Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Apostila 1° Bimestre Penal UNISAL 2017
Apostila 1° Bimestre Penal UNISAL 2017
Apostila 1° Bimestre Penal UNISAL 2017
CONTEÚDO: Crimes contra o sentimento religioso e o respeito aos mortos (art. 208 à 212); Crimes contra a
dignidade sexual (art. 213 à 234-C); Crimes contra a família (art. 235 à 249); Crimes contra a incolumidade
pública (art. 250 à 285); Crimes contra a paz pública (art. 286 à 288-A); Crimes contra a fé pública (art. 289 à
311-A); Crimes contra a administração pública (art. 312 à 359-H).
1
Ultraje a culto e impedimento ou perturbação de ato a ele relativo
Art. 208 - Escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar
cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso:
2. Ação nuclear: As ações nucleares da 2ª parte do art. 208 consubstanciam-se nos verbos:
Cerimônia = é o ato religioso solene, é a exteriorização de um culto, por exemplo, missa, casamento,
procissão, batizados, ritual, adoração, reverência etc.
Prática de culto = consiste no ato religioso sem as solenidades da cerimônia, é algo mais singelo,
por exemplo, novena, oração, sermão etc.
3. Sujeito ativo: Qualquer pessoa esteja ou não participando da cerimônia ou da prática de culto
religioso.
4. Sujeito passivo: A coletividade religiosa. Trata-se de crime vago (sujeito passivo é indeterminado)
São os fiéis que participam da cerimônia ou prática de culto religioso, bem como aqueles que realizam
a sua celebração.
2. Ação nuclear: A ação nuclear típica da parte final do art. 208 consubstancia-se no verbo
vilipendiar, isto é, tratar com desprezo, desrespeito, humilhar, desonrar, desdém, de modo
ultrajante o ato ou objeto de culto religioso. Pode-se vilipendiar por meio escrito, palavras, por
gestos. Por exemplo: proferir palavrões contra a imagem de um santo, atirar papéis contra ele, chutar
imagens etc.
Exige-se que a ação de vilipendiar seja feita no decorrer do ato religioso ou diretamente
sobre ou contra a coisa objeto do culto religioso.
Deve o vilipêndio ser realizado publicamente, ou seja, na presença de várias pessoas.
Conforme doutrina Nucci, “o objetivo é impedir que várias pessoas tomem conhecimento das
manifestações desairosas a respeito de determinado ato ou objeto de culto religioso, o que pode ferir a
liberdade de culto e crença”.
3
3. Objeto material: O objeto material do crime é, portanto, o ato ou objeto de culto religioso.
Ato religioso compreende a cerimônia ou a prática de culto religioso. Comete, portanto, o
crime aquele que, durante o ato religioso, o vilipendia publicamente.
Objeto de culto religioso é toda coisa corporal inerente ao serviço do culto. Segundo E.
Magalhães Noronha, a expressão usada pela lei abrange a que em si é objeto de culto (imagens), a que
a ele é consagrada (igreja, altares, cálice etc.) e a que obrigatoriamente serve a sua manifestação
(livros litúrgicos, etc.).
Ressalva Hungria: "é preciso que tais objetos estejam consagrados ao culto: não serão
especialmente protegidos quando, por exemplo, ainda expostos à venda numa casa comercial".
4. Elemento subjetivo: É o dolo, isto é, a vontade livre e consciente de vilipendiar o ato ou objeto de
culto religioso.
5. Consumação e tentativa: Consuma-se o crime com a prática do ato ultrajante, por exemplo, atirar
lixo contra a imagem sacra. A tentativa é admissível nesses casos, em que o crime é material. Não será
admissível, por exemplo, na hipótese em que o crime é praticado mediante ofensas verbais.
Como o texto legal não faz distinção, o dispositivo trata tanto da violência física contra a
pessoa ou coisa. Haverá concurso material de crimes se a violência empregada configurar por si só
algum crime (lesões corporais, dano etc.). Nessa hipótese, o concurso dar-se-á com a forma majorada
dos crimes contra o sentimento religioso em virtude do emprego de violência.
Para Nucci (2014, p. 1016), embora a lei não seja expressa, entende que a violência utilizada é
somente contra a pessoa e não a coisas ou animais, justificando seu entendimento que o legislador visa
uma maior proteção ao ser humano.
6. Ação penal: Trata-se de crime de ação penal pública incondicionada, de competência do Juizado
Especial Criminal.
7. Classificação doutrinária: O crime é comum (pode ser praticado por qualquer pessoa); formal
(independe do resultado naturalístico, qual seja o efetivo prejuízo ao sentimento religioso,
consumando-se com a prática da conduta); de forma livre (admite qualquer meio de execução);
unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual (pode ser cometido por uma só pessoa, mas
admite o concurso); unissubsistente (nesse caso, será incompatível com a tentativa ou conatus) ou
plurissubsistente (a conduta criminosa pode, conforme o caso, ser ou não fracionada em diversos
atos); e instantâneo (a consumação ocorre em momento determinado, sem continuidade no tempo).
CAPÍTULO II
DOS CRIMES CONTRA O RESPEITO AOS MORTOS
Impedimento ou perturbação de cerimônia funerária
Art. 209 - Impedir ou perturbar enterro ou cerimônia funerária:
Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa.
Afirma Noronha: "É a piedade que se tem para com eles, sentimento individual e coletivo que
cerca os túmulos, cemitérios e as coisas que servem ao seu culto".
4
Hungria, por sua vez, sustenta: "O que a lei penal protege (e neste particular tem ela caráter
constitutivo, e não meramente sancionatório) não é a paz dos mortos (como se tem pretendido, com
abstração do axioma de que os mortos não têm direitos), mas o sentimento de reverência dos vivos
para com os mortos. É em obséquio aos vivos, e não aos mortos (tal como no caso da 'calúnia contra
os mortos', prevista no art. 138, § 2º), que surge a incriminação. O respeito aos mortos (do mesmo
modo que o sentimento religioso) é um relevante valor ético-social, e, como tal, um interesse jurídico
digno, por si mesmo, da tutela penal".
2. ELEMENTOS DO TIPO:
1. Ação nuclear: As ações nucleares típicas são similares às previstas na 2ª parte do art. 208, caput,
quais sejam, impedir ou perturbar, no caso, enterro ou cerimônia fúnebre. Admite-se que o crime
seja praticado por omissão, por exemplo, deixar de fornecer o veículo para transportar o corpo.
enterro = consiste no transporte do corpo para o local onde será sepultado ou cremado.
cerimônia fúnebre = consubstancia-se em todos os atos por meio do qual o defunto é assistido ou
homenageado, por exemplo, velório, embalsamento, honras fúnebres, etc. Não deve ela ter caráter
religioso, pois, do contrário, o crime será enquadrado no art. 208 do CP.
2. Sujeito ativo: Qualquer pessoa pode praticar o delito em tela. Trata-se de crime comum.
3. Sujeito passivo: Cuida-se de crime vago, isto é, tem por sujeito passivo entidade sem
personalidade jurídica, como a coletividade, a família e os amigos do morto. Este, por não mais
ser titular de direitos, não pode ser sujeito passivo do crime em estudo.
Para Nucci (2014, p. 1017) já seria necessário a presença do elemento subjetivo do tipo
específico de realmente querer ultrajar a memória do morto, citando como exemplo de pessoas que em
velórios ficam descontroladas, perturbando nitidamente a cerimônia, mas que não estariam fazendo
com intenção de menoscabar a memória do morto, ainda que saibam que estão perturbando.
6. FORMAS:
6.1. Simples: Está prevista no caput.
6.2. Majorada:
Art. 209, parágrafo único: "Se há emprego de violência, a pena é aumentada de um terço, sem
prejuízo da correspondente à violência". O mesmo parágrafo, portanto, prevê o concurso material de
crimes. Vide comentários ao art. 208, parágrafo único.
8. Classificação doutrinária: O crime é comum (pode ser praticado por qualquer pessoa); vago (tem
como sujeito passivo principal um ente destituído de personalidade jurídica); formal (não exige efetiva
lesão à memória dos mortos e ao respeito a ela devido); de forma livre (admite qualquer meio de
execução); unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual (pode ser cometido por uma só pessoa,
mas admite o concurso); unissubsistente (nesse caso, será incompatível com a tentativa ou conatus.
Exemplo: explodir uma bomba durante a cerimônia fúnebre) ou plurissubsistente (a conduta
5
criminosa pode, conforme o caso, ser ou não fracionada em diversos atos); e instantâneo (a
consumação ocorre em momento determinado, sem continuidade no tempo).
Violação de sepultura
Art. 210 - Violar ou profanar sepultura ou urna funerária:
Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.
- Sepultura é a cova onde se coloca o morto e seus acessórios, como o jazigo, a lápide que compõe o
túmulo etc.. Segundo E. Magalhães Noronha, "abrange o sepulcro, a tumba e o túmulo. É o lugar
onde se acha inumado um cadáver humano ou suas partes. Não é apenas a cova ou vala, mas
compreende também o que se acha construído sobre ela - os adornos fixados, a lápide, as inscrições
etc., tudo, em conjunto, formando a última morada". Deve necessariamente conter o cadáver.
- Urna funerária compreende as caixas, cofres ou vasos que contêm as cinzas ou ossos do morto.
Obs.: Sepulcro ou urna vazia: crime impossível – absoluta impropriedade do objeto (art. 17, CP).
5. Sujeito passivo: Trata-se de crime vago. Sujeito passivo é a coletividade, a família e os amigos do
falecido.
2ª) Exige-se o elemento subjetivo do tipo somente na modalidade profanar, pois não há profanação
sem o intuito de vilipendiar ou desprezar a memória do morto ou seu sepulcro. Opinião de Nucci
(2014, p. 1018).
3ª) A figura penal não exige o chamado elemento subjetivo do tipo. É irrelevante indagar qual o
propósito do agente.
6
8. CONCURSO DE CRIMES:
a) Violação e profanação (art. 210): se para a prática do crime de violação de sepultura ou urna
funerária forem cometidos também atos de profanação, estes restam absorvidos pela violação. Há,
portanto, crime único.
b) Violação de sepultura (art. 210) e crime de calúnia contra os mortos (art. 138, § 2º): se a
profanação constituir calúnia contra o morto haverá concurso formal entre os citados crimes.
c) Violação de sepultura (art. 210) e subtração ou destruição de cadáver (art. 211): há crime
único. Na hipótese em que o cadáver se encontra sepultado, a violação de sepultura constitui meio
necessário para a prática do crime-fim, que é a subtração ou destruição de cadáver. Desse modo, o
primeiro delito resta absorvido pelo segundo. Vale ainda mencionar que os dois delitos atingem a
mesma objetividade jurídica e a pena cominada para ambos é idêntica.
d) Violação de sepultura (art. 210) e furto (art. 155): se o agente violar a sepultura e subtrair objetos
(p. ex., joias, dinheiro, dentes de ouro) que foram enterrados juntos ao corpo do falecido existem duas
correntes.
- Para a 1ª corrente (Fernando Capez), entende que os familiares são os donos dos bens (“coisa
alheia”), e a violação é absorvida pelo furto, uma vez que se trata de meio necessário para a prática
do crime, sendo aplicável o princípio da consunção (RT 598/313). Entretanto, se for praticado
vilipêndio, haverá concurso material de delitos, uma vez que para se subtraírem objetos de uma
sepultura não é necessário vilipendiar o cadáver. Só a violação do sepulcro integra a fase de preparação
e, portanto, somente ela restará absorvida.
- Para a 2ª corrente (Victor Eduardo Rios Gonçalves e Nucci (2014, p. 1018)), esses objetos
equivalem à coisa abandonada, pois os objetos materiais que estão dentro da cova não pertencem
a ninguém, sendo ali abandonados pela família, e o delito configura violação de sepultura. “A
subtração de coroa dentária de cadáver, após a violação da sepultura, não configura o delito de furto,
mas somente o descrito no art. 210 do CP” (TJSP – RT 243/265 e RT 619/291).
Se o agente subtrai objetos externos, como placas de bronze ou de prata, sem violar ou
profanar a sepultura, não há dúvida de que o crime é o de furto.
10. AÇÃO PENAL: Pública incondicionada. Cabível a suspensão condicional do processo (art. 89 da
Lei n. 9.099/95).
11. Classificação doutrinária: O delito é comum (pode ser praticado por qualquer pessoa); vago (tem como
sujeito passivo principal um ente destituído de personalidade jurídica); formal (não exige efetiva lesão à
memória dos mortos e ao respeito a ela devido, basta violar ou profanar a sepultura ou urna funerária); de
forma livre (admite qualquer meio de execução); unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual (pode ser
cometido por uma só pessoa, mas admite o concurso); em regra plurissubsistente; e instantâneo (a
consumação ocorre em momento determinado, sem continuidade no tempo).
7
Destruição, subtração ou ocultação de cadáver
b) subtrair = significa tirar o cadáver ou parte dele da esfera de proteção ou guarda da família,
amigos, vigias do cemitério. Importante: Na hipótese de o cadáver integrar o patrimônio de alguma
Universidade ou instituto de pesquisa, a subtração constitui crime de furto; ou
c) ocultar = significa esconder, colocar o corpo em local onde não possa ser encontrado, mas sem que
isso implique destruição do cadáver ou parte dele. Há apenas o desaparecimento do objeto do
crime, por exemplo, após o atropelamento, o agente esconde a vítima no interior de uma mata ou a
joga em um rio ou a esconde em sua residência.
A ocultação somente pode ocorrer antes do sepultamento, ao passo que a subtração pode dar-se
antes ou depois do sepultamento, por exemplo, haverá subtração se, durante um velório, pessoas tiram
o corpo do ataúde e fogem com ele.
3. Objeto material: É o cadáver ou parte dele. Cadáver é o corpo privado da vida, mas que ainda
conserva a forma humana, ou seja, é o corpo humano morto.
Assim, não se considera cadáver o esqueleto humano ou as suas cinzas, as múmias e os
corpos já decompostos; quanto a estas, constituem objeto material do crime previsto no art. 212 de
vilipêndio ao cadáver.
Exclui-se também a múmia do conceito de cadáver, sendo certo que a sua subtração pode
configurar o crime de furto. O coveiro que subtrai crânios para vendê-los a estudantes de odontologia
incorre no crime de violação de sepultura, porque a ossada não integra o conceito de cadáver, embora
outros entendam tratar-se, neste caso, de furto.
O natimorto, ou seja, aquele que, tendo chegado à maturação necessária, isto é, ao termo da
gravidez, nasce sem vida, pacificamente também é considerado cadáver.
8
4. Sujeito ativo: Qualquer pessoa pode praticar o delito em tela, inclusive a própria família do morto.
Trata-se de crime comum.
5. Sujeito passivo: Trata-se de crime vago. Sujeito passivo é a coletividade, a família e os amigos
do falecido.
8.1 Erro de proibição: Nucci (2014, p. 1019) entende que é possível a configuração do erro de
proibição (credulidade na licitude da conduta) quando o agente, visando realizar transplante, e
acreditando que o morto, ainda em vida, era considerado doador de órgãos ou tecidos, quando na
verdade não era.
Autodefesa: Nucci (2014, p. 1020) entende que não é admissível que se invoque o direito à autodefesa
para o cometimento do delito, pois o que se pretende tutelar é o respeito à memória dos mortos, que
mereceria um sepultamento digno. Assim, em um homicídio, se o homicida desaparecer com o corpo
(prova da materialidade da infração penal), deve responder em concurso material com o homicídio.
Se o agente para destruir ou subtrair o cadáver tiver ele violar a sua sepultura (CP, art. 210),
haverá crime único.
10. AÇÃO PENAL: Trata-se de crime de ação penal pública incondicionada. É cabível a suspensão
condicional do processo (art. 89 da Lei n° 9.099/95).
11. Classificação doutrinária: Trata-se de crime comum (praticado por qualquer pessoa); doloso;
vago (tem como sujeito passivo principal um ente destituído de personalidade jurídica); formal (não
exige efetiva lesão à memória dos mortos e ao respeito a ela devido, basta destruir, subtrair ou ocultar
cadáver); de forma livre (admite qualquer meio de execução); unissubjetivo, unilateral ou de
concurso eventual (pode ser cometido por uma só pessoa, mas admite o concurso); em regra
plurissubsistente; e instantâneo (a consumação ocorre em momento determinado, sem continuidade
no tempo) ou permanente (a consumação se prolonga no tempo), na modalidade “ocultar”.
Vilipêndio a cadáver
Art. 212 - Vilipendiar cadáver ou suas cinzas:
Pena - detenção, de um a três anos, e multa.
9
2. ELEMENTOS DO TIPO: Consubstancia-se no verbo vilipendiar, isto é, ultrajar, desrespeitar,
tratar com desprezo, no caso, o cadáver ou suas cinzas. Difere, portanto, do crime previsto no art.
208, pois neste o vilipêndio atinge ato ou objeto de culto religioso. O vilipêndio pode ser praticado
de diversos modos, por exemplo, atirar excrementos no cadáver, proferir palavrões contra ele,
desferir cusparada, praticar atos sexuais com ele (necrofilia) etc. Deve, portanto, a ação criminosa
se dar sobre ou junto ao cadáver ou suas cinzas.
3. Objeto material: É o cadáver ou suas cinzas. Cadáver é o corpo privado da vida, mas que ainda
conserva a forma humana. Cinzas humanas constituem os resíduos da combustão ou cremação do
corpo (autorizada, casual ou criminosa). Segundo Noronha, "a vontade da lei é tutelar não só estas e o
cadáver, mas também as partes dele, o esqueleto etc., já que ela se referiu aos extremos - cadáver ou
cinzas - abrangendo, portanto, o que se situa entre eles, ou seja, entre os extremos".
4. Sujeito ativo: Qualquer pessoa pode praticar o delito em tela, inclusive a própria família do morto.
5. Sujeito passivo: Trata-se de crime vago. Sujeito passivo é a coletividade, a família e os amigos do
falecido.
8. CONCURSO DE CRIMES: Se o agente violar sepultura e ultrajar cadáver, por exemplo, jogando
sobre ele excrementos, haverá concurso formal de crimes (arts. 210 e 212). Da mesma forma, se o
vilipêndio configurar calúnia contra o falecido, haverá concurso formal de crimes (arts. 138, § 2º, e
212). Caso o sujeito agarre uma mulher a fim de estuprá-la e a mate porque ela tentava se esquivar do
ato sexual, e, somente após a morte, ele consiga a penetração, responde por homicídio qualificado,
tentativa de estupro e vilipêndio a cadáver, em concurso material.
9. AÇÃO PENAL: Trata-se de crime de ação penal pública incondicionada. É cabível a suspensão
condicional do processo (art. 89 da Lei n° 9.099/95).
10. Classificação doutrinária: O crime é comum (pode ser praticado por qualquer pessoa); vago (tem
como sujeito passivo principal um ente destituído de personalidade jurídica); formal (não exige efetiva
lesão à memória dos mortos e ao respeito a ela devido, basta vilipendiar o cadáver ou suas cinzas); de
forma livre (admite qualquer meio de execução); unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual
(pode ser cometido por uma só pessoa, mas admite o concurso); unissubsistente (exemplo: vilipêndio
verbal) ou plurissubsistente; e instantâneo (a consumação ocorre em momento determinado, sem
continuidade no tempo).
TÍTULO VI
DOS CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL
A tutela da dignidade sexual deflui do princípio da dignidade humana, que se irradia sobre
todo o sistema jurídico e possui inúmeros significados e incidências, estando diretamente ligada à
liberdade de autodeterminação sexual da vítima, à sua preservação no aspecto psicológico, moral e
físico, de forma a manter íntegra a sua personalidade.
11
CAPÍTULO I
DOS CRIMES CONTRA A LIBERDADE SEXUAL
Os crimes previstos nesse capítulo atingem a faculdade de livre escolha do parceiro sexual. É o
direito de dispor do próprio corpo, de selecionar os parceiros e de praticar livremente os atos do sexo.
Essa faculdade da liberdade carnal pode ser violada por:
1. ESTUPRO
Art. 213: Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou
permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso: (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos. (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
§ 1o Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de 18 (dezoito) ou maior de
14 (catorze) anos: (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
Pena - reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
1. Tipo objetivo: Constranger significa obrigar, tolher a liberdade, coagir alguém a fazer ou
deixar de fazer algo contra a sua vontade, e, por isso, se existe consentimento da pessoa, não há
crime. “Stuprum, no sentido próprio, significa desonra, vergonha”.
Deve ser ainda, um dissenso sério, que demonstre não ter a pessoa aderido à conduta do
outro. Não se exige, entretanto, uma resistência heróica por parte dela.
Obs.: Se o agente forçar a vítima a contemplá-lo enquanto se masturba, não há o crime em tela, pois
não houve a participação física (ativa ou passiva) da vítima no ato libidinoso. Neste sentido se
manifestou o STJ (REsp. 63.509-RS). Poderá configurar o crime de constrangimento ilegal (art. 146
CP) ou o art. 218-A CP se o agente for menor de 14 anos (Satisfação de lascívia mediante presença de
criança ou adolescente).
Estupro por inseminação artificial: Para Nucci (2014, p. 1032) é impossível. O tipo penal exige,
para a sua configuração, a conjunção carnal ou qualquer outro ato libidinoso entre o agente e a vítima.
Assim, se houver a inseminação artificial forçada, deve o autor responder somente por
constrangimento ilegal. Nessa ótica, também a lição de René Ariel Dotti (O incesto, p. 90-92).
12
Beijo lascivo e ato libidinoso diverso da conjunção carnal:
O beijo lascivo, dado com eroticidade, apalpar os seios ou nádegas, ou acariciar suas partes
íntimas, ainda que vestida, caso praticado com emprego de violência ou grave ameaça, caracteriza o
crime de estupro. Incluem-se os beijos voluptuosos, com “longa e intensa descarga de libido”, nas
palavras de Hungria, dados na boca, com a introdução da língua. Para Nucci (2014, p. 1032), estariam
excluídos os beijos castos, furtivos ou brevíssimos, tais como os dados na face ou rapidamente nos
lábios (“selinho”).
No entanto, na opinião de Cezar Roberto Bitencourt, entende que, a partir da Lei dos Crimes
Hediondos, com pena mínima de seis anos de reclusão, acaba gerando um dano ao princípio da
proporcionalidade, uma total diferença entre a gravidade de um sexo anal e oral e os demais atos
libidinosos. Nesses casos, quando ocorre em lugar público ou acessível ao público, deve desclassificar-
se para a contravenção penal do art. 61 (LCP).
Luiz Flávio Gomes, baseando-se na doutrina de Claus Roxin, indaga: Um beijo lascivo é crime
hediondo? Para ele, seria no máximo a contravenção penal de importunação ofensiva ao pudor
(art. 61: Importunar alguém, em lugar público ou acessível ao público, de modo ofensivo ao pudor:
Pena – multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis). (CAPEZ, 2014, p. 28)
Em sentido contrário, Damásio sustenta configurar o crime de estupro o ato de despir uma
jovem a apalpar os seios desnudos com o emprego de violência ou grave ameaça, ou acariciar as partes
pudendas de uma jovem sobre o vestido. Capez entende também que se for com violência ou grave
ameaça é crime de estupro. Da mesma forma, o beijo lascivo, quando praticado com o emprego de
violência ou grave ameaça, é crime de estupro. A contravenção de importunação ofensiva ao pudor
(art. 61 da Lei das Contravenções Penais) pode ser praticada através de atos libidinosos, desde que
não ocorra emprego de violência ou grave ameaça. Ex.: em um coletivo lotado, encostar-se na vítima;
dar um beijo rápido, sem introdução da língua e sem lascívia; apalpar os seios da ofendida a pretexto
de tecer comentários irônicos sobre seu tamanho.
Para ir mais longe: Homem pega pena de sete anos de prisão por 'beijo forçado' no carnaval – Disponível em:
http://g1.globo.com/bahia/noticia/2015/02/homem-pega-pena-de-sete-anos-de-prisao-por-beijo-forcado-no-
carnaval.html
2. Meios executórios:
A lei descreve como meios de execução do estupro o emprego de violência (real) ou grave
ameaça. Há estupro com violência real quando o agente agarra a mulher à força, quando a agride,
amarra suas mãos, derruba-a no chão e deita sobre ela etc.
- violência contra pessoa diversa: Para Nucci (2014, p. 1034-1035) a violência exercida contra
pessoa diversa da vítima também é viável para configurar o crime. A grave ameaça, por sua vez,
consiste na promessa de mal injusto e iminente à vítima (direto) ou a algum ente querido (indireto),
como a ameaça de morte, de provocação de lesões corporais etc.
- violência contra coisa: Para Nucci (2014, p. 1035), em tese, também seria possível caracterizar o
crime quando a violência é exercida contra coisa, citando como exemplo, quando o indivíduo ameaça
destruir coisa que pertence a vítima que lhe é extremamente cara e relevante.
Conduta omissiva: É possível a responsabilização penal por crime de estupro até mesmo em virtude
de conduta omissiva. Ex.: mãe que nada faz para evitar que seu amásio mantenha conjunção carnal
com a filha de quinze anos de idade. A mãe tinha o dever jurídico de proteção; tendo permitido
pacificamente a prática do delito, responderá por ele juntamente com o amásio. Se a vítima tinha
menos de 14 anos, ambos responderão por crime de estupro de vulnerável (art. 217-A).
13
3. Sujeito ativo: Antes da reforma promovida pela Lei nº 12.015/2009, somente o homem podia ser
sujeito ativo, uma vez que o crime consistia somente na conjunção carnal (introdução do pênis na
vagina da vítima), e tinha como elemento do tipo “constranger mulher”. Com a alteração do artigo,
não só mais o homem, mas a mulher também pode ser sujeito ativo no crime de estupro.
Uma mulher pode também responder por crime de estupro em co-autoria quando
colabora com o delito cometido por algum homem. Ex.: ajudando a segurar a vítima, instigando a
prática do estupro etc. A mulher também poderá ser responsabilizada como autora mediata de estupro
caso induza um doente mental ou menor a forçar outra mulher à conjunção carnal.
Obs.: Síndrome da Mulher de Potifar – é a figura criminológica da mulher que, sendo rejeitada, imputa
falsamente, contra quem a rejeitou, conduta criminosa, relacionada a dignidade sexual. História de José na
Bíblia. Para Nucci (2014, p. 1038) pode haver condenação por estupro baseada na palavra da vítima, mas devem
ser levados em consideração todos os aspectos que constituem a personalidade do ofendido, seus hábitos, seu
relacionamento anterior com o agente, bem como com as demais provas existentes nos autos.
4. Sujeito passivo: Tanto o homem como a mulher. Na antiga redação do art. 213 CP, apenas as
mulheres podiam ser vítimas desse crime.
No caso de mulher, o art. 213 não faz qualquer distinção, de forma que qualquer mulher pode
ser vítima (honesta, prostituta, virgem ou não, moça ou de idade avançada). Se a vítima, porém,
for menor de 14 anos, haverá o delito do art. 217-A CP (estupro de vulnerável).
Obs.: Note-se que o legislador incorreu em grave equívoco, na medida em que, se o crime for
praticado contra a vítima no dia do seu 14º aniversário, não haverá o delito do art. 217-A nem a
qualificadora do § 1º do art. 213 do CP, deve ser aplicado o estupro na forma simples do caput.
O marido, e hoje a mulher, pode ser acusado(a) de estupro contra sua própria esposa (ou
marido)?
Há duas correntes:
a) Não: Nelson Hungria e Magalhães Noronha entendem que não, uma vez que o Código Civil traz
como conseqüência do casamento o dever da coabitação, que significa que os cônjuges têm o dever
de manter relação sexual. Assim, na hipótese de recusa injustificada da mulher, o marido pode forçá-la
ao ato sexual, sem que responda por estupro, por estar agindo no exercício regular de um direito
(art. 23, III do CP). Para esses autores, somente haverá estupro se existir "justa-causa" para a recusa da
mulher. Ex.: marido que acabou de chegar de prostíbulo ou que está com doença venérea etc.
Posicionamento antigo.
b) Sim: Capez (2014, p. 33) Damásio E. de Jesus, Celso Delmanto, Júlio F. Mirabete e Guilherme de
Souza Nucci (2014, p. 1030) entendem que haverá estupro sempre que houver constrangimento,
uma vez que a lei civil não autoriza o emprego de violência ou grave ameaça para fazer valer o
dever de coabitação. Em verdade, o desrespeito a esse dever pode gerar, na própria esfera cível, a
decretação do divórcio. Assim, quando há emprego de violência ou grave ameaça, não se pode falar
em exercício regular de direito, portanto há crime. Violação do princípio da dignidade da pessoa
humana, e da inviolabilidade do corpo da mulher.
Após o advento da Lei 11.106/2005, que alterou o art. 226, II CPB, passando a prever um
aumento de metade da pena para todos os crimes sexuais cometidos contra cônjuge, tornou-se
evidente a possibilidade de o marido cometer estupro contra a própria esposa. Posição majoritária.
6. Consumação: A conjunção carnal consuma-se com a introdução, ainda que parcial, do pênis na
vagina. Não há necessidade de ejaculação. O ato libidinoso consuma-se com a prática de qualquer ato
libidinoso diverso da cópula vagínica. Assim, se antes de ocorrer a conjunção carnal o agente já
realizou outro ato libidinoso, o crime já está consumado.
Para ir mais longe: Policial abusa de passageira em trem da CPTM e deve responder por
estupro: Suspeito ejaculou na vítima e foi agredido por passageiros na estação São Miguel
Paulista. Disponível em: http://noticias.r7.com/sao-paulo/policial-abusa-de-passageira-em-trem-da-
cptm-e-deve-responder-por-estupro-16122016
7. Tentativa. É possível, quando o agente emprega a violência ou grave ameaça e não consegue
realizar qualquer ato sexual com a vítima por circunstâncias alheias à sua vontade, por exemplo, o
agente armado obriga a vítima a entrar em casa abandonada para estuprá-la mas ela consegue fugir.
8. Concurso:
a) Se no mesmo contexto fático o agente mantém mais de uma conjunção carnal com a mesma
mulher, responde por crime único de estupro.
Entretanto, se dois homens em concurso revezam-se na prática da conjunção carnal (curra –
denominação popular na qual duas ou mais pessoas abusam sexualmente da vítima), respondem
por dois crimes de estupro (por autoria direta em um fato e co-autoria no outro). Nesses casos, a
jurisprudência tem entendido ser aplicável o crime continuado. Haverá, também, um aumento de um
quarto na pena por terem os delitos sido cometidos mediante o concurso de pessoas (art. 226, I, CPB,
com redação dada pela Lei 11.106/2005).
b) Se o agente, em momentos diversos, mantém conjunção carnal com a mesma mulher, há crime
continuado (se os crimes forem praticados sob o mesmo modo de execução, na mesma cidade e sem
que tenha decorrido mais de um mês entre uma conduta e outra) ou concurso material (caso
ausente algum dos requisitos do crime continuado). Ex.: pai que estupra a filha por diversas ocasiões,
durante vários meses ou até durante anos.
c) Se em um mesmo contexto fático o agente estupra duas mulheres, responde pelos dois crimes (duas
ações) em continuação delitiva. Nessa hipótese, é aplicável a regra do art. 71, parágrafo único, do
Código Penal, que, segundo estabelece, no crime continuado praticado dolosamente, mediante
violência ou grave ameaça contra vítimas diversas, o Juiz pode até triplicar a pena. Observe-se,
entretanto, que, sendo apenas duas as vítimas, o Juiz não poderá aplicar o aumento máximo, limitando-
se a duplicá-la.
d) O art. 130, caput, do Código Penal prevê o crime de perigo de contágio venéreo, punindo quem
sabe ou deve saber que está acometido de doença venérea e, mesmo assim, mantém relação sexual com
a vítima, sem intenção de transmitir a doença.
Dessa forma, o estuprador que sabe ou deve saber estar contaminado, responde pelo crime de
estupro em concurso formal com o mencionado delito de perigo.
15
e) O art. 130, § 1º, CP, por sua vez, descreve uma forma qualificada do crime de perigo de contágio
venéreo, para a hipótese em que o agente, sabendo ou devendo saber da doença, pratica o
ato sexual, querendo transmiti-la à vítima.
Nesse caso, se a conduta for praticada por ocasião de um estupro, haverá também concurso
formal entre os crimes. Acontece, contudo, que nessa hipótese será aplicado o denominado concurso
formal impróprio (imperfeito), que determina a soma das penas quando o agente, com uma só
ação, visa efetivamente produzir dois resultados (art. 70, caput, 2ª parte).
Por se tratar de crime de perigo, pressupõe que não ocorra a transmissão da moléstia. Se
houver, afasta-se a incidência do crime do art. 130, § 1º, e aplica-se a causa de aumento do art.
234-A, IV, CP ao crime de estupro.
f) Se o agente mantém conjunção carnal e outros atos libidinosos (coito anal, por ex.) contra a
mesma vítima, no mesmo contexto fático, responde por crime único de estupro, já que, após o
advento da Lei nº 12.015/2009, o crime de estupro passou a ter tipo misto alternativo, abrangendo
tanto a conjunção carnal como outros atos de libidinagem. A pluralidade de atos sexuais deve ser
apreciada pelo juiz na fixação da pena-base. É também a maioria dos doutrinadores, como
Nucci. Nesse sentido: STJ – HC 144870/DF; STF – HC 108181/RS.
Para alguns doutrinadores, passaram a entender que, nesta hipótese, deve ser reconhecida a
continuidade delitiva (crime continuado), por ser o art. 213 um tipo misto cumulativo. Na
vigência da legislação antiga, prevalecia o entendimento de que entre estupro e atentado violento ao
pudor devia ser aplicada a regra do concurso material porque tais crimes não eram da mesma
espécie (mesmo tipo penal) e hoje são. Nesse sentido: STF – HC 86110/SP.
§ 1o Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de 18 (dezoito) ou maior
de 14 (catorze) anos: (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
Pena - reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
Se a vítima for menor de 14 anos, configura-se o crime de estupro de vulnerável (art. 217-
A), independentemente do emprego de violência ou grave ameaça.
Há uma lacuna caso o estupro seja praticado no dia do aniversário de 14 anos. Para
Victor Eduardo Rios houve um mero equívoco do legislador, devendo o crime ser qualificado.
As hipóteses de lesão grave que qualificam o estupro são aquelas elencadas nos §§ 1º e 2º do
art. 129 do Código Penal.
Eventuais lesões leves ou vias de fato decorrentes da violência empregada pelo estuprador
ficam absorvidas pelo crime-fim (estupro).
Importante: Essas figuras qualificadas (lesão grave e morte) são exclusivamente preterdolosas
em razão do montante de pena prevista em abstrato. Por isso o julgamento cabe ao juízo singular
e não ao Tribunal do Júri.
Concurso material: Se ficar demonstrado que houve dolo de provocar a lesão grave ou morte, o
agente responde por estupro simples em concurso material com o crime de lesão corporal grave
ou homicídio doloso. Ex.: estupra e depois mata para manter a impunidade.
16
Se o agente tenta estuprar a vítima e não consegue e, por isso, comete homicídio e, em seguida,
pratica ato libidinoso com o cadáver, responde por tentativa de estupro simples, homicídio qualificado
e vilipêndio a cadáver, em concurso material.
11. Natureza hedionda: A Lei nº 12.015/2009 alterou a redação do art. 1º, V, da Lei nº 8.072/90
(Crimes Hediondos), e, declarou de natureza hedionda “estupro (art. 213, caput e §§ 1o e 2o)”, em sua
forma tentada ou consumada. Essa nova redação, que passou a prever o caput do art. 213, afasta
qualquer possibilidade de controvérsia, deixando claro que tanto o estupro simples como suas
figuras qualificadas, constituem crime hediondo.
12. Causas de aumento de pena: Após o advento da Lei nº 12.015/2009, por equívoco do legislador,
passaram a existir dois Capítulos com a mesma denominação – “Disposições Gerais” – no Título
dos crimes contra a dignidade sexual. São os Capítulos IV e VII. Neles existem causas de aumento de
pena aplicáveis ao estupro e a todos os demais crimes contra a dignidade sexual, respectivamente nos
arts. 226 e 234-A:
CAPÍTULO IV
DISPOSIÇÕES GERAIS
Aumento de pena
II – de metade, se o agente é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor,
curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro título tem autoridade sobre ela; (Redação
dada pela Lei nº 11.106, de 2005)
Nessas hipóteses, o legislador entendeu ser necessária a majoração da pena por ser o delito
cometido por pessoa que exerce autoridade sobre a vítima. Ex.: carcereiro sobre a presa; amásio da
mãe da vítima etc.
É evidente que não pode ser aplicada ao crime de estupro a agravante genérica do art. 61, II,
“e”, do CP, que se refere a crime cometido contra descendente, cônjuge ou irmão, na medida em que
haveria bis in idem já que o fato já considerado causa especial de aumento de pena do art. 226, II.
CAPÍTULO VII
DISPOSIÇÕES GERAIS (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
Aumento de pena (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
Art. 234-A. Nos crimes previstos neste Título a pena é aumentada: (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
I – (VETADO); (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
III - de metade, se do crime resultar gravidez; e (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
Será necessário demonstrar que a gravidez foi resultante do ato sexual forçado.
17
O art. 128, II, CP permite a realização de aborto por médico, quando a gravidez for resultante
de estupro, desde que haja consentimento da gestante. É o chamado Aborto sentimental ou
humanitário.
IV - de um sexto até a metade, se o agente transmite à vitima doença sexualmente transmissível de que sabe ou
deveria saber ser portador. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
Note-se que o presente dispositivo não se refere tão somente às doenças venéreas, como sífilis,
gonorréia, cancro mole, papilomavírus, alcançando todas as doenças sexualmente transmissíveis.
Com isso, em tese, estaria abrangida a transmissão da AIDS. De ver-se, todavia, que, como esta
doença é incurável, sua transmissão constitui, para alguns, lesão gravíssima (art. 129, § 2º, II, CP) e,
para outros, tentativa de homicídio, de modo que, o agente deve ser responsabilizado por crimes de
estupro em concurso com lesão gravíssima ou tentativa de homicídio, pois, no mínimo, agiu com
dolo eventual em relação à transmissão da doença. Caso se demonstre efetiva intenção de transmiti-la,
a hipótese será de concurso formal impróprio em decorrência da autonomia de desígnios e as penas
serão somadas.
13. Ação penal: A atual redação do art. 225 CP, com a redação dada pela Lei nº 12.015/2009, traz duas
regras em relação ao crime de estupro:
Art. 225. Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública
condicionada à representação. (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
Esta regra vale para todos os crimes dos capítulos I e II, incluindo o estupro qualificado pela
lesão grave e pela morte. Em relação a lesão grave, é até aceitável a regra, na medida em que a lesão
grave que qualifica o estupro é a culposa, que também depende de representação, nos termos do art. 88
da Lei nº 9.099/95.
Já em relação à qualificadora da morte não há como aceitar que a ação dependa de
representação. Primeiro porque a Constituição Federal reconhece o direito à vida e não pode deixar nas
mãos de terceiros (cônjuge, ascendentes, descendentes ou irmãos), decidir se o agente será ou não
punido. Segundo, porque é possível que a vítima não tenha cônjuge ou parentes próximos. Assim, para
Victor Eduardo Rios Gonçalves, no caso de estupro com resultado morte, a ação penal deve ser pública
incondicionada. Para Capez (2014, p. 117) a ação é pública condicionada a representação.
Súmula 608 do STF: No caso do estupro, se fosse empregada violência real, nos termos da Súmula
608 do STF (no crime de estupro, praticado mediante violência real, a ação penal era pública
incondicionada, pois entendia tratar-se de crime complexo - Art. 101 - Quando a lei considera como
elemento ou circunstâncias do tipo legal fatos que, por si mesmos, constituem crimes, cabe ação
pública em relação àquele, desde que, em relação a qualquer destes, se deva proceder por iniciativa
do Ministério Público). O mesmo ocorria nos crimes nos crimes contra a dignidade sexual dos quais
resultassem lesões corporais de natureza grave ou morte. Com o advento da Lei nº 12.015/2009, o art.
225 expressamente declara que os crimes são de ação penal pública condicionadas a representação.
Importante: Para Nucci (2014, p. 1068-1070), não tem mais aplicação a Súmula 608 do STF após a
alteração legislativa trazida pela Lei nº 12.015/2009, devendo-se observar a regra do art. 101 do CP
que trata do crime complexo. Assim, o crime de estupro seguido de lesão corporal grave ou morte deve
ser considerado como crime complexo em sentido estrito, e como a lesão corporal grave e morte são
crimes de ação penal pública incondicionada, em tais casos também devem ser consideradas ações
públicas incondicionadas.
b) No parágrafo único do art. 225 estabelece que a ação é pública incondicionada se a vítima for
menor de 18 anos:
Parágrafo único: Procede-se, entretanto, mediante ação penal pública incondicionada se a vítima é menor de
18 (dezoito) anos ou pessoa vulnerável. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
18
Assim, se a vítima tiver mais de 18 anos a ação depende de representação, e se a vítima for
menor de 18 anos a ação será incondicionada.
OBS.:
1 – Ação incondicionada não é cabível em qualquer crime de estupro de vulnerável:
EMENTA:
HABEAS CORPUS . ESTUPRO DE VULNERÁVEL. WRIT IMPETRADO CONCOMITANTE À
INTERPOSIÇÃO DE AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. NÃO CABIMENTO. VERIFICAÇÃO
DE EVENTUAL COAÇÃO ILEGAL À LIBERDADE DE LOCOMOÇÃO. VIABILIDADE.
PRETENSÃO DE RECONHECIMENTO DE NULIDADE NOS DEPOIMENTOS COLETADOS
POR MEIO DE AUDIOVISUAL. AUSÊNCIA DE ALEGAÇÃO EM MOMENTO OPORTUNO.
INEXISTÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO. NÃO OCORRÊNCIA, ADEMAIS, DE
PREJUÍZO EVIDENTE. COAÇÃO ILEGAL NÃO DEMONSTRADA. PRETENSÃO DE
TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. VULNERABILIDADE VERIFICADA APENAS NA
OCASIÃO DA SUPOSTA OCORRÊNCIA DOS ATOS LIBIDINOSOS. VÍTIMA QUE NÃO PODE
SER CONSIDERADA PESSOA PERMANENTEMENTE VULNERÁVEL, A PONTO DE FAZER
INCIDIR O ART. 225, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CP. CRIME DE AÇÃO PENAL PÚBLICA
CONDICIONADA À REPRESENTAÇÃO. AUSÊNCIA DE INEQUÍVOCA MANIFESTAÇÃO DA
VÍTIMA NO SENTIDO DE VER O CRIME DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL PROCESSADO.
INEXISTÊNCIA DE CONDIÇÃO DE PROCEDIBILIDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL
EVIDENCIADO.
Decisão Final
O Tribunal, por maioria e nos termos do voto do Relator, julgou procedente a ação direta para,
dando interpretação conforme aos artigos 12, inciso I, e 16, ambos da Lei nº 11.340/2006, assentar a
natureza incondicionada da ação penal em caso de crime de lesão, pouco importando a extensão desta,
praticado contra a mulher no ambiente doméstico, contra o voto do Senhor Ministro Cezar Peluso
(Presidente). Falaram, pelo Ministério Público Federal (ADI 4424), o Dr. Roberto Monteiro Gurgel
Santos, Procurador-Geral da República; pela Advocacia-Geral da União, a Dra. Grace Maria
Fernandes Mendonça, Secretária-Geral de Contencioso; pelo interessado (ADC 19), Conselho
19
Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, o Dr. Ophir Cavalcante Júnior e, pelo interessado
(ADI 4424), Congresso Nacional, o Dr. Alberto Cascais, Advogado-Geral do Senado.
- Plenário, 09.02.2012.
- Acórdão, DJ 01.08.2014.
14. Segredo de justiça: Nos termos do art. 234-B do CP, os processos que apuram crime de estupro
correm em segredo de justiça.
Art. 234-B. Os processos em que se apuram crimes definidos neste Título correrão em segredo de
justiça.(Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
15. Classificação doutrinária: O estupro é crime pluriofensivo (ofende mais de um bem jurídico: a
liberdade sexual e a integridade corporal, se cometido mediante violência, ou então a liberdade
individual, quando executado com emprego de grave ameaça); comum (pode ser praticado por
qualquer pessoa), embora seja próprio na modalidade “constranger alguém a ter conjunção carnal”,
pois nesse caso exige a relação heterossexual; material ou causal (consuma-se com a prática da
conjunção carnal ou de outro ato libidinoso); de forma livre (admite qualquer meio de execução);
instantâneo (a consumação ocorre em um momento determinado, sem continuidade no tempo); em
regra comissivo; unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual (pode ser cometido por uma
única pessoa, mas admite o concurso); e normalmente plurissubsistente (a conduta pode ser
fracionada em diversos atos).
A revogação do art. 214 do CP não se trata de caso de abolitio criminis, porque, a mesma lei, de
forma expressa, passou a tratar como crime de estupro todas as condutas que antes caracterizavam o
atentado violento ao pudor. Assim, não há que se falar em extinção da punibilidade para as pessoas já
condenadas ou que estavam sendo acusadas por este crime, na medida em que o art. 107, II do CP só
admite a extinção da punibilidade quando a nova lei deixar de considerar o fato como crime, o que não
ocorreu. O fato continua sendo criminoso, apenas mudou de nome.
Em relação às pessoas já condenadas ou acusadas por estupro em concurso material com
atentado violento ao pudor, deverão ser condenadas por crime único ou por crime continuado. Se já
condenadas, deverá ser feito ajuste à nova lei no Juízo das Execuções.
3. VIOLAÇÃO SEXUAL MEDIANTE FRAUDE (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
Art. 215. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio
que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima: (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos. (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
Parágrafo único. Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa.
(Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
Nesse crime o agente emprega fraude para possuir mulher ou homem, ou seja, provoca nela
ou nele uma visão distorcida da realidade, para conseguir induzi-la(o) à prática da conjunção
carnal ou qualquer outro ato libidinoso. Daí porque a doutrina costuma denominar esse crime
“estelionato sexual”. É o que ocorre, por exemplo, quando ele ingressa em um quarto escuro onde a
mulher aguarda seu marido para com ele manter relação sexual, ou quando um curandeiro exige de
pessoa rústica a prática de conjunção carnal como único meio de retirar "encostos", "mandingas", ou,
ainda, quando irmão gêmeo se passa pelo outro para possuir a esposa deste. Por outro lado, meras
promessas falsas de casamento para obter relação sexual não caracterizam o crime.
1. Objeto jurídico: Tutela-se aqui a liberdade sexual, ou seja, a liberdade de dispor de seu corpo, a
liberdade de consentir na prática do ato sexual, sem que esse consentimento seja obtido mediante
fraude ou meio similar.
20
2. Tipo objetivo: A lei nº 12.015/2009 unificou os antigos crimes de posse sexual e atentado ao pudor
mediante fraude em uma única infração do art. 215 CP. Se o agente, no mesmo contexto fático e em
face da mesma fraude, obtiver tanto a conjunção carnal como outro ato libidinoso, responderá por
crime único e a pluralidade de atos sexuais deverá ser considerada pelo juiz na fixação da pena-base.
Conforme o texto legal é necessário que o agente empregue fraude ou outro meio que impeça
ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima.
Fraude é qualquer meio iludente empregado para que a vítima tenha uma errada percepção da
realidade e consinta no ato sexual, é a utilização do ardil, do engodo, do engano. A fraude tanto pode
ser empregada para criar a situação de engano na mente da vítima, como para mantê-la em tal estado
para que, assim, seja levada ao ato sexual. Ex.: médicos que mentem para a paciente a respeito da
necessidade de exame ginecológico a fim de tocá-la; falso enfermeiro que adentra em hospital e obtém
autorização de mulher recentemente submetida a cirurgia para que tire sua roupa e lhe dê banho
tocando suas partes íntimas etc.
Consentimento da vítima: Na legislação atual não se faz necessário o consentimento da vítima, até
porque, em determinados casos, o cenário iludente montado pelo agente impede até mesmo que ela
perceba a realização do ato de libidinagem e, portanto, de opor-se a ele. Ex.: médico que ao realizar
toque vaginal na vítima, que está com a visão encoberta, abre o zíper de sua calça e encosta o pênis nas
nádegas dela.
Violação sexual mediante fraude e estupro de vulnerável: É de notar-se que, no crime em análise,
o que o agente impede é a manifestação de vontade da vítima. Caso inviabilize sua capacidade de
reação física pelo emprego de soníferos, anestésicos ou drogas, incorre no crime de estupro de
vulnerável, por ter abusado de alguém que não podia oferecer resistência (art. 217-A, § 1º).
3. Sujeito passivo: Pode ser qualquer pessoa, homem ou mulher. Não é necessário que a vítima seja
virgem ou pessoa recatada. Pela redação originária do Código Penal, somente a mulher honesta
poderia ser vítima desse crime, de modo que a prostituta ou uma mulher de inúmeros leitos (devassa)
não poderia ser sujeito passivo. Após o advento da Lei nº 11.106/2005, foi retirada a exigência da
honestidade (elemento normativo do crime). Com a Lei nº 12.015/2009, foi alterado a palavra
“mulher” para “alguém”, de forma que, atualmente, qualquer pessoa pode ser vítima do crime em
tela.
Caso o agente empregue fraude para obter ato sexual com pessoa menor de 14 anos, responderá
por crime de estupro de vulnerável (art. 217-A) que é mais grave.
4. Sujeito ativo: Pode ser qualquer pessoa, homem ou mulher. Trata-se de crime comum.
5. Consumação: O crime consuma-se com a introdução, mesmo que parcial, do pênis na vagina ou
qualquer outro ato libidinoso.
6. Tentativa: É possível.
7. Causas de aumento de pena: Aplicam-se ao crime de violência sexual mediante fraude as causas
de aumento de pena dos arts. 226 e 234-A do CP, pois aplicam-se a todos crimes do Título.
Parágrafo único. Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa.
(Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
Este dispositivo se aplica, por exemplo, ao irmão gêmeo idêntico que aposta dinheiro com
alguns amigos, que duvidam que ele tenha coragem de abordar a namorada de seu irmão e ter com ela
relação sexual, fazendo-a acreditar que se trata de seu namorado.
21
Outro exemplo é o que Nucci (2014, p. 1046) cita, o da mulher querer engravidar de um
milionário, motivo pelo qual, embriagando-o, não completamente, termina por manter a relação sexual
sem preservativo, buscando, sem dúvida, vantagem econômica, ainda que por meio da criança (pensão
alimentícia ou herança).
9. Ação penal: Nos termos do art. 225 CP, a ação penal é pública condicionada à representação, exceto
se a vítima for menor de 18 anos, hipótese em que a ação é pública incondicionada.
10. Segredo de justiça: Nos termos do art. 234-B do CP, os processos que apuram esta modalidade de
infração penal correm em segredo de justiça.
Art. 234-B. Os processos em que se apuram crimes definidos neste Título correrão em segredo de justiça.
(Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
11. Classificação doutrinária: A violação sexual mediante fraude é crime simples (ofende um único
bem jurídico); comum (pode ser praticado por qualquer pessoa); material ou causal (consuma-se com
a prática da conjunção carnal ou de outro ato libidinoso); de forma livre (admite qualquer meio de
execução); instantâneo (a consumação ocorre em um momento determinado, sem continuidade no
tempo); em regra comissivo; unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual (pode ser cometido
por uma única pessoa, mas admite o concurso); e normalmente plurissubsistente (a conduta pode ser
fracionada em diversos atos).
Pena – detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos. (Incluído pela Lei nº 10.224, de 15 de 2001)
2. Elemento do tipo: O crime de assédio sexual foi introduzido no Código Penal pela Lei nº
10.224/2001 e, em virtude de sua redação ambígua, tem causado grandes controvérsias a respeito de
sua tipificação e extensão. Além disso, as dificuldades em torno da prova e o fato de que a ação
penal era privada tornaram raríssimas as condenações por este delito.
A primeira questão consiste em descobrir qual significado o legislador quis dar à palavra
“constranger”, que é o núcleo do tipo. Este verbo normalmente é empregado em nossa legislação
quando alguém é coagido, forçado, oprimido, obrigado a fazer ou não fazer algo, como ocorre nos
crimes de estupro e constrangimento ilegal. Acontece que no crime de assédio sexual a lei não
descreveu nenhum complemento, mencionando apenas a conduta de “constranger alguém com o
intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual...”.
22
A solução deve efetivamente ser essa, considerando-se o próprio significado da palavra
“assédio” que dá nome ao delito: “importunar, molestar, com perguntas ou pretensões, perseguir
com propostas, sugerir com insistência”. Não basta, entretanto, que o patrão conte uma anedota
com cunho sexual, elogios ou gracejos eventuais e, tampouco um convite para jantar, já que isso
não é algo constrangedor. Ocorrerá o crime caso a funcionária recuse o convite e o chefe comece
a importuná-la com reiteradas investidas.
Importunação ofensiva ao pudor: O crime de assédio sexual pode ser visto, em termos comparativos
como se fosse a contravenção penal de importunação ofensiva ao pudor (art. 61 LCP) agravada
pelo fato de ser cometido por alguém que se prevalece da sua superioridade hierárquica ou da
ascendência inerente ao cargo.
Como a lei não esclarece os meios de execução, todos devem ser admitidos (crimes de ação
livre), como, por exemplo, atos, gestos, palavras, escritos, pedir massagem à secretária, trocar de
roupa em sua presença, apalpar-lhe às nádegas, convidar para um encontro no motel, propor
sexo para ser promovida, para que receba aumento de salário etc.
Importante: Evidente que, se a ameaça for grave, o quadro muda de aspecto, configurando
crime de estupro, consumado ou tentado. Ex.: diretor do colégio que diz que expulsará a aluna,
simulando provas de que ela fez uso de entorpecentes no banheiro, caso ela não se relacione com ele.
2. Sujeito ativo: Pode ser homem ou mulher. O delito pode envolver pessoa do sexo oposto ou do
mesmo sexo. Trata-se de crime próprio, já que a lei exige que o agente se prevaleça da sua condição
de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função.
ascendência = o agente apenas goza de prestígio, influência em relação à vítima. Ex.: diretor de escola
ou professor de faculdade em relação a aluno. Nucci (2014, p. 1051) não concorda, pois esta relação
entre docente e aluno, sem caráter laborativo, não caracteriza o crime.
Não existirá crime se a conduta for realizada pelo subalterno contra seu chefe.
Parágrafo único: Em razão do veto presidencial ao parágrafo único, somente o assédio laboral
constitui crime, sendo atípico o assédio proveniente de relações domésticas, de coabitação e de
hospitalidade, ou aquele proveniente de abuso de dever inerente a ofício ou ministério.
Não confundir tal situação com a da empregada doméstica, pois aqui há perfeitamente uma
relação empregatícia, estando ela sujeita à ascendência de seu patrão, sendo certo que enquadra-se
perfeitamente na figura típica em estudo.
Para Victor Eduardo Rios Gonçalves é também possível o crime de assédio sexual por
líderes espirituais em relação aos seguidores (ministro religioso e fiel), opinião esta que não é a de
Nucci (2014, p. 1051), pois entende que o constrangimento necessita envolver superioridade
hierárquica ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função, e, não tendo esta
relação laborativa, está fora a figura típica.
3. Sujeito passivo: Qualquer pessoa, homem ou mulher, que seja subordinado ao agente ou que esteja
sob sua influência.
4. Elemento subjetivo: O crime só existe se o sujeito age com intenção de obter vantagem ou
favorecimento sexual (conjunção carnal ou qualquer outro ato libidinoso).
23
5. Consumação: É fácil concluir pela redação do dispositivo que se trata de crime formal cuja
consumação ocorre no exato instante em que o agente importuna a vítima, independentemente de obter
a vantagem ou favorecimento sexual visados. Não é delito habitual.
Aplicam-se ao crime de assedio sexual as causas de aumento de pena do art. 226 do CP, exceto
a hipótese do art. 226, II, que prevê aumento de metade da pena se o agente for empregador da vítima,
na medida em que constituiria bis in idem.
8. Espécies de assédio:
a) Assédio sexual por chantagem (assédio sexual quid pro quo – isto por aquilo): encontra-se
também previsto no art. 216-A. Nesse caso, o sujeito ativo não fica importunando a vítima, mas tenta
induzi-la, prometendo-lhe alguma vantagem ou benefício, em troca de favores sexuais.
b) Assédio sexual ambiental: não foi prevista no art. 216-A. Quando uma pessoa assedia outra, no
ambiente de trabalho, independentemente de qualquer hierarquia ou ascendência. Ocorre na legislação
espanhola. Pode configurar outro tipo penal como importunação ofensiva ao pudor.
c) Assédio moral: Não está previsto no art. 216-A. É a eliminação da autodeterminação do empregado
no trabalho, ou a degradação das suas condições pessoais, que traz consequências drásticas para a
integridade física e psíquica do trabalhador, tornar o mesmo um robô. Sintomas desse assédio na
vítima: perda da vontade de sorrir, depressão, perda da autoconfiança, isolamento etc. Pode configurar
outro tipo penal como injúria, difamação etc.
d) Assédio mediante violência ou grave ameaça: Não é assédio, mas estupro, tentado ou consumado.
Se a ameaça não for grave, pode ocorrer o assédio sexual.
9. Ação penal: Nos termos do art. 225 CP, a ação penal é pública condicionada à representação, exceto
se a vítima for menor de 18 anos, hipótese em que a ação é pública incondicionada.
10. Segredo de justiça: Nos termos do art. 234-B do CP, os processos que apuram esta modalidade de
infração penal correm em segredo de justiça.
Art. 234-B. Os processos em que se apuram crimes definidos neste Título correrão em segredo de
justiça.(Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
11. Classificação doutrinária: O assédio sexual é crime simples (ofende um único bem jurídico);
próprio (somente pode ser praticado pelo ascendente ou superior hierárquico); formal, de
consumação antecipada ou de resultado cortado (consuma-se com a prática da conduta criminosa,
independentemente da superveniência do resultado naturalístico); de forma livre (admite qualquer
meio de execução); instantâneo (a consumação ocorre em um momento determinado, sem
continuidade no tempo); em regra comissivo; unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual
(pode ser cometido por uma única pessoa, mas admite o concurso); e normalmente plurissubsistente
(a conduta pode ser fracionada em diversos atos).
CAPÍTULO II
DOS CRIMES SEXUAIS CONTRA VULNERÁVEL
(Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
24
l. SEDUÇÃO
Art. 217 - (Revogado pela Lei nº 11.106, de 2005)
Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
§ 1o Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou
deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra
causa, não pode oferecer resistência. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
§ 3o Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave: (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
Pena - reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
1. Objeto jurídico: Tutela-se aqui a dignidade sexual das pessoas vulneráveis – menores de 14
anos, doentes mentais ou impossibilitadas de oferecer resistência.
Vulnerabilidade absoluta e relativa: Para Nucci (2014, p. 1054), aquela discussão que existia, e que
não era pacífica entre doutrina e jurisprudência, se a presunção de violência, prevista no revogado art.
224, em particular no tocante à pessoa menor de 14 anos, seria absoluta (não comportando prova em
contrário) ou relativa (comportando prova em contrário), ainda continua na legislação, só que com
outro nome, não se chamando mais violência presumida mas vulnerabilidade.
Ou seja, ter relação sexual com menor de 14 anos seria sempre estupro de vulnerável (art. 217-
A)? Para Nucci, a tutela do direito penal no campo dos crimes sexuais deve ser absoluta, quando se
tratar de criança (menor de 12 anos), mas relativa ao cuidar do adolescente (maior de 12 anos).
Entende que se deve debater a capacidade de consentimento de quem possua 12 ou 13 anos, no
contexto do estupro de vulnerável. Havendo prova de plena capacidade de entendimento da relação
sexual, por exemplo uma pessoa prostituta, não tendo ocorrido violência ou grave ameaça real, nem
mesmo qualquer forma de pagamento, o que poderia configurar o crime do art. 218-B, o fato pode ser
atípico ou comportar desclassificação.
No mesmo prisma, deve-se analisar o grau de enfermidade ou deficiência mental para se
analisar de a vulnerabilidade ser absoluta ou relativa. Nas situações acerca da vulnerabilidade relativa,
pode-se desclassificar para a figura do art. 215 e, conforme o caso, considerar a conduta atípica.
Erro de tipo: Apenas o erro de tipo (que não se confunde com presunção relativa) é que pode afastar
o delito, quando o agente provar que, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, pensava que
25
a moça, que concordou em ter com ele relação sexual, já tinha 14 anos ou mais, por ter ela, por
exemplo, mentido a idade e já ter desenvolvimento corporal avançado.
Violência física e grave ameaça: As condutas típicas são as mesmas do estupro simples: ter
conjunção carnal ou praticar qualquer outro ato libidinoso. Ocorre que, no estupro de vulnerável, não
se exige o emprego de violência ou grave ameaça, de modo que, ainda que a vítima diga que
consentiu no ato, estará configurada a infração.
Em suma, com ou sem o emprego de violência ou grave ameaça, o crime será sempre o de
estupro de vulnerável se a vítima se enquadrar em qualquer das hipóteses do art. 217-A e seu §
1º.
São considerados vulneráveis:
a) Os menores de 14 anos: Se o ato for realizado no dia do 14º aniversário, a vítima não é mais
considerada vulnerável. Se ela tiver consentido com o ato em tal data, o fato é atípico porque o crime
de corrupção sexual de menores (art. 218) foi revogado.
c) As pessoas que por qualquer outra causa, não podem oferecer resistência: É indiferente que o
fator impossibilitante da defesa da vítima seja prévio (doença, paralisia, idade avançada, estado de
coma, desmaio), provocado pelo agente (ministração de sonífero ou droga na bebida da vítima, uso de
anestésico etc.) ou causado por ela própria (embriaguez completa em uma festa). É necessário que o
agente se aproveite do estado de incapacidade de defesa e que se demonstre que esse fator
impossibilitava por completo a capacidade de a vítima se opor ao ato sexual.
6. Consumação: No instante em que realiza a conjunção carnal ou qualquer outro ato libidinoso.
7. Tentativa: É possível.
8. Formas qualificadas:
§ 3o Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave: (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
Pena - reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
9. Natureza hedionda: O estupro de vulnerável constitui crime hediondo, tanto em sua forma simples,
como nas qualificadas (art. 1º, VI, da Lei 8.072/90: “estupro de vulnerável (art. 217-A, caput e §§ 1o,
2o, 3o e 4o”).
26
10. Causas de aumento de pena: Após o advento da Lei nº 12.015/2009, por equívoco do legislador,
passaram a existir dois capítulos com a mesma denominação – “Disposições Gerais” – no Título dos
crimes contra a dignidade sexual. São os Capítulos IV e VII. Neles existem causas de aumento de pena
aplicáveis ao estupro e a todos os demais crimes contra a dignidade sexual, respectivamente. Ao crime
de estupro de vulnerável são aplicadas as causas de aumento dos art. 226, I e II e art. 234-A, III e IV,
CP, já estudadas no crime de estupro simples:
III - de metade, se do crime resultar gravidez; e (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
IV - de um sexto até a metade, se o agente transmite à vitima doença sexualmente transmissível de que sabe ou
deveria saber ser portador. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
11. Ação penal: Nos termos do art. 225, p.u. CP, a ação penal é sempre pública incondicionada.
Art. 225:
Parágrafo único. Procede-se, entretanto, mediante ação penal pública incondicionada se a vítima é menor de
18 (dezoito) anos ou pessoa vulnerável. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
12. Segredo de justiça: Nos termos do art. 234-B do CP, os processos que apuram esta modalidade de
infração penal correm em segredo de justiça.
Art. 234-B. Os processos em que se apuram crimes definidos neste Título correrão em segredo de
justiça.(Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
13. Classificação doutrinária: O estupro de vulnerável é crime simples (ofende um único bem
jurídico); comum (pode ser praticado por qualquer pessoa), embora seja próprio na modalidade
“constranger alguém a ter conjunção carnal”, pois nesse caso exige a relação heterossexual; material
ou causal (consuma-se com a prática da conjunção carnal ou de outro ato libidinoso); de forma livre
(admite qualquer meio de execução); instantâneo (a consumação ocorre em um momento
determinado, sem continuidade no tempo); em regra comissivo; unissubjetivo, unilateral ou de
concurso eventual (pode ser cometido por uma única pessoa, mas admite o concurso); e normalmente
plurissubsistente (a conduta pode ser fracionada em diversos atos).
3. CORRUPÇÃO DE MENORES
Art. 218. Induzir alguém menor de 14 (catorze) anos a satisfazer a lascívia de outrem: (Redação dada pela Lei
nº 12.015, de 2009)
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos. (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
2. Elementos do tipo:
Induzir: significa aliciar, convencer, persuadir o menor, com ou sem a promessa de alguma vantagem,
para que satisfaça os desejos sexuais de outra pessoa. O agente visa com a conduta satisfazer a lascívia
de terceiro e não a própria. Exige-se que a terceira pessoa seja determinada.
Importante ressaltar que, se o agente convence uma adolescente de 12 anos a manter conjunção
27
carnal com terceiro, e o ato se concretiza, este responde por estupro de vulnerável e quem
induziu a menor é partícipe de tal crime. Assim, o crime em análise só será tipificado se a vítima
for induzida a satisfazer a lascívia do terceiro, sem, todavia, realizar ato sexual efetivo com este.
Ex.: fazer sexo por telefone; dançar para ele; fazer-lhe um striptease, o menor a desnudar-se etc.
Obs.: Por fim, as condutas de fotografar ou publicar cena de sexo explícito ou pornográfica
envolvendo menores de dezoito anos constitui crime específico previsto no art. 241 e seguintes da
Lei nº 8.069/90 (ECA) – ”Art. 241. Vender ou expor à venda fotografia, vídeo ou outro registro que
contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente: (Redação dada pela Lei nº
11.829, de 2008)Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 11.829, de
2008); Art. 241-A. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir, publicar ou divulgar por qualquer
meio, inclusive por meio de sistema de informática ou telemático, fotografia, vídeo ou outro registro que
contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente: (Incluído pela Lei nº
11.829, de 2008)Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008) § 1o
Nas mesmas penas incorre quem: (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)I – assegura os meios ou serviços para
o armazenamento das fotografias, cenas ou imagens de que trata o caput deste artigo; (Incluído pela Lei nº
11.829, de 2008)II – assegura, por qualquer meio, o acesso por rede de computadores às fotografias, cenas ou
imagens de que trata o caput deste artigo.(Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008) § 2o As condutas tipificadas
nos incisos I e II do § 1o deste artigo são puníveis quando o responsável legal pela prestação do serviço,
oficialmente notificado, deixa de desabilitar o acesso ao conteúdo ilícito de que trata o caput deste
artigo. (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008) Art. 241-B. Adquirir, possuir ou armazenar, por qualquer meio,
fotografia, vídeo ou outra forma de registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo
criança ou adolescente: (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008) Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e
multa. (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)”.
6. Consumação: No momento em que o ato é realizado pelo menor. Não é crime habitual.
7. Tentativa: É possível.
9. Segredo de justiça: Nos termos do art. 234-B do CP, os processos que apuram esta modalidade de
infração penal correm em segredo de justiça.
Para ir mais longe: Fernando Capez - Crime de corrupção de menores e o recente posicionamento do
STJ. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2013-out-28/sumula-500-reconhece-corrupcao-
menores-crime-formal
28
11. Classificação doutrinária: A corrupção de menores é crime simples (ofende um único bem
jurídico); comum (pode ser praticado por qualquer pessoa); material ou causal (consuma-se com a
realização, pelo menor de 14 anos, de ato tendente a satisfazer a lascívia de outrem); de forma livre
(admite qualquer meio de execução); instantâneo (a consumação ocorre em um momento
determinado, sem continuidade no tempo); em regra comissivo; unissubjetivo, unilateral ou de
concurso eventual (pode ser cometido por uma única pessoa, mas admite o concurso); e normalmente
plurissubsistente (a conduta pode ser fracionada em diversos atos).
Art. 218-A. Praticar, na presença de alguém menor de 14 (catorze) anos, ou induzi-lo a presenciar, conjunção
carnal ou outro ato libidinoso, a fim de satisfazer lascívia própria ou de outrem: (Incluído pela Lei nº 12.015,
de 2009)
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos.” (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
1. Objeto jurídico: Tutela-se a dignidade sexual e principalmente a formação sexual dos menores
de 14 anos de idade, na medida em que o fato de presenciar o ato faz com que tomem conhecimento
precoce de certas condutas sexuais.
2. Tipo objetivo: O ato sexual pode ser a penetração do pênis na vagina (conjunção carnal) ou
qualquer outro ato de conotação sexual (presenciar o agente a se masturbar, a manter sexo oral ou anal
com terceiro etc.).
Importante lembrar que o menor não se envolva sexualmente no ato, pois, se o fizer, o
crime será o de estupro de vulnerável.
3. Sujeito ativo: Pode ser qualquer pessoa, homem ou mulher. Se o ato sexual for praticado por duas
pessoas na presença do menor, a fim de satisfazer a lascívia de ambos, os dois respondem pelo crime.
7. Tentativa: É possível. Ex.: menor é convencido a presenciar o ato sexual, mas quando o agente
começa a tirar a roupa o menor sai correndo e não presencia concretamente qualquer ato libidinoso.
Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 10 (dez) anos. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
§ 1o Se o crime é praticado com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa. (Incluído pela
Lei nº 12.015, de 2009)
1. Objeto jurídico: Tutela-se a dignidade e a moralidade sexual do vulnerável, bem como evitar
danos à sua saúde e outros riscos ligados ao exercício da prostituição.
2. Tipo objetivo: O crime consiste em submeter (subjugar, dominar, sujeitar), induzir (dar a ideia,
sugerir, persuadir) ou atrair (seduzir, convencer alguém, com palavras ou promessas de boa vida), para
que se prostitua, ou para que se submeta a outras formas de exploração sexual, ou, ainda, colaborar
para que alguém exerça a prostituição, ou, de algum modo, impedir ou dificultar que a vítima
abandone as referidas atividades.
Em suma, constitui crime introduzir alguém no mundo da prostituição, apoiá-lo
materialmente enquanto a exerce ou de qualquer modo impedir ou dificultar o abandono das
atividades por parte de quem deseja fazê-lo.
Importante: Guilherme de Souza Nucci (Manual de Direito Penal: Parte Especial. 10ª ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2014, p. 842-843) salienta a intenção legislativa de apontar para a existência de
graus de vulnerabilidade: absoluta (não comporta prova em contrário) e relativa (comporta prova
em contrário). O menor de 18 anos é relativamente vulnerável, de modo que alguém, com 17 anos,
procurando a prostituição por conta própria, sem ser seduzido à atividade por qualquer pessoa, não
pode ser tutelado pela lei penal. Tem pleno discernimento para a prática sexual e vê vantagem no ato
do comércio do sexo. Logo, inexistentes a submissão, o induzimento, a atração por parte de terceiro,
nem mesmo a facilitação, o impedimento ou a dificuldade para abandonar aquilo que ele mesmo
procurou e quer para si. O fato é atípico. De outra parte, a pessoa, com 14 anos, pode ser atraída a
prostituição, sem discernimento para o mundo onde ingressa, daí surge a vulnerabilidade comprovada
e a punição faz-se merecida de quem com esse menor tenha relação sexual. No tocante aos enfermos e
deficientes mentais dá-se o mesmo: não possuindo discernimento algum para o ato sexual, a
vulnerabilidade é absoluta, logo, configura-se o estupro de vulnerável (art. 217-A); possuindo
discernimento razoável, a vulnerabilidade é relativa, portanto, pode configurar-se o art. 215, sem
pagamento algum para a prática sexual, ou o art. 218-B quando houver exploração sexual.
Se a pessoa que está se prostituindo for maior de idade e sã, o induzimento à prostituição
configura o crime do art. 228 do CP, que tem pena menor.
Obs.: O art. 218-B, por tratar do mesmo tema, revogou tacitamente o crime do art. 244-A da Lei
nº 8.069/90 (ECA).
Importante: O destinatário das práticas sexuais do menor responderá, nos termos do § 2º, I, se o
sujeito passivo é pessoa maior de 14 e menor de 18 e por estupro de vulnerável se menor de 14
anos.
4. Sujeito passivo: Homem ou mulher menor de 18 anos, ou que, em razão de enfermidade mental,
não tenha discernimento necessário para compreender a prostituição ou a exploração sexual.
Pode ser, até mesmo, a própria prostituta, pois o tipo penal prevê a conduta de facilitar a
prostituição ou outra forma de exploração sexual, ou impedir ou dificultar que alguém a abandone.
6. Consumação: Quando a vítima assume uma vida de prostituição, colocando-se à disposição para o
comércio carnal, ou quando passa a ser explorada sexualmente. Na modalidade de impedimento,
consuma-se no momento em que a vítima não abandona as atividades. Nesta última figura o crime é
permanente. Na modalidade dificultar, consuma-se quando o agente cria o óbice.
7. Tentativa: É possível.
8. Intenção de lucro:
§ 1o Se o crime é praticado com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa. (Incluído pela
Lei nº 12.015, de 2009)
A intenção de lucro a que o texto se refere como condição para a incidência cumulativa de
multa é por parte do agente e não da vítima. Ex.: agente aconselha uma moça a entrar na prostituição
visando obter lucro com sua entrada, incorrerá também na pena de multa. Se o agente visar
reiteradamente participação nos lucros de quem exerce a prostituição, incorrerá em crime de
rufianismo (art. 230), que tem a pena agravada quando a vítima for menor de 18 anos e maior de 14.
9. Figuras equiparadas: No § 2º do art. 218-B, existe a previsão de dois outros crimes para os quais é
prevista a mesma pena do caput:
O dispositivo pune quem faz programa com prostituta menor de idade, desde que tenha
mais de 14 anos, pois, se tiver menos, o crime será o de estupro de vulnerável, que tem pena
muito maior.
Não existe em nossa legislação punição para quem paga para ter relação sexual com
prostituta maior de idade.
II - o proprietário, o gerente ou o responsável pelo local em que se verifiquem as práticas referidas no caput
deste artigo. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
12. Segredo de justiça: Nos termos do art. 234-B do CP, os processos que apuram esta modalidade de
infração penal correm em segredo de justiça.
CAPÍTULO IV
DISPOSIÇÕES GERAIS
AÇÃO PENAL
Art. 225. Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública
condicionada à representação. (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
Parágrafo único. Procede-se, entretanto, mediante ação penal pública incondicionada se a vítima é menor de
18 (dezoito) anos ou pessoa vulnerável. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
32
AUMENTO DE PENA
Art. 226. A pena é aumentada:(Redação dada pela Lei nº 11.106, de 2005)
I – de quarta parte, se o crime é cometido com o concurso de 2 (duas) ou mais pessoas; (Redação dada pela Lei
nº 11.106, de 2005)
II – de metade, se o agente é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor,
curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro título tem autoridade sobre ela; (Redação
dada pela Lei nº 11.106, de 2005)
A Lei nº 11.106/2005 revogou o inciso III deste art. 226, de modo que o fato de o autor do
crime ser casado com terceira pessoa não mais constitui causa de aumento de pena nos crimes sexuais.
CAPÍTULO V
DO LENOCÍNIO E DO TRÁFICO DE PESSOA PARA FIM DE
PROSTITUIÇÃO OU OUTRA FORMA DE
EXPLORAÇÃO SEXUAL
(Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
Lenocínio origina-se do latim lenocinium, que significava o tráfico de escravas para prostituição.
Para Nucci (2014, p. 1071) lenocínio seria a prestação de apoio, assistência e incentivo à vida
voluptuosa de outra pessoa, dela tirando proveito. Os agentes do lenocínio são peculiarmente
chamados de rufião (ou cafetão) e proxeneta.
O lenocínio pode ser principal ou acessório. Lenocínio principal é a mediação para satisfazer a
lascívia de outrem, definida no art. 227 do Código Penal. Por seu turno, os demais crimes previstos
neste capítulo ingressam no conceito de lenocínio acessório. (MASSON, 2014, p. 154).
2. Elemento do tipo: Induzir significa convencer, persuadir alguém a satisfazer os desejos sexuais
de outrem. Nota-se que a vítima não é forçada ao ato sexual. O agente visa, com sua conduta,
satisfazer a lascívia de terceiro e não a própria. Lascívia seria a sensualidade, libidinagem.
Existem necessariamente três pessoas envolvidas: aquele que induz, a pessoa que é
induzida e o terceiro beneficiário do ato sexual. Somente o primeiro responde pelo delito por ter
incentivado a vítima a satisfazer a lascívia do terceiro. Este último não comete crime algum.
Princípio da intervenção mínima: Para Nucci (2014, p. 1071) esse tipo penal fere o princípio da
intervenção mínima, pois a sua prática não tem o condão de lesar o bem jurídico tutelado (dignidade
sexual), pois entende que, incentivar um adulto a ter relação sexual com outro não significa nada em
matéria de prejuízo para qualquer das partes envolvidas, desde que não seja mediante grave ameaça,
violência etc.
4. Consumação e tentativa: Não se trata de crime habitual. A consumação ocorre com a prática de
ato que possa importar em tal satisfação, ainda que esta não se efetive. A tentativa é possível.
5. Ação Penal: A ação penal, como em todos os crimes do capítulo, é pública incondicionada.
6. Formas:
1. Simples: Está prevista no caput.
2. Qualificadas: Previstas nos §§ 1º, 2º e 3º:
§1º - Se a vítima é maior de 14 (catorze) e menor de 18 (dezoito) anos, ou se o agente é seu ascendente,
descendente, cônjuge ou companheiro, irmão, tutor ou curador ou pessoa a quem esteja confiada para fins de
educação, de tratamento ou de guarda: (Redação dada pela Lei nº 11.106, de 2005)
Pena - reclusão, de dois a cinco anos.
O § 1º descreve uma série de qualificadoras, que se referem à idade da vítima, entre quatorze e
dezoito anos (se a vítima for menor de 14 anos o crime será o de corrupção de menores do art.
218 CP), ou à relação de parentesco ou vínculos entre agente e vítima.
Nas hipóteses em que o agente é ascendente, descendente, cônjuge ou companheiro, irmão,
tutor ou curador da vítima, temos o chamado lenocínio familiar.
34
No crime do caput, a relação sexual é consentida, no qual o agente convence a vítima a
satisfazer os desejos de terceiro. Caso o agente empregue violência, grave ameaça ou fraude para
forçar a vítima a satisfazer a lascívia de alguém responde pela figura qualificada do § 2º.
Porém, quando o agente empregar violência ou grave ameaça para forçar a vítima a
manter conjunção carnal ou outro ato libidinoso com terceiro, deverá ser responsabilizado por
crime de estupro.
Assim, a qualificadora do art. 227, § 2º, só tem aplicação para casos em que o agente
emprega violência ou grave ameaça para forçar a vítima, por exemplo, a fazer “sexo por
telefone” ou por webcam, ou a fazer um strip tease para alguém etc. Ademais, se da violência
empregada resultar lesão, ainda que leve, o agente responderá pelos dois crimes, em concurso
material.
7. Segredo de justiça: Nos termos do art. 234-B do CP, os processos que apuram esta modalidade de
infração penal correm em segredo de justiça.
8. Classificação doutrinária: A mediação para servir a lascívia de outrem é crime simples (ofende
um único bem jurídico); comum (pode ser praticado por qualquer pessoa); material ou causal
(consuma-se com a produção do resultado naturalístico, consistente na satisfação da lascívia de
alguém); de forma livre (admite qualquer meio de execução); instantâneo (a consumação ocorre em
um momento determinado, sem continuidade no tempo); em regra comissivo; unissubjetivo,
unilateral ou de concurso eventual (pode ser cometido por uma única pessoa, mas admite o
concurso); e normalmente plurissubsistente (a conduta pode ser fracionada em diversos atos).
Art. 228. Induzir ou atrair alguém à prostituição ou outra forma de exploração sexual, facilitá-la, impedir ou
dificultar que alguém a abandone: (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
§ 1o Se o agente é ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador,
preceptor ou empregador da vítima, ou se assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou
vigilância: (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos. (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
1. Objetividade jurídica: O legislador visa tutelar a dignidade sexual do indivíduo que é levado a se
prostituir ou impedido de exercê-la, evitando-se, assim, o desenvolvimento da prostituição e da
exploração sexual, e, com isso, as conseqüências danosas de tais atividades (proliferação de doenças
sexuais, abandono dos estudos etc.).
b) Atrair = chamar, seduzir, fascinar, por exemplo, anuncia que está contratando moças para se
prostituírem;
c) Facilitar = prestar qualquer forma de auxílio, por exemplo, arranjando cliente, porteiro de hotel que
apresenta catálogo de prostitutas a hóspede, motorista de táxi que diz conhecer garotas de programa e
se dispõe a buscá-las para festa, sites que se dedicam a anunciar garotas e de programa etc;
Pune-se também nesse tipo penal quem submete a vítima a qualquer outra forma de
exploração sexual em caráter habitual. Ex.: induzir mulher a ser dançarina de striptease;
dedicar-se a fazer sexo por telefone ou via webcam etc. Responde pelo crime o responsável pela
organização e cobrança dessas práticas.
Obs.: Se a vítima for menor de 18 anos ou, por enfermidade ou deficiência mental, não tiver o
necessário discernimento, responderá pelo crime de favorecimento da prostituição ou outra forma
de exploração sexual de vulnerável do art. 218-B CP. Este artigo foi incluído pela Lei nº 12.015, de
2009, que acabou revogando tacitamente o art. 244-A do Estatuto da Criança e do Adolescente, que
punia figura idêntica.
4. Consumação: Nas modalidades induzir e atrair, o crime se consuma quando a vítima assume
habitualmente uma vida de prostituição, colocando-se à disposição para o comércio carnal. Na
facilitação se consuma no momento da ação do sujeito tendente a colaborar com a prostituição. Na
modalidade dificultar consuma-se no instante em que o agente cria o óbice. Na modalidade de
impedimento, o crime é permanente, admitindo-se sempre a prisão em flagrante.
Para ir mais longe: “Caso Bahamas” em que o seu proprietário foi absolvido por não ficar
demonstrado a “habitualidade de prestações carnais a um número indeterminado de pessoa” –
Apelação Criminal nº 245.726-3/1/SP: Disponível em
https://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=1793793&cdForo=0&vlCaptcha=uyRmk
5. Tentativa: É possível.
7. Ação Penal: A ação penal, como em todos os crimes do capítulo, é pública incondicionada.
8. Segredo de justiça: Nos termos do art. 234-B do CP, os processos que apuram esta modalidade de
infração penal correm em segredo de justiça.
36
meio de execução); instantâneo (nos núcleos “induzir”, “atrair” e “facilitar”) ou permanente (nas
variantes “impedir” e “dificultar”); em regra comissivo; unissubjetivo, unilateral ou de concurso
eventual (pode ser cometido por uma única pessoa, mas admite o concurso); e normalmente
plurissubsistente (a conduta pode ser fracionada em diversos atos).
3. CASA DE PROSTITUIÇÃO
Art. 229. Manter, por conta própria ou de terceiro, estabelecimento em que ocorra exploração sexual, haja, ou
não, intuito de lucro ou mediação direta do proprietário ou gerente: (Redação dada pela Lei nº 12.015, de
2009)
Pena - reclusão, de dois a cinco anos, e multa
2. Tipo objetivo: A conduta de manter casa de prostituição ou lugar destinado a encontros libidinosos
exige habitualidade, ou seja, que o sujeito conserve o local de forma a permitir a reiteração de atos.
Assim, uma só ação não o tipifica. Por isso, o crime se consuma com a manutenção (reiterada) do
local, sendo inadmissível a tentativa, pois a prática de um só ato é atípica, enquanto sua
renovação gera a consumação.
Existem muitas boates cujos donos incentivam a frequência de prostitutas ou as atraem para o
exercício de suas atividades no local, mas que, por não haver local apropriado para a prática de
relações sexuais, não são classificadas como casa de prostituição. Nesses casos, todavia, devem os
responsáveis ser punidos ao menos pelo crime de favorecimento à prostituição – na forma de
facilitação -, quando não cobrarem porcentagem ou valores das prostitutas, ou rufianismo, quando for
cobrada comissão.
A prostituta que recebe seus clientes em sua casa para encontros sexuais, explorando
sozinha o comércio carnal, não comete o crime em análise.
O tipo penal é abrangente, punindo o dono do local, o gerente, os empregados, quer façam
mediação direta para o atendimento, quer não.
Também é indiferente que o agente vise lucro, ou seja, visando ou não a obtenção de
vantagem financeira, haverá crime.
Alvará de funcionamento: Há muitos julgados no sentido de que a existência de alvará de
funcionamento por parte das autoridades não exclui o crime, já que há desvirtuamento da licença
obtida para outros fins.
Obs.: Veja-se, ainda, que, se houver prostituição ou exploração sexual de menores de 18 anos,
estará configurado o crime específico do art. 218-B, § 2º, II, do CP que trata do favorecimento da
prostituição ou outra forma de exploração sexual de vulnerável. Além disso, em caso de
condenação, constituirá efeito obrigatório a cassação da licença de localização e de funcionamento do
estabelecimento (§ 3º).
3. Sujeito ativo: Pode ser qualquer pessoa. Se alguém mantém a casa de prostituição por conta de
terceiro, ambos respondem pelo crime. Trata-se do proxeneta, ou seja, a pessoa que mantém locais
37
destinados a encontros libidinosos, ou funciona como mediador para a satisfação da lascívia de
terceiros. Em síntese, é o sujeito que atua como intermediário em relações sexuais alheias.
4. Sujeito passivo: São as pessoas exploradas sexualmente no estabelecimento. Podem ser homens ou
mulheres. A sociedade também é vítima deste crime que tutela a moralidade e a saúde pública.
5. Consumação: Quando o estabelecimento começa a funcionar de forma reiterada (crime habitual).
Trata-se, também, de crime permanente. Por isso, em havendo prova de habitualidade, a prisão em
flagrante é possível.
A habitualidade pode ser comprovada por qualquer meio (testemunhas, confissão, filmagens
etc.), não se exigindo a instauração de sindicância prévia pela Administração Pública, pela Polícia
ou pelo Poder Judiciário. (MASSON, 2014, p. 171).
8. Segredo de justiça: Nos termos do art. 234-B do CP, os processos que apuram este tipo de infração
penal correm em segredo de justiça.
9. Classificação doutrinária: A casa de prostituição é crime simples (ofende um único bem jurídico);
comum (pode ser praticado por qualquer pessoa); formal, de consumação antecipada ou de
resultado cortado (consuma-se com a prática da conduta legalmente descrita, independentemente da
superveniência do resultado naturalístico); vago (tem como sujeito passivo um ente destituído de
personalidade jurídica, qual seja, a coletividade); de forma livre (admite qualquer meio de execução);
em regra comissivo; habitual (reclama a reiteração de atos indicativos do estilo de vida ilícito adotado
pelo agente); unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual (pode ser cometido por uma única
pessoa, mas admite o concurso); e normalmente plurissubsistente (a conduta pode ser fracionada em
diversos atos).
4. RUFIANISMO
Art. 230 - Tirar proveito da prostituição alheia, participando diretamente de seus lucros ou fazendo-se
sustentar, no todo ou em parte, por quem a exerça:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
§ 1o Se a vítima é menor de 18 (dezoito) e maior de 14 (catorze) anos ou se o crime é cometido por ascendente,
padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador, preceptor ou empregador da
vítima, ou por quem assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou vigilância: (Redação
dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
§ 2o Se o crime é cometido mediante violência, grave ameaça, fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a
livre manifestação da vontade da vítima: (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, sem prejuízo da pena correspondente à violência.(Redação dada
pela Lei nº 12.015, de 2009)
1. Objetividade jurídica: Evitar a exploração da prostituição alheia pelo rufião, ou seja, aquele que
procura tirar proveito do exercício da prostituição alheia.
4. Sujeito passivo: A vítima deve ser a pessoa que exerce a prostituição (abrangendo homens e
mulheres). Se for menor de 18 anos e maior de 14 anos, configura-se a hipótese qualificada do § 1º.
6. Emprego de violência, grave ameaça ou fraude: Tornam o crime qualificado, nos termos do § 2º.
Ademais, se da violência empregada resultarem lesões corporais, ainda que leves, o agente responderá
também pelo crime do art. 129 do CP, por haver disposição expressa nesse sentido.
8. Segredo de justiça: Nos termos do art. 234-B do CP, os processos que apuram este tipo de infração
penal correm em segredo de justiça.
9. Classificação doutrinária: O rufianismo é crime simples (ofende um único bem jurídico); comum
(pode ser praticado por qualquer pessoa); material ou causal (consuma-se com o efetivo proveito
oriundo da prostituição alheia); de forma livre (admite qualquer meio de execução); em regra
comissivo; habitual (reclama a reiteração de atos indicativos do estilo de vida ilícito adotado pelo
agente); unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual (pode ser cometido por uma única pessoa,
mas admite o concurso); e normalmente plurissubsistente (a conduta pode ser fracionada em diversos
atos).
Art. 231. Promover ou facilitar a entrada, no território nacional, de alguém que nele venha a exercer a
prostituição ou outra forma de exploração sexual, ou a saída de alguém que vá exercê-la no
estrangeiro. (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos. (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
§ 1o Incorre na mesma pena aquele que agenciar, aliciar ou comprar a pessoa traficada, assim como, tendo
conhecimento dessa condição, transportá-la, transferi-la ou alojá-la. (Redação dada pela Lei nº 12.015, de
2009)
§ 2o A pena é aumentada da metade se: (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
I - a vítima é menor de 18 (dezoito) anos; (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
39
II - a vítima, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do
ato; (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
III - se o agente é ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador,
preceptor ou empregador da vítima, ou se assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou
vigilância; ou (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
IV - há emprego de violência, grave ameaça ou fraude. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
§ 3o Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa. (Incluído pela
Lei nº 12.015, de 2009)
Art. 231-A. Promover ou facilitar o deslocamento de alguém dentro do território nacional para o exercício da
prostituição ou outra forma de exploração sexual: (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos. (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
§ 1o Incorre na mesma pena aquele que agenciar, aliciar, vender ou comprar a pessoa traficada, assim como,
tendo conhecimento dessa condição, transportá-la, transferi-la ou alojá-la. (Incluído pela Lei nº 12.015, de
2009)
§ 2o A pena é aumentada da metade se: (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
I - a vítima é menor de 18 (dezoito) anos; (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
II - a vítima, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do
ato; (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
III - se o agente é ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador,
preceptor ou empregador da vítima, ou se assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou
vigilância; ou (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
IV - há emprego de violência, grave ameaça ou fraude. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
§ 3o Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa.(Incluído pela Lei
nº 12.015, de 2009)
Tráfico de Pessoas
Art. 149-A. Agenciar, aliciar, recrutar, transportar, transferir, comprar, alojar ou acolher pessoa, mediante
grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso, com a finalidade de:
I - remover-lhe órgãos, tecidos ou partes do corpo;
II - submetê-la a trabalho em condições análogas à de escravo;
III - submetê-la a qualquer tipo de servidão;
IV - adoção ilegal; ou
V - exploração sexual.
Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.
§ 2o A pena é reduzida de um a dois terços se o agente for primário e não integrar organização criminosa.”
40
CAPÍTULO VI
DO ULTRAJE PÚBLICO AO PUDOR
Nucci (2014, p. 1098): Cremos devessem esses tipos penais (arts. 233 e 234) ser excluídos do Código
Penal, reservando-se, se for o caso, para outros ramos do direito a punição merecida a quem pudesse
ofender o pudor público. Não é mais época de tutela penal absoluta dos costumes e este capítulo não
foge à regra, mormente quando a sexualidade tornou-se mais explorada, inclusive comercial e
artisticamente, bem como o sentimento de vergonha modificou-se estruturalmente. Ao homem médio
já não choca, como no passado, a mesma exposição de obscenidades que anteriormente era motivo
para punições exemplares. Suprimindo-se essas figuras penais, acaba-se com a hipocrisia, por vezes
reinante, em alguns setores da coletividade, que demandam um comportamento público que não
possuem na sua vida privada. Fingem chocar-se com determinados atos, denominados obscenos,
quando estão acostumados a vê-los, incentivá-los ou até praticá-los em locais e recintos privados.
1. ATO OBSCENO
Art. 233 - Praticar ato obsceno em lugar público, ou aberto ou exposto ao público:
Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa.
2. Tipo objetivo:
Ato obsceno é o ato revestido de sexualidade e que fere o sentimento médio de pudor. Ex.:
exposição de órgãos sexuais, dos seios, das nádegas, prática de ato libidinoso em local público etc. Se
o ato for realizado na presença de pessoa menor de 14 anos, configura crime mais grave do art. 218-A
que versa sobre satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente.
A micção (ato de urinar) voltada para a via pública com exposição do pênis caracteriza o ato
obsceno. Também configura o delito os atos feitos por travestis nus ou seminus nas ruas.
O tipo exige a prática de ato e, por isso, o mero uso da palavra pode configurar apenas a
contravenção de importunação ofensiva ao pudor.
Só se configura o crime se o fato ocorre em um dos locais previstos no tipo:
b) Local aberto ao público: onde qualquer pessoa pode entrar, ainda que sujeita a condições, como
pagamento de ingresso - teatro, cinema, estádio de futebol etc. Não haverá o crime, entretanto, se as
pessoas pagam o ingresso justamente para ver show de sexo explícito, por exemplo.
c) Exposto ao público: é um local privado, mas que pode ser visto por número indeterminado de
pessoas que passem pelas proximidades. Ex.: janela aberta, terraço, varanda, terreno baldio aberto,
interior de automóvel etc.
Entende-se, entretanto, que não há crime se o ato é praticado em local escuro ou afastado, que
não pode ser normalmente visto pelas pessoas. Ex.: casal que está tendo relação sexual, de madrugada,
em estrada de terra longínqua e não iluminada.
41
3. Sujeitos ativo e passivo: O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, homem ou mulher. Sujeito
passivo é a coletividade, bem como qualquer pessoa que presencie o ato.
O tipo não exige que o agente tenha finalidade erótica. O fato pode ter sido praticado por
vingança, por brincadeira, por aposta etc. Em qualquer caso, há crime.
4. Consumação: Ocorre com a prática do ato, ainda que não seja presenciado por qualquer pessoa,
mas desde que pudesse sê-lo, ou, ainda, quando o assistente não se sente ofendido. Trata-se de crime
formal e de perigo.
7. Classificação doutrinária: O ato obsceno é crime simples (ofende um único bem jurídico);
comum (pode ser praticado por qualquer pessoa); de mera conduta ou de simples atividade
(consuma-se com a prática da conduta legalmente descrita, e não há espaço para a superveniência de
resultado naturalístico); de perigo abstrato (a lei presume a situação de perigo ao bem jurídico); de
forma livre (admite qualquer meio de execução); em regra comissivo; vago (tem como sujeito passivo
um ente destituído de personalidade jurídica, qual seja, a coletividade); instantâneo (consuma-se em
um momento determinado, sem continuidade no tempo); unissubjetivo, unilateral ou de concurso
eventual (pode ser cometido por uma única pessoa, mas admite o concurso); e normalmente
plurissubsistente (a conduta pode ser fracionada em diversos atos).
2. Tipo objetivo:
Trata-se de crime de ação múltipla, uma vez que a lei descreve vários verbos como núcleo.
Assim, para que exista o crime, o agente deve fazer (confeccionar), importar (introduzir no
território nacional), exportar (fazer sair do País), adquirir (obter a propriedade) ou ter sob sua
guarda (ter pessoalmente a custódia) o objeto material. Este deve ser um escrito, pintura, estampa
ou qualquer objeto obsceno. Exige a lei, ainda, que o agente tenha intenção de comércio, distribuição
ou exposição pública do objeto (elemento subjetivo do crime).
Não se tem punido, todavia, sex shops que vendem objetos com formas de órgãos sexuais,
desde que a exposição e venda dos produtos ocorra em local fechado e apenas para pessoas maiores de
idade.
Para Nucci (2014, p. 1103) tal artigo é inconstitucional: “Não ofende, apenas, o princípio da
legalidade, por via de seu corolário, a taxatividade, diante da falta de clara definição acerca do que
vem a ser algo obsceno (elemento normativo do tipo de vagueza nítida). Fere, sobretudo, outras
normas e princípios constitucionais, como a liberdade de expressão, especialmente no formato
42
artístico, bem como a liberdade de comunicação social, sem qualquer tipo de censura. Para conferir: “É
livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato” (art. 5.º, IV, CF); “É livre a expressão
da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou
licença” (art. 5.º, IX, CF); “A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob
qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta
Constituição” (art. 220, caput, CF); “É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica
e artística” (art. 220, § 2.º, CF)”.
4. Tentativa: É possível.
Nos incisos I, II e III, temos figuras equiparadas, punidas com as mesmas penas, para quem
comercializa ou publica os objetos mencionados, apresenta ao público peça teatral ou filmes
cinematográficos de caráter obsceno, ou realiza audição ou declamação obscenas em local público ou
acessível ao público.
Nos dias atuais, entretanto, não tem havido repressão a essa infração penal, sob o
fundamento de que a sociedade moderna não se abala, por exemplo, com a exibição de espetáculos ou
revistas pornográficas, desde que para adultos. Segundo Heleno C. Fragoso "a pesquisa veio
demonstrar que não há dano na exibição de espetáculos obscenos, que, ao contrário, podem evitar
ações delituosas em matéria sexual, pela gratificação que constituem para certas pessoas". Por essas
razões, não se tem punido o dono do cinema que exibe filme pornográfico, o jornaleiro que vende
revistas da mesma natureza etc.
6. Classificação doutrinária: O escrito ou objeto obsceno é crime simples (ofende um único bem
jurídico); comum (pode ser praticado por qualquer pessoa); formal, de consumação antecipada ou
de resultado cortado (consuma-se com a prática da conduta legalmente descrita, independentemente
da superveniência do resultado naturalístico); de perigo abstrato (a lei presume a situação de perigo
ao bem jurídico); de forma livre (admite qualquer meio de execução); em regra comissivo; vago (tem
como sujeito passivo um ente destituído de personalidade jurídica, qual seja, a coletividade);
instantâneo (nas modalidades “fazer”, “importar”, “exportar” e “adquirir”) ou permanente (no núcleo
“ter sob sua guarda”); unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual (pode ser cometido por uma
única pessoa, mas admite o concurso); e normalmente plurissubsistente (a conduta pode ser
fracionada em diversos atos).
TÍTULO VII
DOS CRIMES CONTRA A FAMÍLIA
CAPÍTULO I
DOS CRIMES CONTRA O CASAMENTO
1. BIGAMIA
Art. 235 - Contrair alguém, sendo casado, novo casamento:
Pena - reclusão, de dois a seis anos.
§ 1° - Aquele que, não sendo casado, contrai casamento com pessoa casada, conhecendo essa circunstância, é
punido com reclusão ou detenção, de um a três anos.
§ 2° - Anulado por qualquer motivo o primeiro casamento, ou o outro por motivo que não a bigamia, considera-
se inexistente o crime.
1. Objeto jurídico: Visa a lei proteger a organização familiar, mais especificamente o casamento
monogâmico, que é regra na grande maioria dos países ocidentais, de tal forma a evitar reflexos na
ordem jurídica que regulamenta os direitos e obrigações entre os cônjuges. Nossa cultura não admite
a bigamia, tendo o novo Código Civil em seu art. 1.521, VI, inclusive, previsto que não podem casar
as pessoas casadas.
43
Concurso necessário: Trata-se de crime de concurso necessário, de condutas convergentes, uma
vez que sua existência pressupõe a participação de pelo menos duas pessoas, cujas condutas se
manifestam na mesma direção, ou seja, a realização do matrimônio.
Para que ambas sejam punidas, entretanto, é necessário que tenham conhecimento da existência
do casamento anterior. Assim, o terceiro de boa-fé que se casa sem saber do impedimento decorrente
de anterior casamento do outro, não comete o crime.
Veja-se, por sua vez, que se ambos conhecem a circunstância do outro casamento, aquele
que já era casado responde pela forma descrita no caput, cuja pena é de reclusão de dois a seis
anos, enquanto a outra parte incide na figura privilegiada do § 1°, cuja pena é de detenção de
um a três anos.
3. Sujeito ativo: É o indivíduo, homem ou mulher, que, sendo casado, contrai novas núpcias.
4. Sujeito passivo: O Estado, bem como o cônjuge ofendido do primeiro casamento e ainda o cônjuge
de boa-fé do segundo.
Se o agente é separado judicialmente ou separado de fato, mas ainda não é divorciado, comete
o crime quando vem a casar-se novamente. Apenas o divórcio e o falecimento do cônjuge extingue o
vínculo e abre a possibilidade de novo matrimônio lícito.
Se o primeiro casamento for nulo ou anulável, mas ainda não tiver sido declarado como tal,
haverá crime. No entanto, o § 2° esclarece que, sendo posteriormente declarada a anulação ou nulidade
do primeiro casamento, considera-se inexistente o crime.
Importante: O simples casamento religioso não configura o crime, salvo se for realizado na
forma do art. 226, § 2°, da CF (com efeitos civis).
7. Prazo prescricional: Como o crime de bigamia usualmente permanece desconhecido por muito
tempo, preferiu o legislador criar hipótese diferenciada no que se refere ao início do prazo
prescricional, de terminando que o lapso somente passa a correr da data em que o fato se torna
conhecido da autoridade pública (art. 111, IV, CPB).
44
8. Ação penal: É pública incondicionada.
9. Classificação doutrinária: A bigamia é crime simples (ofende um único bem jurídico); próprio
(somente pode ser praticado por pessoa casada); material ou causal (consuma-se com a efetiva
celebração do segundo matrimônio); de dano (causa lesão ao casamento); de forma vinculada (o
meio de execução é o casamento, o qual deve obedecer as formalidades da lei civil); em regra
comissivo; instantâneo de efeitos permanentes (consuma-se em um momento determinado, mas seus
efeitos se prolongam no tempo); plurissubjetivo, plurilateral ou de concurso necessário (exige a
presença de duas pessoas) e bilateral ou de encontro; e normalmente plurissubsistente (a conduta
pode ser fracionada em diversos atos).
Parágrafo único - A ação penal depende de queixa do contraente enganado e não pode ser intentada senão
depois de transitar em julgado a sentença que, por motivo de erro ou impedimento, anule o casamento.
O casamento realizado nessas condições é anulável nos termos do art. 1.556 do Código Civil de
2002.
b) ocultando-lhe impedimento que não seja casamento anterior: Os impedimentos estão previstos
no art. 1.521 do Código Civil:
Para que haja delito, entretanto, é necessário que o agente tenha induzido o consorte
inocente em erro essencial ou que lhe tenha ocultado a existência de impedimento para a
celebração do casamento – que não o anterior. Premissa do crime, portanto, é que a outra parte
esteja de boa-fé e tenha sido enganada pelo agente.
45
3. Sujeito ativo: Qualquer pessoa pode ser sujeito ativo desse delito. Nada impede que ambos os
contraentes o pratiquem, basta que um engane o outro simultaneamente. Ex.: “A” oculta de “B” que é
seu irmão e “B” induz “A” em erro essencial ao omitir que porta doença grave transmissível.
4. Sujeito passivo: É o Estado, bem como o outro contraente que esteja de boa-fé.
7. Ação penal: Trata-se de crime de ação privada personalíssima, que somente pode ser intentada
pelo cônjuge ofendido, após o trânsito em julgado da sentença que decretou a nulidade do
matrimônio (condição de procedibilidade). Nesse caso, se ocorre morte da vítima, durante o
tramitar da ação penal, haverá perempção (causa extintiva da punibilidade), uma vez que não se
admite a transmissão da titularidade aos sucessores.
2. Elementos do tipo:
Consubstancia-se no verbo “contrair”, isto é, assumir casamento, no caso, conhecendo a
existência de impedimento que lhe cause a nulidade absoluta.
Estamos diante de uma norma penal em branco em sentido lato, cujo conteúdo carece de
complementação por outra lei, no caso o Código Civil.
46
Se o agente sabe do impedimento e apenas omite o fato do noivo, incorre no crime em
análise. Salienta a doutrina que só ocorrerá o delito do artigo anterior – ocultação de
impedimento – se o agente fraudulentamente ocultar o fato. Assim, se o sujeito mente para
esconder o impedimento, comete crime mais grave do art. 236. Se apenas se omite, sua conduta
enquadra-se no crime em estudo.
3. Sujeito ativo: Qualquer pessoa pode ser sujeito ativo desse delito. Nada impede que ambos os
contraentes sejam coautores, se tiverem ciência do impedimento.
4. Sujeito passivo: É o Estado, bem como o outro contraente que esteja de boa-fé, isto é, desde que
desconheça o impedimento.
7. Ação penal: É crime de ação penal pública incondicionada. Nos termos do art. 1.549 Código Civil,
nada impede, que o Ministério Público proponha ação civil para obter a declaração de nulidade do
casamento, antes ou concomitantemente à propositura da ação penal.
Crime subsidiário: É evidente que, na prática, a intenção do sujeito é obter a remuneração pelo
casamento; caso consiga, responderá apenas pelo crime de estelionato porque o tipo em estudo é
expressamente subsidiário. Assim, considerando que esse crime se constitui pela simples conduta de se
atribuir a condição de autoridade para celebração de casamento, estará configurado somente se,
posteriormente, não obtiver qualquer vantagem como conseqüência de tal ato.
O casamento realizado por autoridade incompetente é anulável, mas se convalida se não
for proposta a ação para a anulação no prazo de dois anos a contar da celebração (arts. 1550, VI,
e 1560, II, do Código Civil).
3. Sujeito ativo: Pode ser qualquer pessoa ou mesmo o funcionário público que não tenha atribuição
para celebrar casamento.
47
4. Sujeito passivo: É o Estado, bem como os cônjuges de boa-fé.
7. Distinção: O crime em estudo é uma forma específica do delito de usurpação de função pública
(art. 328 CPB). É de natureza subsidiária, somente incidindo se o fato não constituir delito mais grave.
Assim, se for praticado com vistas à obtenção de vantagem, a figura penal incidente será a do art. 328,
§ único do CP, cuja pena é de reclusão, de 2 a 5 anos, portanto mais grave.
5. SIMULAÇÃO DE CASAMENTO
Art. 239 - Simular casamento mediante engano de outra pessoa:
Pena - detenção, de um a três anos, se o fato não constitui elemento de crime mais grave.
3. Sujeito ativo: Somente um ou ambos os contraentes podem ser autores do delito em estudo. Na
primeira hipótese, vítima é o outro cônjuge enganado. Já na hipótese em que ambos os cônjuges são
co-autores, somente haverá crime se eles necessitarem do consentimento de seus pais, tutores ou
curadores para a celebração do matrimônio, pois o tipo exige que haja o engano de outrem.
O Juiz de Paz ou o Oficial do Cartório de Registro Civil que realiza a cerimônia, mas
dolosamente engana os noivos e não registra ou não leva a registro o ato no livro respectivo, comete
falsidade ideológica, consistente em omitir declaração que devia constar em documento público.
6. ADULTÉRIO
Art. 240 - (Revogado pela Lei nº 11.106, de 2005)
Obs.: O adultério era um dos raros crimes do CP que se apurava mediante ação privada personalíssima, onde
a queixa-crime somente podia ser intentada pelo cônjuge traído, não admitindo a substituição pelos sucessores
em caso de morte ou declaração de ausência da vítima antes ou durante o decorrer da ação penal.
CAPÍTULO II
DOS CRIMES CONTRA O ESTADO DE FILIAÇÃO
1. Objeto jurídico: Nesse dispositivo a lei tutela a formação da família e a fé pública nos
documentos oficiais.
2. Elementos do tipo: A conduta típica é registrar, dar causa ao registro de pessoa que não nasceu,
havendo, também, infração na conduta de registrar natimorto como se tivesse nascido vivo.
3. Sujeito ativo: Trata-se de crime comum, que pode ser praticado por qualquer pessoa (pai e mãe
fictícios, Oficial do Registro Civil quando ciente da falsidade etc.). Também respondem pelos crimes
os partícipes, como médicos que tenham atestado o nascimento inexistente, "testemunhas" do
nascimento etc.
4. Sujeito passivo: O Estado, bem como a pessoa que possa ser lesada pelo crime.
6. Prescrição: Determina o art. 111, IV, do Código Penal que o prazo prescricional passa a correr da
data em que o fato se torna conhecido.
7. Ação Penal: É pública incondicionada.
a) Dar parto alheio como próprio: É um crime que só pode ser praticado por mulher, cuja ação
incriminada é a de apresentar à sociedade um recém-nascido como se fosse seu próprio filho. É
necessário que a mulher tenha a intenção específica de criar uma situação jurídica em que se
faça passar por mãe do infante, introduzindo-o em sua família. É desnecessário o registro do
menor.
Sujeitos passivos (as vítimas) são o Estado e os herdeiros da agente. A consumação ocorre no
instante em que é criada uma situação que importe alteração do estado civil do recém-nascido. A
tentativa é possível.
b) Registrar como seu o filho de outrem (chamada adoção à brasileira): Cuida-se de infração penal
em que o agente (homem ou mulher) promove a inscrição no Registro Civil de criança declarando
tratar-se de filho próprio, quando, em verdade, cuida-se de filho de outrem. Respondem também pelo
crime o Oficial do Cartório e os pais verdadeiros se, cientes da intenção dos agentes, colaboram para a
efetivação do registro. Comete ainda o crime pessoa que passa a viver maritalmente com a
gestante, ciente de que ela se encontra grávida de outro homem, e, após o nascimento, registra o
recém-nascido como sendo filho dele próprio e de sua concubina. Sujeitos passivos são o Estado e
as pessoas lesadas pela conduta. A consumação se dá no momento em que o registro é efetivado. É
possível a tentativa.
O delito em análise absorve o crime de falsidade ideológica.
3. Crime privilegiado e perdão judicial: Estabelece o dispositivo, em seu parágrafo único, que se o
crime for praticado por motivo de reconhecida nobreza, o Juiz pode reduzir a pena para detenção de
um a dois anos (quando o normal é reclusão de 2 a 6 anos) ou deixar de aplicar a pena, concedendo o
perdão judicial. A reconhecida nobreza é evidenciada quando a conduta demonstra generosidade
ou afeto do agente que visa criar e educar a criança.
50
4. Prescrição: Nos termos do art. 111, IV do Código Penal, para a modalidade de registrar como
próprio o filho de outrem, a prescrição só passa a correr da data em que o fato se torna conhecido. Nas
demais modalidades o prazo prescricional segue a regra geral, ou seja, começa a ser contado da data da
consumação (art. 111, I).
5. Classificação doutrinária: O art. 242 do Código Penal contém crimes simples (ofendem um único
bem jurídico); próprio (na modalidade “dar parto alheio como próprio”) e comuns (nas demais
condutas típicas); materiais ou causais (consumam-se com a produção do resultado naturalístico); de
dano (causam lesão à família); de forma livre (admitem qualquer meio de execução); em regra
comissivos; instantâneos (consumam-se em um momento determinado, sem continuidade no tempo)
ou permanente (no núcleo “ocultar recém-nascido, no qual a consumação se protrai no tempo, por
vontade do agente); unissubjetivos, unilaterais o u de concurso eventual (cometidos por uma só
pessoa, mas admitem o concurso); e normalmente plurissubsistentes (a conduta pode ser fracionada
em diversos atos).
Art. 243 - Deixar em asilo de expostos ou outra instituição de assistência filho próprio ou alheio, ocultando-lhe
a filiação ou atribuindo-lhe outra, com o fim de prejudicar direito inerente ao estado civil:
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa.
1. Objeto jurídico: Trata-se de dispositivo que tutela o estado de filiação.
2. Elementos dos tipo: Consubstancia-se pelo verbo deixar, isto é, abandonar, largar, desamparar
filho próprio ou alheio em asilo de expostos ou outra instituição de assistência, ocultando-lhe a
filiação ou atribuindo-lhe outra.
O agente dessa forma, omite a filiação ou declara falsamente outra. Se ele abandona a
criança, deixando, porém, a indicação de sua filiação, falta um dos elementos exigidos pelo tipo,
não existindo o crime. Pela mesma razão, se ignora a filiação do menor, não pode ocultá-la. Tal ação
pode integrar outro crime.
Obs.: O agente deve realizar o abandono necessariamente nos locais indicados pelo dispositivo
legal, seja o local público ou particular, do contrário, poderá caracterizar o crime de abandono
de incapaz – art. 133 CPB ou abandono de recém-nascido – art. 134 CPB.
3. Sujeito ativo: Na modalidade deixar filho próprio, somente os pais do infante podem praticar o
crime. Já na modalidade deixar filho alheio, qualquer pessoa pode cometer o delito.
4. Sujeito passivo: É o Estado, bem como o menor que é lesado em seus direitos inerentes ao estado
civil.
6. Consumação e tentativa: Consuma-se com o abandono da criança nos locais descritos no tipo.
Trata-se de crime material, portanto a tentativa é perfeitamente possível.
7. Ação penal: É crime de ação penal pública incondicionada.
51
(cometido por uma só pessoa, mas admite o concurso); e normalmente plurissubsistente (a conduta
pode ser fracionada em diversos atos).
CAPÍTULO III
DOS CRIMES CONTRA A ASSISTÊNCIA FAMILIAR
Proteção constitucional: prevê o art. 229 que “os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos
menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou
enfermidade”. (NUCCI, 2014, p. 1121)
1. ABANDONO MATERIAL
Art. 244. Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do cônjuge, ou de filho menor de 18 (dezoito) anos
ou inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido ou maior de 60 (sessenta) anos, não lhes proporcionando
os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou
majorada; deixar, sem justa causa, de socorrer descendente ou ascendente, gravemente enfermo: (Redação
dada pela Lei nº 10.741, de 2003)
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa, de uma a dez vezes o maior salário mínimo vigente no
País. (Redação dada pela Lei nº 5.478, de 1968)
Parágrafo único - Nas mesmas penas incide quem, sendo solvente, frustra ou ilide, de qualquer modo, inclusive
por abandono injustificado de emprego ou função, o pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada,
fixada ou majorada. (Incluído pela Lei nº 5.478, de 1968)
1. Objeto jurídico: A lei tutela a família, no sentido de ser observada a regra do Código Civil que
estipula a necessidade de assistência material recíproca entre os parentes.
2. Classificação doutrinária: O abandono material é crime simples (ofende um único bem jurídico);
próprio (somente pode ser praticado pelas pessoas indicadas no tipo penal); formal, de consumação
antecipada ou de resultado cortado (consuma-se com a prática da conduta criminosa,
independentemente da produção do resultado naturalístico); de perigo concreto (exige prova da
situação de perigo ao sujeito passivo); permanente (a consumação se prolonga no tempo, durante todo
o período em que subsistir a falta dolosa e injustificada da assistência material); de forma livre
(admite qualquer meio de execução); omissivo próprio ou puro (a omissão está descrita no tipo
52
penal); unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual (cometido por uma só pessoa, mas admite
o concurso); e unissubsistente (a conduta é composta de um único ato, necessário e suficiente à
consumação).
§ 1º - A pena é de 1 (um) a 4 (quatro) anos de reclusão, se o agente pratica delito para obter lucro, ou se o
menor é enviado para o exterior.
§ 2º - Incorre, também, na pena do parágrafo anterior quem, embora excluído o perigo moral ou material,
auxilia a efetivação de ato destinado ao envio de menor para o exterior, com o fito de obter lucro.
1. Objeto jurídico:
Consoante o art. 229 da Constituição Federal, “Os pais tem o dever de assistir, criar e educar
os filhos menores...”. Assim, é direito dos filhos menores que os pais lhe propiciem a devida
assistência, criação e educação. Haverá infração a esses deveres se o genitor entregar o filho menor,
para criação e educação, a pessoas inidôneas.
2. Elementos do tipo: Consubstancia-se no verbo entregar. A entrega do filho menor de 18 anos deve
ser feita a pessoa em cuja companhia o agente saiba ou deva saber que o menor fica moral (ex.:
entregá-lo a uma prostituta, cafetão) ou materialmente em perigo (ex.: entregá-lo a um alcoólatra, a um
mendigo que não tenha condições de lhe fornecer os cuidados necessários).
3. Sujeito ativo: Somente podem praticar o crime os pais do menor. Não se inclui, portanto, o tutor.
7. Formas:
1. Simples: Está prevista no caput.
2. Qualificada: Está prevista no § 1° do artigo:
a) para obter lucro: Cuida-se aqui do chamado elemento subjetivo do tipo. Cite-se o exemplo do
genitor que entrega seu filho aos cuidados de um alcoólatra, para que o menor preste a este serviços
remunerados, vindo ele a se favorecer do ordenado recebido pelo ser filho, ficar com o dinheiro;
b) ou se o menor é enviado para o exterior: Essa conduta é considerada mais grave em razão do
maior perigo a que o menor está exposto.
3. Equiparada: Está prevista no § 2°. Pune-se aquele que, com intuito de lucro (elemento subjetivo do
tipo), ajuda a enviar menor para o exterior.
Art. 239. Promover ou auxiliar a efetivação de ato destinado ao envio de criança ou adolescente para o exterior
com inobservância das formalidades legais ou com o fito de obter lucro:
Pena - reclusão de quatro a seis anos, e multa.
53
Parágrafo único. Se há emprego de violência, grave ameaça ou fraude: (Incluído pela Lei nº 10.764, de
12.11.2003)
Pena - reclusão, de 6 (seis) a 8 (oito) anos, além da pena correspondente à violência.
9. Classificação doutrinária: A entrega de filho menor a pessoa inidônea é crime simples (ofende um
único bem jurídico); próprio (somente pode ser praticado pelos pais do menor de 18 anos de idade);
material ou causal (consuma-se com a produção do resultado naturalístico, consistente na efetiva
entrega do filho menor de 18 anos a pessoa inidônea); de perigo concreto (exige prova da situação de
perigo material ou moral à criança ou adolescente); de forma livre (compatível com qualquer meio de
execução); em regra comissivo; unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual (cometido por
uma só pessoa, mas admite o concurso); e normalmente plurissubsistente (a conduta pode ser
fracionada em diversos atos).
3. ABANDONO INTELECTUAL
Art. 246 - Deixar, sem justa causa, de prover à instrução primária de filho em idade escolar:
Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa.
O crime de abandono intelectual consiste no descumprimento, por parte dos pais, de um dos
deveres do casamento, qual seja, o de prover à instrução intelectual dos filhos menores em idade
escolar.
A instrução primária a que se refere o texto penal e, atualmente, chamada de instrução
básica (art. 208 da CF).
- Art. 208 CF: O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:
I - educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada
inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria; (Redação dada pela
Emenda Constitucional nº 59, de 2009) (Vide Emenda Constitucional nº 59, de 2009)
II - progressiva universalização do ensino médio gratuito; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 14, de
1996)
III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de
ensino;
IV - educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade; (Redação dada pela
Emenda Constitucional nº 53, de 2006)
V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de
cada um;
VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando;
VII - atendimento ao educando, em todas as etapas da educação básica, por meio de programas suplementares
de material didático escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde. (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 59, de 2009)
§ 1º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo.
§ 2º O não-oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público, ou sua oferta irregular, importa
responsabilidade da autoridade competente.
§ 3º Compete ao Poder Público recensear os educandos no ensino fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar,
junto aos pais ou responsáveis, pela frequência à escola.
- Art. 6º: É dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula das crianças na educação básica a partir dos 4
(quatro) anos de idade. (Redação dada pela Lei nº 12.796, de 2013)
54
Assim, cometem o crime os pais que não efetuam a matrícula, sem justa causa, quando a
criança atinge a idade escolar (quatro anos), bem como aqueles que permitem a evasão do ensino antes
de completado o ciclo de treze anos mencionado na Lei de Diretrizes.
1. Objeto jurídico: O dispositivo visa, portanto, tutelar a educação, a instrução dos filhos menores,
para evitar que eles se tornem pessoas analfabetas ou com parca instrução que lhes dificulte o convívio
social e o ingresso no mercado de trabalho.
O objeto jurídico é a educação e a instrução de menores de 18 anos, que o Estado tem por
finalidade preservar.
Idade escolar: é o período de vida que abrange a pessoa dos quatro aos dezessete anos completos.
Dispõe a Constituição Federal ser dever do Estado promover a educação básica, obrigatória e gratuita,
para todos os que a ele não tiverem acesso na idade própria. O acesso ao ensino obrigatório e gratuito
constitui Direito Público subjetivo (art. 208, I e § 1.º). Em razão da modificação trazida pela Emenda
Constitucional 59/2009, considera-se a idade escolar dos quatro aos dezessete anos.
2. Conduta típica: Consiste em deixarem os pais de prover à instrução dos filhos em idade escolar,
sem que haja justa causa para isso.
3. Elemento normativo do tipo: sem justa causa significa algo ilícito, não amparado por lei. Logo, é
um elemento de antijuridicidade colocado dentro do tipo penal. É natural que situações extremadas,
como a pobreza ou miserabilidade dos pais e mesmo a falta de instrução destes, podem servir de
justificativa para o não preenchimento do tipo penal. O mesmo se pode dizer da falta de vagas em
escolas públicas, uma vez que cabe ao Estado proporcionar educação a todos os brasileiros,
especialmente aos menos favorecidos economicamente.
A jurisprudência entende como justa causa, hábil a desconfigurar o delito, a ausência de vagas
em escolas públicas, penúria da família etc.
Deixar de prover significa não mais providenciar alguma coisa. No caso deste tipo penal, é a
instrução primária do filho menor.
4. Elemento subjetivo do tipo: é o dolo. Não existe a forma culposa, nem se exige elemento subjetivo
do tipo específico.
Para que exista crime, é necessário que haja dolo na conduta dos genitores, no sentido de privar
os filhos menores da educação de primeiro grau.
5. Sujeito ativo: Só os pais podem ser sujeitos ativos e é irrelevante se vivem ou não em companhia de
seus filhos. Assim, ainda que não convivam com seus filhos, são obrigados a lhes prover à instrução.
Trata-se de crime próprio, que, entretanto, não abrange os meros tutores ou curadores do
menor.
- Art. 55 do Estatuto da Criança e Adolescente – Lei nº 8.069/90: “Os pais ou responsável têm a
obrigação de matricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino”.
7. Consumação: O crime se consuma no momento em que, após os cinco anos de idade do filho, os
genitores revelam inequivocamente a vontade de não cumprir com o dever paterno de lhe propiciar
instrução primária.
8. Tentativa: Trata-se de crime omissivo que não admite a tentativa. É também crime permanente, pois
sua consumação perdura enquanto o menor não for enviado à escola.
55
9. A questão do homeschooling:
Discute-se se os pais, seja por questões de segurança, seja pela baixa qualidade da educação
ofertada pelo Estado, podem oferecer o chamado “ensino domiciliar” aos seus filhos menores de idade,
prática conhecida como homeschooling na Europa e nos Estados Unidos.
Para Damásio E. de Jesus, o fato seria atípico, uma vez que haveria a educação domiciliar da
criança ou do adolescente e restaria ausente a lesividade da conduta.
De outro lado, há entendimentos no sentido de que a legislação brasileira não prevê o ensino
domiciliar, de modo que não se estaria a resguardar os interesses do filho menor de idade caso se
permitisse aos pais propiciar a educação dos filhos da maneira que bem entenderem. Como já decidido
pelo Superior Tribunal de Justiça: “Inexiste previsão constitucional e legal, como reconhecido pelos
impetrantes, que autorizem os pais a ministrarem aos filhos as disciplinas do ensino fundamental, no
recesso do lar, sem controle do poder público mormente quanto à frequência no estabelecimento de
ensino e ao total de horas letivas indispensáveis à aprovação do aluno”.
Embora proferida no âmbito cível, o julgado revela a posição do Superior Tribunal de Justiça
no tocante à impossibilidade do homeschooling, enquanto não houver disciplina legal sobre o assunto.
Os fundamentos são simples: (a) não há fiscalização do Poder Público quanto à frequência da criança
ou adolescente às aulas; e (b) o Estado não tem como avaliar o desempenho do aluno, para o fim de
constatar se a educação domiciliar está sendo suficiente e adequada. Logo, transportando o raciocínio
jurisprudencial para o campo penal, faltaria justa causa no comportamento dos pais que optarem por
ensinar os filhos em sua residência, acarretando a configuração do crime tipificado no art. 246 do
Código Penal. (MASSON, 2014, p. 258)
10. Classificação doutrinária: trata-se de crime próprio (aquele que demanda sujeito ativo
qualificado ou especial); formal (delito que não exige resultado naturalístico, consistente na efetiva
falta de instrução da vítima); de forma livre (podendo ser cometido por qualquer meio eleito pelo
agente); omissivo (“deixar” implica em omissão); permanente (aquele cuja consumação se prolonga no
tempo, enquanto estiver o menor em idade escolar, sem qualquer instrução); unissubjetivo (que pode
ser praticado por um só agente); unissubsistente (crime que pode ser cometido por um ato); não admite
tentativa.
4. ABANDONO MORAL
Art. 247 - Permitir alguém que menor de dezoito anos, sujeito a seu poder ou confiado à sua guarda ou
vigilância:
I - freqüente casa de jogo ou mal-afamada, ou conviva com pessoa viciosa ou de má vida;
II - freqüente espetáculo capaz de pervertê-lo ou de ofender-lhe o pudor, ou participe de representação de igual
natureza;
III - resida ou trabalhe em casa de prostituição;
IV - mendigue ou sirva a mendigo para excitar a comiseração pública:
1. Objeto jurídico: Tutela-se a educação, a formação moral do menor de 18 anos de idade, como
forma de prevenir a delinquência juvenil.
2. Elementos do tipo: Consubstancia-se no verbo permitir, isto é, consentir, tolerar que menor de 18
anos, pratique uma das ações previstas nos incisos epigrafados:
c) III - resida ou trabalhe em casa de prostituição: Com base nesse inciso, o filho da meretriz não
pode com ela morar no local ou casa em que exerce comércio carnal. Da mesma forma o menor de 18
anos não pode lá trabalhar, por exemplo, como garçom, atendente, faxineiro etc.
d) IV - mendigue ou sirva a mendigo para excitar a comiseração pública: Pune-se aqui a conduta
daquele que permite que menor de 18 anos mendigue, isto é, passe a pedir esmolas. O pai, ao permitir
que seu filho menor mendigue ou ao “cedê-lo” ou “alugá-lo” a terceiro para que o utilize em atos de
mendicância, comete o crime em estudo. Aquele que mendiga em companhia de menor de 18 anos
praticava a contravenção do art. 60, parágrafo único, “c” do Decreto-Lei nº 3.688/41, mas tal
dispositivo foi revogado pela Lei nº 11.983/2009.
3. Sujeito ativo: É aquele que tem o menor de 18 anos sujeito a seu poder (pai, mãe, tutor) ou
confiado a sua guarda ou vigilância (ex.: diretor de colégio).
4. Sujeitos passivos: É o menor de 18 anos que se encontra sob o poder ou confiado à guarda ou
vigilância de outrem.
7. Distinção com o art. 245: Trata, referido art. 245, também de modalidade de abandono moral.
Contudo, na correta distinção de Noronha, o primeiro é forma ativa, ou seja, o agente entrega o
menor, e o segundo é forma passiva, pois o agente apenas permite. Ex.: se um pai entrega o filho a
uma prostituta para aí ficar durante certo tempo, comete o delito do art. 245; se, todavia, o menor está
morando com ela e o genitor não age, não se opõe, pratica o do presente artigo.
9. Classificação doutrinária: O abandono moral é crime simples (ofende um único bem jurídico);
próprio (somente pode ser praticado pelo titular do poder familiar ou pessoa a quem tenha sido
57
confiada a guarda ou vigilância de menor de 18 anos de idade); formal, de consumação antecipada
ou de resultado cortado (consuma-se com a prática da conduta criminosa, independentemente da
superveniência do resultado naturalístico); de perigo concreto (exige comprovação do perigo
proporcionado à integridade moral do menor); de forma livre (admite qualquer meio de execução);
comissivo ou omissivo próprio ou puro; habitual (nas modalidades “frequentar casa de jogo ou mal-
afamada” e “frequentar espetáculo capaz de pervertê-lo ou de ofender-lhe o pudor”), permanente (nas
espécies “conviver com pessoa viciosa ou de má vida” e “residir ou trabalhar em casa de prostituição”)
ou instantâneo (nas modalidades “participar de representação capaz de pervertê-lo ou de ofender-lhe o
pudor” ou “mendigar ou servir a mendigo para excitar a comiseração pública”); unissubjetivo,
unilateral ou de concurso eventual (cometido por uma só pessoa, mas admite o concurso); e
unissubsistente (quando omissivo) ou plurissubsistente (se comissivo).
CAPÍTULO IV
DOS CRIMES CONTRA O PÁTRIO PODER, TUTELA CURATELA
Art. 248 - Induzir menor de dezoito anos, ou interdito, a fugir do lugar em que se acha por determinação de
quem sobre ele exerce autoridade, em virtude de lei ou de ordem judicial; confiar a outrem sem ordem do pai,
do tutor ou do curador algum menor de dezoito anos ou interdito, ou deixar, sem justa causa, de entregá-lo a
quem legitimamente o reclame:
1. Objeto jurídico: Tutela-se os direitos dos genitores, tutores ou curadores sobre os incapazes,
bem como os interesses destes.
É importante mencionar que com o advento do novo Código Civil, o termo “pátrio poder” foi
substituído por “poder familiar” (arts. 1.630 a 1.638), competindo, pois, a ambos os genitores o
exercício dos direitos e deveres relativos à prole. A tutela encontra-se prevista nos arts. 1.728 a 1.766 e
a curatela nos arts. 1.767 a 1.783 do novo diploma civil.
2. Elementos do tipo: O tipo penal prevê três modalidades de condutas típicas:
a) Induzir menor de dezoito anos, ou interdito, a fugir do lugar em que se acha por determinação
de quem sobre ele exerce autoridade, em virtude de lei ou de ordem judicial: Nessa modalidade, o
agente convence, persuade, aconselha o menor, ou interdito, a fugir, isto é, a se afastar, sumir do local
em que se encontrava por determinação de seu genitor, tutor ou curador, como por exemplo, da casa
dos pais ou representantes legais. Não basta o induzimento, é necessário que o menor efetivamente
realize a fuga por tempo razoável. Neste crime, o agente não acompanha o menor em sua fuga, pois, se
o fizesse, haveria crime de subtração de incapaz – art. 249 CP.
b) Confiar a outrem, sem ordem do pai, do tutor ou do curador algum menor de dezoito anos ou
interdito: Nessa figura o agente, por exemplo, o diretor de colégio ou asilo, sem autorização do
responsável, entrega o menor ou interdito a outrem. Aquele que o recebe ciente de que a entrega é
arbitrária também responderá pelo crime em tela. Caso desconheça essa circunstância e se recuse a
devolver o menor ou interdito, responderá pelo crime de sonegação de incapaz.
c) Ou deixar, sem justa causa, de entregá-lo a quem legitimamente o reclame: Pune-se a conduta
daquele que, detendo ou possuindo o menor, ou o interdito, recuse a devolvê-lo, sem justo motivo, a
quem de direito. Trata-se aqui do chamado sonegação de incapaz.
3. Sujeito ativo: Qualquer pessoa pode praticar o delito em tela. Na modalidade sonegação de
incapazes, o pai, tutor ou curador do menor ou do interdito que tenha sido destituído ou
temporariamente privado do pátrio poder (poder familiar), tutela ou curatela, caso venha a se recusar a
entregar o incapaz, comete o crime de desobediência (art. 359 CP), cuja pena é mais grave.
58
4. Sujeitos passivos: É o pai, a mãe, o tutor ou o curador.
6. Consumação e tentativa:
a) induzir a fugir: consuma-se com a efetiva fuga do menor ou interdito. A tentativa ocorrerá na
hipótese em que o incapaz é impedido de fugir;
b) confiar a outrem: consuma-se quando o menor ou interdito é entregue a outrem. É possível a
tentativa;
c) deixar de entregar: consuma-se no momento da recusa do agente, sem justa causa, em devolver o
incapaz. Trata-se de crime permanente. Por se tratar de crime omissivo puro, a tentativa não é possível,
pois ou o agente se recusa, e o crime está consumado, ou não há recusa, e o crime não se configura.
7. Distinção: A figura criminal em estudo, na modalidade induzir o menor ou interdito à fuga, difere
do crime de subtração de incapazes. No induzimento, a ação acha-se ligada à idéia de fazer o menor
sair do lugar em que se encontra colocado pelo responsável (asilo, colégio etc.); se o agente induz o
menor a segui-lo haverá subtração, que é crime mais grave.
Na subtração, o menor é tirado do poder de quem o tem sob sua guarda em virtude de lei ou de
ordem judicial; ao passo que, no induzimento, ele é levado a sair do local onde foi posto. Como se vê,
não é fácil diferenciar uma figura criminal de outra.
9. Classificação doutrinária: Os crimes são simples (ofendem um único bem jurídico); comuns
(podem ser cometidos por qualquer pessoa); formais (induzimento à fuga, com divergência
doutrinária, e sonegação de incapazes) ou material (entrega arbitrária); de forma livre (admitem
qualquer meio de execução); em regra comissivos (induzimento à fuga e entrega arbitrária) ou
omissivo próprio ou puro (sonegação de incapazes); instantâneos (consumam-se em momentos
determinados, sem continuidade no tempo); unissubjetivos, unilaterais ou de concurso eventual
(cometidos por uma só pessoa, mas admitem o concurso); e plurissubsistentes (induzimento à fuga e
entrega arbitrária) ou unissubsistente (sonegação de incapazes).
2. SUBTRAÇÃO DE INCAPAZES
Art. 249 - Subtrair menor de dezoito anos ou interdito ao poder de quem o tem sob sua guarda em virtude de lei
ou de ordem judicial:
Pena - detenção, de dois meses a dois anos, se o fato não constitui elemento de outro crime.
§ 1º - O fato de ser o agente pai ou tutor do menor ou curador do interdito não o exime de pena, se destituído
ou temporariamente privado do pátrio poder, tutela, curatela ou guarda.
§ 2º - No caso de restituição do menor ou do interdito, se este não sofreu maus-tratos ou privações, o juiz pode
deixar de aplicar pena.
2. Conduta típica: Consiste em retirar o menor de dezoito anos ou o interdito da esfera de vigilância
de quem exerce o poder familiar, tutela, curatela ou guarda. Para a caracterização do delito, não
importa se houve consentimento do menor, uma vez que tal consentimento é totalmente inválido.
3. Sujeito ativo: Pode ser qualquer pessoa, inclusive os pais, tutores ou curadores do menor ou
interdito, desde que destituídos ou afastados temporariamente do direito de guarda (§ 1º).
5. Consumação: O crime se consuma com a subtração efetivada contra a vontade do titular do direito
de guarda do menor ou interdito. Trata-se de crime permanente.
6. Tentativa. É possível.
Prevê o § 2º uma hipótese de perdão judicial quando o agente restitui o menor ou interdito,
sem tê-lo submetido a maus tratos ou privações de qualquer ordem.
7. Subsidiariedade expressa: O delito é expressamente subsidiário, pois o art. 249 determina sua
aplicação apenas quando o fato não constitui crime mais grave, como, por exemplo, sequestro ou
extorsão mediante sequestro.
O crime ficará também absorvido quando a intenção do agente é colocar o menor subtraído em
família substituta, uma vez que o art. 237 do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90)
pune com reclusão, de dois a seis anos, e multa, quem subtrai criança ou adolescente ao poder de quem
o tem sob sua guarda em virtude de lei ou ordem judicial com o fim de colocação em lar substituto.
CAPÍTULO I
DOS CRIMES DE PERIGO COMUM
1. INCÊNDIO
Art. 250 - Causar incêndio, expondo a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de outrem:
Pena - reclusão, de três a seis anos, e multa.
Aumento de pena
§ 1º - As penas aumentam-se de um terço:
I - se o crime é cometido com intuito de obter vantagem pecuniária em proveito próprio ou alheio;
II - se o incêndio é:
a) em casa habitada ou destinada a habitação;
b) em edifício público ou destinado a uso público ou a obra de assistência social ou de cultura;
c) em embarcação, aeronave, comboio ou veículo de transporte coletivo;
d) em estação ferroviária ou aeródromo;
e) em estaleiro, fábrica ou oficina;
f) em depósito de explosivo, combustível ou inflamável;
g) em poço petrolífico ou galeria de mineração;
h) em lavoura, pastagem, mata ou floresta.
Incêndio culposo
§ 2º - Se culposo o incêndio, é pena de detenção, de seis meses a dois anos.
60
1. Objeto jurídico: Os crimes descritos neste título visam proteger a incolumidade pública, ou seja, a
tranquilidade na vida em sociedade, evitando que a integridade corporal ou os bens das pessoas
sejam expostos a risco. Incolumidade é o estado de preservação ou segurança de pessoas ou de coisas
em relação a possíveis eventos lesivos. (MASSON, 2014, p. 275).
2. Tipo objetivo:
No crime de incêndio, o agente provoca intencionalmente a combustão de algum material no
qual o fogo se propaga, fogo este que, em face de suas proporções, causa uma situação de risco efetivo
(concreto) para número elevado e indeterminado de pessoas ou coisas. A situação de risco pode
também decorrer de pânico provocado pelo incêndio (em um cinema, teatro, edifício etc.).
Obs.: A provocação de incêndio em uma casa afastada não coloca em risco a coletividade e,
assim, não caracteriza o crime de incêndio, mas crime de dano qualificado.
O crime pode ser praticado por ação ou por omissão, como por ex. por parte de quem tem o
dever jurídico de evitar o resultado porque causou acidentalmente o incêndio, e, mesmo podendo
fazê-lo, resolve se omitir e deixar o fogo tomar grandes proporções. Não se exige a utilização de
substância inflamável, podendo o fogo ter sido provocado diretamente em papéis, tecidos etc.
3. Sujeito ativo: Pode ser qualquer pessoa, inclusive o proprietário do local incendiado.
5. Consumação e tentativa: O crime se consuma com a criação do perigo, sendo possível a tentativa.
Se a intenção do agente era matar alguém, responde por crime de homicídio (consumado ou
tentado, conforme o resultado), qualificado pelo emprego de fogo. O homicídio absorve o crime de
incêndio.
Por outro lado, a caracterização do crime de incêndio absorve o crime de dano qualificado
pelo uso de substância inflamável (art. 163, parágrafo único, II, do CP). Este crime só se
caracteriza quando o fogo não causa perigo comum, aplicando-se, portanto, a situações de menor
gravidade.
O § 1º determina a elevação da pena em um terço quando o crime é cometido com intenção de
obter alguma vantagem (ainda que o agente não consiga obtê-la) e quando o fato ocorre em
determinados locais, elencados na lei, nos quais existe uma situação mais grave de risco.
Obs.: O ato de provocar incêndio em mata ou floresta constitui crime previsto no art. 41 da lei nº
9.605/98 (Crimes Contra o Meio Ambiente). Esse crime tem pena menor – reclusão, de dois a quatro
anos, e multa -, pois se configura quando referido incêndio não provoca perigo concreto a diversas
pessoas. Se o causar, o crime é o de incêndio com a pena majorada.
8. Classificação doutrinária: O incêndio é crime comum (pode ser cometido por qualquer pessoa);
material ou causal e de perigo concreto (a consumação reclama a superveniência do resultado
61
naturalístico, consistente no efetivo perigo à vida, à integridade física ou ao patrimônio de pessoas
indeterminadas); vago (tem como sujeito passivo a coletividade, ente destituído de personalidade
jurídica); de forma livre (admite qualquer meio de execução); instantâneo (consuma-se em um
momento determinado, sem continuidade no tempo); não transeunte (deixa vestígios materiais);
unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual (pode ser cometido por uma só pessoa, mas
admite o concurso); em regra comissivo; e normalmente plurissubsistente (a conduta criminosa pode
ser fracionada em diversos atos).
Trata-se de crime que ocorre quando alguém não toma os cuidados necessários em determinada
situação e, por conseqüência, provoca um incêndio que expõe a perigo a incolumidade física ou
patrimônio de número indeterminado de pessoas. Ex.: atirar ponta de cigarro em local onde pode
ocorrer combustão, não tomar as cautelas devidas em relação a fios elétricos desencapados etc.
As causas de aumento de pena do § 1º não se aplicam ao crime de incêndio culposo.
Nos termos da 2ª parte do art. 258, a pena será aumentada se gerar lesão corporal ou morte.
2. EXPLOSÃO
Art. 251 - Expor a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de outrem, mediante explosão, arremesso
ou simples colocação de engenho de dinamite ou de substância de efeitos análogos:
Pena - reclusão, de três a seis anos, e multa.
Modalidade culposa
§ 3º - No caso de culpa, se a explosão é de dinamite ou substância de efeitos análogos, a pena é de detenção, de
seis meses a dois anos; nos demais casos, é de detenção, de três meses a um ano.
4. Sujeito passivo: O Estado e as pessoas expostas a risco em relação à sua integridade ou patrimônio.
6. Tentativa: É possível.
62
7. Distinção:
O crime de explosão fica absorvido pelo homicídio qualificado se a intenção do agente era
matar alguém. Por outro lado, a configuração do crime de explosão absorve o crime de dano
qualificado pelo uso de substância explosiva (art. 163, parágrafo único, III, do CP).
Veja-se, por fim, que o art. 16, parágrafo único, III, da Lei nº 10.826/2003 (Estatuto do
Desarmamento) pune com reclusão, de três a seis anos, e multa, quem possui, detém, fabrica ou
emprega artefato explosivo sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.
No crime do art. 251 é necessário que a explosão crie perigo concreto, o que não ocorre no crime
do Estatuto.
Há ainda a causa de aumento de pena do art. 258 CP se gerar lesão corporal ou morte.
9. MODALIDADE CULPOSA
§ 3º - No caso de culpa, se a explosão é de dinamite ou substância de efeitos análogos, a pena é de detenção, de
seis meses a dois anos; nos demais casos, é de detenção, de três meses a um ano.
Valem aqui as observações feitas em relação ao crime de incêndio culposo. Ex.: colocação de
tambores de gás para utilização como combustível em veículo sem as cautelas necessárias; estocagem
de fogos de artifício ou pólvora em condições perigosas, que vem a causar explosões etc.
10. Ação penal: É pública incondicionada, de competência do Juizado Especial Criminal, exceto
quando resulta lesão corporal ou morte em decorrência do uso de dinamite ou explosivo similar.
11. Classificação doutrinária: O crime é comum (pode ser cometido por qualquer pessoa); material
ou causal (depende da produção do resultado naturalístico, isto é, a efetiva exposição a perigo da vida,
da integridade física ou do patrimônio de pessoas indeterminadas); de perigo comum e concreto; de
forma livre (admite qualquer meio de execução); vago (tem como sujeito um ente destituído de
personalidade jurídica, qual seja, a coletividade); instantâneo (consuma-se em um momento
determinado, sem continuidade no tempo); unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual (pode
ser cometido por uma só pessoa, mas admite o concurso); em regra comissivo; e normalmente
plurissubsistente (a conduta criminosa pode ser fracionada em diversos atos).
63
2. Elementos do tipo: Consiste em expor a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de
outrem. O meio de execução é que difere dos demais crimes de perigo comum, pois o agente se utiliza
de gás tóxico ou asfixiante. Gás tóxico é o que atua por envenenamento, ainda que não mortal,
enquanto gás asfixiante é o que afeta de modo puramente mecânico, as vias respiratórias,
determinando a sufocação. Trata-se de crime de perigo comum e concreto.
Ex.: quem faz uso irregular de bomba de gás lacrimogêneo, ou quem libera gás tóxico dentro de boate
fazendo com que os mesmos sejam intoxicados ou que tenham mal estar etc.
6. Consumação e tentativa: O crime se consuma com o uso do gás tóxico ou asfixiante, desde que
provoque uma situação de perigo concreto para a coletividade. A tentativa é possível.
7. Distinções:
a) O art. 54 da Lei nº 9.605/98 (Crime Ambiental) prescreve: “Causar poluição de qualquer natureza em
níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de
animais ou a destruição significativa da flora: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. § 1º Se o crime é
culposo: Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa. § 2º Se o crime: V - ocorrer por lançamento de
resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou substâncias oleosas, em desacordo com as
exigências estabelecidas em leis ou regulamentos: Pena - reclusão, de um a cinco anos”.
b) O art. 56 da Lei nº 9.605/98 (Crime Ambiental) prescreve: “Produzir, processar, embalar, importar,
exportar, comercializar, fornecer, transportar, armazenar, guardar, ter em depósito ou usar produto ou
substância tóxica, perigosa ou nociva à saúde humana ou ao meio ambiente, em desacordo com as exigências
estabelecidas em leis ou nos seus regulamentos: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa”.
c) Se o agente usar gás tóxico ou asfixiante com o fim de expor a perigo a vida ou saúde de pessoa
determinada, configura-se o crime de perigo para a vida ou saúde de outrem – art. 132 CPB.
8. Ação penal: Trata-se de crime de ação penal pública incondicionada.
9. Classificação doutrinária: O crime é comum (pode ser cometido por qualquer pessoa); material
ou causal (depende da produção do resultado naturalístico, consistente na exposição a perigo da vida,
da integridade física ou do patrimônio de pessoas indeterminadas); de perigo concreto; vago (tem
como sujeito passivo a coletividade, ente destituído de personalidade jurídica); de forma vinculada (o
tipo penal aponta os meios de execução: uso de gás tóxico ou asfixiante); instantâneo (consuma-se em
um momento determinado, sem continuidade no tempo); em regra comissivo; unissubjetivo,
unilateral ou de concurso eventual (pode ser cometido por uma só pessoa, mas admite o concurso); e
normalmente plurissubsistente (a conduta criminosa pode ser fracionada em diversos atos).
64
1. A questão da derrogação do art. 253 do CPB pela Lei nº 10.826/2003:
O art. 16, parágrafo único, III da Lei nº 10.826/03, prevê figura semelhante:
“art. 16: Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem: III – possuir, detiver, fabricar ou
empregar artefato explosivo ou incendiário, sem autorização ou em desacordo com determinação
legal ou regulamentar”;
Do art. 253 do estatuto penal faltaram as condutas fornecer, adquirir ou transportar. À
primeira vista, elas não se enquadrariam na nova figura típica, permanecendo redigidas pelos
dispositivos do Código Penal.
Entretanto, na prática, todos os comportamentos, inclusive esses três, acabaram absorvidos
pela Lei nº 10.826/03. É que, para fornecer ou transportar, é necessário, antes, deter ou pelo menos
possuir o objeto, ainda que momentaneamente.
No que tange à aquisição, não resta dúvida de que quem adquire possui, e quem tenta adquirir
tenta possuir. Diante do exposto, todas as figuras do art. 253 CPB foram alcançadas pela nova lei.
Assim, fabricar, possuir (adquirir, fornecer e transportar), deter ou empregar artefato explosivo
não configura mais crime previsto no Código Penal, mas na Lei nº 10.826/03, com pena de 3 a 6
anos de reclusão, mais multa. Estamos diante de uma novatio legis in pejus, não podendo retroagir
para prejudicar o réu, na medida em que a sanção penal cominada é mais severa.
Para Capez (2014, p. 239) o art. 253 foi apenas derrogado pela Lei de Arma de Fogo
(10.826/03), pois o fabrico, o fornecimento, a aquisição, a posse ou o transporte de gás tóxico ou
asfixiante sem autorização da autoridade competente continua a ser por ele incriminado.
1. Objeto jurídico: Protege-se a incolumidade pública.
2. Elementos do tipo: Trata-se de crime de ação múltipla ou conteúdo variado, pois se o agente
praticar qualquer das condutas típicas, haverá delito único. As ações nucleares consubstanciam-se nos
verbos fabricar (produzir), fornecer (entregar a título oneroso ou gratuito), adquirir (obter a título
oneroso ou gratuito), possuir (ter sob a guarda ou disposição) ou transportar (levar, remover), sem
licença da autoridade, gás tóxico ou asfixiante, ou material destinado à sua fabricação.
É necessário que as condutas típicas sejam praticadas sem autorização da autoridade. É o
chamado elemento normativo do tipo. Presente a autorização, o fato é atípico.
65
admite o concurso); e normalmente plurissubsistente (a conduta criminosa pode ser fracionada em
diversos atos).
5. INUNDAÇÃO
Art. 254 - Causar inundação, expondo a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de outrem:
Pena - reclusão, de três a seis anos, e multa, no caso de dolo, ou detenção, de seis meses a dois anos, no caso
de culpa.
3. Sujeito ativo: Trata-se de crime comum. Qualquer pessoa pode praticá-lo, inclusive o proprietário
do imóvel inundado.
5. Elemento subjetivo: O crime de inundação pode ser praticado dolosa ou culposamente, sendo que,
no último caso, o fato resulta da não observância de um cuidado necessário (no sentido de evitar a
inundação), e a pena evidentemente é mais branda.
Se o agente quiser matar alguém por meio de inundação, poderá configurar-se o concurso
formal entre o crime de inundação e o delito de homicídio (art. 121, § 2º, III, CPB). Caso o
resultado mais grave (morte ou lesão corporal grave) não seja querido pelo agente, mas sobrevenha
culposamente, teremos a hipótese do crime de inundação qualificada pelo resultado (art. 258 CPB).
8. Classificação doutrinária: A inundação é crime comum (pode ser cometido por qualquer pessoa);
material ou causal e de perigo comum e concreto (a consumação reclama a superveniência do
resultado naturalístico, consistente na efetiva exposição a perigo da vida, da integridade física ou do
patrimônio de pessoas indeterminadas); de forma livre (admite qualquer meio de execução); vago
(tem como sujeito passivo um ente destituído de personalidade jurídica, qual seja, a coletividade);
instantâneo (consuma-se em um momento determinado, sem continuidade no tempo); em regra
comissivo; unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual (pode ser praticado por uma só pessoa,
mas admite o concurso); e normalmente plurissubsistente (a conduta criminosa é suscetível de
fracionamento em diversos atos).
66
4. PERIGO DE INUNDAÇÃO
Art. 255 - Remover, destruir ou inutilizar, em prédio próprio ou alheio, expondo a perigo a vida, a integridade
física ou o patrimônio de outrem, obstáculo natural ou obra destinada a impedir inundação:
Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.
Esse crime se caracteriza pela não-ocorrência da inundação, uma vez que a existência desta
tipifica o crime previsto no artigo anterior. A conduta incriminada no delito em tela consiste apenas em
tirar, eliminar ou tornar ineficaz algum obstáculo (margem, p. ex.) ou obra (barragem, dique,
comporta etc.) cuja finalidade é evitar a inundação.
Não se confunde o crime de tentativa de inundação (art. 254), em que o agente quer, mas não
consegue provocá-la, com o crime de perigo de inundação, em que o agente efetivamente não quer
provocá-la.
2. Elementos do tipo: Consubstancia-se nos verbos remover (deslocar), destruir (fazer desaparecer)
ou inutilizar (tornar imprestável, inservível), obstáculo natural ou obra destinada a impedir inundação.
Ao contrário do crime anterior, em que o perigo advém da efetiva inundação, aqui basta o perigo da
inundação com a prática das ações elencadas no tipo penal. Trata-se de crime de perigo concreto.
3. Sujeito ativo: Trata-se de crime comum. Qualquer pessoa pode praticá-lo, inclusive o proprietário
do prédio em que se encontra o obstáculo natural ou a obra destinada a impedir a inundação.
5. Elemento subjetivo: Trata-se de crime doloso, em que o agente objetiva provocar uma situação
de risco à coletividade pela simples remoção do obstáculo, não visando a efetiva ocorrência da
inundação. Assim, o crime se consuma com a situação de perigo decorrente de sua conduta. A
tentativa é possível quando o agente, por exemplo, não consegue remover o obstáculo.
6. Consumação e tentativa: Consuma-se com a prática de uma das ações previstas no tipo penal,
desde que surja a efetiva situação de perigo de inundação. A tentativa é inadmissível.
8. Classificação doutrinária: O perigo de inundação é crime comum (pode ser cometido por qualquer
pessoa); formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado (consuma-se com a prática da
conduta legalmente descrita, independentemente da efetiva inundação); de perigo comum e concreto
(reclama a comprovação do perigo à vida, à integridade física ou ao patrimônio de pessoas
indeterminadas); de forma livre (admite qualquer meio de execução); vago (tem como sujeito passivo
um ente destituído de personalidade jurídica, qual seja, a coletividade); obstáculo (o legislador previu
como crime autônomo atos que representam a preparação do delito de inundação); instantâneo
(consuma-se em um momento determinado, sem continuidade no tempo); em regra comissivo;
unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual (pode ser praticado por uma só pessoa, mas
admite o concurso); e normalmente plurissubsistente (a conduta fracionada em diversos atos).
5. DESABAMENTO OU DESMORONAMENTO
Art. 256- Causar desabamento ou desmoronamento, expondo a perigo a vida, a integridade física ou o
patrimônio de outrem:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
2. Condutas típicas
a) Causar desabamento. Significa provocar a queda de obras construídas pelo homem (edifícios,
pontes ou quaisquer outras construções).
67
b) Causar desmoronamento: Significa provocar a queda de parte do solo (barrancos, morros,
pedreiras etc.).
4. Sujeito ativo: Pode ser qualquer pessoa, inclusive o dono do imóvel atingido.
Também na figura culposa exige-se que o desabamento tenha colocado em situação de risco
concreto número indeterminado de pessoas. A conduta de provocar desabamento de construção ou, por
erro no projeto ou na execução, dar-lhe causa, sem, todavia, gerar perigo comum, constitui a
contravenção penal do art. 29 da LCP. Nesse sentido: “Havendo erro na execução de projeto de
demolição de edifício, ocorrendo desabamento sem danos pessoais, caracteriza-se a contravenção do
art. 29, e não o delito de desabamento ou desmoronamento culposo” (STF – RT 612/419).
2. Elemento do tipo: A figura penal contém as seguintes condutas: a) subtrair (apoderar-se, tira o
bem do local), b) ocultar (esconder) ou c) inutilizar (destrói ou torna inservível ao fim a que se
destina), por ocasião de incêndio, inundação, naufrágio, ou outro desastre ou calamidade, aparelho,
material ou qualquer meio destinado a serviço de combate ao perigo, de socorro ou salvamento.
Ex.: extintor de incêndio, escada, mala de primeiros socorros, bote salva-vidas, ambulância etc; ou d)
impedir (obstar, frustrar), e) dificultar (criar embaraços) serviço de tal natureza, isto é, combate ao
fogo, socorro ou salvamento. A conduta pode se dar por ação ou por omissão, por exemplo, deixar
de retirar um veículo que impede a chegada do socorro.
3. Sujeito ativo: Trata-se de crime comum. Qualquer pessoa pode praticá-lo, inclusive o proprietário
do aparelho.
68
4. Sujeito passivo: É a coletividade em geral.
Essas hipóteses são exclusivamente preterdolosas, ou seja, há dolo na conduta inicial (crime
de perigo comum) e culpa no resultado agravador (lesão corporal grave ou morte). Dessa forma,
como já mencionado anteriormente, existindo dolo em relação à morte, o agente responde apenas por
homicídio doloso, que é crime mais grave, e, se há dolo de causar as lesões, haverá crime de lesões
corporais em concurso com o crime simples de perigo comum.
69
Importante: A modalidade culposa ainda se encontra em vigor por não haver figura semelhante
na lei ambiental. Pressupõe que, por falta de cuidado, o agente dê causa à difusão de doenças ou
pragas potencialmente perigosas a florestas, plantações ou animais de utilidade doméstica.
CAPÍTULO II
DOS CRIMES CONTRA A SEGURANÇA DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO E
TRANSPORTE E OUTROS SERVIÇOS PÚBLICOS
70
3. Sujeito ativo: Qualquer pessoa pode praticá-lo. Trata-se de crime comum.
4. Sujeito passivo: É a coletividade em geral.
5. Elemento subjetivo: É o dolo. Trata-se de crime de perigo e não de dano, pois o agente não quer
causar o desastre, mas apenas criar a situação de perigo.
6. Consumação e tentativa: Consuma-se no momento em que o agente cria a situação de perigo de
desastre. A tentativa é possível.
7. Concurso de crimes:
a) Se há o fim político, o art. 15 da Lei de Segurança Nacional (Lei nº 7.170/83), pune a prática de
sabotagem contra meios e vias de transporte.
b) Caso o agente se utilize de espécies da fauna silvestre para impedir ou perturbar o serviço de estrada
de ferro, responderá o agente também pelo crime contra a Fauna do art. 29 da Lei dos Crimes
Ambientais (Lei nº 9.605/98).
8. Classificação doutrinária: O perigo de desastre ferroviário é crime comum (pode ser cometido por
qualquer pessoa); formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado (consuma-se com a
prática de qualquer das condutas legalmente descritas, independentemente da superveniência do
desastre); de perigo comum e concreto (exige a comprovação da situação perigosa a pessoas
indeterminadas); de forma vinculada (somente admite os meios de execução expressamente indicados
em lei); vago (tem como sujeito passivo um ente destituído de personalidade jurídica, qual seja, a
coletividade); instantâneo (consuma-se em um momento determinado, sem continuidade no tempo);
em regra comissivo; unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual (pode ser praticado por uma
só pessoa, mas admite o concurso); e normalmente plurissubsistente (a conduta criminosa pode ser
fracionada em diversos atos).
1. Objeto jurídico: Tutela-se a incolumidade pública, visando manter a segurança nos meios de
transportes descritos.
2. Elementos do tipo: O tipo penal compõe-se de duas modalidades de conduta:
a) Expor a perigo embarcação (navio, lancha, barco ou qualquer outra construção destinada à
navegação, que vise o transporte coletivo) ou aeronave (avião, helicóptero, balão etc., que também
vise o transporte coletivo), própria ou alheia. Trata-se de crime de ação livre, uma vez que pode ser
praticado por diversos modos, ou,
71
b) praticar qualquer ato tendente a impedir (obstruir, atravancar) ou dificultar (tornar mais difícil)
navegação marítima, fluvial (que diz respeito aos rios) ou aérea.
Ex.: o responsável por rádio pirata que, ciente do risco, atrapalha com a transmissão a conversa entre o
piloto e a torre de comando, caneta de laser que atrapalha a visão do piloto, danos que tornem precárias
as condições de navegabilidade, subtração de peças necessárias ao governo do veículo, abalroamento
ou colisão, remoção de sinais de tráfego, colocação de falsos faróis, etc..
Obs.: Itens prejudiciais à navegação aérea: o Regulamento Brasileiro de Homologação Aeronáutica
(RBHA) n. 121, aprovado pela Portaria 483/DGAC, de 20 de março de 2003, publicado no DOU 76,
de 22 de abril de 2003, constitui complemento a este tipo penal, estipulando os critérios e os aparelhos
permitidos e proibidos na navegação aérea. São liberados em todas as fases do voo: máquinas
fotográficas, flashes, câmaras filmadoras, gravadores de som, aparelhos de marca-passo, relógios
eletrônicos, aparelhos auditivos, equipamentos médico-eletrônicos indispensáveis. São aparelhos
proibidos durante o voo de cruzeiro: telefones celulares, controles remotos, toca-discos CD, scanners
de computador, rádio-transmissores, jogos eletrônicos, microfones sem fio, aparelhos GPS, SABNAV,
GNPS e similares. São liberados: computadores (notebook, laptop etc.), agendas eletrônicas, toca-fita
cassete, rádio-receptor, calculadoras, barbeadores elétricos e eletrônicos, equipamentos eletrônicos de
até 3 volts. São proibidos todos os aparelhos durante o pouso e a decolagem. O objetivo é proteger a
aeronave e seus instrumentos de navegação das interferências eletromagnéticas. (NUCCI, 2014, p.
1153).
É o que ocorre, por exemplo, quando o sujeito dá causa ao evento pela falta de manutenção no
equipamento, provocando o sinistro.
9. Distinção:
a) Caso a destruição da embarcação ou aeronave ocorra por meio de incêndio ou explosão, o crime
passará a ser o do art. 250, § 1º, II, “c”, ou art. 251, § 2º.
b) Caso haja motivação política, o crime poderá ser o previsto no art. 15 da Lei de Segurança
Nacional (Lei nº 7.170/83).
c) Para Fernando Capez caso o agente se entregue, na prática de aviação, a acrobacias ou a vôos
baixos, fora da zona em que a lei o permite, ou faça descer aeronave fora dos lugares destinados a esse
fim, haverá a contravenção penal de abuso na prática da aviação, prevista no art. 35 da Lei das
Contravenções Penais: “Art. 35. Entregar-se na prática da aviação, a acrobacias ou a vôos baixos, fora da zona em
que a lei o permite, ou fazer descer a aeronave fora dos lugares destinados a esse fim: Pena – prisão simples, de quinze
72
dias a três meses, ou multa, de quinhentos mil réis a cinco contos de réis ”. Para Victor Eduardo Rios Gonçalves o
agente responde pelo crime em tela do art. 261 CP.
10. Classificação doutrinária: O atentado contra a segurança de outro meio de transporte é crime
comum (pode ser cometido por qualquer pessoa); formal, de consumação antecipada ou de
resultado cortado (consuma-se com a prática de qualquer das condutas legalmente descritas,
independentemente da superveniência do sinistro); de perigo comum e concreto (exige a
comprovação da situação perigosa a pessoas indeterminadas); de forma livre (admite qualquer meio
de execução); vago (tem como sujeito passivo um ente destituído de personalidade jurídica, qual seja,
a coletividade); instantâneo (consuma-se em um momento determinado, sem continuidade no tempo);
unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual (pode ser cometido por uma só pessoa, mas
admite o concurso); em regra comissivo; e normalmente plurissubsistente (a conduta criminosa pode
ser fracionada em diversos atos).
7. Distinção:
a) Poderá configurar-se o crime previsto no art. 15 da Lei de Segurança Nacional (Lei nº 7.170/83) se
o crime tiver motivação política;
b) O ato de impedir ou dificultar o funcionamento de instalação nuclear ou o transporte de material
nuclear configurará o crime previsto no art. 27 da Lei nº 6.358/78, que dispõe sobre a
responsabilidade civil por danos nucleares e a responsabilidade criminal por atos relacionados
com atividades nucleares.
73
8. Classificação doutrinária: O atentado contra a segurança de outro meio de transporte é crime
comum (pode ser cometido por qualquer pessoa); formal, de consumação antecipada ou de
resultado cortado (consuma-se com a prática da conduta criminosa, independentemente da
superveniência do desastre); de perigo comum e concreto (exige a comprovação da situação perigosa
a pessoas indeterminadas); de forma livre (admite qualquer meio de execução); vago (tem como
sujeito passivo um ente destituído de personalidade jurídica, qual seja, a coletividade); instantâneo
(consuma-se em um momento determinado, sem continuidade no tempo); unissubjetivo, unilateral
ou de concurso eventual (pode ser cometido por uma só pessoa, mas admite o concurso); em regra
comissivo; e normalmente plurissubsistente (a conduta criminosa pode ser fracionada em diversos
atos).
4. FORMA QUALIFICADA
Art. 263 - Se de qualquer dos crimes previstos nos arts. 260 a 262, no caso de desastre ou sinistro, resulta lesão
corporal ou morte, aplica-se o disposto no art. 258.
Ver comentários ao crime de incêndio.
5. ARREMESSO DE PROJETIL
Art. 264 -Arremessar projétil contra veículo, em movimento, destinado ao transporte público por terra, por
água ou pelo ar:
Pena - detenção, de um a seis meses.
Parágrafo único - Se do fato resulta lesão corporal, a pena é de detenção, de seis meses a dois anos; se resulta
morte, a pena é a do art. 121, § 3º aumentada de um terço.
1. Objeto jurídico: Nesse dispositivo a lei protege a incolumidade pública, no que se refere à
segurança nos meios de transporte coletivos.
2. Conduta típica: Consiste em arremessar, que significa atirar, jogar um projétil. Este é um objeto
sólido capaz de ferir ou causar dano em coisas ou pessoas. Não são, portanto, só os projéteis de
armas de fogo, compreendendo, também, pedras, pedaços de pau etc. Não estão abrangidos pelo
conceito, entretanto, os corpos líquidos e gasosos. Além disso, o disparo de arma de fogo, atualmente,
configura crime mais grave previsto no art. 15 da Lei nº 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento).
Para que exista crime é necessário que o projétil seja lançado contra veículo em
movimento por terra, mar ou ar. Exige-se também que o veículo seja destinado a transporte
coletivo (ônibus, navios, aviões etc.). Assim, o arremesso de projétil contra veículo de uso
particular ou de transporte público que esteja parado pode caracterizar apenas outro crime
(lesões corporais, dano etc.).
Para Nucci (2014, p. 1156), que tal expressão não pode ter seu significado restringido, pois o
veículo parado num congestionamento está em movimentação, levando pessoas de um local a outro,
embora, momentaneamente, não esteja em marcha. Assim, somente não se configura o tipo penal do
art. 264 quando o veículo estiver estacionado.
3. Consumação: O crime se consuma com o arremesso, ainda que não atinja o alvo. Trata-se de
crime de perigo abstrato, cuja configuração independe da efetiva demonstração da situação de risco.
O perigo, portanto, é presumido.
4. Tentativa: É possível quando o agente movimenta o braço para lançar o projétil e é detido por
alguém.
Nos termos do parágrafo único, se do fato resulta lesão, ainda que leve, a pena é aumentada
para seis meses a dois anos de detenção e, se resulta morte, a pena é a do homicídio culposo,
aumentada de um terço. Essas qualificadoras são exclusivamente preterdolosas, pois, se o agente
quer provocar a morte, responde por crime de homicídio doloso, que absorve o delito de arremesso de
projétil.
74
5. Ação penal: É pública incondicionada.
6. Classificação doutrinária: O crime é comum (pode ser cometido por qualquer pessoa); formal, de
consumação antecipada ou de resultado cortado (independe da produção do resultado naturalístico,
qual seja, a efetiva existência de dano ou perigo concreto a terceiros); doloso; de forma livre (admite
qualquer meio de execução); em regra plurissubsistente (a conduta pode ser fracionada em diversos
atos); unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual (pode ser cometido por uma só pessoa, mas
admite o concurso); instantâneo (a consumação se verifica em um momento determinado, sem
continuidade no tempo); e de perigo comum e abstrato (não se exige a efetiva comprovação da
ocorrência da situação de perigo a pessoas indeterminadas).
2. Conduta típica: Consiste em atentar (colocar em risco, torná-lo inseguro, perigoso) contra a
segurança ou o funcionamento dos serviços públicos (serviços de água, luz, força ou calor, gás,
limpeza). O agente, com sua conduta, coloca em risco a prestação do serviço público. Ex.: deixar
desencapadas fios de alta tensão em postes públicos, danificar reservatório de água ou postes de luz,
cortar os cabos elétricos fazendo faltar luz em uma região. Se o agente empregar fogo ou explosivo, o
crime será os arts. 250 ou 251 do CPB.
3. Sujeito ativo e passivo: Trata-se de crime comum, qualquer pessoa pode praticá-lo. Sujeito passivo
é a coletividade em geral.
4. Consumação e tentativa: Trata-se de crime de perigo abstrato, isto é presumido. Consuma-se
com o atentado contra a segurança ou o funcionamento do serviço público. Não é necessário que haja
a efetiva paralisação do serviço. Em tese, a tentativa é possível.
5. Formas:
a) Simples: Prevista no caput do artigo.
b) Causa de aumento de pena: Está prevista no parágrafo único: “Parágrafo único - Aumentar-se-á a
pena de 1/3 (um terço) até a metade, se o dano ocorrer em virtude de subtração de material essencial ao
funcionamento dos serviços”.Cuida-se aqui do furto de peças, fios elétricos, maquinários etc.,
essenciais ao funcionamento do serviço.
6. Distinção:
a) Poderá configurar-se o crime previsto no art. 15 da Lei de Segurança Nacional (Lei nº 7.170/83) se
o crime tiver motivação política;
b) O ato de impedir ou dificultar o funcionamento de instalação nuclear ou o transporte de material
nuclear configurará o crime previsto no art. 27 da Lei nº 6.358/78, que dispõe sobre a
responsabilidade civil por danos nucleares e a responsabilidade criminal por atos relacionados com
atividades nucleares.
75
passivo um ente destituído de personalidade jurídica, qual seja, a coletividade); instantâneo (consuma-
se em um momento determinado, sem continuidade no tempo); em regra comissivo; unissubjetivo,
unilateral ou de concurso eventual (pode ser praticado por uma só pessoa, mas admite o concurso); e
normalmente plurissubsistente (a conduta criminosa pode ser fracionada em diversos atos).
§ 1o Incorre na mesma pena quem interrompe serviço telemático ou de informação de utilidade pública, ou
impede ou dificulta-lhe o restabelecimento. (Incluído pela Lei nº 12.737, de 2012)
§ 2o Aplicam-se as penas em dobro se o crime é cometido por ocasião de calamidade pública. (Incluído pela
Lei nº 12.737, de 2012)
2. Conduta típica: Consubstancia-se nos verbos: a) interromper (paralisar, fazer cessar o serviço) ou
perturbar (desorganizar, atrapalhar) serviço telegráfico, radioelétrico ou telefônico; ou b) impedir
(não permitir) ou dificultar-lhe (tornar difícil, colocar obstáculo) o restabelecimento. O rol é taxativo,
de forma que não podem ser abrangidos outros serviços que não os expressamente elencados no tipo
penal. Não se admite, portanto, a analogia.
É imprescindível que a prática das ações típicas (interromper, perturbar, impedir, dificultar)
possa vir a causar perigo a todo o sistema de telecomunicação, pois se trata de crime de perigo comum.
Caso haja o impedimento de comunicação ou conversação entre duas pessoas, o crime será do
art. 151, § 1º, III do CPB (violação de comunicação telefônica).
3. Sujeito ativo e passivo: Trata-se de crime comum, qualquer pessoa pode praticá-lo. Sujeito passivo
é a coletividade em geral, a sociedade.
76
É que a interrupção ou perturbação do serviço provocada pelo agente por ocasião do incêndio,
inundação, deslizamentos ou outra catástrofe acarreta maior perigo para a coletividade, já que nestas situações,
os serviços mencionados são essenciais.
6. Classificação doutrinária: A interrupção ou perturbação de serviço telegráfico ou telefônico é
crime comum (pode ser cometido por qualquer pessoa); formal, de consumação antecipada ou de
resultado cortado (consuma-se com a prática da conduta legalmente descrita, independentemente da
superveniência do resultado naturalístico); de perigo comum e abstrato (a lei presume o perigo a
pessoas indeterminadas); de forma livre (admite qualquer meio de execução); vago (tem como sujeito
passivo um ente destituído de personalidade jurídica, qual seja, a coletividade); instantâneo (consuma-
se em um momento determinado, sem continuidade no tempo); em regra comissivo; unissubjetivo,
unilateral ou de concurso eventual (pode ser praticado por uma só pessoa, mas admite o concurso); e
normalmente plurissubsistente (a conduta criminosa pode ser fracionada em diversos atos).
Obs.: Rádio pirata (Lei nº 9472/97, Art. 183: “Desenvolver clandestinamente atividades de
telecomunicação: Pena - detenção de dois a quatro anos, aumentada da metade se houver dano a
terceiro, e multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem,
direta ou indiretamente, concorrer para o crime”).
CAPÍTULO III
DOS CRIMES CONTRA A SAÚDE PÚBLICA
1. EPIDEMIA
Art. 267 - Causar epidemia, mediante a propagação de germes patogênicos:
Pena - reclusão, de dez a quinze anos.
§ 1º - Se do fato resulta morte, a pena é aplicada em dobro.
§ 2º - No caso de culpa, a pena é de detenção, de um a dois anos, ou, se resulta morte, de dois a quatro anos.
2. Conduta típica: Propagar germes patogênicos, que implica difundir, espalhar vírus, bactérias,
bacilos ou protozoários, capazes de produzir moléstias infecciosas, doenças. Ex.: meningite,
difteria, sarampo, gripe, febre amarela etc. O crime é de ação livre, pode ser praticado por qualquer
meio, contaminação do ar, da água, transmissão direta etc.
É necessário, também, que a conduta provoque epidemia, ou seja, surto de uma doença que
atinja grande número de pessoas em determinado local ou região.
3. Sujeito ativo: Pode ser qualquer pessoa, não apenas os que já estejam contaminados.
5. Consumação: O crime se consuma quando se verifica a epidemia, vale dizer, com a ocorrência de
inúmeros casos da doença. Trata-se de crime de perigo concreto embora haja entendimento que é de
perigo abstrato (NUCCI, 2014, p. 1611-1162).
7. Tentativa: É possível na hipótese de o agente propagar os germes patogênicos, mas não provocar a
epidemia que visava. Haverá tentativa se a autoridade sanitária tiver conhecimento de que alguém está
infectado e tomar prontamente medidas para debelar a doença, impedindo sua transmissão para outras
pessoas. (CAPEZ, 2015, p. 258)
77
8. Causa de aumento de pena:
§ 1º: A pena é aplicada em dobro se resulta morte. Quanto ao resultado agravador, é possível que se
tenha verificado dolosa ou culposamente, tendo em vista o quantum final da pena (que fica entre 20 e
30 anos). Para que se verifique a qualificadora, basta a ocorrência de uma única morte.
Obs.: O crime de epidemia qualificada pela morte é considerado crime hediondo pelo art. 1º,
VII, da Lei nº 8.072/90.
8. Modalidade culposa:
§ 2º: Se a provocação da epidemia for culposa, aplica-se a pena de detenção de um a dois anos e, se
dela resulta morte, de dois a quatro anos.
b) Lei dos Juizados Especiais Criminais: em face da pena máxima prevista (detenção, de 1 a 2 anos),
a modalidade culposa (§ 2º, 1º parte) constitui infração de menor potencial ofensivo, estando sujeita às
disposições da Lei n. 9.099/95, sendo, inclusive, cabível a suspensão condicional do processo (art. 89
da lei), em face da pena mínima prevista.
10. Classificação doutrinária: A epidemia é crime comum (pode ser cometido por qualquer pessoa);
material ou causal (consuma-se com a produção do resultado naturalístico, ou seja, com a provocação
da epidemia); de perigo comum e concreto (depende da comprovação da situação de perigo a pessoas
indeterminadas); de forma livre (admite qualquer meio de execução); vago (tem como sujeito passivo
um ente destituído de personalidade jurídica, qual seja, a coletividade); instantâneo (consuma-se em
um momento determinado, sem continuidade no tempo); em regra comissivo; unissubjetivo,
unilateral ou de concurso eventual (pode ser praticado por uma só pessoa, mas admite o concurso); e
normalmente plurissubsistente (a conduta criminosa pode ser fracionada em diversos atos).
Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço, se o agente é funcionário da saúde pública ou exerce a
profissão de médico, farmacêutico, dentista ou enfermeiro.
3. Sujeito ativo: Sujeito ativo trata-se de crime comum, qualquer pessoa pode praticá-lo.
78
4. Sujeito passivo é a coletividade, bem como as pessoas que vierem a ser atingidas pela doença
contagiosa.
6. Formas:
a) Simples: Prevista no caput do artigo.
b) Causa de aumento de pena: Está prevista no parágrafo único: “Parágrafo único - A pena é
aumentada de um terço, se o agente é funcionário da saúde pública ou exerce a profissão de médico,
farmacêutico, dentista ou enfermeiro”. Essa majorante tem em vista a infração de dever especial decorrente
do exercício de cargo ou profissão.
c) Qualificada pelo resultado: Prevista no art. 285: “Aplica-se o disposto no art. 258 aos crimes
previstos nesta Capítulo, salvo quanto ao definido no art. 267”.
7. AÇÃO PENAL. LEI DOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS a) Ação penal: é crime de
ação penal pública incondicionada; independe, portanto, de representação do ofendido ou de seu
representante legal. b) Lei dos Juizados Especiais Criminais: a forma simples do crime (caput),
ainda que incida a causa de aumento de pena (parágrafo único), constitui infração de menor potencial
ofensivo, estando sujeita às disposições da Lei n. 9.099/95, sendo, inclusive, cabível a suspensão
condicional do processo (art. 89 da lei), em face da pena mínima prevista.
8. Classificação doutrinária: A infração de medida sanitária preventiva é crime comum (pode ser
cometido por qualquer pessoa); formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado
(consuma-se com a prática da conduta criminosa, prescindindo-se da superveniência do resultado
naturalístico); de perigo comum e abstrato (a lei presume a situação de perigo à saúde pública); de
forma livre (admite qualquer meio de execução); vago (tem como sujeito passivo um ente destituído
de personalidade jurídica, qual seja, a coletividade); instantâneo (consuma-se em um momento
determinado, sem continuidade no tempo); em regra comissivo; unissubjetivo, unilateral ou de
concurso eventual (pode ser praticado por uma só pessoa, mas admite o concurso); e normalmente
plurissubsistente (a conduta criminosa pode ser fracionada em diversos atos).
O dispositivo em tela constitui norma penal em branco, pois incumbe à lei ou ato
administrativo complementá-la, cuja existência pressupõe que o médico desrespeite a obrigação de
comunicar doença cuja notificação é compulsória, como cólera, febre amarela, varíola, difteria etc.,
obrigação essa decorrente de lei, decreto ou regulamento administrativo. Assim, por exemplo,
podemos encontrar a Lei nº 6.259/75 que trata da questão da notificação compulsória de doenças, a
qual é complementada pela Portaria nº 1.100/96 do Ministério de Estado da Saúde que estabelece um
elenco de doenças que são de notificação compulsória.
A propósito, o art. 7.º da Lei 6.259/1975, regulamentado pela Portaria 1.100/1996, expedida
pelo Ministério da Saúde, elenca diversas doenças de notificação compulsória, seja em todo o território
nacional (exemplos: cólera, dengue, difteria, hanseníase, rubéola, tuberculose, hepatite etc.), seja em
áreas específicas (exemplos: esquistossomose, filariose e malária).
A expressão “autoridade pública” relaciona-se com as autoridades sanitárias, a exemplo do
Ministério da Saúde, no âmbito da União, e da Vigilância Sanitária, no campo dos municípios.
O médico que denuncia tais doenças à autoridade pública não comete o crime previsto no art.
154 (violação de segredo profissional), uma vez que age com justa causa, pois há o dever de
79
notificação imposto pela lei, o que exclui a tipicidade penal.
2. Sujeito ativo: Trata-se de crime próprio, que somente pode ser praticado por médico.
3. Sujeito passivo: A coletividade, que pode ser prejudicada pela não-comunicação da doença, de
forma a dificultar ou retardar o combate à sua difusão.
5. Formas:
a) Simples: Prevista no caput do artigo.
b) Qualificada pelo resultado: Prevista no art. 285: “Aplica-se o disposto no art. 258 aos crimes
previstos nesta Capítulo, salvo quanto ao definido no art. 267”.
6. AÇÃO PENAL. LEI DOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS a) Ação penal: é crime de
ação penal pública incondicionada, que portanto independe de representação do ofendido ou de seu
representante legal. b) Lei dos Juizados Especiais Criminais: em face da pena máxima prevista
(detenção, de 6 meses a 2 anos, e multa), a modalidade simples (caput) constitui infração de menor
potencial ofensivo, sujeita às disposições da Lei n. 9.099/95. É cabível a suspensão condicional do
processo (art. 89 da lei), em virtude da pena mínima prevista.
7. Classificação doutrinária: A omissão de notificação de doença é crime próprio (somente pode ser
cometido pelo médico); de mera conduta ou de simples atividade (consuma-se com a prática da
conduta criminosa, e o tipo não prevê resultado naturalístico); de perigo comum e abstrato (a lei
presume a situação de perigo à saúde pública); de forma vinculada (somente pode ser executado pela
forma descrita na lei penal); vago (tem como sujeito passivo um ente destituído de personalidade
jurídica, qual seja, a coletividade); instantâneo (consuma-se em um momento determinado, sem
continuidade no tempo); omissivo próprio ou puro (o tipo penal descreve uma conduta omissiva);
unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual (pode ser praticado por uma só pessoa, mas
admite o concurso); e unissubsistente (a conduta criminosa é composta de um único ato).
§ 1º - Está sujeito à mesma pena quem entrega a consumo ou tem em depósito, para o fim de ser distribuída, a
água ou a substância envenenada.
Modalidade culposa
§ 2º - Se o crime é culposo:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos.
2. Conduta típica: Colocar, misturar veneno em água potável, de uso comum ou particular, ou
substância alimentícia ou medicinal destinada a consumo.
Três são os objetos materiais desse crime: a) água potável, de uso comum ou particular.
Conceitua-se como aquela usada para a alimentação. Se imprópria para esse fim (por exemplo: água
contaminada por substâncias químicas), não pode ser considerada potável. Por se tratar de crime de
perigo comum, deve o envenenamento ocorrer em água, ainda que particular, destinada ao uso de
pessoas indeterminadas, pois, se determinadas, o crime poderá ser outro: homicídio tentado ou
consumado; b) substância alimentícia destinada a consumo. Constitui-se como a substância sólida
ou líquida também destinada ao consumo de um número indeterminado de pessoas, por exemplo, aves,
peixes, pães, cereais, farinha, refrigerante, vinhos etc.; c) substância medicinal destinada a consumo.
É também a substância sólida ou líquida destinada à prevenção, melhora ou cura de doenças, por
exemplo, comprimidos, xaropes, ervas medicinais etc.
3. Sujeitos ativo e passivo: Sujeito ativo é qualquer pessoa. Sujeito passivo é a coletividade.
5. Formas
5.1 Figuras equiparadas: O § 1º prevê duas figuras equiparadas, para as quais aplica-se a mesma
pena do caput, incriminando quem:
a) Entrega a consumo a água ou substância envenenada por outrem: É evidente que por se tratar
de figura equiparada, a punição se dá a título de dolo.
b) Tem em depósito, para o fim de ser distribuída, a água ou substância envenenada por outrem:
Essa figura consuma-se com o ato de ter a água ou substância em depósito, ainda que o agente não
consiga atingir sua finalidade de distribuí-la. Trata-se, portanto, de crime formal. O crime é também
permanente, sendo possível a prisão em flagrante enquanto a água ou substância estiver em depósito.
5.3 Qualificada pelo resultado: A modalidade culposa aplica-se tanto à figura do envenenamento
descrita no caput como às formas equiparadas do § 1º. Para a forma culposa existem também
qualificadoras no art. 285 do Código Penal.
3. Sujeito ativo: Trata-se de crime comum, pode ser praticado por qualquer pessoa.
7. Formas:
a) Simples: Prevista no caput do artigo.
b) Culposa: Prevista no parágrafo único: “Parágrafo único - Se o crime é culposo: Pena - detenção, de dois
meses a um ano”.
c) Qualificada pelo resultado: Prevista no art. 285: “Aplica-se o disposto no art. 258 aos crimes
previstos neste Capítulo, salvo quanto ao definido no art. 267”.
8. Distinção:
Caso a poluição hídrica torne necessária a interrupção do abastecimento público de água de
uma comunidade, o crime será o previsto no art. 54 da Lei dos Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/98):
“Art. 54: Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em
danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da
flora: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa”.
9. Classificação doutrinária: A corrupção ou poluição de água potável é crime comum (pode ser
cometido por qualquer pessoa); formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado
(consuma-se com a prática da conduta criminosa, prescindindo-se da superveniência do resultado
naturalístico); de perigo comum e abstrato (a lei presume a situação de perigo à saúde pública); de
forma livre (admite qualquer meio de execução); vago (tem como sujeito passivo um ente destituído
82
de personalidade jurídica, qual seja, a coletividade); instantâneo (consuma-se em um momento
determinado, sem continuidade no tempo); em regra comissivo; unissubjetivo, unilateral ou de
concurso eventual (pode ser praticado por uma só pessoa, mas admite o concurso); e normalmente
plurissubsistente (a conduta criminosa pode ser fracionada em diversos atos).
Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 9.677, de 2.7.1998)
§ 1º-A - Incorre nas penas deste artigo quem fabrica, vende, expõe à venda, importa, tem em depósito para
vender ou, de qualquer forma, distribui ou entrega a consumo a substância alimentícia ou o produto falsificado,
corrompido ou adulterado. (Incluído pela Lei nº 9.677, de 2.7.1998)
§ 1º - Está sujeito às mesmas penas quem pratica as ações previstas neste artigo em relação a bebidas, com ou
sem teor alcoólico. (Redação dada pela Lei nº 9.677, de 2.7.1998)
Modalidade culposa
§ 2º - Se o crime é culposo: (Redação dada pela Lei nº 9.677, de 2.7.1998)
Pena - detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 9.677, de 2.7.1998)
2. Condutas típicas. O dispositivo, com a redação dada pela Lei nº 9.677/98, pune as seguintes
condutas:
a) corromper: sinônimo de estragar, tornar podre, desnaturar. Ex.: Segundo Nelson Hungria preparar
queijo com leite mungido de animais doentes;
b) falsificar: empregar substâncias diferentes das que entram na composição de um alimento, ou seja,
o agente, no momento em que fabrica, produz o alimento, utiliza substância diversa da que devia. Ex.:
adiciona corante a um vinho para que suponha de melhor qualidade;
c) adulterar ou alterar: modificar para pior a substância alimentícia anteriormente fabricada ou
produzida. Ex.: adicionar alúmen à farinha.
Para a existência do crime a lei exige que, com a conduta, o alimento ou substância
alimentícia tornem-se nocivos à saúde ou tenham seu valor nutritivo diminuído. No primeiro
caso, é necessária a demonstração de que, com a ingestão do alimento, haverá conseqüências
maléficas para a saúde do consumidor (uso de água poluída ou de leite estragado na produção de
alimento etc.). Na segunda hipótese, deve-se demonstrar que a conduta do agente reduziu a perfeição
calórica, protéica etc. (adição de água pura em leite, adição de carne de segunda em salsichas ou
lingüiças).
Trata-se de crime de perigo concreto, que exige prova de que o produto se tornou nocivo à
saúde ou da redução de seu valor nutritivo.
4. Consumação: No exato instante em que o agente corrompe, adultera, falsifica ou altera a coisa. Por
se tratar de crime de perigo, não se exige o efetivo malefício às vítimas. Se da ação resultar lesão
grave ou morte, o crime será considerado qualificado, aplicando-se as regras contidas no art. 258
(remissão feita pelo art. 285).
5. Tentativa: Apesar de difícil a constatação, é admissível, já que o iter criminis pode ser cindido.
83
6. Figuras equiparadas:
a) Nos termos do § 1º- A, "incorre nas penas deste artigo quem fabrica, vende, expõe à venda,
importa, tem em depósito para vender ou, de qualquer forma, distribui ou entrega a consumo a
substância alimentícia ou o produto falsificado, corrompido ou adulterado".
b) O § 1º, por sua vez, esclarece que "está sujeito às mesmas penas quem pratica as ações previstas
neste artigo em relação a bebidas, com ou sem teor alcoólico" (cerveja, uísque, guaranás, sucos etc.).
7. Substância destinada à falsificação: O art. 277 do Código Penal pune quem vende, expõe à venda,
tem em depósito ou cede substância destinada à falsificação de produtos alimentícios (bromato de
potássio). A pena é de reclusão, de um a cinco anos, e multa.
Pune o agente que por imprudência, negligência ou imperícia dá causa à adulteração, corrupção etc.
Art. 273 - Falsificar, corromper, adulterar ou alterar produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais:
Pena - reclusão, de dez a quinze anos, e multa.
3. Condutas típicas: São as mesmas do delito anterior, que, entretanto, devem recair sobre produto
destinado a fim terapêutico ou medicinal (objeto material). Abrange os medicamentos destinados à
cura, melhora, controle ou prevenção de doenças de número indeterminado de pessoas ou a serem
utilizados em tratamentos médicos (moderadores de apetite, anabolizantes, anestésicos, analgésicos
etc.). Abrange os medicamentos alopáticos e homeopáticos.
Incluem-se entre os produtos a que se refere este artigo os medicamentos, as matérias-primas,
os insumos farmacêuticos, os cosméticos, os saneantes e os de uso em diagnóstico (§ 1º-A):
§ 1º-A - Incluem-se entre os produtos a que se refere este artigo os medicamentos, as matérias-primas, os
insumos farmacêuticos, os cosméticos, os saneantes e os de uso em diagnóstico. (Incluído pela Lei nº 9.677, de
2.7.1998)
Como a antiga redação exigia que a conduta tornasse o produto nocivo à saúde, requisito não
repetido na atual legislação, pode-se concluir que o delito atualmente é de perigo presumido. É
evidente, entretanto, que essa faceta é questionada pela doutrina em face do princípio da lesividade
quando se trata, por exemplo, de mera falsificação de frasco de vitamina C ou aspirina.
4. Tentativa: É admissível.
5. Figuras equiparadas: A lei pune com as mesmas penas quem importa, vende, expõe à venda, tem
em depósito para vender ou, de qualquer forma, distribui ou entrega a consumo produto falsificado,
corrompido, adulterado ou alterado, bem como pratica tais ações previstas em relação a produtos em
qualquer das seguintes condições (§ 1º-B):
§ 1º-B - Está sujeito às penas deste artigo quem pratica as ações previstas no § 1º em relação a produtos em
qualquer das seguintes condições: (Incluído pela Lei nº 9.677, de 2.7.1998)
6. Substância destinada à falsificação: O art. 277 do Código Penal pune quem vende, expõe à venda,
tem em depósito ou cede substância destinada à falsificação de produtos alimentícios, terapêuticos ou
medicinais. A pena é de reclusão, de um a cinco anos, e multa.
85
7. Classificação doutrinária: A falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado
a fins terapêuticos ou medicinais é crime comum (pode ser cometido por qualquer pessoa); formal, de
consumação antecipada ou de resultado cortado (consuma-se com a prática da conduta criminosa,
prescindindo-se da superveniência do resultado naturalístico); de perigo comum e abstrato (a lei
presume o risco à saúde de um número indeterminado de pessoas); de forma livre (admite qualquer
meio de execução); vago (tem como sujeito passivo um ente destituído de personalidade jurídica, qual
seja, a coletividade); instantâneo (consuma-se em um momento determinado, sem continuidade no
tempo); em regra comissivo; unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual (pode ser praticado
por uma só pessoa, mas admite o concurso); e normalmente plurissubsistente (a conduta criminosa
pode ser fracionada em diversos atos).
6. Crime hediondo: a Lei 9.677/98 alterou substancialmente as penas deste delito, passando as de um
a três anos, e multa, para dez a quinze anos, mantendo-se a multa. Houve, ainda, a criação de novas
condutas típicas, tanto no caput quanto nos parágrafos. Em seguida, a Lei 9.695/98 classificou este
delito como hediondo, ao incluí-lo no rol do art. 1.º da Lei 8.072/90.
7. Pena desproporcional: noticiou-se uma onda de eventos, trazendo à tona alguns problemas
relativos à falsificação e adulteração de remédios, em particular, no contexto das pílulas
anticoncepcionais. Por conta disso, em função da explosiva carga da mídia, o Legislativo, mais uma
vez, editou lei penal, alterando o tipo penal do art. 273, bem como sua faixa de penas. Para um delito
de perigo abstrato, criou-se a impressionante cominação de 10 a 15 anos de reclusão, algo equivalente
a um homicídio qualificado. Há condutas tipificáveis nesse artigo, que são nitidamente pobres em
ofensividade, razão pela qual jamais poderiam atingir tais reprimendas. O outro oposto seria considerar
bagatela a falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de remédios e similares, bem como outras
condutas previstas nos §§ do art. 273. Exagero, por certo. Há relevância jurídica em punir tais atitudes,
mas o ponto fulcral é a absurda penalidade inventada pelo legislador, sem qualquer critério. Diante
disso, em homenagem ao princípio da proporcionalidade, muitos julgados têm optado por soluções
alternativas: alguns absolvem, alegando falta de provas (quando elas, na verdade, estão presentes);
outros preferem usar a analogia in bonam partem, aplicando a pena do tráfico de drogas – o que me
parece a mais sensata; terceiros, ainda, simplesmente, ignoram a pena e punem tal como prevê a lei. O
choque de ideias é evidente, nascendo da confusa atividade legislativa, que, há tempos, domina o
cenário brasileiro. Como mencionado, optamos pelo meio termo: entre a abusiva pena do art. 273 e a
absolvição, por qualquer causa, quando presentes as provas suficientes, o ideal é o uso da analogia,
com aplicação da pena do tráfico de drogas (art. 33, Lei 11.343/06). Conferir: TRF-4.ª Reg.: “Quem
introduz clandestinamente em solo nacional produto de origem estrangeira destinado a fins
terapêuticos ou medicinais, sem registro, de procedência ignorada e adquirido de estabelecimento sem
licença do Órgão de Vigilância Sanitária competente, pratica o delito capitulado no art. 273, § 1.º-B,
incisos I, V e VI, do CP. A pena do delito previsto no art. 273 do CP – com a redação que lhe deu a
Lei n. 9.677, de 02 de julho de 1998 – deve, por excessivamente severa, ficar reservada para punir
apenas aquelas condutas que exponham a sociedade e a economia popular a ‘enormes danos’
(exposição de motivos). Nos casos de fatos que, embora censuráveis, não assumam tamanha
gravidade, deve-se recorrer, tanto quanto possível, ao emprego da analogia em favor do réu,
recolhendo-se, no corpo do ordenamento jurídico, parâmetros razoáveis que autorizem a aplicação de
uma pena justa, sob pena de ofensa ao princípio da proporcionalidade” (Ap. Crim. 0000949-
84.2006.404.7010-PR, 8.ª T., rel. Luiz Fernando Wowk Penteado, 15.12.2010, v.u.; foi aplicada a pena
do art. 12, da Lei 6.368/76 – antiga Lei de Drogas, convertida em restritivas de direitos).
TJSP: “A simples posse, ainda que para fins de distribuição, de medicamentos de procedência
ignorada e adquiridos de estabelecimento sem licença da autoridade sanitária competente não basta,
à luz do disposto pelo § 1.º do art. 273 do Código Penal, à configuração do crime, exigindo-se, para
86
tanto, que o produto tenha sido falsificado, adulterado ou alterado” (Ap. 471.211-3/5, 5.ª C., rel.
Donegá Morandini, 30.09.2004, v. u., JUBI 105/05).
3. Sujeito ativo: Trata-se de crime comum, pode ser praticado por qualquer pessoa.
7. Formas:
a) Simples: Prevista no caput do artigo.
b) Qualificada pelo resultado: Prevista no art. 285: “Aplica-se o disposto no art. 258 aos crimes
previstos neste Capítulo, salvo quanto ao definido no art. 267”.
3. Sujeito ativo: Trata-se de crime comum, pode ser praticado por qualquer pessoa.
7. Formas:
a) Simples: Prevista no caput do artigo.
b) Qualificada pelo resultado: Prevista no art. 285: “Aplica-se o disposto no art. 258 aos crimes
previstos neste Capítulo, salvo quanto ao definido no art. 267”.
8. Classificação doutrinária: O invólucro ou recipiente com falsa indicação é crime comum (pode
ser cometido por qualquer pessoa); formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado
(consuma-se com a prática da conduta criminosa, prescindindo-se da superveniência do resultado
naturalístico); de perigo comum e abstrato (a lei presume a situação de perigo à saúde pública); de
forma livre (admite qualquer meio de execução); vago (tem como sujeito passivo um ente destituído
de personalidade jurídica, qual seja, a coletividade); instantâneo (consuma-se em um momento
determinado, sem continuidade no tempo); em regra comissivo; unissubjetivo, unilateral ou de
concurso eventual (pode ser praticado por uma só pessoa, mas admite o concurso); e normalmente
plurissubsistente (a conduta criminosa pode ser fracionada em diversos atos).
2. Elementos do tipo: Trata-se de crime de ação múltipla, pois várias são as ações nucleares previstas:
vender, expor à venda, ter em depósito para vender ou, de qualquer forma, entregar a consumo produto
nas condições dos arts. 274 e 275 (objeto material). Pune-se aqui a conduta daquele que, sem praticar
as ações típicas previstas nos artigos precedentes, comercializa os produtos nas condições indicadas
pelos referidos dispositivos.
3. Sujeito ativo: Trata-se de crime comum, e não próprio, pois pode ser praticado por qualquer
pessoa, não necessitando ser comerciante. Exclui-se, no entanto, o agente que praticou as ações
delitivas previstas nos arts. 274 e 275, é que a comercialização posterior dos produtos constitui post
factum impunível.
7. Formas:
a) Simples: Prevista no caput do artigo.
b) Qualificada pelo resultado: Prevista no art. 285: “Aplica-se o disposto no art. 258 aos crimes
previstos neste Capítulo, salvo quanto ao definido no art. 267”.
8. Classificação doutrinária: O crime tipificado no art. 276 do Código Penal é comum (pode ser
cometido por qualquer pessoa); formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado
(consuma-se com a prática da conduta criminosa, prescindindo-se da superveniência do resultado
naturalístico); de perigo comum e abstrato (a lei presume a situação de perigo à saúde pública); de
forma livre (admite qualquer meio de execução); vago (tem como sujeito passivo um ente destituído
de personalidade jurídica, qual seja, a coletividade); remetido (a definição típica se reporta aos arts.
274 e 275 do Código Penal); instantâneo (nas modalidades “vender” e “entregar a consumo”) ou
permanente (nas variantes “expor à venda” e “ter em depósito para vender”); em regra comissivo;
unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual (pode ser praticado por uma só pessoa, mas
admite o concurso); e normalmente plurissubsistente (a conduta criminosa pode ser fracionada em
diversos atos).
2. Elementos do tipo: Trata-se de crime de ação múltipla, pois várias são as ações nucleares previstas:
vender, expor à venda, ter em depósito ou ceder (transferir a outrem). O objeto material do crime é a
substância destinada à falsificação de produtos alimentícios, terapêuticos ou medicinais. Ex.: configura
o crime em apreço a manutenção em depósito de sulfito de sódio, substância comumente usada na
falsificação e adulteração de carne, com o fim de mascarar estado de putrefação já iniciado, cuja
adição ao produto in natura é expressamente vedada pela legislação vigente do Ministério da Saúde.
3. Sujeito ativo: Trata-se de crime comum, pois pode ser praticado por qualquer pessoa.
5. Elemento subjetivo: É o dolo. É necessário que o agente tenha ciência de que a substância se
destine à falsificação.
6. Consumação e tentativa: Consuma-se o crime com a venda, exposição à venda, depósito ou cessão
da substância destinada à falsificação de produtos alimentícios, terapêuticos ou medicinais. Nas
modalidades expor à venda e ter em depósito o delito é permanente. A tentativa é possível.
7. Formas:
a) Simples: Prevista no caput do artigo.
b) Qualificada pelo resultado: Prevista no art. 285: “Aplica-se o disposto no art. 258 aos crimes
previstos neste Capítulo, salvo quanto ao definido no art. 267”.
2. Elementos do tipo: Trata-se de crime de ação múltipla, pois várias são as ações nucleares previstas:
fabricar, vender, expor à venda, ter em depósito para vender ou, de qualquer forma, entregar a
consumo.
O objeto material do crime é a coisa ou substância nociva à saúde., ainda que não
destinada à alimentação ou a fim medicinal. Ex.: pomada, inseticida, veneno para rato, cigarro,
chupeta, talheres, cola, tinta, isto é, tudo aquilo que seja destinado ao consumo de um número
indeterminado de pessoas e que por algum motivo seja nocivo à saúde daqueles que venham a utilizá-
lo.
Exclui-se a substância alimentícia ou medicinal, pois ambas se encontram abrangidas pelos
crimes nos arts. 272 e 273 CPB.
Victor Eduardo Rios Gonçalves entende que, se houver relação de consumo, por ser o
adquirente o destinatário final do produto (art. 2º da Lei 8.078/90), estará tipificado o crime do art. 7º,
IX da Lei nº 8.137/90), que pune com detenção, de dois a cinco anos, ou multa, quem vende, tem em
depósito para vender ou expõe à venda, ou de qualquer forma, entrega matéria prima ou mercadoria
em condições impróprias para o consumo. É que o art. 18, § 6º, II da Lei 8.078/90 define que todo
produto nocivo ao consumidor é impróprio para o consumo.
3. Sujeito ativo: Trata-se de crime comum, pois pode ser praticado por qualquer pessoa.
5. Elemento subjetivo: É o dolo. Na conduta de ter em depósito para vender há o chamado elemento
subjetivo do tipo consistente na finalidade de venda.
6. Consumação e tentativa: Consuma-se o crime com a prática de uma das ações típicas. Não é
necessário, contudo, o efetivo consumo da coisa ou substância nociva. A tentativa é possível.
7. Formas:
a) Simples: Prevista no caput do artigo.
b) Qualificada pelo resultado: Prevista no art. 285: “Aplica-se o disposto no art. 258 aos crimes
previstos neste Capítulo, salvo quanto ao definido no art. 267”.
c) Culposa: Prevista no parágrafo único: “Se o crime é culposo: Pena – detenção, de 2 meses a 1 ano”.
2. Elementos do tipo: A ação nuclear típica consubstancia-se no verbo fornecer, isto é, entregar,
vender, no caso, substância medicinal (objeto material) que esteja em desacordo com a receita médica
(elemento normativo do tipo). Esta não compreende a receita prescrita por dentista, pois não se
admite analogia em norma incriminadora, ou seja, o fato é atípico.
Como o tipo penal contém a elementar “receita médica”, não há crime no fornecimento de
substância medicinal em desacordo com receitas emitidas por outros profissionais da área de saúde, a
exemplo dos dentistas e das parteiras, em face da vedação da analogia in malam partem no Direito
Penal.
Entretanto, embora se reconheça a incompatibilidade com o art. 280 do Código Penal, convém
ressaltar a existência de hipóteses excepcionais, previstas nos arts. 30 e 37, d, do Decreto
20.931/1932, nas quais é autorizada a prescrição de medicamentos por dentistas e parteiras:
Art. 30. O cirurgião-dentista somente poderá prescrever agentes anestésicos de uso tópico e medicamento de
uso externo para os casos restritos de sua especialidade.
(…)
Art. 37. É vedado às parteiras:
(…)
d) prescrever medicações, salvo a que for urgentemente reclamada pela necessidade de evitar ou combater
acidentes graves que comprometam a vida da parturiente, do feto ou recém-nascido.
Há, assim, a substituição do medicamento prescrito pelo médico por outro de qualidade,
espécie e quantidade diversa. Ainda que benéfica essa substituição, há crime, pois visa a lei justamente
evitar arbitrariedades no fornecimento de medicamentos pelos farmacêuticos. Não há crime,
entretanto, quando o princípio ativo é o mesmo, tratando-se de medicamento genérico.
3. Sujeito ativo: A doutrina diverge quanto às pessoas que podem praticar esse delito: a) qualquer
pessoa, não se exigindo qualidade especial, como farmacêutico, balconista, atendente etc; b) trata-se de
crime próprio, pois somente o farmacêutico pode praticá-lo.
91
4. Sujeito passivo: A coletividade, pois se trata de crime de perigo comum, bem o eventual usuário
do medicamento.
7. Formas:
a) Simples: Prevista no caput do artigo.
b) Qualificada pelo resultado: Prevista no art. 285: “Aplica-se o disposto no art. 258 aos crimes
previstos neste Capítulo, salvo quanto ao definido no art. 267”.
c) Culposa: Prevista no parágrafo único: “Se o crime é culposo: Pena – detenção, de 2 meses a 1 ano”.
Parágrafo único - Se o crime é praticado com o fim de lucro, aplica-se também multa.
O exercício de determinadas profissões exige conhecimento técnico e teórico bastante
aprofundado; por isso são fiscalizados pelo Poder Público. É o que ocorre com a medicina, a
odontologia e a farmácia, em que o exercício da profissão por pessoa não capacitada pode gerar danos
à saúde pública. Por esse motivo incriminou o legislador o exercício ilegal dessas profissões.
2. Sujeito ativo: Na primeira modalidade o crime é comum, pois pode ser praticado por qualquer
pessoa, ao passo que na segunda, o crime é próprio, pois somente o médico, farmacêutico ou dentista
pode cometê-lo.
3. Sujeito passivo: A coletividade, pois se trata de crime de perigo comum, bem como a pessoa que
venha a ser tratada pelo profissional.
4. Elemento subjetivo: É o dolo. Se houver a finalidade de lucro, incorrerá o agente também na pena
de multa prevista no parágrafo único do artigo. Não é necessário que ele efetivamente obtenha a
vantagem econômica.
7. Formas:
a) Simples: Prevista no caput do artigo.
b) Qualificada: Prevista no parágrafo único: “Se o crime é praticado com o fim de lucro, aplica-se
também multa”.
c) Qualificada pelo resultado: Prevista no art. 285: “Aplica-se o disposto no art. 258 aos crimes
previstos neste Capítulo, salvo quanto ao definido no art. 267”.
8. Ação penal: É crime de ação penal pública incondicionada.
9. Distinção:
a) Veja-se, por fim, que o exercício ilegal de qualquer outra profissão configura a contravenção
penal descrita no art. 47 Lei Contravenções Penais. “Art. 47. Exercer profissão ou atividade econômica
ou anunciar que a exerce, sem preencher as condições a que por lei está subordinado o seu exercício: Pena –
prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa, de quinhentos mil réis a cinco contos de réis”.
10. Classificação doutrinária: O exercício ilegal da medicina, arte dentária ou farmacêutica é crime
comum (na conduta de exercer profissão sem autorização legal) ou próprio (na modalidade de exercer
a profissão excedendo-lhe os limites); formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado
(consuma-se com a prática da conduta criminosa, prescindindo-se da superveniência do resultado
naturalístico); habitual (reclama a reiteração de atos indicativos do estilo de vida ilícito do agente); de
perigo comum e abstrato (a lei presume a situação de perigo à saúde pública); de forma livre
(admite qualquer meio de execução); vago (tem como sujeito passivo um ente destituído de
93
personalidade jurídica, qual seja, a coletividade); instantâneo (consuma-se em um momento
determinado, sem continuidade no tempo); em regra comissivo; unissubjetivo, unilateral ou de
concurso eventual (pode ser praticado por uma só pessoa, mas admite o concurso); e normalmente
plurissubsistente (a conduta criminosa pode ser fracionada em diversos atos).
15. CHARLATANISMO
Art. 283 - Inculcar ou anunciar cura por meio secreto ou infalível:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.
Charlatão é o estelionatário da medicina que ilude a boa-fé dos doentes, inculcando (apregoar,
dar a entender) ou anunciando (divulgar) cura por meio secreto ou infalível, ciente de que a afirmação
é falsa. Normalmente o agente toma essa atitude visando a obtenção de lucro. Tal intento, entretanto,
não é pressuposto do delito.
Charlatanismo vem do italiano ciarlare = falar muito, tagarelar, palrar etc. É o crime do “conversa
fiada”, do que, com lábia, ilude os incautos, fazendo-os crer em curas maravilhosas, em processos
infalíveis etc.
1. Objeto jurídico: Tutela-se a saúde pública. Em que pese tratar-se de verdadeiro estelionato, pois
presente a fraude e, por vezes, a vantagem patrimonial, o legislador optou por considerá-lo crime
contra a saúde pública, na medida em que a falsa cura anunciada pode fazer com que os incautos
retardem ou deixem de procurar o tratamento convencional da doença, o que acarretaria riscos
para a vida ou saúde dessas pessoas.
2. Elementos do tipo: Trata-se de crime de ação múltipla, consubstanciando-se nos verbos inculcar
(sugerir, aconselhar, propor) ou anunciar (rádio, panfletos, cartazes, televisão) cura por meio secreto
ou infalível. O charlatão, dessa forma, propõe ou divulga a cura de doenças mediante o uso de
remédios ou processo de que somente ele tem conhecimento ou então que se diz infalível, por
exemplo, anunciar a cura da AIDS.
3. Sujeito ativo: Pode o crime ser praticado por qualquer pessoa, inclusive médico, desde que esteja
de má-fé e anuncie a cura por meio secreto ou infalível.
6. Tentativa: É possível.
7. Distinção:
a) O charlatanismo não se confunde com o exercício ilegal da medicina, uma vez que, neste, o agente
crê no tratamento recomendado, enquanto, naquele, o agente não crê na cura que anuncia.
b) Não se confunde também com o curandeirismo, que, por sua vez, é crime mais grave e pressupõe
que o agente prescreva, ministre ou aplique medicamento.
8. Classificação doutrinária: O charlatanismo é crime comum (pode ser cometido por qualquer
pessoa); formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado (consuma-se com a prática da
conduta criminosa, prescindindo-se da superveniência do resultado naturalístico); de perigo comum e
abstrato (a lei presume a situação de perigo à saúde pública); de forma livre (admite qualquer meio
94
de execução); vago (tem como sujeito passivo um ente destituído de personalidade jurídica, qual seja,
a coletividade); instantâneo (consuma-se em um momento determinado, sem continuidade no tempo);
em regra comissivo; unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual (pode ser praticado por uma
só pessoa, mas admite o concurso); e normalmente plurissubsistente (a conduta criminosa pode ser
fracionada em diversos atos).
16. CURANDEIRISMO
Art. 284 - Exercer o curandeirismo:
I - prescrevendo, ministrando ou aplicando, habitualmente, qualquer substância;
II - usando gestos, palavras ou qualquer outro meio;
III -fazendo diagnósticos:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos.
Parágrafo único - Se o crime é praticado mediante remuneração, o agente fica também sujeito à multa.
c) Fazer diagnósticos: ou seja, afirmar a existência de uma doença com base nos sintomas
apresentados pelo paciente. O diagnóstico somente pode ser feito por médicos, e, por isso, responde
por curandeirismo o agente que realiza a conduta.
3. Sujeito ativo: O sujeito ativo do curandeirismo pode ser qualquer pessoa, desde que não dotada de
conhecimentos técnicos de medicina, pois, conforme já mencionado, responde por exercício ilegal
dessa profissão aquele que possui tais conhecimentos, mas não tem registro que o habilite a exercê-la.
8. Excessos da atividade religiosa: em face da proteção constitucional, há, com certeza, abusos de
toda ordem por parte de pessoas que exercem autêntico curandeirismo, mas sob a veste de atividade
religiosa. O Estado nada pode fazer para impedir a prática desses rituais, às vezes envolvendo a cura
de males físicos através do emprego de “cirurgias espirituais”, porque está envolvida a crença do
paciente. Enquanto não se ultrapassar o limite do disponível, funciona o consentimento da vítima para
afastar qualquer ilicitude. Entretanto, se o ofendido morrer ou sofrer lesão grave, como
lamentavelmente já aconteceu por conta disso, o agente da “operação espiritual” deve ser
responsabilizado pelo que causou à vítima, tendo em vista que a vida e a integridade corporal em
determinados graus são consideradas bens indisponíveis, ainda que se tenha de afastar a aplicação da
inviolabilidade de crença, pois nenhum direito é absoluto.
9. Classificação doutrinária: O curandeirismo é crime comum (pode ser cometido por qualquer
pessoa); formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado (consuma-se com a prática da
conduta criminosa, prescindindo-se da superveniência do resultado naturalístico); de perigo comum e
abstrato (a lei presume a situação de perigo à saúde pública); de forma vinculada (somente pode ser
praticado pelos meios de execução indicados no tipo penal); vago (tem como sujeito passivo um ente
destituído de personalidade jurídica, qual seja, a coletividade); habitual (a consumação reclama a
reiteração de atos indicativos do estilo de vida ilícito do agente); em regra comissivo; unissubjetivo,
unilateral ou de concurso eventual (pode ser praticado por uma só pessoa, mas admite o concurso); e
normalmente plurissubsistente (a conduta criminosa pode ser fracionada em diversos atos).
Art. 285 - Aplica-se o disposto no art. 258 aos crimes previstos neste Capítulo, salvo quanto ao definido no art.
267.
96
TÍTULO IX
DOS CRIMES CONTRA A PAZ PÚBLICA
No Título IX, procurou o legislador contemplar todas as condutas criminosas que atentam
especificamente contra o sentimento de paz e tranquilidade que deve imperar no seio social.
Conforme E. Magalhães Noronha, “são quase todos esses crimes autênticos atos preparatórios
e a razão de puni-los está ou no relevo que o legislador dá ao bem ameaçado ou porque sua
frequência está a indicar a necessidade da repressão, em qualquer caso, em nome da paz social”.
(Direito penal.São Paulo, Saraiva, v. 4, p. 77-78).
Exceção do art. 31 do CP:
- Art. 31 CP: O ajuste, a determinação ou instigação e o auxílio, salvo disposição expressa em contrário, não
são puníveis, se o crime não chega, pelo menos, a ser tentado.
1. INCITAÇÃO AO CRIME
Art. 286 - Incitar, publicamente, a prática de crime:
Pena - detenção, de três a seis meses, ou multa.
2. Elemento do tipo: Consubstancia-se pelo verbo incitar, isto é, induzir, excitar, provocar, estimular
a realização de crime de qualquer natureza. Trata-se de crime de ação livre, pois pode ser praticado por
qualquer meio: palavras, gestos ou atitudes, panfletos, cartazes, discursos, gritos, e-mails, sites de
internet, entrevista em rádio, jornal televisão etc.
Comete o delito, por exemplo, quem mantém site na internet dizendo que todo marido traído
deve espancar ou matar a esposa; quem aconselha a fazer ligação clandestina de água, luz, TV a cabo;
jornalista do SBT Rachel Sheherazade que defendeu na TV a atitude das pessoas que espancaram,
cortaram a orelha e amarraram ao poste um bandido que havia praticado furto etc.
O tipo penal pune o incitamento à prática, imediata ou futura, de crime. Exclui-se, portanto, a
contravenção penal.
3. Sujeito passivo: Todos os crimes previstos neste título visam a resguardar a paz pública, e, por esse
motivo, o sujeito passivo é sempre a coletividade.
4. Sujeito ativo. O delito de incitação ao crime, que pode ser levado a efeito por qualquer pessoa,
sendo, portanto, crime comum, consiste em instigar, provocar ou estimular a realização de crime de
qualquer natureza (previsto no CP ou em outras leis).
Importante: Exige-se que a conduta seja praticada em público, ou seja, na presença de número
elevado de pessoas, uma vez que a conduta de induzir pessoa certa e determinada à prática de
um crime constitui participação no delito efetivamente cometido. É necessário, ainda, que o agente
estimule grande número de pessoas a cometer determinada espécie de delito, pois a conduta de
estimular genericamente o ingresso de pessoas à delinquência não constitui crime.
Nos termos da lei, a incitação pública à prática de ato contravencional não constitui
crime.
Também não caracteriza o delito a simples opinião no sentido de ser legalizada certa
conduta (porte de entorpecente, aborto etc.).
A incitação ao crime pode ser exercitada por qualquer meio: panfletos, cartazes, discursos,
gritos em público etc. Após o Supremo Tribunal Federal julgar que a Lei de Imprensa não foi
97
recepcionada pela CF/88, o crime em análise pode também ser cometido por meio de rádio, jornal,
televisão, revistas etc., na medida em que não é mais aplicável o crime previsto no art. 19 da Lei de
Imprensa.
6. Consumação e tentativa: O crime se consuma com a simples incitação pública, ou seja, quando
número indeterminado de pessoas toma conhecimento dela. Trata-se de crime formal, cuja
caracterização dispensa a efetiva prática de crime por parte dos que receberam a mensagem. Noronha
entende que se trata de crime de mera conduta.
A tentativa somente é admitida na forma escrita, quando, por exemplo, extraviam-se os
panfletos que seriam distribuídos, quando o agente é impedido de entregá-los às pessoas etc. Na forma
oral é inadmissível.
7. DISTINÇÕES:
b) se houver incitação, direta e pública, à prática de crime de genocídio: art. 3º da Lei n. 2.889/56;
2. Elementos do tipo: Na definição de Heleno C. Fragoso, "fazer apologia, no sentido em que a ação
é prevista na lei penal, é defender, justificar, exaltar, aprovar ou elogiar de maneira perigosa, isto
é, de forma que constitua incentivo indireto ou implícito à repetição da ação delituosa. Não será
bastante, portanto, a simples manifestação de solidariedade, defesa ou apreciação favorável, ainda que
98
veemente, não sendo punível a mera opinião" (Lições de direito penal, Rio de Janeiro, Forense, v. 3, p.
752).
Comete o crime, dessa forma, quem enaltece, elogia fato criminoso (previsto no CP ou
outras leis) ou o próprio autor do crime em função do delito que cometeu. Comete o crime, por
exemplo, quem, em entrevista, elogia um empresário por ter, comprovadamente, sonegado
milhões em tributos, ou um assassino porque matou determinada pessoa, ou um estuprador por
ter escolhido uma vítima bonita.
Diferencia da incitação porque se refere a fato pretérito, ou seja, fato criminoso já ocorrido.
É também requisito desse crime que a apologia seja feita em público, isto é, que atinja
número indeterminado de pessoas. Pode o delito ser cometido por qualquer meio: discurso,
panfletos, cartazes etc.
Após o Supremo Tribunal Federal julgar que a Lei de Imprensa não foi recepcionada pela
CF/88, o crime em análise pode também ser cometido por meio de rádio, jornal, televisão, revistas etc.,
na medida em que não é mais aplicável o crime previsto no art. 19, § 2º, da Lei de Imprensa (Lei nº
5.250/67).
7. Marchas, protestos, passeatas e outras manifestações: para Nucci (2014, p. 1193), o objeto
jurídico tutelado pelos crimes previstos pelos arts. 286 a 288 é a paz pública. Não se quer a associação
criminosa de pessoas porque, a qualquer momento, podem perturbar a paz pública, cometendo delitos
de dano. Igualmente, não se deseja o incentivo público à prática de crime, nem o elogio de delito ou
delinquente, para que não haja o cometimento de novas infrações penais, perturbando, com
efetividade, a ordem pública. Situação bem diversa é o direito de se expressar do indivíduo e a
liberdade de reunião pacífica, garantidos pela Constituição Federal (art. 5.º, incisos IV, IX e XVI).
Portanto, organizar uma marcha ou protesto contra a criminalização de determinada conduta ou
em favor da liberação de certas proibições constitui direito fundamental, típico do Estado Democrático
de Direito. Em época recente, assistimos manifestações e passeatas em prol da legalização do uso da
maconha. Em contraposição, lamentavelmente, alguns setores do Judiciário resolveram proibir tais
eventos, a pedido do Executivo-polícia, sob o argumento de incentivar a prática de crime ou fazer
apologia de fato criminoso. Ora, o objetivo das marchas era pela liberação oficial, dentro dos
parâmetros legais, do uso de determinada droga; não havia nenhuma bandeira de instigação ao uso
ilegal de maconha. Se as pessoas não puderem se expressar, favorável ou contrariamente a algum
delito, como o Parlamento poderá sensibilizar-se a alterar a lei? O crime, materialmente considerado,
configura-se pela vontade popular de que determinada conduta sofra sanção penal.
Formalmente, o Legislativo transforma tal anseio em tipo incriminador. O caminho inverso
pode dar-se, buscando-se a legalização de algo e, consequentemente, a revogação do tipo incriminador.
Nada demais, afinal, o próprio legislador, em 2006, retirou toda e qualquer punição, com pena
privativa de liberdade, ao usuário de drogas (art. 28, Lei 11.343/2006). A política criminal do Estado
pode variar de tempos em tempos, constituindo direito do cidadão participar dessas movimentações
ideológicas.
Fez-se justiça na questão da marcha pela liberação das drogas, pois o STF considerou-a direito
individual – e não apologia ou incentivo a crime. O mesmo pode ocorrer, no futuro, se outras passeatas
99
forem organizadas, em prol de outras liberações, como, por exemplo, do aborto – outra matéria
controversa, que conta com diversas opiniões. Em suma, não há dolo de perturbar a paz pública nos
eventos organizados para protestar contra alguma lei incriminadora ou fato criminoso.
Ementa
100
Proibidão de Funk não é apologia ao crime, diz Juiz ao rejeitar denúncia do Ministério
Público/RJ (06/07/2015)
A ação penal Processo nº 0002438-06.2014.8.19.0001 - 37a VARA CRIMINAL DA COMARCA DA
CAPITAL, proposta em face de um sujeito que foi apreendido pela polícia porque estava ouvindo
“funk proibidão” foi rejeitada pelo Juiz Marcos Peixoto, da 37a, Vara Criminal da comarca do Rio de
Janeiro. Invocando a liberdade de expressão e a censura de tipos penais como apologia ao crime, o
magistrado rejeitou a criminalização.
3. ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA
Art. 288. Associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para o fim específico de cometer crimes: (Redação dada pela
Lei nº 12.850, de 2013)
Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos. (Redação dada pela Lei nº 12.850, de 2013)
Parágrafo único. A pena aumenta-se até a metade se a associação é armada ou se houver a participação de
criança ou adolescente. (Redação dada pela Lei nº 12.850, de 2013)
Redação antiga:
Quadrilha ou bando
Art. 288 - Associarem-se mais de três pessoas, em quadrilha ou bando, para o fim de cometer crimes:
Pena - reclusão, de um a três anos. (Vide Lei 8.072, de 25.7.1990)
Parágrafo único - A pena aplica-se em dobro, se a quadrilha ou bando é armado.
Por outro lado, o objetivo do grupo associado é o cometimento de delitos, embora não se exija
a consecução deles para a concretização da associação criminosa. O perigo abstrato para a paz pública
é evidente e não precisa ser provado, afinal, o Estado não quer a existência de agrupamentos
organizados e estáveis, prontos a delinqüir a qualquer momento.
TJSP: “É uma certa permanência ou estabilidade o que distingue o crime de quadrilha ou bando
(hoje associação criminosa) da simples participação criminosa (societas sceleris ou societas in
crimine). Se os agentes não se unem para delinqüir de modo indeterminado e permanente, mas em
caráter transitório, ocorre, na realidade, ocasional concurso de agentes” (RT 744/560)
101
STJ: “A estrutura central deste crime reside na consciência e vontade de os agentes organizarem-se
em bando ou quadrilha [hoje, com a denominação de associação criminosa] com a finalidade de
cometer crimes. Trata-se de crime autônomo, de perigo abstrato, permanente e de concurso
necessário, inconfundível com o simples concurso eventual de pessoas” (Denun na APn 549-SP, C.E.,
rel. Felix Fischer, 21.10.2009, v.u.).
TRF - 1.ª Reg.: “Demonstrada a reunião de pessoas para a realização de apenas um assalto, embora
de grande porte, impõe-se a absolvição quanto ao crime de quadrilha ou bando [hoje, associação
criminosa]” (ApCrim 2001.38.02.001572-0-MG, 4.ª T., rel. p/ Ac. Des. Mário César Ribeiro,
05.05.2009, m.v.).
STJ: “Para o reconhecimento do crime de formação de quadrilha [hoje, associação criminosa], basta
a comprovação da existência de associação estável de mais de três pessoas [atualmente, bastam três],
com a intenção de praticar crimes diversos, sendo, pois, prescindível a identificação efetiva de todos
os membros da quadrilha ou bando. Precedentes” (HC 160290-MS, 5.ª T., rel. Laurita Vaz,
14.02.2012, v.u.).
TJSP: “O fato de não terem alguns componentes do bando sido identificados, não descaracteriza o
delito, máxime quando a denúncia menciona que agiam juntos os três acusados e mais dois indivíduos
não identificados sem prejuízo da participação dos outros mais” (HC 367.064.4)
- A intenção dos associados, no crime de associação criminosa é a prática de crimes: Não se exige
a consecução deles para a caracterização da associação criminosa. O perigo abstrato para a paz pública
é evidente e não precisa ser provado; afinal, o Estado não quer a existência de agrupamentos
organizados e estáveis, prontos a delinquir a qualquer momento.
Se a reunião for para o cometimento de crimes determinados, haverá apenas coautoria ou
participação nas infrações praticadas. Deve-se analisar se não se trata de um concurso eventual ou
concurso permanente de agentes, igual na associação para o tráfico (art. 35 da Lei 11.343/06).
Quando o intenção for cometer reiteradamente contravenções penais em grupo (ex.: jogo
do bicho), não se tipifica o delito em estudo.
Para Nucci (2014, p. 1196), acrescentem-se, ainda, serem fatos atípicos o agrupamento de
pessoas com outras finalidades especiais, sem o objetivo de conturbar a paz pública, mas, sim, com a
meta de chamar a atenção para a solução de algum problema.
102
TJSP: “Não caracterização de quadrilha ou bando [hoje, associação criminosa] – Movimento dos
Sem Terra – Associação para a prática de crimes não comprovada – Invasão de propriedades com a
finalidade de pressionar autoridades – Expediente que, apesar de perturbar a ordem pública, importa
ilícito civil – Absolvição mantida” (Ap. 272.550-3-Andradina, 5.ª C., rel. Dante Busana, 26.10.2000, v.
u., JUBI 54/01).
3. Sujeitos ativo e passivo: O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. Existe a cautela de se exigir,
pelo menos, três pessoas. Sujeito passivo é a coletividade, a sociedade.
b) a associação para a prática de um crime continuado não basta para a tipificação do art. 288 –
Delmanto, Hungria.
Importante: Delito autônomo – concurso material: Além disso, é necessário ressaltar que o crime
de associação criminosa é autônomo em relação aos delitos que efetivamente venham a ser
cometidos por seus integrantes, uma vez que a lei visa punir a simples situação de perigo decorrente
da associação.
Dessa forma, haverá concurso material entre o crime de associação criminosa e as demais
infrações efetivamente praticadas. Ex.: grupos de pessoas que se unem para exterminar pessoas
(grupos de extermínio); integrantes de torcida organizada que agem em bando sempre que há jogo para
agredir torcedores do outro time; grupo de hackers que se unem para criar falsos sites e obter os
números das contas correntes (furtos); associação criminosa para roubar cargas; empresários que se
juntam a advogados e contadores para montar esquema a fim de sonegar reiteradamente tributos etc.
Concurso do crime de associação criminosa com outro delito qualificado pela mesma
circunstância:
Quando os delitos cometidos forem furtos, roubos ou extorsão mediante sequestro, que já
possuem qualificadora ou causa de aumento de pena pelo envolvimento de pelo menos duas
pessoas, há divergência, na doutrina e jurisprudência, quanto ao correto enquadramento, caso tais
crimes sejam praticados por três ou mais membros de uma quadrilha.
a) Para alguns, os agentes respondem por associação criminosa em concurso material com furto
ou roubo simples porque a aplicação da qualificadora ou causa de aumento seria bis in idem;
103
b) Para outros, como Nucci (2014, p. 1197), é possível, não se configurando bis in idem, no qual os
agentes respondem por associação criminosa e pelos crimes qualificados porque a associação é
um crime de perigo contra a paz da coletividade decorrente da mera associação, enquanto a
qualificadora decorre da maior gravidade da conduta contra a vítima do caso concreto.
Este é a posição atual adotada pelo STF e STJ. Há, na atualidade, uma tendência no
sentido de que o crime qualificado pode ser cumulado com o crime de associação criminosa
porque os bens jurídicos tutelados são distintos.
6. Causa de aumento:
Parágrafo único. A pena aumenta-se até a metade se a associação é armada ou se houver a participação de
criança ou adolescente. (Redação dada pela Lei nº 12.850, de 2013)
Apesar das divergências, prevalece o entendimento, inclusive o de Nucci, de que basta um dos
integrantes da associação estar armado, desde que isso guarde relação com os fins criminosos do
grupo, e que todos saibam e concordem com isto. O dispositivo alcança a utilização de armas
próprias (fabricadas para servir como instrumento de ataque ou defesa) ou impróprias (feitas com
outra finalidade, mas que também podem matar ou ferir - facas, navalhas, estiletes etc.).
104
STF: “A utilização de arma por qualquer membro da quadrilha constitui elemento evidenciador da
maior periculosidade do bando, expondo todos que o integram à causa de aumento de pena prevista
no art. 288, p.u. do Código Penal” (HC 72.992)
Outra hipótese para o aumento de pena é a participação de criança ou adolescente. Nesse caso,
pouco importa se o menor de 18 anos é usado como mero instrumento ou se participa ativamente
da associação (no caso de ser adolescente).
7. Figura qualificada: O art. 8º da Lei nº 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos) dispõe:
Art. 8º Será de três a seis anos de reclusão a pena prevista no art. 288 do Código Penal, quando se tratar de
crimes hediondos, prática da tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins ou terrorismo.
Parágrafo único. O participante e o associado que denunciar à autoridade o bando ou quadrilha,
possibilitando seu desmantelamento, terá a pena reduzida de um a dois terços.
Trata-se de qualificadora que se aplica, portanto, quando a associação criminosa é formada para
a prática desses crimes de maior gravidade. Nessas hipóteses, haverá concurso material entre o
crime de associação qualificada e os crimes efetivamente cometidos.
Obs.: Esse art. 8º também menciona a associação para a prática de tráfico de drogas, porém,
atualmente, a união de duas ou mais pessoas para a prática de tráfico, de forma reiterada ou não,
constitui crime do art. 35, caput, da Lei nº 11.343/06 (Lei de Drogas), punido com reclusão de três a
dez anos, e multa. Além disso, o art. 35, parágrafo único, da mesma lei, pune com as mesmas penas a
associação de duas ou mais pessoas para o financiamento reiterado do tráfico.
Terrorismo: Lei nº 13.260, de 16 de março de 2016 (Regulamenta o disposto no inciso XLIII do art.
5o da Constituição Federal, disciplinando o terrorismo, tratando de disposições investigatórias e
processuais e reformulando o conceito de organização terrorista; e altera as Leis nº 7.960, de 21 de
dezembro de 1989, e 12.850, de 2 de agosto de 2013)
Art. 2o O terrorismo consiste na prática por um ou mais indivíduos dos atos previstos neste artigo, por razões
de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, quando cometidos com a finalidade de
provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a incolumidade
pública.
I - usar ou ameaçar usar, transportar, guardar, portar ou trazer consigo explosivos, gases tóxicos, venenos,
conteúdos biológicos, químicos, nucleares ou outros meios capazes de causar danos ou promover destruição em
massa;
II – (VETADO);
III - (VETADO);
IV - sabotar o funcionamento ou apoderar-se, com violência, grave ameaça a pessoa ou servindo-se de
mecanismos cibernéticos, do controle total ou parcial, ainda que de modo temporário, de meio de comunicação
ou de transporte, de portos, aeroportos, estações ferroviárias ou rodoviárias, hospitais, casas de saúde, escolas,
estádios esportivos, instalações públicas ou locais onde funcionem serviços públicos essenciais, instalações de
geração ou transmissão de energia, instalações militares, instalações de exploração, refino e processamento de
petróleo e gás e instituições bancárias e sua rede de atendimento;
V - atentar contra a vida ou a integridade física de pessoa:
Pena - reclusão, de doze a trinta anos, além das sanções correspondentes à ameaça ou à violência.
105
§ 2o O disposto neste artigo não se aplica à conduta individual ou coletiva de pessoas em manifestações
políticas, movimentos sociais, sindicais, religiosos, de classe ou de categoria profissional, direcionados por
propósitos sociais ou reivindicatórios, visando a contestar, criticar, protestar ou apoiar, com o objetivo de
defender direitos, garantias e liberdades constitucionais, sem prejuízo da tipificação penal contida em lei.
8. Delação premiada: A Lei dos Crimes Hediondos, em seu art. 8º, parágrafo único, trouxe outra
inovação, ao dispor que o participante ou associado que denunciar à autoridade (juiz, promotor,
delegado, policial militar) a associação criminosa, possibilitando seu desmantelamento, terá a pena
reduzida de um a dois terços.
Esse instituto foi chamado por Damásio E. de Jesus de traição benéfica, pois implica redução
da pena como conseqüência da delação de comparsas. Veja-se que, nos termos da lei, só haverá a
diminuição da pena se a delação implicar o efetivo desmantelamento da associação.
Nucci entende ainda, entendemos cabível a causa de diminuição de pena somente quando se
tratar de crimes hediondos e equiparados (tortura, tráfico e terrorismo), pois é previsão feita no
parágrafo único do art. 8.º da lei específica, não podendo ser generalizado para todos os casos do art.
288. (2014, p. 1198).
10. Quadrilha ou bando: eram os termos utilizados para o Título do crime do art. 288. Quadrilha ou
bando era a associação estável de pelo menos quatro pessoas com o fim de cometer
reiteradamente crimes. As palavras "quadrilha" e "bando" eram sinônimas.
11. Diferença entre associação criminosa e organização criminosa: a Lei nº 12.850/2013 estabelece
o crime de organização criminosa: “Art. 1º Esta Lei define organização criminosa e dispõe sobre a
investigação criminal, os meios de obtenção da prova, infrações penais correlatas e o procedimento criminal a
ser aplicado. § 1º Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas
estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de
obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas
penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional”.
12. Classificação doutrinária: A associação criminosa é crime simples (ofende um único bem
jurídico); comum (pode ser praticado por qualquer pessoa); formal, de consumação antecipada ou
de resultado cortado (consuma-se com a realização da conduta criminosa, independentemente da
superveniência do resultado naturalístico); de perigo comum (coloca em risco uma pluralidade de
pessoas) e abstrato (presumido pela lei), malgrado existam opiniões em contrário, no sentido de
constituir-se em crime de perigo concreto; vago (tem como sujeito passivo um ente destituído de
personalidade jurídica); de forma livre (admite qualquer meio de execução); comissivo; permanente
(a consumação se prolonga no tempo, por vontade dos agentes); plurissubjetivo, plurilateral ou de
concurso necessário (o tipo penal reclama a presença de pelo menos três pessoas) e de condutas
paralelas (as condutas se unem em torno de um fim comum); obstáculo (o legislador antecipou a
tutela penal, a fim incriminar de forma autônoma atos representativos da preparação de outros delitos);
e plurissubsistente.
Art. 288-A. Constituir, organizar, integrar, manter ou custear organização paramilitar, milícia particular, grupo
ou esquadrão com a finalidade de praticar qualquer dos crimes previstos neste Código: (Incluído dada pela Lei
nº 12.720, de 2012)
Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos. (Incluído dada pela Lei nº 12.720, de 2012)
106
1. Objeto jurídico: Similarmente ao crime de associação criminosa são tuteladas a paz e a segurança
públicas.
2. Elementos do tipo: O crime do artigo 288–A, CP é de ação múltipla, conteúdo variado ou tipo
misto alternativo, sendo dotado de vários núcleos ou verbos:
Crime único e concurso de crimes: A prática por determinada pessoa, em um mesmo contexto, de
mais de um dos verbos ou núcleos do tipo não implica em concurso de crimes. Por exemplo, se um
indivíduo “integra” e “organiza” um grupo não responde por dois crimes, mas apenas por um. É claro
que se os contextos divergem, há pluralidade criminosa.
Se, por exemplo, um sujeito integra um grupo de extermínio na Baixada Santista e está
constituindo outro grupo, distinto do primeiro, na Capital do Estado, então está cometendo duas
infrações ao artigo 288–A, CP.
Como bem destaca Rogério Sanches Cunha, o legislador, ao arrolar os grupos enfocados no
dispositivo infringiu a regra de hermenêutica de que na lei não existem palavras inúteis, pois que foi
repetitivo, usando expressões sinônimas como “grupo de extermínio” ou “esquadrão”.
Organização paramilitar = se refere a grupos armados civis que se estruturam de forma similar às
corporações militares oficiais.
Milícia particular ou Milícia privada = conforme referida no novo § 6º, do artigo 121, CP, pode ser
conceituada como um grupo armado de pessoas que tem por finalidade prestar serviços de segurança
em comunidades carentes, supostamente criando uma situação de pacificação, aproveitando-se da
omissão do Poder Público.
- art. 121, § 6o A pena é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado por milícia
privada, sob o pretexto de prestação de serviço de segurança, ou por grupo de extermínio. (Incluído pela Lei nº
12.720, de 2012)
Esses grupos ocupam, por meio de coação e violência, certos espaços territoriais, prestando os
serviços de segurança e ignorando o monopólio estatal do controle social.
Grupos de extermínio ou esquadrões da morte = podem ser definidos como a reunião de indivíduos
na qualidade de “justiceiros” e/ou matadores, os quais também atuam nas brechas deixadas pela
omissão estatal no campo da segurança pública. Atuam perpetrando matanças generalizadas ou mesmo
individualizadas e chacinas de pessoas indicadas como marginais, perigosas ou infratoras.
Normalmente esses grupos atuam mediante pagamento da população local e de comerciantes e/ou
industriais de determinada região.
3. Sujeito Ativo: Trata-se de crime comum, podendo ser perpetrado por qualquer pessoa civil ou
militar.
Número mínimo de integrantes: Também neste crime haverá a discussão acerca do número mínimo
de integrantes a configurarem organização paramilitar, milícia particular, grupo ou esquadrão.
107
A verdade é que a lei é silente. O ideal seria que o legislador houvesse se manifestado
expressamente, conferindo maior segurança jurídica. No entanto, em seu silêncio, já se podem
vislumbrar ao menos três entendimentos defensáveis:
a) O número mínimo de duas pessoas, pois o tipo não fixa número algum. Entendimento de Nucci
(2014, p. 1199).
b) O número mínimo seria de três pessoas, utilizando-se de uma interpretação sistemática com o
crime de associação criminosa, previsto no artigo 288 do CP, já que não se pode cogitar de um grupo
de uma ou duas pessoas. Entendimento de Capez (2014, p. 339), Rogério Sanches Cunha e Luiz
Vicente Cernicchiaro que afirma que o número mínimo seria de 3 pessoas.
Entende-se que, no silêncio do legislador, a tendência é que a interpretação seja pelo mínimo de
3 pessoas, tal como já ocorreu no delito de Rixa (artigo 137,CP) onde também não há determinação de
número mínimo, sendo a marca de 3 pessoas aceita de forma pacífica pela doutrina e jurisprudência.
Mas, o que é induvidoso é que esse tipo penal tem a característica de infração plurissubjetiva ou de
concurso necessário.
4. Sujeito Passivo: O crime é vago, pois tem como sujeito passivo toda a coletividade, inclusive pelo
fato de tutelar bens jurídicos de natureza difusa ou coletiva.
5. Tipo subjetivo e Tipo objetivo: O crime é doloso, não havendo previsão de figura culposa. Esse
dolo é específico, pois que a lei estabelece a finalidade de formação dos grupos que é a de praticar
crimes previstos no Código Penal.
Legislação especial: Neste ponto é interessante notar que houve um cochilo do legislador, pois que se
tais grupamentos forem criados com o intento de praticar crimes previstos em legislação esparsa (v.g.
Lei de Drogas, Lei de Tortura etc.) não haverá adequação típica.
Seria bem melhor que houvesse o legislador optado pela redação similar ao crime de associação
criminosa, apenas se referindo a “crimes”, sem especificar o diploma legal de onde devem se originar.
Devido a essa falha, se a formação do grupo for para a prática de crimes fora do Código Penal,
somente restará a figura da associação criminosa (artigo 288, CP ou eventualmente artigo 288, CP c/c
artigo 8º., da Lei 8.072/90). Mas, para isso será imprescindível que haja no mínimo 3 participantes.
Associação criminosa estável ou permanente: É também importante ter em mente que para a
configuração desse ilícito sob comento há necessidade de que a associação criminosa seja estável ou
permanente, visando a prática de “crimes” (no plural). Ou seja, a mera reunião de um grupo para a
prática isolada de um crime, ainda que configurando grupo, esquadrão, organização paramilitar ou
milícia particular, não é suficiente para a tipificação do artigo 288 – A, CP. Observe-se, porém, que
principalmente nos casos de “organização paramilitar” e “milícia particular”, será muito difícil
inexistir tal liame de permanência ou estabilidade, o qual é inerente a essa espécie de grupamento.
108
6. Consumação e Tentativa: A consumação se dá com a efetiva constituição, organização, integração,
manutenção ou custeio dos grupamentos arrolados no dispositivo. Como já frisado, é desnecessária a
prática efetiva de crimes. Basta a formação do grupamento com esse intuito.
A tentativa não é possível, vez que se trata de crime formal, tal qual ocorre com a associação
criminosa.
8. Direito intertemporal: A crime ora previsto pela Lei 12.720/12 é irretroativo, pois que se trata de
“novatio legis incriminadora”.
10. Classificação doutrinária: A constituição de milícia privada é crime simples (ofende um único
bem jurídico); comum (pode ser cometido por qualquer pessoa); formal, de consumação antecipada
ou de resultado cortado (consuma-se com a prática da conduta criminosa, independentemente da
superveniência do resultado naturalístico); de perigo comum (coloca em risco uma pluralidade de
pessoas) e abstrato (presumido pela lei); vago (tem como sujeito passivo um ente destituído de
personalidade jurídica); de forma livre (admite qualquer meio de execução); comissivo; permanente
(a consumação se prolonga no tempo, por vontade dos agentes); plurissubjetivo, plurilateral ou de
concurso necessário (o tipo penal reclama a presença de pelo menos quatro pessoas) e de condutas
paralelas (os agentes buscam o mesmo fim); e obstáculo (o legislador incriminou, autonomamente,
atos que representariam a fase de preparação de outros delitos).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: Parte Especial. 13 ed. São Paulo: Saraiva, 2015, vol. 3
HUNGRIA, Nélson; LACERDA, Romão Côrtes de. Comentários ao Código Penal. 2ª ed. Rio de
Janeiro: Forense, 1954. v. 8
______. Comentários ao Código Penal. 5ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1983. v. 8.
MASSON, Cleber. Direito Penal Esquematizado: Parte Especial. 6.ª ed. rev. e atual – Rio de Janeiro:
Forense; São Paulo: Método, 2014. vol. 2 e vol. 3
NORONHA, E. Magalhães. Direito Penal: dos crimes contra a propriedade imaterial. 26 ed. São
Paulo, Saraiva, 1994. v. 3.
NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 14 ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Forense,
2014.
______. Manual de Direito Penal: Parte Especial. 10ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014.
SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à Constituição. 4ª ed. São Paulo: Malheiros, 2007.
109