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3º Curso Virtual de Teologia do Corpo – 2010 ____________________________________________________ 1

Matrimônio: A Dimensão da Aliança e da Graça


Introdução 29. Ninguém jamais odiou sua própria
carne. Pelo contrário, alimenta-a e a cerca de
1. Logo após a reflexão sobre a ressurreição e o cuidado, como Cristo faz com a Igreja;
celibato, o Papa João Paulo II volta sua atenção 30. e nós somos membros do seu corpo!
para o matrimônio. Sobre este tema são trêss
ciclos de audiências, o primeiro chamado “A 31. “Por isso, o homem deixará seu pai e
Dimensão da Aliança e da Graça”; o segundo sua mãe e se unirá à sua mulher, e os dois
chamado “A Dimensão do Sinal”; e por fim o serão uma só carne”.
terceiro, chamado “A Lei da Vida como Herança”, 32. Este mistério é grande — eu digo isto
que se destina a comentar a encíclica Humanae com referência a Cristo e à Igreja.
Vitae, do Papa Paulo VI. 33. Em suma, cada um de vós também
ame a sua esposa como a si mesmo; e que a
2. Neste texto iremos tratar apenas da “Dimensão esposa tenha respeito pelo marido.
da Aliança e da Graça”. Aqui temos
representadas 16 catequeses proferidas pelo Papa
entre 28 de julho e 15 de dezembro de 1982.
3. Convém submetermos a análise aprofundada o
texto citado, contido neste capítulo quinto da
Epístola aos Efésios, assim como, anteriormente,
A Passagem-Chave (Efésios 5, 21-33) analisamos uma a uma as palavras de Cristo que
parecem ter um significado-chave para a teologia
21. Submetei-vos uns aos outros, no temor do corpo. Tratava-se das palavras em que Cristo
de Cristo. se refere ao "princípio" (Mt 19, 4; Mc 10, 6), ao
22. As mulheres sejam submissas aos "coração" humano, no Sermão da Montanha (Mt
maridos como ao Senhor. 5, 28), e à futura ressurreição (Mt 22,30; Mc 12,
23. Pois o marido é a cabeça da mulher, 25; Lc 20,35). Tudo o que está contido na
como Cristo também é a cabeça da Igreja, seu passagem da Epístola aos Efésios constitui quase
Corpo, do qual ele é o Salvador. a "coroação" daquelas outras sintéticas palavras-
24. Por outro lado, como a Igreja se chaves. Se delas brotou a teologia do corpo nas
submete a Cristo, que as mulheres também se suas linhas evangélicas, simples e ao mesmo
submetam, em tudo, a seus maridos. tempo fundamentais, é necessário, em certo
25. Maridos, amai as vossas mulheres, sentido, pressupor esta teologia ao interpretar a
como Cristo também amou a Igreja e se mencionada passagem da Epístola aos Efésios. E,
entregou por ela, por isso, se se quer interpretar esta passagem, é
26. a fim de santificar pela palavra aquela necessário fazê-lo à luz do que nos disse Cristo
que ele purifica pelo banho da água. sobre o corpo humano. (...) De fato, aquela
27. Pois ele quis apresentá-la a si mesmo passagem da Epístola aos Efésios não pode ser
toda bela, sem mancha nem ruga ou qualquer corretamente entendida, senão apenas no amplo
reparo, mas santa e sem defeito. contexto bíblico. (...) [Essa passagem] é um texto
28. É assim que os maridos devem amar bem conhecido pela liturgia, em que aparece
suas esposas, como amam seu próprio corpo. sempre em relação com o sacramento do
Aquele que ama sua esposa está amando a si matrimônio. (TdC 87)
mesmo.

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com o seu marido, que brota da essência mesma


4. O sacramento ou a sacramentalidade —no do matrimônio e da família. Tal relação, todavia,
sentido mais geral deste termo— tem uma não é submissão unilateral. O matrimônio,
interseção com o corpo e pressupõe a "teologia segundo a doutrina da Epístola aos Efésios, exclui
do corpo". O sacramento, com efeito, segundo esse elemento do pacto conjugal, um elemento
o significado geralmente conhecido, é um que pesava e, por vezes, não deixa de pesar ainda
"sinal visível". O "corpo" significa também o hoje sobre essa instituição. O marido e a mulher
que é visível, significa a "visibilidade" do são, de fato, "submissos um ao outro", estão
mundo e do homem. Portanto, de algum modo reciprocamente subordinados. A fonte desta
— embora do modo mais geral — o corpo recíproca submissão está na pietas (piedade)
entra na definição do sacramento, sendo ele cristã, e a sua expressão é o amor. (TdC 89)
"sinal visível de uma realidade invisível", isto
é, da realidade espiritual, transcendente e
divina. Neste sinal — e mediante este sinal —
Deus se dá ao homem na sua transcendente
verdade e no seu amor. O sacramento é sinal
da graça e é sinal eficaz. Não só a indica e
exprime de modo visível, na maneira de um
sinal, mas produz a graça, e contribui
eficazmente para fazer com que a graça se
torne parte do homem, e que nele se realize e
se complete a obra da salvação, a obra
preestabelecida por Deus desde a eternidade e
plenamente revelada em Jesus Cristo. (TdC
87)

Os esposos: 7. O Autor da epístola sublinha, de modo


“Submissos um ao outro, particular, este amor, dirigindo-se aos maridos.
no temor de Cristo” Escreve, de fato: "E vós, maridos, amai as vossas
mulheres...", e com este modo de se expressar tira
5. Iniciamos uma análise mais particularizada do qualquer temor que poderia suscitar (dada a
trecho da Epístola aos Efésios 5, 21-33. O Autor, sensibilidade contemporânea) a frase precedente:
dirigindo-se aos cônjuges, recomenda-lhes que "As mulheres sejam submissas aos maridos". O
sejam "submissos uns aos outros no temor de amor exclui todo o gênero de submissão, pelo
Cristo" (Ef 5,21). (TdC 89) qual a mulher se tornasse serva ou escrava do
marido, objeto de submissão unilateral. O amor
6. Essa expressão que abre o nosso trecho de Ef 5, faz com que ao mesmo tempo também o marido
21-23, do qual nos estamos a aproximar graças à seja submisso à mulher, e submisso nisto ao
análise do contexto remoto e imediato, tem Senhor mesmo, assim como a mulher ao marido.
eloqüência muito particular. O Autor fala da A comunidade ou unidade, que devem constituir
mútua submissão dos cônjuges, marido e mulher, por causa do matrimônio, realiza-se através de
e de tal modo faz também compreender como é uma recíproca doação, que é também submissão
necessário entender as palavras que escreverá em mútua. Cristo é fonte e, ao mesmo tempo, modelo
seguida sobre a submissão da mulher ao marido. daquela submissão que, sendo recíproca "no temor
Com efeito, lemos: "As mulheres sejam submissas de Cristo", confere à união conjugal um caráter
aos maridos como ao Senhor" (Ef 5, 22). profundo e amadurecido. Múltiplos fatores de
Exprimindo-se assim o Autor não pretende dizer natureza psicológica ou de costumes são, nesta
que o marido é "senhor" da mulher e que a aliança fonte e diante deste modelo, de tal maneira
interpessoal própria do matrimônio é um pacto de transformados que fazem brotar, diria, nova e
domínio do marido sobre a mulher. Exprime, pelo preciosa "fusão" dos comportamentos e das
contrário, outro conceito, qual seja, o de que é na relações bilaterais. (TdC 89)
sua relação com Cristo — que é para ambos os
cônjuges único Senhor — que a esposa pode e 8. Ainda que os cônjuges devam ser "submissos
deve encontrar a motivação para o relacionamento uns aos outros, como ao Senhor" (isto foi posto

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em evidência já no primeiro versículo do texto Igreja, Sua Esposa. (...) Como se pode ver, essa
citado), todavia, no que se segue, o marido é analogia opera em duas direções. (TdC 90)
acima de tudo aquele que ama, e a mulher, em
contraste, é aquela que é amada. Poder-se-ia 11. Devemos tomar consciência de que no âmbito
mesmo levantar a idéia de que a "submissão" da fundamental analogia paulina — Cristo e a
da mulher ao marido, entendida no contexto do Igreja, por um lado, o homem e a mulher como
trecho completo da Epístola aos Efésios, cônjuges, pelo outro — há também uma analogia
significa acima de tudo "experimentar o suplementar: isto é, a analogia da Cabeça e do
amor". Tanto mais que esta "submissão" se refere Corpo. (...) Esta analogia suplementar "cabeça-
à imagem da submissão da Igreja a Cristo, a qual corpo" mostra que, no âmbito da passagem inteira
certamente consiste em experimentar o Seu amor. da Epístola aos Efésios 5, 21-33, estamos lidando
(TdC 92) com dois sujeitos distintos, os quais em virtude
duma particular relação recíproca, se tornam em
certo sentido um só sujeito: a cabeça constitui,
A Analogia Esponsal juntamente com o corpo, um só sujeito (no sentido
físico e metafísico), um só organismo, uma só
9. Na Epístola aos Efésios, somos testemunhas, pessoa humana, um só ser. (...) Esta analogia,
diria, de um particular encontro daquele mistério todavia, não ofusca a individualidade dos sujeitos.
[escondido em Deus desde a eternidade em Deus] (TdC 91)
com a essência mesma da vocação para o
matrimônio. Como se deve entender este
encontro? No texto da Epístola aos Efésios, ele Analogia Esponsal: Mistério e Dom
apresenta-se, primeiro que tudo, como uma grande
analogia. Lemos nele: "As mulheres sejam 12. Que função realiza esta analogia [esponsal]
submissas aos maridos como ao Senhor...". Este é quanto ao mistério revelado na Antiga e na Nova
o primeiro componente da analogia. "O marido é a Aliança? A esta pergunta é necessário responder
cabeça da mulher, como também Cristo é a cabeça pouco a pouco. Primeiramente, a analogia do
da Igreja...". Este é o segundo componente, que amor conjugal ou esponsal ajuda a penetrar na
clarifica o primeiro e mostra sua causa. "E como a essência mesma do mistério. Ajuda a
Igreja está sujeita a Cristo, assim também as compreendê-lo até certo ponto, através de uma
mulheres estejam sujeitas aos seus maridos...". A analogia, é claro. É óbvio que a analogia do amor
relação de Cristo com a Igreja, apresentada terrestre, humano, do marido para com a mulher,
anteriormente, é agora expressa como relação da do amor humano esponsal, não pode oferecer
Igreja com Cristo, e o próximo componente da compreensão adequada e completa daquela
analogia está contido aqui. Finalmente: "Maridos, realidade absolutamente transcendente, que é o
amai as vossas mulheres, como também Cristo mistério divino, tanto no ocultar-se de há séculos
amou a Igreja e por ela Se entregou...". Este é o em Deus, como na sua realização "histórica" no
componente final da analogia. O seguimento do tempo, quando "Cristo amou a Igreja e Se deu a si
texto da epístola desenvolve o pensamento mesmo por ela" (Ef 5, 25). O mistério permanece
intrínseco contido na passagem agora mesmo transcendente com respeito a essa analogia,
citada; e o texto completo da Epístola aos Efésios assim como com relação a qualquer outra analogia
no cap. 5 (vv. 21-23) está inteiramente dominado com que procuremos expressá-lo em linguagem
pela mesma analogia; isto é: a relação recíproca humana. Ao mesmo tempo, entretanto, essa
entre os cônjuges, marido e mulher, é analogia oferece a possibilidade de uma certa
entendida pelos cristãos à imagem da relação "penetração"cognitiva na própria essência do
entre Cristo e a Igreja. (TdC 89) mistério. (TdC 95b)

10. A relação esponsal que une os cônjuges, 13. A analogia do amor esponsal contém em si
marido e mulher deve —segundo o Autor da uma característica do mistério, que não é
Epístola aos Efésios— ajudar-nos a compreender diretamente posta em relevo nem pela analogia do
o amor que une Cristo com a Igreja. (...) A amor misericordioso nem pela analogia do amor
analogia usada na Epístola aos Efésios, paterno (ou de qualquer outra analogia usada na
esclarecendo o mistério da relação entre Cristo e a Bíblia, a que poderíamos ter-nos referido). A
Igreja, ao mesmo tempo, revela a verdade analogia do amor dos esposos (do amor esponsal)
essencial sobre o matrimônio: isto é, que o parece pôr em relevo acima de tudo o aspecto do
matrimônio corresponde à vocação dos cristãos só dom de si mesmo por parte de Deus ao homem.
quando reflete o amor que o Cristo-Esposo dá à (...) Este dom é certamente "radical" e por isso

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"total" [e irrevogável]. Não se pode falar aqui em expressão do amor esponsal, no sentido de que
"totalidade" no sentido metafísico. O homem, com prepara a Esposa (Igreja) para o Esposo, faz a
efeito, como criatura não é capaz de "receber" o Igreja Esposa de Cristo. (TdC 91)
dom de Deus na plenitude transcendental da sua
divindade. Tal "dom total" (um dom não criado)
só é compartilhado pelo próprio Deus na Aquele que ama sua esposa
"trinitária comunhão das Pessoas". Por contraste, está amando a si mesmo
o dom de si mesmo por parte de Deus ao homem,
de que fala a analogia do amor esponsal, pode 15. "Aquele que ama sua esposa está amando a si
somente tera forma da participação na natureza mesmo" (Ef 5, 28). Esta frase confirma ainda mais
divina (ver 2 Ped 1, 4), como foi esclarecido com aquele caráter de unidade. Em certo sentido, o
grande precisão pela teologia. Apesar disto, amor fez do "eu" alheio o próprio "eu": o "eu" da
segundo tal medida, o dom feito ao homem por mulher, diria, torna-se por amor o "eu" do marido.
parte de Deus em Cristo é um dom "total", ou O corpo é a expressão daquele "eu" e o
seja, "radical", como indica precisamente a fundamento da sua identidade. A união do marido
analogia do amor esponsal: é, em certo sentido, e da mulher no amor exprime-se também através
"tudo" o que Deus "pôde" dar de si mesmo ao do corpo. (...) O amor não só une os dois sujeitos,
homem, consideradas as faculdades limitadas do mas permite-lhes interpenetrar um ao outro,
homem enquanto criatura. (TdC 95b) pertencendo espiritualmente um ao outro, a ponto
de o Autor da Epístola poder afirmar: "Aquele que
ama sua esposa está amando a si mesmo" (Ef 5,
28). O "eu" torna-se, em certo sentido, o "tu", e o
"tu" se torna o "eu" (no sentido moral, é claro).
(TdC 92)

16. A comparação com a Igreja como Corpo de


Cristo, Corpo do seu amor ao mesmo tempo
redentor e esponsal, deve deixar na consciência
dos destinatários da Epístola aos Efésios 5, 22-33
um sentido profundo do "sacrum" do corpo
humano em geral, e especialmente do matrimônio
enquanto "lugar" no qual esse sentido do "sacrum"
determina de modo particularmente profundo as
relações recíprocas das pessoas, e, acima de tudo,
as do homem com a mulher, enquanto mulher e
mãe dos seus filhos. (TdC 92)

17. Tomando em consideração a passagem da


Epístola aos Efésios aqui analisada, e em
Batismo como entrada no amor esponsal particular as palavras "Este mistério é grande; eu
digo isto com referência a Cristo e à Igreja", é
14. O amor de Cristo para com a Igreja tem necessário verificar que o Autor da epístola
essencialmente, como finalidade, a sua escreve não só referindo-se ao grande mistério
santificação: "Cristo amou a Igreja e deu-se a Si oculto em Deus, mas também, e acima de tudo, ao
mesmo... para a tornar santa" (Ef 5, 25-26). No mistério que se torna realidade pelo fato de que
princípio desta santificação está o batismo, Cristo — o qual com ato de amor redentor amou a
primeiro e essencial fruto da doação de si, que fez Igreja e Se deu a si mesmo por ela — com o
Cristo pela Igreja. Neste texto, o batismo não é mesmo ato se uniu com a Igreja de modo
chamado com o próprio nome, mas definido como esponsal, assim como se unem reciprocamente o
“purificação pelo banho da água”. (...) O amor marido e a mulher no matrimônio instituído pelo
esponsal de Cristo refere-se a ela, à Igreja, toda Criador. (TdC 93)
vez que uma pessoa singular recebe nela mesma a
purificação fundamental por meio do batismo.
Quem recebe o batismo, em virtude do amor Sacramento e Mistério na Aliança
redentor de Cristo, torna-se, ao mesmo tempo,
participante do seu amor esponsal para com a 17. Devemos fazer a pergunta se neste ponto tal
Igreja. "O banho da água" é, no nosso texto, a analogia não nos permite penetrar mais

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profundamente e com maior precisão no conteúdo o Autor da mesma Epístola não hesita em chamar
essencial do mistério. Devemos fazer-nos tal de "grande mistério". Não podemos, porventura,
pergunta, tanto mais que aquela "clássica" deduzir que o matrimônio permaneceu como
passagem da Epístola aos Efésios 5, 22-33 não plataforma da realização dos eternos desígnios de
surge em abstrato e isolada, mas constitui uma Deus? (...) A análise da Epístola aos Efésios, e em
continuidade, em certo sentido um seguimento dos particular do "clássico" texto do capítulo 5,
enunciados do Antigo Testamento, que versículos 22-33, parece nos levar a tal conclusão.
apresentavam o amor de Deus-Javé para com o (TdC 97)
povo-Israel. (...)Assim, pois, a analogia do esposo
e da esposa, que permitiu ao Autor da Epístola
aos Efésios definir a relação de Cristo com a
Igreja, possui rica tradição nos livros da Antiga
Aliança. (TdC 95)

18. Pois teu marido é o teu criador, SENHOR dos


exércitos é o seu nome! Quem te resgata é o Santo
de Israel! Ele será chamado o Deus de toda a
terra! Mulher abandonada e aflita, o SENHOR te
chama. Esposa da juventude um dia abandonada,
contigo fala o teu Deus. Por um breve instante eu
te abandonei, com imenso amor de novo te
recolho. (Isaías 54, 5-7) - Na Epístola aos Efésios
a perspectiva teológica do texto profético
conserva-se e, ao mesmo tempo, entram novos
momentos revelados: o momento trinitário,
cristológico e, por fim, escatológico. (TdC 95) 21. Com base no amor esponsal de Cristo pela
Igreja, o sacramento da redenção — fruto do amor
redentor de Cristo — torna-se uma dimensão
Matrimônio como sacramento primordial permanente da própria vida da Igreja, dimensão
fundamental e vivificante. (...) Deste modo, a
19. O homem aparece no mundo visível como a Igreja vive do Sacramento da Redenção, e por sua
mais alta expressão do dom divino, pois inclui em vez completa este sacramento. (...) Podemos
si a dimensão interior do dom. E com esta traz ao acrescentar que a Igreja, unida a Cristo, como a
mundo a sua particular semelhança com Deus, mulher ao próprio marido, extrai do sacramento
graças à qual ele transcende e domina também a da redenção toda a sua fecundidade e maternidade
sua "visibilidade" no mundo, a sua corporeidade, a espiritual. (TdC 97)
sua masculinidade ou feminilidade, e a sua nudez.
(...) Assim, nesta dimensão, constitui-se um 22. A sacramentalidade do matrimônio não é
sacramento primordial, entendido como sinal que apenas modelo e figura do sacramento da Igreja
transmite eficazmente ao mundo visível o mundo (de Cristo e da Igreja), mas constitui também uma
invisível oculto em Deus desde a eternidade. (...) parte essencial da nova herança: a do sacramento
O sacramento, como sinal visível, constitui-se da redenção, com o qual a Igreja é enriquecida em
com o homem, enquanto "corpo", mediante a sua Cristo. (TdC 98)
"visível" masculinidade e feminilidade. O corpo,
de fato, e só ele, é capaz de tornar visível o que é 23. O matrimônio como sacramento primordial
invisível: o espiritual e o divino. Foi criado para constitui a figura (e, por conseguinte: a
transferir para a realidade visível do mundo o semelhança, a analogia), segundo a qual é
mistério oculto desde a eternidade em Deus, e construída a estrutura básica fundamental da nova
assim ser sinal d'Ele. (TdC 19) economia da salvação e da ordem sacramental,
que tem origem na graça esponsal que a Igreja
recebe de Cristo, juntamente com todos os bens da
Matrimônio e Redenção Redenção. (...) Refletindo bem sobre esta
dimensão, seria necessário concluir que todos os
20. Também no estado da pecaminosidade Sacramentos da Nova Aliança, em certo
hereditária do homem, o matrimônio nunca sentido, encontram seu protótipo, de certo
deixou de ser a figura do sacramento, sobre o modo, no matrimônio como o sacramento
qual lemos na Epístola aos Efésios 5, 22-33 e que

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primordial. Isto parece sobressair na clássica para a concupiscência). (...) O matrimônio é


passagem citada da Epístola aos Efésios. (TdC 98) lugar de encontro do eros com o ethos e de sua
recíproca interpenetração no "coração" do homem
24. “Pode-se dizer que o sinal visível do e da mulher, como também em todas as relações
matrimônio „desde o princípio‟, na medida em que recíprocas. (TdC 101)
está ligado ao sinal visível de Cristo e sua Igreja
na economia da salvação, transpõe o plano eterno 29. Aqueles que, como cônjuges, segundo o
de amor para a dimensão „histórica‟, e a torna o eterno desígnio divino se unem a ponto de se
fundamento de toda a ordem sacramental.” (TdC tornarem, em certo sentido, "uma só carne", são
95b) também por sua vez chamados, mediante o
sacramento, a uma vida "segundo o Espírito", de
modo que tal vida corresponda ao "dom" recebido
O Matrimônio e a Redenção do Corpo no sacramento. Em virtude desse "dom", ao
conduzirem como cônjuges uma vida "segundo o
25. Cristo, que no Sermão da Montanha dá sua Espírito", eles são capazes de descobrir o
própria interpretação do mandamento "Não particular dom gratuito de que se tornaram
cometerás adultério" — uma interpretação participantes. Enquanto a "concupiscência" ofusca
constitutiva do novo ethos —, com as mesmas o horizonte da perspectiva interior e priva os
palavras lapidares confia como tarefa a cada corações da lúcida claridade dos desejos e das
homem a dignidade de cada mulher; e, ao aspirações, por sua vez a vida "segundo o
mesmo tempo, (embora do texto isto resulte só de Espírito" (ou seja, a graça do sacramento do
modo indireto) confia também a cada mulher a matrimônio) permite que homem e mulher
dignidade de cada homem. Confia, por fim, a encontrem a verdadeira liberdade do dom, junto
cada um —quer ao homem, quer à mulher— a com a consciência do sentido esponsal do corpo
própria dignidade: em certo sentido, o "sacrum" em sua masculinidade e feminilidade. (TdC 101)
da pessoa, especificamente no que diz respeito à
sua feminilidade ou masculinidade, no que diz 30. Portanto, a vida "segundo o Espírito" se
respeito ao "corpo". (TdC 100) expressa também na recíproca “união” ou
“conhecimento” através da qual os cônjuges,
26. O homem "histórico", depois do pecado e em quando se tornam "uma só carne", submetem
conseqüência da sua pecaminosidade hereditária, a sua feminilidade e masculinidade à bênção da
deve encontrar de novo a dignidade e santidade da procriação. (...) Aqui também a vida "segundo o
união conjugal "no corpo", com base no mistério Espírito"se expressa na consciência do dom
da Redenção. (TdC 100) gratuito, que corresponde à dignidade dos
próprios cônjuges na qualidade de pais, isto é, se
27. Enquanto sacramento nascido do mistério da expressa na profunda consciência da santidade da
Redenção e renascido, em certo sentido, do amor vida (sacrum) a que ambos dão origem,
esponsal de Cristo e da Igreja, o matrimônio é participando —como progenitores— das forças do
uma eficaz expressão do poder salvífico de mistério da criação. (TdC 101)
Deus, que realiza o seu plano eterno mesmo
depois do pecado e apesar da tríplice 31. O matrimônio, como sacramento, constitui a
concupiscência escondida no coração de cada base da esperança para a pessoa, ou seja, para o
homem, varão e mulher. Como expressão homem e para a mulher, para os pais e os filhos,
sacramental desse poder salvífico, o matrimônio para as gerações humanas. (...) A origem do
é também uma exortação a dominar a homem no mundo está ligada ao matrimônio
concupiscência (como diz Cristo no Sermão da enquanto sacramento, e seu futuro também está
Montanha). Um fruto deste domínio é a unidade e inscrito no matrimônio, e isto não só nas
indissolubilidade do matrimônio, e, além disso, o dimensões históricas, mas também nas dimensões
aprofundado sentido da dignidade da mulher no escatológicas. (TdC 101)
coração do homem (como também da dignidade
do homem no coração da mulher), quer na 32. Nesse sentido, o matrimônio enquanto
convivência conjugal, quer em todos os outros sacramento também traz em si o germe do futuro
âmbitos das relações recíprocas. (TdC 101) escatológico do homem, ou seja, a perspectiva da
"redenção do corpo" na dimensão da esperança
28. Com base nesses enunciados paulinos formou- escatológica, a que correspondem as palavras de
se a opinião de que o matrimônio constitui um Cristo sobre a ressurreição: "na ressurreição...
específico remedium concupiscentiae (remédio nem os homens terão mulheres, nem as mulheres

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maridos" (Mt 22, 30); além disso, aqueles que, masculinidade ou feminilidade —, profundamente
"sendo filhos da ressurreição... são semelhantes inscrito na estrutura essencial da pessoa humana,
aos anjos e... são filhos de Deus" (Lc 20, 36), foi aberto por parte de Cristo, de um modo novo e
devem sua origem no mundo temporal visível ao com o exemplo da sua vida, à esperança unida à
matrimônio e à procriação do homem e da mulher. redenção do corpo. Assim, portanto, a graça do
Como sacramento do "princípio" humano, e como mistério da Redenção frutifica também —
sacramento da temporalidade do homem frutifica de modo particular — com a vocação
histórico, o matrimônio realiza assim um serviço para a continência "por amor do Reino dos Céus".
insubstituível com relação ao seu futuro extra- (TdC 102)
temporal, com relação ao mistério da "redenção
do corpo" na dimensão da esperança escatológica.
(TdC 101) ________________________________________

Perguntas para estudo


Conclusão
1. Em que sentido a esposa é um símbolo da Igreja e o
33. O Autor da Epístola aos Efésios, dirigindo-se marido um símbolo de Cristo?
diretamente aos cônjuges, exorta-os a modelar a
sua relação recíproca segundo o modelo da união 2. As pessoas na atualidade tendem a reagir
negativamente aos versículos em Efésios 5 que falam
esponsal de Cristo e da Igreja. Pode-se dizer que
sobre a esposa ser “submissa”. Como o Papa explica
— pressupondo a sacramentalidade do esta “submissão” esponsal, na Teologia do Corpo?
matrimônio no seu significado primordial — que Isso muda sua percepção anterior?
ele lhes prescreve que aprendam este sacramento
de forma renovada, a partir da união esponsal de 3. Porque o matrimônio funciona como um modelo ou
Cristo e da Igreja. (TdC 102) protótipo para todos os sacramentos da Nova Aliança?

34. Mediante o matrimônio como sacramento 4. Por que a Igreja ensina que apenas os homens
(como um dos sacramentos da Igreja) ambas as podem ser ordenados sacerdotes?
dimensões do amor, a esponsal e a redentora,
5. Na reflexão anterior, sobre a ressurreição, o Papa
juntamente com a graça do sacramento, penetram
afirma que “o matrimônio e a procriação (...) perdem
na vida dos cônjuges. (...) E se o "grande mistério" sua razão de ser” no futuro céu (TdC 66). Com base
da união de Cristo com a Igreja nos obriga a no que foi visto agora sobre a redenção do corpo e a
relacionar o significado esponsal do corpo com o sacramentalidade do matrimônio, qual a “razão de
seu significado redentor, em tal relação os ser” do matrimônio hoje, no período “histórico”?
cônjuges encontram a resposta à pergunta sobre o
sentido se "ser um corpo", e não só eles 6. Com o que foi visto neste texto, muda a sua maneira
encontram essa resposta, embora se dirija de ver o matrimônio? Em quê?
sobretudo a eles este texto da Epístola do
(Sugere-se enviar as respostas para daniel@teologiadocorpo.com.br)
Apóstolo. (TdC 102) ____________________________________________

35. A imagem paulina do "grande mistério" de © Texto elaborado pela equipe Teologia do Corpo - Brasil
Cristo e da Igreja fala indiretamente também da exclusivamente para fins didáticos, contendo trechos das
"continência por amor do Reino dos Céus", em catequeses do Papa. As citações das catequeses TdC seguem
a numeração de Michael Waldstein (ver quadro de referência
que ambas as dimensões do amor, esponsal e em separado) As citações bíblicas são da tradução da CNBB.
redentora, se unem reciprocamente num modo
diverso do matrimonial, de acordo com diferentes
proporções. Não é, porventura, aquele amor
esponsal, com o qual Cristo "amou a Igreja" —
sua esposa —, "e por ela Se entregou" igualmente
a mais plena encarnação do ideal da "continência
por amor do Reino dos Céus"? Não encontram
apoio precisamente nela todos aqueles — homens
e mulheres — que, escolhendo o mesmo ideal,
desejam ligar a dimensão esponsal do amor com a
dimensão redentora, segundo o modelo de Cristo
mesmo? Eles desejam confirmar com a sua vida
que o significado esponsal do corpo — da sua

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