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Universidade de São Paulo - USP

Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto


Programa de Pós-graduação em Imunologia Básica e Aplicada

Reações de
Hipersensibilidade II, III e IV

Dra. Daniela Carlos Sartori

Março 2019
Ribeirão Preto
Histórico e conceitos

Hipersensibilidade Originou-se da definição clínica de


imunidade como “sensibilidade”.

1) Reação inapropriada contra antígenos inócuos


(Alergias-Hipersensibilidade I)
Patológicas 2) Reação excessiva contra patógenos, drogas
ou proteínas estranhas (Hipersensibilidade II, III e IV)
3) Reação descontrolada a antígenos próprios
(Autoimunidade)

São desencadeadas e mantidas contra antígenos que é


difícil ou impossível de ser eliminado (tendência a ser
crônica e persistente
Tipos de alergenos

-Proteínas estranhas (Ig):


soro heterólogos (soro anti-
veneno de cobra,
aracnídeos, anti-rábico) e
anticorpos monoclonais

- Drogas (Hapteno-
carreador): substâncias
químicas, fármacos ou
metais (baixo peso
molecular);

-Patógenos persistentes :
bactérias intracelulares (Ex.
M. tuberculosis)
Figura 10.1 O sistema imune (Peter Parthan, 2001 )
Tipos de Reações de Hipersensibilidade
Foram denominadas por Gell e Coombs, em 1963, hipersensibilidades do
tipo I, II, III, IV.

IgM e IgG IgG: Macrófagos e linfócitos


IgE
Ag de superfície Ag solúveis T CD4 e CD8
(Imunocomplexos)
Reações de Hipersensibilidade do tipo II

Abul K. Abbas e Andrew H. Lichtman. Imunologia Celular e Molecular, 2000

A reacção sucede 5-8 horas após a entrada de antigénios


solúveis no organismo
Hipersensibilidade do tipo II

1. Tempo da Hipersensibilidade: 5-8 horas

2. Alvos:
- Antígenos na superfície celular (hemácias)

3. Mecanismo efetor (morte celular):


- IgG: opsonização e fagocitose
- IgM: ativação do sistema complemento

3. Patologias (autoimune ou aloimune):


- Anemia hemolítica autoimune/de fármaco (penicilina)
- Hemólises de transfusões de sangue grupo-incompatível
- Anemia hemolítica de recém nascidos (incompatibilidade Rh)
Modificação pela penicilina (hapteno)
Fase de sensibilização e efetora

Sensibilização
Efetora

Th1
Mecanismo de dano celular

(CR1)

Opsonização e Fagocitose: de células opsonizadas por Ac (IgG) ou proteínas (C3b) do


sistema Complemento
Destruição das hemácias: captação e destruição por macrófagos do baço ou fígado
(FcγR ou CR1) – hemólise extravascular
Mecanismo de dano celular

- Lise das hemácias autólogas

2) Manifestações clínicas:
Anemia, icterícia e
em alguns casos esplenomegalia

3) Tratamento: Suplementação
com ácido fólico e o uso de
drogas citotóxicas (ciclosfosfamida,
azatioprina) ou da droga rituximab
(anticorpo monoclonal anti-CD20).

Ativação do sistema complemento: culminando com a formação do MAC

Destruição das hemácias na circulação: hemólise intravascular


Estruturas dos antígenos

Glu: glicose

Gal: galactose

GalNac: N-acetil
Galactosamina

Fuc: fucose
Transfusões de sangue

1) Incompatibilidade de grupo ABO:


- Lise das hemácias recebidas
(hemólise imediata)

2) Manifestações clínicas:
Hemoglobinúria, febre, naúsea e
coagulação intravascular

3) Tratamento: Suspensão imediata


da transfusão e manutenção do
fluxo urinário (diurético).
Hemólise extra e intravascular

Haptoglobina

Fígado
Doença hemolítica do recém-nascido

A Eritroblastose Fetal ocorre se uma mãe Rh-


tiver sido exposta a hemácias Rh+ do 1° feto
(sensibilização) e o 2° feto for RH+ (desafio)
Doença hemolítica do recém-nascido

1) Incompatibilidade do fator Rh: reação de uma mãe Rh- com


repetidas gravidez com feto Rh+:

1. Após o primeiro parto, algumas hemácias Rh+ do feto passam


na circulação materna -- começa a produção de Ig anti Rh
2. A mãe tem agora uma resposta anti-Rh
3. Numa seguinte gravidez com feto Rh+, as Ig-anti Rh da mãe
passam a placenta e atacam as hemacias fetais- anemia
hemolítica neonatal.

2) Manifestações clínicas: anemia moderada a severa, edema


extensivo (hidropisia) ou dano cerebral (bilirrubina é altamente
tóxica) e aumento de eritoblastos (precursores das hemácias)

3) Imunoterapia preventiva: Anticorpos (RHOGAM) contra


antígenos Rh na 28ª semana e 72hs antes do primeiro parto
Feto com DHRN
Reações de Hipersensibilidade do tipo III

A reacção sucede 2-8 horas após a entrada de antigénios


solúveis no organismo
Imunocomplexos ou Depósitos de agregados
complexos imunes antígeno: anticorpo
Hipersensibilidade do tipo III

1. Tempo da Hipersensibilidade: 2-8 horas

2. Alvos:
- Antígenos solúveis (vacinas, soro heterólogo e anticorpos monoclonais)

3. Mecanismo efetor (inflamação):


- IgG e IgM: formação de imunocomplexos
- Ativação do sistema complemento
- Desgranulação de mastócitos (C5a) e neutrófilos (FcγRI)

4. Patologias:
- Reação de Arthus (localizada)
- Doença do soro (sistêmica)
Formação de complexos-imunes

Agregados IC maiores:
Fixam o complemento
e são facilmente removidos
pelo sistema fagocítico
mononuclear

Agregados IC menores:
Tendem a depositar-se
nas paredes dos vasos
sanguíneos

Figura 10.28 O sistema imune (Peter Parthan, 2001 )


Remoção dos IC por eritrócitos

Os imunocomplexos ligam-se ao CR1 dos eritrócitos e são transportados para o fígado e


baço onde são fagocitados pelas células do macrófagos
Reação de Arthus (localizada)
1) Induzida localmente por anticorpos contra o antígeno
solúvel:
- Drogas (heparina), vacinas produzidas em cavalos (toxóide tetânico ou
diftérico) ou mesmo picadas de insetos;
- Resposta inflamatória cutânea (derme), com acúmulo de fluido (edema)
e células inflamatórias (neutrófilos)

1ª injeção: sem reação

soro equino i.d.

2ª injeção: lesão local

Inflamação local que


progredia para lesão cutânea
Reação de Arthus (localizada)

Difusão de IgG Formação Ativação de Formação de edema


na pele (derme) do IC* MC via C5a e eritema

1) *Ativação do SC: geração de C5a e C3a (anafilatoxinas)


2) Ligação ao C5aR: liberação de histamina
Vasodilatação e aumento do fluxo de sangue: eritema (vermelhidão)
Retração das células endoteliais: extravasamento de líquido (edema)
3) Influxo de células inflamatórias (neutrófilos): endurecimento da pele
Reação de Arthus (localizada)
Patologias

2) Manifestações clínicas:

1) Localizada (reação de Arthus):

-Pele: formação de IC localizada


na região perivascular
(vacina, picada de inseto).

2) Sistêmica (doença do soro)

- Vasculite

- Glomerulonefrite

- Artrite
Doença do soro

1) Induzida sistemicamente por IgG e formação de IC circulantes:

- Administração de soroterapia heteróloga contendo anticorpos anti-tetânico ou anti-


diftérico) produzidos em cavalos
- Utilização de anti-toxinas (veneno de cobra)
- Anticorpos monoclonais de camundongos (reação chamada de resposta de anticorpo
humano anti-camundongo ou HAMA).

2) Manifestações clínicas:
- Aparecimento após 7-10 dias e incluem febre, fraqueza, vasculite generalizada com
edema e eritema (exantema), glomerulonefrite e artrite.

3) Tratamento preventivo: Antes do tratamento com soro, o paciente recebe polaramine ou


fenergan, cimetidina e hidrocortisona
Inflamação e lesão tecidual

-Os PMNs atraídos tentam fagocitar -Grânulos citotóxicos: com -Espécies reativas de oxigênio:
os IC via FcγRI, e a fagocitose enzimas proteolíticas:
altamente tóxicos que promovem
mal-sucedida acabam liberando os colagenase, elastase, MMP
morte celular
grânulos citotóxicos. (degradação da matriz
(necrose tecidual)
extracelular)
Hemorragia e necrose

1) Lesão endotelial: acarreta a


exposição da matriz extracelular

2) Adesão e ativação plaquetária:


liberação de grânulos de tromboxano
(TXA2) e recrutamento de plaquetas
(agregação plaquetária)

3) Exposição do fator tecidual: geração


de trombina, cliva o fibrinogênio
circulante em fibrina insolúvel,
criando uma rede de fibrina

4) Formação de trombos: rompimento


dos vasos, hemorragia e necrose
Doença do soro (sistêmica)

Doença do soro

Administração
intravenosa de grandes
quantidades de
antígenos estranhos
(Soro antiofídico)

Exantema urticariforme Hemorragia na pele


Fatores hemodinâmicos

(1) Filtração e pressão sanguínea elevadas influenciam a


deposição de imunocomplexos, como no glomérulo
renal. (2) Turbulência em curvas ou bifurcações
também favorecem deposição de imunocomplexos
Glomerulonefrite

Glomerulonefrite
de IC circulantes

Deposição no
interior dos capilares
dos glomérulos

Camada subendotelial
(formação de agregados)
Reações de Hipersensibilidade do tipo IV
ou Reação de Hipersensibilidade Tardia
Hipersensibilidade do tipo IV

1. Tempo da Hipersensibilidade: 24-48 horas

1. Alvos (antígenos):

- Substâncias químicas acopladas a proteínas (níquel, couro e veneno de plantas)


- Proteínas microbianas (proteínas de micobactéria ou PPD)

3. Mecanismo efetor (inflamação):


- Ativação do macrófagos e linfócitos (citocinas)

4. Patologias:
- Tuberculose
- Dermatite de contato
Exemplos de DTH

Existem três tipos de hipersensibilidade celular distintos de acordo


com a histologia e apresentação clínica

 Reação de contato: substâncias químicas como níquel, formaldeído,


veneno de carvalho e veneno de hera.

 Reação Tuberculínica: desencadeada por componentes micobacterianos.

 Reação granulomatosa: causada por infecções bacterianas e helmínticas


crônicas (M. tuberculosis; S. mansoni).
Patologias
Reação tuberculínica
1) Robert Koch: observou que indivíduos infectados com M. Tuberculosis desenvolveram
uma resposta inflamatória após injeção de PPD.

2) Manifestação clínica: Reação de tuberculina ou teste de Mantoux caracterizada clinicamente


por tumefação do tecido (endurecimento) pelo acúmulo de células T e monócitos e eritema da
pele.

3) PPD: purificado proteico de cultura de M. tuberculosis

Interpretação
• 0 – 4 mm = Não reator: Indivíduo não
infectado pelo M. tuberculosis ou com
hipersensibilidade reduzida.
•5 – 9 mm = Reator fraco: Indivíduo
vacinado com BCG ou infectado por M.
tuberculosis ou outras micobactérias.

48hs •≥ 10 mm = Reator forte: indivíduo


infectado pelo M. tuberculosis, (doente
ou não) e indivíduos vacinados com
PPD- (“purified protein BCG nos últimos dois anos.
derivative” de M. tuberculosis)
Fase de sensibilização e efetora

Fase de sensibilização: Fase de Efetora (reação):


1 a 2 semanas 24 a 72 horas

CD4

MHC II
CD8

Indução da Resposta Imune com padrão Th1 para patógeno Intracelular


(ex. M. tuberculosis) = Resposta de Hipersensibilidade Tardia - DTH
Fase de Reação
0 hora 4 horas 12 horas 48 horas

epiderme

derme
Macrófagos
Ag do Patógeno
Expressão de MHC II

Inflamação
Neutrófilos
Células T
TNF

capilar

Monócitos
E-selectinas
Transmissão da TB (M. tuberculosis)
Tuberculose
Mecanismos de evasão

1) Bloqueio da fusão fagossomo-lisossoma


(favorece a proteção aos mecanismos microbicidas e multiplicação)

1) Diminuição da acidificação do fagolisossomo


(impede a ativação de enzimas proteolíticas que atuam em pH ácido)
Fase de sensibilização

1) Mecanismo de ação
do IFN-γ:
- Estimular a maturação
do fagolisossoma
- Expressão da óxido nítrico
sintetase (iNOS)
- Expressão de enzimas
proteolíticas (catepsina G)
Mecanismo de ação das citocinas

1) IL-3/GM-CSF:
Produção de monócitos
na medula óssea

2) TNF-a: ativação de
células endoteliais
(moléculas de adesão:
E-selectina e ICAM-1 e
VCAM-1)

3) MCP-1/CCL2: proteína
quimiotática de monócito
Migração de monócitos
Doença granulomatosa
Latência e Reativação

Infecção primária: Latência Infecção secundária: Reativação


Granuloma Pulmonar

Organização típica de um Destruição do parênquima por


granuloma Necrose Caseosa

Resistência Suscetibilidade
Lesão tecidual via CD4 Th1

Mecanismos de ação:

1) TNF-α: necrose
tecidual

2) IFN-g: produção
de enzimas proteolíticas
e ROS e NO (tóxicos)
por macrófagos
Lesão tecidual via linfócitos CD8

Mecanismos de ação:

1) Fas/FaL: apoptose
celular

2) Granzimas e perforinas:
apoptose celular
Fibrose pulmonar

1) DTH crônica: Permanência do estímulo antigênico ou impossibilidade de destruição


do Ag por macrófagos e linfócitos. É mediada pela produção excessiva de citocinas.

2) Manifestação clínica: inflamação crônica (lesão tecidual) seguido pela reposição com
tecido conjuntivo (fibrose).

TGF-β
Dermatite de contato (sensibilização)

IL-12:
Diferenciação Th1
Agentes Sensibilizantes

Alguns Indutores de Dermatite de Contato


Alérgeno Produto
Níquel Jóias, moedas
Benzocaína Anestésicos
Látex Luvas
Mistura de Borracha preta Luvas
Corantes Tintura para Cabelo
Dicromato de Potássio Couro
Timerosal Fragrâncias, Pasta de dente
Substâncias Fotossensíveis Sumo Frutas
Pentadecacatecol Hera, Carvalho
Dermatite de contato (reação)

Inflamação da pele
Proliferação dos queratinócitos
Hiperplasia da epiderme

IFNγ TH1 CD8

Sintomas Clínicos  ECZEMA, ENDURAMENTO


Dermatite de contato
Reação de contato
Caracterizada clinicamente por eczema (dermatite) no local de contato com alérgeno

Hipersensibilidade ao Níquel
Dermatite de contato por
hera venenosa
Reação ao couro
Dermatite de contato
Referências Recomendadas

 Imunologia Celular e Molecular. Abul K. Abbas e Andrew H. Lichtman.


8ª Edição, 2005

 O sistema Imune. Peter Parham. 3ª Edição, 2001

 Imunobiologia – o sistema imune na saúde e na doença. Charles A. Janeway, Jr,


Paul Travers, Mark Walport e Mark J. Shlomchik. 8ª Edição, 2007

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