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Narrativa:

Elementos Estruturais
Narrativa de ficção

Discurso figurativo inscrito em coordenadas espaço-temporais.

Sucessão temporal de ações (funções).

Narrativa simples: passagem de um estado anterior a um estado


posterior.

Unidade discursiva em que a instância da enunciação projeta


fora de si (“debreagem”) o enunciado dirigido ao enunciatário.
Ato de linguagem que, por um lado, instaura o sujeito, o lugar
e o tempo da enunciação e, por outro lado, a representação
actancial, espacial e temporal do enunciado.
Narrativa

Actantes da enunciação: “eu” (enunciador / narrador) e “tu”


(enunciatário / narratário).

Actantes do enunciado: personagens.

Enunciação enunciada (relatada): narrativas em primeira


pessoa e diálogos.

Enunciado enunciado (objetivado): narrativas em terceira


pessoa.
Narrativa

“Toda narrativa é uma escolha e uma construção” (Todorov).

Construção: [disposição], correlação e integração dinâmica


dos elementos no interior da obra (Tynianov).

Fábula: conjunto de acontecimentos ligados entre si e


expostos na ordem cronológica e causal, independentemente
do modo como estão dispostos na obra. Passagem de uma
situação para outra, caracterizada pelo conflito.

Trama (intriga; enredo): conjunto de acontecimentos na


ordem e sequência com que aparecem dispostos na obra
(construção artística).
Te m á t i c a
Tema: aquilo de que se fala; unidade das significações dos
elementos particulares da obra.

“O processo literário organiza-se em torno de dois momentos


importantes: a escolha do tema e sua elaboração”
(Tomachevski).

Escolha do tema: interesse.

Tema atual: problemas culturais do momento – interesse


temporário.

Tema universal: problemas humanos permanentes (em


matéria ligada à atualidade).
Te m á t i c a

“O tema atrai, a atenção retém” (Tomachevski).

“Suscitar uma emoção é o melhor meio para cativar a


atenção” (Tomachevski).

O tema da obra decompõe-se em motivos.

Motivos: partículas temáticas indecompostas (“A noite caiu”;


“Raskolnikov matou a velha”; “uma carta chegou”; etc.)
Te m á t i c a

Motivos associados (concernentes à fábula): aqueles que não


podem ser excluídos da narrativa sob pena de comprometer os
nexos de causa e efeito. São motivos dinâmicos, modificadores
das situações.

Motivos livres (concernentes à trama): constituem reforços da


narrativa, que desempenham funções como a de caracterizar
uma ação, um personagem, um ambiente etc. São motivos
estáticos, que não modificam as situações (p. ex., as
descrições).
Motivação

Motivação: sistema de procedimentos que justifica a


introdução de motivos (todo motivo particular ou cada
conjunto de motivos deve ser justificado).

a) Composicional: nenhum acessório deve ficar inutilizado.


Se no início de um conto diz-se que há um prego na parede,
é nesse prego, por exemplo, que o herói deve se enforcar
(Tchekhov).

b) Caracterizadora: confirma um estado de coisas ou a ele


se opõe (homóloga ou heteróloga).

c) Falsa: despistamento.
Partes da narrativa (virtual)

Situação inicial: estado de equilíbrio.

Nó: motivo ou conjunto de motivos que instaura um conflito


(tensão), violando a situação inicial e desencadeando a ação.

Peripécia: motivo ou conjunto de motivos que determina a


passagem de uma situação a outra.

Clímax: ponto culminante da tensão.

Desfecho (desenlace): supressão da tensão e superação dos


conflitos.
Modos de apresentação da ação

Objetiva / Subjetiva

Sumário: presente (in medias res), passado


(flashback) ou futuro (flashforward).

Cena: diálogo (modo dramático); discurso indireto;


discurso indireto livre; monólogo interior; fluxo de
consciência.
Te m p o

Mítico ou fabuloso

Cronológico

Psicológico
Espaço
Exterior

Interior

Ambientação
Franca: descrição dos elementos espaciais pelo narrador.

Reflexa: percepção dos elementos espaciais através das


personagens.
O NARRADOR E O PONTO DE VISTA
Deveria ser a primeira preocupação do escritor escolher
deliberadamente a mente que refletirá a sua, como se escolhe
o local para uma edificação [...] e, isso feito, viver dentro da
mente escolhida, tentando sentir, ver e reagir exatamente
como faria esta, não mais, não menos, e, acima de tudo, não
de outra forma. Só assim poderá o escritor evitar a atribuição
de incongruências [...] ao intérprete escolhido.

Edith Wharton, The Writing of Fiction, 1925.


O Problema do Narrador

1) Quem fala ao leitor?

a) Narrador em primeira pessoa.

b) Narrador em terceira pessoa.


O Problema do Narrador

2) De que posição (ângulo; perspectiva) ele conta a estória?

a) De fora.

b) Da periferia.

c) Do centro.

d) De frente ou de outros ângulos.

e) Alternando.
O Problema do Narrador

3) Que canais de informação ele usa para transmitir a estória


ao leitor?

a) Palavras, pensamentos, percepções, sentimentos e


ações do narrador.

b) Palavras, pensamentos, percepções, sentimentos e


ações dos personagens.

Observação: as informações sobre tempo, espaço e personagens vêm por


intermédio das possíveis combinações dessas possibilidades.
O Problema do Narrador

4) A que distância ele coloca o leitor em relação à estória?

a) Próximo.

b) Distante.

c) Alternando.
Modalidades de Elocução

1) Sumário: modo comum de narrar; relato generalizado de


eventos, que cobre certa extensão de tempo e uma
variedade de locais.

O velho Mr. Pontifex se casara em 175O; durante quinze anos,


porém, a mulher não lhe deu filhos. No fim desse período, Mrs. Pontifex
assombrou a aldeia inteira, apresentando sinais evidentes de que
pretendia presentear o esposo com um herdeiro ou herdeira. Já há muito
tempo considerava-se o seu caso irremediável; e quando ela foi consultar o
médico a respeito de certos sintomas, inteirando-se do que significavam,
chegou a injuriar o doutor, tal foi sua zanga.

Samuel Butler (1835-1902), Destino da Carne, abertura do cap. II,


trad. Rachel de Queiroz, Rio de Janeiro, José Olympio, s.d.
Modalidades de Elocução

2) Cena: modo de mostrar os eventos diretamente ao leitor.

A chuva parou, quando Nick entrou no caminho que


atravessa o pomar. As frutas já haviam sido colhidas, e o
vento outonal soprava através das árvores nuas. Nick parou e
apanhou ao lado do caminho uma maçã Wagner, que a chuva
pusera a brilhar no capim escuro. Colocou a maçã no bolso da
japona tipo Mackinaw.
Ernest Hemingway (1899-1961), “Ventania de Três Dias”, Contos de
Hemingway, trad. A. Veiga Fialho, Rio de Janeiro, Civilização
Brasileira, 1965.
Modalidades de Elocução

3) Digressão: desvio momentâneo do assunto da estória.

Negar a existência de uma paixão de que vemos amiúde


exemplos manifestos parece assaz estranho e absurdo, e, em realidade, só
pode provir da autocensura a que acima nos referimos; mas como é
injusto! Deverá o homem que não encontra em seu coração traços de
avareza ou de ambição concluir daí que essas paixões não existem na
natureza humana? Por que não haveremos de obedecer modestamente à
mesma norma no julgar assim do bem como do mal nos outros? Ou por
que, de qualquer maneira, haveremos, como diz Shakespeare, de “pôr o
mundo em nossa pessoa”?

Henry Fielding (1707-1754), Tom Jones, trad. Octávio Mendes


Cajado, São Paulo, Abril Cultural, 1971, p. 158.
Narrador

Instância do discurso que seleciona, ordena e instaura as


coordenadas actanciais, temporais e espaciais da enunciação e
do enunciado.

Narrativas em primeira pessoa: o narrador participa da


estória narrada.

Narrativas em terceira pessoa: o narrador não participa da


estória narrada.
Narrativas em Primeira Pessoa

✓ O narrador mantém uma relação sincrética com um


personagem da estória.

✓ Narrador-personagem ≠ personagem que se torna


narrador.
✓ Narrador-personagem: manifesta-se no tempo e lugar da
enunciação.

✓ Personagem (inclusive o que é ou se torna narrador):


manifesta-se no tempo e lugar do enunciado.

✓ Narrador-personagem: protagonista ou testemunha.


Narrador-protagonista

O meu fim evidente era atar as duas pontas da vida, e


restaurar na velhice a adolescência. Pois, senhor, não
consegui recompor o que foi nem o que fui. Em tudo, se o
rosto é igual, a fisionomia é diferente. Se só me faltassem os
outros, vá; um homem consola-se mais ou menos das pessoas
que perde; mas falto eu mesmo, e esta lacuna é tudo.

Machado de Assis (1839-1908), Dom Casmurro, prefácio de Ivan


Teixeira, São Paulo, Martins Fontes, 1988, p. 6.
Narrador-protagonista

✓ Projeta-se, como personagem, no centro dos


acontecimentos de uma estória já decorrida.

✓ Expõe ou comenta os acontecimentos segundo a


perspectiva de sua mente, na condição de enunciador
(narrador) da enunciação e do enunciado.

✓ Pode apresentar suas ideias e emoções diretamente ao


leitor, quer na condição de narrador, quer na de
personagem.
Narrador-protagonista
✓ Sabe muito de si, mas, de outros personagens, só sabe
aquilo que é dado à sua observação ou o que lhe é
revelado; porém, pode conjecturar ou especular sobre
pensamentos e sentimentos deles.

✓ Pode apresentar os acontecimentos sob perspectivas


variadas, por meio, por exemplo, de depoimentos orais ou
escritos de outros personagens, aos quais teve acesso
direta ou indiretamente.

✓ Conforme se valha da digressão, do sumário ou da cena,


alarga ou encurta a distância entre o leitor e o enunciado
ou entre o leitor e a enunciação.
Narrador-testemunha

Talvez o leitor prefira interromper esta leitura julgando-me um


intrometido incurável quando eu confessar o quanto aquele homem
estimulava minha curiosidade e quantas vezes tentei vencer suas
reticências em tudo o que dissesse respeito a si próprio. Antes de
pronunciar minha sentença, porém, deixem-me lembrá-los de como
minha vida era sem objetivo, de quão pouco havia para invocar minha
atenção. Devido a meu estado de saúde eu estava impossibilitado de
aventurar-me fora de casa quando o clima estivesse menos que
magnífico; não tinha amigos que me visitassem para quebrar a monotonia
de minha existência diária. Nessas circunstâncias, acolhi com entusiasmo
o pequeno mistério que envolvia meu companheiro e passava boa parte
do tempo tentando decifrá-lo.

Conan Doyle (1859-1930), Um Estudo em Vermelho, trad. Heloisa


Jahn, São Paulo, Ática, 1996, p. 29.
Narrador-testemunha

✓ Projeta-se, como personagem, na periferia dos aconteci-


mentos de uma estória já decorrida.

✓ Expõe ou comenta os acontecimentos segundo a


perspectiva de sua mente, na condição de enunciador
(narrador) da enunciação e do enunciado.

✓ Pode apresentar suas ideias e emoções diretamente ao


leitor, quer na condição de narrador, quer na de
personagem.
Narrador-testemunha
✓ Sabe muito de si, mas, de outros personagens, só sabe
aquilo que é dado à sua observação ou o que lhe é
revelado; porém, pode conjecturar ou especular sobre
pensamentos e sentimentos deles.

✓ Pode apresentar os acontecimentos sob perspectivas


variadas, por meio, por exemplo, de depoimentos orais ou
escritos de outros personagens, aos quais teve acesso
direta ou indiretamente.

✓ Conforme se valha da digressão, do sumário ou da cena,


alarga ou encurta a distância entre o leitor e o enunciado
ou entre o leitor e a enunciação.
Onisciência

✓ Narrativa em terceira pessoa.

✓ Ponto de vista ilimitado.

✓ A estória pode ser vista de um ou de todos os ângulos.

✓ O narrador escolhe livremente qualquer ângulo ou a


alternância de um a outro.
Narrador Onisciente Intruso

Na imprudente execução do prudente plano de coisas,


o apelo raramente traz o esperado, o homem a amar
raramente coincide com a hora do amor. [...] Basta dizer que,
no presente caso, como em milhões, não foram as duas
metades de um todo aparentemente perfeito que se defron-
taram no momento perfeito [...]. Desastrado atraso de que
brotariam ansiedades, desapontamentos, sustos, catástrofes,
e mais que estranhos destinos.

Thomas Hardy (1840-1928), Tess, trad. Nei R. da Silva, Belo


Horizonte, Itatiaia, 1984, final do cap. V.
Narrador Onisciente Intruso

✓ Posiciona-se fora da estória.

✓ Ponto de vista ilimitado.

✓ Predomínio da voz narrativa, que se pronuncia, frequente-


mente, por meio de um “eu” ou “nós”.

✓ Predominância do sumário sobre a cena.

✓ A estória pode ser vista de um ou de todos os ângulos.

✓ O narrador escolhe livremente qualquer ângulo ou a


alternância de um a outro.
Narrador Onisciente Intruso

✓ O narrador sabe mais que o personagem.

✓ O leitor tem acesso a toda amplitude de informações


possíveis sobre ideias e emoções dos personagens e do
próprio narrador .

✓ O narrador tende a apresentar comentários às atitudes e ao


que se passa na mente do personagem.

✓ O narrador tece comentários mais ou menos relacionados


com a estória (digressões).
Narrador Onisciente Neutro

Uma noite do mês de agosto (tinha então dezoito


anos), levaram-na à festa de Colleville. Logo de início ficou
tonta, estupefata com o estrépito das rabecas, as luminárias
nas árvores, o colorido das roupas, as rendas, as cruzes
douradas, aquela massa de gente saltitando ao mesmo tempo.
Estava à parte, modestamente, quando um rapaz de aparência
abastada e que fumava seu cachimbo com os dois cotovelos
sobre o varal de uma carroça veio convidá-la para dançar.

Gustave Flaubert (1821-1880), “Um Coração Simples”, Três Contos,


trad. Milton Hatoum e Samuel Titan Jr., São Paulo, Cosac Nayf, 2004,
p. 17.
Narrador Onisciente Neutro

✓ Posiciona-se fora da estória.

✓ Ponto de vista ilimitado.

✓ Impessoalidade (objetividade) do narrador; evita-se a


digressão.

✓ Predominância do sumário sobre a cena.


Narrador Onisciente Neutro

✓ A estória pode ser vista de um ou de todos os ângulos.

✓ O narrador escolhe livremente qualquer ângulo ou a


alternância de um a outro.

✓ O narrador sabe mais que o personagem.

✓ O leitor tem acesso a toda amplitude de informações


possíveis sobre ideias e emoções dos personagens, mas
raramente do próprio narrador.
Onisciência Seletiva

Era preciso achar um meio de escapar a tudo aquilo.


Devia haver uma forma mais simples, menos complicada,
suspirou ela [Sra. Ramsey]. Quando se olhou no espelho, viu
os cabelos grisalhos, a face abatida, aos cinquenta anos, e
pensou: poderia ter conduzido melhor as coisas – seu marido,
o dinheiro, os livros dele.

Virgínia Woolf (1882-1941), Passeio ao Farol, trad. Luiza Lobo, Rio de


Janeiro, Nova Fronteira, 1982.
Onisciência Seletiva
✓ A estória parece vir diretamente da mente de um
personagem ou de alguns poucos (onisciência seletiva
múltipla).

✓ Predomínio da cena no interior ou exterior das mentes.

✓ Os sumários são fornecidos de modo discreto pelo


narrador ou emerge por meio das palavras e pensamentos
dos personagens.

✓ Na onisciência comum, o narrador conta o que se passa na


mente das personagens; na seletiva, ele mostra os estados
internos por meio do discurso indireto livre, do monólogo
interior e do fluxo de consciência.
O Modo Dramático
Brigid O’Shaughnessy, com a mesma roupa que usara em sua
primeira visita ao escritório, levantou-se de uma cadeira ao lado da
escrivaninha e veio depressa na direção de Spade.
— Alguém esteve no meu apartamento — explicou ela. — Está
tudo revirado, em todos os cantos.
Ele mostrou-se moderadamente surpreso.
— Levaram alguma coisa?
— Acho que não. Não sei. Tive medo de ficar lá. Troquei de roupa
o mais depressa que pude e vim para cá. Ah, você deve ter deixado aquele
rapaz segui-lo até lá!
Spade balançou a cabeça.
— Não, meu anjo. — Pegou no bolso um exemplar de um jornal
vespertino, abriu-o e mostrou para Brigid um quarto de coluna com o
título: GRITO PÕE LADRÃO PARA CORRER.

Dashiell Hammett (1894-1961), O Falcão Maltês, trad. Rubens


Figueiredo, São Paulo, Companhia das Letras, 2001, p. 133.
O Modo Dramático

✓ Apagamento ou ocultamento do narrador.

✓ As informações disponíveis ao leitor limitam-se em grande


parte ao que os personagens fazem e falam, nunca há
indicação sobre o que eles percebem, o que pensam ou
sentem, exceto quando são manifestos em suas
declarações. Os estados mentais só podem ser inferidos a
partir da ação e do diálogo.

✓ A apresentação é eminentemente cênica.


Escolhas

✓ Narrador-protagonista: quando a intenção é a de traçar o


crescimento de uma personalidade à medida que ela
reage a experiências.

✓ Narrador-testemunha: quando a situação deve ser


gradualmente armada e revelada pouco a pouco, com
destaque para o elemento de suspense.

✓ Modo dramático: quando o propósito é produzir na mente


do leitor uma ilusão de presença, como a do espectador
no teatro.
Escolhas
✓ Narrador onisciente intruso: quando a personalidade do
narrador possui função definida a preencher em relação à
estória.
✓ Narrador onisciente neutro: quando o propósito é o de
revelar livremente e à vontade a mente de muitos
personagens com maior objetividade ou impessoalidade.

✓ Onisciência seletiva múltipla: quando o propósito é o de


mostrar como personalidade e experiência emergem, na
forma de um mosaico, a partir do choque entre as
sensibilidades de diversos indivíduos.
✓ Onisciência seletiva simples: quando o intento é o de
acompanhar uma mente em um momento de descoberta.
PERSONAGENS
“[Personagens] não são reais porque se parecem conosco
(embora talvez se pareçam, de fato), e sim porque são
convincentes. [... Um personagem] é real quando o romancista
sabe tudo acerca dele. O romancista pode escolher não nos
contar tudo o que sabe – muitos fatos podem ser omitidos
[...]. Ainda assim, ele vai nos deixar com a sensação de que,
apesar de o personagem não ter sido explicado, ele é
explicável, e com isso se estabelece uma espécie de realidade
que nunca encontraremos na vida diária.
“Porque, quando contemplamos os relacionamentos
humanos em si mesmos, e não como uma circunstância social,
notamos que eles parecem assombrados por um espectro.
Não conseguimos nos entender bem uns aos outros, a não ser
de um modo precário e superficial; não podemos nos revelar,
mesmo quando o desejamos; isso que chamamos de
intimidade não passa de uma improvisação; o conhecimento
perfeito é uma ilusão.
“Nos romances, porém, conseguimos conhecer as pessoas
perfeitamente, e, além do prazer normal da leitura, podemos
encontrar aqui uma compensação pela falta de clareza da
vida. Neste sentido, a ficção é mais verdadeira do que a
história, porque ultrapassa as evidências, e todos nós sabemos
por experiência própria que existe algo além das evidências;
caso o romancista não tenha conseguido mostrar isso da
maneira certa, tudo bem – pelo menos ele tentou. [...]
“E é por isso que os romances, mesmo quando tratam de
pessoas perversas, podem nos servir de consolo: eles sugerem
uma raça humana mais compreensível e, portanto, mais
manejável, e nos oferecem uma ilusão de perspicácia e poder.”
E. M. Forster, Aspectos do Romance, trad. Sérgio Alcides, São Paulo,
Globo, 2005, pp. 86-87.
Personagens Planos

✓ Alegorias, tipos ou caricaturas.

✓ Na forma mais pura, são construídos ao redor de uma


ideia ou qualidade simples.

✓ Facilmente reconhecíveis e lembrados.

✓ Não se modificam pelas circunstâncias.

✓ Não surpreendem.

✓ Não podem ser trágicos.


Personagens Redondos

✓ Indivíduos complexos.

✓ Apresentam densidade psicológica manifesta ou sugerida.

✓ São construídos em conexão com as situações que os


modificam.

✓ São surpreendentes.

✓ Só personagens redondos podem atuar tragicamente.

✓ Apresentam sugestão simbólica (no sentido goethiano).

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