Você está na página 1de 67

HOSPEDANDO

LÉLIA GONZALEZ
(1935-1994)
MINISTÉRIO DA CIDADANIA APRESENTA

HOSPEDANDO
LÉLIA GONZALEZ
(1935-1994)
PROJETO DE PESQUISA DA
BIBLIOTECA | CENTRO DE DOCUMENTAÇÃO
E PESQUISA DA EAV PARQUE LAGE

Juliana Machado, Rubia Luiza da Silva,


Tanja Baudoin e Ulisses Carrilho (org.)

Rio de Janeiro, 2019


Lélia Gonzalez
(1935-1994) era antropóloga, professora
de cultura brasileira na PUC-Rio, política e
defensora dos direitos humanos.

Lélia é um símbolo e referência muito


importante para o movimento negro no Brasil,
publicou inúmeros artigos e dois livros. Ajudou
a fundar instituições como o Movimento Negro
Unificado (MNU), o Instituto de Pesquisas das
Culturas Negras (IPCN), o Coletivo de Mulheres
Negras N’Zinga e o Olodum.

Ela iniciou o primeiro curso de cultura negra na


Escola de Artes Visuais do Parque Lage em 1976.
PERFORMAR O CONHECIMENTO, Dentro do programa Curador Visitante (2015-2016),
criado e dirigido pela crítica e curadora Lisette Lagnado,
COMBATER ANTIGOS CONHECIDOS então diretora da Escola de Artes Visuais do Parque
Lage, a Biblioteca | Centro de Documentação e Pesquisa
passou a ser programada e pensada como dispositivo
Ulisses Carrilho pedagógico por uma curadora. Ao mesmo tempo,
Curador de Ensino e Programa Público autônomo e integrado, articulando o acervo bibliográfico
Escola de Artes Visuais do Parque Lage
desta escola de arte. Beatriz Lemos, idealizadora da
plataforma de pesquisa Lastro – intercâmbios livres em
arte, foi a primeira curadora convidada. Sua presença
e experiência na plataforma contribuíram para uma
programação da biblioteca. Articulada em rede, com
a comunidade artística, a biblioteca reorganizou-se
espacialmente para receber aulas públicas e lançamentos
de livros. Em seguida, já fora do contexto do programa
de exposições da EAV Parque Lage, Ana Luiza Fonseca
assumiu a curadoria da biblioteca com forte atenção
para a publicação como dispositivo a ser consumido
por leitores vorazes, mas também produzido – mais
uma plataforma para a criação artística – por artistas
igualmente famintos. Grupos de leituras aconteceram
(Opinião 17), experimentando dinâmicas de leitura
singulares e um percurso de leituras fluido porque
desviante. Sua trajetória, marcada particularmente pela
articulação da Feira de Arte Impressa Tijuana, pode
reorientar a presença dos livros de artista na biblioteca,
afirmando o livro como suporte possível para o artista.

Em 2019, convidei Tanja Baudoin, professora da escola,


a assumir a curadoria da biblioteca para trabalhar com
as bibliotecárias Rubia Luiza e Juliana Machado, que já
haviam acompanhado as curadorias anteriores. Reunindo
sua formação e a experiência no coletivo If I Can’t Dance,
I Don’t Want To Be Part Of Your Revolution, Tanja foi
convidada a pensar os usos dos arquivos. Mais do que
perguntas em torno da coleção de 20 mil exemplares da
biblioteca, dialogamos sobre os usos dos conhecimentos apenas de bibliotecas e acervos, mas de instituições
ali depositados. Como performamos aquilo que é de arte a partir de uma hospitalidade radical – o
sabido? Com que inteligência, atenção ou sensibilidade que também evoca o passado doméstico da casa.
colocamos nossas vozes na esfera pública? Qual a nossa Contemporaneamente, urge reler Lélia Gonzalez, uma voz
capacidade de escuta em um mundo que convoca singular. Complexa, porque também simples. Ao referir-
certezas frágeis em meio às ruínas cotidianas? Quanto -se à língua portuguesa como pretoguês, Lélia crava a
pode uma biblioteca de uma escola livre, voltada à arte linguagem na corporeidade, na instituição de valores,
contemporânea, com um acervo bibliográfico calcado na ética da relação e da reparação histórica – são muitas
na modernidade europeia, patriarcal e racista? Como, as fortunas. Esperamos, com a escrita destes textos, com
em última instância, o conceito de escola vem a exposição destes trabalhos de Aline Besouro, Millena
perpetuando uma noção de conhecimento fortemente Lízia e Yhuri Cruz e, principalmente, com a reunião destes
calcada na violência colonial e na apropriação, material documentos em torno da participação e contribuição de
e simbólica, de outras culturas? Lélia González na Escola de Artes Visuais do Parque Lage
na gestão do artista Rubens Gerchman, contribuir para a
Em Queermuseu, Queerescola, Escola Cuir, mostra
urgente luta antirracista a partir de mais este dispositivo
paralela à Queermuseu, num gesto de combate a partir
de memória.
da curadoria do Núcleo de Ação Educativa, exibimos
pela primeira vez os documentos de Lélia Gonzalez
em relação à criação do primeiro curso institucional de
Cultura Negra no Brasil, em 1976, na Escola de Artes
Visuais do Parque Lage. Junto de fotos de Alair Gomes,
fotógrafo homossexual e ex-professor da escola, e
Matheusa Passareli, aluna trans não-binária, assassinada
brutalmente em 2018, vítima de transfobia, entre outros
trabalhos, Lélia apresentava-se como um modelo
insubordinado. Apesar de não estar filosoficamente
filiada a um pensamento manifestamente cuir, textos
como “Racismo e sexismo na cultura brasileira” são
fundamentais para a inversão que necessitamos hoje.
Urge um rompimento do mundo tal qual o conhecemos,
o seu legítimo fim, como firma a artista e autora Jota
Mombaça, que nos orienta para uma redistribuição
desobediente de gênero e anticolonial da violência.

Intitulado Hospedando, o programa pensado por Tanja


institui ideias, temas e figuras do passado da escola
que contribuem para a atualidade do pensamento não
BIBLIOTECA A Biblioteca da EAV Parque Lage é MEMÓRIA LAGE Memória Lage é o projeto de digitalização e
DA EAV especializada em artes visuais com enfoque sistematização dos documentos que contam
PARQUE LAGE em arte moderna e contemporânea. O acervo a história da escola. Memória Lage reúne mais
conta com mais de 20 mil títulos, entre obras de 7 mil documentos da instituição. Além
de referência, livros, catálogos, periódicos, do banco de dados sediado na Biblioteca
monografias, livros de artistas e mídias da EAV, conta com uma plataforma digital
digitais. A consulta é local e de livre acesso a que dará acesso público a cartas, cartazes,
alunos, funcionários e visitantes. A Biblioteca folders, publicações, filmes, fotografias,
ocupa duas salas; uma delas é a antiga artigos de jornais, ficha de alunos e gravuras
banheira do palacete, que virou uma sala para e pinturas produzidos desde a primeira
leitura. Há uma varanda com um ambiente gestão da instituição (1975-1979) até hoje.
agradável para receber lançamentos de livros, Os interessados poderão elaborar diversas
rodas de conversas e outros programas. pesquisas a partir de um vasto material,
A Biblioteca também funciona como espaço condicionado e catalogado.
expositivo, integrando trabalhos de arte,
Acesse o arquivo digital aqui:
cartazes, materiais de acervo e os próprios
www.acervo.memorialage.com.br
livros relacionados aos projetos de pesquisa.
A equipe é composta por duas bibliotecárias,
responsáveis pela catalogação e manutenção
do acervo, e uma curadora, que foca nas
atividades públicas. HOSPEDANDO “Hospedando” é um programa de pesquisa
da Biblioteca, que semestralmente se
concentra em uma pesquisa histórica de um
nome ou evento ligado à escola. Cada projeto
usa materiais de arquivo do Memória Lage
como base de pesquisa, e convida artistas
e outros convidados a contribuir com seus
trabalhos e ideias. O objetivo é desenvolver
conversas sobre questões artísticas e sociais
para criar vínculos entre as gerações que
passam pela escola.
TRAJETÓRIA “HOSPEDANDO
LÉLIA GONZALEZ (1935-1994)”

Encerramento do projeto
Hospedando Lélia Gonzalez,
“Lélia Gonzalez – Para não
esquecer”, realizado em 13 de
max wíllà morais, Servir julho de 2019 no salão nobre da
nada, performance, programa EAV Parque Lage. Abaixo: Rubia
“Um berro, um sussurro” da Luiza da Silva. Ao lado: Keyna
Biblioteca da EAV Parque Lage, Eleison, Zezé Motta e Raquel
Foto: Juliana Machado Foto: Rubia Luiza maio de 2019. Foto: Rubia Luiza Foto: Rubia Luiza Barreto. Fotos: Renan Lima

20 17 22 19 13
MARÇO ABRIL MAIO JUNHO JULHO 2019
PRIMEIRO ENCONTRO SEGUNDO ENCONTRO TERCEIRO ENCONTRO QUARTO ENCONTRO QUINTO ENCONTRO
Abertura com com Aline Valentim com Aline Besouro, com Georgia Marcinik, “Lélia Gonzalez — para
Ana Maria Felippe max wíllà morais, Maya Inbar e não esquecer”, com
e Raquel Barreto Millena Lízia e Yhuri Cruz Obirin Odara Beatriz Vieirah, Elizabeth
Viana, Glau Tavares,
Keyna Eleison, Raquel
Barreto e Zezé Motta.

E com performances
e pinturas de Andréa
Almeida, Carol Sunshine,
Dila Oliveira, Susan Soares
e Viviane Laprovita.

12 13
HOSPEDANDO E
21 ATUANDO NA BIBLIOTECA
Tanja Baudoin

LÉLIA GONZALEZ, O CORPO


E A ANCESTRALIDADE NEGRA
NA ARTE CONTEMPORÂNEA
31 BRASILEIRA
Raquel Barreto e Roberta Aleixo

46
Aline Besouro

50 Millena Lízia

54 Yhuri Cruz

59 PARA NÃO ESQUECER


Zezé Motta

65 DOCUMENTOS DO ACERVO
PAPEL SOCIAL NO
DESENVOLVIMENTO DE
101 COLEÇÕES NA BIBLIOTECA DA EAV
Juliana Machado e Rubia Luiza da Silva

LIVROS DE ARTISTAS
107 E REFERÊNCIAS DE CULTURA NEGRA

COLABORADORES
115

14 15
“Em 1976, eu mesma iniciava
o primeiro Curso de Cultura no
Brasil, na Escola de Artes Visuais
(no Parque Lage), justamente
no momento em que, graças à
nova direção, aquela instituição
se renovava. Reunindo artistas e
intelectuais progressistas, cuja
produção implicava numa visão
crítica da realidade brasileira,
a EAV tornou-se o maior espaço
cultural do Rio de Janeiro naquele
período (tanto que sua desativação
foi determinada a partir de
Brasília no início de 1979 com
o afastamento de sua direção).”

Lélia Gonzalez
GONZALEZ, Lélia; HASENBALG, Carlos. Lugar de negro.
Rio de Janeiro: Marco Zero, 1982. p. 40. (Coleção 2 Pontos). ◊

16 17
Zumbi — um dia de festa para a liberdade.
O Globo, Rio de Janeiro, 19 de novembro de 1977.
22 x 34 cm. Acervo Memória Lage.

18 19
HOSPEDANDO
E ATUANDO
NA BIBLIOTECA
Tanja Baudoin

20 21
Este livreto apresenta um projeto de pesquisa a esta figura. A pesquisa particularmente
sobre uma professora da escola nos anos se focou nas suas realizações na escola,
1970, Lélia Gonzalez (1935-1994). Por meio com ajuda dos pesquisadores e pessoas
de documentos e fotos, trabalhos de arte e que conviveram com ela. Uma iniciativa das
textos, esta publicação mapeia o seu tempo bibliotecárias Juliana Machado e Rubia Luiza
na EAV Parque Lage e as reverberações de envolveu a criação de uma estante com
seu legado na atualidade. novos livros sobre artistas negras, com foco
Em 1976, Lélia Gonzalez iniciou o primeiro nas mulheres e questões raciais teóricas.
curso institucional de cultura negra do Brasil O projeto incluiu uma exposição com
na EAV Parque Lage. O curso teve como materiais de acervo e contribuições dos
foco a presença de artistas negros na arte artistas Aline Besouro, Millena Lízia e Yhuri
brasileira e na cultura popular, trazendo Cruz. Uma foto por Januário Garcia serviu
questões de linguagem, religião, identidade como capa do projeto, junto com os desenhos
e exclusão. de Aline Besouro.

Lélia Gonzalez fez parte da equipe da No espírito de Gonzalez, o “Hospedando


EAV entre 1976 e 1979, os primeiros anos Lélia Gonzalez” foi criado como um projeto
da escola na época da ditadura civil- de pesquisa que reuniu elementos discursivos,
militar. Nesse momento, o artista Rubens como leituras, discussões e histórias, com
Gerchman, que criou a escola em 1975, estava contribuições visuais, dança afro-brasileira
desenvolvendo um programa experimental e performance. Cinco encontros públicos de
com abordagem transdisciplinar. Lélia março até julho de 2019 exploraram diferentes
veio do mundo acadêmico, mas na EAV facetas do legado de Gonzalez. O primeiro
conseguiu explorar suas pesquisas sobre
encontro e abertura do projeto contou com
arte afro-brasileira e cultura popular de
falas de Ana Maria Felippe, filósofa e amiga de
maneira aplicada também. Além do curso,
Gonzalez, e Raquel Barreto, historiadora que
ela organizou várias atividades e eventos para
acompanhou o projeto inteiro, participou da
o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência
curadoria do último encontro com a equipe
Negra. A escola forneceu a ela uma
da Biblioteca e fez contribuições inestimáveis.
plataforma para promover seu pensamento
e compartilhá-lo com outras pessoas em O segundo encontro com a dançarina
um ambiente educacional e artístico. Aline Valentim combinou uma abordagem
O projeto de pesquisa “Hospedando Lélia discursiva e corpórea, com uma discussão
Gonzalez”, alojado na Biblioteca durante o coletiva de um dos textos mais conhecidos
primeiro semestre de 2019, visou dar atenção de Gonzalez, “Racismo e sexismo na cultura

22 23
brasileira” (1980), e uma breve introdução à se tornaram o principal motivo para os
dança afro-brasileira. O terceiro encontro foi anúncios dos encontros públicos. Essas
com os artistas da exposição, Aline Besouro, sementes, que ao mesmo tempo podem
Millena Lízia e Yhuri Cruz. O quarto encontro ser conchas, bocas e vaginas, ecoaram
foi dedicado à branquitude – termo referente de repente em um pôster encontrado no
ao sistema hegemônico racial que coloca acervo de Gonzalez que anuncia a primeira
o indivíduo branco e sua identidade racial conferência de mulheres negras no estado
em uma posição privilegiada, perpetuando do Rio de Janeiro em 1988. Lélia Gonzalez,
discriminação, racismo e desigualdades através de seu trabalho e seu legado, não está
sociais e de oportunidades. A vontade diretamente representada nos desenhos de
de fazer essa roda surgiu dos encontros Besouro, mas guiou o artista para um espaço
anteriores, da escuta dos convidados afetivo de criação. Esse foi um trabalho
e do público negro falando sobre suas especialmente encomendado, que considerou
experiências, e do reconhecimento de que a maneira de desenhar de Besouro, com as
questões de raça precisam ser direcionadas linhas fluidas que podem facilmente viajar
também para as pessoas brancas que do papel para outros lugares.
costumam frequentar a escola.
Na obra da Millena Lízia, Deslizando uma
O encontro final ocorreu alguns dias economia erótica colonial, as palavras “desejo”
depois do 25º aniversário do falecimento e “dejeto” apareceram juntas na parede da
de Gonzalez e reuniu pessoas que a biblioteca, uma como a sombra espectral
conheciam pessoalmente e uma geração da outra. Embora graficamente similares,
jovem que está sendo influenciada por seu elas se referem a afetos que são antônimos:
pensamento. Comemorou-se com uma mesa o sentimento de querer estar perto; e a
de debate com a atriz Zezé Motta, que foi necessidade de expulsar. Podemos perceber
aluna de Gonzalez na EAV, Keyna Eleison como esses afetos estão interligados quando
(professora do EAV Parque Lage e curadora) pensamos em sua associação histórica com
e Raquel Barreto (historiadora), entre outras corpos específicos, como Lélia Gonzalez
contribuições de artistas. deixou muito claro em sua análise do corpo
feminino negro como local de projeções
Durante esse período inteiro, os trabalhos dos
complexas. O trabalho dialoga com trabalhos
três artistas residiam no espaço da biblioteca
e pesquisas anteriores de Lízia, que exploram
cercado pelos materiais do acervo. Aline
as realidades performáticas afetivas que
Besouro fez um zine e uma série de desenhos
ocorrem entre os corpos, o impulso de apagar
que ocupavam a sala de leitura, apresentando
certos traços do passado e a necessidade
o contorno de uma mulher e outras figuras
de reimaginá-los e reinscrevê-los, com
como livros, palavras, mãos e sementes que
todos os riscos que isso envolve.

24 25
Dois cartazes de Yhuri Cruz reformularam para a Biblioteca. Uma bibliografia lista
uma peça que ele criou durante 2018, esses livros.
enquanto ele era aluno da EAV no Programa
A EAV Parque Lage é uma escola livre,
de Formação e Deformação. Seu conjunto
que visa ser receptiva a todos os povos sem
de obras criticou diretamente o racismo
discriminação. Este projeto não pode resgatar
institucional dentro da escola. Isso envolveu
a escola de suas responsabilidades contínuas,
uma pesquisa no acervo do Memória Lage
nem compensar a falta de negros em seu meio
para criar estatísticas baseadas na presença
no passado e no presente. É uma tentativa de
de negros ativos na escola durante os últimos
criar espaços em que essa questão possa ser
cinco anos, número que é muito baixo, o que
enfrentada e onde alguns passos em direção
é chocante, mas não surpreendente. Convidar
à mudança possam ser dados. Esperamos
Cruz para retomar este trabalho como parte
que o legado de Lélia Gonzalez permaneça
de “Hospedando Lélia Gonzalez” foi uma
vivo e ativo, dentro da escola e fora de seus
tentativa de abrir o projeto para a crítica e
muros. Gostaríamos de agradecer todas
declarar que os artistas negros já haviam
e todos que contribuíram com o projeto,
apontado essa crítica para a escola, sabendo
os artistas, convidados, autores e colegas.
que o projeto do “Hospedando” em si não
Agradecemos Rubens Rufino e Redeh (Rede
poderia compensar ou reparar essa questão,
de Desenvolvimento Humano) pelo apoio.
que requer atenção profunda e mudanças
Finalmente, quero agradecer minhas colegas
contínuas no nível diário de interações.
Juliana e Rubia, que criaram o programa dos
Este livreto envolve registros dos trabalhos encontros públicos comigo, me ensinaram
desses três artistas, e várias imagens muito durante a trajetória do projeto sobre
e documentos do acervo da EAV e de a questão do racismo no Brasil e na vida
Lélia Gonzalez. Inclui também as vozes cotidiana, e sobre trabalhar em equipe.
de amigas que conheceram Gonzalez,
como Zezé Motta, Elizabeth Viana, Ana Maria
Felippe e Fabiana Santos, e a voz da própria
Gonzalez. As pesquisadoras Raquel Barreto
e Roberta Aleixo contribuíram com um
texto que foca na questão de como o legado
de Gonzalez está vivo nas práticas dos artistas
contemporâneos. Um texto das bibliotecárias
Juliana Machado e Rubia Luiza explica o
esforço delas de trazer mais livros sobre
artistas negras e cultura afro-brasileira

26 27
“ O privilégio racial é uma
característica marcante da
sociedade brasileira, uma
vez que o grupo branco é
o grande beneficiário da
exploração, especialmente
da população negra. E não
estamos nos referindo apenas
ao capitalismo branco, mas
também aos brancos sem
propriedade dos meios de
produção que recebem os
seus adventos do racismo.”

Lélia Gonzalez
GONZALEZ, Lélia. A juventude negra brasileira e a questão do
desemprego. Resumo apresentado na Segunda Conferência Anual
da African Heritage Studies Association, 26-29 abr. 1979.

28 29
LÉLIA GONZALEZ,
O CORPO E A
ANCESTRALIDADE NEGRA
NA ARTE CONTEMPORÂNEA
BRASILEIRA
Raquel Barreto
e Roberta Aleixo

30 31
LÉLIA GONZALEZ, ANCESTRAL Foi por conta de sua atuação e circulação em
lugares como universidades, escolas de samba
Na perspectiva dos povos iorubás, que nos
e partidos políticos que Lélia provocou mudanças
civilizaram, marcando aspectos fundamentais
na formulação de um pensamento negro brasileiro.
da nossa formação cultural, os instantes não
A intelectual que não atuou apenas nos espaços
seguem a tradição ocidental em que as
acadêmicos, mas que procurou levar sua teoria
temporalidades estão condicionadas a espaços
tanto para a política dos movimentos sociais como
fixos e lineares: passado, presente e futuro, em
para a disputa política institucional, concorrendo
uma estrutura evolutiva. O tempo é pensado a
a cargos legislativos em duas ocasiões.
partir de espirais, fluxos contínuos, no sentido
da encruzilhada, como define a teórica Leda O projeto de pesquisa “Hospedando Lélia
Maria Martins, “operada de linguagens e Gonzalez” na Escola de Artes Visuais do Parque
discursos, geratriz de produção sígnica, Lage, a EAV, foi a oportunidade de recuperar sua
diversificada e, portanto, de sentidos plurais”.1 passagem como professora no período inicial da
escola, entre 1976 e 1978. O projeto contou com
Lélia Almeida Gonzalez, nossa ancestral,
exposições, debates, mesas e discussões sobre
é uma das bases para o desenvolvimento
o pensamento e a contribuição da intelectual.
da consciência racial e de gênero no interior
da comunidade negra. Seu legado teórico e Em sua fundação, a EAV tinha como proposta
político e suas contribuições são inúmeras, tornar-se um espaço de experimentação artística,
e ecoam constantemente no desenvolvimento onde se desenvolviam novos procedimentos
de uma epistemologia negra decolonial estéticos, adotando uma concepção transdisciplinar,
brasileira, no pioneirismo na elaboração que incluía não só a pintura, mas também o teatro,
de teoria do feminismo negro, nas lutas a literatura, a fotografia, a dança e o cinema.
[1] MARTINS, Leda
antirracistas contemporâneas e na disputa Nessa perspectiva de pluralidade, Lélia ministrou
Maria. Corpo, lugar da
de uma narrativa interpretativa sobre a memória. In: FONSECA, “A cultura negra no Brasil”, o primeiro curso
Maria Nazareth Soares
formação cultural brasileira. 2 institucional sobre o tema no país. No mesmo
(Org.). Brasil afro-
brasileiro. 3. ed. Belo período, ela promoveu na EAV ocupações,
A força de seu pensamento desconstrói a Horizonte: Autêntica,
debates e atividades em comemoração ao mês
perspectiva ocidental de tempo, costurando 2010. p.65.
da consciência negra, novembro, em conjunto
a história e a memória ancestral enraizada [2] Para um maior
aprofundamento, com a programação que acontecia na cidade,
em corpos e subjetividades negras. Sua
conferir: BARRETO, organizada pelo movimento negro.
contribuição pode ser observada na produção Raquel. Lélia Gonzalez,
uma intérprete do
contemporânea artística, literária, acadêmica, A edição do jornal O Globo do dia 18 de agosto de
Brasil. In: Primavera para
cultural e política de mulheres e homens negros. as rosas negras: Lélia 1976 publicou a matéria “Curso de cultura negra:
Gonzalez, em primeira
Enfatizaremos aqui as influências na poética do a integração através dos valores afro-brasileiros”,
pessoa. São Paulo:
trabalho de algumas artistas contemporâneas. UCPA, 2018. veiculada no mesmo dia que iniciavam as aulas.

32 33
A matéria abordava a trajetória da professora e A proposição de Lélia era bastante original para
as questões que se desenvolveriam nas classes. o período, contrariando a assertiva de que os
No texto, Lélia afirma que “considera importante africanos que aqui chegaram eram apenas
levar aos outros negros o mesmo sentimento que mercadorias, desumanizados; a autora evidencia
agora experimenta, integrada na sua cor”. Essa é seu papel fundamental na formação social. O lugar
uma das razões que a levaram a fazer o curso do que o corpo negro ocupou, e ocupa, no imaginário
Parque Lage. Ela complementa: “Em 1976, o negro ocidental foi determinado pelo “contato”
brasileiro, como grupo ético e cultural, começa estabelecido, no século XVI, durante o tráfico
a ter consciência de si; começa a procurar se atlântico, que objetificou e transformou corpos
posicionar dentro de nossa realidade.”3 humanos em mercadoria. De acordo com a
socióloga Patricia Hill Collins: “A objetificação é
O curso tinha como objetivo pensar o lugar
fundamental para esse processo de diferenças
do negro na cultura brasileira, convidando as [3] Cabe mencionar que
a forma como o debate formadas por oposição. No pensamento binário,
pessoas negras para que assumissem o lugar sobre integração racial
um elemento é objetificado como ‘Outro’, e é visto
de protagonista na formação da cultura nacional: é proposto por Lélia,
evidenciado no título como um objeto a ser manipulado e controlado.”6
“A proposição do curso sobre culturas negras no da matéria, é contrária
Brasil realizado no Parque Lage visa desenvolver à lógica recorrente Há, no entanto, outras histórias possíveis de narrar
da integração, que
um trabalho de reflexão crítica que possibilite pressupõe a integração sobre corpos negros, que não se encerram nas
a designação do lugar do negro na cultura negra no mundo dos privações, mas evidenciam protagonismo. As/os
brancos. O que ela
brasileira. E, ao tentar apontar para tal lugar, ele propôs, e desenvolveu africanas/os trazidas/os ao Novo Mundo possuíam
pretende também trazer a sua contribuição no ao longo de sua cosmovisões e culturas que não se pautavam nas
produção, foi o inverso,
sentido de que o próprio negro se situe e assuma ou seja, foram os/as dicotomias entre corpo (objeto) vs razão (sujeito),
a si e a seus antepassados enquanto presença brancos/as que se fundamento da lógica ocidental-cristã, que
integraram na cultura
marcante na nossa realidade cultural.”4 negra, ainda que o considerava o corpo um problema. As civilizações
neguem, ou melhor, africanas que aqui chegaram pressupunham uma
A perspectiva da autora era também pensar na recalquem essa questão.
Por outro lado, esse inteligência corporal em seus movimentos e
especificidade de uma cultura negra brasileira
processo não extinguiu memórias. O que se pode observar nas religiões
que se distanciava da importação da cultura negra o racismo das relações
sociais brasileiras. de matriz africana, organizadas por uma lógica
estadunidense, em voga naquela época com a
simbólica alimentada por vias do corpo e do
popularização entre nós da Soul Music, dos bailes [4] GONZALEZ, Lélia.
A presença negra na território, em conexão com a natureza, onde o
e da estética do movimento Black Power. cultura brasileira. In:
corpo é um altar para as divindades habitarem.
“Atualmente, o negro brasileiro decidiu sair da Jornal Mensal de Artes,
Galeria de Arte Moderna,
cozinha e se descobrir gente. Mas, em diversos n. 37, mar. 1977. p. 7. [6] COLLINS, Patricia Hill.
Pensamento feminista
casos, está havendo uma busca de valores através
[5] O Globo, 18 ago. negro. São Paulo:
da importação de uma cultura americana.”5 1976. Boitempo, 2019.

34 35
AS/OS ARTISTAS

A partir da interseção entre ancestralidade,


alteridade, tempo e espaço, é possível analisar
o trabalho de cinco artistas que apresentam em
suas obras elementos que transitam por esses
lugares. Tratam-se de buscas e afirmações,
encontros e provocações, que se desdobram nas
produções de Yhuri Cruz, Millena Lízia, Raphael
Yhuri Cruz, Exposição-cena Pretofagia, Mulambö, Não tem museu no mundo
Cruz, Mulambö e Aline Besouro. Centro Municipal de Arte Hélio Oiticica, 2019. como a casa da nossa vó, 2019.
Foto: Pedro G. Linger Foto: Daniela Paioliello
O corpo, morada grafada de uma ancestralidade,
possuidor de conhecimento e memória, é
elemento fundamental e base para os trabalhos para o brasileiro. Em suas produções, é possível
desenvolvidos por Yhuri Cruz e Raphael Cruz. observar que esses espaços habitados por tantas
Ao contrapor o entendimento de corpo composto questões ultrapassam a forma e a materialidade
de partes, físico, possuidor de finitude e dualidade, visível, tecendo outras construções, saberes e [7] NASCIMENTO,
matéria e espírito, o corpo-corpo (possuidor de existir. O corpo é território de ancestralidade. Beatriz. Quilombola
e intelectual.
sentidos tangíveis), os artistas transgridem essas Possibilidades nos dias
Como mencionou a historiadora Beatriz
perspectivas que embasaram durante muito da destruição. São Paulo:
Nascimento: “É preciso a imagem para recuperar Ed. Filhos da África/
tempo o pensamento europeu e contribuíram UCPA, 2018. p. 330.
a identidade.”7 Os encontros espelhados entre
Eu e o Outro são a possibilidade de tornar-se [8] O Modernismo
brasileiro foi um
e reconhecer-se. O artista Yhuri Cruz realiza, movimento heterogêneo,
em sua série de trabalhos Pretofagia (2019), marcado por diferentes
fases. Os artistas que
uma forma distinta de se relacionar com o outro, atuaram no período
que não é devorando-o, em um processo de tinham formação,
localidades e origens
estranhamento daquilo que é externo, porém, sociais distintas.
enxergando-se e reconhecendo-se. O que seu
[9] Os modernistas
trabalho propõe é problematizar o olhar do apontavam a
necessidade de conhecer
outro para o corpo negro numa perspectiva
as produções artísticas e
antropofágica do movimento. Essa etapa culturais europeias, sem,
no entanto, hierarquizar.
específica do Modernismo 8 — a Antropofagia9 —
Ao mesmo tempo,
Aline Besouro, Boca Millena Lízia, Deslizes de uma economia Raphael Cruz, Nono filho de caracterizou-se pelo processo de apreender reconheciam as bases
semente, série de cinco erótica colonial, 2019. Experiência Oya, técnica mista, 2018.  formativas nacionais – os
Foto: Raphael Cruz
o outro, alimentar-se dele, absorver suas
cartazes, 2019. 30 x 42 cm.  epidérmica sobre parede de alvenaria da indígenas e os sertanejos
Biblioteca da Escola de Artes Visuais do energias, devorá-lo, comê-lo, produzindo –, exibindo as questões
Parque Lage. Corpo, grafite e estêncil em peculiares do país,
uma síntese amalgamada, digerida em um
papel paraná. 60 x 130 cm.  desde a cor local até as
Foto: Renan Lima corpo diferente. manifestações populares.

36 37
Pretofagia foi também uma ocupação espacial que memórias. São linhas que se repetem, criam
o artista realizou com pessoas negras no Centro espaços, formas, movimento. Cruz amplia as
Cultural Hélio Oiticica em 2019, os corpos negros possibilidades do entendimento de corpo,
que transitam pelo espaço e que, por vezes, se território e ancestralidade em suas pinceladas
chocam, estabelecendo, assim, esse encontro de grossas, fragmentadas, de linhas que se fazem
recognição, de multiplicação. Não estamos diante traços. As repetições gráficas seguem e criam
de solidariedade ou algum tipo de reciprocidade; formas potencializando pintura e suporte.
os corpos ou corpas negras, como chama o Quando Raphael pinta corpos, ele nos fala de
artista, se reconhecem e se unem a esse outro amor. Amor ao corpo enquanto forma, enquanto
que é, ao mesmo tempo, ele mesmo. Nesse cor, enquanto vida.
momento, não são apenas aqueles/as corpos/as,
Aline Besouro, em Boca semente (2019), cria
porém outros/as corpos/as negros/as que
possibilidades semânticas a partir da fonética e
florescem desse reconhecimento. Para o
da forma presente no trabalho. A artista explora as
psicanalista Jacques Lacan, o momento da
compreensões, cria um jogo a partir dos desenhos
unicidade, do reconhecimento do eu no outro
que são sementes, bocas, vaginas, búzios, olhos.
diante do espelho, é uma etapa como a
A boca [se] mente, nos engana nos dizeres, nas
fragmentação.10 E assim são os corpos negros
suas formas, é um trocadilho. Ela se transforma
numa estrutura racial e política, fragmentados e
para nos fazer ressignificar coisas e espaços, pode
impossibilitados da visualização do eu no outro,
ser o invólucro que garante a existência. É o
não havendo reconhecimento. Para se perceber
feminino que não somente carrega a vida, mas vê
estilhaçado, sem a imagem projetada, é
os tempos e além deles, é por onde saem os sons
necessário compreender-se uno. A percepção
e as palavras, por onde surge a vida, é a escuta,
dessas etapas que desafiam a ordem é observada
é o sagrado. O jogo de muitos sentidos se conecta
por Beatriz Nascimento: “A invisibilidade está na [10] QUINET, Antonio.
Os outros em Lacan. com a sacralidade do feminino e da adivinhação
raiz da perda da identidade; então eu conto Rio de Janeiro: Ed. Jorge
presente nos búzios lançados à espera de uma
minha experiência.” 11 Zahar, 2012.
resposta do oráculo, mas é também uma
[11] NASCIMENTO, Beatriz.
As linhas são possibilidades de movimento ou de Quilombola e intelectual. experimentação de todo significado que aquela
significados que podem aparecer no corpo como Possibilidades nos dias forma pode conter em bocas, olhos, semente,
da destruição. São Paulo:
distinção étnica, podem ser imaginárias, Ed. Filhos da África/UCPA, vaginas. É o feminino presente naquilo que se
estabelecendo territórios. A linha para os iorubás 2018. p. 330. apresenta em forma de adivinhação. Na cultura
é “dotada de significados amplos, coletivos”.12 [12] CONDURU, Roberto. iorubá, Orunmila é senhor da adivinhação, do
Pérolas negras – primeiros
No trabalho Nono filho de Oyá (2018), Raphael conhecimento entre passado, presente e futuro,
fios: experiências artísticas
Cruz usa as mesmas linhas ancestrais, múltiplas, e culturais nos fluxos senhor que transita entre os dois mundos — o
entre África e Brasil.
se estendendo por diversos suportes, entre eles o Orun e o Ayê —, o céu e a terra, é a presença
Rio de Janeiro: EdUERJ,
corpo, território vivo, morada de pulsões, desejos, 2013. p. 103. existente na determinação do destino, por isso

38 39
o conhece. Essa forma se estende a búzios Não é apenas sobre o tempo, passado e
lançados à espera de uma resposta do Oráculo, presente, mas é também sobre a realidade.
mas também uma experimentação de todo Voltar e rememorar é estar em outro lugar, em
significado que aquela forma múltipla de outro tempo e em outra realidade, colocando-se
sentidos pode conter. Quando as bocas e fora daquela realidade imediata. Walter
sementes estão naquele espaço de colorido Benjamin, ao falar de Proust, entende a
vibrante, são formas que saltam como em um lembrança como sendo capaz de enfrentar
tabuleiro à espera da leitura de seu significado, o envelhecimento, “se manifesta com clareza
do semeio para início da vida ou do consumo na reminiscência (internamente) e no
para alimento do corpo. E qual é o seu envelhecimento (externamente)”.13 A frase
sentindo? Não se espera a adivinhação daquilo nos transporta para outro lugar, que valoriza
que ocorrerá num futuro breve ou distante ou o que está presente na nossa lembrança, em
no instante do presente ou nas questões do outro instante que é particular. É a busca de
pretérito, é a percepção de possibilidade e algo que pode não estar acessível de maneira
ambiguidades da forma. É o feminino imediata, mas que está lá. É a afirmação de
transmutado em objeto daquilo que sabe ou que aquilo que há de referência de passado
saberá, é a boca que fala, conta e anuncia, é a se faz presente na ancestralidade.
vagina que pare, sente, a semente que germina.
Os artistas e as artistas vão buscando e
O jogo está lançado, basta saber ler. É
afirmando suas ancestralidades, questionando
conferido a qualquer um a possibilidade de
as construções históricas e imaginadas em
leitura das probabilidades realizadas a partir
distintos suportes e de diversas maneiras.
da cor e da forma, das linhas de um vermelho
Millena Lízia, com as palavras DEJETO-
forte e intenso apoiadas em um azul marcante.
-DESEJO em Deslizes de uma economia erótica
Aline concede a todas e todos a capacidade
e colonial (2019), tensiona as possibilidades de
de ler, de adivinhar.
significados e significantes. As palavras que
A mensagem é um tropeço, não se anuncia, por vezes nos confundem em sons e na forma
não se coloca visível na altura dos olhos. estão alocadas na parede sem trato, sem
Às vezes nos esquecemos ou nem suporte, sem moldura. Numa intervenção
percebemos a sua presença. Não tem museu direta, contrastante de branco e preto, de
no mundo como a casa da nossa vó (2019). sentimentos e sensações que enganam olhos,
A obra do artista carioca Mulambö, feita boca, ouvidos. Capazes de ocupar, por um [13] BENJAMIN, Walter.
A obra de arte na era de sua
com algumas palavras adesivadas no chão, deslize, o mesmo corpo, a mesma forma com
reprodutibilidade técnica.
é lembrança e esquecimento. Uma frase sentidos distintos. Os sentimentos nos saltam In: Magia e técnica, arte
e política. Ensaios sobre
estendida, distante da altura dos nossos aos olhos como reflexos antagônicos de
literatura e arte. Obras
olhos, é o tropeço na lembrança. compreensão e cor que não se separam, escolhidas. Vol. I, 1986.

40 41
caminham juntos. O que o desejo reflete não um se faz na visualização desses dois corpos
é a aspiração, a expectativa, mas sim a repulsa que se deparam e do espelhamento que
daquilo que é posto para fora. É expurgar estabelece as questões de uma identificação
aquilo que se busca, é querer fora de si. possibilitando a construção da identidade.
DEJETO-DESEJO é o conflito linguístico,
A vida torna-se incessante quando pensada
existencial, histórico, de uma sociedade
numa ortogonalidade de encontros temporais,
herdeira das práticas coloniais. O trabalho
passado e presente; esses instantes se
de Millena dialoga com as questões propostas
entrecruzam, tornando o pretérito presente.
por Lélia em seu texto clássico “Racismo e
O tempo histórico localiza os instantes em
sexismo na cultura brasileira”, em que discute
espaços específicos, diferentemente dos
como operam os processos de denegação
tempos que se atravessam. O passado que
racial no imaginário social.
cruza o presente, mas também o repercute,
“Como todo mito, o da democracia racial como diz Walter Benjamin, “o passado se
oculta algo além daquilo que mostra. Numa reflete no instante”.15 O tempo como
primeira aproximação, constatamos que ancestralidade é alimento para aquilo que
exerce sua violência simbólica de maneira fazemos ou desejamos realizar. Ele não se
especial sobre a mulher negra. Pois o outro desconecta do que nos arrebata no momento
lado do endeusamento carnavalesco ocorre do olhar vivo que apreende o instante
no cotidiano dessa mulher, no momento em imediato. Por ele não estar congelado
que ela se transfigura na empregada num espaço, por ele se fazer atuante nos
doméstica. É por aí que a culpabilidade momentos do agora, ele não se encerra e
engendrada pelo seu endeusamento se é contínuo. É transformador, nos constitui
exerce com fortes cargas de agressividade.” 14 enquanto sujeitos!

O corpo negro é o território que possibilita


o reconhecimento, é espaço que ultrapassa
os limites da forma, da representação, [14] GONZALEZ, Lélia.
Racismo e sexismo na cultura
subvertendo o entendimento ocidental que o brasileira. In: Primavera
definiu, por muito tempo, como uma máquina para as rosas negras: Lélia
Gonzalez, em primeira
de trabalho, desprovido de alma ou de sentir. pessoa. São Paulo: UCPA,
Segundo a teórica Leda Maria Martins, o 2018. p.196.

corpo negro é espaço de registro, de memória [15] BENJAMIN, Walter.


A obra de arte na era de sua
e de conhecimento que manteve nesse
reprodutibilidade técnica.
território de sensações a possibilidade de In: Magia e técnica, arte
e política. Ensaios sobre
reconhecimento para nos tornarmos únicos
literatura e arte. Obras
diante da imagem do outro. A unicidade de escolhidas. Vol. I, 1986.

42 43
“ Penso que muito do legado de
Lélia ainda pode ser encontrado
na cabeça de pessoas que
conviveram com ela e que ainda
estão aqui, no planeta, conosco.
Pessoalmente sinto falta de uma
página na internet; um ‘lugar’,
‘locus’ (diria Lélia), onde as pessoas
pudessem encontrar com ela: com
suas escritas, com sua voz; seu
movimento e falação; que abrigasse
as produções de textos, teses e
livros sobre Lélia ou inspirados em
Lélia; onde todos se encontrassem,
de alguma forma, com Lélia, em um
espaço que, acredito, Lélia chamaria
de ‘Aldeia’.”

Ana Maria Felippe

44 45
Aline Besouro

Confia
Zine, 2019. 15 x 21 cm,
16 páginas. Fotos: Renan Lima

Boca semente
Série de cinco cartazes, 2019.
30 x 42 cm.

46 47
“ Lélia, como educadora, professora,
reconhece e agradece a ‘solidariedade
e colaboração’ dos amigos, colegas e
alunos da EAV, bem como dos irmãos
e companheiros de militância. Sua
militância, seus estudos e pesquisas
permitiram-lhe fazer uma imersão na
história e na cultura do ‘povo negro’,
das quais se distanciara pelo processo
racista de embranquecimento. No atual
momento em que vivemos, é bom
destacar — para não esquecer —
o compromisso de Lélia e da EAV
Parque Lage com a educação, a cultura
e a liberdade em nosso país. Ao longo
das décadas seguintes, podemos
acompanhar como essa perspectiva
política alcançaria novo patamar nas
relações raciais no Brasil, e a EAV
e sua direção foram também
protagonistas da História.”

Elizabeth Viana

48 49
Millena Lízia

Deslizes de uma economia erótica colonial Sem título – traço epidérmico


Experiência epidérmica sobre parede Experiência epidérmica sobre parede
de alvenaria da Biblioteca da Escola de alvenaria da Caixa Preta (RJ), 2018.
de Artes Visuais do Parque Lage, 2019. Pele sobre grafite e contra a arquitetura.
Corpo, grafite e estêncil em papel paraná. 6 x 100 m.
60 x 130 cm. Foto: Renan Lima Foto: Vinícius Monte

50 51
“Até aquele momento, para mim,
a presença do negro era algo
indiferenciado. Principalmente,
passei a problematizar todas as
representações e referências ao
‘negro’, a observar o cotidiano e o
tratamento que os brancos davam
às pessoas negras, e a refletir sobre
as relações de classe, cor da pele,
origem social e suas implicações na
violência do Estado. Percebi como
reproduzimos inconscientemente
padrões sociais de fala,
comportamentos, naturalizações
de lugares. A questão, para mim,
virou militância diária. Seu curso
me despertou para as sutilezas do
racismo, aguçou minha crítica. Hoje,
no Brasil, é ainda mais importante
honrar e praticar o legado de Lélia.”

Fabiana Santos

52 53
Yhuri Cruz

Monumento-documento à presença.
Pesquisa e contrato ético com a EAV Parque
Lage não assinado, adaptado para cartaz,
2018-2019. 42 x 59 cm.

54 55
“ A mulher negra anônima,
sustentáculo econômico,
afetivo e moral de sua família e
quem, a nosso ver, desempenha
o papel mais importante.
Exatamente porque, com sua
força e corajosa capacidade
de luta pela sobrevivência,
transmite a nós, suas irmãs
mais afortunadas, o ímpeto de
não nos recusarmos à luta pelo
nosso povo.”

Lélia Gonzalez
GONZALEZ, Lélia. A mulher negra na sociedade brasileira.
In: LUZ, Madel (Org.). Lugar da mulher: estudos sobre a condição
feminina na sociedade atual. Rio de Janeiro: Graal Editora, 1981.

56 57
PARA NÃO ESQUECER
Zezé Motta

58 59
DEPOIMENTO DE ZEZÉ MOTTA com esse desconforto, com responsável por muitas coisas que da umbanda. Ela pedia que eu
NO ENCERRAMENTO DO essa coisa me incomodando…” aconteceram até depois que ela não comentasse com as minhas
PROJETO HOSPEDANDO LÉLIA A primeira ideia que eu tive se despediu. A Lei nº 10.639, por colegas que ela era da umbanda.
GONZALEZ, “LÉLIA GONZALEZ foi criar um sindicato para as exemplo, tenho certeza de que Por que será que ela pedia isso?
— PARA NÃO ESQUECER”, empregadas domésticas, que era um sonho da Lélia. Eu entendi Porque existe realmente essa
REALIZADO EM 13 DE JULHO não havia nos anos 70, depois muito também o que estava intolerância, essa discriminação
DE 2019 NO SALÃO NOBRE eu mudei de ideia. acontecendo quando ela publicou com a cultura negra, enfim, com
DA EAV PARQUE LAGE. o Lugar de negro (1982). “Ah tá, a nossa cultura, com a nossa
Aí aconteceu o milagre. Lendo o
então eles querem que eu fique religiosidade, com a nossa cor
jornal, vejo o anúncio: “Curso de
aqui encolhidinha…” Nos livros de pele, com nosso cabelo, com
cultura negra no Parque Lage,
dela, a gente aprende muita coisa, o ser negro.
com a professora Lélia Gonzalez.”
o Lugar de negro é um livro
A minha fala é em forma de Ah, que alívio. Vim para cá, e Bom, fiz esse curso da Lélia e
muito importante.
depoimento sobre a minha Lélia foi responsável por todos nunca mais me desgrudei (risos),
relação com Lélia Gonzalez e a os segmentos da minha vida. A Lélia se preocupava com cotas, porque eu falei “é aqui que eu
importância de Lélia Gonzalez Eu vim fazer o curso, e Lélia, na porque ela sabia que através da vou ficar!”. Lélia virou, sim, a
para todos nós, para o Brasil, para aula inaugural, falou o seguinte: educação a gente chega lá, e minha guru. Ficamos amigas…
os movimentos negros, para a “Eu sei porque vocês estão aqui.” com cotas nós teremos mais Quando ela se candidatou,
sociedade, para a cultura e, em Não éramos só negros, não, negros nas universidades, mais fizemos reuniões na minha casa.
particular, na minha vida. tinha intelectuais brancos, tinha negros chegam aonde ela chegou. Aliás, na minha casa, tinha muitas
estudantes, jovens, gente mais Foi Lélia que me chamou atenção reuniões do movimento negro
Eu fiz Xica da Silva (1976), viajei
velha… “Eu sei porque vocês para o Abdias de Nascimento, de modo geral. E essa fala nunca
pelo mundo, divulgando o filme.
estão aqui, mas não temos mais que acabei de conhecer nos saiu da minha cabeça. “Temos
[...] Quando voltei, começaram a
tempo para lamúrias. Temos Estados Unidos. Foi Lélia também que arregaçar as mangas e fazer
fazer muitas entrevistas e muitas
que arregaçar as mangas e fazer que, através do curso, me levou alguma coisa. Não temos mais
perguntas sobre a questão racial
alguma coisa.” para o candomblé. Assistir a tempo para lamúrias. Não temos
no Brasil, como eu me sentia,
alguns rituais de cultura negra mais tempo para esperar por
como foi fazer o papel, se foi Foi através da Lélia que eu
fazia parte do curso. E aí eu fui a paternalismo, para que alguém
confortável, se eu concordava descobri que eu não prestigiava,
uma festa para Oxum, eu sou faça alguma coisa, para que
com o tratamento que foi por exemplo, o IPCN, que é um
Oxum Opará, ela também, né? sejamos alguém.” Lélia foi
dado, porque aquela versão do movimento importante. Foi através
Eu fiquei tão encantada que fundamental.
Cacá Diegues explora muito a da Lélia que eu percebi que a
passou o medo e vi que era tudo
sensualidade etc... Eu percebi gente tinha de fazer alguma coisa,
maluquice da minha cabeça e que,
que minha responsabilidade tinha e não ficar esperando que fizessem
se por acaso baixasse o santo,
aumentado e falei: “Gente, eu alguma coisa pra nós. Como a
seria bem-vindo (risos)! Na minha
tenho que me informar, porque nossa Raquel [Barreto] falou, Lélia
adolescência, a minha mãe era
as coisas passam todas na mídia, era realmente uma visionária e

60 61
“ Gostaríamos de chamar
atenção para a maneira como
a mulher negra é praticamente
excluída dos textos e do
discurso do movimento
feminino em nosso país…
As categorias utilizadas são
exatamente aquelas que
neutralizam o problema
da discriminação racial.”

Lélia Gonzalez
GONZALEZ, Lélia. A mulher negra na sociedade brasileira.
In: LUZ, Madel (Org.). Lugar da mulher: estudos sobre a condição
feminina na sociedade atual. Rio de Janeiro: Graal Editora, 1981.

62 63
DOCUMENTOS
DO ACERVO

64 65
GONZALEZ, Lélia; HASENBALG, Carlos.
Lugar de negro. Rio de Janeiro: Marco Zero, 1982.
15,5 x 20,5 cm. páginas 40-41.

66 67
ESCOLA DE ARTES VISUAIS DO PARQUE LAGE. GONZALEZ, Lélia.
Cultura negra no Brasil, 1976. A cultura negra no Brasil, 1976.
Cartazete, 21 x 30 cm. Acervo Lélia Gonzalez. Ementa, 21 x 30 cm. Acervo Memória Lage.

68 69
ESCOLA DE ARTES VISUAIS DO PARQUE LAGE.
Culturas negras no Brasil, 1976. Ementa, 21 x 30 cm.
Acervo Lélia Gonzalez.

70 71
ESCOLA DE ARTES VISUAIS DO PARQUE LAGE.
ESCOLA DE ARTES VISUAIS DO PARQUE LAGE. Relação dos cursos de verão de 1979 da Escola de Artes Visuais:
Oficina Permanente: quadro de horários, 1979-1983. material de divulgação. 1979.
21 x 30 cm. Acervo Memória Lage. 9,5 x 21 cm. Acervo Memória Lage.

72 73
GONZALEZ, Lélia.
A presença negra na cultura brasileira.
GAM-Galeria de Arte Moderna, Rio de Janeiro,
março de 1977, nº 37. 32,5 x 45 cm.
Acervo Memória Lage.

74 75
Artistas negros mostram trabalhos no Parque Lage.
Luta Democrática, Rio de Janeiro, 8 de novembro de 1977. Mostra. O Fluminense, Niterói-RJ, 2 de novembro de 1977.
9,5 x 12 cm. Acervo Memória Lage. 5 x 13,5 cm. Acervo Memória Lage.

76 77
ASSIS, Isaura de. Nota: Quilombo. 1976. ESCOLA DE ARTES VISUAIS DO PARQUE LAGE.
Release do espetáculo Quilombo, 1976. CINEAVE: Teatro Negro de Daniel Caetano. 1975-1979.
21 x 30 cm. Acervo Memória Lage. Cartazete, 21,5 x 31,5 cm. Acervo Memória Lage.

78 79
ESCOLA DE ARTES VISUAIS DO PARQUE LAGE. ESCOLA DE ARTES VISUAIS DO PARQUE LAGE.
CINEAVE: Ganga Zumba: a luta dos escravos na busca CINEAVE: Ganga Zumba: a luta dos escravos na busca
de Palmares. Direção: Carlos Diegues; 1976. de Palmares. Direção: Carlos Diegues; 1976.
Cartazete, 21,5 x 31,5 cm. Acervo Memória Lage. Cartazete, 21,5 x 31,5 cm. Acervo Memória Lage.

80 81
ESCOLA DE ARTES VISUAIS DO PARQUE LAGE. ESCOLA DE ARTES VISUAIS DO PARQUE LAGE.
Candomblé / Nagô Gegê / Keto, 1975-1979. Danças Afro-brasileiras / Macalé dos Santos, 1978.
Cartazete, 20 x 32,5 cm. Acervo Memória Lage. Cartazete, 21,5 x 31,5 cm. Acervo Memória Lage.

82 83
ESCOLA DE ARTES VISUAIS DO PARQUE LAGE. ESCOLA DE ARTES VISUAIS DO PARQUE LAGE.
Convite da Exposição Breve Panorama da Cultura Afro-Brasileira, 1990. Mesa redonda sobre feminismo, 1979.
21 x 29,5 cm. Acervo Memória Lage. Cartazete, 20 x 29,5 cm. Acervo Memória Lage.

84 85
D’ALMEIDA, José Ricardo.
Porque Abolição - 88 (anos)?, 1976.
21 x 31,5 cm. Acervo Memória Lage.

86 87
ESCOLA DE ARTES VISUAIS DO PARQUE LAGE.
Capoeira Angola - Mestre Moraes, 1975-1979.
22 x 33 cm. Acervo Memória Lage.

88 89
ESCOLA DE ARTES VISUAIS DO PARQUE LAGE.
Jardim da Oposição: 1975-1979.
Rio de Janeiro: AMEAV, 2009. 21 x 42 cm.

90 91
Revista Mulherio, ano I, nº 3, setembro/outubro, 1981. GONZALEZ, Lélia. Mulher Negra. Mulherio, ano I, nº 3,
Capa. Acervo Lélia Gonzalez. setembro/outubro, 1981. Acervo Lélia Gonzalez.

92 93
GRUPO DE MULHERES NEGRAS DO RIO DE JANEIRO. 1° Encontro Nacional de Mulheres Negras, 1988.
1º Encontro de mulheres: normas, 1983. Acervo CACES - Centro de Atividades Culturais,
Acervo Lélia Gonzalez. Econômicas e Sociais.

94 95
GONZALEZ, Lélia. Quem é Lélia Gonzalez.
GONZALEZ, Lélia. E a cidadania da mulher e do In: E a cidadania da mulher e do negro?, 1986.
negro?, 1986. Capa. Acervo Lélia Gonzalez. Acervo Lélia Gonzalez.

96 97
“ O Brasil – por razões de ordem
geográfica, histórico-cultural
e sobretudo da ordem do
inconsciente – é uma América
Africana cuja latinidade,
por inexistente, teve trocado
o t pelo d para, aí sim, nomear
o nosso país com todas as
letras: Améfrica Ladina
(cuja neurose cultural tem
no racismo o seu sintoma
por excelência).”

Lélia Gonzalez
GONZALEZ, Lélia. Nanny. Humanidades, v. 17, ano IV.
Brasília: UnB, 1988. p. 23-25.

98 99
PAPEL SOCIAL NO
DESENVOLVIMENTO
DE COLEÇÕES NA
BIBLIOTECA DA EAV
Juliana Machado e Rubia Luiza da Silva

100 101
Atualmente, o acervo da Biblioteca da Essa tentativa de trazermos mais catálogos
Escola de Artes Visuais do Parque Lage de pessoas negras esbarrava na falta de verba
conta com mais de 20 mil títulos, divididos para compor o acervo. Quando a Escola cria
entre catálogos, livros e periódicos. Mais da o Programa Formação e Deformação gratuito,
metade do acervo é oriunda do IBA, o antigo torna-se mais evidente a necessidade de
Instituto de Belas Artes, ou de acervos que outras referências dentro da Biblioteca da
foram doados por artistas que queriam EAV. O programa consistia na participação
compor a Biblioteca da Escola. de 25 artistas-bolsistas, a maioria deles
negros e periféricos.
Com mais de quarenta anos de existência, o
acervo da Biblioteca praticamente é um lugar Durante a pesquisa para o projeto “Hospedando
de referências de artistas homens brancos Lélia Gonzalez”, tornou-se mais latente a
estadunidenses e europeus, tanto na arte necessidade de trazermos mais obras de
moderna como na contemporânea. artistas negros para o acervo: “hospedar Lélia”
e não ter no acervo as referências que seu
Em 2015, eu, Rubia Luiza, me torno bibliotecária
legado trazia não era uma possibilidade. Com o
na EAV – uma mulher negra que, ao
intuito de sanar esta deficiência no espaço, foi
conhecer o acervo, se depara com a falta de
elaborado um plano para desenvolver a coleção.
representatividade negra na Biblioteca de artes.
Observou-se então a necessidade de compor
A função social da/do bibliotecária/o também
o acervo não só com artistas negros, mas
consiste na manutenção do espaço que ela/ele
também com pensadores e filósofos estudiosos
ocupa. Quando se está nesses lugares de tomada
sobre as questões raciais. Com o escopo do
de decisões, se faz necessária uma ação para
projeto, iniciou-se então o contato com editoras
ressignificar esses espaços.
e instituições renomadas de artes, a fim de
Com isso, convido outra bibliotecária constituir um acervo representativo. Através
negra, Juliana Machado, para tentarmos as desse contato, a Biblioteca conseguiu atualizar
possibilidades de novas narrativas numa as obras do acervo na tentativa de formar uma
biblioteca de artes. Reforça-se a necessidade coleção bastante interdisciplinar, com títulos
de enegrecer o acervo, que nasce do desejo da que trazem referências não só do campo da
não naturalização da inexistência de referências arte, mas também da filosofia, da educação e do
literárias negras numa Escola de Artes Visuais. campo político, todos os títulos com enfoque na
Faz-se necessário o enfrentamento daquilo que negritude. Incluir livros de ciências sociais numa
é trivial como leitura: lutar para termos mais biblioteca de arte é entender que a arte também
representatividade negra no espaço é não se se constrói através do estudo de indivíduos e
omitir diante do embranquecimento imposto da sociedade. As discussões perpassam pelas
como padrão teórico. questões de classe, raça e gênero.

102 103
“ Até hoje os brancos falaram
por nós. Temos que assumir
a nossa própria voz. É aquele
velho papo, temos que ser
sujeitos do nosso próprio
discurso, das nossas próprias
práticas.”

Lélia Gonzalez
GONZALEZ, Lélia. A cidadania e a questão étnica. In: TEIXEIRA, João
Gabriel Lima (Org.). A construção da cidadania. Brasília: UnB, 1986. p. 165.

104 105
LIVROS DE ARTISTAS
E REFERÊNCIAS DE
CULTURA NEGRA

106 107
ANGELOU, Maya. A vida não me CONDURU, Roberto. Pérolas GONZALEZ, Lélia; HASENBALG, HOOKS, Bell. O feminismo é
assusta. Rio de Janeiro: DarkSide negras – primeiros fios: Carlos. Lugar de negro. Rio de para todo mundo: políticas
Books, 2018. experiências artísticas e culturais Janeiro: Editora Marco Zero, 1982. arrebatadoras. Rio de Janeiro:
nos fluxos entre África e Brasil. Rosas dos Tempos, 2018.
BARBOSA, Paulo Corrêa. Lélia Rio de Janeiro: EdUERJ, 2013. GONZALEZ, Lélia. Festas
Gonzalez: o feminismo negro populares no Brasil. Rio de HOOKS, Bell. Olhares negros:
no palco da história (educativo). DAVIS, Angela. A liberdade é Janeiro: Editora Index, 1987. raça e representações. São Paulo:
Brasília: Abrevídeo, 2015. uma luta constante. São Paulo: Elefante, 2019.
Boitempo, 2018. GONZALEZ, Lélia. Lélia Gonzalez:
CARNEIRO, Sueli. Lélia Gonzalez: primavera para as rosas negras. INSTITUTO TOMIE OHTAKE;
o feminismo negro no palco da FIRMO, Walter. Firmo. Rio de [s.l.]: Diáspora Africana, 2018. MASP. Publicação educativa:
história. Brasília: Abrevídeo, 2014. Janeiro: Bem-te-vi, 2005. histórias afro-atlânticas. São
GOUVÊA, Patrícia (Org.); Paulo: IMS; MASP, 2018.
CARNEIRO, Sueli. Racismo, FRANCO, Marielle. LÖFGREN, Isabel (Org. e trad.).
sexismo e desigualdade no Brasil. UPP a redução da favela em três Mãe preta. São Paulo: Frida KILOMBA, Grada. Memórias da
São Paulo: Selo Negro, 2011. letras: uma análise da política Projetos Culturais, 2018. plantação: episódios de racismo
de segurança pública do Estado cotidiano. Rio de Janeiro: Editora
CARONE, Iracy; BENTO, Maria do Rio de Janeiro. São Paulo: N-1 HENRIQUES, Joana Gorjão. Cobogó, 2019.
Aparecida Silva. Psicologia social Edições, 2018. Racismo em português: o lado
do racismo: estudos sobre a esquecido do colonialismo. LA SILUETA. Todo poder ao povo!
branquitude e branqueamento GILIOLI, Renato de Souza Porto. Rio de Janeiro: Tinta-da-China Emory Douglas e os Panteras
no Brasil. Petrópolis-RJ: Editora Representações do negro no Brasil, 2017. Negras. São Paulo: Sesc, 2017.
Vozes, 2017. modernismo brasileiro. Belo
Horizonte: Editora Miguilim, 2016. HILL, Marcos. Mulatas e negras LEENHARDT, Jacques. Seydou
CARROZZO, Stella. Rubem pintadas por brancas. Belo Keïta. São Paulo: IMS, 2018.
Valentim. Salvador: Museu de GILROY, Paul. O Atlântico Horizonte: C/Arte, 2017.
Arte Moderna da Bahia, 2011. negro: modernidade e dupla MACHADO, Maria Helena Pereira
consciência. São Paulo: HOOKS, Bell. Ensinando a Toledo. Rastros e raças de Louis
CONDURU, Roberto. Arte afro- Editora 34; UCAM, 2012. transgredir: a educação como Agassiz: fotografia, corpo e
-brasileira. Belo Horizonte: C/ prática da liberdade. São Paulo: ciência, ontem e hoje. [s.l.]:
Arte, 2007. GOMES, Nilma Lino Gomes. Editora WMF Martins Fontes, 2017. Capacete Entretenimentos, 2010.
O Movimento Negro educador:
saberes construídos nas lutas MASP. Histórias afro-atlânticas
por emancipação. Petrópolis-RJ: [vol.1] catálogo. São Paulo: MASP;
Vozes, 2017. Instituto Tomie Ohtake, 2018.

108 109
MASP. Histórias afro-atlânticas MBEMBE, Achille. Necropolítica: RAMALHO, Cláudia. Imagens TJABBES, Pieter (Curador).
[vol. 2] Antologia. São Paulo: biopoder, soberania, estado de para alguma paisagem. Belo Jean-Michel Basquiat: obras
MASP; Instituto Tomie Ohtake, exceção, política da morte. Horizonte: Nandyala, 2013. da Coleção Mugrabi. São Paulo:
2018. São Paulo: N-1 Edições, 2018. Art Unlimited, 2018.
RATTS, Alex; RIOS, Flávia. Lélia
MASP. Lucia Laguna: vizinhança. M’BOKOLO, Elikia. África negra: Gonzalez: retratos do Brasil TOLEDO, Tomás (Org.). Emanoel
São Paulo: MASP, 2018. história e civilizações: tomo II. negro. São Paulo: Selo Negro Araújo, a ancestralidade dos
Salvador: EdUFBA, 2011. Edições, 2010. símbolos. São Paulo: MASP, 2018.
MASP. Maria Auxiliadora: daily
life, painting and resistance. NASCIMENTO, Abdias. RIBEIRO, Djamila. Quem tem
São Paulo: MASP, 2018. O genocídio do negro brasileiro. medo do feminismo negro?
São Paulo: Editora Perspectiva, São Paulo: Companhia das Letras,
MASP. Melvin Edwards: 2016. 2018.
fragmentos linchados.
São Paulo: MASP, 2018. NASCIMENTO, Maria Beatriz. RISÉRIO, Antonio. A utopia
Beatriz Nascimento: quilombola brasileira e os movimentos
MASP. Pedro Figari: nostalgias e intelectual. [s.l.]: Editora Filhos negros. São Paulo: Editora 34,
africanas. São Paulo: MASP, 2018. da África, 2018. 2012.

MASP. Rubem Valentim: PEDROSA, Adriano. Agostinho SCHUMAHER, Schuma; BRAZIL,


construções afro-atlânticas. Batista de Freitas. São Paulo: Érico Vital. Mulheres negras
São Paulo: MASP, 2018. MASP, 2016. do Brasil. Rio de Janeiro:
Senac Nacional, 2007.
MASP. Sonia Gomes: a vida PINACOTECA. Rosana Paulino: a
renasce / ainda me levanto. costura da memória = the sewing SILVA, Nelson Fernando Inocencio
São Paulo: MASP, 2018. of memory. São Paulo: Pinacoteca da. Emanoel Araújo: o mestre das
do Estado de São Paulo, 2018. obras. Rio de Janeiro: Fundação
MBEMBE, Achille. Crítica da razão Biblioteca Nacional, Garamond,
negra. São Paulo: N-1 Edições, PINACOTECA. Territórios: artistas 2010.
2018. afrodescendentes no acervo
da Pinacoteca = Terriories: SODRÉ, Muniz. Reinventando
afro-descendant artists in the a educação: diversidade,
Pinacoteca’s Collection. São descolonização e redes.
Paulo: Pinacoteca do Estado, 2016. Petrópolis-RJ: Editora Vozes, 2012.

110 111
“ Na medida em que nós
negros estamos na lata de
lixo da sociedade brasileira,
pois assim o determina a
lógica da dominação. O risco
que assumimos aqui é o do
ato de falar com todas as
implicações. Exatamente
porque temos sido falados,
infantilizados, que neste
trabalho assumimos nossa
própria fala. Ou seja, o lixo
vai falar, e numa boa.”

Lélia Gonzalez
GONZALEZ, Lélia. “Racismo e sexismo na cultura brasileira”.
Originalmente apresentado como palestra em 1980, publicado na
revista Ciências Sociais Hoje, Anpocs, 1984.

112 113
COLABORADORES

114 115
Aline Besouro Atividades Filosóficas (SEAF- movimento de mulheres negras Glau Tavares
-RJ); autora de “Feminismo negro: e do movimento negro.
É instrutora de Kundalini Yoga É residente da festa Velcro e
mulheres negras e poder –
(3HO) e mestranda em Processos Batekoo RJ. Tem seu som baseado
um enfoque contra-hegemônico Fabiana Santos
Artísticos Contemporâneos no hip-hop e no funk carioca.
sobre gênero” (In: “O negro É artista visual, graduada em
(PPGARTES/UERJ). Formada Identifica seu som como “global
na sociedade contemporânea”, Sociologia e Política (PUC-Rio)
em História da Arte (UERJ), bass das periferias”, passando
Revista do Arquivo Nacional, e mestre em Linguagens Visuais
atua desde 2010 como figurinista por diversas vertentes da música
Rio de Janeiro, 2010) e Valores (EBA/UFRJ). Também trabalha
em produções teatrais e negra em diáspora, sem deixar
do universo natural (Editora com curadoria, aulas e oficinas,
cinematográficas. Em sua suas influências originais de lado.
PerSe, 2018; produção sob cuida de acervos artísticos e
pesquisa, destaca-se o interesse
demanda). organiza livros de arte.
em historiografia, na conexão Juliana Machado
com alguém e na possibilidade
Andréa Almeida Georgia Grube Marcinik É formada em Biblioteconomia
de narrar alguma coisa. e Gestão de Unidades de
É artista com formação em É psicóloga, especialista em Informação pela UFRJ.
Aline Valentim História da Arte pela UERJ. Gênero e Sexualidade (IMS/ Trabalha como bibliotecária
Realizou o curso de curadoria UERJ), mestra em Psicologia
É referência em dança afro- na EAV desde 2015.
pela Escola Sem Sítio no início Social (PPGPS/UERJ) e
-brasileira e danças populares
de 2019 no Paço Imperial e decidiu doutoranda em Psicologia
(maracatu, coco, ciranda,
se aprofundar mais na crítica
Keyna Eleison
afoxé, jongo…) com vinte anos Social (UERJ). É integrante e
da arte ingressando na EAV É curadora. Trabalha
de experiência no grupo Rio pesquisadora do Núcleo de
Parque Lage pelo curso de com pesquisa, fomento e
Maracatu e há doze anos com a Pesquisa e Desconstrução
Formação e Deformação. desenvolvimento em arte e cultura,
sua Cia Babalakina de Dança Afro. de Gêneros (DEGENERA) e
orientação de processos artísticos,
Aproximou-se dessas danças coordena o Gebra – Grupo de
Beatriz Vieirah Estudos sobre Branquitude. Tem
curadoria de exposições e ensino
em busca de maior vínculo com em Arte. Atualmente, é curadora
expressões da cultura negra, É mulher negra, feminista, filha como temática de pesquisa a
da 10ª Bienal SIART da Bolívia,
à qual ela também leva uma de Mainha e de Oxalá. Formada branquitude nos movimentos
cronista da revista Contemporary&
carga política. em Cinema e Audiovisual pela feministas, e seus temas de
e professora do Programa Gratuito
UFRB, adora escrever, filmar e interesse são: branquitude;
de Ensino da Escola de Artes
Ana Maria Felippe pesquisar sobre mulheres negras feminismos não-hegemônicos;
Visuais do Parque Lage.
no cinema e nas artes. relações étnico-raciais, de gênero
É licenciada e especialista
e sexualidade; processos de
em Filosofia (UERJ e UFRJ);
Elizabeth Viana racialização e subjetivação
max wíllà morais
fundadora do Instituto de É pessoa graduada em Artes
É funcionária pública, socióloga de pessoas brancas.
Pesquisas das Culturas Negras Visuais/UERJ (2016) e com
(IPCN-RJ); fundadora da e mestre em História Comparada
especialização em Educação
Associação de Estudos e (IFCS/UFRJ). Ativista do

116 117
das Relações Étnico-Raciais Como docente de arte, busca GeBra. Na graduação, iniciou Roberta Aleixo
(Ererebá, 2019-2020). Participou enfatizar as relações étnico- o estudo sobre o lugar do branco
É mestranda no Programa de
recentemente da Residência -raciais e a importância da escuta. nas relações raciais no Brasil
Pós-Graduação em Artes Visuais
Despina (2019) com Daniel Principais exposições: NPA Bienal a fim de disputar a narrativa
da UERJ. Realiza pesquisa sobre
Santiso; e publicou, com de Estudantes (Itália), After marxista sobre a desigualdade
as relações e contribuições
sua tia Gracilene Guarani, o Cinema (Israel), The State of social e a conformação das
entre artistas contemporâneos
texto “Capítulo 1”, da série Origin (Canadá) e Boom Bang II estruturas que constituem
e o pensamento da historiadora
de anotações para um livro, (Inglaterra). Possui formação em a sociedade brasileira. No
Beatriz Nascimento.
na coletânea Narrativas da Desenho Industrial, Artes Visuais mestrado, preocupou-se em
experiência negra (org. Maria e Educação, e cursou o mestrado elucidar o Estado enquanto
Gilda, 2019). É colaboradora do (MFA) em Artes Visuais na ente de extrema relevância na
Rubia Luiza da Silva
Instituto Maria e João Aleixo em Goldsmiths College, Londres. produção e reprodução dos É formada em Biblioteconomia
Pesquisa, Educação e Culturas pressupostos coloniais. Para e Gestão de Unidades de
em Periferias (2018-2019). Millena Lízia isso, lança mão do conceito Informação pela UFRJ. Uma
Em 2018, realizou com Daniel dispositivo de colonialidade, por pessoa que ama organização
É uma pessoa vivendo este
Santiso A poeira não quer sair ela cunhado, de tal modo que e gestão da informação,
mundo em busca de uma
do Esqueleto, documentário este dê subsídios para se pensar é bibliotecária desde 2014 na
caminhada com dignidade e
experimental exibido no Brasil, a relação entre branquitude e o EAV e, por amar se comunicar
saúdes. Busca as simplicidades,
Uruguai, Sibéria, Emirados Estado brasileiro na produção e acreditar na troca através de
pois as coisas mais banais lhe
Árabes e Índia, entre outros de morte e vida da população conversas como desenvolvimento
chegam com camadas de desafios
países. Seus trabalhos investigam negra. do ser, também faz parte da
e complexidades. É artista
histórias em acervos públicos, equipe de Visitas Guiadas do
contemporânea-ancestral,
situações geográficas e relações que assim vem se organizando Raquel Barreto Parque Lage.
materiais/imateriais com pessoas desde as agitações diaspóricas É historiadora e pesquisadora,
e objetos. das experiências pictóricas- especialista na obra das autoras
Susan Soares
-epidérmicas vividas – apenas Angela Y. Davis (1944) e Lélia É artista multidisciplinar e
Maya Inbar mais uma forma possível de Gonzalez (1935-1994). Possui atualmente tem como objeto
É educadora, artista visual, apresentação. artigos publicados em revistas de pesquisa o fluxo cocriativo
ativista, amante do corpo de circulação nacional como na busca da conexão do “eu”
integral, e busca cada vez mais Obirin Odara a Revista Cult e o Suplemento em meio às imposições da
contracolonizar seu estar no Literário de Pernambuco. sociedade.
É bacharel em Serviço Social,
mundo. Sua prática artística tem mestranda em Política Social Desenvolve uma pesquisa a
se voltado à micropolítica das pela Universidade de Brasília respeito do Partido dos Panteras Tanja Baudoin
relações e às interseções entre e coordenadora do Grupo de Negras e as relações entre Trabalha como curadora residente
gênero, intimidade e economia. Estudos sobre Branquitude – visualidade, política e poder. na Biblioteca da EAV Parque Lage.

118 119
Vive no Rio de Janeiro desde 2015, neocolonial. Tomando essas
quando participou do programa memórias como assombrações,
do CAPACETE. sua produção escultórica
recente se materializa numa
Ulisses Carrilho fusão de pedras e gravuras.
É curador da Escola de Artes Outras pesquisas de caráter mais
Visuais do Parque Lage e ex-aluno instalativo tendem a se relacionar
da mesma escola. Pós-graduado com monumentos, presenças
em Economia da Cultura (UFRGS), afrodiaspóricas, memoriais e
estudou Comunicação Social informações silenciadas.
(PUCRS) e Letras – Português/
Francês (UFRGS). Como aluno da Zezé Motta
Escola, ganhou bolsa-residência É atriz, cantora, ativista, com
para desenvolvimento de cinquenta anos de carreira.
projeto no Lugar a Dudas (Cali, São 14 discos, 35 novelas e
Colômbia), onde realizou a mostra mais de 40 filmes. Conhecida
Aquí mis crímenes no serian de internacionalmente por sua
amor. Desde 2015, trabalha na voz e atuação, mas também
Escola de Artes Visuais do Parque por sua história de luta contra
Lage, com Lisette Lagnado, como o racismo, Zezé é ícone negro
assistente de direção e curador da cultura brasileira. Participou
assistente. Em 2018, assumiu a de filmes como Vai trabalhar,
curadoria de Ensino e Programa vagabundo; Ouro sangrento;
Público da escola. Anjos da noite; Tieta do Agreste;
Orfeu; e Xica da Silva (1976), que
Yhuri Cruz a consagrou internacionalmente,
É artista visual e escritor, e novelas como a recente O outro
graduado em Ciência Política, lado do paraíso. Era aluna do
Rio de Janeiro. Desenvolve curso “Cultura negra”, de Lélia
sua prática artística a partir de Gonzalez, na EAV Parque Lage.
configurações poéticas entre
o fantasmagórico e o real,
buscando dar conta do que
denomina memórias subterrâneas
e da necropolítica como plano

120
GOVERNO DO ESTADO DO COORDENADORA DE ANALISTA DE AMEAV – ASSOCIAÇÃO DE PUBLICAÇÃO
RIO DE JANEIRO PROGRAMAÇÃO VISUAL PLANEJAMENTO AMIGOS DA ESCOLA DE
Amanda Lianza FINANCEIRO ARTES VISUAIS DO PARQUE ORGANIZADORES
GOVERNADOR DO ESTADO Leiliane Silva LAGE Juliana Machado
DO RIO DE JANEIRO COORDENADOR DA ÁREA Rubia Luiza da Silva
Wilson Witzel INTERNACIONAL ANALISTA FINANCEIRA PRESIDENTE Tanja Baudoin
Giacomo Pirazzoli Camila Oliveira Marcelo Viveiros de Ulisses Carrilho
VICE-GOVERNADOR Moura
Cláudio Castro COORDENADORA DO ANALISTAS DE SUPORTE TEXTOS
PROGRAMA AMIGO EAV DE TI VICE-PRESIDENTE Juliana Machado
SECRETÁRIO DE ESTADO Fernanda Sattamini Cristian Pala George Kornis Raquel Barreto
DE CULTURA E ECONOMIA Mateus Coutinho Roberta Aleixo
CRIATIVA DO RIO DE SUPERVISORA DE ENSINO  CONSELHEIROS Rubia Luiza da Silva
JANEIRO DO PARQUINHO LAGE ASSISTENTE DE ENSINO Alvaro Piquet Tanja Baudoin
Ruan Lira Natália Nichols DO PARQUINHO LAGE Eugenio Pacelli Zezé Motta
Ismael Silva Gustavo Martins
SUPERVISORA DE ENSINO  Nelson Eizirik CITAÇÕES
ESCOLA DE ARTES VISUAIS DO PARQUINHO LAGE ASSISTENTE DE ENSINO Ana Maria Felippe
DO PARQUE LAGE Luana Vieira Gonçalves Carmen da Costa Elizabeth Viana
Souza Fabiana Santos
DIRETOR-PRESIDENTE SUPERVISOR FINANCEIRO Lélia Gonzalez
Fabio Szwarcwald CONTÁBIL SECRETÁRIAS DE ENSINO
Hércules da Costa Cristian Mercado COORDENADORA
CURADOR Souza Carolina Azeredo DE DESIGN
Ulisses Carrilho Katia Rosendo Amanda Lianza
SUPERVISOR DE SERVIÇOS
COORDENADORA DE GERAIS ASSISTENTES DE SERVIÇOS DESIGNER
ENSINO Homero Gomes GERAIS Nathalia Lepsch
Gleyce Kelly Heitor Antonio Alan Souza
BIBLIOTECÁRIA Paulo do Carmo IMAGEM DA CAPA
COMISSÃO DE ENSINO Rubia Luiza da Silva Paulo Nemias Montagem feita com
Camilla Rocha Campos Ryan Barboza desenho de Aline
Charles Watson BIBLIOTECÁRIA AUXILIAR José Carlos Silva Besouro e retrato de
Clarissa Diniz Juliana Machado Teixeira Lélia Gonzalez por
Marcelo Campos Januário Garcia
Prili PRODUTORES ESCRITÓRIO DE NEGÓCIOS
Julia Baker Ártemis REVISORA
GERENTE ADMINISTRATIVA Renan Lima Duda Costa
E FINANCEIRA APOIOS
Celina Martins DESIGNER ArtRio
Janna Brilyantova MAM Rio
GERENTE DE PATRIMÔNIO MAM SP
Fabio Augusto Lopes COMUNICADORA DIGITAL Museu do Amanhã
Taís Barcia Pinacoteca
GERENTE DE EVENTOS SP-Arte
Naldo Turl ASSESSORIA DE IMPRENSA Galeria Nara Roesler
Mônica Villela Atlantis Fine Arts
COORDENADORA DE
PESQUISA DA BIBLIOTECA
Tanja Baudoin

122 123
H828 Hospedando Lélia Gonzalez (1935-1994): projeto de pesquisa da Biblioteca

Centro de Documentação e Pesquisa da EAV Parque Lage/ Juliana Machado

et al.— Rio de Janeiro: AMEAV, 2019.

128 p.: il. color.

Prefixo editorial: 455105.

ISBN:978-85-455105-3-6

1. Cultura Negra. 2. Movimento Negro - Brasil. 3. Gonzalez, Lélia, 1935-1994.

4. EAV Parque Lage. I. Machado, Juliana. II. Silva, Rubia Luiza da.

III. Baudoin, Tanja. IV. Carrilho, Ulisses. V. Título.

CDD 305.896081

CDU 316:7

Bibliotecária Jéssica Fernanda dos S. L. Ramos – CRB 7 / 6965

Livreto composto em Gotham


HTF e Recoleta sobre o Projeto
“Hospedando Lélia Gonzalez”,
realizado na Escola de Artes
Visuais do Parque Lage,
entre março e julho de 2019.

Impresso pela Stilgraf, em papel


certificado, Rio de Janeiro, 2019.
MATERIAL RECICLÁVEL.

Capa: Offset 180g/m2


Miolo: Papel offset 70g/m2
Tiragem: 1.500 unidades
“ Gostaríamos de chamar
atenção para a maneira como
a mulher negra é praticamente
excluída dos textos e do
discurso do movimento
feminino em nosso país…
As categorias utilizadas são
exatamente aquelas que
neutralizam o problema
da discriminação racial.”

Lélia Gonzalez
GONZALEZ, Lélia; HASENBALG, Carlos. Lugar de negro.
Rio de Janeiro: Marco Zero, 1982. p. 40. (Coleção 2 Pontos).

Você também pode gostar