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Direito do Trabalho I
Direito do Trabalho I
✓ Direito do Trabalho
O modelo jurídico liberal teve consequências dramáticas, tanto no plano social como no plano
humano. Ao abstrair do homem concreto, do homem historicamente situado, o liberalismo
oitocentista fez da liberdade e autonomia “o monopólio dos privilegiados” e fez da igualdade a
“lei dos mais fortes”.
Ora o Direito do Trabalho surge como produto desta “Questão Social” pois a situação veio a
tornar-se insustentável e os poderes públicos, sob a pressão do chamado “Movimento Operário”,
acabaram por modificar a forma de enquadrar as relações entre o capital e o trabalho. O Direito
do Trabalho não se compaginava com o ultraliberalismo oitocentista justamente porque se traduz
num mecanismo deformador da concorrência, isto é, num mecanismo cuja função principal
consiste em limitar a concorrência entre os trabalhadores no mercado laboral. A resolução desta
grave “Questão Social” passou pela aceitação da intervenção direta do Estado no mundo do
trabalho e pelo reconhecimento de um estatuto de cidadania ao associativismo sindical e aos seus
corolários.
Assim, nasceu este ramo do direito sendo-lhe cometida uma função primacial, que, apesar de
todas as críticas persiste até aos nossos dias: a função tutelar, de proteção da parte mais débil da
relação laboral. Esta função supõe que se limite a liberdade contratual e que se restrinja o livre
jogo da concorrência no mercado de trabalho (por exemplo o Estado edita legislação de caráter
imperativo estabelecendo salários mínimos, quando os trabalhadores fazem greves, etc.).
Em suma, o Direito do Trabalho desconfia, desde sempre, dos automatismos do mercado e do contrato
individual, controla, por sistema, a liberdade contratual e restringe, por definição, a concorrência entre os
trabalhadores no mercado laboral.
No que tange à liberdade de modelação do conteúdo contratual, a verdadeira alteração
traduziu-se em substituir a vontade unilateral do empregador “todo-poderoso” pela vontade
heterónoma do legislador ou pela real autonomia das partes na contratação coletiva.
O trabalho surge como a verdadeira essência do homem, como um meio de realização pessoal
e de expressão de si, como um indispensável meio de aumentar a riqueza da nação e de aquisição
de rendimentos para o individuo que o presta, como meio de ordenar o mundo. O trabalho é um
fator de consideração social e confere-nos um determinado estatuto económico. A importância
do Direito do Trabalho na nossa sociedade é absolutamente indesmentível.
É esta relação de troca trabalho-salário, fundada num contrato, relação marcadamente patrimonial à qual
assiste, no entanto, uma dimensão irrecusavelmente pessoal, é esta relação estruturalmente desigual e
intrinsecamente conflitual, cunhada por uma forte divergência de interesses entre trabalhadores e empregadores,
que constitui o cerne da nossa disciplina. E o objetivo precípuo do Direito do Trabalho consiste em
tentar harmonizar esses interesses conflituantes, funcionando como plataforma de compromisso
de interesses sociais e económicos, não raro, contrapostos em ordem.
A necessidade de estabelecer regras jurídicas, de raiz autónoma ou heterónoma, de origem
nacional, internacional ou supranacional, tendentes a regular e disciplinar esta concorrência
interempresarial, em ordem a salvaguardar as condições de vida e de trabalho dos que aí laboram,
revela-se prioritária. Sem Direito do Trabalho, o supercapitalismo invade e corrompe a
democracia, empobrecendo a nossa comum condição de cidadãos.
É inegável que a globalização capitalista tem submetido o Direito do Trabalho dos países
ocidentais a um processo de tremendo desgaste.
A flexibilização afirma-se como novo leitmotiv juslaboral e o Direito do Trabalho passa a ser
concebido como um instrumento ao serviço da promoção do emprego e do investimento. O
clássico conflito social entre trabalhadores e empregadores passa a ser substituído pelo conflito
entre insiders e outsiders. Um Direito do Trabalho demasiado regido e excessivamente garantístico,
seria o grande responsável por esta segmentação e pelo dualismo do mercado de trabalho.
É inegável, que nos nossos dias, a flexibilidade do mercado de trabalho constitui um objeto
omnipresente e incontornável. Flexibilidade tem vários significados que mostram sinais positivos
(submisso, dócil, etc.) opõe-se a rígido, firme.
“A meu ver, um Direito do Trabalho flexível jamais poderá deixar de ser um Direito do Trabalho robusto e
vigoroso. Creio que o Direito do Trabalho terá de ser flexível naquele sentido ideal, de resistência tênsil. Ser
adaptável à mudança de circunstâncias, mas sem ser quebrado por elas” – Richard Sennett.
Nem todo o trabalho prestado nas sociedades hodiernas é regulado por este ramo do direito
(limita-se as disciplinar as relações laborais marcadas pela nota da subordinação jurídica, pelo
dever do prestador de trabalho obedecer às injunções patronais, pelo poder do credor de trabalho
de comandar a atividade daquele). É o trabalho assalariado, dependente da execução
heteróconfomada, aquele que constitui o principal alvo da atenção do direito laboral. A base do
surgimento deste ramo do direito foi a figura do operário. São destinatários das ordens
juslaborais tanto os professores como as empregadas domésticas, tanto os futebolistas como os
advogados, tanto um jornalista como um ator, tanto um operário como médico, etc.
Durante o século XX, o âmbito subjetivo do Direito do Trabalho ampliou-se
consideravelmente (a fábrica é substituída pela empresa e o operário pelo trabalhador). Esta
mesma ampliação subjetiva veio a colocar em crise a unicidade, se não mesmo a unidade, do
ordenamento jurídico-laboral.
Daí que a diversidade normativa constitua, hoje, uma das principais características do
ordenamento jurídico-laboral. No confronto entre uniformidade e pluralismo declara-se o triunfo
deste último, proclama-se a inadequação do chamado “enquadramento único” e anuncia-se a
quebra do “mito da uniformidade de estatuto do trabalhador subordinado”. Afirma-se o pluralismo
tipológico do contrato de trabalho.
✓ Em suma
O Direito do Trabalho visa regular uma relação que, conquanto surja em função do livre consentimento prestado
por ambos os contraentes, traduzido na voluntária celebração do contrato do trabalho, surge também como uma
relação fortemente assimétrica, em cuja execução a pessoa do trabalhador se encontra profundamente envolvida.
Segundo Jorge Leite, “Direito do Trabalho é o conjunto das normas jurídicas, de origem estadual e
convencional, que visam regular, com vista à sua normalização, as relações individuais e coletivas que têm como
seu elemento unificante e desencadeante o trabalho assalariado”. Esta noção tem a vantagem de:
❖ Sublinhar que as normas jurídicas constitutivas deste ramo do ordenamento não se
cingem àquelas que são emanadas pelo Estado, antes compreendem outrossim normas
criadas pelos sujeitos coletivos, ao abrigo da respetiva autonomia negocial;
❖ Evidenciar que é da regulação do trabalho assalariado que se trata a limitar e a legitimar
os poderes empresariais, a proteger os trabalhadores e a legalizar a posição dominial dos
empregadores;
❖ Vincar que o Direito do Trabalho visa regular, não só a relação bilateral entre trabalhador
e empregador, mas também as chamadas “relações coletivas de trabalho”.
No tocante às relações entre a convenção coletiva e a lei, é sabido que o chamado “princípio
do tratamento mais favorável ao trabalhador” constitui, historicamente, um princípio nuclear.
Este princípio desdobra-se analiticamente nas seguintes proposições nucleares:
❖ O Direito do Trabalho consiste num ordenamento de caráter protetivo e compensador
da assimetria típica da relação laboral, desempenhando uma função tuitiva
relativamente ao trabalhador assalariado;
❖ Esta função tutelar do Direito do Trabalho é cumprida através de normas legais que
possuem uma natureza relativamente imperativa, as quais consagram garantias
mínimas para o trabalhador, admitindo o reforço de tais garantias por via da
contratação coletiva;
❖ Daqui decorre que às relações entre a lei e a convenção coletiva, o princípio da
prevalência hierárquica da lei deve articular-se com o princípio do favor laboratoris;
❖ O favor laboratoris perfila-se, pois, como uma técnica de resolução de conflitos entre lei
e convenção coletiva, pressupondo que as normas juslaborais possuem um caráter
relativamente imperativo, isto é, participam de uma imperatividade mínima.
O artigo 13º nº1 da revogada LCT, fixava a diretriz fundamental em matéria de relacionamento
e coordenação entre a lei e a convenção coletiva, ao prescrever que “as fontes de direito superiores
prevalecem sempre sobre as fontes inferiores, salvo na parte em que estas, sem oposição daquelas,
estabelecem tratamentos mais favoráveis para o trabalhador”.
Concluía-se que em Direito do Trabalho a regra (a chamada “regra de princípio”), era, a da
aplicação da norma que estabelecesse um tratamento mais favorável ao trabalhador, ainda que tal
norma se encontrasse contida numa fonte hierarquicamente inferior. A imperatividade absoluta
da norma superior e a supletividade da norma inferior eram excecionais, pelo que era comum
aludir-se à “singular imperatividade”.
Para além daquela sua função central e nuclear, sempre o Direito do Trabalho desempenhou
outras funções, entre elas a de ser um importante instrumento de gestão, no plano económico,
preocupado com a salvaguarda da eficiência e da competitividade das empresas.
Nos últimos anos as prioridades se inverteram: a preocupação central do Direito do Trabalho
parece hoje consistir na garantia de eficiência económica das empresas, só em segundo plano
surgindo a promoção da equidade nas relações de trabalho; e, no tocante à negociação coletiva, a
sua histórica função de melhoria das condições de trabalho aparece hoje subalternizada e
substituída pela função de flexibilização e adaptação das normas aos interesses da empresa.
Surgiu então o artigo 4º nº1 CT preceituando que “as normas deste Código podem, sem
prejuízo do disposto no número seguinte, ser afastadas por instrumento de regulamentação
coletiva de trabalho, salvo quando delas resultar o contrário”. Extraiu-se que, em princípio, o Direito
do Trabalho legislado possui um caráter facultativo ou supletivo face à contratação coletiva.
Em suma, no campo da concorrência e articulação das fontes juslaborais, estamos perante um
Direito do Trabalho mais flexível, em que a contratação coletiva já não é concebida como um
instrumento primordialmente vocacionado para melhorar as condições de trabalho relativamente
à lei, mas antes como um puro mecanismo de adequação da lei às circunstâncias e às
conveniências da organização produtiva.
Vistas as coisas sob este prisma, a autonomia privada coletiva como que se emancipava da
tutela legal, ganhando maioridade e deixando de ser espartilhada pela lei…
No campo laboral, o reconhecimento da autonomia coletiva não se processou nunca contra a heteronomia
estadual, mas sim contra o poder decisório unilateral do empregador. Com efeito, o Direito do Trabalho,
afirmou-se historicamente e consolidou-se dogmaticamente com base na conjugação dialética de
dois fenómenos – legislação estadual regulamentadora das condições de trabalho e normação
convencional disciplinadora do conteúdo das relações laborais ao nível da empresa, da profissão
ou do setor de atividade.
Com efeito, a lei e o tradicional princípio do favor laboratoris nunca impediram que a autonomia
coletiva se exercesse, cumprindo a principal missão que cabe à contratação coletiva: a missão de
servir de instrumento de melhoria das condições de trabalho.
Aquando da elaboração do atual CT, o grande problema que se colocava nesta matéria
consistia, justamente, em saber se o princípio do tratamento mais favorável, liquidado em 2003,
iria ou não ser reposto em vigor. Será que o favor laboratoris, enquanto “princípio presuntivo”, não
deveria ser ressuscitado pelo novo legislador do trabalho?
O artigo 3º nº 1 CT dá a resposta “As normas legais reguladoras de contrato de trabalho podem
ser afastadas por instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho, salvo quando delas
resultar o contrário.
Significa isto que o CT não trouxe quaisquer novidades neste domínio? Não. Com efeito, o nº3
do seu artigo 3º não deixa de elencar um amplo conjunto de matérias cujo regime jurídico possui,
em princípio, um caráter relativamente imperativo.
Aqui temos um bloco normativo que, em princípio, gozará de imperatividade relativa ou
imperatividade mínima. E, note-se ainda, fora deste bloco normativo também poderá haver casos
de imperatividade relativa (artigo 112º nº5 CT) ou de imperatividade absoluta (artigo 339º nº1
CT).
O atual CT situa-se numa linha de perfeita continuidade em relação ao diploma que o
precedeu. Assim, e em princípio, as normas legais continuam a possuir um caráter dispositivo ou supletivo
face à contratação coletiva, pelo que poderão ser afastadas in pejus por esta (artigo 339º nº1).
A regra deveria ser a de que o legislado é “insuscetível de desmelhoramento” mediante o negociado.
Poderia haver, sem dúvida, exceções a esta regra. Mas aquela regra de princípio não deveria ser
subvertida.
O nomen iuris e o “princípio da primazia da realidade” – “os contratos são o que são, não o que as partes
dizem que são”, eis um princípio geral do Direito que encontra intensa aplicação em sede juslaboral.
Na verdade, as partes são livres para concluir o contrato x ou o contrato y, mas já não o são para
celebrar o contrato x dizendo que celebraram o contrato y (artigo 405º CC).
A liberdade contratual não se confunde, pois, com a manipulação ilícita da qualificação da
relação. Trata-se, afinal, de dar prevalência à vontade real das partes, desvelada pela execução
contratual, sobre a vontade declarada.
As relações jurídico-laborais definem-se pela situação de facto, isto é, pela forma como se
realiza a prestação de serviços, pouco importando o nome que lhe foi atribuído pelas partes.
O artigo 12º do CT de 2003, veio consagrar uma “presunção de laboralidade”. Fê-lo nos
seguintes termos: (só à contrato de trabalho se)
❖ O prestador de trabalho esteja inserido na estrutura organizativa do beneficiário da
atividade e realize a sua prestação sob as orientações deste;
❖ O trabalho seja realizado na empresa beneficiária da atividade, respeitando um horário
previamente definido;
❖ O prestador de trabalho seja retribuído em função do tempo despendido na execução da
atividade;
❖ Os instrumentos de trabalho sejam essencialmente fornecidos pelo beneficiário da
atividade;
❖ A prestação de trabalho tenha sido executada por um período, ininterrupto, superior a
90 dias.
A situação alterou-se com o atual CT. A “presunção de laboralidade” continua presente, mas
agora nos seguintes termos:
❖ A atividade seja realizada em local pertencente ao seu beneficiário ou por ele
determinado;
❖ Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertençam ao beneficiário da
atividade;
❖ O prestador de atividade observe horas de início e de termo da prestação;
❖ Seja paga uma quantia certa ao prestador de atividade;
❖ O prestador de atividade desempenhe funções de direção.
De certa forma, esta presunção representa uma simplificação do método indiciário tradicional, visto
que, como ponto de partida, ela dispensa o intérprete de proceder a uma valoração global de todas
as características pertinentes para a formulação de um juízo conclusivo sobre a subordinação.
Por último, instituindo mecanismos de combate à utilização indevida do contrato de
prestação de serviço em relações de trabalho subordinado, designadamente criando uma nova
ação judicial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho (Lei nº 63/2013, de 27 de agosto). Esta
lei atribui à ACT o dever de, detetados indícios de trabalho subordinado camuflado de trabalho
autónomo, lavrar um auto e notificar o empregador para, no prazo de 10 dias, regularizar a
situação.
Relação com vocação para perdurar no tempo, relação que preenche, por inteiro, a “vida
laboral” do cidadão-trabalhador, relação bilateral em que o trabalhador/homem presta a respetiva
atividade em prol de um único sujeito bem definido, que o remunera e que conforma a sua conduta
emitindo as correspondentes ordens e instruções, relação que se desenvolve num quadro
empresarial – eis alguns dos traços caracterizadores da chamada “relação laboral típica” ou
relação laboral standard.
Requisitos materiais – o artigo 140º nº1 CT afirma “o contrato de trabalho a termo resolutivo só pode
ser celebrado para satisfação de necessidade temporária da empresa e pelo período estritamente necessário à
satisfação dessa necessidade”. Este sistema de cláusula geral, radicando a admissibilidade de
aprazamento do contrato de trabalho na satisfação de necessidades temporárias da empresa, vem
a ser complementado pelo nº2 do aludido preceito, através de uma enumeração exemplificativa
daquilo que se entende por “necessidade temporária da empresa”.
A lei autoriza a celebração de contratos precários em ordem à satisfação de necessidades
meramente transitórias das empresas. Nesta lógica, se a necessidade é transitória, o
correspondente contrato de trabalho pode ser temporário, se a necessidade for permanente, então
já o contrato deverá ser de duração indeterminada. E o sistema exigente de lei desembocaria na
regra enunciada no artigo 147º CT, segundo a qual se considera sem termo o contrato de trabalho
em que a estipulação da acessória tenha por fim iludir as disposições que regulam o contrato sem
termo, bem como o celebrado fora dos casos previstos no artigo 140º.
O certo é que a expressão “necessidade temporária da empresa” é bastante vaga e indeterminada,
remetendo-nos para o próprio empregador, uma vez que em boa medida vem a ser ele que, no
exercício dos seus poderes de gestão empresarial, acaba por definir o que corresponde a uma
necessidade deste tipo.
Aquela paisagem harmoniosa resultante da conjugação entre os artigos 140º nº1 e 2 e 147º nº1,
corresponde, tão-só, a uma parte da realidade. É que o artigo 140º apresenta ainda outros
números, máxime o número 4.
Ou seja, para além das situações “clássicas”, em que o contrato a prazo surge como instrumento
privilegiado de satisfação de necessidades temporárias, a nossa ordem jurídica perspetiva esta
modalidade contratual como um instrumento de dinamização do investimento empresarial e como uma
medida de fomento do emprego.
A verdade é que e ao invés do que sugere o nº1 do artigo 140º, o contrato a termo pode ser celebrado
para satisfazer necessidades permanentes da empresa.
O artigo 140º CT ilustra as tensões que atualmente assolam o Direito do Trabalho. Um direito em
que a lógica “social” se confronta com uma lógica “económica”, pós-moderna – o emprego, ainda
que precário, é preferível ao desemprego.
Além de uma base estrutural, que corresponde à satisfação de necessidades temporárias de
trabalho, a lei fornece ainda uma base mais conjuntural para a contratação a termo, ampliando o
espaço de atuação desta modalidade contratual.
Requisitos formais – o artigo 141º nº1 prescreve “o contrato de trabalho a termo está sujeito a forma
escrita e deve conter: alínea a), b), c), d), e), f). A propósito destes requisitos de ordem formal, dois
aspetos merecem, particular destaque:
❖ A lei exige que, no indispensável documento escrito, seja indicado o motivo justificativo da
contratação a termo. Caso não seja indicado, a consequência é a prevista no nº1 alínea c
do artigo 147º. Caso seja indicado, mas não exista terá aplicação o nº 1 a e b do artigo 147º
- sendo certo que, em ambos os casos, o contrato de trabalho é tido como um contrato
sem termo. A lei impõe, portanto, que o documento contratual seja revelador, que não
seja vago ou opaco, que permita um controlo externo da situação (artigo 147º nº1 c).
❖ A inobservância da forma escrita não implica a nulidade do contrato de trabalho, mas
apenas a nulidade da cláusula de termo resolutivo. As falhas ou insuficiências formais revertem
contra o empregador, pois a sua consequência traduz-se na transformação do vínculo
laboral, que passará de precária a estável, sendo reconduzido ao contrato standard. O
artigo 147º nº1 c é eloquente a este respeito.
A tríade normativa que temos vindo a analisar (artigos 140º, 141º e 147º) constitui o “núcleo duro”
do regime jurídico da contratação a termo. E pode dizer-se que se trata de outras tantas projeções
da garantia constitucional da segurança no emprego no seio de um contrato precário como é o
contrato a prazo. O artigo 139º reitera que o regime legal do contrato a termo poderá ser afastado
por IRCT, com as ressalvas constantes da parte final do preceito.
O CT estabelece ainda um princípio de igualdade de tratamento entre o trabalhador contratado
a termo e o trabalhador permanente (artigo 146º).
Entretanto, em matéria de contrato a prazo o CT manteve a dicotomia básica termo certo/termo
incerto.
Termo certo – quando as partes apõem a um negócio jurídico uma cláusula de termo resolutivo
certo, isso significa que a cessação desse negócio fica colocada na dependência de um evento
futuro suplemento certo: sabe-se que ele irá ocorrer e sabe-se a data em que ele irá ocorrer. Em
sede de contrato de trabalho é esta a modalidade mais difundida de contrato a termo.
Vejamos alguns aspetos do atual regime jurídico do contrato de trabalho a termo certo.
Admissibilidade: a celebração de contrato a termo certo é legalmente admissível em qualquer
uma das situações enunciadas no artigo 140º CT. Em suma, e diferentemente do que sucede em
matéria de contratação a tempo incerto, todas as situações abarcadas pelo artigo 140º se revelam
idóneas para justificar o recurso a esta submodalidade contratual.
Duração: o contrato a termo dura pelo período convencionado. Mas esse período acordado terá
de respeitar as balizas legais, que são as seguintes: a) tratando-se de contrato destinado à
satisfação de necessidade temporária da empresa, o mesmo só poderá ser celebrado “pelo período
estritamente necessário à satisfação dessa necessidade”, como se lê no artigo 140º nº1. O contrato poderá
ter uma duração coincidente com a da necessidade temporária da empresa ou ter uma duração
inferior ao período em que, previsivelmente, essa necessidade se fará sentir. Mas o contrato já não
poderá ser celebrado por um período que exceda a duração previsível da necessidade temporária
da empresa (artigos 140º nº1 e 147º nº1 b);
b) segundo o que dispõe o nº 2 do artigo 148º, o contrato só poderá ser celebrado por prazo
inferior a 6 meses nas situações previstas nas alíneas a) e g) do nº2 do artigo 140º. Logo, se o
fundamento da contratação a termo certo for o da alínea h) do nº2 do artigo 140º, ou se for o nº4,
em todos estes casos encontrará aplicação o limite mínimo de 6 meses de duração. E, sendo esta
norma violada, o contrato que corresponda à satisfação de necessidades temporárias da empresa;
c) o CT veio prever casos especiais de contratação de muita curta duração, no artigo 142º
(contrato de trabalho em atividade sazonal agrícola ou para realização de evento turístico de
duração não superior a 15 dias);
d) de acordo com o artigo 148º nº1, em regra a duração do contrato a termo certo não poderá
exceder os 2 anos, incluindo renovações, nem este contrato poderá ser renovado mais de 3 vezes;
e) a lei mostra-se mais exigente quanto à duração máxima dos contratos a termo celebrados ao
abrigo do nº 4 do artigo 140º;
f) a ultrapassagem dos prazos de duração produzirá a mesma consequência: o contrato converter-
se-á num contrato sem termo (artigo 147º nº2 b CT);
g) procurando combater as práticas fraudulentas, o artigo 148º nº6 dá a resposta.
Renovação: ao invés do que, porventura, seria de esperar, vigora nesta matéria uma regra
supletiva de renovação automática. O sistema legal facilita a renovação do contrato para que o
mesmo caduque por expiração do prazo, é necessário que alguma das partes acione a caducidade,
procedendo à comunicação prevista no artigo 344º nº1 CT. Ou seja, em lugar de a caducidade
operar automaticamente, o que opera automaticamente é a renovação contratual.
Termo incerto – as reservas que admitem o contrato a termo se adensam quando se trata do
contrato a termo incerto. Aqui, com efeito, o trabalhador vê-se colocado numa situação de maior
instabilidade. O termo incerto caracteriza-se por ser um evento certo quanto à sua verificação,
mas incerto quanto à data em que a mesma irá ocorrer.
Admissibilidade: as situações em que a lei concede luz verde para que as partes oponham um
termo incerto ao contrato de trabalho encontram-se tipificados no artigo 140º nº3 CT. Ao
contrário do que sucede no nº2 do artigo esta é uma tipificação taxativa (só existe contrato a termo
incerto se verificarem algumas situações). As partes dispõem de total liberdade para optar pela
modalidade contratual que mais lhes aprouver: contrato a termo certo ou contrato a termo
incerto.
Duração: este durará por todo o tempo necessário para a substituição do trabalhador ausente ou
para a conclusão da atividade cuja execução justifica a respetiva celebração. Tudo dependerá,
afinal, do tempo necessário para substituir o trabalhador transitoriamente ausente ou para
concluir a atividade, tarefa, obra ou projeto previstos no contrato. O CT inovou,
estabelecendo que a duração do contrato a termo incerto não pode ser superior a 4 anos (artigo
148º nº5). Após esses 4 anos, a lei não mais poderá servir de credencial para um contrato precário.
Vindo o prazo a ser excedido sem que o termo resolutivo incerto se tenha verificado, o contrato
converter-se-á num contrato sem termo (artigo 147º nº2 b CT).
Caducidade: tendo em conta a natureza da cláusula de termo resolutivo incerto, compreende-se
que não haja aqui lugar para qualquer renovação do contrato. O CT procura evitar que o
trabalhador seja surpreso pela brusca extinção do seu contrato, pelo que obriga o empregador a
proceder a um aviso prévio (artigo 345º nº1 e 3).
A verificação do termo resolutivo constitui condição necessária, mas também condição
suficiente, para que o contrato caduque. O aviso prévio patronal não é condição indispensável
para a caducidade do contrato. Caducando o contrato a termo incerto, o trabalhador sempre
terá direito a uma compensação pecuniária, calculada nos termos do artigo 345º nº4; em caso de
fração de ano, o montante de compensação será calculado proporcionalmente, como decorrente
do disposto no artigo 366º nº2 d; o contrato a termo incerto poderá converter-se num contrato
sem termo, ao abrigo do disposto no artigo 147º nº2 c CT.
Conversão: artigo 147º nº2 c. A estatuição – conversão do contrato a termo incerto num contrato
de duração indeterminada – aplicar-se-á em 2 hipóteses distintas: havendo comunicação patronal
(cumprindo o empregador o dever de pré-avisar o trabalhador nos termos do artigo 345º CT, caso
o trabalhador se mantenha ao serviço após a data de produção de efeitos daquela comunicação);
não havendo comunicação patronal (caso o trabalhador ainda se mantenha ao serviço decorrido
15 dias depois da verificação do termo resolutivo). A verificação do termo resolutivo a que as
partes haviam subordinado o contrato como que leva a lei a presumir que, afinal, o trabalhador já
não está a desempenhar a específica função para que havia sido contratado – e, logo, a transformar
esse contrato num contrato sem termo.
Note-se que, mesmo havendo aquela comunicação patronal, a efetiva verificação do termo
resolutivo é sempre necessária para que o contrato caduque.
O trabalho temporário:
O chamado “trabalho temporário” analisa-se também num esquema contratual atípico. É que
a relação laboral tradicional se estabelece entre dois sujeitos bem definidos: o trabalhador e o
empregador. Ora, no trabalho temporário as coisas passam-se de outra forma, visto que aqui se
assiste a uma relação protagonizada por 3 sujeitos. Temos uma dialética mais complexa, entre
o trabalhador temporário, a empresa do trabalhador temporário e o utilizador, dando azo,
portanto, a um modelo tripartido do vínculo laboral.
O trabalhador temporário arrisca-se, como alguém escreveu, a servir “dois amos”: a empresa
que o contrata e a empresa que o emprega. O esquema contratual atípico liga 3 sujeitos através de
dois negócios jurídicos, a saber: a) o contrato de trabalho celebrado entre uma empresa de
trabalho temporário e o trabalhador, pelo qual este se obriga, mediante retribuição daquela, a
prestar temporariamente a sua atividade a utilizadores, mantendo o vínculo jurídico-laboral à
empresa de trabalho temporário; b) o contrato de utilização de trabalho temporário, contrato de
prestação de serviço celebrado entre um utilizador e uma empresa de trabalho temporário, pelo
qual esta se obriga, mediante retribuição, a ceder àquele um ou mais trabalhadores temporários.
É um modelo racional tripartido, mas não propriamente triangular (visto que não existe
um contrato entre o trabalhador temporário e a empresa utilizadora).
O contrato que liga o trabalhador temporário à empresa de trabalho temporário pode ser, mas
não tem de ser, um contrato a prazo ou a termo. A expressão “trabalho temporário” pode, com
efeito, revelar-se algo enganadora. Mas, segundo a lei, o vínculo contratual daquele tanto poderá
ter um caráter precário (artigo 172º a CT) como estável (artigo 172º b CT). Este vínculo será
constituído por tempo indeterminado ou a termo, e, nos dois casos, o trabalhador prestará a sua
atividade temporariamente ao terceiro utilizador.
✓ Em suma
A empresa de trabalho temporário remunera o trabalhador temporário; e a empresa utilizadora remunera a
empresa de trabalho temporário (artigo 172º c CT); e ambas exercem as suas prerrogativas sobre o trabalhador,
cabendo o exercício do poder disciplinar à empresa de trabalho temporário (artigo 185º nº4) e competindo o poder
de direção à empresa utilizador (artigo 185º nº2 e 3).
O trabalho intermitente:
Noção. O genus e as espécies – trata-se de uma modalidade contratual que poderá ser utilizada
em empresas que exerçam “atividade com descontinuidade ou intensidade variável” e que se
caracteriza pela circunstância de a prestação de trabalho ser “intercalada por um ou mais
períodos de inatividade” (artigo 157º nº1 CT). Trata-se de adaptar a prestação de trabalho, de
forma elástica, às variadas e mutáveis exigências produtivas da empresa moderna, as quais, por
vezes, implicam que os períodos de prestação de trabalho se sucedam períodos de inatividade
laboral.
Este deverá conter a indicação do número anual de horas de trabalho ou do número anual de dias
de trabalho (artigo 158º nº1 b). As partes estabeleçam no contrato o início e o termo de cada
período de trabalho (artigo 159º nº1); quando a prestação não é antecipadamente determinada, o
trabalhador obriga-se a responder às solicitações da entidade empregadora (artigo 159º nº1).
Poderá se concluir que o trabalho intermitente previsto na nossa lei se desdobra em duas
submodalidades: o trabalho alternado e o trabalho à chamada.
Trabalho intermitente e trabalho a tempo parcial – a distinção entre o trabalho a tempo parcial
anualizada e o trabalho intermitente parece mostrar-se evanescente, registando-se uma certa
sobreposição funcional entre ambas as figuras. No trabalho intermitente o trabalhador
compromete-se a atender às solicitações do empregador, tendo de estar disponível para o efeito e
sendo também especialmente retribuído por essa situação de heterodisponibilidade.
O contrato é intermitente, não apenas porque a atividade laboral apresenta interrupções,
alternando fases de trabalho com períodos de inatividade, mas, acima de tudo, porque quem gere
aquela intermitência, quem marca o ritmo, é o empregador, a quem caberá definir quando se
trabalha e quando se paralisa a atividade, quando o trabalhador está on e quando estará em stand-
by.
Forma e conteúdo – está sujeito a forma escrita e deve conter a indicação do número de horas
de trabalho, ou do número anual de dias de trabalho a tempo completo (artigo 158º nº1); a falta
de redução a escrito ou a falta de indicação no mesmo do volume anual de trabalho implica que o
contrato se tenha como celebrado sem intermitência, sem período de inatividade (artigo 158º nº2).
Segundo o artigo 159º, as partes devem estabelecer a duração da prestação de trabalho, de modo
consecutivo ou interpolado, bem como o início e o termo de cada período de trabalho ou a
antecedência com que o empregador deve informar o trabalhador do início daquele.
O CT refere-se ao trabalho intermitente como modalidade contratual pelo qual as partes optam
ab initio, aquando da celebração do contrato de trabalho. Nada impede, porém, que o trabalho
intermitente resulte da modificação de um contrato de trabalho standard (artigos 158º e 159º CT),
bem como supondo que, a empresa exerce a atividade com “descontinuidade ou intensidade variável”,
nos termos do artigo 157º nº1.
A comissão de serviço:
Consiste numa cláusula acessória que poderá ser aposta ao contrato de trabalho quando em
causa esteja um certo tipo de funções a desempenhar pelo trabalhador, caracterizadas, todas elas,
por uma especial relação de confiança interpessoal.
A figura de comissão de serviço sugere a ideia de preenchimento transitório de um lugar, bem como
a de uma deslocação funcional do trabalhador. O traço mais marcante do respetivo regime jurídico
consiste na circunstância de a comissão de serviço poder cessar, a todo o tempo, por simples
manifestação de vontade de qualquer um dos sujeitos.
Para que tipo de funções admite a lei a utilização desta modalidade contratual? O artigo 161º
prevê 3 tipos de hipóteses. Trata-se, pois, necessariamente, de relações de trabalho marcadas por
um particular laço fiduciário.
Aqui, importa destrinçar as duas grandes modalidades da comissão de serviço laboral (artigo
162º nº1): comissão de serviço “em sentido técnico” (o trabalhador a título transitório, passará a
desempenhar outras funções) e comissão de serviço “em sentido amplo”.
Está sujeita à forma escrita, devendo conter a indicação do cargo ou funções a desempenhar
(artigo 162º nº3). Caso não seja escrito haverá a consequência escrita no artigo 162º nº4. Para além
disto, há que distinguir: no caso de comissão “interna” (artigo 162º nº3 c); no caso de comissão
“externa” (artigo 162º nº2 e 3 d). No artigo 163º nº1 vislumbra-se o problema jurídico-
constitucional: a decisão unilateral do empregador viola o princípio da casualidade do
despedimento, colocando em crise o artigo 53º CRP.
Também é importante distinguir entre comissão de serviço com e sem garantia de emprego. Neste
último caso aquilo que temos é um trabalhador que pode ser livremente despedido pelo
empregador. Tratando-se do primeiro caso o trabalhador mante-se ao serviço da empresa e se
terminar poderá receber uma indemnização (artigo 366º).
O teletrabalho:
✓ Em suma
Deparamos aqui com uma “equiparação limitada” do trabalho no domicílio com dependência económica ao
trabalho subordinado.
Capacidades das partes: o trabalho de menores – “a capacidade para celebrar contrato de trabalho
regula-se nos termos gerais do direito e pelo disposto neste Código” segundo o artigo 13º CT. Sabe-se que a
capacidade jurídica, ou capacidade de gozo, consiste na aptidão para ser titular de determinadas
relações jurídicas (artigo 67º CC). E sabe-se que a capacidade de agir, ou capacidade de exercício,
consiste na aptidão para atuar juridicamente por ato próprio e exclusivo, isto é, para atuar pessoal
e autonomamente. A incapacidade de gozo é insuprível, ao passo que a incapacidade de
exercício é suprível através da representação legal ou da assistência.
No que à capacidade negocial diz respeito, as questões que maior relevo assumem, em sede
juslaboral, prendem-se com os trabalhos dos menores.
As respostas a estas questões, por um lado, obedece a um “princípio gradualista”, modificando-se
o regime jurídico e aligeirando-se as exigências legais à medida que o menor se vai aproximando
da maioridade; por outro lado, a resposta revela-se muito diversificada, em função do tipo de
atividade que o menor se compromete a realizar. Em sede de contrato de trabalho não se trata
apenas de salvaguardar a posição do menor enquanto sujeito que emite uma determinada
declaração de vontade, mas sobretudo evitar que a execução do contrato comprometa o normal e
saudável desenvolvimento do menor, bem como a sua educação e adequada formação. Daí que o
regime jurídico oscile, em função de os trabalhos a prestar pelo menor terem tidos como “leves”
ou, no outro extremo, como “prejudiciais ao desenvolvimento físico, psíquico e moral dos
menores”.
A resposta do ordenamento varia, tendo em conta o tipo de trabalho a prestar pelo menor. Se, em
regra, a fasquia é colocada nos 16 anos (nesta idade adquire a capacidade de gozo para ser titular
de uma relação jurídico-laboral, um pouco à imagem do que sucede com o casamento), a verdade
é que a lei, ora suaviza as exigências, ora endurece o regime.
Ainda que se possa dizer que, em regra, a capacidade jurídica surge, neste campo, aos 16 anos de
idade, isso por si só não significa que um menor com 16 ou com 17 anos disponha, igualmente, de
capacidade negocial do exercício.
A resposta colhe-se do disposto no artigo 70º CT, que institui o sistema gradualista a que acima se
fez alusão. Assim é que:
❖ Artigo 70º nº2 CT;
❖ Artigo 70º nº1 CT.
Ou seja, nos casos do nº2 a lei exige um ato positivo dos representantes legais do menor – a
autorização – para que o contrato de trabalho por este celebrado seja válido. Nos casos do nº1, a
lei basta-se com uma omissão dos representantes – a não oposição – para a respetiva validade.
No que tange à capacidade para receber a retribuição devida pelo seu trabalho, a lei determina que, em
princípio, o menor dispõe da mesma, “salvo oposição escrita dos seus representantes legais” (artigo 70º
nº3 CT). Ou seja, a lei parece permitir que os representantes, por um lado, autorizem/não se
oponham à celebração do contrato pelo menor, mas já se venham opor a que este, prestado que
seja o trabalho, receba a correspondente retribuição…
Importa não confundir o trabalho de menores com o chamado trabalho infantil (trabalho ilegal de
menores, trabalho proibido, sendo combatido muitas vezes pelo Direito penal) – artigo 66º nº1
CT.
A emancipação do menor não prejudica a aplicação das normas relativas à proteção da saúde,
educação e formação do trabalhador menor, como esclarece o nº4 do artigo 66º CT.
Em Portugal, quid iuris? De jure constituto a resposta é claramente negativa, e isto por uma tripla
ordem de razões:
❖ Não existe qualquer normativo específico no qual se possa arrimar a validade dos
contratos que tenham por objeto a prática da prostituição;
❖ O nosso CC considera nulo qualquer negócio jurídico que seja “ofensivo dos bons costumes”.
É certo que este é um conceito indeterminado;
❖ O artigo 169º nº1 do Código Penal tipifica o crime de lenocínio. Esta proibição penal
impõe que as relações de trabalho assalariado que aqui eventualmente se desenvolvam
sejam organizadas na ilegalidade.
Fica a grande questão se para a União Europeia a prostituição é uma atividade económica, não
estaremos nós também a caminhar para o nascimento do contrato de trabalho prostitucional?
Fase pré-contratual e “direito à mentira” – artigo 102º CT. Ainda que esta disposição legal se
limite a mimetizar o artigo 227º CC, o certo é que, em sede laboral, a fase pré-contratual assume
uma delicadeza muito particular, em virtude da disparidade de poder entre os sujeitos e da
posição de extrema vulnerabilidade em que o candidato a trabalhar se encontra. As
discriminações ocorrem, amiúde, na fase pré contratual, tornando-se necessário proteger a pessoa
do candidato ao emprego e salvaguardar a sua posição negocial (artigo 106º nº2 e 17º nº1 CT).
E se o empregador violar estas proibições? Quid iuris? O trabalhador pode contestar a questão e/ou
recursar-se, legitimamente, a responder. Nestes casos o trabalhador pode calar-se, tem direito ao
silêncio. Mas não devemos reconhecer ao candidato ao emprego um direito à mentira?
A resposta é afirmativa. Só com uma indesculpável ingenuidade se ignora que o silêncio
comprometerá irremediavelmente as hipóteses de emprego do candidato. Julga-se, que neste tipo
de casos, o único meio suscetível de preservar a possibilidade de acesso ao emprego e de prevenir
práticas discriminatórias consiste em o trabalhador não se calar, antes dando ao empregador a
resposta que acha que este pretende ouvir. Prática contrária à boa fé? Penso que não.
✓ O formalismo negocial
Artigo 110º CT. Confirmando a regra estabelecida para os negócios jurídicos em geral (artigo
219º CC), também no domínio do contrato de trabalho vigora o princípio da liberdade de forma. Este
não é, por isso, um negócio solene.
O contrato forma-se mediante o encontro das vontades convergentes de ambos os
sujeitos, mas as respetivas declarações negociais não dependem, em princípio, da observância de
forma especial. Uma coisa é a forma legal, outra a forma voluntária, sendo bem conhecidas as
vantagens da formalização dos contratos, seja por permitir uma maior ponderação das partes, seja
por redundar numa formulação mais precisa da vontade dos sujeitos, facilitando a respetiva
prova.
Se a regra geral é a da consensualidade, o certo é que existem numerosas situações em que a
lei do trabalho se afasta da regra, sujeitando as declarações negociais a forma escrita. A leitura do
CT mostra-se elucidativa a este respeito (artigo 141º, 153º, 158º, 166º, 181º, 183º, 101º).
A inobservância da forma escrita implica a nulidade do contrato (artigo 220º CC)? Não, nem
sempre. Boa parte das situações em que a lei do trabalho exige a redução a escrito das declarações
negociais reconduz-se às chamadas “relações laborais atípicas”. Compreende-se que a inobservância
da forma escrita determine a recondução do contrato ao modelo standard. Casos há, é certo, em
que a inobservância da forma escrita determina a invalidade do contrato de trabalho (artigo 6º da
Lei nº54/2017).
Seja quanto aos requisitos formais estabelecidos, seja quanto à inobservância da forma legal, o Direito do
Trabalho procura dar expressão a um certo princípio da proteção do trabalhador nestas matérias.
Como qualquer outro negócio jurídico, também o contrato de trabalho poderá padecer
de invalidade, total ou parcial. A lei do trabalho dedica particular atenção a esta matéria, dos
artigos 121º a 125º CT.
Invalidade parcial – estas situações surgem com bastante frequência no campo juslaboral.
Figure-se um contrato de trabalho, integrado por diversas cláusulas estipuladas pelos respetivos
sujeitos, que apresenta uma cláusula cujo conteúdo é desconforme com a CRP, com a lei ou com
a convenção coletiva aplicável. Será que esta invalidade parcial vai alastrar a todo o contrato? Que efeitos
produz, afinal, a invalidade parcial do contrato de trabalho?
O critério geral de resolução das questões de invalidade parcial, consagrado no CC, assenta no
recurso à chamada vontade hipotética ou conjetural das partes (artigo 292º CC). Ou seja, tudo depende
da indagação de qual teria sido a vontade das partes se soubessem que o negócio continha uma
parte viciada: teriam celebrado na mesma ou esta parte viciada era demasiado importante para
celebrarem o contrato? Na primeira hipótese, procede-se à redução do negócio jurídico. Na
segunda, a invalidade parcial redundará na invalidade total do contrato, com a parte viciada a
alastrar e a contaminar todo o negócio.
Valerá este critério da vontade hipotética ou conjetural das partes em sede juslaboral? O CT
responde a esta questão no artigo 121º dando uma resposta positiva no seu nº1, mas acabando por
se afastar deste critério no nº2.
No artigo 121º nº1 CT dir-se-ia que o legislador do trabalho teria ratificado o critério acolhido no
artigo 292º CC. Conclui-se que assim fosse, algo não estaria bem (a parte viciada revela-se um
elemento imprescindível à contratação e logo a nulidade parcial conduziria à nulidade total do
contrato de trabalho.
Segundo o artigo 121º nº2 CT, quando a invalidade parcial resultar do facto de haver cláusulas
contratuais que violem normas imperativas, a lei prescinde do recurso à vontade hipotética ou
conjetural das partes, optando antes por aplicar uma técnica de substituição automática das cláusulas
inválidas pelas normas invalidantes. Assim, eliminam-se as cláusulas viciadas e estas são substituídas
pelas normas que estavam a ser violadas (“redução teleológica do contrato”).
À luz da solução ex nunc vertida no supracitado artigo 122º nº1 CT, outras normas constantes da
mesma secção deste diploma ganham sentidos: artigo 122º nº2, artigo 123º e o artigo 125º nº1.
Significa isto, quanto a este último ponto, que se a invalidade do contrato de trabalho executado
não produz efeitos retroativos, já a convalidação retroage ao momento da celebração do contrato,
na hipótese de a causa de invalidade desaparecer no decurso da respetiva execução.
✓ O período experimental
Regime jurídico – o período experimental tem como noção o artigo 111º nº1 CT. Trata-se da
primeira fase do ciclo vital do contrato, fase em que o vínculo jurídico-laboral revela ainda uma
grande fragibilidade, apresentando escassa consistência e sendo facilmente dissolúvel por
qualquer das partes.
O período de experiência consiste numa figura cautelar, possibilitando uma certificação mútua:
o empregador certifica-se que o trabalhador possui as aptidões laborais requeridas para o cabal
desempenho das funções ajustadas; o trabalhador certifica-se de que as condições da realização
da sua atividade profissional são as esperadas. Qualquer uma das partes pode denunciar o
contrato sem aviso prévio ou justa causa (artigo 114º nº1 CT).
No entanto o nº2 do artigo 114º CT obriga o empregador a conceder um aviso prévio de 7 dias ao
trabalhador, caso decida denunciar o contrato depois de o período experimental já ter durado
mais de 60 dias. E no caso de ser superior a 120 dias (artigo 114º nº3 CT). Se não se verificar o aviso
prévio a consequência está regulada no nº4 do mesmo preceito.
Há um caráter formalmente bilateral da experiência. Segundo Raul Ventura “ao período de experiência
do trabalhador pelo patrão junta-se o período de experiência do patrão em favor do trabalhador”. Este assume-
se como um instituto limitador do risco empresarial, assegurando ao empregador a indispensável
margem de erro e representando o preço que o ordenamento jurídico terá de pagar a troco da
garantia de estabilidade no emprego.
Qual a duração do período experimental? Depende (artigo 112º nº2, nº1). Estas normas relativas à
duração do período experimental apresentam um caráter de imperatividade mínima, visto que as
fontes inferiores não podem aumentar a duração daquele período, apenas podendo reduzi-la
(artigo 112º nº5 CT).
O período experimental é encarado como um elemento acidental, ou como um elemento natural, do
contrato de trabalho? À luz do nosso ordenamento jurídico, o período experimental consiste num
elemento natural do contrato, não carecendo de ser estipulado para existir (artigo 111º nº3 CT).
O período experimental traduz-se numa espécie de válvula de escape de um sistema que tutela a estabilidade no
emprego e restringe os despedimentos, servindo basicamente para que o empregador aprecie o desempenho
profissional e avalie as capacidades laborais do trabalhador recém-contratado.
O período experimental e o artigo 53º CRP – artigo 53º CRP, lê-se por seu turno o nº1 do artigo
114º CT. A lei permite aquilo que a CRP proíbe: o despedimento sem justa causa. O trabalhador
encontra-se numa posição de vulnerabilidade pois vigora a regra do “despedimento livre”. O
contraste entre o preceito constitucional e o período experimental mostra-se nítido e
insofismável. O período experimental encontra-se no limiar da inconstitucionalidade.
Surge como um instituto vocacionado para reduzir o risco empresarial, conferindo ao empregador
a faculdade de verificar, a posteriori, aquilo que não lhe é possível saber a priori, por mais entrevistas
e análises curriculares que efetue: saber se o trabalhador que executa o contrato está à altura do
trabalhador que o celebrou, saber, em suma, como é o trabalhador in action.
O trabalhador não dispõe de qualquer espécie de estabilidade no emprego. Este encontra-se
“à prova” e quem vai ajuizar se este supera ou não é exclusivamente, o empregador, exercendo um
poder discricionário virtualmente insindicável pelo tribunal.
Trata-se de uma figura que se situa em manifesta rota de colisão com a garantia da segurança no
emprego, o que implica a respetiva submissão a um rigoroso e exigente crivo de requisitos, em
ordem a que o mesmo não se venha a revelar inconstitucional.
A questão da duração do período experimental surge como questão regimental verdadeiramente
nuclear, como autêntica trave-mestra deste instituto. Durante o período estritamente necessário
para verificar se o trabalhador possui ou não as qualidades requeridas para o desempenho do
cargo para o qual foi contratado; durante esse período e apenas durante esse período.
Este período só encontra justificação se, no tocante à sua duração, for respeitado o princípio da
proporcionalidade, na sua tríplice dimensão: conformidade ou adequação de meios,
necessibilidade ou exigibilidade, e proporcionalidade em sentido estrito (artigo 112º nº1 a CT).
A Lei nº93/2019, ainda que tenha sido apresentada como uma lei de combate à precariedade laboral, resolveu
inovar nesta matéria (alargando o período experimental) – Leal Amado considera que assim trata-se de uma
norma inconstitucional
✓ O empregador e a empresa
O respeito devido à dignidade do trabalhador enquanto pessoa implicava que este podia opor-
se, rompendo, de imediato, a ligação contratual e assim fazendo abortar a transmissão do vínculo
laboral para o adquirente do estabelecimento.
Com a Lei nº14/2018 muita coisa mudou. E mudou, sobretudo, no que tange ao “direito de
oposição” do trabalhador, isto é, aos termos em que tal direito, nas suas diversas dimensões, pode
ser exercido, bem como no atinente às consequências do exercício desse direito.
Lê-se agora o novo artigo 286º-A do CT, aditado por esta lei.
Através deste novo artigo, o nosso legislador veio reconhecer expressis verbis ao trabalhador o
“direito à oposição” na sua mais pujante dimensão. Este direito poderá assentar em 1 de 2
fundamentos: ou porque a transmissão do estabelecimento se mostre suscetível de causar
prejuízo sério ao trabalhador, ou então porque, independentemente de qualquer prejuízo sério, a
política de organização do trabalho do adquirente não merece confiança ao trabalhador.
Ao exercer o seu direito de oposição, por escrito, o trabalhador deverá indicar qual o respetivo
fundamento, como resulta do disposto no nº3 do artigo 286º-A CT.
Leal Amado creia que nem seria necessário o legislador buscar fundamentos distintos para o
exercício deste direito de oposição por parte do trabalhador (trata-se de afirmar o princípio
básico da liberdade contratual).
Vale dizer, a tutela da dignidade do trabalhador, da sua autonomia, da sua liberdade contratual
negativa, tudo aponta para que o trabalhador possa opor-se, possa dizer não, apenas e tão só
porque não, sem necessidade de fundamentar a sua decisão. No entanto, o legislador considera
que o trabalhador deve comunicar ao empregador as razões da sua oposição.
A norma constante do nº1 do artigo 286º-A, afasta-se da melhor redação, mas também se afasta
da pior redação. O legislador emite sinais contraditórios.
Leal Amado reitera do nº1 do artigo 286º-A CT o seguinte: o trabalhador goza do direito de oposição à
transmissão da posição de empregador no seu contrato de trabalho, seja porque esta é suscetível de lhe causar
prejuízo sério, seja porque, independentemente de tal prejuízo, a política de organização de trabalho do adquirente
não lhe merece confiança.
Ou seja, a nossa lei conseguiu alcançar o resultado final que ambicionava: o trabalhador pode dizer não à
transmissão da sua posição contratual para o adquirente/transmissário da unidade económica
O trabalhador que seja confrontado com a transmissão da empresa ou estabelecimento e que entenda que
essa transmissão lhe irá causar prejuízo sério ou que não confie na política de pessoal do adquirente, poderá
invocar essa transmissão para fazer cessar imediatamente o contrato, resolvendo-o com justa causa.
As novidades introduzidas pela Lei nº14/2018 não bastam para desmentir a centralidade do
fenómeno da empresa e da inserção do trabalhador na mesma para o Direito do Trabalho.
No entanto, apresentou um importante salto civilizacional. Com este diploma o ordenamento
jurídico-laboral evolui e, dir-se-ia, afina a sua sensibilidade: de uma tutela centrada na salvaguarda da
continuidade da relação de trabalho, em que a questão da identidade do empregador era, de algum modo,
subalternizada, a lei transita para um outro patamar, no qual a continuidade do emprego e a identidade do
empregador são, ambas, valorizadas.
Acontece, todavia, que aquilo que poderia representar um salto para frente, represente na
realidade um retrocesso civilizacional. Isto porque a lei confere o “direito de oposição” e a resolução
do seu contrato, mas isto apenas na eventualidade de a mudança de empregador lhe poder causar prejuízo
sério.
Ou seja, segundo esta leitura da nova lei, esta teria consagrado o direito de oposição do
trabalhador em moldes extremamente limitados. Em bom rigor, o legislador não teria atribuído tal
direito ao trabalhador em caso de transmissão de empresa, estabelecimento ou unidade económica, em nome da
sua autonomia, dignidade e liberdade contratual negativa. O legislador teria, apenas, consagrado tal direito na
hipótese de o trabalhador alegar e provar que a transmissão do seu contrato para o adquirente da empresa ou da
unidade económica lhe poderia causar um “prejuízo sério”.
Leal Amado discorda vivamente desta leitura do novo diploma.
Lendo o nº1 do artigo 286º-A do CT, não parece sustentável o entendimento de que, na parte final
do preceito, o que o legislador quis foi apenar deixar um exemplo de possível “prejuízo sério” para
o trabalhador. A lei soma ao prejuízo sério a ausência de confiança!
E se a letra da lei prevê esta dualidade de fundamentos para a oposição/resolução, creio que ainda
bem que é assim.
Devemos fazer prevalecer os princípios fundamentais (liberdade, autonomia e dignidade),
máxime o de que o trabalhador não é uma mercadoria.
A principal atividade das empresas de trabalho temporário consiste na cedência temporária
de trabalhadores a terceiros utilizadores. O “empréstimo” do trabalhador só é admissível através destas
empresas e mediante a celebração daqueles contratos?
A lei logo ressalva os casos previstos no Código ou em IRCT (artigo 129º º1 g). E a chamada cedência
ocasional de trabalhador constitui mesmo uma vicissitude contratual prevista e regulada nos artigos
288º a 293º CT. A cedência consiste num contrato através do qual uma entidade empregadora
cede provisoriamente a outro determinado trabalhador, conservando, no entanto, o vínculo
jurídico-laboral que com ele mantém e, daí, a sua qualidade de empregador. Ao invés do que
sucede na chamada cessão da posição contratual (artigo 424º CC), aqui o empregador-cedente não
sai de cena.
Trata-se de uma figura a que se recorre no âmbito dos grupos de empresas, consistindo num
instrumento privilegiado para enquadrar as situações de mobilidade interempresarial, sendo
certo que a lei exige que se preencham vários requisitos para que tal cedência seja admitida
(artigo 289º CT).
A lei exige uma declaração de concordância por parte do trabalhador, para que a cedência tenha lugar.
A cedência ocasional do trabalhador dá-se, pois, através de um negócio jurídico que parece
perfilar-se como um negócio trilateral, traduzindo-se o acordo do trabalhador numa declaração de
vontade imprescindível para a perfeição do contrato de cedência.
Quanto à figura da licença sem retribuição, em princípio a concessão de tais licenças carece da
vontade concordante das duas partes, trabalhador e empregador (artigo 317º CT).
❖ Normas que simplificam ou dispensam certo tipo de procedimentos, quando se trate de microempresas
(exemplo de o aligeiramento do procedimento disciplinar em sede de despedimento com
justa causa nas microempresas – artigo 352º a 358º CT).
Pense-se ainda na dispensa do procedimento previsto para os despedimentos coletivos, na
hipótese de encerramento total e definitivo de uma microempresa (artigo 346º CT).
❖ Normas que atendem ao “fator relacional”, isto é, à particular intensidade do laço fiduciário/pessoal
estabelecido entre os sujeitos do contrato de trabalho nas microempresas. Topamos aqui uma das
mais emblemáticas e controversas normas constantes do artigo 392º CT, o qual veio
conceder à entidade empregadora uma faculdade até então inexistente no nosso
ordenamento jurídico: a faculdade de oposição à reintegração do trabalhador ilicitamente
despedido.
Caso a oposição patronal à reintegração do trabalhador seja julgada procedente pelo tribunal, o
trabalhador terá direito a uma indemnização substitutiva, cujo montante será fixado pelo
tribunal (artigo 391º nº1 e 3 e artigo 392º nº3 CT). Significa isto que neste campo as microempresas
poderão ter de suportar indemnizações mais elevadas do que as empresas de maior porte.
Em suma, se é recomendável que o Direito de Trabalho revele alguma “sensibilidade dimensional”, já a hipersensibilidade
se mostra francamente indesejável nesta matéria, podendo redundar na adoção de soluções injustas e mesmo
inconstitucionais. Tudo dependerá da norma em questão, do seu funcionamento, do seu alcance, dos seus efeitos, da
circunstância de a mesma se revelar adequada, necessária e proporcionada, tendo em conta os objetivos visados.
Não há qualquer espaço para a criação unilateral nem para a estipulação contratual, apenas à contratação
coletiva sendo permitido intervir neste domínio, mas sempre com respeito pelos limites legais.
A aplicação das sanções disciplinares pelo empregador encontra-se sujeita a alguns princípios
gerais, consagrados no CT. Além do mencionado princípio da proporcionalidade (artigo 330º nº1),
cumpre ainda destacar o princípio non bis in idem (artigo 330º nº1), o princípio do contraditório (artigo
329º nº6), bem como o princípio da celeridade.
dimensões
Artigos 329º nº1, 2, 3 e 330º nº2 CT
Trata-se, na ótica do legislador, de criar balizas legais temporais nesta matéria, em ordem a
proteger o trabalhador face à virtual eternização da ameaça de uma punição disciplinar.
O exercício do poder disciplinar está sujeito a controlo jurisdicional a posteriori, pelo que, caso o
trabalhador entenda que foi alvo de um castigo injusto, de uma sanção disciplinar incorreta, de
uma punição disciplinar extemporânea, etc., em todos esses casos ele poderá impugnar
juridicamente a referida sanção disciplinar (artigo 329º nº7 CT). Este artigo ressalva o direito de
ação judicial do trabalhador sancionado. O tribunal poderá então confirmar ou anular a sanção
aplicada.
Dentro de que limites temporais poderá o trabalhador impugnar judicialmente aquela sanção? O CT não dá
uma resposta clara a esta questão (artigo 337º nº1).
O CT proíbe a prática de assédio, no nº1 do seu artigo 29º, sendo este definido, no nº2 do mesmo
preceito. E o nº3 acrescenta o que se entende por assédio sexual.
Quanto ao ónus da prova do assédio, haverá que distinguir: no caso de assédio não discriminatório
(artigo 342º nº1 CC); tratando-se de assédio discriminatório (artigo 25º nº5 CT). Em alguns casos
a prova de assédio pode ser bastante difícil, procurando a lei proteger o denunciante e as
testemunhas por si indicadas de represálias disciplinares do empregador (artigo 29º nº6 e 331º nº1
b e d CT).
Quanto as possíveis consequências jurídicas do assédio laboral, cumpre notar que:
❖ Artigo 29º nº4 CT;
❖ Artigo 29º nº5 e consequente artigo 551º CT;
❖ Artigo 283º nº8 e 9 CT;
❖ A prática de assédio por parte de um trabalhador legitima a utilização do poder
disciplinar patronal, podendo dar azo ao despedimento com justa causa;
❖ Artigo 394º nº2 b e f CT.
O objeto da prestação de trabalho – artigo 115º nº1 CT. Eis o chamado princípio da contratualidade
do objeto. Aquando da celebração do contrato as partes devem acordar num conjunto de tarefas ou
serviços concretamente definidos ou individualizáveis, sob pena de eventual nulidade do
contrato por indeterminabilidade do objeto (artigo 280º CC). O trabalhador é contratado para
exercer um tipo genérico de atividade, a que corresponde determinada categoria profissional ou
normativa, competindo à convenção coletiva a definição das várias tarefas ou funções que a
integram (artigo 115º nº2 CT).
O discurso juslaboral tradicional afirmava que a categoria profissional traduz-se numa forma de
exprimir o objeto do contrato de trabalho, identificando e delimitando as funções que um
trabalhador pode ser obrigado a realizar, competindo à entidade empregadora a escolha das
concretas tarefas a prestar dentro do tipo genérico prometido; funcionava como um limite e o
empregador tinha de o respeitar, isto é, tinha de operar dentro do círculo de funções inerentes à
categoria.
Acontece que as categorias constantes das convenções coletivas converteram-se num fator de
excessiva rigidez laboral. A necessidade de flexibilizar a gestão da mão-de-obra e o discurso da
polivalência funcional acabaram por levar o legislador a desmentir o princípio da contratualidade
do objeto do contrato de trabalho (artigo 118º nº2 CT).
Ou seja, o legislador como que “corrige” ou “completa” as partes, assim se assistindo a uma autêntica
redefinição ou reconfiguração legal do objeto do contrato de trabalho. Desta forma, a
categoria torna-se insuficiente em ordem à identificação e delimitação do objeto contratual. A
categoria converte-se numa forma de exprimir o núcleo central do objeto do contrato.
Eleva-se assim o grau de indeterminação do objeto do contrato de trabalho, reduz-se o valor
garantístico tradicionalmente atribuído à categoria profissional, alarga-se o espaço de atuação do
poder de direção do empregador e a autoridade deste, no plano funcional, consolida-se.
A tutela da categoria profissional passa pela proibição de o empregador baixar a categoria do
trabalhador (artigo 129º e CT), salvo nos casos previstos no artigo 119º CT. Mas resulta dos
princípios gerais que a própria mudança para categoria superior, deve ser consensual, contando
com o assentimento do trabalhador.
A mobilidade funcional – artigo 118º nº1 CT. É o chamado princípio da invariabilidade da prestação,
princípio do desempenho de funções correspondentes à atividade para que se foi contratado.
Significa isto que a proteção legal diferida àquela “atividade contratada” impede, em absoluto, que ao trabalhador
venha a ser exigido o desempenho de funções que dela exorbitem? Não! A lei atende às exigências da
flexibilidade empresarial, as quais reclamam do trabalhador que este seja “funcionalmente móvel” –
artigo 120º nº1 CT. Trata-se do chamado jus variandi, faculdade excecional concedida ao
empregador que se traduz numa ultrapassagem dos quadros contratuais.
É certo que a lei coloca limites a este singular “direito de variação” patronal:
❖ O interesse da empresa assim o exigir;
❖ Ser uma variação transitória (não poderá ultrapassar 2 anos – artigo 120º nº3 CT);
❖ Não implicar uma modificação substancial da posição do trabalhador;
❖ Não implicar a diminuição da retribuição (artigo 120º nº4 e 5).
Trata-se de uma alteração transitória de funções que não belisca a atividade contratada!
Artigo 120º nº2. Ou seja, a lei autoriza que as partes, através de simples estipulação contratual,
alarguem aquele “direito de variação”.
As partes poderão dispensar que o interesse da empresa exija a alteração, bem como poderão admiti-la mesmo que
ela implique uma modificação substancial da posição do trabalhador… Esta norma, sublinhemo-lo, visa regular as
cláusulas de mobilidade funcional, cujo único constrangimento se traduz na sua caducidade ao fim de dois anos, caso
não tenham até então sido acionadas.
Atualmente há uma tendência para minimizar o papel do local de trabalho. Compreende-se, mas
não se subscreve, esta afirmação. A estabilidade do local de trabalho é um valor importante, um
valor que merece adequada proteção por parte do ordenamento jurídico-laboral.
A noção de local de trabalho – a noção pode possuir uma amplitude ou extensão variáveis.
Dado que o local do cumprimento da prestação constitui um aspeto essencial do programa
contratual, a definição do âmbito geográfico da prestação laboral caberá aos sujeitos desse
contrato. A própria execução do contrato permitirá delimitar esse local de trabalho, que a
doutrina tem feito coincidir com a ideia de “centro estável ou predominante do desenvolvimento da
atividade laboral”.
Sendo embora um conceito relativo ou elástico, o certo é que, não poderá verificar-se uma total
indeterminação do local de trabalho, pois a situação de heterodisponibilidade do trabalhador tem de
resultar espacialmente delimitada pelo contrato. Com efeito, o trabalhador não se poderá obrigar
a prestar toda e qualquer atividade, em todo e qualquer lugar, sob a autoridade e direção do
empregador. A exigência de determinação ou determinabilidade do objeto do contrato de
trabalho é incontornável, quer quanto ao tipo de funções desempenhadas, quer quanto ao lugar
de execução das mesmas. De acordo com o disposto no artigo 280º CC, o trabalhador
comprometer-se-á a prestar ao empregador uma atividade funcional, temporal e espacialmente delimitada
ou balizada.
O local de trabalho potencial resulta de estipulação contratual, ao passo que o local de trabalho efetivo resulta
da direção patronal!
Este preceito abrange tanto a hipótese de transferência coletiva como a própria transferência
individual.
A par da clássica dicotomia transferência individual/coletiva, o CT distingue as hipóteses de
transferência definitiva do trabalhador daqueles em que a transferência deste é meramente temporária.
Neste último caso, a ordem patronal de transferência, além da fundamentação, deverá indicar o
tempo previsível da alteração (artigo 194º nº3 CT).
Por outro lado, o CT estabelece regras procedimentais em matéria de transferência (artigo 196º CT).
Artigo 194º nº4 CT. Note-se que, tendo em conta o disposto nos números 2 e 6 deste artigo, o
regime constante do nº4 parece possuir um caráter “coletivo-dispositivo”, vale dizer, poderá ser
livremente afastado por IRCT, mas já não poderá ser afastado, em sentido menos favorável para
o trabalhador, através de contrato individual de trabalho.
Em caso de transferência individual, definitiva ou temporária, o CT requer expressis verbis, como pressuposto legitimador
de qualquer ordem patronal nesse sentido, que um motivo do interesse da empresa a exija (artigo 194º nº1 b CT).
“As cláusulas de mobilidade geográfica” – o artigo 24º nº1 da LCT apresentava o seguinte teor: “A
entidade patronal, salva estipulação em contrário, só pode transferir o trabalhador para outro local de trabalho
se essa transferência não causar prejuízo sério ao trabalhador ou se resultar da mudança, total ou parcial, do
estabelecimento onde aquele presta serviço”. Qual o exato sentido que deveria ser atribuído à
expressão “salva estipulação em contrária”?
O CT de 2003 afirmou que a regra de inamovibilidade traduzia-se numa “garantia” meramente
supletiva, que, como tal, não constituía garantia alguma (artigo 315º nº1,2 e 3 CT). E o atual CT não
se afastou desta linha (artigo 194º nº2).
O CT aposta no papel do contrato individual como fator de promoção da mobilidade geográfica
do trabalhador. As “cláusulas de mobilidade geográfica” serão, pois, em princípio, admissíveis à luz do
CT. Não haverá limites a observar nesta matéria?
A supramencionada cláusula de inamovibilidade colocar-se-ia em aparente rota de colisão com a
liberdade de iniciativa económica privada. A acima referida cláusula de mobilidade mal se
compaginaria com a garantia constitucional da estabilidade no emprego, a qual possui uma
importante vertente espacial (artigo 53º CRP).
Dir-se-ia, pois, que, não obstante o disposto no nº2 do artigo 194º CT apontar, de modo
inequívoco, para a supletividade do regime legal da transferência do trabalhador, a verdade é que
nem a inamovibilidade nem a mobilidade poderão ser absolutas. Através de estipulação
contratual as partes poderão restringir ou alargar as faculdades patronais de transferência.
No que toca às cláusulas de mobilidade esta levantaria problemas, desde logo, ao nível de uma
insuficiente indeterminabilidade ou predeterminação do objeto da prestação laboral.
Uma cláusula deste jaez, concedendo à entidade empregadora total liberdade para modificar o
local de trabalho, não deixaria de convocar a aplicação do regime das cláusulas contratuais
gerais (artigo 105º CT). Ou seja, se o artigo 194º nº2 CT prenuncia a conversão das cláusulas de
mobilidade geográfica do trabalhador numa espécie de cláusula de estilo nas empresas
plurilocalizadas, já o artigo 105º do mesmo código poderá proporcionar o reforço da
sindicabilidade judicial deste tipo de cláusulas.
É indiscutível que, em sede de mobilidade geográfica do trabalhador, o CT aposta, decididamente,
no vetusto princípio da liberdade contratual e valoriza o poder jurisgénico das partes.
As cláusulas de mobilidade geográfica caducarão ao fim de 2 anos, caso não tenham sido
ativadas pelo empregador (artigo 194º nº2 CT).
Que meios de tutela dispõe a trabalhadora, caso o empregador inviabilize a transferência solicitada?
❖ Suspensão imediata do contrato de trabalho até que ocorra a transferência, ao abrigo do nº3 do artigo 195º;
❖ Uma ação judicial de cumprimento, pedindo ao tribunal a condenação do empregador na viabilização da respetiva
transferência, bem como, se for caso disso, no pagamento de uma indemnização pelos danos causados (artigo 829º-
A CC);
❖ Resolução do contrato com justa causa subjetiva (artigo 394º nº2 CT).
Tempo de trabalho e tempo de repouso – a CRP estabelece no seu artigo 59º nº1 d e nº2 b, a
fundamentação desta matéria. Trata-se, aliás, de preocupações que acompanham o Direito do
Trabalho desde o seu nascimento: conciliação esta que surge como um desiderato constitucional,
nos termos do artigo 59 nº1 b CRP, analisando-se num dos deveres a cargo do empregador na
relação laboral (artigo 127º nº3 CT) – criar e preservar a própria noção de tempo livre.
Nesta matéria, a lei assenta no binómio tempo de trabalho/período de descanso, sendo certo que o
tempo de trabalho compreende dois módulos diferentes: o tempo de trabalho efetivo (artigo
197º nº1) e os períodos de inatividade equiparados a tempo de trabalho (artigo 197º nº2); por
sua vez, aquele tempo de trabalho efetivo corresponde, não apenas ao desempenho da prestação,
mas também ao tempo de disponibilidade para o trabalho. O período de descanso é recortado
negativamente pela lei, consistindo, nos termos do artigo 199º, em todo aquele que não seja tempo
de trabalho.
A Lei nº93/2019 eliminou a figura do “banco de horas individual”, revogando o artigo 208º-A CT, mas, em
contrapartida, reformulou o artigo 208º-B CT.
Horário de trabalho, descanso semanal e isenção do horário – estabelece o artigo 212º CT que
compete ao empregador determinar o horário de trabalho do trabalhador. Em princípio, o
período de trabalho diário deverá ser interrompido por um intervalo de descanso (artigo 213º nº1
e 214º nº1 CT).
No que diz respeito à alteração do horário de trabalho, a lei manda aplicar o disposto sobre a sua
elaboração, com as especificidades constantes do artigo 217º CT.
Nos termos do artigo 232º nº1 CT, o trabalhador tem direito a descanso semanal obrigatório.
Esse dia de descanso coincidirá, em regra, com o domingo (artigo 232º nº2 CT). Acresce que, por
IRCT ou por contrato de trabalho, pode ser instituído um período de descanso semanal
complementar (artigo 232º nº3 CT).
Acontece que nem todos os trabalhadores dispõem de um horário de trabalho. Com efeito, o
nº1 do artigo 218º CT prevê que, por acordo escrito, poderá ser isento de horário de trabalho o
trabalhador que se encontre em algumas situações. Neste quadro situacional, as partes poderão
acordar numa das seguintes modalidades de isenção de horário, previstas no artigo 219º CT: isenção
total (nº1); isenção parcial ou limitada (nº2); isenção modelada ou relativa (nº3).
O horário baliza a situação de heterodisponibilidade do trabalhador, o qual sabe que, fora desse
horário, não terá de se sujeitar ao poder diretivo do empregador e prestar-lhe a correspondente
atividade laboral; ora, são essas balizas protetoras que vêm a ser removidas aquando da isenção
de horário de trabalho (artigo 265º CT). Trata-se de mais uma ferramenta de flexibilidade
temporal oferecida ao empregador.
A isenção do horário de trabalho é uma situação reversível: assentando a isenção no acordo das
partes, a sua cessação não está na inteira disponibilidade do empregador, pelo que haverá que
distinguir, em função daquilo que as partes tenham estabelecido a esse propósito.
Trabalho por turnos, trabalho noturno e trabalho suplementar – sempre que o período de
funcionamento ultrapasse os limites máximos do período normal de trabalho, deverão ser
organizados turnos de pessoal diferente, como prescreve o nº1 do artigo 221º CT. A noção de
trabalho por turnos encontra-se redigida no artigo 220º CT. A lei revela preocupação com a
salvaguarda da segurança e saúde destes trabalhadores (artigo 222º CT), mas não reconhece o
direito a qualquer retribuição especial.
Ao contrário, no trabalho noturno (artigo 223º CT) a lei não só se preocupa com a proteção
do trabalhador noturno (artigo 224º e 225º CT) como, em regra, prevê o pagamento de uma
retribuição acrescida para quem preste esse tipo de trabalho (artigo 266º CT).
Em todo o caso, esta é uma matéria em que importa ter atenção às “proteções
discriminatórias”!
Quanto ao trabalho suplementar, o mesmo encontra-se regulado nos artigos 226º a 231º CT
e 268º. Destacam-se as seguintes notas do respetivo regime jurídico:
❖ Noção (artigo 226º CT);
❖ Caráter condicional (artigo 227 nº1 e 2 CT). Este trabalho só poderá ser prestado em 2
tipos de situações – critério de necessidade (nº1) e critério de indispensabilidade (nº2).
O simples acordo do trabalhador não basta para legitimar o recurso a este tipo de
trabalho;
❖ Caráter obrigatório (artigo 227º nº3 CT);
❖ Efeitos. A prestação de trabalho suplementar produz dois tipos de efeitos jurídicos
(dependente do número de horas de trabalho prestado por dia e da circunstância de esse
trabalho): direito a descanso compensatório remunerado, nos termos do artigo 229º e 230º CT;
direito a retribuição acrescida, nos termos do artigo 268º (nº2) CT.
Feriados – são dias em que, pelo seu especial significado, se comemoram determinados
acontecimentos com projeção nacional. Artigo 236º nº1 CT. Artigo 269º nº1 CT.
A lei diz-nos quais são os feriados obrigatórios, no artigo 234º nº1 CT. Além dos feriados
obrigatórios, a lei admite que sejam observados, a título de feriado facultativo, mais dois por ano,
desde que tal se encontre previsto em IRCT ou no contrato de trabalho (artigo 235º CT).
O desafio das NTIC e o “direito à desconexão” – a lógica binária tempo de trabalho/período de
descanso, nunca foi linear. A lei sempre permitiu que, verificando-se determinadas circunstâncias,
a entidade empregadora pudesse ir além do horário de trabalho, pudesse afastar do programa
contratual, ordenando ao trabalhador a prestação de trabalho extraordinário ou suplementar.
Era de exceções que aqui se cuidava: nem todos os trabalhadores, mas apenas aqueles que
exercem certo tipo de funções, podem ser isentos de horário de trabalho, se nisso acordarem;
recurso ao trabalho suplementar apenas é lícito quando se verificarem certos requisitos de
necessidade ou indispensabilidade na esfera da empresa.
No essencial, aquele modelo binário era válido!
Em suma, o homem é um ser pluridimensional e multifacetado, que, por isso mesmo, não deve reduzir-se, nem pode ser
reduzido, à sua condição de trabalhador, ao mero plano profissional.
Sucede, porém, que, nos últimos anos, com o advento e com o incremento das NTIC (Novas
Tecnologias de Informação e Comunicação), surgiu um novo e complexo desafio para o Direito do
Trabalho, dado que as NTIC possibilitam que o trabalho acompanhe o trabalhador fora do
espaço/tempo profissional, invadindo o seu tempo de autodisponibilidade.
Leal Amado crê que o “direito à desconexão profissional” não é propriamente um direito. A desconexão
surge como o efeito natural da limitação da jornada de trabalho, isto é, do balizamento do tempo
de trabalho através da definição do horário de trabalho de cada trabalhador. Fora do tempo de
trabalho estaremos, então, em período de descanso, como decorre do disposto no artigo 199º CT.
Sobre a empresa é que recairá, portanto, um “dever de não conexão profissional” fora da jornada de
trabalho, fora das balizas representadas pelo horário de trabalho.
A não utilização das NTIC durante o período de descanso do trabalhador, poderão ser
estabelecidas mediante convenção coletiva de trabalho.
A ideia-chave deverá aqui consistir não tanto em conceder ao trabalhador um suposto novo direito, mas antes em
disciplinar o comportamento invasivo da entidade empregadora.
Neste sentido, creio que é mais de um “dever de não conexão patronal” do que de um “direito à
desconexão do trabalhador” que, in casu, se trata.
Uma situação de conexão por tempo integral não deixa de poder redundar numa prática de
assédio, prevista e proibida pelo artigo 29º CT.
✓ O direito a férias
A duração das férias – de acordo com o disposto no artigo 238º nº1 CT, o período anual de
férias teria a duração mínima de 22 dias úteis, mas aquele período poderia ser aumentado num
máximo de 3 dias úteis em caso de inexistência de faltas ou na hipótese de o trabalhador ter dado
um número diminuto de faltas justificadas (artigo 238º CT) – CT de 2003
À luz do CT, temos um período de férias com a duração mínima de 22 dias úteis (artigo 238º nº1
CT), conquanto isto possa ser aumentado por IRCT (artigo 3º nº3 h CT).
Do ponto de vista político-legislativo, este preceito consistia, em combater o absentismo laboral
e premiar a assiduidade do trabalhador “cumpridor e dedicado”, vinculando o empregador a dar-lhe
efetividade.
Fosse o preceito concebido como estabelecendo um prémio/recompensa ou como prevendo uma
punição/penalização, o certo é que nos situávamos no plano daquilo que era juridicamente devido
pelo empregador (direito subjetivo do trabalhador).
Retribuição durante as férias - pela CRP e pelo Código, vemos que o uso da expressão “férias
periódicas pagas” implica, necessariamente, férias retribuídas – e retribuídas nos termos em que o
artigo 264.º nº1 CT explana (condições correspondentes às de em trabalho efetivo) –, o que nos
leva a concluir pela efetividade do princípio da não penalização retributiva.
As férias, como vimos, é um tempo de autodisponibilidade que preserva um equilíbrio físico e
mental muito caro ao trabalhador, mas que também implica um “corte com a rotina”, e um acréscimo
nos gastos familiares (deslocação, alojamento…), o legislador consagra, no artigo 264.º nº2, o
direito do trabalhador a um subsídio de férias.
O CT prevê que o trabalhador “receba a dobrar” durante as férias, estendendo o valor de referência
para o subsídio de férias fora dos parâmetros do artigo 262.º (retribuição-base e diuturnidades),
englobando ainda outras prestações retributivas decorrentes do modo específico da prestação de
trabalho.
Para que o trabalhador disponha deste montante tão necessário, cabe notar, o CT consagra ainda, no n.º 3 do artigo
264.º, o princípio do vencimento antecipado do subsídio de férias.
A estrutura complexa do direito a férias e a cessação do contrato - pelo n.º 1 do artigo 237.º CT,
vemos que o direito a férias diz respeito a um período de férias retribuídas que vence a 1 de janeiro;
o n.º 2 completa aquele, dizendo-nos que esse período decorre do trabalho prestado no ano civil
anterior (artigo 240º CT). Temos, com isto, que se diz deste direito o ser de formação sucessiva e
vencimento diferido. O artigo 245º CT mostra-nos os efeitos da cessação do contrato no direito a
férias.
O trabalhador tem direito a receber a retribuição e o subsídio correspondentes às férias
vencidas em janeiro do ano em causa e não gozadas (artigo 245.º nº1 a CT); efetivamente, o
direito em questão já está formado, e a cessação do contrato em nada afeta o auferir dessa quantia
pelo ex-trabalhador.
O trabalhador tem direito, ainda, a receber um montante proporcional ao tempo de serviço
prestado no ano da cessação (artigo 245.º nº1 b CT) – uma vez que a estrutura, já vista, do direito
a férias implica que se já se tenha começado a formar um direito que não venceu plenamente , mas
que não deixa, por isso, de se vencer parcial e antecipadamente.
O artigo 245.º fala ainda, no seu n.º 3, que, caso o contrato de trabalho cesse no ano da admissão do trabalhador ou no
subsequente, se atenderá a um critério de proporcionalidade.
A marcação das férias - sabendo, pelo artigo 240.º CT, que as férias devem ser gozadas no ano
civil em que se vencem, é ainda relevante saber quando e como, na linha temporal anual, são
marcadas. À partida, as férias são marcadas por acordo entre o empregador e o trabalhador (n.º 1
do artigo 241.º CT); na falta de acordo, o empregador marca as férias do trabalhador
autonomamente(n.º 2 do artigo 241.º CT); neste caso, porém, a lei apresenta alguns limites
temporais: o período de férias não poderá, como se lê no artigo 241.º nº3, situar-se fora das balizas
de 1 de maio e 31 de outubro – salvo quando se trate de uma microempresa, ou quando o IRCT ou
parecer dos representantes dos trabalhadores admitir época diferente –, com as particularidades
do setor turístico (artigo. 241.º nº4).
Sabemos que, além de os períodos de férias mais cobiçados deverem ser rateados (nos termos do
n.º 6 do artigo 241.º CT) e de os cônjuges e pessoas em união de facto ou economia comum a
laborar na mesma empresa terem direito a gozar férias simultaneamente (n.º 7), vigora entre nós
um princípio de continuidade das férias – apenas se admitem férias interpoladas por acordo entre as
partes, e contanto que 10 desses dias úteis sejam consecutivos (nº8).
Resta falar da alteração do período supramencionado: embora se fale, a este propósito, em motivos
relativos à empresa (artigo 243.º CT) e ao trabalhador (artigo 244.º CT), a situação mais polémica
é certamente, a da alteração unilateral pelo empregador prevista no n.º 5 do artigo 241.º e no n.º 3
do artigo 243.º CT.
O ano da contratação - após vermos a estrutura complexa do direito a férias (de formação
sucessiva e vencimento diferido), não surpreende que uma das dificuldades mais expressivas seja,
precisamente, a incompatibilidade desta perceção com a determinação das férias no ano da
contratação. É aqui que o artigo 239.º CT entra em cena: o legislador entendeu, por aqui,
apresentar uma importante exceção à regra, precisamente para evitar uma situação de prestação
de trabalho por um período muito longo, sem interrupção para férias… Artigo 239º nº1; no n.º 2,
por outro lado, tem-se que caso o ano civil termine antes de decorrido aquele prazo, as férias
deverão ser gozadas até 30 de junho do ano seguinte.
Uma vez que, no ano da contratação, o trabalho prestado concorre para a formação de dois
períodos de férias (o desse ano e o do ano subsequente, a vencer no 1.º de janeiro seguinte), há a
possibilidade de o trabalhador, nessa eventualidade, poder vir a desfrutar de um período
excessivamente generoso de férias – o que explica que o n.º 3 do artigo 239.º estabeleça o limite
de 30 dias úteis de férias.
Se, no ano em que se iniciou, aquele impedimento tiver determinado a impossibilidade do gozo
das férias já vencidas, aplicar-se-á o nº3 do artigo 244º CT. E, se o contrato cessar após o
impedimento prolongado do trabalhador, a norma aplicável será o nº4 do artigo 245º CT.
A tutela do direito a férias - o nosso ordenamento, como não poderia deixar de suceder numa
matéria de tal modo pesada, pelo seu relevo psíquico e físico, na vida do trabalhador, tutela
cautelosamente o direito a férias, por vários mecanismos:
❖ Irrenunciabilidade (artigo 237.º nº3 CT): o gozo deste direito é insubstituível por
qualquer compensação económica ou diversa;
❖ Compensação do trabalhador perante violação patronal (artigo 246.º CT): ao empregador
que procure obstar dolosamente ao gozo das férias impõe-se o direito do trabalhador de
receber uma indemnização no valor do triplo da retribuição correspondente ao período
de férias;
❖ Impedimento do exercício de outra atividade remunerada (artigo 247.º nº1 CT): salvo
quando já exerça uma atividade cumulativa ou quando o empregador o autorize, o
trabalhador não pode exercer, durante este período, qualquer outra atividade
remunerada; há, pois, uma conceção deste direito a férias como um direito - dever , um
direito funcional que limita o trabalhador a gozar as férias – querendo trabalhar, deverá
solicitar autorização ao empregador, sob pena de violar o contrato de trabalho e
responder por isso.
Leal Amado duvida da constitucionalidade deste artigo 247.º nº1, como artigo que admite ao empregador imiscuir-se
na vida do trabalhador, a um nível que raia o golpear, diz-nos, da dignidade pessoal deste último.
✓ As faltas ao trabalho
Um dos principais deveres do trabalhador, pelo artigo 128.º, n.º 1, b CT, é o de comparecer
assídua e pontualmente ao trabalho (caso contrário, estará, por definição, a faltar ao trabalho –
artigo 248º nº1 CT). A noção de falta pressupõe, a conjugação de um elemento material (ausência
física do local de trabalho) e de um elemento normativo (durante o período de trabalho devido).
Se a construção de uma noção de falta é relativamente simples, os desafios legislativos –
principalmente considerando um choque de interesses económicos (combate ao absentismo
laboral) e sociais (limitação do constrangimento pessoal ao trabalhador) – são permanentes e
difíceis; se o peso dos valores da produtividade e competitividade advogam o escopo de um regime
de faltas inflexível, os interesses e contextos pessoais contrariam, decididamente, essa tendência.
O equilíbrio necessário, e sem dúvida possível, é alcançado pelo artigo 249.º do CT!
No artigo 249.º, n.º 1, prevê-se uma distinção entre dois tipos de faltas:
❖ Faltas justificadas (artigo 249.º nº2) – expressa e taxativamente previstas no Código. A
falta só será justificada se se lhe antecipar uma comunicação tempestiva ao empregador,
com a indicação do motivo justificativo (artigo 253.º) – para cuja confirmação o
empregador pode, de seu direito, exigir prova ao trabalhador (artigo 254.º);
❖ Faltas injustificadas (artigo 249.º nº3) – todas as que não se prevejam no número
anterior.
Por aqui, seríamos levados a concluir de um princípio de tipicidade das faltas justificadas que, em princípio, faria deste
regime sólido na sua rigidez; porém, lendo alguns motivos elencados no n.º 2 – veja-se a alínea d), ou a i–, rapidamente se
deduz que, nas palavras da doutrina, se tem um sistema híbrido (uma taxatividade aparente , ou uma tipicidade aberta), o que
faz do regime bem mais aberto do que o que poderíamos ser levados a, inicialmente, pensar.
Veja-se que as disposições relativas aos motivos justificativos de faltas e à duração das mesmas
revestem caráter de imperatividade absoluta (artigo. 250.º CT), pelo que: não poderão ser alteradas
por IRCT (caso se tratem de faltas dadas no desempenho de funções em estruturas de
representação coletiva – regime com caráter de imperatividade relativa); não poderão ser
alteradas por contrato de trabalho (embora, deste modo, a concessão da faculdade de faltas
fundamentadas fora dos casos previstos no artigo 249.º nº2 integre uma cláusula contratual que
será, à luz do artigo 250.º, nula, o empregador não fica impedido de aprovar tais faltas – o que,
pelo artigo 249.º nº2 j, as justifica).
A natureza jurídica das faltas variará, evidentemente, consoante se tenha um ou outro tipo de faltas.
Vejamos as diferenças:
❖ Perante uma falta justificada, a natureza jurídica é a do exercício legítimo de um direito;
por aqui, seria impossível e incompreensível que qualquer direito do trabalhador fosse
afetado (o que acontece, em princípio, como vemos no artigo 255.º nº1). Em todo o caso,
o n.º 2 do artigo 255.º prevê, desde logo, um conjunto de faltas justificadas em que,
todavia, o trabalhador perde retribuição;
❖ No caso de uma falta injustificada, sendo uma violação do dever de assiduidade do artigo
128.º nº1 b, tem-se a perda da retribuição correspondente ao período de ausência, e a não
contabilização desse período para efeitos de antiguidade (artigo 256.º nº1); para além
disto, tal falta constitui, em princípio, uma infração do trabalhador, de gravidade variável
conforme as circunstâncias, e passível de ver por ela ser aplicada uma sanção disciplinar
– no respeito do empregador pelo princípio da proporcionalidade –, no limite
constituindo justa causa de despedimento do trabalhador (artigo 351.º, nº 1 e 2 g CT).
Como corporização nítida da política de combate ao absentismo laboral, o artigo 256.º nº2
penaliza (como “infração grave”) as “pontes”, procurando contrariar os alargamentos de fins-de
semana; o curso não vê esta norma com bons olhos, tomando que se não compatibiliza bem com
o princípio da justiça individualizante tão caro ao direito disciplinar.
Conforme o n.º 3 que se segue, associa-se a essa falta injustificada a perda de retribuição relativa aos dias de descanso
ou feriados imediatamente anteriores ou posteriores ao dia da falta.
✓ A retribuição
Noção e estrutura da retribuição – artigo 258º nº1 CT. Assim sendo, a retribuição traduz-se no
preço da mercadoria força de trabalho, constituindo um elemento fulcral no contrato de trabalho –
“obrigação capital e nuclear a cargo da entidade empregadora”.
Como se viu bem atrás, a existência da retribuição também determina, por seu lado, o sinalagma:
tem-se por aqui uma correspetividade entre o trabalho e o salário, o que deve ser lido com algum
cuidado (pois a inatividade do trabalhador não implica, necessariamente, a perda de retribuição).
Não passa esta nota sem nela se especificar uma certa complexidade, que o CT reconhece e
interioriza: vejamos que, no n.º 2 do artigo 258.º, se acrescenta à “retribuição base” um conjunto de
prestações complementares ou acessórias (diurnidades, subsídios de risco e de alimentação, de
férias, de natal, etc.). O salário, enquanto realidade multiforme e heterogénea, é integrado por
várias prestações pecuniárias, mas também por prestações em espécie (uma “retribuição
complexiva” – ou, em termos críticos, uma “selva retributiva” –, que abrange todas elas).
Para garantir que não se expande desnecessária e exageradamente a componente não pecuniária
da retribuição, o artigo 259.º do CT estabelece um conjunto de limitações, nomeadamente quanto
à circunstância justificativa (n.º 1, parte inicial) e quanto ao valor (n. º1, in fine, e nº2). Estas
limitações dão força expressiva ao valor da proteção do salário na sua forma monetária,
especialmente importante numa economia mercantil como a nossa (veja-se o relevo, no plano jurídico-
internacional, do artigo 6.º da Convenção n.º 65 da OIT, precisamente sobre esta questão).
Em todo o caso, como é evidente, estas prestações integrarão a retribuição do trabalhador se forem devidas por força do
contrato, de normas legais ou convencionais, de usos laborais, etc.; com efeito, a oposição entre o caráter obrigatório da
retribuição e o animus donandi inerente a estas prestações é o que marca a respetiva qualificação (nº3).
Igualmente de fora, entende-se, ficam as “gorjetas” – pagas, como é sabido, ao trabalhador pelo
utilizador direto dos serviços – uma vez que, embora constituam estas parte importante do
rendimento do trabalhador, não são prestações obrigatórias a cargo do empregador.
Modalidades – artigo 261º nº1 CT, sendo que o critério que distingue estas modalidades de
retribuição se relaciona diretamente com respetiva unidade de cálculo ou medida:
❖ Retribuição certa: base de cálculo temporal – em função do tempo de trabalho (por hora,
dia, semana, quinzena, mês – artigo 262º nº2);
É esta a modalidade que confere mais segurança ao trabalhador (além de ser a mais simples e
comum), desassociando a remuneração do trabalhador ao êxito (ou insucesso) da empresa e às
flutuações do mercado.
❖ Retribuição variável: unidade de cálculo assente em critérios distintos da medida
temporal, nomeadamente o rendimento ou o resultado – em função do
rendimento/resultado da atividade (como no caso do salário à peça, salário à tarefa, comissões,
etc.);
Base de cálculo para as prestações complementares ou acessórias – artigo 262º nº1 CT, fornece
uma base de cálculo, poder-se-á dizer, supletiva: assumindo a relatividade ou não omnivalência da
noção de retribuição (a variação da mesma em função do diploma, da norma, da teleologia implícita, em
questão), esta estabelece que, salvo disposição legal, convencional ou contratual, se calculam estas
prestações tendo por referência a retribuição base e diuturnidades.
Na ausência de disposição legal, convencional ou contratual em contrário, apenas a retribuição
base e as diuturnidades servirão de base para o cálculo do valor das prestações complementares
e acessórias.
O curso segue a interpretação de JORGE LEITE, que toma por retribuição base “aquilo que é, graças
ao trabalho de um determinado período (em condições tomadas como normais/comuns para o respetivo setor ou
profissão), juridicamente devido ao trabalhador com determinada categoria profissional, por força do contrato,
de IRCT ou dos usos laborais”.
Assim, as prestações complementares ligam-se às contingências específicas da prestação laboral
ou a aspetos particulares relativos ao trabalhador. Caberá, sem dúvida, à jurisprudência suprir as
falhas inerentes à insuficiência explicativa da norma em causa, lembra Leal Amado.
Lugar e tempo do cumprimento - Vigora com relevo, nesta sede, o princípio da autonomia privada
– as partes podem convencionar livremente o local -, esta é a regra geral estabelecida no CC
(artigo 772º nº1), que transparece no artigo 277º nº1 CT.
Esta norma, que estabelece o local de trabalho como indicado para esse efeito, afigura-se-nos de
caráter supletivo; ainda assim, os interesses dos trabalhadores não são marginalizados pela lei
(artigo 277º nº2 CT).
Neste ponto, regulado pelo artigo 278.º CT, partimos de que o contrato de trabalho é, com relevo,
um contrato de execução sucessiva. A obrigação retributiva, nomeadamente, encontra-se na
categoria das obrigações duradouras, mais especificamente na modalidade das obrigações periódicas
ou reiteradas; assim sendo, o tempo é de crucial importância na conformação global da prestação
do empregador (cujo conteúdo influencia):
❖ O artigo 261.º CT toma que o tempo se traduz na unidade de cálculo da retribuição certa;
❖ Por outro lado, nos termos do artigo 278.º nº1, o tempo funciona também como unidade de
vencimento da retribuição, aspeto que sem dúvida nos interessa mais na análise do
cumprimento da prestação retributiva.
A lei demonstra grande flexibilidade especificativa, ao permitir estipulação diversa pelas partes e
relevância aos usos, e ainda indicando como possíveis unidades de vencimento a semana, a quinzena,
ou ainda o mês. Os limites a esta flexibilidade legal traduzem-se numa premissa essencial: a
obrigação retributiva há-de vencer-se sempre “por períodos certos e iguais”.
A obrigação retributiva vence-se automaticamente (sem necessidade de prévia interpelação por
parte do credor - trabalhador, o que se reconhece pela existência de uma data predeterminada para
o respetivo cumprimento – artigo 805.º nº1 e 2 a CC). Note-se ainda que, nos termos do artigo
278.º nº4 e 5 CT, o montante da retribuição deverá estar à disposição do trabalhador na data do
vencimento ou em dia útil anterior.
A ideia-chave que serve aqui de base é, pois, a da pós - remuneração: o salário será pago posteriormente à
correspondente prestação de trabalho.
Prescrição dos créditos laborais – artigo 337º nº1 CT. Com o decorrer do tempo, de facto, cessa
a exercitabilidade dos direitos subjetivos.
Invocada a prescrição (pelo empregador, uma vez que a prescrição não opera a nível judicial por
ofício do tribunal, nos termos do artigo 303.º CC), mantém-se o vínculo, mas a juridicidade deste,
simplesmente, sai enfraquecida, pois a respetiva garantia limita-se ao obrigado não poder repetir
o que haja prestado – não vale essa prestação como liberalidade, mas sim como pagamento (a
soluti retentio do artigo 304.º CC). O verdadeiro alcance do instituto da prescrição é, assim,
tornar o cumprimento da obrigação inexigível ou incoercível!
Os fundamentos em que assenta a prescrição de créditos são vários: a posição da doutrina
dominante, porém, tende a apontar como seu fundamento específico a punição da negligência do
titular do direito em exercê-lo durante o período de tempo indicado na lei.
No que concerne ao curso da prescrição, sublinhemos que: por regra geral, tem este início quando o
direito puder ser exercido, conforme determina o artigo 306.º nº1 CC; para que o prazo da
prescrição comece a correr torna-se necessário, mas também suficiente, que a dívida seja exigível,
que a obrigação vença; este início pode, no entanto, ser impedido por determinados motivos – as
“causas suspensivas da prescrição” (artigos 318.º a 322.º CC); a suspensão em questão traduz-se em não
se contar para o efeito da prescrição o tempo decorrido enquanto durarem certos factos ou
situações:
A ratio do artigo 337.º, n.º 1, CT - na leitura do artigo 337.º nº1 CT, e assumindo a noção de
prescrição vista acima, o curso faz notar três pontos fulcrais:
❖ Tratamento uniforme concernente a todos os créditos decorrentes da relação laboral;
❖ A prescritibilidade do direito ao salário, uma vez que o CC não declara o salário isento de
prescrição;
❖ A imprescritibilidade dos créditos laborais na vigência da relação laboral.
O que aqui temos é, sem dúvida, uma suspensão do curso da prescrição enquanto vigorar o contrato de
trabalho.
Por contraposição à penalização da inércia negligente do titular do direito – fundamento, como
se viu, essencial no entendimento do instituto prescricional –, a lei laboral entendeu não ser
exigível ao trabalhador - credor que promova a efetivação do seu direito na vigência do contrato,
demandando judicialmente o seu empregador.
Ora, se olharmos novamente para a posição das partes do contrato de trabalho (com o trabalhador
a ocupar um lugar submisso), requer-se uma disciplina especial para a prescrição dos créditos do
trabalhador.
A crítica ao artigo 337º nº1 CT - Embora lendo uma “nota de bondade” na estrutura e estatuições
do artigo analisado, o curso não deixa de lhe apontar falhas e sugerir “reparos”: em primeiro lugar,
o caráter injustificada e incompreensivelmente simétrico do preceito: o regime prescricional dos
créditos laborais é objeto de modelação pelo legislador, que tem em conta:
❖ A situação de dependência em que o trabalhador-credor se encontra relativamente ao
devedor-empregador, a qual aponta para a necessidade de não permitir que a prescrição se
consome na vigência da relação laboral;
❖ O caráter alimentar da retribuição, isto é, a função social por esta desempenhada, que
impele o prazo prescricional a não ser demasiado curto.
O prazo de prescrição dos créditos laborais, é de apenas um ano. Assume ainda particular
acuidade o problema dos trabalhadores contratados a termo.
Com tudo isto, o curso propõe uma solução conjunta: uma maior dilatação do prazo da
prescrição conjugado com uma suspensão do termo.
Nesta ótica, mais adequado seria, então, estabelecer uma prescrição quinquenal, com a suspensão
do termo anual: os créditos antigos (vencidos há mais de cinco anos) continuariam a prescrever um
ano após a cessação do contrato de trabalho; os créditos recentes (vencidos, por exemplo, há dois
anos) passariam a dispor de um prazo prescricional razoável, menos curto, do que o fixado no
artigo 337.º nº1.
O curso explana duas situações práticas de relevo: o cumprimento do serviço militar prestado
pelo trabalhador e a prisão do trabalhador. O cumprimento do serviço militar pelo trabalhador implicará
a suspensão do contrato de trabalho? Não (artigo 296º nº1 CT). A prisão do trabalhador determinará a
suspensão do seu contrato de trabalho? Sim.
Veja-se, todavia, que o artigo 296.º nº5 toma que “o impedimento temporário por facto imputável ao
trabalhador determina a suspensão do contrato de trabalho nos casos previstos na lei”.
O que aqui temos não é uma contradição que anula a efetividade do critério da não imputabilidade/
involuntariedade a que se aludiu; trata-se da suspensão do contrato em virtude de um impedimento
voluntário do trabalhador, mas através da qual se visa proteger outros direitos fundamentais cujo
exercício é incompatível com a normal execução da prestação de trabalho:
❖ Desempenho de certos cargos públicos, como os de deputado, governante ou autarca;
❖ Desempenho de funções em associações sindicais (artigo 468.º nº8);
❖ Caso da licença parental, bem como das demais licenças previstas na lei em sede proteção
da parentalidade – artigos 33.º e ss. CT.
Vemos que nestes casos, previstos pelo artigo 296.º nº5 CT, o contrato não se suspende em virtude do próprio artigo
(ao contrário do que sucede nas situações do n.º 1); o contrato suspender-se-á ao abrigo do n.º 5, apenas porque essa
vicissitude se encontra prevista nas (outras) disposições legais pertinentes.
Suspensão coletiva (artigo 298º a 316º CT) - o contrato de trabalho pode também suspender-se
por facto relativo ao empregador, aqui fundado em dois motivos possíveis: há uma
impossibilidade temporária de o empregador receber a prestação de trabalho (artigo 294.º nº1); a
suspensão mostra-se necessária para assegurar a viabilidade da empresa e a manutenção dos
postos de trabalho, em situação de crise empresarial (artigo 294.º nº2 a).
Situações de crise temporal: nos termos do artigo 298.º nº1 CT, o empregador poderá suspender
os contratos de trabalho por diversos motivos. O empregador deverá comunicar a sua intenção de
suspender a prestação de trabalho à estrutura representativa dos trabalhadores ou, na sua falta, a cada
trabalhador a abranger (299.º nº1); cabe também à entidade patronal disponibilizar, para consulta, os
documentos em que a alegacão de situação de crise empresarial se sustenta, especificamente de natureza
contabilística e financeira (artigo 299.º nº2); abre-se, em seguida, uma fase de informações de
negociação entre as partes, com vista à obtenção de um acordo sobre a matéria (artigo 300.º).
A suspensão do contrato, que decorre deste acordo com a estrutura representativa dos trabalhadores, ou é
unilateralmente decidida pelo empregador, deve ter uma duração previamente definida, não superior a seis meses, prazo que
poderá ser prorrogado por mais seis meses, apenas mediante decisão escrita e fundamentada do empregador (artigo 301.º).
Quanto aos direitos e deveres das partes durante este período, a lei estabelece que:
❖ O trabalhador, pelo artigo 305.º nº1 a, terá direito ao mais elevado de um destes: montante
mínimo mensal igual a dois terços da sua retribuição normal bruta; valor da retribuição mínima mensal
garantida que corresponda ao seu período normal de trabalho, consoante o que for mais elevado;
❖ Ainda se reconhece ao trabalhador o direito de exercer outra atividade remunerada
(artigo 305.º nº1 c;
❖ Em contrapartida, o trabalhador tem o dever de frequentar as ações de formação
profissional previstas no plano de formação elaborado pelo empregador (artigo 302.º e
304.º nº1 c;
❖ Sobre o empregador, temos os deveres presentes no artigo 303.º, entre os quais
destacamos: efetuar pontualmente o pagamento da compensação retributiva e não distribuir lucros.
Os trâmites procedimentais deste regime específico, bem como a passagem do encerramento temporário a definitivo e
a responsabilidade penal do empregador no incumprimento das normas em causa encontram-se regulados nos artigos
311.º a 316.º do CT.
Suspensão consensual, por mútuo acordo (artigo 317º a 322º CT) - o relaxamento do vínculo
contratual pode também acontecer com base no mútuo acordo das partes; aqui, reconheçamos
duas possibilidades:
❖ Licença sem retribuição: o artigo 317.º n. º1, licença que determinará a suspensão do contrato de
trabalho com os efeitos previstos no artigo 295.º (pelo n.º 4 do artigo 317.º). Trata-se esta
de uma faculdade discricionária das partes; qualquer que seja o motivo subjacente ao
pedido, as partes poderão, sem mais, determinar a suspensão do vínculo jurídico-laboral;
❖ Pré-reforma: as partes poderão celebrar um acordo de pré-reforma, suspendendo o contrato
de um trabalhador com idade igual ou superior a 55 anos, que passa a receber do
empregador uma prestação pecuniária mensal (pelo artigo 318.º). O acordo de pré-
reforma está sujeito a forma escrita, e deve conter, entre outros, a indicação do montante
da prestação de pré-reforma (artigo 319.º), que não pode ser inferior a 25% da retribuição do
trabalhador à data do acordo (artigo 320.º). Se o empregador não pagar pontualmente a
prestação de pré-reforma, o trabalhador terá o direito de retomar as funções ou, em
alternativa, o de resolver o contrato, com direito a indemnização (artigo 321.º). As
hipóteses de cessão da pré-reforma encontram-se previstas no artigo 322.º CT, entre elas
se destacando, naturalmente, a da reforma do trabalhador, por velhice ou invalidez.
Suspensão por decisão do trabalhador (artigo 323º nº3 e 325º a 327º CT) - A falta de pagamento
pontual da retribuição confere ao trabalhador a faculdade de suspender o contrato (artigo 323.º nº3),
fundamento isto que se discipline, portanto, os moldes em que operará dita suspensão, o que
encontramos a partir do artigo 325.º CT.
Esta é, uma modalidade atípica de suspensão do contrato de trabalho. O que temos, sem
dúvida, é uma adaptação da figura civilística da exceção de não cumprimento do contrato à
realidade do Direito do Trabalho: não como sucede com a típica suspensão do contrato de
trabalho aparece-nos sempre como um expediente destinado a e à disposição do devedor, este é,
diz-nos o curso, um meio reativo-defensivo à disposição do credor insatisfeito.
A exceptio que aqui temos, evidentemente, não é senão uma resposta legítima do credor-
trabalhador à falta de cumprimento do empregador.
Entende-se, ainda, que há manutenção dos direitos, deveres e garantias das partes durante a suspensão:
porém, só se mantêm aqueles que não pressuponham a efetiva prestação de atividade. O
trabalhador, neste âmbito, poderá exercer outra atividade remunerada, desde que não viole o
dever de lealdade para com o empregador originário (artigo 326.º).
Por último, quanto à cessação desta suspensão, o Código prevê diversas possibilidades no artigo
327.º.; a estas acrescentamos, contudo, que a vontade de o trabalhador terminar a suspensão do
contrato tanto poderá anteceder o seu regresso ao trabalho, como a efetiva dissolução do vínculo
contratual mediante resolução (ao abrigo do disposto no artigo 394.º).
✓ A cessação do contrato
O despedimento consiste numa das formas de cessação do contrato, numa rutura do vínculo jurídico-laboral por
iniciativa unilateral da entidade empregadora.
Formas de cessação (artigo 338º a 403º CT) - vejamos que, desde logo, a cessação do contrato
de trabalho conhece uma pletora de modalidades (8), pelo artigo 340.º CT; em todo o caso, a
doutrina tende a agrupar estas em quatro modalidades propriamente ditas: por vontade do
empregador (despedimento); por vontade do trabalhador (demissão); por vontade de ambas as
partes (revogação); por verificação de certo evento superveniente a que a lei atribui tal efeito
(caducidade).
Caducidade (artigo 343º a 348º CT) – como resulta de Teoria Geral do Direito Civil, abarca um
conjunto de situações nas quais as relações jurídicas duradouras do tipo obrigacional criadas pelo
contrato se extinguem para futuro, por força de um facto superveniente. No que concerne a
caducidade do contrato de trabalho, sabemos que os casos mais importantes se preveem,
imediatamente, no artigo 343.º CT.
Verificação do seu termo (o contrato a prazo “nasce para caducar”, como vimos no estudo desta
modalidade atípica de contrato de trabalho). Impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva
de o trabalhador prestar o seu trabalho ou de o empregador o receber, atentemos, aqui, nos 3
requisitos cumulativos que se exigem à dita impossibilidade para que constitua causa de caducidade:
❖ Superveniente – se a impossibilidade for originária, o contrato é nulo (artigo 401.º CC);
❖ Absoluta – requisito de certa redundância, diga-se: uma “impossibilidade relativa” será, em
bom rigor, uma dificuldade, e não uma impossibilidade propriamente dita;
❖ Definitiva – se a impossibilidade for temporária, poderá aplicar-se o regime da suspensão
do contrato de trabalho;
A situação que melhor ilustra o disposto na alínea b do artigo 343º CT será, porventura, a da morte
do trabalhador. O previsto no artigo 346.º nº1, 2, 3 CT: morte do empregador (a menos que os
sucessores do empregador prossigam a atividade, ou que haja transmissão da empresa, o contrato
caduca); extinção da pessoa coletiva empregadora (a menos que haja transmissão da empresa ou
estabelecimento, o contrato caduca); encerramento total e definitivo da empresa (o contrato de
trabalho caducará, devendo observar-se o procedimento previsto em sede de despedimento
coletivo – artigo 346º nº4 CT; o encerramento definitivo da empresa que ocorra sem respeito pelas
exigências procedimentais, ou sem respeito pelo aviso prévio supracitado, sujeitará o empregador
a responsabilidade penal, nos termos dos artigos 315.º e 316.º CT).
É isto, como facto não imputável ao trabalhador, que fundamenta o direito deste a uma compensação pecuniária (pela
qual responderá o património da empresa), nos termos do n.º 5 do artigo 346.º.
Quanto aos efeitos da declaração judicial de insolvência do empregador (artigo 347º CT), do qual
decorre que, por si só, a declaração de insolvência não faz cessar o contrato de trabalho:
recuperação/manutenção na pessoa do devedor (nº2); liquidação/encerramento definitivo (nº3);
recuperação/transmissão para terceiro (artigo 285º CT).
Nos termos da alínea c do artigo 343º, caduca com a reforma do trabalhador, por velhice ou
invalidez. O artigo 348.º estabelece um sistema compromissório a referenciar interesses de uma
política de emprego – assegurar aos mais jovens a libertação de postos de trabalho – e de índole
social e humana – não descurar os interesses do trabalhador reformado e o valor do seu saber no
processo produtivo. Sendo a reforma pedida, o trabalhador ainda com capacidade e
disponibilidade vê o seu contrato converter-se num contrato a termo pelo n.º 1, com as
especificidades formais e regimentais do n.º 2 do mesmo artigo. Não sendo o processo de reforma
desencadeado, tem o n.º 3 do artigo 348.º que isto também se aplica ao contrato de trabalho do
“trabalhador que atinja os 70 anos sem ter havido reforma”.
Revogação (artigo 349º e 350º CT) – artigo 349º nº1. Com efeito, a qualquer momento, em qualquer
modalidade de contrato de trabalho, por qualquer razão e sem necessidade de apresentação de qualquer motivo
para a rutura, o empregador e o trabalhador podem proceder à revogação bilateral do vínculo jurídico-laboral.
No entanto, a doutrina faz notar que, no nosso sistema jurídico-laboral, a modalidade acaba por
constituir uma válvula de escape ao empregador, como máscara ideal para cobrir um autêntico
despedimento negociado.
O empregador, sempre sujeito à fundamentada justificação do despedimento bem como a uma
cerrada fiscalização do mesmo, pode, por aqui, procurar facilitar para si o despedimento,
servindo-se da sua supremacia negocial e execucional no contrato para se libertar tanto dos
obstáculos materiais inerentes como das dificuldades procedimentais associadas ao
despedimento.
Com isto, não surpreende que o Código apresente um conjunto de exigências ao acordo
revogatório do contrato de trabalho. Forma escrita (artigo 349º nº2), cuja inobservância implica
a nulidade do acordo, nos termos do artigo 220.º CC. A produção dos efeitos do acordo pode ser
diferida, nos termos do artigo 349.º nº3. O acordo pode produzir outros efeitos, para lá da
dissolução do vínculo (a possibilidade do pacto de não concorrência – artigo 136.º nº2 a) –, ou o
pagamento de uma compensação pecuniária global (artigo 349º nº5 CT).
Compensação pecuniária global (artigo 349.º nº5 CT), que, como acabámos de dizer, não é
devida por força da lei, mas pode, simplesmente, ser acordada; trata-se de uma compensação
eventual, opcional. O curso aponta que se, de facto, o acordo revogatório dá a possibilidade de o
empregador negociar um despedimento, esta compensação é senão o incentivo dado ao
trabalhador para que tais negociações cheguem a “bom porto”. Para além disto, atenta Leal Amado
na presunção legal da norma em análise, que beneficia o empregador, efetivamente, sem esta
presunção, o trabalhador receberia a compensação como um plus, para lá dos créditos que lhe são,
sempre, devidos. Resta, como se nota, saber se a presunção que se tem é ultrapassável ou não, ao
que o curso responde com a primeira.
Quanto à cessação do acordo, notemos que é reconhecido ao trabalhador, pelo artigo 350.º nº1 CT,
um “direito ao arrependimento”, um verdadeiro direito potestativo de revogar, unilateralmente, o
acordo revogatório em questão, o que se explica, sem mais, por dois motivos:
❖ Combate à fraude do empregador;
❖ Garantia de ponderação para o trabalhador, neste cooling - off period de sete dias.
Que prazo concede a lei ao trabalhador para exercer o seu “direito de arrependimento”? O CT concede ao
trabalhador 7 dias consecutivos, mais um dia útil, para fazer valer aquele direito.
Perante a possibilidade de o início da produção dos efeitos do acordo não coincidir com o momento da sua
celebração, como se determina o início da contagem do prazo supracitado? A letra da norma parece não
deixar grandes dúvidas: “a partir da celebração”. Em todo o caso, o curso repara que, no n.º 3 do 350.º,
há uma clara presunção de coincidência dos momentos, pelo que milita em favor da contagem a
partir do início da produção de efeitos.
Despedimento (artigo 351º a 393º CT) – a cessação do contrato de trabalho por iniciativa do
empregador. Desde há vários anos que a tutela de segurança no emprego se vem traduzindo numa
base tripla: motivação (aqui se baseia a proibição dos artigos. 53.º CRP e 338.º CT);
processualização ou procedimentação (a inexistência ou nulidade do processo/procedimento
disciplinar determinam a ilicitude ou irregularidade do despedimento); sancionamento dos
despedimentos contra legem (o despedimento ilícito é, como se verá, inválido).
Existem duas modalidades de despedimento: Despedimento por causas subjetivas
(despedimento com justa causa); Despedimentos por causas objetivas (despedimento coletivo,
despedimento por extinção de posto de trabalho, despedimento por inadaptação).
Despedimento com justa causa: são proibidos os despedimentos sem justa causa (artigo 338º
CT), interessa, desde logo, definir justa causa (artigo 351º nº1 CT). O despedimento com justa causa
constitui a sanção disciplinar mais grave (artigo 328 CT).
O n.º 2 do artigo 351.º logo apresenta alguns casos-tipo considerados fundamento para o
despedimento com justa causa. Entende-se, porém, que nenhum dos motivos presentes neste
elenco constitui condição necessária ou suficiente para a existência de justa causa.
Ganham, aqui, destaque os deveres que impendem sobre o trabalhador, para além do dever
principal da prestação de trabalho (artigo 128º CT) – dever de obediência, dever de diligência, dever de
assiduidade e de pontualidade, dever de lealdade (importa não confundir o dever de não concorrência
com o pacto de não concorrência), dever de respeito, urbanidade e probidade, dever de custódia, dever de
produtividade.
O trabalhador não deixa de ser pessoa-cidadão no espaço-tempo laboral, mas também não deixa de ser
trabalhador fora do espaço-tempo laboral.
Como manifestação interina à empresa do princípio do contraditório (artigo 329º nº6 CT),
ganham relevo as fases do procedimento disciplinar (artigo 353º a 358º), cuja inobservância
poderá, até, redundar na ilicitude do despedimento, como vemos pelo artigo 382.º nº2 CT.
Acusação (artigo 353º nº1 CT). A entrega da “nota de culpa”, acompanhada da intenção de proceder
ao despedimento, pelo empregador desencadeia o procedimento disciplinar (artigo 329º nº1 e 2).
Defesa (artigo 355º nº1 CT). Reconhece-se ao trabalhador a faculdade de se defender.
Instrução (artigo 356º nº1, 3 e 4 CT). A instrução era facultativa de acordo com o artigo 356º nº1.
No entanto, este número veio a ser considerado constitucional por força do artigo 32 nº10 CRP.
Parecer da estrutura representativa dos trabalhadores (artigo 356º nº5, 6 e 7 CT). O empregador
deverá, após o que se disse, apresentar cópia integral do processo à comissão de trabalhadores,
que lhe poderá juntar um parecer fundamentado, não vinculativo.
Decisão (artigo 357º CT). Após receber o parecer, ou decorrido o prazo para esse efeito, o
empregador tem 30 dias para proferir uma decisão, fundamentada e num documento escrito.
Nas microempresas o regime é específico e integra o artigo 358º CT.
Despedimento coletivo (artigo 359º a 366º CT): artigo 359º nº1. O que sustenta o
despedimento são fundamentos não subjetivos, mas sim de mercado, estruturais ou tecnológicos
(artigo 359º nº2).
Vemos que a noção legal de despedimento pressupõe um elemento fundamental de natureza dos
factos justificativos subjacentes, e não, como o nome poderia levar a pensar, num aspeto
quantitativo.
O próprio procedimento tramita noutros termos, e numa lógica totalmente distinta do que vimos
na modalidade anterior: vejam-se os artigos 360.º a 365.º para este efeito.
Reconhece-se aos trabalhadores, contanto que se observe este procedimento, um direito a
compensação pela perda do emprego (artigo 366º nº1 e 2CT).
Num período temporal inferior a 2 anos, o critério de cálculo da compensação devida aos trabalhadores abrangidos por
despedimento coletivo modificou-se drasticamente (30-20-12).
Meios de reação contra o despedimento – Se um trabalhador que tenha sido despedido entender que
foi despedido ilegalmente, como poderá ele reagir? O CT responde a isto nos seus artigos 386º a 388º:
❖ Providência cautelar da suspensão preventiva do despedimento (artigo 386.º CT): cinco
dias uteis, nos termos do Código de Processo de Trabalho;
❖ Ação judicial (artigo 387.º e 388.º): a ação de impugnação da regularidade e ilicitude do
despedimento, tratada nos artigos 98.º-B a 98.º-P, concerne despedimentos, digamo-lo,
declarados/expressos; nos casos em que se discute a existência de despedimento, não se
aplica a ação supra descrita, antes a ação comum no meio processual;
❖ O empregador apenas poderá invocar factos e fundamentos constantes da decisão de
despedimento comunicada ao trabalhador (artigo 387º nº3 e 388º nº3 CT);
❖ No caso de despedimento com justa causa, o tribunal deverá sempre pronunciar-se sobre
a verificação e procedência dos fundamentos invocados para o despedimento (artigo 389º
nº2 CT).
O artigo 388.º, veja-se, diz exclusivo respeito à impugnação judicial de despedimento coletivo (6 meses).
Demissão (artigo 394º a 403º CT) – o CT não prevê expressamente o termo demissão, que
decorre doutrinalmente da congregação dos dois termos que, esses sim, a lei utiliza e distingue:
denúncia (artigo 400º a 403º CT) e resolução (artigo 394º a 399º CT).
Quanto à denúncia (demissão com aviso prévio): vigora, à partida, entre nós, o princípio da livre
demissão (artigo 400.º nº1), mediante as exigências, meramente procedimentais, colocadas.
Interessa saber que a dissolução do vínculo, nestes termos, carece de pré-aviso: a lei obriga o
trabalhador a anunciá-la, procurando garantir ao contrato algum tempo de sobrevivência,
retardando o seu óbito por este dispositivo.
O aviso prévio, a funcionar como termo suspensivo aposto à denúncia do contrato de trabalho,
garante mais algum tempo de manutenção de deveres e direitos das partes em sede laboral, e a
sua duração varia em função de fatores diversos – explanados no artigo 400.º – (conforme se tenha
um contrato standard ou a termo, conforme a duração do termo, de acordo com a antiguidade ou
tarefas desempenhadas pelo trabalhador, entre outros). O incumprimento do aviso prévio, sabe-
se, implica a indemnização ao empregador, pelo trabalhador, no valor da retribuição base e
diuturnidades correspondentes ao período de antecedência em falta: a lei tenta ressarcir não os
danos eventuais que se tenha ao empregador provocado pela dissolução em si, mas antes os danos
que uma rutura brusca e inopinada do contrato provoque.
Temos uma importante exceção ao princípio da livre demissão, neste ponto: a possibilidade de
celebração de um “pacto de permanência” traz que se admite às partes estipularem que, durante
um determinado período – nunca superior a três anos –, o trabalhador se obriga a não denunciar
o contrato, como compensação ao empregador por despesas avultadas feitas com a sua formação
profissional (artigo 137.º nº1), a menos que pague ao empregador a soma correspondente a essas
despesas (artigo 137.º2).
Esta compressão da faculdade de demissão ad nutum limita, mas não extingue, a liberdade de trabalho do trabalhador,
que, simplesmente, é conciliada com as fortes expectativas do empregador em colher frutos da formação dispendiosa
levada a cabo naquele trabalhador (pilotos de aviação).
O curso refere, como outro exemplo de compressão desta faculdade, o disposto no artigo 71.º CT,
relativo ao trabalho prestado por menores sem escolaridade obrigatória ou qualificações
profissionais.
Quanto à resolução (demissão com justa causa): se, quando abordámos a modalidade do
despedimento por justa causa, se nos exigiu que a noção de justa causa fosse especificada, então no
caso em que subjazem à demissão fundamentos de justa causa não começaremos da maneira
distinta. O artigo 394.º, nos seus números 2 e 3, logo nos elenca uma data de causas a poderem
fundamentar a resolução do contrato pelo trabalhador: causas subjetivas (n.º 2 do artigo 394.º); causas
objetivas (n.º 3 do artigo 394.º).
O Código prevê, para esta modalidade de cessação, um procedimento próprio, que expõe no
artigo 395.º; decorrente da resolução do contrato pelo trabalhador é, ainda, uma série de efeitos
indemnizatórios (sustentados na legitimidade fundamentada da demissão), que os artigos 396.º a
399.º explanam com detalhe.