu coração”.

Meu filho, tenho confiança em ti. Uma grande


confiança.
Agora, dá-me a mão. . . Fita-me nos olhos. . .
longamente, firmemente. . . está bem.
E dize:

Continuarei no caminho da pureza.

Ou antes, se for talvez preciso que assim fales,


dize isto:
Ingressarei de novo no exercito dos lirios.

EU QUP.RO. . . EU Q U E R O ... SER CASTO.


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Í N D I C E

APRESENTAÇÃO ....................................................................... 5
P R O E M I O ................................................................................. 17
PR E FA C IO DA QUARTA EDIÇÃO HÚNGARA . 21
OS DOIS L A G O S ......................................................... 23

PR IM E IR A P A R T E
OS PLANOS DO CREADOR

1. O prim eiro hom em o a p rim e ira m u lh e r . 2G


2. Os planos do C r e a d o r ........................................... 27
8. A fonte da r i d a .......................................................... 30
4. A m ãe e o f i l h o .......................................................... 31
5. S anta g r a v i d a d e .......................................................... 34
6. O pecado de im pureza .................................................. 38
7. O santo m i s t é r i o ................................................................ 40

SEGUNDA P A R T E
PARA ONDE IREI?

8. No cruzam ento dos cam inhos . . . . . . 40


0. Da infancia á a d o ie s c e u c ia ........................................... 48
10. T eu organism o desenvolve-se . . . . . . 50
11. Q uando a b ril estiv er d entro de t i ............................. 51
12. Id éias novas, desejos desconhecidos . 53
13. O prim eiro a m o r ................................................................. 50
14. Esse desenvolvim ento faz p a rte do plano divino . 57
15. P u ro a té o a lta r, fiél a té o tnm ulo . 58
10. No perigo, n a t e m p e s t a d e ........................................... 60
TERCEIRA PARTE
NO DECLIVE

17. N a l a d e i r a ................................................................................ 66
18. Com os n o m p a n h e ir o s ...........................................................67
10. A c r i s e ........................................... 68
ao. A ru ín a do t e m p l o .................................................................. 69
2 1. Ju v e n tu d e a n d r a j o s a ...........................................................71
22. N a cam inho da p e r d iç ã o ...........................................................73
23. A lei da g r a v i d a d e ..................................................................76
24. Nog- lagos M a z u r i a n o s ...........................................................77

QUARTA P A R T E

NO FUNDO DO ABISMO

2 5. O carvalho p a r t i d o ........................................... 80
2 6. “Um a vez s ó ? ” ......................................................................... 82
2 7. O p rim eiro passo em f a l s o ....................................................84
28. D escensus a v e r n l .................................................. 87
20. Os alu n o s “ ao c o rre n te ” ....................................................91
80. P o rq u e é que “ não ha D eus” ? ............................................ 93
81. S erá a leg ria? S erá f e l i c i d a d e ? .............................................97
32. A arvore roida pelos v e r m e s ............................................ 98
83. Castigos f i s i c o s .......................................................................100
34. P odridão v i v a .......................................................................103
35. T errivel r e s p o n s a b i l i d a d e ................................................. 108
36. Teus pobres f i l h o s ! ............................................................... 109
87. E speran ças p a r t i d a s ......................................... .112
38. Suicídios de e s t u d a n t e s .........................................................119

QUINTA PA R TE

A LUTA CONTHA O DRAGÃO DE SETE


CABEÇAS

SO. R etorno p o s s í v e l.......................................................................125


40. In citam ento á l u t a ............................. 127
41. A agula l i b e r t a ........................................... 129
42. Pelo íu tu ro da p a t r i a .........................................................132
48. P ela in teg rid ad e do l i r i o ................................................. 135
44. O gladlo flam eja n te da n a t u r e s a ................................... 137
45. P a ra a felicidade de tu a alm a . . . . . . 139
46. P a ra a vida — p a ra a m o r t e ! ..................... 140
47. R esiste . .143
48. Quem é o c o v a r d e ? ........................................... 145
49. Deixa-os! .......................................................... . . . 1 4 7
50. Isso a mim não faz m a l ! .................. 151
51. O unico rem edio: evita o p e c a d o .............. 152
52. Uma v assourada, por f a v o r ! ..................... 154
53. C ontra a co rren te . . .156
54. Sob o fogo da m o f a ................................ 158
55. Não é verdade! Mil vezes, não! 160
56. Não brinques com o fogo . . . . . . . 161
57. A proveita a m ocidade . 165
58. C astidade e s a u d e ........................................... 167
59. O que diz a ciência m edica ..................................................169
60. Deus e a n a t u r e z a ........................................... 173
61. Quem não pode ficar p u r o ? ......................175

SEXTA PARTE

LUTA E TEM CONFIANÇA

62. Vida p u ra! alm a pura! , ................................................. 178


63. Sem a vontade, não h a p e c a d o ...................................180
64. Ju stifica -te tu m e s m o ........................................... 184
65. O contagio da I m o r a lid a d e ................................................. 187
66. T uas l e i t u r a s ...................................................................... 190
67. L i v r o s ........................................................................................... 192
68. J o r n a i s ..................................................................................... 195
69. Q u a d r o s ..................................................................................... 195
70. Teatro e c in e m a ............................................................... 199
71. A d a n s a ..................................................................................... 202
72. Sê c a v a lh e ir e s c o ...................................................................... 204
73. Em com panhia das m u l h e r e s ..........................................205
74. T ua noiva p u r a .......................................................................207
75. Ama a d e c e n c ia .......................................................................208
76. M orre e r e s s u s c i t a ! ................................................................209
77. O raq uitism o da alm a ............................................ 211
78. F o rtific a a v o n ta d e . . . . . . . . . 212
79. A aleg ria da v i t o r i a ............................................................... 215
80. N a te rra , m as não da te rra . . . 220
81. O que não sabe m e n t i r ........................................................ 221
82. F o rtific a te u corpo ................................................................222
83. A resistên cia na d o r ........................................................ 225
84. Um genero de vida higiênica . 227
85. N unca e stejas ocioso ...................................................... 232
80. A m a a n a t u r e z a .......................................................................235
87. A lguns conselhos m édicos . . . . . . . 237
88. Um pai e um a m i g o ................................................................ 241
89. N as fontes de um a vida nova............................................. 243
90. O S enhor está c o m i g o .........................................................245
01. “ E d e p o i s ? " ................................... 250

SÉTIMA PAUTE

A ALMA SORRIDENTE. — OS OLHOS


BRILHANTES

93. A m aior v i t o r i a ........................................... . .253


94. Ah! como é bela a geração dos castos! . 254
95. L iberdade, liberd ad e a u e r i d a ! ..........................................257
»«. V ontade. — F orça. — V i t o r i a .......................................... 260
97. M antem -te a c o r d a d o .................................... .261
98. Tu o fa rá s n ã o ? ................................................................ . 2 6 3
99. U m a geração nova . . . .267
100. A sa n ta v o n t a d e ..........................................................269

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