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PROSA ~

Boaventura Cardoso
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DIZANGA
DIA MUENHU
4? edição

© Boaventura Cardoso / União dos Escritores Angolanos, 1988


MEU TO UE!
Kaprikitu mãe dele munhungava no Marçal. Pula que
precisava alimentar prazer, se deu encontro com Maria
do beco. No escuro da noite se gostaram, Kaprikitu lhe
embarrigaram. Mulato filho de pula pai dele está onde?
Mãe negra é mãe é pai. Munhungar o corpo é pelejar
contra a fome.
No pénsamento do kandengue um dia veio virar en-
graxador. Lá no musseque tinha muitos miúdos que pu-
nham graxa nos sapato. Fininho, Zito e Féfé, poça! os
gajos sábado e domingo andavam nos aviões, compra-
vam mikondos, passeavam roupa nova. Ele ficava só em
casa pôr olho nos três manos, cada qual tem pai dele,
a mamã fazendo a vida. À noite, mesmo bêbada, ela tra-
zia algum ferro. Kaprikitu avançou então os planos dele,
puxou para os Eucaliptos ganhar a vida.
Os outros lhe olharam mal. Kaprikitu era mais um de-
safio no negócio de puxar brilho, por isso lhe xingaram
mulato kanga massa. Ficou triste e voltou na casa, kumbú
nada. Hoje amanhã, graxa nada. Mas, sem depressa,
foi aprendendo as truquices dos kilamas do brilho. Se
lhe ameaçavam enrugava cara raivosa e sacudia o pu-
nho, vê lá hen! Só assim Kaprikitu começou a embolsar
algumas moedas.

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MEU TOQUEI
D/ZANGA DIA MUENHU

Alguém pé calçado passava, passo apressado, os gra- Kumbú bué, gravidez na barriga, falas dicotas, o fre-
xas gritavam MEU TOQUE! Berridavam atrás do sapato guês sentou-se no Bar. Kaprikitu berridou até ele e lhe
que dava o pão. MEU TOQUE! era o grito da fome, a enfiou o paleio da profissão: sai graxa freguês? Pergunta
luta dos homens pequenos empurrados cedo na vida dura. que perguntava a todos os fregueses de manhã até à
MEU TOQUE! era a agonia dos explorados. MEU TOQUE! noite. Desde que estava ali nunca ninguém não lhe ti-
quem qui gritou primeiro fui eu! Sueu quin graxo mé! MEU nha falado mal, sempre cumprimentava com a pergunta
TOQUE! Porquê estás minguiçar? Para ganhar a vida pre- sai graxa freguês. Pula deu resposta vai engraxar teu pai.
cisa um gajo lutar com os outros, se agarrar mesmo. Meu pai cara dele nunca lhe vi, mas é meu pai. Vai en-
Kaprikitu virou mestre graxista pouco tempo, sapato fica graxar teu pai não mé! O freguês virou bicho e esticou
bem limpo, o pano até dizia nheque nheque. A vontade um pontapé rijo, fazendo em bocados a caixa da graxa.
dele não era essa vida. Esta sanzala grande onde vivemos Kaprikitu quando viu no chão a caixa que lhe aguen-
-uns que ficam kilamas, outros castigo de monangamba tava a vida, pôs o desafio: vem cá sés home! vem cá sés
-é que lhes arrastou na graxa ainda kandengue. home! O freguês se levantou arrogante e os graxas que
Entretanto, o desejo de estudar dicotava nele. Ele que- estavam ali na cena engrossaram o desafio e repisaram:
ria saber brincar com a palavra no papel, assim como vem cá sés home! Ninguém que falou mais. Todos esta-
trumunava a bola, se maguelava perigosamente nos car- vam esperar o começo da luta. Outros pulas com cora-
ros. Mas lá na escola sôssora sempre chatear amanhã ção no lugar ficaram chateados com a cena. Não gosta-
traz isto, amanhã aquilo. Por isso MEU TOQUE! era tam- ram. Isso não pode ser. Não se faz.
bém o grito e a luta dele. Miúdos na idade, os graxas sabiam no musseque pu-
A arte de graxar estava ficar agarrada nas mãos que xar navalha na conversa salgada, imitar Sabata nos tru-
sabiam ritmar com o pano a música feita assobio. Kapri- ques. Novamente a ameaça apareceu, palavra de rei não
kitu puxou para a Baixa, experimentar outra sorte na volta atrás: vem cá sés home! Os punhos dos engraxa-
vida. Se abancou no fresco da Portugália, visionando dores no ar. Ameaça. Silêncio. Ameaça. O freguês fi-
sempre os fregueses com sapato no pé, kumbú é pre- cou fraco, nunca tinha pensado kandengues do musse-
ciso muito. que não fogem discussão azeda. Kaprikitu olhava só a
Ninguém que pode kuatar o tempo. Os dias na berrida, caixa, as tintas, a graxa no chão. E amanhã? Os olhos
um vai, um vem. Tinha dia de negócio fixe, outros dias começavam a chorar a tristeza que lhe rachava no cora-
era só olhar olhar mais nada e o castigo da fome na barriga. ção. E amanhã? Tinha de pensar no dia de amanhã, pen-
Um dia tal qual os outros, com o Sol a estalar quen- sar já como os kotas que têm mulher e filhos. E ama-
turas, os carros vum-vum sempre, as pessoas todas tam- nhã? Quando vier a Totalimediata se te acaço ...
bém com as corridas. O ódio não cresce se lhe cortarem a raiz.

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NGA FEFA KAJINVUNDA
Kuateno! Kuateno! o grito rebentou no ventre atmos-
férico rapidamente na kazucutice do Xamavo. Neg6cios
ainda parados, quitandeiras na berridagem do gatuno.
Kuateno! Kuateno! Tudo nas corridas para acaçar o di-
nheiro na ponda de Nga Xica roubado. Na berrida os
fiscais também estavam. Pessoas que andavam nos be-
cos ficavam assustadas, movimentação era no aconteci-
mento dos ladrões fugindo, Xamavo tinha desordem.
Kandengues até se espantavam, depois mergulhavam
rindo na algazarra. Kuateno! Kuateno! Grito levado longe,
grito testemunho de boca bocando bocas.
Nga Fefa Kajinvunda, como lhe chamavam por causa
da força dela na discussão, refilona, quem lhe punha s6
desafio?, nem mesmo os polícia se podiam com ela.
Uma vez ela foi. Palavras zangadas com sô Zé, calo-
teiro. Mé dia, hora suarenta. Ainda dentro de casa que
começaram, quase sem barulho. Discutidamente depois,
das gargantas vomitavam berros, diálogo violento com
as malcriações na língua. Palavras e gestos no enqua-
dramento. Os corpos na discussão enunciavam formas
variadas. Paga não pago. Nga Fefa e Sô Zé no afronta-
mento. A solução não aparecia. As pessoas com a

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DIZANGA DIA MUENHU NGA FEFA KAJINVUNDA

curiosidade de saber que conversa era aquela de falar homem e a vitória dela com Sã Zé no chão. As mulhe-
berradamente. Compreenderam bem as conversas que res rebentavam gritos e arrogantemente perguntavam
passavam, quando os dois já cá fora no prolongamento onde se escondera a masculinidade. Você? Você não
da maka. és zohomem mé-dedos na indicação da vítima. Nga
Sã Zé pensava por ela ser mulher podia lhe ganhar Fefa ainda na socagem do adversário. Tiveram de lhe
na luta logo. Se enganou. Eu sou mulher mas você não dizer chega, vontade era muita.
brincas comigo hen, caloteiro, não tem vergonha-Nga Não estava lá mais nenhum homem. Desapareceram.
Fefa falou autoridade nas palavras. Todos não estavam Só as mulheres é que ficaram. A notícia correu musse-
acreditar, é embora era garganta dela, manias de desa- que todo, nem faísca. Quem estava ainda acreditar no
fiar homem mé! Desapareça já-Sã Zé bravou. Mas tei- princípio? ninguém. É boato.
mosia dela não ia. A repetição da cena acontecia outra- Desde então os maridos proibiram as mulheres de an-
vez. Cada um na afirmação de si. Kajinvunda nem que I
dar com Nga Fefa, não fossem aprender os truques. As
fugia só. Fia da mãe! Sã Zé começou de lhe empurrar I recomendações traziam ameaças de espancamentos.
com a mão no peito almofadado. Nga Fefa no chão ali. 1, Kajinvunda-Ihe acrescentaram no nome de Nga Fefa.
Vai agora dá-lhe já-a multidão aquecida de contente. f
Nga Fefa no chão e o homem masculinamente vitorioso. , Nga Fefa, uhn parece mentira! Nga Fefa agarrou
Mas, boxeiramente se levantou e lançou as mãos na gar- mesmo o ladrão. Com uma aduela tirou-lhe a vontade
ganta masculina. Sã Zé na aflição, eué! Zolhos dele na de correr. Os miúdos entravam na socagem e bofetadas
viragem moribunda. Multidão atenta. Expectativa domi- também davam na condenação. Vinham depois relatos
nante nos homens e nas mulheres. Receosos de ver Sã
' de uma aventura breve, no palco mussequeiro, grávido
Zé apanhar nas fuça, os homens estavam. Era uma mu- de cenas.
lher. Vergonha para eles se Nga Fefa ganhava. Elas, no Nunca recuava no medo das pessoas. Nga Fefa tinha
lado delas, não queriam também ver Kajinvunda debaixo homem no corpo dela de mulher. Respondia xingante-
do corpo musculoso. Ora favorável a um, parecendo pró- mente todos que lhe insultavam e até os fiscais punham
ximo o desfecho, ora favorável a outro, mudando sem- respeito nela. Senhoras inda que vinham lá do putu com
pre as esperanças dos assistentes, a luta não terminava. as manias de superior, não torravam farinha com ela.
Gritos e aplausos no seguimento da porrada. No Sam- Olhar sisudo, cigarro fogo na boca, falas poucas, perso-
bila, na hora das mé dia, não te digo nada!, porrada nificava a autoridade e o respeito.
grossa, meu! Ninguém se meteu só na cena. Só eles. Di-
tado que mandava não meter a colher entre marido e Chegou e perguntou saber se o peixe quanto é: Trinta
mulher, ali era lei. Nga Fefa derepentemente baçulou o Escudos. Foi a resposta seca que ela falou na intenção

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DIZANGA DIA MUENHU NGA FEFA KAJINVUNDA

de não arranjar mais conversa. Ela sabia o costume an- notáveis as quitandeiras saíam lentamente da praça tro-
tigo das senhoras da Baixa de discutirem o preço da mer- peçando em caixotes e kindas. Formigas deslizando pa-
cadoria. «Oh! É muito caro Maria. Toma lá quinze escu- reciam. Os polícias vinham acompanhados da senhora
dos se quiseres». Braço estendido da senhora ficou triunfante, apontando Nga Fefa: é aquela negra! Medo
embora só no espaço. Nga Fefa parece lhe bateram vi- ainda no princípio, a quitandeira fez coragem depois.
brantemente no corpo. Tirou o cigarro do canto da boca Olhou à volta. Ninguém não estava.
e descansou arrogantemente as mãos na cintura. A mão Chegaram e nem mais que avançaram saber como é
que a maka foi. Começaram só no castigo da quitan-
da oferta barata ainda abandonada no espaço. Zolhos
das quitandeiras derepente espiando, muximas palpitan- deira. Nga Fefa ainda deu uma paulada na cabeça dum
tes. Parece se vão vundumunar-se. Banzaram. «A se- chui. Aqui é que mesmo a luta de verdade começou.
A senhora no estimulamento da fúria colonial: dêem-lhe
nhora está chamar Maria a quem? Você viste meu nome
é Maria? Velá hen!»-se arregalaram os olhos no desa- mais!. Força!
Kajinvunda sem força, estendida no vermelho sangue
fio enquanto a mão oferta cobardemente murchando.
Senhora, boca admirada. Nunca tinha ouvido dizer qui- da morte.
tandeira fala assim numa senhora. Estava no hábito dela
ir no mercado e entrar na discussão do preço, altiva-
mente. Com o criado lá em casa, com a gente do mus-
seque com quem às vezes falava, comportamento único.
Tempo ainda colonial. Pensou que a quitandeira esti-
vesse maluca. «Parece-me que há aqui um mal-enten-
dido, Maria». Fora da banca, Nga Fefa no gesto musse-
queiro mandou a senhora calar a boca logo logo, se não
lhe dava.
Palavrosamente as quitandeiras caçoaram a mulher da
Baixa, desaparecendo. Nos kimbundos delas escondiam
toda a fúria contra o colonialismo que não podiam falar
na língua da senhora abertamente. Anos de opressão se
transformavam em liberdade nas falas kimbundas.
Ainda no gesto furioso Nga Fefa, enquanto as outras
retomavam normalmente o serviço.
Primeiro umas isoladamente, depois já em grupos

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NOSTEMPO DE MIÚDO
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Manecas na baliza imobilizou o avanço. Bola mar-


chando, Pedrito puxa para Lito, este corre já em direc-
ção à linha divisória, entretanto, o sete recebe-lhe o es-
férico, finta brasadamente, tenta distribuir o jogo, corta
agora Néné Gordo, miá, Cachaça dono do esférico, vai
agora! remata rasteiro para Zeca em progressão, estica
para o lado direito e a bola lateralmente fugindo. Pon-
tapé no canto. Zero zero, tabuada em branco. Pernas
velozes pisávamos espaço redangular, suarentas catin-
gas transpirávamos, nós camisolados, eles costas relu-
zentes. Na corrida outravez, jogada agora no campo delá,
avança Totoxe (tem Xaxado nome dele outro), corta,
miá, miá, mialálá, Paulo aparecendo leva faiscadamente
o esférico, atenção!, jogada lixada, defensiva formada
na baliza azarenta, e remata por cima da trave! Jogo re-
nhido no Campo da Companhia Indígena. Trumuno com
altos e baixos, ninguém que tinha tempo para descan-
sar só. Bola que andava já, jogo ainda em campo me-
tade, o cinco dominando a situação, tenta passar para
o oito, surge Paulo, não consegue, jogo então veio no
nosso campo. Bucho se defende, Quinzé secunda, faz
uma revienga, miá, dá para Rataças. É pontapé de ba-

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DIZANGA DIA MUENHU NOS TEMPO DE MIÚDO

liza. Maxinde contra Quinze de Agosto. Defensiva pre- tina lhes esperou mesmo lá fora. Aqui? Não senhor, não
parada, Zeca capitão da turma na voz de comando. Suor vi meninos entrar.
banhando corpos movimentados. Rasteir,adamente a bola Traquinice nos tempos das férias? Eh! Se vos conto,
corre a nos trazer azar, mas surge Manecas ... BOA DE- me pagas quê então? Bem. Era uma vez ... , não me lem-
FESA! bro mais. Ih! Não faz mais truques pá. Conta lá pá.
Jogávamos esquecidos de tudo, até dos exames que GENTE DE PAZ, é a história que vou pôr. Aconteceu
estavam vizinhos. Traquinice nostempo de miúdo. Pa- nostempo das confusões um dia, palavra d'honra. Nin-
rámos e olhamos. Respiração batucante ainda. Mane- guém si ri.
cas traz a bola!-vozeamos. Guardião na fuga rápida com Já nos tinham avisado. Seis horas recolher. Patrulha
o esférico de borracha. A interrogação prendia nossos atirar só. Sessenta e um quente. Cuidado! Pimentel bar-
pensamentos. Ó Manecas traz a bola!-vozeámos jun- budo sanguinário, olhos na mira fúnebre. Sô Rocha na-
tamente. Olhares de pergunta nos outros. Rataças, corpo cionalista fogoso já lhe mataram então. Cuidado! Seis
mosquito, dá também de correr. Corre! Lhe agarra horas recolher. Patrulha atirar só. Sessenta e um quente.
mesmo! -dissemos no íntimo de cada um. Nos enga- Vínhamos andando assustados. Nove horas da noite,
námos. Pedrito, Lito, Totoxe, quê que há?, também no a corneta tocara fazia tempo. Maxinde-Katepa parecia
ensaio do passo corrido. Companhia Indígena toda, cin- tinha distância. Na porta d'armas ainda que passamos
turões desapertados, euél, no cerco do rectângulo. Vão bem. Sentinela só nos olhou mau. Fomos andando, an-
nos agarrar! dando. Silêncio, ninguém que passava só. Capim alto
Manecas foi o primeiro quem lhes topou na prepara- era surpresa escondida no caminho da noite.
ção do cerco. Desafio suspenso no campo dá desafio fora Zeca (pai dele lhe chamavam Canhoto) me deu cora-
do jogo, sem penalidade. A velocidade nos pés era grande, gem: «se nos perguntarem quem vem aí, vamos falar
nem mesmo que compreendíamos só como é que está- é gente de paz. Em Luanda uma vez ma safei assim».
vamos a correr então. Néné Gordo, empalitava maravi- Nem lhe ouvi mais. Podia? O medo sempre comigo.
lhosamente na berrida. Muros altos eram terraplana em Caminho andado com a vizinhança do perigo. Von-
nossas pernas correndo. Soldados disparados natrás de tade de falar perdemos. Ouvíamos só nossos passos e
nós, cavalgando metros. o vento cortante nas árvores nos punha susto. Segurei
Quê que foi meninos?- Tia Cristina pegou susto. A na mão de Zeca. Cuidadol Sessenta e um quente. Seis
resposta ninguém que dava. Nem já só fala para falar. horas recolher. Vamos morrer! QUEM VEM AÍ?-a per-
Nada. Cada um na busca de lugar seguro. Ouvimos en- gunta sinistra que esperávamos. Parámos. Quietos. Nem
tão as vozes e os passos soldadescos. Aí o coração que mais um passo. Zeca falou baixo: «vamos falar é gente
se ia lixando. No entendimento da nossa aflição, Tia Cris- de paz. Anda!». Fala está onde então? Minhas pernas

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D/ZANGA DIA MUENHU

desmaiando. QUEM VEM AÍ? Arma fogando já quase.


Coração frio, sangue glacial. Encontro com a morte certa.
GENTE DE PAZ!!!-Zeca gritou com toda a força. Não
queria morrer. Pópilas a vida é só uma! Em sentido. Ali.
Estávamos. Quietos. Nem mais um passo. Vamos mor-
rer! Minha mão na mão de Zeca. Selagem fraterna.
«Nossa mãe está doente, fomos na farmácia»-o guarda
queria saber adonde vínhamos. Foi Zeca que conseguiu
responder. «Meninos tenham cuidado, não são horas de
andar. Podem passar.» Chui ainda tinha coração dele
bom. Nossa sorte. Começámos então a sentir a vida re-
novada. Andamos só um bocado e a morte outravez ali
perto. Parámos. Nem mais um passo. NOSSO GUARDA
ATIRA?-bala na câmara, ximba perguntou. NOSSO
GUARDA ATIRA?! O guarda não estava a ouvir. Va-
mos morrer desta vez. NOSSO GUARDA ATIRA? Bala
na câmara faltava pouco para sair a nos matar. A morte
e a vida em luta. Já nos tinham avisado. Sessenta e um
quente. Seis horas recolher. «Não, deixa passar!» Está-
vamos safos. Corrida louca começámos já. Mas ... no es-
curo da noite ameaçando furar nossas barrigas, uma baio-
neta. Zeca bravou: «Nosso guarda já nos disse para
passar, ximba dum raio mé». «Eu ximba? Eu ximba?»-a
mão da morte fazia-nos recuar. Derepente alguém gri-
tou a ordem de passagem. Nem já as poças d'água chu-
vosa se víamos. Era só correr. Sempre em frente.
Já nos tinham avisado. Seis horas recolher. Patrulha
atirar só. Sessenta e um quente. Cuidado! Pimentel bar-
budo sanguinário, olhos na mira fúnebre. Sô Rocha na-
cionalista fogoso já lhe mataram. Cuidado! Seis horas
recolher. Sessenta e um quente.

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