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“...SCRIPTA MANENT!

” A ESCRITA E SUAS CARACTERÍSTICAS

Como disse Marcuschi, um dos maiores linguistas do Brasil, o homem fala desde seu surgimento e seu
nascimento, mas a escrita existe a “apenas” cinco mil anos aproximadamente e, certamente passamos
mais tempo de nosso dia falando que escrevendo. Então, por que escrever é algo tão importante? O que é
a escrita? Quais suas características? Existe uma forma certa de escrever? Vamos agora conhecer um
pouco mais sobre esse universo que é a escrita... (por Fco EDMAR CIALDINE Arruda)

PRA COMEÇO DE CONVERSA...

Existe um ditado em latim que diz “verba volant, scripta


manent”, isto é, “as palavras voam, os escritos permanecem”. Este

ditado, apesar de ter uns dois mil anos, retrata muito sociedade grafocêntrica
o que vemos hoje em dia sobre a escrita. Vivemos em A ideia de uma sociedade
uma sociedade grafocêntrica, que supervaloriza a grafocêntrica se opõe a de uma
sociedade ágrafa, isto é, de uma
palavra escrita. Mas isso não é à toa. Sem entrar na
sociedade cuja língua não possui
discussão agora sobre a relação entre fala e escrita, nenhum registro escrito. Acreditamos
podemos dizer que a escrita foi a maior revolução que apenas 10% de todas as línguas
tecnológica que existiu na história da humanidade. A do mundo possuem uma forma de
registo escrito. A exemplo disso,
partir dela nós dividimos a história e a pré-história, por
poderíamos citar as várias línguas
muito tempo ela foi a única forma de registrar a língua indígenas no Brasil. Então, uma
para a posteridade. Se considerarmos as pinturas sociedade grafocêntrica é uma
rupestres uma forma de escrita, poderíamos dizer que sociedade que valoriza a escrita
acima da oralidade (sendo até mesmo
a escrita foi a primeira forma de registro da linguagem uma condição de ascensão social o
e, ainda hoje, ela é a principal. domínio da norma padrão da escrita).
Assim, sua importância é inegável. No
relação entre fala e escrita
A fala e a escrita são duas formas diferentes entanto, não basta apenas escrever, ou
de representação da língua. Não sendo formas melhor, colocar uma série de letras
opostas, elas se inter-relacionam em um formando palavras e estas formando frases.
continuum do mais oral para o mais escrito.
É preciso saber escrever bem. É preciso
Por exemplo, uma conversa de Whatsapp,
apesar de escrita, possui muitas influências da saber escrever de acordo com o contexto, o
oralidade. Por outro lado, um discurso de um objetivo e quem vai ler. E é aí que mora o
político, ainda que ele esteja falando, é um problema. Ainda que a escrita esteja cada
texto com fortes características escritas. Para
vez mais universalizada, a qualidade e
mais informações sugerimos a leitura de “Da
fala para a escrita: atividades de adequação do que se escreve muitas vezes
retextualização”, de Luiz Antônio deixa a desejar. Isso é um reflexo dos
Marcuschi. problemas sociais, educacionais e políticos
que existem no Brasil. Infelizmente, não será com esse texto que
iremos resolver isso – quem dera fosse possível – mas, quem sabe,
podemos dar uma contribuição e estimular a cada um fazer sua parte.
Desse modo, iremos apresentar aqui uma visão geral sobre a
escrita e suas características. Boa Leitura!
MAS, AFINAL, O QUE É A ESCRITA?

Definir um conceito tão abrangente como a escrita não é tarefa fácil. Se


partirmos, por exemplo, de dois dicionários comuns de língua portuguesa teremos:

MINIDICIONÁRIO AURÉLIO DICIONÁRIO ILUSTRADO DE


DO SÉCULO XXI PORTUGUÊS (BIDERMAN)
ESCRITA Representação de palavras as Representação das palavras os
ideias por sinais; escritura textos da linguagem por meio de
letras e símbolos escritos
ESCREVER Representar por meio da escrita Fazer letras, palavras e frases
sobre o papel ou outra superfície
para exprimir ideias e
sentimentos.

Notemos que a definição da escrita está muito relacionada com sua função de
representação gráfica de uma língua. Sigamos adiante e vejamos o que diz o
Dicionário de Linguística de Jean Dubois e outros na página 222:

A escrita é uma representação da língua falada por meio de signos gráficos.


Trata-se de um código de comunicação de segundo grau com relação a
linguagem, que por sua vez é um código de comunicação de primeiro
grau. A fala se desenrola no tempo e desaparece; a escrita tem como
suporte o espaço, que a conserva. O estudo do diferentes tipos de
escrita elaborados pela humanidade tem portanto íntima relação com
o estudo da língua falada, assim como com das civilizações nas
quais elas se aperfeiçoaram. Um estudo da escrita deve desenvolver-
se em dois planos paralelos: de um lado um estudo histórico da
escrita, desde sua “invenção” até seus estados atuais; de outro lado,
um estudo linguístico, que tenta extrair as regras de funcionamento
da escrita, assim como suas relações com a língua falada.

Se compararmos as três definições, iremos perceber que, enquanto as duas


primeiras falam de representação de ideias e da linguagem, a terceira não deixa
margem para dúvidas: A escrita é uma representação da fala. E ainda relaciona o estudo
da escrita com o estudo da fala e das civilizações Walter Ong
humanas. Seguindo a mesma linha de raciocínio e Walter Jackson Ong (30/11/1912-
complementando, Walter Ong, 12/08/2003) foi um jesuíta americano
em seu livro Oralidade e cultura que desenvolveu vários estudos no
campo da Oralidade e Escrita e como
escrita: a tecnologização da ambas influenciam o pensamento e a
palavra defende que a escrita é cultura dos povos – principalmente na
uma tecnologia, isto é, uma obra aqui citada. Segundo ele, um
ferramenta que moldou e capacitou a atividade indivíduo originário de uma sociedade
oral, ao ser inserido plenamente em
intelectual do homem moderno. Mais que um uma sociedade letrada perderia a sua
desenho ou representação de coisas, a escrita é a percepção original do mundo. Tais
representação de palavras que alguém diz ou se estudos, de acordo com Ong,
imagina que diz. ajudariam a compreender tanto a
cultura impressa quanto a atual
Muitos outros estudiosos defendem essa cultura eletrônica.
importância da escrita, chegando a afirmar que ela
é mais importante que a oralidade por organizar, concretizar e registrar o pensamento
humano. Ora, como já mencionamos acima, a escrita não se sobrepõe à fala, mas
ambas são formas diferentes de manifestação da linguagem.
Por fim, ficaremos aqui com esse conceito, de que a escrita é uma forma de
registro gráfico de uma língua – ainda que possa parecer uma ideia muito simples.

ambas são formas diferentes de manifestação da linguagem


Sugerimos aqui uma série de três vídeos intitulados “Fala e
Escrita” do canal do Youtube CEELUFPE (Centro de Estudos
em Educação e Linguagem da UFPE) em que Luiz Antônio
Marcuschi e Ângela Paiva Dionísio discutem sobre Oralidade,
Escrita e a relação entre ambas. Vale à pena conferir!

NO PRINCÍPIO ERA A PALAVRA... OU O DESENHO?

A escrita surgiu, como podemos imaginar, da necessidade do ser humano de se


comunicar, principalmente em situações que exigiam tempo e distância. Como já
mencionamos, as primeiras tentativas de registro foram as pinturas rupestres que
datam mais de 70 mil anos atrás. Esses desenhos eram semelhantes aos objetos que
representavam e deram origem aos pictogramas, formas gráficas mais ou menos
estilizadas que representavam objetos ou mesmo frases como, por exemplo, os sinais
de trânsito hoje.
A partir de então, podemos citar a escrita cuneiforme e os hieróglifos
egípcios como as mais antigas formas de registro da língua, ambas da região do
oriente médio. Também muitas línguas
orientais possuem uma forma de registro,
os ideogramas, que são antigos e
anteriores ao surgimento da escrita
alfabética. Nessas formas de escrita, cada
símbolo pode representar uma palavra, um
elemento morfológico ou mesmo um som.
Na verdade, existem várias e
diferentes formas de registros da língua
além da escrita alfabética e a ideográfica,
por exemplo: o abjad e o abugida. O
primeiro é a forma de registro de línguas
semitas como o árabe e o hebraico. Neste
caso, o registro é feito essencialmente das
consoantes, sendo as vogais acrescentadas
pelo contexto. Seria como se escrevêssemos “BRSL”, mas lêssemos “Brasil”. Já no
sistema abugida, os símbolos podem representar sílabas ou fonemas.
No caso da escrita alfabética, temos, como exemplo, o alfabeto latino, o alfabeto
grego, o alfabeto cirílico (das línguas eslavas) etc. No nosso caso, o alfabeto latino
surgiu a partir do alfabeto grego ocidental (que era diferente do grego clássico). Este,
por sua vez, derivou do alfabeto fenício. A partir do domínio romano na Europa, norte
da África e Oriente Médio, o alfabeto latino se expandiu e hoje pode ser considerado a
principal forma de registro do mundo ocidental.
NO PRINCÍPIO ERA A PALAVRA... OU O DESENHO? (PARTE 02, O RETORNO)

Uma das questões mais interessantes da escrita é que a história do surgimento


da escrita na humanidade e o surgimento da escrita para a criança guardam em si
muitas semelhanças. O processo de aquisição da escrita geralmente segue etapas
descritas por vários pesquisadores. Podemos destacar aqui Emília Ferreiro e Ana
Teberosky, autoras do livro “A psicogênese da língua escrita”. Elas descrevem esse
processo em 5 etapas:

Nível 1 Pré-silábico Durante esse período a criança começa desenhando, com uma escrita
pictórica, chegando a usar símbolos (pseudoletras). Aos pouco ela
começa a diferenciar letras, números e desenhos.
Nível 2 Intermediário 1/ Essa é uma fase de questionamento da criança. Ela começa a perceber a
Pré-silábico 2 relação entre letra e fonema e cria a ideia de que para escrever é preciso
muitas e diferentes letras.
Nível 3 Silábico Durante este período a criança associa cada som a uma sílaba e a esta
uma letra, ou seja, ela busca dar um valor sonoro para cada símbolo
escrito.
Nível 4 Intermediário 2/ Novamente a criança se questiona sobre o que entenderam na fase
Silábico-alfabético anterior. Então ela começa a ir para além da sílaba. Há um conflito
entre a sílaba e a quantidade de palavras.
Nível 5 Alfabético Por fim a criança passa a começar a entender a lógica da escrita
alfabética. Ela diferencia letra, sílaba, palavra e frase. Mas sua escrita é
fonética, logo, a partir de então, ela vai apenas se adequar à ortografia
da sua língua.

Notemos que, no quadro acima, não


consta a idade. De fato, existem vários fatores
que podem influenciar no processo de
desenvolvimento da escrita – até mesmo o tipo
de escrita (imaginemos como deve ser esse
processo em países orientais, onde a escrita é
ideográfica!?).
Um outro detalhe importante é que esse
processo acima, como podemos
principalmente ler nos níveis intermediários,
ocorre essencialmente através da criação e conflito de hipóteses. A criança, a cada
estágio, se questiona sobre o que ela acreditava antes, testa, confirma ou cria uma
nova hipótese. Vale muito à pena acompanhar de perto quando temos contato com
crianças pequenas em nosso dia a dia e registrar de alguma forma. Nesse sentido, o
papel do professor, muitas vezes, acaba sendo o de orientador, de guia nessa
caminhada.

ESCRITA E FALA OU ORALIDADE E LETRAMENTO?

Historicamente, a palavra escrita guarda uma relação muito próxima com a


palavra falada. Por muito tempo, escrever era algo tão elitizado que chegava a ser algo
místico. Nas sociedades antigas, eram os sacerdotes os principais usuários da escrita.
Mesmo com a invenção da imprensa por Gutenberg, invenção da imprensa por
quando o acesso a textos escritos começou Gutenberg
a se universalizar, a escrita continuou Johannes Gutenberg foi
mantendo uma importância acima da fala. um alemão que, em 1440,
inventou uma máquina a
Porém, há exceções. Como já mencionamos, base de tipos móveis, isto
há grupos sociais ágrafos, isto é, sem uma é pequenos blocos de
madeira com letras em alto
escrita e também, houve contrato verbais relevo. Na verdade, ele
períodos em que a Um contrato verbal é um contrato não foi o primeiro a usar
essa tecnologia no mundo,
palavra dita, uma simples, combinado oralmente entre
mas ele a aperfeiçoou e
promessa feita, era mais duas ou mais pessoas. Ainda que sejadifundiu na Europa, tanto
difícil comprovar sua existência, a lei
importante. Não à toa, permite que o contrato verbal possa que, cinquenta anos depois
contrato verbais podem ser comprovado por quaisquer meios já existiam quase trezentas
cidades com oficinas de
ser juridicamente aceitos. juridicamente admitidos como, por
imprensa.
Mas antes de darmos exemplo, testemunhas, confissões,
atos processados em juízo etc.
continuidade é
importante esclarecer alguns termos importantes...
A representação da língua pode ser feita de duas formas: através do registro
escrito e através da produção sonora. Logo a fala e a escrita são dois modos, isto é,
duas maneiras distintas de como produzimos um texto, de como usamos a língua. Este
texto, por exemplo, faz parte da modalidade escrita, na medida em que estamos
escrevendo ou lendo. Porém, caso a leitura seja feita em voz alta, então, o que
estamos falando já passa a fazer parte de outra modalidade, a falada ou oral. Da
mesma forma, se estamos conversando ou debatendo, o que se está sendo produzido
faz parte dessa modalidade oral. Lembremos de nossas aulas de língua estrangeira, as
atividades de pronúncia... modalidade oral! No entanto há uma clara diferença entre
pedirmos para um aluno, digamos, ler um texto em inglês e pedir que responda nossa
pergunta em inglês. No primeiro caso, estamos apenas oralizando, isto é, repetindo
algo que já foi feito escrito, porém falando. Já no segundo caso, temos uma atividade
que trata de Oralidade.
A Oralidade está ligada ao uso da língua. Ao fazermos uso dela, nós falamos,
gesticulamos, damos pausa, mudamos o tom de voz etc. Ela possui recursos que são
próprios. Então, tenhamos atenção para uma coisa: se para Oralidade é preciso que
falemos; apenas falar, ou melhor, oralizar, não significa que estamos fazendo uso da
Oralidade. Sempre será preciso observar, além do modo de reprodução oral, a
concepção do texto.
Concepção do texto P
Dois aspectos importantes, ao pensarmos
em um texto, é saber seu meio de produção
e sua concepção, ou melhor, como a ideia
do texto nasce. Muitas vezes, quando lemos
uma entrevista em uma revista não paramos
para pensar que aquilo é, na verdade, a
transcrição gráfica de algo que se realiza
oralmente. De mesmo modo, em um
noticiário de rádio ou televisão, a notícia
que está sendo divulgada é, geralmente,
escrita para que o apresentador leia em um
papel ou em uma tela. São essas questões
que nos levam a discutir o continuum entre
oralidade e escrita defendida por linguistas
como Marcuschi.
Por fim, é preciso apresentar a noção de Letramento/ Multiletramentos
Letramento. O Letramento está relacionado às Para um aprofundamento sobre o
nossas práticas sociais e atividades tema, sempre sugerimos a leitura de
“Letramento: um tema em três
do dia a dia. Durante nossa vida,
gêneros” de Magda Soares. O livro
fazemos uso da língua em várias trata, em três textos diferentes sobre
situações e por vários e diferentes os conceitos de letramento,
motivos. Dominar os diversos usos alfabetização, como surgiram e suas
importâncias. É uma leitura
possíveis da língua nas diversas fundamental para todo profissional da
relações sociais é ter um bom nível de Letramento. educação básica que trabalha com
Em realidade, hoje em dia, não tratamos mais de língua portuguesa. Porém, com
Letramento, mas sim de LetramentoS (no plural) ou avanço da tecnologia e das novas
formas e usos da linguagem, não
mesmo Multiletramentos. Isso para retratar a podemos tratar do letramento como
grande variedade de usos da linguagem nas algo único, mas como algo múltiplo.
práticas sociais do dia a dia. Há um letramento para se usar
A partir de tudo isso, podemos perceber que imagens e cores, para se usar textos
digitais etc. Por exemplo: para se
a fala, a escrita, a Oralidade e o Letramento vão se produzir um anúncio publicitário em
inter-relacionando. Não se pode conceber hoje em uma página na internet, não basta ter
dia a língua escrita de um lado e a falada de outro letramento linguístico. É preciso
como se elas fossem totalmente separadas. As letramento digital e mesmo
letramento visual, ou seja, um
redes sociais virtuais como, por exemplo o domínio do uso de imagens e recursos
Whatsapp mudaram a forma de ver a língua: ao de textos eletrônicos.
mesmo tempo que estamos escrevendo para Whatsapp
alguém, estamos Com o desenvolvimento da
conversando como se tecnologia e da internet, os estudos
ela estivesse do linguísticos se voltaram para os textos
digitais, mais especificamente os
nosso lado, isto é, hipertextos. Eles possuem inúmeros
como se recursos que não eram possíveis
estivéssemos utilizar antes em textos no papel. Por
falando. Não à toa a exemplo, em um dicionário eletrônico
é possível, com o recurso de um
forma de uso da clique, ouvirmos como se pronuncia
língua nesse caso uma palavra em outra língua. Além
ficaria em um meio disso, há o uso de meios que
termo entre a língua permitem a conversa em tempo real –
como é o caso do whatsapp. É um
escrita e a língua verdadeiro oceano para quem quer se
falada. especializar nessa área.
Tudo isso vai
influenciar e muito a nossa noção de texto. Como defende Marcuschi, existem texto
que são mais próximos da realidade escrita e outros que são mais próximos da
realidade falada e existem aqueles que estão no meio do caminho. Da mesma forma
há aqueles que são mais formais que outros. Vejamos aqui um quadro que resume
isso:
Procuremos localizar acima em que posição fica um bilhete, uma lei, uma
conversa espontânea, uma exposição acadêmica, uma notícia de rádio ou de TV. Isso
gera um excelente debate! Agora, para que esse debate seja realmente fértil,
precisamos falar sobre gêneros textuais....

GÊNERO TEXTUAL, TIPO TEXTUAL E DOMÍNIO DISCURSIVO

É impossível falar sobre escrita, leitura, oralidade, textos etc sem levar em conta
alguns conceitos fundamentais da Linguística Textual. Na verdade, uma boa educação
linguística passa, necessariamente pelos trabalhos com os mais diversos textos.
Devemos cuidar para que nossos alunos tenham acesso a esses textos diferentes,
possam compreendê-los e produzi-los. A esses textos diferentes, nós os chamamos de
gêneros textuais.
Quando utilizamos a língua, sempre fazemos isso através de um texto, ou
melhor, de um gênero textual. Quando damos aulas, produzimos slides de uma
apresentação, fazemos a lista de compras... sempre há um gênero textual envolvido. E
esse gênero textual tem um formato que é mais ou menos fixo – um formato que é
comum, mas que possui uma certa flexibilidade; e, claro, esse formato tem o objetivo
de cumprir uma função comunicativa. Forma e função são, assim, as duas palavras
chaves para se entender o que é um gênero textual.
Geralmente, quando falamos em gêneros textuais, nós nos referimos a eles
como “tipos”. Porém, na verdade, “tipos textuais” é um outro conceito. Ao falarmos de
tipos textuais estamos nos referido a sequências estruturais de um texto.
Exemplificando, se pegamos uma carta pessoal – isto é um gênero – e, nessa carta
começamos a descrever o dia de hoje, logo temos um tipo textual descritivo, cheio de
adjetivos e substantivos etc. Mas então, no parágrafo seguinte, afirmamos que isso nos
lembra uma história e começamos a contar, na ordem cronológica, usando advérbios
de tempo para isso e as formas verbais... temos um tipo textual narrativo. No meio da
história, que envolve um prato, explicaamos passo a passo como se cozinha esse
prato, tipo textual injuntivo, com seus verbos no imperativo. Então, com isso,
podemos perceber o que são gêneros textuais e que eles e tipos textuais não são a
mesma coisa. Até porque os tipos textuais são fixos, mais ou menos meia dúzia,
enquanto que é humanamente impossível enumerar todos os gêneros textuais que
existem ou que existiram e também, em um texto há vários tipos textuais sendo um tipo
o predominante.
Um último detalhe aqui. Os textos eles se realizam em determinadas situações.
Em um ambiente de trabalho jurídico, por exemplo, teremos vários textos dentro desse
universo como petição, contratos, protocolos etc. Já em um contexto religioso
poderemos encontrar textos como parábolas, sermões, orações, mantras, confissões,
cantos etc. Observemos, assim, que existem muitos contextos e dentro deles alguns
gêneros são mais facilmente encontrados. A esses contextos diferentes chamamos
domínios discursivos
Em nosso curso iremos tratar de alguns gêneros textuais específicos do
domínio discursivo acadêmico (artigo, monografia, resumo, resenha etc)
que são próprios de ambientes universitários e de pesquisa. Porém,
como já mencionamos, não seria possível tratar de TODOS os gêneros
acadêmicos.
MENTE SÃ, CORPO SÃO: ESCREVER TEXTOS COMO EXERCÍCIO

É muito comum termos dificuldades em escrever. Não porque temos problemas


com a linguagem formal, a gramática da língua etc; mas porque, traduzir ideias em
palavras (escritas) nem sempre é fácil. É preciso uma prática constante. Tal qual como
fazer exercícios físicos em uma academia. Se nunca fizemos, o começo é literalmente
muito doloroso – isso sem falar daquele momento em que perdemos a empolgação e
tudo parece muito mais importante e urgente que ir malhar. Nessas horas nós vemos
quem tem a disciplina e o compromisso de continuar e quem não tem. Porém, depois
de um tempo, vira um hábito. Você sente falta quando não faz. Então, escrever não é
muito diferente. Se você não tem esse hábito, começar é difícil. Mas depois do primeiro
passo, as coisas vão se encaixando.
Um bom exercício de prática de escrita é fazer uma retextualização, isto é,
fazer um novo texto a partir de um ou mais texto já produzidos. Exemplificando: quando
escrevemos um livro e fazemos o índice ou o resumo ou a apresentação ou mesmo a
orelha do livro. O texto-base é o livro, mas os demais são outros textos baseados no
livro; Quando pegamos um texto extremamente técnico e reescrevemos usando uma
linguagem mais simples para um público geral, os
dois são o mesmo texto, de certa forma, mas
adaptados para seus públicos.
Reescrever e revisar um texto é uma
atividade de retextualização muito comum em
nosso dia a dia. Aliás, planejar um texto também!
Brainstorming ou tempestade de ideias).
Começamos por lançar as ideias (Brainstorming
Brainstorming é uma técnica que ou tempestade de ideias). Em seguida,
busca explorar a capacidade criativa selecionamos as ideias principais dentro do
ao expor de forma aleatória ideias que objetivo do texto e organizamos em uma ordem
surgem a partir de um determinado
assunto ou problema. Após essa lógica, criando um argumento que direcione o
enxurrada de ideias são filtradas e leitor ao objetivo do texto. Por exemplo: primeiro
organizadas aquelas que melhor se as ideias mais gerais, mais amplas e, aos poucos,
relacionam ao assunto. Muito comum
aquelas que são mais específicas para encerrar
para produzir textos ou em reuniões.
Uma variante dela é a com uma questão que leve o leitor a refletir sobre
“brainwritting” em que os o assunto. Após tudo isso, é transformar essas
participantes de uma reunião ideias em frases e sentenças e depois, com o uso
escrevem de forma anônima suas
dos elementos certos, formar um texto. Não é um
ideias para em seguida começar a
reunião e, de forma equitativa, todas bicho de sete cabeças, mas é preciso prática
as ideias anotadas possam ser constante.
discutidas. Com o tempo vamos tendo atenção à
determinados elementos importantes na hora de
produzir um texto como, por exemplo, repetição,
progressão, não-contradição e relação. Vamos elementos importantes
detalhar um pouco mais. Os elementos dentro do Existem alguns critérios, chamados
de critérios de textualidade, que
texto, bem como fora do texto (contexto) precisam
também são importantes e não podem
estar bem relacionados. Nesse ponto, o uso de ser ignorados durante a produção e
conectivos (preposições, conjunções etc) precisam análise de um texto.
estar alinhados de forma a haver sentido e evitar
contradições. Um produtor de texto desatento pode Coesão Fatores que
cometer essa falha: elaborar um texto cheios de regem a conexão
contradições – é claro que, quando existe uma dentro do texto
intenção de causar a contradição é diferente. A Coerência Elementos que
contradição, quando bem utilizada pode dar uma dão uma
continuidade de
força argumentativa ao texto. Do mesmo modo a
sentido
repetição. Alguns manuais dizem que repetir uma Intencionalidade Intenção do autor
palavra ou sentença várias vezes pode indicar ao produzir um
pobreza de vocabulário, pode deixar o texto texto
cansativo. Verdade. Mas quando fazendo isso de Aceitabilidade Grau de
propósito, o efeito é outro. Acabamos destacando tolerância para o
algo, enfatizando algo. Imaginem o texto da pedra de sentido do texto
Drummond se mudássemos as palavras por dado pelo leitor
sinôminos a cada frase... perderia o efeito de estilo. Situacionalidade Relaciona o texto
Em textos acadêmicos, claro, a situação é outra. à situação social,
Raramente seria necessário causar esse tipo de cultural etc
efeito. Por outro, é comum que um determinado Intertextualidade Relação do texto
termo-chave não possua sinônimos e acabe sempre com outros textos
Informatividade Refere-se ao
preciso repeti-lo mais vezes do que gostaríamos.
desenvolvimento
Nesses casos não há muito o que se fazer. Podemos do tópico do texto
evitar até certo ponto usando pronomes etc. Porém
acabamos repetindo. O mais importante é que essa
repetição não impeça o texto de progredir. A
progressão do texto pode ajudar a determinar até que ponto tais repetições são úteis
ou não. É preciso haver um equilíbrio entre as informações que já existem no texto
(aquilo que é dado) e as informações novas que acrescentamos (aquilo que é novo).
Enfim, como já repetimos, com a prática e exercícios vamos nos aprimorando e
nos familiarizando com os textos.
POR FIM, MAS NÃO TERMINANDO...

Há muita coisa a ser dita ainda sobre


escrita que não caberiam em apenas um texto
texto da pedra de Drummond como esse. Nossa ideia aqui foi ajudar a
No meio do caminho dar o primeiro passo. Ao longo de todo
No meio do caminho tinha uma pedra curso de Letras haverá várias
Tinha uma pedra no meio do caminho oportunidades de tratar desse tema,
Tinha uma pedra
No meio do caminho tinha uma pedra principalmente sob ponto de vistas
diferentes. É importante sempre
Nunca me esquecerei desse acontecimento procurarmos questionar nossos
Na vida de minhas retinas tão fatigadas
professores sobre e também
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
Tinha uma pedra pesquisarmos. Podemos partir de
Tinha uma pedra no meio do caminho algumas palavras-chave desse texto.
No meio do caminho tinha uma pedra. Esperamos ter estimulado a curiosidade
de todos.

ATIVIDADE:

Siga a seguinte sequência para escrever um texto. Só siga para o passo seguinte
quando terminar o anterior, não pule etapas e
nem se adiante.
Quando você pensa em escrever, o que
vem na sua cabeça? Faça uma lista de dez
itens com aquilo que primeiro vier na sua
cabeça.
Separe aqueles que tratam da
importância da escrita. Caso sobrem menos de
cinco itens, complete com outros que se
aproximam dessa ideia. É importante ter ao
menos cinco.
Organize esses itens em ordem de
importância, do menos para o mais importante.
Transforme esses itens em uma ou, no
máximo duas frases.
Reveja a ordem e, caso você ache
necessário reorganize de modo a seguir uma
sequência que lhe pareça lógica.
Utilizando os conectivos adequados,
desenvolva de modo que cada item (agora frase
ou frases) se torne um parágrafo.
Faça um revisão, se necessário uma reescrita de modo que seu texto fique coeso.
Peça para que um colega leia e aponte possíveis falhas e sugestões.
Faça uma nova reescrita para seu texto com o foco no tema: A importância da
escrita. Escolha um gênero textual, um público-alvo.

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