Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
RESUMO: O presente texto possui como objetivo abordar analiticamente uma das teses
escritas por Walter Benjamin, mais especificamente a sua IX tese e interpretá-la, ou seja,
trazendo sua tese ao contexto da globalização. Nessa tese, o autor chama a atenção para o
progresso da humanidade. O progresso é um dos pontos mais polêmicos que temos visto e
sentido. Este está intimamente ligado à globalização, em que houve o desencadeamento de
uma série de eventos, como o desenvolvimento das tecnologias de informação (T.I), da
inteligência artificial, e também do transumanismo. Essa corrente filosófica desafia as leis da
natureza, ambientando o corpo humano com a inserção de tecnologias avançadas, que
permitem criar, renovar e modelar corpos. No entanto, com as devidas nuances a serem
observadas, procura-se questionar se toda essa gama de tecnologia nos levará ao progresso
ou ao regresso enquanto humanidade. A resposta que se aponta a esta questão, neste artigo,
integra a uma perspectiva paradoxal, ambígua e ambivalente.
INTRODUÇÃO
1
Mestra e Doutoranda em Direito pelo Programa de Pós-Graduação Strictu Sensu em Direito
pela Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões – URI – Santo Ângelo/RS.
Licenciada em Filosofia; Pós-Graduada em Filosofia. E-mail – joiciantonia@yahoo.com.br
2
3
Pós-doutor pela Faculdades EST. Doutor em Ciências da Religião, Ciências Sociais e
Religião, pela UMESP. Professor Tempo Integral da URI, Campus de Santo Ângelo. Graduado
em Filosofia e Teologia. Possui formação em Direito. Integra o Corpo Docente do Programa de
Pós-Graduação Stricto Sensu – Mestrado e Doutorado em Direito. Lidera o Grupo de Pesquisa
Novos Direitos em Sociedades Complexas, vinculado à Linha 1, Direito e Multiculturalismo, do
PPG Mestrado e Doutorado em Direito da URI. Pesquisa temas relacionando Gênero, Direito,
Cultura e Religião. Orcid: https://orcid.org/0000-0003-2637-5321. Currículo Lattes:
http://lattes.cnpq.br/4888480291223483. E-mail: nolihahn@san.uri.br
4
Esse trecho se refere ao poema intitulado Saudação do Angelus, que foi citado no livro "O
anjo da História" de Walter Benjamin. Foi enviado por Gershom Scholem como presente a
Benjamin, em 15 de julho de 1921.
O conceito de tempo é um dos mais discutíveis na história. Não há
consenso. Filósofos, literatos, físicos, entram e saem de cena com o objetivo
de encontrar uma denominação que possa suprir esse termo de maneira
adequada. Tempo é elemento para poesia. Tempo é divagar. Tempo se
desdobra em três esferas as quais se vive e se encontra – passado, presente e
futuro. É o que determina os seres vivos. O tempo carrega em si a História,
fatos que construíram a humanidade e desaguaram no momento presente.
Presente, que pode ser nominado de diversas formas, como tecnológico,
reflexivo, progressista, individualista, capitalista, líquido, momentâneo,
frenético, transumano etc.
O tempo se encarrega de desvelar as inúmeras transições pelas quais
percorreu a humanidade. Dentre essas evidências, se apresentam, tanto
progressos como regressos, em termos conceituais ligados ao termo
humanismo. Na passagem de ciclos históricos, de onde o ser humano evoluiu
ao desenvolver o fogo – elemento primitivo e universal necessário para a
sobrevivência e para o desenvolvimento, até a tecnologia avançada de acender
uma lareira com um sensor de voz, por meio de produtos de automatização
ambiental, como a Alexa5. Eis uma evolução no tempo.
Noutro sentido, apesar da evolução científica e tecnológica, situações
de perda do elemento humanidade se desvelam e se revelam em genocídios,
discriminação, guerras que ocorrem neste exato momento, disputas por
território, pela dominação de ambientes, pela dominação de povos, que
segregam, que destroem, que vão em sentido contrário àquilo que se conceitua
como humanismo6, ou seja, com a razão sendo a norteadora das questões
universais, a partir da passagem do teocentrismo para o antropocentrismo.
5
A Alexa é uma assistente virtual que passou a estar presente em muitas casas e escritórios,
devido aos seus dispositivos Echo. Desenvolvida pela Amazon, este produto conta com
diversas funções que podem entreter, informar e também ter bastante utilidade no dia a dia. A
Alexa possui uma configuração que permite desempenhar funções de acender lâmpadas, ligar
aparelhos de climatização, cafeteiras, fechar e abrir cortinas, etc.
6
O Humanismo é considerado um movimento filosófico e literário, ocorrido nos séculos XIV e
XV, que teve início na Península Itálica. Primeiramente, o termo era empregado para designar
os estudos de humanidades, ou seja: literatura clássica, história, dialética, retórica, aritmética,
filosofia natural e línguas modernas. O ponto central do humanismo repousa no fato de colocar
a razão em termos iniciais e encontrar a harmonia e a paz, a partir do conhecimento que vem
da arte, da literatura, da filosofia, rejeitando assim, a barbárie. Marca, também, a passagem do
teocentrismo para o antropocentrismo, ou seja, o homem como o centro do universo.
Nesse viés paradoxal, que se coloca em destaque a ideia de progresso
e regresso da humanidade, encontra-se a reflexão de Walter Benjamin, em
suas teses sobre o Conceito de História, mais precisamente a IX tese, fazendo
referência ao Angelus Novus, a ideia de progresso e regresso. A analogia é
pertinente à corrente filosófica chamada Transumanismo, que emprega
tecnologia avançada no corpo humano afim de desenvolvê-lo, fazê-lo evoluir
com o objetivo de transformar o corpo humano mais longevo, mais saudável e
mais belo. Um corpo que não mais é natural, mas sim com partes artificiais,
sejam próteses, sejam hormônios, externa ou internamente. Um corpo, em
parte, fabricado.
A abordagem do texto divide-se em duas partes. Na primeira, sob a
ótica de Walter Benjamin, acerca da ideia de progresso e regresso, faz-se uma
reflexão desse tema, especificamente a partir do quadro de Paul Klee,
intitulado Angelus Novus, em que o autor se inspirou para escrever a IX tese
sobre o Conceito de História. Na sequência, aborda-se o transumanismo como
uma corrente filosófica e um novo paradigma em que os corpos se
desenvolvem com o auxílio da tecnologia e podem levar a situações
preocupantes, como a eugenia e uma possível perda da humanidade.
8
No seu mais recente livro, Você tem que mudar sua vida! Peter Sloterdijk anuncia a virada
antropotécnica (SLOTERDIJK, 2009). Partindo da percepção que o próprio homem geraria o
homem, a antropotécnica é o conjunto de técnicas desenvolvidas para alterar, modificar e
otimizar o comportamento e o corpo humano.
melhor, as futuras revoluções reunirão em um único processo todas
as formas de mudança que as rupturas anteriores da História haviam
provocado separadamente. Isso será verdadeiro sobretudo no campo
da medicina: estamos às vésperas de uma profunda transformação
que fará com que o conjunto dos progressos médicos do século XX
seja considerado como microacontecimentos. (ALEXANDRE, 2018, p.
XI)
10
Disponível no site da Casa Branca: http://goo.gl/osbyog. Acesso em: 29nov. 2021.
11
Disponível em: http://goo.gl/UvLv5y. Acesso em: 29nov. 2021
12
Disponível em: http://goo.gl/1crTir. Acesso em: 29nov. 2021
A partir deste relatório, assumindo expressamente que as novas
tecnologias possuem um papel visionário e devem atuar sim, no sentido de
dirimir as divisas:
Neste norte, com base nos autores de referência mundial, aqui citados,
denota-se a preocupação no que tange ao momento tecnológico e tudo o que
vier em decorrência de tamanho avanço em escala mundial.
O mundo contemporâneo maximizou o conhecimento técnico e
científico, as estratégias são pautadas para a consolidação do lucro, e
notadamente no desenvolvimento, aperfeiçoamento e evolução do ser humano,
em todos os segmentos, seja físico ou psíquico. Evolução baseada no desejo
de encontrar a perfeição ou chegar perto dela, de viver longos anos com
qualidade de vida, de superar os obstáculos da degeneração humana e poder
substituir aquilo que não mais serve para, aquilo que já não mais perfectibiliza
o ser humano enquanto jovem, produtivo e eficaz. E para isso, é preciso
progredir.
Yuval Noal Harari, tem se destacado mundialmente pelas obras Homo
Sapiens: Uma breve história da humanidade e Homo Deus: Uma breve história
do amanhã. Nessas obras, o autor, traça uma história do passado e do futuro,
respectivamente. Em Homo Deus, a narrativa para o futuro, traz elementos que
parecem ficção científica, no entanto, já estão presentes em alguns nichos da
sociedade que possuem valor aquisitivo elevado para tal. O autor, prenuncia,
com ressalva as conquistas, o futuro da humanidade, afirmando que:
Conclusão
É evidente que nas últimas décadas, houve uma mudança de paradigma na
sociedade, um novo modelo de vida emerge a partir do desenvolvimento da
tecnologia, trazendo um ritmo diferente à sociedade. As relações humanas se
metamorfoseiam rapidamente, os corpos se transformam, são mais ágeis e mais
longevos e quiçá, talvez, mais felizes. Ao passo que inúmeras questões trazidas
pela tecnologia tornam a vida mais fácil e prazerosa e também impulsionam a
conjuntura econômica, não se pode olvidar de que a tecnologia extremamente
avançada também pode deixar rastros de destruição, é o paradoxo do progresso e
regresso que se evidencia.
Encontrar um ponto de equilíbrio entre as afirmações tecnológicas que se
revelam cada dia mais incipientes na sociedade como um todo, é um desafio
constante no agora e para o futuro. Desenvolver o corpo humano para tornar mais
longevo, mais ágil e mais feliz, com produtos e próteses, não parece um perigo em
si. No entanto, quando essa tecnologia permite criar seres humanos com
características a serem definidas por alguém, se está a evidenciar uma espécie de
eugenia, o que causa mais desigualdade social e inúmeras outras possibilidades a
serem analisadas.
Nessa perspectiva, não se pode olvidar das consequências nefastas
ocorridas no século passado, conforme alusão de Walter Benjamin. Paradoxos
existem tanto no passado, no presente e com consequências para a humanidade
futura. A tecnologia é um viés que deve ser visto assim, eis que cria e desenvolve
impérios, mas também causa guerras e destruição em massa. Une e desune
pessoas, comunidades e países. Progresso e regresso podem andar de mãos
dadas, assim como humanismo e transumanismo.
REFERÊNCIAS
MORIN, Edgar. Para onde vai o mundo? Petrópolis: Editora Vozes, 2012.