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Escola de Ciências Sociais e Humanas

Departamento de Economia Política

As Incertezas da Tributação Direta na Economia Digital: A


Metamorfose do Estabelecimento Estável

Gonçalo Grade Monteiro

Dissertação submetida como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em


Direito das Empresas – Especialização em Direito das Sociedades Comerciais

Orientador:
Professor Doutor Vasco Branco Guimarães, Professor Auxiliar do ISCTE
– Instituto Universitário de Lisboa –

Outubro, 2018
Resumo

A globalização e o desenvolvimento das Tecnologias de Informação e Comunicação


geram novos modelos de organização e gestão. Este fenómeno de transformação está na
origem da economia digital.

A desmaterialização advogada pela economia digital revela-se um traço característico


seu. Esta desmaterialização é marcada pela digitalização e pela natureza intangível do
processo económico e comercial e por uma reduzida necessidade de presença física.

Esta característica tem um profundo impacto no âmbito da tributação direta,


nomeadamente na operacionalidade dos elementos de conexão tradicionais fortemente
dependentes da existência de elementos físicos.

Num primeiro momento abordaremos os princípios conformadores do Direito Fiscal


Internacional, por forma a contextualizar o impacto dos desenvolvimentos tecnológicos
na economia e na tributação.

Posteriormente, abordaremos a temática da economia digital, recorrendo aos trabalhos


realizados pelas organizações internacionais, identificando as principais características e
desafios, nomeadamente para a operacionalidade dos elementos de conexão tradicionais.

Por fim, desenvolvemos uma solução para fazer face aos desafios da economia digital,
sobretudo a dificuldade em determinar a jurisdição fiscal competente, apresentada pela
OCDE, no âmbito do projeto BEPS, e recentemente concretizada pela Comissão
Europeia.

Pretendemos assim contribuir para uma reflexão sobre as implicações a nível tributário
da digitalização da economia e sobre a admissibilidade de um elemento de conexão
baseado na presença económica significativa através de uma presença digital
significativa.

Palavras-chave:

Economia digital, Direito Fiscal Internacional, elementos de conexão, estabelecimento


estável, BEPS, presença digital

ii
Abstract

Globalization and the development of information and communication technologies have


generated new organizational and management models. This phenomenon of
transformation is at the outset of digital economy.

De-materialization is a characteristic feature of digital economy. Digitalization, the


intangible nature of the economic and commercial process and a decreasing need for a
physical presence, reflect this de-materialization.

This characteristic has a profound effect on direct taxation, namely on the operation of
the traditional elements upon which taxation relied, strongly dependent on the existence
of physical elements.

Firstly, we shall analyse the basic principles of International Tax Law, in order to
contextualize the impact of technological developments on the economy and taxation.

Secondly, we shall consider the issue of digital economy. With recourse to the reports
produced by international organizations, we shall identify the main characteristics and
challenges, namely regarding the operation of the traditional elements upon which
taxation relied.

Finally, we shall endeavor to present a possible solution to overcome the current


challenges that digital economy faces, mainly the difficulty to determine the competent
tax jurisdiction, as presented by the OECD, in the context of the BEPS project, and
recently implemented by the European Commission.

It is our purpose, therefore, to contribute to a reflection on the tax implications of the


digitalization of economy and on the admissibility of a different factor to base taxation
on: significant digital presence as proof of a significant economic presence.

Key-words:

Digital economy, International tax law, connecting elements, permanent establishment,


BEPS, digital presence

iii
Índice
Índice de Figuras ...................................................................................................................vi

Glossário de siglas ................................................................................................................vii

Introdução .............................................................................................................................. 9

Objeto .................................................................................................................................... 9

Estrutura .............................................................................................................................. 11

Capítulo 1. Os conflitos de tributação internacional ........................................................... 13

1.1. Os acordos de dupla tributação ............................................................................... 16

1.2. Direito fiscal internacional .......................................................................................... 20

1.2.1. Princípios estruturais .............................................................................................. 23

1.2.1.1. Princípio da soberania ....................................................................................... 24

1.2.1.2. Princípio da equidade ........................................................................................ 25

1.2.1.3. Princípio da neutralidade ................................................................................... 27

1.2.2. Princípios operativos .............................................................................................. 28

1.2.2.1. Princípio da Residência e Princípio da Fonte – Os elementos de conexão ....... 29

1.2.2.1.1. A residência .............................................................................................. 32

1.2.2.1.2. A fonte ...................................................................................................... 38

1.2.2.2. O princípio do estabelecimento estável ............................................................. 40

1.2.2.2.1. Estabelecimento Estável no Modelo de Convenção OCDE ..................... 47

1.2.2.2.1.1. Estabelecimento Estável Real ........................................................... 49

1.2.2.2.1.2. Estabelecimento Estável Agência ..................................................... 52

1.2.2.2.1.3. Situação dos Grupos de Sociedades .................................................. 55

1.2.2.2.2. Conclusões sobre o Conceito de EE ......................................................... 56

Capítulo 2. A economia digital ............................................................................................ 61

2.1. As principais características da economia digital........................................................ 64

2.1.1. A mobilidade .......................................................................................................... 66

2.1.2. Os efeitos de rede.................................................................................................... 67

iv
2.1.3. A importância da informação ................................................................................. 69

2.2. A economia digital e os desafios à tributação ............................................................. 70

2.2.1. Os elementos de conexão tradicionais .................................................................... 73

2.2.1.1. O Estabelecimento Estável ................................................................................ 83

Capítulo 3. A tributação do rendimento na economia digital .............................................. 91

3.1. A residência ................................................................................................................. 94

3.2. Fonte, em especial o Estabelecimento Estável ............................................................ 97

3.2.1. O Estabelecimento Estável Real ........................................................................... 101

3.2.2. O Estabelecimento Estável Agência ..................................................................... 104

3.2.2.1. Artigo 5.º n.º 5 ................................................................................................. 106

3.2.2.2. Artigo 5.º n.º 6 ................................................................................................. 109

3.2.3. Atividades preparatórias ou auxiliares.................................................................. 110

3.3. Um novo conceito de elemento de conexão baseado no conceito de presença económica


significativa ....................................................................................................................... 113

3.3.1. Fator Rendimento ................................................................................................. 116

3.3.2. Fatores Digitais ..................................................................................................... 120

3.3.3. Fatores baseados no utilizador .............................................................................. 123

3.3.4. Notas finais ........................................................................................................... 126

3.4. A posição da Comissão Europeia .............................................................................. 127

3.4.1. Introdução de um Estabelecimento Estável Digital .............................................. 132

3.4.2. Introdução de um Imposto sobre Serviços Digitais .............................................. 136

3.5. Reflexão crítica ......................................................................................................... 139

4. Conclusão .................................................................................................................. 155

5. Bibliografia ................................................................................................................ 161

v
Índice de Figuras

Figura 1. Proposta Regime Tributário (Fonte: Serviços da Comissão Europeia) ..................... 134
Figura 2. Imposto sobre serviços digitais (Fonte: Serviços da Comissão Europeia) ................ 138

vi
Glossário de siglas

BEPS Base Erosion and Profit Shifting


CAF Comité dos Assuntos Fiscais
CDT Convenção para evitar a Dupla Tributação
CE Comissão Europeia
CIRC Código do IRC
CIRS Código do IRS
CIVA Código do IVA
CRP Constituição da República Portuguesa
DFI Direito Fiscal Internacional
EE Estabelecimento estável
GST Goods and Services Tax
IP Internet Protocol
IRS Imposto sobre o Rendimento Pessoal
IRC Imposto sobre o Rendimento Coletivo
ISD Imposto sobre Serviços Digitais
ISP (FSI) Internet Service Provider (Fornecedor de Serviços de Internet)
IVA Imposto sobre o Valor Acrescentado
MCCCIS Matéria Coletável Comum Consolidada do Imposto sobre as
Sociedades
MC OCDE Modelo de Convenção Fiscal Sobre o Rendimento e o Património
MUD Mercado Único Digital
OCDE Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico
RGIT Regime Geral das Infrações Tributárias
TIC Tecnologias da Informação e Comunicação
UE União Europeia

vii
8
Introdução

Objeto

Ao longo das últimas décadas, a tributação internacional do rendimento foi-se


tornando cada vez mais complexa, nomeadamente pela diversidade dos sistemas fiscais,
tendo de lidar com diversas práticas fiscais nocivas, bem como diverso planeamento fiscal
abusivo.

A economia digital está a transformar o modo como interagimos, consumimos e


fazemos negócios, aumentando a pressão sobre o sistema fiscal internacional, dada a
profunda alteração dos modelos clássicos de negócios por novos modelos de organização
e gestão.

Os elementos de conexão imprescindíveis à (de)limitação do poder de tributação


dos Estados mostram-se desadequados à nova praxis económico-comercial.

A conexão relevante para fundamentar o poder tributário de um Estado é o local


de origem ou proveniência dos rendimentos. Relativamente à repartição entre Estados do
poder de tributar, especificamente, rendimentos empresariais, é amplamente reconhecido
o princípio do estabelecimento estável enquanto elemento de conexão relevante para
fundamentar o poder de tributar do Estado. Esta regra implica que só serão tributadas
atividades económicas quando existem laços significativos entre a empresa e esse Estado.

Consagra-se por este meio uma ideia de pertença económica.

A ideia de pertença económica corporizada pelo estabelecimento estável baseia-


se, em grande medida, numa presença física (material ou pessoal) no território desse
Estado.

A economia digital vem romper com este paradigma. A desmaterialização


advogada pela economia digital revela-se um traço característico. Esta desmaterialização
é marcada pela digitalização e pela natureza intangível do processo económico e
comercial e, bem assim, por uma reduzida necessidade de presença física.

9
No entanto, os atuais elementos de conexão, nomeadamente o estabelecimento
estável, não conseguem captar as atividades digitais, para as quais a presença física deixou
de ser um requisito.

Como se percebe, esta desadequação dos elementos de conexão tem um profundo


impacto na capacidade de os Estados exercerem o respetivo poder tributário, resultando
numa potencial perda de receitas para o Estado.

Importa compreender este fenómeno e a sua relevância, atual e futura, no seio da


fiscalidade nacional e internacional. Só assim se mostra possível entender os desafios
colocados pela economia digital no âmbito da tributação direta das entidades coletivas e,
bem assim, equacionar possíveis soluções.

Um dos principais desafios é, com efeito, estabelecer um vínculo tributável entre


uma empresa não-residente sem uma presença física e um Estado.

O estudo destas questões tem suscitado o interesse de diversas instituições


internacionais, nomeadamente a OCDE e a Comissão Europeia, bem como de diversos
autores nacionais e estrangeiros.

No desenvolvimento da presente dissertação, considerando a dimensão da


temática da economia digital, e fruto dos constrangimentos que um trabalho desta
natureza comporta, delimitaremos o nosso objeto ao estudo do elemento de conexão
estabelecimento estável e da sua adaptabilidade à economia digital.

De facto, um dos desafios associados ao advento da economia digital é a


dificuldade em determinar a jurisdição fiscal com poder de tributação.

Analisaremos de que forma é que o estabelecimento estável poderá continuar a


desempenhar a sua função de imputação de um rendimento a determinado Estado,
nomeadamente pelo alargamento do seu conceito através da consideração de uma
presença económica significativa.

10
Estrutura
Com o intuito de cumprir o objetivo a que nos propomos começaremos por
abordar a questão dos conflitos de tributação internacional, por forma a compreender a
necessidade de desenvolvimento de mecanismos que dirimam estes conflitos permitindo
a atribuição e repartição do poder tributário dos Estados.

Neste âmbito, analisaremos o processo conducente à construção dos princípios


que pautam o Direito Fiscal Internacional e dos elementos de conexão a que subjazem.

De seguida, num segundo capítulo, analisaremos o fenómeno da economia digital


e a importância das Tecnologias de Informação e Comunicação na sua construção e
progressivo desenvolvimento. Analisaremos as suas características de forma a trilhar o
caminho que nos levará a compreender de que forma é que esta nova realidade
marcadamente móvel, desmaterializada e intangível condiciona a atuação tributária dos
Estados.

Assim, identificaremos os principais desafios colocados pela economia digital à


fiscalidade e o seu impacto na operacionalidade dos elementos de conexão, oferecendo
especial cuidado ao tratamento do conceito do estabelecimento estável.

No terceiro capítulo, e já com uma significativa compreensão do problema que


significa a desadequação dos tradicionais elementos de conexão à economia digital,
identificaremos o trabalho já desenvolvido, essencialmente pela OCDE, e o reflexo do
mesmo no atual conceito de estabelecimento estável.

Ainda neste capítulo, abordaremos em específico uma das soluções proposta pela
OCDE para ultrapassar os desafios colocados pela economia digital: um novo elemento
de conexão baseado no conceito de presença económica significativa. Faremos também
menção à recente concretização deste novo elemento de conexão por parte da Comissão
Europeia através de uma proposta de Diretiva.

Terminaremos com uma reflexão critica à proposta da OCDE e à subsequente


concretização operada pela Comissão Europeia.

11
12
Capítulo 1. Os conflitos de tributação internacional

Nas últimas décadas a esta parte, foram celebradas diversas convenções


internacionais que visam ultrapassar quaisquer conflitos de tributação que possam
suscitar-se no panorama internacional. Estes conflitos resultam, em grande parte, da
adoção por parte de diversas ordens jurídicas de diferentes critérios de definição dos
pressupostos tributários.

Como resultado, um mesmo facto pode integrar a hipótese de incidência de duas


(ou mais) normas tributárias materiais distintas, dando origem à constituição de mais do
que uma obrigação de imposto1. Assim, quando um facto tributário2 apresenta uma
conexão, pelos diversos elementos que o caracterizam, com mais de uma ordem jurídica,
as diferentes formas de definição dos pressupostos tributários aplicados podem resultar
na (i) tributação dessa situação por mais de um Estado – dupla tributação internacional3
– ou (ii) que nenhum a tribute, quando, em condições normais, sem essa bilateralidade ou
multiplicidade de conexões, ela seria potencialmente tributada por um deles. No primeiro
caso, o conflito é positivo, dele resultando uma duplicação de impostos; no segundo, o
conflito é negativo, originando uma situação de dupla-não tributação (double non-
taxation4).

1
Uma situação de concurso de normas.
2
Importa referir que o facto tributário é um facto de estrutura complexa, constituído por diversos
aspetos: material, subjetivo, espacial e temporal.
3
O conceito de dupla tributação tem subjacente um caso de concurso de normas. Há concurso de normas
quando o mesmo facto se integra na previsão de duas normas jurídicas diferentes.
4
Distinto do conceito de dupla-não tributação aparece o conceito de evasão fiscal internacional, muitas
vezes associado à questão da dupla tributação. Como referido, o conceito de dupla-não tributação surge
associado aos casos de situações jurídicas que, não obstante a aparente integração na previsão de normas
de diferentes Estados, acabam por não ser alvo de tributação por nenhum deles. Por sua vez, o conceito
de evasão fiscal internacional – enquanto ação voluntária de escapar ao pagamento dos tributos
(impostos) estipulados por lei –, pode compreender duas aceções distintas: i) atos ilícitos pelos quais o
contribuinte viola os deveres decorrentes de uma relação jurídica tributária; ii) atos lícitos pelos quais um
particular, influenciando voluntariamente elementos de conexão, procura evitar a aplicação de certo
ordenamento jurídico. Nesta segunda aceção englobaria, além da tax evasion propriamente dita, a figura
da tax avoidance ou elisão fiscal internacional. Para uma análise mais detalhada do conceito de dupla-não
tributação e evasão fiscal internacional, vide (Xavier, 2011, pp. 44-49). De referir ainda que associados à
questão da evasão fiscal internacional aparecem os regimes de tributação privilegiada, claramente mais
favoráveis, comumente conhecidos por “paraísos fiscais”, criados por alguns Estados, através da respetiva
legislação, com o objetivo de atraírem pessoas e/ ou capitais aos seus territórios. Neste sentido, Lista dos
países, territórios e regiões com regimes de tributação privilegiada, conforme Portaria n.º 150/2004, de
13 de fevereiro, disponível em www.dre.pt.

13
De todo o modo, os conflitos positivos são mais frequentes e tendem a ter um
maior impacto na manutenção e desenvolvimento das relações económicas
internacionais. Neste sentido, por forma a evitar o risco de uma possível tributação por
mais de um Estado, de uma mesma situação, muitos agentes económicos poderão optar
por não desenvolver a sua atividade com mais de uma ordem jurídica. 5

Todavia, para haver dupla tributação (aqui já entendia como conflito positivo de
normas, dado o particular interesse para o objeto deste trabalho) é indispensável que se
verifique a identidade do facto e a pluralidade de normas tributárias6.

Caso não estejamos perante um “mesmo facto”, quando normas distintas recaiam sobre
factos diversos, então não há dupla tributação.

Neste sentido, e através de uma regra formulada pela doutrina que se tem ocupado
da construção do conceito de dupla tributação – a regra das quatro identidades –, para
que se possa falar de identidade do facto mostra-se necessário ocorrer a (i) identidade do
objeto, (ii) a identidade do sujeito7, (iii) a identidade do imposto8 e (iv) a identidade do
período tributário910.

5
Pense-se no quão gravoso seria para uma sociedade comercial ser tributada pelo Estado em cujo
território tem a sua sede, por todos os rendimentos obtidos, e ser tributada, por esses mesmos
rendimentos, nos diversos Estados onde não tenha sede, mas desenvolva a sua atividade.
6
No mesmo sentido, (Nabais, A Soberania Fiscal no actual quadro de internacionalização, integração e
globalização económicas, 2006, p. 500 e ss).
7
Sobre a identidade dos sujeitos, muito tem sido as divergências e posições díspares suscitadas sobre a
sua essencialidade ao conceito de dupla tributação. Há quem entenda que a identidade do sujeito não é
exigida, bastando-se assim a dupla tributação com as restantes três identidades. Não sendo oportuno
detalhar a problemática em causa, entendemos ser de exigir para a existência de dupla tributação a
identidade do sujeito, distinguindo assim a dupla tributação jurídica – em que a identidade se verifica –
da dupla tributação económica (ou dupla imposição económica ou, ainda, sobreposição de impostos) –
em que a identidade do objeto coexiste com a diversidade de sujeitos. Como referido anteriormente, a
dupla tributação económica não é ainda objeto de tratamento por parte do Direito Fiscal Internacional ou
do MC OCDE (não obstante algumas Convenções entretanto celebradas já contenham algumas normas
que procuram ultrapassar o problema) o que se lamenta. Ainda, para uma análise mais detalhada do
problema da identidade dos sujeitos, vide (Xavier, 2011, pp. 35-36).
8
Ou seja, quando o facto integra a hipótese de incidência de duas normas tributárias materiais distintas,
deve fazê-lo por referência se não a impostos idênticos, pelo menos análogos.
9
O requisito da identidade do período só fará sentido em sede dos impostos periódicos por natureza.
10
Como nos ensina ALBERTO XAVIER, “(…) a averiguação da identidade pressupõe, por vezes, um problema
de “adaptação” (Anpassung, Angleichung), entendido este conceito com o significado específico que
assume na Teoria Geral do Direito de Conflitos. E isto é assim, porque as normas em concurso provêm de
ordenamentos distintos, inspirados por princípios porventura diversos, utilizando técnicas e conceitos
diferentes também, de tal sorte, que a comparação não pode ater-se a critérios formais rígidos” (Xavier,
2011, p. 34). Em sentido semelhante, refere José Casalta Nabais que, “tanto no respeitante à identidade
do sujeito, como no respeitante à identidade do imposto, não nos devemos guiar por rígidos critérios
formais, considerando que as mesmas se verificam sempre que haja uma identidade substancial. Por
exemplo, no respeitante à identidade do imposto, o que é necessário é que dos aspectos materiais e bases

14
Além da identidade do facto11, o conceito de dupla tributação implica ainda a
pluralidade de normas.

Assim, as normas em concurso devem pertencer a ordenamentos jurídicos distintos,


dando origem a uma colisão de sistemas fiscais: quer esses ordenamentos correspondam
a Estados soberanos – dupla tributação internacional – ou correspondam a espaços fiscais
autónomas dentro do mesmo Estado, como é, por exemplo, o caso dos Estados federados
– dupla tributação interterritorial12 (inter-estadual, inter-cantonal, inter-regional, entre
outras).

Como nos ensina ALBERTO XAVIER, “o instituto da dupla tributação foi haurir as suas
raízes na problemática dos conflitos de leis no espaço, no princípio da territorialidade,
isto é, nas questões referentes aos concursos de normas interterritoriais, tendo sido
sempre alheia à matéria de delimitação dos diversos poderes tributários concorrentes
dentro de um mesmo território, ou seja, concursos intraterritoriais”.

Neste sentido, o conceito de dupla tributação reservar-se-á aos concursos de normas de


natureza interterritorial.

Para mais, é necessário que ambas as normas em causa se apliquem efetivamente


no caso concreto, dando assim origem ao surgimento de duas pretensões tributárias
distintas – dupla tributação efetiva ou in praxi. Caso não se verifique a aplicação concreta
de ambas, ou haja apenas a aplicação de uma delas, estamos perante uma dupla tributação
virtual ou in thesi. Nestes termos, na dupla tributação efetiva ocorre um concurso real de
normas, enquanto na tributação virtual o concurso é meramente aparente13.

A dupla tributação traduz-se, face ao exposto, num concurso real de normas, cuja
aplicação autónoma e independente resulta na produção conjunta das consequências

de cálculo ou de outras características resulta uma analogia substancial” (Nabais, A Soberania Fiscal no
actual quadro de internacionalização, integração e globalização económicas, 2006, p. 501).
11
Refira-se, entre a doutrina portuguesa, a rejeição por MIGUEL PIRES da regra das quatro identidades. Para
uma análise mais detalhada desta posição, vide (Pires M. , 1984, pp. 70-76).
12
Não nos ocuparemos, neste trabalho, do tema da dupla tributação interterritorial dadas as suas
especificidades técnicas e a irrelevância para as conclusões que pretendemos apresentar a final. Todavia,
sobre o tema vide (Xavier, 2011, pp. 37-38).
13
Por outro lado, importará não se confundir o fenómeno de aplicação de duas normas distintas a um
mesmo facto tributário, de que temos vindo a tratar, daquele outro, que ocorre no âmbito do direito
interno de um Estado, relacionado com a pluralidade de aplicações da mesma norma, ou seja, há uma só
pretensão duplamente exigida – um fenómeno de duplicação. Para melhor ilustração do que aqui se diz,
veja-se, no caso português, o n.º 1 do artigo 205.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

15
jurídicas de ambas – mais exatamente, num concurso real cumulativo14. Ou seja, no caso
da dupla tributação, as normas em concurso não se contradizem, operando uma exclusão
recíproca, antes pelo contrário.

Ora, é a atenuação ou eliminação deste cúmulo real de normas ou pretensões que constitui
o objeto das medidas tendentes a evitar a dupla tributação.

A incapacidade de os Estados, por si só, encontrarem respostas eficazes aos


problemas suscitados pelo aparecimento de situações plurilocalizadas com incidência
fiscal, originando um fenómeno de cumulação de normas e pretensões, levou, como
reação, à celebração de compromissos internacionais.

Estes compromissos procuraram, desde logo, estabelecer os elementos de conexão


relevantes para definir o poder de tributar de cada Estado face à situação e ao facto
tributário concreto, resultando num exercício de derrogação entre os Estados do poder de
tributar.

1.1. Os acordos de dupla tributação

O Direito Fiscal Internacional, é um complexo de normas tributárias, de fonte


interna ou de fonte internacional, cujo ratio é regular as relações entre Estados e entre
Estados e pessoas, no contexto de situações internacionais, ou seja, situações conexas
com mais do que uma ordem jurídica.

Em tais circunstâncias, vários ordenamentos tributários poder-se-ão considerar – em


função dos elementos de conexão adotados pelos diferentes Estados com os quais a
situação se relaciona – com legitimidade para tributar a mesma situação, ocorrendo, por
aplicação das respetivas normas tributárias internas, uma dupla (ou mesmo múltipla)
tributação15. Neste sentido, o principal objetivo do DFI é, justamente, prevenir, atenuar
ou eliminar a dupla tributação internacional.

14
Entendido como cúmulo de normas ou cúmulo de pretensões.
15
Como nos ensina PAULA ROSADO PEREIRA, “Perante a multiplicidade das situações conexas com mais do
que um ordenamento jurídico-tributário, e tendo em conta o prejuízo para a fluidez das transações
internacionais que decorre do fenómeno da dupla tributação internacional, é essencial que exista uma
actuação concertada a nível internacional, no sentido de criar um ambiente fiscal que não desencoraje
nem distorça os investimentos e o comércio internacionais” (Pereira P. R., Princípios do Direito Fiscal
Internacional, Do Paradigma Clássico ao Direito Fiscal Europeu, 2010, p. 22). A este propósito, refere ainda
EDUARDO PAZ FERREIRA que “o movimento de liberalização da circulação de capitais, como mais

16
Ora, o crescimento da intensidade das relações económicas internacionais tem,
naturalmente, como consequência, um aumento da ocorrência de situações cujo facto
tributário, gerador de rendimento, está ligado a mais do que um ordenamento jurídico-
tributário16.

Neste contexto, a dupla tributação internacional começou a ser encarada como um


problema que carecia de solução, motivando os Estados, em finais do século XIX, a
iniciarem a celebração de tratados internacionais com o propósito de eliminá-la17.

Naturalmente, a celebração das primeiras convenções de dupla tributação internacional


(doravante designados por “CDT”) relativas à tributação do rendimento foram celebradas
entre Estados que já tinham, previamente entre si, vínculos de natureza política18.

A importância que a dupla tributação internacional foi paulatinamente assumindo


e o reconhecimento da necessidade de aperfeiçoar as medidas destinadas a ultrapassá-la
motivou a procura pelos Estados, no contexto das organizações internacionais
competentes, de soluções mais adequadas a reforçar o consenso internacional a este nível.

genericamente a globalização, nas suas diferentes modalidades, veio trazer para a primeira linha das
atenções a possibilidade de uma regulação fiscal a nível mundial, ou, pelo menos, a necessidade de
desenvolvimento de formas intensas de cooperação entre diferentes administrações fiscais” (Ferreira,
Ensinar Finanças Públicas numa Faculdade de Direito, 2005, p. 130). A crescente necessidade de
harmonização fiscal entre Estados e, bem assim, de cooperação entre diferentes administrações
tributárias potenciou o surgimento das CDT, como veremos.
16
Sobre a evolução histórica do comércio internacional, vide (Pereira P. R., Princípios do Direito Fiscal
Internacional, Do Paradigma Clássico ao Direito Fiscal Europeu, 2010, pp. 27-36) e (Ferreira & Atanásio,
Textos de Direito do Comércio Internacional e do Desenvolvimento Económico, 2004). Segundos estes
últimos autores, “o século XXI será, ainda mais do que o final do século XX, marcado pela globalização. A
interdependência entre os diferentes países e continentes é cada vez maior e, à medida que o esforço e
o tempo se contraem progressivamente, as fronteiras vão desaparecendo com o aumento das trocas
comerciais, o desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação, a expansão do
investimento estrangeiro e as constantes inovações (…)” (Ferreira & Atanásio, Textos de Direito do
Comércio Internacional e do Desenvolvimento Económico, 2004, p. 33). Também sobre a evolução e
importância do fenómeno comercial, vide (Araújo, Adam Smith - O conceito Mecanicista de Liberdade,
2001, pp. 1141-1228).
17
O que não significa que esta não fosse já uma matéria tratada pelos Estados antes daquele período.
Sempre se diga que antes do século XIX já haviam sido celebradas algumas convenções em matéria
tributária. Tinham por objeto, fundamentalmente, questões específicas de assistência fiscal entre os
Estados (Pires M. , 1984, p. 182).
18
“É o caso da convenção entre a Prússia e a Saxónia relativa a impostos directos, de 16 de Abril de 1869,
das convenções entre a Áustria e a Hungria relativas à tributação de empresas comerciais e industriais,
de 18 de Dezembro de 1869 e 7 de Janeiro de 1870, e da convenção entre a Áustria e a Prússia relativa à
eliminação da dupla tributação (abordada pela primeira vez de forma global), de 21 de junho de 1899”
(Pereira P. R., Princípios do Direito Fiscal Internacional, Do Paradigma Clássico ao Direito Fiscal Europeu,
2010, p. 28).

17
Foi imbuído neste espírito que, no seio da Sociedade das Nações, surgiram os
primeiros Modelos de Convenção fiscal. Quer estes Modelos, quer os estudos que os
antecederam e precederam, têm ainda reflexos nas regras de distribuição do poder de
tributar tal como se encontram atualmente previstas no MC OCDE.

Após a extinção da Sociedade das Nações, as questões relacionadas com a tributação


internacional foram retomadas ao nível da Organização das Nações Unidades, bem como
da Organização Europeia de Cooperação Económica e, depois, da Organização de
Cooperação e Desenvolvimento Económico (“OCDE”).

Foi já no seio da OCDE, pouco depois da sua criação19, que foi publicada, em
1963, a primeira versão do MC OCDE e dos respetivos Comentários. Nos anos seguintes
o MC OCDE e os seus Comentários foram sendo sucessivamente revistos e adaptados à
realidade internacional em constante mutação20.

O prestígio e a influência que têm granjeado as Convenções Modelo, principalmente da


OCDE, têm contribuído para que a celebração de CDT continue a ser encarada pelos
Estados como uma forma especialmente eficaz de regular as situações tributárias
internacionais, nomeadamente, prevenindo, atenuando ou eliminado o problema da dupla
tributação internacional21.

As CDT procedem a uma delimitação dos poderes de tributar dos Estados


contratantes, no sentido de prevenir ou eliminar a dupla tributação internacional, fazendo-
o através de cedências mútuas de soberania fiscal acordadas pelos Estados contratantes,
no momento da celebração da CDT. As CDT exprimem um consenso internacional
relativamente a um conjunto de princípios do DFI22 – estruturais e operativos – nos quais

19
A Convenção que criou a OCDE, em substituição da OECE, foi assinada em 14 de dezembro de 1960.
20
Esta revisão conduziu a diversas alterações ao MC OCDE, registando-se as mais recentes em 2000, 2003,
2005, 2008, 2015 e 2017. Estas revisões sempre se pautaram pela preocupação em aperfeiçoar
tecnicamente as soluções consagradas em termos de repartição do poder tributário entre os Estados e de
preencher lacunas sentidas a este nível
21
O que tem gradualmente facilitado o processo de negociação de convenções bilaterais entre Estados
os Estados-membros da OCDE e não só, contribuindo para o contínuo aumento do número de CDT
concluídas.
22
A este respeito, Rui Duarte Morais refere-se a um elevado grau de consenso relativamente às “soluções
consagradas nas principais propostas elaboradas a nível internacional para delimitar os poderes
tributários dos Estados em ordem a minorar o surgimento das situações de dupla tributação” (Morais,
Imputação de Lucros de Sociedades Não Residentes Sujeitas a um Regime Fiscal Privilegiado, 2005, p.
132).

18
se orientam e fundamentam (nomeadamente o princípio da fonte, o princípio da residência
e o estabelecimento estável23.

Assim, cada CDT represente um acordo bilateral entre Estados contratantes quanto à
distribuição do poder de tributar e o método de eliminação da dupla tributação que
considerem mais conveniente face às circunstâncias e interesses em jogo.

Relativamente à distribuição do poder de tributar, as CDT, na prática, funcionam


mediante o estabelecimento de limites dentro dos quais os Estados contratantes podem
aplicar o seu ordenamento jurídico-tributário, recorrendo aos aludidos princípios de DFI.
Assim, as CDT definem a legitimidade para tributar uma mesma situação internacional,
recorrendo, sobretudo, aos princípios da fonte, residência e estabelecimento estável.

Nestes termos, podemos identificar na estrutura das CDT dois momentos que se
encadeiam: um primeiro momento de distribuição do poder de tributar entre os Estados-
contratantes, de forma a prevenir a ocorrência de dupla tributação internacional24; e um
segundo momento em que se prevê os métodos para eliminar a dupla tributação25, caso a
aplicação das regras de repartição do poder tributário previstas não tenha permitido evitar
a dupla tributação26.

Faz parte da soberania tributária a possibilidade dos Estados negociarem e


celebrarem tratados em matéria fiscal com outros sujeitos de Direito Internacional27.

23
Os referidos princípios já foram objeto de análise neste trabalho, tendo a mesma se mostrado oportuna
aquando da exposição feita sobre o Direito fiscal internacional supra.
24
Reconhecida a competência para tributar, o Estado considerado competente exerce-a de acordo com
as suas leis tributárias, exceto quando incompatíveis com o disposto numa CDT aplicável à situação.
25
Sobre os métodos usados para eliminar a ou reduzir a dupla tributação internacional, (Teixeira G. ,
Manual de Direito Fiscal, 2012, pp. 290-296).
26
Fundamentalmente, os casos de reconhecimento de competência cumulativa ao Estado da fonte e ao
Estado de residência. Como menciona Paula Rosado Pereira, “A coordenação das soberanias fiscais
permite que as CDT consagrem soluções técnicas e mecanismos de resolução do problema da dupla
tributação mais desenvolvidos, começando pela repartição do poder tributário entre os Estados da forma
mais adequada a cada caso concreto e, quando necessário, culminado o processo com a aplicação dos
métodos de eliminação da dupla tributação” (Pereira P. R., Princípios do Direito Fiscal Internacional, Do
Paradigma Clássico ao Direito Fiscal Europeu, 2010, p. 38). Também a este propósito, (Vasques, 2011, p.
119 e ss).
27
Aspeto de grande relevância no contexto do DFI, dado que uma das suas fontes, talvez a mais
importante, é justamente, a CDT. Sobre a limitação da soberania dos Estados pelo Direito Internacional
Público vide, (Morais, Imputação de Lucros de Sociedades Não Residentes Sujeitas a um Regime Fiscal
Privilegiado, 2005, p. 45). Também sobre esta questão, vide (Cunha, 2006, pp. 174-176). O autor critica a
conceção de soberania como um poder absoluto e ilimitado. Ainda, sobre a questão dos limites
heterónomos ao âmbito da incidência das leis fiscais do Estado, vide (Pereira & Quadros, 2007, p. 83).

19
O processo de negociação de uma CDT entre Estados permitirá, desde logo,
limitar o exercício arbitrário da soberania fiscal e a utilização de conexões abusivas por
parte de um deles28. Por outro lado, sempre se diga que a auto-vinculação do Estado
mediante a celebração de CDT com outros Estados é ainda uma manifestação da sua
soberania tributária não obstante a existência de limitações à mesma, em parte
consequência de cedências mútuas entre Estados.

1.2. Direito fiscal internacional

O Direito Fiscal Internacional (doravante, “DFI”) versa sobre as relações fiscais


entre Estados e as colisões entre normas de Direito interno que podem criar uma dupla
tributação jurídica relativamente ao mesmo facto tributário, dando origem à constituição
de mais do que uma obrigação de imposto, quando esse facto apresente uma conexão com
mais do que uma ordem jurídica (situações internacionais)29.

Sendo o objeto do DFI constituído pelas situações de vida conexas com mais do que um
ordenamento tributário soberano30, o seu conteúdo é constituído por uma multiplicidade
de normas, podendo as mesmas ser classificadas em função da fonte (interna ou
internacional), natureza (direta ou indireta) e função (substancial ou instrumental).

No que diz respeito à fonte, identificam-se normas de produção interna e normas


de produção internacional, destacando as constantes de tratados contra a dupla tributação.

28
As próprias CDT constituem limites autónomos ao âmbito de incidência das leis tributárias do Estado,
já que procedem a uma delimitação negativa da incidência criada por tais leis (Pereira P. R., Princípios do
Direito Fiscal Internacional, Do Paradigma Clássico ao Direito Fiscal Europeu, 2010).
29
Sobre a natureza do Direito Tributário Internacional e a problemática associada, vide (Xavier, 2011, pp.
65-94).
30
A este propósito, alguma doutrina faz a distinção entre Direito Tributário Internacional e Direito
Internacional Tributário, baseando-se a mesma na relação entre o Direito Internacional e o Direito
Interno. Nos termos desta teoria dualista, o Direito Tributário Internacional seria constituído por normas
internas e destinado a disciplinar a competência tributária internacional dos Estados, ao passo que o
Direito Internacional Tributário seria constituído por normas de origem internacional e destinar-se-ia a
disciplinar as relações entre Estados (enquanto sujeitos de Direito Internacional Público) no que toca a
matéria tributária. Atenta a definição de Direito Fiscal Internacional apresentada neste trabalho,
rejeitamos a aludida teoria dualista. Sobre esta questão, Alberto Xavier refere ser “evidente o preconceito
dualista que está na origem desta distinção. Com efeito, à luz desta visão, as normas de origem
internacional nunca regulariam como tal as questões tributárias internacionais, independentemente,
portanto, da sua “transformação” em direito interno, limitando a sua eficácia a disciplinar relações inter-
estatais. Para quem não aceitar a perspectiva dualista de encarar de encarar as relações entre direito
internacional e direito interno, também não poderá manter a distinção acima referida, pelo menos nos
termos em que é formulada” (Xavier, 2011, p. 91). No mesmo sentido, (Pereira P. R., Princípios do Direito
Fiscal Internacional, Do Paradigma Clássico ao Direito Fiscal Europeu, 2010, p. 21).

20
Relativamente à natureza, o DFI contém normas indiretas ou de conflitos (também
apelidadas de normas de conexão), bem como normas de regulação direta ou material.

Sobre as normas de conflitos, estas definem o âmbito de incidência das leis


tributárias internas dos Estados, delimitando-o unilateralmente ou bilateralmente, mas
sem que determinem, por si só, o modo como a situação em causa será tributada31.

Pelo contrário, as normas materiais32 pressupõem resolvido o problema do seu


âmbito de incidência e definem diretamente a disciplina normativa da situação
internacional em causa33. Ou seja, após resolvido o problema da atribuição da
competência a um ou a mais Estado, determina o modo como a tributação se deve operar.

31
Numa articulação entre esta classificação de normas e a relativa à fonte, podemos distinguir entre:
normas de conflito de fonte interna ou normas de delimitação (numa denominação avançada por ALBERTO
XAVIER) – normas que se cingem a definir unilateralmente o âmbito espacial de incidência do ordenamento
jurídico tributário, sem no entanto tomar posição quanto a um qualquer concurso eventualmente
decorrente da aplicação cumulativa deste ordenamento com um outro que também se ache competente
para tributar; e normas de conflito de fonte internacional ou normas de colisão (numa denominação
também avançada por ALBERTO XAVIER) – normas constantes de tratados contra a dupla tributação que,
não se cingindo a definir os casos em que o ordenamento interno é aplicável, decidem, em tese, qual dos
dois ordenamentos jurídicos potencialmente interessados na tributação se aplica à situação concreta. Ao
contrário das primeiras, destas últimas resulta a definição do âmbito espacial de um ordenamento frente
a outro ordenamento distinto (em concurso), procedendo ao reconhecimento das respetivas
competências em termos exclusivos ou cumulativos. Nestes termos, as normas de colisão podem revestir
duas modalidades, consoante reconheçam a competência exclusiva de um dos ordenamentos (normas de
repartição ou de reconhecimento de competência exclusiva) ou, pelo contrário, reconheçam a
competência cumulativa (normas de cumulação ou de reconhecimento de competência cumulativa). As
normas de repartição cingem-se apenas ao problema dos limites das leis, não tendo por objeto um caso
de concurso de leis (poder-se-ia referir, em tese, que se está, através destas normas, a prevenir um
concurso de leis). Por seu turno, as normas de cumulação reconhecem a competência tributária
cumulativa entre dois Estados. São normas convencionais que estabelecem que determinados tipos de
rendimentos podem ser tributados quer pelo Estado da residência quer pelo Estado da fonte, assim
originando um concurso real de pretensões (sem avançar, contudo, uma possível solução que ultrapasse
este concurso). Sobre este tema, permitindo um estudo mais aprofundado, vide (Xavier, 2011, pp. 53-62).
32
Como bem expõe Alberto Xavier, as normas de conflito (na modalidade de delimitação e colisão) dizem
respeito à definição da competência, ao passo que as normas materiais são normas de limitação de
competência tributária dos Estados (Xavier, 2011, p. 63).
33
Sobre as normas materiais, importa referir que estas já não se debruçam sobre o reconhecimento da
lei aplicável (de forma exclusiva ou cumulativa). Sendo certo que pressupõem aquele momento prévio,
estas normas procuram resolver o concurso real de pretensões que as regras delimitação ou repartição
de competências entre Estados originou. São normas de limitação de competência. Nestes termos, já não
revestem a natureza de normas de conflitos, mas sim de normas materiais de solução de conflitos. As
normas matérias podem revestir duas modalidades: normas de regulamentação direta (internas) e
normas de limitação de competência ou atenuação (internacionais). As normas de regulamentação direta
ditam a disciplina substancial das situações tributárias com elementos de conexão com mais de um
Estado: é o caso das normas de fonte interna que, por exemplo, disciplinam o modo como são tributados
os não residentes ou as sucursais de empresas estrangeiras. As normas de limitação de competência ou
atenuação (internacionais), são disposições convencionais que determinam de modo direto como a
tributação deve operar: no que concerne ao Estado da residência, através dos “métodos” clássicos da
isenção ou da imputação; e no que concerne ao Estado da fonte, por via do estabelecimento de limites
máximos às taxas aplicáveis. Sobre este tema, permitindo um estudo mais aprofundado, vide (Xavier,

21
Neste âmbito, importa referir que também a norma de conflitos do DFI, seja ela
de fonte interna ou internacional, apresenta uma estrutura de que fazem parte uma
previsão e uma estatuição. A previsão da norma de conflitos do DFI abrange dois
elementos: o conceito-quadro e o elemento de conexão.

Na esteira de ALBERTO XAVIER, o conceito-quadro exprime o próprio facto


(tributário) que é objeto da definição do âmbito de incidência espacial da lei interna,
operada pela norma de conflitos.

Por sua vez, o elemento de conexão é o instrumento técnico através do qual aquela
definição atua e consiste na ligação do facto (tributário) descrito no conceito-quadro à
ordem jurídica que se irá aplicar à questão em causa34. Após este momento, seguir-se-á,
logicamente, a estatuição ou consequência da norma de DFI.

Como é apanágio da norma de conflitos, o comando previsto na estatuição traduz-


se na designação/ delimitação de uma dada lei (ou ordem jurídica) como sendo a aplicável
à situação em causa35. Como anteriormente referido, as normas materiais têm um
conteúdo mais amplo, pois, após a referida delimitação pelas normas de conflitos,
definem ainda providências de regulamentação direta da situação tributária
internacional36.

O DFI abrange, ao lado de normas substanciais (conflitos ou materiais) normas


instrumentais, cujo objeto já não é delimitação da competência legislativa entre Estados,
como acontece nas primeiras, mas sim a delimitação da eficácia das leis no espaço,
mediante a prática de atos pelos órgãos nacionais de aplicação do direito. Ou seja, a
definição da extensão do poder tributário do Estado e da sua capacidade de fazer aplicar
os respetivos comandos normativos37.

2011, pp. 53-64), (Pereira P. R., Dupla tributação internacional e convenções, 2007, pp. 49-51) e (Guerra,
2007, pp. 62-67).
34
Sobre a diferença entre objeto da conexão e elemento de conexão, vide (Pires M. , 1984, p. 472).
35
Cf. (Xavier, 2011, pp. 55-56).
36
Como refere ALBERTO XAVIER, “As normas de Direito Tributário Internacional podem, assim, ter um duplo
objecto: o problema do âmbito espacial de incidência das leis – limites das leis – que é objecto de normas
de conflitos em sentido técnico; e o problema da solução dos casos de aplicação cumulativa das leis, em
virtude da sobreposição dos respetivos âmbitos de incidência – o concurso de leis – que é objecto de
normas materiais” (Xavier, 2011, p. 57).
37
Conforme nos explica ALBERTO XAVIER, “A solução prevalecente na actual fase de convívio entre os
Estados é a da inadmissibilidade da produção automática dos efeitos jurídicos típicos de tais actos de
direito público, sendo, por isso, necessárias medidas de assistência administrativa ou judiciária (Amtshilfe,
Rechtshilde), pelas quais determinado Estado pratica, a solicitação do outro, os actos administrativos (por

22
Do DFI fazem parte um conjunto de princípios fundamentais que definem as
grandes linhas orientadoras desta ordem jurídico-tributária, fornecendo uma justificação
para as normas concretas, constituindo a sua base e explicando as razões da sua existência
e teor. Princípios perfeitamente reconhecidos por parte dos diversos intervenientes na
ordem jurídica em apreço, sejam eles Estados, Instituições Internacionais, agentes
económicos ou os próprios cidadãos.

Neste sentido, as normas relativas ao tratamento das situações tributárias


internacionais, tanto na legislação de cada Estado como das CDT por eles celebradas
(estas, em grande medida baseadas, no Modelo de Convenção Fiscal sobre o Rendimento
e o Património da OCDE, doravante designada por “MC OCDE”) deverão ser observadas
de forma sistematizada, graças aos princípios do DFI que lhes subjazem.

A análise das normas supra referidas permite identificar, dada a sua presença
constante, diversos princípios característicos do DFI, os quais podemos, num primeiro
exercício de classificação, dividir entre princípios estruturais e princípios operantes.

1.2.1. Princípios estruturais

Os princípios estruturais correspondem às grandes orientações que definem a


estrutura, as principais características e os valores fundamentais da ordem jurídico-
tributária internacional. Assentam em ideias de justiça, equidade e eficiência.

São princípios base sobre os quais se constrói esta ordem jurídica e,


consequentemente, as respetivas normas e procuram nortear a coordenação entre Estados,
relativamente ao poder de tributar situações internacionais e à prevenção ou eliminação
da dupla tributação internacional.

Como princípios estruturais do Direito Fiscal Internacional, tem sido identificado o


princípio da soberania, o princípio da equidade e o princípio da neutralidade.

exemplo, notificações, pedidos de informações) ou judiciais requeridos (por exemplo, execução forçada
de créditos), mas sempre em obediência aos procedimentos previstos pelas leis internas dos Estados
solicitados” (Xavier, 2011, p. 59). Ou seja, é necessária para o efeito a cooperação entre Estados e
respetivas administrações fiscais e autoridades judiciais.

23
1.2.1.1. Princípio da soberania

A soberania tributária permite ao Estado criar e implementar a sua própria política


fiscal, exercendo o seu poder tributário relativamente a situações tributárias internas e a
situações tributárias internacionais com elementos de conexão relevantes com esse
Estado.

Neste sentido, faz parte da soberania tributária a possibilidade de os Estados


celebrarem entre si tratados em matéria fiscal. Este aspeto assume particular relevância,
dado que a CDT é uma das fontes mais importantes do DFI.

No âmbito da soberania fiscal, e com relevância no âmbito do DFI, cumpre


autonomizar dois aspetos distintos, embora complementares: o âmbito de incidência e o
âmbito de eficácia, em termos espaciais, das leis tributárias de um Estado. Em concreto,
e com interesse para o que nos propomos tratar, o âmbito de incidência das leis tributárias
prende-se com a delimitação do poder legislativo do Estado, ou seja, com a possibilidade
de a legislação fiscal de um Estado abarcar na sua previsão pessoas, bens e factos
localizados no território de outro Estado38.

Ora, o DFI promove, na sua missão de evitar ou eliminar a dupla tributação e a


evasão fiscal internacionais39, procurando dirimir quaisquer conflitos que surjam entre
dois ou mais Estados neste âmbito, eventuais limitações à soberania fiscal dos Estados.

No caso das CDT, esta limitação é por demais evidente, existindo uma limitação
do Estado na definição dos elementos de conexão através de um processo negocial
(bilateral). O resultado é repartição do poder de tributar entre estados, tendo, como
consequência, a limitação do exercício arbitrário da soberania fiscal e a utilização de
conexões abusivas por parte de um dos Estados (com o intuito de arrecadar, por hipótese,
maior receita)40.

38
Estamos no âmbito da margem de liberdade dos Estados para, em primeiro lugar, “definirem quais os
elementos de conexão que considerem relevantes para fundamentar o seu poder de tributar situações
fiscais internacionais; em segundo lugar, para definirem os contornos de cada um dos elementos de
conexão consagrados na sua legislação interna; e, em terceiro (mas em íntima conexão com os dois pontos
anteriores), para determinarem a extensão do seu poder de tributar”, cf. (Pereira P. R., Em Torno dos
Princípios do Direito Fiscal Internacional, 2015, pp. 206-207).
39
Para aprofundamento do tema da evasão fiscal no plano internacional, vide (Menezes Leitão L. T., 1993,
pp. 299-330), (Menezes Leitão L. M., 1999) e também (Saldanha Sanches J. L., Os Limites do Planeamento
Fiscal - Substância e Forma no Direito Fiscal Português, Comunitário e Internacional, 2006, pp. 259-446).
40
Sobre a problemática da soberania fiscal face à internacionalização e à integração europeia, vide
(Nabais, Por um Estado Fiscal Suportável - Estudos de Direito Fiscal, 2005, pp. 184-202).

24
Por outro lado, as próprias CDT “constituem limites autónomos ao âmbito de
incidência das leis tributárias do Estado, na medida em que procedem a uma delimitação
negativa da incidência criada por tais leis”41.

1.2.1.2. Princípio da equidade

A equidade está associada à problemática da justiça material, não existindo uma


definição única de equidade42. Do princípio da equidade43 decorrem as orientações gerais
que deverão guiar a formulação das normas destinadas a concretizar a repartição do poder
de tributar entre os Estados e a eliminar a dupla tributação internacional, incorporando
um conjunto de valores com base nos quais deve ser feita uma apreciação critica por
forma a se aferir da justiça e adequação de uma norma no âmbito do DFI44.

Em virtude das diversas dimensões em que este princípio se pode movimentar,


diversos autores têm vindo a autonomizar, dentro dele, duas perspetivas distintas: a
equidade entre sujeitos passivos45 (inter-individual equity ou tax-payer equity) e a
equidade entre Estados (inter-nations equity).

41
Cf. (Pereira P. R., Em Torno dos Princípios do Direito Fiscal Internacional, 2015, p. 207).
Curiosamente, e como já aflorado, podemos identificar no DFI e nas CDT uma dupla vertente: por um lado
consubstanciam um exemplo de limitação da soberania fiscal do Estado, do seu poder tributário; por
outro, enquanto processo de auto-vinculação do Estado, consciente e voluntário, as CDT são a expressão
última do exercício da soberania fiscal por parte desse mesmo Estado (contratante).
42
Sobre a problemática de decidir com recurso à equidade, (Cordeiro, 1990). Também sobre o tema,
(Ribeiro, 1997).
43
Associado a este princípio, está a ideia de que a distribuição da carga fiscal entre os indivíduos deve ser
equitativa e não arbitrária, devendo cada um suportar uma parcela considerada justa dos encargos em
função da sua capacidade contributiva.
44
Sobre o princípio da equidade, vide (Vogel, Worldwide vs. source taxation of income - A review and re-
evaluation of arguments (Part III), 1988, p. 393 e ss).
45
Sobre o conceito de sujeito passivo: A incidência subjetiva ou pessoal pode ser encontrada, no caso
português, em vários códigos fiscais, mas o conceito de sujeito passivo encontra-se consagrado na Lei
Geral Tributária, tendo a mesma surgido com o objetivo de clarificar e sistematizar os direitos e garantias
dos contribuintes e os poderes da Administração fiscal. Assim, nos termos do artigo 18.º n.º 3 da LGT, “O
sujeito passivo é a pessoa singular ou colectiva, o património ou a organização de facto ou de direito que,
nos termos da lei, está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, seja como contribuinte directo,
substituto ou responsável”. O mesmo diploma considera sujeito passivo quer o contribuinte direto
(entidade relativamente à qual se verifica o facto gerador do imposto), quer o substituto ou responsável,
adiantando, contudo, a alínea a) do n.º 4 do mesmo artigo que não é sujeito passivo quem suporta o
encargo do imposto “por repercussão legal, sem prejuízo do direito de reclamação, recurso, impugnação
ou de pedido de pronúncia arbitral nos termos das leis tributárias”. Ainda sobre o conceito, vide (Vasques,
2011), (Nabais, Direito Fiscal, 2017), (de Freitas, 2014) e (Campos & Soutelinho, 2012).

25
A equidade entre sujeitos passivos está relacionada com as posições relativas dos
sujeitos passivos e com a justiça e adequação do tratamento fiscal que lhes é imposto.

Nestes termos, importa compreender se as soluções propostas no âmbito do DFI,


sobretudo para a prevenção e eliminação da dupla tributação internacional, são ou não
equitativas, ou seja, se afastam problemas de concretos de falta de neutralidade e se são
adequadas do ponto de vista dos interesses dos sujeitos passivos envolvidos. Não se trata,
portanto, de uma mera comparação entre a posição de sujeitos passivos em diferentes
Estados.

Por outro lado, a equidade entre Estados está relacionada com a definição do
Estado que envolvido numa situação tributária internacional deverá ter o direito de
tributar e em que medida. A equidade entre Estados é fundamental no contexto de
repartição do poder de tributar entre Estados, da definição da extensão desse poder e das
correspondentes receitas fiscais.

A equidade, enquanto juízo de adequação da norma ao caso concreto, e como


decorrência das orientações e valores conexos com esta figura, deverá permitir o alcance
de uma repartição justa do poder tributário, da base tributável e da receita fiscal entre
diversos Estados, não devendo limitar as respetivas oportunidades de desenvolvimento
económico46.

Relacionado com esta vertente do princípio da equidade está a discussão relativa


à tributação pelo Estado da fonte versus a tributação pelo Estado de residência47, e à
atribuição de um direito exclusivo ou cumulativo de tributar a cada um desses Estados.

Não obstante tratar-se de uma problemática complexa, sempre se diga existir uma
clara prevalência da tributação no Estado da residência sobre a tributação no Estado da
fonte.

Pelo contrário, a equidade entre Estados em conjugação com a ideia de “ligação


económica”48 com um determinado Estado, da atividade e do correspondente rendimento,
tem sido utilizada em defesa do reforço da tributação no Estado fonte do rendimento

46
“O princípio da equidade também logra aplicação no âmbito internacional. Este princípio indica uma
distribuição justa do rendimento entre países importadores e exportadores (inter-country equity)”
(Teixeira G. , Manual de Direito Fiscal, 2012).
47
Que não desenvolveremos neste trabalho.
48
Ideia que desenvolveremos mais adiante para justificar a reformulação dos atuais elementos de
conexão.

26
gerado por transações internacionais49, o que, segundo tem sido defendido, permitira
alcançar uma distribuição mais equitativa dos poderes tributários entre Estados 50.

1.2.1.3. Princípio da neutralidade

Por último, o DFI deve ter em consideração o impacto económico-financeiro do


tratamento fiscal das situações tributárias internacionais, ou seja, não deve descurar a
problemática da neutralidade. A neutralidade51 está assim relacionada com a ideia de uma
eficiente alocação de recursos, enquanto forma de maximizar a eficiência económica.

Não merece discussão que, e num contexto de economia de mercado, os agentes


económicos procedem à colocação dos seus recursos ponderando uma multiplicidade de
aspetos, que variam em função do tipo de investimento pretendido, entre os quais o nível
de tributação a que os correspondentes (e potenciais) rendimentos ficarão sujeitos.

Este aspeto terá particular importância uma vez que o agente económico, na
análise que efetuar, comparará o rendimento líquido de impostos que poderá obter nos
vários Estados candidatos à localização do investimento.

É neste contexto que a tributação é percecionada como um fator de distorção ao


fluxo mais eficiente de capitais, sendo desejável que esta tenha, para aquele efeito (e na
ótica do agente económico), uma influência tão reduzida quanto possível.

Os impostos deveriam assim ser, tanto quanto possível, neutrais, ou seja, não
deveriam influenciar ou distorcer as decisões dos investidores52.

Todavia, dada a diversidade de sistemas fiscais nacionais, parece inevitável que a


sua interação gere algum tipo de distorções. O papel do DFI será o de alcançar o maior
grau de neutralidade possível, evitando introduzir fatores adicionais de perturbação para

49
Vide (Source and Residence: New configuration of their principles).
50
Cf. (Pereira P. R., Em Torno dos Princípios do Direito Fiscal Internacional, 2015, p. 210).
51
Para uma análise aprofundada do princípio da neutralidade, vide (Pereira P. R., Em Torno dos Princípios
do Direito Fiscal Internacional, 2015, pp. 210-215), (Vogel, Wich method should the European Community
adopt for the avoidance of double taxation?, 2002, p. 4 e ss) e (Vogel, Worldwide vs. source taxation of
income - A review and re-evaluation of arguments (Part III), 1988, p. 311 e ss).
52
Conforme nos ensina PAULA ROSADO PEREIRA, em concretização do princípio da neutralidade, o Direito
Fiscal Internacional “deve procurar não interferir na afectação óptima, em termos económicos, dos
recursos produtivos existentes, tentando reduzir ao mínimo as distorções provocadas por aspectos fiscais
nas decisões dos agentes económicos” (Pereira P. R., Em Torno dos Princípios do Direito Fiscal
Internacional, 2015, p. 211).

27
além daqueles que inevitavelmente decorrem da interação entre diferentes sistemas
fiscais, configurando assim também uma limitação ao exercício de soberania por parte
dos Estados.

1.2.2. Princípios operativos

Diversamente, os princípios operativos correspondem a aspetos substanciais da


repartição entre os Estados do poder de tributar e da eliminação da dupla tributação. Os
seus reflexos ao nível das regras jurídicas, tanto do direito interno dos Estados como das
CDT por estes celebradas, são mais concretos se comparados com os dos princípios
estruturais.

Não estamos na presença de um conjunto de princípios que num exercício ético-


moral pretendem conformar a coordenação entre Estados para que estes tendencialmente
encontrem o caminho mais adequado no que toca ao poder de tributar situações
internacionais e à prossecução do objetivo de prevenir ou eliminar a dupla tributação
internacional.

Os princípios operativos norteiam, sim, as soluções concretas e os regimes


consagrados no âmbito do DFI. Oferecem um conjunto de ferramentas de aplicação
prática na resolução dos conflitos de dupla tributação de Estados. Conferem o lastro
teórico que subjaz aos tradicionais elementos de conexão relevantes para, sobretudo,
fundamentar o poder de tributar dos Estados e a extensão do mesmo.

Nestes termos, importa referir que os princípios operativos devem, sempre, ser coerentes
com o conteúdo dos princípios estruturais e espelhar os valores por estes definidos.

Como princípios operativos do Direito Fiscal Internacional, tem sido


identificados os seguintes: (i) quanto à repartição do poder de tributar entre Estados, o
princípio da residência, o princípio da fonte e o princípio do estabelecimento estável; (ii)
quanto à amplitude (extensão) do poder de tributar dos Estados, o princípio da
universalidade e o princípio da territorialidade; e (iii) quanto a outros aspectos
substanciais da tributação, o princípio da tributação como entidades independentes, o
princípio da tributação distinta e sucessiva de sociedades e sócios e, por fim, o princípio
da não-discriminação tributária.

28
Dada a importância para o que nos propomos discutir no presente trabalho,
analisaremos com maior grau de pormenor os princípios relativos à repartição do poder
de tributar e à extensão do mesmo, não obstante algumas breves referências e
considerações en passant quanto aos restantes sempre que necessário.

1.2.2.1. Princípio da Residência e Princípio da Fonte – Os elementos de


conexão53

O elemento de conexão é um dos instrumentos nucleares em torno do qual gravita


toda a estrutura da norma de conflitos54. Como referido anteriormente, o elemento de
conexão integra a previsão da norma de conflitos, a par do conceito-quadro, permitindo
estabelecer a ligação entre o facto descrito pelo conceito-quadro e o ordenamento jurídico
aplicável55 e, bem assim, definir o âmbito de aplicação das leis desse ordenamento à
situação em causa.

Dada a diversidade de factos tributários passíveis de apresentarem conexão com


mais do que uma ordem jurídica, também diversos poderão ser os elementos de conexão
encontrados que estabeleçam uma ligação entre situações tributárias internacionais e o
ordenamento jurídico-tributário dos Estados envolvidos.

Assim, poder-se-á dar o caso de a lei ou as convenções recorrerem a mais do que


uma conexão nas suas previsões normativas, originando situações de pluralidade de
conexões, também designadas por conexão complexa ou múltipla, por contraposição à
conexão simples ou única. A conexão complexa ou múltipla, pode revestir três
modalidades: subsidiária, alternativa e cumulativa56.

53
Tratando-se de matéria que será desenvolvida com maior detalha adiante, procuraremos apenas nesta
fase avançar com um enquadramento genérico do princípio da residência e do princípio da fonte. Sobre
estes princípios, remetemos para (Pereira P. R., Princípios do Direito Fiscal Internacional, Do Paradigma
Clássico ao Direito Fiscal Europeu, 2010, pp. 85-131), (Xavier, 2011, pp. 22-30 e 226-232) e (Pires M. ,
1984, pp. 212-239).
54
Cf. (Pereira P. R., Dupla tributação internacional e convenções, 2007, pp. 48-49).
55
Como refere ALBERTO XAVIER, para além do papel desempenhado pelo elemento de conexão no seio da
previsão da norma de conflitos, a “sua influência também se faz sentir na estatuição da norma, pelo que
nos situamos no grupo daqueles que pensam ser tal elemento “bifrontal”, no sentido de que que ocupa
posição em ambos os setores da proposição normativa” (Xavier, 2011, p. 223).
56
No caso da conexão subsidiária, a norma prevê duas ou mais conexões, sendo que uma delas
(secundária) só se aplicará na falta ou impossibilidade da conexão primária. Por outro lado, no caso da
conexão alternativa, a norma prevê duas conexões igualmente aptas para produzir o mesmo efeito. Por
último, na conexão cumulativa, a norma prevê dois ou mais elementos de conexão cuja ocorrência em
simultâneo é necessária para determinado efeito se produza. Para uma análise mais aprofundada desta

29
Uma outra classificação entre elementos de conexão que fará sentido mencionar
é a que separa elementos de conexão variáveis ou móveis dos elementos de conexão
invariáveis ou fixos. Os primeiros, como se antevê, caracterizam-se pela suscetibilidade
de mudar no tempo e no espaço (como a residência e a sede), ao contrário dos últimos
(como o lugar da celebração de um contrato ou o lugar da situação do imóvel). Daí a
importância, sobretudo no contexto dos impostos periódicos por natureza, de fixar o
momento temporal relevante para efeitos de delimitação da ordem jurídico-tributária com
competência para tributar57.

Na procura de conexões relevantes entre situações tributárias internacionais e um


determinado Estado, optou-se, naturalmente, pelos elementos constitutivos do próprio
Estado – menos mutáveis às transformações socioeconómicas –, determinantes da sua
soberania política (cuja soberania tributária é uma manifestação).

Assim, com base nos aspetos determinantes da soberania estadual, mostra-se


possível identificar elementos de conexão – das situações tributárias internacionais com
a jurisdição tributária de um Estado – de natureza objetiva, relativos ao facto tributável,
e de natureza subjetiva (diversos da nacionalidade58), referentes ao titular do
rendimento59.

Os referidos elementos de conexão – a fonte do rendimento e a residência do


respetivo titular – permitem chegar aos dois grandes princípios consensualmente aceites,
por Estados e organizações internacionais, no que toca à fundamentação do poder
tributário dos Estados: o princípio da fonte e o princípio da residência60.

Assim, perante uma situação tributária internacional, importa, recorrendo aos


elementos de conexão relevantes, determinar o Estado onde se localiza a atividade ou o

distinção, vide (Xavier, 2011, p. 224), (Colaço, Direito Internacional Privado, 1959, p. 20 e ss) e (Colaço, Da
qualificação em Direito Internacional Privado, 1964, p. 19 e ss).
57
Para demonstrar a importância de fixar o momento temporal relevante para efeitos de tributação, e
pegando num exemplo apresentando por ALBERTO XAVIER, pense-se numa sociedade que transferiu a sua
sede de um país abrangido por tratado contra a dupla tributação para outro país dele excluído (Xavier,
2011). Exemplo este que até poderia configurar uma situação de treaty shopping: quando um sujeito não
residente em nenhum dos Estados partes de um tratado, residente, portanto, num Estado terceiro,
desloca a sua residência para um daqueles Estados apenas com o intuito de beneficiar do regime favorável
do tratado, regime do qual, de outro modo não beneficiaria.
58
A residência, por exemplo.
59
No presente trabalho, analisaremos, sobretudo, os elementos de conexão nos impostos sobre o
rendimento.
60
A este propósito, veja-se (Pires M. , 1984, pp. 260-293), (Xavier, 2011, pp. 226-230), (Dourado, A
tributação dos rendimentos de capitais: a harmonização na comunidade europeia, 1997, pp. 59-92).

30
investimento e no qual o rendimento é produzido (Estado da fonte) e o Estado no qual
reside o titular do rendimento de origem estrangeira (Estado da residência)61.

Os princípios da residência e da fonte não se excluem mutuamente, sendo


reconhecida a aplicação cumulativa, com ou sem limitações, de ambos quer na legislação
interna da maioria dos Estados quer nas CDT que tem vindo a ser celebradas62. Não se
verifica, portanto, em termos gerais, a atribuição exclusiva do direito de tributar ao Estado
da fonte ou ao Estado da residência com exceção de alguns tipos específicos de
rendimento63.

A única divergência que vai subsistindo, e que importa referir, está relacionada
com a maior ou menor amplitude do próprio conceito de fonte, ou seja, com os critérios
que permitem ligar a fonte a um dado território. Sendo certo que é uma divergência que
ganhou algum fulgor nos últimos anos, dados os novos e crescentes problemas suscitados
pela realidade intangível/ digital/ virtual/ incorpórea típica da economia digital e do
comércio eletrónico face a uma realidade até então profundamente marcada pela
“fisicalidade” dos elementos64, a verdade é que esta divergência não é nova. Tem vindo
a ocupar o DFI e a sua evolução, acompanhado a crescente complexidade das situações
fiscais internacionais.

Encontrar a fonte de um rendimento numa economia transversal e global em que


as fronteiras se aproximam e dissipam, sempre consubstanciou um desafio e obrigou a
múltiplas adaptações por parte dos diferentes Estados e do DFI65.

Neste sentido, certas legislações não se bastam com o critério da fonte para
fundamentar a tributação dos não-residentes, limitando-se a tributá-los apenas nos casos

61
Importa não esquecer, como refere Alberto Xavier, a existência de “casos em que a lei se utiliza da
técnica das presunções ou ficções para definir elementos de conexão caracterizados pelo recurso a um
conceito mais amplo. São exemplos, as normas segundo as quais um serviço se considera prestado no
território do domicílio do prestador ou do domicílio do beneficiário; um tripulante de navio ou aeronave,
se considera residente no território em que se localiza a direção efetiva da empresa que os explora (…)”
(Xavier, 2011, p. 226).
62
Embora, como já referido, com uma prevalência do princípio da residência. Esta realidade tem sido
criticada por diversos autores, como (Vogel, Worldwide vs. source taxation of income - A review and re-
evaluation of arguments (Part III), 1988, p. 216), (Pires M. , 1984, p. 266 e 273) e (Pistone, 2002, pp. 200-
222).
63
Sobre a ponderação relativamente aos princípios da residência e da fonte, (Pereira P. R., Em Torno dos
Princípios do Direito Fiscal Internacional, 2015, pp. 226-230).
64
Sobre esta contraposição, vide (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011,
p. 257).
65
As sucessivas alterações à MC OCDE são disso exemplo.

31
em que disponham de um estabelecimento estável66 que exprime uma formulação restrita
do princípio da fonte.

Após a determinação do poder de tributar de um Estado, através dos elementos de


conexão relevantes – residência, fonte e, por resultar da interseção entre estes dois
conforme referido, o estabelecimento estável – importará, também, definir a extensão do
mesmo, isto é o alcance do âmbito de incidência das legislações fiscais internas.

1.2.2.1.1. A residência

A residência surge como um elemento de conexão subjetivo, representando uma


ligação pessoal ou subjetiva do sujeito ao território67.

De acordo com o princípio da residência, a conexão relevante para fundamentar


o poder tributário de um Estado é a residência no seu território do titular dos rendimentos
em causa68. Segundo este princípio, o Estado tem o direito de tributar os rendimentos dos
seus residentes. Este princípio assegura a ligação do rendimento a determinado Estado
com base num elemento de conexão pessoal ou subjetivo69. Distingue-se entre residência
individual e residência de entes coletivos, conforme estejamos perante pessoas singulares
ou pessoas coletivas, respetivamente.

66
Como veremos mais adiante, conexo ao estabelecimento estável está a ideia de economic allegiance.
Segundo RITA CALÇADA PIRES, deve ser entendido que, “mesmo sendo o E.E. a figura-base reveladora da
possibilidade de efectivar a tributação na fonte, não é o E.E. a razão de ser última. Essa tributação deriva
da existência de uma forte ligação económica (economic allegiance) do facto tributário a determinado
território” (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, p. 237), fortemente
representada pelo Estabelecimento Estável.
67
Sobre a residência, vide (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, pp.
214-227) e (Xavier, 2011, pp. 226-230).
68
De referir que a noção de residência ou domicílio para efeitos da delimitação da esfera de incidência
das normas tributárias de um Estado é distinta da noção de domicílio fiscal de direito interno, este último
diz respeito a um lugar determinado que serve de referência ao exercício de direitos e cumprimentos de
deveres estabelecidos pelas normas tributárias e para efeitos de circunscrição territorial em cuja área se
situem os serviços de administração competentes para a prática de atos relativos à situação fiscal do
contribuinte (cf. no caso português o art.º 19 da LGT).
69
Para uma explicação concisa de residência, (Pereira P. R., Dupla tributação internacional e convenções,
2007, pp. 51-52).

32
O princípio da residência escora-se na ideia de que o estado em que uma pessoa
singular ou coletiva reside é aquele com o qual são mais intensos os vínculos de
solidariedade que fundamentam o dever de pagar impostos70.

De referir que a qualificação como residente pertence ao direito interno de cada


Estado.71 O próprio n.º 1 do art.º 4.º do MC OCDE, para definir residência, remete para
os conceitos presentes nas normas dos ordenamentos jurídicos nacionais, apresentando, é
certo, algumas referências orientadoras como domicílio, residência, local de direção ou
a qualquer outro critério de natureza similar.

Assim, e face aos critérios do direito interno de cada um deles, pode suceder que
dois Estados considerem a mesma pessoa como residente no seu território, configurando
um caso de dupla residência (ou dual residence). Nestes termos, e na ausência de uma
convenção contra a dupla tributação, ambos os Estados podem ter a pretensão de tributar
a mesma pessoa por todos os seus rendimentos independentemente da respetiva origem
(world wide income), na medida em que cada um deles a considera residente no seu
território.

Ora a função da CDT é, justamente, definir qual das residências prevalecerá para
efeitos tributários, escolhendo uma (residência escolhido) em detrimento de outra
(residência preterida)72.

70
A residência pode ser aferida em função de duas conceções: uma conceção subjetivista e uma conceção
objetivista. Em traços gerais, a noção subjetivista de residência referir exige, para além da permanência
física num dado local (corpus), a intenção de o sujeito se tornar residente de um certo país (animus), ou
seja, implicam a cumulação de dois elementos. Pelo contrário, a noção objetivista de residência implica
apenas a presença física de uma pessoa num certo território (corpus), fixando a duração necessária para
que a estadia se converta em residência.
Sobre o conceito de residência ou domicílio e sobre as noções subjetivistas e objetivistas de residência,
vide (Xavier, 2011, pp. 280-296). A título de exemplo, o direito português define o conceito de residência
que se situa a meio caminho entre a noção meramente objetiva e a noção subjetiva (cf. respetivamente,
alíneas a) e b) do art.º 16.º do CIRS, no caso de pessoas singulares). A de residência das pessoas coletivas
no direito português é aferida através de dois elementos de conexão alternativos: a sede e a direção
efetiva (cf. respetivamente, alínea a) do n.º 1 e n.º 3 do art.º 2 do CIRC).
71
Como refere RITA CALÇADA PIRES, o “conceito tradicional de residência no plano internacional constrói-se
com recurso aos conceitos de residência presentes nos ordenamentos jurídicos nacionais” (Pires R. C.,
Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, p. 214). Tendo apenas por limite a “natureza
da conexão adoptada, que deve ser o domicílio, a residência, o local da direcção ou qualquer outro critério
de natureza análoga” (Xavier, 2011, p. 291).
72
Importa referir que no sistema convencional a residência fiscal só pode ser uma (princípio da unicidade
da residência). Razão pela qual se, em face dos critérios da convenção, uma pessoa for considerada
residente num Estado contratante, passa a ser automaticamente “não residente” no outro, ainda que o
estatuto de residente também lhe seja atribuído pela lei interna deste último (Xavier, 2011, p. 292).

33
O MC OCDE, no n.º 2 e n.º 3 do seu artigo 4.º73, aplica um sistema baseado em
regras de preferência ou conexões subsidiárias para definir a única residência fiscalmente
relevante no caso da mesma pessoa ser considerada residente por ambos os Estados
contratantes. Trata-se de um conjunto de hipóteses a serem aplicadas respeitando a
sequência constante do artigo 4.º da MC OCDE. O caráter exaustivo destes critérios de
conexão subsidiária, aptos a resolver uma multiplicidade de situações de dupla residência,
são comumente designados por tie-breaker rules74.

A dupla residência não é um fenómeno exclusivo das pessoas singulares, pode


também suceder que mais do que uma ordem jurídica considere uma pessoa coletiva
localizada no seu território (dual resident companies), sendo necessário fixa um critério
de preferência na repartição dos poderes tributários75.

Neste sentido, o n.º 3 do art.º 4.º da MC OCDE estabelece que prevalecerá o


critério do local da “direção efetiva” (place of effective management), entendendo-se por
este, o local onde são tomadas, na sua substância, as decisões-chave, tanto a nível de
gestão como a nível comercial, necessárias ao exercício das atividades da entidade na sua
globalidade76 (center of top level management)77.

Não nos deixemos, contudo, enganar pela aparente facilidade de identificação


daquele local.

É indispensável mencionar que no campo de ação do Direito Internacional Fiscal


a identificação/ delimitação da residência das pessoas coletivas sempre se pautou por
especiais dificuldades78. Dificuldades estas explicadas pelo facto de o MC OCDE apenas

73
A MC OCDE adota como sinónimos os conceitos de domicílio e residência.
74
Sobre a dupla residência das pessoas singulares, vide (Xavier, 2011, pp. 291-294).
75
Como identifica RITA CALÇADA PIRES, para a “residência individual, a OCDE apresenta uma listagem
hierarquicamente organizada, completa e clara, o mesmo não acontece para a residência societária. De
facto, no referente a esta, o único critério a ter em consideração, no caso de dupla residência de pessoas
colectivas, será a direção efectiva” (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial,
2011, p. 216).
Sobre a escolha do critério da direção efetiva, parágrafo 22 dos comentários ao n.º 3 do art.º 4.º do MC
OCDE: “Não se afigura uma solução adequada conferir importância a um critério puramente formal, como
é o registo. Daí que o número 3 tome em consideração o local em que a sociedade, etc., é efectivamente
dirigida” (OCDE C. , MC OCDE, junho 2015, p. 138).
76
Cf. parágrafo 24 dos comentários ao n.º 3 do art.º 4.º do MC OCDE (OCDE C. , MC OCDE, junho 2015).
77
Sobre a dupla residência de pessoas coletivas, vide (Xavier, 2011, pp. 294-296), (Pires R. C., Tributação
Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, pp. 215-217) e (Câmara, 2001, p. 69 e ss).
78
Sobretudo, por comparação à residência individual.

34
oferecer como critério delimitador da residência a figura da direção efetiva, cuja definição
é omissa79.

A maioria da doutrina tem reconduzido o conceito de direção efetiva ao local onde


são tomadas as decisões centrais e fundamentais de gestão e comerciais80.

A direção efetiva envolve uma análise factual, onde o decisivo não é o local onde
se opera o resultado das diretivas de gestão, mas onde elas são efetivamente tomadas,
sendo que, caso haja uma impossibilidade de determinar esse local, tem sido admitido a
utilização do local da residência dos administradores ou, caso não seja possível, do
acionista único ou principal, aplicando-se, em caso de uma nova dupla residência, os
critérios oferecidos pelo n.º 2 do artigo 4.º do MC OCDE.

De todo o modo, a grande questão relativamente à determinação da residência de


uma pessoa coletiva continua a ser o recurso ao conceito de direção efetiva e à ausência
da respetiva definição. É certo que nas tentativas de explicação do conceito de direção
efetiva se recorre ao local onde se tomam as “decisões-chave”, as “decisões estratégicas”
ou as “decisões centrais”, mas mesmo estas referências carecem de algum grau de
concretização, sobretudo no contexto atual de dispersão dos centros de tomada de decisão
possibilitada pelas novas tecnologias de informação e comunicação. Na prática, será no
ordenamento jurídico nacional, através de quem aplica a CDT que se definirá o que se
entende por direção efetiva.

Neste sentido, têm sido identificados diversos indicadores que pretendem auxiliar na
localização da direção efetiva de uma pessoa coletiva:

 “Lugar onde são realizadas as reuniões do Conselho de Administração;


 Lugar onde são tomadas as decisões mais importantes;
 Quem adopta as decisões mais importantes;
 Lugar onde é adoptada a “política societária” e quem a determina;

79
O parágrafo 24 dos comentários ao n.º 3 do art.º 4.º do MC OCDE, numa tentativa algo débil, procura
definir o local de direção efetiva como o local onde são tomadas as decisões estratégicas e determinantes
para a atividade da pessoa coletiva, quer do ponto de vista da gestão quer do ponto de vista comercial,
ou seja, o local da gestão global. Contudo este comentário não parece ser suficientemente elucidativo,
sobretudo porque procura definir um conceito através da remissão para outros conceitos que também
carecem de concretização. Razão pela qual sempre se observou um esforço por parte da doutrina, da
jurisprudência e das administrações tributárias dos diferentes Estados em construir e preencher este
conceito.
80
Cf. (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, pp. 216-218) e (Vogel,
Double taxation conventions, 1997, pp. 262-263).

35
 A existência de outros corpos sociais, por exemplo conselhos consultivos, e com
que tipo de poderes; (vi)
 Apuramento sobre se o Conselho de Administração recebe instruções de terceiros,
residentes noutros Estados, para deliberar;
 Quem celebra os contratos societários, bem como determinar se estes contratos
estão sujeitos a outras aprovações prévias ou ratificações posteriores, além das
possíveis autorizações concedidas pela Assembleia Geral no âmbito normal de
um controlo do Grupo;
 Lugar onde são celebrados os demais contratos da Sociedade;
 Verificar a existência de contratos de administração celebrados por entes terceiros
que não os administradores eleitos pela Assembleia Geral”81.

A escolha da direção efetiva como critério identificativo da residência societária


em detrimento de outros critérios como o do local de constituição ou registo, reflete uma
escolha da prevalência da substância sobre a forma por parte do DFI.

Significa isto que se deverá privilegiar a essência das coisas mais do que as meras
formalidades.

Além do mais o critério da direção efetiva para definição da residência pretende


demonstrar a existência de uma forte conexão económica entre determinada pessoa
coletiva e um território.

Relativamente à extensão do poder tributário do Estado da residência, o princípio


da residência aparece, em muitos casos, associado ao princípio da tributação universal,
segundo o qual o Estado tem o direito de tributar os rendimentos obtidos pelos seus
residentes tanto no seu território como fora dele82.

Na maioria dos atuais sistemas fiscais vigentes, a tributação pela Estado da


residência tende a obedecer ao princípio da universalidade (ou princípio da tributação
universal ilimitada), nos termos do qual as pessoas singulares ou coletivas residentes num
Estado ficam sujeitas, nesse Estado, a uma obrigação tributária ilimitada, sendo tributados

81
Cf. (Câmara, 2001, p. 69 e ss).
82
Diversos argumentos têm sido esgrimidos em prol ou contra a aplicação do princípio da residência. Não
cabendo no objeto do presente trabalho a tomada de posição sobre esta temática, importa, todavia,
identificar os principais argumentos utilizados. Para o desenvolvimento deste tema, vide (Pereira P. R.,
Em Torno dos Princípios do Direito Fiscal Internacional, 2015, pp. 218-221).

36
todos os seus rendimentos independentemente da respetiva origem (world wide income)
– quer sejam eles obtidos no Estado de residência ou no estrangeiro.

Estamos perante uma extensão “extra-territorial” da lei interna83. Não optar pela
tributação segundo o princípio da universalidade deixando de parte os rendimentos de
fonte estrangeira faria, muito provavelmente, o Estado em questão incorrer na violação
do princípio da igualdade – próprio dos impostos pessoais sobre o rendimento – ao
discriminar entre os seus residentes, dado que uns, por só auferirem rendimentos de fonte
interna, ficariam com uma maior sobrecarga fiscal face aos demais.

Por outro lado, a não tributação dos rendimentos de fonte estrangeira


representaria, como facilmente se percebe, uma perda de receitas para o Estado de
residência e, bem assim, um estímulo à exportação de capitais no caso de uma menor
tributação no Estado fonte, na medida em que os rendimentos da sua aplicação no
estrangeiro poderiam sofrer uma menor carga fiscal do que os de produção interna 84.

Curiosamente, como bem identifica ALBERTO XAVIER, os mesmos sistemas fiscais


que optam tributar os seus residentes por todos os seus rendimentos independentemente
da respetiva origem tendem a impor uma obrigação limitada aos não-residentes85,
submetendo a imposto apenas os rendimentos que tenham a respetiva fonte localizada no
seu território86.

Contudo, em certos sistemas fiscais, e ao contrário do referido supra, o Estado de


residência opta por uma tributação dos seus residentes apenas quanto aos rendimentos de
fonte interna – consubstanciando uma obrigação tributária limitada –, renunciado fazê-lo
quanto aos rendimentos de forte externa. Confirmando que não há uma correlação
absoluta entre o princípio da residência e ao princípio da universalidade.

83
Conforme, (Pereira P. R., Em Torno dos Princípios do Direito Fiscal Internacional, 2015, p. 231)
84
Conforme (Xavier, 2011, p. 229) e (Pires M. , 1984, p. 237).
85
(Xavier, 2011, p. 231).
86
Estamos no contexto do princípio da fonte e da sua relação com a amplitude do poder de tributar, como
veremos em seguida.

37
1.2.2.1.2. A fonte

Por seu turno, de acordo com o princípio da fonte87, a conexão relevante para
fundamentar o poder tributário de um Estado é o local de origem ou proveniência dos
rendimentos. Segundo este princípio, o Estado tem o direito de tributar os factos ocorridos
no seu território, independentemente de os titulares do rendimento serem ou não seus
nacionais, serem ou não-residentes.

O princípio da fonte assegura, assim, a ligação do rendimento a determinado


território com base em elementos de conexão reais ou objetivos88. O princípio da fonte
ampara-se na ideia de que o estado em que um concreto rendimento tem origem é aquela
cuja ação mais contribui para a respetiva formação89.

Adianta-se desde já que, contrariamente ao que se passa no âmbito da residência,


não há na fonte um poder generalizado e universal de tributação.

Em virtude das dificuldades por vezes sentidas em determinar a localização da


fonte ou origem de um rendimento a doutrina logrou desenvolver, a par da noção clássica
de fonte de rendimento, entendida, grosso modo, como fonte da sua produção, a noção
de fonte do seu pagamento90.

Neste âmbito, têm-se entendido que a fonte do rendimento é um conceito


económico que respeita à sua produção e a fonte pagamento é um conceito financeiro que

87
Sobre a fonte, vide (Xavier, 2011, pp. 297-305) e (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento
Empresarial, 2011, pp. 227-228).
88
No imposto sobre o rendimento, que particularmente nos interessa, o elemento de conexão
fundamental é o lugar da situação da fonte dos rendimentos. Contudo, importa referir que os elementos
de conexão objetivos tendem a variar conforme os tributos em causa. Por exemplo, nos impostos prediais,
o elemento de conexão dominante é o lugar da situação do imóvel (locus rei sitae); nos impostos
sucessórios, pode ser o lugar da abertura da herança ou situação dos bens.
89
Cf. (Vasques, 2011, p. 118).
90
Quanto a distinção entre ambos, refere ALBERTO XAVIER que, no caso da noção de fonte de rendimento
enquanto fonte da sua produção existe um nexo causal direto entre o rendimento e o fato que o
determina; pelo contrário, na noção de fonte de rendimento enquanto fonte do seu pagamento está em
causa a origem dos recursos que representam rendimento para o respetivo beneficiário (Xavier, 2011, p.
298). A este respeito, também PAULA ROSADO PEREIRA refere a necessidade de se recorrer a dois conceitos
de fonte: (i) Fonte (de produção) do rendimento ou fonte em sentido económico – trata-se da fonte de
rendimento propriamente dita. É um conceito económico, referente à produção do rendimento (…); (ii)
Fonte de pagamento ou fonte em sentido financeiro – é um conceito financeiro, relativo à realização do
rendimento e não à sua produção (…). Para além das duas acepções de fonte acima referidas, os
elementos de conexão objectivos compreendem ainda elementos de conexão reais (também designados
por elementos de conexão “lex rei sitae”). Os elementos de conexão reais respeitam à localização de bens
móveis e imóveis, em função da qual determinam o âmbito espacial de aplicação do imposto” (Pereira P.
R., Em Torno dos Princípios do Direito Fiscal Internacional, 2015, p. 222).

38
respeita à sua realização. Releva que “a determinação do lugar da fonte de cada tipo de
rendimento deve ser efetuada, caso a caso, face ao direito positivo interno e
convencional91”, ou seja, a interseção das duas dimensões é necessária por forma a
fundamentar o poder de tributar do Estado fonte do rendimento.

Do ponto de vista prático, a tributação do Estado da fonte caracteriza-se, na


maioria dos casos, mediante a aplicação de uma retenção na fonte sobre o valor do
rendimento. Todavia, o princípio da fonte não atribui, geralmente, um direito exclusivo
de tributação ao Estado da fonte92.

Sobre a extensão do poder tributário, o Estado da fonte não tem um poder de


tributação sobre todos os rendimentos auferidos pelo respetivo beneficiário, tem apenas
poder de tributação sobre os rendimentos originados no correspondente território.
Estamos assim perante uma tributação limitada aos rendimentos derivados de fontes
localizadas no território desse Estado (podendo-se, assim, estabelecer uma ligação ao
princípio da territorialidade)93, reconhecendo-se à fonte o poder efetivo de tributar o
rendimento desde que se verifiquem graus mínimos (threshold) de presença no território
em questão94.

Como refere RITA CALÇADA PIRES, a “tributação na fonte é um direito do espaço


fiscal respetivo que não poderia tributar outros rendimentos, que não apenas os originados
no seu território95”, por inexistência de outro elemento de conexão relevante para
estabelecer a ligação entre um rendimento e o Estado onde o mesmo se gera/ produz.

Ou seja, esta pertença económica (economic allegiance) apenas se manifesta quanto aos
rendimentos originados nesse território visto ser esse único vínculo existente com o
Estado fonte, já que o beneficiário desses rendimentos assume-se como um não-residente.

91
Cf. (Xavier, 2011, p. 299).
92
Os casos de atribuição ao Estado da fonte de um direito exclusivo de tributação são, nos termos da MC
OCDE, bastante restritos e relativos apenas a tipos de rendimentos muito específicos, conforme nos
demonstra o artigo 19.º do MC OCDE (OCDE C. , Modelo de Convenção Fiscal sobre o Rendimento e o
Património, 2011).
93
Em sentido idêntico ao referido relativamente ao princípio da residência, também sobre o princípio da
fonte têm sido esgrimidos vários argumentos em prol e contra a sua aplicação. Para o desenvolvimento
deste tema, vide (Pereira P. R., Em Torno dos Princípios do Direito Fiscal Internacional, 2015, pp. 223-226).
94
De referir que no caso dos rendimentos decorrentes da atividade de um ente coletivo, o elemento que
surge normalmente como limite mínimo (ou limiar mínimo de presença) para existir tributação é o
Estabelecimento Estável.
95
(Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, p. 227).

39
Relativamente ao Estado fonte, observa-se que prevalece, na maioria dos sistemas
fiscais, a regra da tributação dos não-residentes apenas pelos rendimentos obtidos de
fontes localizadas no seu território (source principle) – obrigação tributária limitada,
numa clara aceção à limitação de base territorial – princípio da territorialidade96.

Nestes termos, ao princípio da universalidade contrapõe-se o princípio da


territorialidade97.

Ainda sobre a amplitude de tributar do Estado da fonte, mostra-se consensual o


entendimento de que, dificilmente, esta poderia ser maior, uma vez que a extensão do
âmbito espacial de aplicação das leis de um Estado a rendimentos auferidos fora do seu
território, por pessoas sem uma conexão subjetiva relevante98 a esse Estado (residência
ou sede), ou seja, que nela não residam, não só seria contrária às regras do DFI, podendo
resultar em diversos casos de ingerência na soberania de outros Estados, como de
extraordinária dificuldade de execução.

Como melhor se verá adiante, a crescente desmaterialização factos tributários


(perda de “fisicalidade”) associada à economia digital e a interdependência económica e
jurídica que os liga implica uma dificuldade acrescida na determinação d a localização da
fonte dos diversos tipos de rendimentos.

1.2.2.2. O princípio do estabelecimento estável

Relativamente à repartição entre Estados do poder de tributar, especificamente,


rendimentos empresariais, é amplamente reconhecido o princípio do estabelecimento

96
Segundo alguns autores estará aqui em causa não o princípio da territorialidade per se, mas o princípio
da limitação territorial. Como ensina PAULA ROSADO PEREIRA, o princípio da limitação territorial, “exprime
bem a existência de uma limitação da obrigação tributária numa base territorial, ou seja, limitação da
obrigação tributária aos rendimentos obtidos de fontes localizadas em determinado território” (Pereira
P. R., Em Torno dos Princípios do Direito Fiscal Internacional, 2015, p. 205). Compreendendo-se o esforço
conceptual da autora, entende-se, contudo, que o conteúdo do princípio da territorialidade é o bastante
para exprimir esta ideia de (de)limitação do alcance do âmbito de incidência da legislação fiscal interna
do Estado através das suas fronteiras. Subjaz desde logo ao princípio da territorialidade, a existência de
uma ligação entre o facto tributável e o ordenamento jurídico do Estado em virtude daquele ocorrer/ ter
como fonte o território deste, assim legitimando o seu poder de tributar. Assim parece-nos não ser
necessário um outro conceito que expresse esta limitação do poder tributário pelo território, sendo o
princípio da territorialidade suficientes conceptualmente para o efeito.
97
No mesmo sentido, (Nabais, A Soberania Fiscal no actual quadro de internacionalização, integração e
globalização económicas, 2006, p. 499).
98
Existindo essa conexão subjetiva relevante, a legitimidade tributária do Estado adviria dela e já não da
posição de Estado fonte.

40
estável enquanto elemento de conexão relevante para fundamentar o poder de tributar do
Estado99.

Para que exista estabelecimento estável torna-se necessário que estejam


preenchidas várias condições100:

a) que exista um local de negócio (place of business101);


b) o local tem de se situar numa área localizada;
c) o contribuinte tem de ter o direito de usar esse local;
d) o uso do local de negócio tem de ter alguma permanência;
e) as atividades desenvolvidas nesse local têm de ser atividades empresarias tal como
definidas no tratado e nas leis internas.

Diz-nos a prática que os rendimentos de uma empresa são tributados pelo Estado
onde se localiza a respetiva residência (sede).

Não é, porém, uma regra absoluta: a existência de um estabelecimento estável de


uma empresa (à qual está associado) num outro Estado gera a possibilidade desse Estado
tributar os rendimentos que possam legitimamente ser reconduzidos a esse
estabelecimento estável102. Essa tributação deriva da existência de uma forte ligação
económica (economic allegiance) do facto tributário a determinando território
corporizada, neste caso, pelo estabelecimento estável103.

99
Como nos ensina LUÍS DE MENEZES LEITÃO, o “conceito de estabelecimento estável consiste, como se sabe,
num importantíssimo elemento de conexão nas normas de conflitos relativos à tributação do rendimento,
e aparece como uma consequência da mobilidade das empresas e dos cidadãos que livremente se vêm
instalar em Estados diferentes do seu Estado nacional, ao abrigo do direito de estabelecimento” (Menezes
Leitão L. M., 1999, p. 137).
O conceito de estabelecimento estável encontra-se previsto no artigo 5.º do MC OCDE. Não obstante uma
certa harmonização do conceito, subsistem algumas interpretações diversas em diferentes CDT.
Ainda, sobre o atual conceito de E.E. e os problemas com a sua interpretação, vide (Santos & Lopes, Tax
Sovereignty, Tax Competition and the Base Erosion and Profit Shifting Concept of Permanent
Establishment, 2016).
100
Cf. (Guimarães, O conceito de estabelecimento estável e o comércio electrónico, 2000, p. 161). Estas
condições decorrem do art.º 5.º do CIRC, no caso português, e do artigo 5.º do MC OCDE, os quais
apresentam definições semelhantes. Assim, quando abordarmos o E.E. real no MC OCDE
desenvolveremos com maior pormenor estas condições.
101
Na terminologia do art.º 5.º, n.º 1 do MC OCDE.
102
Tributação que terá de respeitar várias regras e princípios jurídicos, incluindo o princípio da não
discriminação caso conste da CDT uma cláusula idêntica ou similar à do artigo 24.º, n.º 3 do MC OCDE.
103
Com interesse, refere RITA CALÇADA PIRES a existência de outros elementos reveladores da economic
allegiance “no referente aos rendimentos provenientes de actividades móveis, em especial para os
rendimentos provenientes de actividades móveis” (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento
Empresarial, 2011, p. 237).

41
Este princípio desempenha um papel importantíssimo na articulação entre o
princípio da residência e o princípio da fonte104.

Por um lado, limita a regra da tributação do lucro das empresas exclusivamente


no Estado da sua residência (sede), repartindo-o com o Estado da fonte, no caso de lucros
imputáveis a um estabelecimento estável situado no território deste último (conforme
artigo 7.º do MC OCDE). Neste sentido – e contrariando aquilo que, de alguma forma,
constitui a norma nos compromissos assumidos entre Estados (fonte e de residência) por
forma a prevenir a dupla tributação internacional –, o princípio do estabelecimento estável
revela uma concessão ao princípio da fonte, através da derrogação do poder de tributar
por parte do Estado de residência (sede) da sociedade matriz a que pertencem e da qual
são parte integrante.

Por outro, o princípio do estabelecimento estável corresponde a uma formulação


restrita do princípio da fonte, na medida em que faz depender a tributação do Estado fonte
da existência de um estabelecimento estável no seu território e limita tal tributação aos
lucros que sejam imputáveis a esse estabelecimento estável (considerado enquanto
empresa separada e independente a exercer uma atividade).

Assim, quaisquer lucros empresariais que não possam ser reconduzidos a um


estabelecimento estável serão exclusivamente tributados no Estado de residência (sede).

Esta regra implica que só serão tributadas atividades económicas quando existam
laços significativos entre a empresa e esse Estado105. Consagra-se por este meio uma ideia
de pertença económica.

O conceito de estabelecimento estável está intimamente ligado à problemática da


soberania tributária dos Estados. Se no âmbito do direito interno106 o conceito de
estabelecimento estável é nuclear para efeitos da definição do regime de tributação de

104
Nesse sentido, (Pereira P. R., O papel do estabelecimento estável no Direito Fiscal Internacional, 2013,
p. 573 e ss).
105
Em consequência, a “legitimidade do Estado fonte para tributar os lucros empresariais depende,
portanto, do modo como a atividade que os origina é exercida no seu território e da estrutura material
ou pessoal de que a empresa estrangeira ali dispõe para o seu exercício. Deste modo, escapam ao poder
tributário do Estado fonte os lucros de atividades que, embora exercidas no seu território, não recorram
a uma estrutura que corporize um estabelecimento estável aí existente” (Pereira P. R., Em Torno dos
Princípios do Direito Fiscal Internacional, 2015, p. 233).
106
Sobre o conceito de estabelecimento estável na ordem jurídica interna e nas Convenções celebradas
por Portugal, (Cardona, 1995, pp. 265-273). Para a compreensão da evolução do conceito no âmbito das
instituições internacionais, vide breve explicação de (Pereira P. R., O papel do estabelecimento estável no
Direito Fiscal Internacional, 2013).

42
entidades não-residentes pelos rendimentos empresariais obtidos (enquanto Estado
fonte), também o é no âmbito internacional a propósito da regulamentação de normas de
repartição do poder de tributar entre aquele Estado (fonte) e o Estado da residência da
sede da entidade (do qual o estabelecimento estável é uma extensão)107, cuja pretensão de
tributar se baseia no princípio fundamental de que estão sujeitos à respetiva soberania
tributária os seus residentes pela totalidade dos rendimentos auferidos, ainda que
provenientes de fonte estrangeira108.

Pela via da celebração de CDT, os dois Estados acordam (de)limitar a respetiva


soberania fiscal através da regulação e aceitação bilateral do conceito de estabelecimento
estável109. Trata-se de uma limitação ou restrição (voluntária, sempre se diga) à soberania
dos Estados, uma vez que apenas a celebração de CDT impedirá que sejam aplicadas ao
mesmo facto tributário duas normas de incidência constantes de duas ordens jurídicas
distintas110.

O conceito de estabelecimento estável permite uma decomposição em dois


elementos: num elemento estático e num elemento dinâmico. Assim, o elemento estático
exprime a organização/ estrutura através da qual se desenvolve uma certa atividade; o
elemento dinâmico exprime a atividade desenvolvida111.

A verificação cumulativa dos dois elementos supra é necessária à existência do


estabelecimento estável, pois, por um lado, não haverá um estabelecimento estável se
existir uma organização à qual não está associada qualquer atividade, por outro, não
haverá estabelecimento estável se uma entidade não-residente exercer uma atividade num
determinado Estado sem que para isso disponha de uma organização que a veicule nesse
mesmo Estado.

107
Cf. (Pereira P. R., O papel do estabelecimento estável no Direito Fiscal Internacional, 2013, p. 573). Ou
seja, o conceito de estabelecimento estável tem uma dupla valência: nacional e internacional.
108
Ou seja, a utilização deste expediente (o estabelecimento estável) implica uma situação de dupla
tributação jurídica que cumprirá resolver, na medida em que o Estado do estabelecimento estável vai
tributar os rendimentos obtidos pelo estabelecimento estável que a ele sejam imputados por virtude de
estar fisicamente situado naquele Estado e os rendimentos serem aí percebidos, e o Estado da residência
da sociedade a que aquele estabelecimento estável está associado vai tributar os rendimentos dessa
sociedade, nos quais se inclui os rendimentos do estabelecimento estável, havendo assim sobreposição
de tributação sobre o mesmo rendimento (Guerra, 2007).
109
Cuja existência e verificação vai depender o exercício do poder de tributar do Estado da respetiva
instalação.
110
No mesmo sentido do que foi ora dito, vide (Menezes Leitão L. M., 1999, pp. 137-138) e (Cardona,
1995, pp. 247-257).
111
Cf. (Xavier, 2011, p. 311).

43
Quanto ao tipo de organização associada ao conceito de estabelecimento estável
a doutrina tem vindo a distinguir entre estabelecimentos reais – que se traduzem em
instalações fixas, propriamente ditas – e estabelecimentos pessoais – os quais se traduzem
em representações112.

O preenchimento do conceito de estabelecimento estável, por vezes complexo e


sujeito a dificuldades, sobretudo ao nível da aplicação das CDT113 – os diversos
comentários existentes ao artigo 5.º do MC OCDE demonstram isso mesmo (OCDE C. ,
MC OCDE, junho 2015, pp. 143-201) – permite, no caso concreto, assumir a existência
de uma estrutura de tipo empresarial utilizada no desenvolvimento de uma atividade
económica regular no território em questão, determinando, em consequência, a respetiva
tributação nesses Estado em termos muito similares aos aplicáveis a uma entidade jurídica
autónoma aí localizada.

Há, assim, uma tributação baseada num nexo pessoal de conexão, idêntico ao
aplicável em relação às pessoas coletivas residentes114.

Os estabelecimentos estáveis não têm personalidade jurídica distinta daquele de


que são mero prolongamento (sociedade matriz a que pertencem e da qual são parte
integrante)115.

Contudo, e contrariando as teorias da unidade da pessoa coletiva, para efeitos


tributários, os estabelecimentos estáveis são entendidos como um património autónomo
da sociedade a que pertencem, não sendo por isso tributados em conjunto com os restantes
rendimentos daquela116.

112
Sobre esta distinção, vide (Pereira P. R., O papel do estabelecimento estável no Direito Fiscal
Internacional, 2013, pp. 572-573). Abordá-la-emos com maior detalhe nos capítulos sobre
Estabelecimento Estável Real e Estabelecimento Estável Agência, respetivamente.
113
Quanto a esta matéria, vide (Pereira P. R., Princípios do Direito Fiscal Internacional, Do Paradigma
Clássico ao Direito Fiscal Europeu, 2010, pp. 138-144).
114
A este propósito, (Teixeira M. D., 2007).
115
Ao contrário do que sucede com as filiais, sociedades afiliadas ou subsidiárias. Assim, os
estabelecimentos estáveis, por não terem personalidade jurídica, nunca são parte de qualquer contrato
que concluam. O sujeito que figura como parte em qualquer contrato será a sociedade matriz que
representam.
116
Esta autonomia patrimonial conferida pelo Direito Tributário, conexa com o princípio da tributação
como entidades independentes, subjacente ao regime previsto nos artigos 7.º e 9º do MC OCDE,
pressupõe que cada unidade de um grupo de empresas seja tratada como uma entidade autónoma e
independente das restantes. Para uma análise detalhada do princípio da tributação como entidades
independentes, vide (Pereira P. R., Em Torno dos Princípios do Direito Fiscal Internacional, 2015, pp. 240-
243) e, especificamente no caso português, (Teixeira M. D., 2007, pp. 49-91).

44
Verifica-se o apuramento do lucro tributável e o pagamento do correspondente
imposto relativamente a cada empresa associada ou estabelecimento estável,
individualmente considerada e enquanto empresa distinta e separada a exercer uma
atividade, independentemente de estar integrada um grupo empresarial internacional.

Este princípio cria, nas situações tributárias internacionais promovidas por


entidades relacionadas, as condições de base que permitem a conjugação com os
princípios relativos ao fundamento e à extensão do poder de tributar dos Estados,
procurando regular a divisão das receitas tributárias entre os vários Estados nos quais as
partes da empresa multinacional – sejam elas estabelecimentos estáveis ou empresas
associadas – desenvolvem a sua atividade117.

Nestes termos, estamos perante um tipo específico de não-residente (o não


residente com estabelecimento estável), cujas características e presença no território do
Estado fonte em muito se assemelham às dos seus residentes, justificando, em abstrato,
uma sujeição às regras tributárias semelhantes às aplicadas a estas últimas118.

Contudo, importa ter presente que, tratando-se de um sujeito passivo não-


residente, sem uma personalidade jurídica autónoma daquela sociedade matriz a que
pertence e exterior ao Estado da fonte, o regime fiscal do estabelecimento estável
apresenta, em regra, distinções relativamente ao aplicável aos sujeitos passivos
residentes119.

Independentemente dos tipos de estabelecimentos estáveis previstos, e da maior


ou menor cedência feita aos elementos que compõem a noção base do conceito de
estabelecimento estável, a característica apontada pela maioria da doutrina como
fundamental à subsunção de uma realidade ao conceito de estabelecimento estável é a
“fisicalidade”.

117
Nos termos dos artigos 9.º n.º 1 e 7.º n.º 2 do MC OCDE, respetivamente, são estabelecidas as regras
de determinação do rendimento tributável tanto de empresas associadas como de estabelecimentos
estáveis
118
Segundo GLÓRIA TEIXEIRA, “Regra geral, os lucros do estabelecimento estável são tributáveis segundo os
mesmos critérios de tributação aplicáveis às sociedades residentes. No entanto, poderão ser aplicadas
algumas disposições fiscais especiais” (Teixeira G. , Manual de Direito Fiscal, 2012, pp. 280-282).
119
Sobre o tratamento do não residente em Portugal como sujeito passivo de IRC, (Teixeira M. D., 2007,
pp. 16-20).

45
Em qualquer atividade, com qualquer duração, para existir um estabelecimento
estável exigir-se-ia a presença física. Assim, requer-se que a instalação em análise seja
corpórea, palpável e percetível ao olhar humano120.

Como adiante melhor desenvolveremos, a conceção de estabelecimento estável


implica, nos parâmetros tradicionais, a ocupação de um local, de um espaço físico.

O pendor na fisicalidade compreende-se pelo contexto em que foi criado


originalmente o conceito de estabelecimento estável – a segunda revolução industrial121
–, numa época em que a forma empresarial de agir era marcada pela necessidade da
presença física.

Todo o modelo e corpus legislativo que daí adveio regeu-se, naturalmente, pelo
elemento corpóreo e pela ocupação visível e palpável daí decorrentes. Trata-se de um
elemento ainda muito presente nos cânones do Direito Fiscal Internacional.

Contudo, hoje, tal como naquele período, vivemos um momento absolutamente


disruptivo na forma como a atividade das empresas e agentes económicos se desenvolve
e, consequentemente da economia.

A essencialidade da fisicalidade encontra-se em crise, pois já não se mostra


necessária a existência de um espaço físico para o livre desenvolvimento de uma atividade
económica.

Importará compreender, no âmbito deste admirável novo mundo da economia


digital, se, uma vez mais, se mostra possível, tal como se fez para os estabelecimentos
estáveis por ficção, proceder a uma espécie de interpretação adaptativa dos elementos
característicos da noção base de estabelecimento estável por forma a enxertar as novas
realidades, nomeadamente identificando elementos que permitam apurar graus mínimos
de presença (e, consequentemente de pertença económica) no território de um
determinado Estado.

120
Cf. (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, p. 253).
121
A propósito da contextualização do aparecimento do estabelecimento estável, (Skaar, 1991, p. 65 e
ss), (Pereira P. R., O papel do estabelecimento estável no Direito Fiscal Internacional, 2013, pp. 572-586),
(Cardona, 1995, pp. 250-256) e (Menezes Leitão L. M., 1999, pp. 138-139).

46
1.2.2.2.1. Estabelecimento Estável no Modelo de Convenção OCDE

A definição de estabelecimento estável encontra-se prevista no artigo 5.º do MC


OCDE, relevando a articulação com o artigo 7.º, o qual prevê os princípios relativos à
imputação do lucro ao estabelecimento estável.

Sobre o conceito de estabelecimento estável, duas teorias concorreram para a sua


definição: a teoria da realização, no âmbito da qual só seriam estabelecimentos estáveis,
as instalações que adquirissem ou realizassem um lucro, tendo portando um carácter
imediatamente produtivo; e a teoria da pertença económica, no âmbito da qual bastaria,
para a existência de um estabelecimento estável, que as instalações se inserissem na
economia de um Estado, independentemente do seu carácter imediatamente produtivo.

O MC OCDE, no seu artigo 5.º, que consagra a teoria da pertença económica,


muito embora esta sofra algumas limitações em nome da teoria da realização, define
estabelecimento estável como uma instalação fixa através da qual a empresa exerce toda
ou parte da sua atividade122.

Assim podemos identificar como características do estabelecimento estável a (i)


existência de uma instalação material, o (ii) de permanência da mesma, (iii) faça parte da
empresa; (iv) a qual deve exercer a sua atividade nesta instalação ou por meio dela.

Apresenta uma construção cuja ideia de “fisicalidade” surge como elemento central do
estabelecimento estável.

A título de exemplo, a ideia de “fisicalidade” como elemento central do


estabelecimento estável é fortemente veiculada através da permanente referência feita ao
elemento físico no artigo 5.º do MC OCDE e respetivos comentários:

 No parágrafo 4 dos comentários ao n.º 1 do artigo supra, a propósito do elemento


instalação, são mencionados, para o definir, termos como local, material,

122
No mesmo sentido, RITA CALÇADA PIRES ao referir que se encontra ausente da noção geral de
estabelecimento estável a “exigência de produtividade da instalação. Não foi aqui aceite a teoria da
realização, mediante a qual um E.E. só seria E.E. quando a sua exploração gerasse directamente um
benefício. Pelo contrário, o disposto nas primeiras disposições do artigo 5.º revela a adopção da teoria da
pertença económica. Segundo esta teoria, e como se viu, permite-se que toda e qualquer estrutura
económica situada num pais possa vir a ser considerada E.E., mesmo que contribua apenas
indirectamente para a produção do lucro empresarial” (Pires R. C., Tributação Internacional do
Rendimento Empresarial, 2011, p. 239).

47
instalação, espaço. Estes conceitos carregam uma exigência de “fisicalidade”. Só
existem pela presença de um elemento físico que lhes dá forma;
 No parágrafo 5 dos comentários ao n.º 1 do artigo supra, a propósito da referência
a fixa, quando afirma a necessidade de uma ligação entre a instalação e um ponto
geográfico, recorre-se, uma vez mais, à ideia de “fisicalidade”;
 No n.º 2 do artigo em apreço, todos os exemplos apresentados têm uma natureza
física e dependem da presença dos requisitos exigidos para efeitos do n.º 1 (cf.
parágrafo 12 dos comentários ao n.º 2 do artigo), o que reforça a exigência de
“fisicalidade” e de consideração de um elemento geográfico;
 No caso das ficções de estabelecimento estável, no caso da cláusula relativa ao
estaleiro de construção, ainda que contornando o elemento fixidez, valorizando o
elemento temporal, insiste-se na “fisicalidade” ao prever-se a necessidade de
mobilidade do estaleiro permanente e ao apelar a uma avaliação da unidade/
coerência comercial e geográfica123.

Contudo já não se retira daquela definição de estabelecimento estável qualquer


exigência de produtividade ou rentabilidade associadas àquela instalação fixa. Facto é
que o carácter produtivo da atividade não foi acolhido na definição do MC OCDE,
afastando-se, por conseguinte, a teoria da realização.

Como sublinha NEUSA LIQUITO, a “importância da contextualização do


Estabelecimento Estável não se esgota no binómio tributação na fonte / tributação na
residência, nem na tentativa de eliminação atenuação da dupla tributação internacional”,
ou seja, “não se encontra unicamente em «jogo» a capacidade de tributação, mas qual a
jurisdição a quem compete proceder à isenção, quem deve suportar o desconto de créditos,
entre as diversas problemáticas que envolvem esta questão”124.

123
Cf. (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, p. 158).
124
(Liquito, 2010, p. 779).

48
1.2.2.2.1.1. Estabelecimento Estável Real125

Numa alusão ao tipo de organização do estabelecimento estável, os


estabelecimentos reais126 reconduzem-se à ideia de instalação fixa, associada a requisitos
de fisicalidade, fixidade e permanência.

A regra geral para verificar da existência de um estabelecimento estável encontra-


se prevista no n.º 1, 2 e 4 do art.º 5.º do MC OCDE. Nos termos do n.º 1 daquele
normativo, um estabelecimento estável é uma instalação fixa através da qual a empresa
exerça toda ou parte da sua atividade. É consensual a necessidade de verificação
cumulativa de três elementos para que estejamos na presença de um estabelecimento
estável: i) a existência de uma instalação; (ii) a fixidez dessa mesma instalação; e (iii) o
exercício da atividade da empresa através dessa instalação fixa127.

O confronto com o conceito de instalação fixa deixa-nos perante um conceito por


natureza indeterminado128 e, por isso mesmo, agregador de diversas realidades.

Não existindo uma fórmula que nos permita de imediato reconhecer uma
instalação fixa, enquanto elemento característico e obrigatório de um estabelecimento
estável, o legislador, quer nacional quer internacional, optou por fazer uma referência a
diversas realidades que, por terem associadas uma certa estrutura física, consubstanciam
em si mesmo um estabelecimento estável.

Assim, conforme o disposto no n.º 2 do art.º 5.º do CIRC e do n.º 2 do art.º 5 da


MC OCDE, a expressão estabelecimento estável compreende nomeadamente: (i) um local
de direção; (ii) uma sucursal; (iii) um escritório; (iv) uma fábrica; (v) uma oficina e (vi)
uma mina, um poço de petróleo ou gás, uma pedreira ou qualquer outro local de extração
de recursos naturais.

125
Ou estabelecimento estável por natureza ou conceito básico, cf. (Pires R. C., Tributação Internacional
do Rendimento Empresarial, 2011, p. 239).
126
Designa-se de estabelecimento estável real por referência à expressão “res”, que significa “coisa”, que
exprime a ideia de uma instalação física.
127
Cf. RITA CALÇADA PIRES, “Da conjugação destes três elementos resulta um E.E. quando as instalações de
uma empresa se inserirem na economia de um país, independentemente do seu imediato carácter
produtivo” (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, p. 239). No mesmo
sentido, (Cardona, 1995, p. 259)
128
Carecendo por isso de ser preenchido.

49
De todo o modo, e não obstante a falta de regras que nos levem a definir
exatamente o que é uma instalação fixa129, os comentários relativos aos artigos da MC
OCDE promovidos pelos diferentes Estados parte desta organização permitem
compreender a ratio que subjaz à utilização daquela expressão.

Nos termos dos referidos comentários, por “instalação” entende-se todo e


qualquer local e, nalguns casos, material (maquinaria e equipamento), utilizados no
exercício das atividades da empresa130, independentemente de estarem ou não afetos
exclusivamente a esse fim.

Por “fixa” entende-se um local físico determinado, ou seja, uma ligação entre a
“instalação” e um certo ponto geográfico131, com um certo grau de permanência132.

O caracter permanente associado à instalação fixa implica uma ideia de


regularidade, o que não significa que a atividade desenvolvida pela entidade através do
estabelecimento não possa ser interrompida e posteriormente retomada. Não poderá, isso
sim, ter um carácter meramente temporário133.

Por outro lado, para que se considere a existência de um estabelecimento estável,


exige-se que a empresa exerça a sua atividade através dessa mesma instalação fixa, ou
seja, exige-se uma ligação intrínseca entre a organização física e a atuação empresarial.
Significa isto, num critério que estará em falência do ponto de vista técnico, que as
pessoas que que dependem da empresa (o pessoal) exercem as atividades da empresa no
Estado onde está situada a instalação fixa134.

129
O que poderá ser entendido como uma vantagem. Uma definição muito rígida de instalação fixa
deixaria, certamente, de fora muitas realidades que a ela poderiam ser reconduzidas pela partilha de
diversos elementos comuns a ambas.
130
Cf. parágrafos 4, 4.1 e 4.2 dos comentários ao n.º 1 do art.º 5.º do MC OCDE (OCDE C. , MC OCDE, junho
2015, pp. 146-147). Do exposto, o mais relevante parece ser a verificação do controlo efetivo do espaço.
Assim, tentar-se-á evitar a manipulação dos dados pelo contribuinte com objetivos evasivos ou
fraudulentos.
131
Acrescenta MARIA CELESTE CARDONA que, “Conexionado com este elemento deve ter-se em atenção, para
efeitos de qualificação de certa instalação fixa como estabelecimento estável, que é fundamental a
«intenção» (elemento subjetivo) que preside à ligação com certo espaço geográfico” (Cardona, 1995, p.
262).
132
Cf. parágrafos 5, 5.1 e 6 dos comentários ao n.º 1 do art.º 5.º do MC OCDE (OCDE C. , MC OCDE, junho
2015, pp. 151-160).
133
Sobre este elemento, vide (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, p.
242).
134
Cf. parágrafos 2, 7 e 10 dos comentários ao n.º 1 do art.º 5.º do MC OCDE (OCDE C. , MC OCDE, junho
2015, pp. 146, 152 e 154).

50
Do exposto ressalva a presença de uma certa fixidade e fisicalidade135 do conceito
de instalação fixa e, por via de regra, do conceito de estabelecimento estável tradicional.

Entende-se assim por instalação fixa todo e qualquer espaço físico ou


equipamento através do qual uma entidade exerce a sua atividade com um certo grau de
permanência.

No âmbito do referido artigo, para além da definição geral, são apresentados


diversos exemplos de estabelecimentos estáveis e, bem assim exceções. Os exemplos
apresentados – lista positiva – abrangem um local de direção, uma sucursal, um escritório,
uma fábrica, uma oficina, uma mina, um poço de petróleo ou gás, uma pedreira ou
qualquer outro local de extração de recursos naturais e, por fim, um estaleiro de
construção ou de montagem, cuja duração exceda doze meses.

Para alguma doutrina, a esta enumeração exemplificativa subjaz uma presunção


iuri et de jure de estabelecimentos estáveis. Como tal, estariam aqueles exemplos
dispensados de qualquer exercício de concordância com os requisitos decorrentes da
noção geral de estabelecimento estável136. Ou seja, a simples inclusão daqueles exemplos
na referida enumeração seria o bastante para a sua classificação (automática) enquanto
estabelecimento estável.

Compreende-se que os exemplos apresentados o sejam, na medida em que, na


prática, corresponderão grosso modo aos requisitos decorrentes da noção geral de
estabelecimento estável. De todo o modo, não podemos concordar com tal visão. Pelo
contrário, aqueles exemplos, como qualquer outro caso, só deverão ser considerados
estabelecimentos estáveis se corresponderem à noção geral de estabelecimento137.

Nestes termos, tratar-se-ão, isso sim, de presunções ilidíveis da existência, num


dedo Estado, de um estabelecimento estável. No mesmo sentido, veja-se o parágrafo 12
dos comentários ao n.º 2, do art.º 5.º do MC OCDE, ao considerar que aquelas instalações

135
Aquilo a que ALBERTO XAVIER chama de “fixidez, necessária para que o estabelecimento se considere
estável (Xavier, 2011, p. 312).
136
Cf. (Pires M. , 1984, p. 746). No mesmo sentido, refere MARIA CELESTE CARDONA que, os “exemplos
incluídos na enumeração constante do parágrafo 2 do artigo 5.º beneficiam de uma presunção de jure,
por razões de segurança jurídica, não admitindo em consequência qualquer prova em contrário, no
sentido da existência de um estabelecimento estável” (Cardona, 1995, p. 260).
137
Cf. (Xavier, 2011, p. 339) e (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, p.
244).

51
“só constituem estabelecimento estável se satisfizeram as condições estipuladas no
número 1” (relativo à noção geral)138.

Como referido, a par de uma lista (positiva) de exemplos encontra-se, no n.º 4 do


referido artigo, uma lista (negativa) de exceções à noção geral de estabelecimento estável,
atendendo ao carácter preparatório ou auxiliar da atividade do ente coletivo associado a
essas instalações fixas139.

Ora, para existir estabelecimento estável real (ou por natureza), a atividade
desempenhada não pode consistir numa atividade preparatória ou auxiliar. Esta exigência
surge na sequência de elementos como a permanência, a substancialidade, bem como a
consistência no exercício de uma atividade serem essenciais para se estar perante um
estabelecimento estável.

Nestes termos, o critério decisivo para a qualificação de uma atividade como


auxiliar ou preparatória será saber se a atividade em questão é, em si mesma, parte
essencial e significativa das atividades da empresa em conjunto140 – critério da
essencialidade141. O que implicará, necessariamente, uma análise casuística.

Por outro lado, as exceções à noção geral de estabelecimento estável


correspondem, na prática, a instalações sem carácter produtivo, configurando um
modesto recurso à teoria da realização.

1.2.2.2.1.2. Estabelecimento Estável Agência

O n.º 3 e 5 do artigo 5.º do MC OCDE prevê o designado estabelecimento estável


por ficção, o qual se reconduz, essencialmente, a duas figuras: o estabelecimento estável

138
Como refere Rita CALÇADA Pires, nos parágrafos 12 a 15 dos comentários ao n.º 2 do art.º 5.º do MC
OCDE “vislumbra-se a preocupação de enfatizar que os exemplos apresentados devem ser conjugados
com as exigências previstas no primeiro número, pois só se estiverem de acordo com essas exigências
incorporarão o conceito de E.E., com todas as consequências de tributação envolvidas” (Pires R. C.,
Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, p. 244).
139
Para uma análise mais pormenorizada dos elementos negativos do conceito de estabelecimento
estável, (Cardona, 1995, pp. 263-266).
140
Segundo MARIA CELESTE CARDONA, esta “qualificação está, no entanto, dependente da natureza
estatutária das actividades prosseguidas pela empresa. Com efeito é através da análise da relação
existente entre a actividade económica da empresa, consagrada no seu objecto social, e, as outras
actividades por ela desenvolvidas, que deverá ser aferido o carácter auxiliar ou preparatório destas
últimas” (Cardona, 1995, p. 264).
141
Cf. (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, p. 245) e parágrafo 24 dos
comentários ao n.º 4 do art.º 5.º do MC OCDE (OCDE C. , MC OCDE, junho 2015).

52
projeto142 e o estabelecimento estável agência. Com interesse para o presente trabalho,
destacaremos apenas este último. Contudo importa apresentar alguns considerandos
prévios sobre estas figuras.

Desde logo se refira que o aparecimento deste tipo de estabelecimento estável se


deveu à insuficiência e rigidez do conceito tradicional de estabelecimento estável real (ou
por natureza) em acomodar outras realidades empresariais e económicas que tendem a
fugir àquela conceção.

Assim, de forma a relacionar algumas destas realidades no conceito de


estabelecimento estável (assim fundamentando o poder de tributação do Estado) operam-
se as cedências necessárias para o efeito, num processo designado pela doutrina de
desvalorização de elementos exigidos no estabelecimento estável tradicional e
consequente sobrevalorização de outro ou outros dos elementos tradicionais presentes nas
realidades em análise143. Porem, independentemente dos elementos que possam ser
desvalorizados, pelo menos com um dos elementos não se realiza qualquer tipo de
compromisso: a atividade exercida por um estabelecimento estável não pode constituir
uma atividade preparatória ou auxiliar.

Assim, relativamente ao tipo de organização do estabelecimento estável, o Direito


Fiscal Internacional e, bem assim, a maioria das ordens jurídicas internas de cada Estado,
preveem, ainda, a existência de estabelecimentos estáveis que não implicam a presença
de uma instalação física. In casu, uma pessoa, singular ou coletiva, sem necessidade de
ser residente ou ter uma instalação fixa no Estado em que atua144, que não seja um agente
independente, atua no território de um Estado por conta de uma empresa não residente,
no âmbito normal da sua atividade, reconhecendo-se-lhe poderes de intermediação e de
conclusão de contratos que vinculem a referida empresa, no âmbito das atividades desta.
São os denominados estabelecimentos pessoais ou agência, uma vez que utiliza a

142
Ou cláusula do estaleiro de construção (cláusula de construção), na terminologia usada por RITA
CALÇADA PIRES (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, p. 246).
143
Para uma análise mais detalhada do tema, (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento
Empresarial, 2011, pp. 246-252).
144
Cf. parágrafo 32 dos comentários ao n.º 5 do art.º 5.º do MC OCDE (OCDE C. , MC OCDE, junho 2015,
p. 166).

53
existência de um agente dependente como modo alternativo para a presença de um
estabelecimento estável real em determinado território145.

Para esta solução, em muito contribuiu a constatação de que o exercício da


atividade de uma empresa não residente num determinado Estado, através de um
intermediário aí presente, poderá ser um forte indício de uma certa conexão com esse
Estado.

De tal forma, que se reconhece que a atividade da empresa se desenvolveu através


daquele estabelecimento estável de caráter pessoal146, legitimando a tributação do
rendimento realizado por parte daquele Estado como se o mesmo fosse impotável a uma
organização de pessoas e bens equiparada, para efeitos fiscais, a uma empresa
independente (da sede), ou seja, como se fosse imputável a um património autónomo,
análogo à sucursal de pessoa coletiva residente no estrangeiro147.

O Estabelecimento estável agência funciona como uma ficção que contorna a


exigência de uma instalação fixa. Como alternativa a este critério, exige-se a
habitualidade, de modo a valorizar o elemento temporal clássico da permanência148.

Neste âmbito, importa distinguir entre representantes independentes e


representantes dependentes, desde já se adiantando que apenas estes últimos são
estabelecimentos estáveis.

Ao contrário dos primeiros, os representantes dependentes são investidos dos


poderes que lhes permitam celebrar contratos em nome da empresa, dependendo
economicamente desta e estando sujeito à sua direção, sendo remunerado através de um
salário fixo. Neste aspeto, os representantes independentes gozam de maior autonomia,
sendo livres na forma como gerem e organização a sua atividade, podendo escolher
colaboradores e clientela sendo, habitualmente, remunerados por uma comissão.

Nestes termos, apenas no caso do representante dependente149 se presume que o


rendimento tem origem no Estado em que aquele atua, tributando-se como se ele fosse

145
Cf. parágrafo 31 e 35 dos comentários ao n.º 5 do art.º 5.º do MC OCDE (OCDE C. , MC OCDE, junho
2015, p. 166 e 168).
146
Por contraposição ao estabelecimento estável de caráter real.
147
Cf. (Xavier, 2011, p. 316).
148
Cf. RITA CALÇADA PIRES (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, p. 249) e
parágrafo 33.1 e 32 dos comentários ao n.º 5 do art.º 5.º do MC OCDE (OCDE C. , MC OCDE, junho 2015,
p. 168 e 166).
149
Ou “agente”, na formulação utilizada pelo MC OCDE.

54
imputável a uma organização de pessoas e bens equiparada, para efeitos tributários, a
empresa independente, ou seja, como se fosse imputável a uma pessoa jurídica residente
naquele Estado150.

Como referido, associado ao conceito de estabelecimento estável pessoal, está a


ideia de “regularidade” na representação da empresa feita por uma pessoa ou, no caso do
direito português, de “representação habitual”, assim se distinguindo do conceito amplo
de representante no qual se incluem todos e quaisquer intermediários cuja função é
facilitar os negócios de outrem151.

Assim, como refere ALBERTO XAVIER, de forma consentânea com o disposto no


direito interno e no MC OCDE, para que exista “estabelecimento estável pessoal, não
basta a existência de alguém com poderes de representação. É ainda necessário que a
representação seja «habitual», ou seja, que o exercício dos poderes se dê, de modo regular
e constante, não se limitando à prática de actos isolados”152.

1.2.2.2.1.3. Situação dos Grupos de Sociedades

Determina o n.º 7 do art.º 5 do MC OCDE que, “O facto de uma sociedade


residente de um Estado Contratante controlar ou ser controlada por uma sociedade
residente do outro Estado Contratante ou que exerce a sua actividade nesse outro Estado
(quer seja através de um estabelecimento estável, quer de outro modo) não é, só por si,
bastante para fazer qualquer dessas sociedades estabelecimento estável da outra”.

Ou seja, desde logo se estabelece que a existência de uma afiliada não constitui,
por si só, um elemento que a reconduza a um estabelecimento estável da sociedade sede
(matriz), em virtude de a afiliada constituir uma entidade jurídica independente.

Aliás, o próprio facto de a atividade da afiliada ser dirigida pela sociedade sede (matriz)
não faz da afiliada um estabelecimento estável desta153. Não existe essa correlação direta.

150
Cf. (Xavier, 2011, p. 342).
151
Sobre os diversos tipos de representantes, vide (Brito, 1990, p. 101 e ss).
152
Cf. (Xavier, 2011, p. 322).
153
Cf. parágrafo 40 dos comentários ao n.º 7 do art.º 5.º do MC OCDE (OCDE C. , MC OCDE, junho 2015,
p. 173).

55
Na esteira de RICARDO REIGADA PEREIRA, e por forma a prevenir interpretações
“mais arrojadas – como aquelas que foram ensaiadas em Itália154 – alteraram-se os
Comentários ao Modelo de Convenção Fiscal sobre o Rendimento e o Património da
OCDE de forma a clarificar que a existência num Estado de um estabelecimento estável
de uma sociedade do grupo não será relevante no que diz respeito a saber se uma outra
sociedade do grupo possui um estabelecimento estável nesse Estado155”.

1.2.2.2.2. Conclusões sobre o Conceito de EE

A crescente facilidade e liberdade de circulação de pessoas, bens, serviços e


capitais (que conheceu um grande impulso com a globalização) confrontou os Estados
com uma nova realidade.

Os factos tributários, ao contrário do que acontecia antes, passaram a ter conexões


com diferentes Estados e, consequente com diferentes ordens jurídico-fiscais. Ou seja,
diferentes Estados passaram a reconhecer o direito de tributar um mesmo facto tributário,
em virtude da existência de uma conexão entre aquele e o seu território.

Passámos a observar colisões ente normas de Direito interno que podem criar uma
dupla tributação jurídica relativamente ao mesmo facto tributário, dando origem à
constituição de mais do que uma obrigação de imposto, quando esse facto apresente uma
conexão com mais do que uma ordem jurídica (situações internacionais).

De forma simplista, o DFI surge pela necessidade de regular as relações fiscais


entre Estados e, consequentemente, dirimir conflitos entre soberanias ocasionados pelas
situações de vida conexas com mais do que um ordenamento tributário soberano.

Neste sentido, e através do universo de princípios e normas característicos do DFI,


houve a necessidade de definir a repartição/ distribuição do poder de tributar dos Estados.

154
Acórdão do Supremo Tribunal Italiano n.º 3368, 20 de dezembro de 2001 a 7 de março de 2002.
155
Cf. (Pereira R. R., 2014-2015).

56
A tributação internacional, relativamente ao reconhecimento e à repartição de
competências tributárias, recorre, sobretudo, à residência do contribuinte ou à fonte do
rendimento156, considerados por referência a um território.

A jurisdição fiscal surge intimamente ligada ao espaço territorial e a tudo o que


nele se gera e situa.

É da interseção e articulação entre o princípio da residência e o princípio da fonte


(e dos correspondentes elementos de conexão) que surge o princípio do estabelecimento
estável.

Nomeadamente no contexto da tributação de rendimentos empresariais, é


amplamente reconhecido o princípio do estabelecimento estável enquanto elemento de
conexão relevante para fundamentar o poder de tributar do Estado157.

Essa tributação deriva da existência de uma forte ligação económica (pertença


económica ou economic allegiance) do facto tributário a determinado território
corporizada, neste caso, pelo estabelecimento estável.

Do que foi referido sobre o estabelecimento estável, nomeadamente por referência


ao denominado estabelecimento estável real, podemos concluir que este resulta,
tradicionalmente, da combinação entre o (i) lugar fixo de negócios, a (ii) presença física
e a (iii) natureza da atividade negocial158. A esta tríade poder-se-ia juntar a componente
humana, por relação às pessoas que dependem da empresa, exercendo as atividades desta
no Estado onde está situada a instalação fixa – desta forma também se justificando a
ligação entre determinada atividade e o Estado.

Desta combinação resultará um limiar mínimo de presença que justificará a


tributação daí resultante.

Mesmo tratando-se o estabelecimento estável de um conjunto de elementos já


referidos anteriormente, grande parte da doutrina identifica como elemento central do
conceito a “fisicalidade”.

156
Exemplo disso é a utilização no MC OCDE, instrumento de grande importância no contexto
internacional dos conceitos de residência e de fonte como forma de distribuição do poder tributário dos
Estados Contratantes.
157
Cf. (Pereira P. R., O papel do estabelecimento estável no Direito Fiscal Internacional, 2013, p. 571).
158
Cf. (Arnold, Threshold requirements for taxing business profits under tax treaties, 2003, p. 483 a 488).

57
Sendo certo que no estabelecimento estável tradicional a “fisicalidade” sempre foi
um elemento importante é, também, e ao mesmo tempo, o mais rígido. Foi justamente a
insuficiência e rigidez atribuída ao conceito tradicional de estabelecimento estável (real
ou por natureza), em acomodar outras realidades empresariais, económicas e comerciais
que tendem a fugir àquela conceção, que motivou a eclosão de outras formulações do
conceito de E.E. (estabelecimento estável projeto, estabelecimento estável agência).

De forma a acomodar diversas realidades emergentes, operou-se, então, um


conjunto de cedências necessárias para o efeito, num processo muitas vezes designado
pela doutrina de desvalorização de elementos exigidos para a existência de um
estabelecimento estável tradicional (nomeadamente, a presença de uma instalação fixa),
e a consequente valorização de outro ou outros elementos tradicionais (como por
exemplo, a natureza da atividade desenvolvida).

Não obstante o reconhecimento da “fisicalidade” enquanto elemento com


profundo lastro na construção do conceito de estabelecimento estável, o decorrer do
tempo associado ao fenómeno da globalização, tem demonstrado a crescente
incapacidade daquele conceito em acomodar novas realidades e a responder às
necessidades que delas resultam.

A par da “fisicalidade”, importa destacar outros elementos característicos da


figura do estabelecimento estável: substância sobre a forma, a permanência e o carácter
nuclear da atividade.

Com a prevalência da substância sobre a forma, pretende-se que a realidade


considerada seja efetivamente a de um estabelecimento estável (tenha dimensão
económica, comercial), recusando-se a mera aparência como forma de manipulação ou
adulteração da sua natureza com impacto na tributação.

Através desta característica, o estabelecimento estável apresenta-se como uma


forma efetiva de organização, necessária à efetivação da tributação internacional. Assim,
para que a situação existente seja considerada um estabelecimento estável, importa
preencher todos os requisitos exigidos, não podendo haver qualquer dúvida, incerteza,
inconsistência e ineficácia do elemento de conexão.

Uma outra característica do estabelecimento estável, é a permanência, ou melhor,


a exigência da mesma, assim se recusando a transitoriedade da atividade desempenhada

58
na fonte. Não fará sentido aplicar uma tributação regular, e os mecanismos de controlo
inerentes, no caso de atividades desenvolvidas de forma ocasional ou isolada 159, daí que
as atividades económicas desenvolvidas por um não-residente impliquem, para que exista
uma conexão relevante, a continuidade da intervenção dos agentes no mercado.

Por último, temos o carácter nuclear da atividade, ou seja, e no seguimento da


prevalência da substância sobre a forma e da permanência, existe a necessidade de a
atividade do estabelecimento estável ser significativa e com profundo impacto na
interação económica. A recusa em associar o estabelecimento estável a atividades
preparatórias ou auxiliares releva o carácter nuclear da atividade a ser desenvolvida pelo
estabelecimento estável.

Contudo, e tendo em conta as características assinaladas e a importância das


mesmas na construção da figura do estabelecimento estável, estamos perante um conceito
que exige uma especial análise casuística, de forma a verificar a presença efetiva dos
requisitos exigidos160.

Considerando que o conceito de estabelecimento estável não comporta todas as


realidades possíveis161, o mesmo terá de ser flexível o suficiente para se adaptar à
tipologia e substancialidade das atividades em causa. Sob pena de rapidamente perder a
aplicabilidade prática.

Em função desde quadro, o especial cuidado exigido na aplicação do conceito de


estabelecimento reflete a necessidade de manter alguma coerência no regime evitando
assim uma abusiva utilização do conceito, quer no sentido de legitimar o poder de tributar
quer no sentido de o afastar.

De todos os elementos analisados, rapidamente se conclui que a fisicalidade e a


permanência serão aquelas que colocarão mais dificuldades no confronto com a
economia digital, pois esta (nova) realidade desenvolve-se maioritariamente num mundo

159
Como nos ensina RITA CALÇADA PIRES, “Uma actuação isolada apenas dará lugar a tributação se se estiver
perante o plano nacional e um residente” (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento
Empresarial, 2011, p. 255).
160
Sobre a aplicabilidade do conceito de estabelecimento estável ao caso concreto, vide (Pires R. C.,
Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, pp. 255-257).
161
Sobretudo num contexto empresarial, cuja atividade e formas de organização são premiáveis a
múltiplos fatores económicos, políticos, jurídicos, tecnológicos.

59
virtual onde a presença física e mecanismos contínuos de intervenção dos agentes não são
uma realidade162.

Por ser hoje elemento nuclear na estrutura do comércio internacional, releva


perceber o impacto que as mudanças sofridas no comércio internacional têm no
estabelecimento estável.

RITA CALÇADA PIRES fala, por referência ao mundo virtual, no desprendimento da realidade física e de
162

uma “monocontinuidade” (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, p. 257).

60
Capítulo 2. A economia digital

A economia digital é indissociável do fenómeno da globalização. Assim, para que


se compreenda a primeira, importa compreender esta última.

A forma e os meios através dos quais a economia se desenvolve e, bem assim, a


maneira como percecionamos a realidade económico-financeira163, mudaram em virtude
da globalização.

Em virtude dos impactos no mundo hodierno, hoje reconhecidos, a globalização


suscita amores e desamores: se por um lado a ela podemos reconduzir muitos dos avanços
que temos vindo experienciar nas últimas décadas164, parece ser também correta a
afirmação de que a ela devemos muitas das tensões inter-estaduais hoje existentes165.

A fiscalidade não foi imune ao fenómeno da globalização, tendo também sido


contagiada. Como refere RITA CALÇADA PIRES, a “globalização surge como um fenómeno
multidisciplinar, acolhendo todas as áreas em que o ser humano se vê envolvido e não
apenas na vertente das relações económicas”166.

Não se trata de um processo etéreo desenvolvido num ambiente asséptico. É, sim,


profundamente marcado por valorações socio-culturais e politico-ideológicas167. Razão
pela qual a globalização se assume como uma realidade demasiado abrangente e
complexa, avessa a uma definição inequívoca, completa e objetiva 168.

163
Entre outras.
164
Sobre as potencialidades da globalização, vide (Stiglitz, Making Globalization Work, 2006).
165
Neste sentido, (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, p. 36 e ss).
166
Cf. (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, p. 38). Assim, a par da
denominada globalização económica, podemos também identificar a globalização social, a globalização
política e a globalização cultural. Sobre estes tipos de globalização, vide (Santos B. d., 2002).
167
Sobre a história, evolução e efeitos da globalização, vide (Pires R. C., Tributação Internacional do
Rendimento Empresarial, 2011, pp. 40-54).
168
De todo o modo, e como acontece noutros casos, são múltiplas as tentativas de explicar o fenómeno
da globalização A propósito, a doutrina tem vindo a identificar, fundamentalmente, três escolas: os
HiperGlobalistas, os Céticos e os Transformistas. Quanto a este tema, refira-se apenas que a escola dos
Transformistas parece a mais condizente com o que foi dito anteriormente, na medida em que entende
a globalização como um fenómeno não apenas adstrito à economia, mas transversal a diversas áreas,
reconhecendo a complexidade e pluralidade do fenómeno. Na busca por uma definição de globalização,
e pela identificação de elementos que pela sua constante presença a possam caracterizar, esta tem sido
associada aos conceitos de heterogeneidade, pluralismo, democracia, liberalismo/ neoliberalismo,
tecnologia, inovação, conhecimento, interdependência, mobilidade e globalidade. Para desenvolvimento
do tema, vide (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, pp. 38-40).

61
Recorrendo a uma expressão muito comum, sempre se diga que a globalização
consubstancia uma quebra das barreiras tradicionais do espaço e do tempo.

A mobilidade domina o mundo global169. As fronteiras físicas tendem a esbater-


se, deixando gradualmente de ser um obstáculo ao desenvolvimento de uma atividade.

Esta ideia de mobilidade170 faz surgir novas realidades que, por um lado, consubstanciam
verdadeiros desafios para os Estados, tendencialmente alicerçados em estruturas datadas
no tempo e com isso acarretando uma maior morosidade na adaptação à nova conjuntura
entretanto criada, por outro, um manancial de oportunidades, sobretudo para empresas e
agentes económicos.

Um dos desafios associados à mobilidade (intensificada pelas novas tecnologias), com o


qual a fiscalidade se depara, é a degradação da base territorial do tributo, ou seja, das
bases171 sobre as quais deverá incidir o imposto172.

A mobilidade, hoje muito associada ao capital e ao trabalho, possibilita a transferência de


rendimentos de um Estado para outro, diminuindo fortemente os níveis de receita gerada
pela tributação dessa realidade173.

A globalização foi, e é, muito potenciada pela tecnologia e pelos impactos desta


nos meios de comunicação. O constante desenvolvimento tecnológico arrasta
naturalmente consigo o desenvolvimento dos meios de comunicação, permitindo a
evolução e longevidade de um processo complexo e multidisciplinar como é a
globalização174.

169
Hoje fortemente potenciado pelas TIC – Tecnologias de Informação e comunicação.
170
Para além da mobilidade, podem ser apontados outros elementos caracterizadores da globalização
como sendo os elementos nucleares que influenciam o Direito Fiscal, nacional e internacional, a saber: (i)
a tecnologia; (ii) os novos atores do poder nacional e internacional; (iii) a interdependência e (iv) o
enfraquecimento do poder público (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial,
2011, p. 94).
171
O rendimento, o património e a despesa.
172
A mobilidade prossupõe um menor vínculo a um território. Assim, a base sobre qual recai o tributo
diminui, diminuindo também o montante sobre o qual o imposto deveria recair e, consequentemente, o
quantitativo resultante da sujeição fiscal.
173
Cf. Sobre a mobilidade desenvolveremos mais adiante.
174
“O progresso da globalização, e a envolvente tecnológica que a possibilita e fomenta, juntamente com
a menor dependência dos constrangimentos geográficos, têm operado uma redistribuição de poder da
esfera pública para a esfera privada e da comunidade para o individuo. Os estados nacionais vêem a sua
liberdade de acção corroída e o alcance efectivo da sua soberania limitado, ao mesmo tempo que os
indivíduos, as empresas e os demais agentes privados adquirem crescente poder efectivo e uma mais lata
margem de manobra” (Bento, 2004, p. 132).

62
O desenvolvimento dos meios de comunicação permite também uma maior e mais
rápido acesso à informação, quer em qualidade quer em quantidade175. Não basta o acesso
a informação. Exige-se que essa informação seja adequadamente tratada, pois só assim
se estrai conhecimento e se gera valor176.

Esta interdependência entre tecnologia, comunicação, informação e conhecimento


tem sobretudo expressão nas denominadas TIC – Tecnologias de Informação e
Comunicação177, as quais, marcadamente preocupadas com a maximização da economia
e com a eficiência e eficácia dos processos178, geram novos modelos de organização e
gestão179. Este fenómeno de transformação está na origem da economia digital.

A economia digital, resultado de uma sociedade global fortemente acompanhada


pelo desenvolvimento das tecnologias de informação, favorece a interdependência das
estruturas económicas na medida em que as fronteiras físicas não constituem mais entrave
para o desenvolvimento de uma atividade.

A desmaterialização advogada pela economia digital revela-se um traço


característico seu. Esta desmaterialização é marcada pela digitalização e pela natureza
intangível do processo económico e comercial e, bem assim, por uma reduzida
necessidade de presença física.

175
“As novas tecnologias vieram, de facto, alterar de fora radical o mundo e a percepção do mundo. De
uma economia de base industrial, assente na matéria, em átomos, transita-se para uma economia em que
o factor imaterial – dados, informação, conhecimento técnico-científico, bits – ganha proeminência e se
transforma, ele mesmo, num produto com valor económico, virtualmente comercializável. Indústria da
informação, nova economia são, aliás, expressões que procuraram, ainda que de forma parcelar, dar
conta destes fenómenos. De forma mais ampla, é, aliás, corrente falar-se não apenas de economia ou
indústria da informação, mas de era da informação e de sociedade de informação” (Santos A. C.,
Sociedade de informação, globalização e desenvolvimento: paradoxos da crescente complexidade do
mundo, 2007, p. 30).
176
Sobre a importância da informação, vide (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento
Empresarial, 2011, p. 43 e ss) e (Castells, 2004, p. 35 e ss).
177
Doravante, TIC.
178
Cf. (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, p. 47).
179
Como nos ensina RITA CALÇADA PIRES, “A economia como uma economia global, privilegiada na relação
com as novas tecnologias e o impacto que estas produzem no universo económico, coloca a questão de
saber se se está perante uma nova economia. Em 1997, Kevin Kelly, redactor de uma revista especializada
em novas tecnologias, publicou um artigo (artigo que resultou em livro – New rules for the new economy.
10 radical strategies for a connected world) onde apelava ao nascimento de uma nova economia
caracterizada por ser uma economia global, que privilegia os objetos imateriais e é marcada pela
interconexão e conectividade. Depois de uma temporada de recusa, por parte dos economistas, quanto
ao nascimento de uma nova economia, verifica-se, atualmente, uma crescente tendência para a admitir”
(Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, pp. 47-48).

63
A presença física deixa de ser determinante para a realização do negócio. O
envolvimento tecnológico no processo económico e comercial permite um processo de
intangibilidade de bens e serviços e, consequentemente, de afastamento do elemento
físico, com o objetivo de derrubar as barreiras próprias da distância geográfica e temporal.

A ausência de barreiras físicas conjugada com a rapidez das comunicações


permite a presença dos negócios virtualmente em qualquer parte do mundo. Permite-se o
acesso a mercados até então inacessíveis pelos elevados custos de implementação da
presença física que representavam para as empresas. Mas também novos mercados são
suscetíveis de serem criados.

Com efeito, a internet assume-se, enquanto exemplo máximo da economia digital,


um verdadeiro mercado e não um elemento apenas acessório e auxiliar.

Para melhor compreender a economia digital e o seu impacto no Direito Fiscal


(nacional e internacional), nomeadamente nos elementos de conexão, importa referir
algumas das suas características distintivas.

2.1. As principais características da economia digital

“A economia está a tornar-se digital”. Começa assim o relatório do Grupo de


Peritos da Comissão Europeia sobre a Tributação da Economia Digital180.

E refere ainda que, “Digitalisation of products and services shortens distances


between people and things. It increases mobility. It makes network effects decisive. It
allows the use of specific data to such an extent that it permits the satisfaction of
individual customer needs – be it consumers or businesses. It opens up ample
opportunities for innovation, investment, and the creation of new businesses and jobs”181.

Sendo a digitalização profundamente marcada pela desmaterialização e pela


natureza intangível do processo comercial, bem como por uma reduzida necessidade de
presença física, e dependendo a fiscalidade atual, genericamente, da existência de
“fisicalidade” e de fiscalizações in loco, rapidamente se percebe que a par das

180
Cf. (Comissão Europeia, 2014, p. 5).
181
Cf. (Comissão Europeia, 2014, p. 5).

64
oportunidades criadas pela economia digital surge também um conjunto de desafios à
conformação destas duas realidades182.

É fundamentalmente sobre os desafios colocados pela economia digital, e pela


análise de possíveis soluções, que se debruçam o Relatório da Ação 1 final do projeto
BEPS da OCDE183 e, mais recentemente, o Relatório sobre os “Desafios Fiscais
decorrentes da Digitalização”184.

Observamos um conjunto de características típicas da economia digital que são


potencialmente disruptivas face ao paradigma em que ainda assenta a fiscalidade, a
atuação e controlo da larga maioria das Administrações tributárias e, bem assim, aos
tradicionais processos de criação de valor.

De todo o modo, não deixa de ser uma atividade potencialmente geradora de


rendimentos e, como tal, relevante do ponto de vista fiscal.

Curiosamente, e admitindo que poderia redundar numa abordagem mais fácil do


que aquelas que hoje vemos serem acolhidas, os trabalhos de desenvolvidos quer pela
OCDE quer pela Comissão Europeia têm recusado um tratamento autónomo 185 da
economia digital, para efeitos de tributação, face ao aplicado às atividades desenvolvidas
numa economia dita tradicional.

Assumindo-se as especificidades de cada uma, reconhece-se que estamos, do


ponto de vista substantivo, perante uma mesma atividade desenvolvida, contudo, de
formas distintas. Esta diversidade de forma não justifica que se trate a tributação (in casu,

182
Por inadequação da respetiva estrutura, os Estados veem-se incapazes de acompanhar esta mudança.
De todo o modo, não cremos poder falar-se em esgotamento dos modelos de tributação existentes. É
certo que existe um desajustamento entre os atuais sistemas fiscais e a realidade digital, mas há que
promover um encontro entre ambos. Nesse sentido, os sistemas fiscais e os elementos de conexão
tradicionais, desde que adaptados às novas realidades, poderão ainda mostrar-se aptos já que as
premissas que os compõem não estão absolutamente ultrapassadas.
183
Cf. (OCDE, Action 1: Final Report, 2015).
184
Cf. (OCDE, Interim Report , 2018).
185
Num relatório do Comité dos Assuntos Fiscais (CAF) da OCDE apresentado à Conferência Ministerial de
Outubro de 1998, denominado como «A Borderless World – Realising the potencial of Electronic
Commerce», foi estabelecida a regra de que deveriam ser aplicadas ao comércio eletrónico as mesmas
regras e princípios que se aplicam ao comércio tradicional (Guimarães, A Tributação do Comércio
Electrónico: Uma perspectiva jurídico-fiscal, 2001). Como refere M AARTEN DE WILDE, “The OECD stated in
its ‘September 2014 deliverable’ that the digital economy could not be treated separately from the rest
of the economy. In other words, ‘ring-fencing’ the digital economy is not an option. Indeed, the fact that
the overall economy is increasingly becoming digital means that devising rules specificaly for the digital
economy may well be inappropriate. That will simply create complex of delineation” (Wilde, 2015, p. 802).

65
direta) da economia digital que não de uma forma integrada com o atual quadro jurídico-
tributário.

Do referido relatório do Grupo de Peritos da Comissão Europeia, identificam-se


três características principais da economia digital com impacto na fiscalidade: a
mobilidade; os efeitos de rede e a importância da informação.

Com efeito, considerando a sua relevância no desenvolvimento do objeto deste


estudo, importará dedicar-lhes algumas linhas.

2.1.1. A mobilidade

A economia digital permite um novo nível de mobilidade sem precedentes.


Sobretudo pela importância adquirida pelos ativos intangíveis186. A intangibilidade dos
bens e serviços aliada ao desenvolvimento e difusão das TIC permitiu uma dispersão dos
intervenientes, dos produtos e dos meios de produção ou áreas de atividade das empresas.

Assiste-se a um processo de desmaterialização da economia que naturalmente


afeta a sua mobilidade, pois as fronteiras físicas e os naturais constrangimentos temporais
deixam de constituir obstáculos.

As TIC permitiram e continuam a fomentar a transformação de modelos clássicos


de negócios, possibilitando uma maior fragmentação das funções das empresas,
facilitando desta forma a sua deslocação187.

O custo e dificuldade de organização das atividades empresariais à distância têm


vindo a diminuir progressivamente, pois o custo de armazenamento e transporte de
produtos digitais é praticamente zero.

Uma vez criado o produto ou serviço, a sua distribuição ou disponibilização opera-


se a custos mínimos ou mesmo sem qualquer custo.

É cada vez mais fácil deslocalizar a produção para territórios que se apresentem
economicamente mais vantajosos (com menores níveis de tributação), mantendo o centro
de decisões noutro território, havendo a possibilidade de as empresas operarem em

186
Quer pela digitalização de bens materiais como da criação de novos produtos e serviços.
187
Cf. (Comissão Europeia, 2014, pp. 11-12).

66
diversos mercados dispersos por todo o mundo, sem para isso precisar de manter qualquer
estrutura física de apoio188.

Assim, num movimento apelidado de tax jurisdiction shopping, as empresas


procuram Estados com uma menor carga fiscal, procurando assim maximizar o seu lucro.

Contudo, a par deste efeito existe um outro: a referida mobilidade, intensificada


pelo desenvolvimento das TIC, dificulta a capacidade das Administrações tributárias em
identificar o facto tributário e os respetivos sujeitos passivos, afetando a capacidade de
arrecadar receita fiscal189.

A crescente mobilidade associada à intangibilidade dos bens e serviços,


característica da economia digital, dificulta muitíssimo a capacidade da atuação das
diversas Administrações fiscais. A desadequação do atual corpus legislativo e, bem assim
dos atuais mecanismos de controlo, não permite de forma recorrente identificar
transações, o seu objeto e sujeitos.

2.1.2. Os efeitos de rede

Conexo com a característica da mobilidade estão os denominados efeitos de rede,


identificados nos modelos de negócio da economia digital, em que as decisões de um
utilizador e as interações com os interfaces digitais refletem não só benefícios para outro
utilizador190 como se mostram determinantes no processo de criação de valor.

Neste sentido quanto mais clientes/ utilizadores possuírem/ utilizarem um bem ou


serviço, mais valioso este se torna para todos eles. É criada, desta forma, uma
externalidade positiva.

Na economia digital, os efeitos de rede são uma importante componente do


negócio, atente-se o exemplo das redes sociais online: cujo valor de plataformas como o
Twitter, o Facebook ou o Instagram se mostra proporcional ao número de utilizadores.

188
Com efeito, a intangibilidade dos bens e serviços resulta também na sua mobilidade geográfica e na
capacidade de as empresas chegarem a novos mercados, oferecendo os seus produtos e serviços a
clientes dispersos pelo globo, com custos reduzidos.
189
Observa-se uma degradação das bases sobre as quais deverá incidir o tributo. As Administrações
tributárias podem ver uma redução nas receitas fiscais porque os impostos indiretos são difíceis de coletar
e a empresa não-residente não tem presença para se aplicarem impostos diretos.
190
Cf. (Comissão Europeia, 2014, p. 12).

67
Outro exemplo é o dos sistemas operativos adotados por um elevado número de
utilizadores: a adoção de um sistema operativo por um grande número de utilizadores
incentivará o desenvolvimento de software para essa plataforma, que por sua vez resulta
numa maior utilidade do sistema, o que o tornará mais atrativo e com maior capacidade
de atrair novos utilizadores191.

As empresas dedicadas a este tipo de negócios veem o seu valor e o valor dos seus
produtos e serviços aumentarem pelo aproveitamento dos denominados efeitos de rede,
sejam estes potenciados apenas pela adesão gratuita de novos utilizadores, seja pela
implementação de políticas que incentivam interações.

Os novos processos de criação de valor, associados a novas formas de negócio,


potenciados pela digitalização, tem subjacente a interação entre utilizadores e entre estes
e as plataformas digitais. Esta interação origina um conjunto de informação cuja análise
e utilização conduzem à formação de valor, dificilmente quantificável e com potenciais
beneficiários não identificados.

Isto leva-nos a outra característica importante da economia digital: a importância


da informação.

191
Como caso paradigmático temos a Nokia e a Apple. A Nokia, um dos maiores fabricantes a nível mundial
de telemóveis sofreu um revés quando o seu sistema operativo começou a ser cada vez menos utilizado.
Em sentido contrário, a Apple e o seu sistema IOS foi acumulando utilizadores o que incentivou outros
desenvolvimentos no sistema tornando-o hoje um sucesso.

68
2.1.3. A importância da informação

A informação assume especial importância no âmbito da economia digital.

O comportamento do consumidor/ utilizador – por exemplo, a visita de websites,


compras online, utilização de motores de busca, a natureza das pesquisas feitas, entre
outros – contribui para aglomerar grandes quantidades de informação e dados,
denominados de Big Data192, que oferecem possibilidades adicionais numa economia
cada vez mais digitalizada.

Considerando o volume de informação que todos os dias disponibilizamos, muitas


vezes de forma gratuita e mais ou menos consciente, facilmente concluímos que o
tratamento e utilização destes dados é uma poderosa ferramenta de tomada de decisões.

Daqui se depreende que a recolha de dados, a sua organização e interpretação é


fundamental na descoberta e introdução de novas tecnologias, de produtos e serviços193,
exploração de oportunidades de investimento e na planificação da atividade da empresa.

A digitalização permite que as empresas executem centenas de experiências


controladas. Uma inovação pode então ser compartilhada e facilmente desenvolvida
dentro de uma organização ou comunidade e rapidamente replicada em grande escala.

As empresas detentoras das plataformas digitais processam e analisam os dados


recolhidos para encontrar correlações significativas a fim de segmentar produtos e
serviços especificamente para consumidores individuais.

A digitalização permite às empresas o aumento da sua competitividade,


satisfazendo as necessidades individuais de forma mais precisa.

A economia digital é, como vimos, extremamente dinâmica, com barreiras


mínimas de entrada ao desenvolvimento de novos modelos de negócios e à inovação.

192
Cf. (Comissão Europeia, 2014, p. 13). Embora seja possível a tradução de Big data para português como
“meta dados”, a mesma não se mostra uma definição suficiente por mais restrita. Por Big data traduz-se
na possibilidade e nas ferramentas utilizadas para armazenas, agregar e combinar dados para a utilização
em análises direcionadas que, eventualmente, se traduzam na criação de valor.
193
Com menores custos associados à inovação, em termos de medição e análise, tornando mais fácil
executar experiências controladas e medir seu sucesso com grande precisão do que na era pré-digital.

69
Em suma, a economia digital, sendo parte integrante da economia, apresenta
algumas características relevantes para efeitos de tributação.

Nestas incluem-se a mobilidade – potenciada pela proliferação de intangíveis,


pelo fácil acesso aos mercados internacionais e pela possibilidade de dispersar
geograficamente diversas áreas de negócio –, os efeitos de rede e a importância da
informação – conseguida através de negócios multilaterais, baseados em efeitos de rede.

Acresce que estas características acabam por levar a uma tendência para o
monopólio em certos negócios, embora contraposta a uma volatilidade natural de uma
realidade em rápida mutação, em que as barreiras de entrada no mercado são reduzidas.

Face ao exposto, importa compreender, de seguida, o impacto das características


da economia digital na fiscalidade.

2.2. A economia digital e os desafios à tributação

Uma das características distintivas da economia digital é sem dúvida a


desmaterialização operada no processo económico e no processo comercial. Esta
desmaterialização é marcada pela digitalização, pela intangibilidade dos processos e pela
reduzida necessidade de presença física.

A referida desmaterialização propicia a construção de um «mundo virtual», no


qual se desenrola a realidade emergente. Constatar que este novo mundo possibilita a
efetivação de contactos e a possibilidade de acesso à informação em tempo real e, bem
assim, de manifestações de vontade negociais, coloca interessantes desafios às noções de
comércio, comerciante e estabelecimento estável194.

Contrariamente, a economia e comércio ditos tradicionais têm como traço


dominante a “fisicalidade”, conferindo particular relevo à situação geográfica bem como
à dependência de intermediários, o que, naturalmente, permite mais facilmente identificar
transações e os respetivos titulares por parte dos Estados e administrações tributárias195.

194
Como refere (Guimarães, O conceito de estabelecimento estável e o comércio electrónico, 2000, p.
155).
195
Cf. (Pires R. C., Manual de Direito Internacional Fiscal, 2018, pp. 304-305).

70
Assim, pela importância da presença física e geograficamente localizada, as
operações desenvolvidas no contexto da economia e comércio tradicionais são tangíveis
e facilmente conhecidas. Ou seja, dada a materialidade das coisas, os elementos
constitutivos destas operações são facilmente identificados, conhecidos. Trata-se de uma
realidade mais facilmente apreensível.

Nestes termos, em virtude das características associadas à economia e ao comércio


tradicionais, facilmente se percebe o processo de conformação do Direito tributário (quer
nacional quer internacional) a esta realidade, recorrendo à “fisicalidade” como base de
construção do seu sistema de princípios e regras.

Ora, a desmaterialização associada à economia digital vem romper com este


paradigma, dificultando a capacidade dos Estados em conhecer os factos (tributários) e
operar sobre estes o respetivo controlo196.

Problema acrescido surge no caso das situações fiscais plurilocalizadas, ou seja,


conexas com mais do que uma ordem jurídica, suscitando-se maiores problemas de
repartição e afetação de competências tributárias.

A par da desmaterialização, a diminuição da relevância das fronteiras físicas para


o trafego comercial implica que o poder dos Estados sofra uma mutação quanto à
amplitude e quanto à eficácia.

Como sublinha RITA CALÇADA PIRES, “A desmaterialização provoca ainda a


crescente relevância dos elementos geográficos197 o que dificulta a determinação da
competência fiscal e o respetivo modo de proceder a essa determinação, uma vez atuarem
as Administrações fiscais nos termos da soberania do seu Estado e relacionarem-se entre
si, com base em fronteiras geográficas198. Por isso que há que encontrar (novos) meios
de conseguir estabelecer um ponto de contacto entre o facto tributário e um território,
mesmo na economia digital.

196
“O comércio eletrónico vem alterar profundamente a forma como a administração fiscal pode,
efetivamente, exercer a sua atividade, efetivar as suas obrigações, bem como garantir o cumprimento das
obrigações fiscais dos contribuintes”, Cf. (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial,
2011, p. 201).
197
Não obstante as transações terem como referência um qualquer ponto geográfico, as fronteiras não
desapareceram.
198
Cf. (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, pp. 202-203).

71
Antevê-se um impacto da economia digital e dos seus elementos na soberania
fiscal dos Estados.

No seguimento do referido anteriormente sobre o fenómeno de limitação da


soberania fiscal, não se revela um exercício fácil por parte dos Estados manterem a sua
soberania fiscal num contexto globalizado e digital.

Mesmo na parcela que mantém, é cada vez mais difícil fazer a sua apologia.

A mobilidade dos elementos que constituem o facto tributário, associada a uma


crescente desmaterialização do mesmo, implica, necessariamente, para efeitos de
tributação, uma maior coordenação e interdependência entre Estados e respetivas
administrações na obtenção de soluções, o que implicará um maior grau de concessão
entre as soberanias fiscais nacionais, o que levará a uma maior limitação das mesmas.

Observa-se hoje, muita por culpa da digitalização e dos sistemas fiscais que não a
souberam competentemente acompanhar, um desajustamento e inadequação destes
últimos à realidade virtual, justificados pela limitação e fragmentação da soberania fiscal,
pela degradação das bases de tributação tradicionais e pela consequente diminuição de
receita fiscal.

Face a tudo o quanto exposto, identificamos três grandes desafios suscitados pela
economia digital na esfera das administrações Fiscais:

1. Risco de erosão da base de tributação com a consequente diminuição das receitas


fiscais arrecadadas;
2. Dificuldade em determinar a jurisdição fiscal com poder de tributação; e
3. Dificuldades em assegurar o cumprimento tributário.

No presente trabalho debruçar-nos-emos essencialmente sobre a dificuldade em


determinar a jurisdição fiscal com poder de tributação, nomeadamente quanto
estabelecida por E.E.

72
2.2.1. Os elementos de conexão tradicionais

O Direito Fiscal Internacional tem como uma das suas missões dirimir os conflitos
que surgem da pretensão de dois ou mais Estados em tributar um mesmo facto. Fá-lo
através de um conjunto de regras cujo objetivo é a repartição do poder tributário entre
Estados.

Para tanto, o DFI recorre a um sistema de valoração dos diferentes elementos de


conexão, relevando uns em detrimento de outros, em função das situações previstas,
assim definindo, de entre os Estados com competência para tributar determinado facto
tributário, a ordem jurídico-fiscal aplicável.

Como anteriormente referido, os elementos de conexão revelam as “relações ou


ligações existentes entre as pessoas, os objetos e os factos com os ordenamentos
tributários”199.

A ideia de desmaterialização associada à economia digital veio dificultar a


utilização dos elementos de conexão tradicionais, pela inadequação destes últimos,
assentes na “fisicalidade”, à realidade base da economia digital, desprendida, por
natureza, de qualquer presença física num outro território.

As premissas que estiveram na génese do aparecimento dos elementos de conexão


e respetivas regras mostram-se ultrapassadas. A atual contextualização económica não
tem paralelo com a contextualização da época em que surge, por exemplo, o
estabelecimento estável na prática internacional.

Sobretudo pela perda do elemento “fisicalidade” sempre associado ao trato


comercial, os elementos de conexão tradicionais têm mostrado dificuldades de adaptação
à nova realidade, refletindo-se numa menor capacidade de identificar a existência de um
facto tributário, o rendimento a ele associado, os seus sujeitos e, bem assim, a respetiva
ligação a um território.

Diminui-se, assim, a capacidade de tributar um rendimento que seja gerado no


âmbito da economia digital.

199
Cf. (Xavier, 2011, p. 224).

73
Parece clara a desarticulação entre a realidade presente nos elementos de conexão
tradicionais e a realidade sobre a qual pretendem incidir.

Nestes termos, a economia digital levanta, fundamentalmente, três problemas à


fiscalidade200: (i) risco de erosão das bases de tributação; (ii) dificuldade em determinar
a jurisdição fiscal competente; e (iii) dificuldade em assegurar o cumprimento tributário.

Segundo alguns autores, isto demonstra a existência de uma crise no seio dos elementos
de conexão tradicionais.

O desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação possibilita a


existência de ainda mais conexões com mais territórios. O aumento do número de
conexões associadas a um facto tributário pode significar um aumento dos casos de dupla
(ou mesmo múltipla) tributação, gerada pela valoração comum de vários elementos de
conexão – criando um esforço adicional na capacidade de resposta do DFI aos conflitos
que gerar-se-ão – e de dupla não tributação, gerada pela valoração insuficiente de
elementos de conexão presentes em determinado facto tributário e os territórios
envolvidos – levando, potencialmente a uma diminuição da receita tributária disponível.

Se no primeiro caso são perfeitamente identificáveis as ligações de determinado


facto tributário a um ou mais territórios geográficos, pelo contrário, no segundo, os
elementos de conexão mostram-se incapazes de identificar aquelas ligações
impossibilitando o exercício do poder tributário por parte de um ou mais Estados. Será,
possivelmente, a face mais visível da crescente inoperância dos sistemas fiscais atuais e
dos elementos de conexão tradicionais ao advento da economia digital.

Importará por isso analisar o impacto da economia digital nos elementos de


conexão residência e fonte e, de forma mais detalhada, estabelecimento estável.

De acordo com o princípio da residência, a conexão relevante para fundamentar


o poder tributário de um Estado é a residência no seu território do titular dos rendimentos
em causa. É através deste elemento de conexão que se concretiza a tributação efetiva pelo
rendimento global do contribuinte (world wide income). Conforme estejamos perante

200
Verdadeiramente, os problemas que ora se identificam não têm origem com o advento da economia
digital, mas sim com a globalização. Verifica-se, contudo, um desenvolvimento considerável dos mesmos
com a economia digital. Estes problemas são a face visível da inadequação dos sistemas fiscais tradicionais
e, em certa medida vigentes, à realidade global, interligada e interdependente.

74
pessoas singulares ou pessoas coletivas, podemos distinguir entre residência singular e
residência de entes coletivos, respetivamente.

A qualificação de residente pertence ao direito interno de cada Estado201, pelo que,


face aos critérios do direito interno de cada um deles, pode suceder que dois Estados
considerem a mesma pessoa como residente no seu território. Gera-se assim um caso de
dupla residência, com as demais consequências ao nível tributário, que importará dirimir.

O n.º 2 e n.º 3 do artigo 4.º do MC OCDE, através de regras de preferência ou


conexões subsidiárias, permite concluir pela única residência fiscalmente relevante no
caso da mesma pessoa ser considerada residente por mais do que um Estado.

As regras supra referidas, através da aplicação sucessiva (e numa ordem


estabelecida) de diferentes conexões, são sobretudo relevantes caso estejamos perante
uma pessoa singular, pois os conceitos que àquelas subjazem não suscitam particulares
dúvidas interpretativas.

Não implicando a análise desenvolvida neste trabalho de especiais referências à


residência individual e ao respetivo elemento de conexão, quanto a esta sempre se diga
que a dificuldade imposta pela economia digital se reconduz à maior dificuldade em
identificar e associar um sujeito (passivo) a determinado território.

A utilização de meios de comunicação cada vez mais sofisticados e menos detetáveis, o


menor recurso a intermediários (muitas vezes entidades bancárias com especiais deveres
de comunicação às Autoridades tributárias)202 e a crescente utilização de cripto moedas
dificultará e muito a recondução de um sujeito a determinado território para efeitos de
tributação e, consequentemente, em assegurar o cumprimento tributário.

Pelo contrário, o processo de identificação da residência de um ente coletivo


sempre revestiu maior complexidade. A economia digital veio acrescentar dificuldades
suplementares. De facto, a operação de determinar a residência de uma pessoa coletiva
tem-se tornado mais intricada, na medida em que as novas tecnologias de comunicação
permitem não só novas formas e estruturas de organização empresarial como uma maior

No caso português, a residência individual afere-se segundo o disposto no artigo 16.º do CIRS.
201

Para desenvolvimento desta questão, vide (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento
202

Empresarial, 2011, p. 205).

75
dispersão dos processos de tomada de decisão por diversos Estados203, criando
dificuldades acrescidas ao preenchimento do conceito de direção efetiva da pessoa
coletiva.

O processo de tomada de decisão pode estar de tal modo disperso que será
virtualmente impossível reconduzir a gestão estratégica, ou mesmo a gestão corrente,
maioritariamente a um único lugar, por forma a poder considerar-se determinado ponto
geográfico o local onde se desenvolve a direção efetiva de determinada pessoa coletiva204.

Para mais, as novas formas de comunicação possibilitam não só novos métodos


de divisão e exercício de funções no âmbito de uma empresa como também o anonimato
dos seus quadros superiores. O anonimato conseguido no universo digital inviabiliza o
conhecimento das partes, impossibilitando a identificação do sujeito passivo e,
potencialmente, a operação efetuada205.

Tão pouco os endereços eletrónicos (por exemplo, .pt, .uk) podem ser
considerados fiáveis, por nem sempre existir uma correspondência verdadeira entre a
localização geográfica efetiva e o endereço eletrónico.

Da mesma forma, a utilização dos servidores espelho (mirror servers) aumenta a confusão
na busca da localização (de origem).

A economia digital vem assim demonstrar a perda de vigor do critério da


residência, na forma como este está tradicionalmente construído, o que implicará
necessariamente uma valoração insuficiente de elementos de conexão presentes em
determinado facto tributário impossibilitando a sua conexão com determinado Estado e,
consequentemente, potenciando uma situação de não tributação (quando, em abstrato, a
mesma seria expectável)206.

A solução passará pela identificação do Estado com o qual a pessoa coletiva tenha
mais forte conexão económica, independentemente de aí residirem os principiais

203
Pense-se, como exemplo, na situação em que as decisões de gestão de uma empresa são tomadas
pelos seus diretores residentes em países diferentes mediantes videoconferência.
204
Por exemplo, os diretores não se encontram em local único e os acionistas não se deslocam a nenhum
local para serem informados/ votarem/ deliberarem, os trabalhadores estão distribuídos por vários países
sem relações hierárquicas entre si.
205
Neste sentido, vide (Pires R. C., Manual de Direito Internacional Fiscal, 2018, p. 306).
206
A ordem jurídica mostrar-se-ia competente se fosse identificado o elemento conexão.

76
administradores ou acionistas, através de uma construção valorativa que permita
identificar o território onde a atividade empresarial tenha maior grau de implementação.

Por outro lado, o elemento conexão fonte garante o poder de tributação ao Estado
onde se gera/ produz o rendimento. A ideia de pertença económica (economic allegiance),
comumente associada ao Estado fonte enquanto justificação do vínculo criado com
determinado Estado, apenas se manifesta quanto aos rendimentos originados nesse
território, no caso de se verificarem determinados graus mínimos de presença naquele
território, tradicionalmente através da existência de determinados elementos de natureza
material.

Ora, se a identificação da residência já se presta a dificuldades no âmbito da


economia digital, facilmente se percebe o quão difícil será rastrear um rendimento,
fazendo o caminho inverso até ao seu local de origem, sobretudo num contexto de
mobilidade e de ausência de presença física.

A economia digital carrega para o elemento conexão fonte, contagiando também


o elemento conexão estabelecimento estável, problemas marcados pela desarticulação
entre a realidade tangível/ física/ real/ corpórea e a realidade intangível/ virtual/
incorpórea do universo digital207. A contraposição de um universo fortemente marcado
pela “fisicalidade” a um outro marcado pela globalidade, generalidade de acesso
independentemente da localização e, sobretudo, a absoluta prescindibilidade de um
espaço físico para operar surge como principal obstáculo à articulação entre ambos.

Aliás, as regras de tributação na fonte que temos vindo a mencionar ao longo deste
trabalho, sobretudo no âmbito do estabelecimento estável, mostram-se pouco flexíveis
pois procuram manter o mesmo processo de base territorial (associado à presença física
estável) no que se refere ao tratamento da questão fiscal da economia digital 208.

Como refere RITA CALÇADA PIRES, a “fiscalidade internacional fundamenta o seu


núcleo no Estado como espaço geográfico real209”. Este modus operandi gera dificuldades

207
Cf. (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, p. 257).
208
Como procura transmitir JINYAN LI, não sobre a economia digital, mas sobre o comércio eletrónico com
o qual podemos fazer alguns paralelismos, existe uma incompatibilidade do comércio eletrónico com a
ideia de presença física, procurando-se enxertar a “fisicalidade” num universo como o do comércio
eletrónico (Li, 1999, p. 1436). Assemelha-se a algo similar aquele jogo no qual se convida uma criança a
colocar um conjunto peças geométricas na forma geométrica correspondente, e esta procura, sem
sucesso, encaixar/ fazer passar um cubo pela forma geométrica círculo.
209
Cf. (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, p. 257).

77
de tributação pois, ao contrário das regras existentes, a economia digital não se subsume
à unidade territorial. Trata-se de uma realidade que não utiliza como referencial uma
qualquer noção de território.

Deparamo-nos sim com um espaço virtual uno ao qual corresponderão múltiplos espaços
geográficos no mundo físico.

Assistimos por isso a uma potencial crise do elemento conexão fonte, pois a
economia digital não precisa de presença física num território para desempenhar a sua
atividade.

A desarticulação identificada promove a erosão da base tributável e, bem assim,


dificuldade em assegurar o cumprimento tributário, arrastando consigo uma potencial
diminuição da receita tributária, pois, a menos que se contrarie, serão cada vez mais os
rendimentos cuja identificação e recondução a determinado território se mostram
impossibilitadas, com as demais consequências tributárias210, pois dificilmente se aplicam
com sucesso elementos de conexão baseados no território e na “fisicalidade”, num
contexto digital onde ambos os elementos apresentam menor ou nenhuma importância.

Isto não significará, necessariamente, colocar em causa o princípio da


territorialidade211 – enquanto ligação entre o facto tributável e o ordenamento jurídico
do Estado 212 –, não obstante a existência de duas realidades com características
aparentemente incompatíveis213.

210
Como a dificuldade em assegurar e controlar o cumprimento tributário.
211
Mas implicará que a ligação a ele subjacente se confirme através de outros elementos.
212
O princípio da territorialidade relaciona-se com o âmbito espacial do facto gerador do imposto,
permitindo estabelecer, através de elementos de conexão, a ligação entre o facto tributável e o
ordenamento jurídico do Estado, assim legitimando a aplicação das respetivas normas tributárias, ou
melhor, o exercício da respetiva competência tributária.
213
No seguimento de outras considerações já tecidas sobre o princípio da territorialidade, e sobre a
vitalidade do mesmo importa dizer o seguinte:
Os impostos sobre o rendimento, a par dos restantes, emanam dos ordenamentos jurídicos nacionais. Os
ordenamentos jurídicos, por correlacionados ao conceito e figura do Estado, vêem-se delimitados por um
território. Assim, os impostos são sempre reconduzidos a um espaço geográfico onde se exerça o poder
tributário correspondente. Não há sobre o rendimento quaisquer impostos supra ou transnacionais que,
pela sua natureza, permitiriam a respetiva aplicação independentemente da geografia em que aquele
tivesse origem/ fonte. A desconsideração da geografia nestes termos permitiria a aplicação de impostos
ao mundo virtual, onde a conexão com determinado território em função de elemento físico pouco
importa. Bastaria, em abstrato, identificar uma transação da qual adviesse um rendimento para que o
mesmo fosse tributado. Sendo certo que sempre seria uma tarefa hercúlea. Os problemas seriam
múltiplos: a soberania dos Estados; harmonizar os diferentes sistemas fiscais existentes para que
pudéssemos ter um imposto sobre o rendimento consensual no alargado universo de Estados e
administrações; divisão das receitas tributárias; a existência de entidades internacionais que pudessem

78
De todo o modo, e para que seja possível a tributação do rendimento gerado no
âmbito da economia digital, sempre terá de haver uma sobreposição entre ambas as
realidades – virtual e real – pois, na prática, é o Estado, enquanto realidade
geograficamente definida, que detém o poder de tributar214, independentemente da
natureza do rendimento, pelo que terão de coexistir.

Neste sentido, importará continuar a promover a referida ligação de um facto


tributário, mesmo que gerado na economia digital, a um Estado para que seja possível
tributá-lo.

A pedra de toque estará na forma em como a referida sobreposição e ligação serão


feitas215.

Como demonstrado, no DFI existem os princípios de tributação na residência e


de tributação na fonte. Segundo estes princípios, no caso de situações plurilocalizadas,
são as jurisdições da residência e da fonte que têm o direito de tributar os rendimentos
obtidos. Esta escolha justifica-se pela ligação existente entre determinado indivíduo –
pela residência – ou determinado rendimento – pela fonte – com determinado território.
Tratando-se de uma ligação, na sua génese, facilmente apreensível.

É a partir destes dois princípios, consensuais no seio do DFI, que se retira a


existência dos elementos de conexão residência e fonte, os quais se mostram essenciais
na determinação do poder de tributar.

Contudo, os referidos princípios e respetivos elementos de conexão não são


suficientes para indicar a jurisdição fiscalmente competente no caso concreto. Mostra-se

suportar a aplicação e controlo de tais impostos, assegurar o cumprimento tributário e que regular a
divisão e o destino das receitas que resultassem desta tributação. Não é, porém, esta a atual realidade.
Os impostos, enquanto manifestação do poder tributário dos Estados, estão ligados ao território
correspondente, o que tem um profundo impacto na forma como a divisão de rendimentos é operada
entre as várias jurisdições fiscais. Assim, a tributação de um rendimento, independentemente da sua
natureza, implica a recondução do mesmo a um território e, consequentemente, a um sistema jurídico-
fiscal para se operar a respetiva tributação e assim contribuir para as receitas do Estado aplicadas na
prossecução do interesse público – os fins do Estado. Assim, o caminho parece ser, analisado o atual
contexto, continuar a promover a referida ligação de um facto tributário a um Estado para que seja
possível tributa-lo. Para o efeito, ao invés da “fisicalidade”, deverá ser utilizado um outro elemento que
comprove, tal como aquela o faz, a ligação de determinada fonte de rendimento a um Estado, permitindo
um ajustamento entre as distintas realidades em jogo.
214
Não obstante ser uma preocupação internacional e existir articulação entre Estados e as respetivas
administrações fiscais.
215
Começa-se a perceber que a mesma passará pela recusa à fisicalidade como elemento nuclear ao
estabelecimento de uma conexão entre um facto e um território.

79
necessário um maior grau de concretização, de determinabilidade na aplicação ao caso
concreto216.

Em resposta, surgem as regras da residência e da fonte consubstanciando a forma


como os elementos de conexão são especificados e passam ser identificados num
determinado território.

É exatamente ao nível destas regras, tradicionalmente utilizadas para identificar


no caso concreto a residência e a fonte, que existem os problemas de conformação dos
elementos de conexão tradicionais já mencionados à economia digital. É a este nível que
residem os desafios de articulação entre a realidade virtual e a real217.

Os princípios que subjazem aos elementos de conexão residência e fonte


continuam válidos e com legitimidade para fundamentar a tributação de rendimentos.
Continua a fazer sentido determinar o poder de tributação de uma jurisdição através da
especial ligação e relação que se estabelece entre o indivíduo ou o rendimento e uma
determinada geografia.

Pois é essa ligação/ relação com determinado Estado, e os fins deste, que demonstra a
existência de um vínculo económico entre ambos, o qual justifica que determinado
indivíduo ou ente coletivo estejam na disposição de se sujeitarem a determinados
“sacrifícios tributários”218 como contrapartida dos benefícios particulares e gerais que
recebam em troca219.

Dificilmente teremos melhor forma de concretizar esse vínculo.

Assim, no contexto do Direito Fiscal Internacional continua a ser fundamental, como


justificação e para delimitação/ repartição do poder de tributar, a existência de uma
ligação entre o indivíduo ou o rendimento ao território de determinado Estado220.

216
O princípio e a regra que o concretiza são realidades diferentes. Sendo os princípios conceitos vagos e
indeterminados necessitam de concretizações, o mesmo não se passa com as regras que são aplicáveis
diretamente (Canotilho, 2002, p. 1160 e ss).
217
Como refere RITA CALÇADA PIRES, “O facto de as regras concretizadoras dos elementos de conexão
estarem em crise não implica automaticamente a assunção de que o(s) próprio(s) princípio(s) que essas
concretizam esteja(m) igualmente em crise” (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento
Empresarial, 2011, p. 269).
218
Nas palavras de PEDRO SOARES MARTINEZ, (Martinez, Direito Fiscal, 1993, p. 79).
219
Enquanto fundamento da soberania tributária.
220
Conforme aos princípios da residência e da fonte e os respetivos elementos de conexão.

80
O problema que tem sido revelado pelo advento da economia digital, e dadas as
suas características, reside, justamente, na forma ou através de que regras será
estabelecida essa ligação, dada a incapacidade por parte das regras atuais/ tradicionais em
fazê-lo.

Ou seja, não parece existir qualquer dificuldade ou querela no reconhecimento de


necessidade em estabelecer aquela ligação, o busílis da questão está nas regras utilizadas
para o efeito.

Não estamos por isso perante uma crise no plano dos princípios ou dos respetivos
elementos de conexão221, mas sim perante uma crise no plano das regras que os
concretizam e realizam222.

Para tanto, e como já referido, concorre o facto de a economia digital surgir como
uma realidade diametralmente oposta àquela para a qual os elementos de conexão e
respetivas regras foram então pensados e criados. As atuais regras, datadas no tempo, já
não permitem ser aplicadas a esta nova realidade, pois foram as mesmas pensadas e
construídas para serem aplicadas num mundo muito marcado pela “fisicalidade”, base da
construção tradicional.

Existe, por isso, uma desadequação das regras tradicionais para determinar a
residência e a fonte no âmbito de uma atividade essencialmente global, flexível, móvel e
muitas vezes imediata.

Vejam-se, e em concreto, as dificuldades na determinação da residência de um


ente coletivo, na medida em que as atuais regras que operam o preenchimento do conceito
de direção efetiva não consideram (é-lhes até estranha) a atual realidade comercial e
económica223. Estão não só reféns de uma ideia de presença física como de concentração
dessa presença física num só local, o que se mostra perfeitamente inadequado à realidade
atual de profunda dispersão dos polos de decisão.

221
Como nos ensina RITA CALÇADA PIRES, a essência de um princípio não é afetada, “(…) porque um princípio,
por contraposição às regras, detém uma capacidade adaptativa permanente e ativa que lhe garante uma
substância sempre atualizada e ligada às realidades contemporâneas” (Pires R. C., Tributação
Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, p. 271).
222
“A regra existe como forma de resolver a aplicação do princípio ao caso concreto” (Pires R. C.,
Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, p. 269).
223
Já por nós caracterizada.

81
Também relativamente ao elemento conexão fonte, têm as atuais regras sentido
dificuldades em identificar a origem de um rendimento, reconduzindo-o a determinado
Estado. Veja-se o exemplo do Estabelecimento Estável tradicional224 que abordaremos
melhor adiante. Considerando-se o Estabelecimento Estável regra de concretização da
fonte, e não a fonte em si mesma considerada, o mesmo tem-se mostrado inadequado a
esse fim.

A dificuldade e, por vezes, a impossibilidade sentida, na atual conjetura, em


identificar os elementos e características tradicionalmente associados à figura do
estabelecimento estável não só compromete a capacidade de determinar a sua existência,
como também, e em consequência, a capacidade de determinar a fonte de um rendimento.
Assim falhando o processo de concretização do princípio e elemento de conexão fonte.

Como refere RITA CALÇADA PIRES, “A crise nas regras definidoras dos elementos
de conexão demonstra a fragilidade de como as realidades físicas, construídas com base
numa atividade económica permanente e fixa no espaço, e tantas vezes no tempo, são
desadequadas para serem o elemento de conexão de um tipo de atividade essencialmente
flexível, móvel e muitas vezes imediato”225.

De todo o modo, uma vez que os princípios demonstram capacidade e vitalidade


para continuar a vigorar, cuja reconhecida adaptabilidade às novas realidades é um trunfo,
o que terá de ser alterado são as respetivas as regras que terão de ser avaliadas e
atualizadas, por forma a estarem aptas ser aplicadas à nova realidade económica e ao
mundo globalizado em que vivemos.

Nestes termos, o objetivo passará por procurar novas regras que possam satisfazer
adequadamente as funções que devem cumprir – concretizar e bem executar os princípios
da residência e da fonte.

224
Revelador de uma conexão económica entre determinado Estado e uma pessoa coletiva.
225
Cf. (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, p. 274).

82
2.2.1.1. O Estabelecimento Estável

Do que foi referido sobre o estabelecimento estável, nomeadamente por referência


ao denominado estabelecimento estável real, podemos concluir que este resulta,
tradicionalmente, da combinação entre o (i) lugar fixo de negócios, a (ii) presença física
e a (iii) natureza da atividade negocial226. A estes elementos pode e deve-se juntar a
componente humana, por relação às pessoas que dependem da empresa, exercendo as
atividades desta no Estado onde está situada a instalação fixa – desta forma também se
justificando a ligação entre determinada atividade e um Estado.

Desta combinação resultará um limiar mínimo de presença que justificará a


tributação do rendimento daí resultante.

Grande parte da doutrina identifica como característica central/ nuclear do


conceito a “fisicalidade”, enquanto decorrência da noção de “instalação fixa” cuja
verificação tem sido reconhecida como necessária à existência de estabelecimento
estável.

Pelo contrário, autores há que colocam a tónica num elemento diferente,


destacando a importância da “realização de uma atividade empresarial”227 enquanto
elemento fundamental da operacionalidade do conceito de estabelecimento estável.

Ou seja, uma parte dos autores dá enfase à “fisicalidade”, naturalmente associada ao


estabelecimento estável dado o contexto em que surgiu e a respetiva evolução, enquanto
outra parte da doutrina dá enfase à “atividade” desenvolvida como elemento central/
nuclear do conceito de estabelecimento estável.

Avance-se, desde já, que rejeitamos o entendimento (tradicionalista) da


necessidade de um elemento físico para a existência de um estabelecimento estável, sob
pena da completa inoperância da figura no atual contexto económico e comercial.

Admitir o contrário seria, parece-nos, amputar este conceito de um processo de


evolução que vai muito para lá da recondução desta figura à simplista noção de instalação
física. Refira-se, aliás, que a noção de instalação fixa nem se mostra determinante para

226
Cf. (Arnold, Threshold requirements for taxing business profits under tax treaties, 2003, p. 483 a 488).
227
(Garcia Prats, 1996, p. 184).

83
justificar a presença econômica ou um especial vínculo ao Estado, veja-se o caso do
estabelecimento estável agência 228.

Significaria também, desde logo, obstar à utilização desta figura num contexto de
economia digital, condenando-o, de certa forma, à falência. Facilmente se percebe que
assim seria, ou não fosse virtualmente impossível conciliar uma realidade fortemente
marcada pela desmaterialização de processos e elementos com uma outra
tradicionalmente assente num elemento/ ligação física estável com um território.

É disso que se trata. Dificilmente se conseguiria estabelecer a conexão necessária para


operar o conceito.

Com o devido respeito, considerar a “fisicalidade” a característica nuclear do


conceito de estabelecimento estável é simplesmente redutor. A capacidade de adaptação
deste conceito à realidade característica da economia digital passará por relevar outros
elementos e características que possam ser reconduzidos à ideia de estabelecimento
estável (enquanto presença estável, significativa, demonstrativa de uma ligação
económica).

Espera-se, assim, abandonar o comportamento, ainda muito comum, de tentar


identificar no contexto da economia digital um qualquer elemento físico que justifique a
presença de um estabelecimento estável no território de determinado Estado229.

Há que deixar de estar refém de algumas amarras e começar a percecionar a realidade


para além da materialidade das coisas.

Independente da posição que se assuma relativamente ao papel da “fisicalidade”


no âmbito do estabelecimento estável, é incontornável a importância desta característica
na dinâmica reconhecida a esta figura (à qual também se liga muita a característica da
permanência).

Não obstante o reconhecimento da “fisicalidade” enquanto característica com


profundo lastro na construção e desenvolvimento do conceito de estabelecimento estável,
o decorrer do tempo associado ao fenómeno da globalização tem demonstrado a crescente

228
Melhor descrito adiante.
229
Assim se ultrapassando a “(…) inadequação do conceito tradicional de estabelecimento estável –
baseado na presença física estável num território – para continuar a determinar a repartição do poder
tributário entre os Estados, no que toca a rendimentos empresariais” (Pereira P. R., O papel do
estabelecimento estável no Direito Fiscal Internacional, 2013, p. 586).

84
incapacidade daquele conceito (na sua formulação tradicional) em acomodar novas
realidades e a responder às necessidades que delas resultam.

Parece claro que o rápido desenvolvimento das TIC veio agudizar e tornar mais
óbvia uma certa falência daquela característica. Prova bastante, é justamente a construção
de novos tipos de estabelecimento estável, menos dependentes de uma qualquer
instalação física.

Nestes termos, parece assim possível considerar-se a existência de um precedente


em ultrapassar o elemento físico presente no conceito tradicional de estabelecimento
estável: o EE agência, enquanto ficção cujo objetivo é contornar a exigência de uma
instalação física230.

A “fisicalidade” não parece, assim, determinante para justificar uma forte ligação
económica entre o facto tributário e determinado território, e assim um limiar mínimo de
presença que justifique a tributação pelo Estado fonte. Pelo recurso a outros elementos
(que não o físico) somos capazes de justificar a existência daquele limiar mínimo.

Neste sentido, concordamos com os autores que reconhecem na atividade


empresarial e na sua natureza o elemento central do conceito de estabelecimento estável,
revelando de forma mais precisa a ideia de pertença económica (ou economic allegiance).

É a própria atividade empresarial que motivará e melhor justificará que se estabeleça um


vínculo com determinando Estado, independentemente do meio231 utilizado para o efeito.

Em sentido semelhante, refere RITA CALÇADA PIRES, numa alusão à posição


assumida por BRIAN ARNOLD, que “para o comércio electrónico, a existência de um limiar
de tributação (threshold) tem de ser estabelecido com base na natureza e nível da
actividade negocial, bem como com a quantidade de rendimento, pois, no comércio
electrónico não há “fisicalidade”, nem lugar fixo de negócios no entendimento corrente
desses conceitos232”.

O mesmo se poderá dizer relativamente à economia digital.

230
Sendo certo que neste particular sempre se poderia dizer que a “fisicalidade” é assegurada por um
agente, passível de ser considerado um elemento físico presente numa determinada geografia.
231
Procuramos evitar a utilização da palavra estrutura por poder ser, erroneamente, reconduzida a um
elemento físico.
232
Cf. (Pires R. C., Tributação Internacional do Rendimento Empresarial, 2011, p. 259) e (Arnold, Threshold
requirements for taxing business profits under tax treaties, 2003, p. 491).

85
Compreende-se que para a tributação pelo Estado da fonte se tenha de reconduzir
determinado rendimento a um veículo com implementação no território daquele, mas não
deve ser determinante (não obstante algumas dificuldades de conceptualização) que o
mesmo seja apreensível apenas através de um qualquer elemento físico233.

A atividade económica é demasiado complexa, implica demasiadas variáveis para


se poder aquartelar a num único elemento.

Ora, nos últimos anos a esta parte, o princípio do estabelecimento estável tem
vindo a mostrar-se desadequado face à realidade emergente234. O atual panorama do
comércio internacional, em constante mutação graças à nova realidade imposta pela
economia digital, só possível pela evolução das TIC, permitiu ultrapassar a necessidade
de uma qualquer presença física estável (seja uma instalação física ou recursos humanos)
de uma empresa num Estado para dessa forma desenvolver a sua atividade económica.

A ideia de desmaterialização associada à economia digital veio dificultar a utilização dos


elementos de conexão tradicionais, nomeadamente o E.E.

Pelas suas características, não é possível enquadrar a economia digital no conceito


tradicional de estabelecimento estável. Tal como ambos se apresentam, excluem-se
mutuamente.

Há uma profunda inadequação dos pressupostos do estabelecimento estável (real)


tradicional à economia digital235. Como já amplamente referido, a economia digital não
carece de presença física num território para aí desenvolver a sua atividade.

Esta característica, por si, coloca em causa elementos sobre os quais assenta a
construção do E.E. tradicional, pois estes têm por base, essencialmente, a ideia de
“fisicalidade” e de presença in loco.

Senão vejamos:

a) Um dos elementos do E.E. tradicional é a instalação fixa236.

233
Como esperamos conseguir demonstrar mais adiante.
234
O mesmo se diga relativamente ao princípio da residência e ao princípio da fonte.
235
Na medida em que a atual contextualização económica não tem qualquer semelhança com a
contextualização da época do surgimento e desenvolvimento do E.E. na prática internacional.
236236
Cf. n.º 1 do art.º 5.º do MC OCDE.

86
A sua definição como local, material ou instalação utilizados no exercício das
atividades da empresa237 denotam a exigência de uma presença física. Ora, na
economia digital essa “fisicalidade” é tendencialmente inexistente.

Haverá por isso uma dificuldade em corresponder este elemento a uma qualquer
realidade presente na economia digital, obstando assim à concretização de um E.E.
num território.

b) Outro elemento exigido para efeitos de E.E., cuja existência é dificilmente


identificável no contexto da economia digital, é a fixidez.

As dificuldades neste caso colocam-se quer num plano temporal quer geográfico.

No plano temporal, o problema passa pela possibilidade de compatibilidade entre o


tempo dito físico/ real e o tempo digital/ virtual. Na economia digital o tempo tende a
assumir um significado diferente do existente na economia e comércio tradicionais.

O tempo não é mais um fator de limitação. O mundo virtual está ao dispor 24 horas
por dia todos os dias em qualquer parte do globo. Perde-se a própria noção de fuso
horário. Mais, na economia digital e no comércio eletrónico nem existe em muitos
casos uma entrega física. Pelo que o imediato e o agora são os novos ritmos.

A rapidez com que as transações se concluem e o tempo digital destorcem o conceito


de permanência, de durabilidade física vincada, associado ao elemento fixidez.

Por fixidez entende-se a duração prolongada de uma instalação, a rapidez como que a
economia digital se processa é incompatível com esta ideia.

No plano geográfico, o problema passa pela localização concreta e real da instalação


para efeitos de E.E. No mundo real a realidade é constituída por uma diversidade de
Estados e jurisdições perfeitamente delimitas por fronteiras. Pelo contrário, o mundo
virtual é uno, sem barreiras. Processa-se de uma forma tendencialmente livre. Esta
característica, aplicada ao mundo empresarial, permite uma dispersão dos centros de
decisão o que, no mundo real, significa a sua distribuição por múltiplos locais.

A ideia de instalação fixa pressupõe a concentração de um conjunto de atividades


numa mesma localização. Para haver E.E. terá de haver um todo coerente. Ora, a

237
Cf. parágrafo 4 dos comentários ao n.º 1 do art.º 5.º do MC OCDE.

87
dispersão permitida pela economia digital potência justamente o contrário, não se
enquadra no espírito unitário do conceito tradicional do E.E. Caso não haja a referida
concentração numa só jurisdição, não haverá E.E.

Algumas destas atividades poderão ser preparatórias ou auxiliares, não sendo as


mesmas, por definição, geradoras de um E.E.238, mesmo que concentradas num único
local239.

De facto, estas atividades podem ser um foco de alguma fisicalidade que se mantem
mesmo no contexto da economia digital. Contudo, a sua desconsideração para efeitos
de E.E. obsta à recondução da atividade da empresa, ou parte dela, ao território de um
Estado e, consequentemente, à tributação do rendimento empresarial gerado na
economia digital.

Por outro lado, as atividades definidas como preparatórias ou auxiliares, por remissão
ao n.º 4 do art.º 5.º do MC OCDE, no âmbito de uma economia digitalizada e
desmaterializada podem, na prática, não ter essa natureza (não obstante se encontrarem
tipificadas como tal). Cumprirá fazer essa distinção.

Caso fossem estas atividades consideradas240, sobretudo quando presentes


maioritariamente num local, poder-se-ia, em parte, mitigar o problema atual da
maioritária não tributação na fonte dos rendimentos empresariais gerados na economia
digital pois seriam os mesmos reconduzidos a um novo conceito de instalação fixa e
de E.E.

c) Por último, referir que o E.E. Agência também não se mostra preparado para operar
num contexto de economia digital.

Desde logo porque a regra da agência prevista no n.º 5 do art.º 5.º do MC OCDE se
refere a “uma pessoa – que não seja um agente independente”, entendida nos termos

238
Cf. n.º 4 do art.º 5.º do MC OCDE.
239
Cf. parágrafo 21 dos comentários ao n.º 4 do art.º 5.º do MC OCDE, a “combinação das atividades
referidas nas alíneas a) a e) na mesma instalação fixa não deve ser considerada como constituindo um
estabelecimento estável desde que a atividade de conjunto da instalação fixa resultante desta
combinação seja de carácter preparatório ou auxiliar”.
240
Estão em causa atividades também necessárias aos objetivos da empresa e às quais muitas vezes se
associam recursos humanos, fazendo destas atividades potencialmente geradoras de um vínculo
económico com um Estado. Atividades essas que, além do mais, não obstante tipificadas como
preparatórias ou auxiliares podem na realidade não o ser.

88
da alínea a), do n.º 1 do art.º 3.º do MC OCDE, o que limita a possibilidade de
reconduzir esta figura a um software ou hardware que tivesse o mesmo propósito.

Por outro lado, porque também se exige, nos termos do n.º 5 do art.º 5.º do MC OCDE,
que o referido agente “actue por conta de uma empresa e tenha, e habitualmente exerça,
num Estado contratante”. Ou seja, implica a atuação num território e que essa atuação
seja nuclear no espetro das diferentes atividades que possam ser desenvolvidas do
ponto de vista empresarial.

Face ao exposto, começamos a afastar-nos de uma realidade de dupla tributação


internacional em direção a uma outra em que a tributação é omissa por parte dos Estados,
em virtude da crescente incapacidade que tem vindo a ser demonstrada em não só
identificar a existência de um rendimento associado a uma atividade económica e os
respetivos sujeitos como, posteriormente, identificar qual o Estado ou Estados com o qual
aquela está conexa, dificultando-se a repartição do poder de tributar.

Fica claro que o E.E. está construído para uma realidade e conjuntura assente na
“fisicalidade”, na presença real e física num território. Daí a inadequação das respetivas
regras na identificação de um E.E. quando confrontadas com a economia digital.

Observa-se uma erosão na construção fiscal do E.E.

Também a lógica associada à figura tradicional do estabelecimento estável é


utilizada para dificultar a tributação na fonte, numa tentativa consciente de reduzir o
imposto a suportar.

Com a economia digital, o agente económico tem a possibilidade de aproveitar a


mobilidade e a ineptidão das regras atuais face à realidade digital, não se gerando, assim,
o pressuposto da tributação pelo Estado da fonte241.

Os agentes económicos, no caso de desenvolverem uma atividade num


determinado Estado, conformam a sua atividade para que a mesma não recaia na figura
do estabelecimento estável. Comportamento hoje facilitado pela economia digital, na

241
Conforme referido anteriormente, o Estado da fonte apenas tem competência para tributar os
rendimentos empresariais produzidos no seu território por um não residente, caso os mesmos sejam
reconduzidos a um estabelecimento estável aí existente. Caso não existe um estabelecimento estável, o
Estado fonte não pode tributar.

89
medida em que esta, pela sua própria natureza, coloca em causa o conteúdo funcional de
muitas das regras inerentes ao conceito tradicional de estabelecimento estável.

A par do que já aconteceu, permitindo, por exemplo, a conceptualização do E.E.


Agência, mostra-se necessário um novo processo de desvalorização de elementos
tradicionalmente exigidos para a existência de um estabelecimento estável tradicional
(nomeadamente, a presença de uma instalação fixa), por forma a acomodar as diversas
realidades que caracterizam a economia digital.

90
Capítulo 3. A tributação do rendimento na economia digital

O desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação revolucionaram


a forma como até então a economia e o comércio se processavam. Vive-se hoje num
ambiente marcado pela crescente dispensabilidade de presença física, bem como de
intervenção humana presencial.

A crescente transação de bens e serviços intangíveis, incorpóreos, deixam de


necessitar dos tradicionais canais de distribuição para chegar ao seu destino. Rompe-se
com as noções comum de tempo e espaço242.

Observa-se a construção e desenvolvimento de uma economia assente na ausência


de “fisicalidade”, na digitalização, na mobilidade e na virtualidade.

A fiscalidade, até à data, e salvo raras exceções, está fortemente dependente da


existência de elementos físicos, tangíveis, com presença física estável, pelo que a
desmaterialização característica da economia digital e dos novos processos comerciais a
ela associados propiciam uma menor capacidade de conhecimento dos factos e de
controlo por parte das Administrações fiscais.

A invisibilidade que decorre da ausência de “fisicalidade” gera dificuldades na


identificação das transações, do seu objeto, do rendimento delas resultante e dos sujeitos
envolvidos.

Por outro lado, os elementos geográficos tornam-se irrelevantes, dificultando a


determinação da competência fiscal e o respetivo modo de proceder a essa determinação.

A confluência das diversas características da economia digital com a ineptidão


dos habituais meios de identificação e resolução das situações fiscais plurilocalizadas
(normas de conflito) – criadas num contexto diametralmente diferente do atual – cria um
buraco negro onde os diferentes agentes económicos se movimentam muitas vezes de
forma imune, escapando ao poder tributário dos Estados.

A insuficiente articulação e harmonização entre as diferentes leis fiscais nacionais,


e destas com as normas de Direito Fiscal Internacional, conjugadas com falta de resposta

242
Cf. (Pires R. C., Manual de Direito Internacional Fiscal, 2018, p. 304 e ss).

91
face aos diversos desafios colocados pela economia digital, propiciam a erosão da base
tributável e a transferência artificial de lucros das empresas243.

Este problema, por transversal aos diversos Estados, carece de uma resposta
internacional244.

Em reação, em fevereiro de 2013, foi publicado pela OCDE, o primeiro relatório


sobre Base Erosion and Profit Shifting (BEPS)245, cujo objetivo é identificar estratégias
de evasão fiscal que explorem lacunas e incompatibilidades nas regras tributárias –
promovendo a erosão da base tributável e a transferência de lucros – e, bem assim,
apresentar estudos e dados disponíveis sobre a existência e magnitude deste problema,
contendo uma visão geral dos desenvolvimentos globais com impacto sobre as realidades
tributárias das empresas246.

Desde então que o projeto BEPS247 está no centro da agenda internacional,


envolvendo, para além dos Estados-membros da OCDE, os países que constituem o
G20248, os países em desenvolvimento, as Nações Unidas, o Banco Mundial e o Fundo
Monetário Internacional. Não sendo estas questões novas, a verdade é que a discussão em
torno delas se tem intensificado nos últimos anos, com a produção de alguns documentos
muito relevantes na abordagem ao tema e nas possíveis soluções ao BEPS.

Algumas das soluções apresentadas pretendem ultrapassar aquilo que se tem


apelidado de crise dos elementos de conexão, constantes do MC OCDE, atribuindo-lhes
um conjunto de novas ferramentas, com expressão nas respetivas regras concretizadoras,
permitindo alguma adaptação à economia digital e ao novo paradigma da
desmaterialização.

As soluções que têm surgido são um reflexo da estratégia definida pela OCDE no
combate ao BEPS que passa, maioritariamente, pela manutenção das atuais regras de

243
Cf. (Catarino & Guimarães, 2015, p. 443 e ss).
244
Sendo certo que o facto de a economia digital ser vista como realidade ainda em desenvolvimento tem
criado para a definição de uma ação específica.
245
Cf. (OCDE, Addressing Base Erosion and Profit Shifting, 2013).
246
Sobre este projeto, vide (Arnold, International Tax Primer, 2016, p. 183 e ss) e (Ernick, 2013, pp. 3-7).
247
Sobre o BEPS e o sistema fiscal português, vide (Courinha, BEPS e o Sistema fiscal português: uma
primeira incursão, 2014).
248
Grupo constituído pelos líderes das 20 maiores economias mundiais. Em setembro de 2013, solicitaram
à OCDE a elaboração de um plano de ação. Vide (Machado & Costa, Manual de Direito Fiscal - perspetiva
multinível, 2018, p. 161 e ss).

92
tributação249, procurando construir ligações entre a realidade digital e a realidade
internacional fiscal na sua formulação tradicional. As ditas ligações têm tido por base a
descoberta de um qualquer elemento físico passível de ser identificado na realidade
digital.

A par desta estratégia de manutenção das atuais regras de tributação há uma outra
que insiste na procura de regras especificas para a economia digital.

Defendemos pelo contrário uma terceira estratégia, uma via alternativa: mantendo
os atuais princípios de tributação (residência e fonte) e os respetivos elementos de
conexão, sugere-se a alteração das atuais (e tradicionais) regras que os concretizam por
outras passíveis de serem aplicadas a qualquer contexto, independentemente da natureza
real ou virtual.

Por um lado, negamos a definição de regras específicas para a economia digital,


na medida em que poderíamos criar distorções e discriminação entre o comércio
tradicional e o eletrónico – sendo que o último é uma evolução do primeiro pelo que não
se justifica um tratamento díspar – e colocar em causa os próprios princípios de tributação
– regras específicas para a economia digital relevariam as características desta, as quais
poderão não ser subsumíveis com aqueles princípios.

Por outro, a manutenção das atuais regras, mantendo a ideia de “fisicalidade”,


significará continuar neste processo de busca continua por um elemento físico na
economia digital a que nos possamos agarrar para assim justificar a recondução a um dos
elementos de conexão. Sendo a economia digital marcada pela ausência de presença física
e estando a mesma em constante desenvolvimento250, a busca pelo elemento físico será
cada vez mais difícil ou mesmo impossível, pois o mesmo pode nem sequer existir.
Assim, entendemos que esta estratégia não configura uma resposta duradoura, pelo que
não deve ser aceite.

O caminho passará, entendemos nós, pela escolha de regras que possam ser
aplicadas a ambas as realidades, sem perda de vigor. Para isso, teremos de abandonar o

249
Como referido anteriormente, a crise dos elementos de conexão explica-se no plano das regras que o
concretizam, não no plano dos princípios. Segundo RITA CALÇADA PIRES, “O que a maioria da doutrina, das
organizações internacionais e dos países defendeu foi a manutenção dos atuais princípios de tributação,
discutindo, no entanto, a validade das atuais regras de tributação internacional em face do comércio
electrónico” (Pires R. C., Manual de Direito Internacional Fiscal, 2018, p. 327), cujo paralelismo pode ser
feito.
250
Pois está relacionada com as TIC, estando as mesmas em constante desenvolvimento.

93
recurso à “fisicalidade” como característica central da fiscalidade e substitui-la por outra
ou outras características que, de forma idêntica, permitam estabelecer um vínculo
tributável entre uma empresa e um Estado. Mostram-se necessários indicadores
alternativos da presença de uma atividade económica num território, até recentemente
conferidos pela “fisicalidade”.

3.1. A residência251

A doutrina tem apresentado diversas soluções para o problema do elemento de


conexão residência.

A primeira solução, mais extrema, passaria pela tributação direta dos acionistas
pelos rendimentos gerados pela empresa. Através da desconsideração da entidade
societária, tributar-se-ia diretamente os acionistas, independentemente da jurisdição em
que residissem. Procura-se o que fisicamente pode ser atingível. Na medida em que a
economia digital não confere uma desadequação tão profunda dos critérios existentes para
determinar a residência individual, aproveita-se esse facto adaptando-o à realidade
tecnológica252.

Outra solução toma o local de residência dos sujeitos intervenientes na atividade


societária como critério relevante. Assim, a residência da sociedade seria onde fosse a
residência dos diretores ou acionistas. Neste caso, o facto determinante não seria o local
onde são tomadas as decisões, mas antes os sujeitos que as tomam.

No caso de sociedades de negócios que envolvessem apenas uma substância


eletrónica/ digital253, existindo uma relação forte ou um controlo por parte do autor
intelectual, então a residência da empresa seria no local onde este autor residisse.

251
Dada a centralidade do E.E. neste trabalho, não procuremos aprofundar em demasia os
desenvolvimentos ocorridos em sede do elemento de conexão residência.
252
Para o desenvolvimento deste tema, vide (Pires R. C., Manual de Direito Internacional Fiscal, 2018, pp.
329-337).
253
Segundo RITA CALÇADA PIRES, consideram-se sociedades ou negócios “que envolvam apenas uma
substância electrónica aqueles que têm como principal actividade a exploração de um produto intelectual,
ideia ou conceito, através de equipamento electrónico” (Pires R. C., Manual de Direito Internacional Fiscal,
2018, p. 330).

94
Todas estas soluções apresentam uma mesma crítica: recorrem à residência
individual como forma de definir a residência da sociedade, num fenómeno de
desconsideração e desprestígio da realidade societária.

De todo o modo, compreende-se o recurso à residência individual. Trata-se de


uma realidade tangível com menor mobilidade (sobretudo se considerarmos vários
administradores/ diretores) do que aquela vulgarmente associada à residência de um ente
coletivo.

Para além das anteriores soluções, tem sido avançada uma outra que se diferencia
pelo facto de não ter como premissa a residência individual de algum dos administradores
ou acionistas.

Falamos da adaptação do método de fracionamento segundo a fórmula (formulary


apportionment/ approach) à determinação da residência. Através de um método
semelhante ao utilizado na determinação da residência individual (n.º 2 do art.º 4.º do MC
OCDE), a determinação da residência seria feita segundo uma fórmula que quantificaria
e valoraria um compósito de residências de trabalhadores, diretores, administradores,
acionistas e outros indivíduos com especial relação com a empresa em causa.

A par destas soluções, também a OCDE procurou oferecer uma solução que
contrariasse as dificuldades de operacionalidade do elemento de conexão residência na
delimitação do poder de tributar de um Estado.

Assim, para os casos em que a direção efetiva se encontrasse distribuída por


diversas jurisdições a solução passaria ou pela substituição do critério da direção efetiva
ou pelo aperfeiçoamento desse conceito ou por se estabelecer uma hierarquia de testes, à
semelhança da residência individual.

Relativamente à primeira solução – substituição do critério da direção efetiva –


três foram os critérios alternativos apontados: o i) local do registo da sociedade; o ii) local
da residência dos diretores, administradores ou acionistas; e o iii) local onde existe o nexo
económico forte.

A referência ao local de registo deve ser desde logo desconsiderada, pois privilegia a
forma sobre a substância podendo ser alvo de manipulação254.

254
Pelo que se poderia questionar a correspondência do local de registo à realidade da empresa.

95
A opção pela residência dos diretores, administradores ou acionistas cai nas críticas
anteriormente feitas da desconsideração da realidade societária.

O critério do nexo económico mais forte255 não obstante o seu interesse, foi pouco
desenvolvido. Do que se compreende, este implicaria a definição de um conjunto de
considerações que revelassem as características económicas que ligam uma realidade
empresarial a um Estado.

Por outro lado, a opção pelo aperfeiçoamento do teste da direção efetiva passaria
ou pela definição/ preenchimento deste conceito256 – indeterminado por natureza – ou
pela determinação dos elementos que devessem ser ponderados para alcançar a
concretização do conceito. Esta solução implica que qualquer que seja a definição ou
elementos utilizados para o efeito, se mantenha o conceito de direção efetiva aberto o
suficiente para conseguir enquadrar diversas realidades – sobretudo num contexto
extraordinariamente dinâmico como é o da economia digital.

Por último, surge a solução de estabelecer uma hierarquia de critérios para


determinar a residência societária, à semelhança do que se passa na residência individual
(regra tie-breaker). A hierarquia apresentada coloca em primeiro lugar o local de direção
efetiva, seguido do lugar de registo/ constituição, em terceiro o nexo económico mais
forte e finalmente, no caso de nenhum dos anteriores, alternadamente, o acordo entre os
Estados envolvidos.

O desenho seria assente numa adaptação da já mencionada teoria do método do


fracionamento segundo fórmula (formulary apportionment/ approach). Construindo uma
hierarquia, com vários elementos, maior será a probabilidade de se conseguir
efetivamente determinar a residência.

Esta construção não é, porém, isenta de críticas, desde logo pela complexidade
que lhe é apontada dificultando a aplicação prática. Outra crítica que se aponta relaciona-
se com a necessidade de proceder a um processo de valoração de certos elementos no
caso de igualdade, de múltipla localização ou de conhecimento de apenas alguns
elementos.

255
Numa lógica muito parecida aquela que subjaz ao conceito de E.E. é à ligação por este estabelecido
com o território de determinado Estado (e que adiante utilizaremos como ponto central na adaptação do
tradicional conceito de E.E. à realidade da economia digital).
256
Ao contrário do que hoje acontece no âmbito do n.º 3 do art.º 4 do MC OCDE.

96
Ainda assim, parece a via mais adequada a responder às debilidades sentidas na
definição da residência de um ente coletivo através do conceito de direção efetiva,
agravadas pela economia digital.

No caso de impossibilidade em determinar qualquer dos elementos que


componham o centro de interesses vitais económicos tem sido ponderado o recurso aos
elementos fornecidos ao cliente pela sociedade na sua página virtual. Contudo, a
operacionalidade deste critério dependeria do auxílio de intermediários tecnológicos na
descodificação dos dados obtidos, ajudando a identificar o contribuinte. Em si mesmo
também não será um processo simples e, porventura, onerar-se-á em demasia o
intermediário na sua relação com as Administrações fiscais257

De todo o modo, caso a referida hierarquia não permite a determinação da


residência, poderemos sempre recorrer ao critério residual de tributação direta dos
acionistas258.

De referir que todas as teorias e soluções apresentadas continuam, segundo


entendemos, a laborar num erro: continua-se a tentar encontrar no universo digital
elementos físicos que sustentam esse universo e que possam fazer a ponte com a
fiscalidade física, permitindo-lhe alcançar a realidade não palpável.

3.2. Fonte, em especial o Estabelecimento Estável

A exigência de presença, de um certo grau de permanência da atividade de um


não-residente, através de uma ligação geográfica, sempre foi condição essencial de
tributação por parte dos Estados da fonte. Esse grau de permanência é sobretudo
concretizado pela existência de um estabelecimento estável, o qual, na atividade
empresarial, consubstancia o limite mínimo para existir tributação.

Como referem PETER HONGLER e PASQUALE PISTONE, “This compromise was


reached at a time in which the PE concept was the best possible proxy to determine the
existence of a sufficient nexus of business with the taxing jurisdiction of a country other
than that of residence of the taxpayer. In other words, without a physical presence outside

257
Já para não falar da compatibilização desta atividade de auxílio com diversos temas como o sigilo ou,
mais recentemente, o regime geral de proteção de proteção de dados.
258
Cf. (Pires R. C., Manual de Direito Internacional Fiscal, 2018, p. 336).

97
the country of residence, business income was mainly the outcome of production factors
organized under the taxing jurisdiction of such country” (sublinhado nosso)259.

Não obstante tratar-se de uma figura relativamente consensual no contexto do


Direito Fiscal Internacional, persistem ainda algumas tensões entre países importadores
e exportadores líquidos de capital, entre países mais e menos desenvolvidos e entre
Estados residência e fonte e a prevalência de uns face a outros260.

O artigo 5.º do MC OCDE consagra diversas categorias de estabelecimento


estáveis, algumas das quais reflexo da evolução da economia.

Assim, e segundo ANA PAULA DOURADO261, podemos destacar:

1) Um (tradicional) estabelecimento estável com presença física (instalação fixa) –


art.º 5.º, n.º 1, do MC OCDE;
2) Um estaleiro de construção ou de montagem – art.º 5.º, n.º 3, do MC OCDE;
3) Um agente dependente – art.º 5.º, n.º 5, do MC OCDE;
4) Um estabelecimento estável de serviços (não exige instalação fixa) – razão pela
qual recai no art.º 5.º, n.º 5, do MC OCDE, em articulação com o art.º 7.º do MC
OCDE262;
5) Um estabelecimento estável segurador (local de cobrança de prémios ou locação
de riscos, reconhecido pelo artigo 5.º, n.º 5, do MC OCDE).
6) Local de situação do equipamento substancial (em alguns acordos de dupla
tributação);
7) Exploração de recursos naturais.

Como mencionado anteriormente, o art.º 5 do MC OCDE distingue entre agentes


dependentes e agentes independentes, contrapondo o n.º 5 ao n.º 6, respetivamente.

259
Cf. ( Hongler & Pistone , 2015, p. 15).
260
Tensões essas sempre presentes na construção e desenvolvimento do Direito Fiscal Internacional.
261
Cf. (Dourado, Governação Fiscal Global, 2018, p. 86). Reconhece-se na classificação apresentada a
capacidade de abarcar um conjunto de realidades hoje presentes, que advêm de uma interpretação da
realidade desenvolvida pela autora que está para além da letra do MC OCDE. A presente classificação
reconhece alguma mutabilidade e adaptabilidade ao conceito de estabelecimento estável.
262
Cf. parágrafos 42.11, 42.42 e 42.48 dos comentários ao art.º 5.º do MC OCDE (OCDE C. , MC OCDE,
junho 2015).

98
Como explicado, os primeiros constituem um estabelecimento estável, legitimando a
tributação das empresas não residentes no Estado fonte (sendo o E.E. uma extensão
destas). Os segundos, pelo contrário, não constituem um estabelecimento estável.

Também neste caso observa-se uma manipulação das atuais regras por parte das
empresas, as quais, para evitar cair nos pressupostos do E.E. agência, recorrem a pessoal
local sem autoridade formal para a conclusão de contratos263.

De facto, os Estados, e sobretudo os agentes económicos em proveito próprio,


foram paulatinamente reconhecendo as fragilidades do conceito de estabelecimento
estável. O estabelecimento estável “deixou de proteger as bases fiscais do Estado fonte e
passou a servir a elisão fiscal nestes Estados264”.

A Ação 7265 do BEPS tinha como objetivo prevenir a elisão aos elementos
configuradores de estabelecimento estável. Ou melhor, procura prevenir a atuação
considerada abusiva por parte dos agentes económicos em evitar conscientemente a
constituição de estabelecimento estável nos Estados onde desenvolvem as suas
atividades, através da manipulação dos elementos concretizados do E.E.

A solução, sempre se diga, deveria passar pela alteração profunda das regras
concretizadoras do elemento de conexão estabelecimento estável, por forma a adotá-lo de
meios que lhe permitissem operar no contexto da economia digital.

Contudo, da Ação 7 limitou-se a tecer recomendações às regras respeitantes às


atividades preparatórias e auxiliares (art.º 5.º, n.º 4, do MC OCDE), ao conceito de agente
dependente (art.º 5, n.º 5.º, do MC OCDE) e de agente independente (art.º 5.º, n.º 6 do
MC OCDE).

Não se está com isto a menosprezar as alterações realizadas por força do relatório
final da Ação 7. Aliás, esta ação foi importante para que a natureza de algumas atividades,
até então desconsideradas, passassem a ser consideradas para efeitos de existência de E.E.

263
Como veremos, a Acão 7 do BEPS, reconhecendo este problema, propôs alteração de alguns dos
requisitos através dos quais se configura atuação de um agente por forma a ser considerado um E.E.
264
Cf. (Dourado, Governação Fiscal Global, 2018, p. 86).
265
Cf. (OCDE, Preventing the Artificial Avoidance of Permanent Establishment Status, Action 7: 2015 Final
Report, 2015).

99
Porém, parece ter ficado aquém das expectativas. Ao manter e enfatizar a
exigência da presença física da atividade, a Ação 7 não logrou dar um passo determinante
na tributação dos rendimentos provenientes de contextos caracterizados pela
digitalização.

A par disto, e corolário de um processo em constante desenvolvimento266, a OCDE


acrescentou aos comentários ao artigo 5.º do MC OCDE uma parte exclusivamente
dedicada ao comércio eletrónico e à economia digital e à sua relação com o
estabelecimento estável (vide os antigos parágrafos 42.1 a 42.10267 e os atuais parágrafos
122 a 131 dos comentários ao art.º 5.º do MC OCDE).

Uma vez mais, observa-se a manutenção da “fisicalidade” como elemento central.


Através dos comentários supra mencionados, e numa tentativa de mitigar a inoperância
do E.E. num contexto digital, a OCDE procura (a nosso ver de forma errada) enxertar a
realidade digital do comércio e da economia na realidade física do E.E.

De referir que a ideia de manutenção da “fisicalidade” era já abordada no Relatório


“Are the current treaty rules for taxing business profits appropriate for e-commerce?”,
no âmbito do qual a OCDE defendia a manutenção do E.E. para o caso do comércio
eletrónico, recusando qualquer inovação no conceito ou a pesquisa por outras soluções
que não o E.E.268

Pela procura de um elemento físico no comércio digital pretende-se fazer a ligação


e o preenchimento dos elementos do E.E. Ou seja, procura-se um ponto (físico) comum
a ambos para assim se justifica a existência de um E.E. e a tributação do rendimento que
daí advenha.

O contínuo recurso à “fisicalidade” como forma de adaptar o E.E. à realidade


digital condenará, a breve trecho, a aplicabilidade do E.E. Percebe-se que, por força de
um certo conforto teórico-prático, se mantenha este elemento, mas atendendo ao processo
evolutivo da economia digital que se perspetiva, a possibilidade já hoje reduzida de

266
Com diversos estudos efetuados e propostas apresentadas por diversos grupos de trabalho criados
para análise desta temática.
267
Cf. (OCDE C. , MC OCDE, junho 2015) e (OCDE, Model Tax Convention on Income and on Capital:
Condensed Version, November 2017).
268
Cf. (OCDE, Are the current treaty rules for taxing business profits appropriate for e-commerce?, 2005)
e (Pires R. C., Manual de Direito Internacional Fiscal, 2018).
Ao contrário do defendido neste trabalho, o referido relatório defende as atuais regras de concretização
do E.E. recusando alterações fundamentais as mesmas.

100
encontrar elementos físicos que interliguem as duas realidades – permitindo que se
ficcione o E.E. – tenderá a ser cada vez menor.

Assim, a menos que abandonemos a ideia ainda muito enraizada da “fisicalidade”,


procurando elementos de outra natureza, continuaremos a discutir a viabilidade do E.E. e
a fabricar “remendos” que permitam a sua manutenção.

Numa resposta que se quer coordenada ente diversos Estados e jurisdições, a falta
de resultados de algumas Ações BEPS, nomeadamente a Ação 7, e das opções tomadas
pela OCDE tem motivado a apresentação por parte dos diferentes Estados de soluções
nacionais, descoordenadas, que pretendem dar resposta imediata aos problemas de
tributação sentidos pelos Estados, mas que falham na compreensão do problema que não
é local, mas global269.

3.2.1. O Estabelecimento Estável Real

Optando a OCDE por manter, no MC OCDE uma construção tradicional de E.E.,


essencialmente fundada na fisicalidade, a solução passa por estabelecer um elo de ligação
entre a realidade digital e a realidade física, que conforme a primeira a esta última. Ou
seja, é necessário encontrar um elemento que se possa reconduzir a ambas as realidades
e cujas regras concretizadoras do E.E. possam apreender.

O elemento comum a ambas as realidades é o material informático270. É este o


meio através do qual a realidade virtual e a física comunicam. Através do material
informático permite-se ao utilizador da realidade digital aceder a essa mesma realidade.

Porém, de entre o diverso material informático utilizado para realizar transações


num contexto digital nem todo está habilitado, segunda a OCDE, a poder constituir um
E.E.271

269
Com implicações ao nível do princípio da neutralidade e da concorrência fiscal entre os Estados.
270
Cf. parágrafo 125 dos comentários ao art.º 5.º do MC OCDE (OCDE, Model Tax Convention on Income
and on Capital: Condensed Version, November 2017).
271
Vide (Pires R. C., Manual de Direito Internacional Fiscal, 2018, p. 337).

101
O MC OCDE, através do parágrafo 125 dos comentários ao seu art.º 5.º272,
apresenta uma distinção entre o hardware e o software, excluindo a possibilidade de este
último poder vir a ser um E.E.

Como justificação, refere-se que o software – e, portanto, os websites – não


constituem um bem corpóreo, não podendo, por isso, preencher a exigência do elemento
físico (vertido na exigência de uma instalação fixe e na fixidez geográfica), ao contrário
do que se passa com o hardware que pode ser palpável, tangível, visível e detetável na
realidade física273.

Assim, segundo a OCDE, o servidor pode vir a constituir um E.E. no âmbito da


economia digital, ao contrário do website.

Todavia, não basta existir um servidor para que este concretize um E.E. É
necessário que o servidor preenche todos os requisitos exigidos pelo art.º 5.º do MC
OCDE274.

Assim, nos termos dos comentários ao comércio digital presentes no MC OCDE, e


conforme identifica RITA CALÇADA PIRES275:

- A empresa que exerce a sua atividade através de um website tem de ter à sua disposição
o servidor onde está alojado esse website, não havendo necessidade de o servidor ser
sua propriedade. O que releva é a empresa deter o domínio, a exploração do servidor.
Não basta um simples acordo de armazenagem como proprietário do servidor276.

- O servidor tem de ser fixo, não importando a possibilidade da sua deslocação. Importa
sim que o servidor esteja situado num certo local durante um lapso de tempo semelhante
ao considerado para efeitos do n.º 1 do art.º 5 do MC OCDE277.

272
Cf. (OCDE, Model Tax Convention on Income and on Capital: Condensed Version, November 2017).
273
Nestes termos, parágrafo 124 dos comentários ao art.º 5.º do MC OCDE (OCDE, Model Tax Convention
on Income and on Capital: Condensed Version, November 2017).
274
Como se prevê na parte final 125 dos comentários ao art.º 5.º do MC OCDE (OCDE, Model Tax
Convention on Income and on Capital: Condensed Version, November 2017).
275
Cf. (Pires R. C., Manual de Direito Internacional Fiscal, 2018, pp. 338-339).
276
Cf. parágrafo 124 dos comentários ao art.º 5.º do MC OCDE (OCDE, Model Tax Convention on Income
and on Capital: Condensed Version, November 2017).
277
Cf. parágrafo 125 dos comentários ao art.º 5.º do MC OCDE (OCDE, Model Tax Convention on Income
and on Capital: Condensed Version, November 2017).

102
- No local onde estiver o servidor, a empresa tem de exercer a sua atividade através desse
equipamento, não sendo necessária a presença de pessoal278, à semelhança do
desenvolvimento da atividade através de equipamento automático279 e devendo a
verificação desta exigência ser efetuada casuisticamente280. Procura-se assim
ultrapassar o recurso ao denominado servidor espelho.

- Por último, refere-se ainda não poder o servidor desempenhar apenas atividades
preparatórias ou auxiliares281, devendo revelar a utilização do servidor o exercício de
atividades essenciais ao labor da empresa, facto apenas verificável caso a caso,
consoante a natureza das atividades implicadas no caso concreto282.

Contudo, e não obstante o esforço desenvolvido pela OCDE na utilização do


servidor (elemento físico283) enquanto elo de ligação à realidade física, assim
consubstanciado um E.E., parece ser a solução encontrada desadequada a muitas outras
realidades emergentes como é o caso particular das Cloud284.

Reconhecendo algumas limitações técnicas para compreender o seu


funcionamento, a Cloud é o termo comumente utilizado para descrever uma rede global
de servidores, cada um deles com uma função única.

A Cloud não é uma entidade física, tangível, mas sim uma vasta rede de servidores
remotos em todo o mundo que estão interligados e que devem funcionar como um
ecossistema único.

Estes servidores foram concebidos para armazenar e gerir dados, executar aplicações ou
fornecer conteúdos ou um serviço. Como alternativa ao acesso aos ficheiros e dados a
partir de um computador local ou pessoal, permite-se o acesso online a partir de um

278
Cf. parágrafo 127 dos comentários ao art.º 5.º do MC OCDE (OCDE, Model Tax Convention on Income
and on Capital: Condensed Version, November 2017).
279
Cf. parágrafo 41 dos comentários ao art.º 5.º do MC OCDE (OCDE, Model Tax Convention on Income
and on Capital: Condensed Version, November 2017).
280
Cf. parágrafo 126 dos comentários ao art.º 5.º do MC OCDE (OCDE, Model Tax Convention on Income
and on Capital: Condensed Version, November 2017).
281
Cf. parágrafo 128 dos comentários ao art.º 5.º do MC OCDE (OCDE, Model Tax Convention on Income
and on Capital: Condensed Version, November 2017).
282 Cf. parágrafos 130 e 131 dos comentários ao art.º 5.º do MC OCDE (OCDE, Model Tax Convention on
Income and on Capital: Condensed Version, November 2017).
283
Mais um exemplo da dificuldade de adaptação do E.E. à economia digital em virtude do mesmo se
basear na “fisicalidade.
284
Sobre Cloud Computing e o seu enquadramento tributário, vide (Teixeira & Rodrigues, A Tributação do
Comércio Electrónico - Novos Desafios, 2014).

103
dispositivo com Internet — a informação estará disponível onde quer que esteja e em
qualquer altura.

Assim, uma empresa que decida utilizar a Cloud na sua atividade, deixa de
conseguir identificar e localizar o servidor utilizado. Não se trata de uma questão de
vontade, a forma como o sistema está estruturado dificulta muitíssimo essa identificação.
Não podendo identificar o servidor, não se mostra possível reconduzir a atividade da
empresa ao local onde aquele se insere.

Não sendo esta situação subsumível a nenhum dos comentários ao art.º 5.º
presentes no MC OCDE, dificilmente se conseguirá encontrar um elemento físico que
justifique a presença de um E.E., com as demais consequências.

3.2.2. O Estabelecimento Estável Agência

Em linha com o que vem sendo referido, também quando ao E.E. agência observa-
se a manutenção da “fisicalidade” como elemento central na resposta aos desafios criados
pela economia digital.

Desta forma, a OCDE procurou encontrar ma economia digital e no comércio


eletrónico, um elemento físico que suporte o elemento pessoal do conceito.

Nesta abordagem, identificou-se apenas o fornecedor de serviço de Internet/


Internet Service Provider (FSI/ ISP) como possibilidade de constituir um E.E. agência,
por ser o elemento pessoal central existente na ligação entre a realidade virtual da empresa
e a realidade física, pois é este o “agente” que permite e garante à empresa o acesso ao
universo digital 285.

A OCDE acabou por abandonar o recurso ao FSI na busca pelo dito elemento
pessoal, em virtude de este, em regra, não deter nem atuar com os poderes exigidos no
art.º 5.º n.º 5 do MC OCDE para que haja a qualificação de uma pessoa como agente
dependente.

285
Cf. (Pires R. C., Manual de Direito Internacional Fiscal, 2018, p. 339).

104
O FSI tem como função/ atividade deter e gerir servidores, onde disponibiliza
espaço para armazenamento de informação digital – incluindo websites. Daqui não
decorrem quaisquer poderes para celebrar contratos que vinculem a empresa286.

No mesmo sentido, no parágrafo 128 dos comentários ao art.º 5.º do MC OCDE


“afirma-se que «assegurar uma ligação de comunicação – à semelhança de uma linha
telefónica – entre fornecedores e clientes» é uma actividade de carácter auxiliar ou
preparatório, logo a função desempenhada pelo FSI/ ISP em face da atividade exercida
pela empresa jamais seria dotada de essencialidade”287.

Façamos o exercício de recuar à noção e estrutura tradicional de E.E. agência:


observa-se, de certa forma, uma relação tripartida. Esta relação288 permite, através de
interposta pessoa, a celebração de um ou mais contratos entre uma empresa e uma
entidade (pessoal ou coletiva) sediada num outro Estado.

Ora, o FSI apenas permite o acesso de uma empresa ao universo digital289. Não há
posteriormente uma atuação no sentido de negociar com terceiros.

Pelo que dificilmente se observa qualquer paralelismo entre o Agente dependente


e o FSI que permita concretizar um E.E. agência num determinado território.

Neste sentido, não pode um FSI ser um agente dependente e constituir um E.E.
agência.

O facto de não se poder reconduzir o FSI à figura do agente dependente, enquanto


única abordagem identificada para encontrar um elemento pessoal no contexto da
economia digital290, coloca em causa a própria necessidade de se manter a figura num
contexto digital291.

286
O ISP é uma entidade que garante o acesso da empresa ao universo virtual/ digital, surgindo como uma
figura com funções autónomas, próprias cuja atividade é proporcionar o acesso à internet. Neste sentido,
o ISP desempenha funções que coadjuvam a atividade desempenhada no universo virtual, permitindo o
acesso à economia digital, ou seja, consubstancia uma atividade auxiliar e não principal.
287
Cf. (Pires R. C., Manual de Direito Internacional Fiscal, 2018, p. 340) e (OCDE, Model Tax Convention
on Income and on Capital: Condensed Version, November 2017).
288
Numa exposição muito simplista.
289
No qual a empresa, se tiver sucesso, celebrará contratos com terceiros.
290
Não se conhecendo outras abordagens entretanto desenvolvidas para o efeito.
291
Em função do que desenvolveremos adiante sobre a possibilidade de um E.E. digital, não se
compreende a necessidade e entendemos até não ser possível manter a figura do E.E. agência no contexto
da economia digital.

105
Ainda neste âmbito, e em linha com o referido no capítulo anterior, a OCDE
recusa a possibilidade de o website gerar um E.E. agência. Com efeito, e tendo por
referência a centralidade da “fisicalidade”, as mesmas razões que conduziram à recusa de
o website vir a constituir um E.E. real, aplicam-se também para o E.E. agência,
acrescentando-se um argumento suplementar: o website nunca poderia ser considerado
“pessoa” nos termos da definição presente no art.º 3 do MC OCDE292.

Em face do exposto, resulta poder existir, para a OCDE, um E.E. no âmbito da


economia digital, se construído nos termos do art.º 5.º n.º 1 do MC OCDE, mas não nos
termos do E.E. agência.

De todo o modo, as dificuldades de concretização do E.E. agência não se esgotam


na economia digital. Assim, de seguida, abordaremos as alterações ao Art.º 5.º n.º 5
suscitadas pela Ação 7.

3.2.2.1. Artigo 5.º n.º 5

No que diz respeito ao Agente dependente, e ao art.5º, n. º5 do MC OCDE em


concreto, a proposta apresentada pela Ação 7293 visou a clarificação da disposição no
sentido de extensão das atividades abrangidas. Esta proposta reconhece que o papel do
Agente dependente, para efeitos da existência de um E.E., não se esgota na finalização e
conclusão de contratos por conta da empresa não-residente.

Ao contrário do previsto na versão original do artigo supra, existem um conjunto


de situações em que o Agente dependente desempenha um papel determinante na
negociação do contrato, mas, por um qualquer motivo, mostra-se o mesmo finalizado e
concluído num território diferente (por hipótese, na sede da empresa).

Ou seja, não obstante uma atuação intencional no sentido da conclusão do


contrato, o facto de não o finalizar (um mero formalismo) obstaria à recondução do
Agente dependente à figura do E.E., com a consequência de não ser estabelecido um
vínculo tributável.

292
Cf. parágrafo 131 dos comentários ao art.º 5.º do MC OCDE (OCDE, Model Tax Convention on Income
and on Capital: Condensed Version, November 2017).
293
Antes da publicação do relatório final, foram consideradas outras possibilidades de alteração. Neste
sentido, vide (Pleijsier, 2015, pp. 14-150).

106
Com efeito, houve, naturalmente, por parte dos agentes económicos uma
manipulação das regras de imputação do ónus de tributação: recorrendo a Agentes
presentes num determinado Estado para a condução do processo negocial, revocam o
processo a final para efeitos de conclusão. Ou seja, recorrem a pessoal local sem
autoridade formal para a conclusão de contratos.

Assim, a prática do (seu) referido Agente não poderia ser considerada como
consubstanciando um E.E., no estrito cumprimento do previsto no artigo em apreço294.

Percecionando esta realidade, e a erosão da base tributável associada, a OCDE


propôs a seguinte redação para o art.º 5.º, n.º 5295:

“Não obstante o disposto nos nºs 1 e 2, mas com subordinação às regras do n.º 6,
quando uma pessoa atue num Estado Contratante por conta de uma empresa e conclua
habitualmente contratos nessa qualidade, ou habitualmente desempenhe o papel
principal na conclusão dos contratos que são celebrados rotineiramente, sem
modificações materiais pela empresa e estes contratos tenham sido:

a) em nome da empresa, ou
b) para transferência de propriedade, ou para atribuir um direito ao uso,
propriedade daquela empresa ou aquela empresa tenha o direito de uso,
ou
c) para o fornecimento de serviços por aquela empresa296,

Será considerado que esta tem um estabelecimento estável nesse Estado…”

Para além da (re)definição da atividade do Agente dependente foram


acrescentadas, sobretudo, duas alíneas ao artigo, que elencam duas situações distintas
consideradas relevantes para a aplicação do artigo: (b) contratos para a transferência de
propriedade ou direito de uso de bens pertencentes à empresa ou que a mesma tenha
direito a usar; ou (c) contratos para a prestação de serviços pela empresa.

Estas alíneas são alternativas, sendo apenas necessário que uma delas se verifique.

294
Na sua versão original.
295
Cf. (OCDE, Preventing the Artificial Avoidance of Permanent Establishment Status, Action 7: 2015 Final
Report, 2015, pp. 17-18).
296
Negrito nosso para identificar as alterações propostas.

107
Como refere ANA PAULA DOURADO297, “É criticável que a alínea a) «em nome da
empresa» se mantenha, pois é das cláusulas que mais controvérsia têm gerado, dada a
facilidade em ser elidida. Todavia, as alíneas b) e c) pretendem colmatar os esquemas que
elidem a alínea a)”298.

Como já era disposto anteriormente, as atividades do art.5º, n. º4 continuam fora


do âmbito deste artigo.

A par das alterações propostas ao artigo, foram também propostas quer alterações
aos comentários ao artigo quer comentários novos.

Os referidos comentários pretendem justificar as alterações, as quais têm como


propósito o reforço da substância da atividade do Agente, passando a abranger situações
em que os agentes desenvolvem atividades consideradas essenciais à conclusão de
contratos que não eram consideradas anteriormente. O objetivo é precisamente resolver
as debilidades enunciadas, em que a forma prevalecia sobre a substância.

Releva também a preocupação das alterações propostas em definir as situações


em que um Agente dependente assume um papel principal na conclusão dos contratos.
Neste sentido, devem ser consideradas as situações em que o Agente, através dos seus
atos, leva um terceiro a celebrar contratos com a empresa que o mesmo representa.

As referidas propostas foram acolhidas, constando da última versão do MC


OCDE299.

297
Análise com a qual concordamos.
298
Cf. (Dourado, Governação Fiscal Global, 2018, p. 89).
299
Vide (OCDE, Model Tax Convention on Income and on Capital: Condensed Version, November 2017).

108
3.2.2.2. Artigo 5.º n.º 6

Relativamente às propostas de alteração ao art.5º, nº6 do MC OCDE, o objetivo


é, de alguma, esclarecer as situações enquadradas no conceito de agente independente.

Assim, se houver atuação exclusiva, ou quase exclusiva, de um Agente para uma


ou mais empresas, com as quais esteja especialmente relacionado, não se pode considerá-
lo um agente independente.

Pelo recurso a expressões como “exclusivamente ou quase exclusivamente300” e


“empresas especialmente relacionadas301”, a referida proposta mereceu um conjunto de
novos comentários cujo propósito é esclarecer o que se entende com aquelas expressões.

Quanto à primeira expressão, os comentários elucidam (pela negativa) que as


atividades desenvolvidas pelo agente para empresas com as quais não esteja
especialmente relacionado não representarão uma parte significativa da sua atividade (do
seu negócio).

Como métrica a utilizar para classificar uma atividade como significativa, recorre-
se ao seguinte exemplo:

“where, for exemple, the sales that an agent concludes for enterprises to wich it is not
closely related represente less than 10 per cent of all the sales that it concludes as an
agent acting for other enterprises, that agent should be viewed as acting «exclusively
or almost exclusively” on behalf of closely related enterprises”302.

Daqui se retira que um agente desempenha a sua atividade de forma exclusiva ou


quase exclusiva para uma empresa se esta representar para si, considerada a totalidade da
sua atividade, mais de 15-20%.

Quanto à segunda expressão, são definidos alguns critérios.

300
“(…) a person acts exclusively or almost exclusively”, na versão original (OCDE, Preventing the Artificial
Avoidance of Permanent Establishment Status, Action 7: 2015 Final Report, 2015).
301
“(…) closely related”, na versão original (OCDE, Preventing the Artificial Avoidance of Permanent
Establishment Status, Action 7: 2015 Final Report, 2015).
302
Cf. (OCDE, Preventing the Artificial Avoidance of Permanent Establishment Status, Action 7: 2015 Final
Report, 2015, p. 26).

109
Por um lado, se considerando todos os factos e circunstâncias do caso concreto é
possível afirmar que uma pessoa tem controlo, ou que ambas estão sobre o controlo das
mesmas pessoas ou empresas303.

A título de exemplo, os casos de acionistas que detêm menos de 50% das ações, mas que
têm certos direitos que lhes conferem a mesma posição que teriam se tivessem mais que
50%.

Por outro lado, considera-se que uma pessoa está “especialmente relacionada com
uma empresa” se uma ou ambas as partes possuam direta ou indiretamente mais de 50%
de participação (beneficial interest) na outra, ou ainda no caso de um terceiro, ainda que
apenas indiretamente.

As alterações ao art.º 5.º, n.º 6 excluem ainda as empresas que atuam


exclusivamente ou quase exclusivamente por conta de uma ou mais empresas com as
quais estejam numa relação especial304.

As referidas propostas foram acolhidas, com algumas adaptações, constando da


última versão do MC OCDE305.

3.2.3. Atividades preparatórias ou auxiliares

A versão atual do n.º 4 do art.º 5.º do MC OCDE exclui, em abstrato, do conceito


de E.E. as atividades preparatórias e auxiliares: armazenamento, exposição ou entrega de
mercadorias; depósito para armazenamento, exposição, entrega ou transformação;
compra de mercadorias e reunião de informações; uma combinação das atividades
anteriores desde que se mantenha o carácter preparatório ou auxiliar.

Contudo, a realidade tem demonstrado que na economia digital, fruto da dispersão


dos centros de decisão e das estruturas empresarias, as referidas atividades nem sempre
constituem atividades preparatórias e auxiliares (apesar de tipificadas como tal).

303
Cf. (OCDE, Preventing the Artificial Avoidance of Permanent Establishment Status, Action 7: 2015 Final
Report, 2015, p. 26).
304
Cf. (Dourado, A tributação dos rendimentos de capitais: a harmonização na comunidade europeia,
1997, p. 89).
305
Vide (OCDE, Model Tax Convention on Income and on Capital: Condensed Version, November 2017).

110
O relatório final da Ação 7306 reconhece isso mesmo, ao referir que (na versão
original):

“Depending on the circumstances, activities previously considered to be merely


preparatory or auxiliary in nature may nowadays correspond to core business
activities. In order to ensure that profits derived from core activities performed in a
country can be taxed in that country, Article 5(4) is modified to ensure that each of the
exceptions included therein is restricted to activities that are otherwise of a
“preparatory or auxiliary” character. The modifications are found in section B of the
report”.

Por isso, a Ação 7 propôs que se acrescentasse ao n.º 4 a seguinte frase:

“desde que essa atividade ou, no caso da alínea f), o conjunto da atividade da instalação
fixa, tenha carácter preparatório ou auxiliar”307.

Ou seja, pretendeu-se esclarecer que as atividades definidas/ tipificadas só


obstarão à concretização de um E.E. se, de facto, revistarem natureza preparatória ou
auxiliar. Assim a natureza preparatória ou auxiliar de uma atividade terá de ser aferida
caso a caso, não resultando de forma automática do elenco constante do n.º 4 do art.º 5.º
do MC OCDE.

Além do mais, o planeamento das empresas multinacionais caracteriza-se amiúde


por uma fragmentação artificial das suas estruturas e atividades de modo a poder alegar
que as mesmas têm natureza preparatórias ou auxiliares, situando-as em territórios de alta
tributação para elidir o conceito de E.E. e, assim, a tributação na fonte308.

306
(OCDE, Preventing the Artificial Avoidance of Permanent Establishment Status, Action 7: 2015 Final
Report, 2015, p. 10).
307
Na versão original:
“provided that such activity or, in the case of subparagraph f), the overall activity of the fixed place of
business, is of a preparatory or auxiliary character”.
Cf. (OCDE, Preventing the Artificial Avoidance of Permanent Establishment Status, Action 7: 2015 Final
Report, 2015, p. 29).
308
Cf. relatório final da Ação 7, “BEPS concerns related to Art. 5(4) also arise from what is typically referred
to as the “fragmentation of activities”. Given the ease with which multinational enterprises (MNEs) may
alter their structures to obtain tax advantages, it is important to clarify that it is not possible to avoid PE
status by fragmenting a cohesive operating business into several small operations in order to argue that
each part is merely engaged in preparatory or auxiliary activities that benefit from the exceptions of Art.
5(4). The anti-fragmentation rule proposed in section B will address these BEPS concerns”. (OCDE,
Preventing the Artificial Avoidance of Permanent Establishment Status, Action 7: 2015 Final Report, 2015,
p. 10)

111
Razão pela qual a Ação 7 recomenda a introdução de uma norma anti-
fragmentação – um novo número 4.1.

Este preceito será, alegadamente, suficiente para cobrir o abuso em redor do


carácter preparatória ou auxiliar de uma atividade:

“4.1. O n.º 4 não é aplicável a uma instalação fixa que seja usada ou mantida por uma
empresa, se a mesma empresa, ou outra com quem ela esteja numa relação especial,
desenvolver atividades no mesmo lugar ou num outro lugar do mesmo Estado
Contratante e

a) esse lugar ou outro lugar constitua um estabelecimento estável para a


empresa ou para outra com quem ela esteja numa relação especial, ao abrigo das
disposições deste artigo; ou
b) o conjunto da atividade, resultando da combinação das atividades
desenvolvidas pelas duas empresas no mesmo local, ou pela mesma empresa ou
pela empresa com quem ela esteja numa relação especial, nos dois locais
diferentes, não tenha carácter preparatório ou auxiliar

desde que as atividades empresariais conduzidas pelas duas empresas nos dois locais,
constituam funções complementares que sejam parte de uma operação empresarial
coerente”309.

As referidas propostas foram acolhidas, constando da última versão do MC


OCDE310.

309
Na versão original:
“4.1 Paragraph 4 shall not apply to a fixed place of business that is used or maintained by an enterprise if
the same enterprise or a closely related enterprise carries on business activities at the same place or at
another place in the same Contracting State and
a) that place or other place constitutes a permanent establishment for the enterprise or the closely
related enterprise under the provisions of this Article, or
b) the overall activity resulting from the combination of the activities carried on by the two enterprises
at the same place, or by the same enterprise or closely related enterprises at the two places, is not of
a preparatory or auxiliary character,
provided that the business activities carried on by the two enterprises at the same place, or by the same
enterprise or closely related enterprises at the two places, constitute complementary functions that are
part of a cohesive business operation”.
(OCDE, Preventing the Artificial Avoidance of Permanent Establishment Status, Action 7: 2015 Final
Report, 2015, p. 39).
310
Vide (OCDE, Model Tax Convention on Income and on Capital: Condensed Version, November 2017).

112
A substância económica deve prevalecer sobre a forma e se uma empresa
desenvolve atividades significativamente lucrativas num Estado que não o seu, então esse
Estado deve poder tributar os lucros que estão relacionados com o seu território.

3.3. Um novo conceito de elemento de conexão baseado no conceito de presença


económica significativa

Tradicionalmente, a exigência de presença (material ou pessoal), de um certo grau


de permanência da atividade de uma empresa não-residente, através de uma ligação
geográfica, sempre foi condição essencial de tributação por parte dos Estados da fonte311.

Esse grau de permanência é sobretudo concretizado pela existência de um E.E., o


qual, na atividade empresarial, consubstancia o limite mínimo para existir tributação312.

Essa tributação deriva da existência de uma forte ligação económica (economic


allegiance) do facto tributário a determinando território corporizada, neste caso, pelo
estabelecimento estável.

Neste sentido, a “fisicalidade” expressa pelo E.E. tradicional surge como um


elemento determinante para justificar essa ligação económica entre a atividade de uma
empresa e determinado território313.

O surgimento de uma economia digital, marcada pela desmaterialização, pela


digitalização, pela natureza intangível do processo económico e comercial e, bem assim,
por uma reduzida necessidade de presença física, criou uma realidade para a qual os
elementos de conexão atuais – construídos em torno da existência de uma realidade
corpórea – não estavam preparados, tornando-se inoperantes em função da desadequação
dos seus elementos à realidade atual.

As atuais regras de tributação das sociedades já não se adequam a um contexto em


que as empresas, para além da ausência de necessidade de presença física, dependem cada
vez mais de ativos incorpóreos de difícil avaliação e em que os conteúdos gerados pelos

311
(Pereira P. R., O papel do estabelecimento estável no Direito Fiscal Internacional, 2013, p. 575).
312
Tributação que terá de respeitar várias regras e princípios jurídicos de direito fiscal internacional,
incluindo o princípio da não discriminação caso conste da CDT uma cláusula idêntica ou similar à do artigo
24.º, n.º 3 do MC OCDE.
313
O estabelecimento estável, resulta, tradicionalmente, da combinação entre o (i) lugar fixo de negócios,
a (ii) presença física e a (iii) natureza da atividade negocial.

113
utilizadores e a recolha de dados são fundamentais à criação de valor por parte das
empresas que operam no mundo digital314.

O certo é afirmar-se que, “Through the use of remote technology, many digitalised
business can effectively be heavily involved in the economic life of diferente jurisdictions
without any, or any significant physical presence, thus achieving operational scale
without mass. One consequence of this development is that growing number of businesses
may have na economic presence in a jurisdiction without having a physical presence”315.

Em resposta a este problema, a OCDE tem pugnado, sobretudo no âmbito do MC


OCDE316, pela manutenção da “fisicalidade” enquanto elemento concretizador do E.E.,
procurando identificá-la na realidade virtual enquanto elo de ligação à realidade física317.
Ou seja, a solução passará, defende, por encontrar um elo (físico) comum a ambas que
permita a recondução à figura do estabelecimento estável.

Concordamos que o elemento físico facilita sobremaneira a correspondência de


um rendimento a um determinado território e, consequentemente, à identificação de um
E.E. concretizando uma presença económica significativa.

Contudo, só por si, o referido elemento não é suficiente face aos desafios atuais
impostos pela economia digital.

Até porque a imagem, a dimensão, a projeção de uma empresa não se conforma à


mera presença física318.Mesmo optando por não excluir a “fisicalidade” da equação em
apreço, haverá que considerar, a par desta, um outro elemento que permita abarcar um
conjunto considerável de situações que, não podendo ser reconduzidas à figura tradicional
do E.E., dada a ausência de presença física, são, ainda assim, pelos seus elementos,
passíveis de ser reconduzidas a uma ideia de presença (económica) associada àquela

314
O exemplo do E.E. é paradigmático: reconhecendo-se dificuldades na sua aplicação a situações em que
as empresas, em virtude do desenvolvimento das tecnologias de informações e comunicação, exercem
uma atividade, alguma da qual tendo por base intangíveis, num outro Estado sem necessidade de para
isso aí manter uma presença física estável. Estamos perante uma cross-jurisdictional scale without.
315
Cf. (OCDE, Interim Report , 2018, p. 51).
316
A manutenção da fisicalidade está muito presente nos comentários ao art.º 5 do MC OCDE (OCDE,
Model Tax Convention on Income and on Capital: Condensed Version, November 2017).
317
Não obstante, importa referir que no âmbito do relatório BEPS são conceptualizadas algumas soluções
para os desafios colocados pela economia digital que não se desenvolvem em torno da “fisicalidade”. Vide
neste sentido (OCDE, Action 1: Final Report, 2015) e (OCDE, Interim Report , 2018).
318
Neste sentido, vide (Carvalho, 1997).

114
figura, justificando a ligação de determinada atividade e rendimento a um determinado
território.

Neste sentido, propondo-se a redefinição do critério de presença física como


determinante para estabelecer a conexão territorial e a consequente atração da base
tributável, a OCDE apresenta, no Relatório Final da Ação 1 do BEPS319, um novo
conceito de elemento de conexão cujo objetivo é garantir a tributação no Estado fonte
quando uma empresa não-residente aí apresente uma presença económica significativa,
independentemente de não apresentar qualquer elemento físico conexo com esse
território320.

O elemento disruptivo desta proposta não reside, entendemos nós, na consideração


da presença económica significativa enquanto elemento justificador/ concretizador de
uma especial ligação entre uma atividade e um Estado, assim permitindo a tributação por
parte deste321. Essa sempre existiu. Reside, sim, no facto de a referida presença
económica significativa passar a ter por base um conjunto de fatores que demonstrem
uma interação intencional, determinada e sustentada de uma empresa com a economia de
um Estado através da tecnologia e de outras ferramentas automatizadas322.

Como referem PETER HONGLER e PASQUALE PISTONE, “A PE nexus will therefore


exist whenever the digital or physical presence of business in a country gives rise to value
creation”323.

Ou seja, propõe-se que, para as atividades desenvolvidas de forma digital,


desmaterializada, a conexão deixe de ser feita com base no critério tradicional do E.E., a

319
Cf. (OCDE, Action 1: Final Report, 2015) e confirmado em (OCDE, Interim Report , 2018).
320
A referida posição não reuniu inicialmente particular apoio por causa das dificuldades perspetivadas
em determinar o rendimento atribuído à presença económica significativa.
321
Entendemos não ser absolutamente inovador a consideração da presença económica significativa para
efeitos de concretização de um elemento de conexão com determinado território. De facto, a referência
ao E.E. enquanto reflexo de uma forte ligação económica (economic allegiance) a um Estado denota, em
si mesmo, a existência de uma presença económica significativa com aquele território. Se a mesma não
existisse, não haveria razão para uma empresa implementar uma extensão de si (o E.E.) no território em
causa. O que é disruptivo é essa presença económica ser apurada e justificada através de elementos
digitais, intangíveis, tecnológicos e outras ferramentas automatizadas. Ou seja, sem necessidade de
recorrer a elementos físicos.
322
(OCDE, Action 1: Final Report, 2015, p. 107).
323
( Hongler & Pistone , 2015, p. 23).

115
presença física, e passe a ser feita com recurso à chamada presença digital significativa
num mercado324.

O referido relatório (Ação 1) identifica um conjunto de fatores que devem ser


ponderados para efeitos de determinação e concretização de uma presença económica
significativa, através de uma presença digital significativa, agrupados em três grupos: i)
um fator baseado na receita ou rendimento; ii) fatores digitais e iii) fatores baseados no
utilizador325.

A compreensão destes fatores, cuja existência é relevante para a definição de uma


presença económica significativa, permite não só compreender a abordagem da OCDE
ao tema, como também identificar e justificar um nexo de causalidade entre a atividade
desenvolvida num território através de meios tecnológicos e a correspondente criação de
rendimento.

Ou seja, para além de consubstanciarem uma qualquer tipificação para uma


definição de presença económica significativa, a perceção dos elementos que constituem
os referidos fatores permite compreender de que forma é que a utilização de meios
tecnológicos permite a uma empresa criar valor e, consequentemente, rendimento.

Assim, importará desenvolver cada um dos fatores supra referidos.

3.3.1. Fator Rendimento

Em primeiro lugar será de considerar o fator rendimento, na medida em que se


reconhece que um dos indicadores mais evidentes da existência de presença económica
significativa de uma empresa num determinado Estado será, na prática, a obtenção de
rendimentos de forma sustenta no território daquele Estado.

Ora, os serviços e produtos disponibilizados por uma empresa num contexto


tecnológico/ digital – mesmo que através de modelos de negócio multilaterais326,

324
Daí a noção de Estabelecimento Estável Digital ou Virtual, de alargamento do conceito tradicional de
E.E.
325
Esclareça-se que, segundo o Relatório Final da Ação 1, quer os fatores digitais quer os fatores baseados
no utilizador terão de ser combinados com o fator baseado na receita ou rendimento.
326
Modelos de negócio que juntam dois ou mais tipos de clientes/ utilizadores, interdependentes, com o
objetivo de criar valor e facilitar as interações entre os diferentes grupos (efeito rede). Como característica
essencial, verifica-se a necessidade de existir uma plataforma onde os diferentes grupos coexistam em
simultâneo. A plataforma cria valor como intermediária, ligando esses grupos. Como exemplo deste tipo

116
sobretudo os dependentes de efeitos de rede – são largamente sustentados na recolha e
utilização dos dados de clientes ou utilizadores dos serviços, dependendo fortemente do
volume e qualidade de informação obtida para gerar valor.

Assim, presume-se que quanto mais informação for recolhida, maior será a
probabilidade de que o seu tratamento e posterior utilização no desenvolvimento dos
serviços/ produtos da empresa crie valor acrescentado, permitindo que esta aumente as
suas vendas, cobre mais pelos seus serviços ou ambos, gerando, consequentemente,
maiores rendimentos no território fonte dos dados obtidos 327.

O desenvolvimento de uma atividade com esta natureza, cujo valor advém e é


influenciado pela informação recolhida de utilizadores presentes num determinado
Estado, implica necessariamente a existência de meios para o efeito, ou seja, um certo
grau de investimento num determinado território.

Assim, o rendimento gerado num Estado nestas circunstâncias, proveniente da


aquisição de serviços por clientes presentes nesse mesmo Estado, revela necessariamente
uma conexão entre uma atividade e um território sob a forma de uma presença económica
significativa.

Isoladamente, o fator rendimento não será suficiente para estabelecer uma


conexão. Contudo, juntamente com outros fatores, poderá ser a pedra angular para
estabelecer uma conexão baseada na presença económica significativa.

De facto, rendimento proveniente de uma presença económica significativa


sempre houve, veja-se o caso paradigmático do E.E. tradicional. O que se pretende, na

de modelo de negócio e de plataforma temos a Amazon, eBay, Google, Uber, UberEATS, OLX, Glovo,
Facebook, entre outros. Para melhor ilustrar este modelo de negócio, deparemo-nos no caso de
Facebook. O Facebook gera valor através da informação/ dados obtidos da interação entre utilizadores e
entre estes e a plataforma, informação essa depois vendida a empresas para efeitos de marketing e
publicidade. Posteriormente, as mesmas empresas que compraram os referidos dados compram espaço
publicitário na plataforma, o qual será preenchido por anúncios que resultam do tratamento da
informação dos utilizadores previamente obtida – refletindo os seus gostos, tendências, etc.
Este modelo só faz sentido e apenas têm valor para um segmento de clientes se os outros segmentos
estiverem presentes, pois o valor criado será sempre maior quanto maior for o número de utilizadores,
criando assim um efeito de rede (Osterwalder & Pigneur, 2011).
Este tipo de modelo de negócio e de plataforma está muito associado à modalidade de comércio
eletrónico Business-to-Consumers (B2C). Sobre esta matéria, vide (Pires R. C., Tributação Internacional do
Rendimento Empresarial, 2011, pp. 142-144).
327
Segundo o relatório AÇÃO 1, “because user data serves to enhance the value of services na enterprise
offers, a strong user network (and the attendant user data) is likely to result in enterprises either selling
more or enterprises charging more for its core products/ services, or both” (OCDE, Action 1: Final Report,
2015, p. 107).

117
verdade, e dada a atual conjetura económica, é uma presença económica significativa
proveniente ou baseada numa presença digital significativa328.

Razão pela qual o relatório da Ação 1 refere a utilização combinada do fator


rendimento com outros fatores (de natureza digital ou a esta associada) para efeitos de
determinação de uma presença económica significativa329.

De todo o modo, para que possa ser considerado o rendimento como um fator de
avaliação de existência de presença económica significativa importa ter presente algumas
questões técnicas, nomeadamente: quais as transações a considerar, como estabelecer um
limiar mínimo de rendimento a ser considerado, assim como a forma de o aplicar.

Começando pela questão de quais as transações a considerar, o relatório da Ação


1 começa por sugerir que se relevem apenas receitas geradas a partir de transações digitais
concluídas através da plataforma digital da empresa, com clientes presentes no país330.
Especificamente, a conclusão destas transações assenta, principalmente, em sistemas
automatizados presentes naquela plataforma.

Todavia, reconhecendo que este tipo de abordagem poderá levar a que as empresas
promovam a conclusão das transações (contratos) através de outras vias331, evitando o
estabelecimento de uma conexão (com as demais consequências ao nível da tributação),
sugere-se que para efeitos de concretização do fator rendimento sejam consideradas todas
as transações efetuadas de forma remota por uma empresa não residente com clientes
presentes num determinado Estado.

Assim, garantir-se-ia que contribuintes em situação análoga e a realizar transações


semelhantes, não sejam tratados de forma diversa. Garantir-se-ia, desta forma a aplicação
do mesmo nível de tributação para o mesmo tipo de situações.

328
Sublinhado nosso.
329
Vide (OCDE, Action 1: Final Report, 2015, p. 107).
330
Refere o relatório, na sua versão original; “One approach that could be considered in defining a basic
revenue factor is to include only revenues generated from digital transactions conclded with in-country
customers through na enterprise’s digital platform” (OCDE, Action 1: Final Report, 2015, p. 107).
331
Por exemplo, através de correio eletrónico ou por telefone (evitando assim a utilização da plataforma
digital para conclusão da transação). Também as empresas, não obstante recorrerem à tecnologia para
alcançar diversos mercados, ao invés de optar por sistemas completamente automatizados poderiam
optar por encaminhar os seus potenciais clientes para de centrais de chamadas para ai concluírem o
contrato (transação), não consubstanciando uma transação digital. Assim, diversas transações ficariam
excluídas de consideração para efeitos da aplicação do fator rendimento.

118
O alargamento da base de incidência que daqui advém poderá criar maiores
problemas a nível de identificação e controlo das operações por parte dos Estados e, bem
assim, problemas para as empresas, pelo aumento dos custos administrativos e dos custos
de conformidade fiscal associados332.

Por outro lado, conexa com a questão anterior, sugere-se, no quadro do relatório
da Ação 1, a definição de um limiar mínimo de rendimento a considerar para efeitos de
concretização do fator rendimento. Ou seja, o elemento central no fator rendimento não
será a existência, só por si, de um rendimento, mas sim um valor de rendimento bruto
proveniente de transações remotas a partir do qual se considere haver uma presença
económica significativa num Estado.

Este valor deve ser enquadrado em termos absolutos e em moeda local, a fim de
minimizar o risco de manipulação.

Defende-se que este limiar mínimo de rendimento seja suficientemente elevado


por forma a oferecer um elevado grau de segurança fiscal para as operações
transfronteiriças e, bem assim, minimizar a possibilidade de se constituir uma conexão
nos casos em que a receita fiscal perspetivada apresente valores materialmente
irrelevantes333.

No entanto, na definição deste limiar é igualmente necessário ponderar a


mobilidade e flexibilidade na escolha de localização dos negócios baseados na economia
digital e, consequentemente, na facilidade de fragmentação (artificial) dos mesmos, pelo
que se torna essencial a consideração de uma regra anti-fragmentação334, por forma a
evitar abusos por parte dos agentes económicos.

Por último, a aplicação deste limiar não é, todavia, isenta de dificuldades.


Dependerá, principalmente, da capacidade das administrações tributárias dos Estados em
identificar e percecionar a dimensão das transações realizadas remotamente por parte de

332
Ou compliance, na versão original. Cf. (OCDE, Action 1: Final Report, 2015, p. 108).
333
(OCDE, Action 1: Final Report, 2015, p. 108).
334
À semelhança da regra anti-fragmentação prevista na Ação 7, o limiar mínimo seria tendencialmente
aplicável com base em grupos relacionados do que a entidades separadas, evitando qualquer risco de
fragmentação artificial das atividades de venda à distância. De todo o modo, esta regra deverá basear-se
numa presunção ilidível, podendo o contribuinte provar que não operou artificialmente uma
fragmentação da atividade por forma a manipular aquele limiar mínimo de rendimento.

119
entidades não residentes através de plataformas digitais, e, bem assim, a capacidade de
determinar os seus intervenientes.

O relatório da Ação 1 apresenta como possível solução a este desafio a introdução


de um sistema de registo obrigatório para as empresas que, preenchendo os fatores já
enunciados (e os demais que enunciaremos a seguir), evidenciem uma presença
económica significativa num determinado Estado.

Ciente das dificuldades sentidas pelas administrações tributárias na identificação


da ocorrência de uma transação e da escala da mesma, dos vendedores remotos, quer das
dificuldades das empresas na identificação dos países de residência dos clientes e
utilizadores, a OCDE propõe no referido relatório que se considere a aplicação de regimes
similares aos introduzidos para assegurar o cumprimento das regras dos impostos
indiretos sobre as transações335 (como o Imposto sobre o Valor Acrescentado ou um outro
Goods and Services Tax)336.

3.3.2. Fatores Digitais

A par do fator rendimento, e para efeitos de avaliação da existência de uma


presença económica significativa, o relatório da Ação 1 propõe também a ponderação de
um conjunto de fatores digitais.

Os negócios tradicionais (fortemente dependentes da “fisicalidade”) e os negócios


digitais têm em comum o facto de ambos dependerem de múltiplos fatores para poder
alcançar um número significativo de clientes num determinado território337. Ambos
precisam de uma plataforma que lhes permita interagir com atuais e potenciais clientes
ou utilizadores num determinado Estado.

Curiosamente, na economia digital, os fatores utilizados para estabelecer e manter


a referida interação com diversos utilizadores ou clientes num determinado Estado, por

335
A OCDE propõe, como forma de resolver o problema de cobrança do IVA no país de destino, no caso
das transações de serviços eletrónicos ou intangíveis, de empresas para particulares (business to
consumers – B2C), a criação de um sistema de registo e de compliance simplificado para as empresas,
onde se reconheça a necessidade de equilíbrio entre a indispensabilidade de informação para
administrações fiscais e a minimização de custos de cumprimento para as empresas. Sobre este tema,
vide (OCDE, Action 1: Final Report, 2015, pp. 126-129).
336
(OCDE, Action 1: Final Report, 2015, p. 108).
337
No caso dos negócios tradicionais, a localização do espaço (físico), estratégias de marketing e
publicidade ou promoções e especiais formas de pagamento.

120
meio da presença online, são em grande medida análogos aos usados pelos negócios
tradicionais, cumprindo funções muito semelhantes. A sua identificação permitirá
estabelecer uma ligação entre uma empresa e um Estado e ajudar a determinar uma
presença económica significativa através da sua presença digital.

Neste sentido, a OCDE identifica um conjunto de fatores de natureza digital cuja


existência é indiciária de uma presença económica significativa: a i) adoção de um
domínio local; a ii) plataforma digital utilizada; e iii) a definição de meios de pagamento
locais.

Uma empresa não-residente que se pretenda implementar no mercado de um


determinado Estado, tenderá a assumir, para aumentar as suas probabilidades de sucesso,
um conjunto de características que a faça aproximar dos potenciais clientes ou
utilizadores.

Em termos de nome de domínio, tal poderá significar a opção por um domínio e


endereço eletrónico que identifique o país, como “.pt”, “.es” ou “.com”. Trata-se do
equivalente digital a uma morada local.

Esta opção, para além de estabelecer uma proximidade com o público-alvo, reflete uma
preocupação da empresa em proteger as suas marcas, assegurando a exclusividade da
utilização de domínios que se assemelhem ou se confundam com aquelas.

Embora este seja um fator a considerar, sendo a aquisição de domínios locais


(identificativos de território) bastante comum nos dias de hoje, teme-se que seja uma
prática sem grande expressão no futuro. Neste sentido, a utilização de domínios alusivos
a temas mais genéricos, como “.camera”, “.gym” “.cinema” permitirá uma maior
proximidade com os clientes ou utilizadores, tornando irrelevantes os domínios
identificativos de local para os efeitos em apreço338. Por outro lado, no caso de mercados
de menor dimensão, a empresa poderá manter uma presença significativa sem para isso
necessitar de investir num domínio diferenciado339

Relacionada com a questão do domínio, e enquanto fator digital de relevo, importa


considerar a existência de uma plataforma digital local.

338
Cf. (OCDE C. , MC OCDE, junho 2015, p. 109).
339
A Amazon, por exemplo, utiliza apenas seis domínios na Europa (alusivos a Espanha, França, Alemanha,
Reino Unido, Holanda e Itália), no entanto não existem dúvidas que deterá uma presença económica
significativa em muitos outros países europeus.

121
As empresas não-residentes ao desenvolverem a sua atividade num determinado
Estado, tendem a estabelecer websites “locais” ou outras plataformas digitais, com relevo
na língua e normas culturais locais, por forma a tornar mais apelativa a apresentação dos
seus produtos e serviços.

Neste sentido, os referidos websites ou plataformas digitais “locais” podem adotar


um conjunto de características que facilitem a interação com os clientes ou utilizadores
presentes nesse território, nomeadamente a utilização de língua oficial, de preferências
culturais locais, de estratégias de marketing e publicidade especificas, descontos e
promoções ou a utilização de termos e condições específicos de um determinado contexto
comercial e legal localmente identificável.

A utilização deste tipo de plataformas “taylor made” é, para as empresas baseadas


num ambiente digital, a melhor forma de estabelecer uma relação mais próxima ao
mercado alvo. De todo o modo, este nível de investimento não será dirigido a todos os
mercados nacionais com os quais as empresas se relacionam, o que não significa o
desinteresse nesse mercado nem obsta a que nele existe uma presença económica
significativa340. De referir ainda que as plataformas locais não correspondem
necessariamente às fronteiras políticas existentes341.

Outra questão a considerar, no âmbito dos fatores digitais relevantes para a


comprovação de uma presença económica significativa, está relacionada com a adoção e
disponibilização aos clientes ou utilizadores de meios de pagamento característicos do
Estado em que estão inseridos.

A par da escolha do domínio ou do website ou plataforma digital, também os


meios de pagamento disponibilizados tendem a ter em conta o mercado que se pretende
alcançar.

340
Recorra-se, uma vez mais ao exemplo da Amazon: apenas nos seis domínios que utiliza na Europa
(alusivos a Espanha, França, Alemanha, Reino Unido, Holanda e Itália) é que adota como uma das
línguas usadas no website o idioma oficial local. Isto não significa que nos restantes Estados onde está
presente e recorre de forma indiferenciada à língua inglesa não possa considerar-se como tendo uma
presença económica significativa.
341
Uma plataforma local pode estar relacionada com uma região, cuja dimensão poderá ultrapassar uma
fronteira politicamente estabelecida.

122
A adoção de certos meios de pagamento está inserida numa preocupação mais
ampla da empresa de que a experiência de compra/ negocial342 dos clientes ou utilizadores
seja o mais confortável e natural possível. Esta preocupação (e sobretudo estratégia)
reflete-se na apresentação dos preços na moeda local, no cálculo de impostos e taxas
específicas do território e na consideração dos meios de pagamento disponíveis no país.

A inclusão desta diversidade de opções na plataforma digital da empresa pode ser


de tal forma complexa, do ponto de vista técnico, que implique uma utilização
considerável de recursos da empresa para o efeito. Este esforço e investimento num
determinado mercado poderá indiciar a existência (ou pelo menos a vontade) de uma
presença económica significativa da empresa. De facto, uma empresa não se sujeitaria a
este esforço, não faria este investimento, se não quisesse participar ativamente num
determinado mercado, beneficiando da respetiva presença.

Acresce que a utilização de meios eletrónicos de pagamento, através do recurso a


intermediários financeiros, permitirá uma maior capacidade de verificação e controlo das
transações realizadas por parte das administrações tributárias, na medida em que os
referidos intermediários se encontram sujeitos um conjunto de obrigações declarativas
quanto a diversos tipos de movimentos sobretudo por razões fiscais.

No caso do mercado único europeu esta fator é pouco relevante. Pelo contrário,
em países com regulamentos bancários rigorosos, controlo apertado da moeda ou baixa
penetração de cartões de crédito, a existência de opções de pagamento locais é um fator
bastante relevante.

3.3.3. Fatores baseados no utilizador

Por último, e por forma a aferir da existência de uma presença económica


significativa de uma empresa num determinado Estado, o relatório da Ação 1, faz ainda
referência à necessidade de serem considerados, pela sua importância, fatores baseados
no utilizador.

Esta opção baseia-se no reconhecimento da importância dos efeitos de rede e da


informação na economia digital enquanto indicadores de uma interação intencional e

Na versão original do relatório, “(…) a seamless purchasing experience” (OCDE, Action 1: Final Report,
342

2015, p. 109).

123
sustentada de uma empresa não residente na economia de um Estado, reveladora da sua
participação e presença num determinado mercado.

Pretende-se assim avaliar o nível de interação dos utilizadores com uma


determinada empresa, tendo em conta o (i) número mensal de utilizadores ativos, o (ii)
número de contratos concluídos online e a (iii) quantidade de informação recolhida.

Um indicador que pode refletir o nível de implementação de uma empresa na


economia de um Estado é o número de utilizadores mensais ativos na plataforma digital
gerida pela empresa, considerados residentes no ano fiscal em causa.

Esta análise, que utiliza como métrica o número de utilizadores registados que
acedem à plataforma digital, permite medir a base de clientes/ utilizadores num Estado,
quer em termos de tamanho, como no grau de interação e compromisso com a empresa343.

Em relação aos utilizadores, uma outra métrica poderia ser utilizada: o tempo
gasto pelos utilizadores numa plataforma digital especifica, seja ela um website ou uma
App. Esta métrica permitiria aferir do grau de utilização de uma estrutura numa jurisdição
específica, concretizando uma presença e fundamentando a respetiva tributação344.

Um outro fator importante para aferir da participação de uma empresa não


residente na economia de um Estado prende-se com a celebração regular de contratos
online.

Na economia digital, os contratos (transações) relativos a bens ou serviços são


frequentemente concluídos através da plataforma digital da empresa, muitas vezes com
recurso a ferramentas automatizadas, sem necessidade de intervenção de pessoal local
afeto àquela ou de um agente independente.

No relatório da Ação 1 é apresentado, como exemplo desta forma particular de


conclusão, a necessidade de aceitar os “termos e condições de serviço” pelo acesso ou
uso de produtos ou serviços da empresa, mesmo quando se trata da prestação de serviços
gratuitos. A concordância do cliente ou utilizador perante as condições apresentadas na
plataforma digital constitui a celebração de um acordo no que ao direito diz respeito.

343
Genericamente, quanto mais utilizadores uma empresa tiver, mais significativa será a sua presença
digital.
344
Especialmente correlacionado com a teoria do benefício como fundamento da tributação pelo Estado
fonte, como veremos melhor adiante.

124
Nestes termos, o número de acordos celebrados com clientes ou utilizadores no
território de um determinado Estado, pode ser uma importante medida para aferir da
presença económica de uma empresa345.

Por último, mas não menos importante, importa considerar um outro fator
relacionado com os utilizadores, neste caso relativo ao volume de conteúdo e informação
recolhidos (dados pessoais, conteúdos criados pelo utilizador, revisões de produtos,
históricos de pesquisas, etc.) através de uma plataforma digital346, proveniente de clientes
e utilizadores residentes num determinado Estado347.

Importa referir, a par do que já foi feito na análise aos fatores anteriores, que, em
certos casos, não haverá uma relação direta entre o volume de informação recolhida e o
valor dos rendimentos gerados por uma empresa não residente348.

Note-se que a utilização dos fatores baseados nos utilizadores não é isenta de
constrangimentos, a começar pela dificuldade de obtenção dos dados necessários: quanto
ao número de utilizadores de uma determinada plataforma; o número de contratos
assinados; e ao volume de dados obtidos destes.

Mesmo sendo possível a obtenção desta informação é necessária que esta seja
identificável com um determinado território, sendo igualmente necessário determinar, a
partir de que limiar, de cada um dos fatores, a presença de uma empresa num Estado é
significativa.

345
Cf. (OCDE, Action 1: Final Report, 2015, p. 110).
346
Para efeitos da verificação do elemento de conexão, não interessa onde é armazenada esta
informação, mas sim onde é recolhida.
347
Cf. (OCDE, Action 1: Final Report, 2015, p. 110).
348
Na medida em que não é fácil quantificar a priori o impacto da informação obtida na atividade da
empresa.

125
3.3.4. Notas finais

Apresentados os fatores considerados relevantes para a determinação da presença


económica significativa de uma empresa não residente num determinado Estado,
justificando a respetiva tributação, o relatório sugere a sua utilização combinada para uma
melhor aplicação do (novo) elemento de conexão349.

Ou seja, para ser uma medida apropriada de participação na vida económica de


um Estado, o fator rendimento deve ser combinado com outros fatores (digitais ou
baseados no utilizador) que indiquem uma interação intencional e sustentada com a
economia do Estado em questão350.

É importante que se estabeleça uma ligação entre uma atividade geradora de


rendimento de uma empresa não-residente e a sua presença económica (e digital)
significativa num Estado. Que aquele rendimento advém da presença e interação com a
economia daquele Estado.

O objetivo deste novo elemento de conexão não é fortalecer a tributação na fonte,


mas sim permitir que o Estado fonte preserve a sua soberania na tributação de
rendimentos que advenham de atividades desenvolvidas e vinculadas ao seu território e
jurisdição351.

De todo o modo, e não obstante a definição de critérios para o desenvolvimento


de um novo elemento de conexão baseado numa presença económica significativa352, não

349
Utilizando unicamente o fator rendimento, presumir-se-ia a presença económica significativa se o
rendimento gerado ultrapasse o limiar mínimo definido estaríamos. No caso de o rendimento ficar abaixo
do referido limiar o fator rendimento, só por si, obstaria à comprovação da presença económica
significativa mesmo que isso não correspondesse à realidade. A utilização combinada dos diferentes
fatores torna esta proposta muito mais robusta e preparada para se aplicar a uma multiplicidade de
situações.
350
Cf. (OCDE, Action 1: Final Report, 2015, p. 111). Neste sentido, PETER HONGLER e PASQUALE PISTONE,
avançam com um conjunto de fatores representativos de um limiar mínimo para determinação de uma
presença económica significativa e, consequentemente, de um vínculo tributável, para a qual se remete
pela relevância, cf. ( Hongler & Pistone , 2015, pp. 25-26).
351
Reafirmando a prevalência da substância sobre a forma de como uma empresa desenvolve atividades
significativamente lucrativas num Estado que não o seu.
352
Cujo objetivo é a definição da competência tributária dos Estados e a sua repartição.

126
se mostram ultrapassadas as dificuldades relativas à determinação e imputação do
rendimento a tal presença num Estado353.

As referidas dificuldades decorrem da dificuldade de adaptação da atuais regras


em matéria de preços de transferência utilizadas para imputar o rendimento das empresas
multinacionais aos diferentes países – baseadas na análise de funções, dos ativos e dos
riscos na cadeia de valor das empresas consideradas – a uma realidade económica
marcada pela pouca ou nenhuma presença física, em termos de ativos tangíveis e /ou
recursos humanos num Estado, e a modelos empresariais com características diferentes
em termos de criação de valor daquelas que são apanágio dos modelos tradicionais.

A menos que sejam feitos alguns ajustamentos às regras atualmente em vigor ou


que novas regras sejam definidas, sobretudo para a identificação e avaliação de ativos
incorpóreos e do seu contributo para a criação e valor, dificilmente será possível
estabelecer a necessária imputação de um rendimento a uma presença económica
significativa354.

3.4. A posição da Comissão Europeia

Apesar de atingir taxas de crescimento e lucro elevadíssimos, a economia digital


continua a ser relativamente pouco tributada quando comparada às empresas tradicionais
de “tijolo e argamassa”355. Como referido, as regras atuais baseiam-se na presença física
de contribuintes e ativos, havendo a total perceção de que as mesmas não se mostram
adequadas para tributar uma economia digital caracterizada pela dependência de ativos
intangíveis e serviços desmaterializados cuja localização é muitas vezes difícil de
determinar.

Assim, no decurso de um processo que remonta a 2014, com a publicação de um


relatório da Commission Expert Group on Taxation of the Digital Economy 356, onde a
tributação da economia digital foi analisada, a Comissão Europeia apresentou, em 21 de

353
A economia digital coloca um conjunto de desafios ao poder de tributar dos Estados, os quais podem
ser reconduzidos a 3 perguntas concretas: onde tributar (definição da competência tributária)? o que
tributar (determinação do rendimento tributável)? e como tributar? Com o presente trabalho
procuramos, sobretudo responder à primeira pergunta.
354
(OCDE, Action 1: Final Report, 2015, p. 111 e 112) para mais desenvolvimentos.
355
Na versão original, “bricks and mortar”.
356
http://ec.europa.eu/taxation_customs/resources/documents/taxation/gen_info/good_governance_
matters/digital/report_digital_economy.pdf

127
março de 2018, um conjunto de propostas para um sistema fiscal justo e eficaz na União
Europeia (UE) para o Mercado Único Digital.

Estas propostas corporizam o exposto em três anteriores posições:

 Na COM(2015) 192 final, de 6 de maio de 2015, na qual se desenha a Estratégia


para o Mercado Único Digital na Europa357, ressalvando-se a necessidade de
apresentar “um plano de ação sobre uma abordagem renovada em matéria de
tributação das sociedades no Mercado Único, ao abrigo do qual os lucros
deveriam ser tributados no local onde o valor é gerado, incluindo na economia
digital”358.
 Na COM(2017) 547 final, de 21 de setembro de 2017, sobre “Um sistema fiscal
equitativo e eficaz na União Europeia para o Mercado Único Digital”. Tendo
como objeto a tributação direta, esta Comunicação da Comissão Europeia afirma
expressamente que, “Existem insuficiências nas regras fiscais internacionais, uma
vez que foram inicialmente concebidas para empresas «físicas», tendo-se tornado
agora obsoletas”359.
 Nas conclusões do Conselho da União Europeia, de 5 de dezembro de 2017, sobre
“Responding to the challenges of taxation of profits of the digital economy” onde
são assumidas posições estratégicas relevantes. Neste sentido, “where a business
is performing significant activities in a jurisdiction, its absence of physical
presence should not per se prevent it from being subject to tax on its profits
generated in that jurisdiction, provided an appropriate nexus reflecting value
creation is used, taking into account the arm's length principle”, afirmando ainda
“that an appropriate nexus in the form of a virtual permanent establishment,
together with any necessary corresponding amendments to the rules of transfer
pricing and profit attribution, which would take into account where value is
created in the different business models of the digital economy, should be
explored”360.

357
Definido como “um mercado em que é assegurada a livre circulação de mercadorias, pessoas, serviços
e capitais e em que os cidadãos e as empresas podem beneficiar de um acesso sem descontinuidades a
atividades em linha e desenvolver essas atividades em condições de concorrência leal e com um elevado
nível de proteção dos consumidores e dos seus dados pessoais, independentemente da sua nacionalidade
ou local de residência” (Comissão Europeia, 6.5.2015, p. 3).
358
Cf. (Comissão Europeia, 6.5.2015, p. 9).
359
Vide (Comissão Europeia, 21.9.2017 , p. 2).
360
Vide (Conselho da União Europeia, 5.12.2017, pp. 4-5).

128
Neste contexto, surgem então, em março de 2018, uma Comunicação, uma
Recomendação e duas Propostas. Todas elas têm presente a necessidade de garantir, face
ao elevado crescimento dos rendimentos dos negócios digitais361, cuja tributação se
mostra diminuta ou inexistente, a sua efetiva tributação.

Assim, a Comissão Europeia apresenta (i) uma proposta de Diretiva que


estabelece regras relativas à tributação das sociedades com uma presença digital
significativa (cujo o aspecto mais relevante é a introdução da figura do estabelecimento
estável digital)362 e (ii) uma proposta de Diretiva sobre o sistema comum de um Imposto
sobre Serviços Digitais (ISD) aplicável às receitas resultantes da prestação de
determinados serviços digitais363.

As presentes propostas visam resolver os problemas suscitados pela economia


digital através de uma “solução global no âmbito dos sistemas de tributação das
sociedades atualmente vigentes nos Estados-Membros”364.

A divulgação das referidas propostas ocorre menos de uma semana após a


publicação pela OCDE do seu Relatório Interino sobre “Tax Challenges Arising from
Digitalisation”365, em 16 de março de 2018.

De facto, e ao contrário do que se observa nos últimos Relatórios da OCDE,


preocupados, sobretudo, na teorização dos problemas associados à tributação do
rendimento gerado através de atividades digitais e nas possíveis soluções para os
ultrapassar, a Comissão Europeia, através de uma das propostas de Diretiva 366, faz uma
opção clara, de entre as possíveis, de conceptualização do conceito de presença digital
significativa por forma a estabelecer um vínculo tributável para as empresas digitais que
exercem atividades transfronteiras.

A base da Proposta assenta numa extensão do conceito aceite de E.E.

Bem se percebe esta opção. Relembrando o racional que subjaz a esta figura,
refira-se que o E.E. era, através da presença física (estável) que corporizava, indicador da

361
Em 2017, e em média, os negócios digitais enfrentavam uma taxa efetiva de imposto de 9.5% por
oposição a cerca de 23.2% para os modelos de negócio tradicionais.
362
Vide (Comissão Europeia, 21.03.2018).
363
Vide (Comissão Europeia, 21.03.2018). O ISD deve ser aplicável numa base temporária, até ser
encontrada uma solução mais abrangente.
364
Cf. (Comissão Europeia, 21.03.2018, p. 2).
365
Vide (OCDE, Interim Report , 2018).
366
Cf. (Comissão Europeia, 21.03.2018).

129
existência de uma atividade económica intencional e sustentada num determinado Estado,
ou seja, era sinónimo de uma presença económica significativa.

O objetivo ora pretendido pela Comissão Europeia é em tudo semelhante: procura


demonstrar a mesma implementação de uma empresa num território, a mesma presença
económica significativa, feita anteriormente pela figura do E.E. tradicional, através de
indicadores alternativos de atividade económica que se substituam à fisicalidade na
demonstração da mesma presença comercial e económica367.

Esta ideia de presença económica significativa ausente de presença física é


possível através da conceptualização da figura da presença digital significativa, a qual
através de conjunto de fatores368 concretizados adiante, revelam o desenvolvimento de
forma sustenta de uma atividade económica num Estado.

Nestes termos, e em função do vigor ainda reconhecido ao princípio do


estabelecimento estável, e dada a identidade de objetivos, percebe-se a opção pelo
alargamento do E.E., uma figura com profundo lastro no comércio e direito fiscal
internacionais, passando a refletir uma presença económica significativa não só através
de uma presença física, mas também através de uma presença digital.

Pretende-se, posteriormente, que a tributação dos lucros imputáveis a um E.E.


digital se faça de forma semelhança ao que se faz hoje para o E.E. tradicional – ficciona-
se uma entidade separada369 e aplicam-se por analogia os princípios da OCDE em matéria
de preços de transferência370.

Consciente da dificuldade do consenso em torno desta proposta, a Comissão


Europeia desde logo apresenta uma solução alternativa provisória, através da proposta de
Diretiva que estabelece um Imposto sobre os Serviços Digitais (ISD).

Contudo, e embora haja um crescente reconhecimento de que as empresas digitais


devem pagar taxas de impostos semelhantes às empresas tradicionais, alguns Estados-
Membros terão considerado a iniciativa prematura, na medida em que se procura um

367
Colocando de uma forma simplista, o que se pretende é transpor uma figura já existente para o século
XXI, em virtude de terem uma mesma lógica subjacente.
368
Como descrito anteriormente, um (i) fator baseado na receita ou rendimento; ii) fatores digitais e iii)
fatores baseados no utilizador.
369
Cf. art.º 7 da MC OCDE.
370
Sobre os métodos aplicáveis na determinação do lucro impotável ao E.E., vide (Teixeira M. D., 2007,
pp. 35-48).

130
compromisso no nível da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE), que, dado o universo alargado de atores, é considerado como mais capaz de
atingir uma solução.

De todo o modo, sempre se diga, na esteira de RITA CALÇADA PIRES, que a


Comissão Europeia apresenta “propostas concretas de tributação que procuram atingir os
rendimentos gerados e nãos as realidades físicas que possam dar suporte aos negócios
digitais371”.

371
Cf. (Pires R. C., Manual de Direito Internacional Fiscal, 2018, p. 370).

131
3.4.1. Introdução de um Estabelecimento Estável Digital

A proposta de Diretiva que estabelece regras relativas à tributação das empresas


com uma presença digital significativa (e consequentemente uma presença económica
significativa) visa criar, através do alargamento do conceito de estabelecimento estável,
um vínculo tributável para as empresas digitais que operem na UE, sem ou com uma
limitada presença física.

Para tanto, define um conjunto de indicadores alternativos a essa presença física


por forma a ser possível estabelecer uma presença económica significativa através da
consideração de uma presença digital significativa num Estado.

Esta Diretiva estabelece também princípios que permitem imputar lucros de uma
empresa digital a uma presença digital significativa num território, para efeitos de imposto
sobre as sociedades372.

Da análise da referida proposta de diretiva, importa destacar o seguinte:

 Reconhece-se a existência de um estabelecimento estável se existir uma “presença


digital significativa” através da qual uma empresa não-residente exerce total ou
parcialmente a sua atividade num Estado, reconhece-se a figura do
estabelecimento estável digital;
 Considera-se que existe “presença digital significativa” num Estado-Membro se
a atividade exercida através dessa presença consistir, total ou parcialmente, na
prestação de serviços digitais através de uma interface digital;
 Reconhece-se uma “presença digital significativa” num Estado-Membro se
estiverem preenchidos um ou mais das seguintes condições/ limiares (thresholds),
funcionamento como indicadores de atividade económica373:

372
Nos termos do disposto no art.º 1.º da proposta de diretiva: “A presente diretiva estabelece
disposições que alargam o conceito de estabelecimento estável, na medida em que se aplica para efeitos
do imposto sobre o rendimento das sociedades em cada Estado-Membro, de modo incluir uma presença
digital significativa através da qual a atividade de uma empresa é total ou parcialmente exercida. A
presente diretiva estabelece igualmente certos princípios de imputação de lucros a uma presença digital
significativa ou com ela relacionados, para efeitos de imposto sobre as sociedades”. Vide (Comissão
Europeia, 21.03.2018, p. 15).
373
Cf. art.º 4.º n.º 3 da proposta de Diretiva.

132
i. receitas provenientes da prestação de serviços digitais aos utilizadores
numa jurisdição superiores a 7 000 000 EUR no mesmo período de
tributação;
ii. número de utilizadores dos serviços digitais num Estado-Membro superior
a 100 000 no mesmo período de tributação; ou
iii. número de contratos comerciais para serviços digitais celebrados por
utilizadores situados nesse Estado-Membro superior a 3 000374.
 Reconhece-se o poder de tributar do Estado-Membro onde se encontra o utilizador
do serviço digital375, sendo aferida essa presença pelo endereço de IP376;
 Os lucros imputáveis à “presença digital significativa” ou com ela relacionados
num Estado-Membro são tributáveis em sede de imposto sobre as sociedades de
Estado-Membro377;
 É definida, a forma como os lucros são atribuídos à aos Estados-Membros,
refletindo os mecanismos através dos quais as empresas criam valor no mundo
digital378:
i. recolha, armazenamento, processamento, análise, implementação e venda
de dados ao nível do utilizador;

374
Refere a proposta de Diretiva, por forma a justificar os limites mínimos apresentados (threshold), ser
essencial que cada limiar seja suficientemente elevado para excluir com segurança casos em que os lucros
imputáveis à presença digital significativa nem sequer cobririam os custos de conformidade fiscal
estimados de exploração de um estabelecimento estável (Comissão Europeia, 21.03.2018, p. 9). Também
sobre esta questão, (Pires R. C., Manual de Direito Internacional Fiscal, 2018, pp. 366-367)
375
Cf. art.º 4.º, n.º 4 da proposta de Diretiva (Comissão Europeia, 21.03.2018).
376
Cf. art.º 4.º, n.º 6 da proposta de Diretiva (Comissão Europeia, 21.03.2018).
377
Nos termos do n.º 2 do artigo 5.º da referida proposta, “Os lucros imputáveis à presença digital
significativa ou com ela relacionados devem ser aqueles que a presença digital teria obtido se fosse uma
empresa separada e independente a exercer as mesmas atividades ou atividades similares, nas mesmas
condições ou em condições semelhantes, em especial nas suas relações com outras partes da empresa,
tendo em conta as funções desempenhadas, os ativos utilizados e os riscos assumidos através de uma
interface digital” (Comissão Europeia, 21.03.2018, p. 18).
378
Segundo RITA CALÇADA PIRES, “a proposta não seria substancialmente suficiente se, a par da identificação
da conexão digital com um território fiscal do Estado-Membro, não apresentasse regra para determinar
o lucro atribuível à presença digital significativa. Surge assim o artigo 5.º da Proposta de Directiva que,
reclamando a aplicação do princípio da plena concorrência (arm’s length) (n.º2), remete o apuramento
do lucro para uma análise funcional” (Pires R. C., Manual de Direito Internacional Fiscal, 2018, p. 367),
onde “A fim de determinar as funções da presença digital significativa, e imputar-lhe a propriedade
económica dos ativos e os riscos, devem ter-se em conta as atividades economicamente significativas
realizadas por essa presença através de uma interface digital. Para o efeito, as atividades empreendidas
pela empresa através de uma interface digital relacionadas com dados ou utilizadores devem ser
consideradas atividades economicamente significativas da presença digital significativa que imputam os
riscos e a propriedade económica dos ativos a essa presença”, cf. n.º 3 do art.º 5.º da proposta de Diretiva
(Comissão Europeia, 21.03.2018, p. 18).
O novo sistema garante uma ligação real entre o local onde os lucros digitais são gerados e o local onde
são tributados.

133
ii. recolha, armazenamento, processamento e visualização de conteúdos
gerados pelos utilizadores;
iii. venda de espaços publicitários em linha;
iv. disponibilização num mercado digital de conteúdos criados por terceiros;
v. prestação de qualquer serviço digital que não preencha as situações
anteriores379.
 É definido como método de atribuir o lucro em concreto, regra geral, o método do
fracionamento (profit split method) no quadro dos preços de transferência380.
 A proposta de diretiva aplicar-se-á às entidades, independentemente do local onde
são residentes para efeitos fiscais das empresas, quer se trate de um Estado-
Membro ou de um país terceiro. No entanto, não afeta os contribuintes
estabelecidos em uma jurisdição fora da UE onde exista um tratado de dupla
tributação em vigor, a menos que tal tratado inclua uma disposição similar sobre
a presença digital significativa.

Para melhor ilustrar a proposta de Diretiva em apreço, é particularmente clara a


esquematização seguinte381:

Figura 1. Proposta Regime Tributário (Fonte: Serviços da Comissão Europeia)

379
Cf. art.º 5 da proposta de Diretiva (Comissão Europeia, 21.03.2018).
380
Cf. art.º 5.º, n.º 6 da proposta de Diretiva (Comissão Europeia, 21.03.2018, p. 19).
381
Disponível em https://ec.europa.eu/taxation_customs/business/company-tax/fair-taxation-digital-
economy_en.

134
Por último, a Comissão recomenda ainda aos Estados-Membros que reproduzam
as disposições constantes da presente diretiva nas convenções em matéria de dupla
tributação com países terceiros, uma vez que, no caso de existir uma convenção para
evitar a dupla tributação entre um Estado-Membro e uma jurisdição fora da União, as
regras da convenção em matéria de dupla tributação aplicável podem prevalecer em
relação às disposições propostas sobre uma presença digital significativa.

O objetivo das recomendações é abordar situações que envolvam jurisdições de


países terceiros, sem desrespeitar os tratados existentes nos Estados-Membros.

As regras da presente proposta devem ser integradas nos sistemas dos Estados-
Membros para tributação das sociedades e na proposta de uma matéria coletável comum
consolidada do imposto sobre as sociedades (MCCCIS)382 da Comissão, devendo ainda
refletir-se em alterações correspondentes a introduzir no Modelo de Convenção Fiscal
sobre o Rendimento e o Património da OCDE a nível internacional.

Os Estados-Membros devem adotar e publicar, até 31 de dezembro de 2019, as


disposições legislativas e outras necessárias para dar cumprimento à proposta em apreço,
devendo-as aplicar a partir de 1 de janeiro de 2020383.

Cumprirá à Comissão monitorizar a implementação da diretiva após a sua adoção


e a sua aplicação em estreita cooperação com os Estados-Membros.

Em suma, a concretização desta proposta permitirá aos Estados-Membros tributar


os lucros que são gerados no seu território, mesmo por uma empresa que aí não tenha
presença física. As regras que se definem pretendem assegurar que as empresas digitais
contribuam para as finanças públicas ao mesmo nível que as empresa tradicionais (de
pedra e cal384).

382
Enquanto solução ótima para garantir uma tributação mais justa e eficiente das sociedades na UE.
Contudo, o desafio prende-se, em parte, com o facto da atual definição de um estabelecimento estável
na MCCCIS seguir aquela que é atualmente aplicável e, bem assim, as regras de imputação dos lucros não
MCCCIS não refletirem suficientemente as atividades digitais de uma empresa (Comissão Europeia,
21.03.2018, p. 4).
383
Nos termos do n.º 1 e 2.º do art.º 9 da proposta de diretiva (Comissão Europeia, 21.03.2018, p. 20)
384
Na expressão original utilizada pela comissão, “brick-and-mortar companies”.

135
3.4.2. Introdução de um Imposto sobre Serviços Digitais385

A Comissão apresenta ainda uma proposta de Diretiva relativa a uma solução


específica, eficiente e temporária, o Imposto sobre os Serviços Digitais (ISD), para
tributação dos rendimentos resultantes da prestação de determinados serviços digitais386
e enquanto se aguarda o consenso global quanto à solução a adotar.

Segundo a proposta de Diretiva, “In the wait of the comprehensive solution, which
may take time to adopt and implement, Member States face pressure to act on this issue,
given the risk that their corporate tax bases are significantly eroded over time, and also
due to the perceived unfairness of the situation. While unilateral measures are in place
or are concretely planned in 10 Member States for addressing this problem in a limited
way, the trend has been increasing and the measures adopted are very diverse in terms
of scope and their rationale. Such uncoordinated measures taken by Member States
individually risk further fragmenting the Single Market and distort competition,
hampering the development of new digital solutions and the Union's competitiveness as
a whole”387.

Com esta proposta, a Comissão pretende assegurar que as atividades digitais388


cujos rendimentos não são hoje tributados passem a sê-lo, gerando imediatamente receitas
para os Estados-Membros. Procura também a Comissão, numa estratégia de antecipação,
obstar a eventuais disparidades no seio da UE por força de abordagens unilaterais dos
Estados-Membros, potencialmente prejudiciais ao mercado único, propondo, em
alternativa, uma abordagem coordenada de tributar os rendimentos de determinados
serviços digitais.

Prevê-se a recetividade desta proposta de Diretiva, na medida em que não


implicará uma harmonização das taxas do imposto sobre as sociedades de Estados-

385
Na definição apresentada pela proposta de Diretiva, “Um serviço digital é um serviço prestado através
da Internet ou de uma rede eletrónica e cuja natureza torna a sua prestação essencialmente
automatizada, requerendo uma intervenção humana mínima. Esta definição corresponde à definição de
«serviços prestados por via eletrónica» constante do artigo 7.º do Regulamento de Execução (UE) n.º
282/2011 do Conselho, de 15 de março de 2011, que estabelece medidas de aplicação da Diretiva
2006/112/CE relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, e inclui o mesmo tipo
de serviços” (Comissão Europeia, 21.03.2018, p. 8).
386
Como definido na proposta de Diretiva em questão, o “ISD deve ser aplicável numa base temporária,
até ser encontrada uma solução abrangente” (Comissão Europeia, 21.03.2018, p. 5).
387
Cf. (Comissão Europeia, 21.03.2018, p. 3).
388
Cumpre esclarecer que a simples venda de bens ou serviços, auxiliada pela utilização de internet ou
uma rede eletrónica não é considerada um serviço digital, não gera um vínculo tributável.

136
Membros, não restringindo389 a capacidade destes em influenciarem o desejado volume
de receitas de imposto.

O novo Imposto sobre Serviços Digitais (ISD) aplicar-se-ia a partir de 1 de janeiro


de 2020 e seria cobrado pela aplicação de uma taxa única de 3% sobre a receita bruta.

O ISD aplicar-se-ia a determinados serviços digitais, incluindo a disponibilização


em interface digital de espaço para conteúdo publicitário destinado aos utilizadores dessa
plataforma, a disponibilização de plataformas multilaterais que permitam a interação
direta entre utilizadores e facilitar as transações entre estes e a transmissão de dados de
utilizadores gerados a partir das suas atividades na interface digital em causa, enquanto,
por exemplo, o fornecimento de serviços de comunicação ou serviços de pagamento aos
utilizadores, bem como os serviços regulamentados de crowdfunding, seriam excluídos.

O imposto em apreço será aplicado às empresas que preencham cumulativamente


as seguintes condições estariam sujeitas ao ISD390:

i. uma receita mundial anual total superior a 750 000 000 EUR;
ii. uma receita anual total proveniente de serviços digitais na UE superior a
50 000 000 EUR391.

Se a entidade fizer parte de um grupo consolidado, os referidos limiares devem ser


avaliados ao nível do grupo, ou seja, aplicados às receitas mundiais reportadas e às
receitas tributáveis obtidas no território da União pelo grupo no seu todo.

O ISD seria devido nos Estados-Membros onde os utilizadores estão localizados392,


não sendo necessário que os utilizadores tenham contribuído em dinheiro para a criação
das receitas a serem tributadas393. Se os utilizadores estiverem localizados em diferentes
Estados-Membros, a proposta também prevê que a base tributária seja atribuída entre os
Estados-Membros com base em determinadas regras de atribuição/ repartição394.

389
E dessa forma ainda mais a Soberania tributária dos Estados.
390
Nos termos do art.º 4.º da proposta de Diretiva, cf. (Comissão Europeia, 21.03.2018, p. 25).
391
Estes limiares excluirão, por exemplo, que pequenas empresas a iniciar a sua atividade ou empresas
em expansão não fiquem sujeitas a este imposto.
392
À semelhança do que acontece na primeira proposta de Diretiva.
393
Cf. art.º 5, n.º 1 da proposta de Diretiva (Comissão Europeia, 21.03.2018) e (Pires R. C., Manual de
Direito Internacional Fiscal, 2018, p. 369).
394
Nos termos do art.º 5.º da proposta de Diretiva (Comissão Europeia, 21.03.2018).

137
A Diretiva prevê também a cooperação entre os Estados-Membros sob a forma de
um mecanismo de “balcão único”, permitindo aos contribuintes ter um único ponto de
contacto para cumprir todas as obrigações administrativas em relação ao novo imposto395.

Apresenta-se este imposto sobre os serviços digitais como um imposto de


autoliquidação396.

Além disso, é expectável que os Estados-membros permitam aos contribuintes a


possibilidade de dedução do ISD para efeitos fiscais, a fim de mitigar possíveis casos de
dupla tributação.

A Comissão estima que aproximadamente 5 mil milhões de euros em receitas por


ano possam ser gerados para os Estado-Membros se o Imposto for aplicado a uma taxa
única de 3%.

Para melhor ilustrar a proposta de Diretiva em apreço, é também particularmente


clara a esquematização seguinte397:

Figura 2. Imposto sobre serviços digitais (Fonte: Serviços da Comissão Europeia)

395
Cf. art.º 10.º n.º 1 e 3 da proposta de Diretiva (Comissão Europeia, 21.03.2018).
396
Cf. art.º 15.º da proposta de Diretiva (Comissão Europeia, 21.03.2018).
397
Disponível em https://ec.europa.eu/taxation_customs/business/company-tax/fair-taxation-digital-
economy_en.

138
As referidas propostas legislativas serão agora apresentadas ao Parlamento
Europeu para consulta.

Não se prevê qual o grau de recetividade e, consequentemente, de consenso, que


receberá a proposta de Diretiva da Comissão Europeia que visa estabelece as regras
relativas à tributação das sociedades com uma presença digital significativa, pois alguns
Estados pretendem um consenso mais alargado (OCDE).

Mas teme-se que a demora na definição da estratégia a adotar reverta a natureza


provisória do imposto em apreço em permanente.

3.5. Reflexão crítica

Como problematizado por VASCO BRANCO GUIMARÃES, “Caracterizando-se a


noção de estabelecimento estável pela existência de uma instalação fixa aonde se exerce
uma atividade empresarial como é possível responder a um desafio que é colocado pela
existência de um mundo virtual que se caracteriza pela sua globalidade e generalidade de
acesso independentemente da sua localização geográfica?398”

De facto, o grande desafio prende-se com a articulação entre estas duas realidades,
nomeadamente, compreender se os atuais elementos de conexão estão aptos estabelecer
uma ligação entre situações tributárias internacionais e o ordenamento jurídico-tributário
dos Estados envolvidos.

A existência de diferenças entre a economia digital e a economia real justifica a


introdução de um novo elemento de conexão.

Através da conceptualização de um novo elemento de conexão baseado na


presença económica significativa, pretende-se a identificação de mecanismos alternativos
que permitam demonstrar uma presença económica e comercial num território da mesma
forma que o E.E. tradicional o fazia.

Refira-se, há um conjunto de condições que permitem ficcionar uma ideia de


presença tradicionalmente associada E.E.399

398
Cf. (Guimarães, O conceito de estabelecimento estável e o comércio electrónico, 2000, p. 155).
399
Em rigor, não se trata de uma ficção tout court. Com efeito, existe uma presença, está a ser
desenvolvida uma atividade num Estado. Contudo, em função das suas características, é preciso

139
Assim, o recurso à presença económica significativa, concretizada por uma
presença digital significativa, permite uma continuidade e o alargamento da figura do
E.E. às atividades desenvolvidas na economia digital400.

Esta recondução da presença digital significativa à figura do E.E. não é um


capricho. Em termos substantivos, podemos estabelecer um paralelismo entre a realidade
física e a realidade digital enquanto concretização do E.E., o que nos permite, com
algumas adaptações, manter a figura.

Os fundamentos que justificavam e confortavam o E.E. tradicional mantêm-se


válidos, construindo o quadro teórico necessário ao desenvolvimento do novo elemento
de conexão, consubstanciado num novo vínculo para o E.E.

Neste sentido importa compreender o quadro teórico dentro do qual o conceito de


E.E. foi desenvolvido e a razão da atualidade do mesmo, justificando o alargamento da
figura às realidades digitais401.

Como referem PETER HONGLER e PASQUALE PISTONE:

“the current PE definition is not carved in stone, nor is it a fixed concept (…). The concept
of PE is rather to be regarded as a compromise that strikes a fair balance between the
exclusive taxation of the state of residence of the enterprise and the right of the market
country to have a fair share of taxes in respect of business activities that are stably located
on its territory”402.

A existência de um estabelecimento estável de uma empresa não-residente (à qual


está associado) num Estado era e é a melhor forma de comprovar a existência de uma
presença económica, significativa o bastante para justificar a possibilidade desse Estado
tributar os rendimentos que possam legitimamente ser reconduzidos a esse
estabelecimento estável.

concretizá-la num conjunto de elementos de forma a poder apreendê-la de forma semelhante ao que
acontece com o E.E. tradicional.
400
Muitas vezes denominado por E.E. digital ou virtual.
401
Aliás, o novo elemento de conexão em apreço, o novo E.E. baseado na presença digital deve estar em
linha com os princípios gerais do direito fiscal internacional. A conformação do E.E. digital a estes
princípios aumentará as probabilidades de reunir alargado consenso internacional.
402
Cf. ( Hongler & Pistone , 2015, p. 15). Como exemplo, pense-se na concretização de E.E. através de
agente independente. O importante é que mantenha a capacidade de garantir uma justa repartição do
poder de tributar entre o Estado fonte (enquanto mercado onde a empresa não-residente) exerce a sua
atividade) e o Estado residência.

140
Ou seja, o poder de tributação pelo Estado fonte, sendo uma derrogação do poder
tributário do Estado residência, pressupõe a existência de um vínculo entre a atividade de
uma empresa e o respetivo rendimento e um determinado território.

Nestes termos, como fundamento do conceito de E.E. e do poder de tributação do


Estado fonte a ele associado concorrem, essencialmente, duas teorias: a teoria da fonte e
a teoria do benefício403.

Relativamente à teoria da fonte, e como se percebe, esta justifica o poder de


tributar de um Estado pela existência de uma ligação entre a produção de um rendimento
e o seu território.

O mérito conceptual desta teoria é permitir que o Estado fonte exerça o seu poder
tributário em relação a atividades que produzam rendimento no seu próprio território.

A não consideração desta teoria significaria que uma empresa não-residente


apenas seria tributada no Estado onde manteria a sua sede (Estado residência). O que não
se entenderia dada a particular e intencional relação económica desenvolvida entre a
atividade de uma empresa não-residente e o território do Estado em que atua 404 através
de uma presença física. No limite, isso significaria, também, uma utilização das
infraestruturas desse Estado sem qualquer contrapartida associada405, o que dificilmente
seria aceite.

Quer a economia global, num primeiro momento, quer a economia digital, num
segundo, vieram alterar profundamente a estrutura de criação de valor e de rendimento
normalmente associada ao contexto e período em que a teoria da fonte foi desenvolvida.

A economia digital em particular redimensiona profundamente a realidade


enquadrável na teoria da fonte do rendimento, até então mais bilateral (Estado fonte vs.
Estado residência), dispersando-a por mais Estados e, com isso, criando um cenário
multilateral (Estados fonte vs. Estado residência)406, dificultando a perceção da fonte de
rendimento.

403
Em inglês, “the sourcing theory” e a “the benefit theory”.
404
“The existence of a genuine link with the taxing jurisdiction of the country where income is sourced and
the right of such country to tax business income should never be questioned or put in danger in so far as
the presence of a non-resident in the market country is not merely ocasional” ( Hongler & Pistone , 2015,
p. 18).
405
Ligação com o princípio do benefício.
406
Negrito e sublinhado nosso.

141
Permitindo a economia digital a venda de bens e serviços num território sem a
necessidade de presença física (pessoal ou outra), uma conceção moderna da teoria da
fonte poderá ajudar a estabelecer um vínculo – do qual se extrai a existência de uma
presença – com o Estado onde se localiza o mercado onde o rendimento se produz,
justificando a respetiva tributação.

Não obstante as alterações que a economia digital provocou nos tradicionais


processos de criação de valor – sobretudo pela importância dos dados, da interação entre
utilizadores e entre estes e as plataformas digitais neste processo –, identificando-se o
local onde o mesmo é gerado, poderá o mesmo ser reconduzido a uma presença digital,
materializando-a.

A nova dimensão a conferir à teoria da fonte deverá também considerar a teoria


da “tributação do rendimento no país de origem407” formulada por ERIC KEMMEREN408.

Esta teoria justifica o poder de tributação do Estado no qual o rendimento tenha


sido produzido, na medida em que se considera que o facto gerador do rendimento estará
aí localizado.

Como facto gerador o autor identifica a atividade intelectual: só esta cria


rendimento.

Segundo este autor, é a atividade dos indivíduos na estrutura da empresa que gera
o rendimento passível de tributação. Ou seja, a atividade económica da empresa é
indissociável das pessoas que a compõem, que fazem parte da empresa. Esta teoria não
considera, contudo, que a interação da empresa com os clientes e, no âmbito da economia
digital, com os utilizadores também é um fator gerador de valor e, consequentemente, de
rendimento.

Nestes termos, transpondo a lógica associada ao referido “elemento intelectual”


na produção de rendimento ao papel dos clientes e utilizadores na criação de valor na
economia digital permitirá manter a atualidade da teoria da “tributação do rendimento no
país de origem”. Só assim poderá ser um elemento válido na construção de uma nova
dimensão para a teoria da fonte, pois a recondução do valor criado a clientes e utilizadores
presentes num determinado território não só identificá-lo-á como local de fonte dos

407
Na formulação original, “theory of taxation of income in the country of origin”.
408
Cf. ( Hongler & Pistone , 2015) e (Kemmeren, 2010).

142
mesmos409, como permitirá consubstanciar uma presença reconduzível a um E.E. (in casu
digital).

Relativamente à teoria do benefício, importa desde logo compreender os impostos


como “as the price paid for all state services by all taxpayers taken together, and
countries obtain their right to tax based on the services (benefits) provided”410.

Neste sentido, um conceito alargado de E.E. deve, em parte, considerar os


benefícios obtidos por um contribuinte numa determinada jurisdição, pois isso reflete,
corporiza a interdependência existente.

A teoria do benefício implica necessariamente, parece-nos, a existência de uma


forte ligação económica (pertença económica ou economic allegiance) a determinado
território, a qual justifica que um ente coletivo esteja na disposição de se sujeitar a
determinadas obrigações de natureza tributária. Entende-se que um contribuinte que
receba benefícios da comunidade pública em que se insere deve também suportar os
custos dessa mesma comunidade.

Esta teoria justifica a tributação pelo Estado da fonte pois considera-se ser ele o
responsável por assegurar as condições necessárias à produção de bens e serviços. Os
impostos cobrados refletem uma contrapartida prestada pela empresa não-residente pela
utilização das infraestruturas de determinado Estado na obtenção de rendimento.

A construção do E.E. com base nesta teoria reflete ainda que nem todos os
benéficos se reportam a uma presença física, na medida em que o art.º 5, n.º 5 do MC
OCDE considera a existência de um agente dependente (pessoa) a concretização de um
E.E. Ou seja, nem todas as empresas não-residentes carecem de uma presença física para
operar, sem que isso obste ao aproveitamento de quaisquer benefícios.

Esta consideração é relevante, pois é demonstrativa de alguma latitude do conceito


de E.E., o que facilitará a sua abordagem à economia digital.

De todo o modo, quando a teoria do benefício foi desenvolvida e a definição de


E.E. implementada no MC OCDE, nem sequer se perspetivava um mundo digital. Razão
pela qual está ainda algo enraizada a ideia de que é necessária uma presença física para a
tributação pela fonte, uma vez que não se identificavam benefícios possíveis além dos

409
Com as demais consequências ao nível da repartição do poder de tributar.
410
Cf. ( Hongler & Pistone , 2015, p. 19) referindo-se a (Pinto, 2006).

143
benefícios físicos que poderiam ocorrer (por exemplo, rodovias, ferrovias, arruamentos,
transporte público, eletricidade, entre outros).

Numa primeira abordagem a consideração de um local físico e permanente através


do qual uma empresa não-residente desenvolve a sua atividade, como limiar mínimo para
tributação, parece oferecer algumas vantagens.

Duas das principais são: (i) a liquidação e cobrança de impostos é muito mais fácil
se houver local fixo de negócios numa jurisdição; e (ii) o local físico confere certeza e
segurança jurídico-tributária quer a contribuintes quer a administrações tributárias.

Não há, parece-nos, razões para ficarmos reféns destas considerações e,


consequentemente, da ideia de “fisicalidade”.

Quer a Ação 1 do BEPS quer, mais recentemente, as propostas de Diretiva da


Comissão Europeia teorizam e concretizam, respetivamente, um conjunto de elementos
que, não obstante a ausência de fisicalidade, relevam para efeitos daquelas vantagens
(alegadamente só possíveis com a presença física num território): a primeira será
potencialmente assegurada pela conceptualização do E.E. virtual e pelo registo
simplificado das empresas que queiram prestar serviços digitais num território; a segunda
através da definição de limiares mínimos que concretizem uma presença digital e
económica significativa (definição de um limiar mínimo de rendimento, de utilizadores,
de celebração de contratos associados a estes serviços, entre outros).

Além do mais, as regras anti-fragmentação perspetivadas (e até já presentes no


MC OCDE) permitem mitigar um receio associado frequentemente à ausência física.

Por forma a alargar a teoria do benefício, conformando-a a um conjunto de


elementos presentes nos novos modelos de negócios desenvolvidos pela economia digital,
podemos mencionar um conjunto de benefícios associados às empresas não-residentes no
Estado onde se encontra o cliente ou utilizador411:

i. Um sistema legal: Sem um sistema legal que preveja e permita uma realidade
económica digital, as empresas não poderiam oferecer seus produtos online;

411
Cf. ( Hongler & Pistone , 2015, p. 22).

144
ii. Mecanismos que garantam o cumprimento do pagamento por parte do cliente:
sem estas garantias as empresas estariam relutantes em prestar os seus serviços
em determinados Estados;
iii. Proteção dos direitos de propriedade intelectual: na mesma linha que a
anterior, a ausência de garantias afastaria as empresas a prestar os seus
serviços em determinados Estados;
iv. Manutenção de um ambiente digital: sem as necessárias infraescritas técnicas,
os produtos e serviços digitais não podem ser prestados;
v. Energia: sem fornecimento de energia a economia digital e as respetivas
transações não são possíveis;
vi. Reciclagem de lixo: essencial para a indústria de comércio eletrônico; e
vii. Infraestruturas no geral.

A identificação de tais benefícios, mesmo na ausência de uma presença física,


comprova que os novos modelos de negócio desenvolvidos pela economia digital não
obstam ao exercício por parte de um Estado dos respetivos poderes de tributação como
contrapartida pelo custo suportado com a provisão daqueles benefícios, havendo
fundamento para isso.

Comprova-se que a estrutura e fundamentos que tradicionalmente subjazem ao


E.E. se mantém atuais, permitindo uma adaptabilidade da figura à realidade (digital) atual.
Em concreto, observa-se que as teorias supra expostas poderão não só indiciar uma
presença económica significativa num Estado, como continuar a fundamentar a
tributação pelo Estado fonte.

Por outro lado, e do que já temos referido, parece claro que o sucesso do projeto
BEPS, sobretudo no que diz respeito à Ação 1, não passará por adaptar as regras existentes
à realidade atual, mas por criar novas regras que permitam estabelecer a conexão entre
determinado facto tributário e um determinado território por forma a garantir uma
atribuição e delimitação do poder tributário dos Estados que seja justa, equilibrada e
perfeitamente adaptada aos novos modelos de negócios desenvolvidos pela economia
digital.

In casu, a construção de um novo elemento de conexão baseado na presença


económica significativa passará por reconhecer num contexto digital um conjunto de

145
(outros) elementos indiciadores de uma presença económica e comercial num
determinado Estado que não passem por uma ideia de “fisicalidade”, permitindo
estabelecer um vínculo tributável com essa jurisdição e com isso manter a coerência da
figura do E.E. (agora digital) como fundamento à tributação.

O vínculo tributável existirá sempre que a presença (física ou digital) de uma


empresa não-residente, e da sua atividade económica, num determinado Estado dê origem
à criação de valor.

A definição da presença económica significativa e dos elementos ou indicadores


que a conformem não pode redundar numa caracterização demasiado fechada. Neste
sentido, alerta-se que deve ser “carefully drafted as it could be ring-fencing, i.e. give rise
to an infringement of the neutrality principle412” (sublinhado nosso).

Mais do que uma definição, a caracterização deste novo elemento de conexão413


deve refletir a nova realidade digital414, podendo certamente recorrer a alguns limiares
mínimos de delimitação, contudo uma excessiva pormenorização poderá incorrer na
exclusão de algumas situações que em teoria seriam reconduzidas a uma presença
económica significativa.

412
Cf. ( Hongler & Pistone , 2015, p. 23).
413
Ou melhor, da forma como este se estabelece.
414
A OCDE considera que só atividades totalmente desmaterializadas concorrem para este elemento de
conexão, com efeito, avança com um conjunto de características que pretendem identifica-las definidas
da seguinte forma:
1. “The core business of the enterprise relies completely or in a considerable part on digital goods
or digital services;
2. No physical elements or activities are involved in the actual creation of the goods or of the services
and their delivery other than the existence, use, or maintenance of servers and websites or other
IT tools and the collection, processing, and commercialisation of location-relevant data;
3. Contracts are generally concluded remotely via the Internet or by telefone;
4. Payments are made solely through credit cards or other means of electronic payments using on-
line forms or platforms linked or integrated to the relative websites;
5. Websites are the only means used to enter into a relationship with the enterprise; no physical
stores or agencies exist for the performance of the core activities other than offices located in the
parent company or operating company countries;
6. All or the vast majority of profits are attributable to the provision of digital goods or services;
7. The legal or tax residence and the physical location of the vendor are disregarded by the customer
and do not influence its choices;
8. The actual use of the digital good or the performance of the digital service do not require physical
presence or the involvement of a physical product other than the use of a computer, mobile
devices or other IT tools”.
Cf. (OCDE, Action 1: Final Report, 2015, p. 144) e ( Hongler & Pistone , 2015, p. 30).

146
Neste sentido, também se desaconselha, pelos riscos inerentes, o recurso à
tipificação de situações que pela sua presença digital significativa sejam consideradas
atividades economicamente significativas415.

Percebe-se a intenção, sobretudo numa realidade tão mutável como a economia


digital, de identificar um conjunto de atividades que pela sua natureza ou características
redundem numa presença económica significativa, definindo linhas orientadoras para a
concretização do elemento de conexão. Porém, há que considerar os riscos associados a
uma tipificação/ definição excessiva, por força do princípio da neutralidade.

Deve-se alcançar uma formulação flexível quer permita operar numa realidade
extremamente dinâmica e volátil como é a economia digital.

Concretizando-se o consenso necessário em torno deste (novo) elemento de


conexão, e para efeitos de concretização, deverá o mesmo ser vertido no MC OCDE.

Com efeito, identificamos três abordagens possíveis para, através do conceito de


presença económica significativa estabelecer uma ligação entre a atividade de uma
empresa não-residente e um determinado território416:

a) A primeira opção seria reinterpretar a definição atual de E.E., interpretando de


forma extensiva a redação atual417.

Neste caso, a definição atual de E.E. seria usada para avaliar a existência de um vínculo
tributável com um Estado. Essa solução tem o condão de representar uma reação imediata
aos desafios atuais, pois os tratados e CDT’s atuais não precisariam ser alterados.

Teria, no entanto, de ser avaliado de que modo tal interpretação poderia ser subsumível
ao disposto no nº 1 do artigo 5º da OCDE Modelo, que ainda inclui a referência a uma
“instalação fixa”.

Os referidos fatores concretizadores de uma presença económica significativa indiciam


uma interação intencional, determinada e sustentada de uma empresa não-residente com
a economia de um Estado através da tecnologia e de outras ferramentas automatizadas.

415
Metodologia seguida no art.º 5.º, n.º 5 da proposta de Diretiva da Comissão Europeia (Comissão
Europeia, 21.03.2018).
416
(Petruzzi & Buriak, 2018, pp. 17-18).
417
(OCDE, Model Tax Convention on Income and on Capital: Condensed Version, November 2017).

147
Da natureza desta interação, e dos esforços e custos muitas vezes a ela associados,
podemos extrair uma ideia de “permanência” num determinado mercado.

Ora, é justamente esta ideia de “permanência” que encontramos como ratio da ideia de
“instalação fixa”. Admitimos que esta construção poderá ser uma forma de justificar uma
interpretação alargada, mais extensa mantendo uma certa ligação à atual letra da lei.

b) A segunda opção seria desenvolver uma nova definição de E.E., levando em conta
o papel dos clientes/ utilizadores no processo de criação de valor e, por força disso,
realizando um paralelismo com a noção colaboradores/ funcionários de uma empresa
dando origem a um E.E.

Neste caso, no entanto, apenas os clientes/ utilizadores que geram informação/ dados
valiosos para a empresa não-residente, criando com isso valor, poderiam servir como um
vínculo/ conexão com um Estado assim estabelecendo E.E. digital.

Neste sentido, e numa formulação que consideramos particularmente avisada, PETER


HONGLER e PASQUALE PISTONE, propõem um novo n.º 8 ao art.º 5 do MC OCDE:

“If an enterprise resident in one Contracting State provides access to (or offers) an
electronic application, database, online marketplace, storage room or offers
advertising services on a website or in an electronic application used by more than
1,000 individual users per month domiciled in the other Contracting State, such
enterprise shall be deemed to have a permanent establishment in the other Contracting
State if the total amount of revenue of the enterprise due to the aforementioned services
in the other Contracting State exceeds XXX (EUR, USD, GBP, CNY, CHF, etc.) per
annum”418.

Esta definição, que consideramos um bom ponto de partida para uma futura discussão,
não é perfeita e poderá comportar alguns riscos: poder-se-á contornar a aplicação do E.E.
através de uma estrutura de planeamento fiscal; e a definição poderia facilmente tornar-
se obsoleta, isto é, excluir inadvertidamente novas formas de negócios e atividades
introduzidas no futuro.

c) A alternativa passará por desenvolver uma nova definição de E.E. aliada a uma
reformulação total da redação do art.º 5 do MC OCDE, que permita definir um vínculo

418
Cf. ( Hongler & Pistone , 2015, p. 25).

148
tributável entre os lucros de uma empresa não-residente provenientes de uma atividade
digital e um determinado território, necessariamente acautelando as regras de imputação
do rendimento à presença económica significativa em causa.

Ou seja, mais do que desenvolver uma definição de E.E. especifica para a economia
digital que coexista com a definição tradicional de E.E.419, a solução passará por
desenvolver uma (única) definição de E.E. passível de ser aplicável independentemente
do meio (físico ou digital) através do qual se projete uma presença económica
significativa.

Em qualquer caso, e independente da formulação encontrada, qualquer definição


que se apresente para efeitos de um E.E. digital deverá considerar a amplitude do escopo
pretendido, por forma a não gerar incerteza para os contribuintes e, bem assim, evitar
disputas não apenas entre contribuintes e administrações tributárias, mas também entre
diferentes administrações tributárias.

Seja através desta ou de outra formulação mostrar-se-á sempre necessária a


definição de alguns limiares mínimos sob pena de não se conseguir evitar uma excessiva
base de tributação.

Consequentemente, tal definição deveria ser complementada por mecanismos


efetivos para o cumprimento cooperativo e resolução de disputas.

De facto, avista-se uma encruzilhada: por um lado começamos a atingir graus de


concretização deste novo elemento de conexão muito interessantes, veja-se o exemplo da
proposta de Diretiva apresentada pela Comissão Europeia em março deste ano (capítulo
3.4), por outro escasseiam mecanismos de controlo destas atividades a que as
Administrações tributárias se possam recorrer. Quanto a isto já não se trata de um
problema eminentemente jurídico, mas técnico.

De referir que o sucesso de implementação deste elemento de conexão não se


baseia apenas na sua inserção no MC OCDE. A intervenção terá de se alargar aos
comentários que acompanhem o artigo no MC OCDE e terão de ser formuladas
recomendações orientando a forma como os Estados deverão conformar as suas
disposições tributárias próprias a esta alteração.

419
Teríamos assim duas definições de E.E. aplicáveis a diferentes realidades.

149
Também se deseja que se mantenha a tributação dos lucros imputáveis a um E.E.
digital de forma semelhança ao que se faz hoje para o E.E. tradicional – ficciona-se uma
entidade separada e aplicam-se por analogia os princípios da OCDE em matéria de preços
de transferência.

Esta operação não está isenta de dificuldades, obrigando a algumas adaptações


nesta regra. Desde logo, porque através do processo de criação de valor da economia
digital podem ser múltiplas as fontes de imputação simultânea de um rendimento.

Neste sentido, tem sido considerada a redefinição de funções, dos ativos e dos
riscos na cadeia de valor das empresas para efeitos de preços de transferência. Aliás, foi
esta a opção da proposta de Diretiva da Comissão Europeia sobre esta matéria420, nos
termos do n.º 2 do art.º 5 da proposta:

“Os lucros imputáveis à presença digital significativa ou com ela relacionados devem
ser aqueles que a presença digital teria obtido se fosse uma empresa separada e
independente a exercer as mesmas atividades ou atividades similares, nas mesmas
condições ou em condições semelhantes, em especial nas suas relações com outras
partes da empresa, tendo em conta as funções desempenhadas, os ativos utilizados e
os riscos assumidos através de uma interface digital”.

A teoria da fonte justifica repartição do poder tributário com o Estado no qual é


criado valor, independente da presença física da empresa não-residente.

Por outro lado, e nos termos do processo de criação de valor associado a este novo
elemento de conexão, considerando que identificação de um vínculo tributável e a
atribuição do poder de tributar é condicionada em função da criação de valor (pela
interação de diversos elementos), então não fará sentido manter, tal como está, a exclusão
de atividades preparatórias ou auxiliares na concretização de um E.E. devendo eliminar-
se, pelo menos no que à economia digital diz respeito, o n.º 4 do artigo 5.º do MC OCDE.

Com efeito, a natureza física ou digital e nuclear ou auxiliar deixam de ser


relevantes. A partir do momento em que num contexto de presença digital significativa é
criado valor, e com isso rendimento num determinado Estado, justificar-se-á o vínculo
tributável.

420
Cf. (Comissão Europeia, 21.03.2018).

150
Para mais esta dicotomia entre atividades nucleares ou principais e preparatórias
ou auxiliares tende a ser mais difusa no âmbito da economia digital. Pelo que no contexto
de alargamento do E.E. este artigo terá de ser revisto.

Sendo certo que a formulação anteriormente apresentada de presença económica


significativa a constar do MC OCDE não faz referência à dimensão das empresas, é
conveniente que essa conceptualização não se limite só a grandes multinacionais ou
pequenas e médias empresas. O que a digitalização da economia veio provar é que a
dimensão das empresas não é, genericamente, proporcional ao nível de valor criado.

No âmbito de um elemento de conexão baseado na presença económica


significativa, através de uma presença digital significativa, têm sido reconhecidas as
dificuldades de fazer cumprir as obrigações fiscais de empresas não residentes.

Independentemente da hipótese de um registo simplificado obrigatório para


empresas não-residentes que prestem serviços digitais, continua-se a colocar o problema
de após liquidado o imposto devido as administrações fiscais não terem, aparentemente,
meios para fazer cumprir essa obrigação421.

Trata-se de um óbice à receita tributária.

Tem-se discutido como resposta a esta lacuna a introdução de mecanismos que


permitam bloquear as plataformas digitais no caso de as empresas não-residentes não
cumprirem as suas obrigações, limitando desta forma a sua atividade.

Estes mecanismos de bloqueio já existem, pelo que seria transpô-los para as


Administrações tributárias. Desconhece-se, contudo, se tecnicamente é possível às
empresas contornarem tal obstáculo.

Também se equaciona a possibilidade de um mecanismo transnacional que


permite aos Estados fazer cumprir as diversas obrigações tributárias422, a par, por

421
A montante tem-se identificado um outro problema relacionado com a escolha do sujeito passivo que
terá de cumprir a obrigação de imposto. Tendo em conta o processo de criação de valor associado à
economia digital alguns autores têm defendido que a empresa que coleta a totalidade do rendimento é
que terá de entregar os impostos correspondentes, mesmo que venham de um E.E. (cujo o imposto é
liquidado considerando tratar-se de uma figura separada da empresa sede).
422
Neste sentido, “The Rubik agreements signed by Switzerland with the United Kingdom and Austria
have shown that the application of an extraterritorial tax enforcement mechanism could be feasible and
lead to a higher degree of enforceability. If so, the tax due to digital presence is collected by one or several
states on behalf of the others” ( Hongler & Pistone , 2015, p. 37).

151
exemplo, do que existe no contexto europeu para o IVA/ VAT, exigindo-se, contudo, uma
particular articulação para o efeito.

Um mecanismo deste género significaria por parte dos Estados uma (nova) auto-
limitação das respetivas soberanias, delegando-se competências a uma determinada
autoridade estrangeira, mas poderia significaria uma maior eficiência na coleta de receita.

Outra solução a considerar por forma a obstar ao não cumprimento da entrega de


imposto seria através de um mecanismo de retenção na fonte. Esta solução poderá ser
realista sobretudo para o caso de clientes ou utilizadores de um serviço digital serem eles
próprios empresas, pois seriam os únicos capazes de suportar o aumento do custo com
compliance.

De todo o modo, estaríamos no âmbito de um mecanismo muito semelhante ao


que se passa hoje com o IVA (não há uma coincidência entre o sujeito passivo do imposto
e o responsável pela entrega do mesmo).

Enquanto não se concretizar o acolhimento de um novo elemento de conexão na


prática internacional ou de um imposto a aplicar sobre os rendimentos imputados a uma
presença digital significativa423, tem sido entendido que os riscos dos Estados tomarem
opções de forma unilateral para resolver esta questão não são particularmente elevados424.

Para tanto, concorre o risco de dupla tributação que isso poderia acarretar, com as
demais consequências ao nível do princípio da neutralidade, e a potencial erosão da base
tributável dos Estados em causa.

Além do mais, um problema global dificilmente poderá ser ultrapassado por uma
solução local. Mesmo que fosse tentado, implicaria necessariamente uma articulação com
outras Administrações tributárias425 pois dificilmente se conseguiria identificar os
elementos do facto tributário de forma isolada, pelo que seria mais vantajoso que as
opções fossem tomadas de forma transversal.

423
Por forma a provisoriamente colmatar o atual problema de uma reduzida taxa de tributação da
economia digital.
424
De todo o modo, e por referência a 2018, já haviam sido implementados impostos relacionados com
rendimentos provenientes de produtos e serviços digitais: Reino Unido, Austrália (entretanto declarado
inconstitucional), Israel, India, Kuwait, Arabia Saudita. A China e Itália ponderam aplicar (Petruzzi & Buriak,
2018, pp. 3-4).
425
Com as dificuldades a isso associadas.

152
A aplicação unilateral das normas fiscais não só poderá ser contraproducente
como geradora de conflitos. Desde logo pelo facto de os Estados, isolados, dificilmente
compreenderem de forma holística o fenómeno tributário e económico internacional e as
consequências e impactos da interseção e interligação entre ambos.

De todo o modo, reconhecemos que quanto a esta matéria da economia digital –


que suscita esforços adicionais por parte dos Estados e das Administrações tributárias e
consensos alargados nas estratégias a definir – a adoção de novo elemento de conexão
colocará em perspetiva duas tendências, sobretudo no âmbito da União Europeia:

i) “por um lado, a natural relutância dos Estados abdicarem em parte da sua


soberania fiscal, em favor de um processo de harmonização ou cooperação
fiscais que se desconhece se poderá vir a ser adotado num espaço geográfico
suficientemente amplo para produzir os efeitos desejados;
ii) por outro lado, a crescente consciência que a harmonização será, pelo menos
em parte inevitável já que se os Estados não adotarem medidas coordenadas
ela tenderá a ser imposta pelos mercados”426.

Também subiste a questão de saber qual o critério a utilizar para considerar a


existência de um E.E. no caso de uma empresa não-residente preencher os limiares
mínimos para efeitos de uma presença digital significativa e, simultaneamente, deter um
agente dependente nesse mesmo Estado ou um qualquer local físico. Considera-se a
existência de dois vínculos tributáveis427? Dois contribuintes separados? Caso assim não
se entenda, como se liquida o imposto?

Considera-se que algumas destas questões poderão estar relacionadas com o


tratamento dado ao E.E. por cada um dos Estados, mas reconhece-se ser um problema
prático que carece de reflexão.

Para finalizar, importa referir que esta ou qualquer outra solução que se encontre
para estabelecer um elemento de conexão entre um facto tributário e um território num
contexto digital, terá a mesma de ter em conta e respeitar os mesmos princípios aplicáveis

(Santos J. P., 2000, p. 69).


426

Caso se tratem de atividades diferentes, não obstante pertencerem à mesma empresa, poderá ser
427

mais fácil.

153
à economia e comércio tradicionais428, nomeadamente: a neutralidade; eficiência, certeza
e simplicidade; justeza429.

O princípio da neutralidade pode definir-se, de forma resumida, como a


“exigência de a tributação não induzir os contribuintes a certos comportamentos
económicos, como forma de reação aos diferentes encargos tributários”430.

O princípio da justeza na alocação dos factos tributários, resulta do DFI, e impõe


que as soluções de implementação de um regime de tributação dos rendimentos derivados
de serviços digitais, considerem quer o critério da fonte dos rendimentos, quer o da
residência da pessoa/ entidade que aufere dos rendimentos, com vista a repartir a riqueza
gerada.

Por último, princípio da eficiência baseia-se nas dificuldades naturais em


implementar um sistema de tributação para a economia digital e comércio eletrónico,
procurando impor soluções quanto à estrutura dos impostos sobre o rendimento que sejam
compatíveis com a economia e comércio digitais.

428
Cf. Resoluções da Conferência Ministerial de Ottawa (Ottawa Taxation Framework Conditions).
429
Sobre este tema, vide ( Hongler & Pistone , 2015, pp. 41-43) e (Courinha, A Tributação Direta das
Pessoas Coletivas no Comércio Electrónico, 2001).
430
(Courinha, A Tributação Direta das Pessoas Coletivas no Comércio Electrónico, 2001).

154
4. Conclusão
A globalização e o desenvolvimento das Tecnologias de Informação e
Comunicação geram novos modelos de organização e gestão. Este fenómeno de
transformação está na origem da economia digital.

A desmaterialização advogada pela economia digital revela-se um traço


característico seu. Esta desmaterialização é marcada pela digitalização e pela natureza
intangível do processo económico e comercial e por uma reduzida necessidade de
presença física (material ou pessoal).

A crescente transação de bens e serviços intangíveis, incorpóreos, deixam de


necessitar dos tradicionais canais de distribuição para chegar ao seu destino. Rompe-se
com as noções comum de tempo e espaço.

A ideia de desmaterialização associada à economia digital veio dificultar a


utilização dos elementos de conexão tradicionais, pela inadequação destes últimos,
assentes na “fisicalidade”, à realidade base da economia digital, desprendida, por
natureza, de qualquer presença física num outro território. Em especial o E.E., cuja
concretização implica, nos parâmetros tradicionais, a ocupação de um local, de um espaço
físico. A importância do conceito está diretamente conexa com a necessidade de imputar
o ónus da tributação.

As premissas que estiveram na génese do aparecimento dos elementos de conexão


e respetivas regras mostram-se ultrapassadas. A atual contextualização económica não
tem paralelo com a contextualização da época em que surge, por exemplo, o
estabelecimento estável na prática internacional.

Sobretudo pela perda do elemento “fisicalidade” sempre associado ao trato


comercial, os elementos de conexão tradicionais têm mostrado dificuldades de adaptação
à nova realidade, refletindo-se numa menor capacidade dos Estados e respetivas
Administrações tributárias em identificar a existência de um facto tributário, o rendimento
a ele associado, os seus sujeitos e, bem assim, a respetiva ligação a um território.

Os elementos geográficos tornam-se irrelevantes, dificultando a determinação da


competência fiscal e o respetivo modo de proceder a essa determinação.

A existência de um mercado digital que não se encontra sob a dependência direta


de uma qualquer soberania coloca um conjunto alargado de reflexões sobre a validade e

155
consequente operacionalidade dos conceitos jurídicos hoje vigentes para regulamentar as
relações entre Estados, nomeadamente a (de)limitação do poder tributário.

A confluência das diversas características da economia digital com a ineptidão


dos habituais meios de identificação e resolução das situações fiscais plurilocalizadas
(normas de conflito) – criadas num contexto diametralmente diferente do atual – cria um
buraco negro onde os diferentes agentes económicos se movimentam muitas vezes de
forma imune, escapando ao poder tributário dos Estados.

Parece clara a desarticulação entre a realidade presente nos elementos de conexão


tradicionais e a realidade sobre a qual pretendem atualmente incidir.

Nestes termos, a economia digital levanta, fundamentalmente, três problemas à


fiscalidade: (i) risco de erosão das bases de tributação; (ii) dificuldade em determinar a
jurisdição fiscal competente; e (iii) dificuldade em assegurar o cumprimento tributário.

O objeto da presente dissertação de mestrado diz respeito, fundamentalmente, à


identificação do elemento de conexão que permitirá ultrapassar a dificuldade em
determinar a jurisdição fiscal competente.

Na atual conjetura da economia digital, e dada a desadequação dos elementos de


conexão, torna-se cada vez mais difícil identificar um vínculo tributável a determinado
Estado.

Subsiste a questão: Onde Tributar os rendimentos provenientes de produtos e


serviços digitais?

A OCDE, desde 2013, e no âmbito dos trabalhos desenvolvidos no contexto do


projeto BEPS, tem-se dedicado ao estudo dos desafios supra mencionados e à
apresentação das respetivas soluções, realçando-se a análise desenvolvida na Ação 1 e 7.

Neste sentido, o relatório da Ação 1 prevê: i) a introdução de um novo elemento


de conexão baseado no conceito de presença económica significativa, ii) a criação de uma
taxa de retenção na fonte para transações digitais, iii) a introdução de um imposto de
equiparação e iv) alterações às exceções previstas no conceito de E.E.

De referir que esta última sugestão foi concretiza no relatório final da Ação 7.
Contudo, da Ação 7 limitou-se a tecer recomendações às regras respeitantes às atividades
preparatórias e auxiliares (art.º 5.º, n.º 4, do MC OCDE), ao conceito de agente

156
dependente (art.º 5, n.º 5.º, do MC OCDE) e de agente independente (art.º 5.º, n.º 6 do
MC OCDE).

Porém, parece ter ficado aquém das expectativas. Ao manter e enfatizar a


exigência da presença física da atividade, a Ação 7 não logrou dar um passo determinante
na tributação dos rendimentos provenientes de contextos caracterizados pela
digitalização.

De facto, as soluções que têm surgido pela pena da OCDE passam,


maioritariamente, pela manutenção das atuais regras de tributação, recorrendo as mesmas
para construir ligações entre a realidade virtual e a realidade física.

A par desta, existe uma outra estratégia que insiste na procura de regras específicas
para a economia digital, tratando-a de forma autónoma.

Por um lado, negamos a definição de regras específicas para a economia digital,


na medida em que poderíamos criar distorções e discriminação entre o comércio
tradicional e o eletrónico – sendo que o último é uma evolução do primeiro pelo que não
se justifica um tratamento díspar – e colocar em causa os próprios princípios de tributação
– regras específicas para a economia digital relevariam as características desta, as quais
poderão não ser subsumíveis com aqueles princípios.

Por outro, a manutenção das atuais regras, mantendo a ideia de “fisicalidade”,


significará continuar neste processo de busca contínua por um elemento físico na
economia digital a que nos possamos agarrar para assim justificar a recondução a um dos
elementos de conexão. Sendo a economia digital marcada pela ausência de presença física
e estando a mesma em constante desenvolvimento, a busca pelo elemento físico será cada
vez mais difícil ou mesmo impossível, pois o mesmo pode nem sequer existir. Assim,
entendemos que esta estratégia não configura uma resposta duradoura, pelo que não deve
ser aceite.

Assim, deverá ser considerar uma terceira estratégia, uma via alternativa:
mantendo os atuais princípios de tributação e os respetivos elementos de conexão, sugere-
se a alteração das atuais (e tradicionais) regras que os concretizam por outras passíveis de
serem aplicadas a qualquer contexto, independentemente da natureza real ou virtual.

O caminho passará, entendemos nós, pela escolha de regras que possam ser
aplicadas a ambas as realidades, sem perda de vigor. Para isso, teremos de abandonar o

157
recurso à “fisicalidade” como característica central da fiscalidade e substitui-la por outra
ou outras características que, de forma idêntica, permitam estabelecer um vínculo
tributável entre uma empresa e um Estado.

Mostram-se necessários indicadores alternativos da presença de uma atividade


económica num território, até recentemente conferidos pela “fisicalidade”.

Esta estratégia permitir-nos-á manter a figura do E.E. e com isso, por se tratar de
uma figura consensual e perfeitamente integrada no corpus legislativo nacional e
internacional, conferir algum conforto, segurança e facilidade no processo de transição
de uma economia tradicional para uma economia digital.

Neste sentido, propondo-se a redefinição do critério de presença física como


determinante para estabelecer a conexão territorial e a consequente atração da base
tributável, a OCDE apresenta, no Relatório Final da Ação 1 do BEPS431, um novo
conceito de elemento de conexão cujo objetivo é garantir a tributação no Estado fonte
quando uma empresa não-residente aí apresente uma presença económica significativa,
independentemente de não apresentar qualquer elemento físico conexo com esse
território.

Consideramos que o elemento disruptivo desta proposta não reside na


consideração per si da presença económica significativa enquanto elemento justificador/
concretizador de uma especial ligação entre uma atividade e um Estado. Reside, sim, no
facto de a referida presença económica significativa se basear numa presença digital
significativa.

Este novo elemento de conexão consubstancia um alargamento do conceito de


estabelecimento estável o qual permite manter o vigor do princípio do estabelecimento
estável. A presença económica significativa – tradicionalmente assente em elementos
com natureza material, tangível e física – corporizada pela figura tradicional do E.E.,
passa a aferir-se em função de elementos digitais, intangíveis, tecnológicos e outras
ferramentas automatizadas.

Há um processo de transformação, de metamorfose do E.E. por forma a ser


adaptado à realidade digital.

431
Cf. (OCDE, Action 1: Final Report, 2015) e confirmado em (OCDE, Interim Report , 2018).

158
O conceito de presença económica significativa, sobretudo por recurso a uma
presença digital significativa, carece de determinação e concretização.

Neste sentido, o relatório final da Ação 1, identifica um conjunto de fatores que


concorrem para efeitos de determinação e concretização de uma presença económica
significativa, agrupados em três grupos: i) um fator baseado na receita ou rendimento; ii)
fatores digitais e iii) fatores baseados no utilizador.

O mesmo relatório sugere a sua utilização combinada. O carácter complementar


dos fatores considerados permite uma melhor apreensão e aplicação do novo elemento de
conexão.

Por outro lado, a necessária concretização dos fatores e limiares mínimos de


tributação terá de ser acompanhada da definição de mecanismos reporte por parte das
empresas não-residentes e dos respetivos mecanismos de controlo.

Parece estar a construir-se um sistema baseado em declarações (voluntárias) por


parte das empresas não-residentes, não se prevendo especial obrigatoriedade das mesmas
nem quaisquer sistemas de controlo432. Fala-se num regime simplificado de registo, mas
falta compreender se o mesmo será obrigatório e de que forma será feito o controlo do
mesmo.

Neste sentido, consideramos ser necessária a ponderação de mecanismos de


incentivo (por exemplo, benefícios fiscais) que levem as empresas a declarar a sua
atividade digital, sob pena de se desenvolver um esforço inglório.

Concretizando-se o consenso necessário em torno deste (novo) elemento de


conexão, e para efeitos de concretização, deverá o mesmo ser vertido no MC OCDE.

Em qualquer caso, e independente da formulação encontrada, qualquer definição


que se apresente para efeitos de um E.E. digital deverá considerar a amplitude do escopo
pretendido, por forma a não gerar incerteza para os contribuintes e, bem assim, evitar
disputas não apenas entre contribuintes e administrações tributárias, mas também entre
diferentes administrações tributárias.

432
Um sistema assente numa obrigação declarativa auto-imposta.

159
Seja através desta ou de outra formulação mostrar-se-á sempre necessária a
definição de alguns limiares mínimos sob pena de não se conseguir evitar uma excessiva
base de tributação.

Consequentemente, tal formulação deveria ser complementada por mecanismos


efetivos para o cumprimento cooperativo e resolução de disputas.

De todo o modo, consideramos que este novo elemento de conexão permite um


corte com o postulado da “fisicalidade” no corpus legislativo tributário, permitindo em
simultâneo a manutenção dos atuais elementos de conexão o que, inevitavelmente, e
tratando-se de figuras com profundo lastro jurídico-económico, confere uma maior
segurança aos contribuintes e às Administrações tributárias neste processo de
convergência da economia tradicional para a economia digital.

É esta rutura com a fisicalidade que permitirá quer a adaptação dos atuais
elementos de conexão à nova realidade económico-comercial quer a viabilidade futura
dos mesmos. Quaisquer soluções que dependam fortemente de um elemento físico, fruto
do crescente desenvolvimento das TIC, tornar-se-ão rapidamente obsoletas.

Com efeito, através de um processo transformativo transpõe-se o E.E. para a


economia digital, permitindo fundamentalmente, criar regras que facilitem a identificação
e imputação de um rendimento gerado através de produtos e serviços digitais a um
determinado território, pois oferece um enquadramento teórico capaz de estabelecer uma
ligação entre ambos.

Em face do exposto, consideramos ser este o caminho que nos levará das
incertezas para as certezas da tributação da economia digital.

É, porém, um tema inacabado. Procurou-se analisar uma proposta específica


conceptualizada pelo projeto BEPS, e, entretanto, concretizada pela Comissão Europeia,
para despoletar uma maior discussão pública. No futuro, seria interessante continuar este
trabalho em articulação com áreas mais técnicas do saber, por exemplo engenharia
informática, pois a componente técnica do tema é bastante relevante.

160
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