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APOCALIPSES

Livro “Sou o Primeiro e o Último: Estudo em Teoria Mimética e Apocalipse”, do Doutor em


Ciência da Religião, Maurício Gonçalves Riggi, vencedor do prêmio CAPES 2019 para tratar
do assunto, moderado pelo Doutor em Filosofia Martim Vasques da Cunha. Prepare-se para
assistir a instigante argumentação sobre as possibilidades de um destino apocalíptico,
levando em conta as teorias do antropólogo francês René Girard e na historiadora inglesa
Margaret Barker.

Noção apreendida da cinematografia ou da literatura, mas não é limitada ao que tem sido sua
representação.
Mas apocalipse não é só isso, não é apenas catástrofe.

É ao mesmo tempo fenômeno e pensamento, ele revela e realiza.

Chegou até nós através de um livro específico que é o Apocalipse de João, que tem um prólogo
no qual se fala da revelação de Jesus Cristo. Apocalipse (a primeira palavra que aparece no
livro) em grego quer dizer desvendamento, revelação.
As obras eram nomeadas segundo seu início, suas primeiras linhas (icipt, o primeiro sintagma)

Gênero literário chamado apocalíptica: forma de pensar a realidade em sentido macro.


Interpretação macro do sentido da vida.
Quando pensamos apocalipse ficamos presos ao sentido de catástrofe e pouco à revelação.
As catástrofes sinalizam o processo do apocalipse, mas não são o apocalipse em si.

É uma compreensão de que as coisas estão ocorrendo porque o ser humano é obrigado a
tomar consciência de um agravamento de suas relações sociais e com o meio.

É uma pressão que aumenta e perpassa os homens sobre a natureza falida dos nossos sistemas,
nos sentidos mais íntimos e mais amplos.
É um despertar de consciência.

João: quem lê com preparo simbólico percebe que se trata de um chamamento ao martírio. O
apocalipse nos exorta a nos convertermos todos, mas um a um, individualmente.

Réne Girard
Conversão da mentira romântica para uma verdade romanesca, como libertação interior dessas
taras para ver a realidade de uma forma mais objetiva que encara o ser como a principal causa
da desgraça ao redor.
Responsabilidade da violência
Impeliria a atos estremos X revelação da violência e conversão.

Conversão = desmistificação
Entendimento de uma “Conversão às avessas”
O cristianismo no fundo advoga a descrença
Ídolos que os homens se auto impõe
Processo de desmistificação da própria vida, desmistificando seus ídolos alimentados por ele ao
longo da vida até a desmistificação de si mesmo, a identidade heroica que nos auto atribuímos.
Os escritores romanescos, chamados de convertidos, perceberam a grande ilusão que os
mantinha presos numa retórica autocongratulatória que os aprisionava dentro de um
mecanismo ilusório e violento.
É preciso que a humanidade desmistifique suas estruturas de estado, seus sistemas de poder e
de controle, seu nomos. Entre os profetas hebreus já havia o entendimento de que nossos
sistemas são irremediavelmente destinados a falência, pois estão montados em processos de
geração de violência, assassinatos etc. Desmistificando o passado, os ídolos, os heróis nacionais,
a pátria...
A literatura apocalíptica é de resistência e denuncia contra os sistemas de poderes.

O Apocalipse de João é para que as pessoas tomem consciência de que as estruturas do mundo
são fatalmente corrompidas.
Apareceram num contexto histórico em que sucessivos impérios poderosos foram se
consolidando e se aprimorando e se sucedendo e se universalizando.
O apocalipse é uma denúncia radical de criação de um império universal que era capaz de
seduzir as massas e implantar um plano de domínio.
É preciso descrer e pensar uma reorientação completa dos sentidos do homem, cujo sentido é a
autodestruição.
Essas estruturas denunciadas no apocalipse são entrópicas porque estão fundadas na
linguagem da morte. A denúncia a essas estruturas é o significado de revelação.

Muitas leituras apresentam o apocalipse como algo violento, mas pode ser lido como forma de
conhecimento que denuncia a violência intrínseca aos grandes poderes. Essa segunda visão é
mais esperançosa.
No âmbito do pensamento existe a denúncia (hermenêutica) no âmbito do fenômeno, essa
denúncia traria aspectos positivos para a humanidade. São realidades interconectadas e
concomitantes ao céu e à terra.
A origem desse pensamento de hermenêutica hebraica do séc. V a.C. não é teórica-
argumentativa, mas ritual. O apocalipse se alicerça no rito e na liturgia, não na filosofia ou na
dialética. Sua referência primeira é o mundo simbólico (grosso modo um inconsciente coletivo).
Os profetas que escreveram não tinham a mesma base dinâmica que um teórico de hoje teria, a
base não é textual, bibliográfica, mas litúrgica ligada a processos coletivos comuns. As bases
organizadoras desses pensamentos eram muito diferentes das nossas.
O cordeiro enrolado não é o chefe guerreiro. A espada sai da boca, o fogo sai da boca, ou seja,
destrói pela palavra.
Claro que o imaginário do apocalipse é povoado de violência, porque o mundo funcionava
nessas bases.
O Apocalipse de João não conter o imaginário do guerreio do mundo hebreu antigo seria como
querer que a mitologia esquimó não tenha o imaginário do caçador.
Só conseguimos denunciar a violência e tratá-la com violência. Pacifismo é ilusão.
2001 Uma odisseia no espaço é um filme apocalíptico, uma crítica devastadora ao mundo da
ciência, da politica e da tecnologia, fundado e perpetuado a custo de assassinatos. Esse mundo
sapiens não é um fim em si mesmo. Tem algo que o antecipa e algo que o sucede. É
exatamente isso que é tratado no Livro de João, uma serie de experiências místicas no lugar dos
santos dos santos, o recesso mais sagrado do templo de Jerusalém, um espaço concêntrico
torre de vigia, um lugar fora do tempo e do espaço surgido antes do tempo e da história, o dia
um, a eternidade. O livro do apocalipse se passa com oráculos nesse lugar sagrado. O filme do
kubrik se passa com o megalito, que pode ser associado com o trono de deus, lugar onde
ocorria o ritual de expiação realizado uma vez por ano.

O Apocalipse de João não é um livro de destruição do mundo, mas de destruição das velhas
bestas e recriação constante do mundo.

A criação é eternamente renovada no santo dos santos.


O homem, entretanto, não abre mão facilmente dos próprios sistemas e continua a alimentar
as bestas.

Muitos filmes apocalípticos não têm nada de apocalípticos, mas apresentam soluções de
“salvadores da pátria” que o verdadeiro apocalipse condena e combate.

Não é o que acontece com Kubrik que se assemelha a um rito de iniciação, com êxtase místico
que o captura para o dia um.

Livro de Enoch. X Tradição mosaica


Primeiro livro considerado apocalíptico. Foi recuperado pela exegese moderna no século XIX
(britânicos em contato com a igreja ortodoxa etíope, que tinha em seu cânone o livro de Enoch,
já desaparecido no cânone ocidental), tendo ficado oculto na tradição.

Havia uma tradição hebraica de livros ligados ao livro de Enoch, um pentateuco


Descobertas que alteraram o conhecimento que se tinha sobre o cristinanismo primitivo.
Muitas passagens passam a ser claramente compreensíveis quando se tem por base Enoch
O cristianismo está conectado a esse tipo de pensamento, a teologia apocalíptica, e por isso era
tão agressivo à época, principalmente aos fariseus.
Toda a denuncia enochica é uma denuncia ao sistema judaico, aos senhores da elite espiritual,
econômica, politica e militar de Jerusalém.

Hoje nosso imaginário é mais baseado em Moisés que em Enoch.


David Flusser (primo do Vihlem)

Lento despertar de algo que se chama deus das vítimas, o deus transcendente.
No apocalipse a descoberta do deus das vítimas está explicita. A literatura enochica é o ponto
de partida desse pensamento que diz que a lei não basta, que preciso ser misericordioso e
mudar os processos que nos oprimem desde o inicio dos tempos. (os antepassados não nos
garantem, Abraão, Jacó e outros também nasceram sob esse sistema e são prisioneiros dele. A
única coisa que nos garante é o que está no dia um.

Esse desvio do imaginário apocalíptico – Joaquim de Fiori é uma leitura deturpada, por
exemplo.
O livro dos vigias (primeiro livro de enoch) anjos caídos, senhores da humanidade, sacerdotes
caídos que provocavam o grande mal da cegueira espiritual do homem. Cegos para a sabedoria,
para o discernimento. (por isso Jesus cura tantos cegos e pessoas deformadas, mas não osso
quebrado, resfriado etc. está curando daquela influência deturpada)

Expiação é reparação do tecido corrompido.

Rene Girard fala que Hölderlin passa por um processo de loucura que o desperta
Retirada da sociedade como única saída
Ou melhor, o Hölderlin foi o único romântico a perceber que não havia saída, que a única coisa
decente a fazer era se retirar em silêncio. Tornar-se invisível. Ou um convite à santidade.
Quietismo (x estar enganado pelo mundo).

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